f suarez disputacao ii
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Aristteles, conservando sua ordem, ou que nos ocorreram, e indicamos os lugares em
que ns as discutimos. Se acaso algumas opinies de Aristteles, cujo conhecimento
til para as outras cincias, ocorrerem nestes livros e no puderem ser tratados em
nossas disputaes, observando-se a ordem da doutrina que adotamos, apresentamos no
mesmo ndice breves anotaes acerca do texto de Aristteles, nas quais explicamos
tudo que no foi abordado nas disputaes e que contenha algo difcil ou til. Portanto,
na presente disputao devemos explicar a questo do que seja o ente na medida em que
ente, pois que haja ente de tal modo conhecido por si, que no precisa de nenhuma
explicao. Ora, depois da questo de se h, a questo do que seja a coisa a primeira
de todas que necessrio ser pressuposta ou explicada no incio de qualquer cincia,
sobre o sujeito desta. Ora, esta cincia, sendo a primeira e suprema de todas as naturais,
no pode receber a razo e a quididade do seu sujeito, provada ou explicada por outra;
por isso, preciso apresent-la e explic-la logo no incio.
Seo I
Se o ente, na medida em que ente, tem em nossa mente um conceito formal
comum a todos os entes.
1. O que so o conceito formal e objetivo e em que diferem. Primeiro preciso
supor a distino corrente do conceito formal e objetivo. Chama-se conceito formal o
prprio ato ou, o que mesmo, o verbo pelo qual o intelecto concebe alguma coisa ou
razo comum; que se chama conceito porque como que a prole da mente; e formal ou
porque a ltima forma da mente, ou porque representa formalmente mente, a coisa
conhecida, ou porque , na verdade, o termo intrnseco e formal da concepo mental,
aspecto no qual difere do conceito objetivo, por assim dizer. Chama-se conceito
objetivo aquela coisa ou razo que conhecida ou representada, prpria e
imediatamente, pelo conceito formal; como, por exemplo, quando concebemos ohomem, aquele ato que efetuamos na mente para conceber o homem, chamado
conceito formal; no entanto, o homem conhecido e representado por este ato, chama-se
conceito objetivo; de fato, chama-se conceito por denominao extrnseca a partir do
conceito formal, pelo qual o objeto dele dito ser concebido e, por isso, chama-se
corretamente objetivo, porque no o conceito como forma, que termina
intrinsecamente a concepo, mas como objeto e matria a respeito da qual versa a
concepo formal e para a qual tende, diretamente, o gume da mente, pelo que chamado por alguns a partir de Averrois [In De animaIII, Com. 16; Junctas, fol. 160rB-
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vD], inteno inteligida e por outros chamado de razo objetiva. Daqui se deduz a
diferena entre o conceito formal e o objetivo, pois o formal sempre coisa verdadeira e
positiva e, nas criaturas, uma qualidade inerente mente; no entanto, o objetivo nem
sempre coisa verdadeira positiva; com efeito, concebemos s vezes as privaes e
outras, que so chamadas de entes nocionais, porque s tm ser objetivamente no
intelecto. Ademais, o conceito formal sempre uma coisa singular e individual, porque
uma coisa produzida pelo intelecto e inerente nele; no entanto, o conceito objetivo
pode ser s vezes uma coisa singular e individual, na medida em que pode ser objeto
para a mente e ser concebida por um ato formal, mas frequentemente uma coisa
universal ou indistinta e geral, como homem, substncia e semelhantes. Nesta
disputao pretendemos, portanto, principalmente, explicar o conceito objetivo de ente
como tal, de acordo com toda sua abstrao, segundo a qual dissemos [DM I, 1, 16-17 e
26] que objeto da metafsica. Mas, porque muito difcil e depende muito de nossa
concepo, damos incio pelo conceito formal que, como parece, pode ser mais
conhecido para ns.
Vrios pareceres so apresentados
2. O primeiro parecer nega de modo absoluto que se d um conceito formal de
ente que seja, na verdade, uno em si, discernido e distinto dos outros conceitos dos entes
particulares. Assim opina Cajetanono opsculo Sobre a analogia dos nomes, cap. 4 e
6. De fato, ainda que fale de maneira obscura e distinga a respeito de um conceito
perfeito ou imperfeito, esta distino coincide com outra de Fonseca, que devemos
tratar imediatamente. Da que, se for lido atentamente, na verdade opina isto e que ele
alcanou a verdade ou chegou mais perto dela, diz Fonsecano livro IV daMetafsica,
cap. 2, questo 2, seo 3. O fundamento porque, de outra maneira, o ente seria
unvoco e no anlogo, o que falso, como veremos abaixo. A consequncia provadaporque os unvocos so aqueles cujo nome comum. Mas, a razo da substncia
adequada ao nome o mesmo, conforme Aristteles no incio dos Predicamentos
[Categorias, 1, 1a5-11]. Ora, o nome de ente comum a todos os entes. Logo, ou a
razo do nome uma e o mesma e, assim, ente ser unvoco, ou no uno e, assim, nem
o conceito formal de ente poder ser uno porque o conceito formal tem sua unidade a
partir de alguma coisa una ou razo concebida, a que se refere adequadamente. Donde,
se este conceito tambm adequado palavra ou nome de ente, no pode ser mais unodo que a razo de ente, significada por este nome, seja uno.
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3. A segunda opinio, que antes uma explicao do que precede, a do
Ferrarienseno livro I do Contra os gentios, cap. 34, que distingue um duplo conceito:
chama um de quiddo nome e outro de quidda coisa; diz que o primeiro pode ser uno no
conceito de ente, mas o segundo de modo nenhum; fundamenta ambos na analogia do
ente. Explica-se desta maneira pela razo comum dos anlogos. Com efeito, podem ser
concebidos de dois modos. De um modo, por um conceito prprio real, significado pelo
nome; deste modo, na medida em que so anlogos, no tm um conceito real, mas
vrios, como manifesto tanto nos anlogos por proporcionalidade, como por
proporo ou atribuio. Pois se, ouvido este nome risonho, se formar o conceito
prprio da coisa significada, sendo formado, no um, mas um duplo conceito: um do
homem, que prpria e formalmente risonho e outro do animal irracional, que assim
chamado apenas por causa de certa proporcionalidade. Se se formar, no ambos
conceitos, mas apenas um deles, esta palavra no concebida de acordo com toda a
analogia ou significao comum para com as coisas, mas, ou concebida apenas na
medida em que unvoca a respeito dos homens, ou apenas na medida em que
translata e significa metaforicamente o animal irracional. semelhante nos anlogos de
atribuio, por exemplo, sadio. Pois, se se formar o conceito prprio da coisa
significada, ele no uno, mas mltiplo: um do animal, que formal e propriamente
sadio; os outros, das outras coisas, que por vrias referncias ou denominaes so ditas
extrinsecamente sadias, a partir da sade do animal. No entanto, em ambos estes
anlogos, pode formar-se um conceito muito indistinto, que diz respeito mais
significao da palavra do que a alguma coisa, como se, ouvido o nome sadio,
concebas que ordenado sade. Assim, portanto, no caso presente, ouvido o nome
de ente, pode formar-se um conceito indistinto abarcando o que quer que tenha ser ou
referncia ao ser, mas este apenas um conceito do quiddo nome; no entanto, se, na
verdade, forem concebidas as coisas significadas por este nome, no se forma umconceito, mas vrios.
4. Parecer de Fonseca prximo deste. Nem se diferencia muito deste parecer
Fonseca, supra citado, ao distinguir um trplice conceito de ente, a saber: distinto,
indistinto e intermedirio, isto , em parte indistinto e em parte distinto. distinto o que
representa, determinada e expressamente todas as entidades simples, as quais o ente
significa imediatamente; este no uno, mas vrios. indistinto, o que representa tudo,
indistinta e indeterminadamente; este uno. Mas, o intermedirio, em parte indistinto eem parte distinto, o que representa, determinadamente, uma natureza, por exemplo, a
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substncia e as demais, por exemplo, a quantidade, a qualidade, etc., implcita e
indeterminadamente, na medida em que todas concordam, por certa proporo, com a
substncia; este tambm denominado uno.
5. Tanta diversidade de distines, mais atrapalha do que ajuda a clareza.
Ora, tais distines parecem-me multiplicar-se sem causa e mais confundem o assunto
do que o explicam. Pois devemos falar sobre o conceito formal de ente, no de acordo
com o que pode ser conhecido e compreendido sobre todas as coisas que esto
compreendidas sob esta palavra, na medida em que so em si, mas na medida em que
so significadas por esta palavra. De outro modo, a exposio no ser sobre o conceito
de ente, na medida em que ente, mas sobre o conceito de todas as coisas, tanto das
existentes como tambm das possveis, na medida em que so tais e se distinguem entre
si; e deste modo no podem ser concebidas distintamente por ningum, por um conceito
formal, a no ser apenas por Deus, como o mesmo autor corretamente observou. Mas,
neste sentido, mesmo o conceito de substncia ou de vivo, se for explcito e distinto
deste modo, ser apenas aquilo pelo qual todas as substncias ou todos os vivos so
concebidos distintamente, na medida em que so, e deste modo s Deus, tambm,
poder ter deles um conceito formal distinto de substncia, de vivo, etc.
