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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA EMPRESARIAL DA COMARCA DA CAPITAL – RIO DE JANEIRO. NÚCLEO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NUDECON, órgão de atuação da Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro, integrante da administração pública direta do Estado do Rio de Janeiro, sem personalidade jurídica, especificamente destinado à defesa dos interesses e direitos protegidos pela Lei n° 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor, CNPJ 31.443.526/0001-70, com endereço na av. Marechal Câmara, 314, Centro, Rio de Janeiro, RJ, com fulcro nos art. 82, III, 83 e 84 do CDC, vem, propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO LIMINAR 1

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA

EMPRESARIAL DA COMARCA DA CAPITAL – RIO DE JANEIRO.

NÚCLEO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NUDECON,

órgão de atuação da Defensoria Pública Geral do Estado do Rio de Janeiro,

integrante da administração pública direta do Estado do Rio de Janeiro, sem

personalidade jurídica, especificamente destinado à defesa dos interesses e

direitos protegidos pela Lei n° 8.078/90, Código de Defesa do Consumidor,

CNPJ 31.443.526/0001-70, com endereço na av. Marechal Câmara, 314,

Centro, Rio de Janeiro, RJ, com fulcro nos art. 82, III, 83 e 84 do CDC, vem,

propor

AÇÃO CIVIL PÚBLICACOM PEDIDO LIMINAR

Em face CREFISA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS,

pessoa jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 60.779.196/0001-

96, com sede na Capital do Estado de São Paulo, na Rua Canadá, n° 387,

Jardim América, CEP 01436-000, pelos fundamentos de fato e de direito

adiante expostos:

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I - DA LEGITIMIDADE

O Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro está incluído no rol de legitimados do art. 82,

III, da Lei nº 8.078/90, tratando-se de órgão da administração pública direta,

criado para a defesa dos interesses e direitos protegidos pelo Código de

Defesa do Consumidor, conforme a Resolução nº 204/2002 da DPGE.

O papel de proteção do consumidor pela Defensoria Pública

também está previsto na legislação específica de sua organização, sendo uma

de suas funções institucionais “patrocinar os interesses do consumidor

lesado”, como previsto no inciso XI do art. 4º da Lei Complementar nº 80/94.

Na legislação estadual há disposições no mesmo sentido. A

Constituição do Estado do Rio de Janeiro prevê, entre suas funções

institucionais o patrocínio “os direitos e interesses do consumidor lesado, na

forma da lei” (art. 179, § 2º, V, alínea f). No mesmo sentido o disposto no art.

22, § 3º, da Lei Complementar Estadual nº 6/77: “aos Defensores Públicos

incumbe também a defesa dos direitos dos consumidores que se sentirem

lesados na aquisição de bens e serviços”.

É também no art. 5º, inciso XXXII, da Carta Maior que está

prevista a defesa do consumidor pelo próprio Estado, como também constitui

esta um dos princípios da ordem econômica, conforme o inciso V do art. 170.

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Voltando-se para o Código de Defesa do Consumidor, a

redação do art. 83 torna clara a certeza da legitimidade da Defensoria Pública

para a propositura da ação coletiva na defesa dos consumidores: “para a

defesa dos direitos e interesses protegidos por este Código são admissíveis

todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequada e efetiva

tutela”.

Ainda é preciso ressaltar que a Defensoria Pública “é

instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a

orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma

do art. 5º, LXXIV”, nos termos do caput do art. 134 da CRFB/88. Aquele

dispositivo constitucional garante a assistência jurídica integral e gratuita aos

que comprovarem insuficiência de recursos.

Deve, contudo, ser observado que necessitado,

hodiernamente, NÃO MAIS VEM SENDO CONSIDERADO UNICAMENTE

COMO HIPOSSUFICIENTE ECONÔMICO. A renomada Professora ADA

PELLEGRINE GRINOVER, afirmou, em parecer gratuito que exarou para

contestar a pretensão veiculada na ADI da CONAMP (que questiona no STF a

legitimidade ativa da Defensoria Pública para a tutela coletiva), verbis:

“A exegese do texto constitucional, que adota um conceito jurídico indeterminado, autoriza o entendimento de que o termo necessitados abrange não apenas os economicamente necessitados, mas também os necessitados do ponto de vista organizacional , ou seja os socialmente vulneráveis ”.

“Ainda que se entenda que função obrigatória e precípua da Defensoria Pública seja a defesa dos economicamente carentes, o texto constitucional não impede que a Defensoria Pública exerça outras funções, ligadas ao procuratório, estabelecidas em lei”. (PARECER NA ÍNTEGRA EM ANEXO)

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Ainda que com todo este arcabouço jurídico autorizador da

legitimidade da Defensoria Pública para esta ação, o tema não admite mais

qualquer dúvida a seu respeito por força da nova redação do art. 5º da Lei nº

7.347/85 após a edição da Lei nº 11.448/2007:

“Art. 5º. Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I – o Ministério Público;

II – a Defensoria Pública;

III – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV – a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico.”

Acerca da entrada em vigor da norma jurídica acima transcrita,

cabe trazer à baila comentário definitivo de Humberto Dalla Bernardina de

Pinho, membro do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, tecido em

artigo publicado na Revista de Direito da Defensoria Pública do Rio de

Janeiro, abaixo selecionado, verbis:

“A LEI FEDERAL Nº 11.418, DE 15 DE JANEIRO DE 2007 É, A UM SÓ TEMPO, UM MARCO HISTÓRICO E A CORREÇÃO DE UMA INJUSTA DISCRIMINAÇÃO COM UMA DAS MAIS IMPORTANTES E RESPEITADAS INSTITUIÇÕES BRASILEIRAS.” (in “A Legitimidade da Defensoria Pública para a Propositura de Ações Civis Públicas: Primeiras Impressões e Questões Controvertidas 07”. Revista de Direito da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, ano 20, nº 22, 2007)

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Em arrimo aos arrazoados retro expostos, trazemos à baila

escorreita exposição da lavra da insigne consumerista, a Desembargadora

Cristina Tereza Gaulia, a qual assim se manifestou acerca da legitimidade da

Defensoria Pública, verbis:

