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125 REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 46: 125-146 JUN. 2013 RESUMO GOVERNANÇA AMBIENTAL NO BRASIL: ECOS DO PASSADO Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 21, n. 46, p. 125-146, jun. 2013 Recebido em 24 de janeiro de 2009. Aprovado em 28 de junho de 2009. João Batista Drummond Câmara ARTIGOS I. INTRODUÇÃO. Para identificar e descrever a governança ambiental no Brasil é preciso considerar o contexto histórico da formulação e execução de políticas de uso e controle dos recursos naturais, até a consolidação da Política Nacional do Meio Ambiente. Este estudo faz uma reflexão da situação atual da gestão ambiental e seus reflexos no modelo de desenvolvimento econômico brasileiro, buscando responder à seguinte pergunta: quais os fatores que influenciam na governança ambiental no Brasil e como eles relacionam entre si? Para respondê-la, foram considerados os marcos históricos mais significativos, além dos atos normativos, gerenciais e políticos. Também fizeram parte dessa análise as fases da história e suas contribuições para a evolução conceitual e gerencial da gestão ambiental, em relação aos aspectos do uso dos recursos naturais, desde o Descobrimento do Brasil até 2011. Adotou-se como conceito de governança ambiental, neste estudo, o “arcabouço institucional de regras, instituições, processos e comportamentos que afetam a maneira como os poderes são exercidos na esfera de políticas ou ações ligadas às relações da sociedade com o sistema ecológico” (CAVALCANTE, 2004). A construção da política ambiental brasileira encontra- se no mesmo patamar das demais políticas públicas, que são moldadas, muitas vezes, sobre alicerces político-institucionais construídos na história política do Brasil, com forte viés no papel controlador do Estado, que consubstancia as bases da governabilidade e da governança. O processo de formulação e execução das políticas públicas no Brasil mudou continuamente desde o período do descobrimento, cujo modelo autoritário e burocrático foi aos poucos sendo substituído por processos mais democráticos e participativos, induzidos pelas mudanças verificadas no contexto das políticas internacionais. Essas mudanças foram influenciadas pelos problemas econômicos, sociais e ambientais resultantes de modelo de desenvolvimento baseado na teoria econômica neoclássica, de uso O presente artigo trata de uma análise da ação governamental para o controle do uso dos recursos naturais no Brasil, desde o descobrimento, em 1500. Teve como objetivo compreender o processo de formulação e execução de políticas ambientais, considerando a evolução de conceitos, regras e instituições do período colonial até os dias atuais, caracterizando as bases históricas, institucionais e legais que moldaram a atual governança ambiental brasileira. A pesquisa foi realizada consultando referências bibliográficas e documentos governamentais com dados e informações diversos. Pode-se observar que ao longo da história do País, a ação governamental concentrou- se nas ações de comando e controle, com regras e instituições específicas para determinados recursos naturais, com pouca ou nenhuma integração com outras políticas ou processos gerenciais de uso de recursos naturais, situação que mudou significativamente após a instituição da Lei nº 6.938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente, quando houve correspondência da evolução da gestão ambiental no Brasil com os conceitos, princípios, diretrizes e critérios de governança ambiental e seus resultados. Apesar dos avanços em direção aos critérios de reforma e modernização do Estado como descentralização, participação, democratização, capacitação gerencial, eficiência e eficácia, a relação da sociedade, do Governo e do setor privado com a natureza ainda reflete uma visão colonial utilitarista, imediatista e de uso insustentável dos recursos naturais, aliada a problemas de execução das normas e regras, causando degradação ambiental e comprometendo o desenvolvimento sustentável. Indicam a necessidade de se avaliar mais criticamente os alcances da Política Nacional do Meio Ambiente em função da contínua perda dos recursos e serviços ambientais e o elevado padrão de consumo da sociedade em bases não sustentáveis, requerendo mudanças de atitude do cidadão em relação ao uso e proteção dos recursos e serviços ambientais. Os resultados alcançados contribuem para a discussão da relação histórica de uso e ocupação do território nacional e suas consequências para a sustentabilidade. PALAVRAS-CHAVE: governança, governança ambiental, governabilidade, gestão ambiental, política ambiental, desenvolvimento sustentável, teoria da ação coletiva.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA V. 21, Nº 46: 125-146 JUN. 2013

RESUMO

GOVERNANÇA AMBIENTAL NO BRASIL: ECOS DOPASSADO

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, v. 21, n. 46, p. 125-146, jun. 2013Recebido em 24 de janeiro de 2009.Aprovado em 28 de junho de 2009.

João Batista Drummond Câmara

ARTIGOS

I. INTRODUÇÃO.

Para identificar e descrever a governança ambientalno Brasil é preciso considerar o contexto histórico daformulação e execução de políticas de uso e controledos recursos naturais, até a consolidação da PolíticaNacional do Meio Ambiente. Este estudo faz umareflexão da situação atual da gestão ambiental e seusreflexos no modelo de desenvolvimento econômicobrasileiro, buscando responder à seguinte pergunta:quais os fatores que influenciam na governançaambiental no Brasil e como eles relacionam entre si?Para respondê-la, foram considerados os marcoshistóricos mais significativos, além dos atos normativos,gerenciais e políticos. Também fizeram parte dessaanálise as fases da história e suas contribuições para aevolução conceitual e gerencial da gestão ambiental,em relação aos aspectos do uso dos recursos naturais,desde o Descobrimento do Brasil até 2011.

Adotou-se como conceito de governança ambiental,neste estudo, o “arcabouço institucional de regras,

instituições, processos e comportamentos que afetama maneira como os poderes são exercidos na esferade políticas ou ações ligadas às relações da sociedadecom o sistema ecológico” (CAVALCANTE, 2004). Aconstrução da política ambiental brasileira encontra-se no mesmo patamar das demais políticas públicas,que são moldadas, muitas vezes, sobre alicercespolítico-institucionais construídos na história políticado Brasil, com forte viés no papel controlador doEstado, que consubstancia as bases da governabilidadee da governança.

O processo de formulação e execução das políticaspúblicas no Brasil mudou continuamente desde operíodo do descobrimento, cujo modelo autoritário eburocrático foi aos poucos sendo substituído porprocessos mais democráticos e participativos,induzidos pelas mudanças verificadas no contexto daspolíticas internacionais. Essas mudanças foraminfluenciadas pelos problemas econômicos, sociais eambientais resultantes de modelo de desenvolvimentobaseado na teoria econômica neoclássica, de uso

O presente artigo trata de uma análise da ação governamental para o controle do uso dos recursos naturais noBrasil, desde o descobrimento, em 1500. Teve como objetivo compreender o processo de formulação e execução depolíticas ambientais, considerando a evolução de conceitos, regras e instituições do período colonial até os diasatuais, caracterizando as bases históricas, institucionais e legais que moldaram a atual governança ambientalbrasileira. A pesquisa foi realizada consultando referências bibliográficas e documentos governamentais comdados e informações diversos. Pode-se observar que ao longo da história do País, a ação governamental concentrou-se nas ações de comando e controle, com regras e instituições específicas para determinados recursos naturais, compouca ou nenhuma integração com outras políticas ou processos gerenciais de uso de recursos naturais, situaçãoque mudou significativamente após a instituição da Lei nº 6.938/81, da Política Nacional do Meio Ambiente,quando houve correspondência da evolução da gestão ambiental no Brasil com os conceitos, princípios, diretrizese critérios de governança ambiental e seus resultados. Apesar dos avanços em direção aos critérios de reforma emodernização do Estado como descentralização, participação, democratização, capacitação gerencial, eficiênciae eficácia, a relação da sociedade, do Governo e do setor privado com a natureza ainda reflete uma visão colonialutilitarista, imediatista e de uso insustentável dos recursos naturais, aliada a problemas de execução das normas eregras, causando degradação ambiental e comprometendo o desenvolvimento sustentável. Indicam a necessidadede se avaliar mais criticamente os alcances da Política Nacional do Meio Ambiente em função da contínua perdados recursos e serviços ambientais e o elevado padrão de consumo da sociedade em bases não sustentáveis, requerendomudanças de atitude do cidadão em relação ao uso e proteção dos recursos e serviços ambientais. Os resultadosalcançados contribuem para a discussão da relação histórica de uso e ocupação do território nacional e suasconsequências para a sustentabilidade.

PALAVRAS-CHAVE: governança, governança ambiental, governabilidade, gestão ambiental, política ambiental,desenvolvimento sustentável, teoria da ação coletiva.

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imediatista, visando ao lucro, e descompromissadocom as causas ambientais. A adoção desse modelo e ocrescimento dos problemas por ele gerados têmresultado no surgimento de vários movimentos sociaisque pressionaram - mais notadamente a partir dos anosde 1960 - e ainda pressionam as estruturas de podercentralizadas e autoritárias, induzindo transformaçõesna ordem jurídico-institucional e política nos países enas suas inter-relações. Assim, forçam-se mudançasna estrutura e no papel do Estado e da economiamundial.

Dessa forma, a evolução da política ambientalbrasileira é um reflexo da evolução das políticaspúblicas no contexto internacional, da adoção dosprincípios da descentralização, da desestatização, daparticipação social e da institucionalização deprocessos gerenciais integrados e dinâmicos. Taismudanças se dão, principalmente, a partir da percepçãoda falência dos atuais modelos de desenvolvimento esuas influências negativas na sociedade, na economiae no meio ambiente, resultando em transformaçõesde paradigmas de políticas e de instituições públicas,sociais e privadas e suas inter-relações no uso dosrecursos ambientais, na apropriação dos territórios enos modelos de gestão adotados.

Desde o período colonial, o uso dos recursosnaturais vem sendo realizado por meio de normas einstituições que reforçam o papel do Estado comomandatário. Ele baseia-se fortemente nos sistemas dedefinição de titularidade jurídica de propriedade doEstado e de concessão de uso, com adoção deinstrumentos econômicos como taxas, impostos ecobranças aliadas à fiscalização e aplicação depenalidades mediante infrações das regras instituídas,caracterizando sistemas de comando e de controle.Tal condição pressupõe capacidade gerencial nossistemas operacionais, conhecimento das dinâmicasambientais, efetividade no comando e no controle erespeito às normas e instituições, por parte dasociedade, e, muitas vezes, por parte do próprioEstado, enquanto usuário direto de recursos naturais.

Historicamente, pode-se observar que, desde oDescobrimento e o estabelecimento dos primeiroscolonizadores portugueses, a natureza é objeto deexploração para fins econômicos, a exemplo docomércio internacional do pau-brasil, usado comomadeira ou para a extração de seus pigmentos comocorante. Desde aquela fase aos dias atuais, ocorremformas distintas e fases de exploração dos recursosnaturais, que propiciam as bases para a legislaçãoambiental brasileira e sua aplicação na gestão ambiental.

A institucionalização da Política Nacional de MeioAmbiente no Brasil tem buscado incorporar princípios

da democratização das políticas públicas e daparticipação social no processo de tomada de decisãoe na ação descentralizada do Estado. Para isso, busca-se agir dentro dos princípios constitucionais e doarcabouço legal que rege a ação das instituiçõesbrasileiras, que seguem a tendência mundial dereestruturação do papel do Estado nas políticaspúblicas e suas consequências nos modelos dedesenvolvimento de cada país. Consolidar adescentralização e constituir processos decisóriosdiversos - como conselhos e comitês para a gestãoambiental em diversos temas (como pesca, florestas,unidades de conservação, bacias hidrográficas, entreoutros) - é uma atitude que aponta para ademocratização do processo decisório na formulaçãode políticas públicas no Brasil.

