guerra farroupilha e subjetividade de gênero...
TRANSCRIPT
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 70
Guerra Farroupilha e subjetividade de gênero: representações da mulher na literatura e na História do Rio Grande do Sul
Fabiana Sana Aliardi1
Resumo: Este artigo objetiva realizar um diálogo entre a Literatura, a partir do cruzamento da obra A Casa das Sete Mulheres, com as representações do real vivido e da historiografia contemporânea das mulheres na Revolução Farroupilha. O cruzamento de olhares é pertinente para que haja o diálogo. Num recorte mais específico centrarei meu olhar na escrita literária a partir da questão de gênero feminino, procurando compreender as construções da mulher sul-rio-grandense. Palavras- chave: história – literatura – práticas de leitura – subjetividade – gênero. Abstract: This article aims to conduct a dialogue between the Literature, from crossing from the work “A Casa das Sete Mulheres” with representations of the real and lived contemporary historiography of women in “Revolução Farroupilha”. The crossing of the works is appropriate for there to be the dialogue. In a more specific cut I focused my gaze in the literary writing from the issue of female gender, seeking to understand the constructions of the women of the “Rio Grande do Sul”. Keywords: history - literature - reading practices – subjectivity - gender.
Primeiras palavras
Iniciar uma escrita não é fácil, é uma tarefa que exige habilidade com o jogo das
palavras, contudo, uma narrativa não precisa começar pelo começo. Posso iniciá-la
no meio, ou até mesmo de traz pra frente; ou quem sabe ainda, ficar no vaivém.
Enfim, o que posso adiantar é que a ordem aqui não altera a narrativa da Revolução
Farroupilha, e muito menos atrapalha o entendimento da história das mulheres,
todavia, a leitura de uma narrativa literária proporciona um conjunto de
interpretações de acordo com a subjetividade de cada leitor. A fim de enquadrar a
proposta deste artigo, esclareço que a vertente teórica que regem as argumentações
aqui apresentadas pressupõe uma inclinação substantiva no campo literário, porém
as representações do real vivido atuarão em filigrana a fim de efetivar o diálogo
entre a História e a Literatura. O objetivo, portanto, da pesquisa foi dialogar o real
com a representação da realidade da subjetividade de gênero da mulher gaúcha.
1Graduada em Letras/licenciatura – FACOS/CNEC. Acadêmica do curso de Pós-Graduação em
Diálogos entre a Literatura e a História do Rio Grande do Sul pela FACOS/CNEC. E-mail: [email protected]
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 71
Ao lançar o olhar sobre a narrativa A Casa das Sete Mulheres percebe-se que a
família vem sendo desenvolvida por três gerações e que a escritora mesclou
realidade e ficção em uma narrativa histórica, onde fez o uso magistralmente, como
pano de fundo, a Revolução Farroupilha e o Rio Grande do Sul dos meados do
século XIX. A obra traz uma história dentro da outra, cada enredo complexando o
outro; a trama das sete mulheres, a vida de seus homens, tudo dentro de uma casa
e esta a mercê de um pampa sangrento e belicoso. “A força motriz desse épico são
as gentes, os agentes da Revolução Farroupilha, aqueles que lutaram nos campos
de batalha, e aqueles que esperaram na estância, defendendo suas propriedades e
seus filhos” (PESAVENTO, 1984, p.28) sobrevivendo com a esperança de que
chegue uma carta, um bilhete, um recado que acalente o coração e amenize o
sofrimento das mulheres da casa; decidindo ate mesmo o novo rumo e o destino de
todas.
O líder do movimento, o General Bento Gonçalves da Silva, isola as mulheres de
sua família na estância do Brejo, à beira do Rio Camaquã, afastadas da área de
conflito, na intenção de protegê-las durante a guerra. Porém esta demorou mais do
que elas esperavam. E o destino encarregou-se da história de cada mulher da casa.
Devido à diversidade da obra, vários aspectos compreendem o trabalho: a narrativa
histórica visto com base na História e na Literatura, onde serão apresentadas as
semelhanças e as diferenças de um e de outro; a Literatura como suporte sendo a
subtração do mundo à sombra do presente, partindo de fragmentos da obra; e por
fim, Literatura e História e a Subjetividade do Gênero. São neste excerto que serão
expostos fatores ficcionais e reais da obra. Devo adiantar que o fato real foi a
Revolução Farroupilha e a ficção fez parte da descrição das mulheres e de seus
afazeres na obra literária. A ficção inspirada na história gera conhecimento e, assim
como o historiador, o ficcionista tem de representar a história para relatá-la. Já o
termo gênero, segundo Guacira Louro (1997), vem circulando nas ciências sociais,
psicológicas e literárias com uma concepção específica e uma intenção de explicar e
descrever o conjunto de comportamentos atribuídos a homens e mulheres. E o
gênero vem na companhia da subjetividade feminina no que diz respeito à questão
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 72
do outro, e o outro é sempre o próprio sujeito e não um outro sujeito com dignidade
equivalente.
Há importantes autores que discorrem sobre o fato histórico “A Guerra dos
Farrapos”, fator que deu embasamento à narrativa histórica (A Casa das Sete
Mulheres). Contudo, a fundamentação teórica norteadora da pesquisa empírica teve
a contribuição de sólidas documentações compulsada de Fábio Kuhn e Sandra
Pesavento.
Foi no dia 19 de setembro de 1835 que eclodiu a Revolução Farroupilha no
Continente de São Pedro do Rio Grande. Para Fábio Kuhn (2004), os
revolucionários exigiam a deposição imediata do presidente da província, e uma
nova política para o charque nacional e menores impostos para o sal. Coerente com
a concepção teórica perfilhada, Sandra Pesavento (2004) focaliza a instância de
formação do processo gaúcho: a da hegemonia dos quadros da República Velha e a
civilização dos interesses da mesma no interior da sociedade civil; nos retratos de
cada autor observou-se que mais cedo ou ais tarde, o Rio Grande do Sul correria o
risco de ser dominado, e o andamento do cotidiano poderia ser alterado.
Entretanto, esse não é um trabalho de história regional somente, é uma tentativa
bem sucedida de inserir as variáveis específicas da área em contato mais amplo,
escapando assim ao vezo historiográfico de explicar o processo histórico regional da
Guerra dos Farrapos, isolado da realidade mais abrangente na qual se norteou a
pesquisa, pois, o objetivo pretendido foi apresentar as mulheres, que tomaram as
rédeas da casa enquanto seus homens lutavam pela causa do Rio Grande na
guerra, e também apresentar Anita, única mulher que combateu ao lado dos
soldados. A pesquisa mostrou a realidade da mulher gaúcha durante os dez anos da
guerra e como esse tempo transformou a realidade das gaúchas.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 73
A narrativa histórica: história e literatura Sul-Rio-Grandense
Antes de adentrar especificamente na discussão do tema – mulher e subjetividade
de gênero - entendi como pertinente e necessário elucidar algumas questões
relacionadas à História e a Literatura.
A História pôde ser compreendida como duas tendências, na primeira o historiador
se questiona o que é pensável e sobre suas condições de compreensão; usa os
documentos como uma possibilidade, um inventário. Essa visão leva o historiador,
segundo Michael de Certeau (1982 p.45), às hipóteses metodológicas de seu
trabalho e a uma situação epistemológica presente no conjunto da pesquisa
características da sociedade onde trabalha.
