fotografia

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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XVI Prêmio Expocom 2009 – Exposição da Pesquisa Experimental em Comunicação 1 Diálogos e conflitos entre fotografia artística e o fotojornalismo 1 Michelle PARRON 2 André Azevedo da FONSECA 3 Universidade de Uberaba, Uberaba, MG RESUMO Uma busca pela renovação da linguagem fotojornalística. Esse trabalho levanta a discussão de como é possível aliar arte e informação, sem que isso gere estetização da tragédia, visto que o mais importante no registro fotográfico é proporcionar informação. Para tanto, ousadia de ângulos e uma nova forma de usar as lentes da câmera fotográfica surgem para promover mudanças na forma de transmitir informação. PALAVRAS-CHAVE: fotojornalismo; foto artística; meio ambiente; jornalismo ambiental; arte. 1 INTRODUÇÃO Uma narrativa produzida com imagens. O fotojornalismo consiste em registrar o mundo através de recortes da realidade com a responsabilidade de informar, denunciar e acrescentar credibilidade ao texto. Saber usar a imagem como ferramenta de comunicação faz com que o profissional de jornalismo detenha um trunfo nas mãos, uma vez que a fotografia ganhou proporções de extrema relevância nas revistas e jornais impressos. São elas as responsáveis por chamar a atenção do leitor, trazendo a sensação de aproximação e intimidade com fatos noticiados. Diante da variedade de registros fotográficos, como saber o que é fotojornalismo e o que não passa de um mero registro casual do real, ao passo que figura, entre os tipos de registros, a fotografia artística e a fotografia publicitária? O fotojornalismo é, na realidade, uma actividade sem fronteiras claramente delimitadas. O termo pode abranger quer as fotografias de notícias, quer as fotografias dos grandes projectos documentais, passando 1 Trabalho submetido ao XVI Prêmio Expocom 2009, Categoria Áreas Emergentes e Produção Transdisciplinar em Comunicação, modalidade Fotografia Artística (avulso). 2 Estudante do 5° período do Curso de Comunicação Social, habilitação Jornalismo da Universidade de Uberaba (Uniube). Email: [email protected] 3 Professor orientador. Docente no curso de Comunicação Social e na pós-graduação em Lingüística Aplicada na Universidade de Uberaba (Uniube). Coordenador do Memorial Mário Palmério (Uniube). Doutorando em História na Universidade Estadual Paulista (Unesp/Franca). Autor de Cotidianos culturais e outras histórias: a cidade sob novos olhares . (Uniube, 2004). http://azevedodafonseca.sites.uol.com.br

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Uma busca pela renovação da linguagem fotojornalística. Esse trabalho levanta a discussão de como é possível aliar arte e informação, sem que isso gere estetização da tragédia, visto que o mais importante no registro fotográfico é proporcionar informação. Para tanto, ousadia de ângulos e uma nova forma de usar as lentes da câmera fotográfica surgem para promover mudanças na forma de transmitir informação. de aproximação e intimidade com fatos noticiados. 1

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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaçãoXVI Prêmio Expocom 2009 – Exposição da Pesquisa Experimental em Comunicação

1

Diálogos e conflitos entre fotografia artística e o fotojornalismo1

Michelle PARRON2

André Azevedo da FONSECA3

Universidade de Uberaba, Uberaba, MG

RESUMO

Uma busca pela renovação da linguagem fotojornalística. Esse trabalho levanta a discussão de como é possível aliar arte e informação, sem que isso gere estetização da tragédia, visto que o mais importante no registro fotográfico é proporcionar informação. Para tanto, ousadia de ângulos e uma nova forma de usar as lentes da câmera fotográfica surgem para promover mudanças na forma de transmitir informação.

PALAVRAS-CHAVE: fotojornalismo; foto artística; meio ambiente; jornalismo ambiental; arte.

1 INTRODUÇÃO

Uma narrativa produzida com imagens. O fotojornalismo consiste em registrar o

mundo através de recortes da realidade com a responsabilidade de informar, denunciar e

acrescentar credibilidade ao texto. Saber usar a imagem como ferramenta de

comunicação faz com que o profissional de jornalismo detenha um trunfo nas mãos,

uma vez que a fotografia ganhou proporções de extrema relevância nas revistas e jornais

impressos. São elas as responsáveis por chamar a atenção do leitor, trazendo a sensação

de aproximação e intimidade com fatos noticiados.

