excelentÍssima senhora ministra cÁrmen lÚcia, … · abram e institui como fonte orçamentária...

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1 EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA, PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. O SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS (SEBRAE), entidade associativa sem fins lucrativos, transformado em serviço social autônomo, pela Lei nº 8.029, de 12 de abril de 1990, com sede no SGAS, Quadra 605, Módulo A, Brasília (DF), inscrito no CNPJ sob o n° 00.330.845/0001-45, por seus procuradores infra assinados 1 , os quais recebem intimação no endereço supra indicado, telefone (61) 3348-7375, com fulcro no art. 5º, LXIX e LXX, ‘b’ da Constituição da República Federativa do Brasil e art. 1º e seguintes da Lei nº 12.016/2009, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, impetrar MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR contra ato coator praticado pelo Ilustre Senhor PRESIDENTE DA REPÚBLICA, autoridade que deve ser citada na Praça dos Três Poderes, Palácio do Planalto, 3º Andar, CEP nº 70.150-900, Brasília/DF, requerendo-se, nos termos do art. 7º, II, da Lei n° 12.016/2009, se dê ciência do feito ao seu órgão de representação judicial, qual seja, a Advocacia-Geral da União, que poderá ser notificada no endereço SAS Quadra 03, Lote 5/6, 11º andar Edifício Multi Brasil Corporate, Brasília/DF. 1 Doc. Anexo n° 01 Procuração.

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EXCELENTÍSSIMA SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA, PRESIDENTE DO SUPREMO

TRIBUNAL FEDERAL.

O SERVIÇO BRASILEIRO DE APOIO ÀS MICRO E PEQUENAS EMPRESAS

(SEBRAE), entidade associativa sem fins lucrativos, transformado em serviço social

autônomo, pela Lei nº 8.029, de 12 de abril de 1990, com sede no SGAS, Quadra 605,

Módulo A, Brasília (DF), inscrito no CNPJ sob o n° 00.330.845/0001-45, por seus

procuradores infra assinados1, os quais recebem intimação no endereço supra indicado,

telefone (61) 3348-7375, com fulcro no art. 5º, LXIX e LXX, ‘b’ da Constituição da

República Federativa do Brasil e art. 1º e seguintes da Lei nº 12.016/2009, vem,

respeitosamente, perante Vossa Excelência, impetrar

MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE MEDIDA LIMINAR

contra ato coator praticado pelo Ilustre Senhor PRESIDENTE DA REPÚBLICA, autoridade

que deve ser citada na Praça dos Três Poderes, Palácio do Planalto, 3º Andar, CEP nº

70.150-900, Brasília/DF, requerendo-se, nos termos do art. 7º, II, da Lei n° 12.016/2009,

se dê ciência do feito ao seu órgão de representação judicial, qual seja, a Advocacia-Geral

da União, que poderá ser notificada no endereço SAS Quadra 03, Lote 5/6, 11º andar

Edifício Multi Brasil Corporate, Brasília/DF.

1 Doc. Anexo n° 01 – Procuração.

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I – LEGITIMIDADE DO IMPETRANTE

O presente Mandado de Segurança visa atacar ato emanado pelo

Excelentíssimo Senhor Presidente da República consubstanciado na edição da Medida

Provisória nº 850, de 10 de setembro de 2018, que cria a Agência Brasileira de Museus –

ABRAM e institui como fonte orçamentária da referida agência, parte da contribuição

atribuída ao SEBRAE por meio da Lei nº 8.029/90, em flagrante desvio de finalidade e

violação aos artigos 170 e 149 da Constituição Federal.

A Lei nº 8.029, de 12 de abril de 1990, autorizou a desvinculação da

Administração Pública Federal do Centro Brasileiro de Apoio à Pequena e Média Empresa

– CEBRAE, mediante sua transformação em serviço social autônomo, passando a ser

denominado Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE.

Para atender à execução das políticas de apoio às micro e às pequenas

empresas foi instituído adicional às alíquotas das contribuições sociais relativas às

seguintes entidades: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial – SENAI; do Serviço

Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC; do Serviço Social da Indústria – SESI e do

Serviço Social do Comércio – SESC.

Em 2003, o STF, por meio do RE 396.266/SC pacificou o entendimento

sobre a natureza jurídica da contribuição do SEBRAE como sendo uma contribuição de

intervenção no domínio econômico – CIDE.

O enquadramento da contribuição do SEBRAE como CIDE encontra amparo

no art. 170 da Constituição Federal que trata da ordem econômica e financeira e protege

os juridicamente hipossuficientes , inclusive no segmento da economia, como é o caso das

micro e pequenas empresas, sendo sintomática essa vontade do Constituinte, quando

3

estabelece um norte para a eliminação ou redução das desigualdades regionais e sociais.

Assim os artigos 170 e 179, verbis:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na

livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os

ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

I - soberania nacional;

II - propriedade privada;

III - função social da propriedade;

IV - livre concorrência;

V - defesa do consumidor;

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado

conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de

elaboração e prestação;

VII - redução das desigualdades regionais e sociais;

VIII - busca do pleno emprego;

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob

as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Art. 179. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios dispensarão às

microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em lei,

tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela simplificação de

suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias e creditícias, ou pela

eliminação ou redução destas por meio de lei.

E a criação do SEBRAE vem para responder a esse anseio da Constituição,

com o objetivo de planejar, coordenar e orientar programas técnicos, projetos e

atividades de apoio às micro e pequenas empresas, em conformidade com as políticas

nacionais de desenvolvimento, particularmente as relativas às áreas industrial, comercial

e tecnológica.

No entanto, não é possível dizer o mesmo da agência criada por meio da

Medida Provisória 850/2018. Conforme pode se verificar, seus objetivos estão muito

distantes daqueles trazidos no art. 170 da CF, o que, por si só, faz com que o ato do

executivo atraia vício de inconstitucionalidade, em razão da criação de uma CIDE sem

nenhuma vinculação com os preceitos da ordem econômica insculpidos no art. 170 da CF.

4

O STF possui posição firme quanto à necessidade de vinculação de uma

CIDE aos incisos do art. 170. Vejamos:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CIDE. LEI

Nº 10.336/2001. FINANCIAMENTO DE SUBSÍDIOS, PROJETOS AMBIENTAIS E

PROGRAMAS DE INFRA-INSTRUTURA DO RAMO DE COMBUSTÍVEIS.

CONSTITUCIONALIDADE DO TRIBUTO. PRECEDENTES. SOCIEDADE COOPERATIVA.

IMPOSSIBILIDADE DE ESTENDER BENEFÍCIOS FISCAIS PELA VIA JURISDICIONAL, NA

QUALIDADE DE LEGISLADOR POSITIVO, AINDA QUE A PRETEXTO DE ISONOMIA.

PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO. DECISÃO: Trata-se de recurso

extraordinário, manejado com arrimo na alínea a do permissivo constitucional,

contra acórdão que assentou, verbis: “CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO

DOMÍNIO ECONÔMICO/CIDE. COMBUSTÍVEIS, GÁS E DERIVADOS. EC N° 33/2001.

LEI N° 10.336/2001. EXIGIBILIDADE DA EXAÇÃO. 1. A contribuição de intervenção

no domínio econômico, cuja competência da União ou pessoa jurídica da

administração pública indireta federal, é legítima nos casos em que intervém

necessariamente no sentido da realização dos princípios que informam a ordem

econômica, estampados nos incisos do art. 170 da CRFB/88. O Estado, assim,

executa atividades que lhe são constitucionalmente designadas em prol da

coletividade, de acordo com as competências constitucionais. À União, no

exercício destas atividades, é facultada a instituição de cobranças. Nada aleatório

ou discricionário, mas necessidade especial da qual se vale, sendo um grupo

específico que vai pagar a atuação estatal. Com a promulgação da EC 33/01, que

acrescentou os parágrafos 1º a 4º ao art. 149 da CRFB/88, a Carta Constitucional

expressamente veio admitir a intervenção da União, mediante instituição de

contribuição interventiva, sobre a importação de petróleo e seus derivados, gás

natural e seus derivados e álcool combustível, atividade objeto de monopólio.