“Sublinhe-se, ainda que a CF /88 (arts.134, caput c/c 5º, LXXV) impões a Defensoria Pública o dever de prestar assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados. Deve-se, portanto, conferir a estes dispositivos a maior amplitude possível, de modo a lhes assegurar a efetividade que o legislador pretendeu implementar, afastando qualquer interpretação restritiva , tendo em vista estarmos no campo das garantias fundamentais. Entretanto, e mesmo que assim fosse, a Lei nº 11.448/07 veio a lume para, e de uma vez por todas, finalizar a discussão reinante em controvertida jurisprudência sobre a legitimidade ativa da Defensoria Pública para as ações civis públicas. Confira-se seu art.2º, in verbis: ‘Art.2º O art. 5º da Lei nº7347, de julho de 1985, passa a vigorar com a seguinte redação:Art.5º Têm legitimidade para propor ação principal e ação cautelar:(...)II- a Defensoria Pública;(...)’Registre-se, por oportuno que a Lei nº 11.448/07 é lei que trata de questões relativas á processo e, por conseguinte, sendo de ordem pública, se implementa de imediato, inclusive para as ações em andamento de modo que, mesmo que antes da referida legislação se pudesse fundamentar a ilegitimidade ativa da Defensoria Pública, burlando o entendimento da melhor jurisprudência, inequívoca a legitimação párea a propositura da presente ação civil pública por parte da instituição.” GRIFOS NOSSOS (apud Apelação Cível nº 2007.001.65339. Relator: Des. Cristina Tereza Gaulia, Juíz Dr. Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto, Apelante: Ministério Público do ERJ, Agravados. Município do Rio de Janeiro; 18ª Câmara Cível)

Ressalte-se que as opiniões acima foram exaradas antes da

novel modificação na Lei Complementar 80/94, que organiza as Defensorias

Públicas de todo o país, a qual acrescentou, verbis:

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Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre outras:VII – promover ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes; (Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).VIII – exercer a defesa dos direitos e interesses individuais homogêneos e dos direitos do consumidor, na forma do inciso LXXIV do art. 5º da Constituição Federal (Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).(...)XI – exercer a defesa dos interesses e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que mereçam proteção especial do Estado(Redação dada pela Lei Complementar nº 132, de 2009).

Como se vê, a norma acima destacada não se limita a

conceder legitimidade ao Defensor Público para patrocinar Ação Civil Pública

apenas em benefício exclusivo de pessoas hipossuficientes, mas, ao revés,

deixa bem claro que a atuação coletiva pode se dá desde que se vislumbre a

possibilidade de beneficio a um grupo de pessoas nestas condições. Assim

é que, ainda que somente uma parte (mínima que for) dos beneficiados pela

tutela coletiva for hipossuficiente, legítima é atuação da Defensoria Pública.

Neste sentido, destacamos entendimento do insigne

doutrinador, Fredie Didier Jr, verbis:

“(...) Não é necessário, porém, que a coletividade seja composta exclusivamente por pessoas necessitadas. Se fosse assim, praticamente estaria excluída a legitimação da Defensoria para a tutela de direitos difusos, que pertencem a uma coletividade de pessoas indeterminadas. Grifos nossos (in Curso de Direito Processual Civil – Processo Coletivo, vol. 4, 4ª edição, editora Podivm: 2009, p. 212).

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Não obstante, a demanda presente diz respeito a tutela de

consumidores, os quais, por natureza, são consideráveis vulneráveis, portanto

beneméritos de especial proteção do Estado, avultando-se a atuação da

Defensoria Pública, na forma do inciso XI, acima destacado.

Ademais de tudo até aqui exposto, segundo recente julgado

do STJ, a Defensoria Pública passa agora a atuar em qualquer demanda

coletiva, ainda que não seja relativa ao consumidor, mesmo que beneficiando pessoas não-hipossuficientes, senão vejamos, verbis:

Acordão Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇAClasse: RESP - RECURSO ESPECIAL - 912849Processo: 200602794575 UF: RS - Órgão Julgador:

PRIMEIRA TURMA - Data da decisão: 26/02/2008 - Documento: STJ000322153

Fonte DJE DATA: 28/04/2008

Relator(a) JOSÉ DELGADO

Decisão Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Teori Albino Zavascki, por unanimidade, negar provimento aos recursos especiais, nos termos do voto do

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Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão (voto-vista), Teori Albino Zavascki (voto-vista) e Denise Arruda votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luiz Fux.

Ementa PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COLETIVA. DEFENSORIA PÚBLICA. LEGITIMIDADE ATIVA. ART. 5º, II, DA LEI Nº 7.347/1985 (REDAÇÃO DA LEI Nº 11.448/2007). PRECEDENTE.1. Recursos especiais contra acórdão que entendeu pela legitimidade ativa da Defensoria Pública para propor ação civil coletiva de interesse coletivo dos consumidores.2. Este Superior Tribunal de Justiça vem-se posicionando no sentido de que, nos termos do art. 5º, II, da Lei nº 7.347/85 (com a redação dada pela Lei nº 11.448/ 07), a Defensoria Pública tem legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar em ações civis coletivas que buscam auferir responsabilidade por danos causados ao meio-ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valorartístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e dá outras providências.3. Recursos especiais não-providos.

Indexação (VOTO VISTA) (MIN. TEORI ALBINO ZAVASCKI) CABIMENTO, MANUTENÇÃO, ACÓRDÃO, TRIBUNAL A QUO, RECONHECIMENTO,

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LEGITIMIDADE ATIVA, DEFENSORIA PÚBLICA, PARA, AJUIZAMENTO, AÇÃO CIVIL PÚBLICA, PRETENSÃO, DEFESA, INTERESSE COLETIVO, CONSUMIDOR, ENERGIA ELÉTRICA / HIPÓTESE, ACÓRDÃO RECORRIDO, FIXAÇÃO, COMO, LIMITE, BENEFICIÁRIO, SENTENÇA JUDICIAL, AÇÃO COLETIVA, APENAS, CONSUMIDOR, COMPROVAÇÃO, INSUFICIÊNCIA, RECURSOS FINANCEIROS OBSERVÂNCIA, FUNÇÃO INSTITUCIONAL, DEFENSORIA PÚBLICA, PREVISÃO, EM, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E, PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFETIVIDADE, PARA, INTERPRETAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL; OBSERVÂNCIA, PRECEDENTE, STF, E, STJ.

Data

Publicação28/04/2008

Doutrina OBRA : PROCESSO COLETIVO, 2ª ED., SÃO PAULO, REVISTA DOS TRIBUNAIS, P. 77AUTOR : TEORI ALBINO ZAVASCKI

Assim é que a atuação da Defensoria Pública não se trata de

uma faculdade. Ao contrário, reveste-se a atuação de um poder-dever do

Defensor Público que, tendo a sua disposição o ordenamento jurídico, deverá

utilizá-lo de todas as formas para alcançar o escopo constitucional delineado.