6. Dizes que substncia, vivo e nomes semelhantes no significam
imediatamente estas ou aquelas naturezas substanciais ou vivas, mas a razo de
substncia, de vivo, etc.; da que no seja necessario, para formar o conceito distinto
correspondente ao significado de tal palavra, descer s naturezas particulares. Mas, que
diferente quanto ao ente, porque significa, imediatamente, as entidades, pelo menos as
simples, isto , no compostas de natureza comum e diferena que restringe. Mas na
verdade isto falso, como constar mais amplamente da seo seguinte [DM II, 2, 15]
e, por agora mais resumidamente manifesto a partir do modo geral de conceber. De
facto, quem diria que ente significa imediatamente Deus na medida em que Deus,mesmo se Deus simplicssimo e no composto de natureza comum e diferena que
restringe? Enfim, o mesmo pode ser perguntado sobre substncia, acidente e os outros
gneros ou conceitos simples. Tambm, por que se diz que ente significa mais
imediatamente as entidades simples do que as compostas de natureza e diferena que
restringe, como animal, hbito, etc.? Pois, o ente como tal compreende,
genericamente, tudo sob si e, assim como no conceito de substncia ou de qualidade
nada se inclui que no seja ente, assim tambm, tampouco, no conceito de animal ou dehbito. Que, porm, o conceito composto possa ser decomposto em vrios, dos quais
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nenhum inclua outro, mas o conceito simples, no, pouco tem a ver com a significao
mediata ou imediata. Com efeito, quem acreditaria que ente signifique imediatamente
racional e no homem, porque racional expressa um conceito simples e homem um
composto? Assim, atendo-se prpria e precisamente ao conceito formal de ente como
tal, no lhe cabe que, por meio dele, sejam concebidos distintamente os entes
particulares de acordo com as razes prprias e determinadas. Deste modo, o conceito
de ente como tal, se nele se ativer, sempre indistinto a respeito dos entes particulares
na medida em que so tais. Por isso, Santo Toms na I, q. 14, a. 6 diz que, se Deus
conhecesse os que so distintos de si, apenas na medida em que so entes, conheceria
apenas em geral, indistinta e imperfeitamente; donde conclui que no os conhece apenas
na medida em que tm em comum a razo de ente, mas tambm na medida em que um
se distingue do outro; julga, portanto, que o conceito de ente como tal, atendo-se
precisamente nele, sempre indistinto a respeito de qualquer razo determinada de ente,
na medida em que tal e se distingue dos demais, quer seja composto, quer simples.
7. O modo de falar de outros no se prova. Da que tambm suprfluo aquele
tpico sobre o conceito, em parte indistinto, em parte distinto, para explicar o presente
assunto. Primeiro, porque se diz impropriamente que o conceito de substncia
implcita ou indistintamente o conceito de acidente e, de maneira geral, diz-se de modo
muitssimo imprprio que o conceito do primeiro analogado o conceito indistinto dos
outros analogados, que so secundrios, embora muitos assim falem, ao dizer que,
assim como o mesmo nome, embora signifique imediatamente o primeiro analogado,
significa secundariamente os demais, tambm o conceito formal do primeiro analogado
representa indistintamente os demais, na medida em que estes so semelhantes ou
proporcionais quele primeiro; pois o que representa distintamente algo, parece
consequentemente representar, ao menos indistintamente, os outros semelhantes a ele.
Ora, embora isto seja de pouca importncia e talvez dependa do modo de falar, quanto amim, no est provado porque tal conceito prprio e distinto do primeiro analogado
apenas um e representa formalmente apenas o prprio analogado primeiro; no que no
se compara corretamente com o nome, porque o nome significa apenas por imposio e,
assim, o mesmo nome, que significa primria e propriamente um, pode ser imposto, por
transposio, para significar secundariamente outros. Mas, o conceito de uma coisa
representa a prpria coisa apenas naturalmente, e, assim, se um conceito prprio e
adequado do primeiro analogado de acordo com a razo prpria deste, no poderepresentar os demais; donde, nem os faz conhecer por si, mas no mximo, pode ser
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como que a origem ou a ocasio de que outros sejam concebidos e denominados de
acordo com alguma proporo ou referncia ao primeiro analogado, o que no
bastante para que o conceito especial e prprio do primeiro analogado seja chamado de
implcito ou indistinto dos demais. Alm disso, pergunto se este conceito do primeiro
analogado inteiramente idntico ao conceito prprio que corresponde ao nome prprio
da mesma coisa ou natureza, por exemplo, da substncia, ou se, por outra, diverso.
Este ltimo no se pode dizer, porque, se ambos so conceitos prprios da substncia,
no se pode entender em que est a diferena, de modo que se diga que um representa
os acidentes e o outro no. Mas, se se disser o primeiro, ento no se pode dizer mais
que este conceito representa os acidentes do que o conceito prprio de homem
representa os outros animais; at mesmo isto se pode dizer menos, visto que a
semelhana menor. Tambm, porque de outro modo dever-se-ia dizer que a substncia
tem um conceito formal de algum modo comum substncia e ao acidente, o que , na
verdade, muitssimo imprprio e, a rigor, falso, porque, embora o acidente expresse
referncia substncia, o conceito de substncia no representa de modo nenhum esta
referncia, mas apenas o seu termo, mas de acordo com a sua razo absoluta; portanto,
isto no bastante para que este conceito seja denominado conceito implcito ou
indistinto do acidente. O mesmo pode ser considerado facilmente nos demais
analogados ou nos conceitos destes; pois, o conceito formal de homem risonho como
tal, no de modo nenhum o conceito indistinto da campina, nem o conceito prprio do
animal sadio o conceito do remdioe assim por diante. A razo porque aquilo que
fundamenta esta analogia, ou alguma concordncia real ou semelhana entre os
analogados, como diremos abaixo sobre o ente, e esta no representada pelo conceito
prprio de algum analogado; ou no uma semelhana prpria, mas apenas certa
proporo ou atribuio e esta tambm no bastante para que o conceito prprio de um
analogado, tal como tal, represente de algum modo os demais, mas apenas aquelaforma, em ordem qual os demais so denominados tais, a qual representada por tal
conceito, de modo absoluto e na medida em que em si tal, e no com referncia aos
demais.
8. Acrescento ainda. Seja como for, sobre este modo de falar, que se diga que o
conceito determinado da substncia indistinto dos demais gneros de entes ou dos
acidentes, ele no pode dizer-se conceito formal do ente como tal, tanto porque ele o
conceito formal prprio da substncia, na medida em que substncia, mas o conceitoprprio de ente deve ser distinto do conceito de substncia e acidente, como tambm
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porque ente no significa imediatamente substncia como mostrarei abaixo; portanto,
tambm no exprime imediatamente o conceito formal prprio de substncia. Resta,
portanto, que o conceito formal de ente como tal, comparado a determinados entes, na
medida em que so tais, sempre um conceito confuso e indistinto ao representar este
ou aquele ente. Digo, porm, a respeito dos entes particulares, na medida em que so
tais, porque a respeito de seu objeto, que representa imediata e propriamente (seja ele
qual for) pode ser dito e deveras um conceito prprio e distinto, assim como o mesmo
conceito de animal, que a respeito do homem indistinto, a respeito do animal como tal
prprio e distinto, embora sob esta mesma comparao, o mesmo conceito simples se
costume dizer indistinto a respeito daquele conceito composto pelo qual o animal
concebido por sua definio. De modo semelhante, quer em diversos homens, quer em
um em tempos diversos, um conceito de ente pode ser mais distinto do que outro e, ao
contrrio, um pode dizer-se indistinto a respeito do outro mais distinto, na medida em
que se conhece mais ou menos a prpria razo ou quididade do ente como tal; esta
distino dos conceitos formais que em nada vem ao caso, porque mais da parte
daquele que concebe e de uma luz perfeita ou imperfeita ou do modo de conceber do
que da referncia ao objeto, que consideramos aqui principalmente.
Opinio verdadeira
9. Deixadas, portanto, de lado estas distines, cumpre dizer que o conceito
formal prprio e adequado de ente como tal uno, distinto, quanto coisa e razo,
quanto aos outros conceitos formais das outras coisas e objetos. Este o parecer
comum, como reconhece Fonseca, supra [DM II, 1, 4]. Sustentam-no Escoto e todos
seus discpulos, como veremos na seo seguinte [DM II, 2, 5]; Caprolo,Defesas da
teologia de Santo Toms de Aquino, I, dist. 2, q. 1, concls. 1 e 9 e nas respostas aos
argumentos contra estas; Cajetano, Comentrio ao Ente e a essncia, c. 1, q. 2, que citaSanto Toms, Questes disputadas sobre o poder de Deus, q. 7, a. 5 e 6; Soncinas,
Comentrio Metafsica, IV, q. 1; Javelli, q. 1; Domingos de Flndria, q. 2, a. 6;
Herveu de Ndlec, QuodlibetII, q. 7; Domingos de Soto, Comentrio s Categorias,
c. 4, q. 1; colige-se sem dificuldade de Santo Toms, no lugares a serem citados na
seo seguinte [DM II, 2, 8]. Prova-se, primeiro, pela experincia. Com efeito, ouvido o
nome ente, experimentamos que nossa mente no se dispersa nem divide em vrios
conceitos, mas antes recolhe-se em um, como quando concebe homem, animal esemelhantes. Em segundo lugar, porque, como Aristteles disse no livro I [1, 16a3-5]
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Sobre a interpretao, exprimimos nossos conceitos formais pelas palavras; ora, a
palavra ente una, no apenas materialmente, mas tem tambm uma nica
significao, por sua imposio primeira, por fora da qual no significa imediatamente
alguma natureza sob uma razo determinada e prpria, sob o qual se distinga das outras.
Da que no signifique tambm vrios na medida em que so vrios, porque no os
significa na medida em que se distinguem entre si, mas antes na medida em que se
renem ou so semelhantes; portanto, sinal de que a esta palavra corresponde tambm
um conceito formal na mente, pelo qual concebido imediata e adequadamente o que
significado por esta palavra. Ou antes, ao contrrio, inferimos por meio deste sinal que a
imposio de tal nome procedeu de um tal modo de conceber a coisa por meio de um
conceito. Em terceiro lugar, podemos argumentar a partir do conceito de existncia;
com efeito, parece evidente por si que se d um conceito formal de existncia como tal,
pois, todas as vezes que falamos e discutimos sobre a existncia deste modo, como de
um ato, no formamos, na verdade, vrios conceitos, mas um; portanto, tambm o
conceito formal de existncia como tal uno porque, assim como o abstrato concebido
a modo de um, assim tambm o concreto como tal destacadamente constitudo;
portanto, de igual modo ao ente como tal corresponde um conceito formal, pois o ente,
ou o mesmo que o existente, ou, se for tomado como existente em aptido, seu
conceito tem a mesma razo de unidade. Da, o conceito de ente costumar ser
denominado no apenas uno, mas tambm simplicssimo, de tal modo que a ele se faa
a resoluo ltima dos demais. Com efeito, pelos outros conceitos, concebemos tal ou
tal ente; no entanto, por este, prescindimos de toda composio e determinao, donde
este conceito costumar ser tambm denominado o primeiro por si, que formado pelos
homens porque, guardadas as demais condies, pode mais facilmente ser concebido
sobre qualquer coisa; Santo Toms transmite tudo isto nas Questes disputadas sobre a
verdade, q. 1, a. 1 e q. 21, a. 1, bem como Avicena,MetafsicaII [Avicena Latino,Livro
sobre a filosofia primeira ou cincia divina, I, 2, p. 12,30-13,38; I, 5, p. 31,2-32,4]. Pelo
que, no h quase ningum que duvide da unidade deste conceito comunssimo e
indistinto. Mostramos, porm, que nenhum outro pode verdadeira e propriamente ser
chamado conceito de ente como tal, que no seja indistinto a respeito dos entes
particulares, na medida em que so tais. Enfim, se o conceito formal de ente no for
uno, sero vrios; portanto, quantos sero? No h maior razo de que dois do que trs
ou qualquer outro nmero, porque, se estes conceitos se multiplicam, necessrio quese multipliquem de acordo com alguma diversidade das coisas ou entidades
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compreendidas sob a extenso do ente; ora, estas entidades podem multiplicar-se ao
infinito e distinguir-se de acordo com as razes prprias; ento, se se sustentasse uma
vez que um conceito ou o conceito de ente como tal representa determinadas naturezas
do ente, mesmo como distintas, no h nenhuma razo pela qual se deva deter-se em
duas mais do que em trs ou quatro etc., como constar mais evidentemente a partir do
que diremos na seo seguinte sobre o conceito objetivo; pois, embora o formal, na
medida em que ocorre a partir de ns e em ns, possa parecer mais conhecido por
experincia, o conhecimento exato de sua unidade depende muito da unidade do objeto,
do qual os atos costumam receber sua unidade e distino.
