estrutura e evolução da população activa em...

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Mário Cardoso dos Santos Estrutura e evolução da população activa em Portugal O estudo analítico da população activa apresenta-se como ponto de partida para uma melhor compreensão das condições e dos pro- cessos de desenvolvimento, das interacções entre este e os movimentos da mão-de-obra e, eventualmente, das correcções desejáveis. A comparação, no tempo e no espaço, das evo- luções da população total e das várias cate- gorias da população activa, o estudo da for- ma como tem evoluído a população activa com profissão nos grandes ramos da actividade económica; a identificação dos desequilíbrios na mobilização profissional dos diferentes sectores e na distribuição inter-regional da população activa constituem os elementos em que se fundamenta a interpretação crítica dos processos adoptados para o desenvolvi- mento português e dos seus reflexos nas con- dições de vida da população. 1. Introdução A necessidade constante ide produzir e desenvolver as condi- ções de sobrevivência e de existência duma sociedade em fase de desenvolvimento confere à actividade económica uma certa prima- zia nas inovações e transformações básicas. Estas transformações, iniciadas na actividade produtora, repercutem-se a prazo mais ou menos longo em toda a estrutura social, visto que esta se caracte- riza por uma estreita interdependência entre todas as partes que a compõem e, por conseguinte, as modificações iniciadas numa delas transmitem-se sempre às restantes, havendo apenas desfazamentos e diferenças de intensidade nas respostas de uma e de outras, con- N. do A. — Estudo subsidiado pelo Instituto de Alta Cultura.

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MárioCardoso

dosSantos

Estrutura e evoluçãoda população activaem Portugal

O estudo analítico da população activaapresenta-se como ponto de partida para umamelhor compreensão das condições e dos pro-cessos de desenvolvimento, das interacçõesentre este e os movimentos da mão-de-obrae, eventualmente, das correcções desejáveis.A comparação, no tempo e no espaço, das evo-luções da população total e das várias cate-gorias da população activa, o estudo da for-ma como tem evoluído a população activa comprofissão nos grandes ramos da actividadeeconómica; a identificação dos desequilíbriosna mobilização profissional dos diferentessectores e na distribuição inter-regional dapopulação activa constituem os elementosem que se fundamenta a interpretação críticados processos adoptados para o desenvolvi-mento português e dos seus reflexos nas con-dições de vida da população.

1. Introdução

A necessidade constante ide produzir e desenvolver as condi-ções de sobrevivência e de existência duma sociedade em fase dedesenvolvimento confere à actividade económica uma certa prima-zia nas inovações e transformações básicas. Estas transformações,iniciadas na actividade produtora, repercutem-se a prazo mais oumenos longo em toda a estrutura social, visto que esta se caracte-riza por uma estreita interdependência entre todas as partes quea compõem e, por conseguinte, as modificações iniciadas numa delastransmitem-se sempre às restantes, havendo apenas desfazamentose diferenças de intensidade nas respostas de uma e de outras, con-

N. do A. — Estudo subsidiado pelo Instituto de Alta Cultura.

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soante a respectiva natureza e a intensidade das ligações existentescom o sector em que se processou a impulsão.

Como os resultados do desenvolvimento não são homogéneosem todos os sectores da actividade económica — enquanto uns secomportam como impulsionadores, outros, por não acompanharemo ritmo e o sentido adoptados, funcionam como retardadores damudança social — as assimetrias criadas originam contradições,tensões e pontos de ruptura na evolução estrutural que, por envol-verem as relações entre as diferentes camadas sociais e entre estas1

e as instituições, sãoi fontes de problemas que condicionam o pró-prio desenvolvimento.

As transformações e as inovações na actividade económicaapoiam-se numa base fundamental constituída pelo potencial téc-nico, intelectual e social da população activa, na medida em quetodos os actos económicos se traduzem em termos de número depessoas com determinadas aspirações e qualificações a exercer umacerta actividade.

Uma vez reconhecida a importância que assumem os fenóme-nos de população na caracterização da vida social, o estudo analí-tico da população activa apresenta-se como ponto de partida parauma melhor compreensão das condições e dos processos de desenvol-vimento, das interacções entre este e os movimentos da mão-de^-obra e, eventualmente, do sentido das correcções desejáveis. Defacto, o processo de criação de novas actividades e de modificaçãodas tradicionais, com as consequentes alterações nas concepções,nos estilos e nos níveis dè vida, propicia a criação de novos valorese padrões para a sociedade (ou, pelo menos, para algumas das suaspartes) ao actuar sobre a mobilidade social, a composição e a dinâ-mica da população, a estrutura profissional, etc.

O presente trabalho pretende ser um contributo para o diag-nóstico objectivo do processo de desenvolvimento português, sobum ponto de vista que não é estritamente económico e que tem sidoaté agora pouco adoptado entre nós: trata-se de procurar identifi-car, num passado recente, a dinâmica das interacções entre a estru-tura económica e a estrutura da população activa (no Continente).

Dentro desta orientação, começaremos por analisar compara-tivamente, no tempo e no espaço, as evoluções da população totale da população activa, em seguida essa análise será dissociada aoâmbito sectorial através do estudo crítico da evolução da populaçãoactiva com profissão nos grandes ramos da actividade económica— agricultura, indústria e serviços — e, depois, será concretizadacom maior pormenor, no sector secundário, dada a sua reconhecidaposição de sector motor do nosso desenvolvimento económico. Final-mente, analisiar-se-á a evolução das migrações espaciais da popu-lação activa profissional adoptando também uma perspectivaregional que, nesta como noutras questões do desenvolvimentoportuguês, nos parece essencial para uma mais concreta identifi-

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cação dos conhecidos desequilíbrios na generalização do progressoa todo o espaço nacional.

A considerar cumpridos os primeiros objectivos que nos pro-pusemos de compilar alguns elementos fundamentais sobre a po-pulação activa portuguesa e de, através da sua análise crítica emtermos sócio-económicos, proceder ao diagnóstico sumário da suaevolução recente, deverá este trabalho ser encarado como ponto departida para a elaboração de previsões a longo prazo sobre a evo-lução dos movimentos naturais da população activa e da respectivarepartição profissional, assim como para o estudo das correcçõesa introduzir.

2. População total e população activa: evolução e repartição porsexos; taxas de actividade

O conhecimento estatístico da evolução passada da populaçãoactiva não apresenta, em princípio, dificuldades de vulto pois podeser obtido através dos recenseamentos que incluem grande númerode elementos sobre a actividade da população* Apesar da definiçãode população activa ser bastante delicada, nomeadamente no querespeita à definição do trabalho feminino, do trabalho a tempoparcial e dos desempregados e apesar dos critérios que presidemà definição de vários elementos que a compõem variarem ao longodo tempo, a sua análise permite tirar algumas conclusões válidasdesde que seja feita na generalidade e se tenha em conta o graude imprecisão dos elementos em que aquela se fundamenta1.

Os dados globais referentes à evolução da população portu-guesa total e activa constam do Quadro I, no qual se consideraque os desempregados procuram activamente trabalho e que, porconseguinte, podem ser incluídos na população activa.

1 Tendo perfeita consciência de que a análise que se vai efectuar deixarámal explicitados ou em claro alguns aspectos cuja importância para objectivosespecíficos motivará com certeza estudos ulteriores sobre a matéria, resol-veu-se apreíséntar os números colhidos nos volumes do VIU, IX e X recensea-mentos gerais da população tal como foram obtidos, sem qualquer arredonda-mento. Pensa-se que, deste modo, se evitará o penoso trabalho de compilaçãoe tratamento de dados a que fomos obrigados a todos aqueles que venham adebruçar-se sobre estes mesmos números com outros objectivos.

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População total ê activa. Número de pessoas activas por 1000 pessoasda população total (taxa de actividade)

QUADRO 1

POPULAÇÃO TOT1ALE ACTIVA

População total

População activa

Taxa da actividadeíem°/no)

1940

Vale*

7185143

4 984 433

694

índice

100

100

100

1950

Vate

7 856 913

5 681 801

723

ínidioe

109

114

104

1960

Valor

8 292 975

5 954 457

718

índice

115

119

103

Note-se que um primeiro factor de erro que se introduz naanálise deriva do facto de, em 1960, os valores considerados dize-rem respeito à população residente e não à população presente comonos outros anos. Como os dados sobre a população activa nestecenso se referem à população residente, para <a determinação da taxade actividade preferiu-se tomar o valor correspondente da popu-lação total, se bem que, para a análise cronológica da evolução, estaatitude corresponda à sobrevalorização da evolução havida entre1950 e 60, na medida em que a população residente é superior àpopulação presente.

