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7/23/2019 Há perigo na esquina(pedro sasse) http://slidepdf.com/reader/full/ha-perigo-na-esquinapedro-sasse 1/13 Há perigo na esquina: ficção e realidade nos espaços do medo de João do Rio Pedro SASSE* Resumo: Na literatura do medo, a ambientação é fundamental para a produção de seus efeitos estéticos. Esse trabalho pretende descrever os espaços do medo no Rio de Janeiro do início do século XX, a partir de duas obras de João do Rio:  Dentro da noite, uma coletnea de contos sobre os terrores e deturpaç!es da cidade, abordando temas como tortura, suicídios e deformaç!es" e  A alma encantadora das ruas, uma coletnea de cr#nicas sobre o lado menos $lamoroso da %elle &po'ue carioca, veremos a visão social e hist(rica do autor sobre os mesmos temas. )través de uma leitura comparativa, visa*se demonstrar como, na literatura de medo urbano, as fronteiras entre os espaços ficcionais e os espaços reais são difusas, e como essa característica contribui  para a produção do medo como efeito de recepção. +alavras*chave: Espaço, icção, João do Rio, -edo, Realidade. 1. n!rodução )o observar as hist(rias de medo, seam na literatura, no cinema ou até nos video$ames, perceberemos 'ue um dos elementos narrativos de maior /nfase em sua construção é a ambientação. 0ea através de minuciosas descriç!es escritas, de cen1rios  bem construídos, ou os cada ve2 mais comple3os sistemas de imersão dos $ames,  percebemos 'ue a maioria das obras desse $/nero não mede esforços na tentativa de envolver seu leitor no espaço ficcional 'ue prop!e. 41, porém, apesar da diversidade das hist(rias contadas, certas constantes no 'ue se refere 5 construção desse espaço, ou sea, temos uma série de elementos 'ue  parecem se repetir, não importa 'ual sea a trama em si, e 'ue tornam os espaços  parecidos. )o mostrar uma cena 'ual'uer de um filme para um espectador e per$untar  para o mesmo sobre o $/nero do filme, h1 uma $rande chance de ele acertar no caso dos filmes de terror. 6 mesmo acontecer1 em al$uns outros $/neros, como o western, por e3emplo. Nesse 7ltimo caso, podemos dedu2ir 'ue o pr(prio $/nero se cate$ori2a através de seu espaço narrativo, afinal, um faroeste s( pode acontecer no far west .

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http://slidepdf.com/reader/full/ha-perigo-na-esquinapedro-sasse 1/13

Há perigo na esquina: ficção e realidade nos espaços do medo de João do Rio

Pedro SASSE*

Resumo: Na literatura do medo, a ambientação é fundamental para a produçãode seus efeitos estéticos. Esse trabalho pretende descrever os espaços do medo no Rio

de Janeiro do início do século XX, a partir de duas obras de João do Rio:  Dentro da

noite, uma coletnea de contos sobre os terrores e deturpaç!es da cidade, abordando

temas como tortura, suicídios e deformaç!es" e  A alma encantadora das ruas, uma

coletnea de cr#nicas sobre o lado menos $lamoroso da %elle &po'ue carioca, veremos

a visão social e hist(rica do autor sobre os mesmos temas. )través de uma leitura

comparativa, visa*se demonstrar como, na literatura de medo urbano, as fronteiras entreos espaços ficcionais e os espaços reais são difusas, e como essa característica contribui

 para a produção do medo como efeito de recepção.

+alavras*chave: Espaço, icção, João do Rio, -edo, Realidade.

1. n!rodução

)o observar as hist(rias de medo, seam na literatura, no cinema ou até nos

video$ames, perceberemos 'ue um dos elementos narrativos de maior /nfase em suaconstrução é a ambientação. 0ea através de minuciosas descriç!es escritas, de cen1rios

 bem construídos, ou os cada ve2 mais comple3os sistemas de imersão dos $ames,

 percebemos 'ue a maioria das obras desse $/nero não mede esforços na tentativa de

envolver seu leitor no espaço ficcional 'ue prop!e.