Já na segunda tendência tenta encontrar o vivido, exumado graças a um
conhecimento do passado, privilegiando a relação do historiador “reviver ou
ressuscitar” um passado. Essa quer encontrar os homens através dos traços que
eles deixaram, implicando também em um gênero literário próprio: o relato, enquanto
a primeira, muito menos descritiva, confrontam mais as séries que resultam de
diferentes tipos de métodos (CERTEAU, 1982 p.46).
Quando recorre-se aos caminhos da identidade nacional implica assumir o
entrecruzamento da história e da literatura, a partir de um novo patamar conceitual.
Sandra Pesavento (1998), afirma que as vinculações entre as duas correspondem a
uma abordagem bastante antiga. Entretanto, o que se pôde analisar em seu vasto
trabalho foi o que fez o uso recorrente da contextualização histórica, do discurso
literário ou empregam a literatura como uma forma alternativa para a construção do
conhecimento histórico. Logo esse entrecruzamento de literatura e história:
[...] que permitiu superar esse tipo de abordagem, importaria no endosso de uma nova leitura, na qual fosse possível pensar a História como Literatura e a Literatura como História. Cremos que o patamar conceitual que torna possível esse entrecruzamento e esse novo olhar é dado pela noção de representação (PESAVENTO, 1998 p.19).
Tomei como pressuposto que, segundo Sandra Pesavento (1998), a representação
enuncia o outro distante no espaço e no tempo, estabelecendo uma relação de
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 74
correspondência entre ser ausente e ser presente; ou seja, as representações do
mundo social não são o reflexo do real e nem a ele se opõem de forma antitética,
numa contraposição vulgar entre imaginário e realidade concreta.
A Literatura difere da História, na maneira como ela narra os acontecimentos, porém
deve-se saber que Literatura é arte e não constitui uma reprodução simples ou até
mesmo uma fotografia do mundo externo. Letícia Wierzchowski manuseou esse
material empírico como um romance de forma não-passiva, ela não utilizou os fatos
como se fossem apenas dados sociais e psíquicos, tampouco, utilizou a razão como
um filósofo. Ela vai tecendo sua obra com a realidade histórica e muita imaginação,
porque a:
[...] atividade artística não possui comprometimento com o rigor do registro científico. Ela se descompromete da exatidão dos acontecimentos que a inspiram, misturando, eventualmente, fatos históricos com acontecimentos fictícios. Ela não tem a pretensão de formular um conhecimento objetivo que é função da História. (CHAVES, 2006 p.45).
Na fronteira da verossimilhança nasce, pois, a verdade da Literatura, mas qual seria,
então, a verdade? Se a literatura vem a ser o compromisso com a realidade, por que
os livros fazem o uso de tantas representações e ficções? Porque a Literatura traz
vestígios e lidas de um tempo; sensibilidades e sentimentos do passado. E supõem-
se mais um questionamento, qual é o compromisso da Literatura? Sabemos que no
fundo, o livro é a denúncia ao fato histórico, contudo, o compromisso da Literatura
fica na circunstancialidade, embora, sempre tenha sido com a temporalidade, digo,
com o tempo histórico em que o autor vive e produz o seu texto. E segundo Sandra
Pesavento (1998), o discurso ficcional, a narrativa A Casa das Sete Mulheres, é
quase História, na medida em que os acontecimentos relatados são fatos passados
para a voz narrativa, como se tivessem realmente ocorrido.
Segundo Flávio Chaves (2006), ocorre que a retomada desse tempo e sua
representação não dependem das intenções, mas, antes, da força simbólica do
texto, da eficácia do sistema de significados, e, assim, da força de convicção
presente em diferentes momentos históricos. Vale lembrar que o texto possui uma
linguagem simbólica, mas que se torna verdadeira, que torna verossímil o
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 75
compromisso, nada mais é que uma estranha forma da verdade, própria, aliás, da
Literatura, capaz de referir diferentes significados em diversos momentos históricos.
Segundo Paul Veyne (1971), a História da qual se fala muito desde há dois séculos,
não existe. Então o que é História? A resposta ao questionamento é simples desde
que os sucessores de Aristóteles criaram-na, ela continua sendo a mesma até hoje.
Os historiadores narram acontecimentos verdadeiros que tem o homem como autor:
a história é um romance verdadeiro. De acordo com ele:
Como o romance a história seleciona, simplifica, organiza, faz resumir um século numa página e esta síntese da narrativa não é menos espontânea do que a obra nessa memória, quando invocamos os dez últimos anos em que vivemos (VEYNE, 1971 p.14).
Entretanto, nas palavras de Michael de Certeau (1982), a História é encarada como
um texto que organiza unidades de sentido e nela opera transformações cujas
regras são determináveis. Logo se pode recorrer aos procedimentos semióticos para
renovar as práticas de pesquisa. Porém o que vale ressaltar é que a História é a
narrativa de acontecimentos e que a partir deles tudo decorre.
O cotejo entre o compromisso da Literatura com a realidade histórica pode fazer
com que História e Literatura confundam-se intimamente; e a Literatura corre o risco
de ser mera crônica histórica. Já a História narra o fato.
Com este aparato de informações determina-se que Literatura não é História.
Entretanto, ao ser produzida numa dada circunstância, implica sempre numa
referência à História. O seu diferencial reside na distinção entre a circunstância e a
historicidade, que ultrapassa para representar a realidade, porém:
A verdade da ficção ou da Literatura, como em qualquer campo do imaginário, reside na sua possibilidade de convicção, por isso, embora sabendo que Capitu, Emma Bovary, Ana Karenina ou Ana Terra não pertencem a realidade, nós acabamos por incorporá-las efetivamente ao nosso mundo real, fazendo até com que aí resida justamente o julgamento de um bom ou mal romance. Se nos convence, passa a ser verdadeiro; se não nos convence, nós o abandonamos e as suas criaturas, relegando-os ao esquecimento. (CHAVES, 2004 p.10).
E convence porque os personagens produzem cenas e momentos que levam o leitor
ao convencimento. Mesmo que o texto possua uma escrita simbólica como acontece
na obra empírica sua linguagem torna-se verdadeira, verossímil, capaz de referir
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 76
diferentes significados em diferentes momentos históricos, devido ao
comprometimento da Literatura.
Segundo Sandra Pesavento (1998), a narrativa literária não precisa comprovar nada
ou se submeter à testagem, mas guarda preocupações com certa refiguração
temporal, partilhada com a História, dando voz ao passado; História e Literatura
proporcionam a erupção do ontem no hoje. Esta representação daquilo que “já foi” é
que permite a leitura do passado pelo presente como em “ter sido”, ao mesmo
tempo figurando como o passado e sendo dele o destino. Porém o
[...] compromisso intencional que está na origem da obra literária, nem sempre se dá como significado que a faz perdurar no tempo, mesmo depois de esgotada ou esvaziada a circunstância. Sua duração depende da transformação dessa circunstância em metáfora ou alegoria capaz de ser apropriada em momentos ulteriores, tornando vigente então uma leitura histórica do texto (CHAVES, 2004 p.10).
