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1 PEDRO LUIZ WANDERLEY TEIXEIRA [email protected] um rolê pelas ruas da cultura digital FLORIANÓPOLIS SC 2010

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PEDRO LUIZ WANDERLEY TEIXEIRA

[email protected] um rolê pelas ruas da cultura digital

FLORIANÓPOLIS – SC 2010

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA CENTRO DE ARTES – CEART

PPGAV – 2010

PEDRO LUIZ WANDERLEY TEIXEIRA

[email protected] um rolê pelas ruas da cultura digital

Dissertação de Mestrado, PPGAV- CEART –UDESC Orientadora: Prof. ª Dr.ª Célia M. Antonacci Ramos BANCA EXAMINADORA

Profª. Drª. Yara Guasque – CEART UDESC Prof.. Dr. Massimo Canevacci – Universidade de Roma

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AGRADECIMENTOS

Essas são as últimas palavras que venho a escrever nessa pesquisa e aqui no silêncio de minha sala e na inquietação de minha mente minha boca sorri por ter chegado no alto desta montanha. Apesar de estar rodeado de nuvens que não me deixam sequer enxergar meu nariz, é de olhos fechados que vejo o mais bonito e significante desta etapa, o caminho percorrido. Uma multidão de pessoas que cruzaram este meu caminho e a luz vinda daqueles que realmente me deram força, apoio e Viida, para que fosse possível seguir passo a passo. Assim deixarei os nomes e os momentos ecoarem palavras de agradecimentos que não são capazes de atribuir tudo o que desejo a estas pessoas, mas é assim que se fez toda esta trajetória, transformando anseios e pesquisas em palavras escritas.

Um pouco com Deus é muito e a essa divina experiência diária de viida que primeiro venho agradecer, pois és minha base e minha fortaleza. Aos meus pais, Sergio e Eva, pois é por eles que vivo e que reconheço a mais cintilante tradução da palavra AMOR. Juntamente com a Dri, o Sé, que grande honra, e, deles seguiram os frutos, Bibi, Juju, Clarinha e Gui com os seus Lulu e Má e também a Yas a Cris, minha família minha fortaleza longe ou perto somos um.

Dizem que junto de um grande homem vem uma grande mulher, no meu caso fui abençoado com algumas grandes mulheres. Celia Maria, minha profi, minha amiga sem você nada disso teria acontecido, a importância que você tem em minha Viida é tão grande quanto a Africa.(hehehehe) muito agradecido de coração. Cora Teixeira, minha amada, e minha companheira, sem sua força eu teria caído no segundo round, te amo.

Pai Julio e Mãe Antonia, que os grandes deuses retornem a bondade que vocês tem para com o mundo Axé! Amizade é um dos presentes mais belos e partilhar esse sentimento me faz uma pessoa realmente feliz. Willian, Thiago, Henrique (e Aline Sudo minha revisora), Ubirajara, Duts, Zé e Salim, Carlão, desde semmmpre.... Quinho, Carol, Rafa, José, Cris e Kian, sem vocês eu estaria ilhado. E nessa ilha fui abençoado pela Conceição e seus filhos, Shao, Santosha, Xandinho e suas meninas encantadas. Tru e Marcia, Din e Camila, Dr Marco, Fernando e dona Maria, Janete, Billy, Dani, Yuri,Valdo e Call vocês são um grande exemplo para mim, pois em vocês vejo meu passado e projeto meu futuro. Essa viida de arteiro me trouxe grandes celebridades: Cores e Tim gracias... pela rua, dae foi um passo e Vejam, Rizo, Marina Baldini, Stasy, Tanja e Nogger, Barnero,Mos, Danka, Pinguim, Paulo Govea e todas as cores... tamu junto e misturado. As palavras as vezes podem salvar viidas, muito agradecido Daniel Barcellos pelas mensagens e toda sua família por me acolherem num momento muito especial. CEART, quase dez anos em minha viida. Meus eternos amigos, Beto, Julio, Jun, Icaro, Matozzo, Bibi, Atur, Caligas, Max, Cássio, e a todos que fazem deste espaço um ambiente lúdico de amor e ódio.

Ao professor Kinceler por indicar um outro relacionamento com a arte, à Yara, pelo mergulho num espaço no qual eu estava me afogando e agora se apresenta como ondas do mar prestes a serem surfadas. Rosângela, Vargas, Regina e Sandra Ramalho belas sementes foram por vocês plantadas e, assim como a lâmina que abriu os olhos de um cão andaluz, minha retina por vocês também foi modificada. Nelly, acho que virei aquela escultura. Agradeço também a dois anjos, Sandrinha e Márcia, sem a ajuda e emails de vcs estaria literalmente perdido. E meus queridos amigos de escalada. Araceli minha grande secretaria....hahaha... Felipe .. Cleverson... Karin, Adriane, Aletea, Cristiane, Fernanda, Mari Ines, Rosanny, Sandra, Tatiana, Vera, Janis, Amanda, Elisa, Fran e João essa estrada é nossa.

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SUMÁRIO Apresentação Sobre os caminhos percorridos…… 08 Introdução …………. 11 Capítulo 1 - Indisciplinas nas cidades disciplinadas. .............. 22 1.1 tags/pixos/graffit............................... 23 1.2 O berço e a essência ...................28 1.2.1 Ver e ser visto ............................28 1.2.2 Estilo..............................................29 1.3 Sobre os tags/pixos/grafiiti ....................31 1.4 Agora é “nóis” – Brasil ...........................37 1.5 Pra quem sabe ler um pixo é letra....... 50

Capítulo 2 – Ciberespaço .............. 57 2.1 Virtual .....................................58 2.2 World Wide Web ...............60 2.3 Sobre o Ciberespaço ...........66 2.5 Comunicação Digital ................76 2.6 Cibercultura ................................77 2.7www.culturadigital.br .............. 82 Capítulo 3 – Redes .................... 95 3.1 Redes de transgressão ...............95 Capítulo 4 – Cores em bits ...............121 4.1 [email protected] 4.2 O Rolê ......................................24 4.3 ............................................124 4.3.1 Banksy ......................132 4.3.2 Blu ..........................136 4.4 O Atack........................140 4.4.1 Atack I .....................140 4.4.2 Atack II ......................143 4.4.3 Atack III .......................144 4.5 As tretas ........................146 4.5.1 A treta ..............................147 4.5.2 O Atropelo .........................148 Conclusão ....................................177

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Bibliografia ......................................180

RESUMO

Rolê na gíria urbana quer dizer caminhar, dar uma volta. Seguindo esta

definição, esta pesquisa caminha por arquivos postados pelos escritores urbanos,

nas vias da grande rede mundial de computadores.

O avanço tecnológico permitiu grandes mudanças na maneira de nos

comunicarmos. Os espaços de relacionamento humano se estenderam, e também

são ciberespaço e o rolê agora pode ser também digital. Para compreender este

mergulho no virtual, presente em toda a geração do século XXI, é necessário

conhecer a origem da internet e também conceitos referentes ao espaço virtual e

às mudanças na comunicação diante dos meios tecnológicos digitais.

As abordagens aqui apresentadas partem de historicidades, uma sobre os

tags/pixos/graffiti e, paralelamente, sobre a grande rede virtual.

No campo das artes, anteriores a internet, alguns artistas desenvolveram

uma conexão mundial de troca de arquivos, por meio do correio; destaca-se aqui o

grupo Fluxus como um dos pioneiros. Dentre os inúmeros arquivos, circulavam

obras de artes, fotografias e cartões, que provocaram rupturas e devires nas

instituições das artes e possibilitaram um registro histórico. Nesse fluxo da arte

postal, conceitual, o trabalho de Cildo Meireles e Paulo Bruscky consolidou, no

Brasil, uma produção artística a partir de espaços autônomos, e promoveu

circuitos alternativos de informação. Precursores à internet, esses artistas

publicaram suas obras com informações de caráter político e simbólico e, mesmo

diante de um regime militar, foi possível a circulação da informação pelo meio

social, usando os próprios canais de mass media e os sistemas tradicionais de

troca. Da mesma forma os escritores urbanos, autônomos, fizeram circular suas

polifonias pelo digital usando a grande rede como um canal de troca de

informação, como uma grande ferramenta publicitária, ativismo e protagonização

política.

PALAVRAS – CHAVE: Graffiti, pixo, tag, arte, transgressão, internet, ciberespaço,

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cultura digital.

ABSTRACT

Rolê, in urban slang means to walk around, to go for a walk. Following this

definition, this research walks through files posted by urban writers, in the great

computer‟s world wide net.

The technological advance allowed great changes in the way we

communicate to each other. The spaces for human relationship have spread, and

are also cyberspace and the rolê now can be digital. To comprehend this dive in

the virtual, present in every generation of the XXI century, it is necessary to get to

know the origins of the internet e also concepts which refer to the virtual space and

the changes in communication towards the digital technological means.

The approaches presented here depart from historicities, one about the

tags/pixos/graffiti and, in parallel, about the great virtual net.

In the arts field, before the internet, some artist developed a world wide

connection of files exchange, through the post; highlighted here the Fluxus group,

as one of the pioneers. Among innumerous files, pieces of art, photos and cards

circulated, which provoked ruptures and a series of transformations in the art

institutions and allowed a historical record. In this flow of postal, conceptual, art,

the work of Cildo Meireles and Paulo Bruscky consolidated, in Brazil, an artistic

production from autonomic spaces, and promoted alternatives circuits of

information. Previous to the internet, this artists published their pieces with political

and symbolic information and, even towards a military regime, it was possible the

circulation of the information among the social environment, using the mass media

channels and the traditional exchange systems. In the same way, the urban

writers, autonomous, made the polyphonies circulate the digital using the great net

as an information exchange channel, as a great advertising, activism and political

protagonism tool.

KEY WORDS: Graffiti, pixo, tag, art, transgretion, internet, cyberspace, culture

digital.

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BANKSY – forgive us

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“Qualquer pessoa que tenha lido a história da humanidade aprendeu que a desobediência é a virtude original do homem.”

Oscar Wilde

1 http://www.banksy.co.uk/outdoors/outuk/horizontal_1.htm acessado em 05 de outubro 2010

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Sobre os caminhos percorridos .....

Tudo isso começou por influência da minha professora e grande amiga

Célia Antonacci. Movido por uma inexplicável inquietude, larguei os pincéis e as

telas e fui sentir o cheiro do spray na rua. A partir daí, o posicionamento desta

pesquisa parte de minha experiência de cidadão do mundo contemporâneo que

tem a rua como território e a internet como extensão das interações com a viida2.

O fato que me levou a desenhar esta pesquisa foi simplesmente observar e

analisar algumas ações cotidianas contemporâneas com mais atenção. Quase

sempre que volto para casa depois de um graffiti, após também ter feito registros

da ação em fotos, faço o download delas em minha página no facebook e no

flickr e, anteriormente, o fazia no fotolog e no orkut. Dessa forma, aquilo que

estava na rua passa a não mais ter um endereço apenas físico, mas também um

ciberespaço. Essa migração dos arquivos para o espaço virtual faz parte de uma

época tecnológica, um fenômeno de nossa geração, de originar relações também

através de mídias virtuais. Os registros dessas ações possibilitam diferentes

experiências que serão apresentadas no desenrolar destas linhas.

É por meio do ciberespaço que eu e alguns amigos transmitimos nosso

“rolê” em imagens postadas que ajudam a tecer redes de informações com

pessoas dos quatro cantos do mundo. A potência dessas redes virtuais foi o que

despertou meu desejo para pesquisar e escrever sobre as relações dos artistas e

escritores urbanos no ciberespaço.

No ano de 2008 fui convidado a participar de uma exposição na cidade de

Herne, na Alemanha, e, mais uma vez impulsionado pela minha orientadora,

decidi aproveitar e visitar Berlim. Buscando conexões, naveguei por um site

(plataforma multiusuário) chamado www.flickr.com (atualmente bem utilizado por

artistas e escritores urbanos) e encontrei um artista alemão, vulgo Stasy

(http://www.flickr.com/photos/ritschkow/), na lista de contatos de um grande amigo

– Rizo – que produz intervenções junto comigo nas ruas. Stasy, por sua vez, já

2 Viida vêm escrito dessa forma por representar minha assinatura nas ruas.

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havia passado pelas paredes de Florianópolis. Enviei a ele uma mensagem

dizendo que estava indo para a Alemanha e que seria interessante se

pudéssemos fazer algo por lá, especificamente em Berlim. Quando percebi já

estava hospedado em sua casa e pintando a East Side Gallery

(http://www.eastsidegallery.com/), que é uma das partes preservadas do Muro de

Berlim, e na sequência pintamos com outros artistas locais em algumas fábricas

abandonadas da antiga Berlim.

Veja em fotos do rolê em:

www.flickr.com/photos/ritschkow/3008004903/in/set-

72157606762874681/

www.flickr.com/photos/ritschkow/3008844582/in/set-

72157606762874681/

www.fotolog.com.br/driin/42457611

Ao vislumbrar tais acontecimentos, frutos de uma interação virtual a partir

dos arquivos postados e vivenciados nas plataformas multiusuários, neste caso o

flickr, percebi que podia falar dessas relações e seus desdobramentos. Uma

percepção da cultura urbana dos tags/pixos/graffiti3, vista de dentro do olho do

furacão. Digo desta forma, pois, ao conversar com diferentes escritores urbanos,

tanto pela net quanto nos próprios rolês, é nítida as divergências de opiniões a

respeito dos tags/pixos/graffiti quando publicados na grande rede. O exemplo

acima citado, da viagem para a Alemanha, é apenas um fragmento dessa

imensidão de relações feitas através das cores “espancadas”4 nas ruas e

transmitidas por satélites. A conversa com amigos e escritores urbanos e a

observação dessas relações geradas por outros artistas nos espaços virtuais,

foram as razões pelas quais estas linhas seguem. Pois, é dessa mesma forma que

nos tornamos viajantes navegando pelo mundo, seja ele virtual ou concreto.

3 O motivo pelo qual descrevo essas ações dessa maneira é que os tags, pixos e graffitis são denominações de poéticas

urbanas contemporâneas, cada qual com sua particularidade, porém também com sua similaridade. 4 Como cita Gustavo Rebelo Coelho de Oliveira em sua dissertação de mestrado - PiXação: arte e pedagogia como crime -

defendida no Programa de Pós Graduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro(2009)

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A partir dessa imensa muralha de bits, acompanho o “rolê” de artistas

como Osgemeos www.osgemeos.com.br/, Blu www.blublu.org, Zezão

www.flickr.com/photos/zezao, Banksy www.banksy.co.uk, Titi Freak

www.titifreak.blogspot.com e muitos outros. Através dos registros de suas obras e

ações (fotos e vídeos) nos mais variados lugares do mundo, foi possível vivenciar

as movimentações e as expressões, seja instigado pela identificação ou

curiosidade e também para alimentar o repertório estético e/ou subjetivo, motivos

esses que me levaram a pesquisar tal tema.

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INTRODUÇÃO

Sobre os tags/pixos/graffiti

Os registros em diferentes espaços geográficos, concretos ou virtuais,

indicam que o universo do Tags/pixos/graffiti, seus signos e símbolos

transmitidos pelas imagens aplicadas nas ruas constituem uma espécie de livro

urbano, com diferentes histórias a serem contadas através da tinta, seja ela do

spray, rolo ou da caneta e, agora, traduzidas também em bits. Tags/pixos/graffiti

são denominações de manifestações que compõem o cenário contemporâneo das

poéticas visuais de artistas urbanos.

Desde suas primeiras aparições, os tags/pixos/graffiti ocupam os meios

urbanos e circulam em outros espaços midiáticos como jornais, revistas,

fotografias, museus, galerias e bienais. Pintados em trens, muros e nos mais

variados espaços, a “imagem” graffiti foi reproduzida tecnicamente em stencils na

rua e também apropriada pelas mídias oficiais, pelos designers e publicitários e,

hoje, são os próprios escritores urbanos que multiplicam suas imagens nas mídias

virtuais.

Atualmente, uns poucos passos em uma metrópole contemporânea ou

alguns clicks no mouse nos possibilitam acessar os mais diferentes lugares. Na

cidade e na internet navegamos por entre ruas ou vias bombardeadas de signos.

A cidade agora é também cibercidade, e os tags/pixos/graffiti proliferam de

forma caótica por entre essas duas geografias, promovendo uma narrativa

histórica através dos registros e fomentando a própria cultura e identidade dessas

nações.

Imagens e letras inscritas nos muros de concretos, hoje circulam nos muros

virtuais e problematizam alguns muros sociais. Uma inquietude que vem dialogar

com o cotidiano e que, num gesto por vezes até considerado criminoso, consegue

roubar sua alva maquiagem hegemônica.

O trabalho assume o pressuposto de que os tags/pixos/graffiti são formas

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de poéticas urbanas que expressam vozes de sujeitos fora dos sistemas

comunicacionais, e suas ações por vezes transgridem as normas da cidade, de

algumas propriedades privadas, sistemas de sinalização urbana, mídias de

comunicação privada - outdoors -, subvertendo a ordem oficial, tanto no que se

refere à arte, quanto às políticas econômicas, sociais e culturais.

Ao pintar muros, portas e túneis rodoferroviários, os “escritores (...) esses

novos gutembergs” (SÁ, 2006, apud BOLETA, 2006, p. 10) reinventam a cidade e

a arte, alteram os modos de ver o espaço urbano. Dentro da cultura dos

tags/pixos/graffiti os escritores urbanos se utilizavam de cadernos

(agendas/blackbook) e panfletos para desenvolver trocas de informações e redes.

Esta produção cultural seja ela estética ou fortalecimento de identidade, agora,

invade também a Windows5. Os artistas e escritores urbanos internacionalizam

suas escritas bombardeando essa grande cibercidade. As fronteiras parecem ter

sido dissolvidas pelas redes virtuais de informações.

Não cabe a esta pesquisa atestar nem formular alguma espécie de

tags/pixos/graffiti virtuais, pois sua existência é somente a partir de uma ação no

espaço urbano. O que este trabalho pretende dizer é que, através do bombardeio

de imagens dos tags/pixos/graffiti também nas mídias virtuais, torna-se evidente

a construção de várias redes de discussões e aproximações, num processo de

fomento da cultura por meio dos fenômenos da cultura digital.

5 Neologismo usado para representar as janelas hipertextuais dos meio digitais.

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Sobre a pesquisa

Esta pesquisa tem como objetivo estudar as poéticas urbanas conhecidas

por tags/pixos/graffiti e suas migrações para o novo grande fetiche-virtual

urbano6, o ciberespaço. Os escritores urbanos ao se apoderarem também desse

elemento de comunicação, a internet, transmitem suas polifonias transgressoras e

geram redes de relacionamentos, via essa nova geografia interativa.

“O pior analfabeto, velho Brecht, é aquele que não sabe lê sua própria cidade”7

xico sá s/p.

A rua agora também é vista.com outros olhos. Sem limites físicos, a cidade

de bits possibilita dar saltos por entre o virtual. O ciberespaço criou outros muros

de propagação dessa manifestação e os cadernos - blackbooks/agendas -

transformam-se também em blogs, flickrs, fotologs.

Percebe-se assim, que um “rolê” escrito nas ruas e agora na internet

possibilita aos escritores urbanos protagonizarem suas ideias e ideais a

partir deles mesmos. Essa ocupação da cultura digital relativiza questões

políticas fundamentais e nos instiga a investigar os novos caminhos das

relações de poder.

A importância desta pesquisa se dá em parte pelo fato das academias

falarem pouco sobre os tags/pixos/graffiti e menos ainda de sua discussão na

net. Tal campo se abriu no virtual e produziu redes de interatividade. Conversas

que estavam nas esquinas, nos blackbooks/agendas, agora também estão nos

[email protected]. 8

6 Como define Massimo Canevacci

7 (SÁ, 2006, apud BOLETA, 2006, p. 10) 8 O neologismo [email protected] vem a ser uma metáfora sobre a migração das imagens dos tags/pixos/graffiti

para o espaço virtual. Um endereço “fantasia” representando as redes sociais dos escritores urbanos.

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Sobre os métodos

Este estudo pode ser lido de duas formas: em hipertexto eletrônico e

impresso tradicional.

O surgimento da comunicação eletrônica, as novas mídias virtuais e a

“aceleração” dessa aldeia global me fez refletir sobre a metodologia deste projeto.

As mudanças na comunicação geraram um fenômeno denominado cultura digital,

que nos incita a operar em formato de hipertexto. Essa será a metodologia

aplicada nesta pesquisa, com a possibilidade de outros acessos, determinando

diferentes caminhos por meio de links e tags.

Mike Featherstone, em seu texto O flâneur, a cidade e a vida pública virtual

(1996, apud ARANTES, 2000, p. 187) nos leva a perceber que estamos diante do

desafio de aprender a operar em formatos de multimídia, onde o texto escrito é

acompanhado por imagens, vídeos, sons e palavras.

A cidade é um hipertexto.

Dialogar com a cidade contemporânea é perceber seus diferentes sujeitos

constantemente conectados com os links de Windows comunicacionais e

informacionais que dão sentido a antigas e novas geografias urbanas. Para

Massimo Canevacci, “a cidade se caracteriza pela sobreposição de melodias e

harmonias, ruídos e sons, regras e improvisações cuja soma total,

simultaneamente ou fragmentária, comunica o sentido da obra”. (1993, p.18)

Já Walter Benjamin, em seu Projeto das Galerias, havia construído as

imagens e textos justapostos, uma fotomontagem inspirada e influenciada pelo

surrealismo. Mike Featherstone lembra que Benjamin “colecionava sinais e pistas:

restos da vida urbana como panfletos, ingressos, fotografias, anúncios, diários,

recortes de jornal. (...)”, apontando que esses “pedaços da vida urbana deviam

falar por si mesmos” (1996, apud ARANTES, 2000, p. 188). Para ele, se Benjamim

estivesse vivo seu projeto se realizaria de modo mais pleno com o hipertexto e a

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multimídia.

“Aquilo que é escrito é como uma cidade, para qual as palavras são milhares

de entradas”. Walter Benjamin (FEATHERSTONE, 1996, apud ARANTES,

2000, p. 188)

Seguindo Walter Benjamin, Mike Featherstone sugere a passagem dessa

cidade como texto para uma cidade como dado, um modo mais significativo da

experiência contemporânea, onde a internet se apresenta numa espécie de

moldura arquitetônica de interação humana que tem a necessidade de outros

métodos de representação. Métodos que pretendem capturar um pouco mais as

qualidades experienciais da “cidade ciberespacial de bits”. (1996, apud ARANTES,

2000, p. 189)

Para Pierri Lévy

Desterritorializado o hipertexto contribui para produzir aqui e acolá

acontecimentos de atualização textual, de navegação e de leitura. Somente

estes acontecimentos são verdadeiramente situados. Embora necessite de

suportes físicos pesados para substituir e atualizar-se, o imponderável

hipertexto não possui lugar. (LÉVY, 1996, p. 20).

Habitante do ciberespaço, o hipertexto está em todos os nós da rede virtual

ao mesmo tempo, existindo/não, atualizado de acordo com a própria navegação,

com o acesso aos endereços e abertura das janelas. A leitura do hipertexto

acontece de forma não linear, em que é possível promover a interatividade, e

possibilitar ao leitor a própria edição do texto e da leitura. Dessa forma, convido ao

leitor a produzir seus próprios saltos.

A memória é uma ilha de edição9

Diante da tela do computador, o pensamento analógico linear quase que se

dilui. As informações estão disponibilizadas em Windows, e os saltos entre as 9 Palavras de Wali Salomão retiradas de um trecho do álbum o Silêncio que precede o esporro,da

banda O Rappa.

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justaposições de imagens/textos/sons, percebidas em velocidade, nos provocam

novas formas de fluxos e experiências.

Uma profunda identificação com a dissertação de mestrado de Gustavo

Rebelo Coelho de Oliveira - PiXação: arte e pedagogia como crime - defendida no

Programa de Pós Graduação em Educação, da Universidade do Estado do Rio de

Janeiro (2009) me fez repensar o modo e a linguagem do texto, podendo assim

traçar linhas com palavras menos acadêmicas e mais próximas de meu objeto.

O rolê

A comunicação urbana se dá através da leitura da cidade, de suas

geografias concretas e virtuais, da malha feita e costurada pelas mais diferentes

redes. “Uma cidade que será „lida‟ e interpretada utilizando pontos de vista

diferentes, vozes „autônomas‟ com suas regras, seus estilos, suas improvisações”.

(CANEVACCI, 1993, p.18).

Este texto é uma deriva por entre os tags/pixos/graffiti no ciberespaço, ou

seja, a migração desta linguagem para as mídias virtuais.

Uma comunicação através dos espaços urbanos levando “a extensão

geográfica das relações sociais a nossa experiência de tudo isso”. (MASSEY,

1991, apud ARANTES, 2000, p.178)

Neste rolê, salto por entre textos e obras, desenvolvo blocos de reflexão a

partir de referenciais teóricos, entrevistas abertas com escritores e artistas

urbanos, pesquisas em sites, blogs, flickrs e outras janelas virtuais.

Divisão do trabalho

O surgimento do graffiti fez com que outras vozes pudessem falar, seja dos

guetos de Nova Iorque e Paris, dos protestos do Muro, das fábricas abandonadas

e das ruas de Berlim, ou vindas de qualquer esquina de São Paulo. Escritores

saíram às ruas para dialogar suas subjetividades e espancá-las em muros.

O primeiro capítulo será composto por um histórico sobre o surgimento dos

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tags/pixos/graffiti. Para contar a história dessas vozes utilizei a pesquisa de

minha orientadora, a Profª Drª. Célia Antonacci, Grafite Pichação & Cia (1994),

com seus registros temporais e sociais dessa manifestação urbana, desde sua

imprecisa origem até sua manifestação próxima/distante de nós: o Maio de 1968,

com os Situacionistas em Paris; o get up dos guetos novaiorquinos dos anos

1970, sua transmigração para o bombardeio do Muro de Berlim entre os anos

1980/90; e, sua expressão no Brasil, em São Paulo, na década de 1980 aos dias

atuais, com referências nos livros Graffiti Brasil (2005), organizado por Tristan

Manco, Lost Art e Caleb Neelon e o livro TSSS...: a grande arte da pixação em

São Paulo, Brasil (2006), escrito a partir da agenda/blackbook do pixador Boleta.

No desenrolar desse primeiro capítulo tracei uma narrativa histórica sobre

os tags/pixos/graffiti em São Paulo, divididos em três gerações. Uma pesquisa

de grande valor para pontuar esses registros foi a dissertação de mestrado de

Sergio Miguel Franco, Iconografias da Metrópole: grafiteiros e pixadores

representando os pixadores (2009).

Busquei neste primeiro capítulo relatar não apenas os acontecimentos,

mas também apresentar os conceitos e raízes pertinentes à cultura dos

tags/pixos/graffiti, sendo eles princípios básicos para se entender um pouco os

caminhos traçados pelos escritores, e as consequências, dialogando entre os

trabalhos dos escritores urbanos e suas projeções no campo da arte e nos canais

de comunicação, desde produções autônomas ao mass media.

Ciberespaço

Assim como apresenta Castells na introdução de seu livro, A Galáxia da

Internet, este segundo capítulo “tampouco trata todos os temas relevantes,” (2003,

p.11) até porque, “a pesquisa não pode ser completa quando seu objeto (a

internet) se desenvolve e muda muito mais depressa que o sujeito (este

pesquisador – aliás qualquer pesquisador)” (2003, p.11). A obra de Castells é de

grande importância para a fundamentação das linhas que seguem, e compartilho

tal anseio sobre a amplitude de escrever a respeito deste espaço virtual. O próprio

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19

fato de usar o objeto, a rede, para obter informações sobre ela mesma, já é um

fator instigante. Um universo de informações se abriu em Windows. Ao mesmo

tempo lia os livros através do www.books.google.com, baixava artigos.pdf, viajava

por sites, pesquisava as plataformas multiusuários e interagindo na “galáxia” em

total movimento.

Para iniciar esse capítulo tracei um breve histórico sobre a internet, com

base na obra de Asa Briggs & Peter Burke, “Uma história social da mídia – De

gutemberg à internet” (2006), também o livro do acima citado Manuel Castells e

algumas informações a partir da Wikipédia10. O fato de usar a Wikipédia vem a

ser um posicionamento particular deste pesquisador, pelo fato da própria

“enciclopédia livre” ser um retrato, ou a metáfora, com mesmo modelo

arquitetônico que a cultura dos [email protected], base dessa

pesquisa, utilizam para interatividade e conexão com seus indivíduos. Uma cultura

baseada no desdobramento de posts, downloads, uploads e broadcast entre

outros, fomentada por sujeitos plurais.

Para refletir sobre as geografias virtuais, utilizei as obras de Pierre Lévy, “O

que é o virtual?” (1996), e “Cibercultura” (1999), com a finalidade de embasamento

e compreensão do ciberespaço, e da virtualização.

O artigo do Prof. Dr. Walter Zanini, “A Arte da Comunicação telemática – a

interatividade no ciberespaço” publicado na revista Ars, em 2003, também foi de

grande importância, pois descreveu alguns novos caminhos sobre as

manifestações artísticas no espaço virtual e principalmente retratou a questão da

percepção humana, modificada por meio dessa nova comunicação, trazendo a

tona pensamentos do artista, teórico e educador Inglês Roy Ascott e do pensador

Italiano Mario Costa.

A parte final desse capítulo retoma com maior profundidade a questão da

10

Bem-vindo(a) à Wikipédia, uma enciclopédia escrita em colaboração pelos seus leitores. Este site utiliza a ferramenta

Wiki, que permite a qualquer pessoa, inclusive a você, melhorar de imediato qualquer artigo clicando em editar no menu superior de cada página. Se tiver dúvidas como editar clique em ajuda de edição (no fundo da página). Sim, você também pode editar! Leia a Introdução para mais informações. A Wikipédia em língua portuguesa começou em junho de 2001 a partir da tradução do conteúdo da versão original, em inglês, e cresceu desde logo com a produção de novos verbetes. A comunidade vem crescendo de dia para dia. Porém, precisamos de mais colaboradores para podermos ampliar o número de artigos em língua portuguesa e expandir, melhorar e consolidar os que já existem.

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cibercultura, pois esse vem a ser um dos pilares desta pesquisa, em que os

escritores urbanos, utilizando-se dos meios da cibercultura (tecnológicos,

intelectuais), fomentam sua própria cultura e também tecem redes de

relacionamentos de discussão e aproximação. Uma cultura horizontal, sem a

necessidade de depender das grandes corporações e redes hegemônicas de

comunicação e nem servir a interesses capitalistas. Uma manifestação cultural

baseada nas relações humanas dentro dos meios virtuais.

Esta parte da pesquisa é também uma espécie de diálogo com a obra

Culturadigital.br. (2009), livro organizado por Rodrigo Savazoni e Sergio Cohn.

Esta obra é construída a partir de entrevistas realizadas em São Paulo, Salvador,

Rio de Janeiro e Brasília com “gente do governo, do mercado, da sociedade civil

organizada, da academia, que se dispôs a pensar conosco, em conversas abertas,

sobre as mutações em curso” (SAVAZONI, 2009, p.8). Conversas estas que se

apresentam ipsis litteris nesse texto, com o intuito de mostrar diversos pontos de

vista, pois trata-se de um momento presente e em rápida mutação.

As redes de comunicação e de transgressão

O terceiro capítulo é um estudo sobre o desenvolvimento das relações

artísticas através das redes de relacionamento. O capítulo inicia com uma breve

apresentação sobre as redes de comunicação, continuando com a pesquisa de

Castells. A partir de textos do Prof. Dr. Walter Zanini, das pesquisas da Profª Drª

Cristina Freire em, “Arte Conceitual” (2006), descrevo uma narrativa sobre

conceitos envolvidos em relação à arte postal e, juntamente, apresento grupos de

artistas que promovem por meio de redes de trocas de arquivos, ideias e obras,

rupturas nos sistemas das artes, gerando “circuitos alternativos”11. Essa narrativa

começa com o grupo Fluxus, seus integrantes, suas obras e sua poética e, para

isso, também utilizei a dissertação de doutorado de Ana Paula Felicissimo de

Camargo Lima - Fluxus em museus: museus em Fluxus - defendida em 2009,

Unicamp.

11

Assim como descreve Cristina Freire em sua pesquisa Arte Conceitual.

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Nesse capítulo busquei apresentar as proposições artísticas por meio da

descrição das obras e também pelos depoimentos dos próprios artistas. O recorte

para essa parte do trabalho foi trazer a tona as proposições artísticas do fim do

século passado, que tiveram como intenção a ruptura de antigos paradigmas e a

criação de diferentes canais autônomos de circulação das informações. Para isso,

pesquisei além do grupo Fluxus, alguns de seus “herdeiros” no Brasil e destaquei

dentre eles Paulo Bruscky e Cildo Meireles. Para finalizar esse capítulo, menciono

o trabalho da artista mexicana Minerva Cuevas, apresentado na pesquisa de

Cristina Freire, em que descreve parcialmente o seu projeto Mejor Vida

Corporation. A partir de pesquisa em seu próprio site (www.irational.org/mvc),

descorro um pouco mais sobre seu projeto em seu depoimento para a 24ª Bienal

de Ljubljana, Slovenia.

Cores em bits [email protected]

O quinto capítulo, o coração desta pesquisa, acelerado e inquieto explode

as cores em bits na net. Fotos, relatos, discussões obtidas nos espaços concretos

e virtuais, diálogos corpo a corpo e via internet com os escritores, artistas de rua,

bombardeiam o último capítulo.

Qual a importância da internet para os tags/pixos/graffiti?

Partindo dessa interrogação dividi o capitulo em três partes que pudessem

ilustrar algumas das possibilidades atuais de ações promovidas pelo meio digital.

Sendo a internet um canal de comunicação livre, os escritores urbanos, por meio

de sua apropriação, apresentam suas poéticas com seus arquivos, vídeos,

imagens, links e textos, produzindo grande e especifico fluxo de informações e

seus posicionamentos políticos dentro de suas comunidades e para toda rede. O

capitulo foi dividido nas seguintes partes: O ROLÊ, O BOMBARDEIO, O ATACK, e

AS TRETAS.

A primeira parte, O ROLÊ, retrata a deriva pelo meio digital e a maneira

como cada escritor urbano enxerga essa possibilidade virtual dos

tags/pixos/graffiti. A fundamentação foi por meio de entrevistas com diferentes

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escritores urbanos, feitas pela rede digital dentro das plataformas multiusuários.

A segunda parte, O BOMBARDEIO, apresenta dois artistas, Banksy e Blu,

que se destacam na cena artística urbana mundial. Essa escolha deu-se pela

percepção de que ambos haviam alcançado notoriedade a partir da divulgação de

suas obras via internet. Os sites proporcionaram uma excelente visibilidade e

audiência e trouxeram para esses artistas um ganho de capital simbólico e

inserção no campo e mercado das artes.

A terceira parte descreve os três ATACKS ocorridos às instituições de arte

Centro Universitário de Belas Artes, Galeria Choque Cultural e 28ª Bienal de São

Paulo, em 2008. Esses ATACKS foram o resultado de ações planejadas,

organizadas e divulgadas em redes virtuais. A internet serviu de base para o

ativismo político e social e foi um canal para a proliferação de ideias e para a

divulgação dos registros das fotos, vídeos, debates e seus desdobramentos na

mídia oficial e nas redes dos escritores-pixadores.

A última parte são as TRETAS entre os escritores urbanos. TRETA na gíria

urbana vem a ser discussão, conflito, desarmonia, falta de respeito e brigas em

geral. As TRETAS aqui apresentadas referem-se ao resultado de um quarto

ATACK, em que o mesmo grupo de pixadores, apresentados acima, “atropelaram”

– pintaram por cima – de murais de graffiti de escritores urbanos consagrados no

campo das artes e na grande mídia. O resultado desse último atack foi uma

discussão nas ruas e dentro dos canais virtuais de comunicação, como no caso do

Brasil, as duas plataformas multiusuários mais conhecidas dentre os escritores

urbanos, o Fotolog e o Flickr. Escolhi uma página de cada uma dessas

plataformas, ainda que sejam do mesmo escritor urbano, o Djan “Cripta”.

Para apresentar tais questões, esse capítulo faz uma justaposição de

imagens e textos tal qual aparecem nas Windows, costuradas com

argumentações e análises, e desenhadas nas páginas da dissertação.

Experiências vivenciadas/não, a espera de um click:

[email protected]

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Capítulo 1

“INDISCIPLINA NAS CIDADES DISCIPLINADAS.”

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1.1 Tags/pixos/graffiti

Graffiti não é moda... graffiti não é para sair, pintar meia dúzia de coisas e

dizer... “eu faço graffiti... eu sou escritor de graffiti”...

Graffiti não é inventar boatos para se ter ibope... graffiti não é desenho em

roupas..graffiti não é roubar o estilo do outro... graffiti não é decorações em

lojas... graffiti não é qualquer coisa ...

...graffiti é:

Sigilo, silêncio, anonimato, surpresa, inovação, ação,

transformação, conteúdo, qualidade, marcar, intervenção, produção, atitude,

estilo próprio e inteligente, linguagem universal... respeito.

FIZ 12

Desde a antiguidade os seres humanos marcavam sua história com

desenhos nas paredes. A nomenclatura que denomina atualmente essa expressão

deriva da palavra italiana sgraffito – rabisco, ranhura – e um de seus registros

mais primitivos está nas grutas de Lascaux, França. Por meio de ossos furados,

era soprada uma espécie de pigmento que formava a silhueta das mãos. Dessa

forma, foi desenvolvido os primeiros métodos do que conhecemos atualmente

como spray e stencil, ferramentas ideais e principais para o movimento

denominado graffiti.

Célia Antonacci Ramos, em sua pesquisa, descreve o surgimento da

manifestação conhecida como graffiti e suas origens contemporâneas, ainda que

imprecisas. Para ela, “o grafitti é o mais antigo registro de linguagem” (1994, p.13).

Documentos históricos atestam a presença de afrescos-murais em diferentes

espaços e tempos. De Lascaux a Altamira, passando pela Grécia e Pompeia, as

12

A citação que antecede estas palavras foi tirada de uma revista sobre graffiti produzida no Brasil na década de 90

intitulada FIZ , da qual possuo dois volumes.. Cultura, ações, textos, entrevistas com artistas costuradas pelas fotos de

ambientes “degradados” pelo tempo e marcados com gestos coloridos e transgressores compunham seu corpo, talvez uma

espécie de zine anarquista produzido para dar voz àquela cultura de forma autônoma. Essa revista tinha como intenção

manter-se fiel a ideologia do graffiti, pelo ponto de vista de seus produtores, os quais integravam a „segunda geração‟ do

grafffiti no Brasil. Essa revista não possui nenhuma especificidade de autoria, edição e qualquer referência. As publicações

transitavam nas comunidades com o intuito de promover a cultura e incentivar novas gerações e fazer um registro histórico

dessa manifestação artística.

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paredes das cavernas ou das arquiteturas serviram de suporte para registros de

comunicação visual.

Nicholaz Ganz, em seu livro O mundo do grafite: arte urbana dos cinco

continentes (2008), aponta também sobre esses registros encontrados em cidades

na Grécia antiga e na cidade italiana de Pompeia que, dentre uma diversidade de

imagens, anotações em argilas e desenhos obscenos, já continham acima de tudo

a vontade e a necessidade dos indivíduos de se comunicar.

O autor descreve que no ano de 1984 foi lançada a primeira revista de

“graffiti de banheiro” chamada Antropophyteia e, segue contando que durante a

Segunda Guerra Mundial os nazistas utilizaram inscrições em muros para

propagar suas ideologias e, paralelamente, grupos inconformistas alemães como

o “Rosa Branca” se manifestavam por meio de slogans nos muros e folhetos com

informações contra o regime nazista em 1943. (2008, p.08).

Foi também através dos muros que, em maio de 1968 na França, grupos de

estudantes saíram às ruas para declamar suas polifonias pintando frases como a

“imaginação toma o poder” e “é proibido o trabalho alienado”, numa revolução

contra a opressão política.

Desde sempre jovens vivem seus rituais de passagem, usando os meios e a

mídia de seu tempo. Gangues formadas por jovens agressivos, cheios de

testosterona, sempre existiram – e assim será – vide Montéquios e Capuletos

revistos em West Side Story, o Muro de Berlin e seus pixos maravilhosos

preservados em livros de arte, ou maio de 68 em Paris, quando estudantes

barbarizaram os muros da Sorbonne com pérolas como “É proibido proibir”,

“Fodam-se uns aos outros senão eles te fodem”, “A anarquia sou eu”, “Não

reclamaremos nada. Não pediremos nada. Tomaremos. Ocuparemos”. E mais e

mais. (WAINER, 2006, apud BOLETA, 2006).

Percebemos que a “imaginação toma o poder” desde as cavernas de

Altamira até maio de 1968, em Paris, chegamos aos dias de hoje bombardeando

os muros da cidade com apelos de “é proibido proibir”, uma ordem da juventude

que por meio da escrita urbana demonstrava sua revolta e questionava as

ideologias dos sistemas dominantes. Esse despertar parisiense é conhecido como

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um dos primeiros registros oficiais do graffiti em nossa contemporaneidade.

Paralelamente aos eventos parisienses, frases como “abaixo a ditadura” eram

escritas no Brasil, por manifestantes e estudantes com intuito de ir contra ao

regime militar em resposta à opressão política. Mensagens outras também foram

registradas ao longo desse período histórico, muitas em ações de protestos e

outras também no devir de indivíduos que, subjetivamente, ocupavam novos

espaços com escritas pelas ruas, gerando canais de comunicação e fluxos de

informação diferentes das mídias oficiais hegemônicas.