Cumprindo o desiderato constitucional, foi promulgada a Lei 10.336/01,

especificando a forma de incidência e de recolhimento da CIDE, e fazendo com

que a nova contribuição preencha todos os requisitos legais e constitucionais para

gozar de legitimidade sua cobrança. [...] (RE 601733, Relator(a): Min. LUIZ FUX,

julgado em 17/08/2016, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-177 DIVULG

19/08/2016 PUBLIC 22/08/2016)

De igual forma, a doutrina leciona:

A finalidade da intervenção no domínio econômico caracteriza essa espécie de

contribuição social como tributo de função nitidamente extrafiscal. Assim, um

tributo cuja finalidade predominantemente seja a arrecadação de recursos

financeiros jamais será uma contribuição social de intervenção no domínio

econômico.2

2 MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 37 ed., 2016. pag. 424/425

5

Além disso, a retirada de recursos do SEBRAE para manutenção e

restauração de museus encontra grave desvio de finalidade. Não há que se falar em

desenvolvimento econômico no país, vinculado ao art. 170 da CF/88, com a criação da

ABRAM e restauração de museus. A finalidade do SEBRAE de defender os interesses e

fomentar o desenvolvimento das micro e pequenas empresas é constitucional e está

sendo prejudicado por meio de uma medida provisória que possui finalidade distante da

estabelecida nos incisos do art. 170 da CF/88.

A redução da contribuição ao SEBRAE gerará grande impacto nos

compromissos assumidos, em razão da iminente possibilidade de redução de sua

contribuição em 6% (seis por cento). A medida imediata de supressão de recursos merece

rápida intervenção do Poder Judiciário em razão do flagrante prejuízo que causará ao

SEBRAE e às micro e pequenas empresas, que serão atingidas com a redução dos

atendimentos realizados, dos projetos de desenvolvimento e do fomento dos pequenos

negócios nas mais diversas esferas de atuação do SEBRAE.

Pelos fatos acima expostos, resta evidente, notório e manifesto, o

interesse jurídico do SEBRAE no ajuizamento do presente remédio processual em razão

da redução do produto da arrecadação destinado ao SEBRAE, que já vem com redução

histórica de aproximadamente 20% (vinte por cento) de sua receita original ao longo dos

anos, além da incidência da taxa de administração da RFB de 3,5% (três e meio por

cento).

Essa medida prejudica concretamente o desenvolvimento econômico do

País, que tem nas micro e pequenas empresas o maior gerador de empregos formais com

carteira assinada, tendo sido, no primeiro semestre de 2018, na ordem de 93% (noventa e

três por cento).

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O atendimento realizado pelo SEBRAE às MPEs muda o patamar de

qualidade, crescimento e gestão dessas empresas. Logo, o prejuízo para as micro e

pequenas empresas e para o país com a redução da contribuição ao SEBRAE é certo,

tendo em vista a necessidade de redução do universo de atendimentos gerados

anualmente causando relevante prejuízo ao cumprimento de sua finalidade institucional.

Seis por cento do orçamento do SEBRAE equivale ao atendimento de

aproximadamente seiscentas e oito mil micro e pequenas empresas! Está a se falar de

todo o contingente de pequenos negócios atendidos pelo SEBRAE na região Norte do

País, por exemplo.

Mais do que claro, então, o interesse, não somente do SEBRAE, mas de

todos os empreendedores do Brasil, na lide em questão.

A criação da Agência (mediante transformação do IBRAM em serviço social

autônomo), com redução de repasse da arrecadação ao SEBRAE e criação de nova

contribuição destinada a gestão de museus, por Medida Provisória não atende aos

requisitos constitucionais para sua edição, bem como não observou o debate

democrático, atentando ao princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança e,

não menos importante, o da previsibilidade orçamentária.

II - CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA MEDIDA

PROVISÓRIA DE EFEITO CONCRETO

Vale dizer que o presente mandamus não é impetrado contra lei em tese,

mas contra os efeitos concretos da Medida Provisória n° 850/2018, que retira orçamento

do SEBRAE para transferir à ABRAM, afastando assim a Súmula 266 do STF.

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Conforme se depreende do art. 26 da MP em comento, existem efeitos

concretos e imediatos, em prejuízo ao SEBRAE, visto que transfere parte da arrecadação,

que lhe é destinada com intuito de fomento às micro e pequenas empresas, para custeio

da estruturação da ABRAM, logo no momento de sua criação.

Pacífico o cabimento de mandado de segurança contra medida provisória

de efeitos concretos, que prescinde de legislação ulterior para trazer à existência seus

efeitos. Nesse sentido, os seguintes arestos:

Agravo regimental em mandado de segurança. 2. Decreto 8.616/205, Lei

Complementar 148/2014 e Lei 9.496/1997. Adequação da via eleita.

Admissibilidade de mandado de segurança contra decreto de efeitos concretos. 3.

Agravo regimental provido para determinar o processamento do mandado. 4.

Índice de correção da dívida dos Estados. Anatocismo. Princípio da isonomia.

SELIC. 5. Medida liminar deferida para que os impetrados abstenham-se de impor

quaisquer sanções ao impetrante. (MS 34023 AgR, Relator(a): Min. EDSON

FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado

em 07/04/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-234 DIVULG 11-10-2017 PUBLIC 13-

10-2017)

EMENTA: CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE

INSTRUMENTO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULAS 282 E 356 DO STF.

MANDADO DE SEGURANÇA. NORMA DE EFEITOS CONCRETOS. DECLARAÇÃO DE

INCONSTITUCIONALIDADE. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 266 DO STF. AGRAVO

IMPROVIDO. I - Ausência de prequestionamento das questões constitucionais

suscitadas. Incidência das Súmulas 282 e 356 do STF. II - A Corte firmou

entendimento de que não usurpa sua competência a declaração de

inconstitucionalidade incidental. Precedentes. III - Ademais, o acórdão recorrido

entendeu que a lei impugnada produziu efeitos concretos, não incidindo,

portanto, a Súmula 266 do STF. IV - Agravo regimental improvido. (AI 637465 AgR,

Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em

28/04/2009, DJe-094 DIVULG 21-05-2009 PUBLIC 22-05-2009 EMENT VOL-02361-

09 PP-01767)

EMENTA: - CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LEI EM TESE: NÃO-

CABIMENTO. Súmula 266-STF. I. - Se o ato normativo consubstancia ato

administrativo, assim de efeitos concretos, cabe contra ele o mandado de

segurança. Todavia, se o ato - lei, medida provisória, regulamento - tem efeito

normativo, genérico, por isso mesmo sem operatividade imediata, necessitando,

para a sua individualização, da expedição de ato administrativo, então contra ele

não cabe mandado de segurança, já que, admiti-lo implicaria admitir a segurança

8

contra lei em tese: Súmula 266-STF. II. - Segurança não conhecida. (RMS 24266,

Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 07/10/2003, DJ

24-10-2003 PP-00030 EMENT VOL-02129-02 PP-00481)

Evidenciado, também a liquidez e a certeza do direito pleiteado pelo

SEBRAE no presente MS, na medida em que a MP nº 850/2018 tem o condão de,

imediatamente, retirar 6% (seis por cento) do orçamento do SEBRAE. Frise-se, tal como

disposto na MP guerreada, prescinde de qualquer ato administrativo a efetiva

implantação da referida redução. Sua aplicação é de plano e gera efeitos imediatos.

