eugenio raúl zaffaroni - crime organizado: uma categorização frustrada
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CRIME, DIREITO E SOCIEDADE ano 1 númer-o 1 1" semestr-e de 1996
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C. M.Nazareth Cerqueira _�._Eugenio Raúl Zaffaroni
""""-'i'!!Ir, I F. Viriato Correa Geraldo Carneiro _'�t Gisálio Cerqueira Filho
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� L- . Gizlene Neder João Luiz Duboc Pinaud
Leonardo Boff Maria Lúcia Karam
Maurício Murad Muniz Sodré
Nilo Batista Plínio Marcos Sergio Verani
Sidney Chalhoub Silviano, S-antiago
'era Ma,Jaguti Batista
Uma publicação do INSTITUTO CARIOCA DE CRIMINOLOGIA
RELUME � DUMARÁ
)
DIREITO
l/Crime Organizado": uma categorização
frustrada EUGENIO RAÚL ZAFFARONI
1. Introdução
o crime organizado constitui denominação aplicada a número incerto de fenômenos delitivos por diversos especialistas, pelos meios de comunicação de massa, pelos autores de ficção, pelos políticos e pelos operadores de agências do sistema penal (especialmente policiais, ainda que também juízes e administradores penitenciários), cada um deles com objetivos próprios.
Para facilitar a compreensão do fenômeno há que se estabelecer distinção básica: é necessário assinalar que não é o mesmo explicar a pretensão de destacar certos fenômenos com o nome de crime organizado - isto é, a explicação da categorização - e a explicação dos fenômenos que se aspira categorizar.
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Ocupar-nos-emos aqui da primeira, porque - como o adiantamos desde o título - cremos tratar-se de tarefa infrutífera, pois a diversidade que aquela categoria pretende abranger continua dispersa e carente de uma análise particularizada, prescindindo de uma falsa classificação que, por não alcançar seus objetivos, obstaculiza a compreensão dos fenômenos no campo científico.
2. Pluralidade de agentes e crime organizado
A pluralidade de agentes tem chamado a atenção de penalistas e criminólogos em todos os tempos e de diferentes maneiras. Assim, no século passado e na Europa, particularmente depois da Comuna de Paris, se produziu uma considerável literatura
acerca do delito multitudinário, dando lugar a várias valorações das multidões (1) e da responsabilidade penai de seus líderes e condutores. (2)
Em temas mais recentes, e por certo vinculados à proibição de sindicalização dos trabalhadores, generalizou-se o conceito jurídico-penal de associação ilícita, de malfeitores ou para delinqüir - tipo hoje comumente encontrado nos códigos penais de tradição européia continental, ainda que existam dúvidas quanto a sua constitucionalidade. Todavia, este conceito pouco tem a ver com a categoria de crime organizado tal como se pretende na atualidade, entre outras coisas porque esta última é produto da tradição norte-americana.
Tampouco se vinculam ao conceito de crime organizado as qualificadoras tradicionais de alguns tipos penais quando são cometidos em bando, quadrilha ou por três ou mais agentes. No caso da pilhagem rural, e, de modo geral, com relação ao brigantismo, também há antiga literatura criminológica(3L assim como nos delitos políticos cometidos por organizações(4L algumas das quais hoje chamaríamos terroristas, como a preocupação dos positivistas com o anarquismo.(5) Entretanto, a mais superficial análise nos revela que todo este campo é alheio ao que hoje se pretende entender como crime organizado.
o organized crime como tentativa de categorização é um fenômeno de nosso século e de pouco vale que os autores se percam em descobrir seus pretensos precedentes históricos,
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mesmo remotos, porque entram em contradição com as próprias premissas classificatórias. É absolutamente inútil buscar o crime organizado na Antiguidade, na Idade Média, na Ásia ou na China, na pirataria etc.(6L porque isso não faz mais que indicar que se há olvidado uma ou mais das características em que se pretende fundar a categoria, como são a estrutura empresarial e, particularmente, o mercado ilícito.
Se nos ativermos a essas duas características - a estrutura empresarial e o mercado ilícito - é claro que quem fala de crime organizado não está se referindo a qualquer pluralidade de agentes nem a qualquer associação ilícita, senão a um fenômeno distinto, que é inconcebível no mundo pré-capitalista, onde não havia empresa nem mercado na forma em que os conhecemos hoje. Remontar-se a essas antigas organizações delitivas não seria mais que mencionar formas anteriores de pluralidade de agentes ou de associações criminais que não são úteis para precisar o pretendido conceito que se busca.
Reconhecer que todas as tentativas de conceitualização partem do fenômeno da pluralidade de agentes, mas que o mesmo, por sua amplitude, não serve para este fim, corresponde mencionar os diferentes caminhos que se tem ensaiado.
3. O panorama das conceitualizações
São muitos os autores que admitem com sinceridade a falta de definição do chamado crime organizado,
atribuindo-na, inclusive, ao domínio de uma concepção "popular". Esses mesmos autores advertem que os criminólogos não chegam a um acordo e que a fronteira entre o organized crime e o white col/ar crime não está clara pela falta de definição do primeiro.(7) No campo político tampouco existe uma definição: o comitê assessor do governo dos Estados Unidos concluiu, em 1976, não existir "uma definição suficientemente abrangente, que satisfaça as necessidades dos indivíduos e grupos muito diferentes que possam usá-Ia como meio para desenvolver um esforço controlador do crime organizado."(8)
No plano legal, a situação não é diferente, pois a Racketeer influenced and corrupt organizations, conhecida com a sigla R ICO, integra o capítulo 96 do Federal Criminal Code and Rules como instrumento legal específico de luta contra o crime organizado nos Estados Unidos, contendo uma larguíssima lista de atividades delitivas, mas nenhuma categorização.(9) Na Alemanha, a situação não é muito diferente, pois assinala-se com sinceridade o enorme déficit de conceitos teóricos e de base empírica. (l O) O Brasil incorporou legalmente o conceito remetendo-o à tradicional associação ilícita(11), que o excede notoriamente, mas que não faz mais que revelar a carência de outro mais adequado.
Desde um âmbito que lhe é estranho, a criminologia recebeu a tarefa de categorizar o crime organizado assinalado por uma referência ao mercado ilícito, pois desde a proibição alcoólica, e mesmo antes, o público
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norte-americano o associou com o mercado ilegal, ou seja, com "Ia prohibición de bienes e servicios prohibidos" ("com a proibição de bens e serviços proibidos/). (12) Este limite pré-científico do suposto conceito não deixa de ser saudável, porque ao menos deixa fora de seu âmbito atividades que, de outro modo, dariam lugar a uma confusão maior, como a inclusão do terrorismo, bandos de ladrões, vândalos urbanos etc.
Não obstante, este limite pré-científico abriu o debate acerca do eixo das tentativas de categorização, e desde então se discute se devem tentá-Ia partindo do tipo de organização ou do tipo de atividade criminal, sustentando outros que o correto é correlacionar ambos os tipos.(13)
Na década passada foram muitos os autores que se ocuparam destas dificuldades. Dentre eles citaremos dois, que fizeram um balanço das tentativas conceituais no plano teórico. Hagan revisou definições do crime organizado compulsando treze autores, tendo observado consenso entre eles nos seguintes pontos: a) importa uma empresa permanente, que opera racionalmente para obter benefícios mediante atividades ilícitas; b) sustenta sua ação mediante violência real ou fícta; c) implica corrupção de funcionários públicos. Acerca de outras características, como monopólio de serviços, códigos secretos e fechamento do grupo, há muito pouco consenso doutrinário.(14) Maltz, por sua vez, não avança muito a respeito do anterior, pois de sua pesquisa resulta apenas a abrangência de multiplicidade de empresas, mas nega a necessi-
dade do envolvimento em negócios ilícitos, a organização sobre paradig
ma mafioso e a sofisticação das mesmas.( 1 5 \ Bymun considera C\ue estes aportes clarificam a questão, ainda qUQ n5:o posso.m mai:; que reconhe
cer a ambigüidade e a falta de consenso que rodeiam o tema.(16)
4. O poder impõe à criminologia uma missão
.. - . -
impossível
o desconcerto dos criminólogos não é gratuito: eles têm de encontrar uma categoria que satisfaça os políticos, a polícia e, sobretudo, a imprensa e, em certa medida, os autores de ficção.
