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1 ESTADO DE GOIÁS TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS TCM/PGC Fls.: EXCELENTISSÍMA SENHORA CONSELHEIRA PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS DO ESTADO DE GOIÁS URGENTE (medida cautelar) (Art. 150, inciso VI, do Regimento Interno do TCM/GO) O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 94, I, da Lei Orgânica do TCM/GO (Lei Estadual nº 15.958/07) e pelo art. 115, I, do Regimento Interno do TCM/GO (Resolução Administrativa n° 73/09), vem à presença de Vossa Excelência oferecer REPRESENTAÇÃO, nos termos do art. 207 do RITCM/GO, pelos fatos e fundamentos a expostos seguir. I – FATOS E DIREITO Em 12/12/13 foi publicado no Diário Oficial do Município de Goiânia, Edição nº 5736 (anexo), aviso de licitação Pregão Presencial nº 019/13, com vistas à seleção de “pessoa jurídica para prestação de serviços de diagnóstico por imagem e diagnose, nas modalidades médicas de raio-x, ultra-sonografia e eletrocardiograma, pelo período de 12 (doze) meses”, em valor total estimado de R$ 7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil reais), com sessão está marcada para o dia 24/12/2013. A análise do edital, disponibilizado no site do Município, bem como de elementos já conhecíveis do procedimento, indica falhas suficientes para obstar a sua continuidade, bem como capazes de acarretar sua posterior invalidez. Passa-se a discorrer acerca de cada um dos vícios observados Pregão Presencial nº 019/13. a) Prazo insuficiente entre data da publicação e data da sessão Nos termos da Lei Federal nº 8.666/93 (art. 110), na contagem dos prazos nas licitações exclui-se o dia do início e inclui-se o do vencimento. A publicação do aviso deu-se em 12/12 e a data da sessão está marcada para o curioso dia 24/12, véspera de natal, dia em que, como costume, decreta-se

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ESTADO DE GOIÁS TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS MINISTÉRIO PÚBLICO DE CONTAS

TCM/PGC

Fls.:

EXCELENTISSÍMA SENHORA CONSELHEIRA PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE CONTAS DOS MUNICÍPIOS DO ESTADO DE GOIÁS

URGENTE (medida cautelar) (Art. 150, inciso VI, do Regimento Interno do TCM/GO)

O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas dos Municípios do

Estado de Goiás, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo art. 94, I, da Lei Orgânica do TCM/GO (Lei Estadual nº 15.958/07) e pelo art. 115, I, do Regimento Interno do TCM/GO (Resolução Administrativa n° 73/09), vem à presença de Vossa Excelência oferecer REPRESENTAÇÃO, nos termos do art. 207 do RITCM/GO, pelos fatos e fundamentos a expostos seguir.

I – FATOS E DIREITO

Em 12/12/13 foi publicado no Diário Oficial do Município de Goiânia, Edição

nº 5736 (anexo), aviso de licitação Pregão Presencial nº 019/13, com vistas à seleção de “pessoa jurídica para prestação de serviços de diagnóstico por imagem e diagnose, nas modalidades médicas de raio-x, ultra-sonografia e eletrocardiograma, pelo período de 12 (doze) meses”, em valor total estimado de R$ 7.500.000,00 (sete milhões e quinhentos mil reais), com sessão está marcada para o dia 24/12/2013.

A análise do edital, disponibilizado no site do Município, bem como de elementos já conhecíveis do procedimento, indica falhas suficientes para obstar a sua continuidade, bem como capazes de acarretar sua posterior invalidez. Passa-se a discorrer acerca de cada um dos vícios observados Pregão Presencial nº 019/13.

a) Prazo insuficiente entre data da publicação e data da sessão

Nos termos da Lei Federal nº 8.666/93 (art. 110), na contagem dos prazos nas licitações exclui-se o dia do início e inclui-se o do vencimento.

A publicação do aviso deu-se em 12/12 e a data da sessão está marcada para o curioso dia 24/12, véspera de natal, dia em que, como costume, decreta-se

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TCM/PGC

Fls.:

ponto facultativo. O interregno, porém, não atende ao prazo mínimo de 08 dias úteis exigido pela Lei Federal nº 10.520/02, o qual se concluiria apenas no dia 25/12.

