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Trabalho de alunos da UNIC - Garimpo e Meio Ambiente.

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GARIMPO E MEIO AMBIENTE:

UNIVERSIDADE DE CUIAB CAMPUS BARO10 TERMO DIREITO NOTURNODIREITO AMBIENTAL

GARIMPO E DEVASTAO AMBIENTAL

CUIAB-MTOUTUBRO/2006.

UNIVERSIDADE DE CUIAB CAMPUS BARO10 TERMO DIREITO NOTURNODIREITO AMBIENTAL

Acadmicos:

ALDINIA DIAS DE MEDEIROS

DULCEMAR GALDINO DELGADO

LCIA MARIA ROSA DE SOUZA

LUZIA SILVA

MARCELO AUGUSTO MONTEIRO DA SILVA.

Professora: Marli Deon.

CUIAB-MT

OUTUBRO/2006.

GARIMPO E DEVASTAO AMBIENTAL

1-CONCEITO DE GARIMPO

Na linguagem de minerao, aplicado para indicar o local ou stio em que se encontram minas de diamantes ou onde se explora a extrao ou cata de pedras preciosas. Extensivamente, serve para designar o lugar ou povoado em que habitam ou moram os garimpeiros.

H, entre os garimpeiros, nos garimpos, linguajar dificilmente compreendida por estranhos. Para as coisas mais simples e fatos comuns, empregam expresses interessantes, instituindo vocabulrio original.

1.1 - CONSTITUIO O QUE NORMATIZA

A atual Constituio favorece a organizao da atividade garimpeira em cooperativas, levado em conta a proteo do meio ambiente e a promoo econmico-social dos garimpeiros (art. 174, 3).

Tais cooperativas tero prioridade na autorizao ou concesso para pesquisa e lavra dos recursos e jazidas de minerais garimpveis, nas reas respectivas de atuao (art.174, 4).

2- DEFINIES/CONCEITOS BSICOS: Garimpagem/Faiscao/Cata/Garimpo e Garimpeiros.

2.1- Garimpagem.Derivado de garimpo (brasileirismo), entende-se na linguagem da minas o trabalho rudimentar de pesquisa e extrao de pedras preciosas nos lveos dos rios ou margens de cursos naturais de guas e sus terraos, bem como nos depsitos secundrios de chapadas, vertentes e alto dos morros

De acordo com inciso I do art. 70 (revogado) do Decreto Lei 227 de 28/02/67 (Cdigo de Minerao), considerava-se Garimpagem o trabalho individual de quem utilize instrumentos rudimentares, aparelhos manuais ou mquinas simples e portteis na extrao de pedras preciosas, semi-preciosas e minerais metlicos ou no metlicos, valiosos em depsitos de eluvio nos lveos de cursos dgua ou nas margens reservadas, bem como nos depsitos secundrios ou chapadas (grupiaras), vertentes e altos de morros; depsitos esses genericamente denominados garimpos.

A garimpagem pode ser exercida livremente nos rios pblicos e nos terrenos devolutos.

Nas terras de propriedade particular ou arrendadas, somente permitida com autorizao dos respectivos proprietrio e arrendatrio.

2.2 - Faiscao

No inciso II do referido artigo, faiscao corresponde ao trabalho individual de quem utilize instrumentos rudimentares, aparelhos manuais ou mquinas simples e portteis, na extrao de metais nobres nativos em depsitos de eluvio ou aluvio, fluviais ou marinhos, depsitos esses genericamente denominados Faisqueiras.

2.3 - Cata

A cata, segundo o inciso III do mesmo artigo, considerada um trabalho individual de quem faa, por processos equiparveis aos de garimpagem e faiscao na parte decomposta dos afloramentos dos files e veeiros teis, sem emprego de explosivos, as apure por processos rudimentares.

2.4 - Garimpeiros

J o artigo 71define a figura dos garimpeiros, enunciando que ao trabalhador que extrai substncias teis, por processo rudimentar e individual de minerao, garimpagem, faiscao ou cata, denomina-se garimpeiros.

3- TIPOS DE GARIMPOS E RESERVAS GARIMPEIRAS

3.1 Quanto ao Mineral Garimpado

A regulamentao da Lei 7805/89 de 20/06/1989, feita atravs do Decreto 9.812 de 04/01/1990, define no artigo 10 os tipos de minerais garimpveis. Estes minerais so os seguintes: ouro, diamante, cassiterita, columbita, tantalita, wolframita nas formas: aluvionar, eluvionar e coluvial, scheelita, rutilo, quartzo, berilo, muscovita, espodumnio, lepidolita, feldspato, mica, demais gemas e outros, em tipos de ocorrncias que vieram a ser indicadas a critrio do DNPM.

O termo demais gemas bastante abrangente, incluindo a::

As preciosas esmeraldas, rubi, safira.

Alm desses minerais, conhecem-se tambm garimpos de bauxita, caldasito, caulim, pedras para construo civil, ambligonita, morganita, sendo que at minerais radiativos (uranotorianita) j foram encontrados por garimpeiros.

O termo outros abre a possibilidade de garimpagem de qualquer mineral que o DNPM tem procurado regulamentar as atividades e reas de garimpeiras como forma de diminuir os conflitos e problemas pessoais de estabelecer controles e minimizar os problemas ecolgicos.

4-LEGISLAO DE DIREITO AMBIENTAL MINERAO

CONSTITUIO FEDERAL Art.174, 3, 4 e Art.176..As jazidas, em lavra ou no, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidrulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de explorao ou aproveitamento, e pertencem Unio, garantida ao concessionrio a propriedade da lavra.