Dessa forma, resta demonstrado o cabimento do Mandado de Segurança

como medida para evitar que prejuízo seja causado ao SEBRAE e aos pequenos negócios

com a redução imediata de sua contribuição com a criação de uma nova CIDE que não

preenche os requisitos constitucionais exigidos e por isso resta eivada de

inconstitucionalidade.

III – VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO

III.I – Ausência dos Pressupostos para Aprovação da MP Nº 850/2018: Urgência e

Relevância

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 62, disciplinou a figura da

medida provisória. Em 2001, por meio da Emenda Constitucional nº 32, a regulamentação

do remédio sofreu significativas alterações. Dentre os requisitos necessários para a

aprovação de uma MP, no âmbito do Congresso Nacional, destacam-se o da relevância e

o da urgência, cumulativamente.

Relevância e urgência, por certo, são conceitos jurídicos indeterminados, o

que dificulta uma percepção rasa de suas existências, sendo obrigação do Presidente da

República, em um primeiro momento, e do Congresso Nacional, posteriormente, em cada

9

caso concreto, a análise da justificativa e impacto destes elementos.

Alguma delimitação, porém, é possível de se realizar quanto aos requisitos

em destaque. A relevância tem ligação para com o interesse público do assunto. Não

qualquer interesse, mas aqueles de fato relevantes e prementes à sociedade. Aqui,

associa-se o fator urgência.

A urgência se refere ao momento, a medida deve ser inadiável. Celso

Antônio Bandeira de Mello3 assim trata sobre o tema:

[...] mesmo que a palavra contenha em si algum teor de fluidez, qualquer pessoa

entenderá que só é urgente o que tem de ser enfrentado imediatamente, o que

não pode aguardar o decurso do tempo, caso contrário o benefício pretendido

inalcançável ou o dano que se quer evitar consumar-se-á ou, no mínimo

existirão sérios riscos de que sobrevenha efeitos desastrosos em caso de

demora.

Dito isso, a criação de uma agência de administração de museus não se

enquadra no permissivo constitucional de urgência que não possa seguir o trâmite

legislativo ordinário (previsto no art. 64 da CF/88). Mais ainda, considerando a

controvérsia que orbita em torno da ABRAM, no que tange à sua fonte de custeio,

necessário o debate político e consenso social, que deve prevalecer sobre a questão.

A medida já começa a apresentar reações contrárias como, por exemplo, a

dos trabalhadores do próprio Instituto Brasileiro de Museus – IBRAM, vejamos:

Servidores do Ibram criticam criação de agência para cuidar de museus

Após o anúncio feito ontem (10) pelo presidente Michel Temer da criação da

Agência Brasileira de Museus (Abram) e consequentemente da extinção do

Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), o ministro da Cultura, Sérgio Sá Leitão

3 Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo. 20ª edição. São Paulo: Malheiros; 2006; p. 118.

10

reuniu-se com os funcionários do instituto na manhã de hoje (11).

Na reunião, que durou cerca de três horas, os trabalhadores do Ibram

questionaram o porquê da decisão ter sido tomada sem consultá-los e de que

forma a nova agência poderia melhorar a situação dos museus. “Eu quero saber

o que eu faço agora. Vou para a minha sala e tenho uma série de questões para

resolver. O que acontece agora? Eu te digo: estou ofendida”, disse uma das

funcionárias do Ibram ao ministro.

[...]

Críticas

Segundo o museólogo Newton Soares, representante dos trabalhadores do

Ibram, as medidas tomadas pelo governo servirão para “sucatear cada vez mais

uma política nacional de museus”, ao tirar os 27 museus da gestão do governo,

transferindo-os para organizações de âmbito público privado. “Tirar essa gestão

de dentro do governo e passar para outras organizações é transformar os 27

museus do Ibram em um grande balcão de negócios. Fica-se refém da vontade

do mercado. Não se tem autonomia para dizer quais as necessidades e para

pautar as políticas públicas”, disse.

O ex-presidente do Ibram José do Nascimento Júnior divulgou nas redes sociais

um vídeo no qual critica as medidas que, segundo ele, na prática significam a

privatização dos museus e dos acervos "de forma autoritária". "Termina o

Ibram, termina a política nacional de museus, privatiza todos os museus

federais, acaba com as políticas públicas na área de museus, com os pontos de

memória, com todas as ações. A Agência é para criar as OS [Organizações

Sociais], privatizar os museus de forma geral e tirar o Museu Nacional da

Universidade Federal do Rio de Janeiro".

Repúdio

Em nota, os trabalhadores do Ibram repudiaram a criação da Agência Brasileira

de Museus, a extinção deste Instituto e a privatização das políticas públicas de

museus e pedem a suspensão imediata das duas medidas provisórias.

“O processo de mudança institucional imposto, sem diálogo com os

trabalhadores e trabalhadoras, a sociedade civil organizada, o Sistema Brasileiro

de Museus, o Conselho Consultivo do Patrimônio Museológico, bem como todo

o setor museológico, impossibilita a implementação da Política Nacional de

Museus, a função social da memória e precariza a gestão, além de desrespeitar

os profissionais que atuam nesse campo ao longo desses 200 anos de história

museológica brasileira”, diz a nota.4 (grifos inovados)

4 Disponível em < http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-09/servidores-do-ibram-criticam-

criacao-de-agencia-de-museus >. Visto em 12 de setembro de 2018.

11

Além disso, não resta dúvida que um tema como esse exige o debate nas

comissões mistas do Parlamento em razão de se possuir grande impacto nacional.

A redução da contribuição do SEBRAE impactará imediatamente nas ações

em fase de execução nesse momento junto às micro e pequenas empresas. Temerária,

portanto, a retirada de recursos imediatos de uma entidade que tem compromissos

assumidos.

Tanto não pode ser considerada urgente, que, a “transferência” de repasse

de recursos do SEBRAE para ABRAM, ou (i) é tredestinação ilícita da contribuição criada

com fim específico de apoio às micro e pequenas empresas; ou (ii) é criação de nova CIDE,

para custeio do patrimônio histórico e cultural do Brasil e, portanto, não tem lastro do

art. 170 da CF; ou (iii) sendo nova CIDE, está submetida ao princípio tributário da

anterioridade (anualidade e/ou noventena), não podendo ser cobrada neste exercício

financeiro, reforçando a inexistência de urgência na matéria a justificar uma medida

provisória.

Lamentavelmente, em muitas das vezes, o processo de aprovação de

medidas provisórias tem deixado à mingua o exercício do controle jurídico de seus

requisitos de validade, principalmente na real análise quanto aos seus critérios de

relevância e urgência. Por este motivo, o Supremo Tribunal Federal – STF, por meio do

julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade, tem exercido o controle relegado

pelo Congresso Nacional.

Ainda o professor Celso Antônio Bandeira de Mello5, sobre o assunto,

leciona:

5 Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo. 20ª edição. São Paulo: Malheiros; 2006; p. 120.

12

[...] o Judiciário não sai de seu campo próprio nem invade discrição

administrativa quando verifica se pressupostos normativamente estabelecidos

para delimitar uma dada competência existem ou não existem. Uma vez que a

Constituição só admite medidas provisórias em face de situação relevante e

urgente, segue-se que ambos são, cumulativamente, requisitos indispensáveis

para irrupção da aludida competência. É dizer: sem eles inexistirá poder para

editá-las. Se a Carta Magna tolerasse edição de medidas de emergência fora

destas hipóteses, não haveria condicionado sua expedição à pré-ocorrência

destes supostos normativos. Segue-se que têm de ser judicialmente

controlados, sob pena de ignorar-se o balizamento constitucional da

competência para editar medidas provisórias. Com efeito, se ‘relevância e

urgência’ fossem noções só aferíveis concretamente pelo Presidente da

República, em juízo discricionário incontrastável, o delineamento e a extensão

da competência para produzir tais medidas não decorreriam da Constituição,

mas da vontade do Presidente, pois teriam o âmbito que o Chefe do Executivo

lhes quisesse dar. Assim, ao invés de estar limitado por um círculo de poderes

estabelecidos pelo Direito, ele é quem decidiria sua própria esfera competencial

na matéria, idéia antinômica a tudo que resulta do Estado de Direito.

