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Evolução da Textura em Ligas de Ni-Ti rica em Ti e rica em Ni Submetidas a Tratamento Termomecânico de Ausforming A.S. Paula 1,* C.M.L. dos Santos 2,† J.H.P.G. Canejo 1,‡ K.K. Mahesh 1,§ F.M. Braz Fernandes 1,** C.S. da Costa Viana 2,†† 1 CENIMAT, Campus da FCT/UNL, 2829-516 Monte de Caparica, Portugal 2 Seção de Engenharia Mecânica e de Materiais, IME, Pça Gen. Tibúrcio, 80, Urca, Rio de Janeiro, RJ - Brasil - CEP 22290-270 Resumo A anisotropia do efeito de memória de forma (EMF) é fortemente dependente do tipo de orientação preferencial que está presente bem como do comportamento mecânico associado àquela textura. O objetivo deste trabalho foi estudar os efeitos do tratamento termomecânico de ausforming a 500ºC sobre a textura cristalográfica da martensita (B19’) e da austenita (B2) em duas ligas de Ni-Ti: uma rica em Ti e outra rica em Ni. As texturas de B19’ e de B2 foram medidas por Difração de Raios-X (DRX), e as temperaturas de transformação e as fases foram detectadas e identificadas por Calometria Diferencial de Varredura (DSC), Resistividade Elétrica (RE) e DRX. As propriedades mecânicas à temperatura ambiente foram caracterizadas por meio de ensaio de tração na direção de laminação (DL) e microdureza Vickers. Palavras-chave: Ligas de Ni-Ti com Memória de Forma, Tratamento Termomecânico, Ausforming, Textura, Difração de Raios-X. * Doutora em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] Doutorando em Ciência dos Materiais (IME – Brasil) – [email protected] Doutorando em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] § Doutor e Pós-doc em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] ** Professor Associado do Departamento de Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] †† Professor Emérito do Departamento de Engenharia Mecânica e de Materiais (IME – Brasil) – [email protected] 132

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Evolução da Textura em Ligas de Ni-Ti rica em Ti e rica em Ni Submetidas a Tratamento Termomecânico de Ausforming

A.S. Paula1,*

C.M.L. dos Santos2,†

J.H.P.G. Canejo1,‡

K.K. Mahesh1,§

F.M. Braz Fernandes1,**

C.S. da Costa Viana2,††

1 CENIMAT, Campus da FCT/UNL, 2829-516 Monte de Caparica, Portugal

2 Seção de Engenharia Mecânica e de Materiais, IME, Pça Gen. Tibúrcio, 80, Urca, Rio de Janeiro, RJ - Brasil - CEP 22290-270

Resumo

A anisotropia do efeito de memória de forma (EMF) é fortemente dependente do

tipo de orientação preferencial que está presente bem como do comportamento

mecânico associado àquela textura.

O objetivo deste trabalho foi estudar os efeitos do tratamento termomecânico de

ausforming a 500ºC sobre a textura cristalográfica da martensita (B19’) e da austenita

(B2) em duas ligas de Ni-Ti: uma rica em Ti e outra rica em Ni. As texturas de B19’ e

de B2 foram medidas por Difração de Raios-X (DRX), e as temperaturas de

transformação e as fases foram detectadas e identificadas por Calometria Diferencial de

Varredura (DSC), Resistividade Elétrica (RE) e DRX. As propriedades mecânicas à

temperatura ambiente foram caracterizadas por meio de ensaio de tração na direção de

laminação (DL) e microdureza Vickers.

Palavras-chave: Ligas de Ni-Ti com Memória de Forma, Tratamento Termomecânico,

Ausforming, Textura, Difração de Raios-X.

* Doutora em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] † Doutorando em Ciência dos Materiais (IME – Brasil) – [email protected] ‡ Doutorando em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] § Doutor e Pós-doc em Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] ** Professor Associado do Departamento de Ciência dos Materiais (FCT/UNL – Portugal) – [email protected] †† Professor Emérito do Departamento de Engenharia Mecânica e de Materiais (IME – Brasil) – [email protected]

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Nic
Stamp
Nic
Text Box
III Workshop sobre Textura São Paulo, 2006, pág. 132 a 150

1 Introdução

As ligas com memória de forma são utilizadas como atuadores na industria

mecânica, médica e aeroespacial, devido ao seu comportamento singular conhecido

como efeito de memória de forma (EMF). O EMF é conhecido por ser resultante da

transformação martensítica termoelástica. A natureza da transformação é fortemente

dependente da história termomecânica da liga [1].