A esse respeito, o TCU já se manifestou para alertar “à Subsecretaria de Planejamento, Orçamento e Administração do Ministério do Esporte sobre a irregular inobservância do prazo mínimo de oito dias úteis previstos no art. 4°, V, da Lei nº 10.520/2002, devendo-se observar que a abertura da sessão pública não pode ocorrer no oitavo dia útil seguinte à publicação do aviso, por ainda não estar expirado o prazo conferido aos licitantes para a elaboração de suas propostas” (item 1.5.1.3, TC-026.206/2010-2, Ac. 5.838/2010-2ª Câm. DOU de 13.10.2010).

Essa data, contudo, em se tratando de feriado nacional, impõe o deslocamento da realização do pregão para, no mínimo, o dia 26/12/2013.

Não bastasse isso, importante ressaltar que a complexidade do objeto licitado, com vistas a atender 17 unidades de saúde do Município de Goiânia, com disponibilização de equipamentos, profissionais especializados médicos (radiologistas e cardiologistas), técnicos em radiologia e auxiliares, além de serviços indiscriminados de “destinação de dejetos resultantes dos exames” e “adequação física”, leia-se reformas, para a instalação dos equipamentos, com vistas à realização de 76.000 (setenta e seis mil) exames mensais estimados, não se coaduana com a brevidade do prazo fixado para apresentação de propostas.

A jurisprudência do TCU também já se debruçou sobre essa questão: [[Representação. Licitação. Programa Nacional de Banda Larga. Pregão eletrônico. Os prazos da licitação devem ser fixados conforme a complexidade do objeto licitado.]]

[VOTO]

126. Em suas considerações adicionais, a unidade técnica assevera que os problemas apontados na instrução sugerem que os gestores da Telebrás conduziram a licitação de forma apressada, sem observar o grande de volume de recursos envolvidos, a grande dispersão geográfica dos serviços e a natureza do objeto licitado.

127. É de se reconhecer, considerando a complexidade da licitação, que o prazo de 8 (oito) dias entre a publicação do edital (11/10/2010) e a sessão do pregão (25/10/2010), em que pese a observância do mínimo estabelecido pela legislação, foi por demais exíguo e realmente pode ter dado ensejo às ocorrências apontadas. 128. Com efeito, compartilho do posicionamento da Secob-3 de que algumas falhas encontradas poderiam ter sido corrigidas com a simples dilatação do período de publicação do edital, ante eventuais esclarecimentos solicitados pelas licitantes, ou mesmo com a republicação do edital pela própria Telebrás.

[ACÓRDÃO]

9.7. recomendar à Telebrás que, nos futuros certames:

9.7.1. não se limite ao prazo mínimo de publicidade previsto para a modalidade pregão quando a complexidade e o volume de recursos envolvidos assim exigirem, adotando como referência os prazos previstos na Lei de Licitações (30 dias);

(AC-1339-19/11-P Sessão: 25/05/11 Grupo: II Classe: VI Relator: Ministro JOSÉ JORGE – Fiscalização)

Nesses termos, o certame encontra-se maculado por vício inequívoco, relativo à exiguidade do prazo, o que, por si, mostra-se suficiente para obstar a realização do pregão na data fixada, sob pena de nulidade do procedimento.

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Fls.:

b) Inadequação da modalidade licitatória utilizada

Nos termos do art. 1º da Lei Federal nº 10.520/02, a licitação na modalidade pregão destina-se à “aquisição de bens e serviços comuns”, considerados aqueles “cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado” (parágrafo único).

No caso, como relatado no item anterior, a licitação não compreende apenas a disponibilização de aparelhos para exames, mas também de serviços de profissionais especializados como médicos, técnicos em radiologia e auxiliares, além de serviços indiscriminados de “destinação de dejetos resultantes dos exames” e “adequação física”, leia-se reformas, para a instalação dos equipamentos, com vistas à realização de 76.000 (setenta e seis mil) exames mensais estimados.