Algumas observações decorrem imediatamente destes valores:

— a taxa de actividade assim determinada, apesar de sofrerum pequeno decréscimo entre 1950 e 1960, pode parecerelevada em comparação com valores similares frequente-mente citados para outros países2, facto que resulta directa-mente de se terem considerado na população activa os acti-vos com profissão, os activos com ocupação e os desem-pregados;

2 Poderão, por exemplo, citar-se os seguintes valores de taxas de activi-dade que Claude VIMONT apresenta no seu livro La population active dans lemonde, P.U.F., Paris, 1960, págs. 14, 15, 16 e 17: França (1954) 482; Ho-landa (1952) 385; Inglaterra (1956) 484; E.U.A. (1955) 401. De notar que,comparando estas taxas de actividade com aquelas que se obtêm para Por-tugal entrando apenas em conta com os activos com profissão e ots desempre^gados (valor mais próximo do que é normalmente utilizado no estrangeiropara cálculo de taxas de actividade), a situação relativa do nosso País ficamais correctamente definida: para 1940, 50 e 60, os valores das taxas de acti-vidade passam a ser, respectivamente, 399, 394 e 386.

4U

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GRÁFICO I

Evolução da repartição da população total

1940 195O 1960

População total

População activa (deduzidos os desempregados)

População activa com profissão

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— o aumento da população activa é superior ao da popula-ção total.

Deparamos, pois, com dois indicadores de desenvolvimentoeconómico e social — a sociedade participa com uma intensidaderelevante e cada vez mais activamente na criação dos meios neces-sários ao melhoramento das suas condições de vida—que, todavia,só poderão ser considerados significativos desde que, pormenori-zando um pouco mais a análise, vierem a ser confirmados poroutros que se subordinem a critérios menos amplos.

Desdobrando a população activa nas três categorias que a com-põem, obteremos os resuilltados indicados no Quadro II e conden-sadamente representados no Gráfico I que nos permitem jáalguma pormenorização nas observações que se acabam de fazercom base nos indicadores acima mencionados-

População activa com ocupação e com profissão. Taxas de actividade

QUADRO II

POPULA&ÂO ACTIVA

População activa com ocupação ...1) Taxa de actividade (em °/oo) ...

População activa com profissão ...2) Taxa de actividade (em %<>) ...

Total (1 + 2)3) Taxa de actividade (em °/00) ...

4) Desempregados

1940

Valoop

2 115 650294

2 746 705382

4 862 355676

122 078

índi-ce

100

100

100

100

1950

Valor

2 588 439329

3 005 110382

5 593 549711

88 252

indi-ca

122

109

115

72

1960

Valor

2 751 369332

3 126 245376

5 877 614708

76 843

Índi-ce

130

114

121

63

Com efeito, os valores indicados neste quadro mostram-nosque, apesar de ter diminuído o número de desempregados que osrecenseamentos nos fornecem, a forte proporção em relação ao totale o substancial aumento da população activa anteriormente cons-tatados se devem fundamentalmente às pessoas com ocupação emenos às que possuem uma profissão e que estas, no decorrer dosvinte anos considerados, tiveram mesmo a sua taxa de actividadereduzida de 382 para 376. De notar ainda que o índice de 1960

U6

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para o aumento da população activa com profissão (114) acom-panha sensivelmente o da população total (115).

Parece, pois, lícito afirmar-se desde já e apesar da análisese situar ainda num nível muito global, que, durante o períodoconsiderado, o chamamento dos sectores mais progressivos da acti-vidade económica — nos quais se concentra a maior parte dos acti-vos com profissão — parece não ter sido suficiente para absorvero aumento que apresenta a população activa considerada na suatotalidade.

Além da decomposição da população em activos com ocupação,com profissão e desempregados, um outro critério de repartiçãoque pode fornecer algumas informações primárias sobre as carac-terísticas estruturais da população activa é aquele que diz respeitoao sexo. A repartição da população activa segundo o sexo — nor-malmente considerado um critério natural para a atribuição dasactividades produtivas — corresponde de facto a um fenómenosocial de importante significado. Com efeito,, o sexo, salvo algunscondicionalismos específicos como a maternidade ou a impossibi-lidade de execução pela mulher de alguns trabalhos pesados, nãoé um factor determinante da actividade profissional. Outros fac-tores tais como a imagem atribuída à mulher pela sociedade, asrestrições que lhe são impostas em muitos campos pela próprialegislação, os encargos que representam a educação dos filhos,a condução da vida doméstica, etc, são efectivamente aqueles quelimitam a possibilidade que é oferecida à mulher de exercer umaactividade profissional.

Salvo raras excepçiõesi, tais como K> trabalho de secretariado,de dactilógrafa, de enfermeira ou na indústria têxtil, as taxas deactividade feminina são muito inferiores às masculinas. Devesseeste facto a condicionalismos de ordem social que só são alteradosà medida que os padrões tradicionais vão progressivamente dandolugar a estilos e meios de vida próprios de uma sociedade modernae se criam, assim, novas possibilidades em diferentes campos daactividade social (cultural, económica ou política), possibilidadesque são apenas potenciais em estádios de insuficiente desenvolvi-mento e que só através deste têm possibilidade de se definir comonecessidades efectivas.

Poderá, pois, afirmar-se que baixas taxas de actividade femi-nina— nomeadamente na população activa com profissão — sãoindicadores válidos da permanência de padrões tradicionais noestilo de vida da sociedade ou, pelo menos, que o desenvolvimentoque se pode constatar nalguns sectores ou regiões não é suficien-temente generalizado para que a sua incidência se torne significa-tiva ao nível da estrutura global da população activa.

Dos elementos relativos à repartição por sexo da populaçãoportuguesa que constam do Quadro III pode conclmr-se que,apesar de, no total, a população feminina apresentar um valor

W

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constantemente superior ao da masculina, as mulheres activas comprofissão representam uma percentagem relativamente baixa nototal dos activos com profissão de ambos IOS sexos (vide Grá-fico II). Esta percentagem, que de 1950 para 1960 apresenta mes-mo um decréscimo considerável, pode, contudo, resultar, essencial-mente, de imprecisões nos critérios de classificação estatística.

Repartição da população por sexo

QUADRO III

POPULAÇÃO TOTAL,E ACTIVA

1940

Vatotfes

1960

Valioriee

1960

Valoras

População totalMulheresHomens

População activa c/ocup. e c/prof.MulheresHomens

População activa c/profissãoMulheresHomens

7185 1433 733 3613 451 782

1005248

7 856 9134 078 0953 778 818

1005248

8 292 9754 321 5693 971 316

1005248

4 862 3552 736 3822 125 973

1005644

5 593 5493 030 7612 562 788

1005446

5 877 6143 270 8692 606 745

1005644

2 746 705626 861

2 119 844

1002377

3 005 110700 936

2 304 174

1002377

3 126 245584 240

2 542 005

1001981

Comparando também o grau de participação da mulher por-tuguesa na actividade profissional!/ com valores idênticos de outrospaíses através da percentagem de mão-de-obra feminina em relaçãoà população feminina total, pode ajuizar-se da posição relativaocupada pelo nosso país no que respeita a este factor, tendo ematenção que o valor retido para Portugal diz respeito a 1960 aopasso que os de todos os outros países3 se referem a anos anterioresque se indicam:

Alemanha (República Federal) (1954) 34,9Itália (1954) 25,9Suécia (1950) 23,2Estados Unidos (1950) 21,8Bélgica (1947) 19,0PORTUGAL (1960) * 13,5Espanha (1&50) 11,8Brasil (1950) - ,. 9,6México (1950) 8,7* (Em 1950: 17,1).3 Fonte: La population active dans le monde, B.I.T., Genève, 1956.

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Deverá, aliás, notar-se que a comparação entre as taxas deactividade feminina dos vários países indicados permite apenasilações muito imprecisas visto que as diferenças que aparecem naparticipação da mulher na vida económica se devem também à for-ma como são fornecidas as informações sobre a população e à dis-crepância entre definições adoptada em matérias de classificaçãoestatística.