10. Daqui se compreende, primeiro, em que sentido e por que razo este
conceito formal denominado, de acordo com a prpria coisa, distinto dos outros
conceitos, isto , porque, da parte da coisa, realmente distinto do conceito de
substncia como tal, de acidente, de qualidade e dos demais semelhantes. Falamos, com
efeito, no intelecto humano, o qual, ainda quando divide pela mente os que no so
distintos na coisa, separa em si mesmo os conceitos, formando conceitos realmente
distintos da mesma coisa, de acordo com a diferente separao ou diviso da coisa
concebida, do modo como os conceitos formais de justia e de misericrdia divina so
em ns realmente separados ou distintos, embora a misericrdia e a justia em si no se
distingam. Assim, portanto, o conceito de ente como tal, uma vez que ao representar
prescinde da razo prpria da substncia como tal, do acidente e de todos os outros,
necessrio que em si seja realmente separado e distinto dos conceitos prprios de tais
razes ou naturezas, na medida em que so tais, e tambm isto todos concedem
facilmente.
11. Em segundo lugar do que foi dito infere-se que este conceito formal de ente,
assim como uno em si de acordo com a coisa, assim tambm de acordo com a sua
razo e de acordo com ele tambm dividido, de acordo com a razo, dos conceitosformais das razes particulares. manifesto, primeiro, porque em si este conceito
simplicssimo tanto objetiva como tambm formalmente; tem, portanto, em si uma
razo formal adequada simples; logo, de acordo com ele, separado dos outros
conceitos formais. Em segundo lugar, porque, assim como nossa mente, separando os
que no so distintos, distingue realmente em si mesma os conceitos formais deles,
assim tambm, ao inverso, confundindo e unindo os que se distinguem na coisa, na
medida em que so semelhantes em si, une o seu conceito, formando-o uno na coisa ena razo formal; ora, deste modo, so concebidos os entes por este conceito formal de
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ente. Com efeito, a mente toma todos estes apenas na medida em que so semelhantes
entre si na razo de ser e, como tal, forma uma imagem como representao formal
nica representando o que , imagem que o prprio conceito formal; portanto, este
conceito pura e simplesmente uno na coisa e na razo formal e de acordo com este,
separado daqueles conceitos que representam mais distintamente os entes particulares
ou as suas razes.
12. O conceito formal de ente como tal no se multiplica de acordo com a
multiplicao dos objetos particulares. Em terceiro lugar, segue-se que este conceito
formal de ente, no apenas uno, mas tambm que no pode ser vrios, de acordo com
a referncia a objetos mais determinados ou a conceitos mais distintos da parte dos
objetos. Podemos, de fato, multiplicar estes conceitos formais, quer de acordo com o
nmero em diversos sujeitos, quer no mesmo em tempos diversos, quer talvez tambm
de acordo com a espcie [inteligvel] da parte daquele que concebe de modo mais
elevado ou com maior clareza e por uma apreenso mais distinta da razo formal de
ente como tal (embora talvez toda esta distino se d apenas de acordo com o mais e o
menos dentro da mesma espcie [inteligvel], sobretudo permanecendo nos conceitos
que podem ser formados naturalmente pelos homens); na verdade, porm, pela maior ou
menor determinao do objeto, o conceito de ente como tal no pode ser multiplicado
porque, como foi mostrado, pelo fato mesmo de no se deter no conceito comum de
ente como tal e descer-se a este e aquele ente, na medida em que so tais, embora
multipliquem-se os conceitos formais, nem por isso o conceito de ente como tal, mas
acrescentando o conceito de substncia, ou de acidente, etc.
13. Este conceito no apenas do nome, mas tambm da coisa. Em quarto
lugar do que se disse infere-se que falso dizer que este conceito apenas do nome e
no da coisa significada pelo nome de ente e de acordo com a razo pela qual este
significado. Primeiro, porque, como disse [DM II, 1, 9], este conceito anterior palavra e sua imposio s coisas a serem significadas de tal modo. Pois, embora,
quoad nos, os conceitos sejam formados muitas vezes por intermdio das palavras,
secundum se e pura e simplesmente, o conceito primeiro, que gera por si a palavra,
pela qual expresso e a origem da imposio desta; portanto, tal conceito pura e
simplesmente e de modo absoluto conceito da coisa de acordo consigo e no apenas em
ordem significao da palavra, de modo que por esta razo seja denominado conceito
do nome ou o quiddo nome. Em segundo lugar, porque este conceito a modo de certaimagem simples, representando naturalmente o que significado por conveno pela
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palavra. Mas, consiste apenas nisto, que seja conceito da coisa, ainda que, por ser este
conceito simplicssimo e, assim, seu objeto no possa ser explicado por uma definio
prpria, para explic-lo costumemos servir-nos de descries, que s parecem explicar
mais distintamente a significao do nome. Deste modo pode ser dito em bom sentido
que este conceito o quiddo nome, contanto que no se exclua que ele seja o conceito
prprio e adequado da coisa imediatamente significada por esta palavra.
14. De quais anlogos se d uma razo comum. O fundamento do primeiro
parecer (pois do segundo j se disse o bastante) toca a matria sobre a analogia do ente,
a ser tratada abaixo e depende tambm do que precisa ser dito sobre o conceito objetivo,
pois muitos julgam que a unidade do conceito formal no incompatvel com a
analogia, mas sim a unidade do conceito objetivo, sobre o que se falar posteriormente
[DM II, 2, 1-3, 18-36]. Por ora, diga-se brevemente, a partir de Santo Toms no [Escrito
sobre as Sentenas de Pedro Lombardo], liv. I, dist. 19, q. 5, a. 2, ad 1 que, entre os
anlogos de atribuio, h alguns que significam a forma, que est intrinsecamente
apenas no analogado principal, mas, nos demais, apenas por referncia ou denominao
extrnseca, como o sadio e semelhantes; com estes incompatvel a unidade do conceito
formal, pois os analogados no tm entre si uma semelhana e convergncia prpria.
H, no entanto, outros que significam a forma ou natureza, intrinsecamente encontrada
em todos os analogados; deste modo o ente, como veremos abaixo, pois os acidentes
no so entes por denominao extrnseca2, mas por natureza ou razo de ente, que
participam. Neste modo de anlogos no h inconveniente em dar-se um conceito
formal pura e simplesmente e de modo absoluto, em si uno quanto coisa e quanto
razo formal adequada; mas em que consiste a sua analogia, ser explicado abaixo [DM
28, 3 e 14 ss].
Seo IISe h um conceito ou razao formal objetiva de ente
1. Primeira razo para duvidar. A razo para duvidar dupla. A primeira foi
abordada na seo precedente [DM II, 1, 2] e fundamenta-se na analogia do ente, pois,
se o seu conceito objetivo uno, com unidade de univocidade, e assim suprime-se a
analogia, ou por unidade apenas anloga, e, assim, ou no na verdade uno, ou h
incompatibilidade nos termos, porque a analogia inclui intrinsecamente, ou vrias
2No texto intrnseca.
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razes tendo apenas uma proporo entre si, ou vrias referncias a uma forma, por
razo das quais o conceito objetivo do nome anlogo no pode ser uno. O que se explica
e confirma porque, para que haja um conceito objetivo de ente necessrio que todos os
entes convirjam numa razo formal de ente, que seja significado imediatamente pelo
nome ente, porque a unidade do conceito objetivo requer a unidade da coisa ou pelo
menos, da razo formal; ora, se todos os entes convergem numa razo formal, logo tm
como tal uma e a mesma definio como um conceito objetivo, porque, se o conceito
objetivo uno, tambm sua definio pode ser una; portanto, nada falta ao ente para a
perfeita univocidade.
2. Segunda. A segunda razo para duvidar porque, se o conceito objetivo de
ente uno, logo, de acordo consigo, separa-se e divide-se de todos os inferiores, ou das
razes de entes; o conseqente impossvel; portanto, o antecedente tambm. A
consequncia manifesta, porque, se o conceito de ente uno, logo no inclui em si
formal e atualmente os modos determinados dos entes, pois estes opem-se
intrinsecamente e produzem uma distino; donde ser impossvel que estejam includos
em ato, em um conceito objetivo. Portanto, para que o conceito de ente seja uno,
necessrio que prescinda de todos estes; ora, mostro que isto impossvel assim: porque
se o ente como tal prescinde das razes determinadas, logo, para que neles seja
restringido ou determinado, necessrio acrescentar-lhe algo. Portanto, ou aquilo que
acrescentado ente, ou nada; se nada, como pode determinar realmente o ente e
constituir alguma razo prpria do ente? Se, porm, ente, logo, o ente como tal no
pode prescindir dele, pois o que prescinde de algo, no est includo nele. Nem se pode,
com efeito, entender que o ente prescinda dos modos pelos quais restringido e que, no
entanto, esteja includo intrinsecamente neles; nem, pelo contrrio, que o modo, que
restringe o ente, nada inclua seno ente e, no entanto, que o determine a uma razo
especial de ente. Pois, no se entende a restrio e a determinao sem acrscimo; ora, oacrscimo no pode ser entendido a no ser que aquilo que se acrescenta seja tal que no
inclua aquilo a que acrescentado, quer de acordo com a coisa, quer de acordo com a
razo, de acordo com o modo pelo qual se entende que acrescentado. Confirma-se,
pois, por esta causa Aristteles disse na Metafsica III [IV, 3, 1005a18-1005b2; texto
10; Junctas, fol. 72rA-C] que o gnero est fora da razo das diferenas, a saber, porque
abstrai e prescinde delas; portanto, se o conceito objetivo de ente separado e uno,
necessrio que no esteja includo nos que o restringem.