Por todo o exposto, restou cabalmente demonstrada a

legitimidade extraordinária deste Núcleo de Defesa do Consumidor, para a

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propositura da presente demanda coletiva, objetivando tutelar os interesses

dos consumidores lesados pela conduta ilícita adiante relatada.

II – DOS FATOS

Após o advento do Plano de Estabilização Econômica,

conhecido como Plano Real, o segmento bancário e comercial passou a

cobrar diversas tarifas aos consumidores, sob o argumento de que a

gratuidade de outrora não poderia ser mantida, ante a diminuição dos ganhos

das instituições com o mercado financeiro.

Os bancos, então, aumentaram as cobranças sobre os

serviços e passaram a onerar os consumidores com uma enxurrada de tarifas,

dentre as quais a famigerada TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO.

Inúmeras ações individuais foram deflagradas pelo país

insurgindo-se contra a manutenção da indigitada cobrança, uma vez que tal

atuar importava em verdadeiro enriquecimento ilícito por parte das instituições

financeiras, posto que, a despeito de não prestarem qualquer serviço

específico, exigiam abusiva contraprestação pecuniária, numa clara operação

de repasse de custos de obrigação inerente ao seu negócio.

Pois bem, o Banco Central, premido pelos reclamos dos

órgãos de defesa do consumidor, bem como pelo rechaço da cobrança pelo

Poder Judiciário, decidiu vedar a cobrança da malfadada tarifa, encerrando de

vez a discussão acerca de sua legalidade ou não.

Não obstante, o BACEN, através da circular 3.371, instituiu a

chamada TARIFA DE CADASTRO, que na prática apenas substituiu a tarifa

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de abertura de crédito, a despeito de incidir em função do mesmo fato

gerador, mantendo viva, de forma sub-reptícia, a problemática acima narrada,

senão vejamos, verbis:

“Circular 3371Institui Tabela padronizada de serviços prioritários e pacote

básico padronizado, na forma da Res. 3.518, de 2007...

1.1 Tarifa de Cadastro – Exclusivamente, realização de

pesquisa em serviço de proteção ao crédito, base de dados e

informações cadastrais, e tratamento de dados e informações

necessários ao início do relacionamento de conta-corrente de

depósitos, contas de depósito de poupança e operações de

crédito e arrendamento mercantil.”

Assim é que a providência do BACEN não passou de pura e

simples mudança da mensagem grafada no rótulo, na tentativa de alterar a

essência do perfume, o que, à evidência, se afigura impossível.

A celeuma, portanto, persiste, já que, repise-se, através da

presente tarifa também se observa abjeta transferência ao consumidor de

custos de operação que dizem respeito tão-somente ao fornecedor, não se

vislumbrando qualquer prestação de serviço que deva ser remunerada.

Ora, na formação das taxas dos juros remuneratórios as

instituições financeiras já levam em consideração diversos fatores

(inadimplência, impostos, etc.), dentre os quais os custos administrativos. Logo, pretender cobrar tal tarifa consubstancia verdadeiro bis in idem, o que

se afigura inadmissível.

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Durante o atendimento individual do NUDECON, constatou-se

que a ré envida a indigitada cobrança no valor de até R$ 846,83 (oitocentos e

quarenta e seis reais e oitenta e três centavos), conforme se comprova pela

documentação anexa (Procedimento Instrutório nº 1117113591/2012). Como

se vê, merece o comportamento narrado ser devidamente rechaçado, já que

este custo deve ser suportado apenas pela instituição, não se vislumbrando

qualquer tipo de serviço em favor dos consumidores.

Mal comparando, ao se admitir tal espécie de cobrança pelos

bancos, ter-se-á que admitir, no comércio varejista de bens de consumo, a

cobrança de diversas tarifas, tais como: tarifa de atendimento; tarifa de

instalação de câmera de segurança; tarifa de ar condicionado; tarifa de

embrulho; tarifa de consulta de cadastros restritivos de crédito e de emissão

de cheque sem fundos; Tarifa de conferência de autenticidade de notas de

dinheiro; Tarifa de conferência de autenticidade de documentos apresentados;

e etc.

É óbvio que todos os custos acima narrados já devem estar

embutidos no preço final do produto ou serviço, daí porque não é praxe do

comércio envidar tais cobranças, sendo certo que se assim o fosse, tal prática

decerto não prosperaria.

Outrossim, ainda que houvesse um serviço individualizado,

prestado em favor exclusivo do consumidor, o que se admite para

argumentar, tal contratação de serviço nunca poderia ser obrigatória, sob

pena de se materializar verdadeira operação casada.

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Não foi por outro motivo que o banco ITAUCARD, em

procedimento instaurado para tratar de fato idêntico, firmou Termo de

Ajustamento de Conduta tornando a cobrança de tal tarifa facultativa (vide

documento em anexo), dando-se opção ao consumidor de trazer, por moto

próprio, as informações e documentações necessárias que o banco diz ter que

reunir para a concessão do crédito e que onerariam a operação.

Não obstante, as instituições financeiras, infelizmente sob o

beneplácito do BACEN, pretendem tratamento diferenciado, ou melhor,

privilegiado, tudo em detrimento do consumidor, o que, à evidência, deverá

ser rechaçado por este douto juízo, mormente diante das razões de direito

abaixo expendidas.

IV – DO DIREITO

A defesa do consumidor é um direito fundamental, de natureza

social, previsto na Constituição. Uma das conseqüências deste

reconhecimento é a vedação de retrocesso, inclusive em face de legislação

posterior que venha a amesquinhar os direitos e garantias estabelecidas na

legislação em vigor. O art. 1º do CDC ressalta que suas normas são

estabelecidas nos termos do art. 5º, XXXII e 170, V da CF, representando,

pois, a concreção desses mandamentos constitucionais.

De acordo com o art. 1º, do CDC, as normas nele contidas

são de ordem pública e interesse social. São, portanto, cogentes para todas

as relações de consumo, devendo ser acatadas por parte de todo e qualquer

poder regulamentar.

A possibilidade de modificação do conteúdo de uma cláusula

abusiva, a fim de restabelecer o equilíbrio da relação entre consumidor e

fornecedor está prevista no art. 6º, V e VI, e no artigo 51 do CDC.

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O direito do consumidor é indisponível. É a própria natureza

de direito fundamental que determina a indisponibilidade dos direitos dos

consumidores. Desse modo, não podem ser objeto de renúncia ou disposição.

Disponível é o interesse do prestador de serviço, nunca o do consumidor.

