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ESTUDO ESTUDO Câmara dos Deputados Praça 3 Poderes Consultoria Legislativa Anexo III - Térreo Brasília - DF ESTUDO E PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA PARA ASSEGURAR APOIO GOVERNAMENTAL À INCLUSÃO DE CRIANÇAS E JOVENS PORTADORES DE DEFICIÊNCIA NO SISTEMA PÚBLICO DE ENSINO REGULAR Mariza Abreu Consultora Legislativa da Área XV Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia ESTUDO MAIO/2004

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ESTUDO

ESTUDO

ESTUDO E PROPOSIÇÃO LEGISLATIVAPARA ASSEGURAR APOIO

GOVERNAMENTAL À INCLUSÃO DECRIANÇAS E JOVENS PORTADORES DEDEFICIÊNCIA NO SISTEMA PÚBLICO DE

ENSINO REGULAR

Mariza AbreuConsultora Legislativa da Área XV

Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia

ESTUDO

MAIO/2004

Câmara dos DeputadosPraça 3 PoderesConsultoria LegislativaAnexo III - TérreoBrasília - DF

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ÍNDICE

1. Colocação do problema ........................................................................................................................................3

2. Situação das Pessoas com Deficiência no Brasil e importância da educação.......................................................4

3. Educação especial na Constituição Federal e LDB ..............................................................................................7

4. Educação Especial nos atos da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação......................9

5. Oferta de educação especial no Brasil ...............................................................................................................11

6. Metas para a Educação Especial no Plano Nacional de Educação .....................................................................14

7. Apoio do Poder Público às instituições privadas sem fins lucrativos de educação especial...............................17

8. Considerações finais ...........................................................................................................................................23

MATERIAL CONSULTADO ...............................................................................................................................25

© 2004 Câmara dos Deputados.Todos os direitos reservados. Este trabalho poderá ser reproduzido ou transmitido na íntegra, desde quecitada a autora e a Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados. São vedadas a venda, a reproduçãoparcial e a tradução, sem autorização prévia por escrito da Câmara dos Deputados.

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ESTUDO E PROPOSIÇÃO LEGISLATIVA PARAASSEGURAR APOIO GOVERNAMENTAL À

INCLUSÃO DE CRIANÇAS E JOVENS PORTADORESDE DEFICIÊNCIA NO SISTEMA PÚBLICO DE ENSINO

REGULAR

Mariza Abreu

1. COLOCAÇÃO DO PROBLEMA

Recentemente, o Congresso Nacional apreciou a Medida Provisória nº139, encaminhada pelo Poder Executivo no dia 25 de novembro de 2003, e tranformada na Lei nº10.845, de 5 de março de 2004, que “Institui o Programa de Complementação ao AtendimentoEducacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência, e dá outras providências”.

Por meio desse programa, o PAED, a União prestará assistênciafinanceira às entidades privadas sem fins lucrativos que oferecem serviços gratuitos em educaçãoespecial, repassando recursos a suas unidades executoras de acordo com o número de educandosportadores de deficiência, conforme apurado pelo censo escolar realizado pelo MEC no exercícioanterior.

Entretanto, durante o processo de apreciação dessa Medida Provisória,mais uma vez ficaram evidenciadas as dificuldades que precisam ser superadas para assegurarapoio governamental às instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva emeducação especial.

Em primeiro lugar, o Poder Executivo tomou a iniciativa dessa MPdevido à reação da imprensa e da sociedade ao veto presidencial ao Projeto de Lei nº 4.853, de2001, de autoria do Deputado Eduardo Barbosa (PSDB/MG) que visava incluir asmatrículas de educação especial oferecidas por entidades privadas sem fins lucrativos nadistribuição dos recursos do FUNDEF. A Presidência da República vetou o referido projeto porcontrariar o interesse público, na medida em que implicaria impacto financeiro-orçamentário para aUnião na ordem de, em valores de 2003, cerca de 8,7 milhões de reais, instituindo despesaobrigatória e de caráter continuado para os próximos exercícios financeiros.

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Em segundo lugar, o texto original da Medida Provisória previa (art. 7º)que as entidades beneficiadas pelo PAED ficariam excluídas do Programa Dinheiro Direto naEscola – PDDE , implantado em 1995, e que (art. 4º, par. único) o valor per capita do PAED nãoexecederia o valor por aluno/ano do FUNDEF, conforme o disposto na Lei no 9.424, de 1996(art. 6º, § 1º). No texto final da Lei nº nº 10.845, de 2004, foi suprimido o art. 7º do texto originalmas mantido o parágafo único do art. 4º.

Pela Resolução nº 11, de 22 de março de 2004 (art. 5º, §1º), o FNDEfixou o valor por aluno/ano do PAED para 2004 em R$ 33,50 (trinta e três reais e cinquentacentavos), enquanto o valor mínimo anual por aluno do FUNDEF para esse mesmo ano foifixado pelo Decreto nº 4.966, de 30 de janeiro de 2004, em R$ 537,71 (quinhentos e trinta e setereais e setenta e um centavos) para os alunos da 1a a 4a séries, nas escolas urbanas e rurais, e emR$ 564,60 (quinhentos e sessenta e quatro reais e sessenta centavos) para os alunos da 5a a 8a

séries do ensino fundamental, bem assim como das classes de educação especial, também nasescolas urbanas e rurais.

Em conseqüência, a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dosDeputados aprovou por unanimidade, na reunião ordinária de 28 de abril deste ano, requerimentodo Deputado José Ivo Sartori (PMDB/RS) que, com base em Manifesto da Federação dasAPAEs (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) do Estado do Rio Grande do Sul, composição contrária ao valor fixado pelo FNDE, solicita a realização de audiência pública paradebater a situação das APAEs em relação ao Programa de Contemplação ao AtendimentoEducacional Especializado aos Portadores de Deficiência – PAED.

Também em conseqüência da situação criada com a instituição do PAED,o Deputado Leonardo Mattos (PV/MG) encaminhou a esta Consultoria Legislativa a presentesolicitação de trabalho com o seguinte conteúdo: Estudo e sugestão de proposição legislativa que vise apropor ou regulamentar legislação que viabilize maior apoio governamental à inclusão efetiva das crianças e jovensportadores de deficiência no País no sistema público regular de ensino.

2. SITUAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL E IMPORTÂNCIA

DA EDUCAÇÃO

A publicação Retratos da Deficiência no Brasil, referida nos documentosconsultados e citados ao final deste trabalho, tem como objetivo identificar a situação desse grupoda população brasileira. São dessa publicação as informações apresentadas a seguir.

De acordo com a ONU, há no mundo cerca de 500 milhões de pessoascom deficiências, das quais 80% vivem em países em desenvolvimento. No Brasil, de acordo como Censo Demográfico de 2000, realizado pelo IBGE, são 24,5 milhões de brasileiros com algumtipo de deficiência, correspondendo a 14,5% da população.

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Esse percentual é bem mais elevado do que o verificado noslevantamentos anteriores, que era inferior a 2%. Isso se deve à mudança conceitual na coleta dosdados. Antes, atribuía-se a condição de deficiente apenas às pessoas consideradas incapazes; apartir do Censo de 2000, essa condição foi estendida àqueles com alguma ou grande dificuldadepermanente.

De acordo com a Classificação Internacional de Deficiências,Incapacidades e Desvantagens (CIDID), de 1989, deficiência é a perda ou anormalidade deestrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica, temporária ou permanente, eincapacidade é a restrição, resultante de uma deficiência da habilidade para desempenhar umaatividade considerada normal, que surge em conseqüência direta ou resposta do indivíduo a umadeficiência.

O questionário do Censo Demográfico de 2000 incluiu quesitos relativos aalguma ou grande dificuldade ou incapacidade para enxergar, ouvir ou andar, e outros relativos àdeficiência mental ou deficiência física ou motora permanente (paralisia permanente total daspernas, ou de um dos lados do corpo, ou, ainda, falta de perna, braço, mão, pé ou dedo polegar).Em conseqüência, PPDs são as Pessoas portadoras de deficiências e PPIs, as Pessoas perceptorasde incapacidades.

Em 2000, as PPIs correspondiam à cerca de 2,5% da população, ou seja,percentual próximo dos obtidos nos levantamentos anteriores, como no Censo Demográfico de1991 e na Pesquisa Nacional de Amostras Domiciliares – PNAD de 1981, também realizada peloIBGE. De fato, ao incluir aqueles com alguma ou grande dificuldade de enxergar, ouvir ou andar,o Censo de 2000 incorporou no universo de deficientes grande parte da população idosa. Nesseano, a maioria dos deficientes constituía-se de pessoas com alguma dificuldade de enxergar(57,16%).