Neste ponto, valido a transcrição dos arestos abaixo:

A edição de medidas provisórias, pelo presidente da República, para legitimar-se

juridicamente, depende, dentre outros requisitos, da estrita observância dos

pressupostos constitucionais da urgência e da relevância (CF, art. 62, caput). Os

pressupostos da urgência e da relevância, embora conceitos jurídicos

relativamente indeterminados e fluidos, mesmo expondo-se, inicialmente, à

avaliação discricionária do presidente da República, estão sujeitos, ainda que

excepcionalmente, ao controle do Poder Judiciário, porque compõem a própria

estrutura constitucional que disciplina as medidas provisórias, qualificando-se

como requisitos legitimadores e juridicamente condicionantes do exercício, pelo

chefe do Poder Executivo, da competência normativa primária que lhe foi

outorgada, extraordinariamente, pela CR. (...) A possibilidade de controle

jurisdicional, mesmo sendo excepcional, apoia-se na necessidade de impedir que

o presidente da República, ao editar medidas provisórias, incida em excesso de

poder ou em situação de manifesto abuso institucional, pois o sistema de

limitação de poderes não permite que práticas governamentais abusivas

venham a prevalecer sobre os postulados constitucionais que informam a

concepção democrática de Poder e de Estado, especialmente naquelas

hipóteses em que se registrar o exercício anômalo e arbitrário das funções

estatais.

[...

A crescente apropriação institucional do poder de legislar, por parte dos

sucessivos Presidentes da República, tem despertado graves preocupações de

ordem jurídica, em razão do fato de a utilização excessiva das medidas

provisórias causar profundas distorções que se projetam no plano das relações

13

políticas entre os Poderes Executivo e Legislativo. Nada pode justificar a

utilização abusiva de medidas provisórias, sob pena de o Executivo, quando

ausentes razões constitucionais de urgência, necessidade e relevância material,

investir-se, ilegitimamente, na mais relevante função institucional que pertence

ao Congresso Nacional, vindo a converter-se, no âmbito da comunidade estatal,

em instância hegemônica de poder, afetando, desse modo, com grave prejuízo

para o regime das liberdades públicas e sérios reflexos sobre o sistema de

checks and balances, a relação de equilíbrio que necessariamente deve existir

entre os Poderes da República. Cabe ao Poder Judiciário, no desempenho das

funções que lhe são inerentes, impedir que o exercício compulsivo da

competência extraordinária de editar medida provisória culmine por introduzir,

no processo institucional brasileiro, em matéria legislativa, verdadeiro cesarismo

governamental, provocando, assim, graves distorções no modelo político e

gerando sérias disfunções comprometedoras da integridade do princípio

constitucional da separação de poderes. (ADI 2.213 MC, rel. min. Celso de Mello,

j. 4-4-2002, P, DJ de 23-4-2004).

O que justifica a edição dessa espécie normativa, com força de lei, em nosso

direito constitucional, é a existência de um estado de necessidade, que impõe

ao Poder Público a adoção imediata de providências, de caráter legislativo,

inalcançáveis segundo as regras ordinárias de legiferação, em face do próprio

periculum in mora que fatalmente decorreria do atraso na concretização da

prestação legislativa. (...) É inquestionável que as medidas provisórias traduzem,

no plano da organização do Estado e na esfera das relações institucionais entre

os Poderes Executivo e Legislativo, um instrumento de uso excepcional. A

emanação desses atos, pelo presidente da República, configura momentânea

derrogação ao princípio constitucional da separação dos Poderes. (ADI 221 MC,

rel. min. Moreira Alves, voto do min. Celso de Mello, j. 29-3-1990, P, DJ de 22-

10-1993)

Além disso, o STF já se manifestou no sentido de que o trâmite legislativo

ordinário deve ser respeitado, considerando que “o parecer da comissão mista em vez de

formalidade desimportante representa uma garantia de que o Legislativo seja

efetivamente o fiscal do exercício atípico da função legiferante pelo Executivo”, conforme

ADI nº 4.029:

Ementa: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI FEDERAL Nº 11.516/07.

CRIAÇÃO DO INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA

BIODIVERSIDADE. LEGITIMIDADE DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS SERVIDORES

DO IBAMA. ENTIDADE DE CLASSE DE ÂMBITO NACIONAL. VIOLAÇÃO DO ART. 62,

CAPUT E § 9º, DA CONSTITUIÇÃO. NÃO EMISSÃO DE PARECER PELA COMISSÃO

MISTA PARLAMENTAR. INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 5º, CAPUT, E 6º,

CAPUT E PARÁGRAFOS 1º E 2º, DA RESOLUÇÃO Nº 1 DE 2002 DO CONGRESSO

NACIONAL. MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS DA NULIDADE (ART. 27 DA

14

LEI 9.868/99). AÇÃO DIRETA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. A democracia

participativa delineada pela Carta de 1988 se baseia na generalização e profusão

das vias de participação dos cidadãos nos provimentos estatais, por isso que é

de se conjurar uma exegese demasiadamente restritiva do conceito de

“entidade de classe de âmbito nacional“ previsto no art. 103, IX, da CRFB. 2. A

participação da sociedade civil organizada nos processos de controle abstrato de

constitucionalidade deve ser estimulada, como consectário de uma sociedade

aberta dos intérpretes da Constituição, na percepção doutrinária de Peter

Häberle, mercê de o incremento do rol dos legitimados à fiscalização abstrata

das leis indicar esse novel sentimento constitucional. 3. In casu, a entidade

proponente da ação sub judice possuir ampla gama de associados, distribuídos

por todo o território nacional, e que representam a integralidade da categoria

interessada, qual seja, a dos servidores públicos federais dos órgãos de proteção

ao meio ambiente. 4. As Comissões Mistas e a magnitude das funções das

mesmas no processo de conversão de Medidas Provisórias decorrem da

necessidade, imposta pela Constituição, de assegurar uma reflexão mais detida

sobre o ato normativo primário emanado pelo Executivo, evitando que a

apreciação pelo Plenário seja feita de maneira inopinada, percebendo-se, assim,

que o parecer desse colegiado representa, em vez de formalidade

desimportante, uma garantia de que o Legislativo fiscalize o exercício atípico da

função legiferante pelo Executivo. 5. O art. 6º da Resolução nº 1 de 2002 do

Congresso Nacional, que permite a emissão do parecer por meio de Relator

nomeado pela Comissão Mista, diretamente ao Plenário da Câmara dos

Deputados, é inconstitucional. A Doutrina do tema é assente no sentido de que

“'O parecer prévio da Comissão assume condição de instrumento indispensável

para regularizar o processo legislativo porque proporciona a discussão da

matéria, uniformidade de votação e celeridade na apreciação das medidas

provisórias'. Por essa importância, defende-se que qualquer ato para afastar ou

frustrar os trabalhos da Comissão (ou mesmo para substituí-los pelo

pronunciamento de apenas um parlamentar) padece de inconstitucionalidade.

