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1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE SANTO ANTÔNIO DO DESCOBERTO-GO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS e o MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS DO ESTADO DE GOIÁS, pelos representantes signatários, vêm perante Vossa Excelência, com fundamento nos permissivos inscritos nos artigos 127, caput, e 129, inciso II, ambos da Constituição da República; no artigo 27, inciso I, da Lei nº 8.625/93; no artigo 46, inciso IV, da Lei Complementar nº 25/98; e no inciso IV do artigo 1º, além dos artigos 3º e 5º, inciso I, da Lei nº 7.347/85 propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO E IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER COM PEDIDO LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA em face de ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, com endereço na Praça Dr. Pedro Ludovico Teixeira, n° 26, Centro, Goiânia- Goiás, CEP: 74.003-010, representado pelo Procurador-Geral do Estado, Sr. Eduardo Felipe Tocantins, domiciliado na Praça Dr. Pedro Ludovico Teixeira, nº 03, Centro, Goiânia-GO;

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Page 1: EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA … · ADMINISTRATIVO E IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E ... filha de Clovis Figueiredo e Maria ... Fundado no referido diploma

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA

PÚBLICA ESTADUAL DA COMARCA DE SANTO ANTÔNIO DO

DESCOBERTO-GO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS e o

MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS JUNTO AO TRIBUNAL DE CONTAS DO

ESTADO DE GOIÁS, pelos representantes signatários, vêm perante Vossa Excelência, com

fundamento nos permissivos inscritos nos artigos 127, caput, e 129, inciso II, ambos da

Constituição da República; no artigo 27, inciso I, da Lei nº 8.625/93; no artigo 46, inciso IV,

da Lei Complementar nº 25/98; e no inciso IV do artigo 1º, além dos artigos 3º e 5º, inciso I,

da Lei nº 7.347/85 propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE ATO

ADMINISTRATIVO E IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO FAZER

COM PEDIDO LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA

em face de

ESTADO DE GOIÁS, pessoa jurídica de direito público interno, com

endereço na Praça Dr. Pedro Ludovico Teixeira, n° 26, Centro, Goiânia-

Goiás, CEP: 74.003-010, representado pelo Procurador-Geral do Estado,

Sr. Eduardo Felipe Tocantins, domiciliado na Praça Dr. Pedro Ludovico

Teixeira, nº 03, Centro, Goiânia-GO;

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RAQUEL FIGUEIREDO ALESSANDRI TEIXEIRA, SECRETÁRIA

DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, CULTURA E ESPORTE DE GOIÁS -

SEDUCE, brasileira, casada, professora, filha de Clovis Figueiredo e

Maria Antonieta Alessandri, nascida em 24/11/1946, CPF 101693421-15,

com domicílio profissional na Avenida Anhanguera, nº 7171, Setor Oeste,

Goiânia-GO,

em razão dos fatos e fundamentos a seguir expostos.

I - DOS FATOS

O Estado de Goiás, valendo-se da competência prevista no artigo 25, § 1º,

da Constituição Federal, editou a Lei 15.503/05, que dispõe sobre a qualificação de

entidades como organizações sociais estaduais, disciplina o procedimento de chamamento e

seleção públicos e dá outras providências.

Por intermédio dessa lei, o Estado de Goiás além de disciplinar a

qualificação de entidades privadas como organizações sociais, disciplinou uma forma de

parceria do poder público com a iniciativa privada, a ser efetivada por meio de contratos de

gestão, no âmbito da prestação de serviços públicos não exclusivos do Estado, como a

educação (artigo 2º da Lei 15.503/2005).

Fundado no referido diploma legal, delineou-se o projeto de

compartilhamento da gestão pedagógica, administrativa e estrutural de escolas públicas

estaduais para organizações sociais que estão sendo selecionadas por meio de editais de

chamamento público, para atuação em diversos municípios goianos.

No ano de 2016, foi publicado o Edital de Chamamento nº 01/2016,

destinado a transferir “a parceiro privado o gerenciamento, a operacionalização e a execução das

atividades administrativas, de apoio para implantação e implementação de políticas pedagógicas,

definidas pela SEDUCE, nas Unidades Educacionais da Rede Pública Estadual de Ensino,

Macrorregião IV – Anápolis”.

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Após a expedição da anexa recomendação conjunta, firmada por

representantes do Ministério Público de Goiás, Ministério Público de Contas de Goiás e

Ministério Público Federal, contendo, dentre outros, questionamentos sobre a

constitucionalidade da medida, o Estado de Goiás, no exercício da autotutela, revogou o ato

público.

Contudo, no mesmo ano, foi publicado o Edital de Chamamento nº

03/2016, com idêntico objeto, atualmente suspenso, por força de decisão liminar proferida

no bojo da ação civil pública nº 201603610957, proposta pelo Ministério Público do Estado

de Goiás, na 6ª Vara Cível da Comarca de Anápolis, Goiás. Cabe anotar que, em desfavor da

referida decisão, o Estado de Goiás ajuizou recurso de agravo de instrumento, ao qual foi

negado efeito suspensivo, decisão esta mantida em sede de agravo interno (IC n.

201700328219, fls. 166/183).

No dia 17 de julho de 2017, o Estado de Goiás publicou o Aviso de

Chamamento Público nº 01/2017, também destinado a transferir, para organizações sociais,

“o gerenciamento, a operacionalização e a execução das atividades administrativas, de apoio, para

a implantação e implementação de políticas pedagógicas, definidas pela SEDUCE, nas unidades

educacionais da rede pública estadual de ensino da Macrorregião VIII - Águas Lindas/Planaltina”,

incidindo sobre 11 (onze) escolas e 10.344 (dez mil, trezentos e quarenta e quatro alunos).

Tendo em conta que o referido aviso, na essência, mantém o mesmo

conteúdo dos antecedentes e que as poucas alterações promovidas pela SEDUCE não

supriram as irregularidades anteriormente constatadas, o Ministério Público do Estado de

Goiás, o Ministério Público Federal e o Ministério Público de Contas junto ao Tribunal de

Contas do Estado de Goiás expediram nova recomendação conjunta, datada de 27/07/2017,

para que o ato público fosse anulado, no exercício da autotutela.

Desatendidos os termos da recomendação conjunta, imperioso o

ajuizamento da presente ação civil pública.

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II - DO DIREITO

A) DA LEGITIMAÇÃO ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Carta Magna definiu o Ministério Público como instituição permanente,

essencial a função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do

regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 127, CF).

Para esse escopo, foram estabelecidas, no artigo 129, suas funções institucionais:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: (…)

II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância

pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas

necessárias à sua garantia;

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do

patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e

coletivos; (…).

Na mesma esteira, a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público – Lei nº

8.625, de 12 de fevereiro de 1993 – estabelece:

Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições Federal e Estadual, na Lei

Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda, ao Ministério Público(...)

IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei:

a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio

ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico,

turístico e paisagístico e a outros interesses difusos, coletivos e individuais

indisponíveis e homogêneos. (…)

b) para a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio

público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas

administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que

participem; (...)

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A Lei Complementar Estadual nº 25/98 – Lei Orgânica do Ministério

Público do Estado de Goiás – em seu artigo 46, também determina:

Art. 46. Além das funções previstas na Constituição Federal, na Lei Orgânica

Nacional do Ministério Público, na Constituição Estadual e em outras leis,

incumbe, ainda, ao Ministério Público: (…).

IV – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância

pública aos direitos assegurados na Constituição Federal e em outras leis,

promovendo as medidas judiciais e administrativas necessárias à sua garantia;

(…).

VI - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, para:

a) proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente, ao

consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e

paisagístico e a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis

e homogêneos (…).

b) anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público

ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas

administrações direta, indireta ou fundacionais ou de entidades privadas de que

participem; (…).

A Lei n.º 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a ação civil pública

de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos

de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, modificada pela Lei 8.078/90,

estabelece:

Art. 1º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as

ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados: (Redação

dada pela Lei nº 12.529, de 2011).

I - ao meio-ambiente;

II - ao consumidor;

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III – a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

IV - a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. (Incluído pela Lei nº 8.078

de 1990)

V - por infração da ordem econômica; (Redação dada pela Leu nº 12.529, de

2011).

VI - à ordem urbanística. (Incluído pela Medida provisória nº 2.180-35, de 2001).

Art. 5º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

(Redação dada pela Lei n.º 11.448, de 2007)

I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei n.º 11.448, de 2007) […].

Em laudável preleção, Mazzill esclarece sobre o tema que:

“Com o advento do CDC, ficou estabelecido que, para a defesa dos direitos e

interesses protegidos por este Código, são admissíveis todas as espécies de ações

capazes de propiciar sua adequada e efetiva tutela.

Assim, hoje, por força da remissão contida no art.21 da Lei n. 7.347/85, passaram

a caber quaisquer espécies de ações ou pedidos em defesa de interesses difusos,

coletivos e individuais homogêneos (…)

Cabem ações civis públicas condenatórias, cautelares, de execução por títulos

extrajudiciais, meramente declaratórias, constitutivos ou as chamadas

mandamentais. Como exemplos, afigure-se a necessidade de reparar ou impedir

um dano (ação condenatória ou cautelar satisfativa), ou declarar nulo (ação

declaratória) ou anular (ação constitutiva negativa) um ato lesivo ao patrimônio

público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente ou ao patrimônio

cultural”. (MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo:

meio ambiente, consumidor, patrimônio cultural, patrimônio público e outros

interesses. 25 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 267/268).

Os diplomas normativos ora mencionados, especialmente a Constituição

Federal, evidenciam a atribuição do Ministério Público para o exercício da ação civil pública

e assentam a adequação dessa via para a defesa de interesses difusos e coletivos, dentre estes

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o direito à educação, por se tratar de direito de todos, dever da família e do Estado (artigos

205 e 227, da Constituição Federal).

Demais disso, a educação é direito humano e social reconhecido pelo

artigo 26, da Declaração Universal dos Direito Humanos, de 10/12/1948, e pelo artigo 6º, da

CRFB.

No mesmo sentido, o ensino educacional de qualidade também é

assegurado à criança e ao adolescente com prioridade absoluta, conforme dispõem o Estatuto

da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (Lei nº 9.394/96).

Ainda, segundo entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal:

“(...) cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como

dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público

investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ‘ad causam’, quando

o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em

segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo,

recomenda-se o abrigo estatal”. (RE 163.231, Plenário, Rel. Maurício Corrêa, DJ

29.06.01)

Logo, revela-se inquestionável a legitimidade do Ministério Público do

Estado de Goiás para figurar no polo ativo da presente ação civil pública.

B) DA INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO DISPOSTO NO ARTIGO 4º, V,

VII E VIII, E NO ARTIGO 8º, II, DA LEI ESTADUAL Nº 15.503/05. DA

INCONSTITUCIONALIDADE DO MODELO DE GESTÃO COMPARTILHADA NA

EDUCAÇÃO DO ESTADO DE GOIÁS

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O artigo 4º, incisos V, VII e VIII, da Lei 15.503/05, que dispõe sobre a

qualificação de entidades como organizações sociais no Estado de Goiás, prevê que as

organizações sociais fixarão, por seu Conselho de Administração, a remuneração dos

membros de sua diretoria, a estrutura de seus cargos e, por meio de regulamento, o

plano de cargos, salários e benefícios de seus empregados, nos seguintes termos:

Art. 4° Para os fins de atendimento dos requisitos de qualificação, devem ser

atribuições privativas do Conselho de Administração, dentre outras: (...)

V – fixar a remuneração dos membros da diretoria, em valores compatíveis com

os de mercado onde, no Estado de Goiás, atua a organização social, desde que

não superiores ao teto estabelecido pelo art. 92, XII, da Constituição Estadual;

Redação dada pela Lei nº 19.495, de 18-11-2016. (..)

VII- aprovar o regimento interno da entidade, que deve dispor, no mínimo, sobre

a estrutura, forma de gerenciamento, os cargos e respectivas competências;

VIII – aprovar por maioria, no mínimo, de 2/3 (dois terços) de seus membros, o

regulamento próprio contendo os procedimentos que deve adotar para a

contratação de obras, serviços, compras, alienações e admissão de pessoal, bem

como o plano de cargos, benefícios e remuneração dos empregados da entidade,

que

não poderá ultrapassar o limite de 90% (noventa por cento) da maior

remuneração paga aos membros da diretoria”.

Em adição, o artigo 8º, II, do mesmo diploma legal, prevê que o contrato

de gestão celebrado entre a organização social e o Estado de Goiás estabelecerá limites e

critérios para as despesas com pessoal, nos seguintes termos:

Art. 8º. Na elaboração do Contrato de Gestão, devem ser observados os

princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência,

economicidade e, também, os seguintes preceitos:

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II – a estipulação dos limites e critérios para despesa com remuneração e

vantagens de qualquer natureza a serem percebidas pelos dirigentes e

empregados das organizações sociais, no exercício de suas funções, observado,

em relação aos membros da diretoria, o disposto no inciso V, do art. 4º, desta Lei,

sendo vedada a remuneração de empregados e diretores, estatutários ou não, por

meio de interposta pessoa jurídica.

É cediço que, no julgamento da ADI nº 1923/DF, que conferiu

interpretação conforme a Constituição à Lei nº 9.637/98, o Supremo Tribunal Federal

pronunciou-se sobre o marco legal das organizações sociais, admitindo a possibilidade de

compartilhamento da gestão para prestação dos serviços sociais, inclusive na área da

educação.

Na oportunidade, a Suprema Corte entendeu que, no modelo de gestão

compartilhada, as organizações sociais podem contratar pessoal sob regime celetista,

sendo inaplicável a exigência de concurso público, prevista no artigo 37, II, da

Constituição Federal. Vejamos:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUCIONAL.

ADMINISTRATIVO. TERCEIRO SETOR. MARCO LEGAL DAS

ORGANIZAÇÕES SOCIAIS. LEI Nº 9.637/98 E NOVA REDAÇÃO,

CONFERIDA PELA LEI Nº 9.648/98, AO ART. 24, XXIV, DA LEI Nº

8.666/93. MOLDURA CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO

ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO E SOCIAL. SERVIÇOS PÚBLICOS

SOCIAIS. SAÚDE (ART. 199, CAPUT), EDUCAÇÃO (ART. 209, CAPUT),

CULTURA (ART. 215), DESPORTO E LAZER (ART. 217), CIÊNCIA E

TECNOLOGIA (ART. 218) E MEIO AMBIENTE (ART. 225). ATIVIDADES

CUJA TITULARIDADE É COMPARTILHADA ENTRE O PODER PÚBLICO

E A SOCIEDADE. DISCIPLINA DE INSTRUMENTO DE COLABORAÇÃO

PÚBLICO-PRIVADA. INTERVENÇÃO INDIRETA. ATIVIDADE DE

FOMENTO PÚBLICO. INEXISTÊNCIA DE RENÚNCIA AOS DEVERES

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ESTATAIS DE AGIR. MARGEM DE CONFORMAÇÃO

CONSTITUCIONALMENTE ATRIBUÍDA AOS AGENTES POLÍTICOS

DEMOCRATICAMENTE ELEITOS. PRINCÍPIOS DA CONSENSUALIDADE

E DA PARTICIPAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 175,

CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO. EXTINÇÃO PONTUAL DE ENTIDADES

PÚBLICAS QUE APENAS CONCRETIZA O NOVO MODELO.

INDIFERENÇA DO FATOR TEMPORAL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO

AO DEVER CONSTITUCIONAL DE LICITAÇÃO (CF, ART. 37, XXI).

PROCEDIMENTO DE QUALIFICAÇÃO QUE CONFIGURA HIPÓTESE DE

CREDENCIAMENTO. COMPETÊNCIA DISCRICIONÁRIA QUE DEVE SER

SUBMETIDA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PUBLICIDADE,

MORALIDADE, EFICIÊNCIA E IMPESSOALIDADE, À LUZ DE

CRITÉRIOS OBJETIVOS (CF, ART. 37, CAPUT). INEXISTÊNCIA DE

PERMISSIVO À ARBITRARIEDADE. CONTRATO DE GESTÃO.

NATUREZA DE CONVÊNIO. CELEBRAÇÃO NECESSARIAMENTE

SUBMETIDA A PROCEDIMENTO OBJETIVO E IMPESSOAL.

CONSTITUCIONALIDADE DA DISPENSA DE LICITAÇÃO INSTITUÍDA

PELA NOVA REDAÇÃO DO ART. 24, XXIV, DA LEI DE LICITAÇÕES E

PELO ART. 12, §3º, DA LEI Nº 9.637/98. FUNÇÃO REGULATÓRIA DA

LICITAÇÃO. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA IMPESSOALIDADE,

DA PUBLICIDADE, DA EFICIÊNCIA E DA MOTIVAÇÃO.

IMPOSSIBILIDADE DE EXIGÊNCIA DE LICITAÇÃO PARA OS

CONTRATOS CELEBRADOS PELAS ORGANIZAÇÕES SOCIAIS COM

TERCEIROS. OBSERVÂNCIA DO NÚCLEO ESSENCIAL DOS PRINCÍPIOS

DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (CF, ART. 37, CAPUT).