41, porém, apesar da diversidade das hist(rias contadas, certas constantes no

'ue se refere 5 construção desse espaço, ou sea, temos uma série de elementos 'ue

 parecem se repetir, não importa 'ual sea a trama em si, e 'ue tornam os espaços

 parecidos. )o mostrar uma cena 'ual'uer de um filme para um espectador e per$untar 

 para o mesmo sobre o $/nero do filme, h1 uma $rande chance de ele acertar no caso dos

filmes de terror. 6 mesmo acontecer1 em al$uns outros $/neros, como o western, por 

e3emplo. Nesse 7ltimo caso, podemos dedu2ir 'ue o pr(prio $/nero se cate$ori2a

através de seu espaço narrativo, afinal, um faroeste s( pode acontecer no far west .

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Em primeira an1lise, não poderíamos pensar no medo como um $/nero

classificado pelo espaço, 1 'ue a hist(rias encontramos hist(rias de terror nos mais

diversos ambientes, desde $randes cidades 8O médico e o monstro, de 0tevenson9, a

castelos $(ticos 8O castelo de Otranto, de alpole9. ;emos, contudo, 'ue certos

elementos nos podem fa2er identificar ambas as hist(rias como terror. 4averia, então,

um topos específico do medo, 'ue tornaria tal $/nero classific1vel por seu ambiente<

)o analisar os espaços de obras tão díspares, não vamos encontrar, obviamente,

elementos suficientes na construção do cen1rio 'ue possam tornar possível a afirmação

de um espaço homo$/neo do medo. )inda assim, podemos, porém, ver como h1 certa

semelhança na maneira como se constroem os cen1rios.

 Na literatura, a descrição do cen1rio revela o ponto de vista do narrador. No caso

da literatura do medo, essa descrição busca também convencer o leitor de certo ponto de

vista sobre o ambiente: o leitor deve v/*lo como um local hostil, a ser temido. =uando o

leitor conse$ue assimilar esse espaço como um local de peri$os, ele pode assimilar com

mais facilidade a situação em 'ue se encontra a persona$em, o 'ue colabora na

construção do medo artístico na cena. >m procedimento comum para a produção desse

convencimento é o uso de um campo semntico característico, com palavrasrelacionadas 5 morte, destruição, imundície, sentimentos ne$ativos, etc. ?ais elementos

 podem ser encontrados em $rande parte das obras relacionadas ao medo, servindo para

caracteri2ar diferentes espaços. -uitas ve2es, che$am a sair do campo liter1rio servindo

 para construir uma perspectiva em te3tos ornalísticos, por e3emplo.

". Espaço e#!erno

)lém de pensar no espaço construído dentro da narrativa em si, marcado por todos esses elementos 'ue o tornam um locus propício ao medo, podemos notar 'ue

certos elementos e3trate3tuais influenciam na recepção desse tipo de obra. 6 espaço no

'ual o leitor se insere funciona como um potenciali2ador @ se não um condicionador @,

do medo estético.

+ara introdu2ir uma e3plicação sobre o funcionamento do espaço e3terno nas

narrativas de medo, analisemos um conto de )mbrose %ierce chamado A6 ambiente

ade'uadoB, 'ue e3plora até 'ue ponto o ambiente de leitura é importante para a fruição

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de uma Ahist(ria de assombraçãoB. 6 conto possui um prel7dio 'ue nos mostrar1 o

espaço*chave da narrativa. >m menino, filho de um fa2endeiro, perdido ap(s partir em

 busca de al$umas vacas des$arradas, se$ue por uma trilha de cavalos na floresta:

) noite estava clara, mas dentro da floresta a escuridão envolvia tudo.Era mais pelo tato do 'ue pela visão 'ue ele se$uia caminho. Na verdade,seria difícil sair da trilha. Ce ambos os lados a ve$etação, de tão fechada,era 'uase impenetr1vel. J1 caminhara floresta adentro por dois ou tr/s'uil#metros 'uando se surpreendeu ao ver uma fraca luminosidade

 brilhando através da folha$em na beira do caminho, 5 sua es'uerda. 8...9+ouco depois, emer$ia da floresta, indo dar num pe'ueno espaço aberto,recoberto de espinheiros. 4avia res'uícios de uma cerca, semidestruída.) poucos metros da trilha, no meio da clareira, l1 estava a casa de ondeemanava a lu2, através de uma anela sem vidros. ) anela um dia tiverauma vidraça, mas esta, assim como a es'uadria, tinha sido h1 muitodestruída pelos proéteis arremessados por meninos aventureiros,dispostos a provar, a um s( tempo, sua cora$em e sua hostilidade 5sforças sobrenaturais. 0im, por'ue a casa %reede tinha a reputação malditade ser uma casa mal*assombrada. ?alve2 não o fosse, mas nem mesmo omais cético poderia ne$ar 'ue estava abandonada @ o 'ue, em 2onasrurais, si$nifica praticamente a mesma coisa. 8%DERE, FGGG, p. HH*HI9