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3.Razo de uma dificuldade em contrrio. Porm, em contrrio est que a um
conceito formal, corresponde necessariamente um conceito objetivo; ora, foi mostrado
que d um conceito formal de ente; logo, necessariamente, dever dar-se um conceito
objetivo. A maior assente, porque o conceito formal recebe toda a sua razo seu e
unidade do objeto; logo, para que seja uno necessrio que tenda para um objeto de
algum modo uno. Ora, o conceito objetivo nada mais do que o prprio objeto, como
conhecido ou apreendido por tal conceito formal; logo, se o conceito formal uno,
necessrio que o objetivo tambm seja uno.
Vrios opinies so apresentados
4. Primeira opinio. Nesta questo, os que negam que se d um conceito
formal de ente, negam tambm consequentemente que se d um conceito objetivo [B.
Pereira, XV livros sobre os princpios e afeces comuns de todas as coisas naturais,
livro II, cap. 2, no fim]. Tambm assim julga Cajetano nos lugares citados na seo
precedente na primeira opinio; tambm o Ferrariense, no lugar citado [DM II, 1, 2 e
3]. Mas, dentre os que admitem um conceito formal de ente, negam um conceito
objetivo Soncinasno comentrio ao livro II da Metafsica, q. 2 e 3; o Hispalienseno
comentrio s Sentenas, livro I, dist. 3, q. 1; Herveue Flndrianos lugares citados na
seo precedente [DM II, 1, 9]. Atribui-se tambm a Caprolo, mas, na verdade, ele
no o ensina, como direi abaixo. Santo Toms citado tambm a favor deste parecer,
Suma de teologia, I, q. 13, a. 5, Questo disputada sobre o poder de Deus, q. 7, a. 7;
Questo disputada sobre a verdade, q. 2, a. 11, lugares nos quais indica que, s
palavras, que so comuns a Deus e s criaturas, no corresponde uma razo concebida
ou significada, mas vrias. Os fundamentos desta opinio foram abordados no princpio,
pois, embora vrios argumentos sejam aduzidos por estes autores, a fora de todos est
posta nas duas dificuldades abordadas [DM II, 2, 1-3]. Contudo, os autores precedentesno concordam ao explicar o conceito, ou antes, os conceitos objetivos que
correspondem ao ente. De fato, alguns, como o Ferrariense, dizem que so
imediatamente representados pelo conceito formal de ente, todos os gneros de entes, na
medida em que tm entre si alguma proporo ou referncia; Cajetanotambm julga o
mesmo. Outros, porm, como Soncinas, Herveu e outros, dizem que, pelo conceito
formal de ente, representada imediatamente a disjuno substncia ou acidentes.
Ainda outros, como Fonseca, no comentrio ao IV livro daMetafsica, c. 2, q. 2, seo4 e 7, que so representados de maneira absoluta todos os gneros ou razes ou
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conceitos simples, no copulativamente, nem disjuntivamente, mas pura e
simplesmente3.
5. Segunda opinio. A segunda opinio, completamente contrria, que se d
um conceito objetivo de ente pura e simplesmente uno. Sustenta-o Escoto no
comentrio s Sentenas, livro I, dist. 3, parte 1, q. 1-2 [Ed. Vaticana, n. 26-55]; q. 3 [n.
152-66]; I, dist. 8, parte 1, q. 3 [n. 88-89, 95ss]; II, dist. 3, q. 3 [n. 61-65] e 6 [n. 168-
88]; Javelli, no comentrio Metafsica, liv. IV, q. 1; Soto, no comentrio s
Categorias, cap. 4, q. 1; Caprolo da mesma opinio, nasDefesassobre o livro I, dist.
2, q. 1. H, no entanto, diversidade entre estes autores. Pois, Escoto estabelece este
conceito como separado, por natureza da coisa, das naturezas inferiores e dos modos
que restringem o ente. Os outros, porm, estabelecem esta unidade do conceito objetivo
a partir do nosso modo de conceber, sem que haja separao ou distino nas coisas.
Sobre esta diversidade de opinies falaremos na seo seguinte. Mas, a respeito de uma
outra diferena que h tambm entre estes autores, quanto univocidade ou analogia,
falamos mais abaixo [DM II, 3, 6-7; cf. DM XXVIII].
6. A terceira opinio, intermediria entre as apresentadas antes, serve-se de uma
distino e explica-se de vrias maneiras. De fato, alguns dizem que o conceito objetivo
de ente, em si e tomado de modo absoluto sem os inferiores, uno e separa-se destes,
quanto razo; mas, comparado com os inferiores e como neles includo, no uno.
Conciliam, assim, as razes para duvidar aduzidas no princpio; pois, j que, pelo
conceito formal de ente concebido o ente, em si e sem nenhuma comparao com os
inferiores, necessrio que, pelo menos sob esta considerao, este conceito objetivo
tenha unidade. No entanto, quando este conceito considerado como estando presente
nos prprios inferiores, no pode ter unidade. Com efeito, os prprios inferiores, por
exemplo, a substncia e o acidente, diferem pelo mesmo facto que so entes. Portanto,
no podem ter unidade nisto, como tal, porque no podem, de acordo com o mesmo,concordar e diferir; as razes para duvidar sustentadas no princpio confirmam tambm
esta segunda parte. De outro modo, Fonseca, supra, suposta aquela distino acerca do
conceito indistinto, distinto e intermedirio ou em parte indistinto e em parte distinto,
diz, sobre este terceiro conceito, que pode sim ser uno, no, porm, discernido dos
inferiores, mas que , por exemplo, o conceito de substncia. Diz, de igual modo sobre
3
Corrigiu-se velsimpliciter por sedsimpliciter de acordo com Berton (Ed. Vivs, vol. 27, p.368). Cf. Trad. Italiana, nota 232.
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o conceito distinto, que no uno, adequado ao ente, a no ser talvez em Deus, mas que
em ns inclui o conceito de substncia, qualidade etc. Ora, como disse, estes, na
verdade, no so o conceito de ente como tal. Finalmente, sobre o conceito indistinto de
ente, que diz respeito ao assunto, diz que, de certo modo, uno e separado, no porm,
pura e simplesmente, mas sob certo aspeto; com efeito, , de algum modo, separado,
porque no contm, expressa e determinadamente, o que prprio dos membros
inferiores, mas no , pura e simplesmente separado, mesmo de acordo com a razo; do
contrrio seguir-se-ia que ele unvoco. Explica, porm, que esta separao sob certo
aspecto e no pura e simplesmente porque este conceito indistinto de ente, exclui o que
prprio da substncia e das outras entidades simples, de tal modo, porm, que sua
essncia no seja outra que no a essncia destas entidades.
7. Contudo, estas distines, como assinalei na seo precedente [DM II, 1, 5],
no me parecem ajudar para explicar o assunto, mas, quanto mais se multiplicam, tanto
mais o assunto parece obscurecer-se e confundir-se. Omitidos, portanto, os conceitos
distintos ou particulares de substncia e dos demais gneros ou membros que dividem o
ente em comum, tratamos aqui apenas do conceito objetivo que corresponde imediata e
adequadamente quele conceito formal que dissemos, na seo precedente [DM II, 1, 9],
corresponder na mente a esta palavra entee coisa imediatamente significada por ela;
com efeito, os outros conceitos particulares, tomados de acordo consigo mesmos, no
so o conceito de ente, na medida em que ente, mas como sendo tais ou tais entes.
Primeira assero.
8.D-se uma razo objetiva de ente. Digo, portanto, primeiro, que ao conceito
formal de ente corresponde um conceito objetivo adequado e imediato, que no diz
expressamente a substncia nem o acidente, nem Deus, nem a criatura, mas tudo isso, a
modo de um s, na medida em que so entre si de algum modo semelhantes econcordam no ser. Concordam nesta concluso os autores da segunda opinio, Fonseca
no discorda e Santo Toms a favorece muito nos lugares supracitados das Questes
disputadas sobre a verdade, q. 1, a. 1 e q. 21, a. 1, na medida que diz que o conceito de
ente o mais simples e primeiro de todos e que se determina em substncia, quantidade
etc. por certa determinao e expresso de tal modo de ente, onde necessrio que a
exposio se refira ao conceito objetivo, pois o formal no se determina nem se
restringe. Donde, Santo Toms dizer mais explicitamente na Suma de teologia, I, q. 5,a. 3, ad 1: substncia, quantidade e qualidade restringem o ente, aplicando o ente a
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alguma quididade ou natureza; ora, no se pode entender a restrio sem alguma
unidade e comunidade do conceito objetivo. Do mesmo modo, Aristtelesfavorece esta
opinio no livro IV daMetafsica, texto 7 [3, 1005a18-1005b12; Junctas, fol. 72rA-C],
onde diz que a metafsica considera o ente na medida em que ente, sob o qual os
demais gneros esto contidos. Onde Santo Toms diz que a filosofia primeira
considera o ente comum e o que lhe cabe, na medida em que tal. Esta opinio pode ser
provada pela razo da seguinte maneira. necessrio que o conceito formal de ente
tenha algum objeto adequado; ora, este no o agregado das vrias naturezas dos entes
de acordo com algumas razes determinadas destas, por mais que sejam simples; logo,
preciso que este conceito seja uno de acordo com alguma concordncia e semelhana
dos entes entre si. A consequncia evidente por enumerao suficiente, porque
supomos (o que evidente por si mesmo) que este conceito objetivo no uno com
unidade real, isto , numeral ou entitativa, pois consta que este conceito comum a
muitas coisas. Tambm a maior assumida evidente, pois, aquele conceito formal um
ato do intelecto; ora, todo ato do intelecto, como tambm todo ato, na medida em que
uno, deve ter algum objeto adequado, do qual receba a unidade. Ora, a menor prova-se,
porque, se aquele objeto adequado se desse pela agregao de vrias naturezas do ente,
pergunto quais so essas naturezas e como se agregam neste conceito, pois isto no
pode ser concebido e entendido de modo nenhum. O que ficar tambm manifesto,
excluindo todos os modos como isto foi asseverado ou pode ser escogitado.