IV.1. DA ABUSIVIDADE DA COBRANÇA:

No caso vertente, a cobrança de TARIFA DE CADASTRO

imposta nos contratos de adesão unilateralmente elaborados pela ré é

nitidamente abusiva, por afrontar as normas básicas da relação de consumo.

Não se vislumbra qualquer fornecimento de serviço ao consumidor que justifique a imposição de uma contraprestação em favor da instituição financeira ré. Ao revés, o que se vislumbra é o resguardo de

seu próprio interesse, que é o de consultar e arquivar dados do consumidor

para melhoria da segurança na concessão de crédito, minimizando os riscos

de fraude e/ou inadimplência.

Assim é que o pagamento de uma tarifa com o fato gerador

apontado, em verdade consubstancia verdadeiro enriquecimento ilícito, prática

que, como é de sabença trivial, é rechaçada pelo direito pátrio.

Portanto, mesmo que previsto no contrato ou informado ao

consumidor a incidência da mencionada tarifa, não pode o fornecedor envidar

acréscimo de obrigação incompatível com os deveres àquele inerente, e, pior,

totalmente divorciada da cláusula geral da boa-fé objetiva.

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Como assevera Rizzatto Nunes, a boa-fé objetiva:

“é uma espécie de pré-condição abstrata de uma relação ideal. Toda vez que no caso concreto, pro exemplo, o magistrado tiver de avaliar o caso para identificar algum tipo de abuso, deve levar em consideração essa condição ideal a priori, na qual as partes respeitam-se mutuamente, de forma adequada e justa.” 1

A boa-fé, em sentido amplo, diga-se, é um conceito

essencialmente ético, que podemos definir com base no magistério de Alípio

Silveira como “a consciência de não prejudicar a outrem e seus direitos”.

A boa-fé objetiva é norma de comportamento positivada nos

arts. 4º, III e 51, IV, do CDC, que cria três deveres principais: um de lealdade e

dois de colaboração que são basicamente, o de bem informar (caveat

venditor) o candidato a contratante sobre o conteúdo do contrato e o de não abusar ou, até mesmo, de se preocupar com a outra parte (dever de

proteção).

Rui Rosado de Aguiar Júnior, a propósito da aplicação da

cláusula geral de boa-fé, pontifica que as pessoas devem comportar-se

segundo tal desiderato antes e durante o desenvolvimento das relações

contratuais. Esse dever, para ele, projeta-se na direção em que se

diversificam todas as relações jurídicas: direitos e deveres. Os direitos devem

exercitar-se de boa-fé; as obrigações têm de cumprir-se também de boa-fé.

Vale consignar que § 1º do art. 51 do Código de Defesa do

Consumidor somado ao inciso IV deste mesmo artigo é verdadeira norma

geral proibitória de todos os tipos de abusos contratuais.

1 In Curso de Direito do Consumidor, Ed. Saraiva, 2004, p. 128.

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O § 1º, ora citado, explica em três incisos o que vem a ser a

expressão “desvantagem exagerada” que é empregada no inc. IV do já

mencionado art. 51. Cabe aqui a análise do inciso III do § 1º o qual estabelece

que se presume exagerada a vantagem que “se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do

contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso”.

Com efeito, o CDC visa garantir o equilíbrio nas relações

jurídicas de consumo e, para tanto, traz mecanismos capazes de coibir a sobrevivência de cláusulas que se mostrem excessivamente onerosas para o consumidor. Nota-se que a repressão à onerosidade excessiva está

ligada ao princípio da equivalência contratual, que está disposto no art. 4º, n.

III, e art. 6º, n. II, do CDC, como base das relações jurídicas de consumo.

Verificada a onerosidade excessiva apresentam-se três

conseqüências:

a) a nulidade de cláusula por trazer desvantagem exagerada

ao consumidor (art. 51, IV c/c § 1º, III, CDC);

b) o direito do consumidor de modificar a cláusula contratual, a

fim de ver preservado o equilíbrio contratual (art. 6º, V, CDC),

c) a revisão do contrato tendo em vista fatos supervenientes

não previstos pelas partes quando do fechamento do pacto

(art. 6º, V, segunda parte, CDC).

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Demais de tudo acima exposto, ao que parece, a tarifa não

possui valor fixo, ou seja, a instituição ré envida cobrança da tarifa de forma

obscura, sem informar como se chega ao valor cobrado, o qual, conforme

demonstrado no caso concreto colacionado aos autos, pode chegar a

corresponder a 50% do valor do crédito concedido, ou seja, a taxa de juros

cobrada remunera menos a instituição do que a famigerada tarifa de cadastro,

o que se afigura absurdo.

Como se sabe, a variação do valor da tarifa inquina a cláusula

de nulidade absoluta, nos termos do art. 51 CDC, verbis:

“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas

contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços

que:

(...)

X – permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de maneira unilateral; (...)”

O art. 52, por seu turno, estabelece que “no fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos informá-lo prévia e adequadamente sobre: (...) III – acréscimos legalmente previstos;”

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Demais de tudo, como já explicitado, não se pode admitir a

prestação de um serviço condicionada à contratação obrigatória de prestação

de um outro, sem que tal atuar seja tingido de abusivo, posto que

caracterizado estar a prática de operação casada, vedada pelo art. 39, inciso

do CDC.

IV.2 – DA SUBMISSÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS ÀS NORMAS DO CDC

Nem se objete que a cobrança de tal tarifa tenha sido

autorizada pelo Banco Central, já que tais disposições não podem se sobrepor

aos ditames do Código de Defesa do Consumidor. O poder regulamentar do

Poder Executivo não pode ultrapassar os limites da lei, sob pena de violação

ao princípio da legalidade (artigo 37, caput, da Constituição Federal).