Diante da variedade de registros fotográficos, como saber o que é fotojornalismo e

o que não passa de um mero registro casual do real, ao passo que figura, entre os tipos

de registros, a fotografia artística e a fotografia publicitária?

O fotojornalismo é, na realidade, uma actividade sem fronteiras claramente delimitadas. O termo pode abranger quer as fotografias de notícias, quer as fotografias dos grandes projectos documentais, passando

1 Trabalho submetido ao XVI Prêmio Expocom 2009, Categoria Áreas Emergentes e Produção Transdisciplinar em Comunicação, modalidade Fotografia Artística (avulso).2 Estudante do 5° período do Curso de Comunicação Social, habilitação Jornalismo da Universidade de Uberaba (Uniube). Email: [email protected] Professor orientador. Docente no curso de Comunicação Social e na pós-graduação em Lingüística Aplicada na Universidade de Uberaba (Uniube). Coordenador do Memorial Mário Palmério (Uniube). Doutorando em História na Universidade Estadual Paulista (Unesp/Franca). Autor de Cotidianos culturais e outras histórias: a cidade sob novos olhares. (Uniube, 2004). http://azevedodafonseca.sites.uol.com.br

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pelas ilustrações fotográficas e pelos features (as fotografias intemporais de situações peculiares com que o fotógrafo depara), entre outras. De qualquer modo, como nos restantes tipos de jornalismo, a finalidade primeira do fotojornalismo, entendido de uma forma lata, é informar. (SOUSA, 2004, p.8)

O maior diferencial entre a fotografia publicitária e o fotojornalismo é que na

publicidade o profissional prepara um cenário no qual se produz a mensagem que se

objetiva transmitir através do registro fotográfico. Na fotografia publicitária não há

como trabalhar com o desconhecido ou com o inédito que venha a ser encarado como

fato. E na verdade, já no momento da encenação que antecede o registro fotográfico a

foto publicitária se distingue da jornalística como instrumento de informação.

A forma como se produz uma fotografia é capaz de denunciar se a imagem

registrada é ou não jornalística. Nesse contexto, figura entre o fotojornalismo e a foto

publicitária, a fotografia artística.

Não é tido como equívoco aliar a fotografia artística à publicidade, já que a

mensagem publicitária tem como característica o uso, em larga escala, de criatividade e

ousadia na produção fotográfica. A polêmica gira em torno do fotojornalismo aliado à

fotografia artística. Portanto, eis o questionamento que procuramos discutir: até que

ponto a fotografia artística pode ser encarada com viés informativo?

Para representar essa corrente que mistura arte e fotojornalismo, o trabalho do

fotógrafo francês Luc Delahaye é tido como uma transição entre os campos artístico e

jornalístico da fotografia. Em seu trabalho, Delahaye registra cenas do caos humano,

como por exemplo, cenas de guerras, com enquadramentos que fogem do padrão, mas

que não deixa a estética se transpor ao conteúdo informativo do registro.

O trabalho de Luc Delahaye foi responsável por guiar as experiências que

desenvolvemos usando o fotojornalismo com olhar artístico. A fotografia “Natureza

Morta”, apresentada nesse trabalho, pode ser encarada como arte, cuja principal

intenção é denunciar os maus tratos do homem à natureza.

Registrada em janeiro de 2008 na Praia Central de Balneário Camboriú, litoral

centro-norte de Santa Catarina, a fotografia “Natureza Morta” é o flagrante de como a

poluição dos mares pode ameaçar o ecossistema. Através de um ângulo que choca o

observador, nota-se um enquadramento de denúncia do descaso das pessoas diante da

morte do peixe.

A fotografia “Natureza Morta” serviu como ilustração de um texto de minha

autoria, publicado em fevereiro de 2008 no fanzine Inspire, produzido pelos alunos de

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Comunicação Social da Universidade de Uberaba (Uniube), cujo assunto era a poluição

das praias brasileiras no período de férias. O fanzine é uma publicação alternativa, em

geral artesanal, que se caracteriza por grande liberdade editorial. Para defender a

utilização de fanzines no ensino de Jornalismo no curso da Uniube, Fonseca e Vargas

(2009) já estabeleceram algumas reflexões no âmbito do Fórum Nacional de Professores

de Jornalismo.