A resposta termomecânica das ligas com memória de forma sofre mudanças

substanciais com variações na composição química, processamento metalúrgico e

ciclagem termomecânica. Pequenas mudanças na composição química da liga são

conhecidas por proporcionar significantes mudanças nas temperaturas de transformação

[2].

No caso do NiTi, em particular no caso das ligas ricas em Ni e equiatômicas,

muitos pesquisadores têm estudado o efeito de tradicionais procedimentos de

processamento metalúrgico, como: o trabalho a quente, o trabalho a frio e o

envelhecimento nas suas respostas termomecânicas. Defeitos cristalinos introduzidos

durante o trabalho a frio foram identificados como responsáveis por afetar as

temperaturas de transformação nas ligas de Ni-Ti com memória de forma [3-8]. Nas

ligas com memória de forma, o propósito do ausforming é melhorar a resistência dessas

ligas com o EMF [9].

Na liga de Ni-Ti com memória de forma, o ausforming tem lugar na campo

austenítico homogêneo não-transformável, acima de Md (temperatura abaixo da qual a

transformação martensítica induzida por tensão tem seu lugar), na qual pequenas

quantidades de uma segunda fase podem formar-se, como por exemplo pela

precipitação (ausageing) [10].

133

Muitas propriedades do material (módulo de Young, coeficiente de Poisson,

resistência mecânica, dutilidade, tenacidade, condutividade elétrica, etc.) dependem da

textura média de um material.

Vários estudos têm sido dedicados à influência da textura na resposta

termomecânica das ligas com memória de forma, principalmente utilizando a radiação

neutron in-situ para acompanhar a evolução estrutural [11]. A ciclagem térmica, a

laminação ou a trefilação desenvolvem uma textura específica nos metais e ligas. Elas

resultam em diferentes características anisotrópicas (comportamento mecânico, elétrico

e magnético). As ligas de Ni-Ti com memória de forma também são sensíveis a estes

efeitos. A textura obtida dá origem a anisotropia na recuperação da deformação pela

transformação [12]. Ligas de Ni-Ti com memória de forma no campo austenítico têm

um textura do tipo ccc [13,14]: fibra-α I <110>||DL ({001}<112>-{112}<110>-

{111}<110>), fibra-α II <110>||DL ({111}<110>-{110}<110>), fibra-γ <111>||DN

({111}<110>-{111}<112>) e fibra-η <100>||DL ({001}<100>-{011}<100>). A

correspondência cristalográfica calculada entre a fase mãe (austenita, B2) e a martensita

(B19’) baseia-se na notação da variante correspondente de Miyazaki [14], onde a

variante {110}<1 1 0> da fase mãe corresponde às variantes {111}<211> e {002}<002>

da martensita; e a variante {111}<1 1 0> da fase mãe corresponde às variantes

{210}<211> e {210}<002> da martensita.

No presente trabalho, o efeito da laminação a quente (ausforming) sobre a textura

foi estudado em duas ligas de Ni-Ti, uma rica em Ti (Ni-51,0%at.Ti) com EMF e outra

rica em Ni (50,8%at.Ni-Ti) superelástica. As fases foram identificadas por DRX e as

transformações de fases foram analisadas pelo emprego das técnicas de DSC e RE.

Além disso, foram observados os comportamentos mecânicos por microdureza Vickers

e ensaio de tração à temperatura ambiente.

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2 Materiais e Métodos

Os materiais em estudo são duas ligas metálicas binárias constituídas por Níquel

(Ni) e Titânio (Ti), uma rica em Ti (49,0%at.Ni-51,0%at.Ti, segundo análise de

SEM/EDS e 2,00 mm de espessura) que apresenta características de memória de forma

acima da temperatura ambiente (Tamb) e uma outra rica em Ni (50,8%at.Ni-49,2%at.Ti,

segundo informações do fornecedor e 1,00 mm de espessura) que apresenta

características superelásticas (SE) à Tamb.

