fichamento - os herdeiros da traição moderna européia

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Universidade Paulista - UNIP THAU ARQ I – Professora Maria Carolina Nome: Evelyn Candido Lazaroto - T523EB-6 – 1° semestre/2012 A ARQUITETURA DO NOVO MILÊNIO – Leonardo Benevolo Os herdeiros da tradição moderna europeia A arquitetura das três últimas décadas é mostrada e analisada pelo ensaísta e crítico italiano Leonardo Benevolo. O autor faz um apanhado mundial, que inclui a arquitetura da América Latina, América do Norte, Austrália, China, Japão, Europa e de países muçulmanos. Mostra, ainda, os herdeiros da tradição moderna europeia, que será o capítulo desta resenha. Os herdeiros da tradição moderna europeia, cuja ética racionalista e a lógica da utilização das novas técnicas e materiais se mantêm nos limites da modernidade canônica, são analisadas em detalhe as obras de Gino Valle, Vittorio Gregotti, Giancarlo De Carlo, Rafael Moneo, Álvaro Siza. Seus repertórios têm longos precedentes em uma época anterior, no meio do século entre a Segunda Guerra Mundial e a mudança dos anos 90, mas sofreram uma mutação que os destaca das circunstâncias de origem e os coloca de algum modo fora do tempo, seus estilos derivam de uma seleção voluntária, que leva em consideração as demandas transformadas. É a tensão subjacente que dá qualidade à sua produção atual, distinguindo-os dos inconsequentes continuadores das tendências daquela época e de suas ramificações. Iniciaremos por Gino Valle, já falecido, herdou o escritório de arquitetura de seus pai Provino Valle, e pôde confrontar o programa do movimento moderno com uma probidade profissional mais antiga, distante das contraposições de princípio. Sob a escolta dessa educação, segue atentamente o debate cultural italiano pós-guerra, mas evita as escolhas de princípio, cuidando em primeiro lugar do domínio da técnica e da gestão da construção civil, que, diferentemente de todo os outros, ele

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Page 1: Fichamento - Os herdeiros da traição moderna européia

Universidade Paulista - UNIPTHAU ARQ I – Professora Maria CarolinaNome: Evelyn Candido Lazaroto - T523EB-6 – 1° semestre/2012

A ARQUITETURA DO NOVO MILÊNIO – Leonardo Benevolo

Os herdeiros da tradição moderna europeia

A arquitetura das três últimas décadas é mostrada e analisada pelo ensaísta e crítico italiano

Leonardo Benevolo. O autor faz um apanhado mundial, que inclui a arquitetura da América Latina,

América do Norte, Austrália, China, Japão, Europa e de países muçulmanos. Mostra, ainda, os

herdeiros da tradição moderna europeia, que será o capítulo desta resenha.

Os herdeiros da tradição moderna europeia, cuja ética racionalista e a lógica da utilização das

novas técnicas e materiais se mantêm nos limites da modernidade canônica, são analisadas em

detalhe as obras de Gino Valle, Vittorio Gregotti, Giancarlo De Carlo, Rafael Moneo, Álvaro Siza.

Seus repertórios têm longos precedentes em uma época anterior, no meio do século entre a

Segunda Guerra Mundial e a mudança dos anos 90, mas sofreram uma mutação que os destaca

das circunstâncias de origem e os coloca de algum modo fora do tempo, seus estilos derivam de

uma seleção voluntária, que leva em consideração as demandas transformadas. É a tensão

subjacente que dá qualidade à sua produção atual, distinguindo-os dos inconsequentes

continuadores das tendências daquela época e de suas ramificações.

Iniciaremos por Gino Valle, já falecido, herdou o escritório de arquitetura de seus pai Provino

Valle, e pôde confrontar o programa do movimento moderno com uma probidade profissional mais

antiga, distante das contraposições de princípio. Sob a escolta dessa educação, segue

atentamente o debate cultural italiano pós-guerra, mas evita as escolhas de princípio, cuidando em

primeiro lugar do domínio da técnica e da gestão da construção civil, que, diferentemente de todo

os outros, ele aprendeu na prática, não no meio universitário: assim incorpora as exigências dos

modelos antigos e novos em edifício evoluído, como um grau de coerência interna incomum.