Segue abaixo um trecho da matéria:

“No verão, o litoral brasileiro é invadido por turistas de várias partes do país e do mundo. O resultado são praias superlotadas e cidades sem infra-estrutura para suportar duas, três, quatro vezes o número de moradores habitual. E quanto mais gente reunida, maior é a produção de esgoto doméstico despejado na água e, conseqüentemente, jogado no mar sem que esteja com o tratamento adequado.

Algumas regiões litorâneas dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Santa Catarina sofrem mais com a presença dos turistas.”

Representar um fato com olhar diferenciado é o que move o fotojornalista que

encara a profissão como uma busca incessante pela renovação da linguagem.

O fotojornalismo ganhou demasiada importância nos veículos de comunicação a

ponto de uma matéria de jornal impresso deixar de ser publicada quando não apresenta

registros fotográficos, perdendo seu espaço para uma outra matéria que tem apoio

fotográfico. Há alguns sites informativos, como o brasileiro G1, que costumam publicar

fotografias com apenas uma pequena descrição do fato abaixo da foto, visto que a

própria imagem transmite a mensagem com bastante precisão. Essa perspectiva

influencia também a produção do curso de Comunicação Social da Uniube, tal como

evidenciamos em um trabalho anterior. (FONSECA; SANTOS, 2008).

2 OBJETIVO

O objetivo do trabalho é promover a renovação na forma de transmitir a

informação ao aliar o fotojornalismo à fotografia artística. Nossa proposta é contribuir

no debate sobre a incorporação das discussões estéticas na interpretação dos fatos

jornalísticos.

3 JUSTIFICATIVA

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Acompanhando o desenvolvimento dos meios de comunicação no século 21,

percebe-se que a informação passou a ser difundida por meio de inumeráveis mídias.

Surge então a necessidade de registrar um acontecimento com olhar diferenciado, pois o

excesso de informação circulante impõe ao jornalista um trabalho particularmente

preciso na elaboração de sua mensagem. Em outras palavras, só alcança visibilidade a

mensagem que, por sua qualidade, consegue emergir do oceano de informação. Para

isso, o trabalho fotográfico que apresentamos consiste em fazer da união da fotografia

artística com a fotografia jornalística uma maneira de promover a linguagem

informativa a um patamar diferenciado de relevância social e estética.

O jornalismo ambiental está em busca de novos recursos informativos capazes de

expressar a urgência da questão ambiental. Já argumentamos em um estudo anterior

(FONSECA, 2004b) que a imprensa deve encarar sua responsabilidade em participar

ativamente na formação ambiental do cidadão, não apenas nas calamidades, mas

sobretudo no dia-a-dia. Deste modo, nosso esforço se direciona também no sentido de

contribuir para a renovação do jornalismo ambiental por meio da incorporação da arte

na expressividade jornalística.

4 MÉTODOS E TÉCNICAS UTILIZADOS

A realização do trabalho fotográfico busca, além de um bom enquadramento e das

demais questões estéticas, fazer da fotografia algo que transmita sentimento e valor

informativo. Isso inclui um olhar que vem sendo trabalhado através da apreciação das

várias formas de expressão artística, dentre elas as artes plásticas, a literatura e o

cinema, aliadas ao olhar crítico e ético de uma estudante de jornalismo diante dos fatos

cotidianos.

Conhecer e apreciar o trabalho de grandes nomes do fotojornalismo brasileiro,

como Sebastião Salgado, servem de inspiração para o desenvolvimento de novas idéias

de conceitos fotográficos. Acima de tudo, realizar a busca pela inovação, pela

diferenciação na forma de fazer do registro fotográfico, garantindo elevado grau

informativo.

A fotografia foi produzida em janeiro de 2008, na praia Central de Camboriú,

litoral de Santa Catarina. O dia estava ensolarado, mas com nuvens carregadas. A

câmera utilizada foi a Sony DSC – P93A, um modelo amador e, consequentemente,

com poucos recursos disponíveis. Como no momento da fotografia fazia sol, a opção foi

por não fazer uso do flash. O enquadramento próximo ao peixe foi com intuito

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aproximar o observador do drama da poluição das praias, que ocasiona a morte de

animais marinhos, além de flagrar a indiferença dos turistas na orla.

Não eram um, dois ou três peixes mortos, mas uma quantidade alarmante desses

animais que perderam a vida e permaneciam na areia. A cena parecia não comover as

pessoas presentes na praia. Alguns desses peixes chegaram a ser esmagados por alguns

turistas que se exercitavam na areia.

5 DESCRIÇÃO DO PRODUTO

Uma fotografia retratando no primeiro plano um peixe morto sob olhares de

turistas anônimos na praia Central de Camboriú, litoral de Santa Catarina, em janeiro de

2008.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como comunicadores que visam contribuir para o desenvolvimento crítico da

profissão, cujo papel é de grande importância em prestar serviço à sociedade,

acreditamos que o trabalho pode inspirar a disseminação da proposta em realizar um

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trabalho fotográfico artístico com o compromisso de superar a estética, em busca de

uma expressividade ética.

Como defende Fonseca (2004a), o curso de Jornalismo contribui para a

consciência sobre a importância de produzir informação com qualidade, aliada a valores

éticos e em constante inovação das técnicas jornalísticas. O estudo de jornalismo, que

vem sendo construído através das aulas teóricas e da prática que o curso me oferece,

veio ao encontro da paixão pela fotografia que traduzimos como importante mecanismo

de informação aliado ao texto. Isso nos fez buscar nas lentes da câmera digital uma

nova forma de olhar os fatos. Pois como argumenta Fonseca (2005), fundamentando-se

em Paulo Freire (1983) a sociedade precisa de um jornalista capaz de atuar como uma

reflexão, e não como um mero reflexo da sociedade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DELAHAYE, Luc. Winterreise. London: Phaidon, 2000.

FONSECA, André Azevedo da. Cotidianos culturais e outras histórias: a cidade sob novos olhares. Uberaba: Uniube, 2004a.

FONSECA, André Azevedo da. Água de uma fonte só: a magnitude do problema em uma experiência concreta. In: Sergio Vilas Boas. (Org.). Formação & informação ambiental. 1 ed. São Paulo: Summus, 2004b, v. 1, p. 111-148.

_________________. Jornalismo para a transformação: a pedagogia de Paulo Freire aplicada às Diretrizes Curriculares de Comunicação Social. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO, 28, 2005, Rio de Janeiro. Anais... São Paulo: Intercom, 2005. Disponível em: <http://www.intercom.org.br/papers/nacionais/2005/resumos/R0561-1.pdf>. Acesso em: 31 mar. 2009.

FONSECA, André Azevedo da.; SANTOS, Graziela Tavares. Revelação: jornal-laboratório do curso de Comunicação Social da Uniube. In: EXPOCOM SUDESTE, 2008, São Paulo. Anais...São Paulo: Intercom, 2008. Disponível em: <http://www.portcom.intercom.org.br/expocom/expocomsudeste/index.php/jor-2008/article/downloadsuppfile/953/994>. Acesso em: 28 mar. 2009.

FONSECA, André Azevedo da; VARGAS, Raul Hernando Osório. O uso do fanzine como estímulo à produção de texto jornalístico. FÓRUM NACIONAL DE PROFESSORES DE JORNALISMO, 12, 2009, Belo Horizonte, Anais... Brasília, FNPJ, 2009. Disponível em: http://www.fnpj.org.br/soac/ocs/viewpaper.php?id=509&cf=18. Acesso em: 2 abr. 2009.

FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. 15 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1983.

SALGADO, Sebastião. Terra: introdução de José Saramago, versos de Chico Buarque. São Paulo: Cia das Letras, 1997.

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SOUSA, Jorge Pedro. Fotojornalismo: Introdução à história, às técnicas e à linguagem da fotografia na imprensa. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 2004.

VARGAS, Raul Hernando Osório. O lugar da fala na pesquisa da reportagensaio: “O homem das areias”, um flagrante do diálogo oratura-escritura. 2003. Tese. (Doutorado em Comunicação) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003.