Decreto-Lei 227, de 28 de fevereiro de 1967 D nova redao ao Decreto-lei 1.985, de 29 de janeiro de 1940 (Cdigo de Minas). Cdigo de Minerao Art. 1 Compete Unio administrar os recursos minerais, a indstria de produo mineral e a distribuio, o comrcio e o consumo de produtos minerais.

Lei 6.567, de 24 de setembro de 1978. Dispe sobre regime especial para explorao e o aproveitamento das substncias minerais que especifica e d outras providncias.

Lei 7.886, de 20 de Novembro de 1989. Regulamenta o art. 43 do Ato das Disposies Constitucionais Transitrias e d outras providncias.

Decreto 3.358, de 2 de fevereiro de 2000. Regulamenta o disposto na Lei 9.827, de 27 de agosto de 1999, que acrescenta o pargrafo nico ao art. 2 do Decreto lei 227, de 28 de fevereiro de 1967, com a redao dada pela Lei 9.314, de 14 de novembro de 1996.

5- ESTRUTURA LEGAL ROTEIRO PARA LEGALIZAO

5.1 O primeiro documento para legalizao de qualquer empreendimento a Inscrio no CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoas Jurdicas) do Ministrio da Fazenda. Esse documento pode ser obtido inclusive antes do incio das obras civis do prdio da empresa, para lanamento de todas despesas e encargos da construo (inclusive o INSS). Essa inscrio hoje feita diretamente pela Interne, mas a recomendao para que sempre seja feita por um escritrio profissional de contabilidade.

5.2 As inscries Municipais (ISS) e no INSS podem ser feitas concomitantemente. Uma visita Prefeitura do Municpio de Cuiab essencial para a verificao das posturas locais e particulares. Freqentemente um Escritrio de Contabilidade que tenha experincia prvia no assunto ter facilidade para encaminhar toda a documentao necessria.

5.3 A Inscrio Estadual ser necessria quando a empresa pretender explorar servios de vendas de minerais e outras atividades comerciais.

5.4 A legalizao da empresa a nvel municipal vai exigir o habite-se da obra, que s pode ser obtido mediante a apresentao das certides negativas de dbitos fiscais (CND) inclusive junto ao INSS.

5.5 Tambm sero exigidos o Alvar do Corpo de Bombeiros e o atendimento das exigncias do Ministrio do Trabalho quanto a riscos de insalubridade para prevenir possveis reclamaes trabalhistas. A Prefeitura Municipal o rgo em condies de oferecer os detalhes para encaminhamento.

5.6 O registro legal dos funcionrios pode ser feito diretamente ou eventualmente atravs de uma Cooperativa de Trabalho (quando existe localmente).

O credenciamento do empreendimento inclusive a licena ambiental regulamentado por normas especficas e pode ser feito atravs de consulta direto aos rgos, tais como:

SEMA Secretaria Estadual do Meio Ambiente;

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente;

DNPM Departamento Nacional de Produo Mineral;

Cooperativas e Sindicatos de Mineradores.

6- OS RECURSOS MINERAIS DO ESTADO DE MATO GROSSO

No pode ser desprezada a abundncia dos recursos minerais existentes e identificados no Estado de Mato Grosso.

A explorao dos recursos minerais, como atividade organizada, bsica economia, geradora de bens primrios e d oportunidade interiorizao do desenvolvimento.

Mato Grosso tornou-se, nos ltimos anos, um dos principais produtores de ouro e diamantes. Pode-se afirmar, com base no nvel de conhecimento atual e das ocorrncias minerais cadastradas, que o Estado apresenta grande diversidade de minerais capazes de, com conhecimento adequado , dar sustentabilidade a um parque mnero-industrial significativo. Tambm importante observar que as ocorrncias minerais distribuem-se em todo territrio estadual.

As jazidas de areia, argilas, cascalho e calcrio, para o uso na construo civil e para a indstria da cermica, distribuem-se em vrios pontos do territrio, permitindo seu aproveitamento em escala industrial.

So tambm detectados ocorrncias de minerais estratgicos , que podero se constituir em elementos bsicos para o desenvolvimento. Assim, pode-se referir ao cobre, chumbo, zinco e pedras ornamentais.

7- CENRIO OU AMBIENTE DO GARIMPO E GARIMPEIRO NA SOCIEDADE BRASILEIRA CONTEMPORNEA

Nos ltimos anos e, principalmente, meses, garimpo e garimpeiros tm sido presenas constantes nas manchetes dos jornais. Esta recente visibilidade, contudo, no est associada aos mesmos aspectos que fizeram dos garimpeiros do nosso primeiro ciclo minerrio um heri nacional: a riqueza do ouro e a conquista das fronteiras polticas da nao. Muito pelo contrrio: garimpo e garimpeiro aparecem hoje, no nosso imaginrio, como agentes de poluio mercurial, destruio de sociedades indgenas e vrias outras formas de enfrentamento. De personagens de livros didticos passaram a viles da sociedade brasileira contempornea. No desempenho deste papel inseriram-se, no nosso mapa mental, apenas, atravs de eixos sintagmticos negativos.

8- ATIVIDADE ECONMICA DO GARIMPO E O GARIMPEIRO COMO AGENTE ECONMICO

Como atividade e agente econmico, garimpo e garimpeiro sempre se fizeram presentes, alis talvez como uma das ocupaes mais antigas do Brasil. Mas a existncia de ambos, depois da fase de esplendor do sculo XVIII, ficou subjacente a outras atividades econmicas de maior importncia para a nao. Permaneceram vivos no nosso mapa mental como contedo de livro didtico, como histria, e no como matria viva atravs da qual se fazia a sociedade brasileira. Quando ressurgiram no imaginrio nacional, no fim da dcada de 1970, encontraram no mais um Brasil por fazer e desbravar. Garimpo e garimpeiros no eram mais sinnimos de assentamento, de civilizao, de nao em movimento. Defrontaram-se com um pas j feito e em busca de uma nova identidade. A experincia histrica do passado no encontrou mais legitimidade no presente, e a narrativa de sua existncia atual est sendo feita dentro de uma nova tradio - a modernidade onde no parece haver lugar para uma atividade e um agente econmico com as caractersticas que lhes so atribudas.