9. O ente no significa imediatamente a substncia e o acidente. Com efeito,
primeiro, o que Soncinas diz, que este conceito consta da substncia e do acidente
como tais, obviamente falso, pois, ou neste conceito esto includos aqueles dois
copulativamente, e isto ele no diz nem pode dizer; do contrrio, dir-se-ia falsamente
que a substncia ente ou que a qualidade ente, pois, nem a substncia substncia e
acidente, nem qualidade e assim a respeito dos demais. Ou, ento, aqueles dois estoincludos disjuntivamente, como o prprio Soncinas diz; isto, alm de que contra a
experincia, como direi imediatamente, segue-se disto a univocidade do ente, que ele
mesmo pretende evitar; pois, esta disjuno substncia ou acidente cabe pura e
simplesmente e igualmente por primeiro, to verdadeiramente, ao acidente como
substncia; pois, como para a verdade de uma disjuntiva basta a verdade de uma parte,
assim, para que o predicado disjunto predique-se igualmente por primeiro e pura e
simplesmente, basta que uma parte dele convenha ao sujeito, igualmente por primeiro epura e simplesmente. Ora, o acidente acidente to verdadeira e to propriamente como
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a substncia substncia. Logo, aquele disjunto convm ao acidente to verdadeira e
propriamente, em razo de uma parte, como substncia, em razo da outra. O que se
pode ver em todos os predicados semelhantes, pois ser Deus ou criatura, por exemplo,
diz-se to verdadeira e propriamente do homem como de Deus e assim a respeito dos
demais. Ou, enfim, aqueles dois esto includos pura e simplesmente, isto , sem
conjuno ou disjuno, isto , substncia acidente. Isto, primeirissimamente, contra a
experincia, pois o que concebido, percebido pela mente e, deste modo cai sob a
experincia. Ora, ns, ao ouvirmos o nome entee ao concebermos separadamente o que
entendemos ser significado por esta palavra, no percebemos pela mente a substncia
como tal nem o acidente como tal, como qualquer um pode experimentar em si mesmo.
10. Alm disso, aquele conceito formal simples, limitado e separado, quanto
prpria coisa, dos conceitos formais prprios de substncia e de acidente, como sendo
tais. Portanto, por ele no so representados, prpria e distintamente, a substncia e o
acidente, como so representados pelos dois conceitos de substncia e de acidente. Nem
se pode dizer que aquele conceito uno de ente contm de modo mais eminente toda
aquela representao formal que est nestes dois conceitos tomados simultaneamente,
pois este modo de universalidade no conceito formal estranho ao intelecto humano, do
qual tratamos, e quase no se encontra no anglico. Portanto, aquele conceito no
universal por representao eminente de vrios, na medida em que so vrios, mas pela
confuso de vrios, na medida em que so, de algum modo uno. Ento, se por aquele
conceito, a substncia e o acidente no so representados to prpria e distintamente
quanto pelos dois conceitos prprios de substncia e acidente, no se entende que seja o
meio como possam ser representados, de acordo com o que lhes prprio, mas apenas
na medida em que so, de algum modo semelhantes entre si. Portanto, aquele conceito
no consta da substncia e do acidente mesmo representados do dito modo, absoluta,
pura e simplesmente.11. Acresce ainda que, de acordo com este tipo de conceito, mal se entende o
que predicado, de modo determinado, de algo, quando se diz que ente; pois, aquilo
que predicado o conceito objetivo. Se, portanto, aquele conceito este todo
substncia acidente, esta predicao isto ente equivale a esta isto substncia
acidente. Ora, tal predicao no pode ser feita de modo determinado, verdadeira ou
falsamente, a no ser que se entenda que ambas as partes do predicado so predicadas
copulativa ou disjuntivamente, j que estas partes no se renem a modo de substantivoe adjetivo de maneira que sejam predicadas a modo de um s. Tambm, ainda que isto
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acontecesse, o sentido retornaria copulativo e a proposio viria a ser falsa. Acresce,
tambm, contra toda esta opinio que, se naquele conceito se encontram tanto um como
outro destes, substncia e acidente, de qualquer dos modos j citados, pergunto ainda
qual conceito de substncia a est includo, pois substncia, ou a tomada por
substncia criada, ou por incriada, ou por algum conceito objetivo comum a ambas. O
primeiro e o segundo no podem ser ditos, porque o ente, do qual falamos agora,
comum ao ente criado e incriado, como o dissemos acima que o objeto desta cincia.
Se, no entanto, for dito o terceiro, surge da um argumento ad hominem contra os
supracitados autores; tanto porque substncia algo anlogo substncia incriada e
criada e, portanto, se, no obstante a analogia, se d um conceito objetivo comum de
substncia criada e incriada, poder dar-se tambm um conceito de ente; quanto tambm
porque a substncia criada dista mais da incriada do que o acidente da substncia criada.
preciso, portanto, para falar de modo consequente, acrescentar algo quele conceito,
dizendo que consta de determinada razo da substncia criada e do acidente, o que, no
entanto, no crvel por si e pode ser impugnado mais eficazmente pelos argumentos
aduzidos. Resta ainda um argumento semelhante da parte do outro membro, isto , do
acidente. Pois, este tambm, de acordo com os autores j citados, anlogo e, pelo
menos a respeito de alguns dos acidentes, talvez verdadeiro, como direi abaixo.
Perguntarei, portanto, de modo semelhante, se o acidente entra no conceito de ente, de
acordo com algum conceito comum, ou (por assim dizer) de acordo com uma parte do
conceito objetivo comum a todos os acidentes. Contra ambos podem ser aplicados os
argumentos aduzidos e finalmente pode concluir-se que tambm este membro deve ser
dividido em vrios outros.
12. O conceito de ente no inclui todos os gneros primeiros . Portanto, talvez
por esta causa, outros disseram que o objeto adequado daquele conceito formal de ente
so todos os gneros primeiros ou todas as entidades simples, que dividemproximamente o ente ou os inclui. Mas, contra este parecer procedem, do mesmo modo,
os argumentos precedentes. Primeiro, porque tais naturezas no podem ser includas em
tal conceito, nem copulativa, nem disjuntiva, nem pura e simplesmente sem nenhuma
cpula, como manifesto aplicando do mesmo modo o procedimento que foi feito, pois
tem a mesma fora, como ser facilmente manifesto a quem quer que o considere.
Segundo, pela experincia, porque por fora da concepo do ente no percebemos
todas estas naturezas determinadas do ente, como sendo tais e na medida em que sedistinguem entre si. Seria muito mais difcil perceber tantas naturezas do que apenas a
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substncia e o acidente; muito menos crvel dar-se em ns um conceito formal, que
represente distintamente todas estas naturezas do que somente a substncia e o acidente.
Ento, se o conceito formal de ente no representa to distintamente essas naturezas tais
como so e na medida em que se distinguem entre si, conclui-se que s as representa na
medida em que concordam entre si e so, de algum modo, semelhantes, que o
pretendido. A consequncia manifesta, pois, como expliquei, um pouco antes, no
pode achar-se um intermedirio entre estes dois no presente assunto. Terceiro, porque
quase pela mesma razo pela qual se diz que este conceito objetivo de ente inclui todos
os gneros primeiros ou todas as entidades simples, dir-se-ia que inclui todas as
entidades, embora compostas, homem, leo etc., de acordo com as suas razes prprias,
o que ningum at agora disse. A consequncia manifesta porque, se ente inclui em
seu conceito todos os gneros ou naturezas simples, ou porque a razo de ente como
tal no prescinde deles, de acordo com a coisa; ou porque a razo de ente, de acordo
com a razo, entendida como sendo determinada ou restringida imediatamente quelas
naturezas. Mas, na verdade, a primeira e a segunda destas razes procedem do mesmo
modo em qualquer entidade, mesmo nas espcies nfimas, pois, de acordo com a coisa,
a razo de ente no prescinde mais da razo de homem ou de cavalo, etc., do que da
razo de substncia e de acidente, nem tambm homem acrescenta a ente algo que no
seja ente, mais do que substncia, ou quantidade etc. A terceira razo, porm, no
aduzida de maneira consequente, porque, se ente como tal no exprime uma razo
objetiva ou conceito, nada h no ente como tal, quanto coisa concebida, que possa ser
propriamente dividido, determinado ou restringido, nem imediata nem mediatamente.
Portanto, esta razo em nada obsta a que todas as entidades, sejam elas quais forem,
estejam includas no conceito de ente, se a incluso de algumas for dita determinada,
nem ser possvel indicar uma razo suficiente para algumas, mais do que para as
outras.13. O conceito de ente no inclui explicitamente a substncia e implicitamente o
demais. Por isso, finalmente, pode ser dito de outro modo que no objeto adequado do
conceito formal de ente no esto includas vrias naturezas de ente determinadas e
distintas de acordo com o que lhes prprio nem todas sob algo uno comum, mas
apenas uma determinada e expressamente e as outras implcita e indistintamente; por
exemplo, a natureza da substncia como tal, determinada e expressamente e as naturezas
dos acidentes implicitamente. Ora, tambm este modo pode ser impugnado no menoseficazmente do que os precedentes. Primeiro, porque mostrei acima que, pelo conceito
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formal, que representa explcita e determinadamente a substncia como substncia, de
maneira nenhuma os acidentes so representados nem implcita nem indistintamente, se
falarmos propriamente, como expliquei longamente na seo precedente [DM II, 1, 6-
8]. Em segundo lugar, aqui tambm pode ser apresentado o argumento de Soto [DM II,
2, 8], tomado da experincia, pois experimentamos que concebemos acerca de alguma
coisa que ente e duvidamos se substncia ou acidente; como, por exemplo, sabemos
evidentemente acerca da quantidade, que uma realidade, mas se substncia ou
acidente, ou duvidamos ou o tratamos como opinio. Portanto, neste conceito de ente
no est includa a substncia como substncia, isto , expressamente e de acordo com a
sua razo prpria. Terceiro, porque, de outro modo, seria o mesmo o conceito objetivo
de ente e o conceito objetivo de substncia porque o conceito objetivo de substncia
nada mais do que a razo da substncia concebida pelo intelecto determinadamente e
de acordo com o modo prprio; ora, diz-se que a razo de substncia concebida do
mesmo modo pelo conceito de ente. Alm disso, se na razo da substncia, assim
concebida, esto includos indistinta ou implicitamente os conceitos dos acidentes, quer
seja significado pelo nome de ente ou pelo nome de substncia, esto includos do
mesmo modo, porque a razo concebida o mesmo e o modo de conceb-la o mesmo,
isto , expressa e determinadamente. Portanto, o conceito objetivo de substncia e de
ente ser o mesmo; ora, o consequente obviamente falso e contrrio ao modo comum
de conceber, pois esta predicao substncia substncia tautolgica, mas esta de
modo nenhum: substncia ente. Portanto, no diferem apenas nos nomes, mas
tambm pelas razes objetivas que so predicadas. Ademais, de outra maneira, seria o
mesmo dividir toda a substncia e todo o ente. Ademais, seria to falsa esta proposio
o acidente ente como esta o acidente substncia. Tudo o que obviamente falso.