6s elementos de um espaço do medo 1 estão todos elencados: a escuridão da

floresta, a densidade claustrof(bica da ve$etação, a decrepitude da casa, etc. >ma ve2 o

leitor se depara com tal descrição, a tensão narrativa aumenta, visto 'ue este 1 espera

acontecimentos típicos de uma hist(ria de medo. Cevemos, porém, ressaltar 'ue o

narrador não se apro3ima do persona$em 'ue passa por essa re$ião, descrito apenas

como Aum meninoB. Esse persona$em não deve ser assimilado pelo leitor, é apenas um

elemento periférico na hist(ria. Ciante disso, poderia ficar a d7vida: se esse primeiro

 ponto serve apenas de introdução ao cen1rio do conto, por 'ue não é descrito pelo

 pr(prio narrador, heterodie$ético, mas sim por um persona$em 'ue não é o centro da

trama< ) construção do ambiente do medo, como veremos, est1 muito mais li$ada auma forma de abordar o espaço 'ue ao espaço em si. ?anto é assim 'ue uma das poucas

informaç!es sobre o menino 'ue nos é dada vem de suas crenças na casa como um lu$ar 

assombrado, comprovando assim a perspectiva amedrontadora dada por ele.

eita essa ambientação inicial, na 'ual o ovem se depara com uma casa 'ue

 ul$ava ser mal assombrada, descobrimos untamente com o persona$em 'ue l1 se

encontra:

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) fi$ura de um homem sentado no meio da sala, diante de uma mesaonde havia al$umas folhas de papel. 6s cotovelos estavam sobre a mesae as mãos sustentavam a cabeça, sem chapéu. Ce ambos os lados, osdedos estavam enfiados nos cabelos. ) lu2 da 7nica vela 'ue brilhava a

seu lado, o rosto do homem era de uma palide2 cadavérica. 8%DERE,FGGG, p. HI*HG9

6 narrador d1 um corte na cena e nos transporta para o dia anterior ao fato, no

'ual dois ami$os conversam. olton é escritor e publica num ornal da cidade, en'uanto

-arsh é um ami$o seu 'ue o l/, dando suas opini!es acerca da obra do ami$o. Nessa

conversa, olton critica o ami$o pela leitura descompromissada 'ue fa2 de uma de suas

hist(rias de assombração. 6 escritor ale$a 'ue é necess1ria do leitor certa preparação

 para uma leitura desse $/nero, ou sea, é necess1rio estar Aem total solidão @ 5 noite @ 

sob a lu2 de uma vela.B 8%DERE, FGGG, p. I9. olton afirma 'ue outros sentimentos

são mais f1ceis de serem inspirados, mas 'ue o medo re'uer mais esforço do leitor, 'ue

ele Ase disponha a sentir a emoçãoB 8%DERE, FGGG, p. I9. Refletindo sobre essa

afirmação, podemos pensar 'ue uma das causas possíveis dessa resist/ncia natural do

leitor ao $/nero se d/ pela nature2a de tal emoção. 6 medo estético é similar em al$uns

sentidos a um medo e3clusivo do homem, descrito por %auman como Amedo derivadoB:

6 Kmedo derivadoK é uma estrutura mental est1vel 'ue pode ser mais bem descrita como o sentimento de ser  suscetível ao peri$o" umasensação de inse$urança 8o mundo est1 cheio de peri$os 'ue podem seabater sobre n(s a 'ual'uer momento com al$um ou nenhum aviso9 evulnerabilidade 8no caso de o peri$o se concreti2ar, haver1 pouca ounenhuma chance de fu$ir ou de se defender com sucesso" o pressupostoda vulnerabilidade aos peri$os depende mais da falta de confiança nasdefesas disponíveis do 'ue do volume ou da nature2a das ameaças reais98%)>-)N, LLI, p.LG9

Ciferente do medo direto, sentido frente a uma fonte de peri$o imediata, o medo

derivado é um medo proetado numa situação hipotética. Ciante da noção dos peri$os

do mundo, uma pessoa sente medo dos in7meros peri$os 'ue ela emula em sua mente.