As ligas de Ni-Ti com EMF e SE foram fornecidas pela empresa Memory-Metalle

GmbH, situada na Alemanha (www.memory-metalle.de). Segundo informações cedidas

pelo fornecedor, as ligas de Ni-Ti são fundidas num forno de indução sob vácuo e

atmosfera de argônio, usando cadinhos de grafite compactada.

2.1 Processamento Termomecânico de Ausforming

O tratamento termomecânico de ausforming realizado teve por objetivo observar

como o ausforming pode afetar as diferentes propriedades das ligas de Ni-Ti rica em Ti

(EMF) e rica em Ni (SE). Para tal, as chapas dessas ligas foram utilizadas neste

processamento para uma condição de máxima redução em uma única etapa de

laminação a quente. As amostras foram laminadas no mesmo sentido da laminação da

chapa como recebida.

O processamento de laminação a quente (ausforming) foi efetuado com a chapa de

Ni-Ti entre outras duas folhas de aço inoxidável martensítico de 0,35 mm de espessura

cada, ou seja um “sanduíche” Aço/Ni-Ti/Aço (Fig. 01). Para evitar que ocorresse

caldeamento entre o aço e o Ni-Ti durante o ausforming, as folhas de aço foram

previamente aquecidas a alta temperatura para promover a formação de uma camada de

óxido sobre a superfície. Um termopar de cromel-alumel foi introduzido entre uma das

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folhas de aço e a chapa de Ni-Ti (Fig. 01) para definição da temperatura de pré-

aquecimento de forma a laminar a amostra próximo dos 500ºC.

A abertura entre os cilindro foi de 0,70 mm (2 vezes a espessura da folha de aço

inox martensítico – Fig. 01) e o comprimento das chapas de aço inox martensítico era

superior ao da chapa de Ni-Ti com o objetivo de garantir a “mordedura” dos cilindros e

a laminação com máxima redução nas chapas das Ligas EMF e SE. A Fig. 02 apresenta

o esquema do processamento de ausforming. As amostras de chapa das Ligas EMF e SE

foram submetidas a laminação a quente, onde o tratamento térmico ao ar teve como

objetivo aquecer as amostras antes de serem introduzidas entre os cilindros (Tamb) do

laminador à temperatura almejada do processamento de ausforming (Fig. 02). Após

serem laminadas a quente, estas amostras foram temperadas em água à temperatura

ambiente.

Fig. 01 – Configuração “sanduíche” Aço/Ni-Ti/Aço para laminação durante o ausforming.

136

Fig. 02 – Diagrama esquemático do tratamento termomecânico de ausforming.

2.2 Caracterização Estrutural e Térmica

A DRX foi realizada empregando um difratômetro Bruker (30 kV / 100 mA,

anodo rotativo de Cu) para varreduras θ/2θ e análise de textura entre a temperatura

ambiente e 150ºC. A direção de laminação (DL) foi mantida alinhada em φ = 0º,

enquanto a direção transversal (DT) em φ = 90º.

Amostras com uma massa no intervalo de 40 a 50 mg foram cortadas para análise

de DSC (SETARAM DSC92). O ciclo térmico para o DSC compreendeu um

aquecimento até 180ºC para a Liga EMF e até 80ºC para a Liga SE, manutenção por

360 s e subsequente resfriamento até -30ºC para a Liga EMF e até -100ºC para a Liga

SE com taxas de aquecimento e resfriamento de 7,5ºC/min.

Os ensaios de RE foram realizados em um equipamento projectado e construído

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no próprio departamento por K.K. Mahesh. O equipamento consiste no método de

medição da resistividade em 4 pontos, onde 4 eletrodos de cobre estão em contato com

as amostras ao longo do seu comprimento em 4 pontos equidistantes. A corrente

aplicada (1,6 A) é injetada na amostra pelos 2 eletrodos externos. A resistividade é

calculada a partir da medição da diferença de potencial entre os 2 eletrodos internos.

Uma placa de aquisição de dados (National Instruments, EUA) com uma precisão

melhor que 1 μV foi utilizada para enviar o sinal para o computador. O intervalo de

temperatura observado para cada amostra foi entre -30 e 150ºC para a Liga EMF e 60ºC

para a Liga SE.

Os ensaios de microdureza Vickers foram realizados usando um microdurômetro

Leitz DURIMET. Para cada amostra, dez medidas foram tomadas à temperatura

ambiente com carga de 200 g.