As transformações mais marcantes no contextoda política ambiental são tratadas neste estudo, quebusca compreender a aplicabilidade dos conceitosoriundos da teoria social e da teoria institucional,levando em conta seus reflexos nas transformaçõesda sociedade brasileira e da sua relação com osrecursos naturais. De modo geral, o conceito degovernança é tratado na literatura como algo associadoà capacidade de o Estado formular e implementarpolíticas públicas efetivas. A governança atuafortemente nos temas ambientais mais destacados nocontexto nacional e internacional (tais comoaquecimento global, buraco na camada de ozônio,perda da biodiversidade, escassez de água, comérciointernacional e meio ambiente, padrões de consumo,mudanças tecnológicas e estratégias empresariais nabusca do desenvolvimento sustentável), resultando emmodelos de articulação institucional que propiciam agestão ambiental do desenvolvimento.

II. EVOLUÇÃO DA GOVERNANÇA AMBIENTALNO BRASIL – DE 1500 A 1930 DO SÉCULO XX.

A intervenção do Estado no uso dos recursosnaturais no Brasil teve início imediatamente após oDescobrimento e consolidou-se no período colonial,com o controle do acesso às das terras pelo sistemade Sesmarias realizado pela Corte Portuguesa. Naqueleperíodo, foram instituídas, nas terras públicas, políticasde controle do uso da água subterrânea para fins deabastecimento humano e a exploração de recursosminerais e de madeiras, principalmente o pau-brasil.Quando a conquista do território brasileiro se efetivou,a partir de 1530, o Estado português decidiu utilizar(com algumas adaptações) o sistema sesmarial no“além-mar”, sendo o sistema de capitanias o escolhidopor D. João III para ser aplicado na colônia. Era umaforma de promover a ocupação da terra sem onerar aCoroa, uma vez que todos os gastos ficavam a cargodo donatário (DINIZ, 2005). A Sesmaria era uma

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subdivisão da Capitania e tinha o objetivo de que asterras fossem aproveitadas. O primeiro a ter liberdadede distribuir terras no Brasil foi Martim Afonso deSouza, ainda em 1532, cuja carta-patente pode serconsiderada como o primeiro documento oficial dedistribuição de terras no Brasil (DINIZ, 2005).

Esse sistema sesmarial de terras perdurou no Brasilaté 17 de julho de 1822, quando a Resolução nº 76,atribuída a José Bonifácio de Andrade e Silva, instituiuo alvará, instrumento de titulação de terras.Posteriormente, a Lei nº 601/1850 regulamentou o alvaráe o regime de terras, que permaneceu o direito privadopor ocupação primária (usucapião), principalmente nointerior do País (GDF, 1975). Em 17 de julho de 1822,o Príncipe Regente, aconselhado por José Bonifácio,extinguiu o sistema sesmarial. O novo sistema deocupação, com cultura efetiva e morada habitual, foium dos grandes responsáveis pela devastação dasflorestas (MAGALHÃES, 2002).

Durante o período colonial, os recursos naturaiseram considerados de propriedade do Estado, quemantinha restrições legais à sua exploração. Umexemplo é o das políticas de proteção da fauna, já quealguns animais não podiam ser caçados e a pesca erarestrita (Ordenações Filipinas, Livro 5º, TítuloLXXXVIII). O proprietário dos animais era o donodas terras onde eles se encontravam (OrdenaçõesFilipinas, Livro 2º, Título LIX, § 7º, e Título L).Quando não se encontravam em alguma propriedadeterritorial definida ou não possuíam qualquer marcaque indicasse seu dono, eram considerados “cousasachadas ao vento” (Ordenações Filipinas, Livro 3º,Título XCIV apud NÉTO, 1999). Tais princípioslegais, associados ao poder de polícia, asseguravam agovernabilidade do Estado sobre esses recursos,restringindo a liberdade para explorá-los.

O primeiro dispositivo legal de proteção florestalfoi a Ordenação determinada pelo Rei D. Afonso IV,em 12 de março de 1393. Esse dispositivo foiposteriormente compilado no Livro V, Título LVIIII,das Ordenações Afonsinas, e proibia o corte deliberadode árvores frutíferas, que ficou classificado comoinjúria ao rei (WAINER, 1991). As “Ordenações e Leis”do Reino de Portugal, de 1500, espelhavam apreocupação do Governo com as florestas edeterminavam, entre outras, “que o corte de árvoresfrutíferas, em qualquer parte que estiver, pagará aestimação dela ao seu dono em tresdobro. E se o danoque assim fizer nas árvores for valia de quatro milreis, será açoutado e degradado 4 anos para África. Ese for valia de 30 cruzados, e daí para cima, serádegradado para sempre para o Brasil” (CARVALHO,1991).

Daí pode-se observar o rigor na aplicação daspenalidades instituídas em Portugal na época –possivelmente em função das economias voltadas paraa comercialização de frutas. Destaca-se também aautoridade do Estado português no controle dosrecursos naturais, já que colocava como penalidademáxima a condenação de expulsão permanente para oBrasil. As Ordenações Manuelinas (que formavam acompilação legal sobre a legislação florestal no LivroV, Título C) caracterizavam o corte de árvores comocrime e foram consideradas uma saudação ao Rei D.Manuel, tendo o início de sua vigência em 1495 etérmino em 1521 (WAINER, 1991). Felipe II, oMonarca de origem espanhola, chegou ao poder em1595 e reordenou a legislação, enriquecendo-a comnovos princípios que resultaram nas OrdenaçõesFilipinas, em 1603, que prevaleceram em Portugal até1867 e no Brasil até 1916 (MILARÉ, 2001). Em 1605,foi editado o Regimento do Pau-Brasil, por Felipe II,no qual era fixada a exploração em 600 toneladas porano, com o objetivo apenas de limitar a oferta demadeira no mercado europeu e manter preçoselevados. Esse regulamento teve vigência até 1859(WAINER, 1991).

No entanto, a legislação portuguesa nunca chegoua ser aplicada efetivamente no Brasil. A degradaçãodas florestas brasileiras iniciou-se com a exploraçãoextrativa do pau-brasil, atividade que esgotou, empoucas décadas, as matas costeiras do país (PRADOJÚNIOR, 1998). Desse modo, pode-se inferir queapesar da existência da legislação, o próprio governonão lhe dava atenção, agindo de modo a favorecer oprocesso de uso e ocupação dos territórios e aassegurar a colonização portuguesa e seus meios deprodução, altamente predatórios, tendo em vista osaltos rendimentos resultantes da exploração madeireira.

Algumas ações mais voltadas à proteção dasflorestas foram realizadas pelo Rei Dom João VI,imediatamente após sua vinda para o Brasil, em 1808.Uma delas foi a criação do Jardim Botânico, em 13 dejunho daquele ano, no Rio de Janeiro, para aaclimatação de plantas tropicais e o cultivo deespeciarias vindas da Índia. Em 1809, Dom João VIpromulgou uma lei que libertava os escravos delatoresde infrações cometidas contra a natureza,demonstrando sua atenção quanto aos temas ligadosao meio ambiente.

O monopólio do corte, plantio e comercializaçãodo pau-brasil (Caesalpinia echinata Lam) pelo Estadomostrou-se ineficaz devido ao processo predatório desua exploração, o que causou sua redução. Em 1826,já se falava da sua escassez, o que induziu o Estado atomar medidas para sua proteção, tais como a exemplo

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da determinação à Junta da Fazenda Pública dePernambuco de reproduzir árvores da espécie, numatentativa de evitar a falta da madeira (MAGALHÃES,2002). O pau-brasil era utilizado largamente pelos índiosbrasileiros para a confecção de arcos, flechas, pinturasna pele e de roupas. Eles transferiram a técnica daextração do corante do cerne da árvore aosportugueses, que desenvolveram um comérciointernacional marcante até o surgimento das anilinascomo corantes e a oferta no mercado de outrasmadeiras. A escassez do pau-brasil, devido ao processode exploração predatório, levou essa espécie quase àextinção (RESENDE, 2006). O crescimentoeconômico do Brasil foi ecologicamente incorretodesde a exploração do pau-brasil e assim se mantevedurante o desenvolvimento de monoculturas taiscomo os que embasaram os ciclos da cana-de-açúcare do café, em processos que devastaram florestas comoa Mata Atlântica (SÉGUIN & CARRERA, 1999).

Nas Sesmarias praticava-se o método de corte equeima da floresta para a fertilização do solo e limpezado terreno, levando à necessidade da expansão daspropriedades sempre que os senhores das terrasfizessem solicitação à Coroa Portuguesa (PÁDUA,1987). Portanto, o desenvolvimento de lavouras noBrasil, no Período Colonial, baseou-se fortemente naexpansão da fronteira agrícola sobre a vegetaçãonatural, com pouca ou nenhuma preocupação com ouso racional, em longo prazo, das áreas agrícolas jáinstituídas. Naquela época, pouco valiam as leis quevisavam à conservação das florestas, pois parecia nãohaver conscientização da sua importância Isso se dava,possivelmente, pela falta de raízes dos colonizadorescom o Brasil, o que fazia com que predominasse umcaráter utilitarista e predatório das oligarquias ruraislatifundiárias que visavam ao lucro de curto prazo.

Assim, as terras eram levadas à degradação eexaustão, sem que houvesse qualquer preocupaçãoem introduzir novas técnicas mais apropriadas paraevitar o desgaste do solo, possivelmente devido aosentimento de abundância inesgotável dos recursosnaturais (WAINER, 1991). Nas colônias nas quais oseuropeus se fixaram foram desenvolvidas instituiçõespolíticas com o controle eficaz das elites. Já nascolônias com alta densidade de população, sistemasextrativos de produção e poucos europeus, colocaramo poder nas mãos das elites e construíram um aparatoestatal concebido para utilizar a coerção contra amaioria da população (ACEMOGLU, JOHNSON &ROBINSON, 2004).

A partir de 1713, após a verificação da ocorrênciade secas associadas ao desmatamento para a expansãoda agricultura, o Estado editou vários decretos,buscando controlar tais práticas, especialmente a partir

da grande seca de 1791-1792, estabelecendo severocontrole ao desmatamento, que culminaram com acriação da função de juiz de conservação florestal em1796 (BURSZTYN, 1990, p. 25).Em 1823, JoséBonifácio de Andrade e Silva redigiu umaRepresentação à Assembleia Constituinte e Legislativado Império do Brasil. No documento que tratava daEscravatura, José Bonifácio fez uma eloqüente defesada necessidade de conservar os recursos naturais dopaís (PÁDUA, 1987). Em 1830, foi promulgado oCódigo Criminal, em cujos artigos 178 e 257 eramestabelecidas penas para o corte ilegal de árvores(SWIOKLO, 1990).

Em 1920, o governo federal tratou a questãoflorestal em uma legislação mais específica eapropriada para a sua gestão. Naquele ano, o entãopresidente Epitácio Pessoa instituiu uma subcomissãopara elaborar um anteprojeto de lei, transformada noDecreto nº 23.793, de 1934, que ficou conhecidocomo Código Florestal (AHRENS, 2003). Esse códigoinovou ao impor limites no direito de uso dapropriedade privada, por meio da instituição da reservalegal denominada, à época, de Quarta Parte, por seruma reserva obrigatória de 25% da vegetação nativade cada propriedade rural. (DEAN, 1996). Mais tarde,em 1965, esse Código foi atualizado e transformadona Lei nº 4.771, vigente até hoje.

Em 1850, teve início uma pressão por parte dosproprietários de terras para acabar com as restriçõesda conservação das madeiras de interesse da Coroa(ANTUNES, 2000). A Lei nº 601, de 18 de setembrode 1850, conhecida como Lei das Terras, estabeleceuque a aquisição de terras somente pudesse ser feitapor compra, ficando proibido o usucapião sobre terraspúblicas, doravante considerada crime. Desse modo,a terra passou a ser mercadoria, perdendo seu aspectode privilégio (CARRERA, 1999). Em 1872, o Decreton° 4.887 deu início à atividade florestal particular docomércio legal de madeiras, assinado pela PrincesaIzabel Regente. Naquele ano, passou a funcionar aCompanhia Florestal Paranaense, na Província doParaná, no município de Borda de Campo, montouuma fábrica a vapor para serrar pinho, mas nãoprosperou devido às dificuldades para o transporte damadeira (PEREIRA, 1950).