Ao relacionar deficiência com escolaridade, o Censo de 2000 indica que,no Brasil, a situação dos PPDs é mais grave que a do conjunto da população. Na populaçãobrasileira considerada na sua totalidade, 27,6% dos indivíduos têm de 4 a 7 anos de estudo, e umaentre quatro pessoas (25,03%) não têm instrução. No caso dos PPDs, 27,61% não possuemescolaridade, contra 24,6% na população sem deficiência.

Entretanto, quando se faz essa comparação entre os indivíduos maiseducados, ou seja, aqueles com mais de 12 anos de estudo, há uma maior proporção entre PPDs(1,55%) em relação àqueles que não apresentam deficiência (1,07%). Ou seja, as PPDs estão maispresentes nos extremos do espectro educacional.

Entre os indivíduos sem nenhum grau de instrução, a taxa de deficiência éde 15,98%, ao passo que entre aqueles com mais de 12 anos de estudo chega a 19,77%. Portanto,a incidência de pessoas deficientes é maior no segmento populacional mais escolarizado. Essaconstatação parece opor-se à literatura anterior sobre PPDs, que aponta para um alto grau de

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exclusão desse grupo do sistema educacional. Esse fato pode ser explicado pela questão doacúmulo dos anos de vida, pois as pessoas com mais anos de estudo vivem mais.

Entretanto, quando esses dados referem-se apenas às PPIs, constata-seelevada demanda reprimida por educação. Nesse grupo, o percentual de indivíduos sem instruçãoé de 42,5%, enquanto entre os PPDs é de 27,6% e entre os indivíduos sem deficiência, 24,5%. Ataxa de percepção de incapacidade é maior para os indivíduos com menos de um ano de instrução(4,27%), e decrescente à medida que aumentam os anos de escolaridade dos indivíduos, excetopara aqueles com mais de 12 anos de estudo.

Para promover a inclusão social, inclusive das PPDs, são necessáriaspolíticas sociais tanto compensatórias (frentes de trabalho, programa de imposto de renda negativo,seguro-desemprego, previdência social, distribuição de cestas básicas etc.) quanto estruturais(regularização fundiária, moradia, educação pública, saúde pública, micro-crédito, reforma agrária,investimentos em infra-estrutura etc.).

Políticas compensatórias têm efeitos mais rápidos, mas transitórios, pois,quando interrompidas, os grupos por elas beneficiados voltam ao estado original. Políticasestruturais geram benefícios mais duradouros ou permanentes no nível de renda e na qualidade devida dos indivíduos, mas demoram a gerar seus efeitos. Por exemplo, os resultados das políticaseducacionais só se fazem sentir quando o indivíduo começa a trabalhar.

Na realidade, é preciso combinar políticas sociais desses dois tipos. Oproblema da política social brasileira, em especial aquela voltada para as pessoas com deficiência,é a dominância do aspecto compensatório que não deixa raiz na vida das pessoas. Por isso, éimportante que os programas voltados às PPDs sejam constitucionais, diminuindo a possibilidadede sua descontinuidade decorrentes das mudanças das políticas públicas vinculadas à rotatividadedemocrática no exercício do Poder Executivo em todos os âmbitos da Federação brasileira.

No mapa da pobreza e da desigualdade no Brasil, constata-se que osalário-hora das pessoas ocupadas que não apresentam deficiência é 19,9% maior do que o dasPPDs ocupadas.

Na análise de variáveis que contribuem para a diferença de renda entre osindivíduos, a escolaridade constitui variável mais importante do que a idade. A renda aumentacom a idade, mas a uma taxa decrescente, de forma que o salário do trabalhador mais jovemaumenta mais depressa com o acúmulo da idade do que do mais velho. Enquanto o acréscimosalarial de um ano de idade para o primeiro ano de idade após os 15 anos das PPDs ocupadas estáem torno de 7,4%, na população ocupada é cerca de 8,7%. Ou seja, as PPDs apresentam menoresganhos relativos de renda, a medida que ficam mais experientes.

No caso da escolaridade, sua repercussão é positiva nos salários dosindivíduos, pois as pessoas com nível superior ganham mais do que aquelas com ensino médio.

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Ao contrário da idade, a variável escolaridade apresenta retornos crescentes. O retorno doinvestimento em educação para o primeiro ano de estudo de uma PPD (5,8%) é maior do quepara todos os ocupados (3,5%), o que é consistente com a relativa escassez de estudos entre asPPDs ocupadas.

Portanto, entre as políticas públicas setoriais com finalidade de promoçãoda inclusão social, inclusive das PPDs, destacam-se as políticas educacionais destinadas apromover a habilitação e reabilitação profissional da pessoa portadora de deficiência. Odesenvolvimento de tais políticas implica, por exemplo, criação de escolas que integrem pessoascom deficiência e treinamento especializado de professores em braille e na Linguagem Brasileirade Sinais – LIBRAS.

3. EDUCAÇÃO ESPECIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E LDB

O atendimento educacional especializado aos portadores de deficiênciasou aos educandos portadores de necessidades especiais, preferencialmente na rede regular deensino, é direito assegurado pela Constituição Federal (art. 208, III) e reafirmado pela Lei deDiretrizes e Bases da Educação Nacional (art. 4º, III).

É importante observar que, no texto da Constituição e na legislaçãoinfraconstitucional de caráter geral, utiliza-se a expressão portadores de deficiência (CF, art. 208, III)ou portadores de deficiência física, sensorial ou mental (CF, art. 227, II) ou pessoas portadoras de deficiência(Lei nº 10.098, de 2000, que estabelece normas e critérios básicos para a promoção daacessibilidade de tais pessoas).

Na legislação educacional, utiliza-se outra terminologia, sendo asubstituição das expressões portadores de deficiência, ou excepcionais, ou deficientes físicos ou mentais, poreducandos portadores de necessidades especiais ou indivíduos com necessidades educacionais especiais justificadapela finalidade de eliminar o caráter discriminatório associado àquelas expressões, vinculadas apreconceitos e práticas pedagógicas discricionárias. Visa também assegurar atendimentoeducacional especializado aos superdotados 1.

De acordo com a legislação educacional, em primeiro lugar, trata-se deassegurar aos educandos portadores de necessidades especiais iguais oportunidades educacionais.Em segundo lugar, trata-se de oferecer educação escolar a esses indivíduos preferencialmentenuma escola regular e numa sala de aula comum, onde convivam pessoas com e sem necessidades 1 Observe-se que os PLs nº 3.638, de 2000, do então Deputado Paulo Paim (PT/RS) e nº 3.219, de 2004, de autoriado Deputado Ildeu Araújo (PP/SP), referem-se ao Estatuto dos Portadores de Necessidades Especiais, e não sobre o Estatutodo Portador de Deficiência ou da Pessoa com Deficiência, como os PLSs nº 6 e nº 429, ambos de 2003 e ambos de autoria doSenador Paulo Paim (PT/RS). Na Câmara dos Deputados, em março de 2003, foi arquivado o PL nº 5.841, de 2001,do Deputado Eni Voltolini (PP/SC), que propunha a alteração da denominação portador de deficiência para portador denecessidades especiais em lei vigente sobre esse assunto.

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especiais, ou com e sem deficiências, de forma que os indivíduos aprendam a lidar com adiversidade e a diferença.

Na LDB, a educação especial é definida (art. 58) como modalidade deeducação escolar que abrange todas as etapas da educação básica, a educação de jovens e adultos,a educação profissional e a educação superior.

Ao mesmo tempo, o atendimento preferencial na rede regular de ensinonão deve restringir-se ao direito do portador de deficiência em freqüentar uma classe comumnuma escola regular. Deve avançar para o atendimento educacional diferenciado por meio, porexemplo, da eliminação de barreiras e da presença de material didático e de apoio especializadonas salas de aula regulares. Assim, a idéia de integração ou inclusão nas escolas regulares implica aorganização de serviços especializados nesses estabelecimentos de ensino.

Portanto, a modalidade da educação especial prevista na LDB deve, comoregra geral, assegurar o direito de acesso ao ensino da rede regular em classes comuns, semrestringir-se à escola especial ou a classe especial. Não é o aluno deficiente que deve integrar-se àescola e sim a escola que precisa modificar-se e adaptar-se às necessidades das pessoas comdeficiência.