Os ensaios de tração foram realizados utilizando uma SHIMATZU Autograph

AG-G Séries. Os testes foram realizados à temperatura ambiente com o intuito de

observar o comportamento mecânico das duas ligas sob diferentes condições iniciais.

3 Resultados e Discussão

As Fig. 03 e 04 apresentam ciclos térmicos de DSC e RE das chapas das Ligas

EMF e SE, respectivamente, após tratamento termomecânico de ausforming. Ambas as

ligas apresentam comportamento similar no que diz respeito à sequência das

transformações direta e reversa, apesar das gamas de temperaturas de transformação

serem superiores para a liga rica em Ti (Liga EMF). Os resultados de DSC evidenciam

que as Ligas EMF e SE, pelas Fig. 03c e 04c, após o ausforming apresentam

transformações direta e reversa em múltiplas etapas (B2↔R, B2↔B19’ e R↔B19’). O

mesmo ocorre para a Liga EMF antes do ausforming, enquanto a Liga SE apresenta

138

transformação direta em duas etapas (B2→R e R→B19’) e reversa em múltiplas etapas

(B19’→R, B19’→B2’ e R→B2). A transformação B2→R é claramente evidenciada

pelo primeiro pico exotérmico sobreposto ao segundo (Fig. 03a e 04a) e aumento da

resistividade elétrica (Fig. 03b e 04b) no resfriamento. O grau de sobreposição dos picos

exotérmicos de DSC no resfriamento deixa indícios de existir transformação direta em

uma etapa (B2→B19’) em certas regiões da matriz e em outras regiões a transformação

direta ocorrer em duas etapas (B2→R e R→B19’). Outra evidência da transformação

em múltiplas etapas no resfriamento é apresentada pelos resultados de RE (Fig. 03b e

04b) no resfriamento, evidenciada pelo aumento menos abrupto da resistividade

associado à formação de fase-R quando comparado com as condições das Ligas EMF e

SE como recebidas (Fig. 03b e 04b); este comportamento estará provavelmente

associado a uma transformação paralela B2→B19’. O fim da transformação direta dá se

pela transformação R→B19’ evidenciada pelo segundo pico exotérmico sobreposto ao

primeiro (Fig.03a e 04a) e decréscimo na resistividade elétrica (Fig.03b) no

resfriamento. Para a amostra da Liga SE após ausforming (Fig. 04d) não foi possível

apresentar o ciclo térmico por RE até completa transformação direta, devido a

limitações do equipamento, mas pode-se observar claramente a transformação B2→R.

No que diz respeito à transformação reversa, verifica-se por DSC (Fig. 03a e 04a)

que a transformação ocorre em múltiplas etapas (R→B2, B19’→B2 e R→B2) pela

forma do pico endotérmico no aquecimento e a sobreposição com a gama da

temperatura de transformação dos picos exotérmicos no resfriamento. Na análise de RE

da amostra da Liga EMF após ausforming (Fig. 03d) verifica-se um patamar durante o

aquecimento da transformação B19’→B2, o que indicia a presença de transformação em

múltiplas etapas.

139

Fig. 03 – Análises de (a,c) DSC e (b,d) RE nas amostras da chapa da Liga EMF (a,b) antes e (c,d) após o tratamento termomecânico de ausforming.

A Fig. 05 apresenta as figuras de pólos (11 1 ) de B19’ da chapa da Liga EMF

antes (Fig. 05a) e após (Fig. 05c) o tratamento termomecânico de ausforming. Devido às

limitações instrumentais (temperatura mínima) não foi possível obter figuras de pólos

(11 1 ) de B19’ (induzida termicamente) para a Liga SE antes e após o tratamento

termomecânico de ausforming.

A Fig. 05 apresenta as figuras de pólos (110) de B2 das chapas das Ligas EMF

(Fig. 05b,d) e SE (Fig. 05e,f) antes (Fig. 05b,e) e após (Fig. 05d,f) o tratamento

termomecânico de ausforming.

140

Fig. 04 – Análises de (a,c) DSC e (b,d) RE nas amostras da chapa da Liga SE (a,b) antes e (c,d) após o tratamento termomecânico de ausforming.