Neste aspecto, ressalte-se que as normas editadas pelo

Banco Central do Brasil não exaurem as relações havidas entre as instituições

financeiras e seus clientes, sendo plenamente aplicável o Código de Defesa

do Consumidor às relações entre os bancos e seus clientes, conforme já

pacificado pelo Supremo Tribunal Federal. Veja-se a ementa do acórdão

proferido nos autos da ADIN 2591:

“Código de Defesa do Consumidor. Art. 5o, XXXII, da CB/88. Art. 170, v, da CB/88. Instituições financeiras. Sujeição delas ao Código de Defesa do Consumidor, excluídas de sua abrangência a definição do custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas na exploração da intermediação de dinheiro na economia [art. 3º, § 2º, do CDC]. Moeda e taxa de juros. Dever-poder do Banco Central do Brasil. Sujeição ao Código Civil. 1. As

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instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumid or . 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. (...) 4. Ao Conselho Monetário Nacional incumbe a fixação, desde a perspectiva macroeconômica, da taxa base de juros praticável no mercado financeiro. 5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxas de juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. 7. O preceito veiculado pelo art. 192 da Constituição do Brasil consubstancia norma-objetivo que estabelece os fins a serem perseguidos pelo Sistema Financeiro Nacional, a promoção do desenvolvimento equilibrado do País e a realização dos interesses da coletividade. 8. A exigência de lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura do sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. ART. 4º, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMATIVA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ILEGALIDADE DE RESOLUÇÕES QUE EXCEDEM ESSA MATÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidade normativa --- a chamada capacidade normativa de conjuntura --- no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no

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plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade. (ADIN 2591/DF, STF – Plenário, Rel. Min. EROS GRAU, julgada em 07.06.2006, g.n.)

Verifica-se, portanto, que a incidência do Código de Defesa do

Consumidor à hipótese em tela constitui premissa da qual o julgador não pode

se afastar, tendo em vista que o acórdão supra transcrito, proferido em sede

controle abstrato de constitucionalidade, possui efeitos vinculantes e erga

omnes.

Ora, a desvantagem excessiva e o prejuízo do consumidor

são gritantes, sendo certo que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro vem

rechaçando práticas congêneres, valendo aqui a citação do aresto abaixo, o

qual, mutatis mudandis, se aplicam ao caso em tela, a saber, verbis:

“0011414-67.2008.8.19.0209 - APELACAO DES. ANA MARIA OLIVEIRA - Julgamento: 19/01/2010 - OITAVA CAMARA CIVEL

INSTITUICAO FINANCEIRATARIFA DE ABERTURA DE CREDITOCONDUTA ABUSIVARESTITUICAO EM DOBROINOCORRENCIA DE DANO MORAL

Relação de consumo. Responsabilidade objetiva. Ação proposta por consumidor objetivando a declaração de abusividade da cobrança da Tarifa de Adiantamento de Crédito - TAC, a restituição em dobro do valor cobrado a esse título, além de indenização por dano moral. Sentença que julgou procedente, em parte, o pedido inicial para condenar a Ré ao pagamento de R$ 1.200,00, correspondente ao dobro do valor cobrado indevidamente a título de tarifa de abertura de crédito - TAC. Apelação de ambas as partes. Artigo 51 do CDC que considera nulas cláusulas contratuais que prejudiquem o

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consumidor ou o coloquem em situação de desvantagem na relação jurídica de consumo. Ré cujo serviço é o fornecimento de crédito o qual é remunerado pelo consumidor através do pagamento de juros. Cobrança de tarifa para análise da concessão do crédito que é abusiva. Inexistência de prestação de serviço ao consumidor que justifique tal cobrança, sendo apenas um procedimento interno da instituição que visa minimizar os riscos decorrentes do seu negócio, não podendo tais custos serem repassados ao consumidor. Inteligência dos artigos 6º, inciso III, 46 e 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor. Cobrança indevida que enseja a devolução em dobro do valor cobrado. Dano moral não configurado ante a ausência de repercussão extrapatrimonial nos fatos em discussão. Desprovimento das apelações.” (GRIFOS NOSSOS)

Em síntese, verifica-se claramente que a malfadada TARIFA

DE CADASTRO se presta aos mesmos objetivos da antiga TARIFA DE

ABERTURA DE CRÉDITO, e de igual modo deve ser rechaçada pelo Poder

Judiciário, uma vez que não representa qualquer atividade em favor do

consumidor. Ao revés, como alhures explicitado, consubstancia verdadeiro

enriquecimento ilícito em favor da instituição ré.

IV.2. DOS DANOS MORAIS COLETIVOS

A conduta da demandada, de repassar para o consumidor custos que deveriam ser suportados pela própria instituição, bem como de

impor operação casada, tem o condão de ofender à massa de seus consumidores, o que, por si só, caracteriza a existência de danos morais a serem reparados. No caso, danos morais coletivos, tal como admitido pela Lei nº 7.347/85:

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“Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da

ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e

patrimoniais causados (...)

“II – ao consumidor”(...)

No mesmo sentido, o Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 6º. São direitos básicos do consumidor (...)

VI – a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e

morais, individuais, coletivos e difusos” (...)

Ora, aquele que viola a ordem jurídica e, consequentemente,

comete um ato ilícito, fica obrigado a proceder a devida reparação, nos termos

da norma contida nos arts. 186 e 927 do CC/2002.

A ordem jurídica pátria é clara ao impor aos fornecedores a

observância do princípio da boa fé objetiva, atuando de forma proba, sem

visar causar lesão no parceiro contratual, cooperando para a manutenção da

relação contratual.

Como se vê, o comportamento da ré vem em sentido

completamente oposto, já que vêm impondo aos consumidores cobranças

indevidas, priorizando a busca do lucro em detrimento do bem estar do

parceiro contratual.

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Portanto, não atendido o comando da norma, por óbvio, surge

uma obrigação secundária, que configura a responsabilização civil dos

responsáveis pelos danos causados à sociedade.

Tratando-se de uma sociedade de massa, o sujeito passivo do

ato ilícito também pode ser uma coletividade, disso não se tem dúvidas. A

coletividade também possui valores extrapatrimoniais que devem ser

preservados. Sua violação, repise-se, caracteriza ilícito que ofende à própria

coletividade e, como previsto na legislação, o ofensor pode, e deve, ser

condenado à reparação ou amenização, assumindo tal medida o relevante

caráter preventivo de condutas semelhantes, dissuasório de novas violações,

com caráter exemplar.

Neste sentido, cumpre destacar o auspicioso entendimento doutrinário abaixo, verbis:

“No dano moral coletivo não se cogita de compensação ou satisfação de alguma dor ou de algum sofrimento de um sujeito individualizado, como resultado de ofensa a algum direito subjetivo extrapatrimonial. Como observa André de Carvalho Ramos: “O ponto-chave para a aceitação do chamado dano moral coletivo está na ampliação de seu conceito, deixando de ser o dano moral um equivalente da dor psíquica, que seria exclusividade de pessoas físicas”. Sobressai a finalidade dissuasória ou exemplar do montante indenizatório, que atua como fator de desestímulo de comportamentos lesivos semelhantes por parte do réu ou de terceiros” (ANDRADE, André Gustavo Corrêa de. Dano Moral e indenização Punitiva, Rio de Janeiro, Forenses, 2006, p.66).