Nessa esteira, são questionáveis dispositivos da Resolução 01/2002-CN, na

medida em que permitem a votação da medida provisória sem o parecer da

Comissão Mista. (...) A possibilidade de atuação apenas do Relator gerou

acomodação no Parlamento e ineficácia da Comissão Mista; tornou-se praxe a

manifestação singular: 'No modelo atual, em que há várias Comissões Mistas

(uma para cada medida provisória editada), a apreciação ocorre, na prática,

diretamente nos Plenários das Casas do Congresso Nacional. Há mais: com o

esvaziamento da Comissão Mista, instaura-se um verdadeiro 'império' do

relator, que detém amplo domínio sobre o texto a ser votado em Plenário'.

Cumpre lembrar que a apreciação pela Comissão é exigência constitucional.

Nesses termos, sustenta-se serem inconstitucionais as medidas provisórias

convertidas em lei que não foram examinadas pela Comissão Mista, sendo que o

pronunciamento do relator não tem o condão de suprir o parecer exigido pelo

constituinte. (...) Cabe ao Judiciário afirmar o devido processo legislativo,

declarando a inconstitucionalidade dos atos normativos que desrespeitem os

trâmites de aprovação previstos na Carta. Ao agir desse modo, não se entende

haver intervenção no Poder Legislativo, pois o Judiciário justamente contribuirá

15

para a saúde democrática da comunidade e para a consolidação de um Estado

Democrático de Direito em que as normas são frutos de verdadeira discussão, e

não produto de troca entre partidos e poderes.” (In: CLÈVE, Clèmerson Merlin.

Medidas Provisórias. 3ª ed. São Paulo: RT, 2010. p. 178-180. V. tb. CASSEB, Paulo

Adib. Processo Legislativo – atuação das comissões permanentes e temporárias.

São Paulo: RT, 2008. p. 285) 6. A atuação do Judiciário no controle da existência

dos requisitos constitucionais de edição de Medidas Provisórias em hipóteses

excepcionais, ao contrário de denotar ingerência contramajoritária nos

mecanismos políticos de diálogo dos outros Poderes, serve à manutenção da

Democracia e do equilíbrio entre os três baluartes da República. Precedentes

(ADI 1910 MC, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado

em 22/04/2004; ADI 1647, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno,

julgado em 02/12/1998; ADI 2736/DF, rel. Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno,

julgado em 8/9/2010; ADI 1753 MC, Relator Min. SEPÚLVEDA PERTENCE,

Tribunal Pleno, julgado em 16/04/1998). 7. A segurança jurídica, cláusula pétrea

constitucional, impõe ao Pretório Excelso valer-se do comando do art. 27 da Lei

9.868/99 para modular os efeitos de sua decisão, evitando que a sanatória de

uma situação de inconstitucionalidade propicie o surgimento de panorama

igualmente inconstitucional. 8. Deveras, a proteção do meio ambiente, direito

fundamental de terceira geração previsto no art. 225 da Constituição, restaria

desatendida caso pudessem ser questionados os atos administrativos praticados

por uma autarquia em funcionamento desde 2007. Na mesma esteira, em

homenagem ao art. 5º, caput, da Constituição, seria temerário admitir que todas

as Leis que derivaram de conversão de Medida Provisória e não observaram o

disposto no art. 62, § 9º, da Carta Magna, desde a edição da Emenda nº 32 de

2001, devem ser expurgadas com efeitos ex tunc. 9. A modulação de efeitos

possui variadas modalidades, sendo adequada ao caso sub judice a denominada

pure prospectivity, técnica de superação da jurisprudência em que “o novo

entendimento se aplica exclusivamente para o futuro, e não àquela decisão que

originou a superação da antiga tese” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Embargos

de declaração como meio processual adequado a suscitar a modulação dos

efeitos temporais do controle de constitucionalidade. RePro, vol. 198, p. 389,

ago/2011). 10. Não cabe ao Pretório Excelso discutir a implementação de

políticas públicas, seja por não dispor do conhecimento necessário para

especificar a engenharia administrativa necessária para o sucesso de um modelo

de gestão ambiental, seja por não ser este o espaço idealizado pela Constituição

para o debate em torno desse tipo de assunto. Inconstitucionalidade material

inexistente. 11. Ação Direta julgada improcedente, declarando-se

incidentalmente a inconstitucionalidade dos artigos 5º, caput, e 6º, caput e

parágrafos 1º e 2º, da Resolução nº 1 de 2002 do Congresso Nacional,

postergados os efeitos da decisão, nos termos do art. 27 da Lei 9.868/99, para

preservar a validade e a eficácia de todas as Medidas Provisórias convertidas em

Lei até a presente data, bem como daquelas atualmente em trâmite no

Legislativo. (ADI 4029, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em

08/03/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 26-06-2012 PUBLIC 27-06-

2012 RTJ VOL-00223-01 PP-00203)

16

Sendo assim, não resta dúvida que no presente caso estão ausentes os

requisitos para edição de uma medida provisória, cabendo a suspensão imediata dos

efeitos dela decorrentes.

III.II – Impropriedade da Utilização de Medida Provisória para a Criação de um Serviço

Social Autônomo

Como já pudemos trazer à análise, a MP nº 850/2018 não versa,

minimamente, de assunto urgente. Ora, como que a criação de um serviço social

autônomo pode tão urgentemente se fazer necessária? Não estamos a falar do repasse

de verbas ao Museu Nacional, largado ao descaso administrativo há tempos, mas da

criação de uma agência que fará a gestão de museus.

O assunto é tão urgente que demanda uma medida provisória? Será que

sua relevância já é assunto pacífico na sociedade?

Um serviço social autônomo deve partir do anseio, da necessidade social.

Da atitude consciente da Administração em descentralizar atividades de interesse

público, para uma maior eficiência.

Uma medida que possui sua gênese no Legislativo se mostra muito mais

razoável para a concretude de uma medida de tal envergadura. Ademais, vejamos o que

regula o art. 62, § 1º, I, ‘d’ da Constituição Federal:

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá

adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato

ao Congresso Nacional.

§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:

I – relativa a:

[...]

d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e

suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; [...]

17

Embora o orçamento do SEBRAE não integre o orçamento da União, é

encaminhado, por força do Decreto nº 9.029, de 10 de abril de 2017, ao Ministério da

Indústria, Comércio Exterior e Serviços. Caso a MP prospere, o SEBRAE terá alterado seu

orçamento, por meio de Medida Provisória, o que é expressamente vedado pela

Constituição.

Ademais, com a alteração orçamentária imposta, o SEBRAE para

continuidade de suas atividades, deveria rever todo seu planejamento orçamentário e

solicitar novo decreto ministerial, a fim de que a revisão do orçamento fosse objeto de

nova análise pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, ocasionando uma

verdadeira paralisação em suas atividades.

Vê-se, portanto, que a edição da Medida Provisória, coberta por diversas

impropriedades, traz consequências à atuação de um ente privado como SEBRAE, que

sequer foram pensadas pelo seu emissor, forçando que o poder Judiciário seja compelido

a extirpar seus efeitos do mundo jurídico.

Além disso, não é demais ressaltar que a Lei Eleitoral, Lei n° 9.504/98, no

seu art. 73, inciso V, veda, nos 3 (três) meses que antecedem ao pleito, conduta tendente

a nomeação, exoneração ou readaptação de cargos, que na prática ocorreu com a

transformação do IBRAM (antes autarquia) para ABRAM (serviço social autônomo),

alterando assim o próprio regime jurídico de público para privado, bem como a

transferência de servidor público conforme art. 21 da MP nº 850/18.

Por todo o exposto até o presente momento, já é possível observar a

quantidade de irregularidades encontradas no ato emanado pelo Presidente da

República.