Primeiramente, no que se refere a serviços de médicos e técnicos, importa destacar que o Tribunal de Contas da União já decidiu quanto à impossibilidade de licitação de serviço de natureza intelectual e complexa mediante pregão:

É inviável o uso do pregão para contratação de serviços nos quais predomine a intelectualidade, assim considerados aqueles que podem apresentar diferentes metodologias, tecnologias e níveis de desempenho e qualidade, sendo necessário avaliar as vantagens e desvantagens de cada solução. (Acórdão n.º 601/2011-Plenário, TC-033.958/2010-6, rel. Min. José Jorge, 16.03.2011)

Percebe-se no objeto da licitação ora questionada a complexidade dos serviços, vez que se referem à realização de exames e de laudos médicos, atividades de alto grau de especialização e de técnica apurada, as quais não se coadunam com a simplificação característica dos objetos licitáveis mediante pregão.

Em segundo lugar, nem mesmo o Termo de Referência anexo ao edital pôde detalhar os serviços contratados, além daqueles de fornecimento de equipamentos. Não há indicação da quantidade de pessoal mínima para o serviço nem da metodologia de execução, elementos essenciais para a definição do preço, para a formulação de propostas e para o posterior controle da execução contratual.

Com efeito, no caso, o objeto da licitação não configura “aquisição de serviços comum”, conforme exige o art. 1º da Lei nº 10.520/02, sendo imprópria a utilização da modalidade pregão. Assim, em vista da inadequação da modalidade adotada, o procedimento não pode prosperar, sob pena de nulidade posterior.

c) Terceirização de atividades finalísticas e burla ao concurso público

Como se observa, a pretensão de contratar serviços de médicos, técnicos e auxiliares, tendo como destinatários os usuários do serviço público de saúde e não a Administração, configura indevida terceirização ou delegação de atividade fim.

A propósito, o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais já decidiu: (...) concluo não ser possível a terceirização de todos os serviços, mas apenas daqueles de natureza auxiliar, ligados à atividade-meio. Não pode o Município terceirizar serviços que abrangem sua atividade-fim, traduzindo atribuições típicas de cargos permanentes, que só podem ser preenchidos por concurso público. (Consulta nº 44.370, Relator Cons. Moura e Castro)

Também na lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

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No âmbito da Administração Pública, a terceirização, como contrato de fornecimento de mão de obra, (...), não tem guarida, nem mesmo com base na Lei nº 6.019, que disciplina o trabalho temporário, porque a Constituição, no art. 37, inciso II, exige que a investidura em cargos empregos e funções se dê sempre por concurso (Parcerias na Administração Pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 8 ed., p. 219).

Nesse mesmo sentido, cita-se decisão do Tribunal de Contas da União: “Após análise das razões de justificativas apresentadas, a unidade técnica manteve o entendimento de que a realização da licitação por meio da modalidade pregão não guarda conformidade com os ditames legais, haja vista que o objeto contratado não se caracteriza como bem ou serviço comum, mas sim atividade-fim daquela Secretaria de Saúde a qual deveria ser realizada por meio de profissionais legalmente contratados através de concurso público, pelos seguintes motivos: 6.1. A terceirização complementar dos serviços de saúde somente pode ser delegada a instituições privadas por meio de contrato de direito público ou convênio, conforme art. 199, parágrafo primeiro, da Constituição Federal, através do credenciamento de instituições e profissionais, como forma de ampliar a capacidade de atendimento ao Poder Público, o que não está configurado no caso em análise.

(...)

Quanto ao mérito, entendendo ser irregular a terceirização de serviços que constituam atividade-fim da unidade contratante, conforme amplamente tem decidido este Tribunal de Contas da União, com o agravante de se tratar de área na qual o poder público exerce atividade essencial. Contudo, acolho a manifestação do Ministério Público, quanto à inadequação da aplicação da multa ao responsável pela prática do ato irregular, por configurar bis in idem, haja vista a existência de imputação de multa anteriormente pelo TCE/PB. Do contrário, pela prática do mesmo ato – terceirização de serviços de saúde – o responsável estaria sendo duplamente apenado, em desacordo com a jurisprudência desta Corte, tal como decidido nos Acórdãos nºs 1.062/2009 e 3.351/2008, ambos da Segunda Câmara.

(...)

