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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE DIREITO PABLO GURGEL FERNANDES FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA (IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO. Orientador: Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria NATAL / RN 2014

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Page 1: FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO … · Professor Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria – Orientador Universidade Federal do Rio Grande do Norte _____ Professor Dr. Marco

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO CURSO DE DIREITO

PABLO GURGEL FERNANDES

FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO

SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA

(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.

Orientador: Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria

NATAL / RN

2014

Page 2: FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO … · Professor Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria – Orientador Universidade Federal do Rio Grande do Norte _____ Professor Dr. Marco

PABLO GURGEL FERNANDES

FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO

SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA

(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.

Monografia apresentada ao Curso de Direito

sob a orientação do Professor Dr. Luiz Alberto

Gurgel de Faria como requisito parcial para

obtenção do título de bacharel em Direito, do

Centro de Ciências Sociais Aplicadas, da

Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

NATAL / RN

2014

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Catalogação da Publicação na Fonte.

UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA

Fernandes, Pablo Gurgel.

Fraude à execução fiscal: a interpretação sedimentada no Resp 1.141.990/PR e a sua

(in)conformidade com a constituição / Pablo Gurgel Fernandes. - Natal, RN, 2014.

111 f.

Orientador: Prof. Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria.

Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Departamento de Direito.

1. Direito – Monografia. 2. Direito tributário – Monografia. 3. Execução fiscal –

Monografia. 4. Processo tributário – Monografia. I. Faria, Luiz Alberto Gurgel de. II.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.

RN/BS/CCSA CDU 34:336.2

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PABLO GURGEL FERNANDES

FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL: A INTERPRETAÇÃO

SEDIMENTADA NO RESP 1.141.990/PR E A SUA

(IN)CONFORMIDADE COM A CONSTITUIÇÃO.

Monografia apresentada ao Curso de Direito, da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em

Direito.

Aprovado em: 14/11/2014.

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

Professor Dr. Luiz Alberto Gurgel de Faria – Orientador

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

______________________________________________________________

Professor Dr. Marco Bruno Miranda Clementino – Examinador

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

______________________________________________________________

Professora Dra. Flávia Sousa Dantas Pinto – Examinadora

Escola Superior da Magistratura do Estado do Rio Grande do Norte

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A Deus, por ter me guiado até aqui

e revelado o caminho pelo qual

deveria andar;

A minha mãe, que mesmo

nascendo em uma casa de taipa e

tendo que conciliar os estudos com

o trabalho, venceu na vida e pôde

investir em meus estudos;

A Juliane Assunção Paiva, pelo

grande apoio e auxílio, sem os

quais este trabalho

indubitavelmente não seria o

mesmo;

Ao Juiz Federal Marco Bruno

Miranda Clementino e a todos os

servidores da 6ª (sexta) Vara

Federal, pela confiança, torcida e,

sobretudo, lições de vida e de

Direito;

A Aparecida, pela amizade,

disponibilidade e grande atenção

despendidas em meus pequenos

ensaios jurídicos.

A minha querida avó Mary Almeida

de Lima;

Ao meu orientador, Ministro do

Superior Tribunal de Justiça e

professor doutor Luiz Alberto

Gurgel de Faria, pelo exemplo de

responsabilidade e pela

disponibilidade, solicitude e

confiança projetadas neste trabalho

monográfico.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por nunca ter se esquecido de mim e sempre ter preparado

minha trajetória até aqui.

A minha mãe, Vera Lúcia Gurgel da Costa, que nunca mediu esforços

em me incentivar e investir nos meus estudos.

A Juliane Assunção Paiva, pelo carinho, paciência, amor e apoio

incondicionais.

Ao professor Doutor Marco Bruno Miranda Clementino pela confiança

e apoio durante minha formação acadêmica e profissional, em nome de quem

estendo minha gratidão a todos os servidores da secretaria da 6º Vara Federal

pela receptividade e votos de sucesso.

Ao professor Dr. Iur. Leonardo Martins, pelas preciosas lições sobre

direitos fundamentais.

A Maria Aparecida Bonfim Fernandes, pela solicitude com a qual se

dispôs a corrigir minhas minutas mais elaboradas de estagiário e,

recentemente, o presente ensaio monográfico.

A Valter Lázaro, Mariana Lustosa, Nádia Cortez e todos os que

compuseram o gabinete da 6ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande

do Norte por terem contribuído na minha eterna jornada de aprendizado

jurídico.

A minha avó Mary Almeida de Lima pela motivação, confiança e grande

torcida.

A meu amigo de infância Daniel Maia, pelos incentivos, confiança,

torcida e valioso apoio que transcendem a academia jurídica. Verdadeiramente,

um amigo mais chegado que irmão!

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Aos meus amigos Túlio Jales e Geailson Soares Pereira, pelos

diálogos jurídicos e exemplos de vida.

Ao escritório Seabra de Moura Advogados Associados, pelo apoio e

disponibilização da infraestrutura e acervo bibliográfico necessários na

finalização deste trabalho acadêmico.

Aos amigos conquistados durante esse período: colegas de curso,

coordenação, administração e demais professores da graduação.

Por fim agradeço a todos que ajudaram direta ou indiretamente na

elaboração deste trabalho.

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“A segurança jurídica é um daqueles

objetivos maiores do Direito, que,

abstratamente, a todos apela, mas

que a todos incomoda, no instante de

sua aplicação concreta. De início,

incomoda ao legislador, pois a função

legislativa contemporânea é

fragmentária, apressada e, muitas

vezes, atécnica, quando não caótica.

Incomoda ao administrador, pois a

velocidade do tráfego dos negócios

que devem ser regulados exige

atuação imediata e, amiúde, com

desvios radicais de rota e de ponto de

destino. Incomoda ao juiz, já que a

complexidade e a diversidade dos

conflitos, individuais e coletivos, estão

permanentemente conclamando-o a

explorar novos territórios na aplicação

da lei, o que leva, inexoravelmente, à

alteração das decisões e posições

jurisprudenciais consolidadas.

Finalmente, incomoda à doutrina e

aos próprios jurisdicionados que, ora

festejam inovações judiciais em temas

polêmicos, ora criticam o

conservadorismo do magistrado,

quando esse se apega aos

precedentes e à letra da lei.”.

(Herman Benjamin).

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RESUMO

O presente trabalho tece uma análise geral do processo de execução, a partir de seu conceito, finalidade, evolução histórica, princípios e espécies. Aborda a origem, generalidades e especificidades do processo de execução fiscal. Estuda as fraudes do devedor, notadamente, a fraude contra credores e a fraude à execução. Elucida as diferenças entre a natureza jurídica e reflexos das diferentes espécies dessas fraudes. Expõe as peculiaridades da fraude à execução fiscal, a depender do crédito exequendo, e analisa a evolução de sua interpretação jurisprudencial, tomando como marco o Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.141.990/PR, julgado nos termos do artigo 543-C, do Código de Processo Civil. Explica o efeito vinculante dos precedentes judiciais a partir das evoluções legislativas do direito processual civil. Analisa os limites e conformações de sua aplicação à luz do princípio constitucional da segurança jurídica. Demonstra os problemas e interesses a serem ponderados na interpretação do instituto processual da fraude à execução fiscal de dívidas tributárias. Revela a necessidade de a interpretação da fraude à execução fiscal tributária observar o mesmo regime jurídico aplicável à retroatividade normativa. Defende a manutenção da eficácia dos negócios jurídicos celebrados ao tempo em que a súmula de n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça era pacificamente aplicada à fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária, tanto na redação original do artigo 185, do Código Tributário Nacional, quanto em sua atual redação, dada pela Lei Complementar 118/2005. Traça limites temporais para uma adequada interpretação jurídica da fraude à execução fiscal tributária. Conclui que às alterações jurisprudenciais de interpretações jurídicas já consolidadas e que induziram legítima e essencial confiança para a criação, modificação ou extinção de relações jurídicas - como a que se procedeu no Recurso Especial Repetitivo 1.141.990/PR - deve-se aplicar a modulação dos efeitos, atribuindo-lhes, a priori, efeitos puramente prospectivos.

Palavras-chave: Processo de execução fiscal. Fraudes do devedor. Fraude à execução fiscal tributária. Precedentes judiciais. Segurança jurídica. Modulação dos efeitos.

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ABSTRACT

The current work consists in a general analysis of the enforcement process,

starting from its concept, purpose, historical evolution, principles and kinds. It

approaches the origin, generalities and specificities of the tax enforcement

process. This paper studies defaulters’ frauds, specially the one against lenders

and fraud of tax enforcement. The differences of the legal character and the

reflexes of the different kinds of these frauds are also mentioned. Furthermore,

it shows the peculiarities of the fraud enforcement, depending on the enforced

credit, and analyses the evolution of its judicial interpretation, taking as starting

point the Special Controversy Representative Appeal 1.141.990/PR, judged in

terms of the article 543-C, that is in the Code of Civil Procedure. This work also

explains the binding effect of the judicial precedents beginning from the

legislative evolutions of the civil procedural law. It analyses the limits and

conformations in light of the constitutional principle of judicial security.

Moreover, the presented paper demonstrates the problems and interests that

should be weighted up in the interpretation of the procedural institute of the

fraud of tax enforcement in regards to tax debts. It reveals the need of the

interpretation of the fraud of tax enforcement in observing the same legal

regime applicable to law retroactivity. This paper also defends the maintenance

of the legal transactions’ efficacy that happened in the time when the National

Tax Code’s docket nº 375 was peacefully applied to fraud of tax enforcement of

tax credits, in its original text of the National Tax Code’s 185th article and in its

current form, given by the Supplemental Law 118/2005. This dissertation also

gives temporal limits for an adequate juridical interpretation of the fraud of tax

enforcement. It concludes that to the jurisprudence alterations of juridical

interpretations already consolidated and that caused legitimate and essential

confidence for its creation, modification or extinction of juridical relations – as

the one in Repetitive Special Feature 1.141.990/PR – should apply the

modulation of the effects, giving them, at first, purely prospective effects.

Keywords: Tax enforcement process. Defaulter’s fraud. Fraud of tax

enforcement. Judicial precedents. Legal certainty. Modulation of the effects.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..............................................................................................................14

2 GENERALIDADES SOBRE O PROCESSO DE EXECUÇÃO...............................17

2.1 Conceito e finalidade......................................................................................................17

2.2 Origem e evolução histórica..........................................................................................19

2.3 Princípios..... ...................................................................................................................22

2.4 Espécies............................................................................................................................27

2.5 O processo de execução fiscal........................................................................................33

2.5.1 Considerações gerais........................................................................................................33

2.5.2 Especificidades.................................................................................................................36

3 AS FRAUDES DO DEVEDOR: FRAUDE CONTRA CREDORES E FRAUDE À

EXECUÇÃO...................................................................................................................40

3.1 Fraude contra credores..................................................................................................40

3.2 Fraude à execução..........................................................................................................42

3.3 A fraude à execução fiscal..............................................................................................48

3.3.1 Fraude à execução fiscal de créditos de natureza não tributária......................................49

3.3.2 Fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária.............................................50

3.3.2.1 Antes do REsp 1.141.990/PR...........................................................................................53

3.3.2.2 Depois do REsp 1.141.990/PR.........................................................................................55

4

4.1

4.2

4.3

4.4

5

A SEGURANÇA JURÍDICA NA APLICAÇÃO DO RESP 1.141.990/PR...............60

O efeito vinculante dos precedentes judiciais..............................................................60

Os recursos repetitivos...................................................................................................70

A segurança jurídica e a mudança jurisprudencial....................................................73

A aplicação (ir)retroativa do REsp 1.141.990/PR.......................................................92

CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................96

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................99

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1 - INTRODUÇÃO

O Superior Tribunal de Justiça (STJ), através de sua Primeira Seção, ao julgar

o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR1, firmou o novo

entendimento de que a aplicação de sua súmula de n.º 375 deveria ser afastada, pelo

critério da especialidade, para se interpretar o artigo 185 do Código Tributário Nacional

de modo objetivo, atribuindo presunção iure et iure de fraude à execução quando se

tratar de execuções fiscais de dívida tributária.

Em suas razões de decidir, ao ponderar que o processo de execução fiscal de

créditos tributários é o legítimo meio pelo qual uma pessoa jurídica de direito público

busca a satisfação de um crédito destinado ao atendimento das necessidades públicas, o

referido Órgão Jurisdicional (re)interpretou o artigo 185 do Código Tributário Nacional,

para assentar que a fraude à execução fiscal tributária se opera in re ipsa, sendo

constatada de modo objetivo, sem necessidade de se identificar o consilium fraudis.

A partir de então, considerando a vinculação decorrente desse entendimento

firmado na sistemática dos recursos repetitivos, pelo rito do artigo 543-C do Código de

Processo Civil e a partir das (novas) premissas estabelecidas, os juízes e tribunais

passaram a declarar a ineficácia dos negócios jurídicos de modo objetivo e absoluto,

sem abrir espaço para discussões acerca da boa-fé do adquirente ou dos reflexos na

eficácia de negócios jurídicos celebrados antes da alteração jurisprudencial ocorrida.

Sucede, todavia, que até o julgamento do paradigmático recurso repetitivo,

restava pacífica e inequivocamente assentado que, mesmo para negócios jurídicos

celebrados após o início da vigência da nova redação do artigo 185 do Código

Tributário Nacional, dada pela Lei Complementar n.º 118/2005, aplicava-se à espécie a

súmula nº 375, do Superior Tribunal de Justiça, não bastando a mera constatação da

alienação de bens ou rendas capaz de frustrar a satisfação do débito previamente inscrito

em Dívida Ativa2, para que se presumisse, de modo absoluto, a configuração de fraude à

execução.

1 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990.

Primeira Seção. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 10 de novembro de 2010. Diário de Justiça

Eletrônico. Brasília, 19 nov. 2010, v. 907, p. 583. 2 Nos termos do art. 39, §2º, da Lei 4.320/1964, “Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública

dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e

Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de

empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza,

exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de

serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos

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Com efeito, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça3 revelam que sua

jurisprudência se consolidou no sentido de decidir pela imprescindibilidade do registro

da constrição judicial, ou prova da ciência, por parte do adquirente, do trâmite da

execução fiscal, para que se presumisse a má-fé ou se comprovasse o consilium fraudis

e, consequentemente, pudesse incidir a moldura legal da fraude à execução em todos os

seus efeitos.

No entanto, a partir das (novas) premissas estabelecidas pela Primeira Seção do

Superior Tribunal de Justiça - de que basta(ria) a constatação da alienação de bens ou

rendas capaz de comprometer a satisfação de débito previamente inscrito em dívida

ativa ou em fase de execução, a depender da redação vigente à época da celebração do

negócio jurídico – o Poder Judiciário passou a declarar a ineficácia relativa dos bens ou

direitos negociados em momento anterior à própria alteração jurisprudencial, ao passo

que os Tribunais de instância ordinária e o Superior Tribunal de Justiça começaram a

reformar as decisões ou sentenças em conflito com o novo parâmetro interpretativo.

Neste contexto, fazem-se necessários dois questionamentos.

Primeiramente, Ao se declarar a ineficácia dos negócios jurídicos havidos em

fraude à execução fiscal sem se perquirir acerca da boa-fé do adquirente e das nuances

do caso concreto, não se estaria descurando dos efeitos jurídicos deletérios à eficácia

dos negócios jurídicos celebrados em conformidade com o entendimento jurisprudencial

até então vigente?

Em segundo lugar, não se olvidando que o Superior Tribunal de Justiça,

quando da vigência da redação anterior do artigo 185 do CTN, sempre decidiu

diferentemente, assentando ser indispensável o registro da penhora ou prova da má-fé, e

que, inclusive, que dentre os precedentes que ensejaram a edição da súmula n.º 375,

alguns tinham por objeto justamente a fraude à execução fiscal tributária, aplicar o novo

entendimento do referido Recurso Especial aos negócios jurídicos anteriores à sua

vigência não macularia a segurança jurídica?

responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda

estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras

obrigações legais.” 3(REsp 865.974/RS. Primeira Turma. Relator: Min. Teori Albino Zavascki. DJe 10.09.2008); (REsp

810.170/RS. Segunda Turma. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. DJe 26.08.2008); (AgRg no REsp

1046004⁄MT. Segunda Turma. Relator: Min. Humberto Martins. DJe 23.06.2008); (AgRg no EREsp

719.949-RS. Segunda Seção. Relator: Min. Fernando Gonçalves. DJ 08.11.2007).

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Diante dessas problematizações atinentes aos limites e conformações da nova

interpretação jurídica do paradigma estudado à luz do princípio constitucional da

segurança jurídica é que o presente trabalho acadêmico se desenvolverá.

Será a partir da evolução legislativa procedida na esfera do processo civil

brasileiro, que o aproximou da lógica processual do common law ao conferir crescente

importância para os precedentes judiciais, que se analisará o cabimento da modulação

dos efeitos à nova interpretação jurisprudencial do artigo 185 do Código Tributário

Nacional, de modo a harmonizá-la com o mandamento constitucional da segurança

jurídica.

Para cumprir a proposta desse trabalho, o primeiro capítulo tratará noções

gerais sobre o processo de execução, especialmente a partir de seu conceito e finalidade,

origem e evolução histórica, princípios e espécies. O segundo capítulo tecerá

considerações acerca das generalidades e especificidades do processo de execução

fiscal. O terceiro capítulo se ocupará do estudo das fraudes do devedor, sobretudo da

análise do instituto material da fraude contra credores até a fraude à execução fiscal

tributária e sua nova tendência interpretativa adotada na jurisprudência. O quarto

capítulo esmiuçará a fraude à execução fiscal tributária e não tributária, assentando o

regime jurídico aplicável e interpretação jurisprudencial vigente. E o quinto capítulo

analisará a evolução legislativa no processo civil para, a partir da eficácia dos

precedentes judiciais, observar a segurança jurídica nos efeitos da mudança

jurisprudencial nos recursos repetitivos e o seu desdobramento na modulação dos

efeitos do Recurso Especial Representativo de Controvérsia 1.141.990/PR.

O método utilizado para a obtenção de informações consistiu nas pesquisas

legislativa, jurisprudencial e doutrinária, no âmbito do Direito Constitucional,

Tributário e Processual Civil.

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2 GENERALIDADES SOBRE O PROCESSO DE EXECUÇÃO

O estudo do direito e sua precisa aplicação dependem, para que se atinjam os

fins desejados, da adoção de certos “pontos de partida”, premissas fundamentais e

noções propedêuticas. Portanto, para o regular e satisfatório desenvolvimento do

presente trabalho acadêmico, fazem-se necessárias algumas digressões iniciais.

2.1 Conceito e finalidade

O processo de execução pode ser definido como o conjunto de atos judiciais

deflagrados a partir da propositura de uma ação autônoma ou do início de uma nova

fase procedimental e através do qual o Estado, sub-rogando-se no interesse do credor e

aplicando medidas coativas contra a vontade do executado, busca satisfazer determinada

pretensão jurídica do exequente em conformidade com o direito.

No ordenamento jurídico pátrio, o processo executivo é o meio legítimo - e via

de regra exclusivo4 - pelo qual o credor deve, dentro das balizas legais e sob o controle

do Estado-Juiz, satisfazer suas pretensões relativas ao inadimplemento de obrigações de

dar, fazer, não fazer ou pagar quantia certa aquilatadas em títulos executivos judiciais

(artigo 475-N, do CPC5) ou extrajudiciais (artigo 585, do CPC

6).

4 A despeito de ser taxativo o rol estabelecido pelo artigo 92, da Constituição Federal, de órgãos e

organismos autorizados ao imperativo exercício da jurisdição, subsistem, em nosso ordenamento jurídico,

como exceção, hipóteses de execuções extrajudiciais, como aquelas “instituídas em favor do Banco

Nacional da Habitação e das entidades ligadas ao Sistema Financeiro de Habitação;”, e a que a Lei dos

Condomínios e Incorporações disciplina nas incorporações a preço de custo (DINAMARCO, 2009, p.

65). 5 “Art. 475-N. São títulos executivos judiciais: I – a sentença proferida no processo civil que reconheça a

existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia; II – a sentença penal

condenatória transitada em julgado; III – a sentença homologatória de conciliação ou de transação, ainda

que inclua matéria não posta em juízo; IV – a sentença arbitral; V – o acordo extrajudicial, de qualquer

natureza, homologado judicialmente; VI – a sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de

Justiça; VII – o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros

e aos sucessores a título singular ou universal.” 6 “Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a

debênture e o cheque; II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o

documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação

referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores; III - os

contratos garantidos por hipoteca, penhor, anticrese e caução, bem como os de seguro de vida; IV - o

crédito decorrente de foro e laudêmio; V - o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de

aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio; VI - o

crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos

ou honorários forem aprovados por decisão judicial; VII - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública

da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, correspondente aos créditos

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Ao se analisar o Código de Processo Civil vigente, percebe-se que, ao lado do

processo de conhecimento e do processo cautelar, o processo de execução se projeta

como uma das espécies autônomas de tutela jurisdicional dotada de regras, princípios e

lógica própria, em virtude de seus objetivos e procedimentos específicos, mas que, à

similitude das mencionadas espécies, destina-se à pacificação social.

Conquanto as mencionadas espécies de tutela jurisdicional tenham âmbitos de

abrangência distintos e, por muito tempo, segregados, todas devem ser consideradas

como facetas de uma necessária atuação jurisdicional do Estado. Afinal, como se

resguardará o direito material sem as medidas acautelatórias pertinentes, quando

necessário for? Que serventia haverá em um provimento judicial condenatório ou título

extrajudicial a ele equiparado sem posterior execução? Em verdade, não há pacificação

social ou prevalência do interesse público se a aplicação do direito objetivo ao caso

concreto for despida de utilidade e efetividade.

Digno de menção é o posicionamento de Cândido Rangel Dinamarco (2009, p.

55), segundo o qual:

É jurisdicional a tutela oferecida mediante a execução forçada e também

jurisdicionais as próprias atividades do juiz que a comanda – quer se trate de

execução realizada em processo autônomo, quer mediante mera fase

executiva, quer com preponderância de medidas de sub-rogação, quer de

medidas coercitivas. O resultado institucional desse processo (satisfação do

credor) constitui um modo de pacificar as pessoas envolvidas em crises de

adimplemento, eliminando os conflitos pendentes entre elas – o que é

inerente à função jurisdicional.

Contudo, o monopólio estatal da jurisdição e dos meios coercitivos legais que

lhes são inerentes nos moldes atualmente conhecidos não é uma experiência antiga. Ao

revés, é fruto de uma longa evolução histórica que substituiu gradativamente a justiça

privada e o exercício arbitrário das razões pessoais pela precedência da “vontade da lei”.

Embora o direito e a sociedade nutram uma relação vital de interdependência

(“ubi societas ibi ius”), não é certo dizer que este permaneceu imutável ou hermético à

realidade social. Antes, o direito é fato social e histórico (REALE, 2002), produto

cultural de interesses politicamente eleitos (CLEMENTINO, 2006) e, sob essa ótica,

inconstante, mutável e relativo, motivo pelo qual, nesse estudo monográfico, deve-se

atentar, inicialmente, à evolução dos meios de satisfação dos créditos em algumas

sociedades.

inscritos na forma da lei; VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força

executiva.”.

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19

2.2 Origem e evolução

No direito romano, a execução de determinado débito deveria ser precedida e

lastreada por uma sentença condenatória em face do devedor, com vistas a resguardar os

particulares de constrangimentos por dívidas incertas. Afinal, naquela quadra histórica,

em princípio a própria pessoa do devedor poderia se tornar meio ou objeto de satisfação

de eventuais créditos, sendo apoderada pelo devedor a partir da manus iniecctio.

No período arcaico7, em que vigorou o sistema processual das legis actionis,

após o julgado ser proferido, ao devedor era concedido o prazo de 30 (trinta) dias para

adimplir a obrigação aquilatada na condenação, em conformidade com a lei das XII

Tábuas. Mas, nas ocasiões em que este não satisfizesse seu débito, o credor poderia

conduzi-lo a juízo para que pagasse a importância devida ou oferecesse um vindex,

espécie de fiador (MENDES, A., 2009).

Na hipótese de o devedor não proceder nenhuma dessas duas medidas iniciais,

o magistrado autorizava o devedor “(...) a lançar-lhe a mão (manus iniectio) e encarcera-

lo”, como explica Moacyr Amaral Santos (2011, p. 266).

Após esse procedimento, o credor deveria “(...) apregoar o prisioneiro em três

feiras, de nove em nove dias, visando a obter o seu resgate, pelo valor correspondente à

condenação e, quando ninguém se dispusesse, vendê-lo fora da cidade ou mesmo matá-

lo.” (SANTOS, 2011, p. 266), sendo certo ainda que, na hipótese de haverem múltiplos

credores, o corpo do devedor seria esquartejado e dividido (MENDES, A., 2009).

Desse modo, por um longo período de tempo, a manus iniectio perdurou como

instrumento de execução, permanecendo a própria pessoa do devedor como garantia

para o credor. A pessoa humana era subjugada e “coisificada” em virtude de uma

obrigação econômica inadimplida.

Após a Lei das XII Tábuas, com o advento da Lei Poetelia, ampliaram-se os

casos abarcados pela manus iniectio, mas, por outro lado, estabeleceu-se que, nos casos

em que o devedor não fosse arrematado ou resgatado, seria adjudicado ao credor para

que seus débitos fossem pagos com o produto de seu trabalho. De todo modo, esta

realidade processual ainda se encontrava distante de um sistema jurídico hoje concebido

7 O processo civil romano vivenciou três sistemas, que foram o das legis actiones, o das formulae e o da

cognitio extra ordinem, situados, respectivamente, nos períodos que a história interna designou como pré-

clássico, clássico e pós-clássico (MENDES, A., 2009).

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20

como racionalmente adequado à valorização constitucional da pessoa humana e

embasada na responsabilidade patrimonial (artigo 591, do CPC8).

No período clássico, do processo formulário, após o trintídio acima explicado,

caso o devedor não satisfizesse voluntariamente o crédito existente, o credor deveria

propor a actio iudicati, através da qual requereria a execução pela manus iniectio ou

pela pignoris capio, ocasião em que os bens do devedor seriam vendidos em praça

pública (bonorum venditio) e o resultado das negociações aprouveria ao credor. Por

outro lado, caso o devedor impugnasse a ação executiva, redigia-se a fórmula, que era

entregue às partes (litiscontestatio) e inaugurava-se o procedimento in iudicium

(SANTOS, 2011).

Por fim, no período pós-clássico, sob a égide do regime da cognitio extra

ordinem, apenas os bens suficientes para a satisfação da condenação eram constrangidos

para a satisfação do débito. E desse modo, progressivamente o direito foi evoluindo,

assemelhando-se aos contornos executivos atuais e suplantando o caráter pessoal da

execução pela patrimonialidade.

Após a queda de Roma, o processo executivo germano-barbárico passou a

divergir consideravelmente do romano.

Enquanto no sistema romano protegia-se o devedor, que somente podia ser

executado quando plenamente convencido da sua obrigação e com

fundamento em sentença condenatória, no sistema germânico, considerado o

inadimplemento da obrigação como ofensa à pessoa do credor, era este, sem

dependência de qualquer autoridade, a quem não precisava dirigir-se,

autorizado a penhorar, mesmo usando das próprias forças, os bens do devedor

a fim de pagar-se ou constrangê-lo ao pagamento. (SANTOS, 2011, p. 268).

Com o passar do tempo, a penhora passou a depender de prévia autorização

judicial. Todavia, esta se adstringia ao exame das formalidades do pedido, e não da

regularidade e validade da relação obrigacional (MARINONI; ARENHART, 2010).

Já na Idade Média, os juristas combinaram o sistema de execução romano com

o germânico, criando o procedimento per officium iudicis. Reconheceu-se o requisito da

prévia condenação como pressuposto para uma execução legítima, ao passo que se

dispensou a actio iudicati, em homenagem à celeridade da execução no sistema

germano-barbárico (MARINONI; ARENHART, 2010).

Após a sentença, a requerimento do credor se iniciava um novo processo, no

8 “Art. 591. O devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens

presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei.”

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21

qual se observava uma execução aparelhada (executionem paratam) pelos poderes

executórios do juiz, com vistas a realizar a pretensão reconhecida por decisão judicial.

Com o desenvolvimento comercial e sua dinâmica, surgiu a necessidade de

uma célere satisfação de determinados créditos. Assim, passou-se a estender a eficácia

executiva própria das sentenças condenatórias para certos instrumentos de dívida

reconhecidos e lavrados perante tabelião (instrumenta guarentegiata) e se criou, ao lado

da execução aparelhada, um outro processo executivo, para estes novos títulos

executivos extrajudiciais, reservando-se a actio iudicati para situações excepcionais,

como a liquidação de sentença (SANTOS, 2011).

Em outros termos,

Com o passar do tempo e a sofisticação das relações comerciais, novos

documentos foram qualificados como títulos executivos extrajudiciais,

sempre com o objetivo de facilitar a execução, tornando-a algo que, ao invés

de se basear em uma declaração judicial posterior à verificação do direito,

fundava-se apenas em um documento que, visto em abstrato (letra de câmbio,

nota promissória etc.), era suficiente para fazer crer que existia um direito de

crédito (MARINONI; ARENHART, 2010, p. 30).

No regime das Ordenações do velho direito português, continuou-se a

disciplinar os três mencionados procedimentos, a saber, a actio iudicati para situações

nas quais ainda não havia condenação, a execução de sentença e a ação executiva, esta

última fundada em créditos do fisco e outros créditos privilegiados (SANTOS, 2011).