 No medo estético, através da assimilação da situação do persona$em, sente*se também

essa emoção pelo peri$o ima$inado. %auman dei3a claro 'ue se trata mais da falta de

confiança do 'ue o volume ou nature2a das ameaças. & preciso, então, tirar essa

se$urança do leitor, dei31*lo e3posto, vulner1vel. +ara criar essa sensação, as hist(rias

de medo fa2em uso de diversas estraté$ias. Dntrate3tualmente, o leitor pode ser e3posto

através da 'uebra de suas cate$orias co$nitivas, deparando*se com o incompreensível

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desconhecido, o monstro, 'ue, por não ser possível entender, fo$e ao controle do leitor.

E3trate3tualmente, a e3posição pode se dar de forma mais direta. 6 pr(prio local da

leitura, como indicado por olton.

6 escritor, então, desafia seu ami$o a se$uir sua proposta, oferecendo*lhe um

ambiente ade'uado para a leitura e um manuscrito 'ue Aseria capa2 de mat1*lo.B 6

rapa2 não hesitou em aceitar a proposta e assim descobrimos 'ue -arsh era o misterioso

homem na casa assombrada.

) terceira parte do conto nos mostra, então, o desfecho da aposta de olton e

-arsh. 6 menino @ 'ue na noite anterior havia ido até a casa assombrada e se deparado

com o an$ustiado leitor @ a$ora voltava ao local unto a al$uns homens. M1 encontraramo corpo de -arsh ao lado do manuscrito 'ue foi dado para leitura como parte do trato.

 Nesse manuscrito, olton mencionava um misterioso pacto de morte com o anti$o

morador da casa, 'ue havia se suicidado h1 'uatro anos e di2ia 'ue ele faria o mesmo

na'uela noite, voltando para visit1*lo ap(s a meia*noite. ;isto 'ue encontramos -arsh

morto, somos levados a pensar 'ue olton havia, de fato, voltado dos mortos e

assombrado o rapa2 até a morte, porém na 7ltima parte do conto somos informados 'ue

olton não s( não morreu como fora internado na'uela noite ap(s uma tentativa desuicídio. 0endo assim, vemos, apesar de al$um indício sobrenatural na imprecisão do

 pacto e de al$umas partes não mencionadas do manuscrito, o medo criado na união

entre o espaço e3tra e intraficcional criou a atmosfera perfeita para a recepção da

hist(ria de assombração de olton.

0endo assim, vemos 'ue não s( o aspecto físico do ambiente no 'ual -arsh foi

inserido, mas também o conte3to relacionado a esse ambiente contaram decisivamente

 para a criação do medo estético, 'ue no conto foi ma$nificado até a morte do leitor.

-esmo 'ue não se che$ue a esse limite, somos dessa forma influenciados pelo ambiente

e3terno, tanto em seu aspecto físico e mais imediato 'uanto em seu aspecto conte3tual.

=uanto ao aspecto físico podemos perceber 'ue são mais propícios os ambientes

de comun$am dois principais fatores: escuridão e isolamento. 6 primeiro est1 li$ado 5

se$urança propiciada pelo nosso sentido mais desenvolvido, a visão. 6 ambiente escuro

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cancela essa possibilidade, dei3ando*nos a merc/ da incerte2a, da ima$inação e de seus

terrores. Nas palavras de %auman:

 Na escuridão, tudo pode acontecer, mas não h1 como di2er o 'ue vir1. )escuridão não constitui a causa do peri$o, mas é o habitat natural daincerte2a * e, portanto, do medo. 8%)>-)N, LLI, p.LI9

) se$unda nos priva de nossa se$urança social. )poiar*se no outro em

momentos de peri$o é uma forma de lidar como medo, sea para prote$er ou pedir 

 proteção, ou apenas para $arantir 'ue seu sofrimento não sea solit1rio, inc($nito.

%auman cita esse fator como:

8...9 o medo de ser pinçado  sozinho da ale$re multidão, ou no m13imoseparadamente, e condenado a sofrer  solitariamente en'uanto todos osoutros prosse$uem em seus fol$uedos. 8%)>-)N, LLI, p.I9

Ciante de disso, a ima$inação $anha $rande força sobre o real, 1 'ue o entorno

não pode ser nem confirmado pelos sentidos, nem pela ra2ão comum.