o organized crime não é um conceito criminológico, mas uma tarefa que o poder impôs aos criminólogos. Há autores que reconhecem expressamente a existência de quatro fontes conceituais para o crime organizado: a policial, a criminológica, a dos arrependidos" e a dos economistas (a estas acrescentaríamos a dos políticos, com base em diferentes comissões parlamentares). Mas os criminólogos e os economistas (e os políticos) trabalham sobre as informações proporcionadas por policiais e "arrependidos", de modo que "este monopólio sobre as informações deu à polícia um poder proeminente no desenvolvimento de políticas e estratégias referidas ao crime organizado."(17) As agências policiais não permitem que os cientistas tenham acesso às informações.(18)
"Aparte o sexo e as disputas domésticas, não há tema que promova
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maior entretenimento popular que o crime organizado" como o demons
tram o êxito de Os intocáveis e de O poderoso chefão e o te\e\lisionamen
to das audiências das comissões de investigdl,-dU UU Congresso norteamericano.(19) Tal fato está vinculado ao sentido conspiratório com que se tem interpretado o fenômeno dentro do paradigma mafioso. Ao generalizar-se nos Estados Unidos a idéia
de grande conspiração mafiosa a nível nacional, com organização secreta altamente sofisticada, a mesma passou a exercer no público a fascinação própria de toda conspiração. O atrativo das versões conspiratórias se explica, em parte, porque sempre se produz uma descarga de ansiedade ao saber a quem atribuir a causa do mal, ao mesmo tempo em que se admira a quem pode reter um segredo sem debilidades, porque esta pessoa parece adquirir um enorme poder de domínio.(20) Os tristemente famosos "Protocolos" são uma lamentável prova desta fascinação pública,(21) da qual na literatura dá conta de forma magistral O pêndulo d e Foucault.(22)
Como é natural, tudo o que chama a atenção pública move os políticos a usá-lo no campo do clientelismo e a polícia a lhe dedicar atenção preferencial. Dessa maneira, a polícia termina dando as fontes para a elaboração política e os políticos proporcionam documentos com que trabalha a
polícia.(23) Neste sistema de retro alimentação se incluem várias comissões parlamentares e comitês de investigação do Congresso norte-americano, como a presidida pelo Senador Kefauver em 1951, o comitê
McClillian em 1962 e a comissão de 1967. Os lucros políticos destes empreendimentos não foram menores: Thomas Dewey, por duas vezes nominado pelos republicanos como candidato a presidente dos Estados Unidos, adquiriu fama com a perseguição a Lucky Luciano, enquanto E. Kefauver alcançou tal notoriedade com sua comissão, que quase lhe valeu a nominação a presidente pelos democratas em 1952.(22)
Como está claro, a criminologia teve muito pouco a ver com esta tentativa de conceitualização - como não fosse esta a recepção de uma tarefa encomendada pelo poder. Lamentavelmente não logrou cumpri-Ia, em que pese não lhe faltar boa vontade, porque "o crime organizado e os mercados ilegais têm sido largamente utilizados como fontes de mitos, enquanto a realidade é muito menos atraente."(25)
Os criminólogos não haviam se ocupado muito do tema até este século. Como é lógico, os primeiros trabalhos importantes surgiram com a "escola de Chicago"(26), e Sutherland considerou que o crime organizado crescia em unidade e oposição à sociedade, por efeito da debilidade do estado.(27) Será Cressey, muito mais tarde e, quem se encarregará da versão oficial do organized crime.(28)
Todavia, ainda que a criminologia tenha nascido muito vinculada ao poder e com grande permeabilidade ao mesmo - pelo que sempre se pode dizer que é ciência "suspeita" - neste caso não alcançou fundar a tese oficial conspiratória, porque a sociologia estava demasiado desenvolvida para tolerar
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esse grau de servilismo e parcialidade.
Por fim, seguiram funcionando, por um lado, o uso assistemático do termo pela polícia, pelos políticos, pelos meios de comunicação e pelos autores de ficção; e, por outro, o desconcerto criminológico: mal se podià construir uma categoria com base em uma idéia conspiratória pouco crível.
5. Funcionalidade política da versão cons piratória
A idéia de que o organized crime é uma conspiração nacional nos Estados Unidos - apesar de exercer o sólido atrativo popular de todas as teses conspiratórias e de ser relativamente crível por parte de leigos, como também por ser impulsionada pelos próprios delinqüentes, que desse modo aparecem como mais poderosos e dignos de admiração (especialmente se em momentos de crise se acrescentam alguns atributos de Robin Hood, reinvindicadores ou benfeitores sociais) -cumpriu uma dupla finalidade nos anos de sua consagração no pós-guerra: a) por um lado, sua consagração política naquele tempo (comissão Kefauver em 1951 ), em plena guerra fria, serviu para comparar o organized crime com os estados ou regimes autoritários e totalitários; b) por outro, para atribuir a conspiração antinacional a grupos étnicos externos e com conexões no exterior, ou seja, para colocar o mal em conspiração estrangeira. Se a primeira funcionalidade desapareceu com a circunstância que lhe deu lugar, a segunda se mantém até a atualidade, com algumas variantes quanto aos grupos étnicos envolvidos.
A idéia da conspiração com estrutura totalitária, análoga a do comunismo ou do nazismo - que se manifesta nos informes de Kefauver e continua nas conclusões das conferências de Oyster Bay, convocadas pelo governador de Nova Iorque, Nélson Rockfeller, nos anos sessenta, (29) de onde se destaca o grande poder, a centralização do mesmo, um pequeno grupo diretor e até uma estrutura paramilitar, como o afirma Cressey(30) - era ideal para os tempos de MacCarthy.(31) Deste modo, a crença no controle centralizado dos mercados constitui o coração da doutrina e da política oficial na matéria.(32)
Esta versão tem perdido importância política em nossos dias, mas era acompanhada em seu tempo com a idéia de conspiração estrangeira, da qual era complementar naquele momento: Tanto o comunismo como o crime eram conspirações externas que atentavam contra a democracia e o american way of life. (33) Esta funcionalidade tem a vantagem política de pôr o mal fora dos Estados Unidos, ocupando-se do mesmo como um fenômeno invasor externo à sociedade norte-americana. Tal assertiva, contudo, é quase tão grosseira em termos científicos como útil em termos políticos, pois foram vários os autores que desde o começo apontaram que se devia encarar o crime organizado como um produto norte-americano e não como uma conspiração estrangeira,(34) sendo Be", por exemplo, quem, em 1953, por caminho próximo ao funcionalismo mertoriano, destacou que se devia entendê-lo como uma via inovadora de acesso ao poder por parte de minorias étnicas.(35)
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De alguma maneira, nesta explicação se pode visualizar um paralelo com a profecia auto-realizada dos judeus na Europa: reduziriam-lhes o espaço social primeiro e logo lhes criticariam por fazer a única coisa que o espaço social reduzido lhes permitia, ilO mesmo tempo em que isso reforçaria os argumentos redutores do espaço.(36)
Ainda que a versão oficial - que alguns criminólogos chamam de "ortodoxa" - do organized crime não tenha sustentação fática séria, pois todos destacam até hoje a insuficiência de investigação empírica,(37) a mesma foi objeto de uma versão criminológica por parte de Cressey,(38) considerada a mais coerente em sua linha, em que pese reconhecer que a mesma não traz qualquer dado que a sustente.(39)
Não podemos deixar de observar, de passagem, que a atribuição do organized Crime aos grupos étnicos imigrados aos Estados Unidos combina muito bem com toda a ideologia racista que tinha a política imigratória desse país no período de entre-guerras, que fora elogiada pelo próprio Hitler em Mein Kampf (40) e que ressurge em nossos dias (41) até certo ponto apoiada financeiramente pelas mesmas fundações que sustentaram o racismo daqueles anos. (42)
6. A inconsistência criminológica do paradigma
mafioso
Em criminologia ninguém duvida da existência da máfia ou de máfias nos Estados Unidos, mas sim do que se pode chamar legitimamente de o
paradigma mafioso na abordagem do crime organizado, ou seja: a) da afirmação de que essas organizações têm uma estrutura tão sofisticada, centralizada, hierarquizada, nacional etc. quer dizer, tão fortemente conspiratória, que seja compatível comparálas à bolchevique ou à nacional socialista; b) que respondam a fenômenos externos à sociedade norte-americana e, fundamentalmente, a determinantes culturais ou biológicas de grupos imigrados; e c) que se possa transferir o modelo máfia com essas características a toda criminalidade vinculada ao mercado ilegal de bens ou serviços.