GRÁFICO II

Repartição homens-mulheres na população activa com profissão

100

8 0 -

6 0 -

4 0 -

2O-

1940 1950 1960

Homens Mulheres

No entanto, todas estas limitações não são suficientes pararetirar significado a este indicador de desenvolvimento socio-eco-nómico que, por isso mesmo, nos parece que pode ser consideradopara caracterizar globalmente a estrutura da população activaportuguesa.

Como já se afirmou anteriormente em termos gerais, a fraca

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participação da mulher im actividade produtora constitui normal-mente uma característica de situação de desenvolvimento poucomarcado et além disso, um factor de retardamento da própriaevolução.

3. Repartição da população activa com profissão por grandessectores de actividade

O desenvolvimento, na sua condição de profunda mudançasocial, implica uma série de transformações estruturais, de maiorou menor amplitude conforme o sector de que se trate, muitas dasquais têm a sua origem na emergência de uma série de novas acti-vidades e no acréscimo, decréscimo ou mesmo anulação de outras.O processamento dessas transformações implica sempre a apariçãode desequilíbrios e de tensões que são algumas das consequênciasde novas formas de estratificação social, de padrões de vida dife-rentes e de alterações no tipo ou, pelo menos, na forma como sãoencaradas as relações entre grupos socialmente representativos.

Por isso, a amplitude e a orientação das transformações pro-cessadas com base no desenvolvimento económico de uma sociedadepodem ser detectadas com alguma nitidez através da análise dinâ-mica da repartição dos activos com profissão — assimilados aqui,em sentido restrito, à mão-de-obra do País —pois são estes ele-mentos da população que actuam mais directamente sobre os facto-res de desenvolvimento e, simultaneamente, sofrem mais intensa-mente o seu impacto.

Uma primeira aproximação para a análise da evolução estru-tural da actividade produtora em termos de população pode fazer-seatravés da repartição da população activa com profissão por gran-des sectores de actividade económica — agricultura, indústria eserviços—análise que, em termos puramente económicos, é pra-ticamente considerada clássica.

Antes de prosseguir, haverá, porém, que precisar a definiçãodos três sectores que adoptaremos ao longo de todo o trabalho,salvo indicação especial:

— o sector «primário» ou «agrícola» compreende a agriculturapropriamente dita, a silvicultura, a pecuária, a caça e apesca.

— o sector «secundário» ou «industrial» compreende as indús-trias extractivas e transformadoras, a construção civil eobras públicas e a produção e distribuição de electricidade,gás e água.

— o sector «terciário» ou «dos serviços» compreende o comér-cio, os seguros, os transportes, as comunicações e os servi-ços públicos e privados.

A50

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Os elementos que constam do Quadro- IV estão repartidosde acordo com esta classificação e apresentam-se sob a forma devalores absolutos e de percentagem de cada sector em relação aototal da população activa com profissão. Os valores que constamdeste mesmo quadro estão ainda representados nos gráficosIII e IV.

Repartição da população activa com profissão (masculina e feminina)por grandes sectores de actividade

QUADRO IV

POPULAÇÃO ACTIVA

POR SECTORES

Activos com profissão ....

Agricultura, silvicul-tura, caça e pesca

Indústria

Serviços

1940

Número

2 746 705

1 355 115

559 371

832 219

%

100

49,3

20,4

30,3

1950

Número

3 005 110

1 452 938

748 936

803 236

%

100

48,4

24,9

26,7

1960

Número

3 126 245

1 337 450

922 516

866 279

%

100

42,8

29,5

27,7

As tendências insicritas no Quadro IV e no Gráfico IIIevidenciam-nos uma evolução cujo sentido é idêntico ao damaior parte dos países industrializados ou em vias disso: de-créscimo do emprego na agricultura quer em valor relativo (entre1940 e 1950) quer em valor absoluto (entre 1950 e 1960) e aumentoconsequente nos sectores da indústria e dos serviços.

451

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GRÁFICO IH

Evolução da repartição da população activa com profissãopor grandes sectores de actividade

1940 1950 1960

J+52

Agricultura , Silvicultura , Pecuária t Pesca

induilrl.

Serviços

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GRÁFICO IV

Repartição percentual da população activa com profissãopor grandes sectores de actividade

1940 1950 1960

Agricultura, Silvicultura , Pecuária , Pesca

Industria

Serviços

Í5S

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Todavia, para além da constatação de que o nosso País tam-bém acompanha a tendência geral na evolução das migrações inter--sectoriais, haverá que tomar em consideração, por um lado o ritmoa que se processa o fenómeno e por outro as repercussões que ele«propiciará» na estrutura da sociedade portuguesa.

O ritmo com que se vem modificando a repartição da popula-ção activa com profissão por grandes sectores de actividade nonosso País pode ser avaliado quer por comparação com o que setem passado noutros países no mesmo período quer, internamente,medindo a intensidade dessas modificações.

No que respeita ao primeiro ponto, o Quadro V mostra-nosque, em relação aos países industrializados que neles figuram,a evolução da repartição por grandes sectores no nosso País temsido sensivelmente mais lenta. No entanto, uma parte do desfaza-mento1 que se constata naquele quadro é susceptível de ser impu-tada ao facto de os valores para Portugal se referirem à popu-lação activa com profissão que pode considerar-se, em princípio,

Evolução comparada da população activa em Portugal e em algunspaíses europeus— (percentagens)

QUADRO V

PAÍSES

PORTUGAL1

PrimárioSecundárioTerciário

ITÁLIA 2PrimárioSecundárioTerciário

FRANÇA2

PrimárioSecundárioTerciário

ALEMANHA (República Federal) *PrimárioSecundárioTerciário

1940

492030

482824

373033

274132

1950

482527

423226

283636

244333

1960

432938

323

38

30

263

3836

I73

48

35

Fiontos para ois valoires relativos ao® outros países: Traité de Sociologie du Tra-w%h FRIEDKA]Sr-]srAVII,L,B, A. Colin, Paris, 1961, vo. 1, p. 220.

1 Valores relativos à evolução da população activa com profissão.2 Valores relativos à evolução da população activa.3 Valores relativos a 1959.

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menos motivada a migrações intersectoriais do que o total dapopulação activa a que se referem, por falta de melhor, os valoresconsiderados para os outros países. As diferenças na evolução sãoporém suficientemente significativas para que se possa concluirpela existência de uma maior lentidão na evolução observada parao nosso País, quando comparada com a de países industrializados-

No que respeita ao segundo ponto: ritmo de evolução relativada população activa com profissão sob um ponto de vista pura-mente interno, traduzido em índices:

1U0-50 1950-60

Total da população 100 100Total da população activa c/profissão ... 100 99

Primário 98 87Secundário 122 117Terciário 97 102

ou em valores absolutos das modificações estruturais verificadasentre 1940 e 1960:

FEHÍODOS

1940 a 50

1950 a 60

1940 a 60

Agricultura,Silv., Peaca

+ 97 823

—115 488

— 17 665

Indústria

+ 189 565

+ 173 580

+ 363 145

Servidos

— 28 983

+ 63 046

+ 34 063

TOTAL

+ 258 405

+ 121138

+ 379 543

verificamos que já entre 1940 e 1950 se notava uma tendênciapara a rarificação relativa da mão-de-obra rural que se veioa acentuar no decénio seguinte e que, nos dois períodos, é à in-dústria que pertence a maior quota parte do chamamento demão-de-obra, com um ritmo francamente superior ao do aumentoda população total. O sector dos serviços, apesar de apresentaruma regressão entre 1940 e 1950 4, também ultrapassa no decénioseguinte o ritmo de expansão da população total com uma intensi-dade que, no entanto, se apresenta francamente menor que a daindústria.

Se bem que, como já se constatou anteriormente, a profissio-nalização da população total se revele pouco acentuada, é evidenteo declínio do potencial humano ligado à agricultura (menos 115 500activos com profissão só entre 1950 e 60) em contrapartida do de-senvolvimento da actividade ligada à industrialização (mais363 150 entre 1940 e 60) que, por sua vez, larrasta atrás de si o sec-

4 Veremos adiante qual a razão deste facto.

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tor àm serviços* apesar da resposta deste ao impulso dinamizador SÔfazer com um certo desfazamento (mais 34 000 nos dois decé-nios) 5.