18

III.III – Ausência de Consecução de Desígnios Constitucionais Estabelecidos no Art. 170

da Constituição Federal de 88

Pacífico no âmbito desta e. Suprema Corte que qualquer Contribuição de

Intervenção de Domínio Econômico – CIDE deve possuir razão de existir para dar vida a

um dos incisos no art. 170 da Constituição Federal. Nesse sentido, as seguintes decisões:

Decisão: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão assim

ementado: “TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO AO SEBRAE - APEX - ABDI. ART. 149 DA

CF. ALTERAÇÃO PELA EC Nº 33/01. FUNDAMENTO DE VALIDADE MANTIDO. LEI

COMPLEMENTAR. REFERIBILIDADE. 1. A EC nº 33/01, ao incluir o inciso III no § 2º

do artigo 149 da CF e explicitar determinadas bases de cálculo para as

contribuições de intervenção no domínio econômico, não o fez de forma

taxativa, não retirando o fundamento de validade da contribuição ao SEBRAE -

APEX - ABDI, a qual, para a consecução de desígnios constitucionais

estabelecidos no art. 170 da CF, utiliza como base econômica a folha de

pagamento das empresas. 2. A exação recolhida em favor do SEBRAE - APEX -

ABDI constitui uma contribuição de intervenção no domínio econômico,

amparada no art. 149 da CF, e, como tal, não sujeita à reserva de lei

complementar. 3. Em se tratando a exação de contribuição de intervenção que

objetiva incentivar as micro e pequenas empresas em atenção aos princípios

gerais da atividade econômica insculpidos nos arts. 170, IX, e 179 da CF,

prescinde de vinculação direta ao contribuinte ou da percepção, por este, de

benefícios oriundos da arrecadação” O recurso busca fundamento no art. 102, III,

a, da Constituição Federal. A parte recorrente alega violação ao art. 149, §2º, III, a,

da Carta. [...]. Especificamente, concretizar aqueles princípios da ordem

econômica a que alude o art. 170 da CF. A limitação que pretende dar a apelante

por certo restringiria por demais a possibilidade de atuação concreta do Estado

para a consecução desses desígnios constitucionais expressos. De sorte que, na

linha do que ensina Paulo de Barros Carvalho, entendo que os supostos previstos

no referido preceptivo constitucional não são taxativos. (…) Do exposto, não

diviso qualquer incompatibilidade entre a contribuição destinada ao SEBRAE -

APEX - ABDI, incidente sobre a folha de salários, e o disposto na alínea "a" do

inciso III do § 2º do artigo 149 da CF. É dizer, não houve revogação da exação pela

EC nº 33, de 11 de dezembro de 2001 [...]. Ademais, entendeu que, em se

tratando de contribuição de intervenção no âmbito econômico, dedicada a

incentivar as micro e pequenas empresas em atenção aos arts. 170, IX, e 179 da

CF, não se mostraria lógico que fosse arcada, de forma exclusiva, justamente pelo

segmento econômico a que se visa impulsionar. Reafirmou o Tribunal, assim, que

tal espécie de tributo prescinde de vinculação direta ao contribuinte ou da

percepção, por este, de benefícios oriundos da arrecadação, exigindo-se apenas

a adequação aos princípios gerais da atividade econômica (arts. 170 a 181 da

CF). Rechaçou-se, destarte, a alegação de que a contribuição não poderia ser

19

cobrada de empresas de médio e grande porte. A jurisprudência desta Corte

também é uníssona ao afirmar a constitucionalidade do tributo, consoante se

extrai, a título exemplificativo, dos seguintes precedentes: AC nº

2002.71.00.013355-4/RS, Segunda Turma, Rel. Des. Federal Antônio Albino Ramos

de Oliveira, D.E. de 09-04-2007; AC nº 2004.70.06.002277-9/PR, Segunda Turma,

Rel. Juiz Federal Leandro Paulsen, D.J.U. de 16-11-2006; AC nº

1999.71.00.024418-1/RS, Primeira Turma, Rel. Des. Federal Vilson Darós, D.J.U de

06-09-2006. Legítima, portanto, a exigência da contribuição, devendo permanecer

inalterada a decisão singular que julgou improcedente o pedido inicial” Diante do

exposto, com base no art. 328, parágrafo único, do RI/STF, mantenho o

sobrestamento, todavia determino o retorno dos autos à origem, a fim de que

seja observada a sistemática da repercussão geral. Publique-se. Brasília, 21 de

junho de 2017. Ministro Luís Roberto Barroso Relator Documento assinado

digitalmente (RE 603685, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em

21/06/2017, publicado em DJe-139 DIVULG 23/06/2017 PUBLIC 26/06/2017)

(grifos inovados)

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CIDE. LEI

Nº 10.168/2000. FINANCIAMENTO DO PROGRAMA DE ESTÍMULO À INTERAÇÃO

UNIVERSIDADE-EMPRESA PARA O APOIO À INOVAÇÃO. CONSTITUCIONALIDADE

DO TRIBUTO. PRECEDENTES. CRÉDITO FISCAL DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.159-

70/2001 INCIDENTE SOBRE A CONTRIBUIÇÃO EM PAUTA. IMPOSSIBILIDADE DE

ESTENDER BENEFÍCIOS FISCAIS PELA VIA JURISDICIONAL, NA QUALIDADE DE

LEGISLADOR POSITIVO, AINDA QUE A PRETEXTO DE ISONOMIA. PRECEDENTES.

RECURSO DESPROVIDO. DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário, manejado

com arrimo na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão que

assentou, verbis: “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA.

CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - CIDE. LEI N.

10.168/2000. CONSTITUCIONALIDADE. REMESSA AO EXTERIOR. CONTRATO.

TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA. LEGITIMIDADE DA CONTRIBUIÇÃO. I - A

instituição de contribuição de intervenção no domínio econômico exige que tal

intervenção seja feita com apoio em lei; que o setor da economia esteja sendo

desenvolvido pela iniciativa privada para que se possa configurar um ato de

intervenção no domínio econômico, nos termos da Constituição; e que as

finalidades sejam aquelas a que se referem os princípios mencionados no art.

170 do Texto Fundamental. II - A intervenção a ser custeada foi criada pela Lei n.

10.168/2000, instituidora do Programa de Estímulo à Interação Universidade-

Empresa para o Apoio à Inovação, cujo objetivo principal é estimular o

desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa

científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e o

setor produtivo (art. 1º, da Lei n. 10.168, de 2000), finalidade alinhada com os

ditames constitucionais (CR/88, arts. 170, III, 174, 218 e 219). [...] (RE 928943,

Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 26/11/2015, publicado em DJe-242 DIVULG

30/11/2015 PUBLIC 01/12/2015) (grifos inovados)

20

A intervenção no domínio econômico decorre da necessidade de atuação

no estado no setor privado e a União somente pode se valer da competência tributária

conferida pelo art. 149 da Constituição Federal para criação de uma CIDE quando seus

objetivos estiverem vinculados ao disposto em um dos incisos elencados no art. 170 da

CF.

Quando o Estado exerce uma atividade econômica pertencente ao campo

reservado à iniciativa privada, deixa de atuar em sua área para intervir em outra, razão

pela qual, contribuições desta natureza foram alcunhadas de contribuições de

intervenção no domínio econômico.

Ora, resta cristalino que a gestão de instituições museológicas e de seus

acervos, conforme preconiza o objeto da Agência recém-criada, não se adequa a

nenhuma das hipóteses do art. 170 da CF/88, ao contrário daquela destinada ao SEBRAE,

que encontra guarida nos incisos VII e IX, acima transcritos.

A gestão de museus passa ao largo do incentivo à ordem econômica, pelo

que, logicamente, não pode ser custeada por CIDE. Na mesma esteira, o Estado, com a

medida, não se encontra a intervir na economia do país. A medida, ainda que salutar,

deve ter outra fonte e não uma CIDE.

