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O Fausto de Goethe: a tragédia do desenvolvimento BERMAN, Marshall. Tudo o que é sólido desmancha no ar. Tradução de Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Cia das Letras, 1986.

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Apresentação do Texto Fausto, a Tragédia do Desenvolvimento de Marshall Berman

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Page 1: FaustoTragédia Desenvolvimento

O Fausto de Goethe: a tragédia do desenvolvimento

BERMAN, Marshall. Tudo o que é sólido desmancha no ar. Tradução de Carlos Felipe

Moisés. São Paulo: Cia das Letras, 1986.

Page 2: FaustoTragédia Desenvolvimento

Johann Wolfgang von Goethe(Frankfurt am Main, 1749 – Weimar, 1832)

Escritor, filósofo, cientista, teóricoLíder do Sturm und Drang (com Schiller)Os Sofrimentos do Jovem Werther (1774)

Weimar (1775-1786)Membro dos Iluminatti (1980-1986)

Itália (1786-1788)Retorno: diretor do Teatro de Weimar (1791-1817)

Conselheiro da Universidade de Jena (Hegel, Schiller e Schelling)

Casa-se em 1806 com Christiane Vulpiu

Page 3: FaustoTragédia Desenvolvimento

Fausto (1775-1830)

Urfaust (1º esboço, 1775);

Faust, ein Fragment (1791);

Faust, eine Tragödie (1808);

Faust. Der Tragödie zweiter Teil in fünf Akten (1826-1830, publicado em 1832)

Page 4: FaustoTragédia Desenvolvimento

1ª Parte

Heinrich Faust, Mefistófeles, Margarida Múltiplos cenários. Dividida em cenas. Dedicatória e

prelúdio.

Céu: Mefistófeles aposta com Deus a conquista da alma de Fausto, erudito que quer saber tudo.

Estúdio de Fausto: erudito reflete sobre o conhecimento e sobre suas tentativas de usar a magia

para chegar ao conhecimento ilimitado. Fracassa. Considera o suicídio.

Muda de ideia ao ouvir os sinos da Páscoa.

Page 5: FaustoTragédia Desenvolvimento

Rua: Sai a passear com seu assistente, Wagner. São seguidos por um cão que volta à casa com eles.

Estúdio: o cão se transforma em Mefistófeles. Acordo: Mefistófeles fará tudo o que Fausto quiser na Terra e

Fausto o servirá no inferno.

Cláusula: a alma de Fausto será levada somente quando Mefistófeles lhe dê tanta felicidade que

Fausto deseje que dure para sempre.

O demônio o leva a uma taberna. Depois, uma bruxa lhe dá uma poção para que fique

jovem e bonito.

Page 6: FaustoTragédia Desenvolvimento

Fausto vê Margarida (linda e pura) e pede que Mefistófeles a consiga para ele. Com jóias consegue ajuda da vizinha Marta para um encontro no jardim

entre Fausto e Margarida. Casa de Maragarida: Fausto tenta adormecer a Mãe

dela com uma poção, mas, ao invés disso, a Mãe morre. Margarida pressente estar grávida. Seu irmão

Valentim desafia Fausto a um duelo. Ajudado por Mefistófeles, Fausto mata Valentim, que antes

amaldiçoa a irmã. Margarida busca conforto espiritual numa catedral, mas é atormentada por um espírito

maligno que a enche de culpa.

Page 7: FaustoTragédia Desenvolvimento

Mefistófeles leva Fausto à festa a um sarau de bruxas. Enquanto isso, Margarida afoga o filho recém-nascido.

É condenada à morte pela justiça. Fausto sente-se culpado e acusa Mefistófeles, que replica que Fausto

tem a culpa. Consegue a chave da cadeia, mas Margarida se recusa a sair porque não ama mais

Fausto. Coro celestial afirma "Salvou-se! Margarida morreu, mas salvou sua alma.

Page 8: FaustoTragédia Desenvolvimento

2ª Parte

Fausto desperta e inicia um ciclo de aventuras dividido em 5 atos, cada um com um tema diferente.

No final, Fausto consegue ir para o Céu por haver perdido apenas metade da aposta com o demônio.

Anjos, como mensageiros da vontade divina, anunciam no final do Ato V:

"Cantemos em coro, Da vitória a palma, O ar está puro: Respire esta alma!“

Levam a parte imortal de Fausto ao Céu, derrotando Mefistófeles.

Page 9: FaustoTragédia Desenvolvimento

Primeira metamorfose: o sonhadorFausto: (linhagem de) heróis modernos que falam

sozinhos na noite.

Mas, de meia-idade, reconhecido, estimado e cercado de parafernálias da vida espiritual bem-sucedida.

Para ele é tudo lixo, apenas espiritualidade.

Humanista: pensar, sentir e ver. Mente e sensibilidade expandida, mas isolado do mundo exterior.

Sua cultura o divorciou da vida.

Page 10: FaustoTragédia Desenvolvimento

Fausto invoca poderes mágicos do Espírito da Terra, mas estes lhe parecem “apenas um espetáculo!”