J1 o aspecto conte3tual pode ser relacionado diretamente com o ambiente da

leitura em seu sentido mais estrito, como é o caso da hist(ria sobre o suicídio na casa,

como pode ser visto em sentido mais amplo, como um medo compartilhado por uma

re$ião ou época específica. 6 conto colabora com essa ideia 'uando menciona em um

trecho a predisposição re$ional ao medo de fantasmas:

 0im, por'ue a casa %reede tinha a reputação maldita de ser uma casamal*assombrada. ?alve2 não o fosse, mas nem mesmo o mais cético

 poderia ne$ar 'ue estava abandonada @ o 'ue, em 2onas rurais, si$nifica praticamente a mesma coisa. 8%DERE, FGGG, p. HI9

 No %rasil, parte si$nificativa das hist(rias 'ue su$erem a presença de fantasmas

na literatura do medo nacional tem o sertão como ambiente. ?ais narrativas, se lidas emuma atmosfera de crença em tais seres, potenciali2am sua capacidade de $erar o medo

estético.

En'uanto nas re$i!es rurais poderíamos ver essa predisposição pelo medo de

fantasmas, a metr(pole também parece ter seu medo característico: 6 conte3to urbano

 bombardeia seu habitante com notícias de acidentes, roubos, assassinatos, e diversas

outras formas de peri$o, construindo assim uma atmosfera inse$ura, principalmente no

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 período noturno. ?al ambiente torna possível o sur$imento de diversas hist(rias de medo

'ue se utili2am desse conte3to para afetar seu leitor.

41, ainda, uma peculiaridade no espaço do medo urbano 'ue é crucial paraentender sua centralidade na ficção do medo contempornea: En'uanto o espaço

sobrenatural é alheio a realidade do leitor @ visto 'ue não e3istem vampiros,

lobisomens, bru3os e fantasmas para a maioria das pessoas @ no medo urbano, o espaço

das obras coincide com o espaço do pr(prio leitor, não h1 como traçar as fronteiras 'ue

separam o espaço intra e e3trate3tual 'uando se trata desse $/nero, visto 'ue a mesma

cidade habitada, por e3emplo, pelos cruéis assassinos de Rubem onseca é a cidade

habitada pelos seus leitores. 0endo assim, o efeito do medo estético se intensifica pela

sobreposição dos espaços, e, conse'uentemente, dos pr(prios medos.

$. %edo ur&ano e João do Rio

) cidade, local 'ue antes era símbolo de proteção, se$urança, em al$um

momento passou a ser sin#nimo ustamente do contr1rio, tornando*se reconhecida como

um foco de peri$os. )'ueles 'ue estavam 5 nossa volta, antes vistos como pr(3imos,

como um $rupo, a$ora são desconhecidos, potenciais inimi$os separados por uma fina

casca de civilidade. )pesar de h1 séculos e3istirem centros urbanos, é no nascimento da

urbe moderna 'ue desperta no homem um sentimento, misto de terror e fascínio, com a

fi$ura da cidade. +odemos ver esse sentimento sur$indo 1 em es1rio ;erde, com A6

sentimento dum ocidentalB, ou em %audelaire, nos A=uadros parisiensesB, e no %rasil,

onde um dos maiores porta*vo2es desse sentimento é o flaneur  João do Rio.

João +aulo Emílio rist(vão dos 0antos oelho %arreto, conhecido na literatura

 pelo seu pseud#nimo João do Rio, analisa a partir de ambas as profiss!es a cidade, seulado brilhante e seu lado obscuro, a ri'ue2a e a miséria. Em  A alma encantadora das

ruas, busca, através de uma série de cr#nicas tiradas de suas andanças pelas ruas do Rio,

e3pressar não s( a cidade, mas transmitir um pouco da pr(pria e3peri/ncia de caminhar 

 por ela, de senti*la. J1 em  Dentro da noite, vemos, ambientados na mesma cidade,

contos 'ue parecem e3pandir essa e3peri/ncia urbana, 'ue fo$em do vivido, mas não

dei3am de representar o perfeitamente possível. Em ambos, a cidade não é apenas um

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cen1rio, mas um or$anismo vivo, suas ruas tem alma, como vemos constantemente em

suas personificaç!es da cidade:

6h sim, as ruas t/m alma 41 ruas honestas, ruas ambí$uas, ruassinistras, ruas nobres, delicadas, tr1$icas, depravadas, puras, infames,ruas sem hist(ria, ruas tão velhas 'ue bastam para contar a evolução deuma cidade inteira, ruas $uerreiras, revoltosas, medrosas,  spleenéticas,

 snobs, ruas aristocr1ticas, ruas amorosas, ruas covardes, 'ue ficam sem pin$a de san$ue... 8RD6, LFO, p.P9.