Posteriormente, com o Imperador Pedro II e apartir da constatação dos danos causados à cidade doRio de Janeiro devidos ao desmatamento da FlorestaAtlântica nas encostas da Serra do Mar causado pelopara o plantio cafeeiro, foi realizado um projeto dereflorestamento. Tal iniciativa foi considerada umaação destacada de recuperação ambiental. Osmanguezais também foram protegidos de corte,situação tutelar mantida ainda hoje na legislação

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florestal, que os define como áreas de preservaçãopermanente (art. 2º do Código Florestal). Em 1821,foi promulgada a legislação sobre o uso da terra, queprevia a manutenção de reservas florestais em um sextodas áreas vendidas ou doadas, visando ao suprimentode madeiras e de lenhas (DALTRO, 2002). Essespreceitos foram mantidos nas legislações sucessivas,estando atualmente definidos no Código Florestal comosendo reserva legal instituída 80% na região amazônicae 20% no restante do País.

Antigamente a água subterrânea era controlada peloEstado por meio de uma autorização central noPrimeiro Reinado (1822-1831), na Regência Trina(1831-1840) e no Segundo Reinado (1840-1889),ficando seu uso praticamente sem controle do Estadono período de 1889 (Primeira República) até 1930, Asituação foi revertida, com retorno ao controle peloEstado no governo de Getúlio Vargas (1930-1945),quando foi promulgada a Lei do Direito de Água noBrasil (Código das Águas), assim como os códigosde mineração, florestal entre outros (REBOUÇAS,1976).

No período colonial, com a queda no mercado doaçúcar, houve o desenvolvimento da mineração de ouroe diamante. A partir do século XVIII, a populaçãopassou a se expandir nas regiões que concentravam aatividade extrativa dessas riquezas em Minas Gerais,Goiás e Mato Grosso. Além disso, a pecuária passoua avançar pelo interior, consistindo o principal fatorde ocupação da Amazônia naquele período. A partirdaí passaram a ocorrer rupturas no esquemalatifundiário escravista da monocultura e a surgir váriosnúcleos urbanos formados pelos bandeirantes e pelasatividades de garimpo de ouro e diamantes no BrasilCentral e na região amazônica.

Ao final do século XVIII, a Coroa Portuguesaadotou medidas drásticas de controle da atividademinerária, exigindo cotas de tributação e impondo umacobrança exacerbada de impostos, que ficouconhecida como derrame. Essas medidas induziramo surgimento um movimento social contrário a talpolítica, chamado de Inconfidência Mineira. Entre1808 e 1822 foi adotado um conjunto de medidas nogoverno de D. João VI, visando recuperar a economiamineral. Entre essas providências, se realizaram maispesquisas e explorações diversificadas de carvãomineral no Sul, petróleo, ouro e manganês na Bahia, oque culminou na criação de fábricas e companhiasminerais. Com a Independência, em 1822, uma novaConstituição introduziu noções de direito de pesquisae lavra de jazidas minerais.

Outras normas jurídicas para a proteção do meioambiente foram editadas ainda no período colonial,

objetivando a proteção da saúde humana e,indiretamente, o meio ambiente. Essa fase foi chamadapor Benjamin (2000) de laissez-faire ambiental e oque importava era alargar as fronteiras produtivas daagricultura, da pecuária ou da mineração. Com acriação, em 1874, da Associação Brasileira deMineração - que foi transformada nos anos de 1930,em Departamento Nacional de Produção Mineral(DNPM) - o controle governamental na atividademinerária foi instituído com mais efetividade (DNPM,2008). Ao final do século XIX, a mineração brasileirafoi suplantada no cenário internacional devido àobsolescência tecnológica do seu processo deprodução, o que causou desequilíbrio entre opotencial mineral e a participação no mercadointernacional, gerando perdas em relação à produçãodos Estados Unidos, Austrália e África do Sul. Asatividades garimpeiras e industriais mineraisrudimentares foram modificadas para padrõestecnológicos mais efetivos somente a partir dos anosde 1930, com a produção de ferro-gusa e aço emMinas Gerais.

Apesar da fundação da Escola de Minas de OuroPreto, em 1866, visando modernizar a produçãomineral, somente com a criação do DepartamentoNacional de Produção Mineral (DNM), em 1934, opaís passou a contar efetivamente com uma instituiçãovoltada para o desenvolvimento de seus recursosminerais e hídricos. A partir dos anos de 1960, aindústria mineral brasileira expandiu-se de maneirasignificativa, destacando a ação governamental queresultou na implementação do I Plano Mestre Decenalpara o Setor de Minerais, com a instituição de umnovo Código de Mineração e a criação da Companhiade Recursos Minerais (CPRM apud SENADOFEDERAL, 2000).

Pode-se observar, portanto, que do Descobrimentoaté os anos de 1930 a governança ambiental pautou-se em normas nacionais emanadas pelo governocentral que tinham cunho punitivo, com ações decomando e controle voltadas para assegurar aprodutividade e o desenvolvimento econômico, e compouca atenção ao uso sustentável ou de longo prazodos recursos naturais. Os investimentos em ciência etecnologia foram canalizados para a produção, de modoa assegurar competitividade no mercado internacional,aumentando o consumo de recursos naturais e adegradação ambiental. Consequentemente, asinstituições fortaleceram as elites no controle do usoe ocupação do solo e na apropriação dos recursosnaturais, como uma estratégia de governança baseadano comando e controle, com punições severas aodescumprimento das normas, o que consolidou asoligarquias rurais que dominaram as políticas públicas

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até os anos de 1930 do século XX. Do Descobrimentodo Brasil em 1500, até meados do século XX, pode-se dizer que muito pouca atenção foi dada à proteçãoambiental, com poucas normas de caráter protecionistae leis para assegurar a perpetuação de alguns recursosnaturais.

III. DOS ANOS 1930 A 1980 – A EVOLUÇÃO DASINSTITUIÇÕES E A GOVERNANÇA AMBIEN-TAL

Apesar do acesso e uso dos recursos naturaisremontarem ao início da colonização, no contexto dagestão pública esse tema ocupou lugar marginal nopensamento nacional, principalmente quanto aodesmatamento (PÁDUA, 2002). A carência de estudosmais aprofundados das práticas de exploração dosrecursos naturais, durante o período colonial dificultaa construção de uma retrospectiva mais detalhada dagestão ambiental desse período, denotando, de certamaneira, uma relação utilitarista e imediatista com osrecursos naturais, com ações pontuais no controle doseu uso, como deveres fundamentais do Estado e docidadão.

A economia do Brasil, principalmente a partir dosanos de 1930, tem sido submetida a um processo dedesenvolvimento amplamente dominado pela crençadesenvolvimentista de que quaisquer custos valem apena para crescer economicamente (DRUMMOND,1999). Segundo Neder (2002), a coalizão entre asforças políticas industrialistas, com as classes médiase do operariado urbano induziu à regulação públicasobre os recursos naturais nos anos de 1920 e originoua Revolução de 1930. O modelo de integração (nacionale societária) daí recorrente marcou o início de umperíodo caracterizado pelo controle federal sobre ouso e ocupação do território e de seus recursosnaturais, numa lógica de disputa de hegemonia entreas forças políticas e as elites econômicas locais dediferentes estados, e o governo central.

Os dois principais partidos políticos que desde oImpério asseguravam a governabilidade eramformados basicamente pelos fazendeiros que impediamquaisquer ações que procurassem impor restrições aodesmatamento nas propriedades e, portantocaracterizavam tais ações como sendo contrárias aodesenvolvimento agrícola e ao poder público dominante(VOLPATO, 1986). O coronelismo dominou essa épocae contra ele ninguém ousava exigir o cumprimento dalegislação. Essa condição influenciou a governançaambiental nesse período, com as instituiçõesgovernamentais atuando de acordo com as forçaspolíticas e econômicas dominantes e gerandoimpunidade aos infratores da legislação ambientalvigente. Esse comportamento dos sistemas produtivos

dominou a ação governamental até os anos de 1970,influenciando nas fragilidades das ações das instituiçõesresponsáveis pelo controle no uso dos recursosambientais (RESENDE, 2006).

A Primeira República, por ter sido marcada pelacontinuidade das fortes influências do coronelismo(que não recebia influências das antigas oligarquiasrurais), não rompeu com as estruturassocioeconômicas do passado colonial o que fez comque a economia permanecesse voltada para o mercadoexterno e baseada fortemente na monocultura(RESENDE, 2006). A legislação ambiental dos anosde 1930 visou regulamentar a apropriação de cadarecurso natural em âmbito nacional, tendo em vista asnecessidades da industrialização crescente, com focovoltado para a racionalização do uso e exploração dosrecursos naturais (água, flora e fauna) e aregulamentação das atividades extrativas (pesca,mineração), bem como definir áreas de preservaçãopermanente (ALMEIDA et al., 2000).

A legislação florestal sofreu grandestransformações após a década de 1930 e vem passandopor transformações de uma legislação estritamenteflorestal e de cunho econômico para uma ambientalmais pontual. Essas transformações têm se processadopor meio da edição de códigos com o intuito deproteção, tendo se diversificado o controle do Estadosobre os recursos naturais. Mas observa-se amanutenção das estruturas oligárquicas que continuama exercer suas influências e na governança dos temasambientais. Desse processo resultaram legislações queregulamentaram o uso dos recursos naturais como: oCódigo das Águas (Decretos n° 24.643/34, n° 24.672/34, n°13/35 e Decreto-Lei nº 852/38); Código Florestal(Decreto nº 23.793/37); Parques Nacionais (1937);Proteção ao Patrimônio Histórico e Artístico Nacional(1937); Código de Pesca (Decreto-Lei nº 794/38 eDecreto-Lei nº 1.631/39); Código de Minas (Decreto-Lei nº 1.895/40); Código das Águas Minerais (Decreto-Lei n°7.841/45).

Quanto à fauna, o Decreto nº 24.645/34 poucoinovou quanto à propriedade dos animais, pois mantevea fauna brasileira tutelada pelo Estado. Em nenhumaConstituição brasileira (1824, 1891, 1934, 1937, 1946,1967, EC 69 e 1988) os animais são declarados comobens da União (NÉTO, 1999). Com o advento doCódigo Civil, em 1916, os animais selvagens passarama ser coisas sem dono e sujeitos à apropriação (CódigoCivil, art. 593), passando a pertencer ao caçador oanimal por ele apreendido (Código Civil, art. 595)(NÉTO, 1999).

Nesse período foram criadas diversas instituiçõesfederais, com ação mandatária em todo o território

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nacional, sendo que em alguns casos houve replicaçãode tais instituições em âmbito estadual. São exemplosmais destacados dessas instituições federais: oDepartamento Nacional de Águas e Energia Elétrica(DNAEE); o Instituto Brasileiro de DesenvolvimentoFlorestal (IBDF); o Departamento Nacional deProspecção Mineral (DNPM); a Superintendência doDesenvolvimento da Pesca (Sudepe); aSuperintendência de Desenvolvimento da Borracha(Sudhevea); o Instituto do Patrimônio Histórico eArtístico Nacional (Iphan), entre outras.

O início da governança sobre os recursos naturaisfoi caracterizado por ações de Governo quefomentavam o financiamento e o incentivo à produção,induzindo a conversão de princípios dessas leis emmoeda econômica entre elites locais e o governocentral. Estabeleceram-se assim, nesse período,relações fortes de poder em uma estrutura centralizada,piramidal-hierárquica com conflitos, interesses edinâmicas intra e inter-regionais, que se reproduzemao longo das décadas seguintes (NEDER, 2002). Nocontexto da gestão dos recursos naturais, a partir dosanos de 1930, houve tendência na regulaçãoindependente e não integrada dos seus usos, gerandopolíticas setorizadas que atendiam a grupos deinteresses diversos. Ocorreram, muitas vezes, conflitosde uso dos recursos naturais e disputas políticas comações isoladas, descoordenadas e dissociadas do sensocomum ou da vontade da maioria dos atores sociais.