REGULAMENTO PRÓPRIO PARA CONTRATAÇÕES. INEXISTÊNCIA

DE DEVER DE REALIZAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO PARA

CONTRATAÇÃO DE EMPREGADOS. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO

CONSTITUCIONAL DA IMPESSOALIDADE, ATRAVÉS DE

PROCEDIMENTO OBJETIVO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AOS

DIREITOS CONSTITUCIONAIS DOS SERVIDORES PÚBLICOS

CEDIDOS. PRESERVAÇÃO DO REGIME REMUNERATÓRIO DA

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ORIGEM. AUSÊNCIA DE SUBMISSÃO AO PRINCÍPIO DA

LEGALIDADE PARA O PAGAMENTO DE VERBAS, POR ENTIDADE

PRIVADA, A SERVIDORES. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 37, X, E

169, §1º, DA CONSTITUIÇÃO. CONTROLES PELO TRIBUNAL DE

CONTAS DA UNIÃO E PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. PRESERVAÇÃO DO

ÂMBITO CONSTITUCIONALMENTE DEFINIDO PARA O EXERCÍCIO DO

CONTROLE EXTERNO (CF, ARTS. 70, 71, 74 E 127 E SEGUINTES).

INTERFERÊNCIA ESTATAL EM ASSOCIAÇÕES E FUNDAÇÕES

PRIVADAS (CF, ART. 5º, XVII E XVIII). CONDICIONAMENTO À ADESÃO

VOLUNTÁRIA DA ENTIDADE PRIVADA. INEXISTÊNCIA DE OFENSA

À CONSTITUIÇÃO. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE

PROCEDENTE PARA CONFERIR INTERPRETAÇÃO CONFORME

AOS DIPLOMAS IMPUGNADOS. (grifo nosso)

(ADI 1923, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, Relator(a) p/ Acórdão: Min.

LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 16/04/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO

DJe-254 DIVULG 16-12-2015 PUBLIC 17-12-2015)

Assim fazendo, o referido acórdão deu tratamento similar à contratação de

pessoal para prestar os serviços públicos de saúde, educação, cultura, desporto, lazer,

ciência, tecnologia e meio ambiente, deixando de atentar para e de debater o fato de que, por

força do disposto no artigo 206, inciso V, da Carta Magna, com a redação dada pela EC

Nº 53/2006, os profissionais da educação escolar (professores, diretores, orientadores

pedagógicos etc) da rede pública de ensino devem ingressar exclusivamente por

concurso público.

É ver:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...)

V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da

lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de

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provas e títulos, aos das redes públicas; (Redação dada pela Emenda

Constitucional nº 53, de 2006)

É que, na ocasião da propositura da ADI 1923, a EC n.º 53/2006 ainda não

havia sido editada. Ademais, mesmo a ação tendo sido julgada em 2015, o STF não utilizou

como parâmetro na citada decisão a redação do artigo 206, V, da Constituição Federal,

com as alterações trazidas pela EC nº 53/06, não havendo menção nem sequer em obiter

dictum a esses novos preceitos da Constituição.

Amparado equivocadamente na decisão da Corte Maior, o Estado de

Goiás construiu, na área da educação, um modelo de gestão compartilhada que permite às

organizações sociais contratar, por meio de processo seletivo e do regime jurídico da

CLT, até 100% de todo o quadro de professores e servidores da unidade escolar por

ela gerida.

É o que se extrai do item 2.21, da minuta de contrato de gestão publicada

com o Aviso de Chamamento Público nº 01/2017:

CLÁUSULA SEGUNDA – DAS OBRIGAÇÕES E RESPONSABILIDADES

DO PARCEIRO PRIVADO. (...)

2.21. Contratar, por meio de processo seletivo, sobre regime da CLT,

profissionais técnicos e administrativos em quantidade necessária e condizente

com o adequado cumprimento das atividades e dos serviços inerentes ao objeto

dessa parceria;

Ocorre que o posicionamento do Supremo Tribunal Federal, no

pertinente à constitucionalidade da contratação de pessoal pelo regime celetista, com o

devido respeito, não se aplica aos profissionais da educação escolar. É que ao tratar da

constitucionalidade da contratação de pessoal pelo regime celetista por parte das OSs, o

Supremo Tribunal Federal não desceu a detalhes com relação especificamente à educação

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pública, tendo deixado de analisar e considerar que o regime celetista, por expressa

disposição constitucional,, não se aplica aos profissionais da educação escolar, que devem

ser admitidos de forma exclusiva por meio de concurso público. Mais ainda, o modelo

delineado pelo Estado de Goiás padece de inconstitucionalidade, pelos motivos a seguir

aduzidos.

B.1) Do não acolhimento da teoria da transcendência dos motivos determinantes pelo

Supremo Tribunal Federal

Nos termos do artigo 102, § 2º, da Constituição Federal, as decisões de

mérito proferidas pelo Supremo Tribunal Federal nas ações diretas de inconstitucionalidade

e nas ações declaratórias de constitucionalidade produzirão eficácia contra todos e efeito

vinculante, relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública

direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal.

Diante disso, é pacífico que, no plano subjetivo, as decisões proferidas em

sede de ADI e ADC operam efeito erga omnes, oponível a todos.

Contrariamente, divergências surgem quanto ao alcance, no plano

objetivo, dos efeitos das decisões proferidas no controle abstrato de constitucionalidade.

Nesse ponto, duas correntes se delineiam. A teoria restritiva defende que somente o

dispositivo da decisão possui efeito vinculante e contra todos, ao passo que a teoria

extensiva ou teoria da transcendência dos motivos determinantes consigna que os

fundamentos determinantes da decisão também produzem os referidos efeitos.

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Apesar de o Supremo Tribunal Federal já ter manifestado apreço pela

teoria da transcendência dos motivos determinantes, atualmente, pacificou o entendimento

no sentido de que ela não pode ser acolhida.

Com efeito, a Corte Maior acolhe a teoria restritiva e entende que

somente o dispositivo da decisão proferida no controle abstrato de constitucionalidade

produz efeito vinculante e contra todos, mas não os motivos invocados na fundamentação

do acórdão.

Diante disso, forçoso é convir que a semelhança entre os dispositivos da

Lei Estadual n. 15.503/2005 e os dispositivos da Lei Federal n. 9.637/1998, analisados na

ADI 1.923/DF, não impede seja questionada a constitucionalidade da norma estadual, nos

controles abstrato e difuso de constitucionalidade, nem tampouco vincula o Poder

Judiciário local.

Nesse sentido, seguem reiterados julgados do Supremo Tribunal Federal:

DECISÃO RECLAMAÇÃO. DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DOS

MUNICÍPIOS DO CEARÁ QUE IMPUTA DÉBITO A EX-PREFEITO.

ALEGADA INCOMPETÊNCIA. INOBSERVÂNCIA DOS FUNDAMENTOS

DETERMINANTES ADOTADOS NO JULGAMENTO DAS AÇÕES

DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3.715/TO, 1.779/PE e

849/MT. AUSÊNCIA DE IDENTIDADE MATERIAL. RECLAMAÇÃO À

QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. Relatório (…) 4. A reclamação é instrumento

constitucional processual posto no sistema como dupla garantia formal da

jurisdição: primeiro, para o jurisdicionado que tenha recebido resposta a pleito

formulado judicialmente e que vê a decisão proferida afrontada, fragilizada e

despojada de seu vigor e de sua eficácia; segundo, para o Supremo Tribunal

Federal (art. 102, inc. I, alínea l, da Constituição da República) ou para o

Superior Tribunal de Justiça (art. 105, inc. I, alínea f, da Constituição), que

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podem ter as suas respectivas competências enfrentadas e menosprezadas por

outros órgãos do Poder Judiciário e a autoridade de suas decisões mitigada diante

de atos reclamados. Busca-se, por ela, fazer com que a prestação jurisdicional

mantenha-se dotada de seu vigor jurídico próprio ou que o órgão judicial de

instância superior tenha a sua competência resguardada. Ela não se presta a

antecipar julgados, a atalhar julgamentos, a fazer sucumbir decisões sem que se

atenha à legislação processual específica qualquer discussão ou litígio a ser

solucionado juridicamente. É inegável a dificuldade que se põe, relativamente ao

cabimento da reclamação, quando se alega descumprimento de decisão proferida

em controle abstrato de constitucionalidade. A decisão judicial proferida em

controle difuso de constitucionalidade tem seus efeitos restritos às partes que

compõem a relação processual, pois somente em relação a elas a decisão torna-se

vinculante. O respeito à autoridade do julgado e à segurança jurídica dele

decorrente apenas pode ser exigido por aqueles que participaram do caso

concreto levado ao cuidado do Poder Judiciário. Isso não ocorre, no entanto,

quando a decisão é exarada em ação de controle concentrado de

constitucionalidade, pois a eficácia de que se revestem essas decisões atinge a

todos. Por isso, todos têm interesse jurídico legítimo em pretender a tutela judicial

que assegure o respeito à autoridade das decisões proferidas em controle abstrato

de constitucionalidade. Entretanto, o sistema brasileiro admite exclusivamente o

controle de constitucionalidade de leis ou normas específicas, não se aceitando

declaração de inconstitucionalidade de matéria ou tema. Daí porque não seria

correto concluir que a existência de julgado constitucional proferido em

ação de controle abstrato permita o uso da reclamação para se obter decisão

judicial em caso baseado em norma jurídica diversa, ainda que contemple

matéria análoga. O Reclamante aponta como paradigma as Ações Diretas de

Inconstitucionalidade 3.715/TO, 1.779/PE e 849/MT. Este Supremo Tribunal

deferiu, em 24.5.2006, a medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade

n. 3.715/TO para suspender a eficácia de dispositivos da Constituição do Estado

do Tocantins, com alteração da Emenda Constitucional n. 16/2006, que

“criava[m] a possibilidade de recurso, dotado de efeito suspensivo, para o

Plenário da Assembleia Legislativa, das decisões tomadas pelo Tribunal de

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Contas do Estado com base em sua competência de julgamento de contas (...) e

atribu[íam] à Assembleia Legislativa a competência para sustar não apenas os

contratos, mas também as licitações e eventuais casos de dispensa e

inexigibilidade de licitação (art. 19, inciso XXVIII).” Foram fundamentos do

acórdão: “3. A Constituição Federal é clara ao determinar, em seu art. 75, que as

normas constitucionais que conformam o modelo federal de organização do

Tribunal de Contas da União são de observância compulsória pelas Constituições

dos Estados-membros. Precedentes. 4. No âmbito das competências

institucionais do Tribunal de Contas, o Supremo Tribunal Federal tem

reconhecido a clara distinção entre: 1) a competência para apreciar e emitir

parecer prévio sobre as contas prestadas anualmente pelo Chefe do Poder

Executivo, especificada no art. 71, inciso I, CF/88; 2) e a competência para julgar

as contas dos demais administradores e responsáveis, definida no art. 71, inciso

II, CF/88. Precedentes. 5. Na segunda hipótese, o exercício da competência de

julgamento pelo Tribunal de Contas não fica subordinado ao crivo posterior do

Poder Legislativo. Precedentes. 6. A Constituição Federal dispõe que apenas no

caso de contratos o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso

Nacional (art. 71, § 1º, CF/88)” (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 25.8.2006, grifos

nossos). Na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 1.779/PE, o Supremo

Tribunal Federal declarou inconstitucionais os inc. VI e VII do art. 14 da

Constituição do Estado de Pernambuco assim como expressões contidas no inc.

III do § 1º e no § 2º do seu art. 86, que atribuíam competência exclusiva à

Assembleia Legislativa para julgar as contas do Poder Legislativo, do Tribunal

de Contas, do Tribunal de Justiça e das Mesas Diretoras das Câmaras

Municipais, afastando, assim, a competência dos Tribunais de Contas dos

Estados, em confronto com o art. 71, inc. I, da Constituição da República (Rel.

Min. Ilmar Galvão, DJ 14.9.2001). Em 11.2.1999, este Supremo Tribunal julgou

procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 849/MT para declarar a

inconstitucionalidade da Emenda Constitucional n. 1/1991 do Estado de Mato

Grosso, que subtraía dos Tribunais de Contas dos Estados a competência para

julgar as contas da Mesa da Assembleia Legislativa. Nesse julgamento, o

Supremo Tribunal Federal assentou que, em razão do que dispõem os inc. I e II

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do art. 71 da Constituição da República, “compete aos Tribunais de Contas dos

Estados apreciar e emitir parecer prévio sobre as contas do Chefe do Poder

Executivo, a serem julgadas pelo Legislativo e (...) julgar as contas dos demais

administradores e responsáveis, entre eles, os dos órgãos do Poder Legislativo e

do Poder Judiciário” (Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 23.4.1999). Na espécie

vertente, o Reclamante questiona as decisões proferidas no processo n.

9.627/2001 (Acórdãos n. 3.295/2009 e 6.324/2009) pelo Tribunal de Contas dos

Município do Ceará, que imputou a ele o débito de R$ 12.769,20 (doze mil

setecentos e sessenta e nove reais e vinte centavos). As leis objeto das Ações

Diretas de Inconstitucionalidade n. 3.715/TO, 1.779/PE e 849/MT não foram,

por óbvio, analisadas nos processos que tramitaram no Tribunal de Contas dos

Municípios do Ceará referentes às contas do ora Reclamante. Não há relação

entre os acórdãos tomados como paradigma e as decisões reclamadas,

patenteando-se, então, a ausência de atendimento aos requisitos constitucionais

da reclamação (art. 102, inc. I, alínea l, da Constituição da República). Oportuna

a transcrição de trecho da decisão proferida pelo Ministro Celso de Mello na

Reclamação n. 4.003/RJ: “A jurisprudência desta Suprema Corte, para quem a

reclamação - quando promovida com o objetivo de fazer restaurar o ‘imperium’

inerente aos julgamentos emanados deste Tribunal - há de referir-se a situação

idêntica àquela que motivou a formulação do ato decisório invocado como

paradigma, sob pena de subverter-se a própria destinação constitucional do

instrumento reclamatório: ‘(...) Inexistindo identidade ou mesmo similitude de

objetos entre o ato impugnado e a decisão tomada por esta Corte (...), não há

falar em violação à autoridade desta, sendo incabível o uso da reclamação.’ (Rcl

1.852-AgR/RN, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA - grifei) Impende enfatizar,

finalmente, considerada a estrita vocação a que se acha constitucionalmente

vinculado o instrumento da reclamação (RTJ 134/1033, v.g.), que tal remédio

constitucional não pode ser utilizado como um (inadmissível) atalho processual

destinado a permitir, por razões de caráter meramente pragmático, a submissão

imediata do litígio ao exame direto desta Suprema Corte. Torna-se evidente, pois,

presentes tais considerações, a inadequação do meio processual ora utilizado. É

que, como referido, a reclamação não se qualifica como sucedâneo recursal nem

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configura instrumento viabilizador do reexame do conteúdo do ato reclamado,

eis que tal finalidade revela-se estranha à destinação constitucional subjacente à

instituição dessa medida processual, consoante adverte a jurisprudência do

Supremo Tribunal Federal” (decisão monocrática, DJ 4.4.2006, grifos nossos). 5.

O que pretende o Reclamante é valer-se desse instituto para exigir respeito aos

fundamentos determinantes externados pelo Supremo Tribunal Federal no

julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade n. 3.715/TO, 1.779/PE e

849/MT, que não teriam sido observados pela autoridade reclamada. No entanto,

a questão referente à aplicação da teoria dos motivos determinantes não

está consolidada neste Supremo Tribunal, sendo exemplo disso: Rcl 2.475-

AgR/MG, Redator para o acórdão o Ministro Marco Aurélio, Plenário, DJe

31.1.2008; Rcl 5.365-MC/SC, Rel. Min. Ayres Britto, decisão monocrática,

DJ 15.8.2007; Rcl 5.087-MC/SE, Rel. Min. Ayres Britto, decisão monocrática,

DJ 18.5.2007; e Rcl 3.014/SP, Rel. Min. Ayres Britto, DJe 21.5.2010. 6. De se

registrar que, ao examinar casos análogos ao presente, nos quais se alegava

descumprimento das decisões proferidas nas Ações Diretas de

Inconstitucionalidade n. 849/MT, 1.779/PE e 3715/TO por parte dos Tribunais de

Contas dos Municípios, os Ministros deste Supremo Tribunal negaram

seguimento às Reclamações. Nesse sentido, são precedentes as seguintes

decisões monocráticas: Rcl 10.550/CE, Rel. Min. Dias Toffolli, DJe

18.10.2010; Rcl 10.538/CE, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 30.9.2010; Rcl

10.547/CE, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 30.9.2010; Rcl 10.496/CE, Rel. Min.