Mesmo situando-nos a um nível de análise que apenas se refereao potencial humano globalmente integrado, pela sua actividadeprofissional, em cada um dos grandes sectores que se têm vindoa considerar, desenha-se já com alguma nitidez uma progressivaafirmação das actividades mais modernas, apoiada nas transfor-mações empreendidas pelo secundário e pelo terciário^ Com efeito,a importância destes últimos como pólos de absorção da maiorparte da população activa com profissão e, portanto, a possibili-dade de se tornarem factores de impulsão de toda a actividade eco-nómica já se começa a desenhar com uma nitidez perceptível noperíodo de 1950 a 60.

Todavia, entrando também em consideração com as duas cons-tatações anteriormente feitas de que:

—o aumento da população activa com profissão tem apenasacompanhado o da população total;

— a evolução da distribuição da população activa com profis-são pelos vários sectores de actividade pode considerar-sepouco vincada em comparação com a que se verificou empaíses industrializados na mesma época;

poderá concluir-se — pelo menos em termos gerais—que a ten-dência para a modernização, de que se fala acima e que já sedesenha com alguma nitidez através das modificações no quanti-tativo da população activa com profissão em cada um dos grandessectores de actividade, não tem tido uma intensidade suficientepara poder conduzir, de uma forma, digamos, «natural», a trans-formações suficientemente importantes para alterar as caracterís-ticas básicas da estrutura ocupacional da população portuguesa.

Tentando pormenorizar um pouco mais a análise já efectuadaaté este momento, vamos analisar seguidamente, com a ajuda doselementos que constam do Quadro VI, como se comporta no períodoconsiderado a distribuição da população activa com profissão pelasprincipais actividades colectivas incluídas em cada um dos grandessectores primário, secundário e terciário.

Dessa análise destacaremos apenas algumas observações com-plementares que nos permitirão definir algumas facetas interes-santes de que se revestem as tendências globais já identificadas.

A diminuição do número de pessoas activas com profissãona agricultura, silvicultura e pecuária entre 1950 e 1960 é ainda

5 Note-se que o desfazamento do ritmo de desenvolvimento do terciárioem relação ao do secundário é de facto consideravelmente menor do que aqueleque corresponde à tomada em consideração deste valor global para o acréscimodo primeiro nos dois decénios. Veremos adiante o porquê desta afirmação.

456

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Evolução da repartição da população activa com profissãopor actividades colectivas

QUADRO VI

ACTIVIDADES

TOTAL DA POPULAÇÃOPOPULAÇÃO ACTIVA C/PROFISSÃO

A. Agricultura, Silvicultura, Pecuária,pesca

Al Agr., Silv. e Pecuária<HomensMulheres

A2 PescaHomensMulheres

B. IndústriaBI Ind. Extractivas

HomensMulheres

B2 Ind. Transformadoras i«HomensMulheres

B3 C. Civil e Obras Públicas ...HomensMulheres

C. ServiçosCl Transp. e Comunicações

HomensMulheres

C2 Comércio e SegurosHomensMulheres

C3 Administração Pública e Ser-viços de Interesse GeralHomensMulheres

C4 Serviços pessoais, domésticose outrosHomensMulheres

1940

7185 1432 746 705

1355 1151322 9191106 864

216 05532 19631408

788

559 37118 55417 4321122

419 067296 717122 350121 750120 270

1480

832 2198011272 3807 732

172 742145 01727 725

162 727131 86930 858

416 6382

197 887218 751

1950

7 856 9133 005 110

1 452 9381 413 2001177 868

235 33239 73838 951

787

748 93624 86523 236

1629578 996416 854162 142145 075144 072

1003

803 236102 29394 792

7 501216 219184 28631933

189 471145 02244 449

295 25379 093

216 160

1960

8 292 9753 126 245

1 337 4501 297 2831192 880

104 4034016739 419

748

922 51625 93225153

779682 610515 751166 859213 974212 297

1677

866 279116 507106 125

10 382255 2573

216 05639 201

226 294156 71769 577

268 22177 607

190 614

1 Inclui indústrias relacionadas cem os serviços públicos: produção et distribuiçãode electricidade e gás; distribuição de água.

2 Obtido por diferença no quajdno n.° 23 do volume I do VIII recenseamento geralda população: hospedagem, serviços domésticos e similares .+ actividades ignoradas

e mal definidas — população; activa com «ocupação.3 Inclui bancos « op. stobtfe imóveis.

457

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ligeiramente superior à que se apresentou para o total do sectorprimário no mesmo período, visto que o sector da pesca, apesar demodestamente, conseguiu aumentar o seu potencial de activos comprofissão. Este facto, apesar da sua pequena importância quantita-tiva, vem ainda reforçar o grau de rarificação do potencial humanoligado à agricultura na medida em que é o sector sobre o qual recaitoda a diminuição anteriormente registada.

Do aumento total dos efectivos trabalhando profissionalmenteno conjunto das indústrias, cerca de 73 % (263 543 em 363 145)correspondem à indústria transformadora, o que vem confirmara reconhecida posição de liderança que lhe é habitualmente confe-rida no nosso desenvolvimento.

No que respeita ao sector dos serviços, o fraco aumento dapopulação activa com profissão que nele se constatou, e mesmo adiminuição no decénio de 1940 a 1950, são fundamentalmente devi-dos à rubrica serviços pessoais, domésticos e outros, em que seregista uma diminuição muito apreciável. Apesar de, em parte,esta diminuição dever resultar de alterações na classificação esta-tística adoptada nos vários recenseamentos, a importância do de-créscimo é suficiente para se poder considerar que esta categoriade terciários está em franco declínio, o que, mesmo dentro das mo-destas proporções em que se tem processado a «profissionalização»da populiaçãio portuguesa e, por conseguinte, a promoção social aque ela normalmente dá origem, é um indicador positivo.

Constata-se assim que, à excepção dos serviçfòs pessoais e do-mésticos, todas as outras actividades colectivas que se incluíramno sector dos serviços viram os seus profissionais consideravel-mente aumentados entre 1940 e 1960, cabendo ao comércio, segurose banca a posição mais destacada no que respeita ao valor absolutodo aumento verificado. Este aumento é acompanhado pela adminis-tração pública e serviços de interesse geral, mas com um desfaza-mento sensível, como se pode verificar pelos seguintes valores:

Transportes e comunicaçlões + 36 395Comércio, seguros, banca + 82 515Adm. pública e serviços de int. geral + 63 567

Total + 182 477

4. Evolução da população activa com profissão no sector secun-dário

A análise global da repartição da população activa com pro-fissão pelos grandes sectores da actividade económica revelou-nosmais uma vez que, dentro das escalas adequadas às coordenadasportuguesas, aquele em que o emprego aumentou de forma mais

Í58

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importante foi o secundário. Este aumento verifica-se aliás, querem valor absoluto (mais 365 145 activos com profissão entre 1940e 60) quer em valor relativo (para 100 de evolução da populaçãototal entre 1950 e 60, a indústria apresenta um valor de 117 nomesmo período).

Evolução da população activa com profissão (masculina e feminina)na indústria

QUADRO VII

INDÚSTRIAS

Extractivas

Alimentação e bebidasTabacoTêxteisCalçado, vestuário e têxteis em obra ...MadeiraMobiliárioCortiçaPapel, cartão e artes gráficasCoiros e pelesQuímicasMinerais não metálicosMetalurgia, construção de máquinas

e de material de transporteElectricidade, gás, água e serviços de

saneamentoDiversas

Construção e obras públicas

imo

18 5541

60 50122 357

62 0913

119 940^

i 38 690

1719312 4665 3057 6215

15 692

56 598 6

5 48015133

121 750

1950

24 865

713781963

99 695123 0785167415 97520 75717 714

5 94910 386 725 525

81934

9 69343 275

145 075

1960

25 932

67 6441741

110 874128 30049 265 s25 5472140626 463

6 41730 39538 947

140 568

1410620 937

213 974

1 Não inclui «carptação e exploração de águas termais, minerais e dei mesa» in-cluída nas indústrias de alimentação e bebidas.