)l$umas dessas ruas acabam por $anhar essa alma AsinistraB citada por João do

Rio, 'ue nos ser1 de $rande valia na descrição do espaço urbano do medo. Mo$o na

introdução de suas cr#nicas sobre o Rio, 1 temos indícios do tratamento 'ue ele dar1 a

esses locais:) Rua da -iseric(rdia, ao contr1rio, com as suas hospedarias

l#bre$as, a miséria, a des$raça das casas velhas e a cair, os corredores bafientos, é perpetuamente lament1vel. 8...9 h1 ruas l7$ubres, por onde passais com um arrepio, sentindo o peri$o da morte Q o Mar$o do -oura por e3emplo. oi sempre assim. M1 e3istiu o Necrotério e antes do Necrotério l1 se er$uia a orca. )ntes da aut(psia, o enforcamento. 6velho lar$o macabro, com a alma de ?ropmann e de Jac, depois dematar, avaramente $uardou anos e anos, para escalpel1*los, para cham1*los, para $o21*los, todos os corpos dos des$raçados 'ue se suicidam ou

morrem assassinados. ?resanda a crime, assusta. ) +rainha também.-esmo hoe, aberta, alar$ada com prédios novos e a trepidação contínuado comércio, h1 de vos dar uma impressão de va$o horror. S noite sãomais densas as sombras, as lu2es mais vermelhas, as fi$uras maiores. +or 'ue ter1 essa rua um aspecto assim< 6h +or'ue foi sempre m1, por'uefoi sempre ali o )lube, ali padeceram os ne$ros dos tr/s primeirostrapiches do sal, por'ue também ali a forca espalhou a morte 8RD6,LFO, p. P*T9

Esse sentimento ambí$uo, sublime e amedrontador 'ue se sente pela cidade é

também visto na fi$ura do monstro na ficção 'ue, como di2 ohen em A) cultura dos

monstros: sete tesesB, atrai e repele.

6 medo urbano sur$e, então, como um medo contemporneo, e3plorado dentro

da ideia do medo lí'uido de %auman, um medo disperso, inconstante, sem uma

delimitação clara na 'ual se apoiar:

6 'ue mais amedronta é a ubi'uidade dos medos" eles podem va2ar de'ual'uer canto ou fresta de nossos lares e de nosso planeta. Cas ruas

escuras ou das telas luminosas dos televisores. Ce nossos 'uartos e denossas co2inhas. Ce nossos locais de trabalho e do metr# 'ue tomamos

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 para ir e voltar. Ce pessoas 'ue encontramos e de pessoas 'ue nãoconse$uimos perceber. Ce al$o 'ue in$erimos e de al$o com o 'ualnossos corpos entraram em contato. 8%)>-)N, LLI, p.F9

 ) relação dos narradores com a cidade é um dos pontos de intercessão entre  A

alma encantadora das ruas e  Dentro da noite. +or um lado, a ficção é permeada de

fatos, persona$ens e ambientes encontrados em suas cr#nicas ornalísticas, por outro, as

reporta$ens recebem um tratamento liter1rio tal, 'ue, não fosse o suporte, seria difícil

distin$ui*las de certos capítulos da ficção.

 Na literatura do medo urbano, é comum essa sobreposição de discursos. >ma

ve2 'ue se mantém o mesmo ambiente, o mesmo tipo de a$ente do medo e a mesma

forma de lidar com o obeto, a distinção entre o discurso ornalístico e o discursoliter1rio nesse sub$/nero do medo muitas ve2es fo$e ao te3to, sendo apenas uma

informação adacente ao fato em si. omo considerar os casos descritos em Cidade de

 Deus, de +aulo Mins< iccionali2ação da realidade< >ltrarrealismo ficcional<

+arece 'ue o car1ter Alí'uidoB do a$ente do medo moderno, principalmente o

a$ente do medo urbano, também afeta o pr(prio discurso 'ue o sustenta, uma ve2 'ue se

 perde a certe2a das fronteiras 'ue separam o monstro do leitor.