A tragédia ocorrida com o Museu Nacional, vinculado a UFRJ, não justifica a

criação de CIDE, nem pode uma CIDE ser criada para arrecadar recursos para

reconstrução e manutenção de museus ou qualquer outro bem ou patrimônio público,

em o fazendo, resta caracterizada o desvio de finalidade da CIDE. A manutenção de

patrimônio público deve ser objeto do orçamento da própria União ou das entidades

públicas correspondentes.

21

Recursos destinados ao fomento do empreendedorismo brasileiro, de

impacto profundo na economia do Brasil, estão sendo arrancados dos pequenos

negócios, para atividades de gestão de museus. Tal medida de fato não merece

prosperar.

III.IV – Destinação Diversa da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico

Atribuída ao SEBRAE

A Lei nº 8.029/90, ao criar a contribuição do SEBRAE, assim disciplinou:

Art. 9º Compete ao serviço social autônomo a que se refere o artigo anterior

planejar, coordenar e orientar programas técnicos, projetos e atividades de apoio

às micro e pequenas empresas, em conformidade com as políticas nacionais de

desenvolvimento, particularmente as relativas às áreas industrial, comercial e

tecnológica.

Art. 11. Caberá ao Conselho Deliberativo do Cebrae a gestão dos recursos que lhe

forem destinados conforme o disposto no § 4o do art. 8o, exceto os destinados à

Apex-Brasil

§ 1º Os recursos a que se refere este artigo, que terão como objetivo primordial

apoiar o desenvolvimento das micro e pequenas empresas por meio de projetos e

programas que visem ao seu aperfeiçoamento técnico, racionalização,

modernização, capacitação gerencial, bem como facilitar o acesso ao crédito, à

capitalização e o fortalecimento do mercado secundário de títulos de

capitalização dessas empresas, terão a seguinte destinação:

O legislador atribuiu destinação específica para a CIDE do SEBRAE. O STF, já

desde 2003, pacificou a questão, com o fundamento de que o legislador, como política de

governo, para a finalidade de cumprir com os requisitos do art. 170, VII e IX da CF/88,

instituiu a contribuição do SEBRAE:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO: SEBRAE:

CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. Lei 8.029, de

12.4.1990, art. 8º, § 3º. Lei 8.154, de 28.12.1990. Lei 10.668, de 14.5.2003. C.F.,

art. 146, III; art. 149; art. 154, I; art. 195, § 4º. I. - As contribuições do art. 149, C.F.

- contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de

22

categorias profissionais ou econômicas - posto estarem sujeitas à lei

complementar do art. 146, III, C.F., isto não quer dizer que deverão ser instituídas

por lei complementar. A contribuição social do art. 195, § 4º, C.F., decorrente de

"outras fontes", é que, para a sua instituição, será observada a técnica da

competência residual da União: C.F., art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, § 4º.

A contribuição não é imposto. Por isso, não se exige que a lei complementar

defina a sua hipótese de incidência, a base imponível e contribuintes: C.F., art.

146, III, a. Precedentes: RE 138.284/CE, Ministro Carlos Velloso, RTJ 143/313; RE

146.733/SP, Ministro Moreira Alves, RTJ 143/684. II. - A contribuição do SEBRAE -

Lei 8.029/90, art. 8º, § 3º, redação das Leis 8.154/90 e 10.668/2003 - é

contribuição de intervenção no domínio econômico, não obstante a lei a ela se

referir como adicional às alíquotas das contribuições sociais gerais relativas às

entidades de que trata o art. 1º do D.L. 2.318/86, SESI, SENAI, SESC, SENAC. Não

se inclui, portanto, a contribuição do SEBRAE, no rol do art. 240, C.F. III. -

Constitucionalidade da contribuição do SEBRAE. Constitucionalidade, portanto, do

§ 3º, do art. 8º, da Lei 8.029/90, com a redação das Leis 8.154/90 e 10.668/2003.

IV. - R.E. conhecido, mas improvido. (RE 396266, Relator(a): Min. CARLOS

VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 26/11/2003, DJ 27-02-2004 PP-00022

EMENT VOL-02141-07 PP-01422)

É essencial destacar que a destinação do produto arrecadado com

qualquer CIDE configura instrumento de atuação do Estado no domínio econômico. Uma

vez inexistente tal vinculação, a contribuição da ABRAM macula frontalmente o próprio

objetivo do Estado ao instituir tal exação.

Demonstrado, portanto, que a cobertura dos objetivos para os quais a

ABRAM foi criada, pelos recursos advindos de contribuição de intervenção do domínio

econômico, com fundamento no art. 170 da CF/88, está eivada de vício de desvio de

finalidade, pois aqueles não estão abrangidos dentre as hipóteses de setores econômicos

aos quais o governo pode intervir mediante adoção de exação interventiva.

Noutras palavras, o que motiva e autoriza a União a instituir uma

contribuição interventiva é exercer influência no domínio econômico, não pode ser outro

o destino do produto arrecadado senão a atividade ou situação econômica que a ensejou.

Repita-se, gestão de museus não se encontra arrolada no art. 170 da CF/88, razão pela

qual a referida MP encontra eivada de vício constitucional irreparável.

23

III.V – Antijuridicidade do Art. 26 da MP Nº 850/2018

Além de toda a fundamentação acima, no caso de a MP vir a prosperar,

ainda que diante de latente antijuridicidade, o art. 26 da MP nº 850/2018 assim

disciplina:

Art. 26. Para fins do disposto no § 4º do art. 8º da Lei nº 8.029, de 1990, o Serviço

Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas - Sebrae deverá, no prazo de

vinte dias, contado da data de instituição da Abram, remanejar, transpor ou

transferir para a Abram as dotações orçamentárias aprovadas no seu orçamento

referente ao exercício financeiro no qual a Abram venha a ser instituída, mantida

a mesma classificação funcional-programática, expressa por categoria de

programação em seu menor nível, incluídos os títulos, os descritores, as metas e

os objetivos, além do detalhamento por esfera orçamentária, grupos de despesa,

fontes de recursos, modalidades de aplicação e identificadores de uso.

O artigo acima encontra-se eivado de uma série de impropriedades.

Em primeiro lugar, o art. 26 da MP em comento reforça o desvio de

finalidade da CIDE. Outrora criada para fomentar as micro e pequenas empresas, foi

desvirtuada para promover o setor museal, não tendo lastro, portanto, no art. 170 da CF.

Segundo, impõe encargo ao SEBRAE de transferir recursos por conta

própria para a ABRAM, sem observar que tal obrigação é da União6, por força da Lei n°

6 Art. 1° A Secretaria da Receita Federal passa a denominar-se Secretaria da Receita Federal do Brasil, órgão

essencial ao funcionamento do Estado, de caráter permanente, estruturado de forma hierárquica e diretamente

subordinado ao Ministro de Estado da Fazenda e que tem por finalidade a administração tributária e aduaneira

da União.

Parágrafo único. São essenciais e indelegáveis as atividades da administração tributária e aduaneira da União

exercidas pelas servidores dos quadros funcionais da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Art. 2o Além das competências atribuídas pela legislação vigente à Secretaria da Receita Federal, cabe à

Secretaria da Receita Federal do Brasil planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas a

tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais previstas nas alíneas

24

11.457/ 2007, cuja atribuição é indelegável na forma do § único do art. 1°, e que, no caso

de tributos extrafiscais, é remunerada pelo percentual de 3,5%, conforme art. 3°, caput e

parágrafo primeiro, da citada lei:

Art. 3º As atribuições de que trata o art. 2o desta Lei se estendem às contribuiçõe

s devidas a terceiros, assim entendidas outrasentidades e fundos, na forma da legi

slação em vigor, aplicando-se em relação a essas contribuições, no que couber, as

disposições desta Lei.