Letícia Wierzchowski apesar de ter entrado na Literatura de cunho histórico, por
distração, agradou a muitos com sua maneira de escrever. Sabe-se também que a
escritora vive em uma época muito diferente à do romance, em algumas cenas
acaba colocando a visão do mundo atual; logo alguns fatos devem ser observados
para que haja uma melhor compreensão da imaginação de Letícia, ocorrendo assim
[...] o resgate deste tempo e sua representação que não dependem das intenções, mas antes, da força simbólica do texto, da eficácia do seu sistema de significados e, assim, da força de convicção presente em diferentes momentos históricos (CHAVES, 2004 p.10).
A autora Letícia Wierzehowski busca na História apenas um pano de fundo, mas
isso não quer dizer que ela tenha usado exatamente o que pesquisou. Em alguns
momentos se deixa levar pela emoção e acaba por recriar a realidade do passado
com os olhos do presente. É preciso saber que
[...] a Literatura situa-se então muito próxima da simples crônica episódica dos fatos reais. E tanto mais complexa torna-se a sua passagem daí à representação, isto é, à linguagem simbólica capaz de traduzir não apenas a circunstancia, mas o próprio tempo (CHAVES, 2004 p.10).
Pode-se dizer que são complexas as relações entre Literatura e História, pois ambas
estão na base do compromisso e de seu tempo; e precisam representar o vivido e o
imaginário a partir da escrita, pois elas têm como base o compromisso social. Mas
quando tratamos da Literatura, não devemos buscar nela o real vivido, e sim,
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 77
encontrar os indícios de um tempo percebendo que o texto literário não interessa à
História enquanto transcrição, mas enquanto instauração no seu significado.
Por vezes, a aproximação da História com a Literatura tem um sabor de dejà vu,
dando a impressão de que tudo o que se apregoa como novo já foi dito e de que se
está “reinventando a roda”. Segundo Sandra Pesavento (1998), a sociologia da
literatura desde há muitos anos circunscrevia o texto ficcional no seu tempo,
compondo o quadro histórico no qual o autor vivera e escrevera sua obra. A História,
por seu lado, enriquecia por vezes seu campo de análise com uma dimensão
“cultural”, na qual a narrativa literária era ilustrativa de sua época. Neste caso, a
literatura cumpria face à história um papel de descontração, de leveza, de evasão,
“quase” na trilha da concepção beletrista de ser um sorriso da sociedade.
A romancista Letícia Wierzehowski assinala um momento em que a História e a
Literatura se cruzam para definir a unidade da elocução da narrativa. Ao ir ao
encontro do contexto histórico da Guerra dos Farrapos assume a plena consciência
que não lhe cabe traçar a crônica dos fatos translatados, porém revelar a sua
historicidade, contextualizando em um campo semântico com muitas vertentes.
A narrativa A Casa das Sete Mulheres dá conta, por um lado, da visão de mundo
que o texto contém, e, por outro, assegura sua vigência na representação da
realidade de diferentes leitores. Diante dessas articulações e mediações
relembramos que os grandes textos literários são aqueles que possibilitam uma
forma de atualização e sempre se renovam ao serem relidos; e o diagnóstico faz
parte das diversas perspectivas de cada leitor e seu momento.
A narrativa A Casa das Sete Mulheres é portadora de uma verdade, porque além de
não precisar comprovar nada ela cria as representações da realidade. Seu
significado permanece vivo e aberto, o compromisso se cumpre apenas na
representação simbólica dos fatos. Além do mais Sandra Pesavento (1998) diz que
as representações do mundo social não se medem pela sua veracidade, mas pela
sua credibilidade, aceitação e capacidade mobilizadora; e diante da pluralidade de
significados que a Literatura proporciona, a interpretação será sempre um
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 78
compromisso do leitor. A literatura é, no caso, um discurso privilegiado de acesso ao
imaginário das diferentes épocas. No enunciado célebre de Aristóteles, em sua
“Poética”, ela é o discurso sobre o que poderia ter acontecido, ficando a História
como a narrativa dos fatos verídicos, palavras de Sandra Pesavento, (1998). Mas o
que vemos hoje, nesta nossa contemporaneidade, são historiadores que trabalham
com o imaginário e que discutem não só o uso da literatura como acesso privilegiado
ao passado.
A literatura é, pois, uma fonte para o historiador, mas privilegiada, porque lhe dará
acesso especial ao imaginário, permitindo-lhe enxergar traços e pistas que outras
fontes não lhe dariam. Fonte especialíssima, porque lhe dá a ver, de forma por
vezes cifrada, as imagens sensíveis do mundo. A literatura é narrativa que, de modo
ancestral, pelo mito, pela poesia ou pela prosa romanesca fala do mundo de forma
indireta, metafórica e alegórica. Por vezes, a coerência de sentido que o texto
literário apresenta é o suporte necessário para que o olhar do historiador se oriente
para outras tantas fontes e nelas consiga enxergar aquilo que ainda não viu.
Leitura do Passado à sombra do Presente
Nas aulas da disciplina de Historiografia, fiquei conhecendo o escritor Saint Hilaire,
viajante francês, que passou pelo Rio Grande do Sul no século XIX. Em seu livro
Viagem ao Rio Grande do Sul, destaca a mulher gaúcha com uma imagem
depreciativa que imputava a brasileira em geral, quando comparada com a européia,
pois notou que aqui as mulheres conversavam sem constrangimento com os
homens.
Na obra, em analise, percebe-se que as mulheres têm um contato exagerado para
aquela época quando o assunto se refere a conversar como os homens. A imagem
que se tem daquele tempo, conforme quadros e pinturas são de que as mulheres
eram muito reservadas, contudo o fragmento a seguir destorce tal imagem:
Ao desmontar do cavalo, encontrou Perpétua sentada à varanda lendo um livro. [...]. Inácio sentiu uma alegria nova, percebendo que fora ele a causa daquele rubor. Subiu os degraus da varanda. - Como está a senhorita, nestes dias?
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 79
Perpétua largou o livro para o lado e sorriu. Vestia-se de carmim, os cabelos presos numa trança solta, e tinha um perfume de lírios que a circundava como um ralo. Fazia uma tarde bonita. - Estou muito bem, senhor Inácio. E como Le vai a vida? Inácio adiantou-se num arroubo, beijou a mãozinha branca. (WIERZCHOWSKI, 2003 p.183)
Nessa pequena parte da obra, como em tantas outras, percebe-se Perpétua, filha
mais velha de Bento e Caetana, com um livro na mão. Outro fator que ajuda à
compreensão da representação da realidade feminina do século XIX, onde os
homens liam jornais e as mulheres escolhiam os romances.
Na Casa das Sete Mulheres a escritora nos apresenta o hábito da leitura, muito
propício às mulheres do século XIX. Em várias páginas da obra depara-se com uma
das mulheres lendo ou escrevendo. Manoela aparece lendo cartas e escrevendo em
seu diário, quase sempre, as outras moradoras da casa, exceto as de mais idade,
geralmente aparecem na varanda, na biblioteca ou até mesmo em seus aposentos
praticando o ato da leitura.