Hoje, no interior do campo da explorao dos recursos minerais da nao, fala-se sobre garimpo e garimpeiros por oposio explcita e exclusiva s sociedades indgenas, ao meio ambiente e s empresas de minerao. Independentes desses interlocutores eles no possuem qualquer legitimidade ou identidade positiva. Nesse contexto, a atividade garimpeira poderia ser considerada na contramo da histria. O que ela tem para oferecer, no , no momento, considerado suficientemente valioso em relao ao que ela tem para tirar ou destruir.

Silenciosos no interior das matas, os garimpeiros foram trazidos luz por conjuntos discursivos, que viram neles a negao do Brasil novo que se quer construir; do pas moderno e eficiente que se almeja, pois so primitivos, desorganizados e poluidores; do pas justo e igualitrio, pois so produtos de estruturas econmicas perversas. Garimpo e garimpeiros foram, assim, instaurados como opositores das linhas mestras que definem tudo e todos na busca de uma nova identidade para o pas: o meio ambiente bem-cuidado, as sociedades indgenas preservadas, a grande empresa eficiente e no-espoliadora, e as relaes de trabalho humanas e bem-remuneradas. Tornaram-se o nosso outro complementar que, alm de nos permitir tomar conscincia do que somos, sinaliza para tudo o que no queremos ser e ter.

Do ponto de vista objetivo, o garimpo no precisa ser o nosso outro complementar. Outras atividades esto tambm, concretamente, fora desta nova imagem do que se deseja para a nao. O garimpo no precisa ser aquele que permite que nos recriemos como eficientes cuidadosos com o meio ambiente e generosos com outras formas de vida social existentes no nosso interior. Se, por um lado, garimpo e garimpeiros no precisam ser os interlocutores privilegiados desse novo modelo de sociedade que quer se criar, por outro lado difcil se pensarem algum objeto to perfeito para esse papel. Garimpo e garimpeiros aglutinam todos os conjuntos de oposies explosivas da sociedade brasileira do momento, numa apresentao formal ainda mais dramtica. Temos, ento, garimpo versus meio ambiente, sociedades indgenas, condies de trabalho precrias, eficincia, produtividade, primitivismo, violncia, doena, misria, o dilema do preo a pagar pelo desenvolvimento etc.: todas essas oposies inseridas num pano de crateras lunares, corpos boiando nos rios amaznicos, rios vermelhos de mercrio, ndios morrendo de inanio, populaes ribeirinhas contaminadas, pistoleiros e prostitutas lado a lado com populaes inofensivas.

8- GARIMPO E MEIO AMBIENTE

Partindo-se dessa tica, o enfrentamento representacional que envolve garimpo e meio ambiente exemplar. Atravs dele possvel mapear a penetrao, a importncia e o significado da questo ambiental no seio da sociedade brasileira. O aparecimento e aprofundamento de uma conscincia ecolgica no Brasil representam uma tendncia indita e de importncia fundamental na nossa cultura e pensamento poltico. Nos ltimos dois anos ela foi elevada a um nvel de visibilidade cultural e influncia poltica impensado h apenas alguns anos, legitimando novos interlocutores, reforando o poder de alguns j existentes e excluindo outros. A mudana de discurso das lideranas garimpeiras, ao longo do tempo, em relao ao uso do mercrio e aos danos causados ao meio ambiente ilustram no s a disseminao de certos conhecimentos tcnicos, mas tambm o poder do ecologismo de delimitar espaos, fsicos e simblicos, para todas as atividades e grupos no cenrio poltico atual. Por outro lado, a falncia do modelo socialista, expressa no esfacelamento poltico do Leste europeu deitou por tema a nica alternativa apresentada ao sistema capitalista, deixando um vcuo filosfico que abriu caminho para o aprofundamento da questo ecolgica, principalmente num pas como o Brasil, dividido por imensas diferenas materiais, e que no pode mais fazer da via socialista uma sada politicamente competitiva.

Neste sentido, os enfrentamentos nascidos dos conflitos entre interesses regionais, na busca de crescimento econmico, e os nacionais, voltados para a construo de uma identidade de nao moderna, que enxerga no engajamento causa ecolgica um sinal diacrtico desse seu objetivo, so ilustrativos desses dilemas. E, finalmente, o novo significado atribudo pelo movimento ecolgico a determinadas formas de natureza sinaliza para mudanas importantes no mbito da tica, da poltica e da teologia, que apenas se insinuam no nosso mapa mental, mas que possuem implicaes importantes para urna nova forma de pensar as relaes entre homem/natureza e a gesto dos recursos naturais da nao.