2 Inclui 191 lagareiros de óleos vegetais pertencentes à rubrica «óleos e gordurasalimemtídias» que no ciemso de 1940 eetâo classificados nas «indústrias químicas» na ru-bi ica «fabricação de óleos e produto? animais ou vegetais».3 Inclui fabricação de fibfe; fabricação de tecidos; indústrias relacionadas c/ofabrido de fios de tecido®; fabricação die artigos e tecidos de malha; fabricação de outrosartigos têxteis ou análogos; indústrias têxteis mistas ou mal definidas dias quais seretiraiam 4969 considerados coma pertencentes à rubrica «fabricação d© têxteis emobjra co*n exclusão dio vestuário» (ver nota seguinte).4 Inclui fabricação <ie feltro®; chapelaria; fabricação de calçado; fabricação deoutros artigos de vestuário; e 4969 activos c/profissão retirados da rubrica «indústriiastêxteis mistas e mal definidas» que se consideram como pertencentes à rubrica «fabri-cação de têxteis em obra cojm exclusão do* vestuário». Para esta correcção) admátiu-seque a proporção de activos c/pifc>íissão; na fabfricaçao de têxteis emi obra e c/ecsolusãodo vestuário» em relação aos activas c/profissão nas «indústrias têxteis n. d.» eraidêntica em 1940 e 196Õ.

5 Não inclui a indústria da borracha que no censo de 1940 foi considerada nastji dfrva6 Inclui: metalurgia; serralharia; latoaria; fabricação de artigos de arame; cons-

trução' e Deparação de barcos metálicos; construção e reparação de bancos nãoi metá-licos; oficinas de artigos para uso eléctrico; indústrias diversas, mistas» e mal definidasdos artigo^ eu trabalhos não edéctrijcoe em metal; cutelaria; oficinas de veículos me-tálicos.

7 Não inclui a «fabricação de artigos de borracha» que no censo de 1950 foi con-siderada nas indústrias diversas,

8 Inclui embalagens de madeira.

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Esta posição de hegemonia do sector secundário na «mobiliza-ção profissional» não será porém acompanhada por todas as indús-trias que o compõem — não é possível nem desejável que se veri-fique um paralelismo estrito entre a evolução de cada um delese a evolução global, o que importa é o sentido dos desequilíbrios— e, por conseguinte, convém analisar as divergências que se veri-ficam nas respectivas evoluções. É este, aliás, um dos processosmais frutuosos para detectar6, quais as tendências na ocupaçãoprofissional neste sector que se apresenta como motor do desenvol-vimento português.

Conhecidas estas tendências, não só se disporá de mais umelemento significativo para a compreensão objectiva das conse-quências sociais do desenvolvimento industrial, tal como se pro-cessou entre nós no período em estudo, como se poderão tambémcriar a bases indispensáveis para uma abordagem do problemaem termos previsionais.

Uma primeira análise que se nos afigura ter bastante interessee que pode ser imediatamente empreendida a partir dos elementosbásicos que constam do Quadro VII, diz respeito à evolução daocupação profissional por grandes grupos de indústrias. De facto,esta análise pode dar-nos imediatamente uma ideia da importânciarelativa que tem assumido a «mobilização profissional» em doistipos de indústrias fundamentalmente distintas sob o ponto de

Percentagem de activos com profissão em sectores modernose em sectores tradicionais

QUADRO VIU

INDÚSTRIAS

Total das indústrias

Alimentação, bebidas, taba-cos, têxteis, calçado, vestuárioMadeira e cortiça

Metalúrgicas, construção demáquinas e de material detransporteQuímicas

Construção Civil e Obras Pú-blicas

Outras indústrias (extracti-vas e transformadoras)

1940

índice

cc

>

\

H

%

100

43,78,3

10,11,4

21,7

14,6

1950

ínidice

134

121155

145136

119

174

%

100

39,59,6

10,91,4

19,4

19,1

1960

fmdioe

155

126151

248399

176

193

%

100

33,47,7

15,23,3

23,2

17,2

6 Pelo menos, sob uma forma aproximada, em consequência das dificul-dades no tratamento e na interpretação da informação estatística disponível.

Í60

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vista social: as que possam ser consideradas como «tradicionais»e, portanto, mais estreitamente cimentadas aos esquemas e aosconceitos em que se apoia a estrutura social constituída, e as quese possam considerar como «modernas» e impulsionadas por outrosesquemas e conceitos, naturalmente emergentes do contacto e daaquisição de novas formas de pensar e de agir que favorecema dinamização renovadora daquelas estruturas.

Para este efeito, e em termos de mera aproximação, forçosa-mente um pouco grosseira, agrupamos as indústrias tal como seindica no Quadro VIII, no qual as evoluçjões verificadas se tradu-zem em índices (19401= 100) e em percentagem de activos comprofissão em relação ao total das indústrias.

Nele se tomam como indústrias tradicionais as de alimentação,bebidas, tabaco, têxteis, calçado, madeira e cortiça que, no nossoPaís, se podem considerar «clássicas» na estrutura industrial7,e como indústrias «modernas» as metalúrgicas, de construção demáquinas e de material de transporte e químicas, que são de desen-volvimento posterior8.

No mesmo quadro distingue-se ainda a «construção e obraspúblicas» das «outras indústrias» devido à importância que assumeno nosso panorama industrial e, ainda, p-ara não sobrecarregar aúltima rubrica, cuja importância, mesmo assim, não é de forma al-guma menor visto que, em percentagem do total, ocupou semprej,de 1940 a 1960, o terceiro lugar no número de efectivos profissio-nais absorvidos.

Saliente-se imediatamente que a marcada evolução absoluta•do® sectores classificados como modernos e «modernizadores» — de100 em 1940, a metalurgia e construção de máquinas passou em1960 para 248 e a química para 399 — não é suficiente para reti-rar a posição dominante aos sectores caracterizados como tradicio-nais: mesmo em 1960, a alimentação, têxteis, vestuário e calçadoocupa cerca de 33 % dos activos com profissão industriais contraapenas 15 % da metalurgia, construção de máquinas e de materialde transporte.

7 For responderem a necessidades fundamentais ou estarem ligadas aoaproveitamento elementar de recursos naturais facilmente acessíveis.

8 As razões que justificam a consideração destas indústrias como «mo-dernas» podem resumir-se nos seguintes pontos: a) utilizam, em geral, técnicasmais evoluídas a exigirem uma gama mais extensa de conhecimentos da partedos seus trabalhadores; b) pela sua própria natureza, implicam um contactomais intenso com o «know-how» e as perspectivas segundo as quais se abordamproblemas industriais de diferentes naturezas noutras sociedades; c) assegu-ram a viabilidade de uma vida material de nível mais elevado para a comuni-dade, até porque uma parte importante dos seus produtos se destinam a inves-timento quer directo quer indirecto. De notar que a distinção que se faz entresectores tradicionais e sectores modernos — além da natural imprecisão d~que se reveste perante o estádio de desenvolvimnto económico português—seconsidera apenas como um critério adequado à caracterização em termos glo-bais da estrutura ocupacional da nossa actividade industrial.

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Mesmo numa perspectiva de análise puramente interna em queneste momento nos situamos,, identifica-se com suficiente nitidezuma situação de desenvolvimento em que a posição dos sectoresclassificáveis como modernizadores ainda não conseguiu reflectir-senuma importante modificação de estrutura. Isto, note-se, sob umponto de vista que se poderá considerar sociológico, no qual setoma em consideração o chamamento a novas condições de vidaatravés da mobilização profissional e se deixam de lado outroscritérios mais próprios de uma análise económica, como por exem-plo o produto originado9.

Ainda sob a posição relativa que ocupam os sectores tradicio-nais e os sectores modernos no que respeita à mobilização profis-sional, poderá obter-se uma imagem aproximada do grau de desen-volvimento da nossa estrutura industrial por comparação com a deoutros países 10 através dos seguintes valores:

Relação entre o® efec-tivos ocupados nas in-

PAISES dúsírias tradicionais enas indústrias moder-

nas

1) Estados Unidos (1954) • 0,62) Inglaterra (1951) 0,63) Checoslováquia (1949) 0,84) França (1954) 0,95) Itália (1954) 0,96) Argentina (1954) 1,7

7) PORTUGAL { ggj \ZZZ\ZZ\Z\Z\\Z 2£8) índia (1953) 2,5

Note-se que os valores apresentados para os outros países de-vem ser considerados com algumas reservas importantes pelas se-guintes razões:

— para alguns países os valores referem-se à totalidade damão-de-obra: com profissão, com ocupação e desemprega-doiS), ao passo que para Portugal referem-se apenas à popu-lação activa com profissão;

9 De notar, porém, que, de acordo com os dados fornecidos pela matrizde relações interindustriais, mesmo em 1962 o produto originado pelas indús-trias apresentava uma estrutura idêntica à que se constatou para a populaçãoactiva com profissão:Alimentação, bebidas, tabaco, têxteis, vestuário

e calçado 6 988 mil contos ( 40%)Madeira, cortiça e mobiliário 1615 » » ( 9%)Metalúrgicas, mecânicas e eléctricas 3 388 » » ( 19%)Químicas e petróleo 1785 » » ( 10%)Total da indústria transformadora 17 639 » » (100 %«

10 Fonte: La population active dons le monde, B.I.T., Génève, 1956,pg. 569.

462

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— a composição de cada grupo de indústrias não é rigorosa-mente a mesma em todos os países;

e, portanto, as comparações que se fizerem têm um carácter rela-tivamente grosseiro.