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação formulada pelo Tribunal de Contas do Estado da Paraíba, tendo em vista a terceirização de atividade-fim da Secretaria de Saúde do Estado da Paraíba com a contratação de médicos especializados nas áreas de pediatria, anestesiologia e cirurgia, para atuar no Complexo de Pediatria Arlinda Marques, por meio do Pregão Presencial nº 017/2004.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da 1ª Câmara, com fundamento nos arts. 169, inciso IV, 235 e 237, inciso IV, do Regimento Interno do TCU e ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. conhecer da representação para, no mérito, considerá-la procedente;”

(ACÓRDÃO Nº 4218/2010 – TCU – 1ª Câmara. Processo TC 010.472/2007-2. Relator: Ministro José Múcio Monteiro. Data da Sessão: 13/7/2010 – Ordinária.).

No presente caso, a ilegalidade é ainda mais flagrante porque o Município possui os cargos de médico radiologista, cardiologista e técnico em radiologia no quadro (anexo), bem como há concurso público realizado e ainda vigente (Edital nº 02/2012), com aprovados para tais cargos desde julho de 2012 (anexo).

Curiosamente, de todos os aprovados para os cargos supracitados, apenas cinco cardiologistas constam das listas de convocação no sítio oficial do Município (anexo), de modo que os demais cardiologistas, radiologistas e técnicos, ao que tudo indica, foram preteridos em favor da contratação vultosa de terceirizados.

Além disso, a possibilidade de prorrogação do contrato prevista no edital de licitação (Item 12.1.1) denota a intenção de perpetuar-se a terceirização, assim como

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vem sendo feito, em flagrante ilegalidade e evidente prejuízo aos concursados. Nesse cenário, observa-se não somente a imprópria delegação de atividade

fim pelo Município de Goiânia, como também a burla à regra do concurso público (art. 37, I, da Constituição Federal), mediante contratação precária para o exercício de cargos existentes na própria estrutura administrativa do município, em absoluto desrespeito à boa-fé e ao direito subjetivo dos candidatos aprovados.

d) Contrato “guarda-chuva” e risco de direcionamento do certame

Outra falha evidente no procedimento de pregão ora combatido refere-se à aglomeração do fornecimento de mão de obra, de diferentes especialidades e para serviços distintos, com o fornecimento de equipamentos diversos (página 36 do Edital – são 79 equipamentos) para dezessete unidades de saúde em localidades distintas, tudo em um extenso e vultoso objeto.

Cediço que a regra nas licitações é a do parcelamento do objeto, para aumentar a competitividade. Trata-se de entendimento fixado pelo Tribunal de Contas da União - TCU, no Enunciado nº 247 de sua súmula de jurisprudência:

É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.

É essa também a orientação do TCM/GO, expressa na IN nº 05/10: Art. 1°. Orientar os seus jurisdicionados para que nas licitações visando à contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível e desde que não haja prejuízo para o conjunto ou perda da economia de escala, observem as disposições da súmula 247 do Tribunal de Contas da União — TCU, prevendo nos editais o julgamento e a adjudicação por item e não por prego global.

Para além da jurisprudência expressa na súmula acima citada, cabe destacar um precedente esclarecedor do TCU, que entendeu inadequadas as contratações amplas e indistintas como a que ora pretende o Município de Goiânia, chamadas de contratos “guarda-chuvas”. Transcreve-se a resenha da decisão:

Contratos “guarda-chuvas”: ausência de parcelamento do objeto

Representação formulada ao TCU noticiou possíveis irregularidades envolvendo contratos celebrados pelo Município de Aparecida de Goiânia para a execução de obras previstas em contratos de repasse celebrados entre a União e o Estado de Goiás. Conforme a unidade técnica, o gestor municipal utilizou-se de contratos decorrentes de concorrências realizadas para a execução de obras de saneamento municipais em dezenas de bairros do município, sem parcelamento dos respectivos objetos, ainda que por lotes, e separados por localidades ou bairros, ou regiões, em contrariedade à Lei e à jurisprudência dominante do TCU. Em seu voto, o relator destacou que “o aproveitamento de contratos preexistentes, por si só, não configura irregularidade, tendo em vista a possibilidade de aporte de recursos para parte de projeto ou obra já em andamento...”. Todavia, ainda conforme o relator, “os contratos objeto das concorrências realizadas pelo município apresentam escopo de obras bastante amplo, geograficamente distribuídas por diferentes bairros, com possibilidade, inclusive, de acréscimo de novos, não previstos originariamente nos instrumentos, de forma que se apresenta confrontante com as disposições dos arts. 3º, 6º, inciso IX, e 7º, caput, e § §