14. Prova a priori da concluso. Por ltimo, a partir da prpria coisa e como
que a priori, prova-se a nossa opinio contra todas as j citados, porque todos os entesreais tm verdadeiramente alguma semelhana e concordncia na razo de ser; logo,
podem ser concebidos e representados sob esta precisa razo pelo qual concordam entre
si; logo, podem constituir um conceito objetivo sob esta razo; logo, este o conceito
objetivo de ente. O antecedente parece evidente por si, a partir dos termos, pois, assim
como ente e no-ente so diversos e opostos, por primeiro, pelo que se diz que o
primeiro princpio de tudo no importa o que ou no , tambm no importa qual
ente tem alguma concordncia e semelhana com no importa qual ente. Com efeito, ointelecto encontra maior concordncia entre a substncia e o acidente do que entre a
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substncia e o no-ente ou nada. A criatura tambm participa de algum modo do ser de
Deus e por isso se diz que pelo menos um vestgio dele por causa de alguma
concordncia e semelhana no ser. Por essa razo, a partir do ser da criatura
investigamos o ser de Deus e, semelhantemente, a partir do ser do acidente, o ser da
substncia. Enfim, por esta razo, lhes atribumos algumas propriedades ou atributos
comuns, como ter alguma bondade ou perfeio, poder agir ou comunicar-se e
semelhantes. H, portanto, na prpria coisa alguma concordncia e semelhana entre
todos os entes reais. A primeira consequncia tambm bastante clara por si, tanto
porque todos os entes, sob esta razo e concordncia, so cognoscveis, quanto tambm
porque, por esta razo, as outras coisas que tm entre si alguma concordncia, so
concebidas sob ele, unida e conjuntamente, no entanto, mais ou menos, por razo da
maior ou menor concordncia; quanto, enfim, porque, h na coisa fundamento suficiente
para este modo de concepo e no intelecto no falta virtude e eficcia para este modo
de concepo, pois sumamente abstrativo e capaz de separar todas as razes. Da
tambm ser fcil a segunda consequncia porque, como dissemos [DM II, 2, 8], a
unidade do conceito objetivo no consiste na unidade real e numrica, mas na unidade
formal ou fundamental, que nada mais do que a supramencionada concordncia e
semelhana. A ltima consequncia, porm, evidente, pressupostas as outras, porque,
se tal conceito objetivo possvel, ele transcendente, simplicssimo e, deste modo, o
primeiro de todos, que so atributos do conceito de ente. Alm disso, esta concordncia
funda-se no ato de ser, que como que formal no conceito de ente; donde, se retira
tambm o argumento de que, assim como o conceito objetivo do prprio ser ou da
existncia uno, assim tambm o conceito de ente. Afinal, tudo se fundamenta naquilo
que aduzimos acima de Santo Toms [DM II, 1, 14]: que a analogia do ente no est em
alguma forma, que esteja intrinsecamente apenas em um analogado e extrinsecamente
nos outros, mas no ser ou entidade que intrinsecamente participada por todos.Portanto, tudo tem uma concordncia real nesta razo e, por consequncia, uma unidade
objetiva na razo de ente.
Segunda assero
15. O conceito objetivo de ente separa-se de toda a razo particular. Digo, em
segundo lugar: este conceito objetivo , de acordo com a razo, separado de todos os
particulares ou membros que dividem o ente, mesmo que sejam entidades simples aomximo. Esta concluso me parece seguir-se necessariamente da precedente, pois dado
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que todos os entes que de algum modo dividem o ente so distintos entre si e so vrios
objetivamente, no podem ser entendidos como reunindo-se em um conceito objetivo, a
no ser que, ao menos de acordo com a razo (secundum rationem) se faa uma
separao e abstrao das razes prprias nas quais se distinguem. Ora, como toda a
dificuldade consiste nesta divisoe separao, deve ser explicada primeiro e depois a
concluso deve ser provada por si e pelo que lhe prprio.
16. preciso, portanto, advertir que a diviso ou separao do intelecto no
requer distino das coisas ou separao de alguma razo ou modo que, por natureza da
coisa, anteceda, na prpria coisa, a separao do intelecto, mas que, na realidade mais
simples se possa dar tal separao de vrios modos, isto , a modo da forma em relao
ao substrato ou a modo do sujeito em relao forma, ou a modo da forma em relao
forma, como em Deus separamos Deus como tal, do seu ato de vontade, o ato de
vontade de Deus e o ato de vontade do ato do intelecto. De igual modo, separamos a
subsistncia de Deus da natureza de Deus, como seu modo; no que o intelecto afirme
que um modo, mas que a conceba, de sua parte, maneira de modo. Assim, portanto,
o intelecto divide e separa algo de algo, como o comum do particular, no por causa de
uma diviso ou separaao que antecede na coisa, mas por causa de seu modo de
conceber imperfeito, indistinto ou inadequado, razo pela qual no compreende, no
objeto que considera, tudo o que est nele, na medida em que existe, da parte da coisa,
mas apenas de acordo com alguma concordncia ou semelhana, que vrias coisas tm
entre si, as quais so consideradas a modo de uma, sob esta razo. Pelo que ocorre que,
para um conceito objetivo, separado de acordo com a razo das outras coisas ou
conceitos, no seja necessrio uma separao das coisas de acordo consigo, mas baste
uma certa denominao proveniente do conceito formal, que representa este
objetivo, porque, de facto, por ele no representado aquele objeto de acordo com
tudo aquilo que h na coisa, mas apenas de acordo com tal razo de concordncia,como manifesto no conceito objetivo de homem como tal, que de acordo com a sua
razo, se diz separado de Pedro, Paulo e demais singulares, dos quais no difere na
coisa. Ora, esta separao, de acordo com a razo (secundum rationem) uma
denominao proveniente do conceito formal, porque, sem dvida, homem, como se
apresenta a tal conceito, no representado de acordo com todo o modo pelo qual existe
na coisa, mas de acordo com a concordncia que vrios homens tm, os quais so
concebidos a modo de um, sob esta razo.
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17.Razo da concluso. Portanto, assim explicada esta separao da razo no
conceito objetivo, no difcil mostrar que [ela] se encontra no conceito objetivo de
ente. Porque, pelo conceito formal de ente, nem Deus, nem a substncia criada, nem o
acidente representado de acordo com o modo pelo qual esto na coisa, nem conforme
diferem entre si, mas apenas conforme, de algum modo, concordam entre si e so
semelhantes. Portanto, o que imediata e adequadamente se apresenta a este conceito
formal , de acordo com a razo (secundum rationem), separado do conceito objetivo
prprio de substncia ou de acidente. O antecedente foi provado pela concluso
precedente, acrescentando-se tambm o que foi dito numa seo superior [DM II, 11, 9
e II, 2, 15]. Mas a consequncia manifesta porque a separao segundo a razo em
nada mais consiste, como foi explicado. Confirma-se, primeiro, pois o conceito objetivo
de ente, de acordo com a razo, no o conceito objetivo de substncia, ou de acidente,
ou de algum outro gnero determinado; nem tambm um agregado de todos eles.
Portanto, algo uno de acordo com a razo abstrada deles. A maior e a menor foram
provadas acima; a consequncia manifesta porque esta separao de acordo com a
razo consiste apenas na distino de razo em ordem aos conceitos formais.
Confirma-se, em segundo lugar, pois, por causa desta separao esta [proposio] no
idntica a substncia ente , nem esta o acidente ente e, no entanto, ambas
so verdadeiras, porque nelas se entende que predicado algo comum a ambos e
distinto um do outro de acordo com a razo. Tambm por este motivo, como
argumentvamos acima [DM II, 2, 9], pode ocorrer que aps a concepo de algo sob a
razo de ente, se duvide se substncia ou acidente o que, sem [que se d] ao menos
uma distino de razo, nem se pode entender. Confirma-se em terceiro lugar porque
no por outra razo se d um conceito objetivo de substncia separado de acordo com a
razo de todas as substncias e de acidente, separado dos acidentes, a no ser por
causa da concordncia que tm e de acordo com a qual podem ser concebidosseparadamente. Portanto, o mesmo se deve dizer acerca do conceito de ente.
18. Repele-se uma evasiva. Talvez algum responder que no h uma
concordncia real entre todos os entes na razo de ente, assim como h entre todas as
substncias na razo de substncia ou entre os acidentes na razo de acidente. Ora, ou o
sentido que entre os entes como tais no h nenhuma concordncia real, ou que no
tanta quanto [h] entre os outros. O primeiro obviamente falso, nem pode ser
entendido a no ser pelos que julgam que, por exemplo, o acidente no se diz ente senopor denominao extrnseca, assim como o remdio se diz sadio, como, s vezes, parece
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insinuar Cajetano, no opsculo Sobre a analogia dos nomes, cap. 2 [n. 10]; mas no
verossmil que ele assim julgasse, como se dir amplamente abaixo, ao tratar da
analogia do ente [DM XXVIII, 3] e o mesmo Cajetano ensina explicitamente, no
comentrio Suma de teologiade Santo Toms, I, q. 13, a. 5, que o ente, embora se
diga analogamente de Deus e das criaturas, dito deles intrinsecamente; de fato, parece
evidente que algo no pode ser ente real por denominao extrnseca, pois esta a
razo ou fundamento dos entes nocionais/de razo como se dir depois. Portanto,
necessrio que o que ente real seja tal, real e formalmente, pela sua entidade
intrnseca, que idntica com ele prprio e inseparvel dele prprio, mesmo que se
entenda que tudo o mais se abstrai ou se separa dele; assim, mesmo os acidentes,
embora a entidade da substncia seja separada deles, se entendem como retendo
intrinsecamente sua entidade, pela qual so entes reais; por isso, dizamos acima [DM
II, 2, 8 e 11] com santo Toms, que a analogia do ente no exclui que a razo formal
significada pelo ente se encontre intrinsecamente em todos os analogados. Ora, da se
segue que estes [os acidentes] tenham entre si alguma concordncia real de acordo com
a sua razo intrnseca, como foi tambm provado acima. Que, porm, esta concordncia
talvez no seja tanta quanto h entre as substncias ou os acidentes entre si nas suas
razes prprias, no vem ao caso no presente assunto, pois, no mximo, conclui que a
unidade do conceito de ente no tanta, mas no [conclui] que no haja alguma e
suficiente para a separao do conceito objetivo de acordo com a razo; assim como no
h tambm tanta concordncia entre as substncias como tais quanta h entre os homens
e, no entanto, ambas so suficientes para a unidade e discernimento do conceito
objetivo.