Contudo, mesmo tendo em conta as reservas que se acabamde formular, a importância dos desvios constatados permite-nosafirmar sem qualquer pessimismo que haverá ainda que empreen-der um esforço importante com vista à aceleração no melhor sen-tido do processo de desenvolvimento para que a nossa estruturaindustrial se situe numa posição de franca modernidade.

Identificado o sentido da evolução da população activa comprofissão industrial sob um ponto de vista muito amplo no qualapenas se confrontaram os sectores que se podem considerar «tra-dicionalistas» com os que se podem considerar «modernizadores»,parece-nos necessário que se pormenorize um pouco mais esta aná-lise a fim de verificar como se comportaram individualmente asdiferentes indústrias em relação ao ritmo global de desenvolvi-mento que, no que respeita à profundidade das transformaçõesconseguidas, ainda está, como vimos, bastante longe do que se tempassado noutras estruturas mais dinâmicas.Ritmo de evolução relativa da população activa com profissão, por indústria

QUADRO IX

INDÚSTRIAS 1950-60

ExtractivasAlimentação e bebidasTabacoTêxteisCalçado, vestuário e têxteis em obraMadeira e mobiliárioCortiça ,Papel, cartão e artes gráficasCoiro e peles ,QuímicasMinerais não metálicosMetalúrgicas, construção de máquinasDiversasElectricidade, gás, água e serviços de saneamento ...Construção e obras públicas

Total da população activa c/profissão indus-trial

85747290859084

12187

23812413939

118120

100

468

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Com o apoio dos valores que constam do Quadro IX, no qualse regista a evolução da população activa com profissão ôttl Cadauma das indústrias relativamente ao total da população activa comprofissão industrial, poderá imediatamente confirmar-se a exis-tência de uma certa tendência para a modernização da estruturaindustrial portuguesa. Com efeito, os sectores que nos dois períodosmantiveram a sua mobilização profissional simultaneamente cres-cente e acima do valor do conjunto são as1 indústrias mais «jovens»:químicas, metalúrgicas e de -construçjão' de máquinas, minerais nãometálicos e papel, cartão e artes gráficas, situação que, como sesabe, é comum à maioria dos países industrializados. A tendência,pelo menos a médio-prazo, da evolução da mobilização profissionalneste grupo de indústrias apresenta-se, pois, definida com sufi-ciente clareza, havendo apenas a considerar o valor da inclinaçãoque ela apresenta em face de uma desejável aceleração nas trans-formações estruturais que permitam ao País eliminar o desfaza-mento anteriormente referido.

No que respeita às outras indústrias, os elementos que cons-tam dos Quadros VII e IX permitem salientar as seguintes obser-vações gerais:

Indústria extractiva: atendendo à pouca importância destaactividade no nosso País, a mobilização profissional que se lhe re-fere tem relativamente pouco interesse, podendo, todavia, afir-mar-se que a baixa de efectivos que apresenta em relação ao totalda população activa com profissão industrial não é de forma algu-ma aberrante se a inserirmos no contexto europeu. De notar aindaque, na maioria dos países industrializados, os efectivos traba-lhando nas minas só aumentaram em valor absoluto até cerca de1920 invertendo-se em seguida a tendênciau, ao passo que, nonosso País, ainda estão a aumentar até 1960.

Indústria de alimentação: em valor absoluto, os efectivos destegrupo de indústrias aumentaram (consideravelmente entre 1940 e 50(+10 877) e sofreram uma ligeira baixa na década seguinte(—3734) podendo, por conseguinte, registar-se um desfazamentoimportante em relação à evolução do total da população activa comprofissão industrial. Apesar da evolução dos sectores que compõema rubrica entre 1950 e 60 poder resailítar de alterações na classificarção estatística, parece pouco comum esta situação na medida em queé conhecido o movimento geral de expansão deste grupo de indús-trias, praticamente em todos os países 12.

11 Vide C. VIMONT, op. cit., pg. 48.12 A publicação Statistique de Ia main d/oeuvre, O.C.D.E., 1964, con-

tém os seguintes elementos sobre os efectivos totais (milhares de pessoas)nas indústrias de alimentação e bebidas:

464

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Indústria têxtil: é um sector em que o volume de empregoconsiderado no seu valor absoluto tem estado permanentementeem expansão a partir de 1940,, registando-<se todavia, entre 1950e 60, uma diminuição em relação ao ritmo de aumento do total dapopuíagão activa <2cm profissão industrial (vide Quadro IX no qualse regista entre 1950 e 60 uma evolução relativa dos efectivos datêxtil igual a 90, quando a evoluçlão do total da população activacom profissão industrial no mesmo período se considera iguala 100). Esta baixa no ritmo de expansão dos efectivos na têxtilsegue um movimento que?, se não é geral!, é, pelo menos, oque se regista em grande número de países industrializados13.De notar que esta indústria em que \o emprego de um volumede mão-de-obra feminina superior ao de mão-de-obra masculinaera praticamente tradicional no nosso País, passou na década de1950 a 60 para uma situação inversa como se pode ver petasseguintes valores:

Têxtil: m o 195° 196°Homens 29 615 44122 60123Mulheres 32476 55 573 50 751

facto que se deverá, provavelmente, à generalização progressiva dotrabalho a três turnos, conjugada com o impedimento do empregoda mulher em trabalhos nocturnos e também ao aumento da me-canizaçlão em grande número de unidades*, conduzindo em geralà substituição de várias mulheres por um único operário qualifi-cado.

Indústrias do vestuário e do calçado: aumento constante deefectivos com um ritmo que, todavia, se situa bastante abaixo da-quele com que se processa a evolução do total da população activacom profissão industrial. A tendência no sentido do aumento doemprego neste sector — para 100 da evolução dos activos com pro-fissão no total das industriais, o vestuário e calçado passou de 77

Holanda Suécia Noruega* Inglaterra Suíça* Japão* JE.U.A. Espanha1950 154 64 42 754 34 454 1790 1851960 160 67 48 767 41 905 1790 181*

* Inclui também a indústria do tabaco, cujos efectivos para a maiiotria dos paísesou são( estacionários ou estão ean regressão e, portanto, não introiótaeta distensõesimportantes na tendência das alimentares e bebidas.

13 No trabalho de Odete Esteve® de CARVALHO intitulado A indústriatêxtil algodoeira no plano internacional (publicação n.° 3 da série Estudosde Economia do Instituto Nacional de Investigação Industrial), o anexo nú-mero 4 inclue os seguintes valores para a percentagem ao número de pessoasocupadas na industrial têxtil em relação ao total das indústrias manufactu-reiras:

1938 1948 1953Mundo 17,7 15,1 13,9Europa 14,1 13,0 12,4

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entre 1940 e 1950, para 85 entre 19-50 e 1960 — condu-lo, pois,a uma situaçjão inversa da que existe na indústria têxtil: nesta, umacerta tendência para a desaceleraç(ão no aumento dos efectivos quenela trabalham e no vestuário' e calçado uma progressão no sentidoda expansão, facto que é, aliás, comum a grande número de países14.

Indústrias da madeira e do mobiliário: verifica-se também umaumento dos efectivos em valccr absoluto, mas com uma diminuirãono ritmo de expansão relativa entre 1950 e 60. Os valores inscritosno Quadro VII para os anos de 1950 e 60 em que se distinguem osque correspondem à madeira e os que correspondem ao mobiliáriopermitem-nos inferir que a regressão apresentada por este sectoré fundamentalmente devida à primeira, estando, pelo contrário,o segundo em franca expansão.