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1º e 2º, da Lei 8.666/93”. Desse modo, concluiu o relator que o parcelamento do objeto era possível e poderia aumentar a competitividade da licitação, em razão da redução das exigências de qualificação técnica e econômico-financeira, proporcionais à parcela da obra que deveria ser executada. Em consequência, o relator propôs e o Plenário decidiu expedir alerta à Prefeitura de Aparecida de Goiânia para que, em futuras licitações, seja feita a divisão do objeto licitado em tantas parcelas quantas se comprovarem técnica e economicamente viáveis, com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade, sem perda da economia de escala. (Acórdão n.º 1644/2010-Plenário, TC-009.804/2009-8, rel. Min-Subst. Augusto Sherman Cavalcanti, 14.07.2010).

A concentração de todos os serviços em necessariamente um só prestador significa também maior risco de colapso de serviços essenciais, por ser um só o responsável pela execução integral das atividades. Ademais, estimula o surgimento de oligopólios e de distorções no mercado, além de enfraquecer o próprio papel regulador da Administração nas hipóteses de delegações de serviços próprios.

No caso, não resta dúvida de que os serviços médicos não se vinculam aos serviços dos técnicos e operadores, muito menos à locação ou disponibilização dos equipamentos. Ademais, cada unidade de saúde poderia configurar um item licitado ou, havendo justificativa técnica ou econômica, unidades em localidades próximas poderiam ser aglutinadas em lotes menores, com vistas ao favorecimento da competitividade e visando a uma maior segurança e a um menor preço pelo serviço.

Importante ressaltar, também, que o parcelamento não promove qualquer eliminação apriorística, possibilitando que grandes e pequenos atores ofereçam suas propostas e colecionem adjudicações na extensão das suas capacidades, ao contrário do que ocorre na união de serviços individualizáveis em objeto vultoso.

Também fica claro o enfraquecimento da competitividade em razão do objeto quando considerado o exíguo prazo entre divulgação de edital e realização da sessão, bem como a exigência de disponibilização dos vários equipamentos nas diversas unidades de saúde arroladas em apenas 30 dias (página 39 do Edital).

Certo que não haverá muitos prestadores de serviço, além do que já mantém contrato dessa natureza com o município (anexo), com capacidade de atender a objeto tão extenso em pouco tempo, havendo severo risco de violação aos princípios da isonomia e da impessoalidade, previstos no art. 2º da Lei nº 8.666/93.

Soma-se a isso o que dispõe o Item 4.5.3 do edital, que veda a participação de empresas em consórcio. A norma, no contexto do edital, serve para afastar, de uma vez por todas, prestadores de menor porte, ainda que de forma associada, fato que, além de se apresentar em frontal colisão com o art. 170, IX, da Constituição Federal1, reforça o risco de direcionamentos e favorecimentos na presente seleção.

e) Indícios de antieconomicidade

Constata-se que o valor do objeto licitado (R$ 7.500.000,00) é alto e, ao que tudo indica, supera em muito o valor de aquisição dos equipamentos licitados.

1 Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 6, de 1995)

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Isso torna-se ainda mais relevante quando se observa o valor gasto com contratações dessa mesma natureza pelo município ao longo de 2013, que se aproxima de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais), bem como levando-se em conta que as contratações vultosas vêm se sucedendo desde 2008 (anexo) e que a presente licitação persiste na intenção de perpetuar essas contratações, na medida em que o edital prevê a possibilidade de prorrogação contratual (Item 12.1.1).

Os equipamentos que se pretende ver disponibilizados, ao que tudo indica mediante locação - estranhamente o edital não é claro quanto a isso - , são bens duráveis, de modo que a sua aquisição, máxime quando já existe pessoal selecionado por concurso para atuar no uso deles, pode revelar-se muito mais vantajosa que as sucessivas locações milionárias que o Município vem realizando.