Com base na Fig. 05, verifica-se a ocorrência das seguintes componentes de

textura para as amostras:

− Liga EMF antes do ausforming (Fig. 05a) para B19’: reforços centrais

associados às variantes 1:(11 1 )[2 1 1]B19’ e 4:(11 1 )[ 2 1 1 ]B19’ correspondentes

a {110}<110>B2.

− Liga EMF antes do ausforming (Fig. 05b) para B2: reforço central associado à

componente de textura (110)[110]B2, com DL em <110>.

− Liga EMF após o ausforming (Fig. 05c) para B19’: reforços próximos de

χ = 33º associados às variantes 3:(120)[ 2 11]B19’ e 5:(120)[00 2 ]B19’

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correspondentes a {111}<110>B2.

− Liga EMF após o ausforming (Fig. 05d) para B2: reforços próximos de

χ = 35º associados às componentes de textura {111}<110>B2, com DL em

<110>, em concordância com os resultados encontrados para B19’.

− Liga SE antes do ausforming (Fig. 05e) para B2: reforços próximos de χ = 18º

associados às componentes textura {210}<110>B2 e outros reforços próximos

de χ = 30º associados às componentes textura {211}<110>B2, com DL em

<110>.

− Liga SE após o ausforming (Fig. 05f) para B2: reforços próximos de χ = 35º

associados às componentes de textura {111}<110>B2, com DL em <110>.

142

Fig. 05 – Figuras de pólos (a,c) (11 1 )B19’ e (b,d-f) (110)B2 das chapas das Ligas (a-d) EMF e (e,f) SE (a,b,e) antes e (c,d,f) após o tratamento termomecânico de ausforming.

A Fig. 06 apresenta os valores de dureza (HV média) para as amostras das Ligas

EMF e SE antes e após o tratamento termomecânico de ausforming. Verifica-se um

decréscimo da dureza (HV média) da martensita (Liga EMF – Fig. 06a) e da austenita

(Liga SE – Fig. 06b) após ausforming comparada com a condição como recebida. Este

comportamento deve estar relacionado com as mudanças da textura em B19’ e B2

devido ao tratamento termomecânico de ausforming.

143

Fig. 06 – Valores médios de dureza HV oriundos de 10 medições de microdureza Vickers antes e após o tratamento termomecânico de ausforming. (a) Liga EMF. (b)

Liga SE.

A Fig. 07 apresenta os resultados à Tamb da amostra da Liga EMF relativo ao

espectro de DRX (a,c) e a curva tensão-extensão em tração (b,d), (a,b) antes e (c,d) após

o ausforming. Verifica-se que a amostra possui B19’ e fase-R (Fig. 07b) coexistindo à

Tamb após o tratamento termomecânico de ausforming com subsequente têmpera em

água, justificada pela temperatura de fim da transformação direta próxima da Tamb (Fig.

03c,d). Por outro lado, na condição antes do ausforming a amostra possui somente B19’

(Fig. 07a) em concordância com a temperatura de fim da transformação direta (Fig.

03a,b). Com base no comportamento da condição como recebida (Fig. 07d), a chapa da

Liga EMF após o ausforming (Fig. 07d) apresenta um patamar de tensão, relativo à

reorientação das variantes de B19’, não muito bem definido e com o aumento do nível

de tensão. Este comportamento deve estar associado à presença de fase-R juntamente

com B19’ e ao elevado nível de tensões internas na martensita, evidenciado pelo

decréscimo da área dos picos endotérmicos e exotérmicos nos ensaios de DSC após

ausforming (Fig. 03c). Além disso, há um decréscimo na resistência à tração e um

144

aumento na extensão total para aproximadamente 45% (Fig. 07d), quando comparada

com a condição antes do ausforming, (Fig. 07b).

Fig. 07 – (a,c) DRX e (b,d) ensaio de tração à temperatura ambiente da chapa da Liga EMF (a,b) antes e (c,d) após tratamento termomecânico de ausforming.