Em realidade, esse paradigma carece de dados sérios de sustentação empírica, (43) por mais que sejam muitos os documentos e autores que falam dos capos e dos capos de todos os capos e que o mesmo tenha sido adotado e difundido pelo comitê Kefauver (1951), pelas conferências de Oyster Bay, pela comissão de Law Enforcement and Administratian af justice de 1967, por J. Edgar Hoover, pela comissão de 1976 etc., (44) e - ainda - por mais que o mesmo seja a descrição do crime organizado que, formada na temporada pósguerra, influi desde então nas atitude públicas daquele país e se introduz como substrato ideológico dos manuais de criminologia. (45) A principal fonte de alimentação deste paradigma são os testemunhos de "arrependidos", tendo havido grande repercussão o prestado por um deles -Joseph Valachi -- perante o comitê McClellan do Senado em 1963 - pois os aportes de dados da comissão Kefauver foram mínimos (46) -- em
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que pese o fato de que muitos autores o criticaram seriamente, em especial porque muito poucas persecuções penais se puseram em funcionamento a partir dos dados proporcionados, enquanto outros observaram que o mesmo era quase coincid.ente com as versões correntes na imprensa e entre os policiais. (47) Em 1969 tratou-se de reforçar este testemunho com registros magnetofônicos tomados clandestinamente nos escritórios de um renomado mafioso (De Cavalcante).(48)
Dados tão escorregadios não podem fundamen�r seriamente um paradigma com o qual se pretende englobar conceitualmente o crime organizado em sua totalidade, se por tal se entende toda a criminalidade vinculada ao mercado ilícito. Posteriores investigações empíricas têm sustentado que o FBI não pode trazer nenhuma prova sobre sua costumeira afirmação de que o jogo proibido seja a principal fonte de apoio político e econômico da máfia, uma vez que tanto no jogo como na usura (atividades típicas da categoria que se projeta) em muito poucas circunstâncias é possível usar a violência para suprimir a competição e que, em geral, a máfia está menos centralmente coordenada do que a lenda e a ideologia popular nos podem fazer crer. (49)
As conclusões de Reuter a este respeito são sumamente importantes, pois para aquele autor a imprensa e a polícia se alimentam reciprocamente de um modo que assegura a sustentação da reputação da máfia. "Desde que o crime organizado é tratado amplamente nos jornais como diver-
são, estes informam sobre os bandos delitivos conhecidos pelos leitores, o que levanta a máfia. As agências penais, compreensivelmente desejosas de chamar a atenção da imprensa sobre suas atividades, são impulsionadas a preferir a máfia a outros bandos menos conhecidos. Deste modo, a proeminência da máfia aumenta." (50) Para este autor, a máfia é a "mão visível" no mercado ilegal, mas considera que também opera a "mão invisível"-- que são os interesses pessoais e a tecnologia que modela os mercados de bens e serviços legais -e freqüentemente existe uma tensão entre as duas mãos nos mercados ilegais. Conclui que nos três mercados investigados em seu trabalho (apostas em cavalos, loteria e usura) não é verdade que sejam monopolizados nem controlados centralmente, com o que sai vitoriosa a "mão invisível", considerando que há argumentos teóricos que permitem supor que ela é típica de toda a criminalidade do mercado ilegal.(51) "Em resumo -acrescenta - a ortodoxia está debilmente fundamentada. Afirmações sobre o domínio dos mercados pela máfia e a importância do poder da máfia não se baseiam em nenhum esforço de verificação sistemáticoacadêmica nem oficial. A literatura acadêmica proporcionou algum sustento isolado ex post, mas nunca se desenvolveu bem a teoria nem esta foi submetida à verificação rigorosa. Os melhores documentos disponíveis levantam sérias dúvidas acerca de toda a ortodoxia."(52)
Além de todo o assinalado, a indescutível funcionalidade política do referido paradigma é muito mais que
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significativa: todos os autores são acordes no sentido de que o crime organizado existia nos Estados Unidos com anterioridade ao V o/stead Act de 1920, ou seja, a 18ª emenda constitucional ou "lei seca", "proibição" ou the noble experiment,(53) mas.não tinha as características e o volume que adquiriu a partir de então.(54) Não podemos olvidar que o paradigma mafioso nasceu com essa experiência e só se consolidou oficialmente no segundo período pós-guerra (durante a chamada "guerrà-fria"). Este paradigma se mantém sem alterações importantes até o presente, e, ainda, até tempos muito recentes, nem sequer havia mudado o estereótipo italiano ou ítalo-americano, alimentado com detalhadas histórias da máfia, de suas famílias e homicídios,(55) distinguindo a máfia siciliana, a camorra napolitana e a h o n o r ata società calabresa - quer dizer, toda a imigração do sul italiano (que é a imigração italiana predominante naquele país),(56) Oll seja, uma das mais numerosas minorias latinas ou não puritanas, pertencentes à cultura da taberna, contra a qual se orientava a propaganda anti-alcoólica do primeiro pós-guerra.(57) Do mesmo modo, toda a luta contra tóxicos dos Estados Unidos sempre esteve vinculada publicamente a algum grupo imigrado em particular.
7. Crime organizado ou desorganizado?
As atividades que, de modo geral, os criminólogos consideram manifestações do crime organizado são a extorsão e outros atentados à liberdade de trabalho pelos sindicatos, to-
das as formas de jogo proibido, a usura, o tráfico de drogas, a corrupção política, o tráfico de escravas brancas e de estrangeiros e, mais recentemente, os delitos eletrônicos.(58)
Temos visto que, com diversas metodologias de campo (observador participante, entrevistas, averiguações etc.), tornou-se manifesto que nos Estados Unidos estas atividades normalmente são organizadas em forma subcultural e local, e não têm a organização rígida ou burocrática que pretende a versão difundida pelos políticos, pela polícia e pelos autores de ficção.(59) Sem embargo, na posição exatamente contrária parece encontrar-se a Câmara de Comércio dos Estados Unidos, que afirma que o organized crime é um poder nacional, que opera impunemente e livre de todo limite constitucional, indagando se não se trata do Fifth State.(60)
Entre estas duas posições antagônicas, em princípio, não parece haver nada em comum, mas, aprofundandose a discussão, há algo que as une por baixo da superfície: a partir da análise detalhada da primeira é possível encontrar a razão da segunda. Com efeito: a segunda reclama contra algo que parece ser uma concorrência desleal ou com vantagem e não se diferencia muito do tom dos protestos do comércio formal contra o informal em muitas cidades latino-americanas.
A classe de atividades que se pretende categorizar como organized crime se vincula ao mercado e, neste sentido, apresentam-se mais claras as aproximações dos economistas ou as criminológicas que apontam ao econômico, do
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que aquelas que se afastam desta dimensão ou a subestimam. Não se deve pensar que essas aproximações se enquadram em teorizações marxistas acerca destes fenômenos - se bem que as tenham havido e que desde sua perspectiva tenham considerado o crime organizado como um aliado do establishment, assegurando a hegemonia social e contribuindo para a manutenção da subordinação proletária.(61) Todavia, a grande maioria das abordagens econômicas do crime .organizado não se enquadra neste marco teórico.
Uma boa parte daqueles enfocam a questão privilegiando a perspectiva econômica consideram-na atividades que implicam continuação das práticas comerciais ilegais do século XIX (os chamados "barões do roubo"), que se infiltram e florescem em indústrias com excessiva competição, penetrando setores pequenos da economia, onde reina a desordem e a instabilidade. O crime organizado trata de neutralizar ou destruir a competição mediante ameaças e corrupção política e com isso traz estabilidade econômica através de um monopólio ou oligopólio que disciplina o mercado, distribuído inclusive territorialmente.( 62)
Deste modo, o crime organizado seria o conjunto de atividades ilícitas que operam no mercado, disciplinando-o quando as atividades legais ou o estado não o fazem. Em termos mais preciosos, sua função econômica seria a de abranger as áreas de capitalismo selvagem que carecem de um mercado disciplinado.