Ellen Gracie, DJe 30.9.2010; Rcl 10.533/PB, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe

29.9.2010 e Rcl 10.499/CE, Rel. Min. Marco Aurélio, DJe 27.9.2010. 7. Pelo

exposto, nego seguimento à presente reclamação, ficando prejudicado, por

óbvio, o pedido de medida liminar (art. 38 da Lei n. 8.038/1990 e art. 21, § 1°,

do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal). Publique-se. Brasília, 4 de

abril de 2011. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora (Rcl 11479,

Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, julgado em 04/04/2011, publicado em

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 14/04/2011 PUBLIC

15/04/2011)

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AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. SUPRESSÃO PELA FIOCRUZ

DE ADICIONAL DE INSALUBRIDADE SEM OBSERVÂNCIA DO

CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. VIOLAÇÃO DA SÚMULA

VINCULANTE 3. NÃO OCORRÊNCIA. APLICABILIDADE DA TEORIA

DA TRANSCENDÊNCIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES

REJEITADA PELO SUPREMO. AGRAVO DESPROVIDO. I – Só é possível

verificar se houve ou não descumprimento da Súmula Vinculante 3 nos

processos em curso no Tribunal de Contas da União, uma vez que o enunciado,

com força vinculante, apenas àquela Corte se dirige. II – Este Supremo

Tribunal, por ocasião do julgamento da Rcl 3.014/SP, Rel. Min. Ayres Britto,

rejeitou a aplicação da chamada “teoria da transcendência dos motivos

determinantes”. III – Agravo a que se nega provimento. (Rcl

9778 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno,

julgado em 26/10/2011, DJe-215 DIVULG 10-11-2011 PUBLIC 11-11- 2011

EMENT VOL-02624-01 PP-00019)

RECLAMAÇÃO. A reclamação pressupõe a usurpação da competência do

Supremo ou o desrespeito a decisão proferida. Descabe emprestar-lhe contornos

próprios ao incidente de uniformização, o que ocorreria caso admitida a teoria

da transcendência dos motivos determinantes. Precedente: Reclamação

nº3.014/SP, Pleno, relator ministro Ayres Britto, acórdão publicado no Diário da

Justiça eletrônico de 21 de maio de 2010. (Rcl

11478 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em

05/06/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 20-06- 2012

PUBLIC 21-06-2012).

Dessarte, se a própria Corte Maior afastou a aplicabilidade da teoria dos

motivos determinantes, evidente que o acórdão proferido na ADI 1.923/DF, que analisou

os dispositivos da Lei Federal n. 9637/1998, não impede que a constitucionalidade de

dispositivos da Lei Estadual n. 15.503/2005 seja ora questionada.

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Além disso, se a própria Suprema Corte não admite a vinculação dos

motivos determinantes para fins de reclamação, evidente que cada norma, por mais

semelhante que seja a dispositivo já apreciado no controle abstrato, precisa ter sua

constitucionalidade individualmente analisada, o que certamente não se justifica por mera

formalidade, mas sim pela necessidade de o Poder Judiciário se debruçar sobre as

individualidades de cada caso, com total liberdade de convencimento.

B.2) Da aplicabilidade da teoria do distinguishing.

Em adição, afigura-se aplicável ao caso a teoria do distinguishing.

Dissertando sobre o tema, Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael

Oliveira bem elucidam:

Nos casos em que o magistrado está vinculado a precedentes judiciais, a sua

primeira atitude é verificar se o caso em julgamento guarda alguma semelhança

com o (s) precedente (s). Para tanto, deve valer-se de um método de comparação:

à luz de um caso concreto, o magistrado deve analisar os elementos objetivos da

demanda, confrontando-os com os elementos caracterizadores de demandas

anteriores. Se houver aproximação, deve então dar um segundo passo, analisando

a ratio decidendi (tese jurídica) firmada nas decisões proferidas nessas demandas

anteriores.

Fala-se em distinguishing (ou distinguish) quando houver distinção entre o caso

concreto (em julgamento) e o paradigma, seja porque não há coincidência entre

os fatos fundamentais discutidos e aqueles que serviram de base à ratio decidendi

(tese jurídica) constante no precedente, seja porque, a despeito de existir uma

aproximação entre eles, algumas peculiaridades no caso em julgamento afastam

a aplicação do precedente. (…)

(...) Notando, pois, o magistrado que há distinção (distinguishing) entre o caso

sub judice e aquele que ensejou o precedente, pode seguir um desses caminhos:

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(i) dar à ratio decidendi uma interpretação restritiva, por entender que

peculiaridades do caso concreto impedem a aplicação da mesma tese jurídica

outrora firmada (restrictive distinguishing), caso em que julgará o processo

livremente, sem vinculação ao precedente; (ii) ou estender ao caso a mesma

solução conferida aos casos anteriores, por entender que, a despeito das

peculiaridades concretas, aquela tese jurídica lhe é aplicável (ampliative

distinguishing). 1

O Superior Tribunal de Justiça é receptivo à referida teoria. Vide a

jurisprudência:

“(...) 5. Assim, necessário se faz a técnica hermenêutica do distinguishing para

concluir pela inaplicabilidade do precedente consubstanciado no recurso

especial nº 1.159.189/RS, pois os fundamentos fáticos ali destacados, que foram

reconhecidos pelo Tribunal a quo, não estão presentes no acórdão ora recorrido.

6. Agravo regimental não provido”.

STJ, AARESP 201202262460, MAURO CAMPBELL MARQUES -

SEGUNDA TURMA, DJE DATA:13/05/2013.

Não bastasse, a aplicabilidade da teoria do distinguishig no Direito

Brasileiro encontra amparo, a contrario sensu, no artigo 489, VI, do Novo Código de

Processo Civil, in verbis:

Art. 489. São elementos essenciais da sentença: (...)

VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente

invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em

julgamento ou a superação do entendimento.

1 DIDIER JR., Fredie, BRAGA, Paula Sarno & OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil:

teoria da prova, direito probatório, teoria do precedente, decisão judicial, coisa julgada e antecipação dos efeitos

da tutela. 4ª ed.,v. 2, Salvador: Juspodivm, 2009, pp. 392/393

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Dessarte, consoante a teoria do distinguishing, reconhecida pela própria

legislação processual civil, mesmo nos casos em que o magistrado está vinculado a

precedentes judiciais, antes de proferir a sua decisão, ele deve analisar não apenas

eventual distinção/semelhança fática entre o caso em julgamento e o caso apreciado no

precedente, mas também a tese jurídica (ratio decidendi) firmada na decisão paradigma e

aquela suscitada no novo caso.

Logo, o trânsito em julgado do acórdão proferido na ADI 1.923/DF não

impede a discussão que se propõe.

Nesse ponto, mister frisar que não se nega semelhança entre os

dispositivos da Lei Federal nº 9.637/1998 e aqueles da Lei Estadual nº 15.503/2005 cuja

constitucionalidade ora se questiona.

O que se defende é a evidente distinção entre a ratio decidendi da ADI

1.923/DF e o fundamento que se pretende levar ao Poder Judiciário, consubstanciado no

206, V, da Constituição Federal, reproduzido pelo artigo 156, § 1º, V, da Constituição

Estadual, que veda a contratação dos profissionais da educação básica da rede pública de

ensino sem concurso público.

Com efeito, apesar de o Supremo Tribunal Federal ter firmado

entendimento no sentido de que as organizações sociais, na gestão compartilhada dos

serviços sociais, podem contratar sob o regime celetista (ADI nº 1923/DF), o fez

analisando apenas a incidência do artigo 37, II, da Constituição Federal, aplicável ao

serviço público de forma geral.

Todavia, por força do disposto no artigo 206, V, da Constituição Federal

(reproduzido pelo artigo 156, § 1º, V, da Constituição Estadual), na rede pública estadual

de ensino, os professores, diretores, orientadores pedagógicos e todos os que se

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enquadram na categoria de profissionais da educação escolar, conforme definição do artigo

61, da Lei nº 9.394/96 (LDB), devem, necessariamente, ser admitidos por concurso público

a ser realizado pelo Estado de Goiás, sendo incabível que sejam contratados pelas OSs,

sob o regime celetista.

Se o previsto no referido dispositivo constitucional não serviu de

fundamento no paradigma analisado pela Corte Maior, evidente que a aplicação da teoria do

distinguishig é cabível e necessária no presente caso.

Ademais, como o artigo 206, VIII, da Constituição Federal (reproduzido

pelo artigo 156, § 1º, IX, da Constituição do Estado de Goiás) dispõe que os profissionais

da educação escolar pública devem ser remunerados com base no piso salarial nacional,

regulamentado em lei federal, naturalmente não pode ser delegada ao conselho de

administração das OSs a fixação da remuneração dos profissionais contratados, “em

valores compatíveis com o de mercado”, nem tampouco ao contrato de gestão a previsão

dos “critérios para despesas com pessoal”.

Outrossim, tanto a exigência do concurso público, quanto a garantia do

plano de carreira e piso salarial nacional previstos em lei se referem apenas aos

profissionais da educação escolar pública, não atingindo os demais profissionais que

trabalham na unidade escolar.

Imperioso, pois, seja dada interpretação conforme a Constituição do

disposto nos artigos 4º, incisos V, VII e VIII e 8º, II, da Lei Estadual nº 15.503/05, para o

fim de se excluir a possibilidade de contratação pelas OSs, sob o regime celetista, dos

profissionais da educação escolar da rede pública, tendo em vista a incidência de norma

constitucional (federal e estadual) específica, que exige concurso público para a

contratação destes profissionais, garantindo-lhes ainda o piso salarial nacional e o plano de

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carreira previstos em lei, conforme os artigos 206, V e VIII, da Constituição Federal e

156,, § 1º, V e IX, da Constituição do Estado de Goiás.

C) DA VALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO

Um dos pilares da Emenda à Constituição Federal n.º 53, de 19 de dezembro

de 2006, como visto, é a valorização dos profissionais da educação escolar.

Ademais, a EC n.º 53/2006 determinou que a contribuição social do salário-

educação é fonte adicional de financiamento da educação básica pública (CF, art. 212, § 5º) e

criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos

Profissionais da Educação - FUNDEB (ADCT-CF/88, art. 60).

Soma-se a isso a regra claramente traçada na meta 18.1 do Plano Nacional de

Educação, estabelecido pela Lei Federal n.º 13.005/14: “Estruturar as redes públicas de

Educação Básica de modo que, até o início do terceiro ano de vigência deste PNE, 90%

(noventa por cento), no mínimo, dos respectivos profissionais do magistério e 50%

(cinquenta por cento), no mínimo, dos respectivos profissionais de Educação não docentes

sejam ocupantes de cargos de provimento efetivo e estejam em exercício nas redes

escolares a que se encontrem vinculados (grifo nosso)”.

Por sua vez, e de forma ainda mais restritiva, o Plano Estadual de Educação

do Estado de Goiás aprovado pela Lei Estadual n. 18.969/15 prevê que uma das metas do

Estado de Goiás para a educação consiste em “estruturar as redes de Educação Básica de modo

que, até o início do 5º (quinto) ano de vigência deste Plano, 90% (noventa por cento), no mínimo,

dos respectivos profissionais do magistério e 70% (setenta por cento), no mínimo, dos respectivos

profissionais da educação não docentes, sejam ocupantes de cargos de provimento efetivo na rede

pública e estejam em exercício nas redes escolares a que se encontrem vinculados” (estratégia

19.1).

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Portanto, de acordo com o Plano Nacional de Educação, até o início de 2017,

90%, no mínimo, dos profissionais do magistério e 50%, no mínimo, dos profissionais não

docentes deveriam ser ocupantes de cargos efetivos, acessíveis mediante concurso público.

Causa espécie o governo do Estado de Goiás propor parcerias com as

organizações sociais na educação básica, sem qualquer limite à contratação de pessoal pelo

regime celetista, em evidente afronta tanto ao art. 206, V, da Constituição Federal

(reproduzido pelo art. 156, § 1º, V, da Constituição Estadual), que exige acesso exclusivo por

concurso público aos profissionais da educação escolar, quanto violação dos Planos Nacional

e Estadual de Educação, colocando-se na contramão do que dispõem referidas leis,

amplamente debatidas em conferências municipais, estaduais e nacional de educação, bem

como pelos parlamentares federais e estaduais.

Todavia, contrariando referidas disposições constitucionais e legais, no

mencionado despacho n.º 596/2015, o Governador do Estado de Goiás deixou muito claro

que o preenchimento dos cargos vagos no magistério público estadual é muito dispendioso,

razão pela qual a transferência da gestão das escolas públicas para organizações sociais

atenderia à economicidade.

No mesmo documento o Governador aduziu que “o aumento do gasto por

aluno ou por professor não tem tido presentemente efeito direto nas notas das escolas no

Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), fator este que reputo como

relevante para a adoção da presente política pública de emparceiramento”.

Ressalte-se que o Aviso de Chamamento Público n.º 01/2017 não prevê o

percentual máximo de professores e de servidores administrativos que poderão ser

contratados, sob regime celetista, nas escolas a serem geridas por OSs, ficando ao talante da

organização social valer-se de 0% a 100% desses servidores. Ademais, em seu anexo V

consta expressamente que “os salários dos professores regidos pela CLT deverão ficar em

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patamares próximos aos do piso nacional”, o que demonstra, a contrario sensu, que não há

qualquer garantia de que estes profissionais serão adequadamente remunerados, pois poderão

receber menos que o piso nacional. Além disso, propor a inauguração de um novo modelo de

gestão e concomitantemente dispor que os salários dos professores regidos pela CLT deverão

ficar em patamares próximos aos do piso nacional seria, realmente, uma forma de atender ao

mandamento constitucional da valorização do professor? Parece evidente que a resposta é

negativa.

Como se vê, o legislador constituinte derivado pretende melhorar a educação

por meio da valorização dos profissionais, contemplando o ingresso exclusivamente por

meio de concurso público, elaborando planos de carreira, estabelecendo piso salarial e

incrementando fontes para custear uma real melhoria remuneratória para os professores da

rede pública de ensino.

Entretanto, o Estado de Goiás pretende melhorar a educação pública estadual

ao arrepio da vontade do legislador constituinte derivado, bem como dos legisladores federal

e estadual, porquanto reputa muito dispendioso realizar concursos públicos para professores

efetivos, bem como deixa às escâncaras que a melhoria salarial de professores não produz

resultados. Destarte, permite que até 100% dos professores e servidores administrativos das

escolas geridas por OSs sejam empregados privados.

Enfim, o caminho escolhido pelo Chefe do Poder Executivo estadual conflita

com a Emenda Constitucional n.º 53/2006, bem como com os Planos Nacional e Estadual de

Educação, e por isso não merece prosperar.

D) DA OBRIGATORIEDADE DA PRESTAÇÃO DIRETA PELO ESTADO DE

SERVIÇO EDUCACIONAL. VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ARTIGO 205, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. DOS LIMITES DA GESTÃO COMPARTILHADA

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Os artigos 205 e 211, da Constituição Federal, estabelecem:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será

promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho.

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em

regime de colaboração seus sistemas de ensino.

De outra parte, os artigos 2º e 3º, da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional) preceituam que:

Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de

liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno

desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho.

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: (...)

V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

VII - valorização do profissional da educação escolar;

VIII - gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação

dos sistemas de ensino;

IX - garantia de padrão de qualidade; (...)

Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante

a garantia de:

I - educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de

idade, organizada da seguinte forma: (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)

a) pré-escola; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013)

b) ensino fundamental; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013)

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c) ensino médio; (Incluído pela Lei nº 12.796, de 2013)

II - educação infantil gratuita às crianças de até 5 (cinco) anos de idade;

(Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)

III - atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com

deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou

superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades,

preferencialmente na rede regular de ensino; (Redação dada pela Lei nº

12.796, de 2013)

IV - acesso público e gratuito aos ensinos fundamental e médio para todos os que

não os concluíram na idade própria; (Redação dada pela Lei nº 12.796, de

2013)

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,

segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII - oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características

e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se

aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;

VIII - atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio

de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação

e assistência à saúde; (Redação dada pela Lei nº 12.796, de 2013)

IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e

quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento

do processo de ensino-aprendizagem.

X – vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais

próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar 4

(quatro) anos de idade.

Verifica-se, pois, que os legisladores constituinte e ordinário determinaram

a implantação de uma rede pública de ensino, integrada por serviços e ações a cargo dos três

entes da federação (federal, estadual e municipal).

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Ainda, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, inclusive,

determina ao ente estatal o dever de organizar seu próprio sistema de ensino. Senão vejamos:

Art. 8º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em

regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.

Art. 10. Os Estados incumbir-se-ão de:

I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus

sistemas de ensino; (...)

VI - assegurar o ensino fundamental e oferecer, com prioridade, o ensino médio a

todos que o demandarem, respeitado o disposto no art. 38 desta Lei;

Logo, em matéria de educação, o Estado, em suas três esferas, é o

protagonista e os serviços públicos constituem a essência do sistema, de modo que o ente

público possui o dever de prestar o serviço educacional direta e gratuitamente à população.