A LDB dispõe que os sistemas de ensino devem assegurar aos educandoscom necessidades especiais currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos (art. 59,I). Prevê (art. 59, II) também terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigidopara a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempoo programa escolar, para os superdotados. Trata (art. 59, III) da capacitação dos professores em nívelmédio e superior, para o atendimento especializado e para a integração desses alunos em classescomuns. Por fim, assegura aos educandos com necessidades especiais (art. 59, IV) educação especialpara o trabalho, visando sua efetiva integração na vida em sociedade, e (art. 59, V) acesso igualitário aosbenefícios dos programas sociais suplementares disponíveis aos alunos sem necessidades especiais nomesmo nível de ensino.

Em determinadas situações, como a de internação hospitalar prolongada,a garantia do direito à educação impõe que os serviços educacionais sejam oferecidos por meio deprogramas específicos, fora da rede regular de ensino.

Quanto ao acesso e encaminhamento a ambientes especializados deaprendizagem, o Decreto nº 3.596, de outubro 2001, por meio do qual o Brasil ratificou aConvenção Interamericana para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra asPessoas com Deficiência, dispõe que tal acesso só pode se dar por opção dos titulares do direito àeducação, ou seja, dos alunos, seus pais ou responsáveis, e nunca por imposição das escolasregulares, como costuma acontecer na prática.

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Para promover a inclusão dos alunos com necessidades especiais nasclasses comuns, é preciso superar o despreparo dos professores, a falta de infra-estruturaadequada e as barreiras arquitetônicas, assim como a reação negativa dos alunos sem deficiência ede suas famílias.

Por exemplo, para a educação escolar de indivíduos com deficiênciaauditiva é preciso que os professores tenham conhecimento da língua de sinais. Para indivíduoscom deficiência visual, é necessário disponibilizar material didático em braille. No caso dosdeficientes motores, as escolas regulares precisam de rampas, portas de tamanho adequado,adaptações nos banheiros, mobiliários escolares adequados, além de transporte escolar adaptadoaos portadores de deficiência física.

4. EDUCAÇÃO ESPECIAL NOS ATOS DA CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA DO

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

De acordo com a LDB (art. 9º, IV), cabe à União estabelecer, emcolaboração com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, competências e diretrizes para aeducação básica, em suas etapas e modalidades, de modo a assegurar a formação básica comumindispensável para o pleno desenvolvimento da pesssoa humana, o excercício da cidadania e aqualificação para o trabalho.

Em cumprimento ao disposto na Lei nº 9.131, de 1995, que inclui entresuas atribuições a de deliberar sobre as diretrizes curriculares propostas pelo Ministério da Educação (art. 9º, §1º, “c”), a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, aprovou, em 2001, oParecer nº 17 e Resolução nº 02, que “Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial naEducação Básica”. A seguir, sintetizamos os principais conteúdos desses dois atos daCEB/CNE.

Conceito de educação especial: processo educacional definido por uma propostapedagógica que assegure recursos e serviços educacionais especiais, organizadosinstitucionalmente para apoiar, complementar, suplementar e, em alguns casos, substituir osserviços educacionais comuns, de modo a garantir a educação escolar e promover odesenvolvimento dos educandos que apresentem necessidades educacionais especiais, em todas asetapas e modalidades da educação básica.

Educandos com necessidades educacionais especiais: aqueles com: 1º – dificuldadesde aprendizagem ou limitações para acompanhamento das atividades curriculares, não vinculadasa uma causa orgânica específica ou relacionadas a condições, disfunções, limitações oudeficiências; ou 2º – dificuldades de comunicação e sinalização, demandando a utilização delinguagens e códigos diferenciados; ou 3º – altas habilidades, nas áreas artística, intelectual oupsicomotora, ou superdotação.

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Alternativas de oferta da educação especial: 1ª – nas escolas da rede regular de ensino,mediante a organização de serviços de apoio pedagógico especializado, oferecido nas classescomuns ou em salas de recursos, e a presença de professores capacitados e especializados,flexibilização e adaptação curricular, e recursos didáticos diferenciados; 2ª – extraordinariamente,em classes especiais organizadas nas escolas regulares, para atendimento, em caráter transitório, aalunos que não possam ser atendidos em classes comuns; 3ª – em caráter extraordinário, em escolasespeciais, públicas ou privadas, para atendimento a alunos que requeiram atenção individualizada eadaptação curricular tão significativa que a escola comum não consiga prover.

Recenseamento, matrícula e avaliação: necessidade de os sistemas de ensinoconhecerem a demanda real de atendimento a alunos com necessidades educacionais especiais;obrigatoriedade de os sistemas de ensino matricularem todos os alunos; dever de a escola realizaravaliação do aluno para identificação de suas necessidades educacionais especiais.

Participação da família: colaboração da família na avaliação do aluno pelaescola para identificação de suas necessidades educacionais especiais; decisão conjunta da equipepedagógica da escola especial e da família quanto à transferência do aluno da escola especial paraa escola regular (portanto, participação da família no ir e vir do aluno no movimento classecomum – classe ou escola especial).

Eliminação de barreiras: obrigação de os sistemas de ensino quanto àeliminação de barreiras arquitetônicas urbanísticas, na edificação e nos transportes escolares, e nascomunicações, mediante a utilização de linguagens e códigos aplicáveis, como o sistema braille e aLíngua Brasileira de Sinais.

Educação especial fora do espaço escolar: atendimento educacional especializadoem classes hospitalares e ambiente domiciliar para alunos impossibilitados de freqüentar as aulasem razão de tratamento de saúde.

Professores para a educação especial: professores capacitados para atuar em classescomuns com alunos que apresentem necessidades educacionais especiais – aqueles com formação em nívelmédio ou superior na qual foram incluídos conteúdos sobre educação especial que lhes permiteperceber as necessidades educacionais especiais dos alunos, flexibilizar e avaliar o processoeducativo de modo a atender essas necessidades educacionais especiais, e atuar em equipe;professores especializados em educação especial – aqueles com licenciatura em educação especial ou numade suas áreas, preferencialmente de modo concomitante e associado à licenciatura para a educaçãoinfantil ou para os anos iniciais do ensino fundamental, ou com complementação de estudos oupós-graduação em áreas especificas da educação especial, posterior à licenciatura nas diferentesáreas do conhecimento, para atuação nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio.

Conceito de educação inclusiva: avanço em relação ao movimento de integraçãoescolar, que pressupunha o ajustamento da pessoa com deficiência para sua participação noprocesso educativo nas escolas comuns; implica nova postura da escola comum, que deve propor,

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em seu projeto pedagógico, ações que favoreçam a construção de um espaço democrático,possibilitando a interação social e o acolhimento da diversidade. (Observe-se que a LDB nãoutiliza esse conceito).

Em 2002, a Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional deEducação emitiu dois outros pareceres, os de nºs 04 e 23, em resposta respectivamente a“Recomendação ao Conselho Nacional de Educação tendo por objeto a educação inclusiva depessoas portadoras de deficiência” e a “Consulta quanto ao reconhecimento da Formação doProfessor de Orientação e Mobilidade”.

No primeiro deles, a CEB responde à recomendação de doisProcuradores da República, acompanhada de parecer de uma professora da Faculdade deEducação da UNICAMP, segundo a qual os documentos exarados por aquela Câmara do CNEcontrariam os princípios da igualdade e da não-discriminação ao admitirem currículos adaptadosem escolas e salas especiais, implicando a colocação à margem do ensino regular de certosportadores de deficiência. O parecer sustenta as diretrizes nacionais para a educação especial antesinstituídas, com vários argumentos, entre os quais o de que a Constituição Federal e a LDBdispõem sobre o atendimento educacional especializado seguido da expressão preferencialmente, enão exclusivamente, na rede regular de ensino, e que a defesa e a construção permanente daigualdade pressupõe o reconhecimento das situações reais de diferenças, pois ignorá-las poderesultar em mais uma nova forma de discriminação. Em consonância com essa posição da CEB, oPlano Nacional de Educação afirma, no diagnóstico da educação especial que a legislação é sábiaao determinar preferência para o atendimento educacional nas escolas regulares, ressalvando oscasos de excepcionalidade em que as necessidades do educando exigem outras formas deatendimento.

No Parecer nº 23, de 2002, a CEB posiciona-se desfavoravelmente àcriação de especialização para a Formação de Professor de Orientação e Mobilidade, dentro doscursos de formação de professores, tanto nos de nível médio como nos de nível superior, porentender que a ajuda especializada à locomoção e mobilidade de cegos e deficientes visuais exigeformação específica na área de saúde, extrapolando a especificidade pedagógica da formação e dotrabalho do professor.