19. Pode responder-se de outra maneira e indicar-se uma diferena, porque a
razo de ente est entranhada4em tudo; por isso no parece que pode ser separada de
alguns, mesmo de acordo com a razo, mas as outras razes no esto to entranhadasnas coisas. Ora, tambm esta diferena nula, se for tomada com proporo, pois
tambm as razes de substncia e acidente, tomada no sentido mais geral, inerem em
todas as substncias e acidentes, seja qual for a razo e diviso que se considere.
Portanto, isto nada impede quanto diviso5 do conceito objetivo, sobretudo j tendo
sido mostrado que esta diviso no se funda sobre alguma distino da coisa, mas
4
intime5Praescindere vel separare (discernimento e separao)
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apenas em tal modo de conceber, pelo qual a coisa considerada sob uma referncia e
no sob outra.
20. Refuta-se uma outra evasiva. Na verdade, muito pode ser objetado contra
esta doutrina, o que, em parte, diz respeito analogia do ente, em parte distino ou
incluso dele em todas as coisas ou modos que o determinam, de que se falar em
seguida. Agora objeta-se apenas isto: do que foi dito segue-se que os predicamentos no
so gneros primariamente diversos, porque concordam em alguma razo comum.
Responde-se que vrias concordncias ou semelhanas intervm entre vrios
predicamentos, pois os predicamentos dos acidentes concordam, alm de na razo de
ente, na razo de acidente; alguns concordam tambm na razo de acidente absoluto e se
distinguem dos relativos, etc. Portanto, so ditos primariamente diversos porque no
concordam em nenhum gnero, como Porfrio indicou no captulo sobre a espcie
[Isagoge6, 5-23]. Alm disso, porque no diferem por diferenas prprias, mas por si
mesmos, como ser evidente a partir do que se dever dizer na seo 5.
Corolrios da doutrina anterior
21. O modo intrnseco de substncia ou de acidente no se inclui no conceito
de ente. Infiro disto, primeiro, que os modos intrnsecos da substncia ou dos
outros membros que dividem o ente no esto includos em ato neste conceito
objetivo e assim preciso de ente. evidente, porque estariam includos como
constituintes deste conceito de ente ou como dividindo-o. O primeiro no ocorre,
porque impossvel que o uno, como uno, seja constitudo por modos ou diferenas
opostos. E o segundo tambm no ocorre, porque ento este conceito estaria
dividido em ato em dois e, assim, este conceito no seria uno, tendo-se provado o
contrrio. Confirmo, pois pergunto: o que incluir em ato estes modos? Com efeito,
ou ocorre que, na prpria coisa, este conceito comum de ente inclui em ato estes modos,naquelas coisas em que existe; ou ocorre que, na mente ou neste conceito objetivo,
como aquele no qual termina precisamente tal conceito formal, estejam includos em ato
estes modos opostos. Destes, o primeiro verdadeiro, mas no diz respeito ao assunto,
porque este conceito objetivo considerado como preciso e adequado ao conceito
formal de ente, como tal, e no de acordo com toda a realidade que tem na coisa, em
todos os seus inferiores; com efeito, deste modo, o conceito de ente no pode ser nem
preciso nem uno, uma vez que inclui em ato tudo aquilo que necessrio para adistino de todos os gneros e conceitos. Nem se pode dizer prpria e verdadeiramente
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conceito de ente como tal, mas so antes vrios conceitos de todos os entes de acordo
com toda a realidade deles, dos quais o conceito preciso de ente no se distingue na
prpria coisa. Confirma-se, pois, deste modo, que tambm o conceito de homem pode
dizer-se que inclui em ato todos os indivduos, porque o conceito objetivo de homem,
na medida em que existe na prpria coisa, inclui realmente os prprios indivduos e os
modos prprios deles, nem homemse distinguem mais realmente de seus indivduos do
que o ente se divide em substncia, acidente e outros gneros, como se ver mais
abaixo. Por esta causa, dir-se- de maneira muito impropria que o conceito objetivo de
homem inclui todos os indivduos ou os princpios individuantes deles. Inversamente, se
falamos do conceito preciso, o que mais pertinente ao assunto, falso que inclua em
ato os modos opostos dos gneros inferiores, porque, como tal, s inclui o que
representado por seu conceito formal; ora, por este conceito formal no so
representados explicita e precisamente estes modos, de acordo com as razes prprias
deles, porque o intelecto que assim os concebe nada percebe destes, como evidente
pelo que foi dito e tambm pela prpria experincia e a partir de outros semelhantes.
Com efeito, no por outra razo se diz que homemno inclui em ato os indivduos, mas
apenas em potncia, seno porque, na medida em que representado pelo conceito
preciso de homem, no considerado nele alguma razo individual, mas apenas a razo
de homem.
22. Ente no significa imediatamente substncia ou acidente. Infere-se, em
segundo lugar, que esta palavra ente no significa imediatamente substncia ou
acidente ou os outros gneros ou entidades simples, de acordo com as razes prprias
delas, mas [inclui] o conceito objetivo de ente como tal e, em razo dele, os gneros ou
entidades nas quais existe na prpria coisa. Assim, julgam todos os autores citados,
tanto aqui como na concluso da seo precedente, principalmente Escoto, no
comentrio s Sentenas, I dist. 3, q. 1 e 3 [DM II, 1, 9 e DM II, 2, 5]. Citam-se tambmAvicena, Metafsica, liv. I, cap. 4 [27, 16 ss.] e Algazel, [Livro das intenes dos
filsofos, Lgica e filosofia], cap. 6. Toma-se tambm de Santo Toms nos lugares
citados e noEnte e a essncia, cap. 1, onde Cajetano julga o mesmo sobre o assunto,
embora difira de Escoto e estabelea nisto uma diferena entre o ente e os outros
nomes, que significam gneros ou espcies determinados; mas, na verdade, no
sobrevm nenhuma que tenha muito a ver com o assunto presente, exceto aquela que
deve ser tratada na seo seguinte. Donde de preferncia isto se prova e explica:primeiro, pelo exemplo do homem (e o mesmo acontece com os semelhantes); com
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efeito, significa imediatamente homem e mediatamente Pedro, no qual, da parte da
coisa, a razo [de homem] se encontra; portanto, de igual modo o ente, etc. O
consequente provado por igualdade de razo, porque em ambos os casos, o nome
comum e em ambos os casos o conceito objetivo , de acordo com a razo, separado
dos inferiores e o nome no os significa seno por causa de alguma concordncia
que tm entre si.
23. Em segundo lugar, prova-se a priori, porque, assim como as palavras
exprimem os conceitos formais da mente, assim tambm significam imediatamente
os objetos que so representados imediatamente por tais conceitos, porque servem
para exprimir os conceitos na medida em que, aquilo mesmo que os conceitos
representam naturalmente, as palavras significam por conveno. Por isso, s
vezes, a palavra convencionada de modo geral porque o conceito que exprime,
tambm geral. Portanto, aquilo mesmo que objeto imediato do conceito formal
o significado imediato da palavra adequada a este conceito; ora, esta palavra
ente assim a respeito do conceito formal de ente;
24. Em terceiro lugar, isto se explica mais ainda porque esta palavra ente
significa vrios, de tal modo que, por uma nica e primeira conveno abarque
todos estes; portanto, sinal de que no os significa imediatamente, mas por meio
de algum conceito objetivo comum a todos estes. O antecedente se explica pela
diferena entre a analogia desta palavra e das outras, que so anlogas apenas pela
proporcionalidade ou referncia extrnseca a um; pois, nas demais, a palavra significa
sempre, por uma conveno primeira, apenas um, mas depois, por alguma
metfora, foi transferida para significar outros. Donde acontece que signifique
imediatamente a ambos quase como que por uma dupla conveno e significao.
No que concordam com as equvocas, e diferem apenas porque nas equvocas ambas as
convenes so igualmente primeiras e uma no procede da outra, como nasmencionadas anlogas. So exemplos: o riso, pela primeira conveno significa apenas
uma certa ao do homem, mas depois esta palavra foi transferida para significar a
amenidade de um campo; de igual modo, sadio, pela primeira conveno significa
apenas a sade existente no animal, mas depois foi transferida para significar outros que
tm relao para com a sade do animal. A razo , tanto porque esta significao e
conveno mltipla no teve origem a partir de um conceito, mas a partir de
muitos, como tambm porque no se funda numa concordncia real das coisassignificadas, mas apenas numa relao ou proporo extrnseca. Mas, o nome ente,
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na verdade, tem uma significao, por conveno prpria e primeira, comum a
todos os entes, como manifesto, tanto pelo uso e compreenso geral de tal palavra,
quanto pela sua significao formal ou como que formal, que ser o que de si
comum e intrnseco a todos os entes reais, quanto, enfim, porque esta conveno
teve origem a partir de um nico conceito formal de ente como tal . Da, ficar
tambm provada a primeira consequncia, porque uma palavra no pode, por fora
de uma nica conveno, significar vrios como vrios, mas como so de algum
modo um; por isso, cabe razo de uma palavra comum que, pelo menos de acordo
com a razo e em referncia aos conceitos que as palavras exprimem, no signifique
imediatamente vrios na medida em que so tais. O que pode ser mostrado no presente
[assunto], pois ente no significa, imediatamente, apenas a substncia; de outro modo, o
acidente no seria, intrinsecamente, ente; nem significa tambm simultaneamente a
substncia como substncia, nem o acidente como acidente, como pode ser facilmente
explicado percorrendo os trs membros acima apresentados, a saber, pois no pode
signific-los imediatamente, nem disjuntiva, nem copulativa, nem pura e simplesmente,
como ficar facilmente evidente aplicando os argumentos acima elaborados. Com
efeito, estes trs, conceito formal, objetivo e palavra guardam uma proporo entre
si;por isso argumentamos frequentemente de um para o outro, no cometendo, de fato,
um crculo vicioso, mas tomando de cada um o que nos parece mais conhecido, ou mais
facilmente concedido por outros.