E assim o é, tendo em vista a natureza básica e essencial da educação para

o ser humano, uma vez que umbilicalmente ligado à dignidade da pessoa humana e ao

exercício da própria cidadania.

Nesse sentido, mencione-se a jurisprudência do Tribunal de Justiça do

Estado de Goiás:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. MENOR.

INSUFICIÊNCIA DE VAGAS EM INSTITUIÇÃO PÚBLICA PRÓXIMA À

SUA RESIDÊNCIA. EFETIVIDADE DO DIREITO À EDUCAÇÃO.

PONDERAÇÃO. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO

ADOLESCENTE. DIREITOS INDISPONÍVEIS. BEM COMUM E

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. MATRÍCULA EM INSTITUIÇÃO DE

ENSINO PRIVADA ÀS EXPENSAS DA MUNICIPALIDADE E BLOQUEIO

DE VERBA PÚBLICA. POSSIBILIDADE. 1. Conf. arts. 6º, 157, 207 e 208 da

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Constituição Estadual, e arts. 53 e 54 do ECA, deve o Poder Público

providenciar meios para dar efetividade ao direito à educação. 2. A

obrigatoriedade de fornecimento de educação pública a todos, de forma

igualitária e isonômica, limita a discricionariedade político-administrativa

dos Municípios, que atuam, prioritariamente, na educação infantil e no

ensino fundamental, não sendo cabível alegar a “reserva do possível” ou a

vinculação ao regramento orçamentário para esquivar-se de dar efetividade

plena ao direito constitucional à educação, de caráter indisponível. 3. O

custeio de mensalidades em instituições particulares pelo Poder Público e

eventual bloqueio de verbas públicas, em caso de descumprimento, constituem-se

em meios legítimos e aptos a emprestar efetividade às decisões judiciais.

RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJGO, AGRAVO DE

INSTRUMENTO 192109-59.2016.8.09.0000, Rel. DES. OLAVO JUNQUEIRA

DE ANDRADE, 5A CAMARA CIVEL, julgado em 10/11/2016, DJe 2154 de

23/11/2016) – grifo nosso

Em consonância, ainda, segue entendimento jurisprudencial do Tribunal de

Justiça do Distrito Federal e Territórios:

DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À EDUCAÇÃO INFANTIL.

MATRÍCULA EM ESTABELECIMENTO DE ENSINO ADEQUADO. DEVER

DO ESTADO. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO. RECURSO

DESPROVIDO. I. O direito à educação infantil é tutelado

constitucionalmente e constitui direito fundamental que não pode ser

postergado em face de contingências orçamentárias ou administrativas e,

muito menos, da priorização das políticas públicas. II. Preenchido o critério

etário, exsurge para a criança direito subjetivo à matrícula em creche ou pré-

escola, independentemente de questões orçamentárias ou da política estatal para o

setor, sob pena de restar sonegado, em sua essência, o direito à educação infantil.

III. Dada a latitude e o gabarito constitucional do direito à educação infantil,

decreto judicial que determina a disponibilização de vaga em creche ou pré-

escola, por se apoiar diretamente na Lei Maior, não traduz qualquer tipo de

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vulneração à independência dos Poderes ou aos primados da isonomia e

impessoalidade. IV. A existência de fila de espera não pode se sobrepor ao dever

constitucional de prestação universal da educação. V. O Estado não pode invocar

o seu próprio descaso com direito à educação infantil, que acaba criando o déficit

de vagas e estabelecendo o sistema de filas, para forjar uma fictícia ofensa ao

princípio da isonomia. VI. É insidiosa a lógica calcada no pressuposto de que, por

existirem várias crianças que não têm o seu direito respeitado, nenhuma outra

pode obter em juízo o reconhecimento do seu próprio direito subjetivo. VII.

Recurso conhecido e desprovido. (Acórdão n.997124, 20150110451289APC,

Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA 4ª TURMA CÍVEL, Data de

Julgamento: 08/02/2017, Publicado no DJE: 02/03/2017. Pág.: 697/710) – grifo

nosso

Por outro lado, a despeito da previsão geral de que o serviço educacional

seja prestado diretamente pelo ente público, o artigo 209 da Constituição Federal e o artigo

7º da Lei nº 9.394/96 admitem a oferta do ensino por instituições privadas:

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

Art. 7º O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I - cumprimento das normas gerais da educação nacional e do respectivo sistema

de ensino;

II - autorização de funcionamento e avaliação de qualidade pelo Poder Público;

III - capacidade de autofinanciamento, ressalvado o previsto no art. 213 da

Constituição Federal.

Ocorre que, nada obstante o ensino seja livre à iniciativa privada,

observadas as disposições legais, evidente que não há previsão de repasse da

responsabilidade constitucional do próprio Estado às pessoas jurídicas de direito privado, já

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que, repita-se, cabe essencialmente ao Estado ofertar ensino público, obrigatório, gratuito e

de qualidade, por meio de estabelecimentos públicos oficiais.

Em reforço, o professor André Ramos Tavares, ao discorrer sobre o Direito

Fundamental à Educação, leciona:

“A Constituição brasileira assume expressamente o direito à educação como um

direito de matiz social. Ela o faz, inicialmente, no art. 6º, de maneira incisiva e

sintética, para posteriormente ratificar esse posicionamento especificando esse

direito e outros direitos e institutos correlatos, no seu Capítulo III do Título VIII,

exatamente a partir do art. 205.

Como típico direito social, o direito à educação obriga o Estado a oferecer o

acesso a todos interessados, especialmente àqueles que não possam custear uma

educação particular. Os direitos sociais ocupam-se, prioritariamente, dentro do

universo de cidadãos do Estado, daqueles mais carentes”2.

No modelo ora questionado, porém, o Estado de Goiás tenta se esquivar do

papel que lhe foi constitucionalmente determinado, transferindo totalmente a prestação

direta dos serviços de ensino de unidades escolares da Macrorregião de Águas Lindas/Santo

Antônio para organizações sociais, mediante contrato de gestão, com cessão dos

equipamentos públicos, de pessoal e repasse de vultuosas verbas públicas.

E, o que é pior, o faz buscando a flexibilização jurídica nas contratações,

baseado na própria ineficiência e invocando objetivos de ordem econômica, administrativa e

de resultados, com fundamento no artigo 6º, da Lei Estadual nº 15.503/05, que

regulamentou, no âmbito no Estado de Goiás, a parceria com entidades privadas qualificadas

como organizações sociais em todas as áreas. É ver:

2 SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel – Coordenadores. 1. ed. Rio de Janeiro: Editora

Lumen Juris, 2010, p. 776.

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Art. 6º Para os efeitos desta Lei, entende-se por contrato de gestão o ajuste de

natureza colaborativa celebrado pelo Poder Público com entidade qualificada como

organização social, com vistas à formação de parceria para o fomento e a execução

das atividades constantes das alíneas do inciso I do art. 2º desta Lei. Redação dada

pela Lei nº 18.843, de 10-06-2015.

Parágrafo único. Deverá ser fundamentada a decisão do Chefe do Executivo quanto à

celebração de contrato de gestão com organizações sociais para o desempenho de

atividade de relevância pública, mediante demonstração objetiva de que o vínculo

de parceria atende a objetivos de eficiência econômica, administrativa e de

resultados, com documentação de seu conteúdo nos autos do respectivo processo de

seleção e contratação.- Acrescido pela Lei nº 18.331, de 30-12-2013.

Com efeito, extrai-se do Despacho n.º 596/20153, da lavra do Sr. Governador

do Estado:

(…) As razões, estudos, documentos e justificativas contidas nos autos

convencem-me do acerto e da necessidade em o Estado de Goiás promover a

transferência da gestão de equipamentos públicos escolares da Educação Básica a

parceiros privados, aos quais competirá, seguindo a política pública para a

educação ditada pela Administração, executar a referida atividade de relevância

pública.

E são várias as razões que me levam a, como decisor governamental, adotar o

programa de parcerias de que aqui se cuida.(…)

Assim que, razões de gestão e de economicidade, somadas ao atual quadro de

constrangimentos orçamentário e financeiro por que passa o Estado – o que

não é apanágio exclusivo da realidade goiana – levam-me a buscar medida

alternativa à realização de tão elevada despesa pública por meio do integral

provimento dos quadros do magistério. A propósito disso, vale anotar que, com

base em estudo técnico carreado aos autos (f. 633-641), o aumento do gasto por

aluno ou por professor não tem tido presentemente efeito direto nas notas das

escolas no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), fator este que

3 http://www.gabinetecivil.goias.gov.br/downloads/despacho_596.htm.

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reputo como relevante para a adoção da presente política pública de

emparceiramento.

(…). Assim é que, à vista de tudo o que consta dos presentes autos, e em

atendimento ao que preceitua o parágrafo único do art. 6º da Lei estadual nº

15.503/05, com redação dada pela Lei estadual nº 18.331/13, tenho por bem, no

exercício de minha competência governamental, determinar a transferência

da gestão de escolas públicas estaduais a organizações sociais, por meio da

celebração de contratos de gestão, nos estritos termos do que estabelecem aquelas

leis de regência e nos limites do que ditado pelo Decreto nº 8.469/15, por concluir

que a medida mostra-se por tudo adequada ao atendimento do interesse público.

Ocorre que o direito à educação é tutelado constitucionalmente e constitui

direito fundamental que não pode ser postergado em face de contingências orçamentárias ou

administrativas e, muito menos, da priorização das políticas públicas, como já destacado

anteriormente.

Como o Estado possui os equipamentos públicos, assim entendidos toda a

estrutura material, composta de imóveis e móveis, para a prestação dos serviços de

educação, possui um quadro próprio de pessoal, em tese devidamente qualificado, porquanto

criteriosamente selecionado mediante concurso público e dispõe de recursos financeiros para

a prestação dos serviços, resulta claro que, embora possa, não quer desempenhar o ônus

constitucional de prestar diretamente os serviços de educação, colocar as unidades

escolares públicas sob a administração de organizações sociais.

Ademais, em troca, não haverá nem sequer aumento da capacidade

educacional, mas apenas mera transferência de imóveis e móveis, cessão de servidores e

delegação da responsabilidade pelo gerenciamento de recursos públicos, com dispensa de

licitação e sem nenhum mecanismo de controle efetivo dos gastos de tais recursos públicos.

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É o verdadeiro desmonte do Estado em afronta à Constituição

Federal!

Di Pietro, ao comentar a possibilidade (aberta pela Lei nº 9.637/98) de o

Estado, paulatinamente, deixar de prestar alguns serviços públicos sociais para se limitar a

fomentar sua prestação por particulares, conclui:

“Em muitos casos, poderá esbarrar em óbices constitucionais, já que é a

Constituição que prevê os serviços sociais como dever do Estado e, portanto,

como serviço público. […] são inegáveis o conteúdo de imoralidade contido na

lei, os riscos para o patrimônio público e para os direitos dos cidadãos. Em

primeiro lugar, fica muito nítida a intenção do legislador de instituir um

mecanismo de fugir do regime jurídico de direito público a que se submete a

Administração Pública. O fato de a organização social absorver atividade

exercida por ente estatal e utilizar o patrimônio público e os servidores públicos

antes a serviço desse mesmo ente, que resulta extinto, não deixa dúvidas de que,

sob a roupagem de entidade privada, o real objetivo é mascarar uma situação que,

sob todos os aspectos, estaria sujeita ao direito público”. (DI PIETRO, Maria

Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão,

franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 8. ed. São Paulo:

Atlas, 2011)

Acrescente-se, em continuidade, que a extensão dos contratos de gestão a

serem celebrados, com a transferência total dos serviços de educação prestados nas unidades

escolares dos Municípios da Macrorregião de Águas Lindas/Planaltina, prevista no

instrumento público, está a configurar a inconstitucionalidade já apontada pelo Ministro

Ayres Brito, Relator da ADIn 1923/DF, quando proferiu seu voto pela inconstitucionalidade

dos artigos 18, 19, 20, 21 e 22, da Lei 9.637/98:

“[…] Fácil notar, então, que se trata mesmo é de um programa de privatização.

Privatização, cuja inconstitucionalidade, para mim, é manifesta. Conforme

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concluí acima, a Constituição determina, quanto aos serviços estritamente

públicos, que o Estado os preste diretamente, ou, então, sob o regime de

concessão, permissão ou autorização. Isto por oposição ao regime jurídico das

atividades econômicas, área em que o Poder Público deve atuar, em regra, apenas

como agente indutor e fiscalizador. Não fosse assim, a Magna Carta não faria a

menor referência a serviços públicos de saúde (mescladamente públicos, entenda-

se), a estabelecimentos oficiais de ensino, a regime geral de previdência social,

etc. Ora, o que faz a Lei 9.637/98, em seus arts. 18, 19, 20, 21 e 22, é

estabelecer um mecanismo pelo qual o Estado pode transferir para a

iniciativa privada toda a prestação de serviços públicos de saúde, educação,

meio ambiente, cultura, ciência e tecnologia. A iniciativa privada a substituir

o Poder Público, e não simplesmente complementar a performance estatal. É

dizer, o Estado a, globalmente, terceirizar funções que lhe são típicas. O que

me parece juridicamente aberrante, pois não se pode forçar o Estado a

desaprender o fazimento daquilo que é da sua própria compostura

operacional: a prestação de serviços públicos. (grifo nosso)

Realmente, o problema não está no repasse de verbas públicas a particulares, nem

na utilização, por parte do Estado, do regime privado de gestão de pessoas, de

compras e contratações. A verdadeira questão é que ele, Estado, pelos arts. 18, 19,

20, 21 e 22 da Lei 9.637/98 (dispositivos que falam em 'absorção', por

organizações sociais, das atividades desempenhadas por entidades públicas a ser

extintas) ficou autorizado a abdicar da prestação de serviços de que,

constitucionalmente, não pode se demitir.

A se ter como válida a mencionada 'absorção', nada impediria que, num

curto espaço de tempo, deixássemos de ter estabelecimentos oficiais de

ensino, serviços públicos de saúde, etc. Isso, tendo em vista que a organização

social é pessoa não integrante da Administração Pública. Logo, o Estado

passaria a exercer, nos serviços públicos, o mesmo papel que desempenha na

atividade econômica: o de agente apenas indutor, fiscalizador e regulador, em

frontal descompasso com a vontade objetiva da Constituição Federal, o que

de pronto me leva a julgar inconstitucionais os arts. 18, 19, 20, 21 e 22 da Lei

9.637/98”. (grifo nosso)

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No mesmo diapasão, Celso Antônio Bandeira de Mello entende que, ao

prever que a educação é dever do Estado, a Constituição da República de 1988 impede o

ente público de se esquivar dos correspondentes encargos de prestação, pelo processo de

transpassá-los a organizações sociais, porquanto tem o dever de prestá-los diretamente.

Ainda, segundo o autor:

“Não pode eximir-se de desempenhá-los, motivo pelo qual lhe é vedado esquivar-

se deles e, pois, dos deveres constitucionais aludidos pela via transversa de

'adjudicá-los' a organizações sociais. Segue-se que estas só poderiam existir

complementarmente, ou seja, sem que o Estado se demita de encargos que a

Constituição lhe irrogou” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de

direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2009)

Nesse passo, há que se estabelecer limites à transferência da prestação de

serviços de educação em unidades escolares estaduais às organizações sociais.

Primeiramente, resta bem claro que tal transferência somente pode ser feita

de forma complementar ao serviço público estatal de educação básica, e nunca

substitutiva, como pretende o Estado de Goiás. Portanto, a transferência total da prestação

do referido serviço público caracteriza inconstitucional substituição do Estado, pela

iniciativa privada, na prestação de serviços que a Constituição Federal outorgou, com

primazia, ao ente público.

Já teve o Supremo Tribunal Federal a oportunidade de se manifestar neste

sentido, posteriormente ao julgamento da ADI 1923, quando a Ministra Rosa Weber julgou

improcedente a Reclamação nº 15.733/RJ, destacando-se de sua decisão o seguinte trecho:

“A primeira premissa é no sentido de que a saúde, como dever

constitucionalmente imposto ao Estado e direito de todos, tal como

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prescrito no art. 193 da Constituição Federal, traduz atividade típica e

essencial do Estado, de modo a competir a este a prestação de forma

eficiente e com qualidade. Nada obstante este dever, a Constituição e as

Leis Federais 8.080/90 e 9.637/98 autorizam a assistência da iniciativa

privada na prestação do serviço de saúde, desde que em caráter

complementar e sem retirar, de direito e de fato, a gerência do Estado

no dever constitucional de prestar serviço de saúde de qualidade.

Do mesmo modo, em seu voto na ADI 1923/DF, o Ministro Ayres Brito foi

categórico ao afirmar ser impossível ao Estado abdicar da prestação de serviços que a

Constituição lhe outorgou, com primazia.