Entretanto, na fase crucial da contestao da garimpagem aurfera na Amaznia, esse tipo de negativa enftica e gesto teatral poderia surtir efeito, principalmente quando acompanhado de uma estratgia de ridicularizar o discurso ambientalista e os seus agentes, identificando estes ltimos com uma problemtica europia, de pas do primeiro mundo:

(...) O mercrio que ns usamos inerte: o mesmo que tem no dente, o mesmo que as pessoas antigamente bebiam para curar n nas tripas: entra e sai do organismo. No tem nada a ver com o mercrio do Japo ou com aquele que jogado na baa de Todos os Santos. No contamina. Mesmo o garimpeiro, que inala o mercrio durante a queima, no se envenena: o que faz mal so os cogulos na corrente sangnea (...). Pode ser que a chuva e o sistema de drenagem do solo acabem levando o mercrio novamente para os rios. Vamos medir o ndice de mercrio. E mais: desafio algum a mostrar uma pessoa, uma nica pessoa contaminada por esse mercrio na Amaznia (...). Como no se pode fazer nada contra um sujeito que est buscando um jeito de ganhar mais, vai l e diz que est poluindo o rio e fecha. Os meninos da ecologia no perceberam ainda que esto servindo de massa de manobra .

9- CONFLITOS E CRISES ENVOLVENDO POLUIO E DEGRADAO AMBIENTAIS.

Na relao entre garimpo e o meio ambiente, certo que o garimpo, como qualquer empreendimento mineral, constitui-se em atividade expressivamente transformadora do meio em que atua, podendo torna-se fonte de degradao ambientais (FARID 1992) essa poluio e degradao vem ocorrendo devido a produo rudimentar e desordenada desse tipo de atividade cujo o efeito vem sendo mais sentido nas regies dos garimpos da Amaznia legal.

Os prejuzos estende-se por todos os seguimentos do meio ambiente: solo, gua, ar, flora e fauna.

O tema tem alvo de preocupao dos rgos governamentais tendo-se desenvolvidos vrios projetos na rea tais como: Programa de Monitoramento Ambiental das reas Garimpadas na Amaznia Legal (DNPM), Programa Desenvolvimento de Tecnologia Ambiental (CETEM) Programa de Controle Ambiental da Garimpagem no Rio Tapajs (Governo do Par)

Esses programas, embora com dados coletada em regies limitadas e por tempo determinado, possibilitam uma viso abrangente da realidade das regies garimpeiras.

A eroso do solo ocorre nos baixes, onde a cobertura do solo, com a altura de at 20metros, decapeada para se atingir o cascalho mineralizado.

Onde o decapeamente no se mostra vantajoso (caso de alguma garimpos de gemas), so feitos poos e tneis que, aps a extrao do material desejado, so abandonados e no aterrados.

Em locais com morro, caso de serra pelada, os mesmos so totalmente divididos em barranco e desmontados at o nvel do terreno, iniciando a partir dali uma cava.

Obviamente, o nvel de destruio de solo em sitio de garimpagem relativamente baixo, porem concorre com eroso e a contaminao por mercrio que atinge ao solo e cursos dgua. Esse processo tem inicio atravs de seu manuseio inadequado e, principalmente, durante a queima da amlgama para se apurar o ouro, prtica corriqueira nos garimpos brasileiros. Durante a queima, a instalao de mercrio gasoso pode provocar srios danos ao organismo, atingindo principalmente rgos do aparelho circulatrio e sistema nervoso, culminando com a morte.

O mercrio, quando volatizado, pode se dispersar facilmente na atmosfera, distanciando do ponto de origem. Regiando com outros gases em condensao, precipita-se na superfcie terrestre, sendo capaz de reagir e formar inmeras substncias qumicas.

10- RESPONSABILIDADE AMBIENTAL DO GARIMPEIRO

O que queremos conscientizar o garimpeiro de sua responsabilidade com a natureza. Ou o garimpeiro se enquadra ou vai perder o apoio da prpria sociedade (...) necessrio formao de pequenas empresas de minerao para a explorao de ouro em Roraima, evitando a degradao do homem e da natureza (...) preciso cadastrar balsas e homens e impedir que as conseqncias dessa explorao indiscriminada venha provocar o fechamento do garimpo

(J. Altino Machado, Jornal do Brasil, 8 ago. 1989, p. 4).

Mas a questo ambiental, como discurso e prtica, no est reais no garimpo apenas como problema que pode inviabilizar a sua existncia e no legitimaras suas reivindicaes ao direito de explorao dos recursos minerais do pas. Est, tambm, como um objeto de denncia e um veculo concreto para a introduo de novas formas de produo de ouro, que no agridam tanto o meio ambiente e que funcionem como legitimadoras do garimpo no interior dessa nova ordem.

Na realidade assistimos hoje, no interior da comunidade garimpeira, a uma competio acirrada entre os seus membros com maior visibilidade na cena nacional para determinar quem efetivamente est mais comprometido com a questo ambiental. Lderes garimpeiros, com os mais diferentes posicionamentos polticos e legitimidade no interior da comunidade, preocupam-se em denunciar o estado de alguns rios da Amaznia, chamando a ateno para os efeitos cumulativos que o mercrio neles jogado poder acarretar no futuro. Outros atuam politicamente no PV e terceiros freqentam reunies ecolgicas, fazendo mea culpa em pblico e solicitando ajuda tcnica para minorar os problemas da poluio mercurial. O controle do saber de tudo o que ocorre no meio ambiente funciona hoje, no garimpo, como uma bssola para as aes e estratgias futuras dessa comunidade. Em decorrncia disso, os garimpeiros vm realizando mudanas e tentando incorporar novas tecnologias ao seu processo produtivo, bem como angariar apoio no interior da comunidade cientfica. Alis, ambos os grupos, garimpeiros e ambientalistas, reconhecem que a luta pela verdade sobre a melhor forma de explorao dos recursos minerais da nao travada tendo como base o que a cincia diz sobre as diferentes modalidades possveis. Tanto garimpeiros quanto

ambientalistas percebem que no tipo de sociedade em que vivemos o veredicto cientfico est entre os mais poderosos que existem. Ele confere ou tira legitimidade (Bourdieu,1976).