'. ( )ornalismo li!erário e a li!era!ura )ornals!ica

) partir dessa ideia da sobreposição dos discursos, podemos observar, na

tem1tica do medo urbano, ambos os lados dessa fusão, percebendo tanto os aspectos

liter1rios 'ue são transmitidos aos discursos 'ue tem como obetivo principal informar,

'uanto as inspiraç!es ornalísticas no discurso 'ue não tem, a princípio, compromisso

em ser fiel 5 realidade. Na virada para o século XX, as formas de acesso ao mundo eram, 'uase 'ue

e3clusivamente, através do mundo escrito. Mivros, ornais, revistas e pinturas

transmitiam a $rande parte da população uma realidade pouco acessível de outras

formas. Mer os romances re$ionalistas, com suas lon$as descriç!es espaciais, era uma

forma de conhecer um pouco dos costumes e do ambiente das 1reas rurais do país. Ca

mesma forma, no ornalismo, al$umas reporta$ens eram também uma forma de efetuar 

essa via$em a um mundo desconhecido. Euclides da unha, ao escrever Os Sertões, o

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fa2, em parte, baseado em seus pr(prios te3tos ornalísticos, 'ue eram uma forma do sul

do país saber como era a realidade da re$ião de anudos. )ssim, as cr#nicas urbanas

também eram uma forma do leitor AverB partes da cidade 'ue lhe eram invisíveis.

+ara 'ue um ambiente urbano sea e3perimentado como um ambiente do medo,

é necess1rio mais do 'ue uma descrição neutra de um local ou um relato frio de um

evento urbano: o narrador contamina o 'ue é narrado com sua visão de mundo,

construindo uma narrativa subetiva 'ue em pouco difere de um conto. & o caso de

al$uns capítulos de A alma encantadora das ruas, nos 'uais João do Rio apresenta suas

e3peri/ncias em al$umas das 1reas do submundo carioca:

0into n1useas e ao mesmo tempo uma nevrose de crime. ) treva da salatorna*se lívida, com tons a2ulados. 41 na escuridão uma nuvem de fumoe as bolinhas pardas, 'ueimadas 5 chama das candeias, p!em uma tonturana furna, dão*me a imperiosa vontade de apertar todos a'ueles pescoçosnus e e3an$ues, pescoços viscosos de cad1ver onde o veneno $ota a $otadessora.E as caras continuam emplastradas pelo mesmo sorriso de susto e des7plica, multiplicado em 'uin2e beiços amarelos, em 'uin2e dentadurasnoentas, em 'uin2e olhos de tormento

 Q 0enhor, pode ir, pode ir< N(s vamos deitar" pode ir< Q suplica?chan$.)rrasto o $uia, fuo ao horror do 'uadro. ) r(tula fecha*se sem rumor.Estamos outra ve2 num beco infecto de cidade ocidental. 6s chins pelas

 persianas espiam*nos. 6 meu ami$o consulta o rel($io. 8RD6, LFO, p.OG9

;emos como João do Rio fa2 'uestão de descrever o espaço, utili2ar amplamente

o campo semntico típico do espaço do medo: treva, viscosos, cad1ver, veneno, susto,

horror. )s frases curtas dão ao te3to um aspecto de pressa, de tensão. Esse ambiente

infecto, descrito na casa de (pio visitada por João do Rio, pode ser visto também nas

infectadas ruas de A) pesteB de Dentro da noite:

6 ar, um pouco 7mido e um pouco cortante, con$ela as mãos, tonifica ave$etação, e o mar, 'ue se v/ 5 distncia num recanto de lodo, temrefle3os espelhentos de $randes escaras de cha$as, de (leo escorrido deferidas 5 superfície 'uase im(vel. 6 cheiro de desinfecção e 1cido f/nico,o movimento sinistro das carrocinhas e dos autom(veis $alopando ecorrendo pela rua de mau piso, a'uela sueira re'ueimada e manchadadas calçadas, o ar sem pin$a de san$ue ou supremamente indiferente dosempre$ados da hi$iene, a sinistra $aleria de caras de choro 'ue os meusolhos vão vendo, p!e*me no peito um apressado bater de coração e na

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$ar$anta como um laço de medo. ) be3i$a a be3i$a & verdade 'ue h1uma epidemia... E eu vou para l1, eu vou para o isolamento, eu 8RD6,LL, p. FPI9

João do Rio não foi o 7nico a trabalhar tal tem1tica. Muis Edmundo, ao visitar,

também, uma casa de (pio, tem impress!es pr(3imas a João do Rio:

0ão rostos cor de oca, 'ue se desenham em meio 5 lu2 'ue bru3uleia,m1scaras da hi na anti$a, as hediondas m1scaras manchus dos temposda dinastia -in$, fisionomias de desenterrados, mostrando a cova dosolhos ne$ra, como 'ue comida pela terra. )s bocas, de onde pende o pipodos cachimbos, são bocas aterradoras, como as dos 'ue morrem numespasmo de sofrimento e de dor. ?roncos es'ueléticos, fran2inos,

relu2entes de suor. =uando a $ente se abai3a e toca um desses corposseminus, sente uma carne mole, 'ue até parece 'ue se desfa2 5 mais leve

 pressão dos nossos dedosB 8EC->NC6, LLO, p. FFI9

)ssim como as cr#nicas fa2iam uso dessas formas de e3pressão liter1rias, a

literatura de João do Rio, por sua ve2, também bebia dos espaços de medos construídos

nas suas cr#nicas. -esmo em ambientes sin#nimos de felicidade, como as ruas

enfeitadas e festivas do carnaval, João do Rio cria, baseado numa perspectiva eliti2ada

das festas populares, um cen1rio de medo e opressão, 'ue aparece em  A alma

encantadora das ruas:

) multidão apertava*se, sufocada. 4avia sueitos con$estos, forçando a passa$em com os cotovelos, mulheres afo$ueadas, crianças a $ritar, tipos'ue berravam pilhérias. 8...9) rua convulsionava*se como se fosse fender,rebentar de lu37ria e de barulho. ) atmosfera pesava como chumbo. 8...9era como 'ue arrepiada pela corrida diab(lica e incessante dos archotes edas pe'uenas lmpadas port1teis. 8RD6, LFO, p. TT9

a2endo uso desses ambientes 1 construídos em suas cr#nicas e de uma opinião

 1 difundida entre a elite 'ue evitava contato com o povo, João do Rio, em A6 beb/ de

tarlatana rosaB, não teve dificuldade em transportar a sensação de an$7stia dos blocos

carnavalescos para a ficção:

8...9 era uma desolação com pretas beiçudas e desdentadas esparrimando belbutinas fedorentas pelo estrado da banda militar, todo o pessoal de

a2eiteiros das ruelas l#bre$as e essas estranhas fi$uras de larvas

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diab(licas, de íncubos em frascos de 1lcool, 'ue tem as perdidas de certasruas, moças, mas com os traços como amassados e todas p1lidas, p1lidasfeitas de pasta de mata*borrão e de papel de arro2. 8RD6, LL, p. F9

Eram tr/s horas da manhã. 6 movimento das ruas abrandara. 6s outros bailes 1 tinham acabado. )s praças, horas antes incendiadas pelos proetores elétricos e as cambiantes enfurnadas dos fo$os de ben$ala,caíam em sombras Q sombras c7mplices da madru$ada urbana. E s(,indicando a folia, a e3citação da cidade, um ou outro carro arriadolevando m1scaras aos beios ou al$uma fantasia tilintando $ui2os pelascalçadas fofas de AconfettiB. 6h a impressão enervante dessas fi$urasirreais na semi*sombra das horas mortas, roçando as calçadas, tilintandoa'ui, ali um som perdido de $ui2o +arece 'ual'uer coisa de impalp1vel,de va$o, de enorme, emer$indo da treva aos pedaços... 8RD6, LL, p.FP9

+. ,onclusão

 Na atualidade, esse sub$/nero parece $anhar mais força a cada dia e, conforme

min$uam ou desaparecem os monstros sobrenaturais, novos a$entes do medo urbano

sur$em a cada dia, em novas hist(rias de psicopatas, assassinos seriais, se'uestradores,

etc. ?emos escritores consa$rados em nossa literatura, como Rubem onseca, 'ue

abordam amplamente o tema. No campo cinemato$r1fico vemos, também, diversasobras representando tal $/nero.

0em essa fronteira do ficcional e do real bem definida e com o claro aumento

das ameaças na vida urbana, vemos 'ue o medo urbano é cada ve2 mais efica2 em sua

 proposta de medo estético, tra2endo ao leitor um medo 'ue não s( é sentido através da

narrativa, mas alcança o plano da realidade e d1 ao leitor a chance de refletir sobre os

 pr(prios medos 'ue o rodeiam.

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Janeiro: Jor$e Uahar Ed., LLI.

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Editorial, LLO..

RD6, João do. Dentro da noite. 0ão +aulo: )nti'ua, LL.

 VVVVV.  A alma encantadora das ruas. Rio de Janeiro, undação %iblioteca Nacional.

Cisponível em: Whttp:obdi$ital.bn.bracervoVdi$itallivrosVeletronicosY. )cesso em:

FL mai. LFO.