Nesse ponto, então, é que os contratos de gestão, a serem celebrados pelo

Estado de Goiás com organizações sociais, para a prestação de serviços educacionais, são

inconstitucionais, por abarcarem uma transferência total (gestões pedagógica, administrativa,

de bens e financeira) da prestação de serviços de diversas escolas da macrorregião de Águas

Lindas/Planaltina à iniciativa privada, numa flagrante violação ao dever, imposto pela Carta

Magna, de prestação direta. Deve-se ressaltar que o governador do Estado de Goiás deixou

clara em seu decreto, não obstante o uso da expressão projeto piloto, a intenção de transferir

integralmente a gestão de grande parte das escolas da educação básica sob responsabilidade

do Estado, já tendo iniciado este processo em extensas macrorregiões (Anápolis, suspenso

por decisão judicial, no caso Águas Lindas/Planaltina, cuja suspensão ora se requer, havendo

ainda iniciado processo em relação à macrorregião de Luziânia).

Cabe salientar, ainda, que esta transferência se dá de forma no mínimo

temerária, uma vez que, conforme reconhecido pela própria Secretaria de Estado de

Educação, em resposta à recomendação encaminhada pelo Ministério Público, as

organizações sociais não têm experiência em exercer a atividade de educação básica

obrigatória e gratuita. Ora, não se pode “experimentar” com milhares de crianças,

adolescentes, jovens e adultos, sem qualquer garantia por parte das OSs, seja de capacidade

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técnica, pedagógica, financeira, experiência prévia, de gestão pública, em relação aos

ensinos fundamental, médio e educação de jovens e adultos. Afinal, não se pode esquecer

que se trata de direito social fundamental, dever do Estado, que está totalmente

organizado neste sentido, com uma rede inteira de estabelecimentos oficiais, quadro de

servidores, móveis, imóveis, programas, sistemas de gestão, em efetivo funcionamento.

Vale anotar que, em reunião realizada no dia 28/09/2017, a Secretária

Estadual de Educação e sua equipe sustentaram que o objetivo do Estado era estender o

modelo de gestão ora discutido a 30% (trinta por cento) e não à integralidade das escolas

estaduais. Porém, se se trata de um modelo experimental, que envolve a transferência de

milhões de reais, por que motivo não se propôs a experimentação em uma escola ou em um

quantitativo muito mais reduzido do que o ora preconizado?

A transferência da gestão integral de 30% de toda a rede estadual de ensino

não é algo complementar. Equivale à substituição do Estado para todas as escolas

selecionadas, o que, no que tange à macrorregião de Águas lindas de Goiás, impactará sobre

o funcionamento 11 (onze) escolas e na vida escolar de 10.344 (dez mil, trezentos e quarenta

e quatro alunos) – fls. 32/33 do incluso inquérito civil. Ora, não se pode experimentar com

educação básica obrigatória, com o futuro de crianças e jovens, de forma completamente

aleatória, arbitrária, sem justificativa razoável e tampouco garantias fornecidas pelas Oss, já

que o instrumento contratual a ser firmado sequer exige a prestação de garantias para o

recebimento de tão vultosos recursos.

Como bem ressaltou o Ministro Aires Britto, o Estado não pode

desaprender a fazer o que sempre fez e, há de se acrescentar, não pode deixar de garantir

direitos fundamentais, que são ao final a verdadeira razão de existir e o que dá legitimidade

ao Estado.

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O Estado de Goiás coloca em risco, repise-se, de forma temerária e em

desproveito do patrimônio público, sem qualquer tipo de garantia ou contrapartida por parte

das organizações sociais, grande parte da rede pública estadual de ensino nestas

macrorregiões e o direito à educação básica obrigatória de milhares de pessoas.

Deve-se atentar para o fato de que não existe uma justificativa fática

compatível com a realidade. A uma, o Estado de Goiás tem todo o pessoal, sistemas e

estrutura necessária para a boa execução do serviço público que garante o direito

fundamental à educação básica. Tem atingido as metas do IDEB neste sentido. Se existe a

possibilidade de melhoria (sempre há), que seja obtida através de investimentos na própria

rede pública, nos estabelecimentos oficiais de ensino pois o Estado não pode renunciar ao

seu dever constitucional fundamental em matéria de educação, que lhe dá legitimidade, e

transferi-lo para a iniciativa privada, sem qualquer garantia ou contrapartida.

Neste sentido, seguindo a decisão da Ministra Rosa Weber na Reclamação

nº 15.733/RJ, divulgada em 17 de novembro de 2016, referente à saúde, mas que se aplica

integralmente ao caso:

“A segunda premissa, consistente na análise específica das cláusulas do Edital de

Seleção 004/2012, e mesmo da motivação deste ato administrativo, deixou claro

que a ação da autoridade administrativa deve corresponder aos motivos alegados,

sob pena de nulidade. Nesse contexto, entendeu a Corte Estadual que os

motivos invocados para a edição do ato, como as dificuldades ordinárias na

administração de unidades de tratamento intensivo e semi-intensivo,

existentes em hospitais tradicionais e antigos do Estado, não podem servir como

justificativa para a transferência da gestão administrativa e a execução de

serviços típicos de saúde para a iniciativa privada, ainda que através de

organizações sociais. Isso porque as dificuldades relatadas na motivação do

ato apenas revelam a deficiência na gestão do serviço de saúde.

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O raciocínio jurídico adotado foi no sentido de que, não obstante a possibilidade

de adoção do modelo de organizações sociais, na espécie, a motivação do Edital

de Seleção não logrou demonstrar a existência de fatos que autorizem a

contratação de entidade privada, sob qualquer forma, porque ausentes os

pressupostos legais e constitucionais. Desse modo, a transferência da gestão de

unidades de tratamento crítico, como a unidade intensiva e semi-intensiva, de

hospitais estaduais para a iniciativa privada, deve ocorrer apenas de forma

complementar e sem fins lucrativos, conforme dispõe a Lei 8.080/90, condições

que não ficaram demonstradas na motivação do Edital questionado.

Ao contrário: parte do dever constitucional imposto ao Estado de prestar serviço

público de saúde com eficiência e qualidade e do reconhecimento da participação

das instituições privadas na execução deste serviço, como forma de integrar o

sistema único de saúde, desde que sua atuação seja complementar e não uma

autêntica substituição da atividade estatal garantidora do direito à saúde a

todos.

Pelas razões expostas e pelos documentos acostados, verifica-se que o

Estado não logrou comprovar a insuficiência de disponibilidade ou mesmo a impossibilidade

de manutenção da rede pública de ensino, mas, ao contrário, demonstrou que possui

condições materiais e financeiras para tanto, assim como dispõe de profissionais da educação

aprovados em concurso público, razão pela qual não há como admitir que a administração de

escolas estaduais seja realizada por entidades privadas.

É evidente a inconstitucionalidade e ilegalidade que permeia os contratos de

gestão a serem celebrados com as organizações sociais para a gerência integral de

equipamentos públicos de educação, sendo impositivo que o Estado mantenha sob sua

responsabilidade a gerência de tais serviços, cuidando de observar todas as disposições

constitucionais e legais pertinentes.

Pondera-se, enfim, que as parcerias com a iniciativa privada na prestação de

serviços públicos, inclusive os de educação, somente poderiam ser levadas a cabo de forma

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complementar, observando-se as disposições constitucionais e legais que disciplinam a

matéria, o que não foi feito pelo Estado de Goiás, no modelo ora questionado.

D.1) Dos limites da gestão compartilhada

O artigo 2º, I, “c”, combinado com o artigo 6º, parágrafo único, da Lei

Estadual nº 15.503/05, é expresso ao prever que a celebração da parceria com as

organizações sociais dependerá exclusivamente do atendimento aos objetivos de eficiência

econômica, administrativa e de resultados.

Com fulcro na referida lei, o Estado de Goiás, por meio do Aviso de

Chamamento Público nº 01/2017, pretende celebrar contratos de gestão com organizações

sociais para a execução de atividades na área da educação, de forma ampla e irrestrita,

num modelo de compartilhamento que transcende a esfera administrativa e estrutural

das unidades de ensino, para atingir a sua gestão pedagógica.

Contudo, o artigo 156, caput, da Constituição do Estado de Goiás,

determina que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida

e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da

pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

No julgamento da ADI nº 1923/DF, que conferiu interpretação conforme a

Constituição à Lei nº 9.637/98, o Supremo Tribunal Federal admitiu que os entes federados

podem pactuar com entidades privadas a gestão compartilhada dos serviços sociais, todavia,

a Corte Maior não fixou os limites da referida parceria.

A análise acurada dos dispositivos acima mencionados revela que, na área

da educação, a parceria a ser estabelecida com as organizações sociais não pode abranger

a gestão pedagógica da unidade de ensino.

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Com efeito, os objetivos constitucionais da educação (artigo 156, caput, da

Constituição do Estado de Goiás), entendida como processo pedagógico de aprendizagem ou

acesso ao conhecimento, são incompatíveis com os objetivos da parceria com as

organizações sociais. De fato, o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o

exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho não podem se reduzir à lógica da

eficiência econômica, administrativa e de resultados (artigo 6º, parágrafo único, da Lei

Estadual nº 15.503/05).

Enquanto os recursos econômicos e administrativos podem ser geridos sob

a lógica da eficiência (alocação adequada de recursos escassos), o conhecimento é um

recurso infinito que deve ser garantido a todos em igualdade de condições. Em resumo, tratar

a gestão pedagógica com enfoque na “eficiência econômica e administrativa” pode gerar

prejuízos ao processo de aprendizagem e, por consequência, impedir o alcance dos objetivos

constitucionais da educação.

Ademais, o serviço educacional e, por consequência, o próprio direito

fundamental à educação, possui uma grande particularidade: a melhoria na sua prestação

depende quase que exclusivamente da melhora, desenvolvimento e valorização do quadro de

pessoal, da existência de carreiras para o magistério, o que é incompatível com o modelo

desenhado pelo Estado de Goiás.

Cabe ressaltar que por meio de recentíssima decisão do Ministro Ricardo

Lewandowski, datada de 31 de agosto de 2017, o Supremo Tribunal Federal deferiu medida

cautelar para suspender a eficácia dos artigos 2º e 3º da Emenda Constitucional n.º 86/2015,

nos autos da ADI n.º 5595/DF, que trata dos subpisos do financiamento do direito

fundamental à saúde, é baseada no princípio da vedação do retrocesso social, conforme se

extrai do seguinte trecho do julgado:

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“Tal procedimento fere frontalmente o dever de progressividade inscrito no art. 5º,

§§ 1º e 2º e também a garantia de irredutibilidade a que se refere o art. 194,

parágrafo único, IV da Constituição, os quais se encontram lastreados no nuclear

comando de preservação da dignidade da pessoa humana (art. 1º, caput e III) e

nos tratados internacionais sobre os direitos econômicos, sociais e culturais dos

quais o país é signatário”.

O princípio da proibição do retrocesso social é aplicável também ao caso

presente, em que, uma vez conquistada a valorização do quadro dos profissionais da

educação básica pública, com ingresso exclusivo mediante concurso público, garantia de

piso nacional e de planos de carreira, conforme normas constitucionais já destrinchadas, não

é permitido ao poder público diminuir o nível de garantia do direito fundamental à educação,

por meio da desvalorização dos seus profissionais.

Veja-se que não se questiona a possibilidade de o ente federado firmar

contratos de gestão com organizações sociais para a execução de serviços públicos sociais na

área da educação, posto que a questão já foi enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal (ADI

1923/DF). Discute-se sim a extensão desta parceria, que, conforme visto, não pode atingir a

gestão pedagógica da unidade escolar, a seleção de professores e profissionais da educação

escolar, nada impedindo que se atenha à gestão puramente administrativa (manutenção,

merenda, biblioteca, limpeza etc).

Por esse motivo, afigura-se necessária a anulação do Aviso de

Chamamento Público nº 01/2017, para que o Estado de Goiás delineie novo modelo de

compartilhamento de gestão das unidades escolares públicas, nos termos da lei e da

Constituição Federal.

E) DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA E DA AUSÊNCIA DE

ECONOMICIDADE NO MODELO A SER IMPLEMENTADO

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Conforme já apontado, a opção do Estado de Goiás de transferir a gerência de

serviços e equipamentos públicos da educação para organizações sociais, por detrás da

retórica da eficiência, constitui, em verdade, um mecanismo para fugir ao regime jurídico de

direito público a que se submete a Administração Pública.

Por meio dos contratos de gestão, além de abdicar do dever imposto

constitucionalmente de prestação direta dos serviços públicos de ensino, o Estado de Goiás

transferirá às organizações sociais vultuosas quantias (estimadas em quase 35 milhões de

reais anuais, conforme anexo V), sem nenhum controle efetivo de controle de gastos e do

emprego de recursos públicos por tais organizações sociais, violando o princípio da

eficiência administrativa, previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal.

Para a publicação do aviso de chamamento público nº 01/2017, não foi

realizado nenhum estudo ou pesquisa que demonstrasse que o modelo de gerência privada,

em substituição ao modelo de gerência pública, é mais eficaz ou mais econômico aos cofres

públicos.

Paralelamente, a Secretaria de Estado da Educação não demonstrou que os

custos dos serviços a serem contratados, quando prestados pela iniciativa privada, são mais

reduzidos que os custos dos serviços prestados pelo Estado. Ao contrário, reconheceu na

reunião retro mencionada que a gestão das escolas pelas organizações sociais teria o mesmo

custo por aluno.

Ora, Excelência, onde está a demonstração objetiva, pelo Estado de Goiás, de

que a opção pelo modelo adotado é de superior qualidade diante da sua atuação isolada na

prestação de serviços de educação?

O que estamos a assistir, perplexos, é uma verdadeira “farra” com o dinheiro

público!!!

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Tal implementação está sendo feita de forma autoritária, sem a participação

da sociedade e sem a demonstração objetiva de que, realmente, mais atende ao interesse

público, evidenciando a total falta de compromisso do administrador com a democracia. Por

outro lado, os argumentos “burocracia”, “morosidade”, “falta de qualificação profissional

para ações de gerenciamento” mais demonstram incompetência do administrador para o fim

ao qual se elegeu do que propriamente uma maior eficiência objetiva do novo modelo a ser

adotado, diante do outro.

Uma atuação governamental que, pela ineficiência, cause dano ao patrimônio

público pode ensejar, inclusive, a apenação do administrador público por improbidade

administrativa, nos termos do artigo 10, da Lei nº 8.429/92. Não pode se apresentar como

justificativa para aniquilar a Constituição da República e se esquivar de seu dever de prestar

diretamente educação básica obrigatória e gratuita, com a adoção de modelo flagrantemente

inconstitucional. Isso seria um grande absurdo!

Não logrou, o Estado de Goiás, até o presente momento, demonstrar que o

novo modelo de gestão adotado é, objetivamente, mais eficiente do que aquele em que o

Estado atua de forma solitária.

Ao contrário, pela análise dos contratos de gestão a serem celebrados,

constata-se que as “vantagens” tão amplamente “anunciadas” não compensam os custos e os

riscos para o patrimônio público e para os serviços de educação. Não se pode admitir que,

em nome de uma falsa observância a princípios, como a economicidade e a eficiência,

chancele o Poder Judiciário política pública flagrantemente inconstitucional.

Também, repise-se, os serviços serão pré-pagos, em parcelas mensais,

independentemente da sua efetiva prestação.

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A contraprestação estatal não terá por base, portanto, serviços efetivamente

prestados, mas se constituirá em um valor mensal fixo, que será repassado à organização

social, independentemente do quantitativo de serviços prestados.

Cabe destacar alguns pontos do edital que demonstram o dano ao

patrimônio público.

No modelo de contrato de gestão constante do anexo V do edital de

chamamento, cláusulas 2.17 e 2.18, consta que a organização social deverá publicar até 90

(noventa) dias após a assinatura do contrato de gestão, regulamento próprio para a

contratação de pessoal, compras, serviços e alienações, nos termos do art. 17 Lei Estadual

15.503/05.

Ocorre que este art. 17 Lei Estadual 15.503/05 viola a interpretação conforme

dada pelo STF no julgamento da ADI 1923, pois ali a Corte determinou que a organização

social deve contratar e selecionar pessoal de forma pública, objetiva e impessoal,

obedecendo aos princípios da administração pública (art. 37, caput, da CF). Ora, até por uma

questão lógica, para que o Estado tenha condições de avaliar a observância por parte das

OSs destes princípios da administração pública, o regulamento próprio deve existir antes da

assinatura do contrato de gestão. Ou seja, deve ser uma exigência do próprio edital de

chamamento público, e critério de avaliação.

Seguindo na análise das cláusulas violadoras do patrimônio público, a

cláusula 7.5 permite sem qualquer limitação o repasse de “outros recursos a título de

investimento”, pelo Estado à OSs. Ou seja, não há limite com relação aos valores do contrato

de gestão.

Na mesma senda, a cláusula 7.7 permite que as OSs apliquem recursos

públicos em qualquer entidade financeira, desde q tenha nota mínima “B” em “moeda local

de curto prazo”, o que deixa sem nenhuma garantia contra a perda destes recursos. Vide

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exemplo de recente operação deflagrada em julho de 2017 pela Polícia Federal para apurar

crimes contra o sistema financeiro nacional, envolvendo a aquisição de papéis sem lastro

(também conhecidos por “moeda podre”) por institutos de previdência municipais. Outras

operações no mesmo sentido precederam esta última, para o combate a tais crimes que têm

como modus operandi exatamente “investimentos financeiros” em fundos “podres”, o que

não é impedido pelo edital.