Portanto, a comunidade cientfica acionada por ambos os lados, e a sua produo esgrimida como trunfos estratgicos para provar ou no os diferentes pontos de vista de cada um (Pesquisa, 1988). Entretanto, todos os esforos garimpeiros para se tornarem ambientalmente menos perdulrios no encontram eco nos crculos ambientalistas, levando a comunidade garimpeira a atestar que o meio ambiente no conhece o garimpo. Quer apenas us-lo como bode expiatrio da questo ambiental no Brasil.

11- GARIMPO E POLUIO

Do ponto de vista tanto representativo quanto da prtica substantiva, os ambientalistas tratam o garimpo de forma totalizante. Para eles no existem diferentes tipos de garimpo (ouro, diamante, cassiterita, pedras preciosas etc.) que empregam tecnologias diversas, possuem estruturas sociais e organizacionais diferentes e fazem uso ou no de agentes poluidores. Existe, apenas, o garimpo de ouro, que emprega mercrio e polui. E atravs da poluio mercurial que os ambientalistas passam do nvel de acusao genrica para a especfica, tornando-a smbolo de todos os males que a atividade garimpeira causa ao meio ambiente. Neste contexto o assoreamento aparece como um valor menor e hierarquicamente inferior.

12- REDUO E CONTROLE DE POLUIO

Alis, esta uma relao bastante interessante. Se atravs do uso de determinados equipamentos e tcnicas possvel reduzir e controlar a poluio mercurial, no existe disponvel, no momento, nenhum conhecimento, tcnica ou equipamento capaz de recuperar os danos causados pela movimentao de terras que o garimpo ocasiona no leito dos rios.

Portanto, do ponto de vista exclusivamente tcnico e ambiental, o assoreamento , talvez, um vilo to grande quanto o mercrio. Se por trs da questo ambiental estivessem apenas aspectos objetivos, a relao entre esses dois subprodutos do garimpo seria pelo menos mais igualitria. As acusaes dos ambientalistas se centralizariam tambm no assoreamento. A pergunta nesse caso qual o significado que cada um desses problemas tem para o discurso ambientalista.

No contexto desse enfrentamento, o que o garimpo continua no aceitando o papel de vilo paradigmtico dos problemas ambientais. Se, por um lado, os garimpeiros concordam que o mercrio polui, por outro discutem a proporo e o carter absoluto desta poluio. E, mais, argumentam que os ndices de poluio por metais pesados, principalmente o mercrio, nos grandes centros urbanos, so muito maiores e no existe nenhuma campanha a respeito, nem as grandes indstrias recebem um dcimo das hostilidades dedicadas ao garimpo pelos rgos de proteo do meio ambiente e do pblico em geral. Alm disso, a agricultura mecanizada, responsvel por um dos maiores ndices de poluio ambiental, dificilmente chamada para prestar contas.

Se examinarmos toda essa discusso do ponto de vista quantitativo - o ndice de poluio por metais pesados entre os grandes centros urbanos e a Amaznia -, a relao talvez possa, at mesmo, favorecer o garimpo. Ou seja, a contaminao pode ser maior nas grandes cidades do que na selva, o que certamente no justificaria deixar polu-la. Mas, para se entender toda essa problemtica necessrio transcender esse aspecto. As implicaes verdadeiras encontram-se, no na quantidade, mas na qualidade do que poludo, na natureza daquilo que contaminado.

13- AMAZNIA E PANTANAL MATO-GROSSENSE: SANTURIOS ECOLGICOS

No caso especfico da Amaznia e do Pantanal Mato-grossense, a sua classificao como santurios ecolgicos nos fornece indcios claros para a compreenso do que est subjacente discusso sobre a quantidade de poluio mercurial existente nesses locais e nos grandes centros urbanos.

O termo santurio no usado de forma aleatria pelos grupos ambientalistas nem pela sociedade como um todo. indicativo da atribuio de um status sagrado por oposio a um profano. No seu interior guarda-se, ou melhor, resguarda-se aquilo que se quer manter intocado ou fora de alcance das mos profanas. E mais, o termo sugere a existncia de relaes e regras de evitao, respeito e reverncia entre os elementos desses dois domnios.

As intervenes concretas so vistas como violaes de fronteiras, verdadeiras profanaes entre dois mundos descontnuos, no que toca a natureza bsica de cada um.

Considerando-se essa lgica implcita, todas as manipulaes sofridas por elementos do mundo natural que se localizam fora do que definido como santurio ecolgico - no caso, centros urbanos industriais e regies perifricas - produzem menos impacto do que as que ocorrem no interior daqueles. Poluir um rio localizado num domnio profano muito diferente de poluir guas sagradas. No primeiro caso, o processo percebido como abrangendo elementos ontologicamente semelhantes, e no radicalmente diferentes como no segundo.

Portanto, o impacto que a taxa de poluio por metais pesados causa no meio urbano , pela natureza atribuda ao que contaminado, percebida como hierarquicamente menor e inferior, do ponto de vista simblico, do que a que ocorre nas regies classificadas como santurios ecolgicos.

Embora tanto garimpeiros quanto ambientalistas paream estar envolvidos em discusses de ordem quantitativa - por exemplo, o nmero de toneladas de mercrio atiradas nos rios da Amaznia - no fundo discutem, tambm, a natureza das guas que esto sendo poludas. Enquanto os primeiros discordam do status de sagrado atribudo a esses locais, os segundos enfatizam, justamente, essa qualidade.