Já na realidade jurídica brasileira, o Código de Processo Civil de 1939

preservou tão somente a execução de sentença e incluiu a ação executiva, fundada em

créditos aos quais a lei atribui eficácia executiva, entre as ações especiais (SANTOS,

2011).

Por fim, o Código de Processo Civil vigente, após as reformas introduzidas

pelas Leis 11.232/2005 e 11.382/2006, trouxe uma nova sistemática, segundo a qual a

execução de sentença não mais se daria por um processo autônomo, mas por uma nova

fase procedimental, criando o que se denominou de processo sincrético. Aos títulos

executivos extrajudiciais, reservou-se o processo autônomo de execução.

Então, no atual estágio do direito objetivo brasileiro, a partir do

descumprimento de uma obrigação certa, líquida e exigível (artigo 580, do CPC9),

9 “Art. 580. A execução pode ser instaurada caso o devedor não satisfaça a obrigação certa, líquida e

exigível, consubstanciada em título executivo.”

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22

circunscrita a um título executivo, chancela-se ao credor o direito de ajuizar uma

execução para provocar o Estado a empregar as medidas coativas necessárias à

satisfação do crédito existente.

Desse modo, ao contrário da sistemática executiva inicial do direito germano-

barbárico e seguindo a que na Idade Média se iniciou, para satisfazer seu direito

creditício, o credor deve provocar o Poder Judiciário para conferir efetividade ao título

executivo (SANTOS, 2011).

A partir do momento em que o Estado criminaliza o exercício arbitrário das

próprias razões (artigo 345 do Código Penal) e passa a monopolizar os meios legítimos

e racionais de execução, movendo o aparato estatal em face de um devedor e

independente de sua cooperação e vontade, uma série de princípios ganha relevo, tudo

com vistas a equacionar interesses e resguardar valores constitucionalmente assentados.

2.3 Princípios

Os princípios são fundamentos do próprio sistema e vetores interpretativos, que

irão contribuir para que a produção, interpretação e aplicação do direito objetivo ao caso

concreto se deem de modo preciso, adequado e acertado.

Como ramo do direito dotado de autonomia, o processo civil e, mais

especificamente, o processo de execução são dotados de princípios próprios, expressos

ou implícitos, normativos ou supralegais, inerentes à sua natureza e relevantes para a

correta compreensão e aplicação de seus instrumentos.

Inicialmente, deve-se atentar ao princípio da nulla executio sine titulo, nascido

nas concepções processuais liberais do final do século XIX, com vistas a debelar a

possibilidade de se deflagrar uma execução sem a certeza quanto à existência do direito,

como elucidam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2010).

Desse modo, reputa-se indispensável a existência de um título executivo para

lastrear uma execução, mas não apenas isso. Este título executivo deve se lograr dos

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23

atributos da certeza10

, liquidez11

e exigibilidade12

, sob pena de a execução ser

considerada nula (artigos 58613

e 618, I14

, ambos do CPC).

No processo de execução, ao contrário do que se presencia nos processos

cautelar e de conhecimento, o demandado, doravante denominado executado, é sempre

colocado em uma situação de desvantagem processual e material.

Considerado como devedor na execução, sua citação não se dá com o fito de

ofertar contestação, reconvir, propor ação declaratória incidental, impugnar ou recorrer,

mas para cumprir uma obrigação a ele imputada. Caso se trate de processo autônomo de

execução, o prazo, em regra, será de 3 (três) dias, conforme prevê o artigo 652 do CPC.

Em se tratando de cumprimento de sentença, por seu turno, o prazo será de 15 (quinze)

dias, sob pena de multa, nos termos do artigo 475-J, do CPC15

.

Como se percebe, do ponto de vista processual, o executado já é tratado como

devedor e não é por outra razão que a execução se desenvolve no interesse do credor16

,

com atos materiais de restrição de direitos e constrição de bens, respeitadas as balizas

legais de ordem pública, tais como a impenhorabilidade, que adiante será retomada.

Portanto, para justificar este desnível entre as partes e legitimar os atos

executórios, exige-se o título executivo, que presumidamente comprova a existência de

uma pretensão creditício-executória digna de tutela e afasta os efeitos da revelia pela

ausência de impugnação do credor na ação incidental autônoma de embargos à

execução17

.

10

O atributo da certeza atine à existência da obrigação. 11

O atributo da liquidez diz respeito à determinação do quantum debeatur ou precisão do objeto

obrigacional. 12

O atributo da exigibilidade impõe a inexistência de termo, condição ou óbice à cobrança. 13

“Art. 586. A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título de obrigação certa,

líquida e exigível.” 14

“Art. 618. É nula a execução: I - se o título executivo extrajudicial não corresponder a obrigação certa,

líquida e exigível (art. 586)” 15

“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não

o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez

por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á

mandado de penhora e avaliação.” 16

Conforme o artigo 612, do CPC, “Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o

concurso universal (art. 751, III), realiza-se a execução no interesse do credor, que adquire, pela penhora,

o direito de preferência sobre os bens penhorados”. 17

“A não impugnação dos embargos do devedor não induz os efeitos da revelia, pois que, no processo de

execução, diferentemente do processo de conhecimento em que se busca a certeza do direito vindicado, o

direito do credor encontra-se consubstanciado no próprio título, que se reveste de presunção de

veracidade, até porque já anteriormente comprovado, cabendo, assim, ao embargante-executado o ônus

quanto à desconstituição da eficácia do título executivo” (STJ. REsp n.º 601.957/RJ. Relator: Ministro

Hamilton Carvalhido. Sexta Turma. Votação unânime. Julgado em 23 de agosto de 2005. DJe de

14/11/2005).

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24

É o título executivo que irá qualificar as pessoas do credor e devedor,

fundamentar e delimitar o direito daquele e impondo ao Estado o dever de satisfazê-lo

mediante os atos processuais constritivos e expropriatórios necessários. Tais “(...)

atividades se voltam contra o executado, que não pode impedi-las, não lhe cabendo

senão o poder de exigir que se realizem na conformidade e nos limites da lei”

(SANTOS, 2011, p. 273).

Na esteira deste raciocínio, exsurge o princípio da nulla titulus sine lege,

segundo o qual o rol de títulos executivos deve ser interpretado restritivamente e

considerado exauriente, numerus clausus. Apenas a lei, enquanto manifestação do

estado democrático de direito, é que pode criar novas espécies de título executivo e

conferir-lhes eficácia executiva, tudo com vistas a legitimar as desvantagens processual

e material do executado no trâmite do processo executivo.

Uma vez proposta uma ação autônoma de execução fundada em título

executivo extrajudicial ou deflagrada a fase procedimental de cumprimento de sentença,

os atos executórios se assentarão no princípio da patrimonialidade, conforme já

mencionado. Encontrando-se positivado no artigo 591, do Código de Processo Civil, o

referido princípio não se restringe a determinar que os bens presentes e futuros do

devedor responderão pelo débito. Antes, é fruto de uma lenta e gradativa evolução

histórica que extirpou a morte e escravidão do devedor, transferindo a responsabilidade

pessoal e corpórea do devedor para o seu patrimônio.

No atual Estado Democrático de Direito, com a precedência normativa da

Constituição Federal, que se pauta no fundamento principiológico da dignidade da

pessoa humana (artigo 1º, caput e inciso III, da CF18

) e no respeito aos invioláveis

direitos fundamentais à vida e à liberdade (artigo 5º, caput, da CF19

), o processo de

execução deve recair sobre coisas, ao invés de “coisificar” a pessoa humana, vedando-se

a possibilidade de esta responder por seus débitos com o próprio corpo, liberdade, vida

e dignidade.

O patrimônio do devedor, portanto, passou a ter importância central para a

satisfação dos débitos havidos, a partir da tutela jurisdicional executiva. Em verdade, na

18

“Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e

do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III – a

dignidade da pessoa humana”. 19

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à

igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes.”

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25

ausência de bens suficientes e hábeis para satisfazer a execução, quer por uma vida

financeiramente abastada do devedor ou pela adoção de medidas perniciosas, não

haverá efetividade do processo executivo lato sensu.

Indo além, no direito objetivo vigente, ainda que a execução seja norteada

pelos princípios da responsabilidade patrimonial e da disponibilidade20

, superou-se a

noção de vingança privada da execução, para que esta se desse na justa medida do

necessário para a satisfação do devedor. Só se procederão as expropriações necessárias

até o limite do valor da dívida.

Ademais, com vistas a resguardar a dignidade da pessoa humana e preservar-

lhe um patrimônio mínimo, o legislador instituiu um rol de impenhorabilidades, nos

termos do artigo 649, do Código de Processo Civil e da Lei do Bem de Família

(8.009/90), reconhecendo a prevalência de uma vivência minimamente digna do

devedor em detrimento do interesse patrimonial do credor, salvo raras exceções, como

no caso da execução de alimentos, que admite penhora de salário, inclusive com

desconto em folha, nos termos do artigo 734, do Código de Processo Civil.

Neste aspecto, cumpre informar, inclusive, que a Segunda Seção do Superior

Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do AgRg no EREsp 888.654/ES21

,

assentou que a impenhorabilidade do bem de família é irrenunciável, por ser matéria de

ordem pública.

Prosseguindo nessa tendência de racionalização do processo de execução e

vedação de seu emprego como instrumento de vingança privada pelo credor, positivou-

se, no artigo 620, do Código de Processo Civil22

, o princípio da menor onerosidade.

Com base neste princípio, passou-se a proibir os meios executivos que não

gerem a satisfação do débito, a exemplo da vedação ao emprego de atos executivos que

gerem pouca efetividade para muito prejuízo ao devedor, como na hipótese legal

contemplada no artigo 659, §2º, do CPC23

. Portanto, se houver diferentes meios de se

proceder à execução, escolher-se-á o menos oneroso.

20

Nos termos do artigo 569, caput, do CPC, “o credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou

de apenas algumas medidas executivas”. 21

“A proteção legal conferida ao bem de família pela Lei n.º 8.009/1990 não pode ser afastada por

renúncia do devedor ao privilégio, pois é princípio de ordem pública, prevalente sobre a vontade

manifestada” (STJ. AgRg no EREsp n.º888.654/ES. Segunda Seção. Relator: Min. João Otávio de

Noronha. Votação unânime. DJe de 18/03/2011). 22

“Art. 620. Quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça

pelo modo menos gravoso para o devedor.” 23

“Não se levará a efeito a penhora, quando evidente que o produto da execução dos bens encontrados

será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução.”

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26

Contudo, o princípio da menor onerosidade, conforme leciona Cândido Rangel

Dinamarco (2009), deve ser analisado em conjunto com o princípio da efetividade da

tutela executiva, não o precedendo in abstrato.

O princípio da efetividade na prestação da tutela jurisdicional, decorrente dos

princípios constitucionais da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal e

da celeridade processual, impõe ao Estado, ao exercer o monopólio legítimo da

jurisdição e dos meios coativos, o dever de proceder de modo mais efetivo e adequado

na satisfação dos interesses dos jurisdicionados que lhes forem submetidos à apreciação,

independentemente da necessidade jurídica envolvida.

Conforme elucida Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (2009, p. 87),

a efetividade está consagrada na Constituição Federal, art. 5º, XXXV, pois

não é suficiente tão-somente abrir a porta de entrada do Poder Judiciário, mas

prestar jurisdição tanto quanto possível eficiente, efetiva e justa, mediante um

processo sem dilações temporais ou formalismos excessivos, que conceda ao

vencedor no plano jurídico e social tudo a que faça jus.

Portanto, notadamente quando se trata de obrigações de pagar quantia certa,

cujo provimento judicial condenatório ou título executivo a ele equiparado não são auto

satisfativos - ao contrário das sentenças declaratórias e (des)constitutivas - impõe-se a

observância dos meios de execução como desdobramento lógico da efetiva e satisfatória

tutela do direito material.

Por fim, dentre os muitos outros princípios processuais, deve-se frisar o

princípio da boa-fé processual, que impõe aos integrantes da relação jurídico-processual

o dever de agir com lealdade, cooperação e integridade. A sua inobservância caracteriza

ato atentatório à dignidade da jurisdição (contempt of court) e enseja a cominação de

multas, nos termos dos artigos 14, parágrafo único, 601 e 538, parágrafo único, todos do

Código de Processo Civil.

Ao deduzir pretensões manifestamente infundadas, alegar informações

inverídicas, fraudar a execução e opor embargos de declaração com intuito meramente

protelatório, as partes processuais estão desrespeitando a própria atividade jurisdicional

do Estado, maculando o regular, devido e ideal trâmite processual e, por isso, merecem

reprimendas processuais sancionatórias próprias.

Para o processo de execução, especificamente, há disciplina legal para atos de

má-fé eventualmente praticados pela pessoa do executado com vistas a fraudar a

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27

efetividade que deve se verificar nos atos executivos e, por conseguinte, frustrar a

legítima pretensão econômica do credor. A saber, nos termos do artigo 600, do CPC,

Art. 600. Considera-se atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado

que:

I - frauda a execução;

II - se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios

artificiosos;

III - resiste injustificadamente às ordens judiciais;

IV - intimado, não indica ao juiz, em 5 (cinco) dias, quais são e onde se

encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores.

Caso se verifique alguma dessas hipóteses, o executado que se imbuiu de má-fé

se sujeitará à sanção de até 20% (vinte por cento) do valor da causa, a depender da

intensidade de sua conduta perpetrada, nos termos do artigo 601, do Código de Processo

Civil.

Portanto, como se depreende da moldura legal transcrita, o instituto da fraude à

execução, objeto de análise da presente monografia e que será melhor trabalhada

posteriormente, enquadra-se como ato atentatório à dignidade da justiça, por não

frustrar apenas a legítima pretensão do credor, como também – e principalmente – o

respeito que o próprio Poder Judiciário deve lograr, motivo pelo qual além de sanção

processual, o legislador penal tipificou este ato de má-fé como crime (vide artigo 179,

do Código Penal).

2.4 Espécies

Como se viu na evolução histórica (vide item 2.2), o processo de execução, ao

longo do tempo, sempre foi sendo modelado a partir da realidade e das necessidades

sociais, conforme a cultura, valores e interesses envolvidos. Entretanto, tais

modificações e evoluções não ficaram adstritas ao decurso do tempo.

No direito processual civil brasileiro, a depender das situações jurídicas

substanciais envolvidas, constatam-se tratamentos normativos diferenciados, e é a partir

dessa noção que surgem os estudos doutrinários acerca das espécies de execução. Não

se pretende neste momento, todavia, tecer as minúcias nesta dogmática, mas assentar

novas premissas para a compreensão do trabalho, a partir de nuances objetivas e

subjetivas relevantes.

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28

Assim como a dinâmica dos atos atentatórios à posse levou o legislador a

positivar o princípio da fungibilidade das ações possessórias24

e as peculiaridades da

Administração Pública levaram à criação de um conjunto de regras materiais e

processuais específicas - como as cláusulas exorbitantes, no âmbito dos contratos

administrativos, e a prerrogativa de intimação pessoal do representante da Fazenda

Pública25

, no ramo que a doutrina denomina de Direito Processual Público26

-, a origem

e espécie da obrigação exequenda, bem como a natureza dos créditos executados e os

atributos dos sujeitos da relação obrigacional demandaram tratamentos procedimentais

executivos diferenciados para as suas satisfações.

A saber, dentre as diversas classificações criadas pela doutrina, inicialmente

pode-se destacar a distinção entre a execução por processo autônomo e a execução por

fase procedimental.

A execução por processo autônomo se dá quando, pela origem do título

executivo ou faculdade legal conferida ao credor, este deva propor uma ação autônoma

para executar seus créditos. Sempre que se tratar de um Título Executivo Extrajudicial

(exs: cheque, contrato assinado por duas testemunhas, Certidão de Dívida Ativa, etc.)

sua execução se dará por processo autônomo, à similitude da execução da instrumenta

guarentegiata27

e da ação executiva fundada em créditos do fisco e outros créditos

privilegiados, na vigência das Ordenações do antigo direito português.

Sucede que, pelo fato de os títulos executivos extrajudiciais prescindirem de

ação condenatória prévia para lograrem de eficácia executiva, sendo equiparados, por

força de lei, a um título executivo judicial, a medida processual adequada e necessária

para a satisfação dos créditos neles consubstanciados é apenas a propositura de ação

executiva própria.

Em outros termos, não há interesse em deduzir uma pretensão condenatória

através da propositura de uma ação cognitiva própria, haja vista que os títulos

24

Preceitua o artigo 920, do Código de Processo Civil, que “A propositura de uma ação possessória em

vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção correspondente àquela,

cujos requisitos estejam provados”. 25

Nos termos do artigo 25, da Lei 6.830/80, “Na execução fiscal, qualquer intimação ao representante

judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente”. O artigo 38, da Lei Complementar 70/93, por seu

turno, ampliou esta prerrogativa, ao estabelecer que “As intimações e notificação são feitas nas pessoas

do Advogado da União ou do Procurador da Fazenda Nacional que oficie nos respectivos autos”. 26

“A sistematização e o incremento das normas relativas à Fazenda Pública em Juízo vem ressaltando a

atenção de alguns estudiosos, que consideram, inclusive, já haver um regime próprio relativo ao tema,

denominando-o de Direito Processual Público”. (CUNHA, 2014, p. 11). 27

Como já explicitado no tópico 2.2, tratava-se de documento lavrado por tabelião ao qual se conferiu, no

contexto de desenvolvimento comercial, eficácia similar à de uma sentença condenatória.

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29

executivos extrajudiciais, previstos taxativamente no artigo 585, do Código de Processo

Civil, têm por força de lei eficácia executiva análoga à de uma sentença condenatória.

Desse modo, proposta a ação autônoma de execução, o executado será citado para, no

prazo de 3 (três) dias, efetuar o pagamento da dívida (artigo 652, caput, do CPC) e/ou,

querendo, defender-se por meio da ação incidental autônoma de embargos à execução

(artigo 736 e seguintes, do CPC).

Durante certo período histórico, como já foi relatado, no ordenamento jurídico

brasileiro se exigia a propositura de uma nova ação para a execução das sentenças

condenatórias prolatadas em processos de conhecimento. Contudo, após a reforma

processual introduzida a partir da Lei 11.232/2005, estabeleceu-se uma nova

sistemática, segundo a qual, de regra, após o trânsito em julgado da sentença

condenatória e mediante requerimento do vencedor, instaura-se uma nova fase

procedimental, intimando-se a parte sucumbente na pessoa de seu advogado para, nos

termos do artigo 475-J, caput28

, do Código de Processo Civil, cumprir voluntariamente

a obrigação29

.

Assim, dentro desse fenômeno do sincretismo processual, a regra para a

execução de um título executivo judicial passou a ser a fase procedimental executiva de

cumprimento de sentença, nos termos do artigo 475-I, do Código de Processo Civil,

podendo o executado se defender através da impugnação ao cumprimento de sentença,

para a qual é imprescindível a garantia do juízo e cujo âmbito cognitivo se restringe ao

taxativo elenco do artigo 475-L, do mesmo diploma normativo, pelo fato de a questão

jurídica de fundo já ter sido apreciada pelo Poder Judiciário, atraindo o respeito

conferido ao atributo da coisa julgada material.

Quando o sujeito passivo da obrigação de pagar quantia certa for a Fazenda

Pública, entretanto, a execução se dará de forma especial, em atenção aos atributos da

impenhorabilidade e inalienabilidade dos bens públicos. A saber, observar-se-ão os

28

“Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no

prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e,

a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, experdir-se-á mandado

de penhora e avaliação”. 29

“O cumprimento da sentença não se efetiva de forma automática, ou seja, logo após o trânsito em

julgado da decisão. De acordo com o art. 475-J combinado com os arts. 475-B e 614, todos do CPC, cabe

ao credor o exercício de atos para o regular cumprimento da decisão condenatória, especialmente requerer

ao juízo que dê ciência ao devedor sobre o montante apurado, consoante memória de cálculo discriminada

e atualizada”. (STJ. REsp 940.274/MS. Corte Especial. Relator para acórdão: Min. João Otávio de

Noronha. DJe de 31/05/2010).

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30

termos do artigo 73030

, do Código de Processo Civil e o adimplemento da obrigação de

pagar quantia certa se submeterá ao regime de precatórios ou requisição de pequeno

valor, previstos no artigo 100, da Constituição Federal.

Todavia, caso se trate de execução de obrigações de fazer, não fazer ou

entregar coisa, não haverá qualquer procedimento especial distinto para a Fazenda

Pública e particulares31

, casos nos quais se observarão as disposições dos artigos 461 e

461-A, ambos do Código de Processo Civil.

Desse modo, caso uma sentença condene a Fazenda Pública em obrigação de

fazer e de pagar quantia certa, o capítulo que a condenou na tutela específica será

executado nos termos do artigo 461, do Código de Processo Civil, ao passo que apenas

e tão somente o capítulo condenatório de obrigação de pagar quantia certa é que será

executado por processo autônomo.

Em se tratando de execução de alimentos, por seu turno, o credor terá a

faculdade de escolher entre a modalidade executiva cujo rito se encontra previsto no

artigo 732, do Código de Processo Civil, ou a execução especial insculpida no artigo

733, do mesmo diploma normativo, ocasião em que se deparará com única hipótese de

prisão civil por dívida atualmente admitida32

. Caso se escolha a primeira modalidade, a

execução se desenvolverá por fase procedimental, aplicando-se as regras comuns ao

30

“Art. 730. Na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, citar-se-á a devedora para opor

embargos em 10 (dez) dias; se esta não os opuser, no prazo legal, observar-se-ão as seguintes regras: I - o

juiz requisitará o pagamento por intermédio do presidente do tribunal competente; II - far-se-á o

pagamento na ordem de apresentação do precatório e à conta do respectivo crédito.” 31

“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO

IMEDIATO DA DECISÃO JUDICIAL QUE DETERMINA A IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL DO INS DESPROVIDO. 1. O julgamento que condena

o INSS ao pagamento de novo benefício ou à revisão da renda mensal do benefício já concedido

estabelece: a) uma obrigação de pagar, relative ao pagameno das parcelas vencidas, que será objeto de

execução autônoma, regulada pelo art. 730 do CPC; e b) uma obrigação de fazer, consistente na

determinação de implantação do benefício ou da nova renda mensal, regulada pelo art. 461 do CPC. 2.

Sendo a execução da parte da sentença que determina a implantação do benefício regulada pelo art. 461

do CPC, não há que se falar em execução provisória, como pretende o INSS. A partir do trânsito em

julgado da sentença, ou da admissão de recurso desprovido de efeito suspensivo, o juiz, de ofício ou a

requerimento da parte, determinará a intimação do réu para que cumpra, no prazo fixado pelo título

executive, a obrigação de implantar o benefício. 3. Agravo Regimental desprovido.”. (STJ. AgRg no

REsp 1.056.742/RS. Quinta Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Votação unânime.

Julgado em 14/09/2010. DJe de 11/10/2010). 32

O Supremo Tribunal Federal reconheceu o status hierárquico de norma supralegal ao Pacto de San José

da Costa Rica e, ao interpretar o artigo 7º, §7º, da referida Convenção, declarou a insubsistência da prisão

civil do depositário infiel. Em virtude disso, editou a Súmula Vinculante n.º 25, que declara, in verbis: “é

ilícita a prisão civil, qualquer que seja a modalidade de depósito”. Portanto, atualmente, apenas a prisão

civil do devedor de alimentos permanece válida. Para maiores aprofundamentos, vide os julgamentos do

Supremo Tribunal Federal nos RE n.º 349.703/RS, RE n.º 466.343/SP, HC n.º 87.585/TO e HC n.º

92.566/SP.

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31

cumprimento de sentença. Entretanto, caso o credor opte pela segunda espécie

executiva, iniciar-se-á um processo autônomo de execução e com rito específico.

Tal distinção, por imposição do artigo 5º, LXVII33

, da Constituição Federal,

demonstra a excepcionalização da área de proteção do direito fundamental à liberdade

de locomoção (artigo 5º, caput e inciso XV, da CF) com vistas a resguardar a

subsistência minimamente digna e satisfatória dos alimentandos. Há, portanto, uma

adequação constitucional do processo civil em atenção aos interesses especificamente

envolvidos, diga-se, a maior relevância social do crédito perseguido.

De todo modo, independente da natureza da “crise de satisfação” do direito

material, observar-se-á o caráter substitutivo da jurisdição executiva, com vistas a

conferir efetividade às pretensões do exequente e, ao mesmo tempo, substituir a vontade

particular do executado pela vontade da lei, a partir da observância dos parâmetros

legais estabelecidos.

A esta atuação do Estado-Juiz na aplicação dos meios executivos que lhes são

disponibilizados, dentre os quais podem-se mencionar a busca e apreensão (artigos 461,

§5 e 461-A, §2º e 625, do CPC), penhora e expropriação (artigos 612, 646 e 647, do

CPC), dá-se o nome de execução por sub-rogação, por prescindirem da voluntariedade

do devedor.

Entretanto, ao lado desse caráter substitutivo comum a toda execução judicial,

com atos materiais de execução, incorporaram-se outras medidas executivas que

compõem o que se passou a denominar execução indireta. A saber, para a resolução da

crise de satisfação da relação obrigacional subjacente, o legislador também previu

mecanismos para compelir psicologicamente o devedor a, voluntariamente, adimplir a

sua obrigação.

As medidas de execução indireta, por seu turno, consistem em hipóteses de

piora da situação do devedor ou oferta de melhoras, a partir da projeção volitiva do

executado, sendo certo que, em um mesmo processo de execução, podem conviver

ambas as modalidades executivas, não havendo ordem abstrata de precedência.

A forma clássica dessa modalidade executiva é a possibilidade de piora da

situação do devedor, podendo ser dado, a título de exemplo, a cominação – inclusive de

33

“Não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e

inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”.

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32

ofício e em face da Fazenda Pública34

- de astreintes35

para aqueles que têm o dever

imediato de fazer ou não fazer determinado ato36

, nos termos do artigo 461, §4º, do

Código de Processo Civil37

, e a prisão civil do devedor de alimentos já mencionada

alhures.

Na execução judicial de uma obrigação de entregar coisa, o juízo tanto pode se

valer de execução indireta, através da aplicação de astreintes, como também determinar

atos materiais de execução por sub-rogação, tais como a busca e apreensão, quando o

objeto obrigacional mediato for um bem móvel, ou determinar a imissão na posse, caso

o objeto mediato do vínculo obrigacional seja um bem imóvel.

De igual modo, em se tratando de obrigação de fazer fungível, será lícito ao

juízo da execução, a requerimento do exequente/credor, determinar que um terceiro

satisfaça a prestação econômica à custa do executado, conforme estabelecido pelo

legislador no artigo 63438

, do Código de Processo Civil.

A multa de 10% (dez por cento) pelo inadimplemento voluntário na fase

procedimental executiva do cumprimento de sentença, prevista no artigo 475-J39

, do

Código de Processo Civil, contudo, é vista pela jurisprudência do Superior Tribunal de

Justiça como sanção processual, tendo, portanto, natureza diversa das astreintes.

Por fim, podem-se destacar a “sanção premial” prevista para a ação monitória,

segundo a qual se o réu cumprir a obrigação no prazo de 15 (quinze) dias, estará isento

do pagamento de custas e honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do artigo

34

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIO. SERVIDOR CIVIL. REVISÃO DE PENSÃO.

OBRIGAÇÃO DE FAZER E ENTREGAR COISA. COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA CONTRA A

FAZENDA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido

de ser possível ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária cominatória – astreintes -,

ainda que seja contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer. Agravo

regimental improvido” (STJ. AgRg no AREsp 7.869/RS. Segunda Turma. Relator: Ministro Humberto

Martins. Votação unânime. Julgado em 09/08/2011. DJe de 17/08/2011). 35

Por ser uma forma de execução indireta, o FONAJE editou o enunciado cível n.º 144, segundo o qual

“a multa cominatória não fica limitada ao valor de 40 salários mínimos, embora deva ser razoavelmente

fixada pelo Juiz, obedecendo ao valor da obrigação principal, mais perdas e danos, atendidas as condições

econômicas do devedor”. 36

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (vide REsp 1.036.968/DF. Primeira Turma.

Relator: Ministro Teori Albino Zavascki), a multa cominatória diária ou periódica do artigo 461, do

Código de Processo Civil não se aplica às obrigações de pagar quantia certa. 37

“§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu,

independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe

prazo razoável para o cumprimento do preceito.” 38

“Art. 634. Se o fato puder ser prestado por terceiro, é lícito ao juiz, a requerimento do exeqüente,

decidir que aquele o realize à custa do executado.” 39

“Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não

o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez

por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á

mandado de penhora e avaliação.”

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33

1.102-C, § 1º40

, do Código de Processo Civil, e a redução da verba honorária pela

metade, caso, no prazo de 3 (três) dias, o devedor solvente pague integralmente o débito

exequendo no processo autônomo de execução, nos termos do artigo 652-A, parágrafo

único41

, do Código de Processo Civil.

Ultrapassadas as digressões iniciais realizadas neste primeiro capítulo, passar-

se-á ao estudo do processo de execução fiscal, modalidade especial de processo

autônomo de execução de título executivo extrajudicial.

2.5 – A execução fiscal

2.5.1 – Considerações gerais

A execução fiscal pode ser conceituada como o processo autônomo de

execução vocacionado à satisfação dos créditos inscritos na dívida ativa da Fazenda

Pública, de natureza tributária (impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos

compulsórios ou contribuições especiais) ou não tributária (preços públicos, multas

administrativas, etc.), através das regras procedimentais especialmente estabelecidas

pela Lei 6.830/1980.

