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DIEGO TADEU CASTRO DA MATA A EXTRAÇÃO DE QUARTZO EM CORDISBURGO-MG: CONFLITOS NO TRABALHO DOS CRISTALEIROS Monografia apresentada ao departamento de Geografia do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais como requisito para obtenção do título de licenciado em Geografia. Orientadora: Maria Luiza Grossi Araújo Banca Examinadora: Claudinei Lourenço e Marly Nogueira Belo Horizonte 2014

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DIEGO TADEU CASTRO DA MATA

A EXTRAÇÃO DE QUARTZO EM CORDISBURGO-MG: CONFLITOS NO

TRABALHO DOS CRISTALEIROS

Monografia apresentada ao departamento de Geografia do

Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas

Gerais como requisito para obtenção do título de licenciado

em Geografia.

Orientadora: Maria Luiza Grossi Araújo

Banca Examinadora: Claudinei Lourenço e Marly Nogueira

Belo Horizonte

2014

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar os conflitos territoriais relacionados à

atividade dos cristaleiros, grupo de garimpeiros extratores de cristais de quartzo no

município de Cordisburgo-MG, visando identificar os sujeitos que realizam este

trabalho e suas formas de resistência nos garimpos. O trabalho de garimpagem ainda se

caracteriza nos dias atuais pelo seu caráter informal, sendo considerada uma atividade

geradora de grandes impactos ambientais, mesmo quando feita de forma artesanal. Por

isso, esses sujeitos ainda enfrentam muitas dificuldades na (re)produção de sua prática.

Neste contexto, foram realizados trabalhos de campo no município de Cordisburgo que

buscaram um contato direto com esses grupos através de entrevistas e visitas às áreas de

garimpo, sendo possível identificar a presença de conflitos envolvendo cristaleiros,

proprietários de terra e o aparato estatal, representado pelo Instituto Estadual de

Florestas. Essa discussão é desenvolvida durante o trabalho, e indicou uma relação

desigual de forças, na qual o garimpeiro é claramente o mais prejudicado no processo,

seja pela criminalização da garimpagem, considerado ilegal quando não envolve o

cooperativismo, como também pelas relações de trabalho que se desenvolvem entre

cristaleiros e proprietários de terra.

Palavras chave: Garimpo, Informalidade do trabalho, Conflitos ambientais

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AGRADECIMENTOS

Este trabalho é dedicado a todos que de alguma forma contribuíram com minha

formação e amadurecimento na academia; um espaço que se revelou de grande

aprendizado em todos os sentidos. Não poderia deixar de agradecer primeiramente meus

pais, Deuslene e Duval, por ter me possibilitado cursar uma Universidade com a

tranqüilidade de poder fazer escolhas: erros e acertos.

Agradeço meus irmãos, Douglas e Danielle, pelos incontáveis momentos em que

precisei de ajuda e fui prontamente atendido.

Aos meus tios e tias, e à Vó Lilia. Também aos que não puderam estar aqui presentes,

mas que deixam saudades: Vô Valino, Vó Lôra, Vó Quita e Tio Délcio.

Agradeço também meus primos e primas, principalmente ao Rodolfo, Miguel e Vitória,

pelo companheirismo que nos une desde quando éramos crianças em Cordisburgo.

Agradeço à minha orientadora, Maria Luiza Grossi Araújo, pela paciência e pela

dedicação com que se dispôs a me ajudar.

Agradeço aos professores Claudinei Lourenço e Marly Nogueira por terem aceitado de

prontidão a fazer parte deste trabalho, sendo membros da banca avaliativa.

Agradeço aos meus colegas, amigos, coordenadores e professores dos estágios que tive

oportunidade de fazer parte durante meu curso de Geografia. Em especial aos amigos do

GESTRADO/FaE e do Colégio Logosófico González Pecotche.

Aos incontáveis amigos que fiz durante minha passagem pela Geografia, obrigado!

Obrigado pelos trabalhos de campo, pelas quintas-feiras em volta da fogueira, as

viagens para encontros e pelo dia-a-dia no D.A. São tantos amigos que não conseguiria

citar todos, então fica aqui meu obrigado geral.

Aos meus companheiros de banda, os Psicotrópicos, pelos momentos de alegria em

meio ao caos. Obrigado Allan, Jonas, Carla, Linda, Jonas, Milton e Danilo, que

continuemos musicando! Por fim, obrigado a todos em Cordisburgo que me ajudaram a

realizar esse trabalho, contribuindo com entrevistas, conversas e depoimentos.

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LISTA DE SIGLAS

AAF – Autorização Ambiental de Funcionamento

COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais

DNPM – Departamento Nacional de Produção Mineral

ETE – Estação de Tratamento de Efluentes

FEAM – Fundação Estadual do Meio Ambiente

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDH – Índice de Desenvolvimento Humano

IEF – Instituto Estadual de Florestas

INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas

MMA – Ministério do Meio Ambiente

MME – Ministério de Minas e Energia

LO – Licença de Operação

MTE – Ministério do Trabalho e Emprego

ONG – Organização Não-Governamental

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Mapa de localização do município de Cordisburgo-MG. Fonte: Diego Mata.

Página 33

Figura 2 – Localização da bacia do Rio das Velhas em Minas Gerais e municípios

correspondentes. Fonte: Projeto Manuelzão

Página 35

Figura 3 – Cata aberta no solo por cristaleiros. Garimpo artesanal. Fonte: Diego Mata.

Maio/2014

Página 44

Figura 4 – Limites do MNEPL e da zona de amortecimento do parque. Fonte: Plano de

Manejo do IEF para o MNEPL.

Página 56

Figura 5 – “Refugos” deixados por cristaleiros. Impacto visual e pouco

comprometimento com o destino dos materiais. Fonte: Diego Mata. Maio/2014

Página 58

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LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS

Quadro 1: Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade no

município de Cordisburgo – 2000 e 2010. Fonte: IBGE.

Página 37

Quadro 2: Perfil de amostragem dos cristaleiros entrevistados.

Página 42

Gráfico 1: Pessoas com 10 anos ou mais de idade por nível de instrução no município

de Cordisburgo-MG. Fonte: IBGE.

Página 38

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...............................................................................................................9

CAPÍTULO I: REVISITANDO CONCEITOS

1.1 – A mercadoria..................................................................................................17

1.2 – Apropriação do trabalho humano e da natureza como mercadoria.........21

1.3 – Conflitos ambientais e o paradigma do “desenvolvimento sustentável”...26

CAPÍTULO II: BREVE ANÁLISE SOBRE CORDSIBURGO-MG

2.1 – O povoado de Vista Alegre: O início de Cordisburgo.................................31

2.2 – Dados gerais do município.............................................................................32

2.3 – Aspectos socioambientais...............................................................................34

2.4 – Condições educacionais..................................................................................36

2.5 – Economia e Emprego.....................................................................................38

CAPÍTULO III: A EXTRAÇÃO DE CRISTAIS EM CORDISBURGO

3.1 – Registros de Campo......................................................................................41

3.2 – O trabalho no garimpo.................................................................................43

3.3 – Conflitos envolvendo a prática garimpeira.................................................49

CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................60

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................63

ANEXOS.........................................................................................................................67

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João Sem Terra

Desde pequeno me chamam,

desde pequeno me chamam

desde pequeno me chamam, João Sem Terra.

Filho de um sol estrangeiro

que acabou me renegando

fico onde chego primeiro, João Sem Terra

Ver o horizonte tão longe

e saber que tão perto dali

ficou tudo o que vinha crescendo

de bom aqui dentro da gente

Ter que se andar pra frente

sem olhar atrás o que se deixou

não se deseja ao pior inimigo

tão sujo presente

Desde pequeno me chamam,

desde pequeno me chamam

desde pequeno me chamam, João Sem Terra.

Filho de um sol estrangeiro

que acabou me renegando

fico onde chego primeiro, João Sem Terra

Lembra das noites de inverno

onde o frio põe na mesa o vinho e o pão

um foi tirado a videira

o outro amassado por tua mão

Ter que lembrar todo dia

do medo que te fez deixar teu chão

nem ao pior inimigo

se quer tão amarga recordação.

Sá & Guarabyra

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INTRODUÇÃO

Extensas áreas no Brasil constituem espaços tradicionais de mineração e

atividades garimpeiras, como em porções de Goiás, Bahia, com destaque histórico para

Minas Gerais durante o período colonial e, posteriormente, a região Amazônica. A

mineração contribuiu em grande medida para a formação do território nacional, fixando

contingentes populacionais no interior (MARTINS, 2008). Esse processo segue a lógica

econômica mercantil de uma colônia de exploração, e esteve sempre relacionado à

atividade do garimpo, que ainda hoje encontra significativa representação em muitas

destas regiões.

Neste processo, o garimpeiro ganha destaque por seu protagonismo; Através do

seu trabalho ganha magnitude uma maneira de se explorar os minerais existentes nos

subsolos. Em todo esse tempo, a prática do garimpo evidenciou contradições nas

relações de produção do espaço, por sua relevância na história do país, e pelos conflitos

decorrentes desse processo. O momento histórico de apogeu da atividade da mineração

no Brasil se deu no século XVIII, e consolidou o garimpeiro como um importante ator

no processo de conquista de novas fronteiras políticas. Porém, a despeito desta

importância histórica, o garimpeiro sempre enfrentou condições bastante adversas na

reprodução de sua prática, sempre relacionadas à criminalidade e clandestinidade.

Na década de 1970, a crescente discussão em torno de políticas ambientais e

sobre o uso produtivo de diversos elementos, dentre eles os minerais, consolidou o

discurso sobre a importância da gestão adequada para o uso racional destes que são

considerados recursos naturais dentro da lógica de acumulação capitalista. Nesta década

ganhava força a visão ecodesenvolvimentista (MARTÍNEZ ALIER, 2007), que via na

conciliação dos aspectos econômicos, sociais e ambientais a saída para as crescentes

crises ambientais. Novas significações foram atribuídas às formas de se pensar a relação

homem x natureza. Assim, valores como lucratividade e eficiência poderiam estar

alinhados com a conservação do meio ambiente e redução dos problemas sociais. Neste

contexto, como ressalta Barbosa (1991) ao analisar o imaginário nacional no fim da

década de 1970, a prática do garimpo já não era mais compatível com a visão moderna

de desenvolvimento econômico e, assim, sua atividade se tornou cada vez mais

marginalizada. O garimpo não era visto como uma atividade sinônima de avanço, de

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nação em movimento.

A atividade de garimpo pode ser caracterizada nos dias atuais por sua peculiar

situação de ora resistência, ora trabalho alienado em espaços de conflitos, já que se faz

persistente em detrimento de sua deslegitimação e descaracterização, em territórios

onde diversas forças atuantes se fazem presente, e onde os garimpeiros travam batalhas

diárias na busca pela reprodução de seu modo de vida. Ao mesmo tempo em que a

atividade de garimpo é estigmatizada como sinônimo de atraso, a atividade de

mineração feita por grandes empresas e corporações é posta como avanço, recebendo

incentivos políticos (MARTINS, 2008). O discurso ecodesenvolvimentista não cessou

as desigualdades econômicas e as consequências dos desacertos gerados nos conflitos.

Estes processos são então sentidos principalmente pelo garimpeiro.

Em muitos municípios a atividade de garimpo ainda encontra espaço através de

grupos, associações, aventureiros, que possuem características em comum, inerentes ao

processo de garimpagem, mas que também possuem suas particularidades. No estado de

Minas Gerais, atualmente encontramos diversas atividades relacionadas ao garimpo de

metais e minerais, como ouro, prata, diamante, quartzo, dentre outros.

Para se pensar a relação entre o garimpo e a sociedade e, mais especificamente,

na relação entre as forças produtivas do trabalho humano e a natureza, proponho com

este trabalho fazer um recorte de estudo no município de Cordisburgo-MG, onde

atualmente acontecem atividades relacionadas ao garimpo artesanal de cristais de

quartzo. Este mineral tem sido retirado em propriedades particulares pelo trabalho de

garimpeiros. As extrações são realizadas em todo o município, principalmente no

entorno da cidade de Cordisburgo, com destaque para algumas áreas onde o cristal de

quartzo é encontrado em maior quantidade através de lavras quartzíticas, geralmente a

céu aberto, barrancos, e/ou em pequenas profundidades.

Atualmente é possível observar dentro da dinâmica e do cotidiano da cidade de

Cordisburgo um aumento na procura por trabalho em áreas de garimpo. Evidencia-se

este fato pelo crescimento do volume da extração de cristal de quartzo no município, o

que tem provocado uma verdadeira corrida e/ou mobilização pela sua extração e

lapidação, e, consequentemente, o surgimento de diversos conflitos sociais e ambientais

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nestes espaços. O aumento da procura pela garimpagem é resultado da presença cada

vez maior de interessados na aquisição dos cristais, provenientes de diversos lugares do

Brasil, e mesmo de outros países. Os cristais de quartzo, usados como matéria para

produção de bens de consumo eletrônicos, evidencia os efeitos do complexo movimento

de globalização no mundo moderno, da subordinação do trabalho humano às condições

impostas pelo capital e seus efeitos em uma cidade de pequeno porte, onde muitas vezes

a disponibilidade e oferta de empregos não são suficientes para manter os trabalhadores

dentro do setor formal.

Essa dinâmica tem constituído um processo de disputa entre a população local

pelos locais de garimpo e, consequentemente, por denúncias de invasão de terras,

prisões em casos mais extremos, e também pela passagem de trabalhadores para a

informalidade pela falta de oportunidades de empregos no setor formal. Chamados de

cristaleiros, constata-se que as práticas de garimpo do cristal de quartzo em Cordisburgo

por esses trabalhadores não incorporam ainda o processo mecanizado para sua extração.

É realizado principalmente através de técnicas manuais, com uso de ferramentas como

pás, enxadas e picaretas e, principalmente, a força humana. O trabalho caracteriza-se

por sua precariedade, seu caráter vulnerável indicado pela informalidade do garimpeiro

com a atividade extrativa, pelo risco envolvido em sua prática e, igualmente, por sua

ilegalidade em muito dos casos, devido à falta de vínculos institucionais destes

trabalhadores.