Movidos por uma inquietude humana, contra regimes, sistemas, imposições

e aliados a uma imensa vontade de comunicação, sujeitos marcaram os muros de

nossa história. Transgressão como essência, as armas são as subjetividades e as

tintas e muros os meios mais acessíveis ao processo e à uma excelente

audiência. Inúmeros desdobramentos artísticos, sociais e importantes

manifestações políticas trouxeram os indivíduos às ruas numa oportunidade de

expressão singular, na qual permeia os tags/pixos/graffiti.

Ao caminhar pelas ruas somos bombardeados por informações,

transmitidas, no que se refere ao espaço urbano, por signos e códigos, inseridos

em publicidades, intervenções urbanas e sinais de organização social, entre

outros.

Décio Pignatari em Informação, Linguagem, Comunicação (s/d), comenta a

respeito da implosão da informação:

Somos continuamente bombardeados por uma massa heterogênea de

informações que nos urgem e pressionam a, seguida renovadamente, buscar-

lhes uma ratio, uma rede significante de relações, dentro e fora de nosso campo

específico de atividades. A implosão da informação nos convida e força a

estabelecer relações, é um convite e um comando a perceber estruturas – e

toda síntese é estrutura. (PIGNATARI, s/d, p.59).

É nesse udigrudi urbano que nos relacionamos com as informações e que

nos possibilitam as mais diferentes percepções. Para muitos, os ruídos causados

pelas intervenções e poéticas urbanas trazem desconforto, assim como são alvo

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de críticas pelo fato de estarem presentes, muitas vezes, apenas pela vontade de

quem o fez, sem a necessidade de autorização, produzido com autonomia e sobre

qualquer forma de censura, muitas vezes pela invasão da propriedade privada.

Mas as intervenções urbanas não são apenas os carrascos e vilões da cidade,

elas também despertam a atenção, causam suspiros e, desde sempre, possuem

status de obra de arte e são inseridas nas instituições que as atestam como tal.

Segundo Guilles Deleuze em O que é filosofia? – Percepto, Afecto e

conceito, no que se refere à arte e sua relação com os indivíduos: “Ela é

independente do criador, pela auto-posição do criado, que se conserva em si. O

que se conserva, a coisa ou a obra de arte, é um bloco de sensações, isto é um

composto de perceptos e afectos.” (1992, p.213). Esses “perceptos e afectos”,

gerados nessa relação do ser com a obra, são independentes e individuais, muitas

vezes produzidos a partir de concepções e cânones preestabelecidos ou ditados

por blocos hegemônicos, e podem ser também gerados na própria questão de

identificação indivíduo/obra, seja cultural, simbólica e/ou imaginária. A leitura da

cidade é, de certa forma, um caminho percorrido pelo indivíduo e suas relações

com os códigos e signos.

Guy Debord, em Apologia da deriva; escritos situacionistas sobre a cidade,

aponta a observação urbana sobre certos “processos do acaso e do previsível” e

descreve esse fenômeno como uma forma de “psicogeografia” (apud Jacques,

2003, p.39):

A palavra psicogeografia, proposta por um cabila analfabeto para designar o

conjunto de fenômenos observados pelo nosso grupo no verão de 1953, tem

sua razão de ser. Faz parte da perspectiva materialista do condicionamento da

vida e do pensamento pela natureza objetiva. A geografia, por exemplo, explica

a ação determinante das forças naturais gerais, como a composição dos solos

ou dos regimes climáticos, sobre as formações econômicas da sociedade e, por

isso, sobre o conceito de mundo que esta pode ter. A psicogeografia seria o

estudo das leis exatas e dos efeitos preciosos do meio geográfico, planejado

conscientemente ou não, que agem diretamente sobre o comportamento afetivo

dos indivíduos. O adjetivo psicogeográfico, que guarda uma imprecisão

interessante, pode portanto ser aplicado aos dados estabelecidos por esse

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gênero de pesquisa, aos resultados de sua influência sobre os sentimentos

humanos e até, de modo mais geral, a qualquer situação ou conduta que

pareçam provir do mesmo espírito de descoberta. (DEBORD, 1955, apud

JACQUES, 2003, p.39)

Para Guy Debord, a leitura observada por seu grupo, se deu nos

parâmetros geográficos, nas condições das cidades e suas relações afetivas e

econômicas com os indivíduos. No caso das poéticas urbanas tags/pixos/graffiti,

essa leitura é feita a partir dos espaços como possibilidade de inscrição e,

também, da decodificação das inscrições presentes. Tal leitura é o que transforma

e impulsiona as relações dos escritores urbanos, no que se refere à abertura de

“blocos” de percepções gerados pela implosão/decodificação da informação

escrita no espaço urbano, promovendo uma comunicação que segue em

constante movimento até os dias de hoje. Dessa forma, os “perceptos e afectos”

são sentidos nesses códigos e signos, por meio da leitura dos tags/pixos/graffiti.

Seja pelo estilo, caligrafia, ousadia do espaço - no alto de prédio, nos trens – essa

comunicação foi baseada na autonomia das expressões e fomentada pela troca

de informações.

Os tags/pixos/graffiti apropriaram-se das cidades sem pedir autorização,

viajaram o mundo sem passaporte e hoje formam uma das expressões mais

presentes nos grandes centros urbanos. A origem dessa inquietude parece ser um

misto de provocação com brincadeira, porém, os sujeitos, as intenções e as

geografias são tão plurais que seria impossível classificar, homogeneizar e muito

menos rotular ou estabelecer adjetivos a essas ações.

Escrever nas paredes das cidades, nos trens e nas demais superfícies foi à

maneira na qual os grupos de jovens encontraram para dialogar e transmitir suas

subjetividades. De maneira ilegal e muitas vezes considerada criminosa os

tags/pixos/graffiti invadiram os quatro continentes. Sua mais bela especificidade

é que, mesmo sem serem convidados, os sujeitos foram às ruas e tomaram seus

lugares, divulgaram sua cultura através folhetos, revistas, filmes e documentários

com grande orgulho dessa atitude e postura. Atualmente, os registros dos

tags/pixos/graffiti são proliferados pela grande rede de informação, a internet,

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tecendo redes de relacionamento, discussão e aproximação, como já citado na

introdução. No capítulo seguinte falarei com mais ênfase sobre essa articulação.

Os relatos que seguem compõem em parte o cenário das manifestações

urbanas. Minha intenção é trazer um registro histórico dos tags/pixos/graffiti, por

meio de uma narrativa não linear, buscando uma visão poética sobre as ações e

também apresentar alguns canais de mídia que ajudaram a divulgar essa

expressão cultural, produzidos de maneira autônoma, pelos indivíduos e grupos,

ou pertencente ao sistema tradicional e dominante de comunicação.

1.2 O berço e a essência.

Nomes e pseudônimos bombardeados em códigos e signos traçam essa

rede de comunicação de tags/pixos/graffiti, marcam o território e fomentam a

autorrepresentação do indivíduo perante esse espaço interferido e seus sujeitos.

Para os grupos de jovens urbanos, escrever nas ruas é uma ação caracterizada

aqui no Brasil por “rolê”. O rolê pode ser descrito como o conjunto de ações que

um indivíduo faz no espaço urbano para criar relações com os indivíduos de seu

grupo e, também, com os que circulam por essas geografias marcadas à tinta.

Dois aspectos, descritos nos itens abaixo, são de grande relevância para

tentar entender e, se possível, traduzir um pouco da essência e da mágica desse

universo dos tags/pixos/graffiti:

1.2.1 Ver e ser visto

Essa é uma das questões mais fortes para a produção das intervenções, a

visibilidade e a fama, o ibope, como chamamos no Brasil. Ele se dá muitas vezes

pela repetição, quanto mais lugares melhor. A escolha e ousadia do lugar é um

fator de grande importância, quanto mais alto ou mais arriscado e perigoso

melhor. É claro que a questão da apropriação do espaço pode vir a ter

diretamente uma relação com a intervenção pensada para aquela especificidade,

e também completa o sentido da obra. Porém, em suma, o impacto final do

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conjunto é o que realmente conta e conduz ao ibope, seja ele percebido ao vivo ou

por registro, promovendo certa competição e estabelecendo uma enorme rede de

signos que se comunicam entre os indivíduos.

1.2.2 Estilo

Estilo é uma das coisas mais importantes no meio dos grupos e também

para a percepção das intervenções. No início em Nova Iorque, o graffiti era

transmitido basicamente por letras e essas caligrafias foram trabalhadas por

gerações, construídas e desconstruídas por diversos sujeitos. Depois, vieram os

desenhos de personagens e alguns o levaram a abstração. Essas mudanças se

davam, tanto na troca de informações, por meio dos cadernos, agendas e folhas,

quanto na percepção no meio urbano e nas referências registradas nos canais

tradicionais de comunicação, em sua maioria impressos. No Brasil desenvolvemos

uma caligrafia própria que foi intitulada de pixação, movimento que será abordado

mais adiante.

Carlos “Mare 139”, ícone old school13 (velha escola que pintava os trens em

Nova Iorque, por volta de 1976), comenta, em sua entrevista a Chris Pape (a.k.a14

Freedom) extraída do livro, Born in the streets: Graffiti (2009), que a única maneira

de desenvolver seu próprio estilo é estudar e praticar com outros escritores, o que

eles chamavam de bitting. Para ele, todo grande style master faz isso e esse fato

traz longevidade à cultura. Ainda cita que isto não é uma coisa depreciativa e para

demonstrar esse processo diz: “One of my favorite artist was a brillant “bitter”.

Pablo Picasso”. (PAPE, 2009, apud CARTIER, 2009, p.62)

É por meio do estilo que os escritores são reconhecidos e valorizados e

suas expressões vão conquista audiência e potência.

Os irmãos, Osgemeos, escritores consagrados por seu estilo próprio e pela

grande produção ao redor do mundo, atualmente no mainstream dos circuitos das

artes, contam um pouco a respeito da questão “estilo” em entrevista para o site

13

As terminologias foram aqui citadas em inglês para preservar a expressão dita pelo próprio escritor em entrevista, visto que uma tradução poderia alterar o significado e o impacto do termo. 14

A.k.a. - Also known as - sigla para “também conhecido como”.

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www.lost.art.com.br:

É engraçado isso, "estilo", a palavra estilo às vezes te limita, por exemplo, você

tem um estilo e pronto, às vezes as pessoas que não sabem desenhar acabam

tendo mais estilo, porque nunca desenhou antes na vida, nós sempre

desenhamos, sempre procuramos ser nós mesmos, a desenvolver o desenho,

no começo copiávamos outros artistas, nosso irmão mais velho Arnaldo

desenha e nossa mãe também, eles sempre nos influenciaram, crescemos

vendo nosso irmão desenhando, e ele nunca se preocupou com essa coisa de

estilo, acho que e uma coisa muito natural, acho que estilo no traço você nasce

com ele , você pode aperfeiçoá-lo ou matar toda aquela coisa inocente no seu

traço, em busca de um estilo perfeito, nosso estilo hoje é uma mistura de tudo

que agente gosta, desde pequeno nos levamos a sério desenhar, a aprender, e

é engraçado que nos chegamos ate aqui pra ver que estilo é uma coisa que

você já nasce com ela, um dia um amigo nosso, Speto, nos disse; pega tudo

que você admira em outros artistas mais aquilo que ta dentro de vocês bate

num liquidificador , que começa a amadurecer seu estilo.foi o que fizemos ,

então isso tudo nos ajudou (http://www.lost.art.br/osgemeos_interview_01.htm,

2003, acessado em 28 de outubro de 2008).

Dentro dessas características existem variações e muitos desdobramentos

a respeito das intervenções urbanas contemporâneas. A cada escritor cabe suas

ideologias e intenções. A relação e a postura para com os outros escritores e para

com o próprio meio são aspectos que não podem ser abrangidos em sua

totalidade, devido à intangibilidade da subjetividade alheia. Visto que as

intervenções urbanas adentraram no sistema e mercado das artes e dentro desse

campo os tags/pixos/graffiti também se tornaram grandes negócios, a rua

possibilitou uma visibilidade ímpar.

Porém, produzir intervenções nas ruas requer acima de tudo atitude. É

necessário sair da zona de conforto e buscar na cidade algo que preencha e

motive a própria existência, seja ela, a expressão de sentimentos de raiva, revolta,

amor, oposição, protesto, seja pela questão das cores, das formas, do próprio ato

em si, a adrenalina, a brincadeira, o jogo, a fama, ibope, fatores esses que

chamarei de inquietude. Esses aspectos acima citados têm influência e referência

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às origens e raízes dessas manifestações denominadas tags/pixos/graffiti, e

trazem consigo questões sociais, políticas, econômicas, psicológicas, artísticas,

enfim, humanas, tão amplas que essa pesquisa não conseguirá abranger, tanto

pela complexidade quanto pelas limitações de tempo, energia e conhecimento.

É por meio do vandalismo15 e da apropriação dos espaços urbanos, sejam

eles propriedades privadas ou estatais, que esses sujeitos marcam seus nomes

na história de nossa sociedade contemporânea.

1.3 Sobre os tags/pixos/graffiti

As tags parecem ter sido os primeiros a aparecerem na cidade de Nova

Iorque. Essas imagens são formas visuais de (re)screver o próprio nome e deixar

uma assinatura.

Para Célia Antonacci Ramos,

Escrever o próprio nome tem, assim, uma dimensão mágica que tira o indivíduo

do anonimato, assinala sua presença e a conseqüente posse do objeto. Esse

desejo é registrado em muitos ritos e se encontra, primitivamente, nas cavernas

quando o homem já marcava sua presença e possessão do espaço quando

imprimia suas mãos. (1994, p.48)

Muros, trens e demais superfícies foram marcadas com nomes ou

pseudônimos, quase sempre agregados a números que muitas vezes

identificavam o nome da rua ou da linha de ônibus no qual os escritores viviam

e/ou circulavam. Artistas como Julio 204, Cat 161, Cornbread e Taki 183 foram um

dos pioneiros a pintar seus nomes nas estações de metrô e ao redor de

Manhatan. O primeiro escritor urbano nova-iorquino a ter seu nome escrito em

jornais foi Taki 183 www.taki183.net. No verão de 1971, as tags de Taki 183s

despertou a atenção de um repórter do New York Times e as portas foram

abertas, ou melhor, o graffiti entrou na mídia. 15

Para muitos escritores esse termo não configura uma forma depreciativa de traduzir suas expressões, mas é um dos

aspectos fundamentais para sua produção. Seguirei com essa opinião não fazendo apologia, mas pelo fato desse termo ser realmente uma questão de grande importância para a valorização dos escritores dentro de seus grupos, grifes e também da própria cultura.

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Nicholas Ganz conta que as tags se ampliaram tanto na quantidade quanto

no próprio tamanho até se transformarem nos primeiros “pieces” (abreviação de

“masterpiece” – obra-prima). (2008, p.8).

Logo as tags começaram a ser desenvolvidas e elaboradas com grande

habilidade estética, as letras ganharam volumes, cores e formas, e muitas vezes

eram associadas com desenhos de personagens criados pelos próprios artistas ou

então apropriados das culturas de massa, nascendo assim essa identidade bem

marcante do graffiti. Letras desenhadas em muros nos guetos do Brooklyn e Bronx

ganharam um novo espaço: os trens. Uma das influências mais marcantes do

graffiti nova-iorquino para o resto do mundo foi à pintura nos trens e metrôs, que

proporcionava a visibilidade e audiência por um número bem maior de pessoas.

Com a mesma quantidade de material que se pintava um muro também se podia

pintar um trem que circulava em diferentes trechos da cidade e, então, a imagem

seria vista por um maior número de pessoas. Havia também a questão da

dificuldade e da ilegalidade, fatores que proporcionavam status para o escritor.

Com essa atitude, os escritores urbanos começaram a criar e ampliar seus canais

de comunicação e fomentar sua autorrepresentação.

Célia Antonacci cita Baudrillard, que nos anos 1980 já dizia que o graffiti de

Nova Iorque era uma “rebelião que consistiria em dizer: „Eu existo, eu sou tal, eu

habito esta ou aquela rua, eu vivo aqui e agora‟” (1979, apud RAMOS, 1994,

p.14), e também relata que “esses grafites surpreenderam a população,

afugentaram os turistas dos metrôs e foram combatidos pela polícia” (1994, p.14).

Coco 144 comenta, também em entrevista extraída do livro, Born in the

streets:Graffiti, que o primeiro trem foi pintado em 1973, no túnel 1, na 37th Street,

e que a pintura dos trens se tornou um ritual semanal. Para ele, sua meta era a de

pintar um tag em cada vagão, isso com a idade de treze anos. A competição era

então por um maior número de tags em cada vagão, depois pelos maiores

“pieces”. (2009, apud CARTIER, 2009, p.18).

Artistas como Seen, Lee, Dondi, Stayhigh 149, Zephyr, Blade, e Iz the Wiz

tornaram-se ícones dessa cultura pela qualidade e quantidade de trens pintados

segundo Nicholas Ganz. (2008, p.09). Alguns desses artistas protagonizaram dois

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dos mais importantes filmes sobre esse movimento, o documentário Style Wars16

e o filme Wild Style17. Tais filmes foram responsáveis por influenciar gerações nos

mais diferentes cantos do planeta. Além da cultura hip-hop, que sempre exerceu

forte influência sobre os jovens, esses filmes registraram uma época áurea do

movimento, atrelado as suas raízes e aos seus elementos: música, dança, graffiti

e poesia.

A relevância dos registros das ações e fenômenos culturais é de grande

valor para o fortalecimento da identidade e, os filmes acima citados, juntamente

com materiais gráficos da época, foram responsáveis, em grande parte, pela

explosão dessa cultura ao redor do mundo. Outra questão que influenciou e

ajudou a difundir o graffiti foram as viagens feitas pelos escritores nova-iorquinos e

o intercâmbio com outros artistas, principalmente europeus, e logo, os trens da

Europa começaram a ser atacados.

Para executar as pinturas, os escritores tinham seus próprios métodos,

cada linha descoberta era guardada com sigilo. Para isso, era preciso

conhecimento do local e ousadia; alguns chegavam a roubar as chaves dos trens

e copiá-las, para em seguida trocar ou vendê-las, permitindo assim acesso ao

interior dos trens. Grades cortadas, trancas arrebentadas, rostos encapuzados,

fuga, tudo isso faz parte do universo dos tags/pixo/graffiti. O momento da

pintura nos trens requer atenção dobrada, a adrenalina é sempre alta e não é

possível cometer erros para não ser pego pelos policiais e seguranças dos trens.

Lee “Quinones” conta no livro18, Getting Up: subway graffiti in New York

(1982), escrito por Craig Castleman, sobre o dia em que ele e alguns poucos

amigos resolveram pintar um trem inteiro. Para eles, essa ação demandou um

trabalho intenso para a compra das latas, horas e horas de esboços em papéis e

cadernos, além da descrença de outros escritores. Foram meses de projeto para o

início, entretanto, logo na primeira tentativa não foi possível finalizar, devido a

incidentes e ao suposto aparecimento dos policiais. Durante a fuga, um dos

16

Documentário sobre a cultura do hip-hop produzido por Tony Silver e Henry Chalfant, em New York City em 1983. 17

Wild Style foi o primeiro filme sobre o movimento do hip-hop. Produzido em 1983 por First Run Features o filme foi dirigido por Charlie Ahearn e com atuação de Fab Five Freddy, Lee Quinones, the Rock Steady Crew, The Cold Crush Brothers, Patti Astor, Sandra Fabara e Grandmaster Flash. Os protagonistas encenaram papéis fictícios e um deles chamado "Zoro" foi representado pelo lendário escritor nova-iorquino "Lee" George Quinones. 18

Tradução livre do autor. As expressões seguem em Inglês para manter a fidelidade e veracidade do texto.

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escritores afirmou para Lee que eles teriam que voltar àquele lugar para terminar

de pintar os trens, pois, não tinham concluído o planejado. Lee descobre que na

verdade não tinha sido a polícia, mas uma brincadeira sem graça de um dos

amigos, então, eles voltaram na próxima noite e estava tudo como havia sido

deixado no momento da fuga, as latas, a câmera fotográfica e até a bolsa de sua

mãe estava lá. Assim, eles continuaram a pintura dos trens, deixando o local por

volta das seis da manhã, e por volta das sete o trem sairia para fazer sua linha.

Lee chegou à estação e lá estavam alguns outros escritores já comentando a

pintura do trem de maneira negativa “It´s bad style Lee”, “It´s bad!”. Lee, surpreso

com os comentários saiu e pegou um trem, em direção ao Bronx, para a estação

na qual ele teria a possibilidade de ver todo o trem. Chegando lá, mais duas

meninas esperavam o trem e, ele ansioso gritava “look at that train”, as meninas

não entendiam e Lee: “it´s comming!” - e as meninas: “what´s comming?”. Lee

descreve sobre o reflexo das cores sobre os raios de sol, comparava o trem a um

cavalo cavalgando em direção deles e dizia: “there it goes”, o entusiasmo era total:

“There it goes”. Lee conta que de tão entusiasmado esquecera-se de bater as

fotos e seu amigo gritava em seu ouvido: “the pictures!” e, Lee mal conseguiu

registrar o momento. Conta ele que as duas garotas estavam paralisadas, de boca

aberta, e que era possível ver um brilho em seus olhares.

Este fato ocorreu duas semanas antes do Natal e, como não tinha

conseguido registrar bem, devido ao entusiasmo, Lee entrou no trem pintado e

esperou o momento certo para puxar a trava de emergência que paralisaria o trem

permitindo a saída e uma visão perfeita (ação já bem freqüente e dominada pelos

escritores da época). Conta ele que estava agora entre dois vagões e inúmeras

pessoas em volta que não faziam a menor idéia de quem tinha pintado o trem, e

então Lee começou a perguntar para as pessoas, “How do you like it, people?” e

as pessoas respondiam positivamente e outros espantados, as crianças gritavam

“Mickey Mouse”, pois Lee tinha pintado uma figura do rato mais conhecido pelos

americanos para realmente brincar com suas mentes, como ele mesmo

descreveu. Para ele, era como se estivesse numa exposição de arte e seu trem

era a obra capaz de gerar “blocos de perceptos e afectos” nos mais diferentes

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indivíduos. O trem começou a sair e, então, Lee e seus amigos ergueram a

cabeça e gritaram “Yeah, Fabulous Five” (CASTLEMAN, 1982, p.02-11).

Esta fábula aqui apresentada faz parte da história de um grupo de artistas

que até hoje influenciam – por meio dos registros - e resgatam a essência do

movimento hip-hop, e principalmente do graffiti. A partir desse evento os

“Fabulous Five” se tornaram os “Kings”19 da rua e se tornaram lendas. A narrativa

desse episódio ilustra muito bem questões importantes da cultura do graffiti. O

planejamento da ação, a ousadia, os riscos e a mágica do momento. Um fator de

grande relevância é também a questão da comunicação com os outros escritores,

o “diz que me diz”, a competição entre eles e a busca pela superação. Em seguida

o reflexo disso está na importância do registro, das fotos, que seriam uma das

melhores maneiras de mostrar aos outros devido à efemeridade da pintura,

conquistando assim “seus 15 minutos de fama”.

Nicholas Ganz afirma que em meados da década de 1980 não havia

sequer um trem que não havia sido pintado. Um dos melhores registros dessa

época pode ser visto no livro “Subway Art”20 publicado primeiramente em 1984

pela Thames & Hudson, produzido pelos fotógrafos Martha Cooper e Henri

Chalfort. Esse livro contém inúmeras fotos dos trens e dos escritores, nos mais

diversos ângulos e agrega uma eximia descrição do movimento, com histórico,

vocabulários, técnicas, enfim, um perfeito canal de transmissão e proliferação da

cultura. Atualmente, as pinturas em trens, além de atraírem inúmeros escritores,

são ações ainda muito arriscadas. Contudo, promovem o escritor urbano a grande

reconhecimento e respeito.

A pintura em trens tornou-se uma das atividades mais procuradas pelos

escritores da época. Porém, por volta de 1986, essa cena mudou quando as

autoridades de Nova Iorque resolveram fechar o cerco, literalmente, aumentando

a segurança nas linhas de trem. Cartazes foram colocados com recompensa

àqueles que tivessem informações sobre pessoas envolvidas com o graffiti. Para

19

“Kings” - reis das ruas - seriam conquistar o Ibope máximo, é muito comum ver junto as assinaturas o desenho de uma

coroa. 20

Este livro é facilmente encontrado para download via “Google - rapidshare” e muito bom de ser visto pela qualidade e

poética das fotos, bem como, pela sua organização.

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eles, o graffiti era o “destroyer of our beautiful neighborhood”. (CARTIER, 2009,

p.91).

A polícia começa então a perseguir mais e mais os escritores e pintar nas

ruas realmente passou a ser uma ação criminosa. A descrição policial traçava um

perfil comum dos “graffiti ofender” como sendo homens, negros ou porto-

riquenhos, estudantes de baixa classe social, com idade entre 13 e 16 anos.

Enquanto alguns escritores eram presos, outros eram conduzidos às mais

importantes galerias, museus e bienais ao redor do mundo. Um dos maiores

exemplos é o artista Jean-Michel Basquiat, nascido no Brooklyn. Por volta de

1977, aos 17 anos, ele e um amigo, Al Diaz começaram a escrever frases em

prédios abandonados em Manhattan. Assinando com o pseudônimo SAMO ©

("SAMO shit", "same old shit", ou, traduzindo, "a mesma merda de sempre").

Basquiat escreveu frases como: “SAMO © as a new form of art; SAMO © as a

alternative of God; SAMO © saves idiots.” Segundo Leonhard Emmerling na obra

Basquiat (2005), “o projeto SAMO © atacava a especiosidade da sociedade

materialista”. Basquiat insultava aqueles que ele queria contatar através de seu

graffiti, os “Yuppies”, e que mais tarde viriam a comprar suas obras com os

“dólares do papá21”. Para Leonhard Emmerling, SAMO ©, na essência, era uma

espécie de religião, “uma contestação contra a forma como a sociedade usava

seus valores e ideais, um produto artístico concebido para uma sociedade

emproada”. (2005,p.12).

Leonhard Emmerling ainda aponta que Basquiat, assim como outros

artistas de sua época,

passaram da pintura das carruagens do metropolitano para as telas das

galerias, de serem ignorados a andarem de inauguração em inauguração,

somente para depois serem bruscamente abandonados mal o interesse por

eles morresse.(2005,p.14).

De Nova Iorque, o graffiti migra para as demais capitais mundiais. Em

Berlim temos uma das suas mais fortes expressões concretizadas em um muro

21

Expressão usada por Basquiat nos muros.

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construído para a segregação de um povo e símbolo de um autoritarismo

perverso, como diz Célia Antonacci (1994) em sua pesquisa. Construído

fisicamente em 1961, o muro começou a ser pintado por volta de 1980. Seus

blocos sustentavam poemas concretos como “Poder é sempre sem amor, amor

nunca é com poder”. Também junto com as frases vieram as pinturas figurativas, o

famoso beijo, e assim o muro se tornou um endereço cobiçado por artistas de

vários lugares do mundo, como o artista norte-americano Keith Haring.

Entre 1989/90, após a Queda do Muro de Berlim, 100 artistas de várias

regiões do planeta foram convidados a pintar um espaço denominado East Side

Gallery. Atualmente, com cerca de 1,3 Km de comprimento, fica entre

Oberbaumbrücke (Ponte Oberbaum) e Ostbahnhof, e é cotidianamente atacado a

spray, pincel ou rolo. Denominada a maior galeria de arte a céu aberto, esse

espaço conta parte da história do graffiti, bem como da humanidade, no que se

refere ao sentimento pós-guerra vivenciado por uma geração. Esse restante do

muro tornou-se um grande livro urbano, com registros de gerações inscritos em

suas páginas.22

1.4 Agora é “nóis” - Brasil

São Paulo vem a ser o berço do graffiti nacional. Por volta de 1978, um dos

primeiros a pintar as ruas foi o etíope Alex Vallauri, que com seus stencils

espalhados pela cidade influenciou uma série de outros artistas. Entre 1982/83

Vallauri esteve de passagem por Nova Iorque, considerada um ícone na cena do

graffiti mundial. Nessa época, a cidade estava vivenciando seu “boom”, motivo

22 Em 2008 tive a oportunidade de visitar Berlim e ainda por cima deixar uma marca desta passagem junto com as

milhares de intervenções feitas em quase 20 anos de existência. Quando voltei novamente em 2009 o muro estava quase

todo reconstituído para a comemoração dos 20 anos de sua queda, e as marcas todas apagadas ou pela revitalização das

pinturas ou por tinta branca. Talvez estas marcas tivessem deixado o muro mais humano, esteticamente caótico, porém

com registros de várias histórias contadas e que agora sobrevivem na memória das pessoas ou então registradas por

câmeras e impressas em papel fotográfico ou postadas em algum site da internet. A efemeridade do graffiti tornou-se algo

questionável depois do surgimento do espaço virtual e este assunto será trazido com maior riqueza nos capítulos que

seguem.

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esse que atestou grande visibilidade para o artista rendendo-lhe o título de

pioneiro no graffiti brasileiro. Vallauri morreu em 27 de março de 1987, data que

posteriormente tornou-se o dia nacional do graffiti no Brasil. (MANCO, 2005, p.15).

O livro graffiti brasil (2005) aponta que, mesmo não sendo tão

documentado como em Paris ou em Nova Iorque, o graffiti produzido por meio do

stencil foi um movimento de massa no Brasil e artistas como Hudnilson Jr,

Maurício Villaça e Jorge Tavares fazem parte dessa história. A pesquisa de Célia

Antonacci apresenta dois grupos influentes nesse período em São Paulo: o grupo

dos artistas Vallauri, Carlos Matuck e Waldemar Zaidler e o grupo Tupinãodá.

Presentes nas ruas de São Paulo, esses dois grupos também fizeram parte de

exposições em galerias de arte. Em 1987, Alex Vallauri, Carlos Matuck e

Waldemar Zaidler participam da Bienal de São Paulo. Vallauri com a “Rainha do

Frango-Assado”, Waldemar Zaidler com o trabalho “Siesta” e, Carlos Matuck com

um trabalho intitulado “Joaquim, Mário e Afonso”, em homenagem aos escritores

brasileiros Joaquim Machado de Assis, Mario de Andrade e Afonso Lima Barreto.

Na dissertação de mestrado de Sérgio Miguel Franco, Iconografias da

Metrópole: grafiteiros e pixadores representando o contemporâneo (2009), o autor

divide os acontecimentos pertinentes a historia das intervenções urbanas no Brasil

em três períodos:

Pioneiros – de 1970 a 1980

Old school – 1990 a 2000

New school – a partir de 2000

Dentro desse panorama, o autor pontua os artistas, suas intervenções e

suas relações com o campo da arte contemporânea e seu respectivo mercado.

Seguirei esse modelo de divisão pela coerência das datas e das influências que

cada período possui. O objeto desta pesquisa vem a ser a produção cultural e

seus meios de comunicação, autônomos ou inseridos nos sistemas tradicionais,

bem como as trocas de informações pelas redes de relacionamento.

No grupo dos pioneiros estão os artistas acima citados, com seus stencils,

performances e frases ocupando o espaço urbano. Franco apresenta a pesquisa

de Arthur Lara que descreve as primeiras intervenções em São Paulo sobre três

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perfis diferentes, ligados ao conteúdo e também aos seus propositores. As frases

como “Abaixo a ditadura” eram feitas por estudantes e manifestantes, já as frases

do tipo “Gonha mó breu” eram produzidas por jovens dos bairros da Lapa e do

Alto de Pinheiros e eram restritas a esses bairros. Por último as frases

“publicitárias” como “Cão Fila Km 26” (LARA, 1996, apud FRANCO, 2009, p.32).

Para Franco, as intervenções dessa época relacionadas aos grupos de

artistas como Carlos Matuck, Vallauri, Rui Amaral, Jaime Prades, John Howard e

Carlos Delfino, e remetiam ao campo da arte conceitual e também à inserção em

espaços expositivos, visto que artistas como Jean Michael Basquiat e Keith Hering

tinham impulsionado suas carreiras artísticas, visibilidade e valor simbólico a partir

das intervenções urbanas e também na influência de grupos como Fluxus, ligados

as performances e a teatralidade das ações, diferente do movimento que

acontecia nas ruas de Nova Iorque.

A respeito da vinda do graffiti para o Brasil, relata Franco que a Bienal

Internacional de São Paulo foi de grande importância para elevar seu “status”.

Com inserções na década de 1980, a 17ª Bienal trouxe os artistas Keith Haring e

Kenny Scharf, momento que coincidiu com a recente consagração de Basquiat na

Documenta Kassel, em 1982, sendo o artista mais jovem daquela edição, anterior

aos trabalhos dos artistas da primeira geração. (FRANCO, 2009, p.35)

Em entrevista23 com Rui Amaral, um dos pertencentes ao grupo Tupinãodá,

o artista revela que iniciou suas práticas urbanas por volta de 1976. Nesse ano,

ele e um colega começaram a pintar nas ruas do próprio bairro o nome “Patrulha

Canábica”, com uma folha da maconha ao lado por meio de um stencil, a partir de

referências obtidas de um livro que seu colega trouxe dos EUA. Completa ainda

Rui Amaral, que os primeiros a “importarem” o modelo americano para as ruas de

São Paulo foram a geração “Old school” representada pela dupla Osgemeos, Alex

Hornest, Binho, Tinho e Speto, entre outros (AMARAL, 2007, apud FRANCO,

2009, p. 32).

É por volta do fim da década de 1980 que o movimento hip-hop chega com

força à cidade de São Paulo. Os encontros agrupavam jovens de vários cantos da

23

Entrevista concedida ao Sergio M. Franco em junho de 2007

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cidade misturando classes, promovendo uma cultura “importada”, que em pouco

tempo foi assimilada e tornou-se um dos mais fortes movimentos de periferia no

Brasil. O Largo São Bento24 e a Praça Roosevelt foram um dos berços da cultura

hip-hop, responsáveis por uma grande mudança na cidade de São Paulo. Os

encontros eram ritmados pelo rap25, embalados pelo break, coloridos pelos graffitis

e os Mc´s comandavam a festa. Em sua essência, ressaltavam a competição dos

grupos e a união das pessoas dos mais diferentes cantos da cidade, que iam ali

buscar inspiração, entretenimento, cultura e identificação. Esses encontros

serviam de estímulo para as ações nos bairros, que aconteciam quase que

simultaneamente, pois, na época os canais de mídias eram escassos e não

abrangeria este tipo de movimento.

Sergio Franco destaca então que “assim foram construídas as redes de

sociabilidade para estes jovens percorrerem a metrópole a partir dos „points‟ do

centro, tendência esta que foi assimilada e consolidada pela pixação.” (FRANCO,

2009, P.49). Dentre os artistas estavam Osgemeos, Zélão, Guerra das Cores,

Tota, Bonga, Kase, Victhé, Marrom, Binho,Speto, Herbert, Tinho e Rip, muitos

deles ainda na cena urbana e também percorrendo os circuitos e instituições de

arte.

Desse grupo de artistas os que possuem maior destaque na mídia e no

campo das artes atualmente são Osgemeos. Essa dupla paulistana, do bairro do

Cambuci, já estava presente, na década de 1980, nos encontros dos “points” do

graffiti (Largo São Bento) e do pixo (Ladeira da Memória, Praça da Estação do

metrô Paraíso e no Centro Cultural de São Paulo), seja dançando break, cantando

rap, ou pintando na rua. Muitos foram os fatores que levaram os irmãos ao

reconhecimento, primeiramente internacional e consequentemente em território

nacional. São naturais de um bairro onde foi possível estabelecer as mais

diferentes relações com todos os tipos de classe sociais, o que veio a ter grande

24

Atualmente existe um documentário sendo produzido por Guilherme Botelho (DJ Guinho) com intuito de resgatar e registrar a essência do movimento na época. www.temposdasaobento.blogspot.com/. Rodado entre os anos de 2007 a 2010, Nos Tempos da São Bento é um documentário que busca a memória coletiva do hip-hop. Um dos intuitos é resgatar a memória daqueles que fizeram a História do Hip-Hop, ocupando por vários anos o espaço do Metrô São Bento, no centro da cidade de São Paulo. Minuciosa, a estrutura discursiva nos leva ao conflito com o esquecimento; o ato social de se apagar fatos, pessoas e grupos da história. É justamente este conflito, apresentado através do exercício da narrativa, que se transforma em ação dramática, onde a personagem principal é a memória coletiva 25

Rhythm and poetry

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relação com suas futuras expressões. Inicialmente, eram diretamente

influenciados pelos graffiti´s nova-iorquino, estilo que preservam até hoje nos

throw ups, letras grandes bombardeadas com caráter transgressivo. No entanto,

foi através dos personagens e dos cenários lúdicos, denominados por eles de

“tritrez”, uma espécie de universo paralelo, que ganharam espaço no campo da

arte e atenção na grande mídia.

Segundo Tristan Manco (2005), um fator decisivo para esta transformação

e amadurecimento da dupla ocorreu em 1993, quando Barry Mcgee (a.k.a. Twist)

vem morar na cidade de São Paulo. Uma das experiências mais marcantes com a

cultura brasileira foi numa viagem a São Cristovão, interior da Bahia, onde o

americano teve contato com a religiosidade local que o inspirou e exerceu forte

influência sobre seu trabalho. Mas não foi apenas Barry Mcgee que obteve ganhos

simbólicos por entrar em contato com a cultura local. Em meio a um intercâmbio

de informações e encontros com Osgemeos, Mcgee mostrou-lhes um universo

novo por meio de seu próprio trabalho e das fotos e revistas que trouxera dos

EUA. O estilo do trabalho d´Osgemeos ainda seguia os cânones de origem nova-

iorquina, porém o artista americano espanta-se com a sua qualidade, tendo em

vista o isolamento e a falta de material na época. Conta ainda Tristan Manco que

além de apresentar um novo repertório para os irmãos, baseado nas linguagens

dos escritores urbanos americanos, Twist estimulou-os a buscar também

influências em suas raízes e cultura e, essa ruptura foi de grande ganho simbólico

nas futuras produções. Um dos grandes exemplos dessa influência da cultura

brasileira no próprio trabalho de Barry Mcgee está expresso no cartaz de sua

exposição, no museu Lasar Segall em São Paulo, em 1993. O cartaz traz as letras

com fortes características da estética da pixação, formando uma espécie de

moldura e no centro, estava desenhado um rolinho de pintar parede. O Brasil foi

responsável pela inserção da tinta látex de parede e do rolinho nas pinturas

urbanas, o que foi desenvolvido pelos escritores brasileiros principalmente devido

ao custo das latas.

Cedar Lewinsohn (Revista Folha, 2008) curador da mostra Street Art na

qual Osgemeos junto com outro escritor urbano brasileiro, o Nunca, participaram

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pintando a fachada do Tate Gallery, Londres, comenta em entrevista a Revista

Folha26, sobre as peculiaridades do graffiti brasileiro. Para ele a street art no Brasil

tem uma forma única e exclusiva o que a diferenciou das dos outros cantos no

mundo. Uma das razões vem a ser o fator econômico (o custo das latas) e

também o relativo isolamento que obrigou os jovens a improvisar e inovar com

novas ferramentas e maneiras de pintar. Cedar Lewinson descreve também que

quando o hip-hop chegou à Europa “as pessoas simplesmente o compraram na

prateleira”. Para ele, isso resultou numa mesmice, apontando que os graffiti´s

“eram muito similares em diferentes lugares do mundo” (Revista Folha, 2008, ano

17 # 827).

Os brasileiros reinventaram, de maneira autêntica, a linguagem dos

tags/pixos/graffiti e o convite para a exposição no Tate Gallery já demonstrava

tal alcance e interesse. Mas outros interesses não explícitos favoreceram também

tal abertura. As inserções nas instituições de arte possibilitam ganho de grande

valor simbólico e projeção no mercado da arte, fatores decisivos para a inclusão

destes artistas na mostra, devido aos interesses econômicos. Foram possíveis e

determinados pelas conexões d´Osgemeos com o grupo Art Unlimited, que foi

responsável pela coordenação da 23ª, 24ª e 25ª Bienal Internacional de São

Paulo, e que possui redes e conexões com museus e galerias internacionais

(FRANCO, 2009, p.55)

Em entrevista na Juxtapoz Magazine27, Osgemeos relatam que quando

Barry Mcgee deixa o Brasil, eles mantêm contato através de cartas com

depoimentos e fotos, pois na época não havia internet disponível. Tal conexão foi

de suma importância, tanto para Osgemeos quanto para a projeção do graffiti

nacional.

Tristan Manco (2005) descreve que em 1997 o Brasil já tinha uma cena

consolidada com revistas e vídeos, na maioria produzidos de maneira autônoma.

Dentre eles estão a revista Fiz, produzida pelos próprios Osgemeos, juntamente

com Herbert Baglione (Cobal) e inúmeros colaboradores de dentro da cena dos

26

Revista Folha, julho de 2008, ano 17 # 827 27

Revista americana de “art + culture”, uma das principais em street art e seus desdobramentos no campo da arte, galerias e museus. www.juxtapoz.com. Julho, 2010.