A atribuio, por esses dois grupos, de um status ontolgico distinto s guas dos rios amaznicos indica, claramente, a natureza simblica do enfrentamento. Garimpeiros e ambientalistas utilizam esquemas diferentes de classificao, que implicam alvos sociais e interesses divergentes. A selva amaznica dos ecologistas radicalmente diversa da dos garimpeiros. Para os primeiros, ela representa o smbolo de um novo paradigma. Para os segundos, a continuidade de uma tradio de ocupao de fronteiras em que meio ambiente e populaes nativas so entendidos como entraves ao desenvolvimento.

Em termos de luta simblica, o objetivo de cada grupo demonstrar, para os que esto fora desse campo semntico especfico, qual a selva verdadeira: a sagrada ou a profana.

Para isso o movimento ambientalista est mais bem preparado do que a atividade garimpeira.

O poder simblico, o poder de interferir na realidade com palavras, est baseado no capital disponvel para cada grupo, adquirido em enfrentamentos anteriores. E, nos ltimos anos, face aos subprodutos do modelo de crescimento ilimitado adotado pela sociedade ocidental, a explorao de riqueza a qualquer preo, propugnada at bem pouco tempo pela comunidade garimpeira, a deixa simbolicamente deficitria (Bourdieu, 1990).

Embora a pobreza simblica do garimpo o coloque numa posio de pouca legitimidade face aos seus demais interlocutores, as razes de suas representaes, numa perspectiva mais ampla, vinculam-se a uma posio bem mais hegemnica entre ns (Barbosa, 1991). Tal posio caracterizou, do ponto de vista histrico, nossa ocupao de fronteiras e a prpria poltica governamental de desenvolvimento do pas e, mais especificamente, da Amaznia.

Nesse contexto, o garimpo apenas mais uma frente de expanso como a borracha, o gado e a castanha. A sua diferena em relao s demais justamente a conjuno do seu apogeu, ou seja, o ponto mximo da sua explorao, com a mudana de paradigma em relao ao meio ambiente.

Portanto, por parte dos empresrios do garimpo e dos elementos politicamente mais articulados dessa comunidade, a relao homem/natureza transcorre no interior do mesmo modelo de explorao, ou melhor, exausto dos recursos naturais concebidos pela sociedade industrial, onde, at bem pouco tempo, nenhum status agrado era atribudo a qualquer elemento do mundo natural. A tica a mesma de qualquer outro empreendimento econmico: o mximo de lucro, com o mnimo de investimento, no perodo de tempo mais rpido, sem qualquer computao dos danos ambientais. Melhor seria dizer que esta tica sempre foi particularmente aguda no que toca o uso dos bens comuns (gua, ar, terras) e pblicos na sociedade moderna: ausncia total de qualquer responsabilidade coletiva. Neste aspecto, os empresrios do garimpo no se distinguem em nada de qualquer outro grupo no interior da sociedade brasileira. Contudo, com o movimento ecolgico, que tem-se preocupado em alocar responsabilidades pelo uso e abuso do meio ambiente (neste caso, apenas bens de uso comum), as lideranas garimpeiras buscaram a introduo de novas tcnicas produtivas menos poluidoras, passando a incluir, pelo menos para uso externo, o meio ambiente na coluna de custos e a exercitar urna modalidade de discurso ambientalista como estratgia de sobrevivncia poltica. Atravs dele, os garimpeiros engajam-se, como os demais grupos da sociedade, nessa nova ordem e tentam escapar do estigma da marginalidade, pelo aumento do seu capital simblico.

Por parte dos trabalhadores do garimpo, as coisas so bem trais complexas. Primeiro, o grupo assim denominado bastante heterogneo. composto de pessoas das mais diferentes procedncias, tanto do ponto de vista geogrfico quanto do scio-econmico. Existem nos garimpos advogados, jornalistas etc. originrios de centros urbanos, bem como ex-agricultores sulistas e nordestinos, alm de pessoas da prpria regio e que fazem da atividade garimpeira uma ocupao complementar agricultura. Isso sem mencionar sequer a insero diferencial que todos possuem na prpria estrutura interna da garimpagem. Os nicos pontos talvez a homogeneiz-los sejam a percepo dessa atividade como uma alternativa de ganho mais atrativa e a total invisibilidade poltica em que se encontram. difcil saber o que pensa a massa garimpeira sobre qualquer aspecto que envolva a atividade, devido ausncia total de trabalhos que investiguem o sistema representacional dessa comunidade. As informaes existentes so esparsas e fragmentadas.

De qualquer forma, a origem urbana ou rural, as diferenas de nvel educacional e a procedncia local ou externa apontam para a possibilidade de representaes bastantes diferenciadas. Para os grupos originrios da prpria regio amaznica, mais acostumados ao contato direto com a natureza e sua exuberncia, a preservao do verde possui uma dimenso mais cosmolgica que poltica, ao contrrio do que ocorre no seio dos segmentos da sociedade brasileira mais mobilizados pela questo ambiental.

Embora recentemente vrios grupos sociais da regio amaznica - como seringueiros, castanheiros e ribeirinhos - se tenham unido, sob a liderana de Chico Mendes e outros grupos ambientalistas, em torno da preservao da floresta, difcil identificar nisso uma conscincia ecolgica, no sentido que ela possui no interior da sociedade industrial moderna.

Para essas populaes, a defesa do meio ambiente no est ancorada na problemtica histrica e econmica trazida pela revoluo industrial, nem na escassez dos recursos naturais, hoje, tanto atemoriza a sociedade industrial. A relao dessas populaes com o seu meio fsico est baseada em mediaes diferentes. Sua sobrevivncia, sua viso de mundo, suas instituies scio-culturais esto ancoradas neste universo, onde predomina natureza, na sua forma inculta, selvagem, agreste.