Em uma linha parecida e de certa forma complementar a esta explica-
r
ção, move-se o que poderíamos chamar de paradigma empresarial, próximo ao funcionalismo sociológico. Partindo de que qualquer empresa se organiza para obter benefícios, Smith sustenta a teoria do espectro empresarial, em cujos extremos se encontra�iam as atividades legais e as ilegais, mas as diferenças seriam preferencialmente matéria de grau e não de qualidade. Conclui que qualquer explicação - como a conspiração e a etnicidade - se tem alguma relevância na interpretação do crime organizado, será sempre subordinada à teoria da empresa.(63) Bynum observa, com toda a razão,(64) que este enfoque pode remontar a Merton, que sustenta não ser possível distinguir economicamente entre o crime organizado e a corrupção política e os negócios ilícitos.(65)
Em definitivo, seja porque no mercado existem áreas não disciplinadas ou porque estas se criam em razão de que a proibição interfere no mesmo elevando desmesuradamente a renda, o certo é que se abrem espaços que, como em todo o mercado, são ocupados empresarialmente por uma atividade que se apresenta em forma de espectro - como bem a descreve Smith - em cujos extremos estão o lícito e o delitivo, mas que aparecem tão confundidos e dispersos que se torna muito difícil distinguir as matizes ou graus que se inclinam para um ou outro extremo. Por isso, restam milhares de perguntas sem resposta: até que ponto do circuito de capitais o dinheiro é negro ou desde que ponto começa a ser branco? Uma empresa lícita que ocasionalmente laya dinheiro pratica crime organiza-
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do? O suborno continuado, que favorece uma empresa em uma atividade ou indústria lícita, é crime organizado? É crime organizado a atividade de uma indústria lícita que emprega massivamente imigrantes clandestinos para pagar salário menor? O seria se os emprega em menor quantida·de ou porcentagem do total de seu pessoal? Um bando de seqüestradores é crime organizado? Um banco que ocasionalmente toma dinheiro sem preocupar-se com sua origem o constitui?
Em síntese, tem-se a sensação, ao menos do ângulo econômico, de que, o crime organizado é um fenômeno de mercado desorganizado ou não disciplinado, que se abre à disciplina produzida pela atividade empresarial lícita ou menos lícita. É óbvio que estas aberturas ou furos na disciplina do mercado são muito diferentes, instáveis e variáveis, pois como todo mercado é dinâmico, existem espaços que se obstruem e outros que se abrem. Daí que a conceitualização resulte impossível e as tentativas se vejam frustradas e que, ademais, os espaços mesmos não possam suprimirse, porque implicaria parar a dinâmica do mercado, ou seja, fazê-lo desaparecer.
Sem dúvida existem máfias e bandos, há atividades lícitas e ilícitas, mas não há um conceito que possa abranger todo o conjunto de atividades ilícitas que podem aproveitar a indisciplina do mercado e que, no geral, aparecem mescladas ou confundidas de forma indissolúvel com atividades lícitas.
Logo, a categorização que se v.em
tentando não pode se coroar, pois constitui a pretensão de prender em um conceito criminológico a dinâmica do mercado. A empresa resulta tanto mais inalcançável quando se pretende buscar uma categoria que se transfira à lei penal.
Por tudo isso, há um conjunto de atividades e fenômenos econômicos, dentre os quais alguns são incontestavelmente criminais, mas não há uma categoria capaz de abrangê-los no campo criminológico e menos ainda no legal.
É natural que a questão se tenha estabelecido nos Estados Unidos de forma prioritária, surgindo no período de entre guerras, e que as tendências políticas tenham tentado sua categorização no segundo pós-guerra. Explica-se porque a guerra de 1914-18 teve conseqüências que os políticos europeus nunca haviam imaginado. Acreditaram empreender uma guerra relativamente breve, mas não previram que a tecnologia os levava a uma contenda em que o vencedor seria o que durante mais tempo pudesse esgotar seu potencial industrial.(66) Daí que, na Europa, praticamente os que ganharam, ganharam pouco, ficando tão destruídos como os vencidos, enquanto os Estados Unidos alcançaram posição privilegiada, atraindo uma massa enorme de capital e de imigração que não via perspectivas imediatas e seguras em uma Europa destruída por uma guerra com conseqüências jamais imaginadas. Esse foi o espaço que permitiu aos Estados Unidos implementar uma política imigratória racista em meio a uma verdadeira festa de concentração de capitais e es-
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peculação, que terminou com a grande recessão de 1929.(67) A desordem desse mercado e sua interferência com a 18ª emenda ("lei seca") proporcionaram as condições ideais para a penetração de atividades ilegais mescladas com as legais e, como .é habitual naquele país, surgiram políticos que viram aberta a via ao clientelismo, ganhando fama com suas famosas "guerras" através do sistema penal, como também corporações policiais que adotaram seus lemas e seus discursos, e criminólogos que se deixaram levar por uma opinião pública imbuída do estereótipo mafioso e, também, com certo narcisismo, próprio de quem se sente possuidor do saber - chave para a solução de todos os problemas que acarretam a indisciplina do maior mercado do planeta.
Passada a depressão e o New Oeal, restando os Estados Unidos depois da segunda guerra como o país mais poderoso do mundo, as atividades ilícitas no mercado haviam adquirido características e volume diferentes, adequados à nova situação econômica, enquanto os políticos seguiam ganhando clientela com os mesmos métodos, e, por fim, o fenômeno permitiu a ascensão de alguns do mesmo modo que a guerra fria brindou MacCarthy com a oportunidade de ter em xeque a administração de Truman e a primeira de Eisenhower.
8. A extensão de uma categoria frustrada
A categoria frustrada do organized crime, associada ao estereótipo mafioso, se estendeu pelo mundo muito
antes dos tempos atuais. Ante qualquer manifestação mais ou menos grave de organização criminosa, especialmente quando envolvendo estrangeiros, surgia a categoria frustrada nas atitudes mais insólitas. A reforma penal aprovada pelo senado argentino em 1933 respondia à mesma, até o ponto de implantar a pena de morte por eletrocução.(68)
Sem embargo, não se pode negar que a exportação massiva desta categoria desde os Estados Unidos tem lugar em tempos muito mais recentes e por efeito da chamada global ização do mercado. Qualquer que seja a opinião que se tenha acerca da natureza, alcance e perspectivas deste fenômeno, não se pode negar que a circulação de bens e serviços através das fronteiras tem adquirido uma flexibilidade nunca conhecida, favorecida de forma extraordinária pela queda do chamado "socialismo real", tecnologia, mercados regionais, surgimento dos novos países industrializados no extremo oriente e indiscutível presença do Japão como potência mundial.
Ao se globalizar desta maneira, o mercado mundial não se limitou apenas a exportar seus âmbitos de indisciplina, mas possibilitou novos e nunca imaginados espaços de indisciplina, prontamente aproveitados pela atividade empresarial, legal ou ilegal. É claro que se tem gerado verdadeiras economias complementares parcialmente ilícitas, como o caso da cocaína, mas, em geral, pode-se afirmar que, dado o volume da atividade ilegal mesclada com a legal, nos encontramos ante uma nova forma de
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acumulação de capital, antes desconhecida: o dinheiro sujo proveniente de negócios ilícitos e evasões fiscais, o tráfico de bens e serviços proibidos, a especulação financeira etc. Parece que a economia cresce sem bens, ao menos em seu aspecto tradicional.
Ante a desordem que provoca a globalização e que é própria do mercado - somada a das interferências proibitivas e às características que assume na periferia do poder mundial, onde impera uma corrupção maior ou mais manifesta - era natural que se exportasse também a tecnologia de controle ou que, ao menos, se tentasse fazê-lo. Trata-se de uma lei que se repete: quando se transfere um problema social, segue-se a transferência da ideologia de controle. O transplante em massa de população, especialmente do sul da Europa, ao cone sul da América,(69) entre 1880-1914, com a transferência do anarquismo, do socialismo e dos protestos por reivindicações sociais, fez com que o positivismo criminológico racista europeu (70) e particularmente italiano (71) chegasse rapidamente, chamado pelas elites governantes que o assumiram como próprio.(72)
Os operadores políticos da periferia do poder não encontram qualquer inconveniente em assumir hoje como próprio o discurso do organized crime, entre outras coisas porque o consideram inócuo para limitar seu poder arbitrário, fundam esta crença em: a) que resulta tão deslocado de seu contexto genético, que sua incapacidade controladora é notória até para os menos avisados; b) que confiam, com razão, na forma com que con-
trolam todo o poder e em sua limitada capacidade para prostituir qualquer instituição e na de seus escribas para racionalizá-Ia, e c) em não menor medida, na ignorância própria do problema, que para os operadores políticos periféricos sempre é secundário e somente merece atenção quando urge implantar alguma manobra clientelista e neutralizar algum problema desacreditador.