A Lei 6.830/1980, também conhecida como Lei de Execução Fiscal (LEF), foi

editada após a promulgação do Código de Processo Civil de 1973 com vistas a

estabelecer um mecanismo jurídico-processual diferenciado para a “cobrança judicial”42

da Dívida Ativa, imprimindo maior celeridade na tramitação processual e possibilitando

maior efetividade na consecução dos créditos da Fazenda Pública43

, cujo conceito

compreende União, Estados, Municípios, Autarquias e Fundações44

.

Por ser lastreada por um título executivo extrajudicial, a saber, a Certidão de

Dívida Ativa, a execução fiscal será sempre um processo autônomo de execução,

40

“§ 1o Cumprindo o réu o mandado, ficará isento de custas e honorários advocatícios.”

41 “No caso de integral pagamento no prazo de 3 (três) dias, a verba honorária será reduzida pela metade.”

42 A despeito de a Lei 6.830/1980 se referir ao termos “cobrança judicial”, “(...) não se refere à ação de

cobrança, como ação de conhecimento que busque a formação de um título executivo judicial

consubstanciado em sentença condenatória. Diferentemente, prevê a constituição, pela própria Fazenda

Pública, de um título executivo extrajudicial com suporte no qual venha, então, deduzir pretensão de

cobrança – no sentido de buscar a satisfação compulsória – do montante a ela devido, ou seja, de

execução”. (PAULSEN; ÁVILA; SLIWKA, p.145). 43

Nos termos do artigo 1º, da Lei de Execuções Fiscais (Lei n.º 6.830/1980), “A execução judicial para

cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas

autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil”. 44

“A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal equipara as fundações públicas a autarquias, por se

qualificarem como entidades governamentais dotadas de capacidade administrativa, integrantes da

Administração Pública descentralizada (...)”. (PAULSEN; ÁVILA; SLIWKA, p.147).

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34

motivo pelo qual serão a ela aplicadas subsidiariamente as disposições do Código de

Processo Civil, sobretudo as relativas à execução dos títulos executivos extrajudiciais,

bem como também todo o regime principiológico (vide item 2.3). Afinal, na Exposição

de Motivos n.º 223 enviada para o Presidente da República, em 2 de junho de 1980,

consignou-se que

a par de não revogar as linhas gerais e a filosofia do Código, disciplina a

matéria no essencial, para assegurar não só os privilégios e garantias da

Fazenda Pública em juízo, como também a agilização e racionalização da

cobrança da dívida ativa.

Todavia, com vistas a precisar o regime jurídico aplicável às questões

incidentais ao rito específico em comento, deve-se atentar à natureza jurídica do crédito

exequendo, porquanto, não se olvidando que as regras e princípios processuais

abstraídos da Lei de Execuções Fiscais e do Código de Ritos pátrio, de regra, aplicar-se-

ão ao procedimento executivo dos créditos de ambas as naturezas (tributários e não

tributários), será o direito material que solucionará as questões atinentes à

responsabilização patrimonial secundária, à análise de eventuais matérias conhecidas de

ofício, arguidas por meio de exceção de pré-executividade ou ação autônoma e,

sobretudo, à aplicação do instituto processual denominado fraude à execução, que será

analisado com maior atenção nos próximos capítulos.

Inicialmente, pode-se destacar que, a despeito de a Súmula n.º 43545

, do

Superior Tribunal de Justiça, ter sido editada para conferir presunção de dissolução

irregular para fins de redirecionamento da execução fiscal tributária para os gestores da

pessoa jurídica inicialmente executada, nos termos do artigo 135, III, do Código

Tributário Nacional, recentemente a sua Primeira Seção estendeu, em sede de recurso

repetitivo, a legitimidade desse redirecionamento também para execuções fiscais não

tributárias, sob o fundamento de que “o suporte dado pelo artigo 135, III46

, do CTN, no

âmbito tributário é dado pelo art. 10, do Decreto n.º 3.078/19 e art. 158, da Lei n.º

6.404/78 – LSA no âmbito não-tributário, não havendo, em nenhum dos casos, a

45

“presume-se dissolvida irregularmente a empresa que deixa de funcionar no seu domicílio fiscal, sem

comunicação aos órgãos competentes, legitimando o redirecionamento da execução fiscal para o sócio-

gerente”. 46

“Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias

resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: (...)

III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado”.

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35

exigência de dolo” (STJ. REsp 1.371.128/RS. Primeira Seção. Relator: Ministro Mauro

Campbell Marques. Votação unânime. Julgado em 10 de/09/2014. DJe de 17/09/2014).

Prosseguindo, pode-se informar que, para as execuções de créditos de natureza

não tributária, a inscrição em Dívida Ativa implicará na suspensão do prazo

prescricional por 180 (cento e oitenta) dias, nos termos do artigo 2º, §3º47

, da Lei de

Execuções Fiscais. Tal suspensão, entretanto, não alcançará os créditos tributários, pelo

fato de as normas gerais tributárias demandarem uma produção legislativa qualificada,

através de lei complementar, conforme artigo 146, III48

, da Constituição Federal49

.

É, também, justamente com base nessa regra constitucional, segundo a qual as

normas gerais em direito tributário devem ser estabelecidas por Lei Complementar, que,

no conflito entre os artigos 45 e 46, da Lei 8.212/1991, e os artigos 173 e 174, do

Código Tributário Nacional, prevaleceu este diploma normativo, pela

inconstitucionalidade formal daquela lei ordinária ao estabelecer os prazos decadenciais

e prescricionais decenais para as contribuições previdenciárias50

.

Já em se tratando de cobrança da Taxa Anual por Hectare, cuja natureza

jurídica é de preço público, deve-se observar o prazo decadencial de 10 (dez) anos,

conforme a lei específica (Lei n.º 9.636/1998), ao passo que, para a pretensão

constitutiva do Fisco, observar-se-á a perda do direito potestativo de efetuar

validamente o lançamento fiscal após o transcurso do lustro decadencial (artigo 173,

caput, do CTN).

Por fim, ainda a título de exemplificação, no caso de cobrança judicial de multa

administrativa aplicada por autarquias para infrações praticadas em período anterior à

edição da Lei n.º 9.873/1999, que estabeleceu prazo prescricional para o exercício da

47

“A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão

competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de

direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.” 48

“Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação

tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos

impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e

contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; c) adequado

tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas. 49

Nesse sentido, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento da Arguição de

Inconstitucionalidade no Ag 1.037/765/SP, sedimentou entendimento. A saber, asseverou-se que “são

ilegítimas, em relação aos créditos tributários, as normas estabelecidas no §2º, do art. 8º e do §3º do art. 2º

da Lei 6.830/80, que, por decorrerem de lei ordinária, não podiam dispor em contrários às disposições

anteriores, previstas em lei complementar”. (STJ. AI no Ag n.º 1.037.765/SP. Corte Especial. Relator:

Min. Teori Albino Zavascki. DJe de 17/10/2011). 50

Em sentido contrário, encontra-se o posicionamento de Roque Antônio Carraza (2007), segundo o qual

o conceito de normas gerais não abarcaria a chamada “economia interna”, englobando assuntos de

peculiar interesse dos entes políticos, como a própria fixação dos prazos prescricionais e decadenciais.

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36

ação punitiva pela Administração Pública Federal, não se aplicarão as disposições do

Código Civil, mas sim o artigo 1º, do Decreto n.º 20.910/1932, por analogia e em

respeito ao princípio da simetria, dada a natureza administrativa da relação jurídica que

a originou.

2.5.2 – Especificidades

Adentrando nas especificidades procedimentais da execução fiscal, cabe trazer

o posicionamento de Humberto Theodoro Júnior (2007) que, ao se debruçar sobre a Lei

de Execução Fiscal, concluiu ter havido excessos na criação de privilégios por ele

considerados como “exagerados” e “injustificáveis” para a Fazenda Pública. Todavia,

por serem plenamente vigentes e constantemente aplicáveis, cabe mencionar algumas

peculiaridades legais conferidas a este feito executivo.

Tratando-se de modalidade executiva na qual pessoas jurídicas de direito

público se encontram na relação jurídico-processual, buscando a satisfação de seus

créditos, a Lei de Execução Fiscal concedeu-lhes a prerrogativa de intimação pessoal

dos atos processuais e atribuiu presunção iuris tantum de certeza e liquidez às Certidões

de Dívida Ativa51

- único título executivo extrajudicial, na realidade jurídica pátria,

“confeccionado unilateralmente pelo credor” (COSTA, 2009, p. 425) -, tornando-as, de

pronto, exigíveis judicialmente.

Não por outra razão é que, em se tratando de execução fiscal de créditos de

natureza tributária, quando o nome do sócio constar na Certidão de Dívida Ativa, deve-

se presumir a sua responsabilidade pelo débito encartado, nos termos do artigo 135, III,

do Código Tributário Nacional, conforme assentado pela Primeira Seção do Superior

Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento dos Embargos de Divergência no

Recurso Especial n.º 702.232/RS52

.

Prosseguindo no estudo das peculiaridades da execução fiscal, deve-se frisar

também que, com vistas a imprimir maior celeridade ao procedimento executivo, o

51

Nos termos do artigo 3º, da Lei de Execuções Fiscais, “a Dívida Ativa regularmente inscrita goza da

presunção de certeza e liquidez.”. 52

“Se a execução foi proposta contra a pessoa jurídica e contra o sócio-gerente, a este compete o ônus da

prova, já que a CDA goza de presunção relative de liquidez e certeza, nos termos do art. 204 do CTN c/c

o art. 3º da Lei n.º 6.830/80”. (STJ. EREsp n.º 702.232/RS. Primeira Seção. Relator: Ministro Castro

Meira. Primeira Seção. Votação unânime. Julgado em 14/09/2005. DJe de 26/09/2005).

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37

legislador estabeleceu tratamento diferenciado para a citação, autorizando sua realização

via postal, a partir do serviço dos correios (artigo 8º, I53

, da Lei 6.830/1980).

Ademais, para os casos nos quais o trâmite processual não tenha sido efetivo

para localizar o devedor ou bens hábeis a satisfação da dívida executada, estabeleceu-se

a possibilidade de suspensão da execução pelo prazo de até 1 (um) ano para a realização

de diligências, sem importar na deflagração do prazo prescricional, conforme o artigo

4054

, do referido diploma normativo.

Assim como nos processos autônomos de execução, a defesa do executado na

execução fiscal será deduzida na ação de embargos à execução. Contudo, em atenção às

disposições específicas do artigo 16, § 1º55

, da Lei 6.830/1980, dever-se-á observar a

prévia garantia do juízo, como condição de procedibilidade, ao contrário do regime

geral estabelecido pelo Código de Processo Civil56

, que dispensa tal exigência.

A saber, a despeito das divergências doutrinárias existentes, a Primeira Seção

do Superior Tribunal de Justiça, para dirimir essa antinomia, aplicou o critério da

especialidade (lex especialis derrogat lex generalis) ao assentar, por ocasião do

julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.272.827/PE57

, que

a condição de procedibilidade específica do artigo 16, da Lei 6.830/80 deveria

prevalecer nas execuções fiscais. Por outro lado, porém, estabeleceu que a concessão de

efeito suspensivo à ação incidental autônoma em comento não seria automática, mas

sim ope judicis, motivo pelo qual se deveriam observar os requisitos do mencionado

artigo 739-A, §1º, do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente à questão.

De todo modo, à míngua de previsão legal expressa, doutrina e jurisprudência

pátrias delinearam hipóteses de cabimento do instrumento endoprocessual de defesa

denominado de exceção/objeção de pré-executividade, em atenção aos princípios

constitucionais da inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, XXXV, da CF), do

contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LV, da CF), de modo a harmonizá-lo com a

restrição cognitiva inerente à natureza dos processos de execução.

53

Nos termos do artigo 8º, I, da Lei de Execuções Fiscais, “a citação será feita pelo correio, com aviso de

recepção, se a Fazenda Pública não a requerer por outra forma”. 54

“O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens

sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.” 55

“Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução.” 56

Nos termos do artigo 736, caput, do CPC, “O executado, independentemente de penhora, depósito ou

caução, poderá opor-se à execução por meio de embargos” (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006). 57

(STJ. REsp n.º 1.272.827/PE. Primeira Seção. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. DJe de

31/05/2013).

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38

A saber, não se olvidando que, nas execuções fiscais, as Certidões de Dívida

Ativa gozam de presunção legal de certeza e liquidez, o Superior Tribunal de Justiça, ao

editar a súmula n.º 393, assentou que “a exceção de pré-executividade é admissível na

execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício, que não demandem

dilação probatória”.

Em outros termos, passou-se a admitir o manejo da objeção de pré-

executividade para que os executados pudessem arguir matérias de ordem pública,

pressupostos processuais, manifesta ausência das condições da ação e vícios objetivos

do título executivo, enfim, matérias que pudessem ser conhecidas de plano pelo juiz

sem a necessidade de dilação probatória, para repelir eventual lesão ou ameaça de lesão

ao seu patrimônio jurídico de modo célere e econômico processualmente, sem, por outro

lado, prejudicar a efetividade e celeridade devidas na tutela jurisdicional executiva ao

presumidamente legítimo interesse econômico da Fazenda Pública.

Prosseguindo na análise do ordenamento jurídico pátrio, pode-se verificar a

criação de outros instrumentos finalisticamente projetados para assegurar desfecho

prático efetivo para os processos autônomos de execução judicial da Dívida Ativa da

Fazenda Pública, de natureza tributária ou não, como a medida cautelar fiscal, instituída

pela Lei 8.397/1992.

Através da ação cautelar fiscal, a Fazenda Pública poderá obter, através de

provimento jurisdicional, a decretação de indisponibilidade de bens e direitos dos

sujeitos passivos da obrigação tributária, até o limite de sua satisfação (artigo 4º, caput e

§1º, da Lei 8.397/1992), principalmente quando é evidenciada a projeção de condutas

aptas a frustrar o seu adimplemento (artigo 2º, I a IX, da Lei 8.397/199258

).

A despeito de haver posições doutrinárias contrárias à criação deste

instrumento processual, por já existir o procedimento específico para a execução fiscal,

nos moldes da Lei 6.830/1980, leciona Marco Bruno Miranda Clementino (2006, p.

58

“Art. 2º A medida cautelar fiscal poderá ser requerida contra o sujeito passivo de crédito tributário ou

não tributário, quando o devedor: I - sem domicílio certo, intenta ausentar-se ou alienar bens que possui

ou deixa de pagar a obrigação no prazo fixado; II - tendo domicílio certo, ausenta-se ou tenta se ausentar,

visando a elidir o adimplemento da obrigação; III - caindo em insolvência, aliena ou tenta alienar

bens; IV - contrai ou tenta contrair dívidas que comprometam a liquidez do seu patrimônio; V - notificado

pela Fazenda Pública para que proceda ao recolhimento do crédito fiscal: a) deixa de pagá-lo no prazo

legal, salvo se suspensa sua exigibilidade; b) põe ou tenta por seus bens em nome de terceiros; VI - possui

débitos, inscritos ou não em Dívida Ativa, que somados ultrapassem trinta por cento do seu patrimônio

conhecido; VII - aliena bens ou direitos sem proceder à devida comunicação ao órgão da Fazenda Pública

competente, quando exigível em virtude de lei; VIII - tem sua inscrição no cadastro de contribuintes

declarada inapta, pelo órgão fazendário; IX - pratica outros atos que dificultem ou impeçam a satisfação

do crédito.”

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39

134) que “não é o fato de já existir um procedimento que impede a instituição de outro,

ainda que mais rígido, para complementar ou aprimorar a tutela do interesse eleito como

legítimo”.

Certo ou errado, deve-se atentar ao fato de que, entre o lançamento fiscal

(artigo 142, do CTN) e a inscrição em Dívida Ativa do débito, pode ocorrer, espontânea

ou premeditadamente, a suspensão da exigibilidade dos créditos fiscais por intermédio

de recursos administrativos ou parcelamentos fiscais (artigo 151, III e VI, do CTN),

ocasiões nas quais o Fisco não poderá propor a execução fiscal.

Desse modo, no período em que os créditos se encontram com exigibilidade

suspensa, o devedor pode vir a dilapidar seu patrimônio para frustrar futura execução

fiscal e, nesses casos, satisfeitos os requisitos objetivos legalmente estabelecidos,

apenas a conservação da eficácia da decretação de indisponibilidade através de medida

cautelar fiscal (artigo 12, parágrafo único, da Lei 8.397/1992) poderá evitar tais fraudes.

Contudo, mesmo com o trabalho legislativo projetado para conferir as

condições materiais necessárias à satisfação da Dívida Ativa da Fazenda Pública e o

tratamento jurisprudencial diferenciado para as matérias subjacentes, não se logrou

êxito ao objetivo de conferir maior efetividade às execuções fiscais. A saber, conforme

recente estudo do Conselho Nacional de Justiça, o relatório da Justiça em Números de

2014, relativo ao ano-base 201359

, demonstrou que

dos 4,6 milhões de processos em tramitação na fase de execução da Justiça

Federal no ano de 2013, aproximadamente 3,7 milhões (81%) correspondem

às execuções fiscais, sendo que os processos dessa classe processual aqueles

são com maior taxa de congestionamento. De cada 100 processos que

tramitam durante um ano, apenas 10 são baixados dentro do mesmo período.

Ou seja, 90 tornam-se pendentes para o exercício seguinte.

Então, diante da inconteste inefetividade dos processos de execução fiscal,

cabe estudar, no presente momento, dois atos fraudulentos praticados pelos devedores

que impedem a satisfação dos créditos em geral - incluindo-se os créditos fiscais da

Fazenda Pública - a partir dos atos materiais de execução por sub-rogação praticados

pelo Poder Judiciário. São eles: os institutos da fraude contra credores e da fraude à

execução.

59

Documento on-line, não datado, p. 257-258. Disponível em:

<ftp://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2014.pdf>. Acesso em: 12 out. 2014.

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40

3 – FRAUDES DO DEVEDOR: FRAUDE CONTRA CREDORES E

FRAUDE À EXECUÇÃO

Tomando-se por base o conceito atual e dinâmico de Clóvis do Couto Silva

(2007), pode-se considerar a relação obrigacional – para além de um vínculo jurídico

entre credor e devedor, cujo objeto corresponde a uma prestação econômica de dar,

fazer ou não fazer – como um processo, composto por um conjunto de fases

interdependentes que, norteadas pelo princípio da boa-fé, projetam-se para o

adimplemento.

Entretanto, entre a criação da relação jurídica obrigacional e o adimplemento

da sua prestação de caráter econômico, o sujeito passivo pode direcionar determinadas

condutas de encontro à boa-fé e frustrar a legítima pretensão do credor, quer em

momento anterior ao próprio vencimento da prestação devida ou mesmo após o regular

início de um processo judicial de execução, casos que caracterização o instituto material

da fraude contra credores ou o instituto processual da fraude à execução,

respectivamente, a depender das peculiaridades do caso concreto.

3.1 – Fraude contra credores

A fraude contra credores é o ato de alienar gratuita ou onerosamente bens, ou

remir dívidas, praticado pelo devedor insolvente ou por este reduzido à insolvência, com

o nefasto intuito de frustrar a satisfação de um débito que ainda não se encontra em

execução judicial. A priori, portanto, o termo inicial para a sua configuração é o

vencimento da obrigação60

, momento a partir do qual a dívida se torna exigível.

Contudo, como bem pontuou a Ministra do Superior Tribunal de Justiça Nancy

Andrighi, ao julgar o Recurso Especial n.º 1.092.134/SP61

,

Não há como negar que a dinâmica da sociedade hodierna, em constante

transformação, repercute diretamente no Direito e, por consequência, na vida

de todos nós. O intelecto ardiloso, buscando adequar-se a uma sociedade em

ebulição, também intenta – criativo como é – inovar nas práticas ilegais e

60

Nos termos do artigo 158 e 159 do Código Civil, “art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens

ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda

quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivo dos seus direitos. §1º

Igual direito assiste aos credores cuja garantia se tornar insuficiente. §2º Só os credores que já o eram ao

tempo daqueles atos podem pleitear a anulação deles. art. 159. Serão igualmente anuláveis os contratos

onerosos do devedor insolvente, quando a insolvência for notória, ou houver motivo para ser conhecida

do outro contratante”. 61

(STJ. REsp 1.092.134/SP. Terceira Turma. Relatora: Min. Nancy Andrighi. DJe de 18/11/2010).

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manobras utilizadas com o intuito de escusar-se do pagamento ao credor. Um

desses expedientes é o desfazimento antecipado de bens, já antevendo, num

futuro próximo, o surgimento de dívidas, com vistas a afastar o requisito da

anterioridade do crédito, como condição da ação pauliana.

Portanto, concluiu que, “embora a anterioridade do crédito seja, via de regra,

pressuposto de procedência da ação pauliana, ela pode ser excepcionada quando for

verifica a fraude predeterminada em detrimento de credores futuros”.

Este instituto de direito material se encontra regulamentado nos artigos 158 a

165, do Código Civil e, quando configurado, constitui causa de anulação do negócio

jurídico celebrado62

, sujeitando-se, em todo caso, ao prazo decadencial de 4 (quatro)

anos, contados da data de sua realização63

.

Para a caracterização da fraude contra credores, faz-se necessária a presença

cumulativa de dois requisitos, quais sejam, o intento fraudulento (consilium fraudis) e o

dano ao credor consubstanciado na insolvência (eventus damni).

O consilium fraudis, conforme leciona Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz

Arenhart (2010, p. 267), deve ser entendido como “o propósito de fraudar os créditos

por meio do negócio jurídico com a ciência do terceiro beneficiário”, ao passo que o

eventus damni consubstancia-se na redução patrimonial que leva o

devedor/alienante/cessionário à insolvência, prejudicando a pretensão econômica do

credor.

Presentes esses elementos, o credor deverá se valer de uma ação ordinária de

conhecimento denominada de pauliana ou revocatória, em face do devedor e do terceiro

adquirente (litisconsórcio passivo necessário) para desconstituir o negócio jurídico

fraudulento celebrado. O exequente que se encontre na condição de réu em ação de

embargos de terceiro não pode, portanto, pleitear incidentalmente em sua defesa a

anulação de ato jurídico, por fraude contra credores, como estabeleceu o Superior

Tribunal de Justiça em seu enunciado sumular de n.º 19564

.

62

Conforme artigo 171, caput e inciso II, do Código Civil, “Além dos casos expressamente declarados na

lei, é anulável o negócio jurídico: [...] II – por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo,

lesão ou fraude contra credores.”. 63

Nos termos do artigo 178, caput e inciso II, do Código Civil, “É de quatro anos o prazo de decadência

para pleitear-se a anulação do negócio jurídico, contado: [...] II – no de erro, dolo, fraude contra credores,

estado de perigo ou lesão, do dia em que se realizou o negócio jurídico.”. 64

Nos termos da súmula 195, do Superior Tribunal de Justiça: “Em embargos de terceiro não se anula ato

jurídico, por fraude contra credores”.

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42

Julgada procedente, essa pretensão constitutiva negativa terá o condão de

restaurar ao patrimônio do devedor o(s) bem(ns) ou direito(s) alienados e, desse modo,

dar concretude ao princípio da responsabilidade patrimonial.

Em que pese o Código Civil ser expresso no sentido de que a fraude contra

credores é um ato anulável, a simples desconstituição do negócio jurídico não

conferiria, a priori, nenhuma garantia em favor do autor da ação revocatória. Afinal, até

mesmo um credor que não houvesse sido prejudicado pela fraude contra credores

poderia ter preferência na penhora/expropriação do bem, caso detivesse um crédito

privilegiado, a exemplo do trabalhista.

Então, em virtude disso, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao

julgar o Recurso Especial n.º 971.884/PR65

, reconheceu que a natureza da ação pauliana

é anulatória, por previsão expressa do Código Civil. Porém, estabeleceu que essa

anulação só beneficia o autor da ação.

É certo que há uma incongruência técnica no julgado, porquanto ou um

negócio jurídico ou é válido ou nulo, e que, para aproveitar somente o autor, o

provimento jurisdicional deveria ser declaratório de ineficácia. Todavia, como adiante

se verá, os precedentes do Superior Tribunal de Justiça, quando reiterados ou julgados

por amostragem, revestem-se de efeito expansivo, passando a orientar o julgamento de

causas similares pelos órgãos jurisdicionais ordinários.

3.2 – Fraude à execução

Nos termos do artigo 593, do Código de Processo Civil,

Art. 593. Considera-se em fraude de execução a alienação ou oneração de

bens:

I – quando sobre eles pender ação fundada em direito real;

65

Informativo nº 467/STJ: “FRAUDE CONTRA CREDORES. EFEITOS. SENTENÇA. Trata-se, na

origem, de ação pauliana (anulatória de doações) contra os recorrentes na qual se alega que um dos réus

doou todos seus bens aos demais réus, seus filhos e sua futura esposa, todos maiores e capazes, por meio

de escrituras públicas, de modo que, reduzindo-se à insolvência, sem nenhum bem em seu nome, infringiu

o disposto no art. 106 do CC/1916. O Min. Relator entendeu, entre outras questões, que estão presentes os

requisitos do citado artigo ensejadores da fraude contra credores e que chegar a conclusão diversa

demandaria o reexame do conjunto fático-probatório. Quanto aos efeitos da declaração de fraude contra

credores, consignou que a sentença pauliana sujeitará à excussão judicial o bem fraudulentamente

transferido, mas apenas em benefício do crédito fraudado e na exata medida desse. Naquilo que não

interferir no crédito do credor, o ato permanecerá hígido, como autêntica manifestação das partes

contratantes. Caso haja remissão da dívida, o ato de alienação subsistirá, não havendo como sustentar a

anulabilidade. Assim, a Turma, ao prosseguir o julgamento, deu parcial provimento ao recurso.

Precedente citado: REsp 506.312-MS, DJ 31/8/2006. REsp 971.884-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado

em 22/3/2011.”

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II – quando ao tempo da alienação ou oneração, corria contra o devedor

demanda capaz de reduzi-lo à insolvência;

III – nos demais casos expressos em lei.

Desse modo, assim como na fraude contra credores, na fraude à execução o

devedor aliena ou onera bens. Todavia, a despeito de ser um instituto de direito

processual, é considerada uma fraude mais grave do que a fraude contra credores, por

não macular apenas um interesse individual do credor, mas principalmente por atentar

contra o próprio Poder Judiciário, frustrando a satisfação de um débito que já se

encontra em vias de execução judicial.

Não por outra razão, é que este ato fraudulento além de ser considerado como

atentatório à dignidade da justiça (artigo 600, I66

, do CPC) sujeitando o devedor à multa

processual de até 20% (vinte por cento) do valor atualizado da execução (artigo 601,

caput67

, do CPC), encontra-se tipificado do artigo 179, do Código Penal, segundo o

qual:

Art. 179 - Fraudar execução, alienando, desviando, destruindo ou danificando

bens, ou simulando dívidas:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.

Parágrafo único - Somente se procede mediante queixa.

Conquanto o inciso II, do retromencionado artigo 593, estabeleça, como marco

temporal, a existência de demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência, o ato de

fraudar a execução pode ser praticado antes da existência de um processo de execução,

quando ainda pende um processo de conhecimento ou cautelar, desde que o sujeito

passivo da relação obrigacional paute sua conduta fraudulenta de alienar seu patrimônio

na ciência de uma futura execução, com o intuito de frustrá-la.

Desse modo, o critério temporal reconhecido pela jurisprudência do Superior

Tribunal de Justiça para a configuração da fraude à execução é a citação em qualquer

processo que discuta, direta ou indiretamente, a dívida havida68

. Excepcionalmente,

66

“Art. 600. Considera-se ato atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que: (Redação dada

pela Lei nº 11.382, de 2006). I – Frauda a execução; (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973).”. 67

“Art. 601. Nos casos previstos no artigo anterior, o devedor incidirá em multa fixada pelo juiz, em

montante não superior a 20% (vinte por cento) do valor atualizado do débito em execução, sem prejuízo

de outras sanções de natureza processual ou material, multa essa que reverterá em proveito do credor,

exigível na própria execução. (Redação dada pela Lei nº 8.953, de 13/12/1994).”. 68

“para configurar fraude à execução, é necessário que a alienação do bem tenha se dado após ocorrida a

citação válida, não importando o tipo de ação proposta – se cautelar, cognitiva ou executória”. (STJ.

AgRg no EDcl no REsp n.º 649.139/SP. Quarta Turma. Relator: Ministro João Otávio de Noronha. DJe

de 08/03/2010).

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porém, pode-se reconhecer a natureza fraudulenta do negócio jurídico celebrado em

momento anterior à própria citação, desde que se comprove a prévia ciência do devedor

quanto à existência da demanda judicial69

.

Ao contrário do que ocorre na fraude contra credores, o reconhecimento da

fraude à execução, como instituto processual que é, dar-se-á de forma incidental no

próprio processo de execução – ou mesmo em sede de embargos de terceiro70

- e não

trará reflexos no plano da validade do negócio jurídico, mas sim em sua eficácia, de

modo relativo.

Uma vez reconhecida, a fraude à execução ensejará uma declaração ineficácia

relativa, ou seja, o negócio jurídico celebrado continuará válido, mas os pactuantes não

poderão opor seus efeitos perante o credor, no que atine ao crédito exequendo frustrado.

Como sintetiza Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart (2010, p. 270), “é

como se, para a execução, a alienação ou oneração do bem não tivesse ocorrido”.

A lei estabeleceu como único requisito para a configuração da fraude à

execução o eventus damni, dispensando o consilium fraudis. Entretanto, com vistas a

resguardar a boa-fé do terceiro adquirente, desde o início da década de 90 (noventa) se

encontram precedentes do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a prova da

má-fé ou registro da penhora seriam imprescindíveis para que se operassem os efeitos

judiciais do reconhecimento da fraude à execução71

.

Desde então, diversos outros julgados foram reproduzindo esta posição,

compreendendo não ser razoável tornar ineficaz um negócio jurídico cujo objeto

69

“De regra, a caracterização da fraude de execução exige a ocorrência de litispendência, esta

caracterizada pela citação válida do devedor no processo de conhecimento ou de execução. In casu, há

que se ater à peculiaridade levada em conta pela decisão recorrida, qual seja, quando da alienação do

bem, portanto, no momento caracterizador da fraude, o devedor-executado tinha pleno conhecimento do

ajuizamento da execução e, como forma de subtrair-se à responsabilidade executiva decorrente da

atividade jurisdicional, esquivou-se da citação de modo a impedir a caracterização da litispendência e

nesse período adquiriu um bem imóvel em nome dos filhos”. (STJ. REsp 799.440/DF. Quarta Turma.

Relator: Ministro João Otávio de Noronha. Votação unânime. DJe de 02/02/2010). 70

“Independentemente do nomen iuris utilizado pelo Tribunal de origem, é certo que foram considerados

presentes os pressupostos para o reconhecimento da fraude à execução, o que é suficiente para embasar a

improcedência dos embargos de terceiro, não havendo espaço, portanto, para falar em ofensa ao disposto

na súmula nº 195/STJ” (STJ. AgRg no REsp n.º 1.384.682/SP. Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas

Cueva. Terceira Turma. Votação unânime. Julgado em 14/10/2014. DJe de 21/10/2014). 71

“SOMENTE APOS O REGISTRO A PENHORA FAZ PROVA QUANTO A FRAUDE DE

QUALQUER TRANSAÇÃO POSTERIOR (LEI N. 6.015, ARTIGO 240). Vale reafirmar o asseverado

na decisão recorrida, eis que comprovadamente o adquirente agiu de boa-fé, adquirindo bem que figurava

no registro imobiliário como livre e desimpedido, não podendo imaginar que em outra comarca, em outro

Estado, corria ação contra anterior proprietário do bem." (AgRg no Ag 4602 PR, Rel. Ministro ATHOS

CARNEIRO, QUARTA TURMA, julgado em 04/03/1991, DJ 01/04/1991)

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mediato figurava no registro imobiliário como livre e desembaraçado e impor ao

adquirente o dever de supor que em outra comarca e/ou outro Estado havia ação movida

em face do alienante, situações interpretativas que atrairiam completa insegurança aos

negócios jurídicos ou paralisaria sua dinâmica natural e essencial.

Em outros termos, nas precisas palavras do então Ministro Eduardo Ribeiro,

por ocasião do julgamento do EREsp 1.114.415/MG,

Efetivamente, é exigir o inexigível e supor como razoável o que nunca

acontece, entender-se deva alguém, que vá adquirir um bem, além de levantar

a cadeia dominial, averiguar se pende processo, interessando a algum dos

anteriores proprietários. Havendo, deverá pesquisar quanto à solvência.

Que isso se faça quanto àquele com quem se negocia, admita-se como de se

esperar. Estender a pesquisa por uma cadeia às vezes longa significa a

paralisia na vida dos negócios. Em verdade, é sabido que ninguém assim

procede e a conseqüência é simplesmente fazer com que alguém que agiu na

mais absoluta boa-fé termine por pagar a dívida de outrem, com quem não

teve qualquer contato. Poder-se-á objetar com a possibilidade de se

facilitarem as fraudes. Não me parece exista aí motivo suficiente para a

adoção do entendimento contrário. Não se haverá de prejudicar quem age

lisamente, apenas por ser possível que outros não se comportem com

correção. E a má-fé pode ser provada por indícios, existindo, ainda,

providências acauteladoras de que se pode valer o exeqüente.

(STJ. EREsp 114415/MG. Relator: Ministro Eduardo Ribeiro. Segunda

Seção. Julgado em 12/11/1997, DJ de 16/02/1998).

Portanto, por considerar que é o registro da penhora que tem o efeito de gerar a

ciência erga omnes da constrição judicial e a presunção da fraude de qualquer transação

posterior (artigo 24072

, da Lei 6.015/1973 e artigo 659, §4º73

, do CPC)74

, e não se

olvidar que existem medidas judiciais acautelatórias à disposição dos cidadãos e das

quais o exequente poderia ter se valido, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o

entendimento de que, nos casos em que o terceiro adquirente tenha figurado de boa-fé, a

72

“O registro da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior”. (renumerado do art.

245 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975). 73

“A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, cabendo ao exequente,

sem prejuízo da imediata intimação do executado (art. 652, §4º), providenciar, para presunção absoluta de

conhecimento por terceiros, a respectiva averbação no ofício imobiliário, mediante a apresentação de

certidão de inteiro teor do ato, independentemente de mandado judicial”. (Redação dada pela Lei nº

11.382, de 2006). 74

“Em nossa lei processual, a determinação de registro da penhora de bem imóvel surgiu, formalmente,

com a inclusão, pela Lei 8.953/1994, do §4º ao art. 659. Entretanto, mesmo antes disso, a

jurisprudência já considerava que o registro constituía prova segura e suficiente para elidir a

presunção de boa-fé do adquirente do bem imóvel penhorado. Nesse sentido, aliás, dispunha o art.

245 da Lei 6.015/1973 (a inscrição da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior).

A esse respeito, a jurisprudência dessa Corte consolidou-se no sentido de que, ante a ausência do

registro da penhora, para que seja caracterizada fraude à execução, impõe-se ao credor o ônus de

provar que o adquirente tinha ciência da constrição que pesava sobre o imóvel”. (STJ. REsp

865.974/RS. Relator: Ministro Teori Albino Zavascki. Primeira Turma. DJe 10/09/2008) (grifos não

constantes do original).

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só existência de ato negocial de alienação tornasse o devedor insolvente não ensejaria a

declaração de ineficácia relativa própria do reconhecimento da fraude à execução.

Acresça-se ainda que a Lei nº 11.382, de 2006, incluiu o artigo 615-A, ao

Código de Processo Civil, possibilitando ao exequente, no ato da distribuição, obter

certidão comprobatória do ajuizamento da ação executiva para proceder à averbação

premonitória no registro de imóveis, veículos ou outros bens sujeitos à penhora ou

arresto (caput) e, desse modo, fazer presumir a fraude à execução na alienação ou

oneração de bens posteriormente efetuada (§4º).

Atenta a todas essas nuances e em conformidade com a jurisprudência

consolidada, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça editou a súmula n.º 375,

estatuindo, in verbis:

O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do

bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.

(Súmula 375, CORTE ESPECIAL, julgado em 18/03/2009, DJe 30/03/2009)

Como sintetiza a súmula em comento, tornou-se imprescindível, para a

incidência dos efeitos decorrentes do reconhecimento da fraude à execução, que o

adquirente tivesse prévia ciência da penhora ou comprovadamente agido de má-fé, em

conluio com o devedor insolvente. Por óbvio, esses requisitos não obstam que, em

certos casos, se possa presumir a má-fé do terceiro, antes, reafirma tal possibilidade.

Nas situações em que se alienam bem tangível ou intangível após o registro de

uma constrição judicial no órgão competente, presume-se a ciência erga omnes do ato e

que o terceiro que posteriormente adquiriu o bem, no mínimo, assumiu o risco de perdê-

lo pela atividade estatal de execução por sub-rogação ao não atentar ao estado de

insolvência do alienante. Contudo, este não é apenas o único caso.

A própria jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece, em

determinados casos concretos, que a fraude à execução se operará in re ipsa, sendo

subjacente ao próprio ato, como nas situações em que o terceiro adquirente é parente ou

amigo e/ou a alienação se dá a título gratuito75

ou por um valor muito inferior ao de

75

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. IMÓVEL PENHORADO. DOAÇÃO DOS EXECUTADOS A

SEUS FILHOS MENORES DE IDADE. AUSÊNCIA DE REGISTRO DA PENHORA.

IRRELEVÂNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO CONFIGURADA. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA

N. 375/STJ. 1. No caso em que o imóvel penhorado, ainda que sem o registro do gravame, foi doado aos

filhos menores dos executados, reduzindo os devedores a estado de insolvência, não cabe a aplicação do

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mercado. Enfim, situações nas quais as excepcionais condições do caso concreto

apontam para a violação da boa-fé objetiva.

Nesse sentido, caso um executado doe uma fazenda para seu neto com cláusula

de usufruto, terá alienado graciosamente para um parente de 2º (segundo) grau um bem

passível de satisfazer o seu débito, sem, contudo, perder o poder de ingerência

socioeconômica sobre este, em clara violação à boa-fé objetiva e afronta à própria

lógica do direito civil, que repudia o exercício da autonomia privada em prejuízo de

credores.

Outrossim, suponha-se que um ex-agente político, com condenações prolatadas

pelo Tribunal de Contas da União e pelo Tribunal de Contas Estadual76

e cujas

repercussões midiáticas foram incontestes, divorcia-se através de acordo judicial

celebrado após sua citação em uma execução movida com o fito de obter o devido

ressarcimento ao erário, deixando todas as dezenas de imóveis adquiridos na constância

do casamento para a sua ex-esposa. Neste caso, resta evidente a ocorrência de fraude à

execução, seja pelo fato de o cônjuge virago ter ciência dos débitos do marido ou pela

atipicidade de acordos familiares com este teor77

, combinados com a opção pela sigilosa

verbete contido na súmula 375, STJ. É que, nessa hipótese, não há como perquirir-se sobre a ocorrência

de má-fé dos adquirentes ou se estes tinham ciência da penhora. 2. Nesse passo, reconhece-se

objetivamente a fraude à execução, porquanto a má-fé do doador, que se desfez de forma graciosa

de imóvel, em detrimento de credores, é o bastante para configurar o ardil previsto no art. 593, II,

do CPC. 3. É o próprio sistema de direito civil que revela sua intolerância com o enriquecimento de

terceiros, beneficiados por atos gratuitos do devedor, em detrimento de credores, e isso

independentemente de suposições acerca da má-fé dos donatários (v.g. arts. 1.997, 1.813, 158 e 552

do Código Civil de 2002). 4. Recurso especial não provido.(STJ. REsp 1.163.114. Quarta Turma.

Relator: Min. Luis Felipe Salomão. DJe 01.08.2011). 76

Nos termos do artigo 71, §3º, da Constituição Federal, “As decisões do Tribunal de que resulte

imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo”. 77

“FRAUDE DE EXECUÇÃO. SEPARAÇÃO CONSENSUAL CONTEMPORÂNEA DA

EXECUÇÃO AJUIZADA, MAS NÃO EFETIVADA A CITAÇÃO. RENUNCIA DO PATRIMÔNIO

DECORRENTE DA MEAÇÃO.1. Não servem os precedentes da Corte sobre a necessidade da citação

para a configuração da fraude de execução em caso de alienação a terceiro, diante de circunstância

específica, destacada pelo Acórdão recorrido, assim a manobra da separação judicial consensual, com

renúncia pelo executado da parte que lhe cabia em decorrência da meação, reduzindo o executado a

um quadro de insolvência, sem nenhuma razão para tal. O Poder Judiciário não pode cobrir

cenário evidente de fraude construído pelos próprios interessados na preservação do patrimônio.2.

Recurso especial não conhecido.”(STJ. REsp 167.920. Terceira Turma. Rel. Min. CARLOS ALBERTO

MENEZES DIREITO. DJ de 22/05/2000). Cumpre atentar, neste caso, que o Órgão Jurisdicional que

prolatou este precedente estendeu o critério temporal do instituto processual da fraude à execução para

momento anterior à própria citação.

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48

via judicial (artigo 155, II78

, do CPC), em detrimento do público divórcio consensual

em cartório (artigo 17, caput79

, da Lei 6.015/1973).

Entretanto, nos casos em que o bem não tenha penhora registrada ou que, pela

sua natureza, não se sujeita a registro em órgão competente, incumbirá ao credor

comprovar a má-fé do adquirente ou cessionário, para que o ato fraudulento seja

declarado ineficaz perante a execução.

Pelo fato de o ordenamento jurídico pátrio disponibilizar aos credores meios

acautelatórios para coibir ou neutralizar a fraude à execução, de ordinário o Superior

Tribunal de Justiça distribuiu aos credores em geral a incumbência de adotar uma

conduta mais proativa na perseguição de seus interesses creditícios, a partir do manejo

da cautelar de arresto (artigo 813, caput, I e II, “a” e “b”, do CPC80

), ou realização de

averbações premonitórias, nos termos do artigo 615-A81

, do Código de Processo Civil,

que estabelece presunção absoluta de fraude à execução, não se podendo interferir

incontinenti na eficácia de negócios jurídicos celebrados por terceiros de boa-fé.

Portanto, pode-se concluir que, quando se tratar de alienação ou oneração de

bens por devedor sujeito à execução judicial ou já efetivamente integrante da relação

processual executiva, aplicar-se-á, de regra, a referida súmula de n.º 375, do Superior

Tribunal, com vistas a resguardar a boa-fé do terceiro adquirente/cessionário ante a

inércia do credor, que não promoveu a ação cautelar cabível ou procedeu à averbação

premonitória que lhe é facultada.

Há, contudo, uma recente exceção feita pela Primeira Seção do Superior

Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Repetitivo n.º 1.141.990/PR,

quando se trata de fraude à execução fiscal tributária. Desse modo, para melhor

78

“Art. 155. Os atos processuais são públicos. Correm, todavia, em segredo de justiça os processos: [...] II

– que dizem respeito a casamento, filiação, separação dos cônjuges, conversão desta em divórcio,

alimentos e guarda de menores. (Redação dada pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977)”. 79

“Art. 17. Qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informal ao oficial ou ao funcionário

o motivo ou interesse do pedido”. 80

“Artigo 813. O arresto tem lugar: I – quando o devedor sem domicílio certo intenta ausenta-se ou

alienar os bens que possui, ou deixa de pagar a obrigação no prazo estipulado; II – quando o devedor, que

tem domicílio: a) se ausenta ou tenta ausentar-se furtivamente; b) caindo em insolvência, aliena ou tenta

alienar bens que possui; contrai ou tenta contrair dívidas extraordinárias; põe ou tenta pôr os seus bens em

nome de terceiros; ou comete outro qualquer artifício fraudulento, a fim de frustrar a execução ou lesar

credores;”. 81

“Art. 615-A. O exequente poderá, no ato da distribuição, obter certidão comprobatória do ajuizamento

da execução, com identificação das partes e valor da causa, para fins de averbação no registro de imóveis,

registro de veículos ou registro de outros bens sujeitos à penhora ou arresto.”

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elucidação do tema, cabe, no presente momento, estudar o tratamento deste instituto

processual nas execuções fiscais.

3.3 – A fraude à execução fiscal

Como relatado na exposição de motivos da Lei de Execuções Fiscais, esta não

revogou, em linhas gerais, a lógica do Código de Processo Civil, disciplinando as

matérias atinentes a execuções da Dívida Ativa da Fazenda Pública apenas no essencial.

Desse modo, no que não contradizer a disciplina específica dessa espécie executiva, o

Código de Ritos será aplicável subsidiariamente, como regra geral que se estende

inclusive ao instituto da Fraude à Execução, por não estar disciplinado de maneira

diversa na Lei 6.830/1980.

Entretanto, o próprio Código de Processo Civil, por seu turno, estabeleceu que

a fraude à execução pode se configurar a partir da alienação ou oneração de bens “nos

demais casos expressos em lei” (artigo 593, III), ocasiões nas quais, pelo critério da

especialidade, incidirá o texto normativo específico. Desse modo, para precisar a

adequada incidência do instituto em comento, deve-se atentar para a existência de texto

normativo especial. Em caso afirmativo, este o disciplinará, caso contrário, aplicar-se-á

o regime geral do Código de Processo Civil.

Como já relatado, no âmbito das execuções fiscais o legislador não assentou

uma disciplina específica, tampouco se encontram no ordenamento jurídico vigente

outras previsões, à exceção da disciplina específica dada pelo Código Tributário

Nacional, em seu artigo 185, motivo pelo qual se faz necessária a distinção da natureza

dos créditos fiscais executados para compreender o regime aplicável ao instituto em

estudo.

3.3.1 – Fraude à execução fiscal de créditos de natureza não tributária

Para as execuções fiscais de créditos de natureza não tributária, a exemplo das

multas administrativas oriundas do exercício regular do Poder de Polícia82

estatal, como

82

A definição do Poder de Polícia se encontra no artigo 78, caput, do Código Tributário Nacional, por

constituir uma dos elementos da hipótese de incidência da espécie tributária “taxa”. A saber, nos termos

do mencionado texto normativo. “Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração

pública que, limitando ou disciplinando direito, interêsse ou liberdade, regula a prática de ato ou

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as aplicadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais

Renováveis - IBAMA, e de preços públicos, como a Taxa Anual por Hectare, cobrada

pelo Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM, a ausência de previsão

legal específica atrai a incidência do regime estabelecido pelo Código de Processo Civil,

sendo imprescindível, para a aplicação da declaração de ineficácia do negócio jurídico e

posterior sujeição do bem ao binômio sub-rogatório penhora/expropriação, a

observância da súmula n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça, conforme já

explicitado.

3.3.2 – Fraude à execução fiscal de créditos de natureza tributária

Quando se trata de execuções fiscais de créditos de natureza tributária,

contudo, a temática adquire novos contornos, sobretudo pela existência do artigo 185,

do Código Tributário Nacional, tanto em sua redação anterior às alterações promovidas

pela Lei Complementar 118/2005, que entrou em vigor, após o período de vacância da

lei (vacatio legis), em 09 de junho de 2005, quanto em sua novel redação.

A saber, nos termos do referido artigo 185, do Código Tributário Nacional, em

sua antiga redação:

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas,

ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública

por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em fase de

execução.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem

sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento

da dívida em fase de execução.

Após a vigência das alterações dadas pela mencionada Lei Complementar

118/2005, o texto normativo passou a vigorar com a seguinte redação:

Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas,

ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública,

por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.(Redação dada

pela Lcp nº 118, de 2005).

abstenção de fato, em razão de intêresse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos

costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de

concessão ou autorização do Poder Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos

direitos individuais ou coletivos.” (Redação dada pelo Ato Complementar nº 31, de 1966).

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Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem

sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento

da dívida inscrita. (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005).

Desse modo, pelo princípio do direito temporal tempus regit actum, para que os

negócios jurídicos celebrados até 08 de junho de 2005 configurem fraude à execução,

salvo anterior e comprovada ciência do devedor tributário, o marco temporal a ser

considerado, na visão jurisprudencial da época, será o ato processual de citação no feito

executivo, já que a presunção de fraude na alienação ou oneração de bens ou rendas, ou

seu começo, se operaria “por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa

em fase de execução”83

. Para os negócios jurídicos efetivados a partir de 09 de junho de

2005, portanto, é que o critério temporal de incidência será a inscrição em Dívida Ativa.

Embora os marcos temporais da fraude à execução fiscal tributária e das

demais fraudes à execução, não tributárias, fossem dissimilares, e doutrinadores como

Aliomar Baleeiro (1996) e Hugo de Brito Machado (2008) de há muito compreenderem

que, enquanto garantia do crédito tributário, tal presunção encartada no Código

Tributário Nacional seria absoluta, não admitindo prova em contrário, ambas as

espécies do mesmo instituto processual sempre foram interpretadas de forma uníssona

pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de resguardar o

adquirente ou cessionário de boa-fé.

Esta assertiva não é desprovida de dados empíricos, ao revés, encontra guarida

dentre os próprios precedentes que ensejaram a edição da súmula de n.º 375, do

Superior Tribunal de Justiça, dentre os quais figuraram casos regidos pelo artigo 185, do

Código Tributário Nacional, tanto em sua redação pretérita, quanto em sua redação

posterior à edição da Lei Complementar 118/2005, conforme ementas abaixo

colacionadas.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL.

NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA.

EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA EM IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE

REGISTRO EM CARTÓRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DE MÁ-FÉ DO

ADQUIRENTE. FRAUDE NÃO CARACTERIZADA. RECURSO

ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

(STJ. REsp 865.974/RS. Primeira Turma. Relator: Min. Teori Albino

Zavascki. DJe 10.09.2008)

83

Em sentido contrário, Hugo de Brito Machado (2008, p. 239), a despeito de não desconhecer posições

doutrinárias e jurisprudenciais diversas, defende que “estar o crédito tributário em fase de execução não

significa já haver sido proposta a ação de execução. A fase de execução começa com a inscrição do

crédito como dívida ativa”.

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PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À

EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO. ALIENAÇÃO DE BEM. PENHORA

NÃO-GRAVADA NO REGISTRO DE IMÓVEIS. INSUBSISTÊNCIA.

1. Não basta o ajuizamento do executivo fiscal e a citação válida do devedor

para configurar a fraude à execução quando o bem penhorado foi adquirido

por terceiro. É necessário que haja a gravação da constrição judicial no

respectivo Cartório de Registro de Imóveis para que a indisponibilidade do

bem gere efeitos de eficácia erga omnes, o que não ocorreu no caso dos

autos. Precedentes.

2. Recurso especial não-provido.

(STJ. REsp 810.170/RS. Segunda Turma. Relator: Min. Mauro Campbell

Marques. DJe 26.08.2008)

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – EMBARGOS DE TERCEIRO –

ALIENAÇÃO DE IMÓVEL SEM REGISTRO NO CARTÓRIO –

FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL NÃO CARACTERIZADA –

PRECEDENTES.

1. Ausente o registro de penhora ou arresto efetuado sobre o imóvel, não se

pode supor que as partes contratantes agiram em consilium fraudis.

2. Não-demonstrado que o comprador tinha conhecimento da existência de

execução fiscal contra o alienante ou agiu em conluio com o devedor-

vendedor, sendo insuficiente o argumento de que a venda foi realizada após

a citação do executado. Precedentes.

Agravo regimental improvido

(STJ. AgRg no REsp 1046004⁄MT. Segunda Turma. Relator: Min.

Humberto Martins. DJe 23.06.2008).

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. FRAUDE À EXECUÇÃO.

REQUISITOS. ACÓRDÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM

ENTENDIMENTO DESTA CORTE. SÚMULA 168⁄STJ.

1 - O acórdão embargado em consonância com o entendimento pacífico

desta Corte assevera que ante a ausência do registro da penhora a decretação

de fraude à execução depende da prova do conhecimento, por parte do

adquirente do imóvel, de ação pendente contra o devedor capaz de reduzi-lo

à insolvência. Incidência da súmula 168⁄STJ.

2 - Agravo regimental desprovido.

(STJ. AgRg no EREsp 719.949-RS. Segunda Seção. Relator: Min. Fernando

Gonçalves. DJ 08.11.2007).

No mesmo sentido, inclusive, encontra-se recente precedente do Tribunal

Superior do Trabalho, nos termos do acórdão proferido no Recurso de Revista n.º 894-

47.2011.5.10.0084, cujos créditos envolvidos preferem inclusive os créditos tributários,

nos termos artigo 186, caput84

, do Código Tributário Nacional:

RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS

DE TERCEIRO. PENHORA.

A configuração de fraude à execução não pode ser absolutamente objetiva.

Não se deve presumir que a adquirente do imóvel tivesse conhecimento de

que o negócio jurídico em questão era viciado, para enquadrar-se, em tese,

nos requisitos da fraude à execução. A ciência, pelo adquirente, da existência

de demanda contra o alienante, constitui elemento subjetivo essencial para se

perquirir sua qualidade, ou não, de terceiro de boa-fé. Na hipótese em

84

“O crédito tributário prefere a qualquer outro, seja qual for sua natureza ou o tempo de sua constituição,

ressalvados os créditos decorrentes da legislação do trabalho ou do acidente de trabalho.” (Redação dada

pela Lcp nº 118, de 2005).

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questão, não há prova de que o ato alienatório foi praticado com a finalidade

de frustrar a execução e de que a adquirente do bem tivesse conhecimento de

procedimentos executórios os quais pudessem reduzir o devedor à

insolvência, segundo a previsão do art. 593, II, do CPC. Dessa forma, torna-

se irrelevante a ausência de registro do contrato particular no cartório. O

Tribunal Regional deixou expressamente consignado que a terceira

embargante reside no imóvel desde a cessão de direitos e tudo indica que é

adquirente de boa-fé. A configuração de adquirente de boa-fé torna-se mais

concreta com a transferência do imóvel penhorado para a referida parte em

28/1/2013, nos termos do registro realizado no 2º Ofício do Registro de

Imóveis de Brasília – DF, em virtude de sentença prolatada nos autos da

Ação de Obrigação de Fazer nº 2010.01.1.152651-2, que tramitou na 10ª

Vara Cível de Brasília/DF. Nesse passo, entende-se evidente o caráter de

boa-fé da terceira embargante. Recurso de revista conhecido e provido.

(TST. RR 894-47.2011.5.10.0014. Relatora: Ministra Dora Maria da Costa.

DJe de 13/12/2013).

Entretanto, o entendimento selado pelo mencionado enunciado de n.º 375, da

súmula da jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça foi

inexoravelmente afastado para execuções fiscais tributárias pela sua Primeira Seção (

composta pelas duas Turmas de Direito Público) em 19/11/2010, por ocasião do

julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR, pelo

rito do artigo 543-C, do Código de Processo Civil.

Desse modo, nos moldes em que se propõe o presente trabalho acadêmico, o

instituto processual de fraude à execução fiscal tributária deve ser compreendido em

dois períodos, cuja divisa temporal é o julgamento do paradigmático Recurso

Repetitivo.

3.3.2.1 – Antes do REsp 1.141.990/PR

Antes do julgamento do Recurso Especial 1.141.990/PR, pode-se afirmar com

precisão que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, enquanto tribunal

competente para uniformizar a interpretação jurídica das normas infraconstitucionais,

inclinava-se pacificamente sentido de que, para a configuração da fraude à execução

fiscal de créditos de natureza tributária, seria imprescindível o prévio registro da

penhora ou a prova da má-fé do terceiro adquirente.

Em pesquisa jurisprudencial realizada no sítio virtual do referido Tribunal

Superior, inclusive, verifica-se que os últimos julgados sobre fraude à execução fiscal

nos termos do artigo 185, do Código Tributário Nacional, foram o Agravo Regimental

no Agravo nº 1.019.882/PR, pela Primeira Turma, e o Recurso Especial nº 726.323/SP,

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54

pela Segunda Turma, cujas publicações se deram, respectivamente, em 31/08/2009 e

17/08/2009.

Como se depreende das ementas abaixo transcritas, ambos os julgados

seguiram a então pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e aplicaram a

súmula nº 375 na espécie:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO

AGRAVO DE INSTRUMENTO. FRAUDE À EXECUÇÃO. ART. 185 DO

CTN. TERCEIRO DE BOA-FÉ. AUSÊNCIA DE REGISTRO DA

PENHORA. SÚMULA 375 DO STJ.

1. Hipótese em que a Fazenda Nacional busca a penhora de bem imóvel

alienado pelo devedor no curso da execução fiscal.

2. Tendo em vista que o registro da alienação em apreço no Ofício de

Imóveis ocorreu em data anterior (17/8/2004) ao início da vigência da LC

118/05, deve ser aplicada a redação original do art. 185 do CTN, em

conformidade com o princípio tempus regit actum.

3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a fim de resguardar o

direito de terceiro de boa-fé, consolidou o entendimento de que a constatação

de fraude em execução decorrente de alienação de imóvel exige, além do

ajuizamento da ação executiva e a citação do devedor, o registro da penhora

no ofício de imóveis (para que a indisponibilidade do bem gere efeitos de

eficácia erga omnes), salvo se evidenciada a má-fé dos particulares

(consilium fraudis), o que, conforme consignado pelo Corte de origem, não

ficou demonstrado neste feito.

4. Rever as conclusões do Tribunal a quo a respeito da falta de comprovação

pelo exequente acerca da má-fé do adquirente implica reexame do conjunto

fático-probatório, inviável ante o óbice da Súmula 7/STJ.

5. Agravo regimental não provido.

(STJ. AgRg no Ag 1.019.882/PR. Relator: Min. Benedito Gonçalves.

Primeira Turma. DJe de 31/08/2009).

PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO

FISCAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 185, DO

CTN. BEM ALIENADO APÓS A CITAÇÃO VÁLIDA E ANTES DO

REGISTRO DA PENHORA. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO DA

SÚMULA N. 375, DO STJ. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO

RELATOR.

1. "O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora

do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente" (Enunciado n.

375 da Súmula do STJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, em 18/3/2009).

2. Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão

sobre o tema: a) Na redação anterior do art. 185 do CTN, exigia-se apenas a

citação válida em processo de execução fiscal prévia à alienação para

caracterizar a presunção relativa de fraude à execução em que incorriam o

alienante e o adquirente (regra aplicável às alienações ocorridas até

8.6.2005); b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a

inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção

relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente

(regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005); c) A averbação no

registro de imóveis da certidão de inscrição em dívida ativa, ou da certidão

comprobatória do ajuizamento da execução, ou da penhora cria a presunção

absoluta de que a alienação posterior se dá em fraude à execução em que

incorrem o alienante e o adquirente; d) A presunção relativa de fraude à

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execução pode ser invertida pelo adquirente se demonstrar que agiu com boa-

fé na aquisição do bem, apresentando as certidões de tributos federais e

aquelas pertinentes ao local onde se situa o imóvel e onde tinha residência o

alienante ao tempo da alienação, exigidas pela Lei n. 7.433/85, e

demonstrando que, mesmo de posse de tais certidões, não lhe era possível ter

conhecimento da existência da execução fiscal (caso de alienação ocorrida

até 8.6.2005), ou da inscrição em dívida ativa (caso de alienação ocorrida

após 9.6.2005); e) Invertida a presunção relativa de fraude à execução, cabe

ao credor demonstrar o consilium fraudis, a culpa ou a má-fé; f) A incidência

da norma de fraude à execução pode ser afastada pelo devedor ou pelo

adquirente se demonstrado que foram reservados pelo devedor bens ou

rendas suficientes ao total pagamento da dívida, ou que a citação não foi

válida (para alienações ocorridas até 8.6.2005), ou que a alienação se deu

antes da citação (para alienações ocorridas até 8.6.2005), ou que a alienação

se deu antes da inscrição em dívida ativa (para alienações posteriores a

9.6.2005).

3. Hipótese em que a alienação se deu após a citação válida, contudo, antes

do registro da penhora, não tendo sido comprovada a má-fé do terceiro

adquirente, o que afasta a ocorrência de fraude à execução nos moldes do

enunciado n. 375 da Súmula do STJ.

4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

(STJ. REsp 726.323/SP. Relator: Min. Mauro Campbell Marques. Segunda

Turma. DJe de 17/08/2009).

3.3.2.2 – Depois do REsp 1.141.990/PR

Entretanto, em 10/11/2010, quando a Primeira Seção do Superior Tribunal de

Justiça foi instada a se manifestar no paradigmático Recurso Especial de n.º

1.141.990/PR, os ministros Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Humberto Martins,

Mauro Campbell Marques, Benedito Gonçalves e Hamilton Carvalhido – que outrora,

na qualidade de relatores dos recursos relativos a esta questão jurídica, guiavam o os

seus julgamentos em conformidade com o entendimento jurisprudencial até então

pacificamente vigente - votaram com o relator Luiz Fux para afastar, pelo critério da

especialidade, a incidência da súmula até então aplicável, estabelecendo presunção

absoluta (iure et iure) de fraude à execução pela só existência do eventum damni.

Assentou-se nas razões de decidir recursais que, pelo fato de haver uma pessoa

jurídica de direito público buscando a satisfação de um crédito tributário, enquanto

receita pública derivada destinada ao atendimento das necessidades e satisfações do

interesse público, dever-se-ia analisar o instituto processual em questão de modo

diferenciado com relação aos processos nos quais participam apenas particulares.

Portanto, ao considerar o interesse público subjacente à execução fiscal

tributária, firmou-se o entendimento de que, para a configuração da fraude processual

seria prescindível o prévio registro da penhora do bem alienado ou comprovação de má-

fé do terceiro, afastando a incidência da súmula de n.º 375.

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E mais, indo além da fixação da nova regra geral, segundo a qual a fraude à

execução fiscal desta natureza se operar in re ipsa, dispensando a identificação do

concilium fraudis, estabeleceu-se que esta interpretação projetaria seus efeitos inclusive

para os negócios jurídicos celebrados antes da vigência da Lei Complementar n.º

118/2005, devendo-se observar apenas os critérios temporais da “citação válida” ou da

“inscrição do débito em dívida ativa”, em atenção ao postulado do tempus regit actum.

A saber, caso a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu início, tenha

ocorrido antes de 09 de junho de 2005, a configuração do negócio jurídico como

fraudulento será declarada objetivamente quando houver sido efetivada após a citação

válida em execução fiscal. Por outro lado, caso a celebração do negócio jurídico tenha

ocorrido a partir de 09 de junho de 2005, o marco temporal será a inscrição do débito

tributário em dívida ativa, conforme o acórdão paradigma abaixo transcrito:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE

CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. DIREITO TRIBUTÁRIO.

EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO FISCAL.

ALIENAÇÃO DE BEM POSTERIOR À CITAÇÃO DO DEVEDOR.

INEXISTÊNCIA DE REGISTRO NO DEPARTAMENTO DE TRÂNSITO -

DETRAN. INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICO. INSCRIÇÃO EM

DÍVIDA ATIVA. ARTIGO 185 DO CTN, COM A REDAÇÃO DADA

PELA LC N.º 118⁄2005. SÚMULA 375⁄STJ. INAPLICABILIDADE.

1. A lei especial prevalece sobre a lei geral (lex specialis derrogat lex

generalis), por isso que a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às

execuções fiscais.

2. O artigo 185, do Código Tributário Nacional - CTN, assentando a

presunção de fraude à execução, na sua redação primitiva, dispunha que:

"Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou

rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda

Pública por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa em

fase de execução.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem

sido reservados pelo devedor bens ou rendas suficientes ao total pagamento

da dívida em fase de execução."

3. A Lei Complementar n.º 118, de 9 de fevereiro de 2005, alterou o artigo

185, do CTN, que passou a ostentar o seguinte teor:

"Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou

rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda

Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa.

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem

sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento

da dívida inscrita."

4. Consectariamente, a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC

n.º 118⁄2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio

jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005,

consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a

inscrição do crédito tributário na dívida ativa.

5. A diferença de tratamento entre a fraude civil e a fraude fiscal justifica-se

pelo fato de que, na primeira hipótese, afronta-se interesse privado, ao passo

que, na segunda, interesse público, porquanto o recolhimento dos tributos

serve à satisfação das necessidades coletivas.

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57

6. É que, consoante a doutrina do tema, a fraude de execução, diversamente

da fraude contra credores, opera-se in re ipsa, vale dizer, tem caráter

absoluto, objetivo, dispensando o concilium fraudis. (FUX, Luiz. O novo

processo de execução: o cumprimento da sentença e a execução extrajudicial.

1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 95-96 ⁄ DINAMARCO, Cândido

Rangel. Execução civil. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 278-282 ⁄

MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 22. ed. São Paulo:

Malheiros, 2003, p. 210-211 ⁄ AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro.

11. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 472-473 ⁄ BALEEIRO, Aliomar. Direito

Tributário Brasileiro. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996, p. 604).

7. A jurisprudência hodierna da Corte preconiza referido entendimento

consoante se colhe abaixo:

“O acórdão embargado, considerando que não é possível aplicar a nova

redação do art. 185 do CTN (LC 118⁄05) à hipótese em apreço (tempus regit

actum), respaldou-se na interpretação da redação original desse dispositivo

legal adotada pela jurisprudência do STJ”.

(EDcl no AgRg no Ag 1.019.882⁄PR, Rel. Ministro Benedito Gonçalves,

Primeira Turma, julgado em 06⁄10⁄2009, DJe 14⁄10⁄2009)

"Ressalva do ponto de vista do relator que tem a seguinte compreensão sobre

o tema: [...] b) Na redação atual do art. 185 do CTN, exige-se apenas a

inscrição em dívida ativa prévia à alienação para caracterizar a presunção

relativa de fraude à execução em que incorrem o alienante e o adquirente

(regra aplicável às alienações ocorridas após 9.6.2005);”.

(REsp 726.323⁄SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma,

julgado em 04⁄08⁄2009, DJe 17⁄08⁄2009)

"Ocorrida a alienação do bem antes da citação do devedor, incabível falar

em fraude à execução no regime anterior à nova redação do art. 185 do CTN

pela LC 118⁄2005".

(AgRg no Ag 1.048.510⁄SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma,

julgado em 19⁄08⁄2008, DJe 06⁄10⁄2008)

“A jurisprudência do STJ, interpretando o art. 185 do CTN, até o advento da

LC 118⁄2005, pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp

40.224⁄SP), no sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a

alienação de bem de devedor já citado em execução fiscal”.

(REsp 810.489⁄RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em

23⁄06⁄2009, DJe 06⁄08⁄2009)

8. A inaplicação do art. 185 do CTN implica violação da Cláusula de Reserva

de Plenário e enseja reclamação por infringência da Súmula Vinculante n.º

10, verbis: "Viola a cláusula de reserva de plenário (cf, artigo 97) a decisão

de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a

inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua

incidência, no todo ou em parte."

9. Conclusivamente: (a) a natureza jurídica tributária do crédito conduz a que

a simples alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, pelo

sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios

para quitação do débito, gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à

execução (lei especial que se sobrepõe ao regime do direito processual civil);

(b) a alienação engendrada até 08.06.2005 exige que tenha havido prévia

citação no processo judicial para caracterizar a fraude de execução; se o ato

translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de início da vigência da

Lei Complementar n.º 118⁄2005, basta a efetivação da inscrição em dívida

ativa para a configuração da figura da fraude; (c) a fraude de execução

prevista no artigo 185 do CTN encerra presunção jure et de jure, conquanto

componente do elenco das "garantias do crédito tributário"; (d) a inaplicação

do artigo 185 do CTN, dispositivo que não condiciona a ocorrência de fraude

a qualquer registro público, importa violação da Cláusula Reserva de

Plenário e afronta à Súmula Vinculante n.º 10, do STF.

10. In casu, o negócio jurídico em tela aperfeiçoou-se em 27.10.2005 , data

posterior à entrada em vigor da LC 118⁄2005, sendo certo que a inscrição em

dívida ativa deu-se anteriormente à revenda do veículo ao recorrido,

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porquanto, consoante dessume-se dos autos, a citação foi efetuada em data

anterior à alienação, restando inequívoca a prova dos autos quanto à

ocorrência de fraude à execução fiscal.

11. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão submetido ao regime do

artigo 543-C do CPC e da Resolução STJ n.º 08⁄2008.

(STJ. Resp nº 1.141.990/PR. Primeira Seção. Relator: Ministro LUIZ FUX.

DJe de 19/11/2010)

Conclui-se, pois, que em decorrência da nova conformação jurisprudencial

dada ao texto normativo do artigo 185, do Código Tributário Nacional, surgiram duas

novas consequências. A saber, a primeira, como bem pontua Luís Eduardo Schoueri

(2011), reside na necessidade de o comprador investigar se há débito inscrito na dívida

ativa em face do vendedor e, em caso afirmativo, certificar-se documentalmente que, ao

momento da celebração do negócio jurídico, este possuía, em seu patrimônio, bens ou

rendas suficientes para a satisfação do débito fiscal.

A segunda consequência, por seu turno, passou a ser observada no âmbito

jurisdicional, e reside no fato de o novel entendimento jurisprudencial vir sendo

aplicado no julgamento das ações de embargos de terceiro propostas pelos adquirentes

ou cessionários de boa-fé, assim como para o deferimento de pedidos incidentes de

fraude à execução, ainda que a celebração dos respectivos negócios jurídicos tenham-se

dado na vigência da antiga redação do artigo 185, do Código Tributário Nacional e

quando o próprio Poder Judiciário serenamente entendia ser aplicável a súmula de n.º

375, da jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça.

Diante dessa nova conformação, cabe indagar se a alteração jurisprudencial

ocorrida, que afastou a incidência de um entendimento jurisprudencial até então

pacificamente consolidado, poderia retroagir para tolher a eficácia de negócios jurídicos

celebrados antes de sua existência. Afinal, ao se declarar a ineficácia dos negócios

jurídicos sem se perquirir acerca da boa-fé do adquirente e das nuances do caso

concreto, não se estaria descurando dos efeitos jurídicos deletérios à eficácia dos

negócios jurídicos celebrados em conformidade com o entendimento jurisprudencial até

então vigente?

Não se olvidando que o Superior Tribunal de Justiça até 09/11/2010 sempre

decidia diferentemente, assentando ser indispensável o prévio registro da penhora ou

prova da má-fé, e que, inclusive, dentre os precedentes que ensejaram a edição da

súmula n.º 375, alguns tinham por objeto justamente a fraude à execução fiscal

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tributária, aplicar o novo entendimento do referido Recurso Especial aos negócios

jurídicos anteriores à sua vigência não macularia a segurança jurídica?

Diante dessas problematizações atinentes aos limites e conformações da nova

interpretação jurídica dada pelo paradigma estudado à luz do princípio constitucional da

segurança jurídica é que o presente trabalho acadêmico se desenvolverá.

Será a partir da evolução legislativa procedida na esfera do processo civil

brasileiro, que o aproximou da lógica processual do common law ao conferir crescente

importância para os precedentes judiciais, que se analisará o cabimento da modulação

dos efeitos à nova interpretação jurisprudencial do artigo 185, do Código Tributário

Nacional, de modo a harmonizá-la com o mandamento constitucional da segurança

jurídica.

Neste momento, então, passar-se-á ao estudo da relevância e efeitos dos

precedentes judiciais para, ao cabo, assentar a solução adequada.

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60

4 A SEGURANÇA JURÍDICA NA APLICAÇÃO DO RESP

1.141.990/PR

4.1 O efeito vinculante dos precedentes judiciais

Questão que vem ganhando relevo na doutrina a partir das evoluções

legislativas na esfera do processo civil é a natureza jurídica dos precedentes judiciais no

sistema jurídico brasileiro, sua aplicação e graus de vinculação.

Em definição propedêutica, com base nas lições de Karl Larenz (2005), pode-

se considerar o termo “precedente” como uma decisão judicial proferida a partir de uma

situação jurídica concreta e cujas razões fundamentais de decidir têm a aptidão de servir

como parâmetro para a posterior apreciação judicial de casos análogos. Em síntese, os

precedentes judiciais são decisões jurídicas proferidas por órgãos jurisdicionais e cujo

núcleo essencial direciona a resolução de demandas semelhantes.

Por se tratar de decisão judicial, todo precedente é composto pela descrição

fática da situação jurídica apreciada, pela tese jurídica assentada na motivação e pelo

dispositivo decisório, sob o qual recai, no direito objetivo pátrio, o atributo

constitucional da coisa julgada (artigo 5º, XXXVI85

, da CF c/c os artigos 46786

e 46987

,

ambos do CPC). Entretanto, para a lógica precedentalista, é apenas a ratio decidendi,

enquanto norma geral e tese jurídica fundamental, que tem a aptidão de projetar seus

efeitos para casos similares.

Por outro lado, não se pode confundir a ratio decidendi com a integralidade da

argumentação jurídica dispendida pelo magistrado, posto que aquela fica adstrita ao

raciocínio lógico-jurídico essencial e indispensável à norma individual proferida no

dispositivo decisório. Assim, a toda argumentação periférica, secundária e dispensável à

fundamentação da norma individual criada, ainda que se encontre topograficamente na

fundamentação, dar-se-á o nome de obter dictum (DIDIER JR., 2012).

Feitas essas considerações, cabe indagar se, no atual contexto jurídico, os

precedentes têm efeito meramente persuasivo, eficácia expansiva ou caráter obrigatório.

85

“A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. 86

“Denomina-se coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais

sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”. 87

“Art. 469. Não Fazem coisa julgada: I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance

da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença; III

– a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentalmente no processo.”.

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Para Tércio Sampaio Ferraz Jr. (2010), a jurisprudência no Brasil não pode ser

considerada como fonte normativa do direito, senão elemento persuasivo na

interpretação normativa, porquanto não tem força vinculante e obrigatória. Por outro

lado, Luiz Guilherme Marinoni (2011) defende a autoridade dos precedentes dos

tribunais superiores, sobretudo para conferir coerência à ordem jurídica e resguardar a

previsibilidade e confiança nos atos do Poder Judiciário.

De todo modo, independente da posição doutrinária adotada, é inegável que o

Poder Judiciário tem rompido com a tradição conservadora, de origem ideológica liberal

do século XIX, assumindo um papel de protagonista que vem sendo refletido no próprio

ensino e pesquisa jurídicos e alçando o fundamento das decisões a uma importância

superior à própria lei (FERRAZ JR., 2014).

Ao decidir, o magistrado cria duas normas jurídicas distintas, a saber: a) uma

norma de caráter geral, oriunda da interpretação do texto normativo a partir dos fatos

narrados; e b) uma segunda norma, de caráter individual, criada e aplicada para o mérito

específico da demanda em apreço (FERRAZ JR., 2010).

Explica Fredie Diddier Jr. (2012, p. 383) que a primeira norma é

geral porque, tal como ocorre com os princípios gerais a que se chega por

raciocínio indutivo, a tese jurídica (ratio decidendi) se desprende do caso

específico e pode ser aplicada em outras situações concretas que se

assemelhem àquela em que foi originalmente construída.

Portanto, conclui-se que a vocação de universalidade da ratio decidendi é uma

realidade em qualquer sistema jurídico, quer assentado na lógica do civil law, quer

ligado à família do common law, diferenciando-se apenas no grau de autoridade que

logra em seus ordenamentos jurídicos (MARINONI, 2012).

Nos países de origem anglo-saxônica perfilhados ao sistema do common law,

sedimentou-se, com mais rigor, a teoria do stare decisis et non quieta movere88

,

segundo a qual os precedentes judicias, sobretudo dos tribunais superiores, revestir-se-

iam de eficácia vinculante não apenas perante a própria corte que os prolatou, mas

sobretudo perante os órgãos jurisdicionais hierarquicamente inferiores. A essa tese da

eficácia vertical dos precedentes deu-se o nome de doctrine of binding precedent, cuja

origem remonta à Inglaterra do século XIX e reconhecimento judicial se deu na Câmara

88

Brocardo latino segundo o qual o que já foi decidido deve ser aplicado sem variação.

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dos Lordes inglesa por ocasião do julgamento do leading case London Tramways

Company x London County Concil (DIDIER JR., 2012).

Contudo, na experiência jurídica brasileira, é fato que o legislador vem, há

algum tempo, conferindo crescente autoridade aos precedentes judiciais, sobretudo dos

tribunais superiores, com vistas a garantir maior coerência, uniformidade e isonomia na

aplicação do direito, para resguardar a segurança jurídica na aplicação do direito posto e

propiciar maior celeridade no julgamento de questões idênticas.

Por ocasião do julgamento da paradigmática Reclamação Constitucional nº

4.335/AC, na qual se discutiu a tese da abstrativização do controle difuso de

constitucionalidade89

e a eventual ocorrência de mutação constitucional do artigo 52, X,

da Constituição Federal90

, defendida pelo ministro relator Gilmar Mendes, o ministro

Teori Albino Zavascki, ao proferir seu voto-vista, teceu minuciosa retrospectiva da

evolução legislativa que conferiu aos precedentes judiciais das cortes superiores o que

denominou de “força expansiva”, fato que vem aproximando, paulatinamente, o sistema

jurídico brasileiro da cultura do stare decisis, inerente ao sistema do common law.

Nos termos do referido voto-vista,

Não se pode deixar de ter presente, como cenário de fundo indispensável à

discussão aqui travada, a evolução do direito brasileiro em direção a um

sistema de valorização dos precedentes judiciais emanados dos tribunais

superiores, aos quais se atribui, cada vez com mais intensidade, força

persuasiva e expansiva em relação aos demais processos análogos. Nesse

ponto, o Brasil está acompanhando um movimento semelhante ao que

também ocorre em diversos outros países que adotam o sistema da civil law,

que vêm se aproximando, paulatinamente, do que se poderia denominar de

cultura do stare decisis, própria do sistema da common law. A doutrina tem

registrado esse fenômeno, que ocorre não apenas em relação ao controle de

constitucionalidade, mas também nas demais áreas de intervenção dos

tribunais superiores, a significar que a aproximação entre os dois grandes

sistemas de direito (civil law e common law) é fenômeno em vias de franca

generalização (...)

É interessante ilustrar a paulatina, mas persistente, caminhada do direito

brasileiro no rumo da valorização dos precedentes judiciais, no âmbito da

jurisdição geral (e não, exclusivamente, da constitucional, de que se tratará

mais adiante) mencionando alguns de seus mais expressivos movimentos. Em

1963, o Regimento Interno do STF (art. 102) instituiu a Súmula da

Jurisprudência Predominante do Supremo Tribunal Federal, instrumento

prático ainda hoje importantíssimo para viabilizar a força persuasiva dos

89

Tese segundo a qual o precedente firmado em sede de recurso extraordinário também seria aplicável a

casos análogos, ante a relevância, objetividade e repercussão social da matéria suscitada. Assim, a ratio

decidendi firmada pelo Supremo Tribunal Federal adquiriria eficácia erga omnes e deveria abarcar casos

concretos que se enquadrassem na moldura fática similar que serviu como premissa para a aplicação da

interpretação constitucional de determinado dispositivo objeto de controle difuso. 90

“art. 52. Compete Privativamente ao Senado Federal: (...) X – suspender a execução, no todo ou em

parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal;”.

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63

precedentes da Corte. No regime original do Código de Processo Civil de

1973, previu-se mecanismo de uniformização de jurisprudência e de edição

de súmulas (art. 479 do CPC), a evidenciar a preocupação de dar tratamento

isonômico aos demais casos semelhantes. Logo depois, a LC 35/1979 (Lei

Orgânica da Magistratura - LOMAN), autorizou que, nos processos de

competência do Tribunal Federal de Recursos (TFR), o relator negasse

seguimento a recurso contrário a “súmula do Tribunal ou do STF” (art. 90, §

2.º, da LC 35/1979), o que representou manifestação inequívoca da força

expansiva desses enunciados. Seguiu-se, no mesmo sentido, a Lei

8.038/1990, que, em seu art. 38, autorizou o relator, no STF e no STJ, a negar

seguimento a recurso contrário a “súmula do respectivo tribunal”.

O movimento em direção à força subordinante dos precedentes (não apenas

dos sumulados, mas também dos demais) foi acelerado com as reformas do

Código de Processo Civil ocorridas a partir de 1994. A nova redação do art.

557 e de seus parágrafos autorizou o relator, nos tribunais, a,

individualmente, negar seguimento a recursos, quando a decisão recorrida

estiver adequada às súmulas ou à jurisprudência dominante do respectivo

tribunal ou dos tribunais superiores; e a dar-lhes provimento, quando a

decisão recorrida estiver em confronto com súmula ou jurisprudência

dominante dos tribunais superiores. Pelo art. 544, §§ 3.º e 4.º, do CPC, foi

atribuída competência ao relator de agravo de instrumento em recurso

especial e em recurso extraordinário para, desde logo, invocando

jurisprudência ou súmula do STJ ou STF, conhecer do agravo e prover o

próprio recurso especial ou o próprio recurso extraordinário. O parágrafo

único do art. 481 instituiu o sistema de vinculação dos órgãos fracionários

dos Tribunais aos seus próprios precedentes e, quando houver, aos do STF,

nos incidentes de inconstitucionalidade. Em 1998, o parágrafo único do art.

120 do CPC trouxe autorização para o relator decidir de plano conflito de

competência quando há “jurisprudência dominante do tribunal sobre a

questão suscitada”. Em 2001, o art. 475, § 3.º, do CPC, dispensou o reexame

necessário das sentenças que adotam jurisprudência do plenário do STF ou

súmula do tribunal superior competente. Na mesma época, o art. 741,

parágrafo único, passou a atribuir a decisões do STF sobre a

inconstitucionalidade de normas, mesmo em controle difuso, a eficácia de

inibir a execução de sentenças a ele contrárias (verdadeira eficácia

rescisória), o que foi reafirmado em 2005, pelo art. 475-L, § 1.º, do CPC. Em

2006, o art. 518, § 1.º, do CPC passou a considerar descabida a apelação

contra sentenças proferidas com base em súmulas do STF ou do STJ (típica

consagração da súmula impeditiva de recurso). No mesmo ano, os arts. 543-

A e 543-B do CPC, ao disciplinarem a “repercussão geral” para efeito de

conhecimento de recursos extraordinários (art. 102, §3.º, da CRFB/1988),

reafirmaram notavelmente e deram sentido prático à força dos precedentes do

STF. Em 2008, foi editada a Lei 11.672/2008, que acrescentou o art. 543-C

ao CPC, instituindo, para recursos especiais repetitivos, um sistema de

julgamento semelhante ao da repercussão geral. O sistema não apenas

confere especial força expansiva aos precedentes do STF e do STJ, mas

também institui fórmulas procedimentais para tornar concreta e objetiva a sua

aplicação aos casos pendentes de julgamento.

No âmbito dos juizados especiais federais, o regime de vinculação aos

precedentes dos Tribunais Superiores vem desde a sua origem, com a Lei

10.259/2001. O seu art. 14 dessa Lei criou um mecanismo de “uniformização

de interpretação de lei federal”, de competência de um órgão de caráter

nacional (a “Turma de Uniformização” – § 2.º), cujo referencial último é a

observância da “sumula ou jurisprudência dominante no STJ” (§ 4.º). Em

caso de demandas repetitivas, instalado o incidente, ficam retidos os demais

recursos (§§ 5.º a 8.º), os quais, após a definição da interpretação pelo órgão

superior, serão julgados nas Turmas Recursais, que poderão “exercer o juízo

de retratação ou declará-los prejudicados” (§ 9.º). Havendo recurso

extraordinário, nos Juizados, ele será processado e julgado pelo mesmo

sistema dos §§ 4.º a 9.º do art. 14 (art. 15), de modo que o precedente assim

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formado terá a força de impor julgamento idêntico aos demais recursos sobre

a matéria decidida. Regime semelhante foi instituído pela Lei 12.153/2009 ao

“Sistema dos Juizados Especiais dos Estados e do Distrito Federal” (que

inclui todos os órgãos dos Juizados, e não apenas os Juizados da Fazenda

Pública – art.1.º, parágrafo único): o “pedido de uniformização de

interpretação de lei quando houver divergência entre decisões proferidas por

Turmas Recursais sobre questões de direito material” (art. 18), será julgado,

em reunião conjunta das Turmas em conflito, sob a presidência de um

desembargador (art. 18, § 1.º); e será julgado pelo STJ “quando as Turmas de

diferentes Estados derem a lei federal interpretações divergentes, ou quando a

decisão proferida estiver em contrariedade com súmula do Superior Tribunal

de Justiça” (art. 18, § 3.º). Foi criado, também, o pedido de “manifestação”

do STJ, para dirimir divergência “quando a orientação acolhida pelas Turmas

de Uniformização (...) contrariar súmula do Superior Tribunal de Justiça”

(art. 19). Nos casos do § 3.º do art. 18 e do art. 19, em que é provocado o

pronunciamento do STJ, os pedidos semelhantes ficarão retidos (art. 19,

parágrafo único); publicado o acórdão do STJ, esses pedidos “serão

apreciados pelas Turmas Recursais, que poderão exercer juízo de retratação

ou os declararão prejudicados, se veicularem tese não acolhida pelo Superior

Tribunal de Justiça” (art. 19, § 6.º). Quanto ao recurso extraordinário, o

processo e o julgamento obedecerão a esse mesmo método (art. 15), a

significar, aqui também, que o precedente repercutirá no julgamento de todos

os demais recursos em tema semelhante.

Portanto, nota-se que esse fenômeno de aproximação das decisões

jurisdicionais pátrias da filosofia do stare decisis não se limitou ao controle de

constitucionalidade. Ao revés, é um fenômeno que se encontra em evolução,

abrangendo os demais ramos jurisdicionais dos tribunais superiores e do sistema dos

juizados especiais. Afinal, como leciona Carlos Alberto Álvaro de Oliveira (2009, p.

81),

Em tais hipóteses, embora possa estar em jogo o direito da parte, subjaz no

fundo o interesse público, seja pela coordenação do conteúdo dos

julgamentos, seja pela declaração de ilegitimidade ou legitimidade das leis

atos normativos infraconstitucionais, tudo para diminuir as possibilidades de

erros e contradições, incrementando, assim, mediante o aperfeiçoamento da

distribuição de justiça, a confiança do cidadão na autoridade do Estado.

A observância às razões expendidas pelo Poder Judiciário, nesse contexto,

também passa a influenciar a própria atuação da Administração Pública, como compeliu

a União a compensar os prejuízos decorrentes dos expurgos inflacionários aos saldos do

FGTS, após o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, dos Recursos

Extraordinários de n.º 248.188/SC e 226.855/RS – sequer submetidos ao regime da

repercussão geral–, fato que motivou, inclusive, o legislativo a instituir a contribuição

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65

especial do artigo 1º, caput91

, da Lei Complementar 110/2001, e estabelecer, nos termos

dos artigos 3º, §1º, e 4º, caput, do mesmo diploma normativo, que

Art. 3º [...]

§1º As contribuições sociais serão recolhidas na rede arrecadadora e

transferidas à Caixa Econômica Federal, na forma do art. 11 da Lei nº 8.036,

de 11 de maio de 1990, e as respectivas receitas serão incorporadas ao FGTS.

[...]

Art. 4º Fica a Caixa Econômica Federal autorizada a creditar nas contas

vinculadas do FGTS, a expensas do próprio Fundo, o complemento de

atualização monetária resultante da aplicação, cumulativa, dos percentuais de

dezesseis inteiros e sessenta e quatro centésimos por cento e de quarenta e

quatro inteiros e oito décimos por cento, sobre os saldos das contas mantidas,

respectivamente, no período de 1º de dezembro de 1988 a 28 de fevereiro de

1989 e durante o mês de abril de 1990...

De igual modo, em atenção à transcendência das razões de decidir assentadas

na jurisprudência dos Tribunais Superiores (Supremo Tribunal Federal, Superior

Tribunal de Justiça, Tribunal Superior do Trabalho e Tribunal Superior Eleitoral) é que

se podem compreender as inovações legislativas introduzidas pela Lei nº 12.884, de

2013 ao artigo 19, da Lei 10.522/2002, que estatui, in verbis:

Art. 19. Fica a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional autorizada a não

contestar, a não interpor recurso ou a desistir do que tenha sido interposto,

desde que inexista outro fundamento relevante, na hipótese de a decisão

versar sobre:

[...]

II – matérias que, em virtude de jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal

Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior do Trabalho e

do Tribunal Superior Eleitoral, sejam objeto de ato declaratório do

Procurador-Geral da Fazenda Nacional, aprovado pelo Ministro de Estado da

Fazenda; (Redação dada pela Lei nº 12.844, de 2013);

[...]

IV – matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo

Supremo Tribunal Federal, em sede de julgamento realizado nos termos do

art. 543-B da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo

Civil; (Incluído pela Lei nº 12.844, de 2013).

V – matérias decididas de modo desfavorável à Fazenda Nacional pelo

Superior Tribunal de Justiça, em sede de julgamento realizado nos termos dos

art. 543-C da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo

Civil, com exceção daquelas que ainda possam ser objeto de apreciação pelo

Supremo Tribunal Federal. (incluído pela Lei nº 12.844, de 2013).

[...]

Na esfera normativa estadual, é digna de menção a Lei Complementar n.º

303/2005, do Estado do Rio Grande do Norte, que, ao estabelecer normas gerais para os

91

“Fica instituída contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado

sem justa causa, à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao

Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido

das remunerações aplicáveis às contas vinculadas”.

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66

processos administrativos no âmbito estadual, impôs o dever de motivação aos atos que

“deixem de aplicar a jurisprudência firmada sobre a questão” (artigo 13, VI).

Aos que vivenciam a praxe forense é fácil constatar que, na prolação de

decisões e sentenças, tornou-se regra a transcrição ou, ao menos, menção de precedentes

judiciais, sobretudo dos Tribunais aos quais os magistrados estão diretamente

subordinados e das Cortes Superiores, às quais, por mandamento constitucional,

incumbiram-se de uniformizar a interpretação em matérias infraconstitucionais e

constitucionais.

Com maior frequência, encontram-se transcrições de precedentes oriundos de

Tribunais Superiores nos acórdãos dos Tribunais de Segundo Grau (Tribunais de

Justiça, Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais Eleitorais e Tribunais

Regionais do Trabalho), bastando uma simples consulta em seus sítios virtuais ou no

site da “jurisprudência unificada” administrado pelo Conselho da Justiça Federal para

que se comprove tal assertiva.

Esse fato, porém, não decorre simplesmente do caráter persuasivo dos

precedentes judiciais, mas, sobretudo, da necessidade de o Poder Judiciário proferir

decisões isonômicas e coerentes de modo mais célere e efetivo possíveis, buscando

fazer frente à proliferação de demandas judiciais similares e evitando, sempre que

possível, a multiplicação de incidentes e recursos processuais jurisprudencialmente

infundados. Afinal, os precedentes judiciais, “sobretudo os dos tribunais superiores,

pelo menos quando não deparam com uma contradição demasiado grande, são

considerados, decorrido algum tempo, Direito vigente” (LARENZ 2005, p. 611).

Nesse sentido, o simples acompanhamento das sessões das Câmaras e Turmas

dos Tribunais de Segundo Grau demonstrará que, não raras às vezes, seus integrantes

votam em determinado sentido “ressalvando seus entendimentos pessoais”,

principalemente quando a questão já se encontra pacificada pelos respectivos Órgãos

Fracionários, pela Corte Especial, pelo Tribunal Pleno e pelos Tribunais Superiores

competentes. A título de ilustração, observe-se a ementa do REsp 726.323/SP,

colacionada no tópico 3.3.2.1.

Sucede que, como bem elucida Dimitri Dimoulis (2003, p. 194-195),

Os tribunais inferiores sabem que eventual decisão contra uma jurisprudência

‘assentada’ não será admitida nas instâncias superiores, por considerarem que

as mudanças de entendimentos comprometem tanto a segurança jurídica

como a autoridade do próprio Poder Judiciário. Por essas razões a

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67

jurisprudência assentada influencia de forma decisiva as futuras decisões dos

tribunais.

Portanto, em termos práticos, a jurisprudência se tornou verdadeiro “guia

obrigatório” das decisões, por ser dotada, ao menos, de força vinculante material.

Exemplo desse fato é o requisito jurisprudencial da dupla conformidade para a aplicação

da sentença de improcedência prima facie, nos termos do artigo 285-A, caput, do

Código de Processo Civil, que estabelece, in verbis:

Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no

juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros

casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença,

reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.

Explicando melhor, assentou-se na jurisprudência pátria que, para que a

aplicação do artigo 285-A, do Código de Processo Civil, atenda a sua finalidade,

enquanto instrumento de racionalidade e aceleração processual92

, é necessário que as

razões de decidir do juízo de 1º grau se encontrem em harmonia com o entendimento do

Tribunal e dos Tribunais Superiores93

.

É certo que, nesses casos, a vinculação aos precedentes não se dá,

formalmente, em paridade com a eficácia das Súmulas Vinculantes, criadas pelo Poder

Constituinte Derivado, ao positivar o artigo 103-A94

, da Constituição Federal, através da

Emenda Constitucional nº 45/2004, e regulamentadas pela Lei nº 11.417/2006.

Afinal, além de ser dotada de objeto específico (Artigo 103-A, caput e §1º95

, da

CF c/c o artigo 2º, caput e §1º, da Lei nº 11.417/2006), lograr de hipóteses de iniciativa

92

Na Exposição de Motivos n.º 00186-MJ,de 19 de novembro de 2004, o então Ministro da Justiça

Márcio Thomas Bastos assentou que “Sob a perspectiva das diretrizes estabelecidas para a reforma da

Justiça, faz-se necessária a alteração do sistema processual brasileiro com o escopo de conferir

racionalidade e celeridade ao serviço de prestação jurisdicional, sem contudo, ferir o direito ao

contraditório e à ampla defesa”. 93

“O art. 285-A do CPC constitui importante técnica de aceleração do processo. É necessário, para que o

objetivo visado pelo legislador seja alcançado, que o entendimento do juiz de 1º grau esteja em

consonância com o entendimento do Tribunal local e dos Tribunais Superiores (dupla conforme)”. (STJ.

REsp 1.225.227/MS. Relatora: Min. Nancy Andrighi. Terceira Turma. DJe de 12/06/2013). 94

“Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de

dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que,

a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do

Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem

como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei.” 95

“§1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca

das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que

acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.

(incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).”.

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constitucionalmente estabelecidas (Artigo 103-A, §2º96

, da CF) e ter procedimento

próprio (Resoluções nº 381/2008 e 388/2008, ambas do STF) para sua edição, revisão e

cancelamento (artigo 5º, da Lei 11.417/2006)97

, o Constituinte Derivado lhe atribuiu

eficácia vinculante perante os demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração

Pública, a partir da publicação do enunciado em seção especial do Diário de Justiça do

Diário Oficial da União e estabeleceu o cabimento de instrumento processual próprio,

qual seja, a Reclamação perante o Supremo Tribunal Federal (artigo 103-A, §3º98

, da

CF c/c o artigo 7º99

, da Lei nº 11.417/2006), para reprimir sua inobservância e preserva-

lhe a eficácia.

A procedência da Reclamação, inclusive, implicará na anulação do ato

administrativo divergente ou cassação da decisão judicial reclamada, ocasiões nas quais

se determinará a renovação dos atos, com observância da Súmula Vinculante pertinente.

Outro aspecto digno de menção a respeito da edição de Súmula Vinculante é a

possibilidade de manifestação dos interessados na questão jurídica envolvida na edição

da Súmula Vinculante, fato que, lastreado pela concepção pluralista pensada por Peter

Haberle (1997), buscou aproximar a interpretação do Poder Judiciário à realidade social,

a partir da participação ativa dos destinatários finais do processo hermenêutico de

concretização dos textos normativos.

Não por outra razão, Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p. 23), ao analisar o

mencionado artigo 103-A, da Constituição Federal,

constata que, sem sombra de dúvidas, pode-se considerá-la como norma

jurídica. Representa guia de conduta, pois informa como deverão atuar os

juízes e a Administração Pública na tomada de decisões, influenciando o agir

dos particulares.

96

“§2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de

súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.”

(Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 97

“Art. 5º Revogada ou modificada a lei em que se fundou a edição de enunciado de súmula vinculante, o

Supremo Tribunal Federal, de ofício ou por provocação, procederá à sua revisão ou cancelamento,

conforme o caso”. 98

“§3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente

a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato

administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem

a aplicação da súmula, conforme o caso.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004). 99

“Art. 7º Da decisão judicial ou do ato administrativo que contrariar enunciado de súmula vinculante,

negar-lhe vigência ou aplica-lo indevidamente caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal, sem

prejuízo dos recursos ou outros meios admissíveis de impugnação. [...]”.

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69

Por oportuno, não se pode olvidar que a Lei 11.417/2006 também adicionou

artigos à Lei Federal 9.784/1999, para estabelecer que, nos casos em que o impetrante

de recurso administrativo alegar violação a enunciado de súmula vinculante, o órgão

administrativo competente para a sua apreciação deverá arcar com o ônus

argumentativo de explicitar as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade do respectivo

enunciado sumular (artigo 64-A100

).

De igual modo, nos casos em que o Supremo Tribunal Federal acolher a

reclamação fundada em sua violação, dar-se-á ciência à autoridade prolatora e ao órgão

competente para o julgamento recursal, para que estes adequem suas futuras decisões

administrativas a casos análogos, “(...) sob pena de responsabilização pessoal nas

esferas cível, administrativa e penal.” (artigo 64-B).

Contudo, a dinâmica evolutiva das decisões judiciais já relatada aliada à

realidade prática e limitações inerentes ao Poder Judiciário é suficiente para alçar a

jurisprudência em patamar superior ao de simples elemento persuasivo ou azimute

interpretativo, lastro de uma resolução adequada e racional dotada de eficácia material,

independente da manifestação expressa do órgão jurisdicional que a produziu (DIDIER

JR., 2012) e ainda que esse fato propicie a resolução de casos sobre premissas

equivocadas.

Nesse sentido, encontram-se as lições de Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p.

55), ao asseverar que

provocadas pela necessidade de rápida solução do enorme número de feitos

que assoberbam os tribunais pátrios, em conjugação com a multíplice e

apressada (por vezes, até mesmo descuidada) coleta de ementas atualmente

propiciada pela navegação do internauta, revelam-se, nos últimos tempos,

com certa frequência, distorções na verdadeira compreensão dos precedentes.

O fenômeno, denominado de ementismo (...) vem favorecendo a solução de

casos concretos sob premissas equivocadas.

De todo modo, nosso sistema jurídico está caminhando para que a eficácia

vinculante dos precedentes judiciais seja terminantemente incorporada e reconhecida

em nosso direito objetivo. Veja-se, a título de ilustração, que o projeto do novo Código

de Processo Civil (PL 8.046/2010) prevê a criação do Incidente de Resolução de

Demandas Repetitivas, estabelecendo que, em casos de proliferação de demandas sobre

100

“Art. 64-A. Se o recorrente alegar violação de enunciado da súmula vinculante, o órgão competente

para decidir o recurso explicitará as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o

caso.”

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uma mesma questão jurídica, a tese jurídica (ratio decidendi/norma geral) adotada pelo

respectivo tribunal vinculará o julgamento de processos individuais ou coletivos que

tramitarem em sua área de jurisdição até posterior revisão pelo próprio tribunal.

A saber, os artigos 988, caput, e 995, caput, e §1º, do mencionado diploma

normativo vindouro prevêem, respectivamente, que:

Art. 988. É admissível o incidente de resolução de demandas repetitivas

quando, estando presente o risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica,

houver efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a

mesma questão unicamente de direito.

(...)

Art. 995. Julgado o incidente, a tese jurídica será aplicada a todos os

processos individuais ou coletivos que versem sobre idêntica questão de

direito e que tramitem na área de jurisdição do respectivo tribunal, inclusive

àqueles que tramitem nos juizados especiais do respectivo estado ou região.

§ 1º A tese jurídica será aplicada, também, aos casos futuros que versem

idêntica questão de direito e que venham a tramitar no território de

competência do respectivo tribunal, até que esse mesmo tribunal a revise.

Entretanto, à vista de todo o exposto, ainda que se persista em admitir o caráter

meramente persuasivo dos precedentes judiciais e se negue o fato de que todo o

conjunto normativo constitucional e infraconstitucional está se direcionando para a

valorização dos precedentes judiciais, o presente trabalho monográfico está a analisar

uma modalidade diferente e especial destes, qual seja, o Recurso Repetitivo, que se

encontra positivado no artigo 543-C, do atual Código de Processo Civil101

, com redação

dada pela Lei dos Recursos Repetitivos (Lei 11.672/2008).

4.2 Os recursos repetitivos

Em uma classificação gradativa criada pela doutrina, nas quais se elencam as

espécies de precedentes a) persuasivos102

, b) obstativos da revisão de decisões103

e c)

vinculantes/obrigatórios, há posição doutrinária que enquadra os recursos repetitivos ao

101

“Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de

direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo.” 102

Os precedentes meramente persuasivos são aqueles que não têm eficácia vinculante. Noutros termos,

designa-se precedente persuasivo àquele ao qual o magistrado não está obrigado a seguir, senão como

elemento argumentativo. 103

Os precedentes obstativos de revisão de decisões judiciais são aqueles que autorizam a negativa de

seguimento a certos recursos ou dispensam o reexame necessário, quando as respectivas decisões estão

em consonância com os precedentes judiciais, sobretudo dos Tribunais Superiores. Exemplos dessa

espécie são encontrados nos artigos 475, §3º, 518, §1º, 544, §§3º e 4º, 557, todos do CPC. Em casos tais,

autoriza-se o órgão jurisdicional competente a apreciar a admissibilidade dos recursos a partir dos

precedentes firmados, possibilitando a negativa de seus seguimentos ou a dispensa do reexame

necessário, conforme leciona Fredie Didier Jr. (2012, p. 390).

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lado das súmulas vinculantes, dos entendimentos consolidados na súmula de cada um

dos tribunais, perante estes, e da decisão que fixa a tese para os recursos extraordinários,

nesta terceira categoria (DIDIER JR., 2012, p. 388-389).

Em artigo publicado no site do ConJur em 27 de novembro de 2008104

, meses

após o início da vigência do mencionado instrumento processual, o ministro Luis Felipe

Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, afirmou que

(...) a inclusão do art. 543-C no Código de Processo Civil, preceito cujo

processamento foi regulado pela Resolução 8/2008 do Superior Tribunal de

Justiça, permitirá a objetivação no julgamento dos recursos especiais, com a

análise, em abstrato, de questões reiteradamente conduzidas à

apreciação desta Corte, assentando seu entendimento e orientando a

atuação das instâncias ordinárias. (grifos não constantes do original).

Tal assertiva, contudo, não é pretensiosa ou inovadora, sintetizando, apenas e

tão somente, a intensão do legislador ao editar a referida Lei dos Recursos Repetitivos,

conforme se abstrai da Exposição de Motivos nº 40-MJ, de 05 de abril de 2007105

.

A saber, o então Ministro de Estado da Justiça, Tarso Genro, relatou na referida

Exposição de Motivos que o projeto de lei que criou os Recursos Repetitivos, incluindo

o artigo 543-C, no Código de Processo Civil, baseou-se em sugestão do ex-ministro do

Superior Tribunal de Justiça Athos Gusmão Carneiro, com os objetivos de conferir

racionalidade e celeridade à prestação jurisdicional, assim como também de amenizar os

problemas decorrentes do excesso de demandas judiciais naquela Corte de Justiça.

Não por outra razão, em atenção à tendência de objetivação no julgamento dos

recursos especiais é que se conferiu a oportunidade de os tribunais a quo adequarem

suas decisões prolatadas em casos semelhantes e que se encontram com recursos

especiais sobrestados à ratio decidendi sedimentada pelo Superior Tribunal de Justiça,

por ocasião do julgamento do paradigma, conforme o artigo 543-C, §7º, II106

, do CPC.

Em verdade, o próprio sobrestamento recursal tem a função prática de vincular a

resolução do mérito de suas lides à norma geral estabelecida pela Corte Cidadã.

104

Documento on-line, não datado e não paginado. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2008-nov-

27/stj_julgamento_recursos_repetitivos>. Acesso em: 07 set. 2014. 105

Documento on-line, não datado e não paginado. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Projetos/EXPMOTIV/MJ/2007/40.htm>. Acesso em: 07 set. 2014. 106

“§7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem:

(incluído pela Lei nº 11.672, de 2008) I – terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido

coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou (incluído pela Lei nº 11.672, de 2008) II –

serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da

orientação do Superior Tribunal de Justiça. (incluído pela Lei nº 11.672, de 2008).”.

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72

É o que de ordinário se percebe, a exemplo de recursos relativos ao instituto da

fraude à execução fiscal tributária após o advento do paradigmático recurso repetitivo,

como ocorreu no recente julgamento da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da

Quinta Região abaixo transcrito:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PROCESSO QUE RETORNOU

DA VICE-PRESIDÊNCIA. NOVO JULGAMENTO DO AGRAVO DE

INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL.

INSCRIÇÃO DA DÍVIDA ATIVA ANTERIOR À ALIENAÇÃO DO

IMÓVEL. PROVA. APLICAÇÃO DO ART. 185 DO CTN (LC 118/2005).

ADAPTAÇÃO AO RESP 1.141.990-PR. JUÍZO DE RETRATAÇÃO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO.

1 - Trata-se de agravo de instrumento interposto pela Fazenda Nacional ante

decisão que não reconheceu fraude à execução

2 - Afirma que o ato de alienação também foi posterior a anotação do nome

do co-executado pelo setor de distribuição da JF/PE, que ocorreu em

18.01.2012.

3 - O voto condutor, à época, aplicou o entendimento do C. STJ, o qual

considerava que inexistindo registro da penhora, a alienação do imóvel

mesmo posterior à citação não caracterizava fraude à execução, tendo

em vista a boa-fé do adquirente.

4 - Nada obstante, seguindo a nova orientação, em regime de Recurso

Repetitivo, do REsp 1114990/PR, verifico que, muito embora a alienação

do bem executado a terceiro tenha se aperfeiçoado anteriormente ao

registro da penhora do imóvel, o negócio foi posterior à inscrição em

dívida ativa , de acordo com os termos do art. 185 do CTN, em sua nova

redação (LC 118/2005). Como a inscrição em dívida ativa ocorreu em

01.10.2010 e 12.08.2011, após, a inclusão no pólo passivo do co-executado

em 16.01.2012 e, por seu turno, a alienação do imóvel ocorrida em

31.08.2012 ( fl.20/20v) , restou configurada a fraude à execução.

5 - Vale esclarecer que a Súmula 375 do C. STJ não se aplica à hipótese. O

antigo entendimento de apenas caracterizar-se fraude à execução quando

houvesse registro da penhora e fosse configurada a má-fe do terceiro

adquirente, não encontram apoio em sede de execução fiscal.

6 - O certo é que no regime atual, a teor do art. 543-C do CPC, a fraude à

execução independe da alegação de boa-fé do adquirente. Exige-se apenas à

observância do lapso temporal, se antes do advento da LC 118/2005,

pacificou-se, por entendimento da Primeira Seção (EREsp 40.224/SP), no

sentido de só ser possível presumir-se em fraude à execução a alienação de

bem de devedor já citado em execução fiscal". (REsp 810.489/RS, Rel.

Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 23/06/2009, DJe

06/08/2009). Se o ato translativo foi praticado a partir de 09.06.2005, data de

início da vigência da Lei Complementar n.º 118/2005, basta a efetivação da

inscrição em dívida ativa para a configuração da figura da fraude; Ora, como

a dívida ativa da União já tinha sido inscrito no momento da alienação do

imóvel, é de se reconhecer que houve fraude à execução.

7- No exercício do Juízo de Retratação, determinar o prosseguimento da

execução fiscal.

8 - Agravo de instrumento provido.

(TRF5. AG 136.472. Quarta Turma. Relator: Desembargador Federal Lazaro

Guimarães. Votação unânime. Julgado em 09/09/2014. DJe de 18/09/2014).

(grifos não constantes do original).

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73

Pela grande relevância dessa nova sistemática processual, inclusive, foi que o

Conselho Nacional de Justiça – CNJ, no exercício de sua competência

constitucionalmente atribuída para o controle da atividade administrativa do Poder

Judiciário (artigo 103-B, §4º, da CF), editou, em 19 de outubro de 2012, sua resolução

de n.º 160, para determinar que os Tribunais Superiores, Tribunais de Justiça dos

Estados e do Distrito Federal e os Tribunais Regionais Federais, no prazo máximo de 90

(noventa) dias, organizassem seus respectivos Núcleos de Repercussão Geral e

Recursos Repetitivos – NURER (artigo. 1º).

4.3 A segurança jurídica e a mudança jurisprudencial

Diante dessa evolução jurídica do ordenamento jurídico pátrio, procedida com

o escopo – frise-se – de garantir a estabilidade na observância do direito, aclarar e

integrar o direito objetivo, buscando dar-lhe uma aplicação uniforme, racional e

socialmente adequada, de modo célere e efetivo, para conferir eficiência na tramitação

processual e debelar a mora na atividade jurisdicional, emerge a necessidade de os

operadores do direito e, sobretudo, dos membros do Poder Judiciário se aperfeiçoarem

em institutos próprios do sistema precedentalista do common law.

A saber, faz-se necessário o apuramento das habilidades interpretativas para

uma constatação precisa da ratio decidendi107

e dos obter dicta108

e, sobretudo, o

conhecimento, estudo e manejo de técnicas precedentalistas, tais como o

distinguishing109

, o overruling110

, o overriding111

, signaling112

e o reversal113

. Afinal,

107

Vide definição de página 58. 108

Plural de obter dictum. Vide definição de página 58. 109

Há duas acepções para o termo. Em um primeiro sentido o distinguishing pode ser definido como um

método de confronto e comparação entre o caso concreto a ser solucionado e a situação fática sob a qual

se desenvolveu o paradigma, leading case ou precedente. Em um segundo momento, pode-se denominar

distinguishing o resultado prático dessa comparação, resultando no afastamento da norma geral assentada

pela jurisprudência para o caso concreto ou na sua incidência. A saber, pela diferença ou particularidade

entre os fatos fundamentais discutidos e aqueles sobre as quais a ratio decidendi se assentou, afasta-se a

incidência de determinado precedente. 110

O overruling é uma técnica através da qual se retira a força vinculante de um precedente através da

edição de um novo procedente, que supera a sua ratio decidendi, de modo expresso (express overruling)

ou tácito (implied overruling). Quando a esta substituição se atribui eficácia ex tunc, dá-se o nome de

retrospective overruling, aplicando-se a fatos anteriores à superação jurisprudencial e pendentes de

julgamento. Quando a substituição se dá com eficácia ex nunc, dá-se o nome de Prospective overruling,

ocasião em que a ratio decidendi do precedente superado permanece válida e vinculante para os fatos

ocorridos e processos iniciados antes da superação. Há, contudo, situações nas quais, por excepcional

interesse social e com vistas a resguardar a segurança jurídica, os efeitos prospectivos do overruling não

incidiriam nem à situação jurídica apreciada que lhe deu ensejo, fato denominado de pure prospective

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somente a partir desse conhecimento é que se poderá compreender a extensão dos

efeitos dos precedentes judiciais114

e proceder à sua aplicação de maneira mais precisa,

correta e adequada possíveis115

.

A partir dessa perspectiva, aos órgãos jurisdicionais, pelo princípio da

segurança jurídica, é atribuído o dever de atentarem à fundamentação e aos reflexos

sociais de suas decisões. Afinal, não basta que uma decisão seja fundamentada (artigo

93, IX, da CF), antes, ela deve ser justa e adequada à realidade social, sob pena de não

atender à sua finalidade de pacificação social.

Leciona Luiz Guilherme Marinoni (2011) que, em países cujos sistemas

jurídicos se perfilham ao common law, vinculando-se, portanto, ao princípio do stare

decisis, a revogação de um precedente (overruling) tem, de regra, efeitos retroativos.

Todavia, informa que a prática judicial americana se deparou com hipóteses nas quais as

Cortes não permitiram a retroatividade do novo entendimento firmado (retrospective

overruling) que revogou o precedente anteriormente vigente, para resguardar a

segurança jurídica diante de justificadas e legítimas confianças depositadas nos

precedentes posteriormente superados.

Ao se referir à realidade jurídica francesa, Marco Bruno Miranda Clementino

(2010) narra que o Conselho de Estado Francês, embora exerça jurisdição

administrativa e, por isso, não exerça tipicamente o controle de constitucionalidade de

normas, ao julgar o caso “nº 291545 – Societé Tropic Travaux Signalisation”, passou a

decidir pela modulação dos efeitos de decisões modificativas de jurisprudência, “por

imperativo de segurança jurídica”, já que se estava procedendo a uma profunda

modificação da tradição jurisprudencial.

overruling. Por fim, há o antecipatory overruling, enquanto modalidade de revogação preventiva de

precedentes firmados por Cortes Superiores, por órgãos jurisdicionais inferiores, nas situações em que

aquelas procedem ao implied overruling. 111

Limitação da área de incidência de um precedente, em função do advento de uma regra ou princípio

legal. É, pois, a superação parcial do precedente, em virtude de uma produção legislativa. 112

Vide tópico 4.4. 113

É uma técnica de controle da vinculação ao precedente, segundo a qual uma Corte Superior reforma

uma decisão proferida por um Órgão Jurisdicional hierarquicamente inferior. 114

Edilson Pereira Nobre Jr. (2008, p. 99) adverte que “(...) tanto no âmbito administrativo quanto no

judicial, a aplicação do enunciado sumular não se restringe a uma operação exclusivamente mecânica.

Cabe ao seu aplicador proceder ao exame da situação concreta, a fim de verificar se nesta estão presentes

os fatos fundamentais (material facts), capazes de ensejar a adoção da ratio decidendi que respalda a

súmula”. 115

Inicialmente, os aplicadores e intérpretes do direito devem atentar se o caso concreto guarda algum

grau de identificação com o precedente. Se, após a análise dos elementos objetivos da demanda,

constatar-se que os casos são análogos, deve-se analisar a ratio decidendi firmada no paradigma

pertinente.

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Na Alemanha, por seu turno, como relata Karl Larenz (2005), o Supremo

Tribunal Federal já se pronunciou pela possibilidade de aplicação, por analogia, a uma

mudança jurisprudencial, dos princípios aplicáveis em casos de leis retroativas, diga-se,

também por imperativo da segurança jurídica.

Assentado nesse mesmo princípio fundamental, que é a segurança jurídica,

verifica-se que a própria Constituição Portuguesa, mais precisamente em seu artigo 282,

(4)116

, autoriza expressamente o Tribunal Constitucional a limitar os efeitos nocivos ou

radicais de eventual declaração de inconstitucionalidade em sede de controle abstrato,

fixando-os com alcance mais restrito, por razões de interesse público de excepcional

relevo, de equidade ou segurança jurídica.

Ao comentar o referido dispositivo constitucional, Jorge Miranda (2005, p.

286) conclui que

Embora correspondam a conceitos relativamente indeterminados, não

levantam dúvidas as referências a segurança jurídica e equidade. Tem-se em

vista preocupações de estabilidade dos actos jurídicos e de confiança dos

cidadãos e ponderações de justiça em face de circunstâncias mutáveis de

vida social. (grifos não constantes do original).

Adentrando na esfera jurídica brasileira, vislumbra-se similar possibilidade de

modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade em sede de controle

abstrato realizado pelo Supremo Tribunal Federal, nos termos dos artigos 27, da Lei

9.868/1999117

e 11, da Lei nº 9.882/1999118

, assim como por ocasião da edição de

súmulas vinculantes, conforme o artigo 4º, da Lei 11.417/2006119

.

116

Nos termos do artigo 282, (4), da Constituição Portuguesa, “Quando a segurança jurídica, razões de

equidade ou interesse público de excepcional relevo, que deverá ser fundamentado, o exigirem, poderá o

Tribunal Constitucional fixar os efeitos da inconstitucionalidade ou da ilegalidade com alcance mais

restrito do que o previsto nos n.os 1 e 2”. 117

“Art. 27. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de

segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de

dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia

a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.” 118

“Art. 11. Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, no processo de argüição de

descumprimento de preceito fundamental, e tendo em vista razões de segurança jurídica ou de

excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois terços de seus

membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu

trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado.” 119

“Art. 4º A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por

decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só

tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional

interesse público.”

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Perceba-se, portanto, que o princípio da nulidade120

, inerente à declaração de

inconstitucionalidade, é precedido pelo princípio da segurança jurídica, conforme as

características e reflexos sociais da lei inconstitucional.

Em outros termos, a ideia de que os atos normativos contrários à Lei Maior

pátria, por serem nulos, não produzem efeitos (quod nullun est, nullum producit

effectum), cede espaço para situações jurídicas consolidadas na vigência do texto

normativo inconstitucional, com vistas a preservar a harmonia e estabilidade das

relações jurídicas nela arrimadas e atribuir ao provimento jurisdicional eficácia coerente

com as suas repercussões jurídicas, sociais e políticas.

A despeito de doutrinadores como Ivo Dantas (2001) e Manoel Gonçalves

Ferreira Filho (2000 apud DANTAS, 2008, p. 636) entenderem que, independente de

consagração por outros modelos constitucionais, o artigo 27, da Lei 9.868/1999, põe fim

à supralegalidade constitucional e contradiz a lógica jurídica ao admitir a produção de

efeitos de um ato nulo, o instituto da modulação dos efeitos tem sido pacífica e

amplamente aplicado.