E se nos ltimos anos, do ponto de vista simblico, esta forma concebida para o mundo natural tenha sido uma das mais privilegiadas, isso no anula o fato de que, durante sculos, esse mesmo tipo de meio fsico foi smbolo de atraso e exotismo, jamais de um valor positivo a ser cultivado. Mesmo na periferia do sistema scio-econmico e dos centros decisrios da sociedade brasileira, essas populaes sofreram influncias e partilharam com o resto do pas valores que na maior parte dos casos, no estavam em consonncia com o que hoje se privilegia.

Para os grupos ambientalistas oriundos, em sua maioria, dos centros urbanos e das camadas mais intelectualizadas da populao, politicamente mais sintonizadas com as implicaes mundiais das questes ambientais e conscientes do papel totmico desempenhado pela Amaznia no acervo representacional do movimento ecolgico, as razes para se atribuir uma qualidade sagrada aos elementos do mundo natural, guardados no interior dos santurios ecolgicos, esto enraizados em outros aspectos (Drummond, 1989).

14- RECURSOS NATURAIS E BIODIVERSIDADE DOS ECOSSISTEMAS

A distncia do verde e o seu valor de escassez, a redescoberta da natureza como possuidora de um ritmo e uma dinmica prpria; o novo significado ontolgico atribudo aos seus elementos no-humanos; a idia crescente de finitude inexorvel dos recursos naturais; a biodiversidade dos ecossistemas; e, finalmente, a imagem aterrorizante de que estamos diante das ltimas fronteiras da natureza funcionam como sinais diacrticos para a insero simblica desse domnio no sagrado. Portanto, o que para os grupos ambientalistas funciona como um sinal positivo, pelo menos para as lideranas garimpeiras no possui o mesmo significado.

fundamental enfatizar, contudo, que a natureza intocada, como um valor introduzido pelo movimento ecolgico, caso nico nas concepes das diferentes sociedades sobre o mundo natural. Do ponto de vista estritamente representacional, estamos longe de ser a nica sociedade a perceber e considerar que o meio ambiente est em perigo (Douglas, 1975).

Muitos outros povos vem seus ambientes tambm ameaados. Os perigos atribudos no so, naturalmente, idnticos. No momento consideramos a superpoluio um grande problema, pois pressiona ainda as nossas j combalidas reservas naturais. Para muitos desses povos , geralmente, o inverso. Contudo, os tipos de causas e de responsabilidades atribudas so os mesmos. Sempre e em todos os lugares a loucura humana, a ganncia, a ambio e o dio que colocaram o meio ambiente em perigo. A diferena entre a nossa sociedade e as demais justamente o valor indito atribudo natureza virgem. E justamente contra essa representao especfica da natureza que a atividade garimpeira bate de frente. Ao remexer as entranhas da terra, os leitos dos rios e as encostas dos morros existentes no interior dos santurios ecolgicos, esse grupo, mais que qualquer outro, destri esse valor, aniquila a possibilidade dessa representao. Seringueiros e castanheiros usam tambm a floresta.

Entretanto, a atividade econmica que lhes est associada mantm esse nicho ecolgico o mais prximo possvel da intocabilidade ideal concebida pelos ambientalistas. No , portanto, por acaso, que seringueiros e castanheiros se tornaram alvos das atenes preservar. Por outro lado, no toa que garimpeiros tenham sido escolhidos justamente para o papel inverso.

claro que esse modelo sagrado-profano, proposto anteriormente, no se coloca de forma monoltica para a compreenso da discusso subjacente aos ndices de poluio mercurial. No caso do Pantanal e da Amaznia versus centros urbanos industrializados, ele se encontra na sua posio limite: os no-poludos (puros) com os mais poludos (impuros).

Entretanto, a sua utilizao obedece a uma dinmica de segmentao. Dependendo dos elementos, diferentes domnios podem ser mais ou menos sagrados, ou mais ou menos profanos, sempre em relao a outros. Qualquer recurso hdrico localizado em santurios ecolgicos ter suas guas mais sacralizadas do que as dos demais, inseridos em contextos urbanos e industriais. No primeiro caso, necessrio impedir a profanao, o que, em termos de ao concreta, significa a sua intocabilidade. No segundo, purificar suas guas, ou seja, devolver-lhes a sua natureza sagrada original.

Esse modelo analtico adotado para descrever as relaes entre alguns grupos da sociedade ocidental moderna - no caso, garimpeiros e ambientalistas - e o mundo natural pode ser mais bem entendido quando visto no interior da ideologia biocntrica, subjacente ao movimento ambientalista contemporneo. O que revolucionrio nessa postura a idia de que o Comportamento tico no comea e termina nos seres humanos. Prope-se um alargamento da idia de valor, de forma que a natureza cesse de ser apenas propriedade e se torne uma comunidade. Esta nova tica ecolgica exige a extenso do conceito do que consideramos pessoas. Requer o reconhecimento do valor intrnseco de cada componente ecobitico. Nessa perspectiva, os elementos do mundo natural - sejam eles animais, vegetais ou minerais - tm os mesmos direitos que os seres humanos. Eles so a sua prpria justificativa de existncia. Possuem um valor completamente divorciado de qualquer significado ou utilidade que possa ter para os homens. Concretamente, isso significa que, da posio de objeto, na perspectiva anterior ao movimento ecolgico, natureza passou a sujeito, algo dotado de subjetividade e identidade, que preciso ouvir e entender. De mundo inanimado passou a vivo, dinmico, com ritmo prprio. Nesta nova ordem, cada elemento valorizado em si e por si. Cada elemento no humano investido de cidadania, de direitos prprios, que justificam o seu estar no mundo, independentemente de suas relaes com os seres humanos. Numa certa dimenso, como se a natureza tivesse sido humanizada, concebida imagem e semelhana dos seres humanos e ontologicamente igual. Embora revolucionria do ponto de vista da teoria moral, por estender o princpio da igualdade entre os homens natureza, esta perspectiva biocntrica gera questes problemticas. No fica claro, por exemplo, de que maneira a humanidade pode exigir seus direitos sobre os recursos naturais sem violar os direitos da natureza. Como e por quem os direitos naturais sero exercidos, na ausncia, bvia, de sujeitos conscientes?