Deste modo, o discurso abrangente da categoria frustrada do organized crime se estende pelo mundo, é recolhido pelos políticos de todas as latitudes, se traduz em leis penais, é difundido pelos meios de massa, dá lugar a novos estereótipos etc.
9. Uma política criminal intervencionista em uma
economia de mercado
o discurso que incorpora o organized crime não é tão inofensivo como pode crer a maioria dos operadores políticos dos países periféricos do poder mundial, ao menos quanto a suas conseqüências econômicas. Seria demasiado simplista crer em sua total ineficácia com respeito a suas funções manifestas, uma vez que lhe restam funções latentes, nas quais não se parece reparar-se seriamente, pois se limita à discussão das primeiras.
Em princípio, trata-se de uma categoria frustrada, ou seja, de uma tentativa de categorização que acaba em uma noção difusa. Quando este é o marco de intervenção punitiva, à arbitrariedade seletiva de qualquer destas intervenções se agrega uma cota suplementar.
Nestas condições, as proibições in-
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terferem no mercado, gerando um crescimento desmesurado da renda do proibido (serviços ou bens), o que se traduz em raro protecionismo, pois trata-se de protecionismo baseado nos critérios da seletividade penal, e não nos de seletividade econômica. Do ponto de vista econômico ess'e protecionismo é completamente irracional e sua arbitrariedade pode ser totalmente disfuncional.
Por outro lado, a intervenção punitiva sempre é arbitrária. (seletiva) mas, como o legal e o ilegal aparecem mesclados de forma indivisível, uma noção nebulosa como idéia fundamentai da intervenção não faz mais que somar maior arbitrariedade à eleição intervencionista penal, o que se traduz em uma cota de insegurança para a inversão em atividades legais, que, de alguma maneira, se manifesta em forma de abstenção (não inversão ante a perspectiva de insegurança) ou em exigência de uma renda desproporcional com a magnitude do investimento, como preço da insegurança.
A seletividade punitiva não é de todo arbitrária, pois em geral se orienta pelos padrões de vulnerabilidade dos candidatos à criminalização, que neste caso são as empresas mais débeis, presas mais fáceis da extorsão. Com isso, o sistema penal, mais corrupto na periferia, se intromete no mercado como monopolizador da atividade mafiosa extorsiva do empr'esariado mais vulnerável por sua debilidade, que, ao passar do tempo, ante a dificuldade de competir frente às grandes corporações e ao custo agregado da proteção extorsiva, termina
por ser excluído do mercado. Desta maneira, o sistema penal se converte num fator de concentração econômica, que não necessariamente importa a exclusão das atividades ilegais do mercado, senão somente sua concentração junto às atividades legais.
Tudo isso seja dito sem contar que, junto com a competição entre grandes corporações, o sistema penal também pode ser usado -- e normalmente o é -- como fator que interfere nas disputas do poder hegemônico, subtraindo proteção àquele que é derrotado na pendenga: os raros casos em que o sistema penal cai sobre alguém invulnerável se devem a que este perdeu sua invulnerabilidade em uma luta hegemônica com outro competidor de quase igual poder.
Em síntese, e contra o que usualmente se pode crer, a intervenção punitiva no mercado é um fenômeno que se introduz em todos os mutantes e instáveis buracos de indisciplina que este vai abrindo, sem uma categoria reitora e sem que possa deixar de interferir também nas atividades legais. Termina sendo um conjunto de medidas de protecionismo irracional ou arbitrariamente selecionado, que com demasiada freqüência aumenta as próprias atividades ilícitas, a corrupção (particularmente nos países periféricos), destrói a competividade do empresariado mais débil e o elimina do mercado, podendo tomar partido como elemento decisivo nas disputas entre os mais fortes. Poucos intervencionismos podem ser mais negativos para uma economia de mercado.
Este suposto remédio de atividade
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que atentam contra a competição se traduz em uma das maiores ameaças que pode ter o mercado, muito mais irracional e destrutiva que as medidas protecionistas inconsultas e erradas que, ao menos, são discutíveis em termos econômicos, enquanto as intervenções penais, por regra >geral, ocultam seu caráter econômico por baixo de um discurso de absolutismo ético. (73)
10 . A criminalização mediante uma categoria frustrada: o
direito penal autoritário
o transporte de uma categoria frustrada ao campo da lei penal não é mais que uma criminalização que apeIa a uma idéia difusa, indefinida, carente de limites certos e, por fim, uma lesão ao princípio da legalidade -
isto é, à primeira e fundamental característica do direito penal l iberal ou de garantias.
Ainda que desde a lógica científica o fracasso da categorização devesse determinar que a mesma não passasse de uma tentativa no campo criminológico, a lógica política opera de outra maneira e, por fim, o crime organizado fez sua entrada na legislação penal, com a previsível conseqüência de introdução de elementos de direito penal autoritários. O conceito fracassado em criminologia foi levado à legislação para permitir medidas penais e processuais penais extraordinárias e incompatíveis com as garantias liberais.
Não é nossa intenção resenhar aqui o tortuoso caminho da legislação penal e processual criada com
base nesta categorização fracassada no campo científico e exitosa no político. Nos limitaremos a assinalar as principais conseqüências que comumente se associam a seu uso nas diversas legislações que a têm adotado ou nos projetos legislativos que postulam sua adoção, tanto no penal como no processual.
A. Em matéria penal
(a) A impunidade de agentes encobertos e dos chamados "arrependidos" constitui uma séria lesão à eticidade do estado, ou seja, ao princípio que forma parte essencial do estado de direito: o estado não pode se valer de meios imorais para evitar a impunidade.
Não se deve confundir a ação estatal, tendente a descobrir e condenar um culpado, com a que este deve empregar para salvar uma vida humana ou outro bem jurídico importante que está sendo agredido ou que se encontre em perigo iminente de agressão. Neste último caso nos deparamos com uma medida policial e não penal (74) e os bens jurídicos que entram em colisão são a vida ou a integridade física ou a liberdade de uma pessoa inocente e a administração da justiça, devendo sempre inclinarse pela primeira em razão da conhecida ponderação de bens jurídicos (ou ponderação de males) do estado de necessidade. E'sta ameaça concreta que dá lugar à medida policial não tem nada a ver com a lesão já sofrida, ou com o perigo de uma nova lesão no caso em que o autor ou outro realize uma nova conduta análoga. Esta é a diferença substancial entre a
59
coação penal e a policial, que comumente se passa por alto na hora de racionalizar o uso de meios imorais por parte do estado ou do sistema penal.
Confundindo ambas situações, Q
estado autoriza o cometimento de delitos a seus funcionários -- às vezes com um âmbito ou extensão ainda mais inadmissíveis ou escandalosos -, o que dá lugar a situações ambíguas em que é possível que permaneçam encobertos casos de corrup'ção invocando o estado de necessidade etc.
Quanto ao chamado "arrependido", nada tem a ver com a tradicional desistência voluntária. Esta clássica ' ''ponte de ouro" -- como a chama von Liszt (75) -- tem lugar antes da consumação, enquanto o "arrependido" realiza uma ação posterior à mesma. Por outro lado -- e isto é mais determinante -- o que desiste deve ser um verdadeiro arrependido, pois sua desistência deve ser completamente voluntária e livre, enquanto este falso "arrependido" não é mais que um deliqüente que negocia um benefício em troca de informação, ou seja, é um delator. O estado está se valendo da cooperação de um delinquente, comprada ao preço de sua impunidade para "fazer justiça", o que o direito penal liberal repugna desde os tempos de Beccaria (76).
Nada há em termos de direito penai ordinário e conforme os princípios que regem a quantificação da pena que permita mitigar a pena de um deliqüente por sua delação induzida com um benefício, o que tampouco significa um melhor prognóstico de
conduta da pessoa. Desde o ponto de vista ético, a delação não é um elemento que melhore o juízo sobre um comportamento anterior e, em geral, degrada ainda mais a pessoa.