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tags/pixos/graffiti. Uma publicação feita para promover a cultura, registrar as

ações, os roles nacionais e internacionais, mostrar as diferentes ideologias a partir

de entrevistas, colaborando com a proliferação dos tags/pixos/graffitis e

valorizando seus sujeitos, principalmente aqueles que obtiveram espaço nesta

mídia.

Foi também Barry Mcgee que introduziu Osgemeos e a cena brasileira dos

tags/pixos/graffiti no editorial chamado 12 Oz Prophet, em 1997, fazendo com

que São Paulo se tornasse conhecida e desejada por muitos escritores urbanos e,

consequentemente, em 1998 surgiram os primeiros contatos via essa rede de

comunicação.

O primeiro grande encontro internacional foi realizado na Avenida 23 de

Maio, próximo ao Centro Cultural, onde escritores brasileiros e alemães

produziram um grande painel. Dentre eles estavam os nacionais da velha guarda,

Osgemeos, Victhé, Nina, Herbert e os gringos Codeak (Hildsheim), Loomit

(Munchen), Daim e Tasek (ambos de Hamburg).28 Diante desse cenário,

estabeleceu-se uma conexão e então, a convite de Loomit e Peter M, Osgemeos

viajam para a Europa e conhecem outras turmas de grafiteiros. Dessa forma, a

dupla conseguiu permanecer períodos viajando, hospedando-se na casa de outros

escritores.

O escritor Ges, da 3A CREW, comenta no livro, O mundo do grafite, que

“O vinculo internacional entre os grafiteiros é um dos aspectos da cultura que

parece ser exclusiva do grafite. (...) Somente no mundo do grafite é possível

descer de um avião em outro continente e acabar ficando na casa de uma

pessoa com quem você sequer tinha contato.” (GANZ, 2008, p.20).

Viajar vem a ser uma das riquezas mais importantes para a troca cultural,

28

A Alemanha possui uma das cenas mais intensas em relação à produção de tags, graffiti e intervenções urbanas. A

pintura nos trens e metros são uma característica muito forte e o preciosismo na criação das letras (estilo), no tamanho e na preservação das raízes da expressão ligadas ao vandalismo. Berlim é atualmente uma das poucas capitais que concorrem com São Paulo na questão de produção e quantidade. Uma das características mais interessantes são os lugares abandonados, antigas fábricas que se tornaram endereços cobiçados pelos escritores e possuem uma renovação constante, visto que é comum o “atropelo” dentro destes espaços. Outra grande constatação se dá no uso da tinta látex atualmente nos graffiti´s, uma espécie de desconstrução da forma, visto que os Alemães eram sempre enfatizados pelo preciosismo nas composições e nas letras 3D. Talvez por influência da pixação brasileira atualmente um dos trabalhos que mais tem chamado atenção dos escritores alemães são as pinturas no topo dos prédios com frases, e palavras pintadas com rolinhos e tinta de parede, trazendo grande valor simbólico e status para seus produtores.

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para o conhecimento de coisas novas, fomentando novas redes de

relacionamento, conexões e de mudanças a partir do contato com outros

costumes. A possibilidade de uma auto-análise nos faz descobridores e ao mesmo

tempo protagonistas de nós mesmos, a partir da maneira como deixamos que os

outros nos percebam e de acordo com os signos que comunicamos.

Para Osgemeos29 “viajar faz você conhecer melhor quem você é e de onde

veio”

No universo dos tags/pixos/graffiti talvez seja mais fácil notar as

mudanças de estilos, possibilitados pela troca com outros escritores e na própria

cultura, como um aspecto formação de uma identidade comum, mesmo que em

diferentes lugares e em constante processo de enriquecimento.

Os tags/pixos/graffitis podem falar vários idiomas, mas a língua oficial é o

spray na mão e a ação, na rua. As viagens consolidam um processo de grande

importância para o desenvolvimento de uma visão ampla a partir do conhecimento

de vários pontos de vistas.

A respeito das trocas e das mudanças nas viagens, Osgemeos30

descrevem que:

Quando nós começamos a viajar nosso trabalho era mais concreto. Nós

sabíamos naquele tempo o que queríamos em nosso trabalho. Viajar foi uma

conseqüência, logo foi fácil, porque as coisas que aprendemos nós somente

filtramos e observamos. Poderia ter sido diferente se tivéssemos viajado em

1987, por exemplo, nós seriamos apenas outros estrangeiros fazendo “wild

style”31

. Nós amamos isso e começamos dessa maneira, porém nós gostamos

de descobrir novas coisas também. Então, em todos esses anos nós

estudamos diferentes estilos para achar o que temos hoje. Para nós é melhor

porque podemos ver de maneira bem diferente e olhar mais do lado de fora e

então gostar mais ainda. Eu penso que quando os caras vieram para São

Paulo, em 1997, era a época em que estávamos começando a achar nosso

estilo, e nesse tempo nós estudamos muito para ver como evoluir nosso estilo,

visão e essência.

29

Em entrevista à Juxtapoz acima citada (julho 2010, #114, p.63). (Tradução livre do autor). 30

Idem anterior 31

Letras características da linguagem do hip hop com maior rebuscamento e efeitos gráficos.

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Foi necessário um escritor urbano americano, Twist, falar aos brasileiros da

importância de desenvolver uma linguagem própria, mais próxima de sua cultura,

para que os tags/pixos/graffitis do Brasil pudessem viajar primeiro em fotos e

imagens por meio da rede postal entre Osgemeos e Barry Mcgee, para então se

tornar uma publicação, chamada 12ozProphet. Revista que circulou e fez com que

a cena brasileira fosse notada e respeitada por todo o resto do mundo

possibilitando inúmeras conexões. Dessa forma, a conexão se dá geralmente pela

proximidade de interesses e também nas possibilidades de trocas, e esse corpo a

corpo vem a ser muito importante para a produção e renovação cultural. A escolha

pela dupla Osgemeos nesta pesquisa se dá pelo fato de que eles foram os

escritores que mais conseguiram usufruir e aproveitar das conexões, tanto no

campo do graffiti quanto no campo das instituições internacionais e mercado das

artes, sendo também pioneiros no processo de internacionalização dos

tags/pixos/graffiti brasileiros no mundo.

Outro grande momento cultural na história dos tags/pixos/graffiti, em São

Paulo, foi, no fim da década de 1990 e início dos anos 2000, a Geração do Beco/

Escola Aprendiz. Sérgio Miguel Franco (2009), em sua pesquisa, conta que esta

geração passou por um momento muito importante e de grande troca, produção e,

consequentemente, conflitos. Em primeiro lugar, a situação era a seguinte; estava

de um lado a ONG procurando desenvolver intervenções na Vila Madalena, bairro

de classe média, e de outro, os escritores urbanos sem estrutura e sem condições

para comprar latas.

Essa historicidade que venho apresentar não atesta de maneira alguma que

foi apenas em São Paulo que os tags/pixos/graffiti tiveram sua origem e suas

influências. Duas questões me remetem a tal recorte: uma é que a falta de

material específico e fontes bibliográficas de outros centros urbanos, o que traz

para São Paulo a maior expressividade; outra questão é que através desses

momentos históricos, torna-se possível tecer e apresentar os conceitos pilares

dessa dissertação dentro do recorte dos tags/pixos/graffiti.

Tim tchais (Martim Ancôna Amaral), um dos escritores pertencentes a esta

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geração conta em entrevista32:

Comecei a pintar nas ruas de São Paulo no ano de 1997, criamos entre amigos

um nome para nossa crew: Tchais, no inicio eram 5 a 7 pessoas que faziam

parte dessa crew, em 1999 fiz um curso com o grafiteiro Fabio Ribeiro o Binho,

onde muitas técnicas foram aprendidas, e exercitadas continuamente na rua,

onde é a verdadeira escola para se fazer graffiti. No ano 2000 surgiu a ONG

Aprendiz na região da Vila Madalena – São Paulo, essa ONG foi bastante

importante para a evolução do meu trabalho porque nos dava estrutura para

pintar: Espaço, tinta e escadas, além de ser um canal com outras empresas que

começaram a contratar os serviços dos artistas que ali se encontravam.

O escritor Binho, citado por Tim Tchais, é um dos “porta-vozes” do graffiti

perante as instituições artísticas e governamentais. É representante da velha

escola e um dos únicos a seguir com a estética tradicional do graffiti, com suas

origens nova-iorquinas, também proprietário de uma loja de material para graffiti e

responsável pela revista Graffiti: arte e cultura de rua. Assim, Binho vem a ser

detentor de um grande canal de mídia com capacidade de influenciar e promover

escritores e a própria cultura. Sérgio Franco traz a tona o fato de que na capa da

edição nº38, 2007, Binho aparece com o prefeito Kassab, da cidade de São Paulo,

responsável pelo projeto “Cidade Limpa” que “atropelou” de cinza inúmeros

tags/pixos/graffiti, escrevendo na parede, ao lado de um painel por ele

financiado na Av. Paulista, “isto que é arte”. (FRANCO, 2009, p.63).

Assim se caracterizava a nova escola, influenciados pelos escritores da

velha guarda, esses jovens escritores se encontravam frequentemente no

Aprendiz para ter aulas, produzir nas ruas e ainda fazer trabalhos e parcerias com

as empresas, um cenário e momento de grande riqueza cultural por agregar

diferentes perfis e também diferentes classes econômicas.

Dentre os escritores dessa geração destacamos Zézão (José Augusto

Capela), Boleta (Daniel Medeiros), Niggaz (Alexandre da Hora), Highgraff, Titi

Freak, Mazu, Tim Tchais e muitos outros. Alguns desses participavam dos

encontros nas oficinas e ações no Aprendiz.

32

Entrevista feita pelo autor em 2010

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Duas questões muito importantes, em relação a esse momento

histórico, definiram alguns caminhos para a cena artística urbana desse período. A

primeira foi a transformação do bairro da Vila Madalena em um grande laboratório

e principalmente um dos cartões postais da cidade de São Paulo para a cena dos

tags/pixos/graffiti, com referência no famoso “Beco do Batmam”. A outra questão

relevante foram os contatos com as empresas, mercado de trabalho e inserção no

campo da arte ligado às instituições que a representam. O laboratório, a fusão de

conhecimento e sinergia possibilitou uma vertente até então não difusa nas

pinturas, que foi a criação de um movimento ligado às formas abstratas, que

rendeu aos artistas grande visibilidade. Dentre eles destacavam-se Zezão,

Highgraff, Boleta e Tim Tchais. Em relação aos conflitos, em sua maioria eram

gerados em primeiro lugar à própria instituição Aprendiz, que rendia a seus

artistas uma pequena porcentagem e futuramente as próprias relações de

inserção de uns e exclusão de outros nos “jobs” e nos espaços expositivos. O

surgimento de galerias especializadas em comercializar “street art”, seguindo

moldes internacionais, também foi fator de grandes debates e proporcionou

diferentes posicionamentos. Enquanto uns, com dificuldades de se enquadrar nos

moldes do mercado ficaram a margem, outros puderam gozar de uma valorização

de capital econômico, simbólico e cultural perante as instituições e canais de

mídia. O maior exemplo é a “Galeria Choque Cultural”, que em seu site se define

assim:

O que é a Choque Cultural?

A Choque Cultural não é apenas um projeto de galeria comercial, envolve

também educação e compromisso sócio-cultural. A sua principal missão é

aproximar o público jovem das artes plásticas, incentivando o colecionismo,

produzindo conhecimento e promovendo intercâmbios. Desde a sua fundação,

em 2003, o projeto apresentou mais de 200 artistas brasileiros, trouxe para o

Brasil mais de 50 artistas internacionais, levou brasileiros à Europa e Estados

Unidos em mais de 10 grandes exposições, editou muitas gravuras e livros.

Criou um importante network global, entre galerias, artistas e colecionadores,

além de ter chamado a atenção de instituições e museus por todo o mundo

(www.choquecultural.com.br, acessado em 23 de janeiro de 2009).

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Alguns escritores tiveram oportunidades de participar de exposições

nacionais e redes, e foram levados a importantes conexões, enquanto outros não

tiveram possibilidade de ascensão, mesmo com potentes trabalhos nas ruas e

uma grande visibilidade entre os escritores.

Os canais de mídia começaram a falar mais sobre a inserção dos graffitis no

campo da arte e, em 2005, foi publicado um dos livros mais importantes, até então

um dos primeiros nesse formato “comercial”, com fotos coloridas e um precioso

trabalho gráfico, intitulado Graffiti Brasil33. Neste livro é possível conhecer um

pouco do histórico dos tags/pixos/graffitis no Brasil e também traz um número

grande de escritores urbanos com suas pinturas e informações sobre a vida e

trajetória de cada um resumida. Assim a cena nacional estava consolidada e

pronta para ser exportada, visto que o livro foi publicado em inglês. Dentre os

artistas, muitos deles estavam relacionados com redes e conexões dentro de um

mercado das artes e esta publicação trouxe maior visibilidade e possibilitou

ganhos simbólicos tanto para os escritores quanto para as instituições que os

representavam.

Como mostra a galeria Choque Cultural em seu próprio site.

Desde o início, uma boa parcela (50%) do que a Choque comercializa é

exportada, tanto de gravuras quanto de originais. Importantes parcerias e

associações nos tem garantido acesso ao mercado externo, que é muito

interessado no que temos apresentado. Hoje, estamos mais presentes nos

Estados Unidos, Inglaterra, França e Espanha. Por exemplo, em 2006 iniciamos

um programa de intercâmbio com a galeria Jonathan Levine, de Nova Iorque,

que trabalha com artistas e público semelhantes aos da Choque. Temos

mostrado continuamente artistas brasileiros lá e trazendo americanos para cá,

com sucesso de crítica e público para ambas as galerias. Na Inglaterra, desde

2005 temos uma parceria com o escritor britânico Tristan Manco, que tem entre

seus vários títulos lançados, o livro Graffiti Brasil (Thames and Hudson, 2005).

Essa parceria resultou na criação do site choquecultural.co.uk, responsável pela

distribuição mundial das nossas gravuras e no início de um ciclo de exposições

dos nossos artistas na Inglaterra (www.choquecultural.com.br, acessado em 23

33

Livro já citado anteriormente.

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de janeiro de 2009).

Os canais de mídias agora também serviam para valorizar os escritores e

trazer um aumento na audiência e principalmente uma projeção no mercado das

artes, pois esses estavam relacionados com interesses econômicos e eram

produzidos pelos setores hegemônicos. No caso do livro citado, foi escrito pela

mesma pessoa com a qual a “Choque Cultural” possui relações comerciais.

A partir da individualidade dos escritores urbanos, e da particularidade e

potência dos trabalhos, o mercado foi um divisor de águas, no que se refere a

visibilidade e ao ibope. Artistas como Zezão, que durante anos tinha inserido suas

pinturas nas galerias de esgotos, para se esconder e fugir de sentimentos

depressivos, buscando no isolamento um propulsor de seu processo criativo, teve

seu trabalho inserido em inúmeros espaços expositivos, inclusive no MASP em

2010, na exposição coletiva, “De dentro pra fora e de fora pra dentro”, e em mídias

distintas e publicados em território nacional e internacional. Zezão com seu

trabalho nas galerias subterrâneas do esgoto de São Paulo abriu outro canal de

aplicação e veiculação e problematizou também questões ambientais, bem como

conseguiu que os registros de seus trabalhos, em sua maior parte fotos e vídeos,

fossem também inseridos em espaços expositivos e institucionais, transferindo a

esses registros também o caráter de obra de arte.

Um grande marco nessa fase de internacionalização institucional dos

escritores e seus trabalhos, relacionados diretamente no meio urbano, foi a

exposição “Nas ruas de São Paulo” em 2007 na Jonathan Levine Gallery. Essa

mostra trouxe a ascensão comercial de uns e o “fracasso” financeiro de outros, em

se tratando das vendas, acompanhadas através da rede simultaneamente.

Todavia, o capital simbólico foi muito importante a todos. Também foram

levantadas supostas divergências dentro do próprio grupo, formado por Zezão,

Fefe Talavera, Highgraff, Kboco, Onesto, Speto, Titi Freak e Boleta.

Assim, os escritores, na cidade de São Paulo, se encontravam divididos em

grupos, cada qual com seus interesses e posturas diante do reconhecimento no

rolê das ruas, em relação às questões de estilos, em produções conjuntas de

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grande escala, e nos bombardeios, ligados ao vandalismo e ilegalidade das

intervenções, e nas relações com o mercado, tanto das empresas quanto das

instituições e circuito das artes. As “panelas” eram formadas e os debates

traçavam linhas de aproximação e de discussão em relação às posturas

assumidas. Dessa forma, as gerações vindouras encontraram um cenário que

tinha nas ruas uma grande possibilidade de visibilidade e, consequentemente,

foram surgindo outros grupos de convergência e divergência sobre as posturas

assumidas pelos membros das segunda e terceira geração.

1.5 Para quem sabe ler, um pixo é letra.

Dentro do cenário das intervenções urbanas, surge um braço originalmente

brasileiro. Este braço foi estendido com “extensor e rolinho” para alcançar grandes

dimensões nos viadutos. Também usou as pernas e a agilidade e subiu nos mais

altos prédios para deixar sua marca, mesmo que fosse necessário um plano

estratégico, quebrar as trancas das portas ou escalar, o importante era realmente

se fazer presente no espaço urbano. A história desse movimento caminha junto

com os tags e graffitis. Para Sergio Miguel Franco, seria possível traçar planos

distintos de análise e optar por apenas um deles seguindo pelas diferenças,

porém, “perderíamos um ponto fundamental da reflexão: a comunhão subterrânea

que eles possuem, tanto na história, quanto da prática como nas

interdependências processuais para interferirem na cidade.” (FRANCO, 2009,

p.20).

A relação histórica da pixação tem muito em comum com as raízes do

movimento hip-hop nos anos 1980, em que grupos de classes menos favorecidas,

e de regiões periféricas espancaram seus nomes nas superfícies do espaço

urbano. A grande questão em território nacional se dá na recepção dos diferentes

signos, visto que ambos possuem a característica de transgressão como ponto

crucial e a cidade como suporte, e se diferenciam pelo fator estético e questões

culturais nos códigos e signos.

Esses jovens tomaram a cidade. Atualmente a cidade de São Paulo está

totalmente coberta pela pixação. Entre os escritores, o que vale é a ousadia e a

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repetição, bem como as distâncias cruzadas registradas nos rolês escritos na

paisagem urbana.

A pixação possui um código de honra: L.H.P (Lealdade, Humildade e

Proceder). Dentro desse parâmetro os escritores se agrupam em “grifes” e

desenvolvem uma caligrafia própria, um alfabeto e são valorizados também pelo

estilo das letras, bem como pela singularidade dos caracteres. Na assinatura, ou

pixo, segue muitas vezes o nome da grife, aliado ao vulgo, a data e um “salve”

para outro escritor quando ausente, preso (código da lei) ou “falecido”. A questão

do grupo é muito importante. A pixação resgatou os antigos “points” de encontro,

que são organizados através de panfletos com as datas e locais. A postura dos

escritores, envolvidos nas pixações, são sempre de caráter anárquico e com

ênfase nas conquistas de maior ibope pelo grau de dificuldade e risco de cada

ação.

Com intenção de maior visibilidade, alguns escritores conseguiram veicular

seus pixos nos canais de mass media. Relata Sergio Miguel Franco (ano??), que

Boleta (Daniel Medeiros) em 1991 fundou com seu amigo Padre, escritor de

grande renome em seu bairro, a grife “Vicio”, que teve grande destaque e adquiriu

grande status no meio depois que estudaram e mapearam os locais onde as

câmeras da TV Globo extraíam as imagens para a corrida de São Silvestre, que

acontece tradicionalmente dia 31 de dezembro. Conseguiu que seus pixos fossem

televisionados, ação esta que foi apropriada por outros escritores e obrigou a rede

de televisão a mudar todo ano seu posicionamento das câmeras. Boleta também

foi o organizador do primeiro livro nacional a tratar das questões da pixação, com

fotos das intervenções e das ações. A partir da agenda do escritor, encontramos,

neste livro, toda uma postura e poética em relação aos valores e conceitos

culturais, bem como as páginas da própria agenda, registros feitos no caderno que

ilustra o repertório estético e cultural desse movimento. É comum aos escritores

colecionar e guardar numa pasta as assinaturas de outros escritores e grupos nas

chamadas “folhinhas”, dessa forma a comunicação se dá também pela troca e o

reconhecimento de grifes de regiões distantes. O lançamento do livro foi no dia 31

de janeiro de 2006, na casa da socialite paulistana Erika Palomino, evento cheio

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de divergências tanto por parte dos escritores que se viram inseridos num meio

distante de sua realidade, e, em resposta, pixaram toda a casa, quanto pela

própria socialite que ficou constrangida e de mãos atadas sem ter no que fazer

diante de tal transgressão.(FRANCO, 2009, p.85).

Boleta, com essa publicação, consegue assim agregar capital cultural em

relação às instituições que abrem portas para futuros trabalhos de curadoria, bem

como a abertura de sua própria galeria de arte, a Grafiteria. Juntamente com

Boleta, fazem parte da grife Vicio, escritores como Zezão, e outros relacionados

às duas vertentes, graffiti e pixação, relação que causa grande discussão no meio.

Tal discussão gerou conflitos referentes à postura de alguns escritores que

tinham através do graffiti sua inserção em campanhas publicitárias, no campo das

artes e também em projetos de painéis financiados pelos setores do governo,

fugindo assim de sua essência transgressora, tanto defendida e assimilada pelos

escritores relacionados às pixações, pois esses são mais coibidos pelos sistemas

de segurança público e privado e também pela sociedade no Brasil.

Na poética de Xico Sá:

Para os novos Gutenbergs, reinventores dos tipos gráficos das metrópoles, não

há limite. Se deixarem, picham, digo, pixam <o xis dos moleques que vingou

sobre a vossa excelência a Norma Culta portuga/brazuca> até a bunda de

Deus, ora, quem manda deixar o traseiro assim de bobeira, só porque é Deus

pensa que é dono do mundo e de todos os latifúndios dorsais e curador

igualmente do Museus d’Orsay, ora pois. Pixo, logo assusto, impressiono, e

existo no topo, invertendo a pirâmide escrota e naturalista. O resto é BAFO e

bula e abafa o caso. Eis o alfabeto de vera da PEDAGOGIA DO OPRIMIDO.

Purgatório neles, berram as pequenas autoridades, a Prefeitura, o Estado, as

ONGS, os bons burgueses, ah, entendi, querem salvá-los!!! Que gente

decente!!! Então tá combinado, todos doravante, data vênia, esqueceram a

palavra vândalo, que pregaram na testa dos ttsss... e querem os meninos

domados, grafitando como os boyzinhos novaiorquinos, bem entendido, rumo

às galerias e aos slogans oficiais! (SÁ, 2006, apud BOLETA, 2006, p.09)

Assim descreve o panorama e a visão daqueles que do alto desafiam a

gravidade, as autoridades e conquistam suas medalhas arriscando-se o quanto

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puder para erguer a bandeira de suas grifes em território privado.

Xico de Sá, no livro TSSS..., apresenta em seu texto dois recortes de jornal,

um na seção de cartas do Estadão e outro no Noticias Populares. No primeiro

jornal retrata a postura da sociedade reportada na grande mídia impressa em

relação ás pixações:

“As ruas e muros de São Paulo são o exemplo real de como os pichadores são

cruéis. Eles não poupam obras-de-arte, monumentos históricos e muito menos

as paredes de inocentes residências. Na sua sede de vândalos, enfeiam a

cidade com rabiscos incompreensíveis e de mau gosto, como mostra a foto de

D.A. Retratando uma casa simples da avenida Amador Bueno da Veiga, na Vila

Marieta, a imagem mostra o que se passa pela cabeça desses predadores

incansáveis: o desejo único de sujar a cidade. Se já não bastasse toda a

poluição que São Paulo possui, esses anônimos contribuem para o visual de

abandono e sujeira que estereotipa as periferias onde muitas vezes os próprios

pichadores residem”. (SÁ,2006, apud BOLETA, 2006, p.09)

Dessa forma, sendo o jornal grande formador de opinião e atestador de

“verdades” e conceitos, a mídia reporta às pixações como uma espécie de

poluição na cidade. Com pré-conceitos estabelecidos de acordo com os interesses

da mídia e das instituições hegemônicas, a pixação é coibida principalmente pelo

seu caráter transgressor e também pelas questões econômicas e sociais de seus

sujeitos, questões retratadas com mais ênfase na repercussão do caso da 28ª

Bienal internacional de São Paulo de 2008, em que o veredito final foi a prisão da

escritora Caroline Piveta, da grife “sustos”, por 54 dias.

Já no segundo recorte é possível notar a ousadia e as estratégias utilizadas

para atingir maior visibilidade e, consequentemente, ibope, com a seguinte notícia.

Publiquemos aqui, pois, a acontecência: “O Conjunto Nacional, que fica na

Avenida Paulista 2.073, foi alvo de pichações no setor residencial, que tem

entrada pela rua Augusta, em Cerqueira César. Segundo um morador, que

pediu para ser identificado apenas como Di, os pichadores podem ter entrado

no prédio pulando de cima de um orelhão para o beiral da fachada. Dali teriam

quebrado uma janela no 1º andar. Ele contou que, além de quebrar o vidro e

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amassar essa janela, os invasores arrombaram portas. A administração do

prédio, que não registrou a ocorrência na Polícia, negou as informações

confirmando apenas que houve pichação. Di afirmou que ficou apavorado com

a situação. Segundo ele, o esquema de segurança do prédio não poderia

permitir esse tipo de ação, visto que há homens fazendo ronda por dentro e por

fora.“À noite, essa segurança é reforçada” destacou. Ele tentou apurar maiores

detalhes do que aconteceu, mas o porteiro e o segurança disseram que não

viram nada”. (SÁ, 2006, apud BOLETA, 2006, p.09)

Comenta ainda Sá, que foi o próprio Di o sujeito que pixou o prédio e que

num gesto midiático e transgressor conseguiu atestar sua façanha usando

também os canais da grande mídia.

Diferente do Brasil, as instituições na França foram de grande importância

para agregar capital simbólico e catalisaram o processo de internacionalização e

valorização dessa expressão, com grande atuação por meio da Fundation Cartier

pour l’art contemporain, promotora da exposição “Né dans La rue: Graffiti”, em

2009. Mostra que teve participação do escritor Djan “Cripta”, que colocou uma

sessão exclusiva da pixação final do livro “Born in the streets: Graffiti” e também

por fomentar a produção do documentário PIXO, de João Weiner, lançado em

2010. Outro registro nos canais de mídia francesa foi o livro São Paulo Signature,

de 2007, escrito por François Chastanet, com uma substancial análise tipográfica

sobre o movimento.

Livro que serviu de base para consolidar a cena dos tags/pixos/graffiti,

suas historicidades, seus conceitos e transformações ao longo do tempo. É uma

narrativa não linear que passa pelas origens nas ruas de Nova Iorque e sua

principal essência, a expressão de indivíduos aqui chamados de escritores numa

tradução do termo original “writers”. Também pelas intervenções no corpo textual

das cidades, promovendo uma comunicação ímpar com sujeitos plurais via urbes

e também na criação autônoma de novos canais, como os panfletos, revistas,

entre outros e, consequentemente, nos meios de comunicação em massa, seja

pela apropriação estratégica ou para servir aos interesses de instituições

relacionadas ao campo e mercado da arte.

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Em busca de maior visibilidade os escritores usaram estratégias dignas de

planos de marketing, para consolidar sua “marca” que pode ser lida nas paredes e

superfícies das cidades, nos canais de mídias de grande atuação, com finalidade

de valorização simbólica perante sua comunidade, para inserção em novos

campos de atuação, seja eles econômicos, artísticos, e ou políticos.

Andy Warhol disse que pelo menos uma vez na vida todos terão seus

quinze minutos de fama. Publicitário de formação e um grande homem de

negócio, o artista ícone da Pop Art conseguiu com sua obra retratar e questionar a

sociedade americana e o mercado das artes utilizando-se de ícones da cultura de

massa e de consumo. Michael Archer, em Arte Contemporânea: Uma História

Concisa, cita que o trabalho de Warhol “enfatizava o reconhecimento de que a arte

não podia evitar era tratada como mercadoria da mesma forma que as latas de

sopa, barras de sabão e caixas de cereal (...)”.(ARCHER, 2001, p.11).

Preocupado com sua postura criou uma imagem “mítica” ao redor de si e

“encarnava o sonho de americano do lavador de pratos que chegou a milionário,

mas é claro que lavador nunca foi”. (HONNEF, 2005, p.07).

Talvez o que vemos nas ruas da cidade de São Paulo vem a ser uma

grande luta pela visibilidade e, diante desse contexto, cabe a crítica de Warhol.

Algumas empresas enxergam os tags/pixos/graffiti como um grande produto, e

se apropriam de sua linguagem e identidade para obter identificação com

determinados nichos de audiência e público. Para o mercado das artes, os

tags/pixos/graffiti proporcionam um excelente investimento financeiro e seus

sujeitos são tirados do anonimato e caminham para exposições nacionais e

internacionais, criando mitos e proporcionando ótimos lucros. Alguns sujeitos

provocam as instituições das artes apropriando-se de seus espaços e abrindo

fissuras nas sedimentadas posturas e conceitos pré-estabelecidos. Enquanto isso,

muitos ficam a margem, seja pela falta de interesse, de informação, ou pelo

sentimento lúdico de liberdade e autonomia, pois independentemente dos

sistemas e regras a cidade não para.

Célia Antonacci provavelmente tenha acertado quando cita em 1994, Decio

Pignatari dizendo que:

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“...novos modelos de sensibilidade para as massas, que eles comecem a fazer

sentido para um público cada vez maior, porque “amanhã” uma pichação já

aparece numa revista, depois numa novela e assim vai.” (RAMOS, 1994, p.45)

O “amanhã” já é hoje e para Pinky Wainer em TSSS... :

Agora que chegamos ao futuro, tudo é consumido e descartado em duas

edições de alguma revista semanal. Poucas são as formas de arte

descompromissadas com o sonho da fama e da grana. O pixo começou assim.

Espero que ao serem domados pelos poderes públicos e incorporados ao

circuito oficial da arte – inevitável – esses meninos não percam a atitude e a

noção de que só o que é coerente sobrevive. (apud BOLETA, 2006, p.24).

Assim, o futuro trouxe inúmeras questões envolvendo os tags/pixos/graffiti

e também toda a comunicação humana. As conversas que estavam nas esquinas,

nos blackbooks/agendas, agora também estão nos fotologs, flickrs, blogs, sites da

internet, campo que se abriu no virtual e produziu redes de interatividade.

Percebe-se assim, que um “rolê” escrito nas ruas e agora na internet possibilita

aos escritores urbanos protagonizarem suas ideias e ideais a partir deles mesmos.

Essa ocupação da cultura digital a partir deles mesmos relativiza questões

políticas fundamentais e nos instiga a investigar os novos caminhos das relações

de poder. [email protected].

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Capítulo 2

CIBERESPAÇO

2.1 Virtual

O surgimento do espaço virtual, a construção dessa nova realidade, base

das trocas e das relações humanas nos últimos anos é um assunto abordado

neste capítulo.

Atualmente, o mundo vive um dos momentos mais instigantes no que se

refere às questões de realidade, tempo e espaço, velocidade de informação e

comunicação. A grande net conectou diversos indivíduos de lugares próximos e

distantes, semelhantes e diferentes e tornou-se o “personagem” principal das

mudanças de comunicação e de informação, ou seja, dos relacionamentos sociais,

econômicos, culturais e políticos. A net hoje estrutura a nova ordem mundial.

O surgimento da internet, o mergulho dentro do ciberespaço, dessas

janelas de “realidades expandidas”, possibilitou outras maneiras de conceber o

tempo e o espaço. Diante desse novo território, as redes se formam, as culturas

se fundem, a velocidade conduz o meio, a interatividade muda o relacionamento

das pessoas e a informação traz diferentes experiências de realidade. Essa é a

denominada realidade virtual.

Pierri Lévy em sua obra O que é o virtual? (1996) relata a respeito da

origem da palavra virtual:

A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por sua vez de virtus,

força, potência. Na filosofia escolástica, é virtual o que existe em potência e não

em ato. (...) Em termos rigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real,

mas ao atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser

diferentes. (LÉVY, 1996, p.15)

A compreensão da virtualização engloba diferentes aspectos que afetam

não apenas a comunicação, mas também as mudanças econômicas, políticas e

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sociais no período histórico em que vivemos. A percepção do virtual modifica a

inteligência coletiva, a sensibilidade e a cognição humana. A grandiosidade, tanto

de extensão e abrangência da rede, quanto de potência de expressão do

comportamento humano faz da internet o fio condutor das mudanças globais. Para

o sociólogo espanhol e estudioso da rede, Manuel Castells, no livro A Galáxia da

Internet

a elasticidade da Internet a torna particularmente suscetível a intensificar

tendências contraditórias presentes em nosso mundo. Nem utopia nem distopia,

a Internet é a expressão de nós mesmos através de um código de comunicação

específico, que devemos compreender se quisermos mudar nossa realidade.

(CASTELLS, 2003, p.11).

Numa visão panorâmica, se é que seja possível voar para além do virtual,

podemos observar que a internet reflete, potencializa e registra as ações

humanas. Infinitas são as maneiras de navegar suas vias. Caminhos navegados

também por sujeitos em redes e tramas que maquinam atingir maior controle e

poder por meio dos fluxos de informações. A amplitude da rede global abrange

desde grandes corporações que financiam e praticam a guerra, seja bélica ou

econômica ou ambas, a indivíduos plurais que engatinham passos digitais.

Para Castells, a internet é “uma rede de comunicação global, mas seu uso

e realidade em evolução são produto da ação humana sob as condições

específicas da história diferencial” (2003, p.11). Cada indivíduo na rede pode ser

um ponto ou um centro, pois, foi assim que a rede foi idealizada por Paul Baran34,

em suas pesquisas iniciais em meados da década de 1970. Dessa forma, a

interatividade na internet se faz presente na ação dos sujeitos em diferentes

situações, interesses e território. Castells também descreve que a “internet

redefine as distâncias, mas não cancela a geografia” (2003, p.170), e o espaço

que a rede ocupa é o espaço da conexão de lugares e dos fluxos de informações.

34

Paul Baran foi responsável pelo desenvolvimento de uma tecnologia revolucionária nas telecomunicações, pioneira na

transferência de informações por “pacotes” codificados, e trabalhava na Rand Corporation( centro de pesquisa californiano) contratado pelo Pentágono. (Castells, 2003, p.14)

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Iniciarei o capítulo presente com um breve histórico sobre a rede global,

para posteriormente relatar algumas questões conceituais referentes ao

ciberespaço e, consequentemente, à cultura digital.

2.2 WolrdWideWeb

Asa Briggs e Peter Burke em Uma história social da mídia – de gutemberg à

internet relatam a origem da internet atrelada às políticas de defesa durante o

período da Guerra Fria. Estabelecida entre 1968 e1969 com forte apoio do

governo americano por intermédio da ARPA, sigla para Advanced Research

Projects Agency35, essa poderosa rede foi desenvolvida com finalidade bélica,

como parte da resposta do governo ao Sputinik. (2006, p.300).

As pesquisas visavam a criação de uma rede de comunicações que

permitisse a descentralização das informações, devido ao grande risco de um

ataque aos Estados Unidos, especificamente ao Pentágono. Com isso

desenvolveu-se a ARPANET, criada pela ARPA. Segundo Briggs e Burke, a

ARPANET era uma rede limitada, de compartilhamento de informações entre

universidades e outros institutos de pesquisa. Para o Pentágono, um elemento

essencial de sua razão de existir era a de a rede sobreviver a retirada ou

destruição de qualquer computador ligado a ela. Já na visão das universidades,

sua importância se dava no fato de a rede fornecer “acesso livre” aos usuários,

professores, pesquisadores e comunicadores. (BRIGGS, ASA, 2006, P.301).

Ainda em sua pesquisa, Asa e Briggs descrevem que os responsáveis pelo

sistema se orgulhavam da rede poder ser conectada por qualquer computador. A

informação era então trocada imediatamente por “pacotes”, em que o sistema as

“quebrava”, codificando-as, para depois juntá-las, após terem viajado até seu

destino. O primeiro processador de mensagem, conhecido como IMPs foi

instalado no laboratório de Leonard Kleinrock na Universidade da Califórnia, em

1969 e, em apenas 2 anos, a ARPANET já era totalmente operacional. As

35

http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Internet 12/08/2010

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mensagens por email já eram a base das comunicações, sendo que nem todas se

tratavam de assunto de defesa.

Os autores retratam que em 1975 havia cerca de dois mil usuários e que

muitas convenções da futura internet já se encontravam estabelecidas. O sinal @

tornou-se rotina e em 1986 introduziu-se as abreviações “com” para comerciais e

“mil” para militares e “e” para educacionais. O grande avanço segundo os autores

deu-se entre setembro de 1993 e março de 1994, quando a rede tornou-se “a rede

das redes”, aberta a todos. Era uma rede “frouxa” e não tinha proprietários,

embora dependesse dos sistemas das agências de comunicação. Em dezembro

de 1993, o New York Times a descreveu como “ a primeira janela para o

ciberespaço”, num anúncio na seção de negócios, sobre um programa de

navegação chamado “Mosaico”, que visava atrair mais usuários, na época

chamados de “adaptadores”, e provedores (ASA, BRIGGS, 2006, p.300). A

“Mosaic Communications” teve que mudar seu nome para „Netscape

Communications” e tornou disponível na net o primeiro navegador comercial, o

Netscape Navigator, em outubro de 1994. (CASTTELS, 2003, p.18). O valor da

net dependia da ampliação das possibilidades comerciais e o primeiro provedor

começou operar em 1979, numa espécie de “um clube privado” que em parte era

propriedade do grupo Time/Warner. Com a rede aberta aos interesses comerciais,

logo apareceram os grupos rivais e o número de usuários chegou a cerca de 3,5

milhões e seu uso se ampliou. Castells descreve que em 1995 a Microsoft

finalmente descobre a Internet, e juntamente com seu Windows 95 lança o Internet

Explorer. Em meados da década de 1990, a Internet estava privatizada e dotada

de uma arquitetura aberta que possibilitava a conexão entre todas as redes do

mundo. O www funcionava com a utilização de softwares adequados e diversos

navegadores comerciais já estavam disponíveis para o público. (CASTELLS,

2003, p.19).

Para Asa e Briggs, Tim Berners-Lee em 1989 intitulou “World Wide Web”, a

partir do que ele especulava:

“Suponha que eu tenha a possibilidade de programar meu computador para criar

um espaço em que tudo possa ser ligado a tudo” e “(...) que toda a informação

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arquivada nos computadores de todos os lugares estivesse interligada” (2006,

p.302).

Num momento em que a rede tinha alterado sua base para um instituto

europeu de pesquisa – CERN – situado nas montanhas da Suiça, a ideia de rede

para Berners-Lee não era uma tarefa lucrativa ou de alta segurança. Sua vontade

era de conservar a Web sem proprietários, aberta, livre, um meio de ampliar as

oportunidades. O desenvolvimento dos “hiperlinks”, textos e palavras em

destaques, que podiam ser “clicados sobre” abrindo novas janelas e conteúdos,

tornou-se a chave de todo o progresso futuro. Berners-Lee tinha tomado um

sistema de comunicação poderoso de uso da elite e transformou-o em meio de

comunicação de massa. (ASA, BRIGGS, 2006, p.302).

Essa abertura gerou muita discussão no que se refere a palavra “massa”,

pois, para alguns estudiosos e críticos quanto mais aberta a rede mais “terreno

inútil” existiria. Porém, a questão da expansão e da euforia era muito mais forte.

Os primeiros provedores de software consideravam que a Internet dava poder aos

indivíduos, vantagens à sociedade e, para alguns teóricos, a partir da

convergência tecnológica, alcançaríamos “maior liberdade humana, mais poder

para o povo e mais cooperação nacional”. (ASA, BRIGGS, 2006, p.302).

É claro que dentro dessa visão de emancipação que a internet possibilitava,

também uma imensa via de interesses comerciais bombardeava os fluxos de

informações. A rede se assemelhava à mídia, e também, através dela transmitia

informação, entretenimento e educação. Asa e Briggs comentam que Al Gore e

Bill Clinton em meados de 1996 denominaram a internet de “rodovia”, a partir da

simbólica ligação de telefones fixos com a rede nas salas de aula da Califórnia.

Entretanto, foi no seguimento dos negócios que a internet teve seu boom, uma

espécie de revolução do consumo (e-comerce). Nas palavras de Bill Gates em seu

livro The Way Ahead, de 1995, a internet faria com que “todas as mercadorias do

mundo (pudessem) estar disponíveis para serem examinadas, compradas e,

muitas vezes, feitas sob medida”. Gates via as máquinas como libertadoras, falava

numa linguagem diferente, permitia que seus colegas dedicassem parte do tempo

a tarefas criativas e usava parte de sua fortuna para financiar projetos

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educacionais. A Microsoft e suas patentes estavam quase sempre nos noticiários

e a rede passou por um processo de des/valorização das ações das empresas

“virtuais”, denominado de e-conomy. (ASA, BRIGGS, 2006, p.304).

Altos e baixos das ações, “rodopios” nos mercados financeiros,

cibermilionários, Wall Street x Nasdaq, são terminologias que compõe o cenário

econômico gerado pela internet. Atualmente, a Nasdaq36 (National Association of

Securities Dealers Automated Quotation System - Sistema Eletrônico de Cotação

da Associação Nacional de Intermediários de Valores), vem a ser a maior bolsa de

valores do mundo em volume de ações e de transações financeiras.