A cláusula 9.7 permite que até 95% dos recursos públicos repassados sejam

utilizados com remuneração de pessoal, o que está em evidente afronta às regras da lei de

responsabilidade fiscal (LRF). Em outras palavras, permite-se a irresponsabilidade fiscal,

com gastos pela OS de quase a totalidade dos recursos públicos repassados, com pessoal.

Cabe ressaltar que o dinheiro repassado não deixa de ser público e deve haver

responsabilidade em seu gasto.

Some-se a esta burla à responsabilidade fiscal a cláusula 10.1, que prevê a

possibilidade ilimitada de aditivos quantitativo (valores) e qualitativos, e facilmente

chega-se à conclusão de que o edital permite o total descontrole e irresponsabilidade dos

repasses públicos e dos gastos respectivos.

Ademais, no anexo técnico I, consta previsão na cláusula 8.1 da possibilidade

de alienação de móveis públicos por parte da organização social, mediante autorização

expressa do poder público e aplicação dos recursos no contrato de gestão, porém sem

qualquer definição específica do uso de tais valores ou impedimento no sentido do uso com

despesas correntes, por exemplo, o que caracterizaria verdadeira dilapidação do patrimônio

público.

Em resumo, o Estado de Goiás quer entregar toda a sua infraestrutura,

pessoal, recursos públicos para entidades recém formadas ou qualificadas como

organização social, sem experiência prévia anterior com educação pública, sem

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controles quanto aos recursos repassados, com possibilidade de burla à LRF, sem

qualquer garantia por parte da OS. Vê-se que não se trata de parceria, pois a OS não

assumirá nenhum risco, não dará nenhuma garantia e não aportará nada ao contrato.

Ora, qual o interesse do Estado em tal “parceria”? Na verdade trata-se de uma

transferência irresponsável e sem garantia a entidades privadas inexperientes.

Flagrante, portanto, o risco de dano ao patrimônio público.

O modelo adotado pelo Estado de Goiás constitui extensa violação aos

princípios da eficiência e da economicidade, bem como constitui patente vulneração à regra

específica do concurso público, de forma exclusiva, para a seleção de profissionais da

educação escolar, esculpida no artigo 206, inciso V, da Constituição Federal.

Em verdade, o objetivo da Administração Pública é, a longo prazo, com a

proliferação dos contratos de gestão nos moldes em que hoje pretende celebrar, extinguir a

carreira pública de profissionais da educação e de outras áreas em que já se acena, para a

substituição de servidores públicos por servidores contratados pela CLT, em total afronta à

regra esculpida no artigo 206, V, da Constituição Federal de 1988.

Assim, os contratos de gestão, ao preverem a possibilidade de contratação de

até 100% da mão-de-obra a ser utilizada na prestação dos serviços públicos objeto do

contrato, além de se apresentarem como artefato para a intermediação irregular de mão-de-

obra, denotam consequente violação à regra constitucional da obrigatoriedade do concurso

público, do mesmo modo que constituem flagrante violação ao princípio da eficiência

administrativa, pois oneram, desnecessariamente, os cofres públicos.

E.1) Do valor por aluno e da responsabilidade solidária pelas obrigações trabalhistas.

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Um dos pontos cruciais para se aferir se o processo de transferência de gestão

de escolas da rede pública para organizações sociais se amolda ou não ao princípio da

economicidade é verificar o valor por aluno.

No despacho n.º 596/2015, o Governador do Estado de Goiás afirmou que há

estudos, no âmbito da Secretaria de Estado da Educação, Cultura e Esportes, que apontam o

valor do aluno em R$ 388,00. Por outro lado, foi determinado, tanto no citado despacho do

Governador quanto no aviso de chamamento em tela, que o valor mínimo é de R$ 250,00 e o

máximo de R$ 350,00.

Os valores são muito díspares e podem dar margem a vários aditivos ao

contrato de gestão, de modo a frustrar a economicidade que o Estado de Goiás tanto

persegue nesse processo de terceirização.

A título de exemplo tem-se o valor estimado para despesas com água, previsto

no Aviso de Chamamento Público nº 003/2016, referente à Macrorregião de Anápolis. Em

relação a duas escolas no município de Anápolis, uma com 1.262 alunos e outra com 1.640,

enquanto para a primeira estima-se gastos com água no montante de R$ 9.555,00, para a

segunda o valor estimado é de R$ 261.550,00.

Ademais, a alardeada economicidade do modelo desconsidera, por completo,

os eventuais e sucessivos aditamentos de valores que certamente se consolidarão, a exemplo

do que já ocorre na área da saúde, onde já está instalado o modelo de gestão compartilhada.

Desconsidera, também, os riscos que, por força de lei, o Estado de Goiás

assumirá como responsável pelas obrigações trabalhistas que eventualmente não sejam

honradas pelas organizações sociais contratadas.

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Não se trata, no ponto, de simples conjectura. A título de exemplo, na área da

saúde, onde o modelo já está implementado, após auditoria do Ministério do Trabalho e

Emprego em Goiás, constatou-se que três das OSs contratadas deixaram de recolher mais de

R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais) em FGTS, nos últimos cinco anos. Isto sem falar nas

diversas fraudes trabalhistas que, por força de lei, atraem a responsabilidade do Estado de

Goiás, conforme noticiado às fls. 396/397 do incluso inquérito civil.

E.2) Das restrições ao uso dos recursos do FUNDEB.

O capítulo VIII, do Aviso de Chamamento Público nº 01/32017 trata das

dotações orçamentárias que serão utilizadas para custear as despesas decorrentes da

celebração do contrato de gestão.

Em reunião realizada no dia 28/09/2017 na Procuradoria-Geral de Justiça,

a Secretária Estadual de Educação sustentou que recursos do FUNDEB serão utilizados para

pagar os concursados vinculados à SEDUCE e descontados dos valores que serão repassados

às OS. Ou seja, não vão transitar pelas contas das OSs. Somente foram consignados para

atender ao princípio da transparência, para evidenciar o custo real de cada escola. O mesmo

foi pontuado na resposta da Secretária Estadual de Educação à recomendação expedida no

incluso inquérito civil (fls. 334verso, item 15)

Contudo, o item 8.1 do Aviso de Chamamento Público n.º 01/2017 prevê

que as despesas com pessoal e encargos sociais (grupo de despesa 01) correrão à conta de

recursos advindos da fonte com o código 08, que corresponde ao Fundo de Manutenção e

Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação –

FUNDEB, conforme se extrai da anexa Lei Estadual nº 19.225/2016, que “Orça a receita e

fixa as despesas do Estado para o exercício de 2016”.

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O artigo 22, da Lei Federal n° 11.494/2007, que regulamenta o FUNDEB,

estipula que “pelo menos 60% (sessenta por cento) dos recursos anuais totais dos Fundos

serão destinados ao pagamento da remuneração dos profissionais do magistério da

educação básica em efetivo exercício na rede pública” considerando “efetivo exercício:

atuação efetiva no desempenho das atividades de magistério previstas no inciso II deste

parágrafo associada à sua regular vinculação contratual, temporária ou estatutária, com o

ente governamental que o remunera (...)”

Logo, por força de lei, apenas pode ser contabilizada na parcela mínima de

60% (sessenta por cento) do FUNDEB a remuneração dos profissionais do magistério em

efetivo exercício na educação básica pública, com vínculo temporário ou permanente com

o ente governamental que os remunera, in casu, o Estado de Goiás.

A contrario sensu, a remuneração dos profissionais do magistério e dos

demais servidores que venham a ser contratados pelas organizações sociais, sob o regime

celetista, sem vínculo com o ente governamental, não poderá ser computada na referida

parcela.

Ademais, o que se observa é que o Estado de Goiás possui toda a estrutura

humana e material para a prestação do serviço educacional, mas pretende repassar a gestão

das unidades educacionais a empresas privadas, propondo-se a arcar com o ônus de todo o

processo, num verdadeiro ato de imprudência contábil e administrativa, tudo em busca de

uma arriscada flexibilização jurídica para aquisição de bens, serviços e contratação de

pessoal.

Aliás, consoante apurado pelo Ministério Público de Contas do Estado de

Goiás (representação anexa), no primeiro quadrimestre de 2017, o Poder Executivo Estadual

ultrapassou, em R$ 207.936.324,69 (duzentos e sete milhões, novecentos e trinta e seis mil,

trezentos e vinte e quatro reais e sessenta e nove centavos), o limite prudencial de gasto com

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pessoal previsto no artigo 20, II, alínea “c”, da Lei de Responsabilidade Fiscal. O mesmo

cenário foi constatado nos três quadrimestres do ano de 2016, evidenciando que o Estado de

Goiás vem sucessivamente ultrapassando o limite prudencial de gastos com pessoal

determinado em lei.

Em representação protocolizada no Tribunal de Contas do Estado de Goiás,

no dia 27 de julho de 2017, o Ministério Público de Contas de Goiás pontuou que, conforme

publicado no Relatório de Gestão Fiscal do Poder Executivo Estadual referente ao I

quadrimestre de 2017, “(...)o valor total da despesa com pessoal representa 47,24% da

Receita Corrente Líquida, porcentagem esta que atinge o patamar de 97,2% do Limite

Máximo estabelecido pelos incisos I, II e III do art. 20 da LRF, superando, portanto, o

percentual de 95% estabelecido como limite prudencial na LC nº 101/2000.”

A seguir, o referido órgão de contas ponderou que, apesar de o Poder

Executivo Estadual vir, desde o 1º quadrimestre de 2016, ultrapassando o limite prudencial

de 95%, “inexiste qualquer evidência do cumprimento das vedações impostas pelo art. 23

da LC nº 101/2000. Pelo contrário (...), o Poder Executivo Estadual continua adotando

medidas que implicam o aumento de despesa com pessoal durante o segundo semestre de

2017”.

Nesse passo, a possibilidade de contratação, pelas OSs, de 0 a 100% dos

professores e servidores administrativos nas dezenas de escolas que serão transferidas para a

gestão das organizações sociais é mais uma medida que implicará inevitável aumento da

despesa com pessoal.

Logo, diante da ausência de indícios da economicidade do modelo e

considerando a cautela com que a administração pública deve lhe dar no trato da coisa

pública, imperioso que o Aviso de Chamamento Público em tela seja anulado.

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F) DA OFENSA AO PRINCÍPIO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DO ENSINO

PÚBLICO

O artigo 206, VI, da Constituição Federal de 1988 e o artigo 153, § 1º, da

Constituição do Estado de Goiás consagram a gestão democrática como um dos princípios

do ensino público.

O mesmo preceito está consagrado no artigo 14, da Lei Federal nº 9.394/1996

(que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional) e no artigo 106, da Lei

Complementar-GO nº 26/1998 (que estabelece as diretrizes e bases do sistema educativo no

Estado de Goiás), além de reforçado nos artigos 8º, 156, XV, e 204, § 1º, da Lei Estadual

13.909/2001.

Outrossim, a Lei Federal 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente)

prevê que é direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como

participar da definição das propostas educacionais (artigo 53, parágrafo único).

A Lei Federal 12.852/2012 (Estatuto da Juventude, que considera jovens

pessoas entre 15 e 29 anos) também garante a participação efetiva da sociedade na gestão

democrática do ensino (artigos 2º, II, e 12).

Paralelamente, a meta 19, do Plano Nacional de Educação, previsto na Lei nº

13.005/2014 contempla a efetivação da gestão democrática da educação:

> Meta 19: assegurar condições, no prazo de 2 (dois) anos, para a

efetivação da gestão democrática da educação, associada a critérios

técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade

escolar, no âmbito das escolas públicas, prevendo recursos e apoio técnico

da União para tanto.

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- Estratégias: (…) 19.1) priorizar o repasse de transferências voluntárias

da União na área da educação para os entes federados que tenham

aprovado legislação específica que regulamente a matéria na área de sua

abrangência, respeitando-se a legislação nacional, e que considere,

conjuntamente, para a nomeação dos diretores e diretoras de escola,

critérios técnicos de mérito e desempenho, bem como a participação da

comunidade escolar; (...)

19.7) favorecer processos de autonomia pedagógica, administrativa e de

gestão financeira nos estabelecimentos de ensino.

Apesar de todo esse arcabouço normativo consagrando a gestão democrática

do ensino público, o que se tem verificado nesse processo de transferência de gestão de

escolas da rede pública estadual para organizações sociais é que a decisão já foi tomada pelo

Chefe do Poder Executivo Estadual.

Com efeito, ao ler o despacho n.º 596/20154, da lavra do Sr. Governador do

Estado, percebe-se que o atual procedimento da Secretaria de Estado da Educação, Cultura e

Esportes em ouvir representantes dos professores, dos alunos, do Ministério Público, etc., é

apenas uma tentativa de conferir legitimidade para uma decisão tomada há muito tempo, isto

é, foi estabelecido um contraditório meramente formal, pois os principais impactados pela

terceirização não poderão influenciar na decisão do Chefe do Poder Executivo e seus

prepostos, uma vez que já foi decretada.

Do citado despacho n.º 596/2015 lê-se:

(…) As razões, estudos, documentos e justificativas contidas nos autos

convencem-me do acerto e da necessidade em o Estado de Goiás promover

a transferência da gestão de equipamentos públicos escolares da Educação

4 http://www.gabinetecivil.goias.gov.br/downloads/despacho_596.htm.

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Básica a parceiros privados, aos quais competirá, seguindo a política

pública para a educação ditada pela Administração, executar a referida

atividade de relevância pública.

E são várias as razões que me levam a, como decisor governamental,

adotar o programa de parcerias de que aqui se cuida.

(…)

Assim que, razões de gestão e de economicidade, somadas ao atual quadro

de constrangimentos orçamentário e financeiro por que passa o Estado – o

que não é apanágio exclusivo da realidade goiana – levam-me a buscar

medida alternativa à realização de tão elevada despesa pública por meio do

integral provimento dos quadros do magistério. A propósito disso, vale

anotar que, com base em estudo técnico carreado aos autos (f. 633-641), o

aumento do gasto por aluno ou por professor não tem tido presentemente

efeito direto nas notas das escolas no Índice de Desenvolvimento da

Educação Básica (IDEB), fator este que reputo como relevante para a

adoção da presente política pública de emparceiramento.

Nesse particular, é importante assentar que a adoção do modelo de gestão

compartilhada de unidades escolares, que no Estado pretendo

implantar, não importará em precarização da carreira do magistério

público, já que toda escola pública haverá de contar sempre com um

determinado percentual mínimo de professores ocupantes de cargo de

provimento efetivo e que ali haverão de ter exercício funcional mediante

cessão do Poder Público aos parceiros privados (art. 14-B, Lei estadual nº

15.503/05).

(…)

Nesses termos, consagrando a Lei estadual nº 15.503/05 a “educação” (art.

2º, I, “c”) como atividade de fomento público viável por meio de contrato

de gestão com organizações sociais, deve preparar-se agora o ente político

para dar concretude à referida hipótese de provisão. Assim que, ciente da

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necessidade de dar novos e modernos contornos à gestão da educação

pública no Estado de Goiás, a transferência de unidades da Educação

Básica para organizações sociais, por meio da celebração de contratos de

gestão com o Poder Público, consubstancia medida que realiza o interesse

público.

(…)

Assim é que, à vista de tudo o que consta dos presentes autos, e em

atendimento ao que preceitua o parágrafo único do art. 6º da Lei estadual

nº 15.503/05, com redação dada pela Lei estadual nº 18.331/13, tenho por

bem, no exercício de minha competência governamental, determinar a

transferência da gestão de escolas públicas estaduais a organizações

sociais, por meio da celebração de contratos de gestão, nos estritos termos

do que estabelecem aquelas leis de regência e nos limites do que ditado

pelo Decreto nº 8.469/15, por concluir que a medida mostra-se por tudo

adequada ao atendimento do interesse público.

(…)

Enfim, para que a atividade de fomento público tenha lugar, e em

prosseguimento às preliminares providências administrativas

documentadas às f. 4-5 e f. 503 e, bem assim, em atenção ao conteúdo do

Decreto nº 8.469/15, determino à titular da Secretaria de Estado de

Educação, Cultura e Esporte (SEDUCE) e à Comissão Especial de que

trata o inciso II do § 1º do art. 6º-B da Lei estadual nº 15.503/05, a adoção

de todas as medidas necessárias à condução do processo público,

objetivo e impessoal para a transferência da gestão de unidades

escolares da rede básica de ensino, principiando por aquelas da

Subsecretaria de Educação de Anápolis, a organizações sociais de

educação.