O Estado brasileiro buscou, nos anos seguintes,exercer seu papel de gestor da conciliação de gruposde interesse, abrindo espaços políticos para amanutenção de velhas oligarquias colonialistas. Entreelas, destacamos: os produtores de açúcar e o extintoInstituto do Açúcar e do Álcool (IAA); os cafeicultorese o Instituto Brasileiro do Café (IBC); os industriais eprodutores rurais da Amazônia com a Superintendênciade Desenvolvimento da Amazônia (Sudam); aSuperintendência de Desenvolvimento do Nordeste(Sudene); os industriais de informática com aSecretaria Especial de Informática (SEI), entre outros.Tais espaços vêm sendo criados e extintos,sucessivamente, em função das composições deinteresses políticos (BURSZTYN, 1990, p.131).

Somente nos anos de 1960 e 1970, com aintensificação do processo de industrialização no Brasil,passou a ocorrer maior engajamento da sociedade nostemas ambientais e sociais, notadamente com relaçãoàs consequências desastrosas verificadas com apoluição industrial e a contaminação de áreas urbanaspróximas, que resultaram em problemas graves desaúde das populações afetadas. A visão segmentadada questão ambiental no Brasil, consubstanciada por

uma legislação fragmentada e individualizada por tipoou natureza do recurso natural ou de seu uso, foimodificada a partir dos anos de 1970, principalmenteapós a I Conferência das Nações Unidas sobre MeioAmbiente, realizada em Estocolmo. Na ocasião, foicriada a Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema)e a elaborada a regulamentação de temas ambientaisintegrados como recursos hídricos, fauna, flora epoluição (ALMEIDA et al., 2000). Nesse período,vários acordos internacionais multilaterais foramestabelecidos. Ressaltamos: a Convenção sobreLançamento de Dejetos por Navios (1972); aConvenção sobre Espécies da Flora e FaunaAmeaçadas de Extinção (1972); o Tratado deCooperação Amazônica (1978) e a ConvençãoEuropeia sobre Poluição Transfronteiriça (1979).

Os diversos modelos de política econômica adotadosno Brasil, a partir dos anos de 1950, com o incrementoda produção industrial e a expansão da fronteira agrícolamecanizada contribuíram para o êxodo rural e ocrescimento populacional das cidades, intensificando aurbanização, fato gerador de maior demanda por recursosnaturais básicos na construção civil e na indústria(CÂMARA; CARVALHO, 2002). O desenvolvimentoindustrial verificado no Brasil nos anos de 1960 e 1970motivou manifestações sociais contrárias à poluiçãoverificadas nos centros industriais de Cubatão, SãoPaulo, Rio de Janeiro e Volta Redonda, cidades nasquais o problema ambiental causou complicaçõesgraves de saúde pública e dos trabalhadores, além dedanos ecológicos significativos.

Ao final da década de 1970 e início dos anos de1980, foram conduzidos no Brasil os primeiros estudosde avaliação de impacto ambiental em razão deexigências do Banco Interamericano deDesenvolvimento (BID) e do Banco Mundial (BIRD).As agências financiaram os projetos de implantaçãodas usinas hidrelétricas de Sobradinho, Tucuruí e oterminal Porto Ferroviário Ponta da Madeira, além doasfaltamento da BR-364 (Cuiabá/Rio Branco),facilitando a implantação de assentamentos ruraiscausadores de grandes áreas desflorestadas. Noentanto, como o País ainda não dispunha de normasambientais próprias, esses estudos foram realizadosde acordo com as normas de agências internacionais.A ação de movimentos sociais contrários ao ritmo dedegradação ambiental, nessa época, gerou articulaçõesentre esses e outros organismos internacionais,ocasionando pressões políticas que passaram aameaçar o fluxo de capitais estrangeiros que custeavamparte dos programas de desenvolvimento econômicodo Governo federal, demandando uma revisãoprofunda do contexto político-institucional no iníciodos anos de 1980.

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IV. A GOVERNANÇA AMBIENTAL APÓS A LEINº 6.938/81.

A necessidade de um arcabouço legal e institucionalpara fazer frente aos desafios dos problemasambientais marcantes nesse período contribuiu parao estabelecimento da Política Nacional do MeioAmbiente, instituída pela Lei nº 6.938/1981 (BRASIL,1981), que estabeleceu diretrizes gerais dessa políticae seus instrumentos de implementação (art. 9°),destacando a exigência, em nível nacional, dolicenciamento ambiental para as atividades utilizadorasdos recursos naturais e consideradas efetivas oupotencialmente poluidoras.

Tal contexto político-institucional propiciou oestabelecimento de uma malha de instituições federais,estaduais e municipais voltadas para a gestão ambientaldos recursos naturais, ampliando o número departicipantes nos processos decisórios.Quanto ao usodesses recursos, esta participação foi ampliada maisefetivamente ao se instituir a gestão participativa e aose assegurar maior diversidade de atores sociaisenvolvidos no planejamento e gestão do uso de recursosnaturais. A adoção, pela política nacional do meioambiente, do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) edo respectivo Relatório de Meio Ambiente (Rima) noBrasil, com base no art. 9º da Lei nº 6.938/81 e,posteriormente, a Resolução nº 01/86 do ConselhoNacional do Meio ambiente (Conama) estabeleceumecanismos que favoreceram a governança ambientalao introduzir as audiências públicas no processo delicenciamento ambiental, abrindo um importante espaçode manifestação das populações interessadas ouafetadas por empreendimentos causadores de impactosambientais, assim como de mobilização no processode tomada de decisão. Os instrumentos de comandoe controle, característicos da política ambiental, sãoconsiderados de regulação direta, pois implicam ocontrole sobre os locais que estão emitindo poluentes.O órgão regulador estabelece uma série de normas eprocedimentos, regras e padrões a serem seguidospelos agentes poluidores, assim como penalidadesdiversas como multas e cancelamento de licenças eembargos, caso não cumpram o estabelecido.

Nos anos de 1990, verificou-se uma relativamarginalização das audiências públicas durante osprocessos de licenciamento ambiental, assim comodificuldades de acesso à informação por parte daspopulações afetadas, falta de transparência na elaboraçãodos estudos de impacto ambiental (o que, estima-se,favorecia o empreendedor), e falhas na função deregulação, tendo como resultado a emissão de licençasambientais com problemas (ZHOURI, 2006). O ProjetoGrande Carajás de exploração de minério de ferro, daCompanhia Vale do Rio Doce (CVRD), no estado do

Pará, gerou diversos impactos ambientais na região,desde as áreas de lavra até o porto de escoamento nolitoral do Maranhão. Destaca-se, como processogerador da degradação ambiental da Floresta Amazônica,o parque siderúrgico instalado ao longo da ferrovia.

Com a instalação de empresas produtoras de ferro-gusa subsidiadas pelos governos federal e estaduais (Paráe Maranhão), que dependiam da utilização do carvãovegetal oriundo da floresta nativa para a alimentação dealtos-fornos para viabilizar preços competitivos, surgirammanifestações internas e externas da sociedade,pressionando instituições de fomento internacionais comoo Banco Mundial e o FMI a forçarem o Governo brasileiroa adotar medidas efetivas de controle, induzindo namelhoria do licenciamento ambiental e na fiscalização.Essa pressão culminou na criação do Instituto Brasileirodo Meio Ambiente e dos Recursos Naturais renováveis(IBAMA). A Lei nº 7.347, de 1986, que instituiu a AçãoCivil Pública Ambiental instrumentalizou a mobilizaçãoda sociedade para um envolvimento mais significativono processo de tomada de decisão quanto aempreendimentos causadores de impactos ambientaismais expressivos. A lei foi aplicada no mesmo ano, emuma ação civil pública contra o Projeto Grande Carajás,confrontando as empresas produtoras de ferro-gusa queestavam causando desflorestamentos da Amazônia aolongo da Estrada de Ferro Carajás da Companhia Vale doRio Doce.

Em 1988, foi promulgada a nova ConstituiçãoFederal brasileira vigente, que dedicou um capítulointeiro às questões ecológicas. Seu texto aborda aPolítica Nacional do Meio Ambiente e foi oficializadologo após a publicação, em 1987, do relatório “O NossoFuturo Comum”, pela Comissão Mundial sobre o MeioAmbiente e Desenvolvimento. Tal Comissão, presididapela Primeira Ministra da Noruega, Gro HarlenBrundtland, afirmava a necessidade de buscar oequilíbrio entre desenvolvimento e preservação dosrecursos naturais (BRUNDTLAND, 1988). AConstituição Federal brasileira, de 1988, trouxe o meioambiente para o foco das decisões políticas,reconhecendo a ligação entre desenvolvimento social eeconômico e a qualidade do meio ambiente. Aos poucos,começou a se delinear uma abordagem integradora quese opõe à visão desenvolvimentista clássica adotada atéentão. Foram feitas algumas alterações relevantes nalegislação referente à fauna e à flora nesse período. ALei nº 9.605, de 12/2/1998, ao definir os animaissilvestres, aumentou o campo de abrangência no tocanteà fauna silvestre (art. 29, § 3º), tendo elevado à categoriade crime o que antes era contravenção (NETO, 1999).

Ainda em 1989, o Código Florestal teve alguns deseus artigos alterados pela Lei nº 7.803, assim comoforam acrescentados outros artigos visando melhorar

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a gestão florestal. Foi instituída a Reserva FlorestalLegal (RL), assim como a exigência de ela seraverbada à margem da matrícula do imóvel, no cartóriode registro, tendo ficado proibida sua alteração noscasos de desmembramento e transmissão dapropriedade a qualquer título (BRASIL, 1989). AMedida Provisória nº 1.551 (28/5/1997) tambémalterou o Código Florestal, tendo como uma dasprincipais mudanças a utilização de apenas 20% daárea em propriedade localizada na Amazônia,aumentando a porcentagem da reserva legal, antesdefinida em 50% da propriedade (NETO, 1999).

Outra ação de Governo que visava à consolidaçãodas bases institucionais para a gestão ambiental noBrasil foi a criação do IBAMA, por meio da Lei Federalnº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, que é umaentidade autárquica de regime especial, com autonomiaadministrativa e financeira, e personalidade jurídicade direito público, com sede em Brasília, vinculada,então, à extinta Secretaria do Meio Ambiente daPresidência da República (posteriormente, Ministériodo Meio Ambiente). O IBAMA foi criado com afinalidade principal de executar as políticas nacionaisde meio ambiente referentes às atribuições federaispermanentes, relativas à preservação, à conservaçãoe ao uso sustentável dos recursos ambientais, suafiscalização e controle, e executar as ações supletivasda União em conformidade com a legislação em vigore as diretrizes daquele Ministério, de acordo com oDecreto nº 3.833/2001.

Apesar de ter propiciado mais representatividadeinstitucional e maior abrangência no cenário nacional,a criação do IBAMA passou por fases distintas dereformulação, consolidação e inserção no contexto doSistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), tendoocorrido conflitos de competência com instituiçõesestaduais de meio ambiente devido à nãoregulamentação dos artigos 23, 24 e 34 da ConstituiçãoFederal. O arcabouço legal brasileiro vem buscandodescentralizar as ações do Poder Público, fortalecendoo papel dos estados e municípios na gestãogovernamental, mudando a lógica das antigasOrdenações que governavam o Brasil Colônia, no quala propriedade de todas as coisas tendia a ser do Rei,corporificando um Estado unitário extinto em 1889com a República e com a instituição da Federação(NÉTO, 1999).

V. A GOVERNANÇA AMBIENTAL E AS TRANS-FORMAÇÕES NA GESTÃO PÚBLICA NOBRASIL NOS ANOS 1990.

A partir da década de 1990, ocorreramtransformações políticas, econômicas, tecnológicase institucionais na gestão pública no Brasil, buscando-

se assegurar a inserção do país na nova ordem mundialDestacou-se a entrada efetiva na agenda governamentalda transformação do papel do Estado, assim como aocorrência, no mesmo período, de maior abertura aomercado internacional e o forte ingresso do capitalestrangeiro no processo de privatização, gerando aconsolidação de um Estado mais democrático e menosprodutor, no sentido empresarial, assumindo umacondição mais reguladora ou normatizadora.