Exemplo concreto da aplicação do instituto da modulação dos efeitos se

encontra no julgamento da ADI 2.240/BA, da relatoria do então ministro Eros Grau, na

qual, a despeito de se ter constatado a inconstitucionalidade formal da Lei Estadual nº

7.619/2000, do Estado da Bahia, por violação a pressuposto constitucional estabelecido

no artigo 18, §4º, da Lei Maior, para a criação do município de Luiz Eduardo

Magalhães, o Supremo Tribunal Federal ponderou as graves consequências de sua

declaração de inconstitucionalidade em face de todas as situações jurídicas exsurgidas e

consolidadas a partir da criação dessa municipalidade, ocasião em que se posicionou,

por maioria, no sentido de conferi-la efeitos puramente prospectivos, ao prorrogar a

vigência do mencionado diploma legal impugnado pelo prazo de 24 (vinte e quatro)

meses. Afinal, em determinados contextos sócio jurídicos, a relevância das matérias

120

Como leciona Jorge Miranda (2005, p. 272-273), o princípio da nulidade subsiste por dois motivos

essenciais: “por a Constituição (ou a lei) como fundamento de validade, como base da força intrínseca da

norma em causa, dever prevalecer incondicionalmente desde o momento em que esta é emitida ou em que

ocorre a contradição ou desconformidade, e não apenas desde o instante em que a contradição é

reconhecida; por a mera eficácia futura da declaração poder acarretar diferenças de tratamento das

pessoas, e dos casos sob o império do mesmo princípio ou preceito constitucional, uns sujeitos ao seu

comando e outros (os considerados antes da declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade)

subordinados ao sentido da norma inconstitucional ou ilegal, ao sentido de uma norma juridicamente

inválida”.

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apreciadas pelo Poder Judiciário não admite, com justeza, a prolação de provimentos

jurisdicionais dotados de eficácia retroativa (ex tunc).

Contudo, esta modulação dos efeitos deve nortear apenas o Supremo Tribunal

Federal, por ocasião da verificação da compatibilidade vertical das normas

infraconstitucionais em sede de controle abstrato ou por ocasião da edição de uma

súmula vinculante? Em outros termos, uma Corte Superior pode modular os efeitos de

uma decisão que prolatou ao analisar casos concretos, cuja eficácia, a priori, seria inter

partes?

À míngua de previsão legal expressa nesse sentido, o Supremo Tribunal

Federal passou a admitir, por analogia e atendidos os mesmos requisitos, a modulação

dos efeitos de suas decisões por ocasião do controle concreto de constitucionalidade.

Portanto, ainda que não se trate de processo objetivo (exs: ADI, ADC, ADPF, etc.), em

atenção ao caráter expansivo e à aptidão de universalidade das quais se revestem suas

decisões, a Corte Constitucional pátria, em sua jurisprudência, passou a admitir a

modulação dos efeitos no bojo de casos individuais (exs: inquéritos, conflitos de

competência e recursos extraordinários), atribuindo-lhes novas conformações à suas

eficácias temporais.

Inicialmente, podem-se destacar precedentes sobre direito processual, a

exemplo do julgamento do Pleno do Supremo Tribunal Federal no Inquérito 687/SP121

.

Naquela ocasião, a Corte Suprema decidiu cancelar a súmula nº 394122

, que tratava da

manutenção da competência penal por prerrogativa de função após a cessação do

exercício funcional que lhe deu ensejo. Contudo, mesmo não sendo súmula vinculante

e, ressalte-se, anos antes da edição da Lei 11.417/2006 - que, como já relatado, em seu

artigo 4º previu a modulação dos efeitos na edição de Súmulas Vinculantes -, entendeu

pela adequação temporal do julgado, a fim de convalidar “todos os atos praticados e

decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, com base na súmula 394, enquanto

vigorou”.

Outrossim, por ocasião do julgamento do Conflito de Competência nº

7.204/MG123

, da relatoria do ministro Ayres Britto, a Corte Constitucional pátria

121

STF, Pleno, INQ. 687/SP, Rel. Ministro Sydney Sanches, maioria, julgado em 25/08/1999, DJe de

09/11/2001. 122

“cometido o crime durante o exercício funcional, prevalece a competência especial por prerrogativa de

função, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados após a cessação daquele exercício”. 123

STF, Pleno, CC 7.204/MG, Rel. Ministro Ayres Britto, maioria, julgado em 29/06/2005, DJe de

09/12/2005.

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superou a jurisprudência pacificada para fixar que a competência para julgamento de

ações relativas a danos materiais e morais, propostas por empregado em face de

empregador, seria da Justiça Trabalhista. Todavia, dado o grande volume de processos

julgados ou pendentes de julgamento perante a Justiça Comum, mais uma vez o

Supremo Tribunal Federal atribuiu efeitos prospectivos à decisão, estatuindo que a nova

ratio decidendi sedimentada só se aplicaria para as demandas posteriores à Emenda

Constitucional 45/2004 e que ainda não se encontrassem com o mérito resolvido.

Prosseguindo, percebe-se, de igual modo, a aplicação da técnica de modulação

de efeitos em precedentes versados sobre direito material. No âmbito do direito

tributário, ao julgar o Recurso Extraordinário 560.626/RS124

, da relatoria do ministro

Gilmar Mendes, o Pleno do Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucionais os

artigos 45 e 46, da Lei 8.212/1991, por disporem sobre prescrição e decadência, a

despeito de serem matérias reservadas a Lei Complementar. Contudo, convalidou os

recolhimentos efetuados nos prazos por eles previstos, quando não impugnados antes da

data da conclusão de seu julgamento.

Por ocasião do julgamento do MS 26.604/DF125

, da relatoria da ministra

Carmen Lúcia, em que se tratou da fidelidade partidária, o pleno do Supremo Tribunal

Federal, por maioria, reconheceu ser direito partidário manter o número de cadeiras

parlamentares obtidas em eleição proporcional, motivo pelo qual eventual desligamento

de parlamentar no curso do seu mandato, por ruptura imotivada do vínculo partidário

anteriormente assumido, no sistema de representação política proporcional, acarretaria a

perda automática do cargo.

Entretanto, no referenciado julgado, assentou-se que por:

razões de segurança jurídica, e que se impõem também na evolução

jurisprudencial, determinam seja o cuidado novo sobre tema antigo pela

jurisdição concebido como forma de certeza e não como causa de

sobressaltos para os cidadãos. Não tendo havido mudança na legislação

sobre o tema, tem-se reconhecido o direito de o impetrante titularizar os

mandatos por ele obtidos nas eleições de 2006, mas com modulação de

efeitos dessa decisão para que se produzam a partir da data da resposta do

Tribunal Superior Eleitoral à Consulta nº 1.398/2007. (grifos não constantes

do original).

124

STF, Pleno, RE 569.626/RS, Rel. Ministro Gilmar Mendes, maioria, julgado em 12/06/2008, DJe de

05/12/2008. 125

STF, Pleno, MS 26.604/DF, Rel. Ministra Carmen Lúcia, Pleno, maioria, julgado em 04/10/2007, DJe

de 03/10/2008.

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De igual modo, encontram-se diversos outros exemplos práticos da aplicação

da modulação de efeitos sobre entendimentos firmados em específicos casos concretos,

a exemplo do RE 600.885/RS126

, no qual o Supremo Tribunal Federal reconheceu que o

ingresso nas forças armadas deveria obedecer ao princípio da legalidade estrita,

impondo-se lei formal para dispor sobre a questão, mas, ao considerar que, por mais de

20 (vinte) anos, dezenas de concursos foram realizados sem a sua observância,

consolidando incontáveis situações jurídicas, entendeu por conferir efeitos prospectivos

à interpretação sedimentada em seu decisum.

A aplicabilidade da técnica da modulação dos efeitos, entretanto, não se

adstringiu ao âmbito do Supremo Tribunal Federal. Ao revés, a aplicação analógica do

artigo 27, da Lei 9.868/1999 já foi objeto de debate no Superior Tribunal de Justiça,

embora nela não tenha encontrado guarida.

A saber, por ocasião da apreciação dos Embargos de Divergência no Recurso

Especial 738.689127

, que tinha como questão de fundo a interpretação do crédito-prêmio

do IPI, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça - a quem incumbe pacificar a

divergência das Turmas de Direito Público (1ª e 2ª Turmas) e, portanto, manifestar-se,

em último grau, sobre a interpretação judicial de textos normativos infraconstitucionais

– debateu o cabimento da modulação dos efeitos da decisão.

Naquele julgado, através de seu voto vista, o ministro Herman Benjamin

propôs a aplicação da mencionada técnica, pelo fato de se estar alterando um

entendimento que era pacífico no Corte Cidadã até agosto de 2004, no sentido de que o

crédito subsistia. Portanto, diante da considerável mudança da orientação judicial sobre

a questão jurídica, dever-se-ia considerar a “sombra de juridicidade” que até então

pairava sobre os operadores do direito e se estendia na orientação das condutas dos

cidadãos.

O referido ministro asseverou que

(...) também no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, as decisões que

alterem jurisprudência reiterada, abalando forte e inesperadamente

126

STF, Pleno, RE 600.885/RS, Rel. Ministra Carmen Lúcia, Pleno, maioria, julgado em 09/02/2011, DJe

de 01/07/2011. 127

TRIBUTÁRIO. IPI. CRÉDITO-PRÊMIO. DECRETO-LEI 491/69. (ART. 1º). VIGÊNCIA. PRAZO.

EXTINÇÃO. “MODULAÇÃO TEMPORAL” DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE. (...) 2. Salvo nas

hipóteses excepcionais previstas no art. 27 da Lei 9.868/99, é incabível ao Judiciário, sob pena de

usurpação da atividade legislativa, promover a “modulação temporal” das suas decisões, para o efeito de

dar eficácia prospectivas a preceitos normativos reconhecidamente revogados. (STJ. EREsp 738.689/PR.

Relator: Min. Teori Albino Zavascki. Primeira Seção. DJe de 22/10/2007).

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expectativas dos jurisdicionados, devem ter sopesados os limites de seus

efeitos no tempo, buscando a integridade do sistema e a valorização da

segurança jurídica.” (grifos não constantes do original).

Na mesma toada, o ministro João Otávio Noronha se perfilhou, acrescentando

que a modulação da interpretação jurisdicional, com a aplicação de efeitos prospectivos,

teria exatamente o condão de possibilitar uma “(...) Corte Superior transcender o

interesse individual e fazer prevalecer a própria credibilidade do Poder Judiciário”.

Entretanto, tal entendimento não restou sufragado pela maioria, que minimizou o

princípio da segurança jurídica, ao asseverar que o artigo 27, da Lei 9.868/1999 seria

aplicável apenas ao controle de constitucionalidade realizado pelo Supremo Tribunal

Federal.

Manifestando-se, o doutrinador e processualista Luiz Guilherme Marinoni

(2011, p. 244) asseverou que “O Superior Tribunal de Justiça, neste julgamento, perdeu

grande oportunidade para adotar técnica imprescindível a um Tribunal incumbido de

dar unidade ao direito federal”. Afinal, não se trataria de aplicação analógica do artigo

27, da Lei da ADI, mas de aplicação direta e reconhecimento da eficácia imediata do

valor que lhe é subjacente, qual seja, o princípio constitucional da segurança jurídica,

imprescindível para não ocasionar surpresas desagradáveis e deletérias aos interesses

daqueles que depositaram legítima confiança nos precedentes judiciais (MARINONI,

2011).

Entretanto, até os dias atuais, as duas Turmas de Direito Público do Superior

Tribunal de Justiça perseveram nesse entendimento, conforme arrestos abaixo

colacionados:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO JUDICIAL QUE VISA AFASTAR O ICMS

SOBRE A DEMANDA CONTRATADA E NÃO UTILIZADA DE

ENERGIA ELÉTRICA. LEGITIMIDADE ATIVA DO CONSUMIDOR.

MUDANÇA DE ENTENDIMENTO DO STJ. NOVA ORIENTAÇÃO

JURISPRUDENCIAL, CONSOLIDADA EM SEDE DE RECURSO

ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PEDIDO DE

MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ART. 27 DA LEI 9.868/99.

IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. AGRAVO

REGIMENTAL IMPROVIDO.

I. A Primeira Seção do STJ, ao julgar o REsp 1.299.303/SC (Rel. Ministro

CESAR ASFOR ROCHA, DJe de 14/08/2012), sob o rito do art. 543-C do

CPC, pacificou o entendimento no sentido de que o usuário do serviço de

energia elétrica (consumidor em operação interna), na condição de

contribuinte de fato, é parte legítima para discutir a incidência do ICMS

sobre a demanda contratada e não utilizada de energia elétrica, bem como

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para pleitear a repetição do indébito referente ao mencionado tributo, não

sendo aplicável, na hipótese, a orientação firmada pela Primeira Seção desta

Corte, no julgamento do REsp 903.394/AL (Rel. Ministro LUIZ FUX, DJe

de 26/04/2010), também submetido à sistemática prevista no art. 543-C do

CPC.

II. Hipótese em que o Estado do Ceará não se insurge contra o conteúdo do

julgamento do aludido Recurso Especial 1.299.303/SC, julgado sob o rito do

art. 543-C do CPC, mas defende ser necessário o provimento do Recurso

Especial, para conformar o resultado do presente processo ao entendimento

jurisprudencial da época em que fora prolatado o acórdão do Tribunal de

origem, declarando-se que aquele Estado não pode cobrar o ICMS sobre a

demanda contratada e não utilizada de energia elétrica, afastados, porém, os

direitos à restituição ou à compensação tributárias.

III. A Primeira Seção do STJ, ao julgar os ERESP 738.689/PR e os

EREsp 767.527/PR (Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJU

de 22/10/2007), proclamou que, "salvo nas hipóteses excepcionais

previstas no art. 27 da Lei 9.868/99, é incabível ao Judiciário, sob pena

de usurpação da atividade legislativa, promover a 'modulação temporal'

de suas decisões", donde se conclui que tal competência limita-se ao STF. IV. Agravo Regimental improvido.

(STJ. AGREsp 1.332.559. Segunda Turma. Relator: Ministra Assusete

Magalhães. Votação unânime. Julgado em 23/09/2014. DJe de 02/10/2014).

(grifos não constantes do original).

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL

NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO DO DISTRITO

FEDERAL. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO. NOMEAÇÃO EM

CARGO DIVERSO. DECRETO DISTRITAL 21.688/00.

INCONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA NAS INSTÂNCIAS

ORDINÁRIAS. MODULAÇÃO DE EFEITOS. IMPOSSIBILIDADE.

PRECEDENTE DO STJ. ART. 27 DA LEI 9.868/99. VIOLAÇÃO.

PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. EXISTÊNCIA. MATÉRIA

CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO STF. MATÉRIA FÁTICA.

EXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO

PROVIDO.

1. "O prequestionamento pode ser implícito, e é reconhecido sempre que as

questões decididas na causa remetam o Tribunal às normas legais que o

recurso especial diz contrariadas" (AgRg no REsp 1.226.130/AL, Rel. Min.

ARI PARGENDLER, Primeira Turma, DJe 7/3/13).

2. "Nos termos do art. 27 da Lei 9.868/1999, somente o Supremo Tribunal

Federal, por maioria de dois terços de seus membros, pode atribuir eficácia

ex nunc à declaração de inconstitucionalidade de lei" (EDcl no AgRg no

REsp 636.261/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, DJe

24/9/09). 3. A tese arguida pelo Distrito Federal, no sentido de que a

manutenção da sentença de Primeira Instância, que julgou procedente o

pedido formulado na inicial, importaria em afronta ao princípio da isonomia,

é matéria cujo exame compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal,

nos termos do art. 102, III, da Constituição da República.

4. A matéria devolvida ao Superior Tribunal de Justiça pelo recurso especial

restringe-se ao art. 27 da Lei 9.868/99 (possibilidade ou não de modulação

dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do Decreto Distrital

21.688/00), não autorizando o reexame da matéria de fundo concernente ao

próprio mérito da controvérsia, que não foi objeto de recurso autônomo, sob

pena de eventual reformatio in pejus. Ademais, a pretensão do Distrito

Federal de reexame do próprio mérito da causa esbarra na necessidade de

exame de matéria fática (existência ou não de cargos vagos, bem como de

má-fé do autor, ora agravado), o que atrai o óbice da Súmula 7/STJ.

5. Agravo regimental não provido.

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(STJ. AGREsp 1.351.914. Primeira Turma. Relator: Ministro Arnaldo

Esteves Lima. Votação unânime. Julgado em 16/04/2013. DJe de

22/04/2013).

A par desta interpretação jurídica e, para prosseguir no desenvolvimento deste

estudo, pertinente se faz a seguinte indagação: faz-se necessária previsão legal expressa

para a modulação dos efeitos de decisões judiciais?

Como já relatado, o Supremo Tribunal Federal dispensa tal exigência ao

estender a aplicação desta técnica de controle temporal dos efeitos de suas razões de

decidir também em sede de controle incidental de constitucionalidade, à míngua de

previsão legal expressa. Mas, como isto pode ser considerado plausível juridicamente?

Das lições de Humberto Ávila, em sua obra Teoria dos Princípios (2011b),

depreende-se que não há correspondência biunívoca entre texto normativo e norma,

motivo pelo qual há casos em que há norma sem dispositivo legal específico que a

assente, há dispositivo sem norma e há normas que defluem da interpretação conjunta

de mais de um dispositivo, como é o caso da segurança jurídica. A norma da segurança

jurídica vigora sem existir dispositivo legal expresso e específico que a assente.

Este fato, entretanto, não implica em menor grau de positividade à segurança

jurídica, como leciona José Souto Maior Borges (1997), até porque toda norma, em

certa medida, encontra-se implícita, posto que é resultante da interpretação incidente

sobre dado texto normativo, conforme afirma José Artur Gonçalves (2002) e adiante

melhor se elucidará.

No mesmo sentido, encontra-se o posicionamento doutrinário de Paulo de

Barros Carvalho (2008, p. 263-264), que, ao tratar do sobreprincípio da segurança

jurídica no direito tributário assevera:

Entre as grandes diretrizes que formam o estrato axiológico das normas

tributárias no Brasil, algumas se apresentam como conteúdos de

enunciados expressos, enquanto outras se encontram na implicitude dos

textos do direito posto. Todas, porém, com a mesma força vinculante. A

circunstância de figurarem no texto, ou no contexto, não modifica o teor

de prescritividade da estimativa, que funciona como vetor valorativo que

penetra as demais regras do sistema, impregnando-lhes, fortemente, a

dimensão semântica. Por isso mesmo são colocadas no altiplano da

Constituição. De lá, precisamente onde começam todos os processos de

positivação das normas jurídicas, descem aqueles primados para os vários

escalões da ordem legislada, até atingir as regras terminais do sistema,

timbrando os preceitos que ferem diretamente as condutas em interferência

intersubjetiva, com a força axiológica dos mandamentos constitucionalmente

consagrados. (grifos não constantes do original).

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83

Nas palavras de Frederico Seabra de Moura (2009, p. 333), “se chega à

conclusão de que o direito brasileiro consagrou a segurança jurídica a partir da

positivação de outras normas”. Pode-se perceber, portanto, a norma da segurança

jurídica pairando sobre os dispositivos que garantem a legalidade, a irretroatividade e a

anterioridade, mas não se encerra neles, porquanto, André Ramos Tavares (2006, p.

662) bem frisa que

Um direito à segurança jurídica, em sentido amplo, poderá abranger: i) a

garantia do direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada; ii) a

garantia contra restrições legislativas dos direitos fundamentais

(proporcionalidade) e, em particular, contra a retroatividade de leis punitivas;

iii) o devido processo legal e o juiz natural; iv) a garantia contra a incidência

do poder reformador da Constituição em cláusulas essenciais; v) o direito

contra a violação de direitos; vi) o direito à efetividade dos direitos previstos

e declarados solenemente; vii) o direito contra medidas de cunho retrocessivo

(redução ou supressão de posições jurídicas já implementadas); viii) a

proibição de retrocesso em matéria de implementação de direitos

fundamentais; ix) o direito à proteção da segurança pessoal, social e coletiva;

x) o direito à estabilidade máxima da ordem jurídica e da ordem

constitucional.

Portanto, mesmo não constando expressamente do extenso rol de direitos

fundamentais do artigo 5º, da Constituição Federal, é inequívoca a existência de

fundamentalidade material do princípio da segurança jurídica. Afinal, a cláusula de

abertura ou inexauribilidade insculpida no §2º128

, do mencionado dispositivo

constitucional, autoriza a equiparação do mencionado sobreprincípio aos direitos

fundamentais de primeira geração.

Esta constatação é de suma importância, porquanto os direitos fundamentais de

primeira geração, dimensão ou, na classificação de Georg Jellinek, status negativus, são

direitos de resistência ou defesa que impõem ao Estado uma competência negativa, um

dever de abstenção, uma obrigação de não fazer, limitando a sua atuação e restringindo

a sua intervenção nas suas esferas de proteção.

Desse modo, ressalvadas as situações nas quais as áreas de proteção desses

direitos são restringidas de forma permitida, como nos casos de concretização mediante

lei, reserva legal (qualificada ou não), direito constitucional de colisão ou eventuais

128

“§2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e

dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil

seja parte”.

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84

limitações constitucionais em casos excepcionais, impõe-se ao Estado o dever de abster

de praticar intervenções desproporcionais, injustificadas, como bem lecionam Dimitri

Dimoulis e Leonardo Martins (2009).

Logo, a observância do princípio da segurança jurídica deve se dar de forma

imediata (artigo 5º, §1º129

, da CF), prescindindo de norma infraconstitucional

regulamentadora específica, fato que impõe ao Estado a abstenção da prática de atos

jurídicos que maculem a legítima confiança nele depositada pelos cidadãos.

É certo que, originaria e tradicionalmente, a segurança jurídica se direcionava

como limite ao exercício das funções legislativa e administrativa. Contudo, diante da

evolução processual já relatada alhures, que conferiu às decisões judiciais crescente

vinculação material, impõe-se o reconhecimento de sua aptidão de inovar na ordem

jurídica, motivo pelo qual se deve incluir como destinatário da vedação à retroatividade

maléfica da produção jurídica também o Poder Judiciário.

A validade e a eficácia dos negócios jurídicos celebrados pelos cidadãos e em

conformidade com a jurisprudência vigente ao tempo de sua perfectibilização, portanto,

devem ser resguardadas e consideradas imunes a posteriores alterações jurisprudenciais

procedidas pelo Poder Judiciário, por imperativo do autoaplicável princípio

fundamental da segurança jurídica.

A partir dessa noção, então, é que se deve compreender que o entendimento

restritivo do Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicabilidade da modulação dos

efeitos em sua atuação jurisdicional não teve o condão de encerrar a questão, tampouco

coibir a sua utilização por outros órgãos jurisdicionais.

Para ilustrar essa questão, deve-se fazer menção a interessante julgamento

proferido no recurso nº 0500029-33.2010.4.05.9840 pela Turma Recursal da Seção

Judiciária do Rio Grande do Norte. A saber, naquela ocasião, como narra Clementino

(2010, p. 31), a despeito de o órgão jurisdicional colegiado ter entendido que o recurso

interposto em face de decisão concessiva de tutela de urgência não o poderia ter sido

feito por instrumento, por ir de encontro à principiologia própria dos Juizados Especiais,

decidiu-se que tal entendimento deveria ser modulado, pelo fato de muitos recursos

terem sido interpostos de boa-fé pelos jurisdicionados, com arrimo em anterior

posicionamento de sua própria jurisprudência. Então, aos efeitos da nova interpretação

dada à matéria processual conferiu-se eficácia puramente prospectiva e promoveu-lhe

129

“§1º As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”.

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85

ampla divulgação nos meios disponíveis, para fins de ciência de advogados e

procuradores.

Ademais, deve-se observar que a jurisprudência e o legislador

infraconstitucional têm se pautado, em diversos contextos, no princípio da segurança

jurídica.

Exemplo de observância do princípio da segurança jurídica pelo legislador

ordinário se encontra no artigo 2º, parágrafo único, XIII, da Lei Federal nº

9.784/1999130

, que, ao reger os processos administrativos na esfera federal, estatui a

vedação de efeitos retroativos a nova interpretação. Tal texto normativo legal protege a

confiança legítima depositada pelos cidadãos no Poder Público, ao considerar que a

interpretação legal procedida por um órgão ou autoridade competente para tanto tem o

condão de orientar a conduta dos administrados.

Nesta mesma toada, e atentando à necessidade de se preservar a estabilidade

nas relações sociais, é que o Superior Tribunal de Justiça acolhe a teoria do fato

consumado para se abster de desconstituir certas situações jurídicas consolidadas pelo

decurso do tempo com amparo em decisão judicial131

, assim como também reconhece a

irrepetibilidade de verbas alimentares percebidas de boa-fé.

Há que se ressaltar, inclusive, no que atine à modulação dos efeitos na

alteração de jurisprudência dominante, que o projeto do Novo Código de Processo Civil

(PL 8.046/2010), após estabelecer expressamente que os tribunais têm o dever de

uniformizar a sua jurisprudência, mantendo-a estável, íntegra e coerente (artigo 520),

em seu artigo 521, caput, e §§ 10 e 11, foi de encontro ao entendimento restritivo

sedimentado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do

EREsp 738.689/PR para estabelecer que

130 “Art. 2

o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade,

motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica,

interesse público e eficiência. parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre

outros, os critérios de: (...) XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o

atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.” 131

“Impõe-se, no caso, a aplicação da Teoria do Fato Consumado, segundo a qual as situações jurídicas

consolidadas pelo decurso do tempo, amparadas por decisão judicial, não devem ser desconstituídas, em

razão do princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações sociais” (STJ. REsp 709.934/RJ.

Segunda Turma. Relator: Ministro Humberto Martins. Votação unânime. Julgado em 21/06/2007. DJe de

29/06/2007). “A teoria do fato consumado apoia-se na evidência empírica de que o tempo não retrocede –

pelo contrário, foge irreparavelmente – de sorte que é naturalmente impossível regressar-se a situações

ultrapassadas, para desconstituir relações que se consolidaram como fatos.” (STJ. AgRg no REsp

1.291.328/RS. Primeira Turma. Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho. Julgado em 24/04/2012.

Votação unânime. DJe de 09/05/2012).

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Art. 521. Para dar efetividade ao disposto no art. 520 e aos princípios da

legalidade, da segurança jurídica, da duração razoável do processo, da

proteção da confiança e da isonomia, as disposições seguintes devem ser

observadas:

(...)

§10. Na hipótese de alteração de jurisprudência dominante, sumulada ou

não, ou de precedente, o tribunal poderá modular os efeitos da decisão

que supera o entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lhe

atribuindo efeitos prospectivos.

§11. A modificação de entendimento sedimentado, sumulado ou não,

observará a necessidade de fundamentação adequada e específica,

considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e

da isonomia. (grifos não constantes do original).

Resta evidente que a evolução de nosso sistema processual em direção à lógica

precedentalista típica dos países de common law não pode se dissociar da racionalização

das manifestações jurisdicionais, tampouco trazer instabilidade às relações jurídicas

arrimadas na legítima confiança depositada nos precedentes, tudo em atenção à

segurança jurídica.

A existência de “lacuna ontológica” quanto à aplicabilidade do instituto

processual em comento no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, todavia, conforme

abalizada doutrina de Estevam Mallet (2005), Luiz Guilherme Marinoni (2011), Nelson

Nery Junior (2009), Roque Antônio Carrazza (2009) e Tércio Sampaio Ferraz Jr.

(2009), não obsta a sua aplicação direta.

Ao revés, ao modular os efeitos de determinados pronunciamentos

jurisdicionais, o Poder Judiciário estaria apenas e tão somente cumprindo os seus

deveres constitucionais de abstenção da prestação uma tutela jurisdicional que não seja

adequada e consentânea com a finalidade de pacificação social, dispondo sobre a

repercussão social daquela decisão judicial a casos análogos e resguardando os atos

praticados pelos cidadãos sob a expectativa de que a interpretação jurídica elaborada

pelos órgãos constitucionalmente competentes para tanto seria a correta.

Para eles, com acerto, a despeito de nosso ordenamento jurídico não proibir ou

exigir efeitos retroativos a decisões judiciais, a questão dos efeitos retrospectivos deve

ser objeto de política judiciária não apenas no âmbito restrito do Supremo Tribunal

Federal ou do Superior Tribunal de Justiça, estendendo-se também aos demais

Tribunais Superiores aos quais a Constituição Federal atribuiu o munus de pacificar e

sedimentar o entendimento final do Poder Judiciário sobre determinadas matérias e, por

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conseguinte, nortear as condutas do povo, gerando, assim, reflexos na órbita

fenomenológica da sociedade.

Esta questão deve ser compreendida a partir das lições de Hans Kelsen (2009),

para as quais a atividade jurisdicional é criativa e não se restringe a mera aplicação do

direito. A decisão judicial que exsurge da apreciação de um caso concreto pode ser

compreendida como a continuação do processo de produção do Direito. Afinal, não se

pode confundir, como bem preceituam Eros Grau (2006) e Humberto Ávila (2011b), o

texto normativo, enquanto criação legislativa, da norma jurídica, criada pelo intérprete a

partir de sua interpretação, à luz do fato social e dos valores que o circundam.