Determino ainda que, em atenção à política pública em causa, a Secretaria

de Estado de Educação, Cultura e Esporte (SEDUCE) promova junto aos

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municípios envolvidos na transferência da gestão de escolas públicas

estaduais a oferta de um fluxo de informações transparente e constante à

comunidade escolar – diretores, professores, servidores administrativos,

alunos e pais de alunos –, de modo a participá-la ativamente da

implantação desse importante e inovador modelo de gestão de escolas

públicas. (sem destaques no original)

Demais disso, verificou-se que, mesmo após as audiências públicas

realizadas pela Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte de Goiás, nas

Macrorregiões de Macrorregiões de Águas Lindas/Planaltina e Luziânia/Novo Gama, nos

dias 25/04/2017 e 18/05/2017, apesar das incisivas manifestações dos órgãos e entidades

militantes na área da educação, o projeto original não foi alterado, evidenciando que a

construção democrática do modelo de fato não ocorreu.

Ora, é clarividente que a decisão de “emparceiramento” na gestão das escolas

da rede pública estadual está sacramentada, ficando claro, ainda, que os diretores,

professores, servidores administrativos, alunos e pais de alunos deverão ser convencidos

acerca da adoção do modelo. Enfim, não há nada de democrático nesse processo de

transferência de gestão para organizações sociais.

Não se nega, à evidência, que o Governador do Estado foi eleito para tomar

diversas decisões em nome de seus concidadãos, porquanto é um legítimo representante do

povo. Todavia, quando se trata de ensino público, a Constituição Federal, a Constituição de

Goiás, as Leis Federais 8.069/1990, 9.394/1996 e 12.852/2012, a Lei Complementar-GO n.º

26/1998 e a Lei Estadual 13.909/2001 mitigam esse poder dos mandatários de ocasião.

De fato, a gestão democrática do ensino público confere aos professores,

diretores, servidores administrativos, alunos e pais de alunos o poder de participarem

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diretamente - isto é, sem intermédio de representantes eleitos - da gestão administrativa,

didática e pedagógica das escolas e demais instituições de ensino público.

Ora, o direito político de todo cidadão participar da direção dos assuntos

públicos de seu País, de seu Estado e de seu Município, inclusive diretamente, decorre tanto

do parágrafo único do art. 1º da Constituição Federal, quanto do art. 23, 1, “a”, da

Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). Bem por

isso, o cidadão goiano tem direito a um contraditório substancial no processo de

transferência da gestão de escolas públicas estaduais para organizações sociais e não ser um

mero destinatário de propaganda do Governo do Estado.

Esse o quadro, em razão do deficit democrático que tem marcado o processo

de transferência da gestão de escolas públicas estaduais para organizações sociais no âmbito

do Estado de Goiás, afigura-se salutar a anulação do Aviso de Chamamento Público nº

01/2017.

G) DAS FRAGILIDADES DO PROCESSO DE HABILITAÇÃO DAS

ORGANIZAÇÕES SOCIAIS EM MATÉRIA DE EDUCAÇÃO:

As fragilidades do processo de habilitação das organizações sociais em

matéria de educação são assaz evidentes e já resultaram no ajuizamento de diversas ações

civis públicas em face de outras organizações sociais que celebraram contratos de gestão de

objetos análogos em outras macrorregiões do Estado de Goiás.

Até o presente momento, a SEDUCE não publicou o resultado do

credenciamento correlato ao Aviso de Chamamento Público n. 01/2017, sendo este o único

motivo pelo qual uma das organizações sociais não foi inserida no polo passivo da presente

ação.

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De toda sorte, impende salientar a ocorrência de múltiplas falhas no processo

de habilitação que precedeu a publicação de todos os Avisos de Chamamento Público

destinado à seleção de organizações sociais qualificadas em educação no âmbito deste

Estado para a celebração de Contratos de Gestão objetivando o gerenciamento, a

operacionalização e a execução das atividades administrativas, de apoio, para a implantação

e implementação de políticas pedagógicas, definidas pela SEDUCE, nas Unidades

Educacionais da Rede Pública Estadual de Ensino de diferentes macrorregiões, inclusive na

Macrorregião VIII – Águas Lindas/Planaltina.

De início, cumpre realçar as diversas ações civis públicas ajuizadas na

capital goiana em desfavor do Centro de Soluções em Tecnologia e Educação (Centeduc),

Centro de Gestão em Educação Continuada (Cegecon), Instituto REGER de Educação,

Cultura e Tecnologia (REGER), FUNDAÇÃO ANTARES DE ENSINO SUPERIOR,

PÓSGRADUAÇÃO, PESQUISA E EXTENSÃO (FAESPE) e Instituto Brasileiro de

Cultura, Educação, Desporto e Saúde (IBRACEDS), conforme amplamente divulgado pela

imprensa deste Estado e ilustrado pelos documentos de fls. 184/200 do incluso inquérito

civil.

Até o momento, duas organizações sociais (Oss) foram inabilitadas na sessão

pública de abertura dos envelopes do Chamamento Público n. 01/2017 mas lhes foi

concedido um prazo de 8 (oito) dias úteis para a entrega de novos envelopes (fls. 325/326 do

anexo inquérito civil), sendo elas o Instituto Brasileiro de Cultura, Educação, Desporto e

Saúde (IBRACEDS) e Instituto Destra de Educação.

Acerca do Instituto IBRACEDS, cumpre tecer algumas considerações.

A bem da verdade, a qualificação do IBRACEDS como organização social na

área de educação do Estado de Goiás foi uma verdadeira ação entre amigos. Em fevereiro de

2015 o IBRACEDS passou por uma reformulação completa em seu quadro de associados,

chamando a atenção do ingresso de uma pessoa: Gustavo Paixão Faleiros.

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Gustavo Paixão Faleiros é filho de Antônio Faleiros Filho, que à época da

qualificação do IBRACEDS como organização social ocupava o cargo de Secretário de

Estado Extraordinário, situação que configura nepotismo.

Além do nepotismo, observe-se que Antônio Faleiros Filho foi designado

pelo Governador do Estado de Goiás, por meio do Decreto nº 8.441, de 28 de agosto de

2015, coordenador do Grupo de Trabalho instituído com a finalidade de proceder às medidas

necessárias à celebração de contratos de gestão por organizações sociais na área de

educação.

Ora, Antônio Faleiros Filho chefiava o grupo responsável por ter qualificado

a instituição do filho Gustavo Paixão Faleiros como organização social. Trata-se de

clarividente violação aos princípios da impessoalidade e da moralidade.

Vale registrar, em obiter dictum, que em 2011/2012 Antônio Faleiros Filho

foi Secretário de Estado da Saúde e nessa época André Luiz Braga das Dores foi diretor do

Hospital Geral de Goiânia (cargo em comissão), ou seja, subordinado diretamente ao

Secretário. Portanto, qualificar a associação do filho (Gustavo) e do amigo (André) foi algo

realmente inconstitucional, violador dos princípios da administração pública.

Ainda em caráter obiter dictum, para se ter uma ideia da “ação entre amigos”

no âmbito do IBRACEDS, após se sagrar vencedor do lote nº 01 do chamamento público nº

005/2016-SED, a organização social realizou diversos chamamentos públicos, entre eles o

edital de chamamento nº 001-A/2017 para contratação de assessoria jurídica pelo prazo de

12 (doze) meses e previsão de valor global de R$ 240.000,00.

No site do IBRACEDS consta o edital datado de 24/05/2017 e o prazo para

inscrição de 25/05 a 01/06/2017. Não se sabe se houve publicação em jornal de grande

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circulação ou algo parecido que assegurasse transparência ao chamamento. No dia

01/06/2017 foram abertas as propostas e somente acorreram 3 (três) interessados, o que

causa espécie para um contrato dessa magnitude. Ademais, sabe-se que o mercado

advocatício passa por momentos dramáticos no país e um contrato que garanta até R$

20.000,00 por mês é bastante atrativo.

De todo modo, sagrou-se vencedor o escritório Brzezinski Advogados

Associados S/S, pertencente a João Paulo Brzezinski da Cunha, advogado pessoal do

Governador do Estado de Goiás Marconi Ferreira Perillo Júnior e ex-Defensor Público Geral

no período em que Antônio Faleiros Filho foi Secretário de Saúde.

O art. 2º, II, “d”, da Lei Estadual 15.503/2005 exige idoneidade moral dos

dirigentes das organizações sociais. Contudo, no processo de qualificação do IBRACEDS

percebe-se que essa exigência não foi observada.

A fim de avaliar a idoneidade moral de candidatos em concursos públicos, é

usual a Administração Pública exigir certidões dos ofícios da Justiça Estadual de distribuição

de feitos criminais, cíveis, protestos de títulos, interdição e tutela das cidades em que o

candidato reside ou residiu nos últimos 5 (cinco) anos, bem como certidões da Justiça

Federal, Eleitoral Militar da União e folhas de antecedentes da Polícia Civil e da Polícia

Federal.

Com efeito, essas certidões acima referidas são o mínimo para se aferir a

idoneidade moral de alguém, todavia, nem essas esse mínimo de zelo foi exigido dos

dirigentes da IBRACEDS.

André Luiz Braga das Dores é réu de ação penal (protocolo nº 458551-

56.2011.8.09.0175) e de ação de improbidade administrativa (protocolo nº

257105.49.2012.8.09.0051) decorrentes da rumorosa operação “Fundo Corrosivo”,

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deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – GAECO do

Ministério Público do Estado de Goiás, a qual descobriu desvio de verbas do fundo rotativo

de hospitais públicos estaduais, dentre eles o Hospital Geral de Goiânia, à época dos fatos

chefiado por André.

Além dessas ações, André Luiz Braga das Dores responde à ação de

improbidade administrativa nº 307230.50.2014.8.09.0051, que sindica um dano ao erário do

importe de R$ 15.180.000,00.

Leandro Rodrigues de Almeida é réu em ação civil de improbidade

administrativa na Comarca de São Simão (protocolo nº 5600-83.2016.8.09.0173), sendo que

a acusação pode ser assim resumida: a) fraude à Carta Convite nº 057/2013; b)

superfaturamento do contrato nº 03/2013; c) pagamento por livros não entregues, fatos

ocorridos entre abril e junho de 2013, com prejuízo ao FUNDEB de São Simão/GO no

montante de R$ 74.257,06.

Assim, vê-se que André Luiz Braga das Dores e Leandro Rodrigues de

Almeida não possuem idoneidade moral para dirigirem uma organização social, conforme

exige a legislação goiana.

Como se vê, não houve aferição mínima de idoneidade moral dos membros

do IBRACEDS, pois uma simples exigência de certidões judiciais seria suficiente para

desqualificá-los como dirigentes de uma organização social.

O art. 2º, II, “d”, da Lei Estadual 15.503/2005 exige notória capacidade

profissional dos dirigentes das organizações sociais. Contudo, no processo de qualificação

do IBRACEDS percebe-se que essa exigência não foi observada.

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No âmbito da Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Desporto não foi

exigido nada a respeito da notória capacidade profissional dos dirigentes do IBRACEDS,

porquanto não foi feita nenhuma entrevista com os interessados, não houve a juntada de um

currículo sequer no momento em que os autos tramitaram na SEDUCE, não se sabe qual a

capacidade profissional de qualquer membro do IBRACEDS na área de educação, muito

menos se é notória ou não.

Enfim, agentes públicos da SEDUCE qualificaram o IBRACEDS como

organização social da área de educação e cultura sem avaliar o requisito legal de notória

capacidade profissional (fls. 400 e 414 do incluso inquérito civil).

A situação correlata ao Instituto Destra de Educação não difere muito.

Para desacolher a recomendação conjunta expedida pelo Ministério Público

do Estado de Goiás, Ministério Público Federal e Ministério Público Especial junto ao

Tribunal de Contas do Estado de Goiás, a segunda ré informou esta Promotoria de Justiça

que foram adotadas medidas para arrostar uma possível inidoneidade das entidades

participantes. Para tanto "passou-se a prever, como exigência de habilitação do edital de

chamamento 003/2017, certidões cíveis e criminais de todos os dirigentes das entidades,

inclusive conselheiros, além de tornar expressas as vedações legais" – fls. 334v e 335 do

inquérito civil anexo).

Ora, não fosse bastante tudo que já foi pontuado acerca dos membros do

Instituto Brasileiro de Cultura, Educação, Desporto e Saúde (IBRACEDS), observa-se que

Karla Azeredo Ramos de Castro e Marcus Vinicius Rodrigues Lima, Gerente de

Controladoria e Prestação de Contas da Destra e membro do Conselho Fiscal do Instituto

Destra de Educação, respectivamente, respondem a uma ação civil pública por ato de

improbidade administrativa (autos PROJUDI n. 54931-12.2016.8.09.0051) em razão de

possíveis danos ao erário no tocante a despesas relativas à manutenção de equipamentos

médico-hospitalares no Hospital Geral de Goiânia-HGG.

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Karla Azeredo Ramos de Castro responde a outra ação civil de

responsabilidade por ato de improbidade administrativa, na qual teve bens bloqueados por

suspeita de dano ao erário pois, na condição de chefe da Divisão de Manutenção do Hospital

de Urgências de Goiânia (HUGO), ela e outros três servidores teriam atestado notas fiscais

sem que houvesse prova fundada de que as manutenções contratadas foram executadas.

Anote-se que a decisão liminar foi agravada mas foi mantida pelo Egrégio

Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.

O grande trânsito de pessoas entre as organizações sociais qualificadas para a

atuação nas áreas da saúde e educação, por si só, já é um forte indicativo de que as

organizações sociais qualificadas pelo Estado de Goiás nesta última seara não preenchem o

requisito legal da notória capacidade profissional.

A SEDUCE contrapôs-se à recomendação conjunta, salientando em sua

resposta que a falta de prévia experiência das organizações sociais participantes em matéria

de gestão educacional seria natural, por se tratar de um “modelo inovador”, sem qualquer

paralelo no país (fl. 334v do inquérito civil).

Ao fazê-lo, porém, reconheceu expressamente que elas não possuem

experiência em matéria educacional.

Ademais, por ocasião das audiências públicas, representantes da SEDUCE

defendiam que a idoneidade e a capacidade de desempenho das organizações sociais seria

medida pela pessoa de seus gestores.

Verifica-se, portanto, que não fosse bastante a fragilidade do modelo

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defendido, no caso em análise, a Secretaria de Educação do Estado de Goiás encontra-se em

vias de contratar organizações sociais constituídas às pressas para incursionar pela seara da

educação, cujos membros respondem a ações de improbidade administrativa inclusive por

atos lesivos ao erário, o que torna as suas inidoneidades inequívocas.

III - DA TUTELA DE URGÊNCIA ANTECIPADA EM CARÁTER LIMINAR

O Novo Código de Processo Civil cuidou da tutela provisória em seus arts.

294 a 311 e disciplinou a tutela provisória de urgência mais especificamente nos artigos 300

a 302. Sobre o tema, dispôs o art. 294:

Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou

evidência.

Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada,

pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

Textualmente, dispôs o art. 300 do Novo Diploma Processual Civil que a

“tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a

probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”, com o

que o Novo Código conferiu a mesma disciplina basilar às tutelas provisórias de cunho

satisfativo e cautelar, sobretudo quanto aos pressupostos.

Como se vê, com a nova disciplina conferida ao tema, os dois clássicos

pressupostos da tutela de urgência, a saber, a “a fumaça do bom direito” e o “perigo da

demora” foram transformados em “probabilidade do direito” e “perigo de dano ou risco ao

resultado útil do processo” e já não se fala, tampouco, em demonstração da “prova

inequívoca” ou “verossimilhança do direito” para o deferimento de uma tutela provisória.

A tutela provisória de urgência destina-se a arrostar uma situação de risco ao

resultado colimado por intermédio da tutela jurisdicional, bastando, para tanto, a

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demonstração da probabilidade do direito alegado e do perigo de dano ou risco ao resultado

do processo.

O quadro fático-jurídico até o momento analisado justifica a concessão

da tutela provisória de urgência para a suspensão do Aviso de Chamamento Público nº

01/2017, haja vista a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano ou o risco ao

resultado útil do processo.

Para as obrigações de fazer e não fazer, a concessão da tutela de urgência de

natureza satisfativa (antecipada) possui previsão nos artigos 300 a 304 do Novo Código de

Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), aplicável à Ação Civil Pública por

força do que dispõe o artigo 19 da Lei 7.347/855. Como bem salienta Lúcia Valle Figueiredo,

citada por Rodolfo de Camargo Mancuso (in Ação Civil Pública, 5ª edição, p. 145, Editora

Revista dos Tribunais):

“Deverá o magistrado pela prova trazida aos autos, no momento da concessão

da tutela, estar convencido de que, ao que tudo indica – o autor tem razão e a

procrastinação do feito ou sua delonga normal poderia pôr em risco o bem de

vida protegido – dano irreparável ou de difícil reparação. A irreparabilidade

do dano na ação civil pública é manifesta, na hipótese de procedência da

ação. A volta do ‘status quo ante’ é praticamente impossível e o ‘fluid

recovery’ não será suficiente a elidir o dano.

Mister também salientar que os valores envolvidos na ação civil pública

têm abrigo constitucional. A lesão a ditos valores será sempre irreparável

(danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valores

histórico, turístico e paisagístico)”.