Segundo Michael de Certeau (1982), com base em historiadores chega-se a
concluir, nesse momento, que as jovens mulheres liam para a fruição, para passar o
tempo, embora em nenhum momento da obra mencione o estilo de literatura, porém
podemos afirmar, que elas liam sozinhas e em silêncio, através de fragmentos da
obra, como o mencionado acima, por exemplo, seguido das palavras de Márcia
Abreu.
[...] Imaginava-se que a leitura sempre se fizera como supomos que ela hoje se faz, em silêncio e solitariamente, de modo a favorecer a concentração e o recolhimento. Supunha-se que, em todas as épocas, ler implicava pensar sobre textos e interpretá-los, exigindo habilidades superiores à capacidade para decifrar os sinais gráficos da escrita. Acreditava-se que o contato com os livros foi sempre valorizado por favorecer o espírito crítico, tornando o leitor uma pessoa melhor por meio do contato com experiências e idéias registradas por escrito. (ABREU, 2006 p.13).
Segundo palavras de Roger Chartier (1999), a leitura silenciosa é um encantamento
perigoso (p.124). A leitura em voz baixa funciona “como a imaginação do leitor
pudesse ser mais facilmente arrebatada por uma leitura silenciosa.” (p.124). É como
se o leitor compreendesse melhor o que se está lendo.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 80
Enquanto a leitura oral proporciona uma nitidez na entonação das frases, fazendo o
uso de seus pontos e vírgulas, e acima de todos os fatores, a expressão facial
precisa ser adequada a circunstância; a leitura silenciosa proporciona uma paz
interior, um navegar nas páginas e uma melhor percepção da história.
Diante das mulheres casadas, a leitura, com exceção das cartas, não foi destacada,
porque segundo Roger Chartier (1999) a leitura às mulheres representavam um
perigo para o marido. “O romance poderia excitar as paixões e exaltar a imaginação
feminina.” O hábito da leitura poderia incentivar idéias eróticas, e isso ameaçava a
castidade e a boa ordem. Em função disso
[...] o romance do século XIX, pois associado com as (supostas) características femininas de irracionalidade e de vulnerabilidade emocional. Não é simples coincidência que o adultério feminino tenha se tornado nessa época o arquétipo de transgressão social descrito pela Literatura, de Emma Bovary a Anna Karenina e Effi Brist. (CHARTIER, 1999 p.172).
A partir do século XIX a mulher vem se destacando, e a leitura começa a ter um
importante papel na sociabilidade feminina. Houve uma época em que foi visível a
percepção de duas categorias: de um lado os homens que se reuniam nos bares e
cabarés para fumar e jogar; e de outro, as mulheres jovens, cuja vida estava sendo
dividida entre a Literatura e a Música. Entretanto, segundo Roger Chartier (1999),
quando pessoas de dois sexos estavam juntas em uma mesma situação de leitura, a
mulher ficava em posição de tutelada em relação ao homem. Em algumas famílias
católicas, as mulheres eram proibidas de lerem o jornal. O mais freqüente era o
homem ler em voz alta; isso mostra, na época, mais um sinal de superioridade do
homem.
Márcia Abreu (2006) ressalta e concorda que a leitura de romances levava ao
contato com cenas reprováveis, estimulando a identificação com personagens
envolvidos em situações pecaminosas como as mentiras, as paixões ilícitas e os
crimes. Um leitor de romances certamente desejaria transportar para sua vida real
as situações com que travara contato por meio do texto. Também perigoso era o
impulso de imaginar-se no lugar dos personagens envolvidos em situações
criminosas: supor-se no lugar de uma adúltera era quase tão grave quando praticar
o adultério. Mesmo os que resistissem à tentação de aproximar a matéria lida do
mundo vivido seriam prejudicados, pois ocupariam tempo precioso com a leitura de
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 81
material tão pouco elevado, esquecendo-se de suas obrigações cotidianas. (ABREU,
2006 p.15)
Ao longo da leitura da obra percebe-se que algumas das mulheres da casa faziam
parte de uma sociedade de poder aquisitivo elevado. E que elas não necessitavam
trabalhar fora enquanto seus homens encontravam-se na guerra. Logo procuravam
ocupações nos bordados do enxoval e na prática de leituras. Suponho que essa
segunda ocupação fazia parte de uma associação de prazer e enobrecimento do
sujeito, construído historicamente pela ascensão da burguesia. Além de passar o
tempo, enriqueciam seus vocabulários enquanto se divertiam.
O cotejo de escritores relacionados, que ressaltam sobre a mulher leitora, confirma
que as mulheres que liam era somente aquelas com poder aquisitivo elevado; entre
a classe operária, por exemplo, as mulheres mesmo com vontade não tinham
tempo. “Descascar batatas, bordar, fazer pão e sabão eram tarefas que não
deixavam tempo livre para a recreação.” (p.174), pois:
[...] os afazeres domésticos vinham em primeiro lugar, e admitir que liam equivalia a confessar que estavam negligenciando suas responsabilidades familiares de mulher. A imagem idealizada da boa dona de casa parecia incompatível com a leitura (CHARTIER, 1999 p.174).
Contudo, alguns estudiosos, segundo Roger Chartier (1999), vão dizer que essas
mulheres se rendiam a algumas leituras sempre que possível, porque a leitura era
condenada como desperdício de tempo, ofendendo uma ética de trabalho bem
exigente, já as mulheres de classe média e alta, tipo as da casa, não enfrentavam
esses obstáculos, talvez porque para elas a leitura fosse um meio de amenizar os
sofrimentos da guerra.
Os pais, como homens e maridos, não apreciavam muito a leitura das filhas
mulheres, mas como estavam exclusivamente envolvidos com a guerra, não sobrava
tempo para atender a esses caprichos. Intencional ou não, Letícia discorre sobre os
devaneios das mulheres da casa que liam. Manoela se apaixona perdidamente pelo
italiano Giuseppe Garibaldi, e esta foi a personagem que mais se destacou na
escrita e na leitura; Rosário, por várias vezes, encontrava-se na biblioteca na
companhia dos livros e de suas visões de um caramuru, conhecido como inimigo da
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 82
família de Bento; Perpétua se enamora de um homem casado que tem uma mulher
enferma; e por última, Mariana que se apaixona por um índio, totalmente fora das
tradições da família de Bento, e por ironia, seguindo um destino do qual sua mãe
não teve coragem. Percebe-se na narrativa que:
[...] como nunca antes, a figura da mulher leitora demandava reconhecimento, por parte de romancistas, editores, bibliotecários e pais dispostos a desencorajar a perda de tempo ou proteger suas filhas dos caprichos da imaginação ou da estimulação heróica (CHARTIER, 1999 p.174).
Muitas vezes o ato de leitura foi representado em pinturas como algo que ocorria em
um grupo feminino em lares burgueses ou uma imagem de uma jovem mulher
solitária. Em contraposição, a leitura em voz alta era mais comum nos grupos
masculinos do café ou da oficina. Porém as mulheres leitores do século XIX são
associadas ao desenvolvimento da leitura individual e silenciosa, talvez a leitura
representasse, naquele momento, um conceito de privacidade e intimidade. As
jovens da Casa mantinham o hábito da leitura silenciosa.