25. Em quarto lugar, argumento que, por causa desta significao imediata do
conceito ou da razo comum de ente, pode o ente ser o mais propriamente distribudo,
dizendo, todo ente bom e dividido, por exemplo, em substncia e acidente; com efeito,
no apenas a palavra que a dividida, mas o que significado pela palavra. Por isso,
tambm se faz muitssimo bem comparao, dizendo que este melhor ente do que
aquele, o que feito tambm por Aristteles naMetafsica, liv. VI, cap. 1 [1026a10-18].Por fim, servimo-nos muitssimo bem desta palavra, como extremo ou mediador de
silogismo, pois a unidade da palavra no serviria para raciocinar, seno por razo de um
nico significado prximo e imediato. Deste modo, tima aquela razo geral de que
o ente, na medida em que ente, o objeto do intelecto ou da cincia metafsica ;
donde ser necessrio que seja algo uno o que significado imediatamente por esta
palavra. Com efeito, esta razo s pode ser eficaz na medida em que este no um
objeto qualquer, mas tambm o sujeito sobre o qual so feitas demonstraes e omediador para demonstrar algo sobre os inferiores. Por ltimo, vem a experincia,
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mencionada muitas vezes, de que, ouvido o nome ente, concebemos algo e no
substncia, nem acidente. De facto, no pode ser dito (como alguns do a entender) que,
ento, nos detemos no conceito da palavra, pois isto contra a experincia; com efeito,
quem sabe a significao da palavra ente forma um outro conceito do que quem
ignora. Este, de facto, concebe a palavra e a se detm, ou duvida sobre o que
significado por esta palavra; aquele, porm, alm da palavra, concebe a coisa
significada e no duvida de modo nenhum sobre a significao no entanto, no
concebe a substncia nem o acidente. Portanto, esta palavra tem um outro significado
mais imediato.
26. Ora, Soncinas objeta algumas razes, que apresentaremos na seo
seguinte [DM II, 3, 10]; com efeito, provam apenas que ente no significa algo
intermedirio, distinto, por natureza da coisa, da substncia e dos acidentes, mas no
que no possa distinguir-se, quanto razo, por um conceito indistinto da mente. Objeta
depois que Aristteles, no livro X da Metafsica [2, 1054a13-19], texto 8 [Junctas, fol.
257aB-C] diz que ente significa os dez predicamentos, o que Averrois [Junctas, fol.
257vG-H] explica sobre a primeira significao e sem intermedirio, o qual nisto
seguido por Alexandre de Hales. Objeta, em segundo lugar, que Aristteles no livro VI
da Metafsica [11, 1026a27-29], texto 4 [Junctas, fol. 146vK] diz que, se no se do
entes abstrados da matria, a filosofia natural filosofia primeira, isto , que a cincia
metafsica no pode ser distinguida dela de modo nenhum, conseqncia que no seria
boa, se o ente como ente significasse algo comum substncia e ao acidente, pois isto
poderia ser objeto da metafsica, ainda que no houvesse entes imateriais. Em terceiro
lugar, podemos objetar com Aristteles no livro I da Fsica [33, 186a23-33], texto 25
[Junctas, fol. 17rB-C], onde indica que ente no significa algo uno que possa ser
mediador de silogismo; com efeito, rejeita, por esta causa, este raciocnio de
Parmnides: o que quer que esteja margem do ente, no-ente; ora, no-ente
nada; logo, o que quer que esteja margem do ente nada.
27. Em quarto lugar, pode objetar-se que Aristteles diz no livro VII da
Metafsica, cap. 4, [1030a28-1030b3], texto 15 [Junctas, fol. 164vI-L], que o prprio
ente se diz de todos os gneros ou predicamentos, no, porm, de modo semelhante, isto
, no de acordo com a mesma razo e conceito. Em quinto lugar, cita-se o mesmo
Aristteles que diz no livro VIII daMetafsica, cap. 6 [1045b1-3], texto 16 [Junctas, fol.
164vI-L], que, com efeito, este prprio ente, isto , por si e na medida em que tal, imediatamente substncia, qual, quanto etc. e por isso no posto na definio, como
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que dizendo que o ente desce imediatamente aos primeiros gneros, nos quais lugares
Averrois, Alexandre [de Afrodisia] e Santo Toms assim explicam e julgam. Em sexto
lugar, aduz-se Aristteles no livro I dos Primeiros [Analticos], cap. 28 [444b20 ss.],
onde indica que os primeiros gneros so tais que nada se diz deles como Alexandre [de
Afrodisia] e Filopono parecem explicar.
28. Soluo. Ao primeiro testemunho responde-se que Aristteles nada diz a
sobre a significao imediata, mas apenas sobre a predicao geral e igual de ente e uno,
pois se encontra, igualmente em todos os predicamentos; da, conclui que so idnticos
entre si. Para a eficcia deste argumento no necessrio que nesta significao seja
eliminado todo intermedirio de razo. Da que Santo Toms diga neste paaso que ente
significa as naturezas dos dez gneros na medida em que so em ato ou em potncia, no
que indica suficientemente que no as significa imediatamente de acordo com as razes
prprias, mas de acordo com uma [razo] comum. Assim, a explicao de Averrois no
nos necessria, embora ele mesmo mostre suficientemente que ele exclui apenas um
intermedirio que seja gnero e que expresse uma natureza definida e propriamente
restringvel, do que falaremos posteriormente. Ao segundo, alguns respondem que o
argumento de Aristteles bom, mas que no se fundamenta no facto de o que o ente
no possa significar um conceito comum substncia e ao acidente, mas no facto de que
se no houvesse nenhuma coisa que abstraia da matria de acordo com o ser, a razo de
ente como talno abstrairia mais da matria do que a razo de corpo ou de ente natural;
por isso, a considerao do ente como tal no transcenderia os limites da filosofia
natural, porque, ento, a substncia material seria o ente primeiro; ora, a mesma a
cincia do ente primeiro e do ente comum, como dissera no princpio do livro IV [1,
1003a20-28] e Santo Toms e Escoto advertem no lugar mencionado do livro VI.
29. No entanto, esta resposta geral necessita de maior verificao. Com efeito,
pode duvidar-se primeiramente se, embora no houvesse nenhuma substncia imaterial,deveria haver uma cincia metafsica distinta da fsica e da matemtica. Parece que
assim deveria ser asseverado, pois ento dar-se-ia a razo de ente abstraindo da
substncia material e da quantidade e dos outros acidentes. Dar-se-iam tambm as
propriedades comuns como verdadeiro, uno, idntico, diverso, todo, parte etc., das quais
nem a fsica nem a matemtica tratam agora, nem tratariam tambm ento, por serem
mais comuns e ultrapassarem os objetos prprios. Logo, seria necessria uma terceira
cincia superior a ambas, que seria, por isso, a metafsica. Donde poder duvidar-se, em
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segundo lugar, se esta cincia seria, ento, anterior filosofia natural; com efeito,
parece que assim deve ser dito, porque seria sobre um objeto mais abstrato e anterior.
30. De fato, para mim, provvel que, ainda que se desse esta hiptese, ainda
restaria lugar para a cincia metafsica. Com efeito, agora, apenas uma parte dela
a que discute sobre as substncias espirituais.Portanto, poderia ento permanecer
quanto s demais partes e discutiria sobre o ente e os outros transcendentais , sobre
os dez predicamentos e sobre os princpios e causas universais. Contudo,
estabelecido isto, de acordo com o pensamento de Aristteles no lugar citado, a filosofia
natural seria a cincia primeira, ou filosofia, pelo menos em dignidade e superioridade
porque trataria do objeto mais nobre, isto , da substncia como tal e de toda substncia;
por conseguinte, trataria tambm das causas primeiras e princpios das coisas, no de
acordo com a abstrao da mente, mas de acordo com a coisa.
31. Donde, enfim, dizer-se que parece mais provvel neste caso, que no seria
necessria uma cincia especial da metafsica, distinta da filosofia natural. A razo
porque ento a filosofia trataria de toda substncia e por conseguinte de todos os
acidentes, mesmo da quantidade, na medida em que propriedade da substncia, quanto
entidade e essncia dela e na medida em que se distingue, tanto da prpria substncia
quanto de todas suas outras propriedades, porque toda esta considerao da quantidade
no abstrairia da matria sensvel nem excederia a amplitude do objeto da filosofia. Pela
mesma razo, caberia mesma filosofia a diviso e a considerao de todos os
predicamentos, porque nada neles seria, quanto prpria coisa, no fundado na
substncia sensvel. Com efeito, nem os predicamentos dos acidentes se estenderiam
mais amplamente do que o predicamento da substncia. Ademais, a considerao de
todas as essncias e de todas as causas reais caberia filosofia, pela mesma causa.
Enfim, por igual razo, a mesma trataria dos predicados comuns substncia e aos
acidentes, nem seria preciso constituir uma cincia especial por causa apenas destes,porque no abstrairiam da matria sensvel e o conceito de ente no seria distinto do
conceito de ente material. Nem obstaria que a razo de ente e semelhantes fossem
comuns s coisas matemticas e fsicas, porque esta comunidade seria apenas de
acordo com uma concordncia real, no de acordo com alguma abstrao peculiar
pertinente constituio do objeto de uma cincia. Como tambm agora a
quantidade contnua e discreta concordam na razo comum de quantidade e, no entanto,
no se d uma matemtica comum porque a fsica trata suficientemente desta
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necessrio que a restrinja de outro modo aos predicados superiores, que sejam gneros
ou espcies, pois de modo absoluto: como pode ser verdadeira, j que evidente que
muitos so predicados dos primeiros gneros? At mesmo o prprio Aristteles no livro
II dos Posteriores Analticos, cap. 14 [981a ss.] indica que alguns predicados superiores
ou mais universais esto contidos dentro do gnero, mas que alguns se dizem de outros
tambm fora do gnero, o que todos os comentadores entendem que foi dito