5 Intepretação analógica do dispositivo legal, uma vez que que o artigo 19 da Lei 7.347/85 se refere ao

revogado Código de Processo Civil de 1973.

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O art. 84, § 3°, do Código de Defesa do Consumidor, incidente no caso por

integrar o microssistema processual coletivo, autoriza a concessão de tutela liminarmente ou

após justificação prévia, quando for relevante o fundamento da demanda e houver justificado

receio de ineficácia do provimento final.

Por sua vez, a Lei 7.347/85, que disciplina a ação civil pública, contém

expresso preceito permissivo do deferimento de medida liminar, contido no artigo 12,

segundo o qual “poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia,

em decisão sujeita ao agravo”.

Em face da absoluta harmonia com o instituto regulado pelos artigos 303 e

304 do novel Código de Processo Civil, tem-se por inegável a natureza antecipatória da

medida liminar encartada no Código de Defesa do Consumidor e na Lei da Ação Civil

Pública.

A concessão da tutela de urgência antecipada, pois, possui os seguintes

requisitos essenciais: a apresentação no bojo do processo de elementos que evidenciem a

probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

No caso em exame, dúvidas não restam quanto à probabilidade do direito

alegado, consoante se infere dos argumentos e dispositivos legais trabalhados

exaustivamente nos tópicos acima, sobretudo em virtude da afronta à regra específica que

dispõe sobre a necessidade de seleção dos profissionais da educação escolar por meio de

concurso público (art. 206, inciso V, da Constituição Federal) e da violação à meta 18.1 do

Plano Nacional de Educação, estabelecido pela Lei Federal n.º 13.005/14 e à estratégia 19.1

do Plano Estadual de Educação do Estado de Goiás, aprovado pela Lei Estadual n.

18.969/15.

A inconstitucionalidade e ilegalidade do projeto foi destacada para o Estado

de Goiás para a SEDUCE-GO por intermédio da recomendação conjunta expedida pelo

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MPGO/MPF-GO/MPC-GO (fls. 303/324 do inquérito civil n. 201700328219), na qual, em

breve síntese, foram levantados os seguintes pontos:

a prestação do serviço educacional é obrigação direta e intransferível do Ente

Estadual e da respectiva Secretaria investida de atribuições para tal, nos termos da

CRFB e da legislação infraconstitucional pertinente;

não há elementos suficientes oferecidos pelo Estado de Goiás e pela SEDUCE-GO

no chamamento público que comprovem a economicidade do modelo a ser

implantado.

não existe um planejamento dos pólos passivos para conciliar uma gestão privada e

as atribuições históricas dos servidores eleitos pelas próprias comunidades escolares

para gerirem as unidades, fato que enseja verdadeira distorção do princípio da gestão

democrática, previsto na CRFB e nas LDB's nacional e estadual;

O Aviso e Chamamento Público nº 1/2017 não prevê um percentual máximo de

professores e servidores administrativos que poderão ser contratados sob regime

celetista, razão por que as Oss contratadas poderiam se valer de 0 a 100% desses

servidores.

Extrapolamento dos limites da gestão compartilhada, já que no aviso de chamamento

pretende-se celebrar contratos de gestão para a execução de atividades na área de

educação que extrapolam a esfera administrativa e estrutural das unidades de ensino,

de sorte a atingir a gestão pedagógica.

Os objetivos constitucionais da educação, assim entendida como processo

pedagógico de aprendizagem ou acesso ao conhecimento, são incompatíveis com os

objetivos da parceria com as OSs e a lógica do lucro.

A decisão do STF na ADI nº 1923 não se aplica integralmente ao caso analisado,

especialmente em virtude da Emenda Constitucional nº 53/09, que condicionou o

ingresso no magistério das redes públicas de ensino à aprovação em concurso

público.

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70

Com efeito, a probabilidade do direito alegado está plenamente evidenciada

pela flagrante desobediência às normas constitucionais e infraconstitucionais já referidas. O

processo de transferência de gestão das unidades escolares da macrorregião Anápolis é

temerário e está repleto de indícios que poderá ensejar futuras irregularidades, além de

prejuízos ao erário e ao processo educacional dos discentes envolvidos, conforme a

documentação anexada.

O perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo não é menos

induvidoso.

A permissão da continuidade do processo iniciado no Chamamento Público nº

001/2017, por outro lado, poderá acarretar atos lesivos aos interesses tutelados nesta ação,

com prejuízos inestimáveis e irreversíveis à educação de milhares de crianças,

adolescentes e jovens decorrentes de uma mudança drástica de gestão, sem qualquer

garantia por parte das organizações sociais selecionadas.

A probabilidade de dano ao patrimônio público é manifesta, na medida

em que sequer serão exigidas garantias por parte das organizações para o recebimento

de tão vultosos recursos, na casa de milhões de reais. Ademais, diversos pontos já destacados

nesta ação demonstram a total falta de controle dos valores repassados e do modo de

utilização de tais recursos públicos, abrindo espaço para graves desvios de tais recursos

Com educação básica obrigatória e pública não se pode experimentar, ainda

mais em larga escala e sem garantias como quer o governo do Estado.

No ponto, vale efetuar um paralelo entre a situação ora analisada e a decisão

proferida pelo Tribunal de Justiça de Goiás nos autos nº 201203818275, referente ao repasse

da gestão de hospitais públicos estaduais a organizações sociais, cuja integralidade do texto

segue abaixo:

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“DECISÃO

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS propôs ação civil

pública, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, em desfavor do

ESTADO DE GOIÁS e outros.

Aduz que o Estado de Goiás decidiu por repassar a gerência de hospitais

estaduais, firmando contratos de gestão, para organizações sociais. Afirma

que o Estado não homologou a decisão do Conselho Estadual de Saúde que

teria se manifestado negativamente quanto a celebração de tais contratos.

Sustenta que o serviços repassados às organizações sociais são previamente

quantificados nos contratos e pagos, independente de sua efetiva execução.

Complementa que, caso não haja a efetiva execução do serviço em dado

período, o pagamento referente à parcela subsequente poderá sofrer redução

de 10 a 20% tão-somente, havendo contratos de gestão que não prevêem

redução alguma.

Verbera que, nesses contratos, as O.S.s poderão contratar até 50% dos

empregados de forma direta, sob o regime celetista, podendo despender,

dependendo do contrato, de 60% a 70% do valor do contrato para gastos

com pessoal. Ressalta que, em função de tais previsões contratuais, muitos

servidores concursados vêm sendo removidos e lotados onde as vagas já

foram preenchidas.

Ressalta o modelo de gerência adotado viola o princípio da

complementaridade da atuação da inciativa privada no SUS.

Alega que os contratos de gestão consomem vultosas quantias, o que

comprovaria a capacidade do Estado de prestar diretamente o serviço

público de saúde, sem ter que recorrer a contratos de gestão.

Requer, em sede de antecipação de tutela, a proibição ao Estado de Goiás de

renovar ou prorrogar os contratos já celebrados com as organizações

sociais, bem como proibir celebração de novos contratos de gestão; além

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disso, requer a reassunção das ações e serviços de saúde nos hospitais

estaduais, para que o Estado preste diretamente o serviço público de saúde.

A inicial seguiu instruída dos documentos de fls. 65 a 1601.

Determinou-se que o Estado de Goiás se manifestasse quanto ao pedido

liminar à fl.1602.

O Estado de Goiás manifestou-se às fls. 1606 a 1613, ocasião em que

afirmou haver risco de dano irreparável de maneira reversa, pois, se

concedida a antecipação, o Estado não poderá voltar a prestar o serviço de

forma direta imediatamente.

Breve relato.

Decido.

O Código de Processo Civil ao tratar da antecipação de tutela estabelece:

Art. 273 - O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou

parcialmente os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que,

existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e :

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou II -

fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito

protelatório do réu.

Vislumbra-se a ausência de risco de dano irreparável ou de difícil reparação.

A suspensão imediata dos serviços prestados pelas OS ou a proibição de

renovação ou prorrogação, nos moldes propostos pelo Ministério Público

poderá acarretar perigo à saúde da população, uma vez que esta poderá

ficar privada desse serviço essencial. Conforme o Parquet bem relembrou

por diversas vezes, tais contratos implicaram em vultosos gastos por parte da

Administração para permitir a execução do objeto do contrato, qual seja a

prestação do serviço de saúde, de modo que sua imediata suspensão traria

mais prejuízos do benefícios. O perigo é inverso.

Ademais, o lapso temporal entre a cessão da atuação das organizações

sociais e a retomada da prestação do serviço por parte do Estado, por menor

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que seja, é suficiente para gerar graves danos àqueles que dependem dos

hospitais estaduais para tratarem da saúde.

No que tange ao pedido liminar de não celebração de novos contratos de

gestão, considerando a gravidade das irregularidades apontadas pelo

Ministério Público no referidos contratos, quanto a sua forma de execução,

pagamento, metas, e à possibilidade de dispensa de 50% dos funcionários

para que sejam substituídos por celetistas, bem como pelo vultoso dispêndio

do erário para manter tais contratos, prudente evitar que novos contratos

sejam firmados, a fim de que se evite a perpetuação de tão severas

irregularidades.

Assim sendo, indefiro o pedido de antecipação da tutela para proibir a

renovação ou prorrogação dos contratos de gestão.

Defiro o pedido de proibição de celebração de novos contratos, com

organizações sociais, para gestão dos hospitais estaduais goianos.

Citem-se os réus.

Intimem-se

Goiânia, 13 de dezembro de 2012.

EDUARDO PIO MASCARENHAS DA SILVA

Juiz de Direito”

Infere-se, dessa maneira, que todos os requisitos do instituto da tutela de

urgência se fazem presentes, valendo destacar, na esteira da decisão acima transcrita, que a

concessão da liminar vindicada é “prudente evitar que novos contratos sejam firmados, a fim

de que se evite a perpetuação de tão severas irregularidades”. Impedir que os contratos na

área da educação se iniciem, de tal modo, está nas mãos do juízo competente para a presente

ação. Nesses termos, na linha da atualizada doutrina, o deferimento da tutela de urgência

passa a ser de rigor e não mais mera faculdade do Juiz.

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Esse é o entendimento de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery,

que, embora ainda baseado no Código de Processo Civil de 1973, analisa o mesmo instituto

atualizado pela Lei nº 13.105/2015:

“Embora a expressão 'poderá', constante do CPC 273 caput, possa indicar

faculdade e discricionariedade do juiz, na verdade constitui obrigação, sendo

dever do magistrado conceder a tutela antecipatória, desde que preenchidos os

requisitos legais para tanto não sendo lícito concedê-la ou negá-la pura e

simplesmente. Para isto tem o juiz o livre convencimento motivado (CPC

131): convencendo-se da presença dos requisitos legais, deve o juiz conceder

a antecipação da tutela; caso as provas não o convençam dessa circunstância,

deve negar a medida. O que o sistema não admite é o fato de o juiz,

convencendo-se de que é necessária a medida e do preenchimento dos

pressupostos legais, ainda assim negue-a. A liminar pode ser concedida com

ou sem a ouvida da parte contrária. (apud in Código de Processo Civil

Comentado - 3ª edição - Ed. RT - pág. 547)”.

Vale dizer, se há nos autos provas cabais dos fatos e da subsunção dos fatos

ao direito alegado, como no presente caso existe e, ainda, comprovado risco de que a demora

pode gerar perigo de dano irreparável, os requisitos da tutela de urgência encontram-se

satisfeitos, impondo-se, por medida de absoluta Justiça, o deferimento do pedido.

Somem-se a isto os conflitos que têm ocorrido como consequência de

protestos sociais contra as medidas tomadas pelo Estado de Goiás e pela SEDUCE-GO no

processo de transferência de gestão, exemplificados pelas seguintes matérias jornalísticas

publicadas:

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- 6PMs e estudantes ficam feridos em protesto contra OSs na Educação - Três militares

tiveram lesões; corporação diz que tentou coibir 'atos violentos'. Não há número confirmado

de jovens feridos; eles reclamam de agressões.

- 7PM aponta arma para estudante em ato contra OSs na Educação - Corporação

confirmou denúncias de que homem se trata de um policial. Fato aconteceu em protesto

contra terceirização de escolas estaduais, em GO.

- 8Alunos ocupam escola estadual em protesto contra terceirização, em GO - Eles

criticam medida de conceder gestão da Educação para Oss. Secretaria diz que colégio está

fechado e defende novo modelo: 'Parceria'.

Quanto mais tempo perdurar a vigência do Chamamento Público nº 001/2017 e

todas as consequências negativas dele decorrentes, maior a chance das graves violações apontadas

tornarem-se inviáveis e irreversíveis, sob pena de se forjar um problema crônico educacional, de

proporções e consequências sociais relevantes.

IV – DOS PEDIDOS

Diante de todo o exposto, o Ministério Público do Estado de Goiás e o

Ministério Público de Contas Junto ao Tribunal de Contas do Estado de Goiás requerem:

1 - a concessão da tutela de urgência pleiteada liminarmente e especificada no capítulo III

desta inicial, inaudita altera parte e independentemente de justificação prévia, consistente

6 Disponível em: http://g1.globo.com/goias/noticia/2016/05/pms-e-estudantes-ficam-feridos-em-

protesto-contra-oss-na-educacao.html . Acesso em 04/10/2016, às 15h.

7 Disponível em: http://g1.globo.com/goias/noticia/2016/01/pm-aponta-arma-para-estudante-em-ato-

contra-oss-na-educacao-veja.html . Acesso em 04/10/2016, às 15:10h.

8 Disponível em: http://g1.globo.com/goias/noticia/2015/12/alunos-ocupam-colegio-publico-em-

protesto-contra-terceirizacao-em-go.html . Acesso em 04/10/2016, às 15:15h.

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em obrigação de fazer no sentido de determinar que o Estado de Goiás e a SEDUCE-GO

suspendam imediatamente o Chamamento Público nº 001/2017;

1.2 - a fixação de astreintes no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por dia de

descumprimento da ordem, a incidir sobre o patrimônio pessoal da Secretária Municipal de

Educação, e de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) por dia de descumprimento em desfavor

do Estado de Goiás, a ser revertida em favor do Fundo Estadual dos Direitos da Criança e

do Adolescente (art. 214 do ECA);

2 - seja determinado pelo Juízo remessa de planilha, por parte dos requeridos, com os custos

exatos que foram dispendidos nas propagandas, nos meios de comunicação privados diversos, em

defesa do modelo de gestão compartilhada proposto;

3 – uma vez recebida a inicial e concedida a liminar, a citação dos réus para, querendo,

oferecerem resposta no prazo legal;

4 - a juntada de documentos contidos nos autos extrajudiciais no 201700328219, bem como

a produção de todas as provas admitidas em direito;

5 – ao cabo, a procedência do pedido para que seja declarada a nulidade do edital de

Chamamento Público nº 001/2017 e o(s) contrato(s) de gestão dele decorrente(s), em virtude

de sua flagrante inconstitucionalidade e ilegalidade, e, caso reste comprovada lesão ao

patrimônio público nas referidas divulgações em massa, sejam as pessoas físicas responsáveis

condenadas ao integral ressarcimento do dano, nos termos do artigo 5º da Lei nº 8.429/92;

6 - seja determinada obrigação de não fazer no sentido de que o Estado de Goiás e a SEDUCE-

GO se abstenham de lançar novos chamamentos com a mesma natureza e objeto similar ao

conteúdo da presente ação, ou seja, repasse de gestão de unidades escolares públicas a

organizações sociais;

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7 - a condenação do réu ao pagamento das custas e demais ônus sucumbenciais e a dispensa

do adiantamento de custas, emolumentos e outros encargos, em face do previsto no art. 18 da

Lei n. 7.347/85 e do art. 87 da Lei n. 8.078/90.

Opta-se pela não realização audiência de conciliação ou de mediação, nos

termos do artigo 319, inciso VII, do novo Código de Processo Civil, haja vista os direitos

tutelados nesta ação se configurarem como indisponíveis.

Atribui-se à causa o valor de R$ 104.300.940,00, valor do desembolso

estimado ao longo de três anos definido pela SEDUCE para compor o Contrato de Gestão da

MACRORREGIÃO VIII – ÁGUAS LINDAS/PLANALTINA.

Nesses Termos,

Pede Deferimento.

Santo Antônio do Descoberto, 04 de setembro de 2017

ANA CAROLINA PORTELINHA FALCONI

AIRES Promotora de Justiça

FABIANA LEMES ZAMALLOA DO PRADO Promotora de Justiça

LUCRÉCIA CRISTINA GUIMARÃES Promotora de Justiça

DANIEL LIMA PESSOA Promotor de Justiça

FERNANDO AURVALLE DA SILVA KREBS Promotor de Justiça

MAÍSA DE CASTRO SOUSA BARBOSA Procuradora do Ministério Público de Contas junto ao

TCE

TARCILA SANTOS BRITTO GOMES

Promtora de Justiça

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Promotora de Justiça