Da mesma obra, colacionamos o seguinte trecho:

“A indenização punitiva surge, no sistema jurídico vigente, não apenas como reação legítima e eficaz contra a lesão e a ameaça de lesão a princípios constitucionais da mais alta linhagem, mas como medida necessária para a efetiva proteção desses princípios. Com efeito, não é possível, em certos casos, conferir efetiva proteção à dignidade

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humana e aos direitos da personalidade senão através da imposição de uma sanção que constitua fator de desestímulo ou dissuasão de condutas semelhantes do ofensor, ou de terceiros que pudessem se comportar de forma igualmente reprovável. Não é possível contar apenas com a lei penal e com penas públicas para prevenir a prática de atentados aos direitos da personalidade. A lei tipicamente penal não tem como prever, em tipos delituosos fechados, todos os fatos que podem gerar danos injustos, razão pela qual muitas ofensas à dignidade humana e a direitos da personalidade constituem indiferentes penais e, por conseguinte, escapam do alcance da justiça criminal. Além disso, por razões diversas, nem sempre a sanção propriamente penal, oriunda de uma sentença penal condenatória, se mostra suficiente como forma de prevenção de ilícitos. Nesse contexto, a indenização punitiva constitui instrumento indispensável para a prevenção de danos aos direitos personalíssimos” (p. 169).

Assim é que o valor a ser arbitrado a título de danos morais deve

ter finalidade intimidativa, situando-se em patamar que represente inibição à

pratica de outros atos abusivos por parte da demandada, que insiste em

repassar aos consumidores de seus produtos e serviços ônus que somente

lhe cabe.

É imperioso que a Justiça dê aos infratores resposta eficaz ao

ilícito praticado, sob pena de se chancelar e estimular o comportamento

infringente. É a chamada utilização da “técnica do valor de desestímulo”.

A respeito desse tópico, vale trazer à colação os apontamentos

de Carlos Alberto Bittar, verbis:

"Com efeito, a reparação de danos morais exerce função diversa daquela dos danos materiais. Enquanto estes se voltam para recomposição do patrimônio ofendido, através da aplicação da fórmula danos emergentes e lucros cessantes, aqueles procuram oferecer compensação ao lesado, para atenuação do sofrimento havido. De outra parte, quanto ao lesante, objetiva a reparação impingir-lhe sanção, a fim de que não volte a praticar atos lesivos a outras pessoas. É que interessa ao direito e à sociedade que o relacionamento entre os

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entes que contracenam no orbe jurídico se mantenha dentro dos padrões normais de equilíbrio e respeito mútuo. Assim, em hipóteses de lesionamento, cabe ao agente suportar as conseqüências de sua atuação, desestimulando-se - com a atribuição de pesadas indenizações - atos ilícitos tendentes a afetar as pessoas. (...) Essa diretriz vem, de há muito tempo, sendo adotada na jurisprudência norte americana, em que cifras vultuosas têm sido impostas aos infratores, como indutoras de comportamentos adequados, sob os prismas moral e jurídico, nas interações sociais e jurídicas. Nesse sentido é que a tendência manifestada, a propósito pela jurisprudência pátria, de fixação de valor de desestímulo como fator de inibição a novas práticas lesivas. Trata-se, portanto, de valor que, sentido no patrimônio do lesante, o possa conscientizar-se de que não deve persistir na conduta reprimida, ou então, deve afastar-se da vereda indevida por ele assumida, ou, de outra parte, deixa-se para a coletividade, exemplo expressivo da reação que a ordem jurídica reserva para infratores nesse campo, e em elemento que, em nosso tempo, se tem mostrado muito sensível para as pessoas, ou seja, o respectivo acervo patrimonial”

Vê-se, pois, que a condenação pleiteada tem caráter

eminentemente punitivo. O pedido de condenação por dano moral coletivo

nada mais é do que a pretensão de se estabelecer uma sanção de natureza

civil por ofensa a direitos coletivos ou difusos.

Conclui-se que, embora a afetação negativa do estado anímico

da massa de consumidores lesados possa ocorrer, em face dos mais diversos

meios de ofensa a direitos difusos e coletivos, a configuração do chamado

dano moral coletivo é absolutamente independente desse pressuposto.

Leonardo Roscoe Bessa dedica-se ao tema em artigo

publicado na Revista de Direito do Consumidor nº 59, RT, 2007, cuja

apresentação é a que segue: “O presente ensaio busca delinear o denominado dano moral coletivo. O objetivo principal é destacar que sua configuração independe de qualquer afetação ou abalo à integridade psicofísica da coletividade (...)”

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E, ao final, conclui o mesmo autor:

“Assim, é método impróprio buscar a noção de dano moral coletivo a partir do conceito, ainda problemático, de dano moral individual. Mais impróprio ainda é trazer para a discussão o requisito relativo à necessidade de afetação da integridade psíquica, pois até mesmo nas relações privadas individuais está se superando, tanto na doutrina como nos tribunais, a exigência de dor psíquica para caracterizar o dano moral.” (grifamos)

Nem se objete que condenações de tal jaez, qual seja, de função

punitiva, gere enriquecimento sem causa, já que o valor pleiteado não se

reverterá em benefício do autor coletivo, mas será convertido em benefício da

própria comunidade, posto que será destinado ao Fundo referido pelo art. 13

da LACP.

No sentido dos arrazoados acima expostos, colham-se as

recentes decisões do E. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, verbis:

“AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AGÊNCIA BANCÁRIA. INEXISTÊNCIA DE CAIXA CONVENCIONAL NO ANDAR TÉRREO, PARA ATENDIMENTO PRIORITÁRIO DE PESSOAS IDOSAS, PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E GESTANTES. DESCUMPRIMENTO DA LEI 10.098/2000 E DA LEI ESTADUAL 4.374/04. O MINISTÉRIO PÚBLICO, POR FORÇA DOS ARTIGOS 127 E 129, III, DA CF, 81 E 82, DA LEI 8.078/90 (CDC) E DO ARTIGO 1º, DA LEI 7.347/85, TEM LEGITIMIDADE PARA ATUAR NA DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS, QUE SE CARACTERIZAM COMO DIREITOS TRANSINDIVIDUAIS, DE NATUREZA INDIVISÍVEL, ASSIM COMO DOS INTERESSES OU DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS, DECORRENTES DE ORIGEM COMUM. PRESENTE O INTERESSE JURÍDICO, CONSUBSTANCIADO NO BINÔMIO NECESSIDADE – UTILIDADE DO PROVIMENTO JURISDICIONAL. A RELEVÂNCIA SOCIAL DO BEM JURÍDICO EM DISCUSSÃO, QUE INTERESSA A TODA COLETIVIDADE, E ESPECIALMENTE ÀQUELES GRUPOS DE PESSOAS, TORNA INDISPONÍVEIS OS INTERESSES INDIVIDUAIS. DANO MORAL COLETIVO CONFIGURADO, INDEPENDENTEMENTE DA PROVA DA CULPA, BASTANDO A VIOLAÇÃO DE DIREITOS DIFUSOS E COLETIVOS.

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A SANÇÃO PECUNIÁRIA TEM CARÁTER PUNITIVO. O SEU VALOR DEVE SER ARBITRADO MODERADAMENTE, PROPORCIONALMENTE ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO FATO. INDENIZAÇÃO A SER REVERTIDA AO FUNDO ESTADUAL PREVISTO NO ARTIGO 13, DA LEI 7.347/85. DANO MORAL REDUZIDO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CIVEL, entre as partes acima mencionadas. ACORDAM os Desembargadores que compõem a 7ª Câmara Cível, por UNANIMIDADE de votos, em negar provimento ao agravo retido, rejeitar as preliminares e dar parcial provimento ao recurso.” GRIFEI (SÉTIMA CÂMARA CÍVEL - APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.001.64608 - RELATOR: DES. CARLOS C. LAVIGNE DE LEMOS – Julgamento: 19/08/2009)

“Apelações cíveis. Ação coletiva de consumo movida pelo Ministério Público. Publicidade enganosa em empréstimo pessoal consignado para aposentados e pensionistas do INSS. Omissão de informe sobre a taxa de juros praticada e outros encargos. Garantia de acesso ao Judiciário. Direito do consumidor, considerado vulnerável, de amplo acesso à Justiça representado pelo MP (inteligência dos arts. 4º I c.c 6º VII e 82 I CDC). Violação dos princípios da informação, da transparência, e dos deveres anexos à boa-fé objetiva. Publicidade enganosa por omissão. Mídia televisiva, impressa e radiofônica. Percentual da taxa de juros e demais encargos, valor total do empréstimo e periodicidade do pagamento que deveriam constar na publicidade de forma clara, objetiva e em igual destaque às demais informações relativas ao contrato de empréstimo. Inteligência do art. 31, dos parágrafos 1º e 3º do art. 37 e dos parágrafos 3º e 4º do art. 54 CDC. Sentença que determinou que a informação sobre a taxa de juros venha em destaque da mesma forma que as demais informações concernentes ao contrato de empréstimo consignado. Correção. Indenização por danos materiais e morais individuais e danos morais coletivos. Pedido regular e legalmente feito na vestibular. Possibilidade à inteligência do art. 3º da Lei 7347/85 e dos arts. 6º VI e VII da Lei 8078/90, na forma dos arts. 95 e 97 desta última. Dano material individual a ser apurado em liquidação ocasião em que o consumidor deverá comprová-lo. Dano moral individual que, na mesma senda, é devido em função da angústia e sofrimento impostos aos aposentados pela enganosidade, ludíbrio e abusividade gerados pela publicidade enganosa. Dano moral coletivo, a ser revertido para o Fundo de Reconstituição de Bens Lesados, que, de caráter preventivo-pedagógico, visa a banir da sociedade mal formada e mal informada, comportamentos antiéticos. Inteligência do Dec. 92302/86, Dec. 1306/94 e Lei 9008/95. Responsabilização do fornecedor pelos danos material e moral individuais. Condenação em valor certo pelo dano moral coletivo. Desprovimento do primeiro apelo. Provimento do recurso do MP. Vistos, relatados e discutidos estes

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autos das apelações cíveis referidas em que são partes as acima indicadas, ACORDAM os Desembargadores da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em NEGAR PROVIMENTO ao primeiro apelo e DAR PROVIMENTO ao segundo, na forma do voto do Relator.” GRIFEI (5ª Câmara Cível - Apelação Cível nº: 2009.001.05452 - Relator: Des. Cristina Tereza Gaulia – Julgamento:24/06/2009)

A tese supra vindicada é tão séria e incisiva que o Superior

Tribunal de Justiça vem modificando seu entendimento, senão vejamos,

verbis:

DANO MORAL COLETIVO. PASSE LIVRE. IDOSO. A concessionária do serviço de transporte público (recorrida) pretendia condicionar a utilização do benefício do acesso gratuito ao transporte coletivo (passe livre) ao prévio cadastramento dos idosos junto a ela, apesar de o art. 38 do Estatuto do Idoso ser expresso ao exigir apenas a apresentação de documento de identidade. Vem daí a ação civil pública que, entre outros pedidos, pleiteava a indenização do dano moral coletivo decorrente desse fato. Quanto ao tema, é certo que este Superior Tribunal tem precedentes no sentido de afastar a possibilidade de configurar-se tal dano à coletividade, ao restringi-lo às pessoas físicas individualmente consideradas, que seriam as únicas capazes de sofrer a dor e o abalo moral necessários à caracterização daquele dano. Porém, essa posição não pode mais ser aceita, pois o dano extrapatrimonial coletivo prescinde da prova da dor, sentimento ou abalo psicológico sofridos pelos indivíduos. Como transindividual, manifesta-se no prejuízo à imagem e moral coletivas e sua averiguação deve pautar-se nas características próprias aos interesses difusos e coletivos. Dessarte, o dano moral coletivo pode ser examinado e mensurado. Diante disso, a Turma deu parcial provimento ao recurso do MP estadual. REsp 1.057.274-RS, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 1º/12/2009.(grifos nossos)

Não sendo aceita a tese de existência de dano extrapatrimonial

tal como afirmado no presente pleito, decerto toda a sociedade estaria gravemente ameaçada. Explica-se: nos dias coevos, as relações de

consumo são de massa, sendo certo que algumas práticas abusivas, do ponto

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de vista individual, são economicamente insignificantes, o que (é fato!)

desmotiva o consumidor a buscar reparação dos danos. Assim, sem o

instrumento ora invocado, em função do baixo número de pessoas buscando

individualmente a reparação dos seus direitos, se consolidaria a absurda

situação de que, para os fornecedores, seria vantajoso perpetuar a incúria de

seu atuar, o que se afigura inadmissível.

Os danos morais à coletividade causados neste caso concreto,

portanto, restam evidentes, devendo ser emitido provimento jurisdicional à

altura da repercussão social alcançada pelo teor depreciativo das condutas

empreendidas pelas demandadas, sendo o que se espera e se requer.

IV.3. DA TUTELA ANTECIPADA:

Diante da nítida abusividade e afronta às normas básicas da

relação de consumo na cobrança da TARIFA DE CADASTRO, em razão de

inúmeros consumidores arcarem com custos inerentes exclusivamente ao

fornecedor, imperiosa a concessão da tutela antecipada.

A prova inequívoca e verossimilhança do alegado estão

fundamentadas na documentação anexa.

Por outro lado, o dano irreparável ou de difícil reparação está

configurado nas inúmeras cobranças efetuadas pela Ré aos seus milhares de

consumidores, nos quais estarão incidindo a famigerada tarifa, de molde a

configurar excessiva desvantagem e prejuízo.

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Portanto, presentes os requisitos do art. 12 da Lei 7.347/85, bem

como no §3º do art. 84 do CDC, estão sobejamente demonstrados e a

intervenção do Poder Judiciário é imperiosa para garantir a justa aplicação e

cumprimento da legislação em vigor.

Há que se esclarecer que estamos diante de demanda

consumerista, consistente em pleito de obrigação de não fazer, logo, o

dispositivo normativo aplicável, de forma prioritária, deve ser o Código de

Defesa do Consumidor.

Socorrendo-nos do estatuto consumerista, verificamos que a

disposição atinente a antecipação dos efeitos da tutela pretendida está

encartada no art. 84, §3º, que assim dispõe:

“Art. 84.(...)

§3º. Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.”

Como se vê, a disposição contida no artigo citado é diferente

da regra geral estatuída no Código de Processo Civil, sendo certo que o CDC

se refere a RELEVANTE FUNDAMENTO DA DEMANDA e ao RECEIO DE INEFICÁCIA DO PROVIMENTO FINAL.

Com relação ao primeiro requisito, a doutrina é concorde em

apontar sua similitude com o fumus boni iuris (juízo de probabilidade

razoavelmente demonstrado). Não obstante, com relação ao segundo

requisito, não se pode dizer que este seja correspondente ao periculum in

mora.

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Segundo o magistério de RIZZATTO NUNES, o sentido da

expressão é o de “menos eficácia do que teria a decisão se não fosse concedida liminarmente”.2

Ora, é extreme de dúvidas que, quanto mais rápido cessar a

atividade abusiva do banco, de empreender cobranças de tarifa abusiva, mais

eficaz será a sentença final, já que até lá inúmeras lides individuais serão

evitadas, além do evidente alívio no orçamento dos tomadores de crédito,

vítimas da conduta rechaçada pela demanda, que não terão o custo efetivo na

concessão de crédito sensivelmente recrudescido.

V - PEDIDO:

Diante das razões acima expostas, requer a Vossa Excelência:

a) A concessão de liminar inaudita altera pars, a fim de

determinar a suspensão da cobrança de tarifa sob a rubrica

“tarifa de cadastro”, ou qualquer forma de encargo que incida

sobre pesquisa (ao SPC, SERASA, CCF, etc.), formação e/ou

atualização de bancos de dados cadastrais de seus

consumidores, em todas as operações comerciais realizadas

pela Requerida no território nacional;

b) A concessão de isenção de quaisquer custas ou despesas

processuais, por ser a Defensoria Pública do Estado,

instituição pública e permanente que garante o acesso à

2 Curso de Direito do Consumidor. Editora Saraiva. 2004: p. 715.

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Justiça na acepção da lei, defendendo-os em Juízo livre de

qualquer contribuição ou taxa, à vista do que dispõem o artigo

18 da Lei nº 7.347/85 e o artigo 87 da Lei nº 8.078/90

c) A citação da requerida para, querendo, contestar a presente

ação, sob pena de confissão e revelia, além de presunção de

veracidade dos fatos narrados na preambular;

d) Caso não seja cumprida a obrigação no prazo assinalado por

Vossa Excelência, seja cominada multa diária por prestação,

no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do artigo

461, § 5º, do CPC, c/c art. 84, § 4º, da Lei 8078/90;

Ao final, sejam julgados PROCEDENTES os pedidos,

confirmando-se a tutela antecipada eventualmente concedida para:

a) Declarar nula a clausula que veicula a contratação da

TARIFA DE CADASTRO, ou qualquer outra que institua

encargo que transfira para o consumidor os custos sobre

pesquisa (ao SPC, SERASA, CCF, etc.), formação e/ou

atualização de bancos de dados cadastrais de seus

consumidores, em contratos firmados pela ré em todo o

território nacional;

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b) Na remota hipótese de ser rechaçado o pedido retro,

subsidiariamente, requer seja emitido PRECEITO

CONDENATÓRIO consistente na obrigação de não fazer, de molde a que a ré se abstenha de impor, de forma

obrigatória, a contratação dos serviços veiculados pela

famigerada TARIFA DE CADASTRO;

c) Condenar a ré à devolução em dobro dos valores pagos a

título de “tarifa de cadastro”, nos termos do artigo 42, do

CDC, devendo a Ré publicar edital com vistas a habilitação

dos consumidores lesados;

d) Condenar a ré a indenizar os danos morais coletivos, a serem

determinados pelo prudente arbítrio desse MM. Juízo em

valor que sugerimos não inferior a R$ 1.000.000,00 (hum

milhão de reais), devendo este valor ser revertido ao Fundo

Estadual de Defesa do Consumidor ou, caso este não tenha

sido criado até a data do provimento final desta, seja o valor

revertido ao Fundo Nacional de Defesa do Consumidor;

e) Compelir a Ré a publicar edital em meio de comunicação, em

três jornais de grande circulação e emissora de radiodifusão,

com escopo de informar os consumidores deste Estado sobre

a suspensão da mencionada cobrança de tarifa de cadastro,

conforme dispõe o artigo 21, da Lei n. 7347/85 c/ art. 94, da

Lei n. 8078/90;

e) Condenar a Requerida ao pagamento das custas processuais

e honorários advocatícios, a serem revertidos para o CEJUR,

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através de depósito em conta vinculada ao órgão, nos termos da

lei 1146/87;

Requer, por derradeiro, a intervenção do Ministério Público para

acompanhar o presente feito na condição de custos legis ou, querendo, na

condição de litisconsorte ativo.

Protesta pela produção de todos os meios de provas em direito

admitidas, em especial, depoimento pessoal da parte ex adversa e

testemunhos, bem como outras formas moralmente legítimas e hábeis a

demonstrar a veracidade dos fatos.

Dá a causa o valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

Rio de Janeiro, 17 de abril de 2012.

FABIO SCHWARTZDefensor PúblicoMatr. 860.771-5

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