Porém não era apenas no lado econômico que a rede gerava

transformações e debates. No campo da política, os autores Asa e Briggs citam o

livro Communication and Control, 1991, de Geoffrey Mulgan, examinando o que

chamou de “tramas do mundo das redes”, onde a internet serviu para controle de

propagação de notícias e informações. Em relação à veracidade dos fatos que a

imprensa noticiava, os autores Asa e Briggs citam que:

Então, e desde então, independente da tecnologia, que se tornou possível trazer

as palavras – e, ainda mais importante, as imagens – para dentro de casa, parecia

estar ameaçada a veracidade como valor necessário por trás do jornalismo na

imprensa escrita e na televisão, e não pela primeira vez na história. Tantos os

eventos quantos os assuntos eram, por vezes, secretamente transformados em

tragédias, com a introdução de elementos ficcionais. As linhas divisórias entre

informação, entretenimento e educação estavam, por conseguinte, mais

embaçadas do que anteriormente. (2006, p.306).

Em meio às “linhas embaçadas”, a rede cresce para todos os lados e,

dessa forma, possibilita grandes aberturas para a circulação de fluxos de

informações em direção contrária aos interesses das grandes mídias e também

polemizadora dos conteúdos enlatados para controle hegemônico.

A expansão da internet causou uma revolução no comportamento humano.

A complexidade de entender as relações humanas a partir das novas tecnologias

geraram inúmeras indagações sobre como vigiar, controlar e legislar a rede. Até

36

http://pt.wikipedia.org/wiki/NASDAQ acessado em 20/09/2010.

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hoje ainda é um desafio, por exemplo, como proibir ou controlar a pornografia? O

aparecimento dos novos crimes via rede, como pedofilia, entre outros levaram

governantes e empresas a buscarem constantemente a criação de novos

dispositivos desenvolvidos com a finalidade de vigiar. Sistemas de “filtragem”,

procedimentos de autorregulamentação, legislação e censura foram aplicados em

alguns países e empresas. Porém, conteúdos e decisões nacionais passaram a

ter repercussão em escala mundial e vice-versa. As fronteiras, entre cultura,

disciplinas – história, sociologia, antropologia, psicologia, direito, e , também entre

os costumes e hábitos se tornaram confusas. (ASA, BRIGGS, 2006, p.312).

A desterritorialização dos conteúdos e a descentralização da informação,

por meio da conexão na rede, possibilitou acelerar o fenômeno denominado

“globalização”.

Com relação à “globalização”, termo em moda em meados de 1999, a

internet cumpre um papel único no que se refere às questões de uniformidade

religiosa, econômica, política e cultural. Muitas convergências e divergências

sobre o fenômeno global em trasformação. Asa e Briggs apresentam o autor

londrino Michael Glove que, em um ensaio sobre os filmes de Hollywwod feitos

para o mercado mundial, apontou que interromper a globalização seria uma

“missão impossível”, destacando que “a globalização talvez seja inevitável, mas

não temos que gostar dela”. Para Glove, “a globalização pode tornar mais fácil o

encontro de culturas novas, mas torna a viagem menos valiosa, porque as culturas

se tornam parecidas umas com as outras.”(2006,p.315).

O processo de internacionalização das culturas, das práticas capitalistas,

econômicas e políticas é assunto de extrema profundidade e relevância nas

transformações globais. Seus reflexos são frutos de uma ação ideológica que

parte do neoliberalismo e tem também como intenção o monopólio econômico das

grandes corporações mundiais, que buscam expansão de mercado, mão de obra

barata, por vezes “escrava”, e insenção fiscal.

Entretanto o avanço da internet, abriu também a possibilidade de fluxos

de informações alternativas, de troca de experiência e vivência; redes de

relacionamentos, redes de artistas, num processo de emancipação do

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conhecimento e fomento de cultura. Deixarei para retratar este tema com maior

ênfase em linhas posteriores. Da mesma forma que a informação e a mídia

servem como meios de controle elas podem também servir para libertar.

Um dos fenômenos mais poderosos e transformadores na evolução da

internet foram os sites de busca e pesquisa. Asa e Briggs relatam que em agosto

de 2004, Sergey Brin e Larry Page, os “jovens gênios”, que fundaram, em 1998,

numa garagem de São Francisco, o Google, despertaram atenção digna de

celebridades. O fato era que com apenas 24 e 25 anos respectivamente, os jovens

haviam lançados as ações da empresa num leilão não convencional. Os dois

empreendedores eram comparados com frequência aos rivais, um pouco mais

velhos, Jerry Yang e David Filo, que em 1994 tinham criado o Yahoo!.

O Google e o Yahoo! são duas páginas de pesquisa e busca que auxiliam a

navegação na internet. Dizia-se que o Google foi inspirado no computador da série

de TV Jornada nas estrelas, capaz de responder a (quase) qualquer pergunta. A

internet era agora considerada tão comum que as atenções populares se voltaram,

na imprensa e outros veículos, em que havia uma crescente demanda por

informações, para o cronograma de criação de uma sociedade digital e para a

mutável tecnologia das comunicações por telefonia móvel. (ASA,BRIGGS, 2006,

p.326)

A era digital causou uma verdadeira revolução na estrutura dos processos

humanos atuais. Com isso, as questões sobre esta grande rede global, os riscos e

perigos, as soluções e desenvolvimentos, em suma o contexto político, econômico

e social que a internet introduziu nesse período histórico, são de grande relevância

para o entendimento do aqui e agora. Falar sobre a expansão da realidade no

virtual pode parecer, para alguns, algo como um “déjà vu” de ficções científicas

futuristas. Contudo, da mesma forma que séries de TV tem a possibilidade de

mexer com a cabeça de jovens, que se capacitam para transformar algo

potencialmente lúdico, como um computador que sabe tudo, no Google,

ferramenta de extrema relevância nas pesquisas atuais, essas mudanças

tecnológicas abalaram e modificaram as formas contemporâneas de

relacionamento e percepção humana.

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Asa e Briggs trazem à tona alguns questionamentos levantados no artigo,

“Interrogar a sociedade da informação” publicado na Intermedia, em abril de 2004,

de autoria de Guy Gough Berger, chefe do Departamento de Estudos do

Jornalismo e da Mídia, na Universidade de Rhodes, na África do Sul. Berger

perguntava: “A „sociedade da informação‟ é algo que já estamos vendo e que

conhecemos, ou uma coisa a ser decidida e determinada?”, acrescentando em

seguida: “Poderia ser as duas coisas ao mesmo tempo – algo aqui e agora e algo

que ainda está por vir?” (2006, p.327).

Talvez seja difícil descrever o aqui e agora, tampouco, realmente prever

novos caminhos diante do desenvolvimento tecnológico e das rápidas mudanças

sociais globais. A rede serviu para unir e separar, também é fonte inesgotável de

informação capaz de alienar, controlar ou libertar pensamentos e expressões

humanas. Hoje atua como entretenimento, é usada como forma de controle

hegemônico, de massificação de culturas, mas também tece redes piratas37

, que

criam outros centros descentralizados de informação e promovem culturas

alternativas. O sociólogo espanhol e estudioso da rede, Manuel Castells, afirmou

no livro A Galáxia da Internet que “a Internet é, acima de tudo, uma criação

cultural”. (2003, p.32).

A internet passou por grandes desenvolvimentos tecnológicos e

acontecimentos históricos, para chegar ao que estamos vivenciando atualmente,

tanto no que se refere a velocidade da informação, quanto ao número e pessoas

conectadas. A grande rede é a base das transformações sociais, econômicas e da

revolução tecnológica da atualidade. Um novo campo se abriu e agora navegamos

nesse ciberespaço.

2.3 Sobre o Ciberespaço

Segundo o professor Walter Zanini, em seu artigo “A Arte da Comunicação

telemática – a interatividade no ciberespaço”, publicado na revista Ars, o

ciberespaço é um termo criado por William Gibson, em seu romance

37

Citando como exemplo o programa bittorrents e o site www.piratebay.org.

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“Neuromancer”, de 1984. (2003, p.12). Essa geografia virtual tornou-se um dos

pilares que estruturam as transformações e relações sociais da

contemporaneidade.

O letrista da banda Gratefull Dead, também fundador da Eletronic Frontier

Foundation, Jp Barlow38, foi intitulado como arquiteto do ciberespaço e, sobre esse

fato, comenta em entrevista:

Decidi nomear o ciberespaço. Decidi que o espaço que você ocupa quando está

ao telefone ou na rede precisava ter um sentido de lugar, ter uma identidade

política. Só então se pode discutir as conseqüências econômicas e sociais dessa

dimensão que a humanidade criou. (revista trip 22 maio de 2009).

A virtualização da comunicação humana, baseada nessa nova geografia, o

ciberespaço, impulsionou mudanças em quase todas as esferas do

comportamento humano. Pierre Lévy, em Cibercultura, descreve que:

O ciberespaço (que também chamarei de "rede") é o novo meio de comunicação

que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo especifica não

apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas também o universo

oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos que

navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo "cibercultura",

especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de

atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente

com o crescimento do ciberespaço. (LÉVY, 1999, p.17)

Conectados por meio da tecnologia virtual navegamos em um espaço

desterritorializado do plano físico das coordenadas de Greenwich e do Equador.

Saímos do tic-tac dos ponteiros analógicos e estamos diante de um dos mais

significativos fenômenos de compreensão de realidade. Diante desse ciberespaço,

infinitas possibilidades se desdobram. As mudanças dentro dessa realidade

possuem reflexos culturais, sociais, políticos e econômicos. Para a compreensão

dessa nova geografia, que se apresenta no virtual, é necessário visualizar que

38

John Perry Barlow (https://projects.eff.org/~barlow/)

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mesmo em meio as variadas opiniões teóricas, o virtual agora é realidade e como

tal requer um olhar desmistificado de utopias, mas ricos de possibilidades.

Continuando com Lévy,

Certamente nunca antes as mudanças das técnicas, da economia e, dos costumes

foram tão rápidas e desestabilizantes. Ora, a virtualização constitui justamente a

essência, ou a ponta fina, da mutação em curso. Enquanto tal, ela não é boa nem

má, nem neutra. Ela se apresenta com o movimento mesmo do “devir do outro” –

ou heterogênese – do humano. Antes de temê-la, condená-la, ou lançar-se às

cegas a ela, proponho que se faça o esforço de aprender, de pensar, compreender

em toda a sua amplitude e virtualização. (LÉVY, 1996, p.12)

Lévy descreve esse momento histórico como uma mutação em curso e o

aprofundamento nesse espaço nos leva as mais diferentes experiências diante

dos meios virtuais. A compreensão desses acontecimentos transita entre a esfera

do real concreto e virtual, devido à desmaterialização do processo de

comunicação, dos conteúdos e dos signos. Mesmo com a utilização dos meios

físicos e tecnológicos para se acessar essa geografia, o ciberespaço existe em

potência e não em presença. Para o autor, o virtual

tem somente uma pequena afinidade com o falso, o ilusório ou o imaginário. Trata-

se, ao contrário, de um modo de ser fecundo e poderoso, que põe em jogo

processos de criação, abre futuros, perfura poços de sentido sob a platitude da

presença física imediata. (LÉVY, 1996, p.12).

Por se tratar de um fenômeno atual e pelas diversas formas de concebê-los

e interpretá-los, a percepção dessa virtualização ainda é passível de muitos

questionamentos. Alguns autores tem visões totalmente diferentes diante da

cibercultura. A escolha por Pierre Lévy se deu pelo seu otimismo diante dessa

geografia. A respeito desse posicionamento o autor aponta:

Estão certos. Meu otimismo, contudo, não promete que a Internet resolverá, em

um passe de mágica, todos os problemas culturais e sociais do planeta. Consiste

apenas em reconhecer dois fatos. Em primeiro lugar, que o crescimento do

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ciberespaço resulta de um movimento internacional de jovens ávidos para

experimentar, coletivamente, formas de comunicação diferentes daquelas que as

mídias clássicas nos propõem. Em segundo lugar, que estamos vivendo a abertura

de um novo espaço de comunicação, e cabe apenas a nós explorar as

potencialidades mais positivas deste espaço nos planos econômico, político,

cultural e humano. (LÉVY,1999, p.11)

Diante da reflexão otimista de Lévy sobre esse espaço, cabe perceber que

estamos conectados com redes mundiais de indivíduos plurais e as possibilidades

de comunicação são infinitas e criadoras de experiências de relacionamentos e de

produção de cultura. Mesmo assim não podemos esquecer que nem todos estão

conectados na rede, e que o acesso requer desenvolvimento tecnológico, recursos

financeiros e principalmente interesse por parte das grandes corporações que

usam a rede como forma de bombardeio de publicidades e de ideologias

capitalistas. O ciberespaço também já está na era comercial e não podemos ser

“inocentes” ao ponto de não perceber que por trás das plataformas virtuais,

empresas como Microsoft, IBM, Aple, Google, Yahoo! trabalham numa perspectiva

dos valores hegemônicos de controle de mercado financeiro e de poder. Pierre

Lévy descreve também que existe um grande “abismo entre os bens-nascidos e

os excluídos, entre os países do Norte e as regiões pobres” (1999, p.??), onde

sequer existem os meios tecnológicos para comunicação.

Cabe ressaltar que a questão da exclusão é evidentemente crucial, pois o

acesso à rede depende, a princípio, de meios físicos e financeiros. Porém, Lévy

levanta uma questão relevante a respeito da exclusão. Para o autor, não basta

apenas a redução dos custos de conexão, mensurados por valores financeiros e

tecnológicos. Posicionar-se diante da tela do computador e acessar as interfaces

de interatividade e relacionamento não é suficiente para superar as situações de

inferioridade e exclusão. O maior desafio é realmente estar em condições de

“participar ativamente dos processos de inteligência coletiva que representa o

principal interesse do ciberespaço. (1999, p.238).

Outro questionamento vindo de Lévy é que não são os pobres que se

opõem à internet, mas são aqueles se sentem ameaçados de perder o monopólio,

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o poder e os privilégios, sejam eles econômicos, políticos ou culturais, que

procuram limitar o acesso total ou parcial das informações e relacionamentos em

rede. Vide os exemplos de Cuba e da China com políticas de censuras dos

conteúdos que fogem a “ordem” das ideologias e estrutura de poder dominante.

Na visão do autor, esses novos instrumentos deveriam servir para priorizar

a valorização da cultura, os projetos locais, de forma a ajudar a participação de

coletivos de ajuda mútua, grupos de aprendizagem cooperativa, em suma, visa o

ganho em autonomia. (LÉVY, 1999, p.238). Autonomia vem a ser uma das

palavras-chave para a abordagem da internet como produtora cultural a partir dos

sujeitos plurais conectados dialogando seus hipertextos. Os meios digitais atuais

nos permitem expressar nossas subjetividades e experimentarmos uma

comunicação global, diante da não necessidade de utilização dos meios de

comunicação em massa, criando grandes espaços de proliferação de fluxos de

informações alternativos e independentes.

Contudo, a massificação da informação, a globalização das culturas

neoliberalistas, a manipulação das redes para apelos e interesses comerciais

transformam também a rede em uma “armadilha” com risco da “americanização”

das culturas locais por meio da manipulação dos conteúdos e imposição dos

valores, tornando o condutor não aquele que clica e abre as janelas, mas àqueles

que o conduzem ao mergulho.

Mesmo dentro desse cenário que nos faz “apóstolos” trabalhadores e

consumidores dessas grandes corporações hegemônicas, a relevância maior não

está em ser contra ou a favor, mas em entender que o ciberespaço se mostra

como a nova face da informação. Se por um lado, estamos a “serviço” das

Microsoft, por outro, ela também nos “serve” e somos capazes de burlar regras, de

piratear dados, de trabalhar em rede, de sermos ativistas e protagonistas políticos

de nós mesmos. Devido à potencialização dos signos nesse novo ambiente, a

comunicação por meio dos hipertextos digitais, promove mudanças na maneira de

interação, de relacionamento e da percepção da realidade.

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Porém, para entender essa maneira de agir no ciberespaço, é necessária

uma compreensão desse território, mesmo que parcial, que nessa pesquisa em

particular se apresenta dentro de um ponto de vista “otimista” e “LÉVYano”.

Para refletir sobre as mudanças e transformações, o Prof. Dr. Walter Zanini

apresenta o artista, teórico e educador inglês Roy Ascott (1991), um dos

fundadores da arte telemática39, que afirma:

“estamos reescrevendo e reconstruindo o mundo através da percepção, memória,

inteligência e comunicação dos sistemas de mediatização do computador;

habitamos cada vez mais o que é essencialmente um dataspace, um environment

telemático, uma realidade virtual”. 40

(apud ZANINI, 2003, p.14)

Essa realidade que se expandiu com a virtualização dos meios é fruto da

comunicação humana numa rede global de informações. Estamos em processo de

decifrar, e ao mesmo tempo (re)simbolizar essa justaposição dos signos em

metamorfose perpétua. A comunicação e sua percepção são feitas por meio de

blocos de hipertextos, onde “cada um é chamado a tornar-se um operador

singular, qualitativamente diferente, na transformação do hiperdocumento

universal e intotalizável”. (LÉVY, 1999, p.149).

Dessa forma, guiar, conduzir ou seguir, é de total responsabilidade do

cibernauta. Depende agora dos atores sociais, ativistas culturais, artistas, dentre

outros, não fazer com que esse espaço se torne uma reprodução dos meios de

comunicação de massa.

Lévy aponta também que esse movimento social e cultural não aponta

somente a um conteúdo em particular, mas que opera por meio de uma

comunicação interativa, comunitária e transversal. Para ele, o ciberespaço atua

também como uma grande ferramenta de organização de comunidades dos mais

variados tamanhos, possibilitando transformá-las em coletivos inteligentes que

articulam entre si e com outras comunidades. Essa interconexão é supostamente

39

(a palavra telemática, cunhada na França em 1977, por Simon Nora e Alain Minc, significa a conectividade entre a

tecnologia da informática e a da telecomunicação) atinge-se um dos pontos mais à frente do impulso de imaterialidade das linguagens poéticas contemporâneas. (ZANINI, 2003, p.13). 40

Roy Ascott ,em artigo publicado em número especial da revista Leonardo, em 1991,no texto de Walter Zanini, na revista

Ars, 2003

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positiva na visão do autor, pois coloca em contato indivíduos, lugares e momentos

diferentes, socializando seja de maneira lúdica, intelectual, ou econômica. A

descentralização da informação favorecida pela rede tem como contraponto a

análise, a princípio, das organizações, visando enxergar quais as finalidades e os

resultados obtidos com a sinergia de recursos financeiros e intelectuais na

propagação de informações e conteúdo na net. (1999, p.132-133).

Porém, para que possamos falar mais sobre esses acontecimentos, sobre

os posicionamentos e as relações em comunidades, um grande esforço está em

perceber de que modo a realidade virtual, ou expandida, nos afeta atualmente.

A respeito da percepção humana na era do ciberespaço, Walter Zanini

segue com Roy Ascott (1997) citando que:

Estamos entrando num mundo-mente (world-mind) e nossos corpos estão

desenvolvendo a faculdade de cibercepção (cyberception), isto é, a amplificação

tecnológica e o enriquecimento de nossos poderes de cognição e percepção.

(apud ZANINI, 2003, p.15).

Acredito que seja nítido as transformações de comportamento e de

recebimento das informações hipertextuais, propagadas pelos meios tecnológicos

em nossa geração, se pararmos para analisar a familiaridade com que as crianças

e adolescentes de hoje utilizam esses meio de comunicação, via interface digital.

Não são raros os casos em que as crianças ajudam os pais a atualizarem ou

manusearem um telefone celular ou uma navegação na internet.

O sociólogo Sergio Amadeu, no livro Cultura digital.br, apresenta um

exemplo interessante sobre a questão do comportamento desses sujeitos

contemporâneos via geração digital.

Você vê um adolescente com uma tela aqui na frente e aí ele abre uma mensagem

instantânea aqui, está com 10, 15 telas abertas, está com um outro mensageiro

instantâneo aqui do lado, fazendo um trabalho de escola aqui, ao mesmo tempo

que ele está ouvindo uma música, ele está num site “x”ouvindo uma música que

provavelmente nunca ouvirá novamente, e está baixando algo numa rede

BitTorrent. Tudo ao mesmo tempo. Aí você pergunta para ele: “O que você está

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fazendo?” Aí ele vira para você e fala: “Nada. Eu não estou fazendo nada.” [Risos].

(apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p.71).

Para o sociólogo, isso é uma nova cognição e de grande profundidade,

pois, se voltarmos os olhares para o “pessoal da velha guarda tem dificuldade de

deixar o Twitter aberto, o Gmail aberto e ir trabalhando um texto.” (apud CULTURA

DIGITAL.BR, 2009, p.71). Claro que esse exemplo pode ter controversias em

relação à idade e às gerações, porque essa familiaridade também se dá com o

uso, acesso e recursos. Para Sérgio Amadeu, isso pode ser definido como

multitarefa (termo que vem da informática), onde o cérebro humano permite que

se organize, recombine e trabalhe os hipertextos de formas simultâneas à

comunicação, transformando os meios e, consequentemente, modificando o

modus operandi do digital e do humano.

As mudanças das relações humanas estão totalmente ligadas ao meio,

tanto na tecnologia vigente quanto na maneira de nos comunicarmos. Assim,

compreender os meios, a linguagem e o espaço são formas de sentir o quanto a

inteligência humana e a comunicação transformaram a realidade atual. Roy Ascott

(1997) relata que:

Sabemos que se trata do virtual, de uma construção telemática, e ainda assim

vivemos a sua realidade. E isto porque nos damos conta de que, em toda a parte e

em todas as épocas, a realidade sempre foi construída e mediada pela última

tecnologia – linguagem humana - em toda a variedade de sua configuração

filosófica, cultural e tecnológica. As telecomunicações interativas - a tecnologia

telemática - são uma linguagem antes de qualquer outra coisa e nos falam, ou

melhor, nos transmitem uma nova linguagem e, ao fazer isso, para o nosso

melhor, falamos uma linguagem de cooperação, criatividade e transformação. É a

tecnologia não do monólogo, mas da conversação, que alimenta fecundos fins

abertos, e não uma estética fechada e conclusiva. A telecomunicação interativa é

uma tecnologia que capacita o indivíduo a conectar-se com outros. (apud ZANINI,

2003, p.15)

Essa comunicação através dos meios tecnológicos virtuais possibilitou uma

conexão ampla com sujeitos plurais. Dessa conexão surgiram diversas

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plataformas de relacionamento em rede, de vivências e experiências onde os

indivíduos não necessariamente estão presentes nem no tempo nem no espaço.

Isso se dá, por exemplo, na comunicação feita por correio eletrônico, nas tele

presenças, e nos sites de relacionamento (plataformas multiusuários) tipo Orkut e

facebook. Estes espaços são transformadores de realidades, onde a presença do

indivíduo se dá no acessar seu perfil, nas relações com as imagens, textos, vídeos

e os links postados e também na própria imagem teletransportada em real time.

Uma realidade advinda da potência do hipertexto no momento da atualização.

Zanini menciona os conceitos da “Estética da Comunicação” - que Mario Costa

considera o presságio de uma nova idade do espírito, baseada numa

extraordinária fusão da arte, tecnologia e ciência. Assim Mario Costa (1986) atesta

que:

A “estética da comunicação” - afirma - “é uma estética de eventos”. O evento é

definido em suas propriedades e, sinteticamente, podemos dizer: não se reduz a

uma forma; apresenta-se como um fluxo espaço-temporal, um processo interativo

vivente; expande-se ilimitadamente no espaço-tempo; sua importância não reside

no conteúdo permutado mas nas condições funcionais da troca; seu processo se

faz em tempo real; é uma mobilização de energia que substitui forma e objeto; é o

resultado de duas noções interativas temporais: o presente e a simultaneidade;

consiste no emprego do espaço-tempo para criar balanços sensoriais. (apud

ZANINI, 2003, p.18).

A presença dos sujeitos transitando todos os lugares da rede e ao mesmo

tempo não existindo em nenhum lugar, talvez seja um desafio para entender essa

percepção da realidade virtual, entretanto, atualmente vivenciamos esses

exemplos quase que diariamente. Ao relacionarmos por meio das plataformas

multiusuários a comunicação humana percebemos que ela não é estática. A

interatividade do espectador e a percepção desses hipertextos como realidade

expandida, nos leva a encarar essa interface como presencial e real. Para Lévy, a

imagem perde sua exterioridade de espetáculo, abre-se para a imersão e sua

representação é substituída pela virtualização interativa. (1999, p.150).

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Walter Zanini faz referência ao pensador italiano Mario Costa (1986), para

responder sobre a questão dessa representação da imagem.

Para ele, a “resposta decisiva parece ser a seguinte: a auto-geração e a auto-

suficiência existencial das novas imagens é, enfim, ainda e sempre, a exposição

de parte de nós mesmos e o que nelas contemplamos é, na verdade, a colocação

em cena da nossa potência” (apud ZANINI,2003,p.18).

Essa potência descrita por Mario Costa, vinda das “novas imagens”,

desdobradas pelos hipertextos que postamos na rede ou então acessamos,

conduzem a esse novo modelo de comunicação. A comunicação digital nos

permite a protagonização de nossos “eus”, permite acesso a outros indivíduos e

lugares a partir de um roteiro, ou edição daquele que comanda a “navegação”. É a

mutação desse ser digital desdobrado na rede.

Walter Zanini, citando Ascott (1997), declara sobre o ser que se transforma

biologicamente pela logística espacial das redes:

“Cada fibra, cada nó, cada servidor na Net é parte de mim. À medida que interajo

com a rede, reconfiguro a mim mesmo. Minha extensão-rede me define

exatamente como meu corpo material me definiu na velha cultura biológica. Não

tenho nem peso nem dimensão em qualquer sentido exato. Sou medido pela

minha conectividade. Minha paixão é plantar sementes conceituais no substrato da

Net e vê-las crescer; olhar a Net atentamente numa atitude Zen à medida que

novas formas emergem, à medida que a energia criativa da conectividade gera

novas idéias, novas imagens, uma nova vida. Emergência (emergence) é o

comportamento chave da Net.( apud ZANINI, 2003, p.15)

Em essência, é sobre esse ser tecnologicamente expandido e digitalmente

sensibilizado que esta pesquisa desenha suas interrogações e exclamações.

Sujeitos do aqui e agora, que propõem também as novas formas de cultura, de

expressão artística, ativista, rebelde ou passiva. Zanini também aponta que

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entre outras múltiplas considerações, para as quais é preciso necessariamente

remeter o leitor, Ascott realça a mente humana nesse processo tecnológico da

rede (noz faz perceber) “que cada um de nós é feito de vários “eus”. (2003, p.16).

Conectados ou não somos parte dessa rede, a comunicação foi modificada

pelo meio eletrônico. O virtual abriu janelas com vista para um novo território. Para

Castells, a lição fundamental é que a maneira de transformar as tecnologias, seja

ela qualquer tecnologia, é experimentar, apropriar, e no caso da Internet, torna-se

mais verdadeira a mudanças pelo fato de ser uma tecnologia da comunicação.

(2003, p.10).

2.4 Comunicação digital

A comunicação consciente (linguagem humana) é o que faz a especificidade

biológica da espécie humana. Como nossa prática é baseada na comunicação, e a

Internet transforma o modo como nos comunicamos, nossas vidas são

profundamente afetadas por esta nova tecnologia da comunicação. Por outro lado

ao usá-la nós transformamos a internet. Um novo padrão sociotécnico emerge

dessa interação. (CASTELLS, 2003, p.10).

A própria mudança da comunicação induziu, consequentemente, à

modificação do indivíduo. A mutação do corpo humano híbrido com a máquina

parece desenvolver diferentes cognições. A interatividade faz com que o cérebro

trabalhe de maneira participativa, deixando de ser espectador apenas para se

tornar um ser de múltiplas percepções. Os olhos e a tela, a mão e o mouse, a

boca e o teclado, agora linkados e expandidos.

Uma problemática estética absolutamente original se configura nessa relação do

homem com a máquina de inteligência artificial, capaz de converter em imagens as

informações ( ou a provisão de símbolos codificados) contidos em seus circuitos. A

imagem torna-se “o produto de alguma forma vivente da tela e igualmente dos

dedos, da retina e do pensamento do observador; ela é o produto de uma

surpreendente hibridação de carne, de símbolos e de silício” , como diz Couchot,

que, ao mesmo tempo, realça o fato de nos encontrarmos diante de uma “nova

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estética de distribuição”, na forma de “como a imagem é socializada”3. (ZANINI,

2003, p.12).

Socializar essas imagens é também socializar uma autorrepresentação

“editada”, publicando parte de nós mesmos. Essa nova comunicação desenvolve

uma sensibilidade radicalmente diferente do que já tinha ocorrido ao longo da

história, como relatou o antropólogo italiano Massimo Canevacci em entrevista41.

Para o pensador, a experiência de relação com as outras pessoas, em diferentes

tempo/espaços possibilita uma comunicação simultânea com sujeitos “que podem

morar em mais ou menos todos os lugares do mundo”, modificando intensamente

a capacidade perceptiva e também cognitiva. Além do que a possibilidade de estar

executando multitarefas, como ler um jornal de Nova York, mandar um email,

acessar o Orkut, é uma característica contemporânea dessa comunicação digital,

segundo Canevacci.

A interação e a distribuição dessa nova estética da comunicação humana

por meio da tecnologia digital “socializada” produz um fenômeno intitulado

cibercultura.

2.5 Cibercultura

Cibercultura designa a configuração material, simbólica e imaginária do período

pós-guerra correspondente à predominância mundial das tecnologias e redes

digitais avançadas, na esfera do trabalho, do tempo livre e do lazer. Nessa

perspectiva, o conceito de cibercultura, trabalhado em sua real amplitude, não se

equaciona somente aos processos internos ao cyberspace – vale especificar, não

envolve apenas “comunidades virtuais”, tendências comportamentais, questão de

gênero, novas formas de identidade e identificação, condição do corpo,

publicações e bibliotecas virtuais, web art, etc. –; mais que isso, diz respeito a um

arranjamento estrutural e estruturante de época que abrange o próprio contexto

tecnológico responsável pelo aparecimento do cyberspace. Rompe-se, aqui, com o

conceito reducionista de cibercultura, correspondente à visão mais comum hoje em

41

Entrevista realizada para a publicação Sextante - FABICO/UFRGS, sob orientação do jornalista Wladymir Ungaretti, em

agosto de 2007. http://www.overmundo.com.br/banco/entrevista-com-pensador-massimo-canevacci acessado em 12 de agosto de2010

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dia sobre a matéria (Trivinho 2000). Embora doravante conflua para o cyberspace,

a cibercultura está tanto além quanto aquém dele. Ela se conforma, a rigor, como a

atmosfera tecnológica integral do último quartel do século XX, em especial os anos

90, marcados pelo surpreendente advento, desenvolvimento acelerado e

multiaplicação civil da World Wide Web. A cibercultura é, propriamente, o mundo

em curso, em todos os setores. (TRIVINHO, 2001, p.112).

Se a internet conectou os quatro cantos do mundo, possibilitou o

desenvolvimento do espaço virtual, transformou radicalmente as relações,

percepções e comportamentos, é por meio da cultura digital que nos

movimentamos realmente nessa geografia.

Primeiramente para poder falar de cultura utilizarei uma breve definição que

Castells apresenta em seu livro já acima citado:

Por cultura entendo um conjunto de valores e crenças que formam o

comportamento; padrões repetidos de comportamento geram costumes que são

repetidos por instituições, bem como por organizações sociais informais. Cultura é

diferente de ideologia, psicologia ou representações individuais. A cultura é uma

construção coletiva que transcende preferências individuais, ao mesmo tempo em

que influencia as práticas das pessoas no seu âmbito, neste caso os

produtores/usuários da Internet.(CASTELLS, 2003, p.34).

Os registros das mais diferentes ações humanas, em redes virtuais

coletivas, agora podem ser vistas, experienciadas e acessadas pelos hipertextos

no ciberespaço. Essas ações traduzidas em bits fazem da rede um grande arquivo

de expressões postadas e publicadas. Como o próprio Castells já tinha

comentado, a Internet é antes de tudo uma criação cultural, assim, podemos

caracterizar esses hipertextos linkados como os próprios valores e crenças

culturais que transitam coletivamente na rede numa infinidade de ações locais,

tornando-se globais, que transformam todo esse universo num imponderável

hipertexto, como foi dito por Lévy.

Castells também comenta que a Internet foi projetada como uma tecnologia

de comunicação livre e o resultado não é que sejamos livres graças à internet,

mas que tudo depende do contexto e do processo, e devido à sua maleabilidade e

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a possibilidade de alteração pela própria prática social, pode-se então trazer à

tona resultados sociais potenciais.

Para perceber melhor como se dá esse processo cultural é interessante

analisar seus agentes, os sujeitos e suas ações.

Castells afirma que a cultura da internet se caracteriza por uma estrutura

em quatro camadas: a cultura tecnomeritocrática, a cultura hacker, a cultura

comunitária virtual e a cultura empresarial. (CASTELLS, 2003, p.34).

Alguns relatos históricos citados no início deste capítulo ilustram ações e

reflexos dessas camadas culturais que o autor aponta.

As quatro camadas dispostas por Castells seguem uma hierarquização

disposta da seguinte forma: no topo está a cultura tecnomeritocrática, voltada a

projetos tecnológicos, de excelência científica e do mundo acadêmico. Baseada

no poder do conhecimento, “especifica-se como a cultura hacker ao incorporar

normas e costumes as redes de cooperação”. (2003, p.35). Os hackers com

domínio dos meios tecnológicos adotaram a crença na interconexão interativa,

construindo redes sociais e criaram comunidades online onde praticam uma

cultura comunitária virtual. Para Castells, a cultura comunitária virtual faz da

internet um “meio de interação social seletiva e de interação simbólica.” (2003,

p.35). A cultura empresarial utiliza-se das demais culturas para difundir suas

práticas em todos os domínios da sociedade buscando por meio da rede a

implantação veloz de seus interesses econômicos.

Seguindo com Castells, a internet no estágio atual possui dois tipos de

usuários. Os produtores/usuário, cuja prática é diretamente voltada às questões

tecnológicas de evolução do meio, e os consumidores/usuários, que são os

beneficiários dos sistemas e aplicativos e que não estão diretamente ligados ao

desenvolvimento da net. Cabe ressaltar que no início os primeiros usuários foram

os produtores-consumidores e que embora os consumidores não produzam os

sistemas e programas, seus usos possuem grande valor de mudança e de

importância para a própria produção da internet.

Uma vez que as comunidades virtuais, segundo Castells, são “fontes de

valores que moldaram comportamento e organização social.” (2003, p.46), o

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recorte desta pesquisa desenhou linhas entre as comunidades virtuais. Composta

de sujeitos plurais, as comunidades on-line tiveram origens semelhantes aos

movimentos contra culturais dos anos de 1960. A cultura comunitária moldou as

formas sociais e os processos de uso, contudo, à medida que se expandiram em

relação ao alcance e ao número de usuários, suas conexões com os movimentos

alternativos se enfraqueceram. (CASTELLS, 2003, p.46-49). Devido a grande

flexibilidade da net em transitar fluxos de informações, muitos grupos aproveitaram

para disseminar suas ideologias, desde extremistas (neonazistas, racistas,

pedófilos) a ambientalistas e artistas.

Castells define que as comunidades possuem duas características

fundamentais, a primeira é a comunicação horizontal e livre, diante de uma era

dominada por “mídias e burocracias governamentais censoras”. (2003, p.48). A

segunda característica apresentada pelo autor é a formação autônoma de redes,

que possibilita qualquer pessoa de criar e fomentar grupos de identidade e

construção de significados, transformando essas comunidades em instrumento de

organização social e ação coletiva. (2003, p.49).

Esse caldo da cultura digital parece ainda estar sendo degustado e

digerido. As ações e reflexos são naturais de nossa geração, ou melhor, de nossa

era, pois as gerações são muitas, os interesses e os questionamentos são

inúmeros.

Rodrigo Savazoni em Provocações, apresentação do livro já mencionado

Cultura digital.br, explica:

Nosso intento com este trabalho é produzir provocações sobre a cultura digital.

Sabemos que as ideias sobre este nosso mundo acelerado ainda não decantaram.

O nosso vôo é inteiramente percorrido dentro de nuvens, por isso os efeitos da

turbulência são permanentes. Neste ambiente, as sínteses são impossíveis. A rota

parece infinita.

O diferencial, no entanto, consiste na utilização de um site de rede social para

organizar os debates no plano virtual. Nesse ambiente, os interagentes podem

organizar sua rede política de relacionamentos, construir grupos e fóruns de

discussão, propor atividades e conversas, produzir um blog, entre outras

atividades.(apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p.07).

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Agende-se e participe, ajudando-nos a construir a cultura do presente.

Os organizadores Rodrigo Savazoni e Sergio Cohn reúnem na Cultura

digital.br um grupo de especialistas que discorrem suas várias opiniões e

interrogações sobre a cultura digital. Seguindo com a provocação de Rodrigo

Savazoni, essas linhas que seguem serão como um ready-made duchampiano,

uma apropriação Ipsis litteris (Ctrl V CtrlC)42 na tentativa de definir e dialogar sobre

a cultura digital.

O livro Cultura digital.br é um apanhado com mais de vinte entrevistas

realizadas em São Paulo, Salvador, Rio de Janeiro e Brasília, uma mostra

bastante representativa do pensamento contemporâneo brasileiro sobre cultura

digital e suas mutações em curso. Para Savazoni Cultura digital.br “é uma obra de

intervenção e pensada com a intenção de provocar reflexão e ação em seus

leitores.” Basta acessar www.culturadigital.br e participar da discussão sobre a

cultura contemporânea, lá o livro continua de forma horizontal com os autores em

redes de discussões, abrindo fóruns, criando blogs, com a possibilidade de

“produzir suas próprias narrativas a partir das provocações que compilamos”.

(SAVAZONI, 2009, apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 117).

Com essa citação, o próprio organizador já define um pouco esse

fenômeno, demonstrando de maneira prática como funciona a cultura digital, nas

possibilidades de interatividade, de relações e da própria horizontalidade que é

permitida através da comunicação em rede.

Nós somos a própria cultura digital e sequer temos um espelho. Por isso,

resolvi deixar que cada entrevistado nos mostrasse seu caminho, sua opinião, tal

qual é mencionada no livro. Não é possível criar ficção neste momento, estamos

todos no olho do furacão, e repetindo o que o próprio organizador Rodrigo

Savazoni comentou; “estamos voando por entre nuvens e turbulências”. Logo, as

afirmações são feitas de dentro pra fora, cada qual com seu contexto, e aqui

apresentadas em seu total.

42

Este copia e cola, na realidade, vem a ser uma das metodologias mais atuais usadas por essa geração digital, devido a velocidade e o volume de informações digitais e a possibilidade de acessar diversos conteúdos simultaneamente.

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O presente requer que repensemos e reapresentemos a concepção de plágio.

Sua função tem sido há muito desvalorizada por uma ideologia que tem pouco

lugar na tecnocultura. Deixemos que as noções românticas de originalidade,

genialidade e autoria permaneçam, mas como elementos para produção

cultural sem nenhum privilégio especial acima de outros elementos igualmente

úteis. Está na hora de aberta e ousadamente usarmos a metodologia da

recombinação para melhor enfrentarmos a tecnologia do nosso tempo.

Critical art ensemble43

, 2001 (Cultura digital.br,2009, p. 151)

A melhor maneira de preservar a integridade das opiniões foi a de colocar

como se fosse uma grande conversa, linhas desenhadas pelos entrevistados e

deslocadas para esse com-texto das redes virtuais, num processo de apropriação

como se fosse um urinol assinado por R.MUTT.

2.6 www.culturadigital.com.br

Para Franklin Coelho, coordenador do projeto Piraí Digital, a definição de

Cultura digital:

A cultura digital significa uma revolução em termos de hábitos cotidianos

baseada numa história de sociedade industrial compartimentada, segmentada.

Isto se quebra numa possibilidade de estrutura em redes. O digital é

exatamente a quebra dessa sociedade industrial e a possibilidade de uma

explosão em termos de uma sociedade em rede. (apud CULTURA DIGITAL.BR,

2009, p. 117).

André Lemos, sociólogo, apresenta um olhar sobre as origens desse

fenômeno e da possibilidade de protagonização política e representativa via

comunicação digital.

Às vezes, quando se fala de cultura digital, cibercultura, tem sempre uma ideia

futurista, uma ideia de ficção científica. E, na realidade, não é isso, trata-se da

cultura hoje marcada por essas ferramentas eletrônicas. O que a meu ver

alterou substancialmente a nossa relação com os objetos técnicos na

atualidade é que pela primeira vez, talvez, a gente tenha a dimensão técnica, o

43

Critical Art Ensemble (CAE) - www.critical-art.net

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digital, colado à dimensão da comunicação. São tecnologias não apenas da

transformação material e energética do mundo, mas que permitem a

transformação comunicativa, política, social e cultural efetivamente. Porque nós

conseguimos transitar informação, bens simbólicos, não materiais, de uma

maneira inédita na historia da humanidade.