Verificou-se, ao longo do processo de liberalizaçãoda economia brasileira que se desenvolveu a partir dosanos de 1990, uma forte ofensiva contra aresponsabilidade ambiental do Estado. Os partidáriosdessa liberalização exigiam um Estado mínimo eenxuto, ao mesmo tempo em que atacavam o sistemade licenciamento ambiental por ser lento, atribuindo-lhe a responsabilidade pela falta de emprego no país,como se sua ação tivesse algum peso diante dos efeitosdo superávit primário, das taxas de juros e de outrosmecanismos recessivos da estabilização monetária(ACSELRAD, 2005). A reforma do Estado seguia alógica do saneamento financeiro do setor público e oreconhecimento da incompetência do poder públicona gestão de atividades de mercado, atribuindo ao setorprivado a responsabilidade de assumir tais funções.

Em 1990, o Programa Nacional de Desestatização(PND), foi criado no primeiro dia do governo FernandoCollor de Mello por medida provisória e transformadorapidamente na Lei nº 8.031 de 12 de abril de 1990. Alei foi um marco no processo da reforma do Estadobrasileiro, resultando em seguida na privatização deempresas estatais como a Vale do Rio Doce, empresassiderúrgicas e petroquímicas, portos, ferrovias erodovias, bancos estaduais e regionais, entre outras. Essa fase de privatizações foi incrementada, duranteo governo Fernando Henrique Cardoso, pelo Bancode Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).São exemplos significativos a privatização da malhaoeste da Rede Ferroviária Federal (vendida a preçomuito abaixo do mercado), das telecomunicações, dasatividades de resseguros, da refinação de petróleo, entreoutras. Tais mudanças requereram reformulaçõessignificativas na organização interna do Estado, o quegerou a criação de 35 emendas constitucionais quevisaram assegurar a liberalização de mercados ereorganizar o sistema legal brasileiro para enfrentarcom mais propriedade as imposições da globalizaçãoe a modernização do Estado.

O Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado,elaborado em 1995 pelo então Ministério daAdministração e Reforma do Estado, foi um elementonorteador do processo de reforma do Estadobrasileiro. Foram definidas as seguintes estratégiasbásicas para o êxito da reforma: 1) no plano fiscal, a

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busca de um novo padrão de financiamento do setorpúblico; 2) no plano organizacional, a criação de novosmodelos institucionais, com ênfase nadescentralização, publicização, privatização eterceirização de serviços; 3) no plano administrativo,a flexibilização e orientação do planejamento e da gestãopara resultados, na utilização intensiva de tecnologiasda informação e de comunicação, e na profissio-nalização de pessoal com foco nas carreiras estra-tégicas de Estado (RIBEIRO, 2003).

As transformações decorrentes dos processos dedesregulamentação, privatização e desestatizaçãoredefiniram o papel do Estado brasileiro, fazendo comque o Estado fortalecesse seu papel regulatório(CAVALCANTI & PECI, 2001). Abriu-se espaço paraa iniciativa privada em setores antes consideradosexclusivos da atuação estatal, a exemplo da exploraçãode petróleo. As principais instituições representantes doEstado regulador são as agências, instituídas em âmbitosfederal, estadual e municipal. No âmbito federaldestacam-se as agências unissetoriais em setores comoos de energia, telecomunicações, petróleo e gás,vigilância sanitária, transportes e outros setoreseconômico. São elas: Agência nacional de EnergiaElétrica (Aneel), Agência Nacional de Petróleo (ANP),Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa),Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel),Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS) eAgência Nacional de Águas (ANA), Agência Nacionalde Transportes Terrestres (ANTT). Todas atuamdiretamente no controle da gestão do uso dos recursosnaturais e na qualidade ambiental e de vida da populaçãobrasileira e sua criação visou consolidar o papelregulamentador do Estado nessa nova perspectiva depolíticas públicas, confirmando a participação socialem diversos mecanismos de gestão instituídos.

Em que pesem tais mudanças favoráveis àdemocratização, Mappa (2004) cita que as reformaspolíticas feitas nos países do sul não correspondem àdemocratização do Estado nem das sociedadesrespectivas, mas, sim, o enfraquecimento do Estado,sua fragmentação, implosão e criminalização. Destaca-se no conceito de governança o ajuste e o superávitfiscal e leva-se o conceito de governança corporativaempresarial ao setor público, em especial em suacontabilidade financeira, impondo um padrãoglobalizado de gestão marcadamente dissociada davisão ecossistêmica ou dos princípios dodesenvolvimento sustentável. As ações institucionaisde gestão ambiental são contingentes, resultandogeralmente em programas, projetos e novas instituiçõespara enfrentá-los, geralmente de curta duração, devidoà visão imediatista de resultados a serem alcançadosnos processos de decisão políticos. A criação de

instituições e agências reguladoras no Brasil nos últimosanos corrobora essa afirmação (LE PRESTRE, 2003).

O conceito de governança vincula-se à prioridadedo econômico sobre o político, do capital sobre oEstado, do mercado sobre a democracia, do lucrosobre a justiça social (MAPPA, 2004). Tal condiçãodo predomínio da temática financeira nas políticaspúblicas mostra-se evidente ao se considerar o poderinstituído ao ministro de Estado da Economia e suaimportância no processo decisório nacional, nosúltimos anos, em detrimento de sua efetividade oualcance de seus programas prioritários, aliados ao focodado no acompanhamento por meio da avaliação dedesempenho financeiro das ações contidas no PlanoPlurianual. O Planejamento e o Orçamento têm sidofatores determinantes na formulação e execução depolíticas públicas no Brasil, podendo ser entendidoscomo instituições que exercem papel fundamental noordenamento das relações entre os atores para aexecução das políticas públicas (SILVERWOOD-COPE 2005).

Reflexos desse contexto de gestão financeira napolítica ambiental vêm se manifestando na políticaambiental, em pressões sobre o sistema delicenciamento ambiental do governo federal e dosestados, para liberação imediata de obras do Plano deAceleração do Crescimento (PAC). Isso se verificaem obras como as das usinas hidrelétricas de SantoAntônio e Jirau, (ambas no Rio Madeira, emRondônia), no licenciamento da Usina Nuclear deAngra 3 e na transposição do Rio São Francisco, entreoutras. Para o alcance de tais licenças, foi necessárioque o governo federal fizesse uma mudança nos cargos-chave do setor ambiental, com ênfase no Ministériodo Meio Ambiente (MMA) e no IBAMA. O MMAinstituiu, em maio de 2001, a Comissão Tripartite,constituída por três representantes do próprioMinistério, três da Associação Brasileira de EntidadesEstaduais de Meio Ambiente (Abema) e três daAssociação Nacional de Municípios e Meio Ambiente(Anamma). O objetivo foi promover a gestão ambientalcompartilhada entre os entes federativos, de modo aregulamentar no setor ambiental os princípios definidosno art. 23 da Constituição Federal - que estabelece ofederalismo cooperativo, articulando as competênciascomuns dos entes federados para proteger o meioambiente.

Foram elaborados e instituídos convênios paraajustes das ações institucionais, definindo-secompetências e responsabilidades entre os poderespúblicos federal, estadual e municipal para matériasde meio ambiente (MOURA, 2005). A ComissãoTripartite foi instituída consolidando um pactopolítico para a busca da melhoria da governança

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ambiental. As organizações governamentaisintegrantes do Sistema Nacional de Meio Ambiente(Sisnama), a exemplo das instituições públicasrelacionadas a outras áreas de políticas públicas,enfrentam problemas estruturais decorrentes dapolítica econômica, que vêm contribuindo para odesaparelhamento do Estado.

Tais fatores levam ao licenciamento ambiental, quedeveria ter sua função precípua de avaliação dasustentabilidade socioambiental de umempreendimento elevada, à condição de merolegitimador do crescimento econômico, como projetoda sociedade, colocando o meio ambiente comorecurso material a ser explorado. São notórias a faltade pessoal qualificado, a insuficiência de recursosorçamentários e financeiros e a desarticulaçãoinstitucional entre as diversas esferas de governo. Essasituação tem resultado em fragilidades, fraquezas econflitos de competência, comprometendo odesenvolvimento sustentável.

As organizações não governamentais, preocupadascom a dinâmica predatória do modelo dedesenvolvimento resultante da abertura comercial eda desregulamentação, sustentam que o licenciamento,além de necessário, era insuficiente, apontando a faltade fiscalização como uma das causas da proliferaçãode conflitos ambientais (ACSELRAD, 2005). Essasituação ocorre concomitantemente a um aumento dapressão interna e externa de movimentos sociais epolíticos em prol da conservação da natureza, docontrole da poluição, do uso de tecnologias alternativas,de novos mercados verdes, de alternativas viáveis parao desenvolvimento sustentável, de mudanças nosparadigmas de produção do setor empresarial e damudança nos padrões de consumo da sociedadebrasileira. Esse processo se dá de forma desigual ecria situações críticas em regiões de desfavorávelrelação entre população e recursos e de baixa eficiênciado governo (VIOLA, 1996). Tal contexto reflete-seno desequilíbrio da distribuição espacial da governançaambiental no Brasil, principalmente ao comparar asregiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste com as regiõesSul e Sudeste, estas últimas com maior presença doEstado e maior mobilização social para a temáticaambiental.

O processo de abertura de canais de influênciapolítica na ação do Estado com instituições setoriaislevou a uma configuração complexa e onerosa doaparelho do Estado, que sofre com a baixa eficiênciae pouca credibilidade, situação que se agravando coma prática clientelista de recrutamento de pessoal einterferências políticas no processo de tomada dedecisão, comprometendo a efetividade das instituições

e o crescente déficit fiscal (BURSZTYN, 1990,p.132).

VI. DEMOCRACIA, DESCENTRALIZAÇÃO E PAR-TICIPAÇÃO SOCIAL NA GOVERNANÇAAMBIENTAL NO BRASIL.

Os governos de diversos países vêm buscandoadaptar-se, na medida do possível e com intensidadesdiferenciadas, à tendência global de redução do papeldo Estado, devido às pressões econômicas. Ao mesmotempo, vem aumentando a participação da sociedadecivil na formulação e execução de políticas públicas,o que causa mudanças significativas na composiçãodos atores sociais e tomadores de decisão no país, aexemplo da proliferação de conselhos gestores,comitês e grupos de trabalho multissetoriais – a cadavez mais e plurais quanto à composição erepresentatividade.

O debate sobre desenvolvimento, pobreza edesigualdade tem focado a questão da mudançainstitucional, como aponta o relatório do Banco MundialEquidade e Desenvolvimento. No documento, afirma-se que o desenvolvimento depende tanto dos mercadoscomo do bom funcionamento das instituições e, ainda,que a questão crucial para a promoção dodesenvolvimento em sociedades pobres é a melhoradas suas instituições (COELHO et al., 2005). Fligstein(2001) e Abramovay (2005) apontam em direçãosemelhante quando associam processos dedesenvolvimento à capacidade de os atores empromover a comunicação, a negociação e a cooperaçãoentre atores do mercado, da sociedade e do Estado.

A sociedade civil brasileira está vinculada àemergência de movimentos sociais assim como aosprocessos pelos quais atores sociais modernos edemocráticos surgiram, “adquiriram uma novaidentidade democrática e passaram a pressionar oEstado e o sistema político a se adaptarem a uma novaconcepção acerca da moderna institucionalidadedemocrática, com maior atuação e responsabilidadena formulação e execução de ações inerentes daspolíticas públicas (JACOBI, 2006b). As ONGsexpandiram-se nos países em desenvolvimento desdeo início da década de 1980, incluindo amplo conjuntode interesses, tais como direitos ambientais, humanose das mulheres (PRINCEN et al., 1994). Devido àcrescente interdependência econômica e ecológica,organizações internacionais e ONGs têm sido cruciaispara a integração de países em desenvolvimento aosistema mundial. No entanto, os interesses dasorganizações internacionais e das ONGs são,provavelmente, mais consistentes com a agenda dospaíses industrializados do que com a agenda dos paísesem desenvolvimento (MILLER, 1992).