Diante da inserção dos levantamentos até agora presume-se o questionamento: O
que significava a leitura da mulher? Ler como uma mulher significava incorporar um
viés novo e desafiador, pois, ao ler, a mulher além de inovar e desafiar destruía
ideias prontas e ainda introduzia novos nomes à literatura consagrada. A crítica do
gênero feminino desafiou a própria noção de cânone, palavras de Marisa Lajolo;
essa guerra de hábitos ofereceu ao mundo da literatura uma nova ordem, elaborada
a partir do gênero, onde:
[...] não é necessária a leitura prolongada, nem são precisos os livros complicados. Coisa leve, variada, que nos de uma visão rápida do mundo em que estamos e do que acontece nele, no campo das ciências, das artes, da política e dos disse me disse. (LAJOLO, 20098 p.118).
A seleção na leitura é algo imperioso, do contrário, o tempo perdido na leitura de
páginas medíocres não compensa o sacrifício de horas de trabalho ou até mesmo
de repouso, se não irá aprender nada. Devemos salientar que a mulher, com sua
marca feminina, em seu discurso de literatura, ganhou os jornais, as revistas, a
televisão, entre outros espaços.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 83
Literatura e História: a subjetividade de gênero
As preocupações relativas ao gênero como uma categoria de análise histórica
emergiram nas últimas décadas do século XX. Segundo Guacira Louro (1997), a
categoria gênero tem sido apresentada por historiadores como uma rejeição ao
determinismo biológico implícito no uso dos termos sexo ou diferença sexual e com
isso acabou introduzindo uma idéia de desigualdade entre homens e mulheres,
construído a partir de atribuição de papeis diferenciados.
Segundo Áurea Petersen (1999), embora vários estudos utilizem gênero como
categoria de análise, em muitos casos, os escritores usam gênero simplesmente
para substituir a expressão história das mulheres. Essa utilização de gênero poderia
ser entendida como uma busca de legitimidade, vista que a palavra feminismo nos
anos oitenta estava carregada de uma forte conotação negativa, devido ao impacto
produzido pelo movimento feminista. Lembra ainda que a informação sobre o
assunto mulheres é necessariamente informação sobre os homens, ou seja, que o
estudo de um implica no estudo de outro. Por essa razão está presente uma crítica
na categoria gênero relacionada aos estudos femininos.
Pode-se compreender gênero como sendo composto por duas partes: a primeira diz
que é um elemento constitutivo das relações sociais fundadas sobre diferenças
percebidas entre os dois sexos; já a segunda parte é um primeiro modo de dar
significados as relações de poder. Com essas definições evidencia-se o caráter de
construção social das relações entre homens e mulheres. Nas palavras de Joan
Scott (1990), gênero constitui-se como um:
[...] meio de decodificar o sentido e de compreender as relações complexas entre as diversas formas de interação humana. Quando as historiadoras buscam encontrar as maneiras pelas quais o conceito de gênero legítima e constrói as relações sociais elas começam a compreender a natureza recíproca do gênero e das sociedades e das maneiras particulares e situadas dentro de contextos específicos, pelas quais a política constrói o gênero e o gênero constrói a política (SCOTT, 1990 p. 16).
Em congruência ao que foi exposto até aqui a categoria gênero vem-se constituindo,
portanto, uma ferramenta fundamental para os diferentes campos do conhecimento;
onde se preocupam com o estudo de relações entre homens e mulheres. Segundo
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 84
Guacira Louro (1999), os estudos feministas estiveram sempre centralmente
preocupados com as relações de poder. E para Focault, consiste em perceber o
poder não apenas como coercitivo e negativo, mas como produtivo e positivo. O
poder, não apenas nega, impede, coíbe, mas também faz, produz, incita. O poder
produz sujeitos e induz comportamentos.
Sabe-se que a partir do momento em que pensamos homens e mulheres em
separados, temos dois pontos a serem analisados. Apresento aqui somente a
questão da mulher com seu lado feminino e heróico. Todo povo, toda cultura tem o
seu herói, o que o diferencia é apenas a sua época. Por ser parte real, parte
construído, por ser fruto de um processo de elaboração coletiva, o herói nos diz
menos sobre si mesmo do que sobre a sociedade que o produz ( MARKUN, 1999
p.26).
Para a História o herói é um ser que pode lhe ser atribuído um acontecimento,
porém as conseqüências seriam diferentes se ele não agisse. Já na Literatura o
herói é visto, até os dias atuais, como um produto, onde o leitor é quem determina
seu papel.
Na obra A Casa das Sete Mulheres encontram-se alguns tipos de heroínas. A
maioria delas fez parte da Revolução Farroupilha, entretanto estão envoltas no
anonimato. Heroínas são as esposas, filhas e escravas das estâncias que
entretinham os serões familiares desfazendo telas para os curativos ou gastando os
dedos nos teares para tramar os ponchos que agasalhariam os farroupilhas. E ainda
as mulheres heroínas eram apaziguadoras dos ânimos dos povoados das estâncias
e recebiam os visitantes de ambas as facções, oferecendo a todos a mesma
hospitalidade.
A Casa das Sete Mulheres questiona a condição de mulher na época do Império
através das sinhazinhas da República Rio-Grandense. Ao negar a mão de Manoela
em casamento para Garibaldi, Bento diz: Nossas esposas ficam em casa, não vão
para a guerra. Só as chinas, as lavadeiras, as vivandeiras e as mulheres de soldado
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 85
raso vão para a guerra. As nossas esposas são fortes, corajosas até o ponto que lhe
é exigido.
Pode se perceber outro exemplo quando a mãe de Manoela diz que “Liberdade para
os homens é uma coisa, para as mulheres é outra” talvez ela esteja censurando a
filha e faz um discurso dominante da época sobre a honra da mulher, sendo que ela
também foi desonrada antes do casamento. Manoela reconhece a importância
conferida ao gênero feminino: “Prodigiosa sorte nascer homem e ter tanto poder.”
Mariana também desabafa com Manoela sobre o papel da mulher na sociedade: “Eu
queria ser homem, um soldado farrapo, eles são livres para pelear, embebedar-se e
divertir-se com as chinas.” Em outro momento Manoela diz que sentia muita inveja
da liberdade das chinas, porque elas iam para onde queriam e não para onde os
homens mandavam.
Sendo uma fronteira entre a ficção e o real a obra é considerada narrativa de
mundo, de fato, um tanto quanto traiçoeira. Contudo é nessa fronteira que os heróis
se movem, e onde eles mais habitam; reconstruindo através da ficção
acontecimentos, costumes e personagens históricos.
Essa fantasia acaba dando abertura à ficção e sabemos que História é uma coisa e
ficção é outra. Letícia ao fazer o uso da ficção, muitas vezes, deu a entender que
sua obra não valeria de cunho histórico. A autora acaba recriando uma
representação da realidade em alguns momentos.
As mulheres sentiam saudades por traz da vida rude que levavam nas estâncias e
charqueadas nas lidas do dia-a-dia; a mulher do sul desenvolveu todo um ritual de
delicadeza a primeira vista, porém o homem estava na guerra e acabou sendo da
mulher a responsabilidade de, na medida do possível, manter a estância em
funcionamento, não permitindo que se desativasse a charqueada, sustentando a
casa, quer na cidade ou no campo, mantendo a esperança.