A gente pode empregar como sinônimos cibercultura e cultura digital, que

seriam nomes para a cultura contemporânea, marcada a partir da década de 70

do século passado, pelo surgimento da microinformática. A microinformática é

que vai dar esse tom planetário que ganha uma dimensão mais radical com o

surgimento das redes. Então é essa cultura do telefone celular, dos

computadores, das redes, dos micro-objetos digitais que funcionam a partir

desse processo eletrônico digital. A cultura digital é algo que já está entre nós

desde a década de 1970 e que ganhou contornos mais políticos e mais

comunicacionais hoje. (apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 136).

A produção dessa cultura via digital possibilitou a visualização dos eventos

gerados pelas margens. A comunicação dos periféricos ganha potência através da

combinação dos códigos e signos transitando pelos canais virtuais. O sociólogo

Sergio Amadeu, em sua entrevista sobre o fenômeno da cultura digital, aponta

que:

Práticas sociais que eram extremamente marginais ou secundárias, a partir do

momento que utilizam essas tecnologias da informação e utilizam estas

tecnologias em rede tomam um corpo maior, e nós temos um processo de

reversão dessa tendência. Então, tudo o que era separado, especializado,

passa a ser unificado na rede. Você tem o fenômeno da tecnoarte, que é um

típico fenômeno da cultura digital. É um fenômeno que se utiliza da

metalinguagem digital, da capacidade de recombinação de arquivos, da

capacidade de retrabalho de toda a produção simbólica. Então cada vez mais

ciência, tecnologia e arte se juntam. (apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 67-

68).

O que estava fora pode estar dentro. As redes virtuais possibilitam agora

uma conexão de indivíduos que não tinham voz dentro de um sistema hegemônico

de comunicação. Esse fenômeno abriu um novo espaço de atuação e de fomento

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de cultura no ciberespaço, e desenvolveu, através do uso contínuo dos meios

tecnológicos, uma linguagem própria. Sobre o ciberespaço Sergio Amadeu relata:

Do Willian Gibson, de Neuromancer, para a academia. E ninguém é contra

aquela expressão para definir esse espaço onde se cria fundamentalmente uma

cultura digital, que não se limita efetivamente ao interior das redes. Mas quando

você pensa em cultura digital e cibercultura, necessariamente você está

pensando num fenômeno que se relaciona com as redes. Então, quando olho,

ouço ou penso a cultura digital, eu também penso numa fase da chamada

cultura de rede. É basicamente isso. Ela é ligada às redes que usam a

metalinguagem digital, que retiram toda a produção simbólica dos seus

suportes, e por isso ela permite tanta recombinação. (apud CULTURA

DIGITAL.BR, 2009, p. 67-68).

Tudo junto e misturado. O acesso por clicks, abrindo janelas para a grande

rede, consegue transformar os indivíduos, antes espectadores, em agentes

promotores da própria cultura de uma maneira muito rápida. Essa nova interface

da comunicação desenvolveu a produção descentralizada de fluxos de

informações independentes e de diferentes códigos, por meio da atualização de

signos, imagens e texto. A criação, artística ou não, quando colocada em rede

possibilita o despertar de novos blocos de percepção. O caminho, o conteúdo,

pode ser agora comandado ou acessado pelo indivíduo que esta por detrás da

tela, que digitaliza suas relações, edita sua autorrepresentação e as vivências na

net. A cultura digital em rede proporciona uma fusão de experiências

recombinadas simbolicamente, seja ela por um novo vídeo no youtube, uma nova

foto postada no facebook, flickr ou orkut, que vão ser atualizadas através dos

hipertextos, estimulando a percepção virtual e, assim, criando os eventos e as

movimentações dessa nova comunicação.

Dessa forma, a combinação das representações circuladas nas redes

virtuais possibilitou uma maior liberdade e abrangência das informações e a sua

circulação passa agora a não ter fronteiras, tempo e espaço são redefinidos pelos

acessos, pelos meios tecnológicos. A criação da cibercultura navega por entre os

espaços e aterrisa em lugares múltiplos simultaneamente. A inteligência coletiva

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recombina os signos, não pede licença, e o que estava protegido pelos

Copyrights, agora é pirateado e distribuído.

Sergio Amadeu menciona que,

Então você tem um conjunto de ideias que foram hegemônicas durante todo o

século XX, até a emergência da rede. Por que eu digo isso? Porque quando a

rede liberta o texto do suporte papel, liberta a música do suporte vinil, liberta a

imagem do suporte ali da película, o que você tem? Você tem aquilo o que

sempre foi: criações. Quando aquilo vai para a rede, você tem não só uma

capacidade de convergência desses símbolos, desses ícones, de toda essa

produção, mas tem a possibilidade de fazer com que aquilo retorne ao ambiente

comum da cultura. Você recombina tudo. (...).

Sem dúvida que está ocorrendo um processo do que é coletivo, do que é

comum. O que não significa que não exista a participação do indivíduo nesse

processo. Isso é impossível de você negar, uma vez que você teve um período

que criou esta construção social chamada indivíduo. Não tem jeito de você

dizer: “O indivíduo não tem um papel nesse processo.” Só que o que a rede

faz? Ela fala: “Indivíduo, você é limitado dentro desse processo. A sua criação é

necessariamente coletiva.” A cultura é, necessariamente, coletiva. E a cultura é

feita dessa forma. Nós, numa fase histórica, tivemos que dizer que isso era

extremamente relevante. A relevância estava no autor e no gênio, que pode

existir e que existe. Mas espera aí! Você está dentro de um contexto, então os

grupos são importantes nesse sentido coletivo. A rede retoma isso. A rede

permite que essas práticas se manifestem, e permite que a gente retome alguns

termos que eram aplicados num contexto completamente diferentes. (...)

O grande lance é que está se gestando uma fusão de culturas, uma diversidade

cultural que nós não tínhamos possibilidade de conhecer antes. As culturas

tinham mais dificuldade de se movimentar, mais dificuldade de se recombinar. A

rede facilita isso. E a ideia de que uma cultura ela está sempre em movimento,

porque ela sempre está movimento, ela sempre busca a criação, ela tem uma

dinâmica interessante e essa dinâmica se junta, no caso da rede, com uma

diversidade impressionante. Então eu acredito que esse fenômeno da

diversidade cultural ele foi reforçado, ele é reforçado no ambiente de rede.

(apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 69-71).

A cultura é, e sempre foi, coletiva, produzida por determinados grupos. A

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importância também das redes virtuais vem a ser o registro de suas relações, a

própria movimentação dessas comunidades, que fomentam esse processo

cultural, onde através dos hipertextos postados torna-se possível traçar uma

narrativa dos acontecimentos.

A geração do agora, virtual, talvez vivencie essa realidade por meio da

autorrepresentação inserida dentro de determinadas “comunidades imaginadas”,

como denominou Benedict Anderson, que se manifesta através dos ambientes das

redes virtuais sociais, diferenciando-se de acordo com cada interesse do indivíduo

ou grupo. A possibilidade de conhecer pessoas que nunca viu, de ir a lugares

nunca visitados, traz infinitas possibilidades de comunicação e de combinação.

A respeito dessa produção cultural na rede, Sergio Amadeu segue dizendo,

O que a cultura digital exige? Qualidade. Me exige saber escolher, saber optar.

Então eu não me impressiono com o poder do processamento. A qualidade que

você tem que ter hoje é a de entender o processo de rede. É mais importante

do que o processamento. O processamento é importante. Mas, veja, a rede é o

grande multiprocessador. Então a questão é: quais são as suas estratégias na

rede? Como é que nós vamos organizar, articular nas redes?

Então a rede é a grande possibilidade de organização e comunicação. Não

existe organização sem comunicação. E se as redes são fundamentais o

processo de organização hoje, você está dizendo efetivamente que dentro

dessa comunicação você tem que buscar aquilo que a gente chama de

hierarquização, de priorização, de relevância. O mundo presencial é o mundo

das escolhas. O ciberespaço não é o mundo das escolhas, por isso ele se

coloca apenas como democracia dentro de ciberespaço. Se eu não gosto do

teu site, eu vou para o outro. Eu não preciso optar. (...)

A internet é uma rede onde a inteligência está na periferia, e não no

centro. A internet não tem um pólo central. Agora, você tem a internet como um

grande oceano. A metáfora da navegação é muito boa. (apud CULTURA

DIGITAL.BR, 2009, p. 72- 75).

Broadcast Yourself, essa é a chamada do próprio site de vídeos youtube.

Esse slogan ajuda a definir bem sobre essa questão da cultura digital. Estamos

agora navegando por estradas de nós mesmos, somos criadores de nossos

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eventos sem a necessidade de aprovação de instituições e de interesses. Na

horizontalidade da rede surge a possibilidade de piratear a própria cultura, de

samplear e recombinar, gerando ondas com enorme potência e amplitude cultural,

prontas para serem navegadas. Cada rede cria seus laços, e sua

representatividade está expressa diretamente nesses laços, nessa relação.

Comunidades que no passado recente utilizavam-se de meios de

comunicação como zines, xerox, correio, revistas, livros, e que estavam

identificadas pela maneira como se vestem, pelas ideologias e conceitos, agora

transitam com seus downloads pelos mais variados espaços, identificados pelos

sites que usam, pelas imagens postadas, músicas nos www´s.

Quando perguntado se essa questão da cultura do “faça você mesmo” vem

da herança punk, ou ciberpunk, como uma forma da contracultura e o peso disso

na cultura digital, o antropólogo André Lemos responde,

Ah, o peso é total. Continuamos ainda sobre esta influência, hoje todo discurso

por liberdade de expressão, discussão sobre direitos autorais, remediação de

mídia, blog jornalísticos, tudo isso aí vem justamente desses hackers que

inventaram a microinformática, que inventaram os protocolos da internet. Que

faz com que a gente possa usar a internet sem ter que pagar royalties, porque

esses protocolos são abertos e são uma ferramenta técnica da humanidade.

Então esse pensamento de liberação da informação e de trocas livres de

informação e produção colaborativa do conhecimento emerge justamente a

partir da microinformática, com essa possibilidade de construção aberta e

coletiva. Os primeiros hackers são os caras que vão inventar a microinformática

e os protocolos da internet, que vão construir a internet. O maior exemplo de

software livre que nós temos hoje em funcionamento é a própria internet. O

HTML é um código aberto, os protocolos são de domínio público. Então nós

temos uma herança do movimento ciberpunk, se a gente quiser chamar assim,

que seriam os punks da cibernética, aqueles que dizem “olha, aproveite a

tecnologia, faça da tecnologia o que você puder, faça dessa tecnologia uma

obra de arte, porque só assim você vai poder dominar esse sistema, e não

deixar que outros dominem o sistema e você junto”. (apud CULTURA

DIGITAL.BR, 2009, p. 138).

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Dentro dessa contaminação diária de downloads e uploads, as tribos vão se

formando e se relacionando, a interatividade nos próprios meio virtuais consolidam

a identidade e o agrupamento em comunidades. A mudança radical nos meios de

comunicação, dentro de uma história extremamente recente, possibilita uma

grande independência na hierarquia da distribuição das informações. Claro, como

já mencionou Castells em linhas anteriores, a Internet não veio para libertar todos,

porém, quando sua utilização desloca o sujeito da dependência do mass media e

transforma em produtor cultural, seja ele, uma espécie de ciberpunk, de hacker ou

pirata da rede. Quando digo pirataria, venho mencionar o saque da soberania

hegemônica dos meios de comunicação com suas verdades impostas, que agora

através de ações virtuais coletivas conseguem desvirtuar a obediência “católica

apostólica” dos “papas” do capitalismo. Para Sergio Amadeu:

Isso me lembra um cara que me influenciou muito, um antropólogo da UnB,

Gustavo Lins Ribeiro. Eu li um texto dele, ele traz as ideias do Benedict

Anderson, que ele diz o seguinte, em síntese: o Benedict Anderson fala que a

imprensa foi fundamental para criar essa comunidade imaginária, que se chama

nação. A imprensa foi vital para solidificar uma pauta dessa fraternidade, dessa

comunidade, não é? E o Gustavo Lins Ribeiro diz: se a imprensa foi

fundamental para construir uma comunidade imaginada, chamada nação, será

que as redes digitais (ou a internet) não está ou não será fundamental para

construir uma comunidade imaginada transnacional?

(apud CULTURA DIGITAL.BR,2009, p. 76).

Esse grande sonho de comunidade global imaginada talvez não seja a

união de todas as nações num grande grupo homogêneo, pois seria uma grande

pobreza cultural e também de extremo perigo no que se refere ao controle

hegemônico de poder político e econômico. Mas o que potencializa as questões

em rede pode ser a capacidade de fusão e troca de diferentes culturas, a partir de

sujeitos e comunidades locais com possibilidades de intervenção globais.

Para Nelson Simões (diretor-geral da RNP, Rede Nacional de Ensinos e

Pesquisa) www.rnp.br/en reflete sobre a cultura digital e a importância das redes

nesse processo:

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De tudo o que eu vivi, a colaboração digital foi talvez minha experiência de

interação mediada mais poderosa. Me surpreendeu o papel que o digital foi

tomando na sociedade. Tecnologicamente falando tudo isso é muito precário e

ainda muito recente, mas seus efeitos são muitos poderosos.(...) A rede é o

centro desta troca, seus usos são cada vez mais múltiplos e ela continua

ganhando papel central na forma como nos relacionamos hoje. A evolução que

se deu é surpreendente, os números foram muito rapidamente multiplicados por

dez mil na velocidade e na capacidade, e isso aconteceu por conta dos usos.

Uma rede dessa é mais do que a forma de comunicar, ela abre o espaço para

você criar coisas que nós não conseguimos imaginar ainda. A interação

próxima do real tem a ver com gerar uma oportunidade de inovar. A internet foi

construída por múltiplas mãos com uma visão de compartilhar, de trocar, de

interoperar. Ela nasce com o objetivo de integrar pontos que não conversariam

naturalmente, então todos esses requisitos de abertura, neutralidade,

diversidade, isto tem muito haver com aspectos culturais dos relacionamentos

da geração de conhecimento. A rede se encaixou nesse espaço e cumpre esse

papel. E criou a possibilidade de continuar avançando, isso não tem limite

ainda. (apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 108).

A cada dia as pessoas se mostram mais inseridas nas redes virtuais, com

diferentes idades e condições sociais. Quais os motivos? Quais os interesses? A

questão é que a complexidade dessa imensa rede não possibilita previsões,

profecias, pois, sua mutação é contínua, se faz a cada atualização, a cada nova

plataforma que se abre. Interatividade direta que influencia em novos modos de

comunicação, das redes acadêmicas e militares aos twiiters. Cada qual se

adaptando e aderindo aos espaços que surgem, por curiosidade, por interesses

econômicos, para inserção em comunidades. Impossível generalizar, todavia é

nítida a questão da importância de estar inserido na rede e não ficar a margem. A

conexão se faz necessária. A produção colaborativa independente pode ser um

ganho e um caminho alternativo nesse contexto de informação de massa gerada

pelos meios de comunicações hegemônicos.

Andre Lemos diz:

Eu acho que a produção colaborativa já está aí. Na realidade nem deram

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um caminho, elas foram criadas e foram apropriadas.(...) Então eu acho que

nós precisamos hoje, em termos de inclusão, ensinar as pessoas a aproveitar

um potencial que já está aí e não ficar pensando “bom, quem sou eu para

produzir tal coisa, quando eu tiver uma inspiração, quando eu tiver os bons

meios aí sim eu vou produzir alguma coisa”. Nós já temos isso nas nossas

mãos e as pessoas já estão fazendo, embora eu acha que ainda timidamente.

Mas nós já temos um instrumento que pode se transformar efetivamente em

arte, no sentido de uma transformação artificiosa do mundo para produzir essa

relação com o outro. (apud CULTURA DIGITAL.BR,2009, p. 140).

Talvez um dos maiores desafios seja saber operar os meios de maneira

consciente. A transformar interação numa maneira política e/ou poética de

conexão, que visa também trazer voz para aqueles que deveriam estar mudos. As

grandes corporações se utilizam desses aparatos digitais como forma de

manipulação, sedução e controle, porém estas produções políticas e poéticas

permitem a produção de cultura e informação sem estar atreladas a nenhum

sistema político hegemônico ou de consumo.

O “do it yourself” é um dos grandes exemplos de como se interagir.

Atualmente os infinitos recursos nos permitem, ainda melhor, nos instigam a

operar e dialogar nesse espaço. André Lemos em sua entrevista segue dizendo

que mesmo diante de muita banalidade em termos de novas informações e

conteúdos, com a internet tem-se a possibilidade de produzir e escrever as

informações. Escrever com textos, fotos, vídeos, promover críticas às mídias e aos

jornais, conseguindo assim até produzir os próprios jornais. O grande desafio,

para ele, é que num país como nosso, de desigualdades, a inclusão das pessoas

e o estímulo para que as produções sejam feitas de formas colaborativas cria e

desenvolve um processo diferente de participação. Anteriormente, a inclusão se

dava numa questão do espectador, diante da tela do cinema, da televisão, e a

única possibilidade era a de uma postura crítica em relação ao texto como um

todo. Hoje temos possibilidades e recursos para que possamos realmente produzir

e publicar filmes com boa qualidade.

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Então você tem em cada movimento, em cada instrumento que aparece uma

função social que rapidamente se apropria para fazer coisas. Não estou

dizendo com isso que nós estamos vivendo uma panacéia participativa. Quando

a imprensa de Gutemberg surge também tem uma possibilidade de que a gente

tivesse todas as publicações distribuídas e isso não garantiu necessariamente o

melhor dos mundos. Mas nós temos uma grande potência nas mãos, que está

sendo atualizada cotidianamente, e temos coisas já concretas acontecendo.

Mas não podemos pensar que isso vai resolver tudo, que a mera participação e

colaboração vai resolver todos os problemas. Mas a partir do momento em que

nós podemos emitir livremente, nos conectar aos outros, nós conseguimos

reconfigurar a cultura, a sociedade, a política. Esses para mim são os três

princípios básicos da cibercultura, e podemos encontrar isso nos blogs, nos

podcasts, no software livre, no Twitter. Todo mundo pode produzir. Essa

produção só faz sentido se um tiver conectado a outro, porque não é produzir

para mim mesmo, e sempre que uma sociedade dá voz às pessoas, as pessoas

podem falar, as pessoas podem se agregar para fazer coisas, isso tem uma

potência gigantesca de transformação social, política e cultural. Não é à toa que

são os países que não querem transformação que reprimem justamente a

emissão e a conexão. São os países mais totalitários hoje que tendem a

reprimir a internet, porque ela é justamente o lugar da emissão e da conexão.

(apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 142).

Por meio da cultura digital, os valores podem ser trocados e invertidos. As

periferias conseguem ser valorizadas, num movimento de dentro pra fora, sem a

necessidade de uma apropriação cultural pelos mass media, mas sim pela própria

criação de espaços de veiculação das proposições. É também por essa

virtualização da cultura, que nos permitimos a construção de uma hierarquização

das informações, onde somos capazes de nos guiarmos a partir de nossos

próprios interesses, editando os conteúdos que queremos acessar, criando novos

conteúdos para protagonizar nossos “eus”, singulares ou coletivos, através da

Internet.

Importante ressaltar que essa possibilidade de produção gera também um

boom de informações como nunca fora publicada anteriormente. Lévy apresenta

esta era digital, a partir de uma definição de Roy Ascott, como o “segundo grande

dilúvio”, o da informação. A densidade de links, imagens, hipertextos, a explosão

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dos bancos de dados de maneira anárquica e caótica, a ensurdecedora cacofonia

das mídias que inundam regiões por ondas turbulentas de propagandas e apelos,

provocam sensações humanas até então nunca exploradas. Um período histórico

que tem como pilar a comunicação e informação num grau de influência nas

relações sociais, político e econômicas, que exigem cada vez mais a realização

das ações em redes virtuais. O Sociólogo Laymert Garcia dos Santos, em sua

entrevista no livro Cultura digital.br, diz que as mudanças a respeito da cultura vão

muito além de apenas a migração para o digital.

Na minha perspectiva, é outra história, porque não se trata só de uma digitalização

da cultura, mas da criação de uma outra cultura, com outros referenciais, com uma

outra cientificidade operatória (ou seja, uma outra maneira, um outro conceito de

cultura) e uma outra maneira de conceber o que deve ser considerado ou não

cultura e de como é que você olha as outras culturas, que não são a cultura de um

cibernético. E, ao tratar a cultura moderna como também sendo de um outro

tempo, como cultura tradicional, ela permite uma reavaliação completa das outras

culturas com relação ao moderno, e da moderna e das tradicionais com relação a

essa cibercultura. Então é uma questão muito maior do que só uma utilização, uma

tradução ou transposição do que é cultura para o mundo digital ou, enfim, para a

chamada realidade virtual. É muito mais do que isso. É uma reconfiguração da

própria noção de cultura e da noção de conhecimento, inclusive, que está junto

com a noção de cultura. Foucault percebeu que talvez a gente esteja indo para

uma formação outra, esteja entrando numa outra formação histórica e que há uma

transformação de fundo no campo da vida, do trabalho e da linguagem. Que são

os três campos fundamentais para mostrar que nós estamos caminhando para

uma outra configuração. Eu posso dar um exemplo disso, que é um caso muito

concreto. O que a vida cibernética trouxe? Ela trouxe a noção de informação. O

que é a informação? Informação é a terceira dimensão da matéria, junto com a

massa e a energia. Portanto, quando a informação começa a ser central na

elaboração e até na própria definição do que é o real, o entendimento a partir

dessa noção de informação (que é a diferença que faz a diferença), ao ser central

na cultura contemporânea, é necessário começar a ver também as outras culturas

a partir dessa noção. Se você começa a ver as suas culturas a partir dessa noção,

você começa a notar o seguinte: a alta tecnologia lida com atualizações do virtual,

de potências virtuais (ou potências do virtual, da dimensão virtual da realidade),

não da realidade virtual, mas da dimensão virtual da realidade, e ao lidar com

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essas potências, ela atualiza um determinado número de potências de uma

determinada maneira. (apud CULTURA DIGITAL.BR, 2009, p. 286).

A busca por maior entendimento dessas mudanças no processo cultural e

até na própria cultura atual, como descreveu o sociólogo Laymert Garcia dos

Santos, é realmente o motivo pelo qual busquei, através de diversas opiniões,

principalmente nas páginas anteriores, formular conceitos, argumentos, em suma,

buscar embasamento para poder descrever, um pouco, o que vem acontecendo

com as relações humanas nesse início de século, no que se refere às mudanças

na comunicação por meio das tecnologias virtuais. Este fenômeno cultural é um

dos reflexos do comportamento de nossa sociedade em meio à virtualização. Não

é apenas uma particularidade dos artistas, nem, contudo dos escritores urbanos,

mas um processo de mudança social como um todo, caracterizado pelos usos das

tecnologias digitais.

Porém quando me debruço a esboçar estas linhas sobre a cultura digital, a

proposta deste trabalho é de trazer a tona alguns conceitos básicos para a

fundamentação teórica no que se refere a autorrepresentação política, artística e

cultural de indivíduos em redes sociais, comunidades, especificamente os

escritores urbanos, bem como seus registros no ciberespaço.

Falar de algo como cultura digital é falar de algo tão presente em nosso dia-

a-dia que poderia falar das interações dessa geração, na qual faço parte, que tem

como suporte de relações e experiências os meios virtuais.

Poderia aqui falar de fotos, arquivos, depoimentos, downloads, broadcast e

então analisar cada questão, quais os interesses nessa autorrepresentação nos

sites de relacionamento, na maneira como pesquisamos, escolhemos nossas

músicas e como interagimos com esse mundo de realidades concretas e virtuais,

de geografias expandidas.

Contudo, não é possível generalizar essas ações, pois as mesmas são

individuais e variáveis de acordo com o contexto, cultural, social, tecnológico e,

também, muitas vezes pelo caráter subjetivo e/ou pessoal.

No meu ponto de vista, esta geração aprendeu a vivenciar essas relações

virtuais como uma expansão da realidade concreta. Já não se pensa apenas no

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material, o ciberespaço nos transforma em seres navegadores dessa realidade

virtual, no caso como explicaríamos a quantidade de relacionamentos que se

constroem através das redes virtuais e em muitos casos chegando até ao próprio

sexo virtual, por meio da imagem, seja ela estática (envio de fotos) ou movimento

(live cam).

No caso do graffiti, a cultura digital escreve, paralelamente com inúmeras

outras narrativas, o rolê de vários brazucas, tanto em território nacional, quanto no

grande e velho mundo, que está sedento por cores e poesias da antiga

Pindorama. A comunicação digital nos permite acessar uma imagem ou vídeo de

diferentes sujeitos conectados em redes, e poder mandar um salve em forma de

post, (uma mensagem, elogio ou crítica) e por vezes receber um também. Relata

também as possibilidades de nos influenciarmos, seja nas cores, no traço, na

atitude ou, até mesmo, na grandeza do exemplo de alguns artistas que há pouco

tempo estavam quase anônimos, e agora podem voar com a arte. Sujeitos esses

que descrevem suas trajetórias e alimentam “sonhos” através dessas imagens

postadas em flickrs, blogs e sites, que na filosofia da arte conceitual é o registro

histórico da obra, o arquivo, resultado da performance.

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Capítulo 3

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REDES

3.1 Redes de transgressão

Para Castells, “a Internet é o tecido de nossas vidas” e, “passou a ser a

base tecnológica para a forma organizacional da Era da Informação: a rede.”

(2003, p.07). O autor segue em sua pesquisa afirmando que a rede é um conjunto

de nós interconectados, que sua formação é uma prática muito antiga em nossa

sociedade e que ganhou vida nova em nosso tempo, transformando-se em rede

virtual de informações, denominada Internet. O capítulo que segue traz a tona

essa relação de “a rede é a mensagem”, parafraseando Castells, onde a rede

conecta sujeitos plurais com suas polifonias e serve de ferramenta de organização

essencial para comunicação e sobrevivência num ambiente de rápida mutação.

(CASTELLS, 2003, p.07).

As redes de comunicação fazem parte de nosso cotidiano. Suas

articulações e conexões são determinantes para o papel que exercemos no aqui e

agora. Hoje pensamos em rede, atuamos em rede, seja ela de maneira comercial,

política ou subjetiva, geramos ciclos de relacionamentos. Nossas conexões

profissionais, familiares, afetivas ou artísticas, nossa maneira de dialogar com o

meio e construir sistemas de trocas atualmente dependem também de interações

no ciberespaço. Essas redes são possibilitadas por um meio tecnológico que

armazena e distribui os diferentes valores e interesses.

Entretanto, quando parei para escrever sobre as redes de comunicação,

uma das metáforas que me veio à cabeça foram as redes dos pescadores daqui

da Ilha de Santa Catarina. Homens e mulheres sentados à beira da lagoa tecendo

e remendando redes de pesca a espera da época da tainha44. Depois de tecida,

os pescadores vão para o mar com diversos barcos tripulados e as colocam em

pontos estratégicos com a finalidade de pegar toneladas de peixes. Alimentos

para sua própria sobrevivência e também para a sobrevivência de toda a

comunidade. Quando a pesca é bem sucedida, a comunidade espera na praia

44

Peixe local que tem forte influencia na cultura da pesca da Ilha de Santa Catarina.

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para ajudar com “mil mãos”, fortes e unidas como um grande cardume, para puxá-

la e assim conseguindo seus peixes vivos, frescos e muitas vezes de graça. Essa

rede, além de ser um instrumento para pesca é uma forma de cultura, pois sua

produção é manual e passada de geração a geração. Essa rede é a intervenção

no meio físico para garantir o alimento, uma união entre indivíduos e o seu habitat,

mas também é uma rede de comunicação entre as diferentes gerações e entre as

diferentes pessoas da comunidade. Essa rede é feita de linhas, nós específicos,

manualmente produzidos, por vezes “malha fina” para peixes menores, camarão e

pode ser lançada apenas por um pescador (tarrafa), entretanto, ela pode ser

quilométrica e ligar pontos distantes captando a maior quantidade de alimento

possível.

Dentro de pequenas comunidades, essa rede é a própria comunidade, seu

retrato, onde cada ponto pode ser comparado com cada habitante, e os fios

seriam então os relacionamentos, as trocas, tanto de experiências quanto de

cultura e subsídios físicos.

Este capítulo não vem a ser uma ode à pesca local ou a cultura ilhéu, nem

toda cultura ilhéu acontece em rede, e nem todo ilhéu é pescador. Ao pensar nas

tessituras das redes de comunicação entre os pescadores locais daqui da ilha de

Santa Catarina, percebe-se que a comunicação e a relação entre os indivíduos

traduzem o conceito de comunidade, que se conecta pelos meios de produção,

sejam econômicos, culturais ou políticos. É através da comunicação que as

linguagens e a identidade se fortalecem, e por meio das comunidades que os

indivíduos se organizam socialmente e exercem seu posicionamento político.

Para os autores Michael Hardt e Antonio Negri, na obra Multidão (2005),

sobre as redes sociais de comunicação e informação apontam que o,

(...) próprio trabalho, através das transformações da economia, tende a criar

redes de cooperação e comunicação e a funcionar dentro delas. Todo aquele

que trabalha com a informação ou o conhecimento – dos agricultores que

desenvolvem propriedades específicas em determinadas sementes aos

criadores de software – dependem do conhecimento comum recebido de outros

e por sua vez criam novos conhecimentos comuns. Isto se aplica

particularmente a todas as formas de trabalho que criam projetos imateriais,

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como idéias, imagens afetos e relações. Daremos a este novo modelo

dominante o nome de “produção biopolítica”, para enfatizar que não só envolve

a produção de bens materiais em sentido estritamente econômico como

também afeta e produz todas as facetas da vida social, sejam elas econômicas,

culturais ou políticas. Esta produção biopolítica e a expansão do comum que

acarreta é um dos principais pilares em que se assenta hoje a possibilidade da

democracia global. (2005, p. 15).

Os autores descrevem a construção do conceito biopolítica através das

relações entre os indivíduos nos três níveis: econômico, cultural e político. Para

eles, a prática da “democracia global” vem da organização política, e entende-se

por política a junção desses três níveis de relacionamentos e o posicionamento

diante do grupo ou sistema. Então, quando a produção cultural é desenvolvida

pelas comunidades e trocada em ambientes em redes, os valores, crenças e

fluxos de informações representam, tanto de maneira singular, como plural –

indivíduo e/ou comunidade – a produção política e o modo como protagonizarão

essa identidade perante os outros grupos.

As comunidades, sejam elas de pescadores ou escritores urbanos,

produzem sua própria identidade cultural e se agrupam pelo espaço geográfico,

pelas relações, pelos laços familiares ou comerciais, interesses, traçando redes de

trocas e de vivências.

Essa rede desenhada pela arte urbana contemporânea tem um de seus

pontos ancorado nesta ilha e nem por isso é apenas ilhéu, ela é pirata, europeia,

americana, pode ser africana, figurativa ou abstrata, rebelde ou bela, é uma rede

que transforma os cardumes de cores e letras espancadas nas cidades em bits,

que alimentam a cultura digital da arte urbana contemporânea.

As mensagens pintadas em muros agora estão também formando redes

virtuais de cultura e comunicação e, dessa forma, pode-se exemplificar através

das redes dos tags/pixos/graffiti a transformação da nossa esfera azul em

“aldeia global”. Este fenômeno de virtualização das relações trata-se de um

acontecimento que engloba os mais diferentes indivíduos conectados e com

possibilidade de comunicação. Fenômeno não apenas restrito às comunidades

dos tags/pixos/graffiti, mas que envolve toda geração desse início de século e é

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a base das transformações sociais atuais. Nesta pesquisa a cultura de arte urbana

contemporânea possibilita, através de sua representação nas plataformas digitais,

exemplificar uma parte dessas mudanças sociais, políticas e culturais, no que se

refere à aproximação e conexão de indivíduos de diferentes lugares num processo

de “desterritorialização” (aproximação atemporal) das geografias pelos meios

virtuais e na troca de informações e arquivos em escala global. Mas a qual aldeia

global nos referimos e como nos conectamos a ela? Em que medida os escritores

urbanos estão emaranhados na rede global?

O escritor moçambicano Mia Couto em seu texto sobre globalização e

tecnologia reflete sobre a possibilidade da web na perspectiva da mosca ou da

aranha. Para ele a web, esse entrelaçar de fios, pode ter uma relação ambígua

entre a rede e a teia. Escreve Mia Couto:

"No silêncio de uma velha sala, eu preparava esta intervenção quando me

aconteceu observar na esquina do teto uma teia de aranha. Esse pequeno

animal concebera e construíra não uma casa onde morar, mas uma armadilha

para caçar. Os ingleses chamam web a esse entrelaçar de fios. A tradução

deste termo é ambígua – pode ser rede, pode ser teia. Essa mesma

ambigüidade puxou o gatilho de uma velha inquietação. Venho partilhar

convosco esse desassossego.

Preocupa-me a maneira como estamos cedendo à tentação de olhar a

tecnologia como solução global para todos os nossos múltiplos males. Muitos

de nós acreditamos que é a técnica que vai nos salvar da miséria. (...) O que

nos separa da riqueza são, sobretudo, questões de natureza não técnica. São

atitudes, vontades, uma determinação política e uma postura do domínio da

cultura. Digitalizar não nos converte em seres modernos. Encostar a orelha num

telefone não nos torna produtores de coisa nenhuma. Caso não venhamos a

exercer alguma soberania em atos que afinal, são de cultura, entramos nesse

universo a que chamamos sociedade digital como um mercador menor, (...).

Não pretendo fazer a apologia de coisa nenhuma. Afinal, é inevitável que

abracemos todo este brilho das inovações digitais. (...) A Web é uma rede mas

também uma teia. Nessa teia a que voluntariamente aderimos seremos a

aranha se tivermos uma estratégia. Seremos uma mosca se nos mantivermos

pensando com a cabeça dos outros." (COUTO, Mia, p.65-67, 2005)

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De acordo com o pensamento de Mia Couto, a metáfora da aranha e da

mosca - teia e rede -, nos traz muitas reflexões a respeito de nossa postura

política nas redes digitais. Talvez nesse momento ainda não seja fácil

percebermos o quanto estamos presos como moscas, mas também o quanto

podemos ser aranhas tecendo estratégias políticas contra hegemônicas ou, quem

sabe até, para alguns, armando teias perigosas. Temos que lembrar que a rede de

comunicação virtual foi criada com intenção bélica de segurança e sigilo militar.

Somente mais tarde, ela se tornou um meio de propagação de ideias e ideais de

grupos hegemônicos, de grandes corporações, do Estado, das Universidades, dos

pesquisadores financiados pelas empresas e, mais recentemente, essa tecnologia

vem sendo democratizada e permitindo acesso a classes sociais de baixa renda.

Agora, ela possibilita também um espaço para a movimentação de informação

com diferentes fluxos e conteúdos.

As posições diante desse sistema são ambíguas, como já disse Mia Couto,

e mesmo em relação às redes de relacionamentos traçadas pelos escritores

urbanos contemporâneos são diversos os posicionamentos. Estamos dentro

desse sistema de comunicação, cada um com suas particularidades, objetivos e

consequências. Agora, temos uma chance de usar esse meio para estabelecer e

protagonizar nossas ações de maneira autônoma.

Uma das questões que se pode levantar sobre a construção dessas redes

pelos artistas urbanos é que essa troca de informação, de arquivos postados em

sites virtuais traz um significante valor tanto histórico quanto cultural. Histórico no

que se refere à produção de uma narrativa não linear feita a partir dos registros

das intervenções urbanas postadas nas mídias virtuais. Cultural pelo fato da

interatividade possibilitar, por meio de depoimentos, de conexões dos indivíduos e

pela influência das próprias imagens via essa geografia, mudanças estéticas,

subjetivas e/ou políticas.

Entretanto, percebemos que antes das conexões em redes virtuais, os

artistas, desconsiderando as tradições das exposições em galerias e museus,

resolveram se conectar a outros meios. A busca por novos circuitos levou muitos

artistas a explorarem outros canais, a cidade, com os graffitis, o correio, com a

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arte postal, o jornal como meio de intervenção e os walkie talkies, como meios de

comunicação nas derivas.

Para Walter Zanini os artistas antes mesmos das novas tecnologias digitais

de comunicação, nas vias de “desmaterialização” da arte conceitual,

desenvolveram uma rede transcontinental de troca de informações, obras,

ideologias e registros via correio, denominada arte postal. Para ele,

A arte postal (mail-art), um sistema prático de comunicação que aproveita como

suporte os serviços dos correios - ou seja, uma forma de intercâmbio que se

estabelece fora dos circuitos do establishment artístico e em condições econômicas

favoráveis - desempenhou um papel único de articulação comunitária, que é

indispensável reconhecer. Com origens remotas nas vanguardas iniciais do século

XX, mais tarde resgatada pelo Grupo Fluxus, a arte postal foi sinônimo, nas

décadas de 1960-70, de uma grande atividade multimídia. Todo o seu projeto, da

produção aos atos de remessa e recepção, colocava-se em situação de confronto

diante do complexo sistema econômico administrativo institucional que envolve a

obra-objeto. Espalhados pelos continentes, os artistas elegeram os meios

reprodutíveis adaptados ao canal, no propósito de estabelecer uma malha sem

intermediários de comunicação. Não raro seus trabalhos seriam expostos

publicamente. Tratava-se sobretudo de material impresso (cartões postais, gráficos,

fotografias, offsets, serigrafias, xerox, jornais, revistas, etc., mas também de filmes

super8 e vídeos), um prolífico mundo de imagens e palavras dirigidas à reflexão da

arte e de grande envolvimento em questões sociais e políticas na ordem do dia, em

problemas ecológicos, etc.. (2003, p.13).

Essas inovações provocaram grandes mudanças nos processos artísticos,

na pesquisa em arte, no que é arte, no que pode a arte e, também, na

apresentação e recepção da arte. Tudo isso, pode-se dizer, causou um curto-

circuito nos circuitos das artes. Cristina Freire em sua obra “Arte Conceitual”

(2006) aponta para relevância desses acontecimentos em rede na arte conceitual.

Segundo Cristina Freire, essas práticas artísticas foram capazes de

questionar e interrogar as posições sempre instáveis e cambiantes das figuras

que compõem o sistema da arte (crítico, curador, editor, galerista), do estatuto

da obra de arte (por meio da indiferenciação entre documentação e obra de

arte), assim como dos meios e instituições que a legitimam. (2006, p.13).

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A abertura de novos e diferentes espaços para a circulação da arte foi uma

forma de questionar os valores e a postura dos sistemas das artes, e surgiu como

uma força de independência das instituições e cânones preestabelecidos, e vem a

ser uma das palavras chaves dessa pesquisa. Claro que mesmo fora dos sistemas

tradicionais, essa produção já possuía sua própria forma de identidade e de

inclusão de seus propositores, e futuramente também fora apropriada pelos

sistemas das artes. As comunidades formadas pelos artistas teciam redes de

comunicação via correio e dialogavam suas experiências, seus valores na forma

de arquivos, construindo sua própria identidade a partir da liberdade, mas também

seguiam heranças de movimentos anteriores de sua produção. Porém, é a partir

desses novos fluxos de informações, transmitido por uma produção artística em

circuitos alternativos, que se desencadeou todo um movimento paralelo de

discussão sobre os preceitos das instituições das artes, buscando uma

aproximação “arte e vida”, nas décadas de 1960/70. A destituição do valor

mercadológico das obras, ligados a essa rede de produção artística independente

dos sistemas tradicionais possibilitava a abertura de outros espaços de circulação

da obra de arte e também um diálogo com sujeitos plurais e distantes, que por

meio das redes de trocas conseguiram polemizar e apontar caminhos diferentes

para o conceito de arte.

Cristina Freire segue descrevendo que era “necessário ampliar o sentido da

arte conceitual, para então incluir ações que partem do cotidiano, misturando arte

e vida, e para as quais projeto e registro integram uma mesma obra.” (2006, p.13).

Dessa forma, a arte postal, livre e “envelopada”, abriu outros caminhos que foram

percorridos pelos arquivos – obras, registros e experiências – em cartas

marcadas, desenhadas que construíram diálogos sem fronteiras.

Walter Zanini descreve que,

Essa arte, de profunda vocação dialógica, destituída de valor de mercado,

estabeleceu incontáveis alianças, situando-se para além das fronteiras

nacionais e blocos ideológicos. Por um específico sentido humano e global, ela

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se projetou como presente pleno de verdadeiras indicações do futuro. (2003,

p.03).

O desenvolvimento dessa rede de artistas, conectados por meio dos

correios, utilizando-se de circuitos alternativos, foi de grande importância na

quebra de paradigmas de valores e conceitos nas artes, configurando-se numa

ruptura com a dependência dos sistemas tradicionais, instituição, museus e

galerias, apontando novos rumos para a produção artística.

Cristina Freire descreve que um dos pioneiros a exercer um tipo de arte

conceitual, e também a utilizar esse termo para representar manifestações

artísticas e acontecimentos, foi o grupo FLUXUS, em 1961, mas essa terminologia

(Arte Conceitual) foi sedimentada nos discursos do sistema das artes a partir da

próxima década, 1970. O interessante é que esse termo “Fluxus” foi criado

inicialmente para ser uma revista com o objetivo de publicar textos de artistas de

vanguarda. O grupo era estruturado ao redor do artista italiano George Maciunas,

radicado nos Estados Unidos, e tinha participação dos artistas Nam June Paik,

Joseph Beuys, George Brecht, Bem Vautier e Wolf Vostell. O Fluxus “desenvolveu

uma atuação social e política radical, que contestava a arte como instituição por

meio de performances, filmes e publicações (contando até com a Editora Fluxus)”.