( b ) O sistema de penas fixas (mandatory sentencing) do direito norte-americano recente ou as penas mínimas elevadas do direito escrito de tradição continental européia -normalmente invocados no combate ao crime organizado -- lesionam os princípios de racionalidade, proporcionalidade e humanidade das penas, ao tempo em que pretendem reduzir os juízes ao simples papel de máquinas computadoras que carecem de qualquer capacidade valorativa.
O sistema de penas fixas desapareceu no século passado, depois de ter estabelecido códigos como o revolucionário francês (77) e o imperial brasileiro, (78) mas ressurge no final deste século, seja por causa das regras de penas fixas norte-americanas, tachadas de inconstitucionais por vários juízes federais norte-americanos, (79) seja por causa das penas mínimas altíssimas em algumas legislações latino-americanas, que todavia ninguém se atreveu a tachar de i n constitucionais. (80)
Não menos violadoras da mais elementar racionalidade são as penas máximas absurdas, que ultrapassam os quarenta e cinco anos de prisão. A estas realmente falta seriedade, porque é inaceitável que os cárceres se convertam em asilos de anciãos com o corrrer dos anos. Somente nos Estados Unidos - de onde se ensaia uma política penal que �e encontra
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em vias de uma catástrofe total e se ufanam em ter um milhão e meio de presos, (8 1 ) se pode crer em semelhante absurdo: no resto do mundo sabemos que dentro de quarenta ou cinqüenta anos os governos terão outras preocupações mais importantes e os cárceres quiçá tenham sido superados por outra tecnologia de controle mais barata, ainda que por isso não menos perigosa.(82)
Tão perigoso quanto a anterior é apelar ao usual "embuste das etiquetas" e trocar de nome as penas, chamando-as "medidas de segurança" ou outro nome qualquer: não se trata de voltar ao velho estratagema consistente em violar todos os limites do direito penal liberal por via do velho recurso de chamar a pena de outro modo, permitindo assim a aplicação retroativa, a desproporção, a irracionalidade, a crueldade etc., como freqüentemente se intenta nestas leis e projetos.
(c) Há muitas maneiras de violar a legalidade sem abandonar as tradicionais formas de fazê-lo no direito penai de tradição européia continental. Em não conformidade com este, porém a exportação da nebuloda idéia de organized crime tem querido trazer a nossas legislações uma das mais conhecidas, criticadas e formas claras de violá-lo que conhece o direito penai anglo-saxão: o conceito de conspiracy. (83) Ao invés do cientificamente correto, ou seja, adotar as instituições de outra tradição que sirvam para melhorar a nossa, se adotam das que são suscetíveis de piorá-Ia.
Conspiracy é um dos conceitos mais difusos e discutíveis do direito
penal anglo-saxão. Os historiadores do direito inglês precisam que nasceu há séculos como delito independente para falsas acusações e que logo se foi estendendo a todos os delitos, à medida que se estendia a rule of law ou legalidade. Em outras palavras: à medida que se reduzia a faculdade dos tribunais para criar novos delitos, por império da legalidade, a conspiracy ia se estendendo, como recurso judicial para violá-Ia.
Com efeito: fixados claramente alguns delitos pelo common law e criados outros pelo statute law (por leis do parlamento), sem que as cortes pudessem ampliar o catálogo de uns nem de outros, estas apelaram a um suposto tipo penal difuso, no qual se pode arbitrariamente introduzir qualquer ação imaginável e que definem de modo original: agreement to do an unlawful act or a lawfu l act b y unlawful means. (84) Para completar o panorama de incerteza, importa esclarecer que a palavra unlawful não se entende somente como o ilícito, mas também como o "imoral".
Não tem nada a ver com associação ilícita do direito continental, porque basta que haja uma proposição dirigida a uma pessoa, ainda que não a admita; porque é suficiente que se proponha um só delito em particular; e porque o meio pode ser lawful. Não é raro que esta curiosa fórmula tenha sido utilizada para perseguir o sindicalismo e certas forças políticas e que sua história não seja nada elogiosa quanto ao serviço que prestou às liberdades públicas.(8S)
Além da introdução da conspiracy,
61
não é menos grave a tendência geral a criminalizar atos preparatórios atípicos desde o ângulo das tradicionais fórmulas da tentativa.
B . Em matéria processual penal
( a ) Em quase todas as leis que se amparam na idéia de organized crime ampliam-se as faculdades preventivas da polícia, com a qual sofre um sério detrimento o princípio de judicialidade, constituindo uma das formas mais idôneas para estender rapidamente o uso da tortura e as oportunidades de corrupção.
( b ) Ao mesmo tempo, tende-se a limitar o direito de defesa em várias formas, sendo uma das mais usuais o segredo do procedimento, estendido indeterminadamente, a incomunicabilidade do acusado, a proibição ou dificuldade para comunicar-se com seu defensor, o segredo acerca da identidade dos juízes, fiscais, testemunhas etc.
(c) O caráter conspiratório que se atribui ao crime organizado leva quase sempre a restringir o princípio da publicidade do processo.
( d ) Com generosidade se autoriza a interceptar correspondências, chamadas (telefônicas) e outras comunicações, de forma que afeta seriamente a reserva e a privacidade.
( e ) Sem sombra de dúvida, todas vêm acompanhadas de limitações à excarceração, de modo que se inverte a presunção de inocência.
(f) Admite-se provas de duvidosa
procedência e, dentre elas, a manifestada pelos famosos agentes encobertos e os delatores, o que não se resolve com a pretensão de que devem vir acompanhadas de provas objetivas. Em nosso direito os delatores não são testemunhas, de modo que podem falsear os fatos à vontade.
(g) Na expansão pelo mundo do conceito difuso de crime organizado, não é raro vê-lo acompanhado de regras que estabelecem competências especiais, às vezes comissões especiais de muito duvidoso caráter judicial, violações ao princípio do juiz natural etc.
Em geral, pode-se afirmar que o transporte à lei de uma categoria criminológica frustrada, que trataram de inventar os criminólogos norte-americanos por pressão dos políticos, das corporações policiais e dos meios de massa, não tem outro efeito que lesionar de forma plural a legalidade no direito penal e o acusatório no direito processual penal, o que é explicável, posto que em realidade constituem as duas faces do direito penal liberal.(86} O direito penal autoritário ou antiliberal tem fixado suas características desde há muitos séculos, especialmente através das obras fundacionais como o manual de inquisidores,(87) e é o mesmo que voltamos a encontrar cada vez que, em casos como o presente, se quebra o direito penal liberal.
Sempre que se produzem estes fenômenos na história, o fazem como marca de uma guerra contra um inimigo cósmico ou quase cósmico, em que se personifica o próprio mal. Os
62
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pol íticos norte-americanos são muito propensos ao clientelismo político por este meio, de modo que não é a primeira vez que se empreende uma guerra contra um problema social ou de natureza econômica pela via penai -- e por desgraça, tampoucq será a última -- com o sabido resultado de que perderam todos essas guerras (88) e puseram em perigo as instituições democráticas, sem contar com o triste e negativo exemplo que proporcionam essas fábulas ao mundo, dada a capacidade reprodutora do que se faz naquele país.
1 1 . Conclusões
( a ) Não há duvida acerca da existência de associações ilícitas, sociedades para delinqüir, quadrilhas ou bandos.
( b ) Em toda a economia de mercado aparecem e desaparecem setores indisciplinados, como resultado da sua própria dinâmica, que são ocupados por empresas, do mesmo modo que os setores disciplinados, mas estas empresas muito poucas vezes são associações ilícitas, posto que na generalidade dos casos combinam atividades lícitas e il ícitas em diferente medida.
(c ) Fora dos casos de verdadeiras associações ilícitas, não há um limite claro e nem sequer aproximado que permita distinguir, entre uma empresa "legal" e outra "ilegal", porque sempre combinam atividades, sendo inclusive muito raro que uma empresa "lícita" não incorra em alguma atividade ilegal. A tentativa de categorizar a atividade ilícita como "crime or-
ganizado" fracassou no plano científico, pois tudo o que se pode provar é a existência de um fenômeno de mercado.
(d ) O "mito mafioso" estendido a todas as atividades ilegais do mercado é uma teoria conspiratória cientif icamente falsa, sustentada pelos meios de comunicação, pela ficção, pelo clientelismo político e pelas polícias, que a criminologia se esforçou em elaborar, mas não pode fazê-lo, em que pese ser do agrado de muitos criminólogos.