A Fig. 08 apresenta os resultados à Tamb da amostra da Liga SE relativos ao

espectro de DRX (a,c) e à curva tensão-extensão em tração (b,d), (a,b) antes e (c,d) após

o ausforming. Verifica-se que a amostra possui B2 à Tamb antes e após o tratamento

termomecânico de ausforming com subsequente têmpera em água, sendo impossível

detetar qualquer presença de fase-R à Tamb como mostram as transformações por DSC

145

(Fig. 04a,c) e RE (Fig. 04b,d). O espectro de DRX (Fig. 08c) não apresenta nenhum

precipitado como o Ni4Ti3, presente na condição antes do ausforming, (Fig. 08a). Com

base no comportamento da condição antes do ausforming (Fig. 08b), a chapa da Liga SE

após o ausforming (Fig. 08d) apresenta um patamar de tensão, relativo à transformação

da martensita induzida por tensão, não muito bem definido e com aumento do nível de

tensão. Este comportamento deve estar associado ao elevado nível de tensões internas

na austenita, evidenciado pelo decréscimo da área dos picos endotérmicos e exotérmicos

nos ensaios de DSC após ausforming (Fig. 04c). Além disso, há um decréscimo na

resistência à tração e um aumento na extensão total para aproximadamente 48% (Fig.

08d).

146

Fig. 08 – (a,c) DRX e (b,d) ensaio de tração à temperatura ambiente da chapa da Liga SE (a,b) antes e (c,d) após tratamento termomecânico de ausforming.

Uma temperatura de laminação a quente vizinha de 500ºC é ainda muito próxima

da temperatura de início da recristalização (350ºC) das ligas de Ni-Ti com EMF e SE

[10], e conjugadamente com percentagens de deformação iguais ou superiores a 30%

(redução da espessura) não irá promover uma completa recristalização da matriz

austenítica. Dessa forma, a densidade de discordâncias após o tratamento de ausforming

é alta e promove a transformação B2→R antecedendo a transformação B2→B19’ e/ou

R→B19’ (Fig. 03c,d e Fig. 04c,d) [10,15-18]. Além disso, ambas as ligas apresentam

um decréscimo nas áreas dos picos endotérmicos e exotérmicos (Fig. 03c e Fig. 04c)

147

quando comparadas com as suas respectivas condições como recebidas (Fig. 03a e

04b) [10,15,18].

Apesar das Ligas EMF e SE apresentarem diferentes componentes de textura em

B2 no estado como recebido ((110)[110]B2 para a Liga EMF – Fig. 05b, e {221}<110>

B2 e {210}<110>B2 para a Liga SE – Fig. 05e) o processamento termomecânico de

ausforming teve como resultado componentes de textura próximas para ambas as ligas,

{111}<110>B2 (Fig. 05d,f).

Devido às limitações experimentais, não foi possível obter figuras de pólos de

B19’ para a Liga SE. Dessa forma não é possível comparar a influência da textura

cristalográfica entre as ligas no que respeita às propriedades mecânicas de B19’ e B2,

mas, como possuem texturas de B2 tão próximas, poderá presumir-se que as ligas

estudadas (Liga EMF e Liga SE) apresentam propriedades mecânicas similares entre

elas quando se encontram quer em domínio martensítico, quer em domínio austenítico.

Dessa forma, ambas as ligas EMF e SE apresentam uma perda na definição do patamar

de tensão devido à reorientação das variantes da martensita (Fig. 07d) e à transformação

martensítica induzida por tensão (Fig. 08d), respectivamente, um aumento na extensão

total e um decréscimo na tensão máxima (mais significativo para a Liga EMF).

Observa-se também um decréscimo da dureza (HV média) de B19’ para a Liga EMF

(Fig. 06a) e de B2 para a Liga SE (Fig. 06b) [15,19,20].

4 Conclusões

O ausforming nas Ligas de NiTi com EMF e SE a aproximadamente 500ºC e com

30% (ou mais) de redução na espessura:

− resulta numa estrutura parcialmente recristalizada;

− induz a transformação direta e reversa em múltiplas etapas (B2↔R;

148

B2↔B19’; R↔B19’);

− promove o desenvolvimento da componente de textura associada a

{111}<110>B2;

− apresenta um decréscimo da definição do patamar associado à reorientação

das variantes de B19’ ou à transformação martensítica induzida por tensão,

bem como um aumento na dutilidade.

5 Agradecimentos

A.S.P, K.K.M e F.M.B.F. agradecem à FCT/MCTES pelo subsídio plurianual ao

CENIMAT. C.M.L.S. e C.S.C.V agradecem à agência Brasileira CNPq (concessão

141664/2002-9).

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