(FREIRE, 2006, p.13).

As ações do grupo tinham como característica misturar arte e cotidiano e

buscavam destruir as convenções e valorizar as criações coletivas. Performances,

happenings, publicações, filmes e vídeos foram algumas das expressões do

grupo, que obtiveram um “profundo impacto nas artes pela sua postura radical e

subversiva.” (FREIRE, 2006, p.15). No grupo havia o interesse por essa “outra”

possibilidade de expressão que aproximava a arte com as ações do cotidiano, que

potencializava a produção coletiva, simbólica, possivelmente polêmica, e esse

sentimento foi capaz de influenciar gerações de artistas em diferentes cantos do

planeta conectados pelas redes postais.

Em seu artigo a, “Atualidade de Fluxus”, Walter Zanini, descreve,

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O que George Maciunas pretendia, acima de tudo, na atmosfera poética do

trabalho de que foi iniciador, era uma arte feita de simplicidade, antiintelectual,

que desfizesse a distância entre artista e não-artista, uma arte em estrita

conexão com a normalidade da vida e segundo princípios coletivos e finalidades

visceralmente sociais. (...) Também Fluxus rejeitava o “objeto de arte (...) como

um bem não-funcional a ser vendido e meio de vida para um artista” e em favor

de uma produção antiindividualizada. (2004, p.11)

Dessa “simplicidade” nasciam as atividades do Fluxus, sua ideologia

buscava poetizar as “coisas belas” do cotidiano e banalizar e questionar as

tradicionais belas artes. O nome vem de origem latina e seu significado quer dizer,

por exemplo, “mudança contínua”, “estado não determinado”, “flutuante”. (ZANINI,

2004, p.13).

Ana Paula F. de Camargo Lima, em sua tese de doutorado, Fluxus em

Museus: museus em Fluxus, cita um trecho do catálogo da 17º Bienal de São

Paulo, 1983, que traduz, de maneira poética, o espírito do grupo.

Muito, muito tempo atrás, quando o mundo ainda era novo – isto é, aí por volta

de 1958-, um grupo de artistas, compositores e outras pessoas que queriam

fazer coisas bonitas começaram a olhar o mundo em volta de um jeito novo

(para eles): Diziam: - Ei! Uma xícara de café pode ser mais bonita que uma

escultura grandiosa. Um beijo de manhã pode ser mais teatral que o teatro de

um afetadinho qualquer. O barulho de meus pés nas botas encharcadas de

água pode ser mais bonito que uma imponente música para órgão. E quando

viam essas coisas ficaram mais ligados. E começaram a fazer perguntas. Por

exemplo: - Porque todas as coisas que eu vejo que são bonitas, como xícaras,

beijos e pés em botas encharcadas, têm de ser apenas transformadas em parte

de algo mais bonito e grandioso? Por que não posso simplesmente usá-las

como elas são? (apud LIMA, 2009, p.31).

Dick Higgins, uma história do fluxus para crianças.45

45

apud Zanini, Walter (org) 17º Bienal de São Paulo, 1983, p.32 (catálogo de exposição)

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De maneira lúdica poética, por vezes contestadora, o grupo Fluxus

começou a contar uma história diferente para os artistas e a apontar outras rotas a

serem percorridas no universo das artes. A partir de encontros e reuniões,

diversos artistas já propunham ações, anteriores ao “marco oficial” na história do

grupo. Zanini conta que o grande evento que apresentou o grupo foi “a

multiperformance “Fluxus Internationale Festspiele Neuester Musik” (“Festival

Internacional Fluxus de Música Novíssima”), no salão de festas do Museu do

Estado de Wiesbaden, entre 1º e 23 de setembro de 1962”. O festival era

composto de 14 concertos e dentre os participantes, músicos e artistas de

diversas nacionalidades, estavam Dick Higgins, Alison Knowles, George Brecht,

La Monte Young e Maciunas, nos Estados Unidos e, na Europa, Ben Patterson,

Wolf Vostell, Tomas Schmit, o coreano Nam June Paik, Emmett Williams, Arthur

Koepcke e Robert Filliou. Zanini comenta que houve “execução de peças de

ausentes, como John Cage”, e que “as performances tinham sua base na “música”

ou “antimúsica”, que criavam com revolucionário caráter teatral, visual e sonoro”.

O Fluxus originou-se de um agrupamento de artistas “como fruto de uma

internacionalização de propósitos”. (ZANINI, 2004, p.13).

Além de desenvolver seus próprios meios de expressão - (concertos,

publicações e festivais, entre outros) – os eventos tinham a intenção de polemizar

e provocar uma mudança na produção artística. Zanini usa as palavras do próprio

manifesto de 1966 para apresentar algumas ideologias do grupo. O Fluxus

“abandonara a distinção entre arte e não-arte” (...) abandonara a

“indispensabilidade, exclusividade, individualidade, ambição, habilidade,

complexidade, profundidade, grandeza, valores institucionais e utilitários” e

conceituava-o como “monoestrutural, não teatral, não barroco, impessoal,

qualidades impessoais de um simples evento natural, um objeto, um jogo, um

quebra-cabeça ou piada. (ZANINI, 2004, p.12).

Maciunas e seu grupo fluíram em outras águas, no que se refere às

vanguardas artísticas de sua época. Com heranças nos movimentos futurista –

quanto ao “relacionamento das dimensões que separavam ancestralmente a arte

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da vida” –, dadaísta – no “choque com os dominantes hábitos da sociedade

burguesa, em insólitos caminhos de liberdade” –, e em Duchamp, como guia

conceitual. (ZANINI, 2004, p.11). O grupo foi um dos pioneiros a buscar uma

quebra nos paradigmas das artes através de ações cotidianas no espaço urbano,

como também o desenvolvimento de trocas de informações, obras, arquivos por

meio de redes postais, na criação de festivais, happenings e na produção e

distribuição de mídias alternativas.

Caracterizados por intervenções lúdicas e poéticas no espaço urbano as

atividades do grupo Fluxus além de proporem uma ruptura nos processos

artísticos da sua época também questionavam alguns espaços institucionais, com

certa dose de humor e crítica.

Ana Lima, em sua pesquisa, comenta que em abril de 1963, o grupo,

liderado por George Maciunas, envia por meio do Boletim Fluxus nº6, a proposta

de “sabotar e interromper os usuais mecanismos e protocolos da sociedade de

espetáculo, teatros, museus e galerias.” As instruções eram as seguintes:

1. Interrupção de concertos durante momentos sensíveis com “bombas de

fedor”, “bombas de espirro” e etc.

2. Encomendas por telefone em nome de museus, teatros e galerias, a

serem entregues na hora exata ou logo antes das aberturas. Encomendar

grandes objetos: cadeiras alugadas, mesas, palmeiras, caixões, madeira, folhas

de compensado, tijolos, areia, carvão a serem entregues na calçada.

3. Interromper entradas de salas de concertos, teatros, museus, galerias, etc.

durante as horas críticas chamando (pelo telefone) vários taxis, ambulâncias,

bombeiros, etc.etc.etc. (isso poderia ser combinado com a “pane” da frota

Fluxus). (LIMA, 2009, p.47).

Ana Lima atesta não conseguir relatar o quanto dessa proposta foi

empreendida, porém, traz como relevância, que a partir da conservação física

desse boletim, que chamaremos de arquivo, permanece “potencialmente uma

temporalidade estendida”, numa idéia de “fricção entre os limites da cultura

instituída e a rua”. (LIMA, 2009, p.47).

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Assim, as proposições do grupo trouxeram para o espaço urbano

intervenções físicas com caráter ideológico de questionamentos, como no caso

das ações propostas pelo Boletim nº 6, também possibilitou uma diferente

circulação no fluxo de pessoas promovendo os festivais, e das informações,

desdobramentos, mapas ideológicos, transmitidas pelas obras (por músicas,

revistas e outros). Dessas propostas e eventos, o que se tem são arquivos e

documentações, como no caso do boletim nº 6, filmes e cartas, que se tornaram o

registro histórico de um pensamento coletivo, vivenciado por diversos artistas que

estavam conectados por essas redes.

A respeito das ações do grupo, por vezes individuais, Ana Lima, ainda em

sua pesquisa, descreve que o artista Robert Filliou instalou, em 1961, uma galeria

aberta na laje de seu apartamento para trazer interações imprevisíveis e ilimitadas

a partir de elementos como vizinhos, amigos, músicos, pássaros, chuva, numa

criação coletiva com os fluxos aéreos. Ana Lima relata que essa galeria era “um

ambiente no qual o aforismo “Arte é o que faz a vida mais interessante que a

arte46” (que toma emprestado dos dadaístas) fosse realmente experimentado”.

Assim, enfatiza a pesquisadora que a reivindicação pela liberdade, numa fusão

arte e vida, fazia do Fluxus “antes um estilo de vida do que uma estética ou teoria

rotulável”. (LIMA, 2009, p.48).

Robert Filliou propôs também a criação de uma Eternal Network, uma

conexão em que os artistas seriam pontos autônomos de contato e de troca, uma

valorização à interatividade e a circulação de instruções, mapas, partituras,

intituladas de cartão fluxus, produzidos com materiais de baixa qualidade e

semelhantes às cartas de baralho e também a cartões de visita, descartava-se

assim a necessidade de espaços instituídos pelos sistemas das artes.

Ana Lima, usando também as palavras de Robert Fillilou, descreve que a

abolição desses espaços:

permitiria, por outro lado a existência da arte em qualquer local onde se pense e

faça e discuta arte e vida, substituindo-se o conceito histórico de uma

vanguarda artística pelo de uma rede aberta, livre e eterna: “onde

46

Robert Fillilou

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permanentemente existe alguém que faz uma coisa e alguém que faz outra

coisa. Há sempre alguém que dorme, alguém que se abstém, alguém que ama.

Somente a rede é eterna. (apud LIMA, 2009, p.50).

As proposições de Robert Fillilou trouxeram inúmeros desdobramentos para

as questões da arte conceitual, essas formas de agir, pensar e executar arte

problematizaram não só as relações de espaços e de desconstrução do objeto

arte, mas também refletiram e questionaram valores sociais, políticos e

econômicos.

Hélio Fervenza em seu texto - Considerações da arte que não se parece

com arte47 – apresenta uma proposição artística onde Allan Kaprow prepara um

chá gelado.

Ele coloca um recipiente no fogo para aquecer a água e observa quando esta

começa a ferver, sente o calor e vê as nuvens de vapor que se formam. Depois

derrama o líquido num bule e coloca folhas de chá. Uma vez resfriada a

infusão, ele acrescenta cubos de gelo. Ele sente o frio desses sólidos e observa

seus gestos ao manipulá-los. Ele faz chá, observa e se observa. (FERVENZA,

2005, p.95).

A proposta de Allan Kaprow vem como uma resposta a uma sugestão

impressa em pequenos cartões por George Brecht, entre 1959 e 1962, contidas

num dos textos de Events (Eventos). Textos esses que podiam ser compreendidos

e interpretados de forma diferente, geralmente aberta e ambígua.

Três eventos aquosos

gelo, água, vapor

Segundo Fervenza, esses eram os dizeres do cartão escolhido por Kaprow

e a poética estava na sua concepção de arte, propondo a produção de uma

bebida como manifestação artística. A grande relevância desses acontecimentos

na arte conceitual vem a ser as potenciais mudanças que os artistas quando

articulados em grupos, comunidades ou redes conseguem gerar, com a

47

Considerações da arte que não se parece com arte, Concinnitas, ano 6, volume 1, número 8, julho 2005

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possibilidade de influenciar outros artistas e outras gerações, cada qual a sua

maneira. Na perspectiva do Fluxus, os trabalhos além de apontar para outros

rumos, novos espaços de circulação, também são embriagados de uma poética

lúdica e grande dose de humor.

No fluxo do Fluxus podemos destacar muitos artistas internacionais e

brasileiros, mas neste trabalho destaco dois artistas brasileiros, Cildo Meireles e

Paulo Brusky. A escolha deu-se pelo motivo de que esses artistas conseguiram

ampliar o sentido de circulação das propostas artísticas, a partir da criação de

espaços autônomos com a abertura de fluxos alternativos de informação inseridos

em suas obras.

Segundo Cristina Freire, em 1970, Cildo Meireles publica na seção de

“Classificados” do Jornal do Brasil dois anúncios intitulados Inserções. Anúncios

que antecederam a série Inserções em Circuitos Ideológicos, que será comentada

adiante. (2006, p.59).

Com essa obra, Cildo Meireles utiliza-se do meio de comunicação como

canal para inserção de informações diferentes daquelas das mídias

convencionais. Em depoimento registrado por Antônio Manuel para sua pesquisa

“Ondas do Corpo” o próprio Cildo Meireles48 aponta que:

Na verdade, as "Inserções em circuitos ideológicos" nasceram da necessidade

de se criar um sistema de circulação, de troca de informações, que não

dependesse de nenhum tipo de controle centralizado. Uma língua. Um sistema

que, na essência, se opusesse ao da imprensa, do rádio, da televisão,

exemplos típicos de media que atingem de fato um público imenso, mas em

cujo sistema de circulação está sempre presente um determinado controle e um

determinado afunilamento da inserção. Quer dizer, neles a 'inserção' é exercida

por uma elite que tem acesso aos níveis em que o sistema se desenvolve:

sofisticação tecnológica envolvendo alta soma de dinheiro e/ou poder. (1981)

48

*Extraído do depoimento de C.M. registrado na pesquisa Ondas do corpo, de Antônio Manuel. Copy-desk e

montagem do texto: Eudoro Augusto Macieira. Publicado no Livro "Cildo Meireles" da FUNARTE. Rio de Janeiro,

1981. (http://passantes.redezero.org/reportagens/cildo/inserc.htm) 23/08/2010.

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Em 1970, Cildo Meireles propõe inserções em espaços não convencionais

para as artes, com a intenção de não depender de museus, galerias e críticos e

também de propor reflexão sobre os mesmos. Os artistas procuravam maneiras

de possuir autonomia total dos sistemas das artes, pois queriam trazer à tona

questionamentos sem que estivessem expostos à censura, sem pedir permissão,

atestando que o desdobramento da obra se daria pelo envolvimento imediato com

o público que estaria recebendo essas informações em diferentes canais de

circuitos ideológicos e dentro do próprio sistema de troca e comércio de

mercadorias de uso cotidiano, como, no exemplo dos classificados,

posteriormente nas garrafas de coca-cola e papel moeda.

Seguindo com o depoimento de Cildo,

Enquanto o museu, a galeria e a tela forem um espaço sagrado da

representação, tornam-se um triângulo das Bermudas: qualquer coisa, qualquer

idéia que você colocar lá vai ser automaticamente neutralizada. Acho que a

gente tentou prioritariamente o compromisso com o público. Não com o

comprador (mercado) de arte. Mas com a platéia mesmo. Esse rosto

indeterminado, o elemento mais importante dessa estrutura. De trabalhar com

essa maravilhosa possibilidade que as artes plásticas oferecem, de criar para

cada nova idéia uma nova linguagem para expressá-la. Trabalhar sempre com

essa possibilidade de transgressão ao nível do real. Quer dizer, fazer trabalhos

que não existam simplesmente no espaço consentido, consagrado, sagrado.

Que não aconteçam simplesmente ao nível de uma tela, de uma superfície, de

uma representação. Não mais trabalhar com a metáfora da pólvora - trabalhar

com a pólvora mesmo. (1981)

Assim, nessa busca para transmissão de “contra-informações”, como ele

mesmo descreve, Cildo Meireles desenvolve o “Projeto Coca-Cola”. É com frases

como “Yankees go home” que Cildo interfere diretamente nas garrafas de Coca-

Cola a partir de decalques, inserindo informações que tanto contestavam a

produção capitalista, sendo a Coca-Cola um ícone, quanto criava um novo circuito,

inserido na própria obra que fora apropriada, um objeto não convencional das

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artes, de uso comercial, cotidiano, e devolvida ao próprio sistema capitalista com

uma nova mensagem.

Hélio Fervenza descreve sobre a proposição do projeto de Cildo Meireles

fazendo um comparativo com o chá de Allan Kaprow.

Dessa vez não era uma bebida feita em casa, mas produzida e engarrafada aos

milhares industrialmente. Mais precisamente, ele questionava sua distribuição,

os significados por ela veiculados e sua onipresença econômica e cultural. Ao

mesmo tempo, indagava-se sobre o sistema de circulação que tornava isso

possível. Este se constituía na venda, no consumo da bebida e na devolução de

sua embalagem. Assim, produzia-se um ciclo, um circuito: a embalagem saía da

indústria para o distribuidor, do distribuidor para o consumidor e depois, num

movimento inverso, este último a devolvia ao distribuidor, que a fazia retornar à

indústria para ser de novo reutilizada. (2005, p.96).

Essas proposições foram intituladas de “Inserções em Circuitos

Ideológicos” e, para Fervenza, Cildo percebe que ao utilizar o próprio sistema,

abre-se uma oportunidade para uma atuação crítica, que é inserida no mesmo

circuito percorrido pelas mercadorias industriais a partir das novas mensagens

aplicadas no objeto e devolvidas ao mercado. Em relação à arte e indústria Cildo

complementa, ainda em sua entrevista, que,

Por pressuposto, a arte teria uma função social e teria mais meios de ser

densamente consciente. Maior densidade de consciência em relação à sociedade

da qual emerge. E o papel da indústria é exatamente o contrário disso. Tal qual

existe hoje, a força da indústria se baseia no maior coeficiente possível de

alienação. Então as anotações sobre o projeto "Inserções em circuitos ideológicos"

opunham justamente a arte à indústria. (1981).

Dessa forma, Cildo permite-se questionar o sistema, num processo

autônomo e utilizando os próprios meios da indústria, visto que essas proposições

aconteceram no inicio da década de 1970, período no qual o Brasil vivia um

regime de grande censura e sobre intensa ditadura militar. Foi nessa fase de

medo e silêncio que surgiram proposições com caráter político e social crítico de

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Cildo Meireles para com o então regime ditatorial. Esses anos que seguiram ao AI-

5 foram um período em que o regime militar com intenção de manter seu poder e

forçar a censura causou inúmeras prisões, torturas, exílios e mortes de artistas,

jornalistas e estudantes que se posicionavam contra o regime. Em 1975, Cildo

Meireles desenvolveu uma mensagem de crítica a esses acontecimentos. Em uma

série de notas de um cruzeiro carimbou a frase “Quem matou Herzog?”,

polemizando o “desaparecimento do jornalista Wladimir Herzog, morto pelos

órgãos de repressão dos militares. As obras de Cildo Meireles traziam fortes

questionamentos a respeito da política, do circuito institucionalizado das artes, do

sistema capitalista e do mercado da arte, porém, uma das questões mais

relevantes de sua obra é que nesses dois exemplos – garrafas de coca-cola e

notas carimbadas –, além das frases de conteúdo crítico, que serviam de estímulo,

exemplo para a continuação dessas propostas por outros sujeitos e também para

futuras proposições. Em algumas garrafas de Coca-Cola Cildo usou a frase;

“Gravar nas garrafas, opiniões críticas e devolvê-las à circulação”, e seguindo com

suas iniciais C.M. e a data, e também a frase “a reprodução dessa peça é livre e

aberta a toda e qualquer pessoa”. Sendo assim, o artista além de propor suas

inserções, também permite que essas possam ser veiculadas por outros sujeitos,

aumentando o poder de audiência e circulação da obra. Atualmente, o artista

inglês Banksy também permite o uso de suas imagens para download em seu site,

o que será tratado no próximo capítulo com mais profundidade, não só sobre o

artista, mas também sobre os desdobramentos de seus arquivos no virtual49.

Paulo Bruscky, nos anos 1970, foi um dos artistas brasileiros em

conectividade com grupo Fluxos e que, juntamente com Julio Plaza, Mario

Ishikawa, Regina Silveira, Ivald Granato, Regina Water, Anna Bella Geiger, Bené

Fonteles, J. Medeiro, Unhandeijara Lisboa, Daniel Santiago, Ângelo de Aquino,

Gabriel Borba, Mauricio Fridman, e os mais jovens Mario Ramiro, Tadeu Jungle,

Walter Silveira, Hudnilson Jr. e muitos outros participantes compunham o

movimento da arte postal. (FREIRE, 2006, 65).

49

(http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/seculoxx/modulo4/arteguerrilha/cildo/index.html) acessado em 22/10/10.

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Bruscky é considerado um dos grandes expoentes desse campo artístico,

tanto pelas articulações quanto pela produção e suas conexões. Para Cristina

Freire, a arte postal foi muito significativa pela força subversiva à arte, pelo

rompimento com o mercantilismo e também pelo fato de compartilhar as criações

com o maior número possível de pessoas através da rede postal. (2006, p.64). A

arte postal permitiu uma facilidade de trocas de informações muito importante na

época, com a possibilidade de conexão de indivíduos até então na periferia dos

circuitos das artes como os latino-americanos, que buscaram na produção artística

em rede de correios uma chance para “subverter a repressão política e participar

do debate artístico mais amplo”. (FREIRE, 2006, p. 65).

Cristina Freire aponta que por meio da arte postal o valor de exposição foi

suprido pelo de circulação, onde a movimentação dos “arquivos-conceito”

transitava pelas margens dos circuitos oficiais das artes e transitava nas diferentes

localidades e temporalidades. Para a autora, as operações de trocas poderiam ser

divididas em três tipos:

a intervenção nos meios físicos que compõem a mensagem enviada pelo

correio, como por exemplo nos envelopes, selos, carimbos e etc.; a utilização

da via postal para a remessa de obras passíveis de serem enviadas pelo

correio como fotografias, Xerox, projetos e etc.; ou ainda a intervenção na

própria estrutura dos Correios. Não é procedente identificar cada artista, uma

vez que toda a rede de comunicação emissor-receptor, mensagem e suporte

constitui um sistema único. Isso significa que a figura do criador isolado dilui-se

com freqüência e o circuito artístico institucionalizado é questionado pelo

enorme elenco de participantes. (2006, p.67).

E, se na arte conceitual das décadas de 1960 e 1970 a arte correio tecia

uma importante rede entre artistas de todo mundo, e tinha como base a troca de

arquivos e registros que por muitas vezes questionavam os sistemas

institucionalizados, tanto das artes quanto do próprio capitalismo, atualmente,

essa rede de comunicação, inserida nos fenômenos da cultura digital, faz da

internet o meio de propagação mais importante na atualidade.

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Cristina Freire descreve que os artistas “articulados à contracultura”,

produziram e geraram de maneira autônoma periódicos, inúmeras formas “de

jornais, fanzines, selos, carimbos, cartões e uma quantidade significativa de lista

de endereços tipo “quem é quem”. Para a autora, esses artistas “foram

precursores da internet, pois a rede postal era uma internet menos ágil e mais

preocupada com a relação forma-conteúdo”. (2006, p. 59).

Em uma entrevista ao livro Conceitualismos do Sul/ Sur, organizado por

Cristina Freire e Ana Longoni, Paulo Bruscky disse:

Os primeiros contatos com alguns integrantes do Grupo Fluxus, como também

com artistas do grupo japonês Gutai, ocorreram no início dos anos 1970, através

do movimento internacional de arte correio, sendo uma grande rede que

incorporou os equipamentos tecnológicos de comunicação até chegar na internet,

e possibilitou não só o intercâmbio entre artistas dos mais diversos países como

possibilitou exposições e realizações de projetos, agrupando estes artistas em

uma grande comunidade, já iniciada alguns anos antes pelos primeiros integrantes

do Fluxus. (BRUSCKY apud FREIRE, 2009, p.73).

É na abertura de circuitos alternativos que a arte conceitual tem uma de

suas expressões mais fortes, a partir da formação de redes de comunicação e

produção artística autônoma diante dos sistemas tradicionais. Para Cristina Freire,

“está implícita, dentro desse movimento da arte postal, a noção de uma forma de

arte como comunicação, sem a necessidade de intermediários, que desprezava as

instituições e visava uma produção direta para seu público, muitas vezes utilizando

o próprio sistema a ser questionado”. (2006, p. 57).

Seguindo a entrevista com Paulo Bruscky,

A arte correio surgiu como um veículo para unir as pessoas do mundo todo que

trabalhavam no mesmo segmento. Eu fiz um levantamento no Recife que você

pode fazer a projeção para qualquer lugar, guardadas as devidas proporções, e

esse era o único meio de comunicação incontrolada. Na época era preciso quase

metade da população para controlar o fluxo de correspondência expedida e

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recebida. Era algo com a participação do mundo todo. Nós discutíamos o problema

social, inclusive. Na verdade, a proposta maior era o intercâmbio. O que ficou é a

prova disso, não são obras. É claro que tudo termina sendo obra, mas é a

comprovação de que o mais importante da comunicação entre os artistas era

discutir a vida, os conceitos.Tudo vira obra: se for uma coisa de artista,

inevitavelmente vira obra.

A internet hoje também cumpre hoje esse papel. Todos os e-mails… Realmente,

hoje há uma grande rede que veio evoluindo em função do correio, porque esse

era o único meio internacional de se comunicar. Essa rede podia unir artistas

porque estourou num momento que já vinham trabalhando isoladamente. Essa

rede conseguiu juntar essas pessoas do mundo todo, que já se afinavam no

conceito. O subterrâneo explodiu naquela época e conseguiu cumprir um papel

que vem desenvolvendo até hoje: a comunicação entre os artistas, a grande

discussão, que é o mais importante. (apud FREIRE, 2009, p.77).

Percebemos que para Paulo Bruscky, a rede serviu para unir artistas de

diferentes lugares que se afinavam com conceitos similares e que através da

transferência de arquivos tinham não só os registros das movimentações, mas

também os mesmos acabavam se tornando obra pelo fato de estar fazendo parte

de um processo artístico-cultural. Nessa mesma perspectiva, também percebo

atualmente a internet com a rede dos tags/pixos/graffiti traçando linhas similares

aos processos da arte postal. Essa rede também possibilita a união de diferentes

sujeitos e a troca de arquivos se dá através da migração deles para o espaço

virtual, a diferença através da percepção, que anteriormente era tátil e, agora, via

hipertexto digital.

Para Cristina Freire, “a arte postal transfere o foco do que é

tradicionalmente chamado de “arte” para o conceito mais amplo de cultura” e, para

a autora, essa mudança vem a ser o que faz essa prática artística ser tão

contemporânea. (2006,p.68).

Dentro da cultura da arte postal, a riqueza estava também em integrar

indivíduos de países que circulavam fora do circuito hegemônico dos Estados

Unidos e da Europa Ocidental. Esses circuitos autônomos eram responsáveis por

inúmeras exposições alternativas ao redor do mundo. Sua maior importância,

segundo Cristina Freire, é a criação de uma comunidade, uma tribo imaginária.

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Tribo essa que conseguiu romper barreiras, estruturas, quebrar paradigmas

através de diferentes proposições artísticas e de uma produção autônoma, que

criou diferentes circuitos e propôs outros espaços. Para Freire, “vale lembrar que a

posição política não está necessariamente no conteúdo, mas nas estratégias e

práticas”. (2006, p.68).

Cristina Freire aponta que a arte postal foi uma espécie de estratégia

libertária, que articulou e mobilizou inúmeros artistas num contexto político

repressor e que a cada dia essa noção de rede se expande e englobam outras

mídias como telefone, fax e, por fim, a internet.

A arte postal possibilitou a criação de novos processos de significação

artística muitas vezes engajada num contexto político e social. Um exemplo disso

é apresentado pela autora, que relata o fato ocorrido com o artista Clemente

Padin, preso em 1977 pela ditadura uruguaia. Uma grande ação feita pelos

artistas, por meio da mobilização em rede, conseguiu pressionar o governo o que

levou à sua libertação. Para Padin, a arte postal representa uma descentralização

dos sistemas de arte – galerias, museus, críticos e curadores –, que possuem um

sistema de marketing e prestígio imponente e hegemônico na arte. Padin resume

seu pensamento em novos objetos para novos sujeitos. (FREIRE, 2006, p.70)

Cristina Freire relata que a intenção e os valores dessa rede sofreram

mudanças, pois, se anteriormente a arte postal questionava o status da arte como

bem do consumo, agora esses valores são substituídos, em alguns projetos na

internet, por uma postura mais radical que visa “promover uma sociedade mais

justa e solidária, por meio da atividade artística”. (2006, p.72).

Um dos grandes exemplos sobre os novos ativismos na net, citado pela

pesquisadora, é a artista mexicana Minerva Cuevas, com um trabalho investido de

questionar as grandes corporações. A Mejor Vida Corporation

(www.irational.org/mvc) – uma empresa virtual com estrutura semelhante a de

grandes corporações, visa subverter o sentido das ações de comércio na rede. A

M.V.C. propõe mudanças sociais através de suas ações, campanhas e produtos,

bem como as relações sociais nesse tempo de globalização. Quando

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entrevistada50, durante a apresentação de seu projeto –

"Information/Misinformation" –, parte da 24ª Graphic Biennial, em Ljubljana,

Slovenia, maio de 2001, ela declarou:

É comum, por exemplo, que um dos artistas que está conectado ao meu trabalho

é Cildo Meireles com as garrafas de coca-cola ou as notas de dinheiro, mas eu

acho que e ele tem uma abordagem diferente nos assuntos sociais, eu não acho

que existe tal coisa como “arte política”. Eu penso no projeto MVC em termos de

ativismo social, mas estou usando mediadores e instituições do contexto da arte.

Uma coisa é usar elementos de um contexto social específico para produzir uma

obra de arte e outra coisa fazer um projeto útil em termos sociais. (tradução livre

do autor)51

Para a artista, seu projeto intitulado Mejor Vida Corporation busca através

de ações no corpo social, não só questionar, mas acima de tudo, busca a

possibilidade de transformar o meio. Minerva salienta a possibilidade de estar

utilizando o museu para articular uma audiência específica, mas enfoca também

que a internet e as intervenções urbanas também são excelentes canais de mídia.

Outra questão que Cuevas menciona nessa conversa, retirada de seu próprio site,

é que seu projeto assemelha-se ao Ne Pas Plier, na França, que se utiliza de

canais midiáticos como internet, adesivos, banners, cartões postais e jornais de

maneira autônoma, com intuito de transformação do meio a partir da informação

de cunho social, aplicada em materiais publicitários, similares ao das grandes

corporações hegemônicas. No entanto, a artista considera que além da

informação, a grande beleza desse coletivo francês está também em trabalhar

diretamente com crianças em projetos educacionais. Para Minerva Cuevas, o

50 Conversa entre Hans Ulrich Obrist e Minerva Cuevas (www.irational.org/mvc ) acessado em 22/10/2010

51 It's common, for example, that one of the artists that is linked to my work is Cildo Meireles with the coca-cola bottles or

money paper, but I find that he has a very different approach to social issues, I don't think there is such a thing as "political art". I think about the MVC project in terms of social activism, but I am using mediums and institutions from the art context. One thing is use elements from a specific social context to produce an art piece and another one to make a project useful in social terms. (www.irational.org/mvc).

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ativismo deve ser considerado como um way of life, e essa decisão é uma decisão

pessoal, em vista que muitos coletivos tem uma duração curta.

Ao refletir sobre essas práticas artísticas, percebo que as ações propostas

pelos artistas, quando articuladas em grupo, quando colocadas em circulação de

forma autônoma, deslocada das instituições, restabelecem conceitos, provocam

rupturas, questionam o sistema, apropriam-se dele e aumentam suas polifonias.

A arte se fez presente sugerindo a ausência de moldes estagnados,

passíveis de hierarquias, controles e subordinação. Seja para revolucionar

gerações, seja preparando um chá, escrevendo em garrafas, enviando cartas,

ouvindo o barulho da água dentro de botas encharcadas ou propondo a abertura

de galerias no terraço de nossas casas. Como disse Lygia Clark em 1968: “(...)

somos os propositores: nossa proposição é o diálogo: sós, não existimos; estamos

a vosso dispor [...] somos os propositores: não lhe propomos nem o passado nem

o futuro mas o agora.” (apud LIMA, 2009, p.50)

Esses artistas criaram suas redes e traçaram novos caminhos para as

artes. Suas propostas eram, em suma, dialogar, poetizar e questionar a própria

vida, os conceitos preestabelecidos e a ordem, tanto das coisas quantos as que

foram ditadas. Se não tinham espaços, eles criavam espaços ou sugeriam

diferentes mídias. Organizavam festas, trocavam poesias e afrontavam a ditadura,

carimbavam o dinheiro e destituíam o valor de mercado da obra, desfazendo a

noção distorcida de que o público, em arte, não é aquele que a consome, que tem

poder aquisitivo e que compra objetos de arte, como apontou Cildo Meireles em

seu depoimento. Esses artistas plantaram, fora do circuito tradicional das artes,

sementes tão ricas, belas e potentes, efêmeras como as flores da primavera. Seu

perfume e suas cores residem na memória daqueles que puderam percebê-las.

Hoje, o registro dessas flores foi multiplicado, copiado e desdobrado e, depois,

pendurado nas paredes das próprias instituições as quais elas haviam brotado no

lado de fora, na calçada, no terreno ao lado, como ervas daninha ou flores

silvestres. Hoje, a memória dessas proposições reside nas próprias cartas, nas

fotos de mãos que carimbam, nos filmes e nos cartões dentre outros, que foram

circulados e trocados pelos artistas em rede.

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Para Cristina Freire, a grande parcela da memória artística contemporânea

reside em arquivos de artistas alimentados pelos fluxos das redes postais. Para a

autora, temos que “compreender arquivo como uma metáfora e observar seu

alcance mais amplo e fecundo no domínio da arte contemporânea.” (2006, p.73).

Seguindo com sua pesquisa, Cristina Freire cita que grande parte do

projeto intelectual de Michel Foulcault pode ser compreendido como uma forma de

arqueologia.

Advém daí um conceito de arquivo, obviamente diferente do sentido comum de

espaço físico para armazenagem de documentos e obras. O arquivo é, para o

filósofo, um dispositivo que não conserva coisas, antes, revela, mesmo que por

fragmentos, um sistema e arranjo de idéias. (apud FREIRE, 2006, p.73).

Se na arte postal, os arquivos, registros das movimentações e trocas de

experiência entre os artistas revelaram idéias, proporcionaram rupturas em

conceitos estagnados, então, atualmente os sites, onde os registros das ações

produzidas pela cena cultural da arte urbana contemporânea tem sido arquivados

e comentados pelos protagonistas, revelam uma espécie de narrativa histórica do

que vem acontecendo nas ruas.

A internet vem sendo usada pelos artistas e escritores urbanos que postam

os arquivos com fotos e vídeos, tecendo essa grande rede mundial. A produção

dessa cultura digital se estabelece no próprio processo de navegar por entre

esses arquivos e no desdobramento dos mesmos. Temos como base dos sites de

relacionamentos o download dos registros das intervenções urbanas, ou seja, as

fotos dos espaços apropriados pela própria cultura dos tags/pixos/graffiti,

digitalizadas e postadas na internet.

Nota-se, é certo, uma mudança nos sentidos das redes, e o papel

desempenhado pela internet não deve ser menosprezado. Devemos lembrar

que a internet não é apenas um meio como a pintura, a gravura ou vídeo, mas,

sobretudo um sistema de transmissão de dados que, potencialmente, simula

todos os meios de reprodução. Na rede mundial de computadores surgem

projetos que, de certa forma, remontam à estratégia futurista, reavivada pela

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arte postal, de organizar ações coletivas. A rede torna-se esse lugar de

associação temporária onde arte e política encontram-se. Não por acaso, são

as gerações mais jovens que se valem dessa rede sem centro e, dentro das

possibilidades dadas pelo contexto histórico e tecnológico, operam-na

estrategicamente, num misto de “provocação e esperança”. (FREIRE, 2006,

p.70).

Esses arquivos revelam e traduzem o posicionamento político dos seus

autores e promovem uma autorrepresentação dos indivíduos e de sua

comunidade. A organização em rede digital faz desse canal um circuito para a

proposição de novos rumos, traz a possibilidade de aproximação e discussão. Mas

também apresenta os questionamentos dentro das próprias comunidades, com o

intuito de fortalecimento da identidade. Talvez uma provocação ao sistema, os

artistas utilizam-se dos meios fornecidos por ele para abrir espaço para a troca de

informações com conteúdos transgressores, poéticos, lúdicos e anti-hegemônicos.

Uma publicidade que foi roubada de sua proposta de veiculação dos produtos

capitalistas e que agora traduz a polifonia das ruas em mídias digitais,

promovendo, assim, esperança e caos.

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Capítulo 4

CORES EM BITS

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4.1 [email protected]

Na cultura digital dos [email protected], as imagens

conseguem alcançar diferentes pontos ativando a subjetividade do receptor

possibilitando uma valorização dessas comunidades. Histórias essas que são

transmitidas pelos próprios atores e escritores, que fomentam sua cultura via

geografias concretas da cidade e, agora, nas vias de uma “cibercidade”. Como

lembra Freire:

A narrativa histórica para Foucault não é seqüencial, mas passa por mudanças

abruptas e profundas. A questão relevante que se coloca nas análises históricas

não são continuidades a se estabelecerem como tradição e rastro, mas o recorte,

a ruptura e o limite, “as transformações que valem como fundação e renovação

dos fundamentos.” (FREIRE, 2006, p.74).

Este capítulo tem como intenção descrever alguns acontecimentos,

mudanças e rupturas apresentadas por meio de fatos históricos, de pesquisas no

campo virtual, que ocorreram no período de 2008 a 2010, e entrevistas feitas

através de um questionário, via email, e conversas corpo a corpo.

Os ensejos pelas questões aqui apresentadas partiram da minha

experiência nas intervenções nas ruas e, também, de informações compartilhadas

na rede virtual e na troca de arquivos e links.

Foi a partir dessas pesquisas sobre as redes de relacionamento dos

escritores urbanos, que percebi que muitos artistas saíram do anonimato e

conquistaram espaço e fizeram circular suas obras despertando novos blocos de

percepção, adquiriram respeito, ou não, e, em alguns casos, alcançaram distantes

regiões geográficas através das redes de relacionamentos virtuais.

Este capítulo é dividido em quatro partes: O ROLÊ, O BOMBARDEIO, OS

ATACKS e AS TRETAS.

A primeira parte, O ROLÊ, retrata a deriva pelo meio digital e a maneira

como cada escritor urbano enxerga essa possibilidade virtual dos

tags/pixos/graffiti. A fundamentação dessa parte foi por meio de entrevistas com

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diferentes escritores urbanos, feitas pela rede digital dentro das plataformas

multiusuários.

A segunda parte, O BOMBARDEIO, apresenta dois artistas, Banksy e Blu,

que se destacam na cena artística urbana mundial. Essa escolha deu-se pela

percepção de que ambos haviam alcançado notoriedade a partir da divulgação de

suas obras via internet. Os sites proporcionaram uma excelente visibilidade e

audiência e trouxe para esses artistas um ganho de capital simbólico e inserção

no campo e mercado das artes.

A terceira parte descreve os três ATACKS ocorridos às instituições de arte

– Centro Universitário de Belas Artes, Galeria Choque Cultural e 28ª Bienal de

São Paulo, em 2008. Esses ATACKS foram o resultado de ações planejadas,

organizada e divulgada em redes virtuais. A internet serviu de base para o

ativismo político e social e foi um canal para a proliferação de ideias e para a

divulgação dos registros das fotos, vídeos, debates e seus desdobramentos na

mídia oficial e nas redes dos escritores-pixadores.

A última parte são as TRETAS entre os escritores urbanos. TRETA na gíria

urbana vem a ser discussão, conflito, desarmonia, falta de respeito e brigas em

geral. As TRETAS aqui apresentadas referem-se ao resultado de um quarto

ATACK, onde o mesmo grupo de pixadores, apresentados acima, “atropelaram” –

pintaram por cima - de murais de graffiti de escritores urbanos consagrados no

campo das artes e na grande mídia. O resultado desse último atack foi uma

discussão nas ruas e dentro dos canais virtuais de comunicação, como no caso do

Brasil, as duas plataformas multiusuários mais conhecidas dentre os escritores

urbanos, o Fotolog e o Flickr. Escolhi uma página de cada uma dessas

plataformas multiusuários, ainda que elas sejam do mesmo escritor urbano, o

Djan “Cripta”.

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4.2 O ROLê

O rolê na tradição dos tags/pixos/graffiti é o modo de caminhar pelas vias

urbanas descobrindo novos espaços para deixar um registro e tecer uma rede de

comunicação entre os grupos de escritores urbanos. A revolução tecnológica

trouxe mudanças e a comunicação passou a ser também uma comunicação

digital, fator que refletiu diretamente nesse universo dos tags/pixos/graffiti. Agora

o rolê é percebido, editado e desdobrado também via internet. É nessa rede que

outros artistas e escritores urbanos contemporâneos, anônimos como eu,

conseguem aumentar o volume de nossas vozes e fazem circular nossas

narrativas, conquistam o respeito nas comunidades, nas quais constroem uma

identificação cultural, sem dependência e censura de mídias convencionais.

A produção cultural dessa comunidade, agrupada hoje pelas geografias

virtuais, já não é somente passada através da oralidade ou da narrativa escrita

linear. Agora os processos culturais transitam por entre satélites, através de

arquivos digitais nessa imensa rede. São eles verdadeiros hipertextos, grandes

portas e Windows que se abrem nas paredes dessa cibercidade. O tempo e

espaço já não são quantificados pelos ponteiros analógicos da geração anterior,

agora tudo é baseado na velocidade das transmissões e acessos, por meio dos

suportes e das tecnologias. Sendo assim a transmissão de registros, experiências

também vivenciadas pela luz das telas das máquinas são as responsáveis por

esse udugrudi virtual que tem por definição cultura digital. Esse rolê vem a ser um

caminho também percorrido dentro desse espaço virtual, por entre sites individuais

dos escritores e nas plataformas multiusuários como flickrs e fotologs.