5. OFERTA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NO BRASIL

O conhecimento da realidade da educação especial no Brasil é, ainda,bastante precário. Faltam estatísticas completas sobre o número de pessoas com necessidadeseducacionais especiais e informações sobre o atendimento oferecido nessa modalidade deeducação escolar.

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Segundo o Censo Demográfico do IBGE, a população braslieira entrezero e 17 anos de idade correspondia a 61 milhões de crianças e adolescentes. Na versãopreliminar do Relatório da Situação da Infância e da Adolescência Brasileira 2003, do UNICEF,4,7% deste total, ou seja, 2,9 milhões de pessoas, apresentavam algum tipo de deficiência.

O quadro abaixo apresenta a evolução da matrícula na educação especialna educação básica no Brasil, de acordo com o Censo Escolar realizado anualmente peloINEP/MEC.

EVOLUÇÃO DA MATRÍCULA NA EDUCAÇAO ESPECIAL NA EDUCAÇÃO BÁSICA

1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

201.142 334.507 293.403 311.354 300.520 323.399 337.987 358.898

A Secretaria de Educação Especial do MEC divulga a seguinte tabela coma Evolução da Matrícula de Alunos com Necessidades Especiais, conforme os dados doINEP/MEC.

EVOLUÇÃO DA MATRÍCULA DE ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS POR TIPO DE DEFICIÊNCIA

- 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

Tipo deNecessidade

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

QuantidadeAlunos

Total Brasil 201.142 334.507 337.326 374.129 300.520 323.399 337.897 500.375

Deficiência Visual 8.081 13.875 15.473 18.629 8.019 8.570 9.622 20.521

Deficiência Auditiva 30.578 43.241 42.584 47.810 35.545 36.055 35.582 56.024

Deficiência Física 7.921 13.135 16.463 17.333 10.764 12.182 11.817 24.658

Deficiência Mental 121.021 189.370 181.377 197.996 178.005 189.499 199.502 251.506

Deficiência Múltipla 23.522 47.481 42.582 46.745 41.726 47.086 50.484 62.283

Condutas Típicas 9.529 25.681 8.994 9.223 7.739 9.190 9.744 16.858

Superdotação 490 1.724 1.187 1.228 454 692 625 1.675

Outras - - 28.666 35.165 18.268 20.125 20.521 66.850

FONTE: MEC/INEP/SEEC

Como se pode observar, em alguns anos (1998, 1999 e 2003), os dadosnão conferem.

A maior proporção dos matriculados na educação especial consiste emalunos com deficiência mental, o que corresponde à predominância das doenças mentais entre as

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PPDs (11,56% segundo o Censo Demográfico de 2000). Em 2003, os alunos matriculados nessamodalidade de educação escolar estavam assim distribuídos: 50,3% com deficiência mental;12,4% com deficiência múltipla; 11,2% com deficiência auditiva; 4,9% com deficiência física;4,1% com deficiência visual; 3,4% com condutas típicas; e 13,4% com outras deficiências. Apenas0,3% apresentavam altas habilidades ou superdotação.

Segundo a Secretaria de Educação Especial do MEC, os dados do CensoEscolar de 2003 (MEC/INEP) registram que a participação do atendimento inclusivo cresceu, no Brasil,passando dos 24,7% de 2002 para 28,7% em 2003, um crescimento de 30,6% em apenas um ano, em relação àsmatrículas. A participação do atendimento em separado, nas classes especiais e nas escolas especiais, diminuiu,passando de 75,3% para 71,3%.

De acordo com a publicação Retratos da Deficiência no Brasil, anteriormentereferida, a avaliação das matrículas nos diferentes níveis de ensino indica que as PPIs apresentammaior dificuldade de atingir níveis mais elevados de escolaridade quando comparadas com asPPDs em geral. Em termos gerais, o grande número de PPDs e PPIs aprendendo a ler e escrever,comparado com a população de PPDs e PPIs na população total que freqüenta a escola, indica asdificuldades encontradas por esse indivíduos para a progressão na escola. Em conseqüência, aparticipação de PPDs e PPIs nos cursos supletivos é também maior do que a verificada noconjunto dos níveis e modalidades de ensino. Portanto, as pessoas com deficiências e compercepção de incapacidades têm menor inserção na educação e, quando logram acesso à escola,têm dificuldade de acompanhar os alunos sem deficiência.

Enquanto, conforme o diagnóstico da educação especial no PlanoNacional de Educação, em 1998, 59,1% dos 5.507 Municípios brasileiros não ofereciam essamodalidade de educação escolar, em 2002 3.612 redes municipais de ensino registraram matrículasem educação especial, o que corresponde a 64,9% dos Municípios brasileiros. Da mesma formacomo em outros indicadores educacionais, as diferenças regionais são significativas. Em 1998, noNordeste, a ausência dessa modalidade acontecia em 78,3% dos Municípios, destacando-se RioGrande do Norte, com apenas 9,6% dos seus Municípios apresentando dados de atendimento.Na região Sul, 58,1% dos Municípios ofereciam educação especial, sendo o Paraná o de mais altopercentual (83,2%). No Centro-Oeste, Mato Grosso do Sul tinha atendimento em 76,6% dos seusMunicípios. Espírito Santo era o Estado com o mais alto percentual de Municípios com oferta deeducação especial (83,1%).

Quanto à dependência administrativa, em 2003, as matrículas na educaçãoespecial estavam assim distribuídas: 61,2% particulares; 21,2% estaduais; 17,4%, municipais; e0,2% federais. Portanto, o atendimento particular, nele incluído o oferecido por entidadesfilantrópicas, é responsável por mais da metade de toda a educação especial no País. De fato, oatendimento educacional especializado oferecido em escolas especiais é mais difundido na redeprivada do que na pública.

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Segundo dados do IBGE apresentados na publicação Mídia e Deficiência,referida nos documentos citados ao final deste trabalho, no ano 2000, 70% dos alunos comdeficiência estavam em classes especiais, sendo as instituições não governamentais, como asAPAEs e os Institutos Pestalozzi, responsáveis por 47% desses alunos.

No diagnóstico da educação especial apresentado no Plano Nacional deEducação, encontram-se informações sobre as condições dos estabelecimentos de ensino queoferecem educação especial quanto, por exemplo, à precariedade das instalações sanitárias e àinexistência, insuficiência e inadequação do material didático-pedagógico às necessidadesespecíficas dos alunos, características constatadas em muitos centros de atendimento educacionala essa clientela. Também encontram-se no PNE dados relativos à formação do magistério ematuação na educação especial, às diferentes modalidades de atendimento e à distribuição dasmatrículas na educação especial nas etapas da educação básica e na modalidade de educação dejovens e adultos.

Por fim, o PNE identifica as seguintes tendências nos sistemas de ensinoquanto à educação especial:

• integração/inclusão do aluno com necessidades especiais no sistemaregular de ensino e, se isto não for possível em função das necessidades do educando,atendimento em classes e escolas especializadas;

• ampliação do regulamento das escolas especiais para prestarem apoio eorientação aos programas de integração, além do atendimento específico;

• melhoria da qualificação dos professores do ensino fundamental paraessa clientela;

• expansão da oferta dos cursos de formação/especialização pelasuniversidades e escolas normais.