Gino Valle representou outra maneira de ser regionalista, aquela em que o arquiteto centraliza

sua arquitetura em apenas uma cidade, geralmente sua cidade natal. Valle foi um grande arquiteto,

mas sua obra não se restringiu somente à cidade de Udine. Na Europa esta preocupação

aconteceu principalmente pela devastação gerada pela Segunda Guerra Mundial, estes arquitetos

queriam contribuir com o ressurgimento de sua cultura, e reconstruíam as cidades.

Deixa obras excelentes não somente na Itália, mas também em várias partes do mundo. Seu

talento mais secreto revela-se em alguns artefatos comemorativos, o monumentos aos caídos de

Udine (1959-1969), o projeto não executado em memória dos caídos de piazza della Loggia, no

cemitério de Brescia (1975), o túmulo Passolini em Casarsa (1977): os mais comovidos e

compostos já projetados na Itália moderna, sem nenhum tipo de complacência.

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A experiência de Gino Valle, única em seu gênero pela alta qualidade não exibida, mas

demonstrada concretamente, não indica novas tendências gerais. Coloca em evidência a

necessidade, e também o fascínio, de tirar das circunstâncias o melhor resultado possível. O ofício

da arquitetura encarrega-se de um grande número de condicionamentos positivos e negativos, que

ele preferia não evitar, extrair deles uma soma positiva é um empreendimento único, que presta um

serviço a toda a coletividade.

Vittorio Gregotti nasce no Norte de Itália, Novara, em 1927. Em 1950 obtém a licenciatura em

arquitetura na universidade de Milão e começa a sua carreira colaborando na conhecida revista

Casabella.

Começou a projetar no auge das discussões ideológicas do pós-guerra italiano. Esteve

presente em todas as fases subsequentes, mantendo relações atentas com artistas, literatos,

especialistas de todo tipo, clientes, administradores, e dosando judiciosamente as contribuições

acolhidas em seu grupo de trabalho. Hoje depois de cinquenta anos e de diversas transformações

organizativas, o Gregotti Associati acumulou experiências em todas as escalas projetuais, do

design à construção civil e urbanística. Gregotti ainda desenvolve pessoalmente uma atividade

crítica e autocrítica importante, não ocasional, mas profissionalmente cultivada.

Devido essencialmente à sua originalidade, Vittorio é conhecido como um grande

impulsionador da arquitetura mundial, por ter influenciado não só muitos arquitetos da nova

geração, como também, e essencialmente, pelas inovadoras linhas implementadas nas suas obras.

Vittorio é o autor de edifícios como o Centro Cultural de Belém, em Lisboa, o Estádio Olímpico de

Barcelona, entre outros.

Giancarlo de Carlo sempre combinou percursos mentais com uma inexausrível curiosidade e

disponibilidade para as oportunidades concretas, e, ainda hoje, depois de mais de meio século de

atividade, ´r impossível reconhecer-lhe uma fisionomia estabilizada.

Ao longo dos anos 80, De Carlo desenvolve o projeto de moradias para pescadores em

Mazzorbo, uma ilha da Laguna Vêneta, vizinha a Borano, a ilha das rendas bordadas. Ao mesmo

tempo em que desenvolve um projeto participativo, De Carlo aprofunda sua reflexão espacial. Se

diz “depurado das tendências puristas de um lado, e das neo-realistas por outro”, iniciando assim

uma nova fase de projetos. Trata-se de uma fase de menor investigação dialógica, e maior reflexão

sobre o desenho, sobre a forma. O arquiteto associa isso à idade: declara que o projeto

participativo demanda uma energia que já não possui, e assim, se recolhe para a reflexão solitária.

É o caso da Torre de Siena (1988-89, não executada), dos portais de San Marino (1994-99), e do

edifício da Faculdade de Economia, em Urbino (1999-2001).