Mesmo não participando diretamente da guerra, como Anita, a mãe-esposa-filha dos
farroupilhas promoveu todo um envolvimento com a tragédia que se desenvolvia nos
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 86
campos de batalha. A obra A Casa das Sete Mulheres foca a questão onde a mulher
soube manter com dignidade e envergadura gigantesca, o merecimento de ser a
reconfortante lembrança de seus heróis.
Segundo Aldira Rematozo (s-d), “Às vezes a mulher acompanhava o homem às
aventuras da guerra. Anônimas heroínas, nenhuma delas teve relevância na história.
Mas Anita Garibaldi nos Campos do Sul, não foi um caso isolado.” (p.31). Na
verdade as mulheres acompanhavam as batalhas porque levavam mantimentos,
peças de roupas e até mesmo as crianças para rever seus pais; claro que elas não
se envolviam nos conflitos, embora padecessem os horrores da guerra. Já Anita
acompanhou mesmo os guerreiros, ela foi combatente, lutou pela causa ao lado dos
homens.
Outro bom exemplo de mulher pode ser encontrado em Caetana, esposa de Bento
Gonçalves, mulher sensível, frágil:
Desculpe esta sua esposa tão fraca, que, de tanto viver esta angústia, já desaprendeu a suportá-la. A espera é um exercito duro e lento, meu querido, que só os fortes logram vencer. Vencê-la-ei por usted. Nunca ignorei a sua fibra, nem a força dos seus sonhos e luto para estar eu à altura da sua companhia e da grandeza dos seus atos. (WIRZCHOWSKI, 2003 p.33).
Caetana não era uma mulher como Anita, que foi para luta armada defender seu
homem. Entretanto também foi uma guerreira na lida da casa e na criação dos filhos,
enquanto Bento estava ausente. De qualquer forma, cada mulher da casa teve a sua
maneira de ser uma lutadora de seus direitos. Letícia Wirzchowski cria um enredo
onde cada mulher representa uma realidade feminina.
Caetana acompanhou Bento Gonçalves nos momentos de prosperidade e na
miséria, nas vitórias e nas derrotas. Deu-lhe nove filhos, dos quais Bento, Caetano,
Joaquim e Leão foram soldados da República Rio-Grandense. A filha Perpétua, por
sua vez, casou-se com Inácio, um importante farroupilha.
Vale lembrar que as moças daquela época eram vigiadas dia e noite, geralmente por
uma escrava, ou dama de companhia, porém a autora transcreve de outra forma
aquela realidade quando redige: “... Mariana ficou desolada, fugiu para a sanga,
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 87
restou lá uma tarde inteira a chorar...” (p.132). Como em um tempo em que os
cuidados com as moças eram sigilosos uma menina poderia ficar sozinha, ainda
mais numa sanga?
Outro ponto onde devemos prestar atenção é quando Letícia menciona na obra que
as mulheres viúvas mergulham em um sofrimento profundo, muito pelo contrário,
pela maioria dos casamentos serem contratos, as viúvas se sentiam libertas e
seguiam com suas vidas com naturalidade. Essas e outras representações
distorcidas da realidade da época se deram pelo motivo, talvez, da obra ser escrita
muito tempo após seus acontecimentos e a autora ser parte deste tempo.
Todavia quero me ater um pouco mais em Anita, cujo nome foi Ana de Jesus
Ribeiro, já mereceu biografia de vários historiadores ilustres; segundo Aldira
Rematozo (s-d), foi uma pessoa profundamente humana, intensamente feminina,
não permitindo que as aberrações a desviasse da condição de mulher. Também não
podemos negar que seu amor a Garibaldi foi muito mais significativo que o amor ao
Rio Grande. Porém sem a avassaladora paixão que a uniu até a morte, ao
aventureiro Giuseppe Garibaldi, não seria a heroína guerreira, mas isso em nada
diminuiu seu valor. Contudo, Anita, aquela que demonstrou bravura e efetiva
atuação, sendo heroína de dois mundos. Na obra ela só aparece citada: “Uma brava
dona, condenada a ser mulher nesse mundo de machos.” (ABREU, 2006 p.24).
Em 20 de outubro de 1839, Anita, tendo abandonado o marido Manuel Duarte de
Aguiar, estava a bordo do Rio Pardo para início da fabulosa aventura que a levaria a
acompanhar o novo companheiro em dois mundos: América e Europa. Nas
proximidades de Mostardas, em São Simão, nasce Menoti, no dia 16 de setembro
de 1840, o primeiro filho do casal.
Ainda casada, quebrou regras que vigoravam na sociedade do período. A solução
para viver novamente de forma honrada foi acompanhar Garibaldi. O seu
envolvimento na Revolução Farroupilha não foi por crença em uma causa, mas por
Garibaldi. Anita lutava para convencê-lo que poderia segui-lo e que também era uma
guerreira. Podemos afirmar que a primeira batalha de Anita, talvez a mais difícil, foi
trocar seu casamento, abandonar sua reputação e ir viver com o outro, um
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 88
aventureiro, e com apenas dezenove anos de idade Ana Maria Ribeiro dava seu
primeiro passo em direção à História. E por amor ao Garibaldi, apaixonou-se pela
causa dos Farrapos. Nesse momento, quando o gênero feminino vai a guerra,
percebemos que aqui começa a representação masculina da mulher gaúcha.
Criada e recriada, Anita Garibaldi, foi uma personagem com moldes republicanos, foi
considerada uma heroína republicana, onde criou uma representação para legitimar
algo, estando presente em todas as sociedades e períodos.
O mais significativo em sua decisão de seguir o homem amado foi a estabilidade de
seu comportamento: em todos os momentos por que passaram, Anita foi sempre a
mesma mulher decidida, companheira, repleta de bravura e solidariedade, provando
que, ao seguir com Garibaldi, atendeu não um rasgo banal de emoção, e sim ao
apelo do que é mais duradouro: o sentimento. “Anita sofreu toda a casta de
privações e incômodos com um estoicismo e uma coragem admiráveis.” (p.09). Anita
derramou seu sangue pela Revolução de 1835 e Garibaldi sempre a apresentou
como um soldado ao grupo. Ela não teria nenhuma regalia por ser esposa do chefe,
seria tratada como todos, sem distinções.
Anita Garibaldi, no monumento concretizado na Itália2 em 1913, está sendo
representada como se estivesse no campo de batalha; esse é o perfil de Anita
romanceado na obra A Casa das Sete Mulheres. No monumento ela é apresentada
com uma posição de ataque, passa a ideia de estar à frente de uma tropa, tomando
a iniciativa de investida contra os inimigos. O canhão, que aparece ao lado, agrega à
pose o verdadeiro cenário de enfrentamento e luta. Vendo as fotos do monumento
percebe-se que Garibaldi parecia mais um coadjuvante; ainda apresenta um olhar
que mistura contemplação e apreensão; e o cenário representa não ser o mesmo.