Assevera Konrad Hesse (1998, p. 61 e 63) que

O intérprete não pode compreender o conteúdo da norma de um ponto

situado fora da existência histórica, por se assim dizer, arquimédico, senão

somente na situação histórica concreta, na qual ele se encontra[...] A

vinculação da interpretação à norma a ser concretizada, à (pré)-compreensão

do intérprete e ao problema concreto a ser resolvido, cada vez, significa,

negativamente, que não pode haver método de interpretação autônomo,

separado desses fatores, positivamente, que o procedimento de concretização

deve ser determinado pelo objeto da interpretação, pela Constituição e pelo

problema respectivo.

Como ilustração prática da atividade criativa da jurisdição, pode-se indicar a

mudança de entendimento do Supremo Tribunal Federal para se perfilhar a posição

concretista do Mandado de Injunção132

, dada a inefetividade prática da Ação Direta de

Inconstitucionalidade por Omissão133

. Este fato, inclusive, possibilitou a edição da

recente Súmula Vinculante nº 33134

, do Supremo Tribunal Federal, que efetivou o

direito dos servidores públicos a uma aposentadoria especial, que carecia de

concretização por ausência de regulamentação legal, em virtude da reserva legal

132

Narra Gilmar Mendes que o Supremo Tribunal Federal, “(...) afastando-se da orientação inicialmente

perfilhada no sentido de estar limitada à declaração da existência da mora legislativa para a edição de

norma regulamentadora específica, passou, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica

função legislativa, a aceitar a possibilidade de uma regulação provisória pelo próprio Judiciário”.

(MENDES; COELHO; BRANCO, 2010, p. 1394). Exemplos dessa nova posição se encontram nos

Mandados de Injunção de n.º 670, 708 e 712. 133

Por ocasião do julgamento da ADI 3.682/MT, a despeito de reconhecer a omissão na regulamentação

do artigo 18, §4º, da CF, o Supremo Tribunal Federal não impôs um prazo para a atuação legislativa do

Congresso Nacional, mas apenas fixou “um parâmetro temporal razoável”. (STF. ADI 3682/MT. Tribunal

Pleno. Relator: Min. Gilmar Mendes. DJe de 06/09/2007). 134

“Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre

aposentadoria especial de que trata o artigo 40, §4º, inciso III, da Constituição Federal, até a edição de lei

complementar específica”.

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estabelecida na norma de eficácia limitada do artigo 40, §4º, III, da Constituição

Federal.

Assim, os provimentos jurisdicionais têm o condão de inovar na ordem jurídica

e influenciar diretamente na criação e manutenção (preservação, modificação ou

extinção) de relações jurídicas. Portanto, em atenção à cláusula de inexauribilidade do

artigo 5º, §2º, da Constituição Federal135

, o princípio fundamental da segurança jurídica

deve se limitar à irretroatividade da lei em face do ato jurídico perfeito, do direito

adquirido ou da coisa julgada136

, antes, deve ser direta e imediatamente aplicado às

mudanças de orientações jurisprudenciais até então pacíficas no seio dos Tribunais que

procederem ao que, nos sistemas precedentalistas, denomina-se overruling (MALLET,

2005).

A irretroatividade da lei, em verdade, deve ser interpretada como a

irretroatividade do Direito, já que é a partir da interpretação que a lei, enquanto objeto

do direito, ganha relevância e influencia na realidade social. É a partir das

manifestações dos órgãos jurisdicionais, sobretudo dos Tribunais Superiores, que o

direito é revelado e aplicado às situações jurídicas substanciais postas.

A segurança jurídica, então, como leciona Humberto Ávila (2011a, p. 142),

“(...) pode da mesma forma ter como objeto não a norma propriamente dita, mas a sua

aplicação uniforme e não arbitrária. Daí se falar em ‘segurança de aplicação das

normas’, no lugar de segurança das normas”. Afinal, nas precisas palavras de J. J.

Gomes Canotilho (2003, p. 257), “o homem necessita de segurança para conduzir,

planificar e conformar autónoma e responsavelmente a sua vida. Por isso, desde cedo se

consideraram os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança como

elementos constitutivos do Estado de direito”.

Prosseguindo, o referenciado doutrinador português assevera que

O indivíduo tem do direito poder confiar em que os seus actos ou às decisões

públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas

alicerçados em normas jurídicas vigentes e válidas por esses actos jurídicos

deixado pelas autoridades com base nessas normas se ligam os efeitos

jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico (CANOTILHO,

2003, p. 257).

135

“Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos

princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja

parte”. 136

Conforme prevê o artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal, “a lei não prejudicará o direito

adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

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Desse modo, pode-se compreender que a Constituição não veda pura e

simplesmente a irretroatividade das leis, tanto que as normas puramente processuais têm

aplicação imediata aos processos em curso e os efeitos de um negócio jurídico se

subordinam, de regra, à nova legislação. O que o Constituinte estabeleceu foi a

proibição de aplicação de efeitos retroativos à lei posterior que prejudique dentre outras

situações, o ato jurídico perfeito. A prejudicialidade é, pois, o elemento a ser observado

na (ir)retroatividade normativa (TAVARES, 2006, p. 663).

Não se impede, portanto, a superação de uma tese jurídica dominante, afinal,

determinados precedentes podem se revelar posteriormente obsoletos, imprecisos,

incorretos ou inexequíveis. A evolução jurisprudencial, quando racional, é necessária e

salutar à adequação do Direito em face da progressiva evolução histórica, política e

econômica da sociedade e dos seus valores, sobretudo quando se lida com a textura

aberta e polimorfa das quais usufruem as normas-princípio (NOBRE JR., 2008), tão em

voga no contexto neoconstitucional - tanto que, no âmbito da jurisdição constitucional,

verificam-se os fenômenos da inconstitucionalidade superveniente, como evidencia

Teori Albino Zavascki137

, e da mutação constitucional, nos moldes em que salienta

Konrad Hesse138

e explica Inocêncio Mártires Coelho139

-.Contudo, o Poder Judiciário

não pode se desincumbir da responsabilidade de adequar os efeitos de seus

pronunciamentos na órbita fenomenológica.

Quando se fala em modulação dos efeitos de decisões proferidas em sede de

controle de constitucionalidade, mitiga-se o princípio da nulidade da lei ou ato

normativo inconstitucional em face de situações jurídicas consolidadas pelo decurso do

tempo. Mas, em se tratando da superação de entendimentos jurisprudenciais pacíficos,

devem-se adequar os efeitos da nova norma jurídica introduzida no âmbito jurídico a

137

“não é de se estranhar, assim, a ocorrência do fenômeno da inconstitucionalidade superveniente, acima

referido: uma norma nascida em harmonia com a Constituição pode tornar-se com ela incompatível em

face de substanciais mudanças da realidade social em que atua”. (ZAVASCKI, 2001, p. 114). 138

Assenta Konrad Hesse (1991, p. 22-23) que “se o direito e, sobretudo, a Constituição, têm sua eficácia

condicionada pelos fatos concretos da vida, não se afigura possível que a interpretação faça deles tábula

rasa. Ela há de contemplar essas condicionantes, correlacionando-as com as proposições normativas da

Constituição. A interpretação adequada é aquela que consegue contretizar, de forma excelente, o sentido

(sinn) da proposição normativa dentro das condições reais dominantes numa determinada situação. Em

outras palavras, uma mudança das relações fáticas pode – ou deve – provocar mudanças na interpretação

da Constituição.” 139

“visto sob essa perspectiva, portanto, as mutações constitucionais são decorrentes – nisto residiria a

sua especificidade – da conjugação da peculiaridade da linguagem constitucional, polissêmica e

indeterminada, com os fatores externos, de ordem econômica, social e cultural, que a Constituição –

pluralista por antonomásia – intenta regular e que, dialeticamente, interagem com ele, produzindo leituras

sempre renovadas das mensagens enviadas pelo constituinte”. (COELHO, 2011. p. 180-181).

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partir de inovadora ratio decidendi a determinadas relações jurídicas calcadas na

“sombra de juridicidade” do uníssono entendimento jurisprudencial até então vigente.

Exatamente com base nessa noção foi que o Supremo Tribunal Federal, por

maioria, no dia 22 de outubro de 2014, ao julgar o Recurso Extraordinário n.º

590.809/RS, sob o regime de repercussão geral, entendeu ser incabível ação rescisória

em face de decisão que se baseou na orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal

Federal, ainda que posteriormente tenha sido por ele superada, conforme noticiado em

seu sítio virtual140

.

O processualista Luiz Guilherme Marinoni (2011, p. 248) é enfático a estatuir

que

a proteção da confiança justificada nos precedentes judiciais constitui dever

dos Tribunais Superiores, pelo que a limitação dos efeitos das decisões que

revogam precedentes ou jurisprudência consolidada não está sequer à

discrição do Superior Tribunal de Justiça. Esse Tribunal, para dar

cumprimento a sua missão constitucional de dar unidade ao direito federal,

tem o dever de utilizar a técnica da limitação dos efeitos retroativos, como

todo tribunal que, ao decidir, fixa normas que orientam a conduta dos

jurisdicionados, dando-lhes previsibilidade para trabalhar e viver.

Afinal, como afirma Estevam Mallet (2005, p. 141),

não é possível desprezar impunemente a expectativa legitimamente criada na

sociedade, desconsiderar a confiança produzida, ignorar os comportamentos

adotados segundo o que na altura se dizia e apregoava ser correto. Fazê-lo

compromete a própria autoridade dos tribunais e a credibilidade das

respectivas decisões, que deixam de servir ou de ser vistas como guia seguro

para o comportamento das pessoas.

Desse modo, à mingua de previsão legal expressa, mas se valendo da

aplicabilidade imediata do princípio fundamental da segurança jurídica, conforme

autorização expressa do artigo 5º, §1º, da Constituição Federal141

, devem-se observar

quatro critérios lógicos para uma correta política judiciária de gestão dos efeitos de seus

precedentes, quais sejam: a existência de entendimento jurisprudencial dominante e

potencialmente confiável, a existência de confiança depositada na jurisprudência

140

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Não cabe ação rescisória com base em mudança posterior de

jurisprudência, decide STF. Notícias STF, Brasília, Quarta-Feira, 22 de outubro de 2014. Disponível em:

<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=278092>. Acesso em: 23 out. 2014. 141

“As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”.

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dominante, a delimitação temporal da pacífica vigência do entendimento precedentalista

superado e a relevância da repercussão do novo entendimento sedimentado.

Quanto ao primeiro requisito, deve-se aferir a existência de norma geral

assentada em pronunciamentos jurisdicionais sobre determinada situação fática apta a

protrair seus efeitos a outros fatos sociais similares e seu grau de confiabilidade,

elemento inerente a seu grau de vinculação e pretensão de permanência. Afinal, “quanto

maiores forem a vinculatividade e a pretensão de permanência da decisão, tanto maior

deve ser a protetividade da confiança nela depositada” (ÁVILA, 2011a, p. 483).

Esta vinculação pode ser tanto formal, quando atribuída expressamente por

normas do ordenamento jurídico, tais como as decisões proferidas no controle

concentrado de constitucionalidade, ou material, situação na qual, a despeito de inexistir

vinculação formal, a decisão se reveste de uma pretensão de permanência que torna

mínima a probabilidade de súbita modificação.

São exemplos deste último caso, nas palavras de Humberto Ávila (2011a, p.

483),

Decisões do Supremo Tribunal Federal, proferidas pelo seu Órgão Plenário,

do Superior Tribunal de Justiça, prolatadas pelo seu Órgão Especial ou pela

Seção competente sobre a matéria, ou objeto de súmula (que) manifestam

elevado grau de pretensão terminativa, na medida em que permitem a ilação

de que dificilmente serão modificadas, bem como uma presunção formal de

correção, em virtude da composição do órgão prolator...

A existência de confiança neste entendimento jurisprudencial sedimentado, por

seu turno, dispensa maiores explicações, por residir na espontânea e consciente projeção

de determinadas condutas dos cidadãos arrimada na certeza de que elas estariam

legitimamente arrimadas e resguardadas pelo direito vigente, sobretudo na visão dos

Tribunais Superiores.

Já a delimitação temporal da pacífica vigência do entendimento precedentalista

é imprescindível para aferir até que momento havia a legítima confiança digna de tutela

e que deveria ser resguardada pela modulação dos efeitos, considerando-se, para tanto,

em outros termos, o período no qual clara e inequivocamente pairava a “sombra de

juridicidade” nas condutas do cidadão.

Por fim, como já defendido, a aproximação do sistema processual brasileiro da

lógica própria do sistema do common law impôs e impõe aos órgãos jurisdicionais o

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dever de sopesar, com responsabilidade, os efeitos de suas decisões nos interesses

jurídico-patrimoniais dos jurisdicionados e dos próprios cidadãos que se encontram em

similares contextos fáticos, sendo certo que, quanto mais graves forem os novos rumos

interpretativos trilhados pelo exercício típico da função jurisdicional, maiores as

cautelas na necessária modulação dos efeitos.

4.4 A aplicação (ir)retroativa do REsp 1.141.990/PR

Como já relatado no tópico 3.3.2.2, a Primeira Seção do Superior Tribunal de

Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.141.990/PR,

afastou a incidência da súmula nº 375, de sua jurisprudência dominante, para execuções

fiscais de créditos de natureza tributária. Todavia, ao invés de ter adstrito o seu

pronunciamento judicial à análise do instituto da fraude à execução sob a perspectiva do

artigo 185, do Código Tributário Nacional, em sua novel redação dada pela Lei

Complementar nº 118/2005, também antecipou, em sede de obter dictum, o seu

entendimento para a interpretação dos casos de fraude à execução ocorridos antes de 09

de junho de 2005.

A saber, ao julgar o mencionado recurso paradigma, o Superior Tribunal de

Justiça estendeu a presunção absoluta (iure et iure) de fraude a execução à interpretação

legal do artigo 185, do Código Tributário Nacional em sua redação pretérita, mesmo

não sendo esta a questão de fundo propriamente envolvida e à míngua de qualquer

provocação. Tratou-se, na prática, da aplicação da técnica do signaling/caveat,

desenvolvida pelo tribunais americanos.

Entretanto, a aplicação dessa técnica denominada signaling/caveat se deu de

forma equivocada. Em sua origem e essência, esta técnica foi concebida como um

refinamento da técnica do prospective overruling (DIDIER JR., 2012), com vistas a,

mutatis mutandis, modular a incidência de uma nova interpretação jurisprudencial,

afastando a “sombra de juridicidade”/previsibilidade jurídica que até então pairava

sobre uma respectiva questão jurídica, em respeito e à serviço da segurança jurídica, e

não o contrário.

A situação fática levada à apreciação naquela ocasião consistia na aquisição de

uma motocicleta em 27 de outubro de 2005, sobre a qual, quando da celebração do

negócio jurídico, não recaia qualquer restrição junto ao cadastro do DETRAN/PR,

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motivo pelo qual os embargos de terceiro foram julgados procedentes em primeiro grau

e permaneceram com provimento favorável ao embargante no Tribunal Regional

Federal ad quem, por ocasião da apreciação do recurso de apelação. Sucede, entretanto,

que a União (Fazenda Nacional), irresignada, interpôs o recurso especial em análise.

Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal opinou, em seu parecer,

pelo desprovimento da insurgência recursal, por entender que seria típico e

inquestionável caso de aplicação da súmula de n.º 375, do Superior Tribunal de Justiça.

Entretanto, ao julgar este recurso por amostragem, supreendentemente a Primeira Seção

chegou à conclusão diametralmente oposta a toda construção jurisprudencial firmada,

afastado a incidência do enunciado sumular até então aplicável.

A partir de então, por refletir o entendimento do Superior Tribunal de Justiça

nessa matéria de direito público, o mencionado obter dictum passou materialmente a

vincular a interpretação do instituto da fraude à execução no direito tributário,

reproduzindo-se na jurisprudência pátria e, em termos práticos, os negócios jurídicos

celebrados até 09 de junho de 2005 também passaram a ser absolutamente considerados

como fraudulentos à execução, havidos por relativamente ineficazes, desde que

celebrados objetivamente após a citação do devedor no processo de execução fiscal.

Ao afastar a incidência da súmula de nº 375 inclusive para a interpretação dos

negócios jurídicos celebrados até então, o Superior Tribunal de Justiça não considerou

os fatos de que, dentre os precedentes que ensejaram a sua criação, encontravam-se

julgados nos quais se enfrentou a interpretação do instituto da fraude à execução fiscal à

luz do artigo 185, do Código Tributário Nacional, e que havia consolidado sua

jurisprudência até então no sentido de que a ocorrência da fraude à execução não

poderia ser decretada pela simples citação do executado, pelo que seria razoável

resguardar a boa-fé do adquirente.

Atento a esse fato e aos efeitos que a alteração jurisprudencial produz à

segurança jurídica, o magistrado federal Marco Bruno Miranda Clementino, titular da 6ª

Vara Federal da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, estabeleceu, nas razões de

decidir da sentença dos Embargos de Terceiro nº 0002425-58.2011.4.05.8400, que

10. Embora a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por

ocasião do julgamento do recurso especial representativo de controvérsia nº

1.141.990/PR, pelo rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, tenha

estabelecido que, em execuções de créditos de natureza tributária, a súmula

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nº 375 do STJ não seria aplicável, entendo que esse precedente não vincula o

presente caso concreto.

11. É que, nesse específico recurso, apreciava-se concretamente a

incidência do artigo 185 do Código Tributário Nacional (CTN) sob a redação

atual, introduzida pela Lei Complementar nº 118/2005, sendo essa a

respectiva ratio decidendi. E, embora, no voto do relator, se tenha feito

menção à redação anterior do artigo 185, tal se deu como mero obiter dictum,

já que a questão de fundo não era propriamente essa.

12. Estabeleço essa premissa até por uma preocupação com segurança

jurídica, já que o STJ, sob a vigência da redação anterior, sempre decidiu

diferentemente, entendendo não ser razoável vincular a ocorrência de fraude

à execução à mera citação do executado, assentando ser indispensável o

registro da penhora para que se presumisse a fraude.

13. Dentre os precedentes que ensejaram a edição da súmula n.º 375,

alguns tinham por objeto justamente o enfrentamento, pelo STJ, da discussão

sobre os limites e à configuração da fraude à execução na execução fiscal, à

luz da própria interpretação e aplicação do artigo 185 do CTN, quando da

vigência de sua anterior redação.

(...)

15. Desse modo, caso a alienação ou oneração de bens ou rendas tenha

ocorrido no período da vigência da redação pretérita, a saber, até 08 de junho

de 2005, entendo que, para que se configure fraude à execução fiscal, faz-se

imperioso o prévio registro da penhora do bem alienado ou que reste

comprovada a má-fé do terceiro adquirente.

(...)

Conforme demonstrado no tópico 3.3.2.1, aprofundando-se mais na pesquisa

jurisprudencial da Corte Cidadã, verificou-se que ao menos até o dia do julgamento em

análise, permaneceu irretocável e inabalável a interpretação superior de que seria

imprescindível o prévio registro de penhora judicial ou a prova da má-fé do adquirente

para que se pudesse incidir os efeitos da fraude à execução fiscal.

Portanto, conclui-se que, ao sinalizar para o novo entendimento interpretativo

de um dispositivo legal já modificado, atribuindo-lhe, ainda que em sede de obter

dictum, eficácia retroativa, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça

desconsiderou toda a jurisprudência pacificada em sentido contrário e subverteu a

própria essência da técnica do signaling, influindo negativamente nos efeitos de

negócios jurídicos celebrados com arrimo na, até então, pacífica aplicação da súmula nº

375, e frustrando a legítima confiança depositada na jurisprudência do órgão

jurisdicional a quem compete uniformizar, em última instância, a interpretação dos

textos normativos infraconstitucionais.

Verificada a presença de uma legítima confiança no entendimento

jurisprudencial superado, sua pacífica aplicação e vigência até 10 de novembro de 2010,

e o fato de que a situação concreta apreciada no paradigma envolvia a alienação de uma

motocicleta em 27 de dezembro de 2005, pela observância do autoaplicável princípio

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fundamental da segurança jurídica impor-se-ia, ao menos a aplicação da técnica do pure

prospective overruling, para que a presunção absoluta de fraude à execução fiscal só se

operasse para negócios jurídicos celebrados após 19 de novembro de 2010, data da

publicação e publicização do julgamento do Recurso Especial em análise.

Nos moldes da técnica da ponderação assentada por Robert Alexy (2011), ao se

considerar que: a atribuição de presunção absoluta de fraude à execução fiscal

tributária atribui maior efetividade às execuções fiscais; Mas, não se olvidando que:

existia entendimento jurisprudencial dominante e potencialmente confiável no sentido

diametralmente oposto, porquanto consubstanciado na súmula n.º 375, do Superior

Tribunal de Justiça; havia confiança depositada na jurisprudência dominante; pairava

até a ocasião desse inovador julgamento, datado de 10 de novembro de 2010, a

interpretação de que a boa-fé do terceiro adquirente deveria ser resguardada; e que a

nova regra geral assentada no Recurso Repetitivo julgado pela Primeira Seção logra de

vinculação material; Conclui-se que o princípio da efetividade da execução, subjacente

ao próprio instituto da fraude à execução e hipertrofiado pela novel interpretação dada,

deve ser precedido pelo princípio da segurança jurídica.

Em outros termos, ainda que se reconstrua essa análise pelo critério da

proporcionalidade, levando-se em conta e constitucionalidade dos propósitos e do meio,

assim como a adequação e necessidade da interpretação da fraude à execução para

resguardar a efetividade tão distanciada dos executivos fiscais, os efeitos retrospectivos

da nova interpretação construída no paradigmático recurso por amostragem não

subsistiriam à proporcionalidade em sentido estrito, nos termos do parágrafo

antecedente.

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5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A título de conclusão, para que se reforce o que foi defendido nesse trabalho,

algumas questões merecem ser retomadas.

Enquanto produto social, o Direito e, especialmente, o processo de execução,

sofreram relevantes modificações ao longo da história.

Gradativamente, o Estado foi se aparelhando dos meios executivos necessários

à satisfação dos débitos executados, ao passo que a pessoalidade cedeu espaço para a

responsabilidade patrimonial do devedor.

Nesse contexto, e com vistas à promoção da pacificação social, assentou-se

uma série de princípios a serem observados no processo de execução, dentre os quais se

destacam os princípios da boa-fé, da nulla executio sine titulo, da nulla titulo sine legis,

da responsabilidade patrimonial do devedor e da efetividade da execução, essenciais ao

adequado desenvolvimento executivo.

Ao se aparelhar dos meios coercitivos necessários à satisfação dos créditos

executados, sobretudo decorrentes de obrigações de pagar quantia, o Estado-Juiz passou

a praticar atos de execução por sub-rogação, dentre os quais se destaca o binômio

penhora/expropriação, quer nos processos autônomos de execução ou na execução por

fase procedimental.

Conquanto também se tenham estabelecidos medidas de execução indireta, por

vezes são as medidas sub-rogatórias que garantem a devida efetividade das execuções

judiciais, a partir da(s) constrição(ões) que recaem no patrimônio do executado.

Em sua atividade própria de execução, ao Estado é imposto o dever de

dispender seus esforços para conferir efetividade e celeridade na satisfação das

pretensões creditícias sobre as quais recaem sua tutela.

Contudo, entre a origem da obrigação e o seu adimplemento, o devedor, ao se

distanciar da boa-fé que deve nortear sua conduta, pode praticar determinados atos de

disposição patrimonial com vistas a frustrar a legítima pretensão de satisfação do

crédito, que são as fraudes do devedor, notadamente a fraude contra credores e a fraude

à execução fiscal.

Em ambos os casos, o credor aliena ou onera os bens que, por força de sua

responsabilidade patrimonial, satisfariam as obrigações por ele inadimplidas. Todavia,

sua principal diferença reside nos interesses prejudicados.

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Ao passo que a fraude contra credores atenta apenas contra o interesse privado

do credor, na fraude à execução, além de se ofender a pretensão patrimonial do

exequente, macula-se principalmente a dignidade da jurisdição executiva, que tem os

deveres constitucionais de zelar e agir pela efetividade de seus provimentos

jurisdicionais.

A segunda diferença entre os referenciados institutos reside no fato de que, na

fraude contra credores, é a partir da ação pauliana ou revocatória que se anula o negócio

jurídico celebrado, enquanto que na fraude à execução, mediante simples incidente

processual é que se declara a ineficácia relativa do negócio jurídico fraudulento.

Em se tratando de fraude à execução, na ausência de regulamentação legal

específica, aplicam-se as disposições gerais do Código de Processo Civil, ao passo que,

para execuções fiscais tributárias incidirão as disposições do artigo 185, do Código

Tributário Nacional.

Em ambos os casos, contudo, a despeito de as molduras normativas terem

estabelecido apenas o eventus damni como requisito para a caracterização desse

instituto processual, o Superior Tribunal de Justiça, com vistas a resguardar a boa-fé do

adquirente, consolidou o entendimento jurisprudencial de que seria imprescindível a

comprovação do conluio entre os pactuantes ou o prévio registro da penhora para que se

declara-se a ineficácia dos negócios jurídicos havidos, interpretação que culminou na

edição do enunciado de n.º 375, da súmula de sua jurisprudência dominante.

Apenas em 10 de novembro de 2010, a Primeira Seção do Superior Tribunal de

Justiça, ao julgar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia n.º 1.141.990/PR,

pelo rito do artigo 543-C, do Código de Processo Civil, afastou a incidência do

referenciado enunciado sumular para conferir presunção absoluta (iure et iure) à fraude

à execução fiscal tributária prevista no artigo 185, do Código Tributário Nacional.

Desse modo, passou a vigorar a regra geral segundo a qual para que se

configure a fraude à execução fiscal tributária basta que o ato de celebração do negócio

jurídico tenha ocorrido após o ato de inscrição em Dívida Ativa.

Entretanto, o mencionado órgão fracionário da Corte Cidadã, em sede de obter

dictum, também estendeu essa novo entendimento para o período anterior à sua

prolatação, na qual a toda a sua jurisprudência havia se projetado no sentido de

resguardar a boa-fé do adquirente.

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Assim, inclusive para os negócios jurídicos celebrados à época em que

vigorava a redação pretérita do artigo 185, do Código Tributário Nacional – antes de 9

de junho de 2005 -, a fraude à execução fiscal tributária se operaria objetivamente,

residindo a única diferença no critério temporal para aferição, que, como já elucidado

no trabalho, é o ato processual de citação.

Após verificar a tendência que o legislador tem conferido ao sistema

processual pátrio, aproximando-o da família do common law e emprestando-lhe maior

respeito e vinculação (ao menos material) aos precedentes oriundos dos Tribunais

Superiores, evidenciou-se a necessidade de reconhecer a incidência direta, imediata e

plena do princípio constitucional da segurança jurídica, para que, à míngua de previsão

legal expressa, mas com arrimo nas experiências do direito alienígena e pátrio, a ratio

decidendi de determinados paradigmas jurisprudências tivesse a sua incidência temporal

modulada, dado o papel jurisdicional constitucionalmente atribuído aos Tribunais

Superiores aliado à natureza criativa da interpretação jurisprudencial do Direito

Pelo fato de o Superior Tribunal de Justiça ter conferido efeitos ex tunc à nova

interpretação que modificou completamente a jurisprudência até então pacífica em seu

âmbito jurisdicional, este e os demais órgãos jurisdicionais inferiores passaram, em

virtude da vinculação material inerente ao regime dos recursos repetitivos, a aplicar a

presunção absoluta (jure et jure) de fraude à execução fiscal, reconhecendo a ineficácia

relativa dos negócios jurídicos até então celebrados e autorizando a expropriação de

seus objetos mediatos (imóveis, móveis, ações, etc.), fato que notadamente rompeu com

a segurança jurídica que até então pairava sobre os efeitos materiais desses atos

jurídicos perfeitos.

Conclui-se, portanto, ao cabo do presente estudo, que à interpretação inovadora

dada ao instituto processual da fraude à execução fiscal tributária, regido pelo artigo

185, do Código Tributário Nacional, dever-se-ia ter atribuído efeitos puramente

prospectivos, para que, assim como ocorre com as leis retroativas, resguardassem-se os

efeitos materiais dos atos jurídicos perfeitos até então celebrados com arrimo na pacífica

jurisprudência recente e abruptamente superada.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1.332.559. Segunda Turma. Relatora: Ministra Assusete Magalhães. Brasília, DF, 23 de

setembro de 2014. Diário da Justiça Eletrônico. Brasília, 02 outubro. 2014.

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Divergência no Recurso Especial nº 719.949. Segunda Seção. Relator: Ministro

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Relator: Ministro Mauro Campbell Marques. Brasília, DF, 04 de agosto de 2009. Diário

da Justiça Eletrônico. Brasília, 17 ago. 2009.

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Relator: Ministro João Otávio de Noronha. Brasília, DF, 15 de dezembro de

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______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 810.170. Segunda Turma.

Relator: Ministro Mauro Cambbell Marques. Brasília, DF, 12 de agosto de 2008. Diário

da Justiça Eletrônico. Brasília, 26 ago. 2008.

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Relator: Ministro Teori Albino Zavascki. Brasília, DF, 02 de setembro de 2008. Diário

da Justiça Eletrônico. Brasília, 10 set. 2008.

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Relator: Ministro Teori Albino Zavascki. Brasília, DF, 02 de setembro de 2008. Diário

da Justiça Eletrônico. Brasília, 10 set. 2008.

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Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros. Brasília, DF, 07 de abril de 2010. Diário

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Relator: Ministro Sidney Beneti. Brasília, DF, 22 de março de 2011. Diário da Justiça

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______. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial Representativo de Controvérsia

nº 1.141.990. Primeira Seção. Relator: Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 10 de novembro

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