De Carlo vê a participação como uma luta pela construção de uma racionalidade dialógica na

arquitetura. Uma racionalidade construída não a partir dos anseios e conceitos dos arquitetos, mas

sim, da coletividade. Porém não concorda com o advocacy planning, pois considera que esta

postura tira do arquiteto o impulso criativo, reduzindo-o a um tradutor dos anseios coletivos. Insiste

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que o arquiteto deve trazer a inovação, enriquecendo o debate participativo, superando o repertório

existente daquela coletividade.

O fortalecimento das pequenas comunidades, longe de nostálgico, é um passo rumo a uma

sociedade mais cosmopolita, onde a consciência de cada um quanto ao seu papel na coletividade

seja maior e, portanto, sejam os homens mais livres. É a mensagem que fica na arquitetura de

Giancarlo De Carlo: arquitetura é a arte de se construir espaços para se viver junto.

Rafael Moneo sempre apresentou uma arquitetura com inerente arbitrariedade como algo

discreto. Em outras palavras, a arbitrariedade da forma desaparecia na construção, e a arquitetura

atuava como ponte entre as duas. Hoje, a arbitrariedade da forma é evidente nos próprios edifícios,

porque a construção é destituída do jogo projetual. Quando a arbitrariedade é tão claramente

visível nos edifícios mesmos, a arquitetura está morta; o que se entende como o atributo mais

valioso da arquitetura desaparece.

Os edifícios diferem com respeito às exigências e às condições do sítio, mas todos são

edifícios públicos. Eles podem ser considerados como representativos do seu trabalho dos últimos

dez anos.

Por que edifícios ao invés de projetos? Por que trabalho ao invés de discurso teórico? Ele

acredita que na crua realidade de obras construídas é possível ver claramente a essência de um

projeto, a consistência de ideias.

Álvaro Siza com uma arquitetura que retoma ao mesmo tempo as duas atitudes projetuais

que marcaram a primeira metade do século, as poéticas racionalista e organicista, e com grande

capacidade de adaptação, Siza propõe uma espécie de "atualização de culturas arquitetônicas

plurais". O seu desenho se descobre como um palimpsesto: nele encontramos resíduos variados

que nos reportam a experiências alheias, anteriores, aqui revividas sob nova relação intencional. A

história da arquitetura é referência manipulada no seu método projetual que vai da reconstrução

tipológica à releitura.

Com licença poética, Siza retoma temas e soluções formais da arquitetura de Corbusier,

Wright, Aalto, Mies, Loos, Mendelshon, Stam, Scharoun. Ele, como Fernando Pessoa, é vários,

múltiplos. Na alma, é todos aqueles outros: seus desenhos reviveram, na escuridão de olhos

fechados, imagens da história da arquitetura. Sua arquitetura é interferência nessa realidade. Aí, o

arquiteto ratifica a ideia de que a arquitetura nunca surge no vazio: suas formas remontam a outros

desenhos e suas imagens nos remetem a outras arquiteturas. Siza é feito de muitos Álvaros.

Para Siza, os arquitetos não inventam nada, apenas transformam a realidade. Desse modo, a

história da arquitetura, como parte integrante da realidade do arquiteto, também concorre na

imaginação de Álvaro Siza, na medida em que o registro de suas formas e as instâncias visuais

produzidas por uma memória sem fronteiras alimentam seu imaginário. É o que vemos mais

obviamente no restaurante não construído em Malagueira, imagem da Savoye; ou no interior da

biblioteca da Universidade de Aveiro, iluminada por uma versão das clarabóias da biblioteca de

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Viipuri, de Aalto. Ou ainda na torre inclina de escritórios em Berlim, que refaz a espiral do

Guggenheim de Wright.

O ponto de equilíbrio encontrado por Siza permanecerá provavelmente, como para outros

personagens: os jovens sobressairão se souberem utilizar seu exemplo para criar novidades reais

e imprevisíveis.