Visão contemplativa, mística e matemática fazem dele um espectador passivo (poder mental = prisão), mas

deseja uma ligação vital, erótica e ativa com o mundo.

O Espírito da Terra ri de seu desejo de ser Übermensch, ao invés de Mensch.

Os problemas de Fausto são semelhantes aos das sociedades europeias modernas antes das

Revoluções Francesa e Industrial.

Page 11: FaustoTragédia Desenvolvimento

Divisão social do trabalho gerou produtores de cultura e de ideias, mas isolados do mundo a eles inacessível.

Cultura moderna, aberta e dinâmica em sociedade medieval, fechada e estagnada:

vida interior versus vida exterior.

Nos 60 anos em que Goethe escreveu Fausto surge, para romper o isolamento, nova divisão social do

trabalho e novas relações entre pensamento político e vida social: cheias de aventura, mas também trágicas.

Cisão do Fausto = da sociedade: fonte do Romantismo.

Page 12: FaustoTragédia Desenvolvimento

Fonte de vergonha e de orgulho subdesenvolvidos: Alemanha (XVIII), Rússia (XIX) e Terceiro Mundo (XX).

Culturas de vanguarda em sociedades atrasadas produzem a cisão fáustica entre

“visões, ações e criações revolucionárias” e a noite de “sombrias alamedas da futilidade e do desespero.”

O suicídio trancaria Fausto no interior da autonegação; mas, Goethe lhe traz luz e afirmação.

Page 13: FaustoTragédia Desenvolvimento

O deus ex-machina não é cristão (Domingo de Páscoa), mas infância: a lembrança da criança que o adulto esqueceu fornece ao náufrago dos sentimentos

a energia para lançar-se ao mundo exterior.

Renascimento de Fausto (escrito em 1799-1800 e publicado em 1808) prefigura arte e pensamento do

século XX: Freud e Proust redescobrem a infância.

Modernização

A tradição conservadora vê no desenvolvimento industrial a negação do desenvolvimento emocional, mas para

Goethe “as rupturas psicológicas da arte e do pensamento romântico [...] podem liberar tremendas energias

humanas [...] para o projeto de reconstrução social.”

Page 14: FaustoTragédia Desenvolvimento

O “projeto romântico de liberação psíquica no processo histórico de modernização.”

Fausto se emociona com o mundo, segue a multidão (visão da vida social das classes oprimidas) e percebe

o elo entre seu esoterismo e os esforços do humilde trabalhador urbano.

Se alegra em retornar à antiga vizinhança (espaço da infância), mas sucumbe à culpa da lembrança de que seu pai e ele, ambos médicos, ceifaram muitas vidas.

Por isso ele abandonou a prática da medicina e dedicou-se à “solitária investigação intelectual” que o

isolou do mundo e quase o levou à morte.

Page 15: FaustoTragédia Desenvolvimento

Nova esperança, novo desespero: não pode retornar ao passado infantil, e tampouco libertar-se da casa

paterna. Precisa ligar o calor da vida cotidiana e comunitária à revolução intelectual e cultural da

mente. Duas almas.

Para resolver a síntese, paradoxos.Psicológicos e econômicos.

Paradoxo Mefistófeles: o pai das mentiras, por ironia goethiana, aparece quando Fausto se sente mais

perto de Deus.

“No princípio era o Verbo” torna-se “no princípio era a Ação”: criar um mundo.

Page 16: FaustoTragédia Desenvolvimento

O diabo: lado sombrio da criatividade e da divindade, “subtexto do mito judaico-cristão da criação.”

Na criação há pecado, destruição e mal - o “espírito que tudo nega” mostra que o que existe deve morrer.

O mal cria o bem: Deus cria, mas também destrói.

Fausto quer criar e encontra o poder da destruição.

Mais paradoxo: o que foi criado até agora deve ser destruído para abrir caminho para a criação moderna.

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As baixas da criação não são responsabilidade de ninguém: é a “lei da vida”. Portanto, aceitar a

destrutividade como elemento da criatividade para livrar-se da culpa e agir. Sem dúvida moral.

Questão: como agir? Mefistófeles mostra; Fausto aprende e passa a agir

sozinho.

Dinheiro e economia capitalista: extensão do homem; poder sobre outros homens e circunstâncias;

ampliação do raio de ação.

Para além do capitalismo: mente e corpo como ferramentas e recursos para maximizar a experiência

(intensidade, vivência, ação, criatividade).

Page 18: FaustoTragédia Desenvolvimento

Outra questão: para onde vamos?

Fausto sente que deve continuar movendo-se, pois se parar (repouso e satisfação), deverá entregar sua alma ao diabo.

“Mergulhar no turbilhão do tempo, na enxurrada dos eventos”, no processo, na atividade.

Mas às vezes, Fausto se preocupa com que tipo de homem irá tornar-se.

Mefistófeles: “Você está no fim – o que você é.”

Ambiguidade.