(Vide Decreto nº 6.103, de 2007).

§ 1º A retribuição pelas serviços referidos no caput deste artigo será de 3,5% (três

inteiros e cinco décimos por cento) domontante arrecadado, salvo percentual div

erso estabelecido em lei específica.

Este encargo operacional e financeiro não pode ser transferido ao SEBRAE,

por afronta ao art. 5°, XVII, também da Constituição Federal7.

O SEBRAE recebe sua contribuição social diretamente da RFB,

mensalmente. Não somente se mostra descabida a proposta, como impossível. Como o

SEBRAE deverá, em vinte dias, transferir recursos, os quais ainda nem possui, para a

ABRAM?

Repise-se que o SEBRAE tem seu orçamento e planejamento elaborado,

analisado e aprovado no ano anterior ao exercício financeiro de execução. Isto implica

dizer que os programas e projetos têm suas ações previstas com bastante antecedência,

sofrendo impacto direto com a redução do orçamento de forma abrupta e intempestiva,

tal qual descrito na norma supracitada.

Com efeito, a transferência desses recursos, da forma que se dá, poderá

ocasionar, inclusive, dificuldade no cumprimento de compromissos já firmados perante

a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, e das contribuições instituídas

a título de substituição. 7 XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo

vedada a interferência estatal em seu funcionamento;

25

seus parceiros, pois, a atuação do SEBRAE é sempre em estrita observância ao

planejamento aprovado.

Ora, imperioso reconhecer que o prazo previsto na MP 850/2018 é irrisório

para fins de toda operação de transferência orçamentária exigida, uma vez que, como

dito mais acima, o SEBRAE não é órgão da administração pública, tendo autonomia

administrativa, orçamentária e financeira.

Assim, não se trata de mera transferência bancária de recursos, há muito

mais envolvido nessa operação, razão pela qual o disposto no artigo ora combatido,

demonstra-se totalmente dissonante do ordenamento jurídico pátrio, eivado de total

desvio de finalidade.

E mais, como manter a mesma “classificação funcional-programática,

expressa por categoria de programação em seu menor nível, incluídos os títulos, os

descritores, as metas e os objetivos, além do detalhamento por esfera orçamentária,

grupos de despesa, fontes de recursos, modalidades de aplicação e identificadores de

uso” entre os recursos do SEBRAE e da ABRAM? Mesmas metas? Mesmos objetivos?

Como compatibilizar metas os objetivos dos recursos destinados ao SEBRAE e à ABRAM,

sendo que as entidades possuem finalidade institucional completamente distintas?

A exemplo da APEX e da ABDI, a própria RFB deverá realizar o recorte dos

recursos expropriados do SEBRAE, e repassá-los à ABRAM, bem com cobrar sua

respectiva taxa de administração pelos serviços.

IV – PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA MEDIDA LIMINAR

Com relação aos pressupostos ensejadores da medida liminar, restam

integralmente presentes, vejamos:

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O perigo de dano iminente de difícil reparação resta demonstrado

considerando que a retirada de recursos do SEBRAE irá conturbar o planejamento e a

previsibilidade orçamentária.

Além disso, o orçamento do SEBRAE está comprometido com obrigações

contratuais já firmadas. E não estamos falando apenas dos compromissos firmados pelo

SEBRAE Nacional, unidade coordenadora do Sistema SEBRAE, como também os

assumidos pelos 27 SEBRAEs Estaduais responsáveis pela execução das atividades de

fomento e desenvolvimento das micro e pequenas empresas em todo o país.

Como acima já mencionado, o corte no orçamento do SEBRAE equivale ao

atendimento de seiscentos e oito mil pequenos negócios!

No que tange à reversibilidade da medida, também se observa que a

concessão da liminar não causará nenhum prejuízo imediato e não reversível,

considerando que a agência ainda não iniciou suas atividades, afastando assim qualquer

indicativo de perigo da demora em sentido inverso, isto é, não há qualquer prejuízo na

suspensão da medida provisória. As atividades de preservação e gerenciamento de

museus não serão interrompidas e poderão continuar sendo realizadas pelo IBRAM. Já

sobre o quadro reverso, não se pode concluir da mesma forma.

Caso a ABRAM seja efetivamente criada, e, logo a seguir, tenha suas

atividades suspensas, ou até mesmo extinguidas, já havendo o SEBRAE sofrido o recorte

de recursos, o prejuízo para os pequenos negócios já haverá ocorrido.

Com relação à verossimilhança das alegações, é evidente no caso em

exame e resta cristalino que o art. 170 da CF define os contornos que podem ser dados

para a criação de novas contribuições de intervenção no domínio econômico, requisitos

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estes que a ABRAM não preenche em nenhuma de seus objetivos, restando afastada a

possibilidade jurídica de utilização da CIDE para custear o novo serviço social autônomo

ora criado.

Presentes os requisitos legais, requer-se o deferimento de liminar para que

seja imediatamente suspensa a tramitação da MP nº 850/2018 perante o Congresso

Nacional.

V – PEDIDOS

Pelo exposto, requer-se:

a) com fulcro no art. 7º, III, da Lei n° 12.016/2009, considerada a

manifesta gravidade e excepcionalidade da situação descrita nos

presentes autos, que seja deferida liminar inaudita altera pars, para

que seja imediatamente SUSPENSO os efeitos da edição da Medida

Provisória nº 850, de 10 de setembro de 2018, que cria a Agência

Brasileira de Museus – ABRAM, ou, sucessivamente, determinar a

suspensão dos efeitos dos artigos 23 (que altera a redação dos §3° e §

4°, do art. 8°, da Lei n° 8.029/90), e do art. 26 da Medida Provisória n°

850/2018, até decisão final de mérito;

b) no mérito, seja concedida a ordem para reconhecer a ilegalidade, por

desvio de finalidade, da Medida Provisória nº 850, de 10 de setembro

de 2018, por utilizar como fonte orçamentária parte da contribuição

destinada ao SEBRAE, bem como a sua inconstitucionalidade, por

afronta aos preceitos constitucionais exigidos para a criação de uma

contribuição de intervenção no domínio econômico, não preenchidos

na medida provisória ora contestada, ou, sucessivamente, declarar

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inconstitucionais e, portanto, sem efeitos, os artigos 23 (que altera a

redação dos §3° e § 4°, do art. 8°, da Lei n° 8.029/90), e o art. 26 da

Medida Provisória n° 850/2018, pelos fundamentos supra.

c) requer-se ainda, seja notificada a autoridade coatora, o Excelentíssimo

Presidente da República para prestar informações no prazo legal; e

d) seja, nos termos do art.7º, II, da Lei n. 12.016/2009, que se dê ciência

do feito ao seu órgão de representação judicial, qual seja, a Advocacia

Geral da União para se manifestar, caso julgue conveniente, bem como

intimar o Ministério Público, na qualidade de fiscal da lei.

Os procuradores da Impetrante declaram a autenticidade das cópias dos

documentos que instruem esta inicial.

Requer, por fim, que as intimações sejam feitas em nome da advogada

LARISSA MOREIRA COSTA (OAB/DF n° 16.745).

Dá à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais) para efeitos meramente

fiscais.

Nestes termos, pede deferimento.

Brasília, 12 de setembro de 2018.

Larissa Moreira Costa

OAB/DF 16.745

Sergio Thiago Costa Carazza

OAB/DF 23.452

Rafael Fernandes Machado de Oliveira

OAB/PI 13.731

Thiago Luiz Isacksson D’Albuquerque

OAB/DF 20.792