6. METAS PARA A EDUCAÇÃO ESPECIAL NO PLANO NACIONAL DE

EDUCAÇÃO

Com base no diagnóstico e nas diretrizes formuladas no Capítulo daEducação Especial, o PNE contém 28 metas. Além daquela de nº 28, que se refere à observânciadas metas pertinentes nos demais capítulos do Plano, é possível classificar as outras 27 metas,com base nos seus respectivos conteúdos, da seguinte maneira:

• Metas relativas à ampliação da oferta de educação especial: nº 1 (ampliar a ofertada estimulação precoce para as crianças na educação infantil), nº 4 (nos primeiros cinco anos,redimensionar e incrementar, se necessário, as classes especiais, salas de recursos e outrasalternativas pedagógicas para favorecer e apoiar a integração em classes comuns); nº 5

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(generalizar, em dez anos, o atendimento especializado na educação infantil e no ensinofundamental, inclusive por meio de consórcios entre Municípios e, quando necessário, da ofertade transporte escolar); nº 6 (implantar, em até quatro anos, em cada unidade da Federação, pelomenos um centro especializado para atendimento de pessoas com severa dificuldade dedesenvolvimento); nº 7 (ampliar, até o final da década, o número desses centros para as diferentesregiões de cada Estado); n º 26 (implantar, a partir do primeiro ano, programas de atendimentoaos alunos com altas habilidades);

• Metas relativas ao levantamento da demanda: nº 3 (generalizar, em cinco anos,a aplicação de testes de acuidade visual e auditiva na educação infantil e no ensino fundamental) enº 25 (organizar informações coletadas pelo censo educacional e censos populacionais sobre apopulação a ser atendida pela educação especial);

• Meta relativa à gestão: nº 24 (em três anos, organizar setor responsável pelaeducação especial em todos os sistemas de ensino);

• Metas relativas à formação dos professores e de outros profissionais: nº 2(generalizar, em cinco anos, a oferta de cursos sobre o atendimento básico a educandos especiais,para os professores em exercício na educação infantil e no ensino fundamental); nº 19 (incluir noscurrículos de formação de professores, nos níveis médio e superior, conteúdos e disciplinasespecíficas para a capacitação ao atendimento dos alunos especiais); nº 20 (incluir ou ampliarhabilitação específica, na graduação e pós-graduação, para formar pessoal especializado emeducação especial, garantindo, em cinco anos, pelo menos um curso desse tipo em cada unidadeda Federação); nº 21 (introduzir, em três anos, conteúdos disciplinares referentes aos educandoscom necessidades especiais em cursos de áreas relevantes para o atendimento dessas necessidades,como Medicina, Enfermagem e Arquitetura, entre outras);

• Metas relativas a material didático e equipamentos apropriados: (para deficientesvisuais e auditivos) nº 8 (disponibilizar, em cinco anos, livros didáticos falados, em braille e emcaracteres ampliados, para os alunos cegos e os de visão sub-normal do ensino fundamental); nº 9(disponibilizar, em cinco anos, livros de literatura falados, em braille e em caracteres ampliadospara os alunos cegos e os de visão sub-normal); nº 10 (equipar, em cinco anos, as escolas deeducação básica e, em dez anos, as de educação superior que atendam educandos surdos e aos devisão sub-normal, com aparelhos de amplificação sonora e outros equipamentos que facilitem aaprendizagem); nº 11 (implantar, em cinco anos, e generalizar em dez anos, o ensino da LínguaBrasileira de Sinais para os alunos surdos); (para deficientes físicos) nº 12 (estabelecer, noprimeiro ano, os padrões mínimos de infra-estrutura das escolas; somente autorizar a construçãode prédios escolares, públicos ou privados, de acordo com esses padrões e, em cinco anos,adaptar a eles os prédios escolares existentes); nº 15 (assegurar, durante a década, transporteescolar com as adaptações necessárias para alunos com dificuldade de locomoção); nº 18

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(disponibilizar, em dez anos, órteses e próteses 2 para os educandos com deficiências, emcooperação com a saúde, previdência e assistência social);

• Metas relativas à qualidade: nº 13 (definir, nos dois primeiros anos,indicadores básicos de qualidade para o funcionamento de instituições de educação especial,públicas e privadas); nº 14 (ampliar o fornecimento e uso de equipamentos de informática comoapoio à aprendizagem do educando com necessidades especiais); nº 16 (assegurar a inclusão, noprojeto pedagógico das unidades escolares, do atendimento às necessidades educacionais especiaisde seus alunos); nº 22 (incentivar, durante a década, a realização de estudos e pesquisas,especialmente pelas instituições de ensino superior, sobre as diversas áreas relacionadas aosalunos com necessidades especiais);

•Meta relativa à educação profissional: nº 17 (articular as ações de educaçãoespecial com a política de educação para o trabalho, para desenvolver programas de qualificaçãoprofissional e promover a colocação de alunos especiais no mercado de trabalho);

• Metas relativas ao financiamento da educação especial: nº 23 (aumentar osrecursos destinados à educação especial, para atingir, em dez anos, o mínimo equivalente a 5%dos recursos vinculados à manutenção e desenvolvimento do ensino, em parceria com a saúde,assistência social, trabalho e previdência); nº 27 (assegurar a continuidade do apoio técnico efinanceiro às instituições privadas sem fim lucrativo com atuação exclusiva em educação especial,que realizem atendimento de qualidade, atestado em avaliação do respectivo sistema de ensino).

Com base nas metas do Plano Nacional de Educação, e na situação daeducação especial no Brasil antes descrita, podemos afirmar que os principais problemasrelacionados com a oferta dessa modalidade de educação escolar, em síntese, são:

1º – ausência de levantamento preciso da demanda por atendimentoeducacional especializado, quanto ao número de educandos com necessidades especiais e ao tipode atendimento necessário;

2º – oferta insuficiente de educação especial face à demanda conhecida; 3º – recursos públicos financeiros insuficientes; 4º – despreparo dos professores; 5º – falta de material didático e pedagógico apropriado e das adaptações

necessárias nos prédios escolares, mobiliário e equipamentos aos alunos com necessidadesespeciais;

6º – insuficiência do processo de integração ou inclusão dos alunos comnecessidades especiais nas escolas regulares e classes comuns;

2 Próteses são dispositivos utilizados para substituir membros amputados ou mal formados. Órteses são dispositivosde uso externo que têm como objetivo proporcionar melhora funcional.

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7º – não garantia da participação da família no processo de decisão relativaa essa integração ou inclusão nas escolas regulares e classes comuns;

8º – oferta insuficiente de educação especial na rede pública de ensino,especialmente em relação ao atendimento em classes ou escolas especiais, com importanteparticipação nessa oferta de estabelecimentos privados de ensino, especialmente de instituiçõessem fins lucrativos ou filantrópicas;

9º – insuficiente assistência financeira e técnica do Poder Público a essasinstituições.

7. APOIO DO PODER PÚBLICO ÀS INSTITUIÇÕES PRIVADAS SEM FINS

LUCRATIVOS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL

Como já vimos, apesar do esforço empreendido, o Poder Público não temreunido condições suficientes para assegurar educação especial a todos os que dela necessitam.Por essa razão, tem firmado parcerias com instituições privadas sem fins lucrativos especializadas e comatuação exclusiva em educação especial, notadamente as Associações de Pais e Amigos dosExcepcionais – APAEs e as Sociedades Pestalozzi. Para isso, está autorizado pela LDB, quedispõe (art. 60) sobre o estabelecimento de critérios, pelos orgãos normativos dos sistemas deensino, para caracterização de tais instituições, para fins de apoio técnico e financeiro pelo Poder Público,diretriz da educação nacional reafirmada, como também já vimos, na meta nº 27 do capítulo deeducação especial do Plano Nacional de Educação. Em conseqüência, pessoal tem sido cedido erecursos públicos repassados a essas organizações não governamentais.

Segundo informações da Federação Nacional das APAEs, constantes dapublicação Mídia e Deficiência, a rede das APAEs conta, hoje, com 2 mil escolas e atende 230 milpessoas, 99% delas com deficiência mental. Conforme a mesma entidade, 70% dos recursos paramanutenção dessas instituições são captados junto à comunidade e 30% são obtidos junto aoPoder Público, dos três níveis de governo, e a organizações não-governamentais.

Os programas suplementares destinados aos educandos do ensinofundamental público, de responsabilidade do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação– FNDE, autarquia vinculada ao Ministério da Educação, programas esses instituídos nosgovernos anteriores, notadamente nos mandatos de Itamar Franco e Fernando HenriqueCardoso, têm também incluído entre seus beneficiários os alunos dessas instituições educacionais.É o caso dos programas da merenda escolar (PNAE), transporte escolar (PNTE), dinheiro diretona escola (PPDE) e programas para aquisição de equipamentos e material didático, formação deprofessores, adaptação arquitetônica de prédios escolares para acessibilidade, informática etc.,mediante a apresentação de PTAs e assinatura de convênios com o FNDE.