Dentro deste contexto local, foi possível refletir em categorias e

problematizações que permeiam esta pesquisa de graduação em Geografia. A resistência

cultural e histórica dos trabalhadores do garimpo, as contradições em torno do discurso

hegemônico sobre o meio ambiente e da dinâmica econômica gerada no município de

Cordisburgo em consequência dessa prática merecem ser analisadas a partir da ciência

geográfica. Com o crescente aumento das atividades de garimpo têm emergidos

diversos conflitos na região. Como resultado, há uma maior fiscalização nestas áreas, e

consequentemente uma maior criminalização do cristaleiro, que é claramente o mais

afetado neste processo. Aos cristaleiros tem recaído um ônus pelo aumento da

degradação do meio ambiente no município, ainda que outras atividades na região

gerem impactos ambientais de igual ou maior amplitude. Também recaem sobre o

cristaleiro denúncias sobre invasão de propriedades particulares, fato corriqueiro

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durante uma atividade de garimpo.

Após algum período de reflexão sobre estes aspectos, surgiram alguns

questionamentos que norteiam o direcionamento deste trabalho. Como tem sido a

prática de extração dos cristais em Cordisburgo e os resultados dela derivados? Como se

estabelece as relações de trabalho entre cristaleiros e os donos da terra? De que forma

se dá a articulação entre cristaleiros, de forma a resistir e desenvolver sua atividade?

Qual o destino do mineral? Quais as maiores dificuldades enfrentadas pelo cristaleiro?

O objetivo geral deste trabalho é, primeiramente, analisar e interpretar os

conflitos inseridos no município de Cordisburgo-MG relacionados ao processo de

exploração e comercialização de cristais de quartzo em garimpos artesanais. Pretende-se

compreender os processos sociais que condicionam a natureza do conflito, evidenciando

as contradições inerentes à (re)produção do espaço, sobretudo, no trabalhador do

garimpo.

Além do objetivo geral deste trabalho, outros pontos são relevantes para a

construção desta pesquisa. Pretende-se investigar a trajetória de exploração do mineral

no município, de tempos passados aos dias atuais, analisando a dinâmica desta

atividade. Em outras palavras, é importante investigar o ritmo e o grau de intensidade

em que esta atividade tem sido exercida ao longo da história do município. Busca-se

registrar as diversas formas de resistência de que o cristaleiro se apropria ao reproduzir

sua prática, principalmente no tocante às questões de fiscalização por parte de órgãos

ambientais. Pretende-se ainda, investigar a presença de cooperativas, associações e

lideranças entre os cristaleiros e sua participação no processo de garimpagem. Por fim,

será importante analisar a condição de trabalho no garimpo; o cotidiano e as

significações atribuídas pelos cristaleiros em sua prática, a organização das etapas do

processo produtivo e das etapas de trabalho em geral. Procura-se destacar na pesquisa os

fenômenos mais expressivos capazes de possibilitar a compreensão da trama das

relações socioespaciais e ambientais que envolvem os cristaleiros e como isso se

manifesta na produção do espaço geográfico.

Ainda que a questão dos conflitos que envolvem os garimpos e garimpeiros seja

bastante comentada em âmbito acadêmico, poucos são os registros relacionados

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especificamente aos garimpos de cristal de quartzo, fenômeno que tem atingido não

apenas Cordisburgo, mas vários municípios da região central mineira, como Curvelo,

Sete Lagoas, Corinto, Gouvêa, entre outros, onde o número de cristaleiros têm

igualmente crescido. Esta pesquisa poderá contribuir para incrementar a discussão em

relação aos garimpos de cristal dentro da Universidade. Da mesma forma, é um

exercício teórico e prático que possibilitará uma troca de experiências com os

envolvidos diretos, de forma que, com este trabalho, se possam ultrapassar os limites

físicos da academia e seja ele um instrumento real de debate e exposição de ideias.

O interesse desta pesquisa para mim é um esforço para retratar e avaliar

transformações que acontecem em um espaço em que eu experiencio constantemente

através de minha vivência afetiva e geográfica, uma vez ser Cordisburgo a cidade onde

nasceram e ainda vivem maus pais, e que pude viver boa parte de minha vida. Observar

as transformações nas relações sociais advindas de processos econômicos no município

onde vivi e ainda hoje vivem familiares meus, me faz querer refletir sobre esses

processos geográficos com a proximidade e, ao mesmo tempo, o necessário

distanciamento que todo trabalho de pesquisa pede. Deve-se pensar que este conflito

não pode ser encarado como um acontecimento isolado, mas que se revela apenas uma

pequena parte de um processo que deve ser compreendido como resultado da produção

do espaço que se realiza de forma contraditória num contexto total.

Para a realização deste trabalho, faz-se necessário aderir a certos procedimentos

metodológicos de forma a viabilizar a coleta de dados necessária para se adquirir as

informações relevantes para a pesquisa. Em um primeiro momento este trabalho

apresentará uma revisão bibliográfica que aborde discussões de alguns autores

selecionados, que podem nos servir de fundamento para a compreensão deste complexo

processo.

Devemos pensar que a apropriação de recursos naturais deve ser considerada

primeiramente como consequência da produção de mercadorias e da subordinação do

trabalho humano ao lucro através do comércio e do consumo, processo que sofreu

significativa intensificação após a década de 1970, a partir da introdução de políticas

neoliberais na economia e uma nova forma de se apropriar da natureza (ainda que seja

bom lembrar que homem e natureza não se dissociam, ou seja, o homem é também

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natureza e também é apropriado - pelo seu trabalho). Com base nas ideias de Marx

(1980) em sua obra O Capital, tentaremos elucidar algumas das características da

mercadoria, que é o elemento básico para a produção de riquezas da sociedade, agora

recursos naturais, o que nos leva à reflexão seguinte, fundamentada principalmente em

pesquisas desenvolvidas por Martínez Alier (2007), Porto-Gonçalves (2013) e

Zhouri&Laschefski (2010), sobre a relação contraditória entre os conflitos ambientais

gerados nos espaços de garimpo e os discursos políticos que sustentam o chamado

“desenvolvimento sustentável”, discurso este que também passa a ser mercadoria.

Foi realizado dois trabalhos de campo no município de Cordisburgo, para que a

partir dele se possa colher o movimento da história. Neste ponto, é importante ressaltar

as contribuições que os trabalhos de campo trazem para a ciência geográfica. Diferentes

formas de se conceber o trabalho de campo nos conduz a diferentes formas de se

interpretar o espaço. Neste sentido, não considero o campo apenas como ato de

empirismo e observação descritiva. É preciso pensar este momento para além de uma

observação neutra. Com esse trabalho de campo, pretende-se realizar uma investigação

e reflexão teórico-metodológica usando a história oral como instrumento de pesquisa. A

metodologia da história oral possibilita o registro dos próprios protagonistas no

processo como fonte documental, sendo bastante relevante na análise das representações

sociais.

Segundo Freitas (2006), a história oral é um método de pesquisa que utiliza a

técnica da entrevista e outros procedimentos articulados entre si, no registro de

narrativas da experiência humana. Assim, a história oral possui grande abrangência no

sentido de possibilitar a coleta e registros documentais de fonte oral. Um projeto de

história oral pode se desenvolver em diferentes contextos, adquirindo caráter

multidisciplinar, não se restringindo apenas ao campo da História, mas também a vários

campos de investigação das ciências sociais. É fundamental, portanto, ressaltar a

importância do homem como elemento principal para a história oral. A participação

humana direta, o contato pessoal, é o que servirá de base para o registro de dados

adequados, ainda que atualmente observa-se a presença da eletrônica na história oral

como procedimento de captação de informações. A eletrônica será então um meio, mas

jamais um fim. (MEIHY, 2005)

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Freitas (2006) também divide a história oral em três eixos de abordagem:

tradição oral, história de vida e história temática. Utilizarei para o direcionamento deste

trabalho o terceiro eixo, da história temática, que não necessariamente envolve toda a

trajetória de vida do informante, mas é direcionada a um assunto específico, possuindo,

assim, caráter temático. Esta escolha se dá pelo fato de considerar que a questão dos

cristaleiros em Cordisburgo exige uma abordagem específica para a aquisição de

informações qualificadas para o trabalho, ainda que as outras abordagens possam ser

usadas em alguns momentos.

O alcance da proposta em se trabalhar com a história oral pode ir para além de

apenas método analítico, sendo também transformação social. A história oral ganha

importância neste estudo principalmente por possibilitar ao cristaleiro ser sujeito no

processo histórico. É sabido que os grupos menos favorecidos sempre foram deixados à

margem no processo e que com isso não foram ouvidos e muito menos documentados,

sendo que muitas vezes as memórias destes grupos poderiam se constituir em registros

de valor inestimável. De acordo com Freitas (2006), a história oral abre novas

perspectivas para o entendimento do passado recente, pois amplifica vozes que não se

fariam ouvir.

É importante ressaltar que a preparação de procedimentos para a investigação de

um objeto de estudo garante uma maior qualidade na aquisição dos dados e elementos

enriquecedores em uma pesquisa, como o caso de uma entrevista semiestruturada, na

qual alguns pontos são previamente preparados de forma a conduzir o trabalho. No

entanto, acredito que a maior fonte de informações será a vivência experienciada, a

observação participante, o momento da conversa com as pessoas. Neste ponto, podemos

ressaltar as colocações feitas por Henri Lefebvre (1991) em sua obra “A vida cotidiana

no mundo moderno”, que evidencia a necessidade de se considerar o cotidiano e a

cotidianidade como um momento único de investigação das relações da nossa sociedade

na nossa época. Para o autor, a cotidianidade (e a modernidade) é produzida no

movimento de produção do espaço pela sociedade, e estas transformações nos revelam

fatos essenciais em momentos aparentemente insignificantes.

Sendo assim, o que antes poderia ser pensado como “banal”, ou “insignificante”,

passa a ser visto sob um viés diferente, sendo importante sua apreensão para o

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entendimento do mundo moderno. São nestes momentos que os valores são criados, as

verdadeiras ideias, os costumes, os sentimentos. Pesquisar um importante processo em

Cordisburgo é para mim um exercício que deve envolver todos estes fatores.

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CAPÍTULO I

REVISITANDO CONCEITOS

Neste trabalho, estamos tratando de uma questão que se manifesta em um espaço

específico, o do garimpo em uma cidade pequena, que possui suas contradições

específicas, seus processos específicos, mas que também se manifesta como

consequência de um processo maior, global, que reverbera naquele espaço sob aquela

forma. O mineral explorado neste garimpo é o quartzo, que se dispõe em boa quantidade

naquela região, através de suas variedades cristalinas. O quartzo é neste caso, portanto,

a mercadoria que mobiliza ao trabalho, é através da apropriação deste mineral que

diferentes indivíduos se envolvem no processo, transformando o espaço e a natureza,

sendo sujeitos imprescindíveis para a reprodução da lógica de acumulação capitalista. E

a comercialização e viabilidade econômica desta mercadoria só se fazem possível, pois

está subordinada às necessidades de consumo. Procuraremos nesse capítulo, com base

em uma revisão teórica, elucidar alguns aspectos que condicionam a natureza deste

processo, a partir da unidade básica que constitui a lógica da produção capitalista, a

mercadoria.

1.1 - A Mercadoria

Parece-me bastante claro que vivemos atualmente o mundo das mercadorias.

Ainda que nem toda produção seja diretamente produção de mercadorias, como por

exemplo, as relações que muitas famílias ainda têm com a produção de alimentos

voltada para o seu próprio consumo, não podemos negar a importância e o

protagonismo da mercadoria em nossa sociedade. Isso porque a existência de atividades

produtivas que não estão diretamente voltadas para a venda ou circulação comercial,

que não estão mercantilizadas, se torna de alguma forma dependente dos recursos

produzidos para a venda, e estas atividades acabam sendo absorvidas também pelo

mercado. Como pode ser possível observar em muitos casos, as atividades produtivas

tradicionais tendem a ser apropriadas pela lógica da mercadoria. Karl Marx (1980 p.41),

em sua Crítica da Economia Política, define a mercadoria como “(...) um objeto externo,

uma coisa que, por suas propriedades, satisfaz necessidades humanas, seja qual for a

natureza, a origem delas, provenham do estômago ou da fantasia”. A mercadoria pode

ser considerada sobre um duplo aspecto: qualidade e quantidade.

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A utilidade de uma mercadoria condiciona o seu valor-de-uso, que é

determinada pelas propriedades inerentes à sua composição, que a torna útil e capaz de

satisfazer uma necessidade qualquer, e é, portanto, dotada de qualidades subjetivas.

Desde que o homem passou a se apropriar da natureza, transformando-a, se produz

valores de uso. Neste sentido, não é levado em conta ainda o conteúdo de sua forma

social peculiar na sociedade burguesa, que será determinada em relação a outras

mercadorias, constituindo assim o seu valor-de-troca. O valor-de-troca de uma

mercadoria se manifesta, desta forma, através da relação entre valores-de-uso, na

relação de troca que se estabelece entre uma coisa e outra. Esta relação está

condicionada a mudanças no tempo-espaço, uma vez que as condições materiais para

reprodução da vida humana se apresentam bastante complexas e variadas.

Ao se estabelecer uma relação de troca entre as mercadorias, “põe-se de lado os

valores-de-uso” (MARX, 1980; p.44), pois há entre estas uma proporção adequada.

Sendo as mercadorias fruto da transformação humana, elas só podem ser, portanto, fruto

do trabalho humano, do dispêndio de um labor, para a realização de uma atividade.

Desconsiderando o seu valor-de-uso, apenas restará o fruto de seu trabalho, não sendo

possível mais distinguir um trabalho dos outros. O trabalho não é mais concreto, torna-

se trabalho abstrato. Neste sentido, a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o

tempo de trabalho socialmente necessário para produzir um valor de uso é o que

determinaria grandeza de seu valor, ademais, “como valores, as mercadorias são apenas

dimensões definidas de tempo e trabalho que nelas se cristaliza” (MARX, 1980, p. 46).

Podemos considerar desta forma, que a mercadoria se realiza como valor de

troca a partir do momento que esta passa a adquirir “substância criadora de valor”, que é

traduzido pelo trabalho socialmente necessário dispensado para a produção de um valor

de uso. O que está em questão neste caso é que a produção de mercadorias dentro do

sistema capitalista, ainda que venha para satisfazer as necessidades humanas, objetiva

em um primeiro momento, o lucro (BRAGA et. al., 2010; p.3).

Em sociedades com outras relações de produção, o que caracterizava o resultado

dos trabalhos era principalmente o valor-de-uso, sendo primordial a produção voltada

para o atendimento de necessidades sociais, diferentemente da sociedade capitalista, que

por outro lado tem sua produção vinculada à troca, o que significa que nesta sociedade o

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resultado do trabalho assume predominantemente a forma de mercadoria, como produto

voltado para a troca.

Isso conduz à ideia de que as necessidades humanas estão submetidas à lógica

do lucro, e que, portanto mercadorias em que são atribuídas mais acréscimo de utilidade

têm sua produção mais estimulada, fazendo com que a sua procura e seu valor final seja

maior. No entanto, uma vez que o valor é determinado pelo trabalho realizado, e não

pela utilidade atribuída em si, através de uma oferta e demanda, a substância da

mercadoria como geradora de valor guarda outros aspectos que vão para além de sua

utilidade, afinal, o que determina este valor final?

1.1.1 – O Fetichismo da mercadoria

A palavra “fetichismo” deriva de “fetiche”. “Fetiche”, em português, deriva da

palavra francesa “fétiche”, a qual, por sua vez, tem sua origem na portuguesa “feitiço”.

Essa última, por fim, remete à latina “facticius”, significando aproximadamente o

mesmo que “artificial”.

A teoria do fetichismo proposta por Karl Marx pode ser tomada como um

elemento central para o entendimento da dinâmica da mercadoria dentro das relações de

produção capitalistas. O conceito ganhou destaque principalmente em sua obra

intitulada O Capital (1867), explicitando o que ele considera ser um caráter que as

mercadorias possuem de encobrir as relações sociais de exploração do trabalho. Sendo

produto do trabalho humano, as mercadorias possuem em sua substância conteúdo

social, não sendo dessa forma apenas matéria bruta transformada. Ela reflete aos

homens as características sociais do seu próprio trabalho como características objetivas

dos próprios produtos de trabalho, como propriedades naturais sociais dessas coisas.

A mercadoria é misteriosa simplesmente por encobrir as

características sociais do próprio trabalho dos homens,

apresentando-as como características materiais e propriedades

sociais inerentes aos produtos do trabalho; por ocultar, portanto, a

relação social entre os trabalhos individuais dos produtores e o

trabalho total, ao refleti-la como relação social existente, à margem

deles, entre os produtos do seu próprio trabalho. (MARX, 1980;

p.81)

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Dito isso, temos no cerne desta questão a problemática da ideia proposta por

Marx ao discutir o fetiche da mercadoria, na qual os valores de troca esconderiam as

relações sociais advindas do trabalho produtivo, por uma idolatria do objeto exterior da

mercadoria. Os homens se relacionam com os frutos do seu trabalho, fazendo com que

estes frutos ganhem sua própria condição de existência, na qual ela se comporta

dialeticamente como um produto, em uma dimensão de seu valor de uso, e também

como uma mercadoria em um mundo de mercadorias;

[...] um mundo no qual os homens não são mais do que os veículos,

os suportes, que conduzem estas mercadorias ao mercado, mercado

este no qual estas mesmas mercadorias se relacionarão de forma

quase autônoma, uma vez que são dotadas de uma objetividade

numérica que expressa a medida de sua relação com as demais.

(FLECK, 2012; p.148.)

O fetichismo da mercadoria consistiria dessa forma, conforme proposto por

Marx, no distanciamento das relações sociais advindas do trabalho para a produção de

mercadorias, que assumem elas próprias o protagonismo no processo, não mais os

produtores. É dessa forma que o vínculo social entre os produtores é estabelecido, via

produtos do trabalho humano, dissimulado na relação entre coisas, “a força de trabalho

coloca-se nas coisas, torna-se coisa entre as coisas, mercadoria entre mercadorias”

(GAUDEMAR, 1977; p.198). Há uma inversão na finalidade da produção, uma vez que

a necessidade por alguma coisa, no sentido da utilidade, não é o que motiva sua

produção, mas sim a criação de mais valor. Buscando fazer uma conexão com o objeto

de estudo deste trabalho, penso que os cristaleiros não decidem retirar cristais da terra

por meramente achar que o mundo tenha necessidade dos produtos advindos de sua

transformação, mas sim porque aquela é sua mercadoria de troca, além da sua

mercadoria corpo e força de trabalho, que gerará o valor, materializado no dinheiro que

ele recebe.

A procura pelos cristais gera as transformações observadas naquele espaço, fruto

da valorização desta mercadoria em questão. Dentro de um contexto que podemos

considerar como globalizado, os cristais servem como matéria bruta para a produção de

diversos artigos, como os eletrônicos, ter e certamente esta demanda e valorização deste

tipo de mercadoria corresponde a processos únicos deste período histórico, não vistos

em outros períodos da sociedade, ainda que a apropriação de recursos e sua

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transformação em mercadorias tenham sido a base da produção capitalista desde sua

origem. Deste processo temos a base para conflitos que se materializam no território,

evidenciando as diferentes perspectivas que os diversos sujeitos se apropriam do

espaço.

1.2 - A apropriação do trabalho humano e da natureza como mercadoria

Neste ponto da discussão, tentarei apontar um direcionamento de como as

relações que os humanos estabelecem entre si e com a natureza se constituiu através dos

tempos históricos dentro do contexto capitalista. Tentarei explicitar, com base nas

discussões apresentados por Porto-Gonçalves (2013), Santos (1996; 2011), Harvey

(1996), dentre outros autores, os diversos períodos do processo de globalização que a

sociedade vivenciou. Considero que este exercício de compreensão será importante para

se apreender o contexto em que se encontra o debate dos paradigmas relacionados à

chamada questão ambiental atualmente, que procuro destacar no tópico seguinte deste

capítulo.

A apropriação de elementos da natureza com o intuito de sua transformação em

objetos úteis não é uma característica exclusiva do sistema de produção capitalista.

Podemos dizer que desde os tempos mais primórdios o homem já transformava a

natureza através de seu trabalho, por meio da caça, da coleta, da agricultura, dentre

outros. Neste sentido, ainda que não houvesse a prioridade da produção com o objetivo

de se criar mercadorias capazes de troca, já havia a presença da técnica, de

conhecimentos que possibilitaram a reprodução do modo de vida e transformação do

mundo a sua volta. Não existe sociedade sem técnica, afinal é daí que a sociedade

realiza determinados procedimentos com determinados fins. No entanto, temos a partir

da universalização do capitalismo uma nova dinâmica na sociedade que, dentre vários

outros aspectos, desencadeia em uma nova forma de relação entre sujeitos e os objetos

frutos do trabalho humano, na qual estes objetos passam a ganhar cada vez mais

protagonismo e as relações sociais passam a ser cada vez mais mediadas pelas coisas.

Como argumenta Porto-Gonçalves (2013, p.77) quando analisa os limites da

técnica, é certo que nem todas as sociedades têm/tiveram a mesma relação que a

sociedade capitalista tem com as técnicas. Esse novo momento que é produzido dentro

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da lógica de produção do capitalista pode ser considerado como o momento da

globalização. A globalização, como comenta Milton Santos (2001), seria “o ápice do

processo de internacionalização do mundo capitalista” através de um “estado das

técnicas e o estado da política” (SANTOS 2001; p.23).

Diz Porto-Gonçalves (2013) que passamos por quatro períodos principais de

globalização, e que estes períodos não são superados um por outros, através de uma

evolução linear de acontecimentos, mas se sobrepõem, de forma que encontramos estes

momentos imbricados uns aos outros. Para o autor, a partir do padrão de poder que foi

estabelecido em 1492, com a descoberta da América, é que podemos considerar a

origem do mundo globalizado, pois é a partir deste momento que “(...) passamos a ter

uma história e uma geografia verdadeiramente mundiais, cada vez mais se impondo às

histórias regionais ou, pelo menos, as condicionando” (PORTO-GONÇALVES, 2013;

p.24).

É importante atentar para a expressão padrão de poder que é cunhada pelo autor,

pois esta denota justamente a relação que é estabelecida desde então. A mundialização,

ou globalização, muitas vezes é interpretada como uma relação de interdependência

entre povos em uma escala global. Ainda que esta noção não esteja equivocada em sua

totalidade, ela se apresenta incompleta por omitir os caminhos traçados nesse percurso.

Estamos de fato diante de um novo mundo após 1492, em que se acentua a dependência

entre os países, na medida em que se acentuam as relações mercantilistas. O que não

quer dizer que esta interdependência se apresenta de forma neutra, homogênea, apenas

como fruto de uma troca de necessidades. É importante atentar que esta “(...)

interdependência está organizada com base num sistema de relações hierárquicas de

poder”, afinal existem os colonizadores e os colonizados, os senhores e os escravos, os

patrões e os empregados, e que desta forma

[...] o processo de globalização traz em si mesmo a globalização da

exploração da natureza com proveitos e rejeitos distribuídos

desigualmente. [...] junto com o processo de globalização há, ao

mesmo tempo, a dominação da natureza e a dominação de alguns

homens sobre outros homens. (PORTO-GONÇALVES, 2013;

p.25.)

O sistema-mundo moderno-colonial, como se refere o autor a este novo

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momento da sociedade, foi assim construído a partir de uma relação de exploração e

apropriação de recursos e pessoas, e que pode ser considerado como o alicerce do que

Porto-Gonçalves entende vir a ser o momento seguinte, em que a evolução dos sistemas

técnicos possibilitou o uso das máquinas a vapor, principalmente a partir do século

XVIII. Ainda que a estrutura moderno-colonial nunca tenha sido superada, nem mesmo

nos dias atuais, neste momento a geografia mundial sofrerá significativas

transformações.

A revolução oriunda do uso das máquinas a vapor possibilitou um aumento

considerável na produção de energia (em seu sentido físico, mas também no sentido do

trabalho humano), e consequentemente na transformação mais intensa de matéria. Com

as condições técnicas postas, as condições políticas se assentam, e o controle da

natureza se faz necessário. A superação de distâncias através de sistemas de transportes

cada vez mais complexos fez com que a exploração da natureza e as relações espaciais

atingissem outros níveis. Porto-Gonçalves chama este momento de fossilista-

imperialista (2013, p.26), dentro de um contexto de exploração acentuada de recursos

fósseis através de uma relação imperialista de dominação. A ciência e os saberes

humanos cada vez mais livres dos dogmatismos religiosos alimentam a lógica da

dominação, uma vez que a compreensão das coisas e do funcionamento da natureza

autorizaria o ser humano a controlá-la e dominá-la. O ser humano deixa de ser

natureza, passa a ser apenas homem, que enxerga na natureza seu objeto, seu recurso

passível de apropriação.

O surgimento de grandes grupos empresariais acirra as disputas e a necessidade

de produção de mercadorias, e a natureza passa a ser então mercantilizada em quase

todos os aspectos da vida. Este processo se dá através de um fluxo que direciona

principalmente os recursos encontrados na África, Ásia e América Latina em direção

aos países europeus, detentores da hierarquia econômica, à custa de uma exploração

devastadora que ocasionam desordens e desacertos que são impostos por esse modo de

produção. Como podemos observar o colonialismo desta forma não se encerra, mas

ganha contornos de imperialismo. Como afirma Porto-Gonçalves, “A busca incessante

do lucro por meio do aumento da produtividade [...] se crê independente e acima do

fluxo de matéria e energia do planeta [...] de cada contexto geocultural e social

específico” (PORTO-GONÇALVES, 2013; p.31).

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Como ressalta Milton Santos (2001, p.33), existem os momentos em que se

comprometem as ordens estabelecidas, e manifestam-se as crises. No capitalismo, as

lutas trabalhistas, a crise do liberalismo de 1929, dentre outros, começa a colocar em

questão os limites do capital, ainda que os limites da natureza, dentro da lógica de sua

exploração ainda não eram situados como problema central. O modelo fordista, modelo

de desenvolvimento gestado durante a Segunda Revolução Industrial, emerge a partir da

década de 1930, e consolida-se principalmente após o fim da Segunda Guerra Mundial.

Este período pode ser compreendido através da articulação entre produção e consumo

em massa, padronização dos equipamentos de produção e produtos, através de um novo

sistema de reprodução da força de trabalho, de controle e gerência do trabalho, num

contexto de construção de um novo tipo de sociedade (HARVEY, 1996). Baseou-se em

um idealizado capitalismo popular (PORTO-GONÇALVES, 2013; p.32), com as linhas

de montagem e produção em série, com total dinamização entre intermediários,

fabricantes e trabalhadores, aumentando a produção e o consumo.

A resposta capitalista às crises seria, portanto, uma afirmação ainda mais concisa

de sua possibilidade de existência, na qual os problemas reivindicados pelas lutas

trabalhistas poderiam ser resolvidos através de mais produtividade, em uma

complementaridade entre trabalho e capital e com ausência da interferência do estado.

Comenta Porto-Gonçalves (2013; p. 34), que este é o período que consagrou a chamada

sociedade de consumo de massas, ainda que este termo omita o fato de que este

consumo de massa não atinge todo o mundo com a mesma medida.

Segundo o autor, este período também é marcado por “um novo padrão

internacional de poder que se configura com a importância cada vez maior das grandes

corporações empresariais transnacionais” (2013; p.34), fazendo com que o capital

financeiro se torne hegemônico, acentuando ainda mais as desigualdades entre os países

dominantes e os países dominados, na medida em que aumentam as dívidas contraídas

por estes últimos. Como afirma Quijano (apud PORTO-GONÇALVES, 2013; p. 37),

“está em curso um processo de reconcentração do controle de recursos, bens e rendas

em mãos de uma minoria reduzida da espécie, atualmente não mais do que 20%”. Dado

o cenário de total dependência econômica de países pobres em relação aos países ricos

através de dívidas externas, “(...) organismos financeiros internacionais impõem

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políticas de ajuste estrutural que, no fundo, agravam a pilhagem de recursos naturais e

os problemas ambientais.” (PORTO-GONÇALVES, 2013; p. 38). Parece prudente dizer

que este período foi extremamente lucrativo para os países industrializados, ao passo

que aumentou a dependência econômica dos países mais pobres em relação a estes.

O que foi exposto acima nos mostra como o capitalismo (e a Globalização) se

desenvolveram com base em relações de exploração e pela desigualdade de forças, não

perdendo as características de seus diversos momentos, mas sim se adaptando e

apropriando de novas formas de (re)produção. É consenso para alguns autores que

estamos atravessando um momento específico dentro do modo de produção capitalista,

que se iniciou a partir de meados da década de 1970. Milton Santos denominou este

momento de período técnico-científico-informacional (SANTOS 1996). Para o autor

este período pode ser caracterizado pela aplicação da ciência à técnica - por isto meio

técnico científico - mas este meio e estas técnicas impregnadas de informação, que tem

seu papel cada vez mais aprofundado dentro dos sistemas produtivos.

Porto-Gonçalves considera este período como o período de Globalização

Neoliberal (2013, p.38), no qual a acentuação da dependência econômica dos países do

chamado Terceiro Mundo em relação aos países industrializados atinge níveis bastante

altos. É importante considerar neste caso que a base produtiva dos países

industrializados é constituída principalmente das matérias-primas, ou recursos naturais,

retirados dos países do Terceiro Mundo e daí a apropriação desses territórios – trabalho

humano e natureza - até os seus limites.

Esta base é fundamental para a manutenção do modo de vida que se estabelecerá

nestes países dentro deste “novo” mundo informacional, ainda que as relações

colonialistas, imperialistas e fossilistas permaneçam ali. Está em questão, neste caso, a

relação perversa que a globalização impõe na base da vida social, na medida em que se

legitimam ações constitutivas de um cenário de desigualdade por parte de poderes

estatais e privados. A ideia de um mundo moderno, informatizado, aldeia global, que

nos é imposto por estes grupos através de uma ideia enlatada de desenvolvimento,

avanço, é por si só uma mercadoria a circular, e esconde os processos que as constroem.

A matéria-prima tem que virar produto. O produto tem de ser comercializado. Assim, o

que sobra para as populações que estão à margem senão o trabalho?

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Deste modo, o esforço (energia, literalmente) desses países nessa

direção significa, na prática, ampla utilização de recursos naturais,

muitos não renováveis, como os minerais, com a sua depleção, o

que está implicando o avanço sobre áreas ocupadas

originariamente por populações de outras matrizes culturais [...]

configurando uma geografia desigual dos proveitos e dos rejeitos

dessa ordem-desordem mundial, dramática para a maior parte da

população das regiões que causam menor pegada ecológica sobre o

planeta. (PORTO-GONÇALVES, 2013; p.46)

A insustentabilidade de um modelo que pressupõe o controle e apropriação da

natureza como forma de desenvolvimento econômico me parece clara quando

observamos esta disparidade. Sendo assim, este período de globalização neoliberal que

se constituiu a partir da década de 1970 também fizeram emergir os questionamentos ao

sistema econômico vigente, no que tange às relações de trabalho e ao desafio ambiental

resultado da apropriação indiscriminada do trabalho de homens e mulheres. Como

argumenta Porto-Gonçalves “(...) até os anos 1960, a dominação da natureza não era

uma questão, e sim uma solução – o desenvolvimento. É a partir desse período que se

coloca explicitamente a questão ambiental.” (2013, p.51). Todavia, a força do discurso

desenvolvimentista não impediu que os questionamentos e os debates que daí emergiu

conseguissem superar as amarras do capital.

1.3 – Os conflitos ambientais e o paradigma do “desenvolvimento sustentável”

Como debatido no tópico anterior, os debates sobre uma nova ética para a

sociedade humana começaram a ser colocados em questão principalmente a partir da

década de 1970, momento em que os impactos ambientais em escala global colocavam

em cheque o modelo predatório de desenvolvimento vigente. Diversos grupos, tal quais

ambientalistas, ecologistas, passam a vislumbrar saídas a essa crise, que se revela não

apenas uma crise ambiental, mas uma crise política, na medida em que um modelo de

sociedade como um todo passa a ser questionado, assim como seus hábitos e suas

culturas. No entanto, como afirma Martínez Alier (2007), em termos cronológicos e de

organização, podemos considerar que correntes preservacionistas, que viam no culto à

vida silvestre a saída para os problemas ambientais que se desenvolviam no seio da

sociedade capitalista os primeiros a colocarem em evidência tais impactos.

Esta corrente de pensamento não considerava, no entanto, a relação homem-

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natureza em sua totalidade, separando-os sumariamente, por exemplo, através de

criação de Parques Ecológicos, verdadeiros santuários de natureza. Surge, então, o mito

moderno da natureza da natureza intocada, como aponta Antônio Carlos Diegues

(2001). Dessa forma, os primeiros conservacionistas pareciam recriar e reinterpretar o

mito do paraíso terrestre mediante a criação dos parques nacionais desabitados, onde o

homem poderia contemplar as belezas da Natureza. (Diegues, 2001).

Neste sentido o culto à vida silvestre não trava um embate direto com o

crescimento econômico, o desenvolvimento pressuposto pelo capitalismo, e de certa

forma até admite sua condição secundária frente ao poder econômico, como também

ressalta Martínez Alier (2007). Ainda que essa corrente coloque em consideração a

necessidade de se preservar e manter o que resta de espaços de natureza original.

Outra corrente ecologista, que Martínez Alier (2007, p.26) refere-se como

“evangelho da ecoeficiência”, emerge como alternativa ao conceito de natureza

intocada, por um viés que busca a compreensão dos efeitos do crescimento econômico,

não apenas nas áreas de natureza original, mas também em sua relação com as

economias industriais, agrícolas e urbanas. Esta corrente, segundo Martínez Alier;

Acredita no “desenvolvimento sustentável”, na

“modernização ecológica” e na “boa utilização” dos recursos.

Preocupa-se com os impactos da produção de bens e com o

manejo sustentável dos recursos naturais, e não tanto pela

perda dos atrativos da natureza ou dos seus valores

intrínsecos. (MARTÍNEZ ALIER, 2007; p.26-27)

É interessante observar, ao analisar as relações do/no meio ambiente sob este

viés, que a palavra recurso natural acaba ganhando destaque. De acordo com Portugal

(1992), os recursos naturais são matérias e energia que a natureza coloca a disposição,

para que transformando ou usando-as diretamente, o ser humano possa sobreviver e ter

qualidade de vida. Observa-se assim uma relação utilitarista e econômica dos elementos

naturais, e neste sentido os ecologistas que viam na preservação de santuários

ecológicos uma forma de resistência ao descaso ambiental capitalista passaram a ser

considerados sonhadores e ingênuos, e assim opositores do progresso. (ZHOURI et al.

2005; p.13)

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Surgiram então as bases para as discussões em torno do conceito de

“desenvolvimento sustentável”, que ganharam força no fim da década de 1980,

principalmente com o Relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial sobre o

Meio Ambiente e Desenvolvimento em 1987. Este documento foi fundamental ao

reforçar a necessidade de buscar continuadamente o desenvolvimento econômico, mas

em consonância com a diminuição contínua das desigualdades sociais e da preservação

dos recursos disponíveis, explorando racionalmente dentro de regulamentações e

também através de debates, inclusive com os mais diretamente afetados no processo.

Podemos citar fóruns internacionais, nacionais, mecanismos de licenciamento

ambiental, criação de instituições ambientais, dentre outras formas de tratar sobre o

tema. Neste sentido uma série de atribuições políticas e normas regulatórias se fizeram

necessárias, no âmbito estatal e federal, com meta de se atingir um equilíbrio e a gestão

adequada dos recursos. Além disso, definiu três princípios básicos a serem cumpridos:

desenvolvimento econômico, proteção ambiental e equidade social.

Chegamos neste ponto da discussão a um fator bastante importante na análise

das condições atuais dos garimpos, foco deste estudo; a ideia de progresso dentro da

lógica do capital não foi superada, ainda que os problemas ambientais se agravassem.

Voltamos novamente à noção de adaptação que o capitalismo tem para se reproduzir.

Como o próprio conceito de Martinez Alier nos aponta – “eco eficiência” – o que está

em jogo ainda são a produtividade, a eficácia, o lucro, a dinamização do trabalho, mas

agora embasados por uma suposta gestão racional de recursos no qual se tem a busca

por ganhos econômicos e ganhos ecológicos.

O conceito de desenvolvimento sustentável tem, é claro,

limites – não limites absolutos, mas limitações impostas pelo

estágio atual da tecnologia e da organização social, no

tocante aos recursos ambientais, e pela capacidade da

biosfera de absorver os efeitos da atividade humana. Mas

tanto a tecnologia quanto a organização social podem ser

geridas e aprimoradas a fim de proporcionar uma nova era de

crescimento econômico (CMMAD, 1991; p.9 apud

Zhouri&Laschefski, 2010, p.14).

No entanto, a regulamentação e a adoção de políticas públicas a partir de então

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não reduziu as desigualdades e os conflitos na passagem do século XX para o século

XXI, podendo ser relatados ainda inúmeros problemas que não encontraram soluções

concretas. Martínez Alier (2007) salienta que as conseqüências oriundas do crescimento

econômico e da exploração do homem/natureza não podem ser totalmente solucionadas

através de políticas públicas e inovações tecnológicas. Sua argumentação vai de

encontro à discussão proposta por Porto-Gonçalves (2013) e enfatizada anteriormente

neste trabalho, que nos mostra que os impactos positivos e negativos provenientes deste

processo atingem de forma desigual os grupos envolvidos.

Os problemas da sociedade humana, que não tiveram grandes soluções mesmo

com o aumento do debate, apontam desta maneira para uma apropriação do discurso do

desenvolvimento sustentável para práticas que não vão além de uma nova roupagem

para a velha forma de se conceber o desenvolvimento. As concepções que sustentavam

a ideia de uma mudança radical no modelo urbano-social-capitalista e sua lógica

desenvolvimentista foram perdendo terreno para os novos modelos que pensavam em

“adequações” dentro da cadeia produtiva, tendo como resultado um conceito de

desenvolvimento (sustentável) que é dominante no discurso, como nos mostra Eder

Jurandir Carneiro;

[...] a quase totalidade dos discursos e práticas voltados para a

construção socialmente legitimada da chamada “questão

ambiental” ancora-se na noção de “desenvolvimento

sustentável”. De pequenos projetos locais de “educação

ambiental” a conferências e acordos internacionais sobre

biodiversidade ou redução dos níveis de emissão de gases de

estufa; de projetos específicos, envolvendo “parcerias” de

grandes mineradoras com ONGs conservacionistas à criação

de normas legais e agências públicas de “política ambiental”,

todos evocavam e ainda evocam o “desenvolvimento

sustentável” como fórmula consensual de caução e

legitimidade. (CARNEIRO, 2005; p.65)

Neste sentido, a apropriação de técnicas e procedimentos através de uma noção

de desenvolvimento sustentável encontrará embates em situações em que uso de

determinados espaços se tornam conflituosos. Os conflitos ambientais emergem em

escala local através dos mecanismos que buscam regular as atividades e o acesso aos

recursos naturais. Os embates pelo uso da natureza se faz presente devido às diferentes

leituras que são atribuídas pelos diversos sujeitos sociais que reproduzem o espaço.

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Dessa forma, os desacertos oriundos de um processo de escala global, como a

chamada “dívida ecológica” que desloca os recursos para os países mais

industrializados, ou mesmo situações de desemprego estrutural que mobiliza

trabalhadores para o setor informal, condicionam a natureza do conflito.

A perseguição aos cristaleiros, vistos como agentes diretos da destruição do

meio ambiente, agentes da violação dos direitos da propriedade privada apenas endossa

o discurso preservacionista e ecodesenvolvimentista, ainda que a manutenção desse

discurso indique pouca transformação e benefício para o cristaleiro, já que em muitos

desses casos lhe é privado a venda de sua mercadoria força-de-trabalho.

No capítulo III desse trabalho irei destacar esta questão mais profundamente,

analisando como esses fatores interferem no contexto do município de Cordisburgo.

Para tanto, julgo importante apresentar primeiramente essa localidade, sua história, seus

aspectos físicos e conjuntura socioeconômica atual. Este pequeno exercício de

contextualização é importante para uma melhor espacialização da geografia local.

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CAPÍTULO II

BREVE ANÁLISE SOBRE CORDSIBURGO-MG

Cordisburgo era pequenina terra sertaneja, trás

montanhas no meio de Minas Gerais. Só quase

lugar, mas tão de repente, bonita.

João Guimarães Rosa

2.1 – O povoado de Vista Alegre: O início de Cordisburgo1

A região onde hoje se situa o município de Cordisburgo esteve em um primeiro

momento relacionado à atividade desbravadora por bandeirantes e assentamentos de

pequenos fazendeiros que se apossaram de terras hoje pertencentes ao território

municipal. Em meados de 1883 o Padre João de Santo Antônio, oriundo do distrito de

Morro Vermelho, em Caeté, chega à região, conhecida como Arraial do Saco dos

Cochos, fundando ali uma povoação e denominando-a de Coração de Jesus da Vista

Alegre; alusão ao panorama de belas paisagens naturais que encontrara.

As terras utilizadas para o assentamento do povoado estavam em litígio, e foram

adquiridas por Bernardo de Mascarenhas, oriundo de família detentora de grandes

posses, que transferiu em escritura pública e repassou ao sacerdote quarenta alqueires de

terra para o crescimento do povoado.

Um dos marcos da fundação do povoado e assentamento de pessoas foi a

construção da Capela dedicada ao Patriarca São José, no ano de 1884, e o início da

construção da Igreja do Sagrado Coração de Jesus no ano de 1885, que foi finalizada em

1894. O povoado de Vista Alegre se elevou à condição de distrito no ano de 1890,

através de um decreto do então governador de Minas, João Pinheiro da Silva, passando

então o povoado de Coração de Jesus da Vista Alegre a ser reconhecido como distrito

de Cordisburgo da Vista Alegre, município de Sete Lagoas.

1

Tais informações sobre a história do município tiveram como fonte principal o site oficial de

Cordisburgo, mas também são resultados de conversas com moradores mais antigos. Acesso ao site

oficial em <http://www.cordisburgo.mg.gov.br/portal1/municipio/historia.asp?iIdMun=100131210>

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32

O ano de 1904 marca uma importante reestruturação na dinâmica local de

Cordisburgo da Vista Alegre, quando é inaugurado o complexo ferroviário na cidade,

segmento da linha férrea Central do Brasil. Antes deste período, haviam poucas

residências esparsas, que passaram então a compartilhar o espaço com novas

residências, muitas de funcionários da Estação, e estabelecimentos comerciais,

principalmente no entorno da Estação. Ainda hoje essa é a região central da cidade,

onde se encontram diversos estabelecimentos residenciais e comerciais, novos ou

antigos e que funciona como um atrativo e local de encontro para a população na busca

por lazer. A avenida principal da cidade leva hoje o nome de Avenida Padre João.

O distrito foi incorporado ao município de Paraopeba no ano de 1911. Em 1923

o nome do distrito é alterado, passando a se chamar apenas Cordisburgo. Por fim,

Cordisburgo consegue sua emancipação no ano de 1938, compreendendo o distrito sede,

e os distritos de Lagoa, atualmente conhecida como Lagoa Bonita e ainda sede distrital

de Cordisburgo, e Traíras, atualmente conhecida como Santana de Pirapama, (já

desmembrada e emancipada).

2.2 – Dados gerais do município

O município de Cordisburgo encontra-se na região centro-norte do estado de

Minas Gerais, mais precisamente na microrregião de Sete Lagoas. Está situado a 120

km de distância da capital Belo Horizonte pelas rodovias BR-040 e MG-231. Tem como

municípios vizinhos Santana de Pirapama, Curvelo, Paraopeba, Caetanópolis, Jequitibá

e Araçaí.

Estima-se em Cordisburgo uma população de cerca de 8.667 habitantes (IBGE,

2010) distribuídos irregularmente em uma área de 823,654 km2 entre o núcleo urbano

principal (distrito sede), o distrito de Lagoa Bonita e outros povoados e lugarejos. São

eles o povoado de Barra do Luiz Pereira, o povoado de São José das Lages e os

lugarejos do Onça, Cuba, Murundus, Bagagem, Periquito, São Tomé, Bálsamo,

Diamante, Riacho Comprido, Cinza, Maquinezinho, Marinhos, Barra das Canoas, Brejo

do Gustavo, Brejo Alegre, Morro Grande, Agreste, Agrestão e Capão do Gado.

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33

A população rural do município é de 2.706 habitantes (31,22% da população total) e a

população urbana de 5.961 habitantes (68,78% da população total). Dentre a população

residente, contabiliza-se 4.435 homens e 4.232 mulheres. O IDH – Índice de

Desenvolvimento Humano é de 0,733 e a média salarial dos homens é de R$ 399,80 e

das mulheres é de R$ 281,64 de acordo com os dados do IBGE de 2011.

Figura 1: Mapa de localização do município de Cordisburgo-MG

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34

2.3 – Aspectos socioambientais

Não é de interesse desse presente estudo dialogar propriamente sobre aspectos

geológicos/geomorfológicos, assim como sobre a vegetação da região. No entanto,

penso ser pertinente uma breve contextualização.

Do ponto de vista geológico, a região está localizada nos conjuntos de rochas do

Grupo Bambuí (subgrupo Paraopeba). Cordisburgo ocupa uma posição de destaque na

ocorrência de extensas áreas de calcário (TRAVASSOS, 2010), promovendo formações

cársticas na paisagem, com suas feições geomorfológicas características, como grutas,

dolinas, lapiés, entre outras, que são esculpidas pela ação das intempéries ao longo do

tempo. Estas formações são derivadas de fenômenos de dissolução que resultam em

intensa circulação fluvial subterrânea, carência de cursos de água de superfície e

depressões fechadas.

A área insere-se na Unidade Geomorfológica conhecida como Depressão

Sanfranciscana, (Boaventura et al. 1977, apud TEIXEIRA DA SILVA, 2002). Esta

unidade caracteriza-se por situar-se na plataforma do rio São Francisco, área cratônica

que compreende desde o centro-norte mineiro, avançando pela Bahia. Estas áreas

correspondem a antigos terrenos que já sofreram vários processos erosivos, e que

possuem grande complexidade litológica, com destaque para rochas de origem

metamórficas. A cidade está inserida também na sub-bacia do Rio das Velhas, em seu

médio curso. Um importante afluente do Rio das Velhas, o Ribeirão da Onça, tem seu

curso inserido dentro do município de Cordisburgo, e o próprio Rio das Velhas

representa o limite municipal entre Cordisburgo e Jequitibá, e Cordisburgo e Santana de

Pirapama.

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35

Figura 2: Localização da bacia do Rio das Velhas em Minas Gerais e municípios

correspondentes

Fonte: Projeto Manuelzão

O clima é caracterizado como semiúmido, e suas temperaturas médias variam

com a latitude, sendo a média anual de 22,1°C, a média máxima anual de 29,2°C e a

média mínima anual de 16,4°C. O índice pluviométrico anual é de 1230,3mm.

O município possui uma vegetação composta por capoeira, cerrado e campos. A

predominante é o cerrado, e de acordo com informações do Plano de Manejo elaborado

pelo IEF para o município. Nas partes mais baixas ele se apresenta denso e com árvores

de maior porte. Próximo aos cursos d’água sua vegetação é composta por mata ciliar.

Sobre os afloramentos calcários desenvolve-se a Floresta Estacional Decidual, também

conhecida como vegetação de “mata seca” (Piló, 1998).

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36

A COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais – é a responsável

pelo abastecimento e distribuição da água do município. A água é tratada e captada por

poços artesianos, sendo que apenas o distrito de Lagoa Bonita é atendido nas zonas

rurais, o que faz com que nos demais povoados o abastecimento de água aconteça por

captação em córregos e cisternas.

Dos 2.690 domicílios particulares permanentes registrados no município pelo

IBGE, 29,8% possuem saneamento do tipo adequado, 41,1% semiadequado, e 29,1% do

tipo inadequado. Analisando a incidência de domicílios inadequados nas áreas urbanas e

rurais do município, temos uma discrepância nos resultados, que nos mostram um valor

de 1,2% de domicílios considerados inadequados na área urbana, e 87,8% de domicílios

considerados inadequados na área rural.

De acordo com informações encontradas no Plano para Incremento do

Percentual de Esgotamento Sanitário da Bacia do Rio das Velhas (FEAM, 2010), o

município conta com duas estações para tratamento de esgoto. No entanto, as

ETEsencontram-se em situação precária de funcionamento. Ademais, o município não

recebe verbas de imposto vinculadas ao ICMS ecológico, uma vez que não possui

Licença de Operação (LO) ou Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF). A

ausência de instrumentos legais de regulamentação e gestão como plano diretor

integrado de saneamento básico dificulta melhorias no serviço.

O manejo dos resíduos sólidos é realizado pela prefeitura sem coleta seletiva e

dispensado em aterros convencionais. Estes aspectos nos indicam que políticas públicas

no sentido de desenvolver um manejo adequado dos rejeitos são bastante precárias no

município.

2.4 – Condições educacionais

O município conta com uma escola pré-escolar, quatorze escolas de ensino

fundamental e uma escola que atende o nível médio, situada na cidade. Os estudantes

residentes nas áreas rurais fazem o trajeto diário até a cidade de Cordisburgo para o

acesso à escola por meio de um ônibus escolar cedido pela prefeitura. Em relação ao

número de docentes, constam-se 19 docentes para o ensino pré-escolar, 69 para o ensino

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37

fundamental e 12 para o ensino médio. Em Cordisburgo estão matriculados um total de

1425 alunos, considerando todos os níveis de ensino (INEP, 2012).

Segundo os indicadores sociais do censo de 2010 do IBGE, a taxa de

analfabetismo da população de Cordisburgo acima dos 15 anos de idade é de 10,8%.

Em comparação ao censo realizado no ano 2000, essa taxa diminuiu. Neste período, os

indicadores registravam uma maior incidência de moradores com leitura e escrita

insuficientes, valor que ficava em 13,7%.

Quadro 1: Taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais de idade no

município de Cordisburgo – 2000 e 2010

Taxa de analfabetismo da

população de 15 anos ou

mais de idade – 2000

13,7%

Taxa de analfabetismo da

população de 15 anos ou

mais de idade – 2010

10,8%

Fonte: IBGE. Acesso em <http://cod.ibge.gov.br/1131C>

Ainda que se constate uma redução neste indicador social, ainda sim é relevante

ponderar que esse valor de 10,8% pode ser considerado como sendo bastante elevado, e

aponta para a necessidade de melhores investimentos no campo educacional. Por

exemplo, parece-me importante a efetivação de programas de expansão do ensino médio

para as escolas das áreas rurais, ampliação da oferta de ensino para jovens e adultos e

aumento do número de escolas pré-escolares, dentre outros aspectos.

Outro dado estatístico que enfatiza esta demanda pode ser analisado no gráfico

1, que ilustra em números absolutos o nível de instrução da população local. Nesse

gráfico podemos verificar o predomínio de pessoas que possuem no máximo o ensino

fundamental incompleto. Constata-se, portanto, a baixa escolaridade, de uma forma

geral, da população do município.

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38

Gráfico 1: Pessoas com 10 anos ou mais de idade por nível de instrução

Fonte: IBGE. Censo demográfico 2010

2.5 – Economia e Emprego

Em Cordisburgo as principais atividades econômicas encontradas são o

comércio, a pecuária, a agricultura e o turismo. As atividades comerciais são variadas,

englobando lojas diversas, padarias, supermercados, bares, dentre outras. Tem crescido

na cidade a presença de lojas especializadas em telefonia móvel, e comerciantes que

dedicam um espaço de seus estabelecimentos para a venda de produtos eletrônicos.

Alguns destes estabelecimentos são antigos, sendo considerados tradicionais na cidade.

Em uma conversa com um destes proprietários, foi-me relatado que parte da população

tem o hábito de realizar compras em Sete Lagoas, o que prejudica a economia local,

uma vez que o dinheiro deixa de estar em circulação no município.

A produção agrícola é incrementada principalmente pelas atividades de

silvicultura, da produção de cana-de-açúcar e cultivo de frutíferas, como abacate,

banana, goiaba, laranja, limão (IBGE, 2010). A atividade da silvicultura possui grande

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

Sem instrução/EnsinoFundamentalincompleto

Ensino Fundamentalcompleto/Ensino

Médio incompleto

Ensino Médiocompleto/Superior

Incompleto

Ensino Superiorcompleto

Pessoas com 10 anos ou mais de idade por nível de instrução

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representatividade na produção de carvão, e compõe um elemento marcante nas

propriedades agrícolas no entorno da cidade, podendo ser vistas em vários pontos,

constituindo um elemento marcante na paisagem do município. Segundo dados do MTE

(2011), o número de empregos formais no setor agropecuário no município foi de 138

pessoas para o ano de 2011.

Em relação ao turismo, destacam-se no município duas atrações pertencentes a

circuitos turísticos distintos; o Museu Casa Guimarães Rosa, pertencente ao Circuito

Guimarães Rosa e a Gruta do Maquiné, pertencente ao Circuito das Grutas.

O Museu está localizado na avenida principal da cidade, e conta com atividades

relacionadas à memória da vida e obra do escritor Guimarães Rosa, através de visitação

guiada e da narração de estórias do escritor por grupos organizados locais – em especial,

podemos citar o Grupo Miguilim.

A Gruta do Maquiné está localizada a cinco quilômetros do centro da cidade,

através de uma rodovia asfaltada e em boas condições de manutenção. A Gruta está

inserida desde 2005 na Unidade de Conservação Monumento Nacional Peter Lund,

criada pelo Instituto Estadual de Florestas – IEF.2 Ambas as atividades turísticas

empregam a população local em diversos setores, contudo, sua magnitude ainda não é

suficiente para gerar trabalho e renda para um número expressivo de pessoas.

O setor industrial da cidade é pouco significativo. Segundo dados do censo de

2010, o município de Cordisburgo não conta com nenhuma indústria de alta ou médio-

alta tecnologia.

O funcionalismo público também contribui com a movimentação econômica

municipal, e oferece salários que variam entre um a três salários mínimos.

Ainda segundo o mesmo censo, a taxa de desemprego no município gira em

2

Esta questão será discutida com maiores detalhes, analisando os usos distintos desta UC, no capítulo

III. Isso devido ao fato de acontecer atividade cristaleira dentro da zona de amortecimento da UC,

gerando conflitos pela exploração dos recursos.

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torno de 4,8%. No entanto, este dado choca-se com os resultados obtidos na

investigação da vinculação dos trabalhadores com seus empregos. Segundo o censo, o

percentual de empregados sem carteira de trabalho assinada está em 47,9%.

A interpretação e análise das informações registradas nesse capítulo servem

desta forma, para pensarmos um pouco sobre dinâmica espacial de Cordisburgo. A

cidade, assim como muitas outras cidades de pequeno porte no Brasil, enfrenta os

problemas decorrentes de um processo de globalização que reestrutura os modos de

produção, estabelecendo impactos que são, em maior ou em menor medida, sentidos

pela população (CORRÊA, 1999). O panorama apresentado indica que as condições de

educação, saneamento e trabalho no município precisam de melhorias para atender a

todos com maior qualidade. Esses desafios são recorrentes nos pequenos centros

urbanos. A fim de identificar quais as impressões sobre este processo é que se faz

importante uma maior compreensão de determinados fenômenos que se manifestam

localmente, como é o caso dos garimpos de cristais. Estaria este processo em alguma

medida condicionado aos aspectos acima referidos, como as condições da economia

local e as condições de trabalho?

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41

CAPÍTULO III

A EXTRAÇÃO DE CRISTAIS EM CORDISBURGO

3.1 – Registros de Campo

Para contribuir com a realização deste capítulo, foram realizados dois trabalhos

de campo no município, em datas distintas; a primeira no período de 17 a 22 de abril, e

a segunda entre os dias 30 de abril a 5 de maio, no ano de 2014. Os trabalhos de campo

tiveram como intuito uma maior aproximação com o tema proposto nessa pesquisa,

através de entrevistas que foram agendadas previamente, visitas in loco das áreas de

garimpo, e registros fotográficos nestas áreas.

Durante este período, foi possível entrevistar formalmente cinco moradores que

exercem ou já exerceram a atividade cristaleira em Cordisburgo. Dos cinco moradores

entrevistados, apenas dois ainda realizam o trabalho de garimpagem no município,

enquanto outros três tiveram experiências em um passado recente, mas que já estão em

outras ocupações. Também foram entrevistados outros moradores, que trabalham em

outras atividades, que são afetadas direta e indiretamente pelo processo de extração de

cristal. Entre estes moradores, incluem comerciantes, proprietários de terra, e

funcionários do Monumento Natural Peter Lund, vinculados ao IEF, que forneceram

informações sobre as práticas que revelaram um modo de vida bastante marcante no

garimpo. As entrevistas se mostraram bastante ricas e relevantes, pois mostraram uma

realidade que é sentida diretamente pelas pessoas envolvidas, revelando discursos e

posicionamentos firmes por quem se insere no processo, mas também muitas dúvidas,

temores e incertezas.

O quadro 2 nos mostra que dentre os entrevistados para este trabalho, podemos

encontrar perfis diversos de cristaleiros, principalmente em relação ao grau de

escolaridade e idade dos envolvidos.

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42

Quadro 2: Perfil de amostragem dos cristaleiros entrevistados

Idade

Escolaridade

Sexo

Estado Civil

Situação na

atividade

Entrevistado

1

40 Fundamental

Completo

M

Casado

Interrompeu

Entrevistado

2

37 Médio

completo

F

Casada

Interrompeu

Entrevistado

3

62 Médio

completo

M

Divorciado

Ativo

Entrevistado

4

24 Superior

completo

M

Solteiro

Interrompeu

Entrevistado

5

38 Fundamental

incompleto

M

Casado

Ativo

Todavia, muitas das informações registradas foram colhidas em outros

momentos, através de conversas com a população - cristaleiros ou demais moradores –

durante minhas visitas à cidade, sem que houvesse uma preparação formal, mas sim em

ocasiões cotidianas. Muitas das vezes as conversas sobre os cristaleiros se fundiam com

outras conversas, outras divagações. Estes momentos também foram de grande valia

para minha pesquisa.

As visitas às áreas de garimpo serviram também para poder entender o processo

de trabalho nos garimpos, os meios de trabalho dos quais os cristaleiros se apropriam

para realizar sua atividade, os recursos e as técnicas empregadas. A relação dessas

pessoas com a terra se mostrou muito forte em alguns casos, nos quais o trabalho no

campo em atividades relacionadas com o uso direto do solo constituem um traço

marcante em suas famílias, sendo essas práticas passadas por gerações. Ainda que não

diretamente em uma prática de garimpo, mas em muitos casos com agricultura e

pecuária. Neste sentido, também foi possível perceber que a atividade de extração de

cristais é realizada de modos diferentes, com formas de resistências e de apropriações

distintas pelos cristaleiros, uma vez que as condições socioeconômicas dos

trabalhadores também se revelaram heterogêneas.

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Desta forma, procuro nesse capítulo expor os momentos que se fundaram a

partir dos trabalhos de campo. Na tentativa de abordar de maneira crítica essas questões,

dividirei esse registro em mais outros três títulos, procurando abarcar em um primeiro

momento as formas de garimpagem e as relações de organização do trabalho que pude

catalogar. Em um segundo momento serão apresentados e analisados os conflitos

socioambientais e as diversas formas de resistência das quais os cristaleiros se

apropriam para reproduzir sua atividade. E por fim, em um terceiro momento, o lugar

do cristaleiro no cotidiano do município, através de sua influência para a dinâmica

socioeconômica da região.

3.2 – O trabalho no garimpo

3.2.1 – Retirada de cristais: a organização do trabalho

O garimpo de cristais em Cordisburgo apresenta variados métodos de

apropriação. Puderam ser identificados garimpos artesanais, garimpos semi-artesanais e

garimpos mecanizados, sendo que as formas mais comuns registradas foram os

garimpos artesanais. Neste sentido, diferentes e complementares formas de organização

do trabalho são reproduzidas: desde o garimpeiro autônomo, que trabalha

informalmente na clandestinidade em lavras ilegais; passando por garimpeiros que

vendem sua força de trabalho para proprietários de terra e mesmo proprietários de terra

que se configuram como o próprio garimpeiro, procurando extrair renda em sua

propriedade através da retirada de cristal, sendo esta retirada em alguns casos de forma

mecanizada. Por constituir um grupo majoritário dentro do contexto de garimpagem

dentro do município, dedicarei mais atenção na análise dos processos envolvendo os

garimpeiros informais e os garimpos artesanais.

Os cristaleiros, devido a muitas vezes terem sua prática criminalizada, procuram

recorrer a estratégias de forma a resistir e continuar trabalhando no garimpo. Para não

serem vistos por proprietários de terras, costumam realizar acampamentos na mata ainda

pela madrugada. Estes acampamentos são geralmente simples, pouco estruturados e

servem como base de apoio para os cristaleiros, sendo o local onde almoçam,

descansam e se interagem. Alguns pontos de fuga são usados para casos mais extremos,

sendo comuns relatos de cristaleiros que conseguiram escapar da repressão policial se

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escondendo em túneis construídos.

O método de extração do cristal em um garimpo artesanal consiste em sua maior

parte em uma abertura de um buraco cavado no solo, chamado de cata, geralmente raso,

não ultrapassando um metro de profundidade. No entanto há registros de catas mais

profundas, de até dez metros de profundidade. As catas são geralmente estreitas, tendo

espaço disponível para apenas um ou dois cristaleiros por vez. Em alguns casos, alguns

túneis são construídos, conectando uma cata a outras.

Figura 3: Cata aberta no solo. Fonte: Diego Mata

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Estes cristaleiros, por exercerem um trabalho de caráter artesanal, não realizam

uma leitura sofisticada da estrutura geológica do solo. A busca é pouco especializada e,

portanto, não é possível averiguar a princípio quais são os locais onde o cristal se

apresenta mais abundantes. A escolha pelo local de extração se dá de forma mais ou

menos casual, depende de “sorte”, e leva mais em consideração a parte logística para a

realização do processo. Dessa forma, os locais onde o trabalho de extração e/ou o

transporte dos minerais são mais facilitados é que sãoos mais procurados.Por exemplo,

podemos citar locais com estradas ou trechos em melhores condições de acesso, ou

locais onde exista menor repressão ao trabalho. Este trecho de uma conversa realizada

com o cristaleiro entrevistado 1 indica a incerteza na hora de escolher o local

apropriado.

“(...) tem lugar que não tem nenhuma pedra, e tem lugar que é

cheio”. Varia né? Quando pega um veio, aí acha muito. Tem hora

que dá umas pedras, tem hora que não dá nada. Depende do lugar.

Sr. J. Entrevistado 1.

Dentre a vasta gama de variações do quartzo que podemos encontrar na

natureza, os mais procurados para a extração no município são o quartzo hialino,

conhecido também como cristal de rocha; o quartzo morion, de cor negra, que se trata

de uma variação do quartzo fumê acrescido de impurezas; e a aventurina (ou prásio),

uma variação do quartzo de cor esverdeada. No garimpo, a aventurina é considerada a

mais valiosa e, desta forma, é a mais procurada pelos cristaleiros. A aventurina é

referidapeloscristaleiros como “pedra verde”.

As pedras verdes são mais valiosas por ter seu emprego em uma indústria de

maior beneficiamento dentro de seu segmento. Devido ao seu maior grau de pureza, este

mineral é considerado de melhor qualidade, e então é usado para compor partes de

produtos eletrônicos, como telas de telefones celulares, peças de computador; e também

na indústria óptica. Existem muitas histórias sobre as pedras verdes, de pessoas que

conseguiram um grande valor ao encontrar uma unidade, mesmo de pequeno porte. Em

uma das entrevistas, a cristaleira D. conta que seu marido, J., havia encontrado uma

pedra verde poucos dias antes, e que lhe rendeu uma significativa quantia em dinheiro.

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46

“Semana passada o J. achou uma de meio quilo, toda verde.

Bonita demais. Ele vendeu por 800 reais. Dizem que eles usam

para fazer peças de computador. Tem um negócio dentro do

computador que usa isso.” D.3.

Dessa forma, em alguns casos a extração de cristais tem como objetivo

exclusivo a procura pelo cristal verde, sendo que outras variações de menor valor, como

o cristal de rocha, não são aproveitados e são deixados de lado no momento da extração,

sendo apenas detritos no solo. Os cristais de rocha podem, no entanto, ser aproveitados

no comércio como souvenires para turistas que eventualmente procuram por cristais

como objeto de decoração de residências.

O cristaleiro J.é um dos que costuma retirar todos os cristais que encontra,

mesmo os que não possuem tanto valor de mercado. Para ele, os cristais são

primeiramente fonte de renda, mas também são apreciados como objetos decorativos em

casa. Em sua residência existem muitos cristais de quartzo espalhados, alguns

acumulando na garagem, disponíveis para serem vendidos ou doados para amigos e

parentes.

Tem muitos que larga isso aqui tudo pra lá. As pinhas mesmo tem

muitas vezes que tão arrancando, acham elas, e dizem 'ah, não vou

levar isso não', aí eu mesma sou danado para levar, aquelas

pedras brancas, e isso aqui, eu pego tudo.(J. Entrevistado 1)

Quanto mais o mineral for conservado, mantendo suas pontas intactas, maior o

valor final. Desta forma, o trabalho é realizado de forma cuidadosa, e os cristaleiros

costumam valorizar a aparência do mineral, sempre se referindo à beleza dos cristais. O

cristal bruto é retirado e as impurezas são retiradas com a aplicação direta de ácido

muriático. Os cristais são então transportados por caminhonetes de volta à cidade, para

seguir para a lapidação. Em Cordisburgo não existe casa de lapidação, e dessa forma, os

cristais geralmente são levados para serem lapidados em Corinto.

3 Entrevista concedida ao autor em 02/05/2014

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3.2.2 – Cristaleiros: Sujeitos diversos

Como referido anteriormente, a extração de cristais em Cordisburgo acontece de

forma bastante distintas, executadas por grupos variados, que se apropriam dos minerais

com intuitos diversos.Podemos considerar que a existência dos conflitos relacionados à

extração de cristais em Cordisburgo está fundamentada na disputa pelo uso da terra,

com o objetivo de dela se extrair a renda.

Foi possível perceber que as pessoas envolvidas no processo possuem uma

relação de proximidade com a terra, sendo muitas vezes uma prática presente em suas

famílias, e com isso são sendo construídas fortes relações de identidade com o campo.

As práticas agrícolas sempre foram marcantes no município, mas sofreram grande baixa

a partir do momento em que se diminuíram as oportunidades de trabalho nas fazendas

locais. Dessa forma, o ato de extrair cristais se configura como uma atividade de contato

direto com a terra, sendo muitas vezes um reflexo de práticas culturais de outros

momentos.

Os relatos indicaram um aumento considerável de trabalhadores em garimpo no

município principalmente em meados do ano de 2006, período em que o número de

atravessadores e empresários interessados na compra do mineral bruto aumentou no

município, o que gerou uma mobilização de pessoas em direção às áreas de garimpo.

Neste sentido, com a maior demanda do mercado em relação aos cristais,

diversos moradores se interessaram pela atividade. Moradores com histórias distintas de

vida e condições sociais variantes se encontram nos garimpos e então podemos

encontrar desde pessoas que vislumbram no garimpo a única forma de se obter renda,

até pessoas que buscam na atividade um complemento, ou uma saída em tempos

difíceis, financeiramente falando. Este fato é o que condiciona a natureza oscilante da

atividade, que ainda que tenha aumentado em volume, ainda enfrenta períodos de altos e

baixos em determinadas épocas do ano.

A extração de cristais acontece muitas das vezes em propriedades particulares, e

neste sentido, o papel do proprietário tem fundamental relevância na dinâmica do

processo, uma vez que este se coloca como autoridade dentro de seus “domínios” e

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toma as rédeas do modo como se estabelecerá a produção e o uso do solo. Dessa forma,

o direcionamento das atividades e as particularidades dos conflitos dependem em

grande parte da forma como o proprietário discerne o processo.

Existem proprietários que não estão interessados na retirada de cristais em suas

terras, e recorrem a mecanismos de forma a reprimir os garimpeiros que possam

escolher seus estabelecimentos rurais como local de extração. Contrariamente, existem

proprietários que admitem o uso de suas propriedades para retirada de cristais, através

de acordos com os cristaleiros; e em algumas situações, o proprietário acaba sendo o

próprio cristaleiro, garimpando em sua propriedade de forma autônoma.

Nestas três situações apresentadas, foi possível perceber que o garimpeiro sem

propriedades rurais, se mantém em uma condição de desvantagem na luta pela

reprodução de sua prática. Mesmo quando existem acordos entre proprietários de terra e

garimpeiros para a extração de cristais, os proprietários procuram ao máximo extrair

renda da terra, se transformando em uma relação direta entre patrão e empregado.

Concomitantemente, o garimpo passa a ser mecanizado, uma forma de explotação dos

minerais que gera uma quantidade muito mais significativa de impactos à medida que

também se aumenta significativamente os ganhos obtidos. Nesse sentido o proprietário

de terras fornece os meios de produção necessários para o trabalho, como ferramentas,

máquinas, alimentação e a própria terra. Enquanto isso, o garimpeiro vende sua força de

trabalho, se submetendo a condições impostas pelos patrões, que muitas vezes não se

configuram em vantagens para os garimpeiros. Por isso, estas relações tendem a não

prosperarem, se dissolvendo depois de certo período. A fala da cristaleira D. nos indica

este desacerto, quando comenta uma experiência que vivenciou ao lado de seu cônjuge;

Já trabalhei com meu marido em parceria com B.4, e certa vez nós

tiramossete mil reais em cristal. Aí ele tirou os custos da máquina,

descontou muitas coisas e a parte dele foi muito maior que a

nossa, sendo que o trabalho era todo nosso. A gente não achou

certo e resolveu voltar a retirar por conta própria, enquanto ele

ainda retira cristais com máquina na terra dele.

4Neste caso, B. se refere a um proprietário de terras conhecido na cidade.

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É compreensível que os cristaleiros não se adaptem a esta divisão produtiva do

trabalho, uma vez que o dispêndio de energia em uma atividade de garimpo é bastante

intenso, e os riscos inerentes ao processo são sentidos diretamente por eles. Dessa

forma, não faria sentido que a maior parte dos lucros obtidos ficasse na mão do

proprietário das terras, ou só faria sentido se analisássemos mesmo sob a ótica da

exploração do trabalho. O direito de posse confere ao proprietário o domínio sobre todo

o processo, mesmo o domínio sobre o trabalho do cristaleiro. Ainda que o garimpo

tenha sim suas imposições sobre o ritmo de trabalho, o que é imposto pelos

proprietários não é exatamente o ritmo que a atividade no garimpo se reproduz. Sem se

adaptar às imposições dos proprietários, temos que a maioria das atividades de garimpo

ainda são autônomas, o que os distancia dos interesses dos donos de terra, e daí temos

uma das facetas do processo que desenvolvem os conflitos.