No combate à Laguna, Anita ainda estava tentando convencer Garibaldi de que a
levasse junto. É difícil de acreditar que nesse período, uma mulher, da cidade,
jovem, em meio a vários homens, teria a chance de comandar uma tropa, se
colocando à frente como símbolo de liderança. E Garibaldi, como capitão da
2A imagem do monumento encontra-se no anexo do artigo.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 89
embarcação, deixaria sua autoridade de lado e repassaria a uma mulher pela qual
não queria que estivesse ao seu lado nesse momento? Complicado, hoje, entender
algumas das representações que a autora nos apresenta na narrativa. Todavia,
devemos salientar que a narrativa é Literatura.
E ao pesquisar sua morte percebe-se que foi feita uma alusão à morte de Anita,
pois, foi reinventada a partir do imaginário da escritora. Mesmo havendo uma versão
bem diferente da apresentada, justamente essa que fez Anita e Giuseppe Garibaldi
os heróis que são hoje. Porém se investigar nos textos históricos e jornais da época
tem uma representação da realidade um pouco distorcida à da Literatura. Quando
Anita e Garibaldi chegam a Mandrioli na Itália, Anita além de estar grávida encontra-
se muito doente e acaba sendo um atraso para a fuga de Garibaldi. Segundo a
pesquisa de Sérgio ele a deixa ali mesmo no chão da praia e promete que um dia
voltará para enterrá-la dignamente. Até volta, após ter decorrido dez anos.
Por volta do dia 10 de agosto de 1849, segundo informações da aula, algumas
crianças que brincavam acharam um braço e uma mão para fora da terra. No
relatório do delegado local, lia-se o seguinte: Observou-se que os olhos estavam
salientes e metade da língua para fora, entre os dentes, além da traquéia com sinais
de que sofreu estrangulamento. O cadáver foi encontrado grávido de
aproximadamente seis meses.
Aqui não restam dúvidas, Anita grávida e muito doente só prejudicaria os planos de
Garibaldi. O delegado com a ajuda de algumas denúncias anônimas e mais o laudo
médico concluiu que: [...] denunciava que o responsável pelo estrangulamento da
desconhecida (Anita) era justamente Giuseppe Garibaldi, num ato de desespero
destinado a facilitar sua fuga, dificultada pela gravidez da mulher que o seguia.
(MARKUN, 1999, p.20).
Contudo, Aldira Rematozo (s-d), relata que Anita, prestes a completar trinta anos de
idade morre nos braços de Garibaldi, encerando um período de dez anos ao lado do
homem amado que lhe valera por toda uma vida. Ficando conhecida como a heroína
de dois mundos, pois a Itália também viria a amá-la; deixava ao guerreiro os filhos
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 90
que jamais tivera com outro homem. Ao morrer deixava ainda um dos maiores
exemplos de bravura que o mundo já viu; Assim foi Anita, uma admirável mulher que
ao deixar a vida, já conquistara a eternidade pelos caminhos do amor.
Fruto de várias construções, Anita se tornou uma representação para o povo
Lagunense, e para os republicanos no início do século XX. É um exemplo de
feminilidade, de coragem e de mãe. Ao nos reportarmos a Anita, logo nos vem à
imagem de uma mulher em meio aos homens lutando por uma causa, porém neste
recorte da obra percebe-se que Anita tinha outro lado também:
[...] Anita depositou Menotti no berço e voltou para o lado do marido. [...] Menotti geme em seu bercinho. [...] Anita vai até o berço e sossega o filho. [...] Anita segura nas mãos grandes, calosas, de pele clara, entre as suas. [...] Ela as leva aos lábios e beija aquelas palmas que conhece de cor. Aspira o cheiro daquele homem que tanto ama. (WIERZCHOWSKI, 2003 p.365).
Com base na narrativa literária temos a representação da Anita como mãe e esposa;
dedicada ao esposo e protetora de seus filhos. Anita foi uma mulher diferente, foi a
pioneira ao enfrentar uma luta armada, ficou famosa por suas atitudes; também foi
com a história dessa brava guerreira que iniciou um novo momento histórico para as
mulheres, distinto e promissor. As mulheres até aquele momento eram vistas de
maneira sensível e frágil e o caráter conservador da mulher na educação das filhas
dos estancieiros gaúchos no século XIX, assim como a pobreza e a rotina de seu
cotidiano (especialmente na situação de confinamento em que estavam expostas),
realidades que até aquele momento elas não estavam acostumadas. Porém as
mulheres da casa eram bem vistas por todos, distorcendo um pouco a realidade do
Brasil e mostrando o seu potencial. Naquele momento as
mulheres não tinham uma presença significativa na historiografia brasileira. Eram vistas com olhar preconceituoso, isso quando eram mencionadas. As mulheres eram citadas como prostitutas ou feiticeiras. Só eram associadas á relações não discriminatórias, quando eram observadas como esposas e mães e se a sua submissão ao marido fosse total. Mulheres que tomavam participação política, mesmo em casa, eram muito mal vistas. As que faziam isso eram adúlteras ou bruxas, tornando-se um mal para a sociedade. (DEL PRIORE, 1994 p. 12). Mas as mulheres não tinham nenhum poder?
Em meados de 1835 as mulheres ainda eram submissas aos homens e não tinham
autoridade perante a sociedade, todavia, as mulheres da casa, com seus homens na
guerra durante tantos anos, tiveram que se habituarem a exercer novas tarefas
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 91
assumindo responsabilidades e com isso começaram a adquirir poder. Segundo
Mary Del Priore:
[...] melhor do que tentar responder se as mulheres tinham poder, é tentar decodificar que poderes informais e estratégias elas detinham por trás da ficção do poder masculino, e como se articulavam a tal subordinação e resistência. O estudo dos discursos normativos sobre a mulher deve ser estimulado quando levar em conta as práticas sociais, do contrário, tendo no homem o sujeito das falas, e a mulher seu objeto, corre-se o risco de fazer um retrato fora de foco do segmento feminino. (DEL PRIORE, 1994 p 13).
A questão apontada por Del Priore (1994) traz algumas reflexões sobre a história
das representações criadas sobre Anita Garibaldi. Mas porque a personagem de
Anita, não tinha os aspectos relacionados á mulher, assim como as mulheres
descritas na história da casa? Para Anita sua condição de ser mulher era inferior, o
que importava era ela ser guerreira, esposa, mãe, completa e acima de todos os
conceitos, lutadora pela liberdade e o progresso do Rio Grande.
No contexto histórico da Revolução, essa mulher nascida em outro estado
demonstrou que o herói é um cidadão do mundo. De sua vida breve doou
significativa parte à causa dos Farrapos e soube fazer, desse período em que esteve
entre nossos heroicos idealistas, uma obra completa e feliz. “Era necessário possuir
um coração de leão para assim se arriscar. Felizmente Anita ignorava o que era
medo.” (p.11), e até mesmo que era mulher, muitas vezes.
Segundo Marô Silva (1985), só existiam duas opções para a vida das mulheres:
dona de casa ou cortesã, sendo definidas, muitas vezes, já em seu nascimento.
Raras foram às vezes que as moças foram contra os postulados que as mantinham.