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Pelo programa da merenda, a União repassa o valor aluno/dia de R$ 0,13(treze centavos de real) para os alunos do ensino fundamental e pré-escolar das escolas públicas efilantrópicas, no período de 200 dias letivos anuais, e o valor per capita/dia de R$ 0,18 (dezoitocentavos de real) para as crianças das creches, correspondentes a 250 dias por ano. Pelo PNTE,programa do transporte escolar instituído em 1993, o FNDE repassa recursos para aquisição deveículos às Prefeituras e às APAEs. Implantando em 1995, o PDDE consiste no repasse derecursos financeiros diretamente às escolas públicas de ensino fundamental, com mais de 20alunos, e às escolas de educação especial, mantidas por organizações não-governamentaisregistradas no Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS. Contribuindo para a construçãoda autonomia da escola, os recursos do PPDE podem ser utilizados nas seguintes ações: aquisiçãode material permanente; manutenção, conservação e pequenos reparos da unidade escolar;aquisição de material de consumo necessário ao funcionamento da escola; capacitação eaperfeiçoamento de profissionais da educação; avaliação de aprendizagem; implementação deprojeto pedagógico; e desenvolvimento de atividades educacionais. Fixado pelo FNDE, o valorda parcela única anual do PDDE têm sido maior para as escolas das regiões Norte, Nordeste eCentro-Oeste, excluído o Distrito Federal, do que para as das regiões Sul, Sudeste e do DistritoFederal, e maior para as instituições filantrópicas de educação especial do que para as escolaspúblicas.

A atuação do governo federal, até o início do atual governo, parece terfundamento na compreensão de que as instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e comatuação exclusiva em educação especial, desenvolvem atividades de caráter público, embora não sejamestatais, na medida em que prestam o atendimento educacional especializado aos educandosportadores de necessidades educacionais especiais que as redes públicas de ensino não conseguemoferecer.

Entretanto, nos últimos anos, cresceram as dificuldades enfrentadas pelasescolas filantrópicas de educação especial para obterem apoio financeiro e técnico do PoderPúblico. Em primeiro lugar, após o início do funcionamento, em 1998, do Fundo de Manutençãoe Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – Fundef, osEstados, o Distrito Federal e os Municípios passaram a apontar impedimentos para manter oapoio a essas instituições, o que motivou a apresentação de inúmeras proposições à apreciação doCongresso Nacional.

De acordo com as informações constantes ao final deste trabalho, partedessas proposições visam a inclusão das matrículas nas entidades privadas sem fins lucrativos,especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, para efeito da distribuição dosrecursos do Fundef. É o caso da PEC nº 97/2003, do Deputado Pastor Reinaldo (PTB/RS), edos PLs nº 4.676/1998, do Deputado Maurício Najar (PFL/RJ), e dos apensados nº 4.758/1998,do então Deputado Flávio Arns (PT/PR), nº 747/1999, do Deputado Ricardo Izar (PPB/SP), nº4.045/2001, do Deputado Givaldo Carimbão (PSB/AL) e nº 6.052/2002, do então Deputado

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Magno Malta (PL/ES). Esse era também o conteúdo do já citado Projeto de Lei nº 4.853, de2001, do Deputado Eduardo Barbosa (PSDB/MG), aprovado pelo Congresso Nacional e vetadopelo Poder Executivo.

Outra dificuldade apontada pelos Estados, Distrito Federal e Municípiospara manterem o apoio às instituições privadas sem fins lucrativos de educação especial consistiano impedimento de pagar os professores cedidos para atuação no ensino fundamental oferecidopor tais instituições com recursos da parcela do Fundef vinculados à remuneração dosprofissionais do magistério em exercício de suas atividades na rede pública de ensino. Esseproblema foi resolvido pela Lei nº nº 10.845, de 2004, ao dispor que (art. 3º, par. único) osprofissionais do magistério cedidos pelos Estados, Distrito Federal e Municípios às entidadesprivadas sem fins lucrativos que oferecem educação especial, no desempenho de suas atividades,serão considerados como em efetivo exercício no ensino fundamental público, para os fins dodisposto na Lei no 9.424, de 1996 (art. 7º), que instituiu o Fundo de Manutenção eDesenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – Fundef.

Em segundo lugar, a atuação do governo Lula parece estar informada porconcepções do papel do Estado, e de sua relação com a sociedade, e de educação especial quetendem a acrescentar novas dificuldades para a assistência técnica e financeira do Poder Públicoàs instituições privadas sem fins lucrativos de educação especial.

Analisemos iniciativas do atual governo, como a criação de dois novosprogramas de responsabilidade do FNDE – o PAED e o PNATE, ambos instituídos por MedidaProvisória, respectivamente em 21 de novembro de 2003 e 16 de março de 2004. No caso doPAED, com já vimos, trata-se de resposta à repercussão negativa do veto presidencial ao projetode lei aprovado pelo Congresso Nacional que incluía a matrícula das instituições filantrópicas deeducação especial na distribuição dos recursos do Fundef.

Embora nas razões do veto, tenha se utilizado o argumento de contrariar ointeresse público, devido ao impacto financeiro-orçamentário criado para a União, o MECmanifestou-se, à época, pela inconstitucionalidade do Projeto de Lei nº 4.853, de 2001. Em recenteofício encaminhado ao Dep. José Ivo Sartori (PMDB/RS) com informações referentes aos recursosdestinados à educação especial a fim de esclarecer posicionamentos expresso no Manifesto das APAEs, que fazcrítica ao PAED, o Deputado Paulo Pimenta (PT/RS) afirma: A Lei do FUNDEF nº 9424/96, quefixou o valor mínimo per capita a ser destinado aos alunos do ensino fundamental, no seu artigo 2º determina queeste fundo destina-se aos alunos matriculados nas redes públicas municipais e estaduais. Portanto a destinação desterecurso às escolas privadas filantrópicas foi argüida de inconstitucionalidade e beneficiar estas matrículas, fora dasredes públicas, implicaria numa alteração da lei aprovada em 1996.

Primeiro, cabe rebater essa afirmação de inconstitucionalidade, a qual nãose sabe por quem foi argüida. De fato, o art. 60 do ADCT da CF de 1988, com a redação dadapela EC 14 de 1996, não restringe a destinação dos recursos do Fundef ao ensino fundamental

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público. Quem o faz é a Lei nº 9.424, de 1996. Considerando que, como já vimos, a LDB dispõe(art. 60) sobre tratamento diferenciado por parte do poder público às instituições privadas sem finslucrativos, especializadas e com atuação exclusiva em educação especial, entendemos ser viável a alteração daLei nº 9.424, de 1996, para possibilitar a aplicação de recursos do Fundef nessas instituições, semque se possa argüir essa mudança como contrária ao texto da Constituição Federal.

Segundo, cabe lembrar que o texto original da Medida Provisória queinstituiu o PAED propunha que as instituições que viessem a receber recursos pelo novoprograma deixariam de receber o PDDE. Provavelmente, poucos recursos novos seriamacrescidos pelo governo federal ao financiamento dessas instituições de educação especial. Com anegociação no Congresso Nacional, foi eliminado o dispositivo que previa a exclusão do PDDEdas instituições que recebessem recursos do PAED. Entretanto, foi mantido o texto original quenão estabelece vinculação com o valor nacional aluno/ano do Fundef, ou qualquer outro limitemínimo, para a fixação do valor per capita do PAED pelo FNDE. Um cheque em branco, que oPT na oposição não aceitaria. Como vimos no início deste trabalho, enquanto o valor mínimoanual por aluno do Fundef para a educação especial em 2004 corresponde a R$ 564,60 (que sóvale para os cinco Estados onde há complementação da União, sendo maior em todas as outras22 Unidades Federadas), o valor per capita do PAED foi fixado pelo FNDE em R$ 33,50aluno/ano para todo o País. Parece estar subjacente a essa diferença de valor a compreensão deque o Poder Público não se considera responsável pelo financiamento dessas instituições 3.

Por fim, ao tomar essas posições, o governo Lula parece entender oconceito de público de forma restritiva ao estatal, sem estendê-lo a instituições públicas nãoestatais porém não privadas no sentido de lucrativas, como o caso de escolas comunitárias efilantrópicas. Entretanto, é possível levantar a hipótese de que a Presidência da República nãotenha certeza do argumento, defendido pelo Ministério da Educação, da inconstitucionalidade daaplicação de recursos públicos nessas escolas, pois não o utilizou ao vetar o PL nº 4.853, de 2001.

Quanto ao PNATE, o texto original da MP não inclui, entre osbeneficiários desse programa, os alunos das instituições privadas sem fins lucrativos, especializadas e comatuação exclusiva em educação especial, e as emendas apresentadas por parlamentares com esse objetivonão foram incorporadas do Projeto de Lei de Conversão oferecido pelo relator, Deputado GilmarMachado (PT/MG) e aprovado pelo plenário da Câmara dos Deputados no último dia 6 de maio.Lembre-se que, por meio do programa de transporte escolar anterior – o PNTE, de 1993, já serepassavam recursos federais às instituições filantrópicas de educação especial.