Embora, do ponto de vista filosfico, possam ser estabelecidos critrios que solucionem alguns desses impasses - como j tem ocorrido nos Estados Unidos no nvel das situaes concretas fica difcil se pensar numa dinmica operacional baseada nesses princpios, principalmente em formaes sociais em que o liberalismo no possui razes muito profundas nas instituies da sociedade e no pensamento poltico-filosfico, como o caso do Brasil (Merquior, 1991).

Como poltica, o biocentrismo parece ter ficado longe de sua inteno inicial de um mundo comunitrio. As relaes entre o universo humano e o mundo natural no celebram, como era a inteno filosfica inicial, a interdependncia nem a indivisibilidade da vida, mas a dissociao e o congelamento de cada um, homem e elementos naturais, nos nichos ecolgicos respectivos. A separao e a descontinuidade so aprofundadas, pois a ao humana sobre a natureza, mesmo nos seus nveis mnimos, , por definio, profanadora e, como tal, deve ser mantida distncia.

15- PROCESSO DE CONSTRUO DA IDENTIDADE GARIMPEIRA E MEIO AMBIENTE

Contudo, seja qual for o tema ou o tom da discusso, o meio ambiente j est no garimpo, ou como um problema ou como uma incorporao: portanto, uma nova realidade, um novo valor a ser includo no processo de construo da identidade garimpeira. Alis, o Para o papel desempenhado pelas cooperativas de seringueiros no desmonte do poder dos seringalistas, ver O'Dwyer (1989). Estudos Histricas, Rio de Janeiro, vol. 4, n. 8, 1991, p. 229-24314 meio ambiente se coloca, no momento atual, como o valor central, englobador de tudo e todos. Ele no problematiza apenas o garimpo, mas todas as demais atividades econmicas, independentemente da potencialidade que cada uma tenha de acionar recursos de poder.

Nesta perspectiva, ele seria hoje o valor, aquele que empresta legitimidade com sua marca. O meio ambiente se tornou o grande referencial para todos os grupos. Do ponto de vista poltico, a adaptao ao tema ecolgico, ainda que de forma superficial, apresenta-se como a nica sada competitiva, na medida em que os grandes sistemas alternativos de interpretao da realidade, na busca de um mundo melhor, comeam a desaparecer debaixo das ruras do socialismo do Leste europeu. Se, na perspectiva socialista, o trabalho supostamente encompassava o capital e a propriedade, nesta outra perspectiva a natureza, seja o que cada grupo entenda como tal, engloba as mesmas categorias anteriores e mais o trabalho. Portanto, cada segmento esmera-se em evidenciar sua integrao ao novo esquema universalizante.

Assistimos, assim, a mineradores fazendo pesquisas ambientais para provarem a eficincia de seus mtodos; a garimpeiros querendo se reeducar na maneira de utilizarem o mercrio ou mesmo de abandonarem essa tecnologia; a madeireiros fazendo seminrios com deputados verdes; e a todas as instncias do poder poltico (municipal, estadual, nacional) se reciclando para saberem como atuar sob a ideologia do verde.

CONSIDERAES FINAIS

Ao se defrontar com a questo das atividades garimpeira e os problemas decorrentes da mesma, evidencia-se o fato de o Garimpeiro ser um trabalhador inserido em uma relao de uma profunda dependncia, ligado ao trabalho com a terra, ele o primeiro a ser atingido pela crise climtica; no entanto, o que o torna mais exposto a esse fenmeno o fato de ser desprovido dos mais elementares meios de produo. Dessa forma, o garimpo surge como a nica alternativa que a esses trabalhadores atingidos pela fome e pelo desemprego.

Embora segmentos do setor mineral admitam a existncia de distores srias na atividade garimpeira a sugesto de solues para se resolver o problema de garimpo no pas esbarra na falta de consenso entre os segmentos.

Um horizonte mais visvel poderia ser a realizao de reforma agrria, acompanhada de uma organizao de cooperativas, como um meio de se garantir a distribuio de assistncia tcnica, escolar, na rea de sade, possibilitando a fixao do homem em seu local de origem e revertendo o fluxo migratrio em direo de centros urbanos e as provncias garimpeiras.

O que se percebe entre os garimpeiros um potencial associativo que pode ser estimulado, visando-se a uma atividade de garimpo mais racional e tambm mais produtiva do ponto de vista social.

BIBLIOGRAFIA

ATIVIDADES GARIMPEIRAS NO BRASIL: Aspectos tcnicos, econmicos e sociais: Jocy Gonalo de Miranda, Moacy Sipriano, Raimundo Augusto C. Mrtires e Wagner Jos Giaconi.

MCT CNPq CETEM.

BARBOSA, Lvia, 1991. Representaes nacionais e identidade garimpeira; carncia material e pobreza simblica. Rio de Janeiro, Cetem. (Relatrio final da pesquisa do projeto Pocon).

PESQUISA sobre poluio no Rio Tapajs,1988. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro.