excelentÍssimo senhor doutor juiz de direito da vara cÍvel do...
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA __ VARA
CÍVEL DO FORO CENTRAL DA COMARCA DA REGIÃO
METROPOLITANA DE CURITIBA - PARANÁ.
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
PARANÁ, através da Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente, por
seu representante infra-assinado, usando das atribuições que lhe são conferidas,
vem à presença de Vossa Excelência, com fulcro nos artigos 129, inciso III e 225
da Constituição Federal e com fundamento nas Leis Federais n. 6.938/81 e n.
7.347/85, bem como demais leis estaduais e municipais pertinentes a espécie,
propor a presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL
com pedido de concessão liminar,
em face de ILSE APARECIDA ARTINI – RESTAURANTE - ME, pessoa
jurídica de direito privado, inscrita no CNPJ/MF sob o nº. 12.341.027.0001-27,
com sede na Avenida Anita Garibaldi, nº. 5.164, bairro Barreirinha, Curitiba-
Paraná, CEP 82.220-980, através de seu representante legal.
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1. FATOS
No dia 22 de novembro de 2012, foi protocolada
nesta Promotoria de Justiça de Proteção ao Meio Ambiente, reclamação a
respeito da casa noturna situada no prédio comercial ao lado do Posto de
Gasolina Arabian, com endereço na Avenida Anita Garibaldi, nº. 5.164, bairro
Barreirinha, nesta Capital, localizado em Zona Residencial 2 – ZR-2. A
reclamação foi feita através do Ofício nº. 091/12 da Ação Integrada de
Fiscalização Urbana – AIFU, pelo qual se encaminhou cópia do protocolo
11.696.845-2 da Secretaria de Segurança Pública, que solicitou à AIFU relatório
relacionado a abaixo-assinado que solicitava providências urgentes quanto ao
funcionamento da referida casa noturna.
O abaixo-assinado acima mencionado noticia que as
atividades desenvolvidas pela casa noturna, além de causar poluição sonora,
uma vez que não possui isolamento acústico adequado, tampouco infraestrura
para funcionar como danceteria, contribui, indiretamente, com a perturbação de
sossego dos moradores do entorno, uma vez que seus frequentadores
constantemente promovem arruaças, brigas, pichações, quebra de árvores,
depredações de patrimônio público, disparos de armas de fogo, bem como
consumo e venda de entorpecentes em frente ao estabelecimento e imediações,
colocando em risco a segurança dos moradores do entorno.
Além disso, consta na denúncia o consumo e venda
de bebidas alcoólicas a menores de 18 anos de idade, o que é proibido por Lei.
Foram realizadas denúncias pelo 156, 190 e 181,
conforme demonstram documentos anexos, onde são solicitadas fiscalizações
no posto de Gasolina Arabian, junto ao qual funciona a referida casa noturna.
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Além do que foi exposto, consta no procedimento de
protocolo nº. 07-003779/2012 da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, a
Autorização Ambiental de Funcionamento – AFU nº. 11005253, válida até
30/12/2012, dela destacando que “o desenvolvimento das atividades solicitadas
somente será permitido após a emissão de alvará de localização e funcionamento, bem
como após a obtenção de todos os documentos e licenças exigíveis, em atendimento ao
artigo 32 da Lei Municipal 11.095/2004”.
Ocorre que o estabelecimento vem exercendo suas
atividades sem o devido Alvará de Localização e Funcionamento.
Vale destacar que a requerida aparece no pólo
passivo de Ação Inibitória nº. 0002605-40.2011.8.16.0024, proposta pelo
Município de Almirante Tamandaré, na qual o Município alegava que a
requerida exercia suas atividades sem a documentação exigida pelas
autoridades locais. Tal processo foi julgado extinto, sem resolução de mérito,
uma vez que o estabelecimento comercial não mais se encontrava em
funcionamento, como pode ser observado pela consulta processual através da
ASSEJEPAR, datada de 23/04/2012.
Ressalta-se que o CNPJ 12.341.027/0001-27 utilizado
pela requerida para o exercício das suas atividades, como casa noturna, na
Avenida Anita Garibaldi, nº. 5.164, bairro Barreirinha, Curitiba-Paraná,
encontra-se cadastrado com endereço diverso e no Município de Almirante
Tamandaré.
Isto posto e considerando a Informação da Ação
Integrada de Fiscalização Urbana – AIFU (anexa), em resposta ao despacho nº.
5453/2012 do gabinete do Subcomandante-Geral da PMPR, que descreve uma
série de ações realizadas tanto pela Secretaria Municipal do Urbanismo como
pela Polícia Militar do Paraná, no sentido de paralisar as atividades do referido
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estabelecimento sem qualquer resultado efetivo e, considerando que o
estabelecimento comercial permanece em atividade sem Alvará de Localização
e Funcionamento, contrariando as determinações do Poder Público que,
conforme pode ser observado pelos documentos anexos, esgotou com suas vias
de ação, não resta outra alternativa senão a propositura da presente Ação Civil
Pública como medida que se impõe.
2. O DIREITO
Buscando proteger a qualidade de vida, a
dignidade e bem-estar, a Constituição Federal de 1.988, pela primeira vez na
história da República Federativa do Brasil, dedicou um Capítulo exclusivo ao
meio ambiente, possibilitando ao Poder Público e à coletividade os meios
necessários para a tutela desse bem comum do povo. Definindo princípios e
regras a serem seguidos, dentre eles o Princípio do Meio Ambiente
Ecologicamente Equilibrado e Essencial à Sadia Qualidade de Vida, o caput do
artigo 225 da Constituição Federal, assim dispôs:
“Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações”.
Destaca-se, que quando se fala em meio ambiente em
um sentido mais amplo, entende-se como sendo “tanto o meio ambiente
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natural, quanto o cultural e, ainda, o urbano (ou artificial)”, conforme se extrai
da obra Direito Ambiental e Questões Relevantes 1.
Além do dispositivo constitucional supracitado, outros
artigos do mesmo texto legal evidenciam a opção do legislador em considerar a
preservação do meio ambiente como um dos pilares fundamentais da ordem
constitucional, tais como o artigo 5º, inciso XXIII da Magna Carta: “a propriedade
atenderá a sua função social” e ainda:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar
a todos existência digna, conforme os ditames da justiça
social, observados os seguintes princípio:
[...]
III - função social da propriedade;
[...]
VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
serviços e de seus processos de elaboração e prestação;
[...].
E
Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada
pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais
fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o
bem- estar de seus habitantes.
1 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. Fundamentos de Direito Ambiental no Brasil. In CUSTÓDIO, Helita Barreira. Direito Ambiental: e questões relevantes. Campinas : Millennium Editora, 2005.
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§ 1º - O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal,
obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o
instrumento básico da política de desenvolvimento e de
expansão urbana.
§ 2º - A propriedade urbana cumpre sua função social quando
atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade
expressas no plano diretor.
Sendo assim, de acordo com o artigo 39 da Lei
10.257/2001, sobre o Plano Diretor, entende-se que:
Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social
quando atende às exigências fundamentais de ordenação da
cidade expressas no plano diretor, assegurando o
atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à
qualidade de vida, à justiça social e ao
desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas
as diretrizes previstas no art. 2o desta Lei. (grifo nosso)
Eros Roberto Grau enfatiza que “as propriedades são
poderes que se exercitam, não exclusivamente e no interesse de seus titulares, mas
também de terceiros dentro de uma linha de prudente arbítrio”2.
Desta forma, no que tange às diretrizes previstas no
artigo 2º da referida Lei, tem-se que:
2 GRAU, Eros Roberto. Direito Urbano, São Paulo, RT, 1988, p. 132. In MEDAUAR, Odete; ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de. Estatuto da Cidade: Lei 10.257 de 10.07.2001. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 140.
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Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e da
propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:
[...];
VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a
evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou
inconvenientes;
[...]. (grifo nosso)
Com isso, demonstra-se que a requerida vem
continuamente descumprindo tais dispositivos constitucionais, uma vez que,
além de manter o exercício de suas atividades irregular, contribui diretamente,
com a poluição sonora advinda do som emitido da própria casa noturna, bem
como indiretamente, através do barulho, algazarra, rachas com carros e demais
ruídos provocados por seus frequentadores e que perturbam o sossego e a
segurança dos moradores do entorno.
Sobre a aventada poluição sonora, ao contrário do que
muitos julgam ser verdade, não é apenas um problema de desconforto acústico,
ela é configurada como o excesso de ruído capaz de produzir mal estar ou
problemas de saúde ao ser humano.
Nos grandes e médios centros urbanos a poluição sonora e
o excesso constante de uma série de ruídos é um problema vivenciado pelos
cidadãos e para o qual o direito não pode ficar indiferente.
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Existem muitas formas de poluição, cada qual com seus
efeitos danosos ao meio ambiente, muitas vezes trazendo gravíssimos danos ao
ambiente humano.
O barulho excessivo é causa não somente de problemas na
audição, mas como causador do estresse em todo o sistema circulatório,
respiratório e digestivo podendo provocar dores de cabeça, cansaço e elevação
da pressão arterial, além da insônia, podendo interferir no aprendizado de
crianças e até mesmo afetar uma criança por nascer.
O ruído possui a natureza jurídica de um agente poluente,
porém cumpre considerar que sua área de contaminação afeta principalmente o
ser humano, e que, mesmo cessada a produção de ruídos, seus efeitos
continuam muitas vezes por toda a vida da pessoa exposta a este tipo de
poluição.
Neste sentido, a Lei Federal nº. 6.938/81, que institui a
Política Nacional do Meio Ambiente, assim dispõe:
Art 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
[...]
II - degradação da qualidade ambiental, a alteração
adversa das características do meio ambiente;
III - poluição, a degradação da qualidade ambiental
resultante de atividades que direta ou indiretamente:
a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da
população;
b) criem condições adversas às atividades sociais e
econômicas;
[...]
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O Estado do Paraná, na edição de sua Constituição,
dedicou capítulo especial à questão ambiental, garantindo a defesa do meio
ambiente e da qualidade de vida do povo paranaense, importância esta que se
extrai do contido na redação do artigo 207, in verbis:
“Artigo 207 - Todos tem direito ao meio ambiente
ecologicamente equilibrado, bem de uso comum e essencial à
sadia qualidade de vida, impondo-se ao Estado, aos Municípios e
à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as
gerações presentes e futuras, garantindo-se a proteção dos
ecossistemas e o uso racional dos recursos ambientais.
[...]
§2º. As condutas e atividades poluidoras ou consideradas lesivas
ao meio ambiente, na forma da lei, sujeitarão os infratores,
pessoas físicas ou jurídicas:
I - a obrigação de, além de outras sanções cabíveis, reparar os
danos causados; ”
No âmbito Municipal, a Lei n°. 10.625/02 traz a seguinte
definição de poluição sonora:
Art. 2º - Para os efeitos desta lei, aplicam-se as seguintes
definições:
I - SOM: vibração acústica capaz de provocar sensações
auditivas.
II - RUÍDO: som capaz de causar perturbação ao sossego público
ou efeitos psicológicos e fisiológicos negativos em seres humanos
e animais.
III - VIBRAÇÃO: movimento oscilatório transmitido pelo solo
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ou por uma estrutura qualquer.
IV - POLUIÇÃO SONORA: emissão de som ou ruído que
seja, direta ou indiretamente, ofensivo ou nocivo à saúde,
à segurança e ao bem estar da coletividade ou transgrida
as disposições fixadas nesta lei. (grifo nosso)
E ainda:
Art. 1º - É proibido perturbar o sossego e o bem estar público com
sons, ruídos e vibrações que causem incômodo de qualquer
natureza ou que ultrapassem os limites fixados nesta Lei.
Parágrafo único – as vibrações serão consideradas prejudiciais
quando ocasionarem danos materiais, à saúde e ao bem estar
público.
Na mesma direção segue Washington de Barros Monteiro,
ao tratar do uso nocivo da propriedade, ressalta:
“O legislador tutela o sossego, que advém da calma, da
tranqüilidade e da quietação. A poluição sonora provoca
distúrbios no organismo, diminuição do trabalho intelectual e
cansaço físico. Neutralizando o repouso, impede que
recuperemos nossas forças e energias”.3
Os problemas decorrentes do excesso de ruído, atingindo
níveis excessivos estão incluídos entre os sujeitos ao controle da poluição
ambiental, cuja normatização e estabelecimento de padrões compatíveis com o
meio ambiente equilibrado e atribuído ao CONAMA - Conselho Nacional do
3 MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. v. 3, 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
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Meio Ambiente, de acordo com o disposto no inciso II do artigo 6º da Lei
6.938/1981:
Art 6º - Os órgãos e entidades da União, dos Estados, do
Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as
fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela
proteção e melhoria da qualidade ambiental, constituirão o
Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, assim
estruturado
II - órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio
Ambiente (CONAMA), com a finalidade de assessorar, estudar e
propor ao Conselho de Governo, diretrizes de políticas
governamentais para o meio ambiente e os recursos naturais e
deliberar, no âmbito de sua competência, sobre normas e padrões
compatíveis com o meio ambiente ecologicamente equilibrado e
essencial à sadia qualidade de vida.
A Resolução 1/90 do CONAMA - Conselho Nacional do
Meio Ambiente prevê:
I - A emissão de ruídos, em decorrência de quaisquer atividades
industriais, comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de
propaganda política, obedecerá no interesse da saúde, do sossego
público, aos padrões, critérios e diretrizes estabelecidos nesta
Resolução;
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II - São prejudiciais à saúde e ao sossego público, para os fins do
item anterior, os ruídos superiores aos considerados aceitáveis
pela NBR 10.152, Avaliação de Ruídos em Áreas Habitadas -
visando ao conforto da comunidade - da Associação Brasileira de
Normas Técnicas - ABNT.
(...)”
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), o início
do estresse auditivo humano se dá à exposição de 55 dB (A), acima desse índice
nosso organismo começa a sentir os reflexos causados pela poluição sonora.
No presente caso, o estabelecimento encontra-se
localizado em Zona Residencial 2 – ZR-2, local que, segundo Lei Municipal
9.800/2000, Quadro IV (parâmetros de uso e ocupação do solo), não permite as
atividades de discoteca, danceteria e boate.
No entanto, em razão do local estar inserido no Sistema
Viário Setorial, existe a previsão de uso dessas atividades, porém isso não
significa que os moradores do entorno tenham que suportar o ônus das
atividades da requerida.
Vale ressaltar, que o empreendimento localiza-se ao lado
do Posto de Gasolina Arabian, onde os freqüentadores da requerida
frequentemente permanecem fumando e consumindo bebidas alcoólicas,
contrariando o disposto pela Lei nº. 11.582/2005, segundo a qual proíbe o
consumo de bebidas alcoólicas na área do posto, extraindo-se:
Art. 1º Fica permitida a comercialização de bebidas alcoólicas
nas lojas de conveniências e "self service" instaladas nos postos
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de combustíveis da Capital, sendo vedado o consumo em
toda a extensão da área abrangida pelo posto.
É oportuno que se analise as modalidades de reparação do
dano ambiental, uma vez que muitas vezes não basta indenizar, mas fazer
cessar o mal e retomar a tranqüilidade. Este é, pois, o caso em questão, onde os
vizinhos do estabelecimento comercial da requerida se encontram terrivelmente
incomodados com as festas e algazarras noturnas, perturbando-lhes o sono,
neutralizando-lhes o repouso e impedindo que se recuperem após suas jornadas
diárias. Frise-se que a audição é o único sentido do corpo humano que não
descansa nem enquanto dormimos.
A atividade poluente acaba sendo uma apropriação pelo
poluidor dos direitos de outrem, pois na realidade a emissão poluente
representa um confisco do direito de alguém à um ambiente sadio, livre de
qualquer poluição.
O que se procura com a presente demanda é proporcionar
uma sadia qualidade de vida aos moradores vizinhos do estabelecimento
requeirda, permitindo que todos tenham direito ao meio ambiente que assegure
condições de saúde, bem-estar e de segurança.
Frise-se Excelência, que a violação ao direito no presente
caso ultrapassa a seara dos direitos individuais, atingindo assim a coletividade,
pois como já foi acima explicitado, a poluição sonora atinge a todos que a ela
ficam expostos. Tal fator encontra-se inclusive comprovado pela presença de
abaixo-assinado dos moradores vizinhos, os quais se sentem incomodados.
Considerando o exposto juntamente com a documentação
anexa, pede-se pelo provimento da presente ação, com o intuito de proteger os
moradores vizinhos e prevenir que danos ainda maiores sejam causados.
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A Lei Municipal n. 9.800/00 em seus artigos 36 e 38
dispõem:
“Art. 36 - As atividades urbanas constantes das categorias de
uso comercial, de serviços, e industrial para efeito de aplicação
desta lei classificam-se:
[...]
II - quanto à natureza, em:
[...]
incômodas – as que possam produzir ruídos, trepidações,
gases, poeiras, exalações ou conturbações no tráfego que
possam causar incômodos à vizinhança;
[...].
No que tange a previsão de imposição de sanção a quem
pratica poluição sonora, o artigo 42 do Decreto-lei n. 3.688/1941 – Lei das
Contravenções Penais dispõe:
Art. 42 – Perturbar alguém, o trabalho ou o sossego alheios:
I – com gritaria ou algazarra;
II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com
as prescrições legais;
III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido
por animal de que tem guarda:
Pena – prisão simples, de 15 (quinze) dias a 3 (três) meses, ou
multa.
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Manifesto está, que as atividades da requerida são
incômodas e nocivas à saúde dos moradores da região, devendo, portanto
cessar a causa que provoca a perturbação da tranquilidade da população
moradora dos arredores do estabelecimento em questão, inclusive com relação
à segurança de todos.
No que tange à segurança, esta diz respeito ao
afastamento de qualquer perigo patrimonial ou pessoal da área de moradia. Ou
seja, se o uso nocivo de propriedade vier a comprometer a integridade
patrimonial de qualquer dos vizinhos, estes últimos têm o direito de recorrer ao
aparelho judicial a fim de buscar proteção.
Nesse sentido vale ressaltar que por diversas vezes os
moradores da região efetuaram telefonemas à Polícia Militar em razão da
perturbação de sossego e do barulho excessivo vindo das atividades da casa
noturna.
Assim, objetiva-se com esta petição, proporcionar um
meio ambiente mais saudável e seguro aos moradores vizinhos do
estabelecimento comercial da requerida, apenas defendendo e garantindo o
preceito constitucional de se viver em um meio ambiente sadio e livre de
qualquer meio poluente.
3. O DANO MORAL AMBIENTAL
O dano moral ambiental coletivo, hoje perfeitamente
aceito pela nossa doutrina e jurisprudência, tem como principal aplicação os
casos de danos ambientais.
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Em se tratando de direito ambiental a repercussão dos
danos se reflete no cível, no crime e administrativamente. Trata-se de esferas
independentes entre si, mas todas importantes quanto aos objetivos que visam.
No cível a reparação pode ser não apenas dos danos
materiais, mas também morais, estes são compensáveis e aqueles indenizáveis.
Dizem-se indenizáveis aqueles danos em que a vítima
pode ser restituída ao estado anterior à ocorrência do dano. Já os compensáveis
são aqueles em que a vítima não tem como ser restituída ao estado em que se
encontrava antes, porém, lhe é entregue certa quantia em dinheiro ou coisa
como forma de amenizar o ocorrido.
Na aplicação do dano moral ambiental deve ser
considerado e interpretado de forma sistêmica o artigo 225 da Constituição
Federal com o ordenamento jurídico, pois ocorrendo lesão ao equilíbrio
ecológico, este afetará a sadia qualidade de vida e à saúde da população.
Rompido o equilíbrio do ecossistema todos correm riscos.
Nesta seara é o ensinamento do ilustre jurista, Dr. Carlos
Alberto Bittar, Procurador do Estado de São Paulo - Doutor em Direito pela
Universidade de São Paulo:
“A nosso ver, um dos exemplos mais importantes de dano moral
coletivo é o dano ambiental, que consiste não apenas na lesão ao
equilíbrio ecológico, mas também na agressão à qualidade de vida
e à saúde. É que esses valores estão intimamente inter-
relacionados, de modo que a agressão ao ambiente afeta
diretamente a saúde e a qualidade de vida da comunidade (CF,
art. 225).” 4
4 BITTAR, Carlos Alberto. Reparação Civil por Danos Morais. São Paulo: RT, 1994, p. 202.
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Coaduna com este posicionamento o jurista italiano Carlo
Castronovo, para quem o “'ambiente', como 'paisagem', como 'habitat', como 'belezas
naturais', é categoria relacional que exprime a mútua colocação de uma série de elementos
que, em seu conjunto, constituem um valor que transcende a sua mera soma, valor esse
que não pode ser traduzido mediante parâmetros econômicos”. 5
A jurisprudência tem adotado e concedido à compensação
por danos morais em matéria ambiental:
“Poluição Ambiental. Ação Civil Pública formulada pelo
Município do Rio de Janeiro. Poluição consistente em supressão
da vegetação do imóvel sem a devida autorização municipal.
Cortes de árvores e início de construção não licenciada, ensejando
multas e interdição do local. Dano à coletividade com a destruição
do ecossistema, trazendo conseqüências nocivas ao meio
ambiente, com infringência, às leis ambientais, Lei Federal
4.771/65, Decreto Federal 750/93, artigo 2º, Decreto Federal
99.274/90, artigo 34 e inciso XI, e a Lei Orgânica do Município
do Rio de Janeiro, artigo 477. Condenação à reparação de danos
materiais consistentes no plantio de 2.800 árvores, e ao
desfazimento das obras. Reforma da sentença para inclusão do
dano moral perpetrado a coletividade. Quantificação do dano
moral ambiental razoável e proporcional ao prejuízo coletivo. A
impossibilidade de reposição do ambiente ao estado anterior
justificam a condenação em dano moral pela degradação
ambiental prejudicial à coletividade. Provimento do recurso.”
(TJRJ - 2. ª Câmara Cível - Apelação Cível n.º 2001.001.14586 -
Rel.: Des. Maria Raimunda T. de Azevedo - J. 07/08/2002)
5 CASTRONOVO, Carlo. La Nuova Responsabilità Civile - Regola e Metáfora. Milão: Giuffrè, 1991, pp. 161 – 162.
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“DANO AO MEIO AMBIENTE. DERRAMAMENTO DE
ÓLEO NA BAÍA DE GUANABARA. RESSARCIMENTO DE
DANOS MATERIAIS E MORAIS. DANO EMERGENTE.
LUCRO CESSANTE. DANO MORAL DE PESSOA
JURÍDICA. POLUIÇÃO NAS PRAIAS. PREJUÍZO DO
COMÉRCIO LOCAL. DESVALORIZAÇÃO DO PONTO
COMERCIAL. 1. Comprovado o dano ao meio ambiente,
decorrente do vazamento de óleo na baía de Guanabara,
proveniente das instalações da empresa, cabe o pedido de
reparação dos prejuízos individualmente causados. 2. É da
PETROBRÁS o dever de cuidar para que não ocorra qualquer
dano ao meio ambiente. 3. Dano é o gênero, do qual são espécies o
dano material e o dano moral. 4. O dano material, por seu turno,
se subdivide em danos emergentes e lucros cessantes. 5. Dano
emergente é o que importa em efetiva diminuição no patrimônio
da vítima, em razão do ato ilícito. 6. Lucro cessante é o reflexo
futuro no patrimônio da vítima. 7. A honra subjetiva é exclusiva
do ser humano e se caracteriza pelo decoro e auto-estima. 8. A
honra objetiva é comum à pessoa natural e à pessoa jurídica e se
reflete na reputação, no bom nome e na imagem perante a
sociedade. 9. Desprovimento dos recursos.” (TJRJ - 8.ª Câmara
Cível - Apelação Cível n.º 2002.001.09351 - Rel.: Desa. Letícia
Sardas - J. 17/12/2002)
É o teor do artigo 3º da lei 7.347/85 - Lei de Ação Civil
Pública:
“Art. 3º - A ação civil pública poderá ter por objeto a condenação
em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer ou não
fazer.”
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Em comentários ao referido artigo dizem Nelson Nery
Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:
“1. Condenação em dinheiro. A aferição do quantum
indenizatório nas ações coletivas com a finalidade de reparação
do dano difuso ou coletivo é questão de difícil solução. Poderão
ser utilizados os critérios de arbitramento ou de fixação da
indenização com base no valor do lucro obtido pelo causador do
dano com sua atividade. É possível a cumulação da indenização
por danos patrimoniais e morais (STJ 37; CDC 6º VI).”6
A poluição sonora, por ser causadora de estresse, interfere
na vida social, profissional, emocional, afetiva e familiar das pessoas as quais
atinge, provocando danos morais também nessas esferas, danos esses, às vezes,
irremediáveis. Nesse sentido, cabe ressaltar que todos os prejuízos concernentes
ao desassossego, insalubridade e até mesmo insegurança, a que se sujeitam as
vítimas das perturbações acústicas, inserem-se na seara dos danos morais,
sendo passíveis de indenização.7
Desta feita, verifica-se a possibilidade de se impor à
requerida, o pagamento pelos danos morais sofridos até então pela coletividade
e aqueles que possam vir a ocorrer. Pois, a poluição sonora, como já falado
causa prejuízos à saúde.
6 JÚNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação civil extravagante em vigor. São Paulo: Malheiros. 5ª ed.. p. 1529. 7 CARNEIRO, Waldir de Arruda M. Perturbações sonoras nas edificações urbanas. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
20
4. A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
A inversão do ônus da prova é perfeitamente cabível no
caso em discussão. O artigo 21 da Lei 7.347/85 determina que se aplicam à
defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que tenha
cabimento, os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.
O artigo 6º, inciso VIII da Lei 8.078/90 é expresso ao
admitir a inversão do ônus da prova em causa fulcrada no Código de Defesa do
Consumidor, na medida em que hipossuficiente o autor, segundo as regras
comuns da experiência como bem esclarece o texto legal, in verbis:
Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
[...]
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a
inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil,
quando, a critério do Juiz, for verossímil a alegação ou quando
for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de
experiência;(...)
Tal dispositivo, certamente, tem aplicação também no âmbito de
proteção ao meio ambiente, pois o Ministério Público quanto do ajuizamento de
Ações Civis Públicas está em franca desvantagem perante o demandado. Assim
entende a jurisprudência dominante:
EMENTA: O instituto da inversão do ônus da prova,
independentemente do título em que esta disposto no Código de
Defesa do Consumidor, pode ser aplicado nas ações civis
publicas, desde que as circunstancias fáticas assim o autorizem.
(TJPR, Processo: 334622-7/01, Agravo Regimental Cível, Órgão
21
Julg.: 5ª. Câmara Cível, Relator: Desembargador Leonel Cunha,
22.05.2006)
No que tange à responsabilidade pelo demandado ao
pagamento das respectivas custas, manifestou-se a jurisprudência:
7.3.2. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E A
ATRIBUIÇÃO DOS CUSTOS DA PERÍCIA PELO
DEMANDADO. Admissibilidade nas demandas que envolvam
a proteção ao meio ambiente. Ministério Público e demais co-
legitimados ao ajuizamento de ações civis públicas que estão em
franca desvantagem perante os demandados.
Ementa: Tratando-se de demanda que envolva a proteção ao
meio ambiente, é cabível a inversão do ônus da prova e a
atribuição dos custos da perícia, pois o Ministério Público e
demais co-legitimados ao ajuizamento de ações civis públicas
estão em franca desvantagem perante os demandados. Edcl
70002338473 - 4ª Cam. Civ. - TJRS - j. 04.04.2001 - rel. Des
Wellington Pacheco Barros.8
E ainda:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. AGRAVO
DE INSTRUMENTO. PROVA PERICIAL. INVERSÃO DO
ÔNUS. ADIANTAMENTO PELO DEMANDADO.
DESCABIMENTO. PRECEDENTES.
I - Em autos de ação civil pública ajuizada pelo Ministério
Público Estadual visando apurar dano ambiental, foram
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deferidos, a perícia e o pedido de inversão do ônus e das custas
respectivas, tendo a parte interposto agravo de instrumento
contra tal decisão.
II - Aquele que cria ou assume o risco de danos ambientais tem o
dever de reparar os danos causados e, em tal contexto, transfere-
se a ele todo o encargo de provar que sua conduta não foi lesiva.
III - Cabível, na hipótese, a inversão do ônus da prova que, em
verdade, se dá em prol da sociedade, que detém o direito de ver
reparada ou compensada a eventual prática lesiva ao meio
ambiente - art. 6º, VIII, do CDC c/c o art. 18, da lei nº 7.347/85.
IV - Recurso improvido. (STJ. REsp 1049822/RS. Rel. Min.
Francisco Falcão. Primeira Turma. Julg: 23/04/2009)
Tem-se, portanto, o cabimento da inversão do ônus da
prova.
5. A CONCESSÃO DE LIMINAR
Conforme autorizado pelo artigo 12 da Lei n. 7.347/85:
“Poderá o juiz conceder mandado liminar com ou sem justificação prévia,...”.
O “fumus boni iuris”, que é a existência e ocorrência do
direito substancial invocado por quem pretende a segurança, está claramente
demonstrado pelos documentos que acompanham a presente e, pela legislação
citada, notadamente a insistência da requerida em permanecer funcionando ,
ainda que causando tantos incômodos à população do entorno, e não conte com
as devidas licenças e documentos necessários para seu funcionamento.
8 Revista de Direito Ambiental, Coordenação: Antônio Herman V. Benjamin e Édis Milaré. Editora Revista dos Tribunais. Ano 6, n. 23, julho-setembro de 2001.
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Por outro lado, se for possibilitado à requerida que
continue com sua atividade, danosa, enquanto perdurar o processo, estar-se-á
permitindo a continuação de uma atividade extremamente prejudicial aos
moradores da região e comprovadamente ilegal, em detrimento ao bem-estar e
à saúde de um sem número de pessoas que vivem nos arredores do
estabelecimento. Aí reside o “periculum in mora”
Disso resulta a necessidade da concessão da medida
liminar, “inaudita altera parts”, sem necessidade de justificação prévia, requer-se
assim, seja determinado a interdição total das atividades do estabelecimento,
bem como a imediata interrupção dos serviços de água e luz do local sob o
número de inscrição imobiliária 5220001043801-6, com número de matrícula
na Sanepar nº. 14330690 e Unidade Consumidora do Copel nº. 91390591,
conforme solicitado pela própria AIFU (item “a” Informação AIFU anexo),
com base no Art. 11 da Lei 7.347/85, com a imposição de multa diária, em valor
a ser arbitrado por Vossa Excelência, pelo descumprimento do preceito.
Requer-se ainda a Vossa Excelência, em concedendo
a liminar, que determine à Secretaria Municipal do Meio Ambiente e ao
Comando Geral da Polícia Militar do Paraná, para que fiscalize o cumprimento
da ordem, apontando ao juízo eventuais violações para a apuração de multa
diária e a requisição de força policial, se necessário.
5. OS PEDIDOS
Diante de todo o exposto e com base na legislação
colacionada, roga-se de Vossa Excelência:
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1 - a concessão da liminar pugnada, com a fixação
de multa diária por descumprimento da determinação judicial, nos termos do
item anterior;
2 - a citação da Ré, no endereço acima declinado,
por Oficial de Justiça, nos termos do art. 172, parágrafo 2º do CPC, para
querendo, responder e acompanhar os termos da presente, sob pena de serem
considerados como verdadeiros os fatos nesta alegados;
3 – a condenação da Requerida na obrigação de não
fazer, consistente em não ter estabelecimento comercial nos moldes atuais ou
qualquer outro que provoque perturbação do sossego público;
4 – determinação à Secretaria Municipal de
Urbanismo para bloquear a Indicação Fiscal nº 92.053.220 para os ramos de
bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, lanchonetes,
casas de chá, de sucos ou similares, discotecas, danceterias, salões de dança e
similares, serviços de música ao vivo e serviços de música mecânica;
5 – a produção do todos os meios de prova em
direito admitidos, inclusive depoimento do requerido, prova pericial,
documental e testemunhal;
6 – a condenação da Requerida em danos morais
cujo valor será arbitrado por Vossa Excelência, em liquidação de sentença;
7- a procedência da ação em todos os seus termos,
condenando-se o requerido ao pagamento das despesas processuais e verbas
honorárias de sucumbência, cujo recolhimento deste último deve ser feito ao
Fundo Especial do Ministério Público do Paraná, criado pela Lei Estadual n.
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12.241, de 28/07/1998 (DOE n. 5302, de 29/07/1998), nos termos do artigo 118,
inciso II, alínea “a”, parte final da constituição do Paraná;
7 – a dispensa do pagamento de custas,
emolumentos e outros encargos, nos termos do artigo 18 da Lei n. 7.347/85.
Comunica-se a Vossa Excelência para os fins do
artigo 236, parágrafo 2 º do Código de Processo Civil, que o Ministério Público
Estado do Paraná, através de seu Promotor de Justiça designado na Promotoria
de Proteção ao Meio Ambiente, receberá intimações na Rua Marechal Deodoro,
nº. 1028, 10º andar – Centro, Curitiba - PR.
Atribui-se à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil
reais).
Nestes termos, pede deferimento.
Curitiba, 28 de fevereiro de 2013.
Sérgio Luiz Cordoni Promotor de Justiça