3 Para se ter uma idéia da diferença de custo entre o ensino regular e a educação especial, observe-se que o Projeto deLei do Senado nº 390, de 2003, da Senadora Ideli Salvati (PT/SC), líder do PT naquela Casa Legislativa, ao incluir naLei nº 9.424, de 1996, as ponderações relativas ao valor aluno/ano do Fundef, propõe peso 2,00 para a educaçãoespecial e 1,33 para as escolas rurais no ensino fundamental público.

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Analisemos, ainda, posições expressas na publicação Mídia e Deficiência, jámencionada, especialmente no capítulo intitulado Educação – nó a ser desatado.

De acordo com essa publicação, a partir 2004, o MEC passa a desenvolverprograma para implementar a educação inclusiva no sistema de ensino público em 80% dosMunicípios brasileiros até o final do governo Lula.

Segundo o texto, a passagem do modelo da integração (aceitação poralgumas escolas comuns de crianças e adolescentes com deficiência, considerados capazes deacompanhar a maioria dos alunos) para o da inclusão (adequação de todas as escolas comuns àsnecessidades educacionais especiais das pessoas com deficiência) enfrenta resistências,decorrentes não apenas do confronto de diferentes abordagens pedagógicas ou médicas, mastambém devido a disputa por recursos vultosos, pressões por espaço em políticas públicas, luta por manter mercadode trabalho, oposição de interesses corporativos e articulação de poderosos lobbies políticos. Isso porque, além dereceberem doações de empresas e pessoas físicas, as organizações não-governamentais que mantém escolas especiaisarticulam poderosos lobbies para ampliar a já vultosa captação de verbas junto a fontes municipais, estaduais efederais. Segundo o texto, exemplo de seu poder foi a pressão exercida junto ao CongressoNacional para a juridicamente equivocada aprovação do PL nº 4.853, de 2001, e, após o vetopresidencial, para a edição da Medida Provisória nº 139, de 2003.

Segundo a Mídia e Deficiência, a meta do governo federal é que o públicodas escolas especiais se reduza gradativamente a um mínimo percentual de crianças eadolescentes que realmente tenham altíssimo grau de severidade em deficiência, a ponto decomprometer ou dificultar significativamente seu desempenho escolar. De acordo com essapublicação, atualmente o tradicional público de escolas especiais compreende alunos que têmdeficiência tanto com altíssimo nível de severidade quanto com níveis menos grave, não sejustificando, neste último caso, sua permanência nessas escolas.

Ao tratar do debate sobre a educação especial, a Mídia e Deficiênciareconhece que, para alguns estudiosos, a LDB é um marco a favor da educação inclusiva noBrasil, mas, para outros, não é tão favorável assim, na medida em que permite a manutenção declasses e escolas especiais, ainda que extraordinariamente e em caráter temporário. Paraespecialistas identificados com a primeira posição, a instituição da educação especial comomodalidade não a transforma em outra rede de ensino, pois reconhecem ser muito difícil promovera inclusão de algumas crianças e adolescentes, que não têm condições de vida autônoma, e existircasos em que os próprios pais solicitam escolas diferenciadas.

Ainda de acordo com a publicação citada, o MEC não quer que aintrodução da educação inclusiva seja interpretada como uma guerra contra as escolas especiais,pois trabalha para criar uma escola pública inclusiva e transformar a escola privada especial em opção, enão na única alternativa. Conforme depoimento do Presidente da Federação Nacional dasAPAEs, o movimento dessas instituições não é contra a educação inclusiva, mas discorda da

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posição de que todas as pessoas com deficiência podem freqüentar o ensino regular junto aalunos sem deficiência e considera um erro trilhar o caminho da inclusão com olhar simplista.

Na Mídia e Deficiência, são reproduzidas manifestações de especialistas comos seguintes argumentos contrários ao projeto de lei que previa inclusão das APAEs no Fundef:

1º – essa medida geraria ainda mais pulverização dos já escassos recursosdo Fundo;

2º – as escolas públicas comuns recebem recursos apenas de um nível degoverno e de uma pasta ministerial, enquanto as entidades filantrópicas podem apresentarprojetos para os três níveis de governo e recebem verbas de diversos Ministérios, como o daAssistência Social e o da Saúde;

3º – o Fundef tem natureza pública, enquanto as APAEs e entidadescongêneres, ainda que filantrópicas, são instituições privadas que podem, inclusive, cobrar peloserviço oferecido de quem tenha condições econômicas;

4º – o Fundef está destinado ao ensino fundamental, que é um nível deensino, enquanto a educação especial é uma modalidade de educação que, assim como a educaçãode jovens e adultos, deveria contar com recursos em rubrica própria.

Em resposta a esse argumentos, é possível contra-argumentar que:

1º – de acordo com o Censo Escolar de 2003, a matrícula no ensinofundamental nas redes estaduais e municipais correspondia a 31.136.627 alunos, enquanto amatrícula na educação especial, no ensino fundamental, na rede privada, era de 92.443 alunos –portanto, soa estranho falar em pulverização de recursos;

2º – não é verdade que as escolas públicas comuns recebem recursosapenas de um nível de governo, pois escolas estaduais e municipais também recebem recursosfederais, e a educação especial oferecida no âmbito da rede pública de ensino deveria tambémcontar com verbas oriundas de outras funções da ação governamental, que não apenas a daeducação;

3º – as APAEs e entidades congêneres devem ser consideradasinstituições não privadas como as demais, mas de caráter público não estatal, comunitário efilantrópico, e como tal devem prestar contas dos recursos públicos que recebem, assim comosubmeter-se a controle social e a regulamentação pelo Poder Público, inclusive quanto amensalidades eventualmente pagas por quem tenha condições de fazê-lo;

4º – os dados do Censo Escolar do MEC informam a matrícula no ensinofundamental nas instituições privadas de educação especial, sendo, portanto, possível incluir naredistribuição de recursos do Fundef apenas esses alunos, e não todos os que freqüentam essasinstituições – além disso, defender que a educação especial, assim como a educação de jovens e

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adultos, devam contar com recursos específicos, contribui para que essas modalidades deeducação escolar constituam-se de forma paralela à rede regular de ensino, contrariando osprincípios da chamada educação inclusiva e as posições defendidas por vários setores dacomunidade educacional, por exemplo, em relação à necessidade de inclusão no Fundef dasmatrículas de EJA no nível do ensino fundamental.

Por fim, na publicação Mídia e Deficiência, afirma-se que, não por coincidência,o autor do Projeto de Lei nº 4.853, de 2001, o Deputado Eduardo Barbosa (PSDB/MG), e oarticulador de votos no Senado Federal, o Senador Flávio Arns (PT/PR), são ex-Presidentes daFederação Nacional das APAEs. E considera-se o PAED sério golpe em todo o projeto de educaçãoinclusiva, incorrendo em flagrantes contradições com a política estabelecida pelo próprio Ministério da Educação 4.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo exposto até este momento, no presente trabalho, é possível afirmar anecessidade de se ampliar o debate em torno da educação especial no Brasil em geral, e, emparticular, sobre o apoio técnico e financeiro do Poder Público, previsto em lei, às instituiçõesprivadas sem fins lucrativos especializadas e com atuação exclusiva em educação especial.

Esse debate precisa ser aprofundado em suas duas dimensões. Primeira, ocaráter público não estatal, comunitário e filantrópico, dessas instituições educacionais. Segunda, aoposição entre o atendimento educacional especializado pela integração ou inclusão a escolasregulares, em classes comuns, e o atendimento educacional especializado oferecido em classes ouescolas especiais.

Se é verdade que a legislação aponta a preferência pela primeiraalternativa, em determinadas situações é necessário o atendimento educacional de acordo com asegunda.

Se é possível que o financiamento público a entidades como as APAEspossa implicar a retenção nessas escolas especiais de crianças e adolescentes que poderiam seratendidos nas classes comuns do ensino fundamental público, essa possibilidade não devecontribuir para reduzir o montante de verbas públicas destinadas às entidades filantrópicas deatuação exclusiva na educação especial. A solução correta para essa questão deve ser a nãorestrição da assistência do Poder Público ao caráter financeiro, mas sua extensão ao apoio técnicoa essas instituições, ou seja, deve-se articular o repasse de dinheiro público com a supervisãopedagógica a tais escolas pelas respectivas secretarias de educação. Por exemplo, o que já fazemvárias Prefeituras, como a do Município de Porto Alegre, em relação às chamadas crechescomunitárias. 4 Cabe questionar se é apropriado utilizar uma publicação da Fundação do Banco do Brasil para um debate políticocomo esse.

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Se é possível a má aplicação ou mesmo o desvio de recursos públicosdestinados às instituições privadas sem fins lucrativos especializadas e com atuação exclusiva em educaçãoespecial, esses problemas não são privilégio de qualquer instituição social, e só podem serprevenidos e combatidos com controle social sobre o Poder Público e as entidades que delerecebam recursos financeiros.

Definições como essas poderiam ser objeto de uma proposição a seroferecida à apreciação do Congresso Nacional, a qual poderia incluir também dispositivo sobre aparticipação dos pais ou responsáveis no processo de decisão relativa à inclusão de alunos comnecessidades especiais em classes comuns nas escolas regulares 5, objeto do PL nº1.543, de 2003 ,de autoria do nobre Deputado Leonardo Mattos (PV/MG).

5 Lembramos que essa participação já é assegurada pela Resolução nº 02, de 2001, da Câmara de Educação Básica doConselho Nacional de Educação, que “Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica”(arts. 6º e 9º, § 2), e pelo Decreto nº 3.596, de 2001, de ratificação da Convenção Interamericana para a Eliminaçãode Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência.

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MATERIAL CONSULTADO

Legislação educacional vigente

Constituição Federal de 1988 (art. 208, III).

Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que “Estabelece as Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional” (art.s 58 a 60).

Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, que “Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outrasprovidências” (Capítulo sobre Educação Especial).

Lei nº 10.845, de 5 de março de 2004, que “Institui o Programa de Complementação aoAtendimento Educacional Especializado às Pessoas Portadoras de Deficiência, e dá outrasprovidências”.

Proposições em tramitação no Congresso Nacional

1. FINANCIAMENTO

1.1. Inclusão das matrículas nas entidades privadas sem fins lucrativos, especializadas e com atuação exclusiva emeducação especial na distribuição dos recursos do Fundef:

1.1.1. PEC 97/2003 de Pastor Reinaldo PTB/RS1.1.2. PL 4676/1998 de Maurício Najar PFL/RJ

Apensados PL 4758/1998 de Flávio Arns PSDB/PR PL 747/1999 de Ricardo Izar PPB/SP PL 4045/2001 de Givaldo Carimbão PSB/AL (na falta vagas públicas) PL 6052/2002 de Magno Malta PL/ES (todos os casos do art. 213 CF)

Observação: PLS 390/2003 de Ideli Salvati PT/SC – inclui na Lei nº 9424/96 as ponderaçõesrelativas ao valor aluno/ano do Fundef para e educação especial e as escolas rurais no ensinofundamental público

1.2. Pagamento de professores cedidos para essas instituições com recursos do Fundef

1.2.1. PL 5195/2001 de Osmânio Pereira PSDB/MG Apensado ao PL 4676/1998 Superado/atendido pela Lei nº 10.845, de 05.03.2004

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1.3. Subvinculação de recursos para a educação especial (em geral, não apenas para as instituições privadas semfins lucrativos)

1.3.1. PL 3652/2000 de Ronaldo Vasconcellos PFL/MG (no mínimo 10% dos recursos deMDE)

1.3.2. PL 3977/2000 de Vadão Gomes PPB/SP (no mínimo 5% dos recursos de MDE deEstados e Municípios)Parecer favorável ao PL 3652/2000 e desfavorável ao PL 3977/2000 de ProfessorLuizinho PT/SP em 2001 – não apreciado

1.4. Salário-educação para educação especial e indígena no ensino fundamental

1.4.1. PL 3933/2000 de José Carlos Coutinho PFL/RJ (desnecessário)

2. FORMAÇÃO PROFESSORES

2.3. Preparação de todos os docentes para a educação especial

2.1.1. PL 1645/1999 de Pedro Fernandes PSD/MA novos artigos na LDB com disciplinas de braille e linguagem de surdos e mudos na CEC, parecer pela rejeição de Flávio Arns PT/PR (não inclusão de disciplinas no currículo por lei) + indicação na CCJR, parecer pela aprovação de Chico Alencar PT/RJ vai a plenário

2.4. Outros

2.4.1. PL 773/1999 de Alceu Collares PDT/RS (aproveitamento de docentes leigos)2.4.2. PL 3984/1997 de Esther Grossi PT/RS (par, único art. 62 LDB = normal médio e

superior igualmente para educação infantil e séries iniciais do ensino fundamental)

3. RESERVA DE VAGAS EM INSTITUIÇÕES DE ENSINO

3.1. PL 1883/2003 de Leonardo Mattos PV/MG (5% da vagas em estabelecimentos federais de ensino médio e superior para portadores de necessidades especiais) (Apensado ao PL 1643/1999 do Senado Federal – reserva de vagas nas universidades públicas)

3.2. PL 3472/2004 de Nilson Mourão PT/AC (10% das vagas na IES públicas para deficientes físicos) (Também apensado ao PL 1643/1999 do Senado Federal)

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4. OUTROS TEMAS EDUCACIONAIS

4.1. Participação dos pais na decisão de inclusão

4.1.1. PL 1543/2003 de Leonardo Mattos PV/MG (par. 2º ao art. 60 da LDB)

4.2. Merenda com cardápio adequado a portadores de necessidades especiais (como diabetes)

4.2.1. PL 647/1999 de Marcos de Jesus PTB/PE

4.3. Oferta de educação especial

4.3.1. PL 3306/2004 de Carlos Nader PFL/RJ (instalação obrigatória de uma escola pública deEnsino Fundamental e Médio para deficientes visuais e auditivos, em cidades com mais 50.000habitantes.)

5. OUTROS TEMAS

5.3. Estatuto da Pessoa com DeficiênciaPLS 6/2003 e 429/2003 de Paulo Paim PT/RSPL 3638/2000 de Paulo Paim PT/RSPL 5439/2001 de Paulo José Gouvêa PL/RS (Apensado ao PL 3638/2000 de Paulo PaimPT/RS)PL 3219/2004 de Ildeu Araújo PP/SP

5.4. Estágios de estudantes, inclusive da modalidade de educação especialPLS 473/2003 de Osmar Dias PDT/PRPL 4065/1993 do Senado FederalPL 2402/2003 de Gastão Vieira PMDB/MA

5.5. Dia Nacional dos SurdosPL 1791/1999 Eduardo Barbosa PSDB/MG

5.6. Ed. especial como atividade essencial em relação ao exercício do direito de grevePL 2180/1996 de Raquel Capiberibe PSB/AP (Apensado ao PL 401/1991 de Paulo PaimPT/RS)

5.7. Inúmeras outras proposições que tratam, por exemplo, de mobilidade dos deficientes físicos,atendimento preferencial em órgãos públicos, tratamento diferenciado no imposto de rendaetc.

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Documentos do Conselho Nacional de Educação

Parecer nº 17, de 03 de julho de 2001, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional deEducação, com “Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica”.

Parecer nº 04, de 29 de janeiro de 2002, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional deEducação, com “Recomendação ao Conselho Nacional de Educação tendo por objeto aeducação inclusiva de pessoas portadoras de deficiência”.

Parecer nº 23, de 03 de julho de 2002, da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional deEducação, com “Consulta quanto ao reconhecimento da Formação do Professor deOrientação e Mobilidade”.

Resolução nº 02, de 11 de setembro de 2001, da Câmara de Educação Básica do ConselhoNacional de Educação, que “Institui Diretrizes Nacionais para a Educação Especial naEducação Básica”.

Estudos da Consultoria Legislativa

Almeida, Sandra Cristina Filgueiras de. Legislação Aplicável aos Portadores de Deficiência. Junhode 2003.

Bonfim, Symone Maria Machado. Conteúdo da Legislação Relacionada à Pessoa Portadora deDeficiência. Novembro de 2003.

PUBLICAÇÕES

Retratos da Deficiência no Brasil (PPD). Marcelo Neri et. al. Rio de Janeiro: Fundação GetúlioVargas / Instituto Brasileiro de Economia, Centro de Políticas Sociais, 2003. Integra oPrograma Diversidade da Fundação Banco do Brasil.

Mídia e Deficiência. Veet Vivarta (coordenação). Brasília: Agência de Notícias dos Direitos daInfância e Fundação Banco do Brasil, 2003. Integra o Programa Diversidade da FundaçãoBanco do Brasil.