3.3 – Conflitos envolvendo a prática garimpeira

As práticas de retirada de cristais envolvem relações conflituosas entre

cristaleiros e proprietários de terras, desencadeando, em muitos casos, em

manifestações de resistência por parte dos cristaleiros perante contextos em que seu

trabalho se vê ameaçado e sua condição de garimpeiro criminalizada.

Os embates que se criam a partir do movimento do garimpo nos revelam as

relações de poder imbricadas nos territórios em disputa. Inseridos na dinâmica desigual

da sociedade, as disputas nos territórios conjugam relações entre os sujeitos que

produzem o espaço. Para Montenegro Gómez (2006, p. 104),

O território está relacionado com a disputa na apropriação do

espaço, portanto, com interesses conflitantes que convergem num

mesmo espaço. A apropriação do espaço por um grupo ou

indivíduo entra em disputa com as aspirações de outro grupo ou

indivíduo.

As relações que se manifestam no garimpo são, dessa forma, relações de poder

materializadas nas disputas pela apropriação do território. Como aponta Gonçalves

(2012), essas relações são dialeticamente indissociáveis dos processos sociais que

controlam interesses, separam ou unem, permitem ou negam posses, usos e utilidades,

conforme interesses políticos, sociais, culturais ou econômicos.

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Nesse sentido, é importante considerar a atuação dos proprietários de terra no

entorno do município e também a intervenção do Estado, representado pelo IEF –

Instituto Estadual de Florestas, através do Parque Estadual Monumento Natural Peter

Lund, existente no município. Esses dois grupos estão ativamente inseridos no conflito.

3.3.1 – Conflitos com proprietários de terra

Ter a posse de uma terra confere ao proprietário o controle sobre o solo de seu

espaço, porém, no que diz respeito aos recursos encontrados no subsolo, a questão

ganha outros contornos. No Art. 176 da Constituição Federal (1988) a distinção entre

solo e subsolo é colocada de forma bastante elucidativa:

As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os

potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da

do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem

à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da

lavra.

Conforme o Art. 20, Inciso IX, “os recursos minerais, inclusive os do subsolo”,

são classificados como bens da União, sendo dessa forma passíveis de exploração

apenas sob condições estipuladas pela mesma, que deve estabelecer e assegurar as áreas

e condições para o exercício da atividade. A atividade garimpeira não é proibida, desde

que esta seja organizada de forma associativa.

No entanto, uma fala registrada pela Entrevistada 2 aponta que na prática que lhe

é imposta no dia a dia, as condições apontam outro rumo para a forma como a atividade

se realiza;

Nós paramos de arrancar cristal. Lá vai ficando difícil, e eles

põe é a culpa na gente. [...]Rancou os pau tudo, você viu o

que eles “fez”? [...] Ali no Remanso. Estocando tudo,

rancando galha dessa grossura assim. Você precisa ver que

trem. Coração da gente até dói de olhar. E os passarinhos

correndo desesperados. (Entrevistada 2)

A ausência de regulações precisas sobre o uso e apropriação dos recursos dentro

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das propriedades particulares em Cordisburgo faz com que esta dinâmica seja estipulada

pelo proprietário. Neste sentido o recurso, que supostamente é um bem público

assegurado pela União, passa a ser um bem privado, impostas as condições pelo

proprietário. Diante do conflito pelos diversos usos possíveis dentro de um território,

prevalece o interesse maior do proprietário sobre o rumo que sua propriedade terá.

Os donos de terras que não admitem a extração garimpeira em suas posses

acusam os cristaleiros de invasão de propriedade, e de degradação intensa do solo, o que

inviabilizaria outras formas produtivas como a agricultura e a pecuária. Dessa forma,

costumam se posicionar a favor da repressão e criminalização do garimpeiro,

contribuindo com denúncias à polícia militar sobre possíveis “invasões” que acometam

seus territórios.

As contradições dessa situação ganha corpo ao analisarmos os usos produtivos

realizados por algumas destas propriedades, quando comparadas com a atividade do

garimpo. O entrevistado 4, que interrompeu suas atividades no garimpo por não mais

querer fugir dos órgãos repressores, comenta que não concordava com a criminalização

de sua prática, mesmo tendo discernimento de que estaria entrando em propriedades

particulares. Este cristaleiro aponta que os argumentos relacionados à degradação do

solo não se sustentam, principalmente porque os proprietários de terra não objetivam

um uso racional de sua terra, mas tem interesse em impedir as atividades de garimpo por

ser esta atividade incompatível com outras em que os proprietários vislumbram maior

retorno financeiro. Por exemplo, foi citada a silvicultura, hoje bastante difundida nas

terras no entorno do município, e que segundo os cristaleiros, é feita sem regulação e

legislação ambiental adequada pelos proprietários, que muitas vezes retiram a vegetação

nativa sem controle, gerando impactos de maior magnitude sobre o solo comparado à

atividade do garimpo.

Segundo este entrevistado, os proprietários de terra têm estocado madeiras no

solo, de forma a inviabilizar a abertura de catas. Esse método visa evitar com que os

cristaleiros continuem entrando em suas propriedades, fazendo com que eles procurem

outro lugar de extração. Ao mesmo tempo, esse método também visa preparar o solo

para cultivo de eucalipto. Ele comenta sobre uma situação conflituosa que vivenciou

com um proprietário de terras no município.

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Na verdade ele não está mexendo com cristais, ele está

destruindo para o povo não arrancar cristal. Ele vai estocar

tudo para plantar eucalipto. No lugar do cristal ele quer é

eucalipto. [...] Então o que T.5 está fazendo: ele está

arrancando a mata nativa para plantar eucalipto, para poder

acabar com o cristal, para o povo parar de entrar na sua

terra. (Entrevistado 4, ex-cristaleiro)

Nesse sentido, podemos considerar que o uso do solo pelos proprietários no

município não tem levado em consideração determinadas regulamentações que são

postas pelos condicionantes legais, pouco importando a questão ambiental no processo

produtivo. No entanto, o discurso da “destruição do meio ambiente” permanece para o

cristaleiro. A mercadoria também não importa muito, pois em muitos casos

propriedades que se dedicavam à extração de cristal, inclusive em acordos com

cristaleiros para a extração, tiveram essa atividade interrompida assim que se tornava

menos lucrativa, e mais exigente no sentido do manejo da atividade. As oscilações do

mercado também direcionam o uso produtivo da terra, então o cristal sai de cena quando

diminui seu valor de mercado. Assim, por uma simples mudança de atividade, que visa

principalmente a maior margem de lucro e em menor tempo possível, cristaleiros são

rebaixados de trabalhadores a criminosos invasores.

Por fim, há de se considerar os proprietários de terra que extraem cristal em suas

propriedades através do processo mecanizado de extração. De forma intensiva e

pontual, esta modalidade gera grandes impactos ao ambiente, ao mesmo tempo em que

pouco “emprega” garimpeiros, acentuando ainda mais o cenário de desigualdade. O

volume de cristal extraído nesses casos revela um processo produtivo mais complexo,

que gera lucros exorbitantes para os proprietários de terra, sem a contrapartida para os

garimpeiros, nem o município.

Nesses casos, a presença de um atravessador não é necessária, sendo o negócio

realizado diretamente entre os proprietários e empresas interessadas na compra. Estas

empresas vêm de diversos lugares, mas destaca no município a presença de empresas

provenientes da China, com o objetivo de comprar os minerais como matéria bruta, que

é beneficiada apenas no país de origem. Além de empresas provenientes da China,

5 T. neste caso se refere a um proprietário de terras no município.

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também tem sido comum no município pessoas autônomas deste país, com o objetivo

de comprar menores quantidades.

Tem alguns de firmas que comprava. Mas tinham até

chineses camelôs. Eles compram, e eles mandam para

lapidação, faz as joias e eles vendem na China, na rua, igual

em Belo Horizonte a gente vê os camelôs, lá na China

também tem. Eles vêm, ficam aqui três meses, compram, e

vai. Chegando lá eles fazem as joias, vendem, depois voltam.

Agora, tem a firma, que compra muito, pega muita

quantidade, aí compra mesmo e o cristal sai barato pra eles.

(Entrevistado 1)

Considero dessa forma que a relação conflituosa entre os diversos sujeitos

envolvidos com a extração de cristais não são situações específicas, que afetam apenas

as pessoas abarcadas no processo. Elas têm mudado a dinâmica do município, trazendo

para a pequena cidade pessoas provenientes de lugares distantes. Uma relação que

parecia não ser provável há pouco tempo atrás e que se torna concreta devido à

valorização da mercadoria que ali se encontra abundante no solo. No entanto, os

cristaleiros não têm apenas os proprietários de terra como “obstáculo” para a reprodução

da atividade garimpeira, existe também os mecanismos estatais, representados

principalmente pelo Instituto Estadual de Florestas - IEF.

3.3.2 – Conflitos na área do Monumento Natural Estadual Peter Lund

O IEF está presente no município de Cordisburgo através da gestão do

Monumento Natural Estadual Peter Lund– ou MNEPL – uma Unidade de Conservação

que foi estabelecida no ano de 2005. O MNEPL teve seu plano de manejo desenvolvido

no ano de 2011, regulamentando o uso do solo e as atividades econômicas realizadas

dentro de seu entorno.

A Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) conceitua uma

Unidade de Conservação como um

[...]espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo águas

jurisdicionais com características naturais relevantes, legalmente

instituído pelo poder público, com objetivos de conservação e

limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se

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aplicam garantias adequadas de proteção - Lei no

9.985/2000.(BRASIL, 2000 apud IEF, 2011. p.13)6

As UC podem ser caracterizadas dessa forma como espaços limitados, definidos

territorialmente e legalmente instituídos pelo poder público que possua características

naturais relevantes que possam ser passíveis de uso econômico e que tenha garantias

adequadas de preservação.

O MNEPL, uma UC do tipo Proteção Integral, foi criada pelo Decreto Estadual

no. 44.120/2005 (IEF, 2011), com o objetivo de proteger o sítio histórico-científico

Gruta do Maquiné, sua flora e sua fauna, em uma área de 72,7 hectares, localizado no

município de Cordisburgo. Por ser uma área de proteção integral, é destinada

exclusivamente para o uso turístico da Gruta do Maquiné, sendo protegidas e isoladas

muitas outras grutas dentro da área do parque, grutas que não são abertas para visitação.

Também são admitidas pesquisas científicas e ações relacionadas à educação ambiental.

O plano de manejo para o parque foi realizado pelo IEF em parceria com um grupo

privado. O MNEPL está localizado a 5 km da sede municipal de Cordisburgo, na

rodovia MG-421.

Além dos limites estabelecidos para o MNEPL, também foi delimitada uma

Zona de Amortecimento (ZA) para o parque. Os limites da ZA estão incluídos

inteiramente no município de Cordisburgo, totalizando uma área de 8.271 hectares. A

ZA tem como objetivo aliviar os impactos gerados, sendo uma extensão regulatória dos

limites do Parque. Ainda que englobe dentro de sua área fazendas privadas, estes

proprietários são condicionados a seguir as diretrizes do MNEPL, ainda que nem

sempre este fato seja cumprido, como referido na questão dos proprietários de terra do

município.

6Plano de Manejo do MNEPL (IEF, 2011).

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Figura 4: Limites do MNEPL e zona de amortecimento

Fonte: Instituto Estadual de Florestas

Podemos constatar então o que Martínez-Alier chamou de “evangelho da

ecoeficiência”. O caráter organizativo das UCs através de gestão de recursos e manejo

adequado do uso do parque indica que as atenções são sempre voltadas à velha forma de

se consumir a natureza. Considerando a Gruta de Maquiné um atrativo turístico natural

que gera circulação de dinheiro, é necessária então uma mobilização de serviços

realizados de forma eficiente para que assim este setor gere ainda mais renda. O manejo

do parque serve desta forma para a garantia do que seria um desenvolvimento

“sustentável”, sendo mais pensado para o aproveitamento financeiro dos recursos, do

que propriamente na preservação e preocupação com os valores intrínsecos à natureza,

não necessariamente relacionados diretamente à esfera econômica. Torna-se um

discurso acrítico que leva a uma prática acrítica. Não é difícil imaginar que neste

contexto, a atividade garimpeira seja sumariamente proibida, uma vez que segundo o

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próprio Plano de Manejo do MNEPL, esta “é uma atividade que acarreta em grandes

prejuízos ambientais.” (IEF, 2011. p. 23).

Devido às suas características naturais, o subsolo das áreas dentro da área do

parque e sua zona de amortecimento apresentam boas quantidades de quartzo, o que

mobiliza a extração de cristais dentro desses territórios. Os conflitos emergem a medida

que o uso produtivo do parque, destinado à proteção de áreas se chocam com os usos

realizados pelos cristaleiros. Forja-se um embate pautado em uma dicotomia rasa e

simples: proteção x degradação. O parque serve para proteger e o cristaleiro serve para

degradar. Mais que isso, o uso racional das atividades realizadas pelo parque indicariam

uma manutenção e proteção dos recursos em longo prazo, enquanto que o uso intensivo

e desregulado da atividade cristaleira esgotaria a atividade em pouco tempo. Ainda que

de fato, garimpos tenham a tendência a se esgotarem depois de certo período, uma

análise um pouco mais cuidadosa nos mostra que o discurso do desenvolvimento

sustentável, carregado de precisão técnica, não suprime as contradições que são

evidenciadas nos conflitos.

Dentro da zona de amortecimento do parque, há uma área bastante procurada

por garimpeiros para retirada de cristal, conhecida como Serra das Torres. Esse local é o

ponto mais alto do município, e o acesso para se chegar até lá é facilitado, sendo feito

pela estrada asfaltada que liga a cidade de Cordisburgo à Gruta de Maquiné. Próximo à

chegada à Gruta, entra-se em uma propriedade por uma estrada de cascalho, onde já se

localiza esta área de garimpo.