(e) A pretensão de levar o "mito mafioso" à lei penal implica uma interferência totalmente arbitrária na economia de mercado que pode conduzir a efeitos econômicos catastróficos: concentração econômica, eliminação da pequena e média empresa, corrupção nas corporações por concentração da atividade ilegal, protecionismo despropositado, alterações irracionais de alguns bens e serviços com conseguinte aumento da atividade ilegal em razão da absurda rentabi li·dade.
( f) No plano jurídico penal, esta intervenção punitiva com base em um conceito falso e ilimitado implica retrocesso muito grave do direito penai liberal e o conseqüente restabelecimento do direito penal autoritário (inquisitorial), lesionando as garantias constitucionais e internacionais e aumentando a corrupção das agências do sistema penal.
Notas (*) ( tradução de Rogério Marco l in i )
63
( 1 ) V. por exemplo as d iferentes valorações
das mult idões por autores como H. Ta ine,
Les origines de la France contemporaine, La
Revolution, tomo I , Paris, 1 8 78; G . Tarde.
Essais et mé/anges sociologiques, Lyon-Paris,
1 900; Scipio S ighele, I delitti de lia folia,
Torino, 1 9 1 0; G. Le Bon, Psychologie des
foules, Paris, 1 895 . Sobre esta época em ge
rai, Jaap van G inneken, Folia, psicologia e
politica, Roma, 1 99 1 .
( 2 ) Em geral, quase todos os autores da época
buscam a pena para o l íder, em quem bus
cam encontrar s i n a i s degenerat ivos . Por
exemplo, C Lombroso - R . Laschi, Le crime
politique et les revolutions pour rapport a u
droi!, à I'anthropologie criminelle et à la
science du gouvernement, Paris, 1 892, es
pecia lmente o tomo 1 1 ; Pascual Rossi, L os
sugestionadores y la muchedumbre, Barce
lona, 1 906; a pr imeira edição de La folia
delinquente de Sighe/e, Torino, 1 89 1 .
(3 ) Em castelhano se pode recordar o trabalho
pioneiro de Constancio Bernaldo de Quiróz
na Espanha, logo estendido ao México; em
português, Chrysol ito Chaves de Gusmão,
O banditismo e associações para delinqüir,
Rio de Janei ro, 1 9 1 4 .
(4) Menciona-se toda a classe de organizações,
i n c l u i n d o a s p o l í t i c a s e, d e n t r e e l a s ,
f re q ü e n t e m e n te s e faz refe r ê n c i a a o s
carbonários. Sobre esses: Indro Montanel J i ,
L '/talia giacobina e carbonaria ( 1 789- 1 83 1 ),
Rizzol i , Mi lano, 1 9 78.
( 5 ) P o r ex., C. Lom broso, Gli anarchici, To rino,
1 894 .
(6 ) Por ex . August Bequai, Organized Crime, The
Fifth State, Lexington Books, 1 979, p. 9.
(7) Timothy S . Bynum, Controversies in the Study
of Organized Crime, em "Organized Crime
in America: Concepts and Controversies" ,
edi ted b y T.S.Bynum, New York, 1 98 7, p . 4 .
( 8 ) National Advisory Committes on Crime
justice Standards and Coais, Report on the
Task Force on Organized Crime, Washing
ton, 1 9 76.
(9 ) 7 993 Edition, Federal Criminal Code a n d Rules,
as amended to February 7, 1 993, St. Paul,
M inn., West Publishing Co., p. 665.
( 1 0) C f. Mar ion Bo gel , Strukturen und
Systemanalise der organisierten Kriminalitat
in Deutschland, Berl in, 1 994.
( 1 1 ) Ass im, a Lei nO 9.034, de 3 de maio de 1 995,
"dispõe sobre a ut i l ização de meios opera
c iona is para a p revenção e repressão de
ações praticadas por organizações cr imino-
sas",
( 1 2 ) Pe te r Reuter , Disorgan ized Crime. Th e
Economics of the Visible Hand, The MIT
Press, 1 983 .
( 1 3 ) Michael Maltz. Toward Defining Organized
Crime, em "The Politics anel the Economics
of Organized Crime" edi led by H. Alexander
and C. Caiden, Lexington Books, 1 985, p. 2 1 .
( 1 4) F r a n k H a g a n . T h e O r g a n i z e d C r i m e
conti uum : A Further Specification o f a New
Conceptua l Model, em "Cr imina l J usl ice
Review", 1 983.
( 1 5 ) Ma ltz, op. c i t . , p . 7.
( 1 6) Bynum, op. cit., p .7 .
( 1 7 ) Bequai , op. cit . , p .2 .
( 1 8) Reuter, op. c i t . , p . 8.
( 1 9) I dem, p.9.
64
(20) Cf . J e a n C h e v a l i e r - A l a i n C e e r b r a n t,
Dizionario dei Simboli, B ib . Univ. R izzo li,
1 986, t. ii, p . 3 5 4.
(2 1 ) V. Norman Cohn, EI mito de la conspiración
mundial. Los Protocolos de los Sabios de
Sión, Madrid, 1 98 3 : Ceorge L. Mosse, 1I
razzismo in E u ropa, Da lle o rigine a li
Olocausto, Laterza, 1 992, p. 1 2 7.
( 2 2 ) U m ber lo Eco, 1 1 p e n d o l o di F o u c a u /t,
Bompiani , Mi lano, 1 988.
(23) Reuter, op. c i t . , p .8 .
(24 ) I dem, p. 7 .
(25) Idem, p . 5 .
(26 ) O trabalho de campo com os d iários de John
Landesco, Organized Crime in Chicago,
1 92 9 (reimpresso pela Ch icago Univers i ty
Press em 1 968 ) se inscreve na pr imeira tra
d ição desta classe de trabalhos da escola
de Ch icago. Sobre ela em geral, Mart ins
Bulmer, The Chicago School o f Sociology,
Institutionalization, Diversity, and the Rise Df
Sociological Research, The U niversity Df Chi
cago Press, 1 984, especia lmente pp. 1 0 1 -
1 02 . Uma seleção d e le i turas que inc luem
textos da época de diferentes tendências em
Cus Tyler, Organized Crime in America, A
Book o f R e a dings, T h e U n i v e r s i t y o f
Michigan Press, 1 962 .
( 2 7) Edwim H . S u th e r l a n d , Cri m i n o l o g y,
Lippincott Co., 1 9 78, p. 2 70.
( 28 ) Donald R. Creessey, Theft Df the Nation: The
Structure and Operations of Organized Cri
me in America, New York, 1 969.
( 29 ) Cf. Bequa i , op. c i t., p . 3 .
(30) Cressey, op. c i t . , p . 3 1 4.
(3 1 ) V. R i ch a rd H . Rovere , EI Senador joe
N/acCarthy, FCE, México, 1 98 7.
( 3 2 ) Cf. Reu ter, op. ci t., p .9 .
(33 ) Cf. Bynum, op. cit., p. 7 .
(34 ) Cf . Reu ter, op. ci t., p .3 .
( 3 5 ) Dan ie l Bel l , Cr ime as an American Way of
L ife, em "Antioch Review", j unho de 1 95 3 .
( 3 6 ) Esta profecia auto-real izada é i l ustrada mui
to documentada mente pela clássica obra de
León Pol iakov, Historia dei antisemitismo,
Raices, Buenos Aires, 1 989 .
( 3 7 ) Mar ion Bogel reconhece o mesmo para a
Alemanha em op. c i t .
(38) Cressey, op. c i l .
(39) Cf . Reuter, op. ci t., p . 9 .
(40 ) Adolf H i tler, N/ i lucha, Santiago do Chi le, de
zembro de 1 939, p. 1 26 : "Allis se niegan a
aceptar la inmigración de elementos nocivos
desde el punto de vista de la salud social y
prohiben en absoluto la naturalización de
ciertas y determinadas razas, dando asi a/gunos
tímidos pasos en dirección a un modo de con
templar las cosas que se parece muchisimo ai
concepto dei Estado Nacional."
( 4 1 ) Nos refer imos ao best-se l ler de Richard J .
Herrnstein e Charl es M urray, The Bell Cur
ve, I n telligence a n d Class Structure in
American Life, New York, 1 994.