Quais são as questões e as relações dos escritores urbanos com a net?

Como se apresentam diante do digital? Quais as influências e mudanças nos

trabalhos e também na própria “imagem” do escritor urbano que se apresenta via

digital?

Para tentar responder tais questões, formulei uma entrevista (questionário)

com duas simples perguntas e mandei e-mails para amigos próximos e distantes,

tanto no plano de amizades, como no simbólico.

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As questões:

Defina sua expressão urbana e quais os motivos que te levam a fazê-la?

Qual a importância da internet para seu trabalho artístico e suas relações

com outros escritores urbanos. (ex:)

Nem todas as entrevistas foram respondidas. Alguns diziam não possuir

tempo e nem habilidade para com a escrita. O artista italiano Blu, famoso pela

relevância política de seu trabalho nas paredes do mundo e da internet,

(apresento seu trabalho nas linhas sobre o BOMBARDEIO) respondeu meu e-

mail, mas ressaltou que devido à demanda (perguntas quotidianas de estudantes,

curiosos e interessados, pesquisadores), ele não tem tempo hábil para responder

a todos e que em seu site seria possível obter as informações sobre sua pessoa e

trabalho.

As respostas que obtive não são capazes de atestar uma única verdade e

nem também é o foco desta pesquisa trabalhar e analisar de forma quantitativa.

Os resultados delas são opiniões de quem faz parte da rede dos

[email protected], a maior agenda urbana que se tem registro.

Apresentarei as questões e as opiniões relatadas por sujeitos plurais de diferentes

nacionalidades e contextos, mas que são próximos na identidade cultural dos

tags/pixos/graffiti. Para ressaltar as opiniões deixarei transcrita tal qual me foi

enviada, garantindo assim maior veracidade e mantendo a linguagem de cada um.

A ordem das respostas será pela sequência que chegaram a mim, pois não seria

viável uma espécie de hierarquia e prioridade. Sobre a importância da internet

seguem as opiniões de alguns escritores.

O escritor urbano Arig, radicado na cidade de Atibaia, conta que seu

costume de desenhar vem desde sua infância, estimulado por sua mãe que o

levava a visitar as Bienais. Aproximadamente em 2000, ele retoma suas

intervenções nas ruas após um longo tempo dedicado exclusivamente as artes

digitais. Segundo Arig (www.dalabo.blogspot.com ):

A maior importância é poder me deliciar com a arte do Planeta todo um exemplo é

todo dia visitar o www.woostercollective.com. As redes sociais são importantes

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para conhecer quem está por trás de cada projeto e eventualmente fazer um

contato. (entrevista cedida ao autor em 2010).

Atualmente Arig prepara-se para sua exposição coletiva, assim a rede pode

auxiliar a divulgação de sua mostra e a partir do www.woostercollective.com é

possível buscar referências que influenciem seu trabalho.

Vejam também comenta que a internet facilita o conhecimento da cena

artística urbana mundial. Ele descreve que seus trabalhos partem de produções

autorizadas e apropriação de espaços públicos e privados sem autorização, e que

suas obras se espalham por vários locais diferentes, como São Paulo,

Florianópolis e algumas cidades no Chile, dentre outras. Radicado em

Florianópolis Vejam relata que:

A internet facilitou a comunicação de escritores de graffiti do mundo inteiro, graças

a estes contatos surgiram viagens, trocas de informações e conhecimento através

de material fotográfico. Com a internet você pode conhecer a cena do graffiti no

mundo inteiro, você pode comprar material ou seja ela colabora na busca por

informações. Mas esse mundo só existe na rua, a internet é como um banco de

dados. (entrevista cedida ao autor em 2010).

Neste depoimento Vejam retrata a importância da rede nas conexões e

viagens, sejam elas concretas ou virtuais, mas também, afirma que as ações nas

ruas são determinantes a esses desdobramentos.

Na questão das distâncias Tim Tchais (www.flickr.com/photos/timtchais) do

mesmo modo aponta que:

A internet tem uma importância muito grande no meu trabalho por ser um meio de

circulação de informação muito forte e que vence grande parte das fronteiras que

muitas vezes não podemos cruzar geograficamente. Podemos usá-la para

compartilhar informações e resultados dos trabalhos realizados, é um ambiente

onde você pode ver e ser visto sem sair de casa, como tudo nessa vida existem os

prós e os contras, ela aproxima quem está longe e afasta quem está perto.

(entrevista cedida ao autor em 2010)

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Tim Tchais, que participou da geração do Beco Escola Aprendiz, conta

sobre a importância da comunicação que faz com seu colega de “crew” que vive

em Londres a cerca de nove anos. Entretanto para ele a rede pode proporcionar

uma “ilusão”, pois, alguns indivíduos usam a rede como ferramenta para adquirir

“fama”.

E como está sobrecarregada de informações, nem sempre se pode confiar no que

se vê na rede, sendo muitas vezes um grande mar de ilusão, de onde “brotam”

muitos artistas virtuais hoje em dia, que estão somente nesse ambiente ou tem sua

“marca” bem estabelecida socialmente, no final das contas é um grande ambiente

de propaganda gratuita, e deve ser utilizado da forma que melhor convir para cada

pessoa. (entrevista cedida ao autor em 2010).

A grande rede mundial então conecta os sujeitos de vários cantos e um dos

artistas a responder o questionário via email foi o alemão Stasy e, do mesmo

modo que Tchais, a respeito dessa “fama” na rede, ele comenta que “Eu também

não gosto da “fama” baseada na internet, eu prefiro estar mais no “background”

como pessoa e com meu graffiti é o mesmo.” (entrevista cedida ao autor em

201052)

Para Tchais outra grande relevância é a possibilidade de registro que a

Internet disponibiliza e relata como se deu a mudança do analógico para o digital.

Antes os álbuns de fotos, traziam as informações do que havia sido feito e

registrado, hoje esses mesmos “álbuns” estão quase extintos, e foram trocados

pelas páginas da internet, onde pode- se eternizar um graffiti que nas ruas não tem

a mesma duração, facilmente se pode localizar seus trabalhos no mapa do

Google, algo que era apenas um sonho para os grafiteiros de gerações anteriores

à WorldWideWeb. Por ser muito efêmero o graffiti ou intervenção urbana tem sua

vida prolongada neste meio, facilitando o registro “histórico” e atual do movimento

artístico que está sendo desenvolvido, cuidando sempre pra não cairmos no

engano de pensar que o que está na web se traduz no que está na rua. (entrevista

cedida ao autor em 2010).

52

also I don´t like internetbased fame. I prefer to be in the backround as a person and with my graffiti it is the same.”tradução livre do autor

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Rodrigo Rizo, escritor urbano também radicado em Florianópolis, começou

sua expressão nas ruas há oito anos, nesse tempo muitos de seus graffitis foram

apagados, para ele:

Acredito que a internet é ferramenta primordial para qualquer graffiteiro. Quase

mais importante do que fazer graffiti, é ter um registro fotográfico da sua obra,

afinal nunca se sabe quanto vai durar um trabalho na rua, e a foto é a única

lembrança que fica. Como o digital é o que impera, a fotografia vai parar no

computador, e do computador pra internet, o espaço de compartilhamento mais

dinâmico que existe. (entrevista cedida ao autor em 2010).

Rizo, igualmente aos outros aqui citados, delínea que a internet tem

possibilitado uma troca de arquivos entre os escritores e também serve de espaço

de divulgação para seu trabalho. Para ele a conexão permite um intercâmbio

cultural sem precedentes, e segue:

Através da internet entro em contato com diversos artistas do graffiti do mundo

todo. Tenho diversos amigos de outras partes do mundo, que conhecem meu

trabalho, através de fotos que eu publico em minhas páginas pessoais. Nesse

ambiente a gente se abastece mutuamente de referências, você acaba também

absorvendo elementos das obras dos artistas que você se identifica e que

normalmente não teria um contato real que possibilitasse essa troca. Assim é

possível que você enriqueça seu trabalho de uma forma autêntica e não

simplesmente copiando. Além disso, possibilita também um intercâmbio

presencial. Anualmente recebemos diversos artistas do mundo todo que

conhecemos via internet e que nos visitam sem sequer nos conhecer, e acabam

tendo uma experiência de viagem muito mais rica, por encontrarem pessoas que

como eles, conhecem a cidade que vive como a palma da mão suja de tinta.

(entrevista cedida ao autor em 2010).

Da mesma forma que Rizo, o escritor Enivo (www.flickr.com/enivo) comenta

que a internet:

Facilitou conhecer muita gente, a internet é um veículo que sendo bem utilizado,

podemos tirar muito proveito. Vira e mexe ando fuçando e descobrindo coisas

novas. Mas procuro não me prende muito à internet, gosto mesmo de sentir a

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plasticidade de uma obra na rua, galeria ou museu,... mas como não posso ainda

viajar o mundo todo, ela é muito válida. (entrevista cedida ao autor em 2010).

O escritor Enivo tem as ruas como lugar de expressão desde 1998, na

idade de doze anos, e desde então vem “marcando as ruas da cidade como um

carimbo de poesias, materializando idéias e sentimentos através da imagem.”

(entrevista cedida ao autor em 2010).

As respostas dos escritores são muito próximas mesmo que as localidades

geográficas sejam distantes. Stasy comenta em sua entrevista sobre o valor de

pesquisa na rede e também sobre as conexões com diferentes escritores, e que

estas possibilitam uma mobilidade geográfica conhecendo os seus flickrfriends:

A internet é muito importante. Eu passo bastante tempo assistindo graffiti na

internet. É como ler o jornal. Eu não tenho certeza se há uma mudança no meu

graffiti por causa disto. Mas me motiva a fazer mais para me desenvolver. Eu não

coloco coisas que eu fiz na internet para todos verem. Apenas meus amigos do

flickr podem ver minhas coisas. Porque existe tanta coisa na internet a obra única

está num círculo vicioso de inflação. Vale menos a pena. Eu não quero que minhas

obras valham menos. Quando estou navegando na internet é muito importante

para mim pegar informações sobre onde comprar tinta, onde pintar e o mais

importante eu encontro pessoas para pintar comigo na internet. Eu apenas procuro

no flickr graffiti mais o lugar que eu quero ir (por exemplo Florianópolis) e então eu

contacto as pessoas. Funcionou bem dessa forma na América do Sul. Então existe

um outro site bem legal. Se chama www.streetfiles.org é como um facebook para

os artistas do graffiti. Estou conectado com vários amigos do graffiti. As vezes eu

agendo reuniões através dessa plataforma com outros escritores. Eu mantenho

contato com as pessoas ou procuro por pessoas novas quando estou indo para

algum lugar novo. (Tradução livre do autor)53

53

The internet is very important. I spent a lot of time watching graffiti pictures in the internet. it is like reading the newspaper.

I am not sure if there is a change in my graffiti because of it. but it gives me motivation to do more and to develop myself. I

don´t put stuff I did in the internet for everybody to see it. just my "flickrfriends" are able to see my stuff. Because there is so

much graffiti in the internet the single piece is in a vicious circle or inflation. it is less worthy. I don´t want my pieces to be less

worthy. when I am traveling the internet is very important for me. i get informations about where to get paint, where to paint

and most important i find people to paint with in the internet. i just look in the flickr for graffiti+ the place i want to go to (for

example florianópolis) and then i contact the people. it worked pretty well that way in southamerica. then there is another

nice website. it is called www.streetfiles.org it is like facebook for graffiti artists. I am connected with o lot a graffiti friends.

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As entrevistas atestam pontos de vistas comuns entre os escritores

urbanos. É possível notar alguns aspectos muito importantes nessa ocupação na

internet. Muitos escritores buscam também uma maior visibilidade na rede e assim

a partir do volume de comentários e, em alguns casos, como no flickr, é possível

ver o numero de visitações em cada foto, utilizam-se de estratégias diversas para

a obtenção de “fama”, o que é questionado por muitos escritores. Em conversa

informal com alguns escritores, de uma postura mais radical, eles dizem que a

internet pode criar certa ilusão em relação a essa fama e Ibope, pois devido ao

número de acessos e comentários alguns escritores, novatos principalmente,

passam a agir com certa arrogância, e esquecem ou desconhecem alguns

conceitos básicos sobre as raízes dessas expressões culturais. A outra questão

relevante vem a ser sobre o estilo, como já foi citada no primeiro capítulo, esta é

uma das particularidades mais interessantes na net, pois se anteriormente a

criação era influenciada pelos grupos, atualmente se tem um banco de dados

gigante com referências não apenas nos grupos específicos, mas na produção de

imagens em escala global.

Outra questão é o poder da informação e sua liberdade de expressão.

Como nos casos anteriormente citados, a autonomia e a amplitude de alcance são

uma das forças mais potentes na comunicação atual. Ao mesmo tempo em que se

pode contestar o poder hegemônico por meio das intervenções urbanas, pode-se

também ampliar esse alcance fazendo com que exista a possibilidade de acessar

essa informação sem ser censurado e, assim, provocar diferentes canais para a

circulação de uma contra informação, como já havia sido proposta por Cildo

Meireles.

Aqui foram levantados alguns questionamentos. As dimensões desses

possibilitam uma abrangência parcial devido às divergências e a rápida

transformação e renovação tecnológica do meio. Alguns endereços foram

notificados e a senha está dada, se a curiosidade, ou o posicionamento crítico

Sometimes I arrange meetings over this platform with other writers. I stay in touch with people. or look for new people when i

am going to some new place.

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instigar a novos anseios, basta entrar na rede dos [email protected] e

participar da produção cultural através da interatividade.

4.3 O BOMBARDEIO

Bombardeio é uma expressão derivada da gíria dos tags/pixos/graffiti que

num sentido simbólico atacam, bombardeiam, os espaços urbanos repetidamente

fazendo suas imagens replicarem e serem dessa forma percebidas até aos

desinteressados pela arte urbana. Com as possibilidades de vias virtuais, muitos

grafiteiros também passaram a elaborar sites pessoais e a postar fotos de suas

intervenções urbanas com objetivos apenas de expor seus trabalhos sem usar as

ferramentas tecnológicas para fazer grafitti virtual, mas apenas como espaços

expositivos, e sem possibilitar diálogos interativos através de seu site. O

bombardeio nesse caso vem a ser a repetição contínua de arquivos em sites

privados. Foi a partir da visibilidade e audiência de intervenções urbanas

publicadas em mídias digitais que alguns artistas alcançaram notoriedade, como

Banksy e Blu, que obtiveram um grande reconhecimento no campo das artes a

partir de seus próprios sites ou de broadcasts themselves.

Sem possibilitar acesso para réplicas, esses artistas se “sacralizam”,

colocando-se numa posição diferente dos demais que se apresentam nas

plataformas multiusuários, onde se torna possível maior interatividade.

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4.3.1 Banksy www.banksy.co.uk

Eles dizem que o graffiti aterroriza as pessoas e é um símbolo do declínio na

sociedade, mas o graffiti é somente perigoso na mente de três tipos de pessoas;

políticos, publicitários executivos e grafiteiros.

As pessoas que realmente desfiguram nossos bairros são as companhias que

gritam gigantes slogans em prédios e ônibus e vivem tentando fazer com que nos

sintamos inadequados a menos que compremos suas coisas. Eles esperam ser

capaz de gritar suas mensagens na nossa cara em toda superfície disponível, mas

nunca lhe é permitido responder. Bem, eles começaram a briga e o muro é a arma

escolhida para rebater. Algumas pessoas se tornam policiais porque querem fazer

do mundo um lugar melhor. Algumas pessoas se tornam vândalos porque querem

fazer do mundo um lugar melhor para se olhar.” BANKSY (Tradução livre do

autor)54

.

Com uma personalidade muito provocativa e usando imagens de

personalidades e autoridades políticas (Pricesa Diana, Rainha Victoria), como

também ícones da cultura de consumo (Mickey e Ronald Mc‟Donald´s), o artista

inglês Banksy incita em problematizar diversos campos da sociedade

contemporânea, principalmente as grandes corporações hegemônicas.

As imagens que estavam nas ruas tiveram um alcance muito maior quando

publicadas nos meios digitais e aparecem, simultaneamente, em vários cantos do

mundo. Talvez pelo caráter transgressor das imagens, sua popularidade foi

meteórica. Banksy publicou quatro livros sobre seu próprio trabalho, sendo o

último uma fusão dos anteriores com um projeto gráfico de maior qualidade,

produzido pela editora Century. Em 2001 foi lançado o primeiro livro intitulado

Banging your head against a brick wall, uma publicação cheia de provocação, com

54

They say graffiti frightens people and is symbolic of decline in society, but graffiti is only dangerous in the mind of three types of people; politicians, advertising executives and graffiti writers. The people who truly deface our neighborhoods are the companies that scrawl giant slogans across buildings and buses trying to make us feel inadequate unless we by their stuff. They expect to be able to shout their message in your face from every available surface but you´re never allowed to answer back. Well, they started the fight and the wall is the weapon of choice to hit them back. Some people become cops because they want to make a world a better place. Some people become vandals because they want to make the world a better looking place.

54 (BANKSY

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um projeto gráfico em preto e branco e com um manifesto publicado em suas

páginas iniciais.

É nesse perfil contestador que segue também as duas outras edições,

Existencialism (2002), e Cut it out (2004), chegando por fim na publicação final

Banksy Wall and Piece. Este último livro, segundo fontes pesquisadas por Sergio

Miguel Franco, ficou em primeiro lugar nos Bestsellers, com mais de dez mil

exemplares vendidos. (FRANCO, 2009, p. 135).

Apesar de esses livros serem facilmente baixados por downloads,55 em

versões.pdf, é no site www.banksy.co.uk que sua visibilidade tem maior potência.

Desde o início de minha pesquisa (anterior a esta dissertação, aproximadamente

2007), percebo que o site já sofreu várias modificações, principalmente no

conteúdo e nas imagens e registros, mas o formato permaneceu quase o mesmo.

Logo, a internet foi seu maior meio de propagação, fonte de pesquisa – suporte

utilizado para registro do próprio artista –, e fomento de sua popularidade. Um dos

eventos que lhe renderam maior publicidade e também grande valorização

simbólica de seu trabalho, tanto no campo das artes quanto junto ao grande

público, incluindo os canais de mass media, que puderam acessar o evento,

posteriormente divulgado pelo youtube, foi à série intitulada Atalhos. Sobre tal

inserção, o próprio artista comenta: “passar realmente pelo processo de ter uma

pintura selecionada deve ser muito chato. È muito mais divertido chegar lá e

colocá-la você mesmo.” (apud GANZ, 2008, p.139).

A primeira instalação ocorreu na Tate Gallery, em 2003. Foi uma pintura a

óleo não assinada, achada num mercado de Londres, que retratava uma

paisagem bucólica de uma igreja, floresta e um riacho, na qual Banksy pintou uma

faixa da polícia (Police line: don’t cross) usada para isolar áreas, emoldurou de

maneira ostentosa e a colou com fita dupla-face na parede do museu, como se

pertencesse à coleção da galeria. Ao lado fixou também uma descrição da obra

em crítica à mídia que trata de forma espetacular os crimes e a pedofilia,

vandalizando assim a própria nação por essa obsessão. (BANKSY, 2006, p.169-

169).

55

Destes quatro livros possuo o último deles, sendo que os três anteriores foram baixados via Google - rapid share.

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135

Em 2004, a série Atalhos estendeu-se pelo Museu do Louvre, em Paris,

com uma réplica da Monaliza com um “smile” na face, e passou pelo New York

Metropolitam Museum, Brooklyn Museum e MOMA, em Nova Iorque, com uma

lata de sopa de tomate da rede de supermercados TESCO.

Entre as ações mais significantes desse artista, destaco as pinturas feitas,

em 2005, no grande Muro do “Apartheid”, que atualmente divide Israel da

Palestina. Banksy decide usar o muro como suporte para criar um espaço de

protesto lúdico, ironizando o que ele mesmo denomina de a “maior pisão a céu

aberto”. Cenas de crianças brincando na praia aparecem como uma abertura no

muro, ou uma criança voando em balões infantis trespassa o muro, e ainda, uma

imensa sala de visitas com uma escada desenhada sugerindo a passagem para o

outro lado. Esses são alguns dos graffitis de Banksy que problematizam a

existência política do muro.

Todas essas pinturas e ações foram registradas em fotos e publicadas na

internet pelo autor, em seu próprio site ou em sites para vídeos. Dessa forma,

além de questionar o campo da arte com seus atalhos, Banksy transforma na

internet sua maior ferramenta de audiência e canal de protesto. Mas seu site não é

apenas um lugar de protesto, nele (http://www.banksy.co.uk/shop/index.html) é

possível acessar imagens para download de vários trabalhos.

Em seu primeiro livro, antes de sua popularização via internet, é possível

ver registros de seus trabalhos sendo apagados pelas autoridades britânicas.

Entretanto, atualmente na Inglaterra existem algumas de suas pinturas sendo

protegidas por uma película de vidro ou acrílico, em virtude de sua meteórica

valorização financeira, chamada de The Banksy effect. Sergio Miguel Franco, em

sua pesquisa, comenta que em 13 de janeiro de 2008, Banksy atinge um recorde

de venda nunca antes alcançado por um artista vindo dessa vertente urbana. Um

pedaço do muro de uma casa em Bristol foi avaliado em mais de duzentas mil

libras, o equivalente a R$ 800.000,00 reais, duas vezes o valor da casa em

questão.

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Sua última façanha foi o lançamento de seu documentário chamado “Exit

Trough the gift shop56”, onde o artista se apresenta mascarado, fortalecendo seu

mito, pois até então sua identidade não é conhecida. O filme foi lançado no

“Sundance Film Festival”, em 2010. Muitas especulações são feitas ao redor do

filme, principalmente do protagonista principal não ser o Banksy, e sim Thierry

Guietta, Mr Brainwash57, que durante anos foi quem registrava as ações de vários

artistas urbanos no cenário mundial, e conseguiu muita proximidade com

Shephard Farey “Obey the Giant”, responsável pela produção gráfica da

campanha do atual presidente Barack Obama, e de outros artistas como Space

Invader, ZEVS, dentre outros, e, for fim, o próprio Banksy. Entretanto, a grande

questão foi a de que o francês Thierry Guietta, residente nos EUA, desde a

década de 1980, por influência do ambiente, tenha se tornado um grande artista e

que logo em sua primeira exposição Life is Beaultiful, em Los Angeles, tenha

emplacado cifras milionárias e gozava de grande prestígio no campo das artes e

das mídias, usufruindo não só das redes de sociabilidade, quanto da própria

linguagem e conteúdo do trabalho tanto de “Obey” quanto de Banksy.

As razões as quais venho apresentar o artista Banksy neste último capítulo

desta pesquisa, inicialmente, foram pelo fato desse artista publicar arquivos pela

mídia digital, com imagens e registros, de contexto anti-hegemônico, capazes de

despertar críticas e provocações no campo da arte, com questões sociais e

políticas relacionadas à sociedade contemporânea e, também, na própria cena

das poéticas urbanas, sendo um ícone devido a sua ousadia e potência cultural e

estética. Posteriormente, ao analisar os fatos pude perceber que esta produção

não se estendia apenas para produzir um devir crítico, mas também estava

associada ao mercado da arte, buscando visibilidade, audiência e,

consequentemente, ganho de capital simbólico, para consolidar ganhos

econômicos, devido à rede de relacionamentos. Dessa forma, a internet

bombardeada pelos arquivos, serviu de plataforma publicitária para a ascensão

meteórica de Banksy.

56

Já disponível na rede para download, via Bitorrent – piratebay. 57

Existem diversas especulações sobre a criação do artista Mr.Brainwash, pelo próprio Banksy, sendo este também uma proposição artística e uma grande crítica ao mercado das artes.

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Essa dedução ocorreu pelo fato de Steve Lazarides, proprietário de uma

das principais redes de galerias de arte, a Lazarides Gallery (www.lazinc.com),

com espaços físicos expositivos em Londres e Nova Iorque, estar desde a

primeira edição, publicada de forma autônoma pelo artista, como principal

fotógrafo. Desde a primeira edição impressa, já existia uma indicação de que

outros volumes viriam, o que remete a pensar numa estratégia de protagonização

política e cuidado com a imagem e também pelo fato de Steve Lazarides aparecer

no documentário como porta-voz oficial de Banksy. Outra questão bem relevante é

que vários artistas que aparecem no documentário estão no site da Lazarides

Gallery, representados pela galeria. A partir da publicidade gerada pela veiculação

de seus trabalhos na internet e da potente crítica social, Banksy mantém a

máquina girando, provendo ganhos ainda maiores de capital simbólico, financeiro

e midiático.

4.3.2 Blu (www.blublu.org)

No mesmo caminho de Banksy seguem os trabalhos do artista italiano Blu,

já citado aqui, que tem como suporte para suas animações as paredes da cidade

e os meios virtuais de propagação de seu trabalho. A sua explosão na rede se deu

por meio de seus vídeos que apresentam desenhos sequenciais, animados nas

paredes e muros da cidade e editados na técnica de stop motion58.

Em seu vídeo, Big Boom http://vimeo.com/13085676, postado ainda em

2010, Blu conta a história da humanidade desde a explosão inicial do Big Bang: a

criação dos primeiros seres vivos a sua explosão final por uma bomba atômica,

derivada de uma guerra nuclear. Graffitis pintados nas ruas de cidades europeias,

sem sua migração para o virtual, seria praticamente impossível uma audiência de

seus trabalhos por um grande número de pessoas. Primeiro, pelo fato de que suas

obras estão espalhadas por regiões distantes e teriam que ser percebidas ao vivo

ou por algum meio tradicional de informação. Além disso, sendo uma de suas

expressões o vídeo, esse teria dificuldade de inserção em salas de cinema que

58

Técnica de edição de vídeo onde as fotografias são editadas frame a frame.

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não possuíssem uma característica mais enquadrada, tanto no perfil do

espectador, quanto da viabilidade econômica. O trabalho de Blu também se

assemelha ao conteúdo político abordado por Banksy. Sua execução geralmente

é em espaços previamente autorizados e inseridos em vários festivais

relacionados à cena artística urbana, o que não o impede de subverter a ordem e

a hierarquia quando se utiliza de meios financeiros públicos e privados para

criticar o próprio sistema que o financia, o que lhe permite um ganho simbólico

inestimável em seu trabalho, pela postura crítica, política e, quando bombardeado

na rede, possibilita o despertar de percepções diferentes das informações

transmitidas pela publicidade.

Hoje, com uma produção numerosa de intervenções e de vídeos, Blu

utiliza-se de seu site/blog para divulgar o registro dos desenhos, a venda de

posters de seus trabalhos e obras, e promove o lançamento de seu livro.

Foi através do bombardeio desses arquivos – registros das obras – na

internet, que possibilitou uma audiência ampla e, de forma autônoma, eles

expressaram suas polifonias transgressoras usando os próprios meios de

comunicação oferecidos por esse sistema. Um fator que leva a grande reflexão é a

preocupação dos artistas para com os registros de suas ações. Registros que

inseridos no próprio site de cada artista, tem como função uma

autorrepresentação e a produção de uma narrativa histórica, bem como a

formação de uma identidade, o que leva a construção de uma espécie de projeto

publicitário que consegue consolidar a “imagem” do artista via cultura digital, um

dos fenômenos de comunicação mais acessíveis e de grande potência

contemporânea. Cabe ressaltar que Banksy e Blu são representados também pela

Lazarides Gallery, tornando inevitável uma comparação com Andy Warhol, quando

nos diz: “Ganhar dinheiro é uma arte, trabalhar é uma arte e fazer um bom

negócio é a maior de todas as artes.” (HONNEF, 2005, p.30).

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By Mr brainwash59

59

Lata de spray de sopa é uma referência ao trabalho de Warhol que conseguiu fazer críticas à

própria sociedade e mercado das artes e também desfrutou de grande prestígio e ganho

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4.4 O ATACK

A poesia está morta novamente – e mesmo que a múmia do seu cadáver possua

ainda algumas de suas propriedades medicinais, a auto-ressureição não é uma

delas. Se os legisladores se recusam a considerar poemas como crimes, então

alguém precisa cometer os crimes que funcionem como poesia, ou textos que

possuam a ressonância do terrorismo. Reconectar a poesia ao corpo a qualquer

preço. Não crimes contra o corpo, mas contra Idéias (e Ideias-dentro-das-coisas)

que sejam letais e asfixiantes. Não libertinagem estúpida, mas crimes exemplares,

estéticos, crimes por amor. (BEY, Hakim, 2003, p.31)

ATACK foi o nome de uma série de ações organizadas via internet por

escritores urbanos – pixadores – a três instituições de arte em São Paulo, no ano

de 2008. A primeira ação foi realizada no Centro Universitário de Belas Artes

como parte do TCC – Trabalho de Conclusão de Curso –, do aluno Rafael

Augustaiz – “PIXOBOMB” – como é conhecido na rua. A segunda foi à Galeria

Choque Cultural, sábado, 06 de setembro e, a última, a 28º Bienal de São Paulo,

domingo, dia 26 de outubro.

4.4.1 Atack I

Dia 11 de julho de 2008, à noite, um grupo de jovens encapuzados e

vestindo roupas largas caminhavam com um objetivo. As folhinhas já tinham sido

distribuídas de mão em mão e publicadas na rede àqueles que estavam

conectados. A „senha‟ foi dada! Palavra de ordem:

PIXA TUDO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

Foi assim que começou o primeiro ATACK. Com essa ação ao Centro

Universitário de Belas Artes de São Paulo, um grupo de jovens marcou, ou

melhor, levou a pixação às páginas da historia das artes no Brasil. Eles invadiram,

provocaram e até agora se ouve os ecos vindos de latas – preto fosco –,

econômico dentro deles, assim a história parece se repetir.

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espancando as paredes da instituição. Para Hakim Bey, talvez esse fosse um

„crime‟ perfeito contra um sistema tradicional das artes; para a instituição, uma

afronta, um „crime‟ a ser punido. Talvez porque tenha sido uma performance

poética feita em solo brasileiro por propositores que não bailavam a música erudita

e conceitual vinda das academias, mas dançavam quem sabe a ruptura silenciosa

de Cage, sorriam olhando no olho do coiote de Beuys, tinham a veracidade da rua

e, assim, se ouvia a sonoridade estridente e desconfortável do caos.

TSSSSSSSSSSSSSSSSSSSSS.............

o caos é lindo,

Timothy Leary

A descrição desse happening vem de umas das cenas do documentário

lançado este ano, 2010, chamado PIXO.

O Centro Universitário de Belas Artes foi o primeiro local a ser atackado, foi

lá que Rafael estudou quatro anos como bolsista integral do PROUNI, e talvez

esse seja o motivo que desencadeou todos os três atacks. Rafael, a convite de

sua professora, apresentou um trabalho na “Mostra 100 anos de Oscar Niemeyer”,

em 15 de dezembro de 2007, e sempre posicionado como escritor urbano

envolvido desde os 12 anos na pixação, fez seu pixo nas paredes da exposição.

Em relação ao resultado, ele comenta em conversa com Gustavo60:

Transcendência horizontal da história, e transcendência vertical de Deus. Quase

pirei com aquele símbolo que fiz de todas minhas loucuras, diversas escaladas.

Nada me incomodou como aquilo. Uma espécie de encanto. Aquela parada, pelo

local me incomodo. Criei uma máscara onde meto pra lá que foda-se. Nem eu

60

Apesar de a grande mídia tradicional ter relatado esses fatos com bastante freqüência, foi nas dissertações já citadas de Gustavo Ribeiro Coelho e Sergio Miguel Franco que pesquisei para fundamentar o texto que segue abaixo, visto que a visão das mídias tradicionais geralmente é tendenciosa ao grupo hegemônico e as informações que seguem abaixo foram relatadas por sujeitos com características muito relevantes para esta pesquisa. Gustavo tornou-se “pesquisador aliado”, como ele se intitulou, pois durante esses acontecimentos, ele e Rafael “Pixobomb” trocaram muitos emails e conversas via MSN, transferindo as conversas e os textos ipisis litteris para sua pesquisa, sendo de grande importância para o entendimento e o decorrer dos fatos e também por sua postura e posicionamento durante a pesquisa, (crime como arte e pedagogia). Sergio Miguel Franco tem uma visão bem esclarecida do campo das artes e durante alguns anos trabalhou próximos aos escritores urbanos no projeto Aprendiz, sendo esse um dos fatores que o levou a pesquisar, como ele mesmo descreve.

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entendia o que tinha feito. Evitei até que os piXadores fossem ver. Enclausurado.

Privei a piXaÇÃo. Não fiz o deslocamento dela. Poderia até fazer como o genial

pintor Magritte – „isto não é uma piXaÇÃo‟. É como se eu tivesse pegado tudo e

sacrificado na casa do Estado. Criou uma distância, transcendência horizontal. O

que está no limite é a piXaÇÃo. Terra céu, vida e morte. Parecia que estava lado a

lado com a loucura, e aquilo não foi nada perto dos trampos que faço. Muitas

coisas ficaram tangíveis depois disso pra mim. Só deixou de me perturbar depois

do feito nas Belas Artes. Tenho que fazer algumas coisas. Meu espírito pede. Não

consigo mais pensar a não ser o que tenho de fazer. Acho que depois que fazer o

que tenho, fico de boa.” (apud COELHO, 2009, p. 190).

Talvez pelo deslocamento de sua expressão para dentro de um espaço

expositivo, com a perda do valor transgressivo, domesticado e também pela perda

de capital simbólico para com os sujeitos de sua comunidade cultural, Rafael, de

certo modo, foi levado a articular e montar uma estratégia para mudar o jogo, e

nada melhor que entrar no jogo da arte, que vem desde Duchamp contestando,

alongando e redefinindo os limites da arte. Assim, ao deslocar a pixação da rua,

não apenas na questão tipográfica, mas com toda sua carga transgressiva e

cultural, conseguiria problematizar diversas questões, pertinentes principalmente

ao campo da arte, mas traçando questões sociais, em que a pixação é um

movimento principalmente de classes periféricas e políticas, por estar se

apresentando perante o meio ambiente hierárquico acadêmico com sua mais

verdadeira posição, o livre-arbítrio. Veredicto final.

Aluno jubilado, preso, processado, ou melhor, sucesso

total! Trabalho eXtremo!

Rompi com um mundo das aparências, o diploma mesmo é válido no mundo

das aparências. Não faço questão. Se um dia eu for atrás será só pelas

pessoas que me apoiaram. Acho que transito nos dois. (apud COELHO, 2009,

p.192)

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4.4.2 Atack II

O segundo ataque foi à Galeria Choque Cultural. Essa ação deve-se a uma

suposta cooptação da estética do pixo realizada pela Galeria em anos anteriores,

quando produziu uma série de lambe-lambes escritos “PIXO GRÁTIS” e os

destinou à comercialização no exterior. Alguns artistas por ela representados,

como Zezão e Titi Freak, que fazem parte de “grifes”61 como “VICIO” e “SUSTOS”,

ligadas à pixação, já haviam utilizado a caligrafia do pixo em objetos e instalações

para exposição e comercialização.

Para o ATACK II, conta Gustavo Coelho que principalmente pelo Orkut e

pelo Fotolog, novamente as folhinhas foram bombardeadas na rede. Mais uma vez

o grupo se reúne via internet para o Atack. No convite lia-se:

Evadiremos com nossa arte protesto uma bosta de uma galeria de arte “Choque

Cultural”. Segundo sua ideologia, abriga artistas do “underground”. Então é tudo

nosso. Declararemos total protesto. Local de encontro: Pça Benedito Calixto. Rua

Cardial Arco Verde com Rua Lisboa, próximos dos metrôs Clínicas e Sumaré.

Horário: 15:00 Sábado 06-09-08 Resgatem frases: “VIVA A PIXAÇÃO”, “ARTE

COMO CRIME, CRIME COMO ARTE” “TODOS PELO MOVIMENTO PIXAÇÃO”.

(apud COELHO, 2009, p.199).

Dessa vez, pintaram as paredes, as obras, apropriaram-se do espaço que

eles consideravam como traidor ao movimento, “uma bosta de uma galeria de

arte”, como eles disseram, e inseriram a pixação tal qual é feita na rua, sem

autorização, sem convite, nas paredes da galeria e sobre os trabalhos lá expostos.

Para o grupo Atack, a justiça estava feita. Se a proposta era “pixo grátis”, foi o que

a galeria recebeu.

E não é que foi de graça! Conta Sergio Miguel Franco, que a galeria

declarou prejuízo de quinze mil reais e levou o caso à delegacia. Porém, também

cogitou que as obras transgredidas pudessem ser vendidas pelo dobro do preço

no mercado internacional das artes e, ao mesmo tempo, pode usufruir de toda a

61

Grife, como já citado, significa grupo na gíria dos pixadores.

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veiculação que o atack promoveu nas grandes mídias, rendendo, assim, ganho de

capital simbólico e financeiro à instituição perante o mainstream em detrimento a

sua “imagem” para alguns integrantes dos tags/pixos/graffiti.

4.4.3 Atack III

A última edição da série foi considerada o Atack ao “vazio”. A 28ª Bienal de

São Paulo, apelidada de “Bienal do Vazio”, teve suas paredes preenchidas por

caligrafias urbanas, tidas como pixos! Resultado do atack, o prédio da Bienal foi

todo pixado, o grupo todo encurralado num canto pelos seguranças. O que resta

fazer? Quebrar o vidro e fugir!

Assim foi a fuga de quase todos, comenta Gustavo, porém uma menina,

Caroline Piveta, foi detida. Acusada de destruir patrimônio histórico, pois o prédio

da Bienal é tombado, a escritora da grife “Sustos” é pega como bode espiatório e

considerada criminosa. Resultado: 54 dias de reclusão, a maior pena cumprida por

um pixador. Qual o crime? Caroline, juntamente com seu bando, talvez tenha

assustado, causando fissuras nos “monólitos paranóicos”62 e assim foi castigada

por roubar o “vazio” e sua palidez conceitual, alva e hegemônica e devolver á

instituição e ao sistema das artes a boa e velha poesia de protesto “ABAIXO A

DITADURA”.

No Oriente, `as vezes os poetas são presos – uma espécie de elogio, já que

sugere que o autor fez algo tão real quanto um roubo, um estupro ou uma

revolução. Aqui, os poetas podem publicar qualquer coisa que quiserem – o que

em si mesmo é uma espécie de punição, uma prisão em paredes, sem eco, sem

existência palpável – reino de sombras do mundo impresso, ou do pensamento

abstrato – um mundo sem risco ou eros. (BEY, 2003, p.31).

Esse grupo após contestar com suas intervenções os espaços das

instituições, um deles o “vazio”, demonstrou o poder de organização e de

circulação que a internet oferece. Foi a partir da proliferação dos convites nos

62

Expressão de Hakim Bey no livro Caos (2003).

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meio virtuais que se deu toda a articulação. Todas essas ações foram registradas

em vídeo e fotos, com seu maior representante o fotógrafo “Choque Photos”.

Alguns dos vídeos registrados por Djan “Cripta” foram “absorvidos” pela Fontation

Cartier, que foi responsável pela sua inserção no campo das artes e Djan foi

convidado para participar de uma exposição em Paris. A partir dos registros foram

gerados arquivos digitais e colocados na rede, promovendo não só os

participantes, mas possibilitando diversos desdobramentos e debates dentro

mesmo das comunidades dos tags/pixos/graffitis, como também em blogs

pessoais, profissionais e canais pertencentes às mídias oficiais. Um de seus

desdobramentos finais foi o lançamento do documentário PIXO, no qual aparecem

trechos desses Atacks. O documentário também teve apoio da Foundation Cartier.

Rafael “Pixobomb” possibilitou, com suas estratégias, provocar fissuras e

estender para o campo das artes uma grande discussão de caráter social e

político, se apropriou da cultura da pixação, seu suporte de expressão, e a inseriu

“goela a baixo” nas instituições referentes ao campo das artes, pois, devido à

reflexão diante de sua primeira proposição, meramente estética, sentiu-se

obrigado a reproduzi-la tal qual sua origem – protesto e transgressão.

A edição deste ano da 29ª Bienal oferece um espaço para a pixação. Mas

quem é a pixação? Tem um porta voz? Questão que reflete um pouco essa

contradição é que mesmo não sendo colocada como ATACK, a pixação ganhou

um espaço “domesticado” (sem seu caráter transgressor) e destinado a apresentar

as questões culturais pertinentes a esse campo cultural. Vídeos, fotos e as

famosas “folhinhas” estão representando o acervo dos responsáveis pelos

registros das cenas e dos protagonistas do ATACK, os beneficiários por essa

mostra “pixação” na 29ª Bienal, com ganhos simbólicos e projeções em outros

espaços expositivos e no mercado da arte.