Nesse local, por se localizar dentro da zona de amortecimento do parque, são

realizadas constantes “batidas”, que são as buscas realizadas pela polícia militar, com o

intuito de impedir os cristaleiros. Os funcionários do IEF também realizam vistorias

constantes, sendo inclusive solicitados pelos proprietários de terras contrários às

atividades garimpeiras para entrarem em suas propriedades com o intuito de localizar

possíveis garimpeiros.

Em conversa com uma funcionária do MNEPL, foi possível perceber que o

discurso do desenvolvimento sustentável é bastante presente, claramente mais pautado

numa ecoeficiencia do que no bem estar do trabalhador, o que em minha opinião

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aproximaria mais de uma noção de sustentabilidade.

Para essa funcionária, os hábitos dos garimpeiros no momento em que estão

trabalhando são prejudiciais ao ambiente, uma vez que esta atividade não possui um

direcionamento que seria organizado. Ela relatou casos em que os cristaleiros são

orientados a realizar determinados procedimentos de forma a minimizar os impactos

gerados na atividade. Dentre vários impactos que a atividade de garimpo de cristais

geraria, essa funcionária chamou atenção principalmente para a questão das catas que

são abertas no solo e das queimadas que são realizadas.

Figura 5: “Refugos” deixados pelos cristaleiros. Fonte: Diego Mata

A queixa em relação às catas se deve ao fato de essas não serem tampadas após

o esgotamento dos minerais ali por ventura encontrados. As orientações vão ao sentido

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de realizar o fechamento das catas, pois as cavidades abertas facilitam a erosão do solo,

e prejudica a ação das brigadas de incêndio. A abertura e a retirada de cristais também

gera detritos, os “refugos” que não são aproveitados, eles são deixados na superfície, e

são facilmente carregados pela ação das chuvas. No caso das queimadas, segundo a

entrevistada, elas teriam como objetivo a limpeza do solo, para facilitar a escavação das

catas, porém acabam saindo do controle em alguns casos.

Na maioria das vezes... grande parte dos incêndios florestais são

por causa dessas pessoas. Porque eles colocam o fogo, aí limpa

tudo e fica melhor pra ver onde pode ter cristal. [...] Ou até mesmo,

o cara passa o dia inteiro lá, precisa esquentar uma marmita e

acaba colocando fogo na mata. Às vezes ele nem queria fazer

aquilo, mas tem que ter atenção. Já está degradando o meio

ambiente, né?[...] Quando tem incêndio, fica difícil correr na mata,

porque com tanto buraco de cristal, fica muito perigoso.

(Funcionária do MNEPL).

Um dos pontos centrais dessa questão específica é o fato de o tempo produtivo

ser moldado de forma a viabilizar a maior rentabilidade com menor esforço de trabalho.

Pensando no tempo do garimpo, o dispêndio de energia na forma de trabalho para

fechar catas pode significar a perda de dinheiro, sendo esforço em vão no sentido de não

ter o retorno do ganho, e por isso não esse tipo de prática não é realizada pelo

garimpeiro.

No entanto, os garimpeiros questionam a visão estigmatizada que é posta sobre

sua atividade, como agente destruidor da natureza. Os garimpeiros entrevistados

mostraram discernimento da magnitude dos impactos que seu trabalho gera,

questionando a forma como são vistos e tratados pelos funcionários do MNEPL. Para os

cristaleiros, proprietários de terras que também estão irregulares, tanto na atividade

cristaleira quanto em outras atividades, não são perseguidos nem criminalizados.

Segundo os relatos dos cristaleiros, em alguns casos os proprietários preferem

direcionar o uso produtivo de suas propriedades de forma irregular. Nesse caso, é

financeiramente vantajoso pagar as multas ambientais resultantes da atividade irregular

do que obter uma licença ambiental para exploração de recursos. Esse comentário

abaixo, feito pelo Entrevistado 5, resume um pouco as opiniões dos cristaleiros em

relação a atuação da fiscalização do IEF no município;

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Eles acusam a gente de destruir a terra, mas a gente rancar o cristal

só não destrói não, porque onde que se arranca, têm cascalho e

pedra só, não tem árvore. Agora, quando extrai as pedras com

máquina, aí sim destrói, faz o que faz e estraga mesmo. Agora eles

estão fazendo lá é geral, tampando o terreno todo só pra plantar o

eucalipto. Morros, uns morrões assim. Mas o T. até a Dilma sabe o

que ele faz aqui, então não tem como nem brigar. E eles são o

poder maior desse país, então como nós vamos fazer? Quem que

nos vai defender? (Entrevistado 5)

Esta situação indica o desamparo em que se encontra o garimpeiro, geralmente

em condições precárias para reproduzir sua prática. Para um proprietário de terras com

recursos financeiros, burlar as regulamentações ambientais é simples e vantajoso, e por

isso não podem ser considerados criminalizados, ainda que sua prática configura-se

como tal. A criminalização vem carregada de um estigma, a do homem pobre vinculado

ao garimpo. A do homem que não possui terras, não possui propriedades, e por isso está

em uma posição desmoralizada.

Nas conversas com os cristaleiros, ficou nítido durante as falas dessas pessoas

que a noção de proteção à natureza atribuída por eles eram muito diferentes da visão

preservacionista do discurso dominante do desenvolvimento sustentável. A ideia de

proteger os recursos naturais e limitar o uso da região do MNEPL não faz nenhum

sentido para essas pessoas, tendo em vista a condição em que se encontram

determinadas porções da natureza da região, à mercê de pessoas poderosas. No entanto,

isso não quer dizer que não sem preocupam com o meio ambiente, ou que estejam

“destruindo a natureza”, mas que eles possuem discernimento para saber a dimensão do

impacto que geram ao ambiente.

As análises desses conflitos mostram que os principais atores sociais do

processo – o cristaleiro, o proprietário de terras e o poder estatal – estabelecem relações

entrelaçadas, nas quais o cristaleiro pode ser considerado o elo mais fraco, por sua

condição histórica. Ainda que este tópico da pesquisa tenha feito uma análise

diferenciada dos conflitos envolvendo primeiramente os donos de terra, e

posteriormente a atuação do IEF, não é possível pensar as relações separadamente, uma

vez que os interesses dos atores sociais do processo são incertos, e se transformam a

cada dia.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tendo em vista a abrangência do tema, o recorte espacial se fez necessário para

que as análises presentes nesse presente trabalho pudesse se concentrar no processo

existente dentro do município de Cordisburgo. Ao me defrontar com a questão do

garimpo e dos cristaleiros, e dos conflitos decorrentes dessa atividade, evidenciou-se o

fato de o cristaleiro, principalmente o cristaleiro artesanal, informal, ser um trabalhador

numa relação de profunda subordinação. Devido à sua condição vulnerável no que diz

respeito às garantias de trabalho, de acesso à terra, de articulação política, entre outros

aspectos, este trabalhador enfrenta diversos problemas e resiste na atividade mesmo em

situações conflitivas.

A partir da pesquisa que foi realizada no município, foi possível constatar que a

atividade cristaleira ainda se encontra presente na cidade, envolve grupos diversos,

sendo ainda fonte de renda para muitas pessoas que não conseguem encontrar outras

saídas para se obter dinheiro, ou mesmo pessoas que possuem uma relação forte com a

tradição do uso da terra, e retira cristais como fonte alternativa de renda. Foi possível

comprovar a relevância da atividade no município também através de conversas com

outros moradores, não ligados à atividade cristaleira. Comerciantes locais relatam a

importância que a atividade tem também para a circulação comercial da cidade, e se

posicionam favoráveis à atividade cristaleira.

No entanto, a percepção da atividade garimpeira como agente de degradação da

natureza fez-se presente em praticamente todos os discursos que pude constatar. Com

exceção apenas dos próprios cristaleiros, todos parecem associar a atividade informal do

garimpo aos problemas ambientais relacionados ao uso do solo. Nesses discursos, a

alternativa que parecia mais viável para a população seria a de organizar e regulamentar

a atividade, através de associações e cooperativas. Em Cordisburgo, não existe nenhuma

associação ou cooperativa que seja responsável pela organização da atividade. Para a

população, essa ausência seria a raiz para os conflitos que são gerados. Para Martins

(2008), a visão estigmatizada do garimpeiro vem de um legado histórico das condições

difíceis enfrentadas por esses grupos, mas também pela falta de amparo legal para dar

condições para a realização desta atividade. Segundo ele;

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Esta situação delicada do garimpo frente à opinião pública tem

muitas explicações. Todavia, não há dúvida de que a legislação

minerária, desde os tempos coloniais, é um dos fatores mais

decisivos. Isso porque sempre marginalizou a atividade garimpeira,

colocando os garimpeiros na clandestinidade e no limiar da

criminalidade. (MARTINS, 2008. P.69)

É importante ressaltar que, no sentido de oferecer melhores condições para os

garimpeiros, de fato a organização em cooperação seria o mais viável para o processo.

No entanto, não é demais comentar que as atribuições legais tendem a colocar os grupos

sociais mais vulneráveis em condições de desvantagem. Os cristaleiros em Cordisburgo

com quem tive oportunidade de conversar não vislumbram grandes vantagens caso

sejam introduzidos em um sistema de cooperativa. Nesse contexto o garimpeiro de

subsistência passaria a ter que conviver com novas atribuições e uma nova dinâmica de

seu trabalho, impostas por outras pessoas, caso se organizasse em grupos associativos.

Assim, novas formas de se conceber o trabalho no garimpo entraria em conflito com a

identidade cultural do garimpeiro tradicional, uma vez que restringiriam aspectos

fundamentais da identidade garimpeira Acrescenta-se também outro ponto nesta

questão: os garimpeiros, na condição negligenciada que enfrentam, pouco são ouvidos,

e pouco se sabem sobre eles, e sobre suas demandas de trabalho. Assim, uma associação

deveria levar em consideração primeiramente quem são essas pessoas, o que elas

querem, o que elas lutam e reivindicam para poder desenvolver sua atividade. Esta

passagem do Levantamento Nacional dos Garimpeiros (1993) comenta essa questão

Essas iniciativas revelam-se ainda limitadas e pouco eficazes.

Ademais, a necessidade de promover a atividade cooperativa, em

respeito ao patrimônio mineral e ambiental das áreas e com ampla

difusão dos benefícios econômicos e sociais decorrentes, exige a

imediata superação de alguns obstáculos: quem são, quantos são

onde e como atuam os garimpeiros? Como interferir de modo

consequente e produtivo nessa realidade? (DNPM, 1993 apud

MIRANDA, 1997. p. 48-49).

A interpretação dos conflitos envolvendo proprietários de terras e o poder estatal

representado pelo IEF também foram bastante importantes para dimensionar e

espacializar o embate que está posto em Cordisburgo. Foi possível constatar que em

determinadas situações, proprietários de terra se comportam como verdadeiros agentes

da degradação do meio ambiente, sempre pensando no retorno financeiro que a

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atividade possa lhe propiciar. O caso da Unidade de Conservação também faz parte

desse jogo de interesses particulares. A criação de parques onde a natureza seja

preservada, não deixa de ser mercadoria passível de consumo. O embate se molda por

quem irá tirar proveito dos louros provenientes desse consumo, e assim apenas

atividades selecionadas podem se reproduzir nas áreas preservadas. Não me posiciono

contra a criação de áreas de conservação, mas, no entanto, fica evidenciado que no caso

do Monumento Natural Estadual Peter Lund, a delimitação de uma área de proteção, e

uma série de relatórios técnicos de manejo do uso do solo não são capazes de suprimir

os conflitos que emergem das condições desiguais que estão postas na sociedade.

Para se pensar na questão do garimpo, não só em Cordisburgo, mas também em

outras regiões, não é necessário apenas se pensar na legalidade, na criminalidade, ou na

preservação dos chamados recursos naturais. É preciso pensar que esse processo

envolve primeiramente relações de poder, que tornam as relações sociais bastante

desiguais, colocando diversos sujeitos em situações onde não se vê alternativa que não

seja ir à contramão do que a “racionalidade técnica” propõe. Esses complexos processos

nos mostram que a sociedade continua desigual, e que o ônus ainda recai mais para os

grupos historicamente já desfavorecidos.

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ANEXO

ROTEIRO DE ENTREVISTAS

CATEGORIA UM: CRISTALEIROS E PESSOAS DIRETAMENTE ENVOLVIDAS

Dados Gerais

1. Nome:

2. Data de Nascimento:

3. Local de Nascimento:

4. Grau de Escolaridade:

Origem e Trajetória

6. Quando você começou nesta atividade e por quê?

7. Outras pessoas da família trabalham em garimpo?

8. Quais outras atividades realizavam antes do garimpo?

Trabalho e Organização

9. Como é feito o deslocamento para as áreas de extração?

10. Como é feita a logística do trabalho? É realizada em grupos maiores, menores?

11. Que tipos de ferramentas são utilizados para a extração?

12. Qual a quantidade média de cristal pode ser retirada em uma jornada de trabalho?

13. Qual é o destino da produção? Quem compra os minerais retirados?

14. Como é a relação com os donos das terras onde são retirados os cristais?

15. Existe algum tipo de apoio através de associações, cooperativas ou lideranças

políticas no município?

16. Existe algum tipo de repressão ou perseguição por parte de algum órgão ou

instituição?

A Percepção do cristaleiro

17. Como você caracteriza o cotidiano no garimpo?

18. Quais são as suas expectativas com o garimpo?

19. Quais as principais dificuldades enfrentadas pelos garimpeiros?

20. Você pode falar um pouco como é viver em Cordisburgo?

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CATEGORIA DOIS: POPULAÇÃO DE CORDISBURGO EM GERAL

Dados Gerais

1. Nome:

2. Data de Nascimento:

3. Grau de Escolaridade:

4. Local de Nascimento:

5. Desde quando mora na cidade?

Percepção sobre o processo na cidade

6. Você já ouviu falar sobre a extração de cristais em Cordisburgo nos dias atuais e os

problemas enfrentados pelos garimpeiros? Você conhece algum relato?

7. Você tem alguma informação quanto à origem do garimpo na cidade?

8. Você possui algum familiar que está/esteve envolvido no processo?

9. Você consegue avaliar quantas pessoas do município trabalham com garimpo?

10. Para você, o que este processo representa para o município?

11. Em sua opinião, como os garimpeiros se relacionam com o meio ambiente?

12. Você concorda com a proibição desta atividade? Justifique.