(42) V. John Sedowick, Ins ide the Pioneer Fund;
Adam Mi l ler, Professors of H ate; ambos em
"The B e l l C u rve D e b a t e . H i s t o ry,
Documents, Opin ions", ed i ted by Russel l
J a coby and N a o m i G l a u berman , T i m e s
Books, 1 995, p p . 1 44 Y 1 62 .
65
(43 ) Bequai, op. c i t ., p. 7 .
(44) V. Francis lann i - E l izabeth Reuss lann i, A
Family Business: Kinship and Social Control
in Orga nized Crime, N e w York , 1 9 7 2 ;
P r e s i d e n t ' s C o m m i s s i o n o n L a w
Enforcement a n Admin istration o f J ustice,
The Challenge of Crime in a Free Society:
Washington, 1 967 .
( 45 ) Cf. John Gall iher-James Cain, Citation Support
for the Mafia Myth in Criminology textbooks,
em "American Sociologist", 1 9 74.
(46) Jay Albanese, Organized Crime in A merica,
Cincinnat i , 1 98 5 .
( 47 ) Cf. Bynum, o p . cit . , p . 6 ; Reuter, o p . cit ., p .9 .
(48) Cf. Bequai, op . cit . , p .4 .
(49) Cr. Reu ter, op. ci t., p . 3-4.
(50) I dem, p . 4.
( 5 1 ) I dem, p . 7.
(52) Idem, p . 1 0 .
( 53 ) Sobre este período, B i l l Severn, The End of
the Roaring Twenties, Prohibition and Repeal,
New York, 1 969 .
(54 ) Cf . Bequai, op. c i t . , p . 34 .
(55 ) Por ex . a h istór ia relatada por Bequa i , op .
cit., p. 1 2 .
( 56 ) V. Ercole Sori, Las causas económicas de la
emigración i ta l iana entre los s ig los X IX y XX,
em Devoto-Rosoli, "La i n migración I ta l iana
en la Argentina", Buenos Aires, 1 985, p . 1 5 .
( 57 ) Cf. J oseph R. G u sfield, EI paso moral : el pro
cesso s im ból ico en las designaciones púb l i-
cas de la desviación, em " Est igmatización y
conducta desviada", compilação de Rosa dei
O lm o, Un ivers idad dei Zul ia , s . d ., p. 73 .
( 58 ) Por ex . Bequai .
(59) A s s i m : A l b a n e s e , o p . c i t . ; A n n e l i s e
Anderson, The Business o f Organized Crime,
S t a n fo rd , 1 9 7 9 ; H o w a r d A b a c:! i n s ky,
Organized Crime, Boston, 1 98 1 .
(60) C i t . por Bequai , op . c i t .
( 6 1 ) Wil l ian J . Chambl iss, Functional and Confl ict
Theories of Crime, em "Whose Law, What
Order", edited by Chambl iss-Mankoff, New
York, 1 9 76, p . 8 ; do mesmo, Exploring
Criminology, Macmil lan, New York, 1 988,
p . 86 .
( 62 ) Cf . Bequai, op. c i t . , p . 6 .
(63 ) Dwight Smith, Paragons, Pariahs and Pirates :
A Spectrum Based Theory of En terprise, em
"Cr ime and Del inquency", 1 980, p . 3 5 8.
(64) Bynllm, op. cit., p. 8.
(65) R o b e r t K. M e r t o n , Teoria y estructura
sociales, FCE, México, 1 9 70, p. 1 5 2 .
(66) V. Marc Ferro, La Gran Guerra ( 1 9 1 4- 1 9 1 8),
Buenos Aires, 1 98 5 .
(67 ) C f . Maurice N iveall, Historia de los hechos
económicos contemporâneos, Barcelona,
1 9 77 .
(68 ) V. José Peco, La reforma penal en el Senado
de 1 933, B uenos Aires, 1 936.
(69) V. Devotto-Rosol i , op . c i t .
( 70 ) Em geral, todo o posit iv ismo cr iminológico
operava dentro do paradigma racista da épo-
66
ca, part icularmente na versão de Herbert
Spencer (Principes de Sociologie, trad. de M.
E. Cazel les, Paris, 1 883 ) .
( 7 1 ) É notór ia a tendência racista no posit ivismo
i ta l ia no, em especial em La Criminologia de
Rafael Garofalo (traducción de P. Dorado,
Madrid, s .f. ) .
( 72 ) Pode se ver a produção em br ionár ia d o
positivismo argent ino: Luis Maria Drago, Los
hombres de presa, 2' ed. , B uenos Ai res,
1 888 ; l ' b ib l iograf ia i n dicada por H u g o
Vezzetti, L a locura e n la Argentina, Buenos
Ai res, 1 98 3 .
( 73 ) Para a recente crítica ao fundamenta l i smo
ético, Luig i Manconi, L im i ta re la sofferenza.
Per u n programma d i r iduz ione dei dann i,
em " Lagal izare la droga", Feltr inel l i , 1 99 1 ;
D o u g l a s N . H u sak, Drugs a n d R ig h ts,
Cambridge U nivers i ty Press, 1 99 2 .
( 74 ) A esse respeito, l ii a k i Agirreazkuenaga, L a
coacción a dministrativa directa, Civ i tas ,
Madrid, 1 990.
( 7 5 ) Franz von Liszt, Lehrbuch des Deutschen
Strafrechts, Berl i n, 1 89 1 , p . 2 1 6 .
( 76 ) V. Opere diverse dei March ese Cesare
8eccaria bonesana, Patrizio milanese, Parte
Prima, Prima Edzione Napoletana, Napol i,
1 7 70, I , p. 1 1 7; Dei delitti e delle pene, a
cura di Franco Venturi, E inaudi , 1 98 1 , p. 89 ;
trad. de Laplaza, Buenos Aires, 1 955, p . 288 .
( 7 7 ) Code Pénal. Des 25 Septembre - 6 Octobre
1 79 1 .
( 78) Sancionado em 1 83 1 , ver ed. d e Jos ino do
Nascimento e S i lva, Código Criminal do Im
pério do Brasil, Rio de Jane i ro, 1 863; Code
Criminel de l'Empire du Brésil, trad. de Victor
Foucher, Paris, 1 834.
( 79 ) A esse respei to : G .M. Weiteka mp-5can ia
Herberger, Amerikanische 5trafrechtspolit ik
auf dem Weg in die Katastrophe, em "Neue
Kr imina lpol i t ik", 1 995, cuaderno 2.
( 80) A Corte Suprema a rgentina havia declara
do a i nconst ituciona l idade da pena m ín ima
por roubo de automóvel à mão a rmada, que
é superior ao mín imo do homicídio s imples.
Poster iormente, com outra composição,
mudou de cr i tério com argumento que im
p l ica uma renúncia ao poder controlador da
const i tuciona l idade das penas, o que não
deixa de ser lamentável.
( 8 1 ) Cf. Wei twkamp-Herberger, op. cit.; Marc
M a u er, The F ra g i l i ty o f C r i m n a l J u st ice
Reform, em "Socia l Justice", 25 , nO 3 : N i ls
Chistie, Crime Contrai as Industry, Towards
Gulags Western Style?, Routledge, 1 993.
(82) v . D i ego M a n u e l Luzón Pena, C o n t ro l
e le t rón ico y sanc iones a l ternat ivas a la
pr i s ión , em "VI I I Jornadas Peni tenciár ias
Andaluzas", Sevil la, 1 994.
(83 ) A Lei nO 24 .424 introduziu na Argent ina a
"confabulación", que é Lima má tradução da
conspiracy, a inda que, dada a forma em que
a legis la, é c laro que o legis lador não sabia
do que se tratava.
(84) Cf. Smith and Hogan, Criminal Law, Londres,
1 992, p. 269.
(85 ) E l is abetta Grande, A ccordo criminoso e
"consp ira cy ". Tipicitá e stretta lega litá
nell'analisi comparata, C EDAM, 1 99 3 .
( 8 6 ) A a p rofu n d a de modo a d i m i rável L u i g i
F e r r a j o l i , D i r i t to e r a g i o n e . Teoria dei
garantismo penale, Laterza, 1 989.
(87 ) Malleus Maleficarum Translated with an
Introduction, Bibl iography and notes by the
: d
67
Rev. Montagne Summers, Londres, 1 9 5 1 .
(88 ) Cf. W e i t o k a m p- H e r b e rger, o p . c i t . e n
"Kr imina lpol i t i k", 1 9 95 .