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As dificuldades na implantação de políticas públicasambientais se encontram na complexidade doarcabouço jurídico e suas interfaces com outraspolíticas até na pouca uniformidade de conceitos naárea ambiental, nas incertezas da ciência quanto aosfenômenos naturais, na variedade das estruturasadministrativas e nas tradições de processoslegislativos distintos da agenda ambiental, o que acabaretardando sua concretização (ACSELRAD, 2005). Omodelo de descentralização das políticas sociaisaparece como estratégia inovadora para revigorar oEstado e minimizar a crise de gestão quanto àineficiência das políticas públicas, valorizando podereslocais e promovendo a participação dos cidadãos nagestão pública (COSTA, 2003). O resultado é o ganhode importância das relações de interdependênciaindividual e coletiva na construção dos processos queefetivam a governança. Tal interdependência geracooperação ou conflitos que se traduzem numa melhorou pior condição de vida para os atores afetados, apartir de normas de conduta estabelecidas, de regrasdo jogo definidas ou instituídas de maneira formal ouinformal, e de modelos de desenvolvimento deestratégias de ação de indivíduos e grupos.

Pode-se dizer que há, ainda, um longo caminho aser percorrido para a compreensão da contribuiçãoda natureza humana na complexidade das relaçõesinterpessoais, grupais, raciais, estatais, institucionais,não institucionais e sua contribuição para a governançamundial e a sobrevivência humana, influenciando,portanto, a governança ambiental e o alcance dodesenvolvimento sustentável. Os mecanismos decontrole ambiental, por parte dos governos, têm semostrado ineficientes devido a diversas causas, entreelas: fraquezas institucionais relativas às ingerênciaspolíticas, por vezes antagônicas com os mandatosinstitucionais; superposição ou indefinição decompetências; desarticulação entre as instituições eorganizações diversas, que atuam no uso e ocupaçãodo solo; e uso dos recursos naturais. São aindacomuns a carência de pessoal, insuficiência einadequação de infraestrutura e de recursosfinanceiros, que geram debilidades na estrutura dagovernança ambiental instituída, com fortes reflexosna degradação ambiental.

O uso de recursos naturais considerados depropriedade comum (como os hídricos ou algunspesqueiros, por exemplo), são geralmente reguladospor instituições formadas a partir da busca deconsensos que aperfeiçoem o acesso a todos osinteressados, reduzindo desequilíbrios ou injustiçascomo privilégios de uns e restrições a outros. Taisinstituições podem ser formais ou informais edependem do tipo de relacionamento entre os

interessados. No caso de uso de recursos comunssob a responsabilidade do Estado, é necessário queeste exerça uma ação gerenciadora e controladora dosusos e dos usuários.

A governança ambiental brasileira vem sofrendodiversas pressões de grupos conflitantes, em especialem relação ao comportamento dos atores sociais naconstrução de políticas ambientais no Brasil. Exemplossignificativos são os do processo de licenciamento datransposição do Rio São Francisco e das usinashidrelétricas no Rio Madeira, Santo Antônio e Jirau, e,mais recentemente, da Usina Nuclear de Angra III eusina hidrelétrica de Belo Monte. Podem-se observarposições contraditórias e conflitos de interesse entreórgãos governamentais, empresas privadas,organizações não governamentais, representações declasse e de grupos organizados da sociedade. Taisempreendimentos foram decididos e incluídos comometas prioritárias pelo governo federal com forte viésdesenvolvimentista, o que opõe as forças políticasdescompromissadas com o desenvolvimento nacionalaos representantes de movimentos sociais radicais,antagônicos aos interesses da sociedade e da Nação.

A política econômica influenciou fortemente agovernança ambiental, com o desenvolvimento deações relativas ao PAC gerando conflitos decompetência no licenciamento ambiental. Criou-se umasituação de acirrada disputa entre grupos econômicospara a obtenção dos contratos de prestação de serviços(principalmente na construção civil), aliada aoasseguramento, pela estrutura do Estado, dagovernabilidade. Essa situação levou, muitas vezes, àopressão de atores e grupos sociais atingidos pelasobras planejadas ou já em execução, mostrando asfragilidades ainda presentes no processo democráticoda tomada de decisão quanto ao desenvolvimentoeconômico do país.

A experiência dos comitês de bacias hidrográficasdemonstra a importância do exercício da participaçãocivil nesses fóruns, e sua manutenção como espaçosde um questionamento que não se realiza apenas daforma do processo decisório do Estado, mas, também,das relações entre Estado e sociedade civil, no campodas políticas públicas (JACOBI, 2006a). O conceitode descentralização determina que os órgãos eautoridades locais tenham poder de estabelecer regrase normas por conta própria, de maneira independente,mas não os exime do controle do Estado, visandogarantir o atendimento dos interesses locais dasociedade como um todo e não de grupos mais fortese mais organizados (SANTOS, 1997).

Além do Conama, vários conselhos estaduais emunicipais foram criados a partir dessa lei, propiciando

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a participação de diversos atores sociais na construçãodo processo de governança ambiental no Brasil. Apesardisso, as possibilidades de criação de novas estruturas,que utilizem estratégias de transição e que se inscrevamnum tecido sócio-institucional existente – que tem umalógica peculiar fundada na dispersão de esforços, nafragmentação e na descontinuidade - são certamentelimitadas (VIEIRA, 1998).

A institucionalização da Política Nacional de MeioAmbiente no Brasil tem buscado a incorporação deprincípios da democratização das políticas públicas,da participação social no processo de tomada dedecisão e da ação descentralizada do Estado. Age-sedentro dos princípios constitucionais e do arcabouçolegal que rege a ação das instituições brasileiras,seguindo a tendência mundial de reestruturação dopapel do Estado. A concepção da estrutura gerencialdo Sisnama adota a gestão integrada e participativa,sendo composta por diversos órgãos governamentaise não governamentais setores empresariais,representações de classe, entidades indígenas, entreoutras.

Apesar da existência de diversos conselhosambientais, muitos funcionam de modo instável comuma frágil inserção popular, com pouca competênciapara definir grandes temas ambientais nas arenas dediscussão e formulação de políticas públicas(RIBEIRO, 2006). Alguns fatores podem explicar afragmentação das ações das políticas ambientais. Entreeles, o tratamento distinto e separado dos recursos,meios e sistemas – ar, água, energia, solos, plantasetc. No contexto administrativo do Estado, essadivisão se expressa pela criação de diferentes agênciase instituições responsáveis por diferentes áreas/setores, de forma a tornar “gerenciável” suaadministração.

Tal concepção de sistema de gestão de políticademonstrou coerência com a tendência de se instituira gestão democrática e fortalecer as instituições sociaisem diversos níveis, encarando-os como atores ativosna formulação e na execução da Política Nacional doMeio Ambiente e servindo de exemplo para outraspolíticas públicas, principalmente quanto àconsolidação da governança ambiental e suacontribuição no estabelecimento da governançanacional. Houve, portanto, indução de processos quevisaram estabelecer a governabilidade, com foco nasreformas do setor público e no fortalecimento daparticipação (empowerment) da sociedade civil naspolíticas públicas. Envolveram-se temas como acapacitação institucional das diversas instituições degoverno e não governamentais, representativas dasociedade civil organizada e buscou-se a melhoria dacondição social, econômica e ambiental global,

enfatizando a necessidade de dar conta dos custossociais do ajuste estrutural e de reduzir a pobreza,conferindo grande prioridade à reestruturação dosserviços sociais, com o objetivo de incrementar aequidade e a eficiência.

VII. DISCUTINDO CONCEITOS, CRITÉRIOS EPRINCÍPIOS DA GOVERNANÇA AMBIENTAL.

A governança ambiental, entendida como processode intervenção no controle do uso dos recursos,encontra-se delineada como elemento norteador depolíticas públicas, desde a Grécia Antiga. A palavragoverno refere-se a atividades tomadas primariamenteou integralmente pelos Estados (particularmenteaquelas que operam no nível do Estado-Nação), paramanter a ordem pública e facilitar a ação coletiva.Governança refere-se à emergência de um novo estilode governo, no qual os limites entre o setor público eo privado e entre o nível nacional e internacional sefundem (JORDAN et al., 2003). O estudo degovernança estende-se a todas as perguntasrelacionadas à forma como um grupo de pessoasgoverna a si próprio e o meio em que vive. São,portanto, poucos os assuntos em todas as ciênciaspolíticas e de economia política que não se enquadramno domínio da governança (KEEFER, 2004).

A emergência do conceito de governança no iníciodos anos de 1990 marcou um ponto de inflexãobastante claro na trajetória recente do Banco Mundial,que representou um deslocamento de preocupações,de caráter mais técnico, ligadas às reformasburocráticas e ao gerenciamento de políticaeconômica, para temas mais abrangentes como alegitimidade e o pluralismo político. Em linhas gerais,a agenda de políticas do Banco Mundial deslocou-sedas reformas macroeconômicas para as reformas doEstado e da Administração Pública, objetivandopromover a “boa governança” e fortalecer a sociedadecivil (BORGES, 2003). O conceito de governança foidefinido pelo Banco Mundial como sendo “a maneirapela qual o poder é exercido na administração dosrecursos econômicos e sociais do país, com vistas aodesenvolvimento”, tendo estabelecido quatrodimensões-chave para a boa governança: administraçãodo setor público; quadro legal; participação e prestaçãode contas (accountability); e informação etransparência (WORLD BANK, 1992).

No arcabouço conceitual de governança, sãoencontradas diversas definições que vão desdedefinições genéricas a definições de governançaespecífica como a ambiental e a corporativa. AComissão sobre Governança Global das Nações Unidas(COMMISSION ON GLOBAL GOVERNANCE,1995) definiu “governança” como sendo a soma total

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dos vários modos como indivíduos e instituições,públicos e privados, administram seus negócioscomuns. Trata-se de um processo contínuo por meiodo qual interesses conflitantes ou diversos podem seracomodados e uma ação cooperativa estabelecida.Esse processo inclui instituições e regimes formaisinvestidos de poder para impor a observância dasregras, do mesmo modo que arranjos informais depessoas e instituições concordaram em estabelecer oupercebem ser de seu interesse. Essa definição sugeredois elementos centrais para a aceitação de um sistemade governança como justo e válido: a vontade ouaceitação pelos associados públicos e privados, de umaestrutura ampla em que gerenciem seus negócios; eum processo de negociação e equilíbrio de poder(HAUSELMAN & VALLEJO, 2005).

São oito as características da boa governança: aparticipação, o estado de direito, a transparência, aresponsabilidade, a orientação por consenso; aigualdade e a inclusividade; a efetividade e a eficiência;e o suporte à auditoria (DRUMMOND et al., 2006,p.1). A governança refere-se, então, a atividades degestão que dependem de objetivos comuns ecompartilhados, quase como um pacto tácito, e podeser conceituada como sendo o “arcabouço institucionalde regras, instituições, processos e comportamentosque afetam a maneira como os poderes são exercidosna esfera de políticas ou ações ligadas às relações dasociedade com o sistema ecológico” (CAVALCANTE,2004, p.1). Pode-se dizer, portanto, que a governançase foca no processo decisório e nos objetivos daspolíticas públicas e, em última instância, nadirecionalidade do modelo de desenvolvimentonacional. A governança pode ainda ser entendida comosendo um processo de estabilização da sociedade, faceaos conflitos internos e externos, a busca de insumospara sua sustentabilidade, assim como a construçãode objetivos e condutas para alcançá-la, por meio demecanismos formais e informais os quais definemcondutas determinadas, satisfaçam suas demandas erespondam às suas necessidades (ROSENAU, 2000).

O Relatório Perspectivas do Meio Ambiente Global(GEO-4), do PNUMA, define governança como sendo“a maneira na qual a sociedade exerce controle sobreos recursos. Isso denota os mecanismos por meiodos quais o controle sobre os recursos é definido e oacesso regulado”. Explica-se, ainda, que há governançapor meio do Estado, do mercado ou de grupos dasociedade civil e organizações locais, sendo exercidapor instituições, leis, sistemas de direito de propriedadee formas de organização social (UNEP, 2007). Agovernança ambiental pressupõe vontade política e umaconsciência (com a qual a vontade política deveenvolver-se) do papel de apoio à vida exercido pelos

recursos ecossistêmicos, de modo a incorporar atemática ambiental no seguinte conjunto heterogêneode atores políticos envolvidos: movimentos sociais,sindicatos, empresas privadas, organizaçõesambientais, cientistas, pesquisadores, grupos dasociedade civil, instituições governamentais, políticose outros (LITTLE, 2003).

Governança pode ser entendida ainda como “astradições e instituições nas quais a autoridade é exercidanum país”. Mais especificamente, este inclui: 1) oprocesso pelo qual os governos são selecionados,acompanhados e substituídos; 2) a capacidade dogoverno para formular e implementar efetivamentepolíticas sólidas; e 3) o respeito de cidadãos e doEstado, para as instituições as quais governam, e ainteração entre economia e sociedade (KAUFFMANN,KRAAY & MASTRUZZI, 2004).

Para desenvolver a governança, são apontados peloBanco Mundial e pelo Instituto Brasileiro deGovernança Corporativa os seguintes critérios:descentralização, participação, democracia,transparência, equidade, prestação de contas,guidelines (instruções e padronizações), matriz deresponsabilidade (quem cria, aprova, atualiza),estabelecimento de workflows (relações intra einterinstitucionais na execução de ações), um códigode conduta baseado confidencialidade, propriedade dasinformações, suporte a quem procurar em caso dedificuldades (INSTITUTO BRASILEIRO DEGOVERNANÇA CORPORATIVA – IBGC, 2007).

Com relação à base conceitual que envolve estadoe política pública, Diniz (1996, p. 12-13) descrevedois conceitos configuradores da ação estatal distintose complementares: “governabilidade” e “governança”.O primeiro é entendido como “as condições sistêmicasmais gerais sob as quais se dá o exercício do poderem uma dada sociedade”, tais como a forma degoverno, as relações entre os poderes, os sistemaspartidários, entre outros; o segundo, como acapacidade governativa em sentido mais amplo,“envolvendo a capacidade da ação estatal naimplantação das políticas e na consecução das metascoletivas”, incluindo “o conjunto dos mecanismos eprocedimentos para lidar com a dimensão participativae plural da sociedade” (idem).

Em situações extremas, o governo pode existirsem governança e vice-versa, distinguindo-se, dessemodo, as duas noções e apontando para o governocomo autoridade formal, o poder de polícia, a habilidadede levar a efeito políticas públicas, enquantogovernança volta-se para a gestão estabelecida porobjetivos comuns e compartilhada (CAMARGO,2003). É relevante a importância do capital social no

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manejo coletivo de recursos naturais e noestabelecimento de governança, com benefícios diretospara o desenvolvimento de comunidades locais epopulações tradicionais, sendo muito efetivo no manejointegrado de bacias hidrográficas, de unidades deconservação, de recursos pesqueiros, de vida silvestre,de manejo florestal, entre outros (PRETTY, 2003).

Na última década, a agenda de políticas do BancoMundial deslocou-se do ajuste estrutural e das reformasmacroeconômicas para reformas do setor público, comvistas à “boa governança” e ao “empowerment” dasociedade civil (BORGES, 2003). A governançaambiental exige a participação do Estado em seus trêsníveis de governo (federal, estadual e municipal),sociedade civil e setor privado, variando a importânciade cada um em função da escala de governança (TONIet al., 2006). Um sistema democrático tem duas facesque são guiadas por normas: o partidarismo (ouprocesso de representação) e a imparcialidade doprocesso de execução, sendo que tais fatores qualificama “boa governança” e a “qualidade” de instituiçõesgovernamentais, destacando a imparcialidade deinstituições governamentais que implementam políticasgovernamentais (DOBSON, 2000).

O conceito de governança provoca o processodecisório para que se torne algo legítimo e identificadocom os ideais de cooperação, solidariedade edemocracia que estão na gênese e organizações dessanatureza. Portanto, envolve noções como participação,parceria, aprendizagem coletiva, regulação e práticasde “bom governo” como orçamento participativo eações de desenvolvimento local e regional (MALO,2001). É um enorme desafio para a governançaambiental “lidar com o preconceito de raízes fincadasno inconsciente coletivo nacional, que forma uma visãopré-analítica e antiecológica, forjada em velhas práticasque ratificam a ideia de que ações de proteção ambientalsuscitam resistência sob a alegação de que o meioambiente é uma barreira ao desenvolvimento nacional”(CAVALCANTE, 2006, p.14), principalmente quandoesse preconceito emana de formuladores e gestoresde políticas públicas.

Segundo North (1990), instituições podem serdefinidas como sendo as regras que guiam as relaçõeshumanas, criam incentivos e diminuem possíveisincertezas oriundas do convívio social, sendoresponsáveis pela organização dos espaços realizadapelos grupos humanos, por meio de regras informaisque correspondem aos anseios e reais necessidadessociais daqueles que as estabelecem. Define-se aindaque a organização pode ser entendida como aagregação de indivíduos que possuem algumaidentidade comum e unem-se para alcançar

determinados objetivos, com estratégias e regras quevigoram na sociedade, articulando instituições eorganizações que se coordenam e determinam asrelações históricas da sociedade entre si e com osrecursos ambientais.

É preciso evidenciar a influência direta da teoriada escolha pública e sua visão sobre a democraciapluralista, que aponta a competição entre os gruposde pressão como a causadora de ineficiênciaseconômicas e da pressão de demandas particularesde grupos de interesse na agenda pública (OLSON,1999). Mediante a constatação das crises ambientais,sociais e econômicas acentuadas nos últimos anos,há necessidade de se rever o modelo dedesenvolvimento econômico norteado pela teoriaeconômica neoclássica, que tem levado à exaustãodos recursos naturais e a desequilíbrios fortes entrepaíses desenvolvidos e em desenvolvimento,caracterizando o eixo de desequilíbrio hemisféricoNorte-Sul, norteador de diversas agendas globaisatualmente.

Apesar da aplicação dos princípios de participaçãosocial, da descentralização do poder central e daconstrução de agendas locais de desenvolvimento,pode-se observar que sua aplicabilidade no contextodas realidades culturais e institucionais estabelecidasvem dando pouco resultado em processos dedescentralização política do poder e de tomada dedecisão, principalmente quando este é realizado de cimapara baixo ou sem uma capacitação prévia dos atoressociais envolvidos. Muitas vezes, o poder centralencontra dificuldade na articulação das esferas de podernacional, regional e local, na construção de agendasde desenvolvimento - a exemplo das Agendas 21 locais.Frey e Rousseng (2003), ao analisarem a contribuiçãoà governança ambiental dos municípios paranaensespelo processo de elaboração das Agendas 21 locais,demonstraram a importância de arranjos institucionaisdemocráticos, de uma participação diversificada eplural dos diferentes setores da cidade e docomprometimento efetivo dos governantes locais. Aexperiência brasileira mostra como o campo da gestãopública tem se caracterizado pela fragmentação dasfunções administrativas e das iniciativas de projetosou programas de “modernização” por setor,departamento, organização, processo etc., sem que,necessariamente, estabeleçam vinculação entre si,dificultando a percepção dos problemas tanto sob oprisma da complexidade quanto da sua dimensão(RIBEIRO, 2003).

O modelo de apropriação dos recursos ambientais,com base na propriedade privada e no direito de usoindividual, pode ser questionado por representar grande

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fragmentação dos ecossistemas e interferênciasprofundas nos serviços ambientais, apontando para anecessidade da gestão do território, onde os vínculosecológicos não se tornam objetos de contratos de trocae não entram nos cálculos decisórios dos atoreseconômicos (GODDARD, 1997). A baixa capacidadedas instituições públicas na organização da cooperaçãoentre as diversas atividades produtivas de um mesmoespaço apresenta-se também como fator importantede interferência em sinergias possíveis para a utilizaçãode recursos naturais, resultante da fragmentação esetorialização administrativas, e direcionamento parao desenvolvimento econômico dissociado da gestãoambiental (idem).

Os graves problemas ambientais verificadosatualmente no país, como as mudanças climáticas e aperda da biodiversidade e dos recursos hídricos, exigemcada vez mais a capacidade de resposta dos órgãosambientais, exigindo a governança ambiental necessáriapara propiciar o desenvolvimento sustentável. Aobrigação do Estado como premissa da açãoambientalista é apontada por Le Preste (2003), ao dizerque o Estado deve identificar e definir o problema eos meios de ação, dar prioridade aos problemasambientais na agenda pública e decidir sobre arepartição dos custos e arbitragens aceitáveis, a fimde obter a melhor qualidade do meio ambiente.

As mudanças institucionais visam garantir umespaço de negociação e articulação entre os diferentessegmentos dos grupos locais e os atores externos queafetam ou, potencialmente, podem afetar odesenvolvimento territorial. Tal articulação, em tese,permite que a população local participe e tenha papelde peso nas decisões que afetam o desenvolvimentosocioeconômico do seu território (TONI et al., 2006).A ineficiência burocrática, a busca de arrecadação e acorrupção são fatores que fortalecem o ceticismo nasinstituições públicas, duvidando que estas possam sercapazes de administrar os recursos com sabedoria oualocá-los equitativamente. Tais fatores podem afetarsobremaneira a capacidade institucional para agovernança ambiental e comprometer o alcance dosmandatos institucionais e legais definidos(ANDERSSON, 1991).

A participação de grupos de interesse naformulação de políticas pode gerar problemas para agovernança quando as organizações da sociedade civilnão são adequadamente representativas de seusmembros e os governos devem ter consciência dosinteresses que esses grupos defendem, assim comodos interesses que não representam (BORGES, 2003).As relações de interação institucional entre diferentesescalas para a gestão ambiental e os processos de

criação de estruturas formais e informais pelos atoressociais envolvidos apresentam relações positivas enegativas, unidirecionais e assimétricas, horizontais everticais, devido à natureza do recurso ambiental, dasculturas envolvidas, da complexidade da estruturapolítico-institucional e da abrangência geográfica dorecurso em questão (BERKES, 2001; YOUNG, 2001).

Pode-se perceber a complexidade dessas relações,ao longo do tempo, e os mecanismos de regulaçãoinstituídos, assim como as fraquezas e como estassão exploradas pelos mecanismos de mercado, porgrandes corporações e pela lógica do capital comoindutora do desenvolvimento local, regional e global,resultando, com raras exceções, na degradação dosrecursos naturais e na degradação socioeconômica deáreas sob exploração desses recursos (YOUNG, 2001;BERKES, 2001). A fraqueza dos mandatosinstitucionais e legais e o baixo nível de implementaçãodas políticas e leis ambientais, em que as soluçõespolíticas são pouco claras devido ao jogo de interessesdiversos e à pouca visibilidade dos resultadosalcançados, comprometem a governança ambiental (LEPRESTRE, 2003).

Segundo Ribot (2006) A sustentabilidade do manejode recursos naturais depende das tecnologiasdisponíveis, de preços e das instituições. A presençado Estado é forte quando há falhas de mercado e desuas externalidades. São crescentes as políticas dedevolução de responsabilidades aos usuários locais derecursos naturais, sendo que o sucesso depende dacapacidade local para a ação coletiva. O autor analisouos efeitos democratizantes da descentralizaçãodemocrática em países em desenvolvimento,fortemente praticada nos últimos 20 anos, que buscaa provisão de serviços por governos locais,desenvolvimento e manejo de recursos, fomentada porgovernantes, agências internacionais dedesenvolvimento e outras instituições que transferempoder a instituições locais, empresas privadas eorganizações não governamentais.

Essa situação é similar ao que vem acontecendono Brasil, com uma participação crescente derepresentações de classe, ONGs, conselhos locais,grupos de interesse, entre outros, que vêm assumindopoderes e responsabilidades governamentais emprocessos de descentralização, a exemplo dos comitêsde bacia hidrográfica, populações de reservasextrativistas, usuários de recursos em florestasnacionais, comunidades de pescadores, entre outros.As mobilizações sociais e o envolvimento crescentedas ONGs ambientalistas vêm concentrando esforçospara a participação efetiva nos processos de tomadade decisão, fazendo-se presentes no interior do aparato

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político-administrativo, em seus diversos níveis deatuação, mas divergindo muito entre si quanto àsproposições de sociabilidade e construção deidentidades, refletindo na conformação da estruturade governança em suas áreas de atuação (FERREIRA,1996).

O destino da sociedade fica predeterminado poruma elite de planejadores que ocupam posiçõesestratégicas na formulação de políticas, naadministração governamental e no setor privado, eafirma que a boa governança implica necessariamentena discussão ampla de iniciativas de políticascausadoras de impactos consideráveis com aspopulações afetadas ou partes interessadas(CAVALCANTE, 2006). A transferência de poder doespaço central (nacional) para os espaços locais, amudança do padrão de relacionamento de instânciasdecisórias situadas nos diversos espaços territoriais,e a integração institucional devem ser exercidasplenamente, considerando as diferentes expressões doconhecimento ecológico tradicional e doconhecimento local como fontes suplementares deconhecimento, sistemas de valores e tecnologiaspassíveis de serem utilizadas na pesquisainterdisciplinar do eco desenvolvimento (SACHS,1993).

Apesar do crescente interesse na governançadescentralizada, os governos locais em todo o mundotêm recebido pouca atenção sistemática (SELLERS& LIDSTRÖM, 2007). Essa situação é notória nagestão ambiental municipal brasileira, em que pesemos esforços da Anamma, do Instituto Brasileiro deAdministração Municipal, do Ministério do MeioAmbiente, do Ministério das Cidades, entre outrasinstituições. O estabelecimento de políticas públicaslegitimadas apenas pelo sistema de representatividadee fundadas na autoridade formal demonstra-se ineficazpara a solução dos problemas ambientais (LERNER,2006). A política econômica brasileira reproduz adinâmica econômica capitalista e globalizada,imediatista e financeiramente predatória em termos deprodução, que passa a ser a principal matriz orientadorae norteadora do crescimento econômico do país, que,com base nas políticas de curto prazo, dá respostasmais rápidas e eficientes na dinâmica financeira global(SOUZA, 2004). Pode-se dizer que esse quadro resultano enfraquecimento das políticas públicas e sociais,não fugindo a essa regra a Política Nacional do MeioAmbiente.

O fomento da governança ambiental a um nívelmais concreto implica nas seguintes condições: asensibilidade da sociedade e a capacidade de definiruma agenda, a autonomia do processo de investigação

e de quaisquer grupos de investigação, a organizaçãodo movimento antipoluição, um sistema concebido deforma adequada de indenização, e várias medidas queajudem a combater os problemas sociais maissignificativos (FUNABASHI, 2006).

Agências internacionais sustentam que os paísesem desenvolvimento podem impulsionar taxas decrescimento econômico, por meio da introdução demedidas de “boa governança”, mas que, geralmente,subestimam o tempo e o esforço político necessáriopara alterar a governança instituída e sobreestimamas repercussões dos impactos econômicos(GOLDSMITH, 2007). Poucas são as ações efetivadasaté o momento com o propósito de resolver a questãoda fragmentação das políticas, sejam ambientais, sejamde outra natureza. Ao contrário, as diferentes leis,agências, planos e programas, e outros instrumentoscriados durante esse período, apenas contribuírampara aumentar essa segmentação (CÂMARA &CARVALHO, 2002). Pode-se dizer ainda que a situaçãoatual da governança ambiental, fortemente centradaem instituições governamentais, encontra-secomprometida (em termos de credibilidade, pelasociedade) em função da ineficiência burocrática, dabusca de arrecadação para a manutenção do sistemagovernamental e do fortalecimento do sistema decomando e controle, e em função da corrupção, fatoresque fortalecem o ceticismo nas instituições públicas(ANDERSSON, 1991).

A governança ambiental no Brasil apresentaelementos típicos das definições mais comuns degovernança, entre eles a descentralização, ademocracia e a participação, instruções epadronizações, apesar da pouca efetividade do seualcance pleno. Transparência, equidade, prestação decontas, matriz de responsabilidades, estabelecimentode fluxos de trabalho (workflows) interinstitucionaisna execução de ações, código de conduta e suporteficam em planos secundários no processo de gestão,comprometendo o alcance pleno da governançaambiental.

VIII. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

A governança ambiental no Brasil vem sendoestabelecida, desde o Descobrimento, por regras,normas e instituições que regulamentam o acesso euso dos recursos naturais, tendo sido mais marcadocomo política pública a partir dos anos de 1930, como estabelecimento de diretrizes, princípios e regraspara o uso de recursos hídricos, minerais e florestas,o que acentuou o processo gerencial de comando econtrole com penalidades, taxas e impostos que poucocontribuíram para seu uso racional. A concentraçãode poder na égide de instituições públicas criadas

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especificamente para tais fins resultou em políticasespecíficas e desarticuladas do contexto ambientalintegrado e ecossistêmico

A evolução da governança sobre o uso dos recursosnaturais no Brasil moldou-se por uma cultura utilitaristae descompromissada com a sustentabilidade comoestratégia de produção em longo prazo, aliada a baixosníveis de investimento em pesquisa, ciência etecnologia em meios de produção e de apropriaçãodos recursos naturais. Como resultado desse processohouve perdas do capital natural em larga escala, assimcomo do potencial para o desenvolvimentosustentável, por causa da extinção de espécies, perdade solo e degradação de ambientes naturais.

As fases de expansão e contração do Estado,períodos de concentração e descentralização, deautoritarismo e de democracia, parecem terinfluenciado pouco no ritmo de destruição da natureza,mostrando que o crescimento econômico sempredominou a condução da formulação de políticaspúblicas, assim como influenciou o comportamentoda sociedade brasileira quanto ao seu padrão deconsumo e de relação com a natureza. A governançaambiental no Brasil se baseia na legislação ambiental,no sistema de licenciamento, na atuação do MinistérioPúblico, nos conselhos e comitês instituídos e naslideranças políticas e suas influências no processodecisório, nas atuações das organizações nãogovernamentais e na atitude do cidadão comoconsumidor sustentável.

O processo de governança ambiental tem buscadoalcançar os postulados das teorias sociais de açãocoletiva, do uso de recursos de propriedade comum,da definição de agendas locais de desenvolvimentosustentável e do fortalecimento das instituições sociais,fortalecendo o papel da Política Nacional de MeioAmbiente na consolidação do Estado moderno e dademocracia. Democracia e participação, eficácia nagestão e utilização adequada dos mecanismos demercado são processos fundamentais para odesenvolvimento social e para o crescimentoeconômico, e constituem critérios importantes para oalcance da boa governança, incluída nesta a governançaambiental.

A reforma do Estado enfrenta o grande desafio dabusca do equilíbrio entre a ficção da igualdade daspartes que compõem o sistema federativo e a realidadedas desigualdades sociais, econômicas, culturais eambientais que caracterizam as diferentes regiões doPaís, suas populações, seus processos históricos deuso e ocupação do território e dos recursos naturais,levando à definição de padrões distintos de tamanho,centralidade, composição e estrutura do Estado e sua

distribuição espacial. Tais especificidades de contextosgeopolíticos e socioeconômicos levamnecessariamente à conformação de estruturasdiferenciadas de governança ambiental.

Há necessidade de se compreender asambiguidades dos processos econômicos e sociais nodesenvolvimento das políticas públicas no Brasil, umavez que a gestão ambiental requer mudanças de práticase atitudes em busca da sustentabilidade, quequestionem o modelo atual de desenvolvimento aindagerador de externalidades ambientais, sociais eeconômicas e refletem problemas e dificuldades,gerando conflitos quanto ao uso, apropriação e gestãodos recursos naturais. Tal visão, que parece nortear alinha-mestra da formulação de políticas públicas doatual governo, reproduz tais práticas ao definir comoprograma prioritário um Plano de Aceleração doCrescimento que visa pôr em prática o slogan“Espetáculo do Crescimento” como força-motriz paraa mobilização social na construção de pactos para asua viabilização.

Essa tônica tem se reproduzido continuamente nosprogramas e metas governamentais desde oDescobrimento com respaldo social, em que pesehaver resistências de grupos sociais organizados quepercebem outros caminhos para o Brasil e tentammostrá-los, insistentemente. Tais grupos agemconforme a afirmação de Cavalcante (2006), queressalta que considerações de curto prazo determinamo que será empreendido, independentemente dasconexões entre decisões econômicas e suasconsequências e possibilidades ambientais,comprometendo a efetividade da governançaambiental.

A governança ambiental, apesar de já bemconsolidada no Brasil, ainda carece de apoio naconstituição de processos de gestão ambiental, nosseus aspectos legais, institucionais, de capacitaçãoinstitucional, de representatividade dos atores sociaise de interface com as demais políticas públicas. Acompreensão da instituição da governança ambientalpode contribuir na análise da complexidade dasinterações entre o governo, setor privado, terceiro setore a sociedade, e suas relações com o meio ambiente,buscando identificar o contexto e as razões históricasda sua conformação.

Torna-se uma necessidade, para a melhoria dagovernança ambiental, o conhecimento maisaprofundado da natureza das relações institucionais esocioculturais envolvidas no uso de recursos naturaispara um melhor dimensionamento das causas dosinsucessos ou fracassos, na tentativa de se alcançar odesenvolvimento sustentável. O Brasil do terceiro

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milênio parece não ter conseguido, ainda, libertar-sedas amarras e alicerces colonialistas de políticaspúblicas utilitaristas e predatórias do meio ambiente,

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ENVIRONMENTAL GOVERNANCE IN BRAZIL: ECHOES FROM THE PAST

João Batista Drummond Câmara

This article deals with an analysis of government action to the control of the use of natural resources in Brazil,since its discovery in 1500. Aimed at understanding the process of formulation and implementation ofenvironmental policies, considering the evolution of concepts, rules and institutions from the colonial period tothe present day, featuring the historical bases, institutional and legal issues that have shaped the current Brazilianenvironmental governance. The survey was conducted by consulting references and government documentswith different data and information. It can be observed that throughout the history of the country, governmentaction focused on the actions of command and control, with rules and institutions for specific natural resources,with little or no integration with other policies and management processes of natural resource use situationchanged significantly after the enactment of Law No. 6.938/81, under the National Environmental Policy whenthere was correspondence of the evolution of environmental management in Brazil with the concepts, principles,guidelines and criteria for environmental governance and its results. Despite advances towards the criteria ofreform and modernization of the state as decentralization, participation, democratization, managerial capacity,efficiency and effectiveness, the relationship between society, government and the private sector with naturestill reflects a colonial utilitarian, immediate and unsustainable use of natural resources, coupled with problemsof implementation of rules and regulations, causing environmental degradation and jeopardizing sustainabledevelopment. Indicate the need to evaluate more critically the scope of the National Environmental Policy dueto continued loss of environmental resources and services and the high standard of consumer society on a nonsustainable base, requiring changes in attitudes of citizens regarding the use and protection resources andenvironmental services. The results achieved contribute to the discussion of the historical relationship of theuse and occupation of the territory and its consequences for sustainability.

KEYWORDS: Environmental Governance; Environmental Policy; Descentralisation; Modernizationof the State.

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