Na sequencia do Atack à Instituição Bienal, o grupo realizou um quarto

Atack. Dessa vez, não a uma instituição oficial de arte, mas aos próprios

tags/pixos/graffiti. Segundo Rafael Pixobomb em um texto enviado por email a

Gustavo Coelho, esse quarto Atack partiu de uma indignação dos pixadores do

grupo de Atack com a turma dos escritores urbanos que já estavam no sistema

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das artes e, por isso, são considerados traidores do movimento, uma vez que

fazem graffiti em espaços autorizados pela prefeitura e financiados por

empresários. Escreveu Rafael Pixobomb:

Recado aos grafiteiros - Grafiteiros caiam fora, estamos pensando em romper um

acordo que a sociedade sempre acreditou que existiu, se não fizermos isso será

por muita humildade, subiremos todos os grafites dos pop-star que se levantaram

nas nossas custas colocando a piXaÇÃo como lado negro, correm com a política e

nunca fizeram uma por ninguém a não ser só pensar nos seus bem star! Apagam

vários pixos, estão se apropriando de nossa linguagem e ainda nos queimam! Já

era, o grafite é a evolução da piXaÇÃo o caralho, aqui é atitude e não bunda-mole,

acabará o teatrinho, São Paulo a cena do loko é piXaÇÃo. Tem o nosso respeito

os grafiteiros marginais, eles sim são família!!! (apud COELHO, 2009, p. 238)

Esse quarto Atack serve para ilustrar as tretas, que ocorrem nas ruas e,

agora, na internet.

4.5 – AS TRETAS

Na gíria das ruas, “treta” significa confusão, briga, conflito gerado pela falta

de respeito, pela divergência de valores, em suma, desarmonia causada pelo

relacionamento humano, que pode se estender a um simples bate-boca, ou até

guerras mundiais, cada qual com seu devido interesse, causa e ideologia

legitimadora. Nesta última parte do capítulo 4, apresento algumas tretas que são

discutidas via internet a partir dos rolês urbanos e digitais.

Muitas dessas discussões estão registradas nos sites, flickrs e fotologs,

entre outras plataformas multi-usuários, e contam histórias segundo o ponto de

vista de quem as está narrando.

Por se tratarem de fatos isolados dentro das comunidades dos

tags/pixos/graffiti, aqui definidas como [email protected], alguns

fatos citados ao longo desta pesquisa e seus sujeitos se repetirão nessas linhas

que seguem e as discussões das ruas são agora também retratadas nos espaços

virtuais. Os desdobramentos dos arquivos percebidos diante da tela do

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computador, os downloads e uploads, também são capazes de produzirem

diferentes reações, abrindo campo para troca de opiniões e assim fomentando o

processo cultural. A liberdade de expressão no meio digital permite que a

discussão seja registrada e, o mais interessante, representada pela escrita, pelas

imagens, vídeos e links conectados em rede, possibilitando que a informação seja

um grande hipertexto, de acesso a quem possa interessar. A comunicação dos

tags/pixos/graffiti proliferada em meio virtual, aquilo que estava somente nas

ruas paasa a ser protagonizada pela cultura digital, apresentanda com extrema

potência o “aqui e agora”.

4.5.1 A treta

A treta aqui apresentada foi, como anteriormete citada, o quarto Atack.

Para embasar e atestar as argumentações, que venho costurando nesta

dissertação, pesquisei os espaços virtuais dos protagonistas das narrativas acima

descritas e dentre elas escolhi as páginas do escritor urbano Djan, da grife

“Cripta”. O motivo que me levou a essa decisão foi pela personalidade do mesmo,

que junto com Rafael “Pixobomb” participou dos Atacks às instituições artísticas.

A série Atack, no seu quarto episódio, atropelou diversos murais grafite,

dentre eles o mural na Avenida 23 de Maio, produzido pelos Osgemeos, Nina, Ise,

Nunca, Zefix. Esse painel já havia sido pintado em 2002 pelos artistas Osgemeos,

Nina, Nunca, Herbert e Vitché e foi apagado pelo programa “Cidade Limpa”. Essa

ação de “limpeza” causou um enorme transtorno para a prefeitura, pois o painel

tinha sido autorizado e pago pela municipalidade em 2002. (FRANCO, 2009,

p.54). Diante do mal entendido, o prefeito Kassab, por meio da Associação

Comercial, encomenda um novo painel orçado em R$ 200.000,00. Essa situação

causou revolta aos pixadores, uma vez que o grupo de grafiteiros que aceitou

refazer o painel por R$ 200.000,00 era o mesmo que polemizava em seus

trabalhos nas ruas a ação de “limpeza“ da prefeitura.

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4.5.2. O Atropelo

“Quem quiser dormir em paz ...

que vá pra outras capitais...”

http://www.youtube.com/watch?v=l9wEtNglglI63

O endereço acima se refere a um vídeo no YOUTUBE, no qual, a cena dos

atropelos é editada com outras imagens, uma poética, um registro e a ação via

digital. Nesse período de pesquisa nas páginas de “Cripta” Djan, foram colocadas

inúmeras fotos dos atropelos, no próprio vídeo é possível ver o fotógrafo Choque

Photos com tripé acompanhando a ação. Aleem disso, é possível notar a

preocupação com a “imagem” dos protagonistas, vestindo macacões e

encapuzados, num gesto simbólico e até mesmo teatral. Quando postadas as

cenas das ações houve posições divergentes relatadas nos depoimentos,

tomadas por aqueles que a acessaram via plataforma multiusuário, no caso,

www.flickr.com/photos/criptadjan.

Para apresentar essas discussões entre os grupos pertinentes aos

tags/pixos/graffittis, escolhi uma página do fotolog e uma do flickr e apresentarei

as tretas.

63

Acessado em 10 de novembro de 2010

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FOTOLOG dia 10/11/2010

O fotolog é uma plataforma multiusuário que foi uma das pioneiras e mais

populares entre os escritores urbanos.

www.fotolog.com.br/cripta_1996/72640149

Gozando à custa da Pixação64.

23/03/10

Enganam-se quem pensa que só temos um motivo para atropelar esses

VERMES, essa turma de safados OS GEMEOS – NUNCA – ISE e os chupa

saco que vem atrás alem de correr com o KASSAB já vem explorando a

estética da pixação com fins lucrativos há muito tempo, quando eles

perceberam que a Pixação estava em alto no meio artístico Europeu começaram a

64

Grifos do autor

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usar letras de pixos em seus trabalhos, marcas de roupa como NIKE e camisas

que vendem na loja GRAPIXO que o próprio nome já é sugado da Pixação, não

teria problema nenhum nessa apropriação se algum desses VERMES fossem

Pixador, seria mais do que justo, se alguém é merecedor de ganhar alguma coisa

com a Pixação são aqueles que sempre derem o sangue nas ruas.

E pra que uns caras que já ganham dinheiro com seus trabalhos de Graffiti

ilustração ou como quiserem chamar estão explorando algo do qual eles nunca

fizeram parte, o babaca do NUNCA diz por ai que era Pixador, alguém se

lembra dele no Point? Ou já viu algum pixo dele? Diz ele que pixava AFIRMA,

perguntei para o LIN e outros manos dos RGS e ninguém se lembra dele,

desculpa esfarrapada de um verme safado que só quer lucrar nas custas do

movimento.

Roupas pra Nike com letra de Pixo – NUNCA

.

http://nicekicks.com/2010/02/nunca-x-nike-sportswear-team-brazil-pack/

Loja da Nike em Los Angeles USA – OS GEMEOS

http://www.flickr.com/photos/mikelin/8596930/in/set-213494/

Eu até me envergonho de um dia ter me vinculado com esses VERMES,

quem assiste os DVDs 100Comédia até vai se perguntar, “Porra o DJAN não

corria com eles?”, eu até corria até abri os olhos pra verdade, nunca é tarde

pra isso irmãos, quando percebi que o interesse dos VERMES era só em se

vincular com a Pixação para se promoverem como transgressores e descobridores

do movimento cortei o nó pela raiz, o primeiro passo foi atropelar o painel do

SESC na Rua 24 no centro, até então eles vibravam com os ataques, dizendo que

nos éramos geniais, e que tínhamos que atropelar os painéis de Graffiti

autorizados mesmo, mas como diz o velho ditado “pimenta no dos outros é

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refresco”, foi só meche com eles que a mascara caiu, assim que souberam que

foram atropelados começou a choradeira, “Por que nós? Somos os únicos que

representam o Graffiti no Brasil”.

Quando se escolhe o caminho da verdade não se pode poupar nem passar

pano pra ninguém, o foda é que eles continuam babando o ovo de alguns

Pixadores dando latinhas e fazendo algumas palhaçadinhas na rua, e tem

Pixador que se ilude, quer falar que a Pichação e o Graffiti sempre existiram

respeito, que respeito? Quando apagam uma agenda de Pixo para entrar o Graffiti

autorizado qual deles se opõe, e a culpa nunca é de ninguém, a desculpa é, “A

dono da casa que me chamou. A foi a prefeitura que apagou”, então se continuar

assim um dia vão começar a autorizar os picos, laterais, topos de prédios como já

anda acontecendo, e por que temos que respeitar um espaço que não foi

conquistado de forma ilegal?

Quero deixar claro uma coisa, não tenho nada contra o Graffiti como forma

de expressão, o problema é a conduta de alguns Grafiteiros que se acovardaram

na disputa por espaços na rua, vê se já atropelamos algum Graffiti ilegal, a

questão é quando a disputa ficar justa ai sim pode haver paz, em quanto isso não

mudar vou continuar atropelando esses vermes, eu escolhi não ficar em cima do

muro e correr somente pela a Pixação, espero que mais pessoas abram os

olhos para a verdade e façam a sua parte.

VIVA A PIXAÇÃO.

Foto publicada às 11:25

Comentários no Livro de Visitas (44)

aquarelista disse em 23/03/10 11:31

o dificil é fazer o intelectual de merda mudar o foco, enfim. Atropela.

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mobybeto disse em 23/03/10 11:32

vamu pixa tudooooooo.....

ajatos13zn disse em 23/03/10 11:37

Pixação !!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!Salve Djan Tamo JUNTO maloqueiro

sipros_itapevi disse em 23/03/10 11:37

BOA ...... ......

bitucas disse em 23/03/10 11:37

cerollll em todoss elessss

homenspizza85 disse em 23/03/10 12:07

to dentro!!ARRUAÇA TOTAL NESSES PAU NO CU!!!!!!!!

next_oreia disse em 23/03/10 12:07

vamo foska as q.bradas karaiii

salve djan eh nois!

tamafu disse em 23/03/10 12:13

Os Malucos ja se falaram com vc sobre esse cerol fininnnnnnnn ae?!

kkkkkkk

Os caras moscaram podiam ter ligado alguem do meio da pixação pra fzr as

paradas e ter ganho o seu sem pagar de pixo...tem um monte ai só olhar bem,

mas é sem massagem, cerol fininnnnnnnnnnnnnnnnnnnnnn

kkkkkkkkk

Fmz

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hon1 disse em 23/03/10 12:17

ééé ...

ci é um graffit ilegaL mesmo , até da pra tolera mais isso naum explica q deve

atropelar uma pixação

espero q essa moda naum pegui aqi

pq tem uma rapa aqi metido a bombstar q ja fizeraum isso e tomaraum u penalti

firmezas Djan to du lado da pixação 100% ilegalidade

1000 graU de vandaL

VIVA A PIXAÇÃO !!!

doidera_thi disse em 23/03/10 12:25

sem massagem nos jão que tenta atravessa a píxação

luxuria09_10 disse em 23/03/10 12:45

PIXA TUDO

A PIXAÇÃO E O MOVINTO MAIS UNIDO

VAMO QUE VAMO RAPAZIADA

PIXA TUDO 2010

FIKA NA PAZ AE

war1990 disse em 23/03/10 12:47

É quente c vender pro Kassab é a mesma coisa q fazer pacto com o capeta!!!

esses gemeos ai q vão toma no cú... 100 ideologia nenhuma ..lamentável ..to ai

mano vendo o desenrolar da ideia flw djan força mlk!!!

xchex disse em 23/03/10 13:45

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Mandou muito bem cara.

É isso ai.

Abracios, falou.

xXx

os_adams disse em 23/03/10 13:49

salve djannnn!!!

cerolllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllllll !!!!!

poroes disse em 23/03/10 15:38

Dead [| kassab

blestcvl disse em 23/03/10 16:45

é isso memo desce o rolo neles

é nois djan

PRIVADO

Comentário recebido em 23/03/10 16:56

suspeitosjr disse em 23/03/10 17:12

dece o rolo kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk'

borgo_4mc disse em 23/03/10 17:38

SUMESMo manO vc eh refencia em sampa

hsasus'

paz ae

cansadosdavida disse em 23/03/10 19:24

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kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

cerol dont'stop

kkkkkkkkkkkk

mo dó

o fodão da paulista la lanxo mesmo ein ... acabei de ver o link ae

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

pq nao fez desenho ou coisa relacionada ao estilo dele?

so mostra a falta de estilo propio e o quanto ele paga um pau pra pixação

enfim ... pra mim eu continuo com aquela opiniao da paulista qui vc lembra muito

bem

vamos relembrar?

kkkkkkkkk

" NUNCA VI "

kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk

E

O

T

E

R

R

O

R

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! EM RITIMO DE FESTA

wesley_pil disse em 23/03/10 23:14

esse link mostra a falta de ideia desse que eu NUNCA vi nos point nem em forma

de pixo o cara se acha o desenhista e num tem ideias proprias kkkkkkkkaii fudeu

!kkkkkkkk

diranaco disse em 24/03/10 00:00

o ritmo eh frenetico .

viva a pixaçao.

xmudox disse em 24/03/10 00:44

É PRA SE ARROMBAR MANO!

PICHAR TUDO ESSA PORRA MSM!

ospoetas disse em 24/03/10 13:11

salve djannn

vixxx esse ai fico cabrero em!!!!

como diz o diegooo do vamosss relembrar!!!!!

''sou muito mais graffiteiro que você...você já fez bomb em prédio? bomb feito com

escalada?'' hahahaha

salve salve total apoio!

plc_oskb disse em 24/03/10 16:27

é a cara atrazA esseS VÈRME!!!

soosloco163 disse em 24/03/10 17:21

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dceorolo e jah era....pau nocuh doKASSAB!!!

axsrf disse em 24/03/10 20:29

salve,salve............malokaaaaa...!!!

lrm_rp disse em 24/03/10 21:11

Salvee! Otima Quinta Feira Forte abraço!

tumulosmelhores disse em 24/03/10 22:49

E AI XAPA,ESSE EU VI NA FOLHA HEIN,AI O PREFEITO AO INVES DE SE

PREOCUPAR COM ENCHENTES,SEGURANÇA E EDUCAÇÃO,FICA

DESVIANDO DINHEIRO PRA "ARTISTAS CONSAGRADOS",SE BEM QUE SE

ELE NÃO PAGAR PRA ELES OUTRO GRAFITEIRO VAI E FAZ,NESSA AI O

PUTO DO KASSAB PAGOU OS CARAS E COM CERTEZA PEGOU O DELE

TBM,PQ NA MADRUGA MESMO O CARA JA MANDOU OS GUINDASTES

IREM LÁ PRA APAGAR OS PIXOS DE VCS,AI JA É D+

BOM A MINHA PARTE EU TBM FIZ LÁ NO BECO,JUNTEI MINHA RAPA E

DESCEMOS O ROLO,NA TERÇA FEIRA ME LIGARAM PRA PERGUNTAREM O

PQ,AI DESCI A LENHA E DISSE SE LÁ NÃO TIVER ESPAÇO PRA PIXO O

ROLO VAI DESCER,AGORA VAI SER ASSIM MANO,APAGARAM MUITO PIXO

MESMO E OS DA FAMILIA TUMULOS FORAM JUNTOS,AGORA SERÁ

DIFERENTE,APAGOU PIXO VAI LEVAR ROLO DE CARNEIRÃO NO

TOBA,KKKKKKKKK

AI PASSA LÁ NO MEU E VE A FOTO DO CAIXÃO QUE EU FIZ,FALOU E

AMANHÃ É NÓIS NO CONEXÃO REPORTER

cripta_1996 disse em 25/03/10 08:35

Hoje passa uma materia sobre pixação no SBT.

Se liga ai!

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http://www.fotolog.com.br/tumulosmelhores

mobybeto disse em 25/03/10 08:51

demoro djan....

vou somar na audiencia...

abraço

nunodv disse em 25/03/10 10:02

To ligado , vi a chamada do programa ontem de madrugad...

Um maluquinho mandando uma rima.... e tal. vou ver, foda é que é o de sempre,

vandalo , depredador e tla. mas vamos ver....

Abração mano...

Tá ligado no meu BLOG?

Se tu aceitar, vou te entrevistar pra lá... abração mano. fé na caminhada...

dimaspegos disse em 25/03/10 10:31

E

DJAN

nen podih deixa esses cara

fala essas merda

fqala q era pixado

e depois meti o pau

nas pixacao

saoum bando de pilantra

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vamo fosk

tudo

aquarelista disse em 25/03/10 11:09

demorou djan, valeus

rud_sap disse em 25/03/10 11:16

isso que e ultra mega pixo, da hora loko.................

tatorock89 disse em 25/03/10 12:24

SALVE FAMILIA !!

PODE CRÊ...VOU ASSISTIR COM CERTEZA ESSE PROGRAMA DE HJ...CANO

NA FACU PRA NÃO PERDER NADA!!!

VALEU FAMILIA !

È NOIS...SEMPRE

2milfamilia disse em 25/03/10 12:34

na rua é a22im...quem pode mai2 chora meno2......

....... re2peito e humildade prevalecem!

2alve Djan.."o DVD chegou na mão"...valeu!

anormaiszs disse em 25/03/10 13:10

salv cripta

pd cre mano

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hj d olho na tela

fmza ahe

kel_vr disse em 25/03/10 20:01

6 não perdoam mesmo! kkkkkkkkkk

pixa tudoooo

psicopatas87 disse em 26/03/10 02:05

Isso mesmo, tem q passar o cerol nessas grafitin veio.

Pow, em relação a materia do SBT.

Na moral, programa veio do caraio, os caras gravam usam a imagem e depois

editam do jeito que eles querem? Não curti não.

Pra variar passaram uma imagem de pixador burro, revoltado sem ter o que fazer.

E ainda pior ,sugerirão que pixador tem que virar grafiteiro., Que só assim vai

melhorar de vida.Enfim entre outras coisas que colocaram. Foi moh tiração esse

programa. Muito sensacionalismo.

Abç....

a_k_z_o disse em 26/03/10 08:39

CARALHO TRUTA O BAGUI EH GIGANTE

NA FOTO ANTERIOR PARECIA UM MURINHO NORMAL

uhsauhauhasuhUHAsUHsaUHsaUHsaUHSAUHAS

VAI CARAIIIIIIIIIIIIIIIIII SOLTA O ROLOOOOOOOOOOOOOOOOOO

IDEIA CERTA!!

VIVA APIXAÇÃO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

violadoresvj disse em 26/03/10 12:45

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BAH LOKÃO O ALONGADOR E O ROLÃO EM MANO

BAH ASSIM NÃO TEM COMO NÃO CHAMA ATENÇÃO ATÉ DE QUE NÃO

CONHEÇE A PIXAÇÃO

FIKA CUM DEUS AI MANO

PAZ

unidosklein disse em 26/03/10 16:58

Loko a matéria heim DJAN!!!

valew parceiro , saiu o meu tmb, fiquei surpreso!

Eh noixxxxxxxx!!!

abrazzzzzzzzzzzzz

By: Japonês!

smul_omambembe disse em 26/03/10 17:08

Muito legal o programa no SBT hein,

Gostei de ver como é sério o trabalho de voçês e a dedicação com o movimento!

Salve Djan

Ao observar o conteúdo desta página de internet levantei algumas questões

importantes à reflexão, não cabendo o julgamento do fato em si, e sim a questão

da veiculação da informação por meio da cultura digital.

A ação é registrada nas ruas e publicada no fotolog. Esse deslocamento do

atropelo para o virtual possibilita uma visibilidade ampla por sujeitos plurais e,

assim, também preserva o caráter de registro histórico, visto que esses pixos

foram apagados na mesma madrugada pela prefeitura, devido a um verniz que foi

aplicado em cima da pintura do painel, impermeabilizando o desenho.

Essas imagens postadas muitas vezes são capazes de proporcionar maior

visibilidade e audiência ao escritor urbano e possibilita a ele adquirir respeito na

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comunidade e expressar seu posicionamento político.

Os comentários apresentados afirmam como legítima a ação e incitam a

continuação e propagação das mesmas em outros desdobramentos. As palavras

como “viva a pixação, eh noixxx, salve, vamu pixa tuuudo” , traduzem a identidade

e a força cultural dessa comunidade, reforça a questão da conexão em rede como

meio de organização social, como canal de informação e articulação de ideias e

ações. Um exemplo da importância da comunicação via internet pode ser

percebida no comentário de Túmulos: “BOM, A MINHA PARTE EU TBM FIZ LÁ

NO BECO, JUNTEI MINHA RAPA E DESCEMOS O ROLO”.

Nesse comentário percebe-se que outros grupos também agiram da

mesma forma atacando outros painéis de grafites autorizados.

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FLICKR dia 10/11/2010

O flickr também é uma página muito utilizada pelos escritores urbanos,

brasileiros e estrangeiros e sua rede tem sido cada vez mais intensificada, visto

que sua aparição se deu posteriormente ao fotolog.

http://www.flickr.com/photos/criptadjan/5098245288/

Desmascarando um verme entre-nos!

Salve Rapa!

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Hoje eu venho aqui para desmascarar um verme (CHOQUE PHOTOS) que

esta se aproveitando e se promovendo a custa do movimento PIXAÇÃO,

infelizmente foi preciso uma Bienal para descobrir realmente quais os interesses

individuais e egoístas desse VERME, um exemplo claro pra começar é a primeira

frase de um texto em seu flickr onde ele diz (Meu Espaço na 29a Bienal

Internacional de Artes de São Paulo!), fora outras questões internas que rolaram

nos bastidores da produção para a Bienal, sem contar a babação de ovo que ele

faz paras os curadores da Bienal nesse mesmo texto em seu flickr.

www.flickr.com/photos/choquephotos/5036845297/

Os espaços concedidos na BIENAL para a PIXAÇÃO são do coletivo (PIXAÇÃO

SP) nome que escolhemos para representar o movimento em uma totalidade e de

forma neutra, portando mesmo que as fotos sejam de autoria do CHOQUE aquele

espaço foi concedido ao movimento, não é uma exposição individual dele, pois se

não fosse pela a PIXAÇÃO ele nem estaria na Bienal.

Outra questões:

O CHOQUE queria o nome dele separado do coletivo na lista de Artistas

convidados da 29º Bienal, o pedido foi negado pela curadoria que deixou claro que

ou ele estava com nos (PIXAÇÃO SP) ou pulava fora, sabe por que motivo ele

queria isso? Medo de ser associado ou processado como pixador, ele que já foi

pixador (mesmo que de vila) renega seu passado para a imprensa como neste link

abaixo, onde inclusive ele me desmente publicamente dizendo.

"Nunca fui pichador. Desconheço o motivo do Djan ter afirmado isto"

www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/800384-as-portas-da-bi...

kkkkkkkkkkkkkkk coisa de covarde mesmo, só rindo pra não chorar!

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Pra piorar as coisas olha o salve que ele me mandou por email essa semana

revoltado por não conseguir me registrar pixando a obra dos URUBUS na Bienal.

“Djan, Você nem se deu o trabalho de me chamar para fotografar sua ação,

embora eu estivesse na Bienal no dia. Como vc sabe o principal (que era a ação e

os seguranças te grudando) eu perdi, e o resto por eu estar mal posicionado e o

local ser super escuro ficaram uma merda, muito diferente dos registros que fiz

das outras ações. Sinceramente pra mim é vergonhoso estar no local e ter

produzido um material desse, portanto não quero estes registros soltos na internet

e muito menos sendo utilizados no processo que vc quer mover contra os

seguranças. Eu nunca deixei nenhum de vcs na mão com registros e sempre

cheguei junto sabendo das conseqüências, mas desta vez vc próprio não se

ajudou, e ainda me ofendeu chamando aquele Leandro que nem deu as caras por

lá. Portanto, sou neutro nesta questão e não me envolverei.”

Então como o CHOQUE não foi capa da folha (as nossas custas como

sempre) que se foda os irmãos neh! Mui amigo esse cara em, e olha que Eu nem

preciso dessas fotos para mover essa ação. Além de querer me culpar por sua

incompetência de estar na Bienal sabendo o que ia acontecer e não conseguir

registrar ele ainda acha uma ofensa Eu chamar outro fotografo como o “Leandro

Montovani” que ele se refere no texto acima, então agora ele é o fotografo

exclusivo dos Pixadores, só ele pode tirar fotos nossas kkkkkkkkkkkkkkkkkkk, da

pra acreditar?

Eu só sinto de ter descoberto isso agora, e como fui Eu que o envolvi (CHOQUE)

no movimento minha obrigação é de trazer a verdade aqui pra todos, independe

de ser amigo ou colega meu, tem muitos pilantras que dizem correr lado a lado,

mas na realidade só se aproximam de nós (PIXADORES) com interesses

individuais e egoístas.

Eu não passo um pano pra safado não, hoje eu te amo, mas amanhã posso te

odiar, o CHOQUE não é o primeiro. Eu já desmascarei outros vermes que se

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diziam “amigos” como OS GEMEOS e sua trupe de baba ovos que fazem

cosmética da PIXAÇÃO e pousam de descobridores do movimento na Europa.

www.fotolog.com.br/cripta_1996/72640149

E já que o CHOQUE é um covardão que não atende ó telefone e nem responde

email eu vou deixar um recado pra ele aqui.

Ai CHOQUE não fique pensando que você vai viver de exposições e vendas dos

registros que você tem nosso e do movimento (PIXAÇÃO), logo estaremos

vetando você juridicamente de expor ou vender nossas imagens, Eu vou fazer

questão de instruir a todos pixadores que você registrou que façam o mesmo, pois

o objetivo dos registros que era um livro até agora não aconteceu, então não fique

achando que vai viver as nossas custas pousando de artista em quanto os

verdadeiros estão na rua dando o sangue, já chega de gozar com nosso pau, de

dar entrevistas falando sobre o assunto, até trabalho na folha já arrumamos pra

você que por incompetência nem isso conseguiu manter.

É isso ai galera ramelo eu cobro mesmo, sem massagem!

Comentários e favoritas

1.

CREATURE MONSTERS (3 semanas atrás | resposta)

Porrada nele hahaha

salve djan

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169

7.

felipe guimaraes (3 semanas atrás | resposta)

saquei..

8.

AG©N (3 semanas atrás | resposta)

eita vai vendo

9.

CRIPTA DJAN (3 semanas atrás | resposta)

Duas cores, com certeza que a verdadeira PiXAÇÃO esta rua e por isso

mesmo que na Bienal ela só esta sendo representada através de registros

todos feitos na rua, não tem nenhuma parede nem quadro com PIXAÇÃO

na Bienal, muito menos PIXO sendo vendido, mas reconhecimento é

importante pro movimento, até mesmo por que uma das essências da

PIXAÇÃO é o reconhecimento, na Bienal só estamos expandindo para o

mundo a potência do PIXO, se para alguns pixadores não é importante

vc pode ter certeza que a maioria esta muito satisfeita, EU que estou

na rua posso afirmar isso.

10.

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170

Leandro Mantovani (3 semanas atrás | resposta)

Uma ofensa foi foda.

Só não colei no dia porque eu estava trabalhando , não foi por pouco caso

como o cara pensou.

Sem mais .

Abraço Djan.

11.

Duascores.com (3 semanas atrás | resposta)

Concordo Djan, mas esta palavra "reconhecimento" a gente pode traduzir

melhor para o nosso idioma; ibope. Quando fala que a "pichacao" esta

sendo vendida foi na mesma ideia do link que vc citou acima. A "pichacao"

esta entrando no mercado de "arte", pois pixacao também é arte, mas uma

arte PERTENCENTE a cidade, rua e isso não tem preço. Vender pichacao

para a burguesia ai ate eu entro no meio, mas nem de perto e nem de longe

nada do que esta sendo " comercializado" neste mercado de arte falida no

Brasil tem que ser chamado de pixacao.

A mídia e esse sistema artístico de classe alta e política esta criando

marionetes e a liberdade que temos nenhum preço paga. Por isso que não

mostramos a cara, pois depois que mostramos o medo vem e ai as coisas

complica. Ninguém quer ser preso. O anonimato e uma das essências da

parada e pra mim não tem nenhuma diferença a exposição na Bienal e do

painel que foi feito na 23 de maio! Os dois aceitaram cachês do estado e a

política usa e usou a cada um de vocês para ganhar ibope.

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Quem ganha com isso e a Folha de São Paulo, a Bienal. Lideres do

movimento do graffiti e da pixacao? Vergonha! Não existe lideres!!!

Nem o que faz mas e nem o que faz menos domina a parada!! Acho

que vocês que já estão totalmente visíveis na mídia teriam que rever

os conceitos sobre as raízes do movimento.

12.

Tharcustche (3 semanas atrás | resposta)

Manos até não queria mas...

No ano passado nosso coletivo foi convidado para participar da Bienal de

Artes Visuas aqui em Porto Alegre. Imediatamente respondemos que não.

Porque? Nossa concepção de arte não reconhece AS BIENAIS como

tutoras do que é, ou do que não é arte. AS BIENAIS, são instituições dos

burguêses e não nossas, nosso ibope, nosso reconhecimento, não pode

ser medido por instituição alguma, se existe alguma instituição que

devemos reconhecer são a partir daqueles que correm riscos, ao ousar

transgredir as normas de uma sociedade baseada na opressão e

exploração da nossa capacidade de criação. Nossa instituição deve ser

criada com a distruição do arcaico, do velho, do conservador do status de

poucos. Não precisamos deles, são inimigos, retém a possibilidade do

aprendizado intelectual, social e econômico.

Particularmente acho que os compas beberam de um veneno mortal,

flertaram com quem não nos reconhece e que não merece o nosso

respeito. Por um acaso retiraram o processo sobre a Carol? NÃO? Não

quero me indispor com os amigos mas meus apontamentos são sinceros e

voltado pra agregar os ingovernáveis. A vida nos ensina muita coisa, basta

perceber os sinais e nutrir nossos desejos.Eles ainda vão caír e vai ser, no

pau, na luta e na tinta, em cada grito, em cada distúrbio.

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Força a todos!

Pintar e Lutar!

13.

Duascores.com (3 semanas atrás | resposta)

- Tharcustche

Sempre e bom ler as suas ideias.

Eles oferecem 200 mil reais e ganham 1 bilhao com a nossa imagem.

"nosso ibope, nosso reconhecimento, não pode ser medido por instituição

alguma"

Apoio total!

Forca na batalha!!

14.

galogri (3 semanas atrás | resposta)

sem ação não tem foto nenhuma !

15.

CRIPTA DJAN (3 semanas atrás | resposta)

Sabe o que é foda a Pixação não pode nada, nem receber reconhecimento,

agora o Graffiti pode tudo, ai ninguém fala nada, e ainda tem um monte de

babaca que passa um pano, ninguém aqui ta querendo tirar a pixação da

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rua, não é por que colocamos um vídeo e algumas folhas dentro da Bienal

que o movimento vai perder a essência.

"A midia e esse sistema artistico de classe alta e politica esta criando

marionetes e a liberdade que temos nehum preco paga."

Eu não tenho medo medo de mostrar a cara na mídia pra falar o que pensa

não, Eu sim estou fazendo bom uso da liberdade de expressão, pra que se

esconder, varias pessoas morreram na ditadura militar para nossa geração

poder ter liberdade de expressão.

"O anonimato e uma das esencias da parada e pra mim nao tem nehuma

diferenca a exposicao na Bienal e do painel que foi feito na 23 de maio! Os

dois aceitaram caches do estado e a politica usa e usou a cada um de

voces para ganhar ibope."

Nos na Bienal não estamos interferindo em espaço na rua, é totalmente

diferente, só pra te dar um exemplo, quando a prefeitura apagou por

engano painel da 23 outros manos do graffiti foram fazer um bomb sem

autorização, sabe o que aconteceu? foi todo mundo pra delega, depois

venho Os Gemeos e pintaram la sem pertubação nenhuma....E outra nos

não estamos recebendo nada da Bienal, eles apenas estão reembolsado o

custo que tivemos pra fazer os trampos.

16.

CRIPTA DJAN (3 semanas atrás | resposta)

Tharcus, e \internos da nação (política interna) ou aos negócios externos

(política externa).[1] Nos regimes democráticos,a ciência política é a

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atividade dos cidadãos que se ocupam dos assuntos públicos com seu voto

ou com sua militância."

Então amigos aqui fica claro que quem faz a política somos nos

mesmos, e não é só através do nosso voto, e pra quem não se lembra a

apropria pixação nasceu atreves de protestos políticos.

A pixação é a política de questionar os espaços privado que cada vez é

maior na cidade, é a política da liberdade de expressão e liberdade da vida.

Não esqueçam isso a política não é só feitos pelos canalhas que estão no

poder, nos que temos que fazer nossa proporia política.

Por isso essa é a melhor forma de celebrar Arte e política.

17.

Duascores.com (3 semanas atrás | resposta)

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175

Opa...Valeu pela ideia Djan! Pixacao e uma cultura marginalizada e nao

aceita pela sociedade. A pixacao nasceu no Brasil e LITERALMENTE faz

parte da cultura brasileira. Vizualizada com mais frequencia na Cidade de

Sao Paulo ela contem valores, regras, estilo de vida e crencas na questao

de ser livre para se expressar,etc...

Entendendo melhor o seus esforcos conta a opressao, descriminacao e

ditadorismo visivel no Brasil, eu vou entendendo um pouco mais sobre os

seus esforcos.

Forca mano!

Forca na batalha!!!

18.

espaçoan (2 semanas atrás | resposta)

jah tinha ctz disso...te falei varias vezes djan....o maluco eh safado.... quem

era o choque antes de tirar fotos de pixo.... se promoveu as custas de

varios manos ae q sofrem nas quebradas em troca de porra nenhuma...e

qdo ele pos dinhero no bolso naum lembrou de nenhum desses manos...e

ainda se sente no direito de falar sobre a pixação como se estivesse no

meio.... pra mim naum passa de um aproveitador oportunista q estah

cagando e andando pelo movimento...soh ker saber de encher o bolso e

ficar pagando de heroi na midiazinha virtual... mas quem eh de mentira uma

hora a mascara cai!

19.

bee131 (2 semanas atrás | resposta)

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aí tu falow juk inda bem q num foi soh eu hahaha nada como o tempo para

mostrar quem eh quem

20.

CRIPTA DJAN (3 dias atrás | resposta)

Outra fita grave que eu não havia comentado é sobre o video da morte

do mano "GUIGO" Néticos que o CHOQUE colocou na Bienal sem o

nosso consentimento e da familia do mano, desrespeitando um pedido

do Pai do "GUIGO" que pediu pra nos no enterro que não publicasse nada

sobre o ocorrido, Ai me vem esse VERME do CHOQUE por dinheiro e

coloca a porra do vídeo na Bienal, e ainda por cima se refere sobre o

ocorrido em seu flickr como " UM EMOCIONANTE AUDIOVISUAL"

O cara é tão safado que mesmo depois que o mano caio ele ainda continuo

gravando, e os manos que estavam no role disseram que ele ainda tentou

filmar o mano caído.

No enterro do mano ele nem deu as caras e como de costume de quando o

chicote estrala desligou o celular pra ninguém falar com ele.

Pior ainda é saber que tem pessoas que mesmo sabendo de todas essas

podridões ainda apóiam esse tipo de VERME.

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A página do Djan no flickr segue com a mesma característica e polêmica de

seu fotolog. Mas a grande relevância está nos conteúdos das mesnagens. No

fotolog havia comentários, já no flickr há contestações e divergências. Os

posicionamentos diferentes em relação à mensagem postada por Djan atestam a

utilização desses canais para ponderar, discutir e fomentar ideias, ideologias e

apresentam também o ativismo político de seus sujeitos conectados nessa rede.

Além disso, podemos notar que há nesses comentários, pessoas de vários cantos

do Brasil, logo sua difusão é ampla e aponta para as diferentes opiniões. Dessa

forma é nítida a importância dos registros e das opiniões locadas no espaço

virtual, como um posicionamento político e autorrepresentação do indivíduo dentro

de sua comunidade. Outro aspecto de grande importância vem a ser a

comunicação feita a partir desses registros, pois as opiniões podem ser lidas de

várias formas e em hipertextos, podendo ser editada por meio dos links acessados

que promovem formas de interpretações e interatividades variadas.

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Conclusão

Cotidiano em processo

Esta pesquisa apontou experiências de um cotidiano em processo.

A compreensão dos tags/pixos/graffiti e dos [email protected] são

desafios presentes em nossa sociedade contemporânea. A percepção da

geografia virtual como uma extensão de nossa realidade e catalisadora de

diferentes experiências e relações entre as pessoas que interagem com as redes

do ciberespaço são fenômenos em construção no nosso meio social. Seus

reflexos em nossa sociedade estão registrados nas páginas do ciberespaço e os

arquivos postados constrõem uma espécie de narrativa histórica não linear desse

fenômeno cultural.

O presente projeto procurou apresentar uma narrativa sobre as brevidades

históricas referentes aos tags/pixos/graffiti, apresentando conceitos básicos

pertinentes às raízes desse campo de manifestação para se entender um pouco

as regras do “jogo”, a partir de pesquisas e das experiências que a rua me

possibilitou.

Quando jovens urbanos saíram às ruas para conquistar seus espaços,

alguma coisa mágica ficou no ar, seja o cheiro da tinta, a brincadeira, o grito, o

proibido, ou a potência de fazer com que suas polifonias fossem ouvidas e, assim,

as ruas e os trens e, atualmente, a internet foram invadidos, tomados de assalto.

Muitos entraram na dança, os estudantes em Paris, a geração hip-hop em Nova

Iorque, os artistas em Berlim, e, no Brasil, os jovens misturavam protestos

políticos nos labirintos de Delfino e nos “frangos assados” de Valauri, Matuck e

Zaidler, a primeira geração em São Paulo. Logo a segunda geração paulistana

inventou os pixos. Colocou um tempero, deu uma gingada, devolveu e ganhou

espaço nos salões do velho mundo, uns seduzidos pelo mercado, aprenderam a

jogar e circulam por entre becos e palácios, outros, as margens, espancam seus

pixos nos arranha-céus. Invadiram toda a cidade e a transformaram num imenso

livro urbano de histórias marcadas a tinta, suor, adrenalina, protesto, amor e ódio.

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Essas histórias, agora também são contadas nos

[email protected] e esperam por um click para que possam ser

interpeladas.

Para pensar sobre este momento de virtualização das culturas fundamentei

esta pesquisa sobre o ponto de vista de Pieri Lévy e Manuel Castells, que

apontaram questões sociais, políticas e econômicas em relação ao surgimento da

internet e principalmente a esta percepção através do digital. Para muitos, a

Internet é uma grande possibilidade de lucro, para outros uma aproximação com

pessoas distantes e constata-se nesta pesquisa a afirmativa de Manuel Castells,

no livro A Galáxia da Internet,que “a Internet é, acima de tudo, uma criação

cultural”. (2003, p.32).

Pela importância conceitual destaquei Cildo Meireles com seus circuitos,

Bruscky com sua conexão mundial via arte postal que buscaram um caminho

diferente, se fizeram autônomos e poéticos, construiram informações por fluxos

paralelos. Esses circuitos alternativos promovidos por redes autônomas foram

então um início do que é a internet para muitos ativistas. A grande rede

possibilitou que se estabelecesse uma grande e potente forma de ativismo, e

mesmo que os mercados possam seduzir esses sujeitos, as respostas serão

dadas. Banksy quando suas obras foram vendidas nos leilões por extravagantes

preços postou em seu site um desenho de uma figura de terno olhando para um

quadro com uma grande moldura com os seguintes dizeres: “I can´t believe you

morons actually buy this shit”65.

Para finalizar, gostaria de aqui escrever sobre meu desconforto e

inquietude durante esta pesquisa e escrita deste texto. Uma de minhas maiores

interrogações partiu de meu posicionamento crítico como pesquisador e escritor

urbano. Todos os questionamentos apresentados e discutidos nesta pesquisa

fazem parte das minhas conversas no dia a dia com outros pesquisadores, jovens

grafiteiros/pixadores, namoradas e amigos. Apesar de hoje um pouco distante das

ruas, eu utilizo o Fotolog e o Flickr como um espaço para a veiculação e

65

Eu não acredito que você idiota atualmente compra esta merda ( tradução livre do autor)

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discussão de minhas poéticas urbanas.

Uma coisa que aprendi é que“a rua cobra caro”.

Os atacks são uma espécie de resposta à academia de arte que muitas

vezes perdeu o foco de seu olhar para as ruas e apenas fica reformulando

conceitos datados do século passado e ignora expressões perifeericas da qual

provem um caldo cultural mais temperado.

A mesma reposta também foi dada a galeria Choque Cultural, pela

banalização comercial de uma cultura e, por fim, à instituição Bienal que foi

obrigada a dançar ao som do caos, com seus senhores e doutores sendo

questionados e medidos pelas suas próprias palavras. Talvez reeducados por

aqueles que têm no lema L.H.P. (Lealdade, Humildade e Procedimento), pois “a

rua cobra caro”.

Então, se realmente a discussão dos méritos e das divergências em relação

às ações das ruas, os tags/pixos/graffiti estão nas ruas e nos espaços virtuais, a

única maneira de entrar nessa discussão é arrumar a senha, fazer o login e

acessar os [email protected]. Não é colocando ponto final e impondo

um ponto de vista que conseguiremos atestar como verdade nossos ensejos, mas

sim, entrando numa zona de livre expressão, como a rua e a internet que

conseguiremos uma visão ampla, ouvindo sujeitos plurais com humildade e

procedimento.

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