Indústrias de coiros e peles: progressão de efectivos muitofraca quer em valor absoluto quer em valor relativo. Entre 1950e 1960 nota-se uma certa tendência para o aumento de activos comprofissão a trabalhar nestas indústrias, cuja importância, porém,é suficientemente diminuta para que se possa concluir pela esta-bilização do respectivo número de activos com profissão e anteciparmesmo, à imagem do que tem acontecido noutros países, uma futuraregressão em valor absoluto do pessoal nelas empregado.

Indústrias de electricidade, gás, água e serviços de saneamento:aumento sensível), quer em valor absoluto quer em valor relativo.De notar, porém, entre 1950 e 1960, uma ligeira diminuição no seuritmo de expansão relativa, que se cifra em 118, para 132 entre1940 e 1950.

Indústria de construção e das obras públicas: aumento emvalor relativo só a partir de 1950, apresentando, porém, um índicedos mais elevados: 120. Este aumento muito pronunciado e o pró-prio valor absoluto-, que em 1960 representa 23 % do total de activoscom profissão industrial revestem-se de um importante significadona medida em que a magnitude que assume a mobilização pro-fissional líquida deste sector entre 1950 e 60 (cerca de mais 69 000activos com profissão) confirma-nos a posição que esta indústriaocupa como absorvedora de mão-de-obra e como via mais frequenteda passagem do trabalhador rural para a indústria transformadora.

Completando agora as observações gerais que foi possível for-mular através da análise, interna e externa, do dualismo entre

14> Por exemplo, os Estados Unidos, a Suécia e os Países Baixos. VideClaude VIMONT, op. cit, pág. 54 e 55.

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sectores tradicionais e sectores modernos com aquelas observaçõesque decorreram da análise do comportamento individualizado dealguns grupos de indústrias e que nos demonstram um desequilíbriopouco vincado em relação às estruturas de que se partiu, é entãopossível obter uma panorâmica relativamente pormenorizada dasmodificações em que se tem progressivamente empenhado — no querespeita à mobilização da população activa com profissão — o sec-tor mais dinâmico da nossa actividade produtiva: o sector indus-trial. Com efeito, esta panorâmica veio confirmar a conclusão an-teriormente feita com base no primeiro grupo de observações deque, apesar de o sector industrial se apresentar com uma tendênciade certo modo dinamizadora, o vigor com que essa tendência se temmanifestado não parece suficiente para conduzir a alterações comuma tal profundidade que permitam ao profissional português vin-cular-se mais intimamente a formas e a perspectivas de vida signi-ficativamente integradas no intenso dinamismo estrutural queapresentam os processos acelerados de desenvolvimento socio-eco-nómico, aos quais é inerente o aparecimento de tensões estruturaisimportantes.

5. Distribuição e migrações espaciais da população activa comprofissão

Analisada a evolução estrutural da população activa com pro-fissão no que respeita à sua repartição por grupos de indústrias,um outro aspecto importante que merece alguma atençião refere-seà sua distribuição espacial. Com efeito, além dos desequilíbriosinter-sectoriais na mobilização profissional que os processos de de-senvolvimento provocam, existe ainda outra manifestação impor-tante desses desequilíbrios ao nível da distribuiçião inter-regionalda população activa que, pela acumulação em determinadas regiõesà custa da rarificação noutras, pode constituir-se obstáculo sérioa um aproveitamento integral da capacidade produtiva do potencialhumano disponível e, além disso, tornar-se, directa e indirecta-mente, um freio importante à generalização, em todo o espaço na-cional, do esforço e dos benefícios do desenvolvimento.

Para além dos problemas económicos e técnicos que, ao nívelda harmonização de factores e da conciliação de solicitações denatureza muito diversa, são levantados pela mobilidade inter-re-gional dos trabalhadores, haverá que considerar o fenómeno sobo seu ponto de vista sociológico na medida em que se trata, funda-mentalmente, de uma profunda experiência humana que é deter-minada pelas transformações empreendidas na estrutura social.

As iniciativas de deslocação têm uma aparência de decisõesindividuais determinadas pelas pressões exercidas por diversos fac-tores no sentido do abandono do meio de origem e/ou pelo alicia-

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mento que representam informações mais ou menos objectivassobre melhores condições de vida e oportunidade de promoção socialnoutras regiões-

Todavia, as iniciativas de deslocação estão sempre inseridasnum movimento mais amplo de carácter colectivo, movimento cujascaracterísticas deverão ser analisadas sob vários ângulos se sepretender uma ampla visão do conjunto daqueles factores — entreos quais, o económico toma um lugar não exclusivo mas de evidên-cia— que determinam as pressões à migração regional, pressõesque podem ser mais ou menos fortes e mais ou menos consciente-mente apreendidas à escala individual.

Ritmo de evolução absoluta da população activa com profissão, nos distritos

(Base: 1940 = 100)QUADRO X

DISTRITOS 1960

Aveiro •

Beja

Braga

Bragança

Castelo Branco

Coimbra

Évora

Faro

Guar d a

Leiria ,

Lisboa

Portalegre

Porto

Santarém

Setúbal

Viana do Castelo ,

Vila Real

Viseu ,

Total de activos c/profissão no Continente

116

106

108

110

105

101

112

108

95

114

131

104

125

108

148

90

106

98

114

468

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Ritmo de evolução relativa da população activa com profissão, nos distritos

QUADRO XI

DISTRITOS

Beja

Braga

Bragança

Castelo Branco

Coimbra *

Évora

Faro

Guarda

Leiria

Lisboa

Portalegre

Porto

Santarém

Setúbal

Viana do Castelo

Vila Real

Viseu

Total de activos c/profissão no Continente

1940-50

98

101

98

91

94

93

104

101

91

97

106

106

104

104

121

83

94

91

100

1950-60

103

92

97

106

98

95

88

94

91

103

108

86

105

91

108

96

99

94

100

Uma análise quantitativa das migrações líquidas inter-regio-nais da população activa, mesmo ao nível muito global que nosconsentem os elementos estatísticos disponíveis, constituirá maisuma via de estudo com que poderá completar-se a interpretaçãocrítica (em termos de resultados obtidos) dos processos adoptadospara o desenvolvimento português. Poderão, assim, isolar-se algu-mas das consequências que tem acarretado uma relativa aceleraçãoda nossa evolução, não geograficamente generalizada, e que temconduzido a uma situação de dualidade em que tanto os padrõestradicionais da sociedade portuguesa como os modernos se situam,como já vimos, numa posição que se poderá considerar, de certomodo, marginal.

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Com efeito, a análise dos Quadros X e XI eyidenciariios ime-diatamente o desequilíbrio espacial do desenvolvimento portuguêsjá várias vezes apontado por outros autores, mas agora em termosde ritmo de evolução da população activa com profissão nos váriosdistritos do Continente: entre 1950 e 1960, década em que se si-tuam os primeiros passos no sentido de uma transformação estru-tural sensível, a expansão verificada nalgumas regiões (principal-mente Lisboa, Porto, Setúbal, Aveiro e Leiria) tem como contra-partida uma diminuição absoluta do número de pessoas activas comprofissão em nove distritos (Beja, Coimbra, Évora, Faro, Guarda,Portalegre, Santarém, Viana do Castelo e Viseu) e um afrouxa-mento— diminuição relativa — em relação à evolução do total deactivos profissionais do continente em mais três (Braga, CasteloBranco e Vila Real).

Se se atentar em que esta diminuirão no ritmo de evolução.,simultaneamente em valor absoluto e em valor relativo, se refereàs regiões do País em que a saciedade tradicional está mais solida-mente implantada15, imediatamente sobressai a «sucção» a queaquela se começou a sujeitar na década de 50.

Este desequilíbrio, próprio de um desenvolvimento pouco pro-gramado, nada debatido e apenas orientado por preocupações decarácter económico oriundas das empresas, se, em si mesmo, nãose pode considerar como tendo um carácter puramente negativo—as tensões são inerentes a qualquer processo de transformação rela-tivamente profundo — pode acarretar, no entanto, uma situaçãoem que a sociedade tradicional tenderá a passar duma naturalposição de «refreador» desse desenvolvimento para uma posiçãode seu nítido «opositor».

De facto, ao sentirem-se progressivamente empobrecidos querem recursos materiais quer em «meios» humanos, pelo menos asposições dominantes desse elemento importante da nossa sociedadepoderão tender para encarar abertamente as perspectivas de desen-volvimento como prejudiciais a>cs seus interesses. Ficará assim ex-traordinariamente dificultada a adopção de soluções, institucionaisou outras, que, dentro de uma orientação de desenvolvimento inte-gral, venham a ser intentadas com o objectivo de tornar menos agu-das as diferenciações nos ritmos de progresso das diferentesregiões e de obstar, portanto, a que desequilíbrios demasiado pro-fundos possam fazer perigar o próprio processo de modernização),já de si tão pouco nítido, em que o País começa a estar empenhado.

De notar ainda, que esta pauperização progressiva a que estásujeita a maior parte das regiões rurais portuguesas no que res-

15 Exceptua-se o caso de Bragança em que a expansão constatada sedeve poder explicar pelo facto de os valores para 1960 se referirem à popu-lação residente, e não à população presente como nos anos anteriores e, alémdisso, devido ao aumento substancial na mobilização profissional que repre-sentou para o distrito a construção das barragens do Douro.

' vro

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peita ao potencial humano directamente implicado na actividadeprodutiva — o que significa, de facto, que nelas se acentua umararifi cação da oferta de trabalho—demonstra a existência de,mais que um apeio, uma forte pressão ao êxodo a que as gentesestão sujeitas por falta de vitalidade dessas regiões.

A amplitude que, entre 1950 e 1960, assume a diminuição deactivos com profissão nos nove distritos em situação regressivano que respeita à actividade profissional pode ser avaliada como auxílio do Quadro XII, em que os valores das diminuições empercentagem do total de activos com profissão existentes no distritoem 1950, variando entre 0,4 e 10 %, nos dão uma ideia aproximadada intensidade variável com que o êxodo de profissionais se temrepercutido no potencial disponível nos vários distritos.

Diminuição de activos com profissão em nove distritos do Continente

QUADRO XII

DISTRITOS *

SantarémPortalegreBejaGuardaViseuFaroCoimbraÉvoraViana do Castelo

Número

— 8954— 8362— 5152— 4990— 3070—•2867— 2262— 1916— 356

Em % do n.° de activosc/profissão existentes

no distrito em 1950

5105522120,4

* Ordenados por valor decrescente das diminuições em valor absoluto.

Atendendo a que a taxa de crescimento da população activano nosso País entre 1950 e 1960 se situa à volta dos 5%, as dimi-nuições constatadas nesse período apresentam uma importânciaconsiderável que vem situar com alguma objectividade o problemada pauperização em inteligências, vontades e braços a que as acti-vidades tradicionais — dominantes nos distritos em causa—têmestado sujeitas.

A importante rarefacção de mão-de-obra profissional, que severifica nestas regiões só pode ser corrigida através de um surtode desenvolvimento convenientemente polarizado em centros mo

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tores, o que, por sua vez, exige, pelo menos, a existência de grupossuficientemente representativos, motivados e habilitados para quepossam ser capazes de o forjar e orientar. Ê este dilema que nãopode ser resolvido sem o recurso a soluções1 simultaneamente pro-fundas nas transformações originadas e equilibradas perante as ne-cessidades globais, até porque o desenvolvimento não consiste ape-nas num conjunto de medidas parciais que se adoptam. O desenvol-vimento refere-se sim a um intenso processo de transformação emque têm que se empenhar os sectores dinâmicos da estrutura socialpara os quais o progresso não representa qualquer ameaça.

6. Conclusão

A análise sumária que se tem vindo a fazer da evolução dapopulação activa portuguesa nas duas décadas que se tomaramcomo referência veio evidenciar uma sociedade cuja estruturaocupacional se encontra insuficiente e desigualmente desenvolvida,apresentando ainda como uma das suas características a coexis-tência de dois sectores: um tradicional e outro moderno. Tanto umcomo outro evoluiram (o primeiro no sentido do declínio e o se-gundo no da expansão), se bem que com ritmos diferentes— a evo-lução processou-se de tal forma que o sector moderno, apesar dea sua presença se afirmar cada vez mais, ainda não atingiu umgrau de vitalização suficiente para retirar ao sector tradicionala sua predominância. Mesmo no que respeita ao sector industrial,o mais dinâmico da actividade produtiva nacional, ainda não seconseguiu que a sua parte moderna, apesar da expansão a que temestado sujeita, retirasse a posição de hegemonia às actividadesclássicas da nossa estrutura industrial.

Esta situação de dualidade cujos contornos se desenham comuma certa nitidez, pode considerar-se o resultado de preocupaçõesde expansão essencialmente orientadas para a industrialização,campo em que se tem promovido a convergência da maior partedos interesses e dos esforços, como consequência da convicçãogeneralizada de que o desenvolvimento global seria pura e simples-mente a resultante das transformações empreendidas isoladamentepelas empresas, agindo em função dos mecanismos de mercado.Daí uma grande parte dos desequilíbrios existentes entre os-ritmos de transformação dos vários componentes das estruturasprodutiva e ocupacional portuguesas e os consequentes desajusta-mentos sectoriais e regionais.

Todos estes factos, que, por um lado, condicionam o volumee os progressos da própria produção nacional, são muito impor-tantes pelos múltiplos reflexos que acarretam nas condições e no

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nível de vida da população trabalhadora. Dentre estes reflexos,destacaremos aqui, pela sua incidência social, o nível de saláriose as possibilidades de promoção social e cultural pela via da pro-fissão.

No que se refere ao primeiro aspecto, a maior aproximaçãoentre os nossos níveis de salários e aqueles que são praticados noestrangeiro—uma das soluções em profundidade para obstar aodeslocamento da mão-de-obra para fora do País em busca de me-lhores condições de vida w — depende sobretudo da mobilização pro-fissional que (Consigam as indústrias mais modernas e tecnicamenteevoluídas — as que maiores remunerações permitem — desde que asua implantação possa conduzir a uma maior disseminação espacialdo progresso.

No que se refere ao segundo aspecto, o esforço que é necessáriointensificar no sentido de uma rápida reconversão da mão-de-obrarural e urbana não qualificada e sub-empregada está estreitamentedependente da oferta de empregos por parte de indústrias tecni-camente evoluídas,, dirigidas com competência e implantadas nasregiões mais atrazadas e que, através da utilização de técnicas e demétodos de trabalho actualizados, possam criar ocupações profis-sionais de níveis sensivelmente mais elevados do que aqueles quesão actualmente postos à disposição da maioria da população activa.Este tipo de emprego, implicando a necessidade de uma formaçãoprofissional adquirida no interior da empresa ou, de preferência, eminstituições de ensino especializadas, é aquele que pode ajudar à tãonecessária generalização da promogão sociaT e cultural às camadasmenos favorecidas da nossa população.

Soluções válidas para os desajustamentos apontados só podemser obtidas através de uma maior intensificação do desenvolvi-mento, encarado não apenas segundo uma perspectiva económicae técnica mas também como uma profunda modificação estruturale institucional. Aliás, fazer progredir simultaneamente as trans-formações económicas e as sociais é a única forma de, pelo menossem profundas soluções de continuidade, obstar à proliferação detensões importantes1 que podem fazer perigar a própria viabili-dade do processo de desenvolvimento.

Se não se abordarem frontalmente os problemas e as respec-tivas soluções em amplo debate e com a tecnicidade disponível,ser-se-á conduzido a uma má orientação nas escolhas a que haveráque proceder cada vez com maior acuidade ou cair-se-á no trata-mento das questões do desenvolvimento português com base empremissas desajustadas à nossa realidade. Desajustamento devido

16 E que representa, de facto, um muito prejudicial empobrecimento depotencial humano que, a médio prazo, poderá tornar-se um entrave à acele-ração do desenvolvimento nacional.

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à transposição pura e simples de conclusões apressadamente tiradasda análise de outras sociedades em que — apenas por se encontra-rem mais adiantadas — as etapas dos respectivos processos de de-senvolvimento já são susceptíveis de esquematização.

O conhecimento objectivo da realidade portuguesa, através deperspectivas múltiplas mas integrantes e, mais do que isso, a cons-trução de modelos concretos para o desenvolvimento económico esocial do País, com objectivos amplamente discutidos e aceitese em termos que lhe sejam efectivamente adaptados, são tarefasa intensificar cada vez mais, se se pretender melhorar essa reali-dade.