Na época da Revolução Farroupilha não existia profissões femininas que lhes desce
independência econômica. E Anita quebrou todas as regras e padrões femininos
existentes da época, representando outro perfil de mulher.
Representar é, sobretudo, estar no lugar de outro, é a presentificação de uma
ausência, é sempre uma atividade que envolve a imaginação criadora, é um
processo onde combina a exposição de um significante, portador de um significado,
que remete a algo ou alguém oculto. Segundo Roger Chartier, a representação é
uma apresentação pública de uma pessoa, é uma construção de um grupo que
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 92
detêm o poder e almeja constituir uma identidade de si mesmo em busca de uma
unidade. (CHARTIER, 1991 p. 183-184).
Já para Pesavento (1998), a representação da realidade anuncia um outro, distante
no espaço e no tempo, estabelecendo uma relação de correspondência entre ser
ausente e ser presente que se distancia no mimetismo puro e simples. Em outras
palavras as representações do mundo social não são o reflexo do real. No entanto
há no ato de tornar presente ou ausente, a construção de um sentido ou de uma
cadeia de significações que permite a identificação. “Representar, portanto, tem o
caráter de anunciar, “pôr-se no lugar de”, estabelecendo uma semelhança que
permite a identificação e o reconhecimento do representante com o representado.”
(PESAVENTO, 1998 p.19); portanto não se pode levar toda a obra como uma
veracidade, mas sim, como a representação de uma realidade que viveu a mulher
gaúcha na Revolução Farroupilha.
De certa forma cada mulher do enredo fugiu às regras se adaptando às novas
realidades e assim, aos poucos, revolucionando as rotinas femininas; tamanha
foram às mudanças que hoje temos uma mulher no cargo mais alto do Brasil.
Considerações finais
Chego à ilação com a certeza de que o artigo não termina aqui, porém dou um
tempo, nesse momento, com a pesquisa. Talvez eu devesse ter seguido outro viés,
o da História, por exemplo, onde a visão do historiador seria a mais relevante,
todavia o que realmente me importa nesse momento é que a obra silenciosa da
mulher prevalece mantendo viva a engrenagem doméstica, de alimentar, de criar, e
de tecer, além de aquecer o corpo e o coração de seus homens. A mulher na quadra
farroupilha subiu de condição, e ainda hoje, diariamente, se destaca na sociedade
apesar da Revolução Farroupilha, depois de tanta luta e sofrimento a todos, não
obteve um vencedor e sim um empate entre os homens da Corte Real com os
Farrapos.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 93
E quanto à subjetividade de gênero ainda temos muito a estudar, mas posso
adiantar de acordo com o aporte teórico translatado, que a mulher vem dominando o
mercado cada vez mais enaltecendo a posição masculina. Devo mencionar que a
mulher teve uma visibilidade muito maior, a partir da época de 1835 e que depois da
Revolução, a gaúcha obteve certo poder diante da sociedade rio-grandense. Vale
lembrar que o objetivo foi alcançado, onde foi obtido com clareza que as mulheres
tomaram as rédeas da casa enquanto seus homens lutavam, com isso conquistando
dependência e mais destaque; recordo ainda que, a leitura direcionada às mulheres,
foi de grande valia para ajudar no seu enobrecimento e crescimento social;
juntamente com a representação masculina na guerra; fator determinante para seu
destaque.
No diálogo que se estabeleceu com o jogo transdisciplinar e interdiscursivo das
formas de conhecimento sobre o Rio Grande, onde a História e literatura se
encontraram foi preciso definir o que era realidade histórica da ficção para que a
continuidade da pesquisa não ficasse prejudicada e o objetivo se mantivesse
inalterado.
Referências
ABREU, Márcia. Cultura Letrada: literatura e leitura. São Paulo: UNESP, 2006.
BERTUSSI, Lisana. Literatura Gauchesca: do Cancioneiro Popular à
Modernidade. Caxias do Sul: Educs, 1997.
CERTEAU, Michael. Representação e Realidade. In: - A Escrita da História. Rio de
Janeiro: Farense Universitária, 1982.
CHARTIER, Roger (Org.). Práticas de Leitura. São Paulo: Estação Liberdade,
1991.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 94
CHARTIER, Roger. História da Literatura no Mundo Ocidental. In: - Os novos
leitores do século XIX: mulheres, crianças e operários. Ática: São PAULO. 1999.
CHAVES, Flávio Loureiro. Cultura Regional. Língua História e Literatura. Caxias do
Sul: Educs, 2004.
CHAVES, Flávio Loureiro. Cultura Regional. Língua História e Literatura. Caxias do
Sul: Educs, 2006.
DEL PIORE Mary. História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto, 1994.
DUMAS, Alexandre. Memórias de Garibaldi. Porto Alegre: L&PM, 1999.
KÜHN, Fábio. Breve história do Rio Grande do Sul. 2ª edição. Porto Alegre:
Leitura XXI, 2004.
LOURO, Guacira Lopes. Gênero Sexualidade e educação: uma perspectiva pós-
estruturalista. Vozes: Rio de Janeiro, 1997.
LAJOLO, Marisa. Das tábuas da lei à tela do computador: a leitura em seus
discursos. 1ª edição – São Paulo: Ática, 2009.
MARKUN, Paulo. Anita Garibaldi: uma heroína brasileira. São Paulo: Editora
SENAC, 1999.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. Discurso Histórico e Narrativa Literária. In: -
Contribuição da história e da literatura para a construção do cidadão: a abordagem
da identidade nacional. Porto Alegre: UFRGS, 1998.
PESAVENTO, Sandra Jatahy. O corpo e a alma do mundo. História. Porto Alegre:
UFRGS, 2004.
R e v i s t a e – L a t o S e n s u – F A C O S / C N E C
V O L. 3, O U T U B R O / 2 0 1 3 - I S S N 2 2 3 7 – 9 6 0 6
Página 95
PESAVENTO, Sandra Jatahy. História do Rio Grande do Sul. 3ª edição. Porto
Alegre: Mercado Aberto, 1984.
PETERSEN, Áurea T. Gênero por escrito: saúde, identidade e trabalho. In: -
Discutindo o uso da categoria gênero e as teorias que respaldam estudos de gênero.
EDIPUCRS: Porto Alegre, 1999.
PINTO, Céli Regina Jardim; GUAZZELLI, Cesar Augusto Barcellos. Ciências
Humanas: Pesquisa e Método. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2008.
REMATOZO, Aldira Correa; RUDIGER, Francisco Ricardo; FLORES, Ilda Agnes
Hubner; SILVEIRA, Maria Dutra, RIBEIRO, Niamara Pessoa e FRIGERI, Rosane. O
Papel da Mulher na Revolução Farroupilha. Editora Tchê: Casa Masson, Porto
Alegre, sem data.
SCOTT, Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica. Educação e
realidade. Porto Alegre, 1990.
SILVA, Marô. Anita Garibaldi. Editora Tchê: Coleção Esses Gaúchos: Porto Alegre,
1985.
VEYNE, Paul. Como se escreve a História. Edições 70. Lisboa: Livraria Martins
Flores, 1971.
WIERZCHWSKI, Letícia. A Casa das Sete Mulheres. 5ª edição. Rio de Janeiro:
Record, 2003.