Destaca-se que a justificativa econômica do termo de referência é vaga e de fato nada diz, sendo insuficiente para eliminar a suspeita de antieconomicidade.

f) Necessidade de medida cautelar

As falhas supracitadas, amparadas em fundados indícios de irregularidades, são capazes de ensejar a nulidade do certame, de modo que resta clara a presença da fumaça do bom direito e do risco de ilícitos no caso, sendo necessária a atuação breve do Tribunal com vistas a evitar a realização da sessão do Pregão nº 19/2013.

O perigo da demora, por sua vez, reside na iminência da realização da sessão do pregão, marcada para ocorrer no dia 24/12/2013, sendo a que sua realização poderá acarretar dispêndios desnecessários pela Administração e interessados, na medida em que a sua validade e eficácia encontram-se em cheque.

Com efeito, presentes os requisitos para a concessão de medida cautelar, torna-se imprescindível determinar, cautelarmente, a paralisação do procedimento.

g) Legitimidade do Ministério Público junto ao TCM/GO

O artigo 94, inciso I, da Lei Orgânica do TCM/GO (Lei Estadual n.° 15.958/07) dispõe sobre a atribuição dos Procuradores de Contas para promoverem a defesa da ordem jurídica, requerendo, perante o Tribunal de Contas dos Municípios, as medidas de interesse da Justiça, da Administração e do Erário.

Já o artigo 208, inciso II, do RITCM/GO, ao tratar especificamente sobre os legitimados para representarem perante o Tribunal, estabelece que:

Art. 208. Têm legitimidade para representar ao Tribunal de Contas dos Municípios:

(...)

II – Membros do Ministério Público de Contas junto a este Tribunal;”

Em face disso, é inequívoca a aptidão do autor para provocar o Tribunal.

h) Competência do TCM/GO

A Lei Orgânica do TCM/GO dispõe que compete a esta Corte de Contas “exercer a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial

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das prefeituras e câmaras municipais demais entidades instituídas e mantidas pelo Poder Público Municipal” (Art. 1º, inciso II, da Lei Estadual n.º 15.958/07).

Além disso, a Lei Orgânica do TCM/GO autoriza, expressamente, a iniciativa desta Corte para realizar fiscalizações e auditorias, nos seguintes termos:

Art. 1º Ao Tribunal de Contas dos Municípios, órgão de controle externo, compete, nos termos da Constituição Estadual e na forma estabelecida nesta Lei:

(...)

V - realizar, por iniciativa própria ou da Câmara Municipal, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo e Executivo municipais e demais entidades instituídas e mantidas pelo erário municipal;

(...)

Art. 19. O Tribunal exercerá a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial das unidades dos Poderes Municipais e das entidades da administração indireta, inclusive das fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público Municipal, na forma estabelecida no Regimento Interno, para verificar a legalidade, a legitimidade e a economicidade de atos, contratos, convênios, termos de parceria e outros ajustes, das aplicações das subvenções e renúncias de receitas, com vistas a assegurar a eficácia do controle que lhe compete e a instruir o julgamento de contas de gestão.

Cita-se, também, a regra de competência específica em matéria de licitações e contratos trazida pela Lei nº 8.666/93, que segue transcrita:

Art. 113. O controle das despesas decorrentes dos contratos e demais instrumentos regidos por esta Lei será feito pelo Tribunal de Contas competente, na forma da legislação pertinente, ficando os órgãos interessados da Administração responsáveis pela demonstração da legalidade e regularidade da despesa e execução, nos termos da Constituição e sem prejuízo do sistema de controle interno nela previsto.

§ 1º Qualquer licitante, contratado ou pessoa física ou jurídica poderá representar ao Tribunal de Contas ou aos órgãos integrantes do sistema de controle interno contra irregularidades na aplicação desta Lei, para os fins do disposto neste artigo.

§ 2º Os Tribunais de Contas e os órgãos integrantes do sistema de controle interno poderão solicitar para exame, até o dia útil imediatamente anterior à data de recebimento das propostas, cópia de edital de licitação já publicado, obrigando-se os órgãos ou entidades da Administração interessada à adoção de medidas corretivas pertinentes que, em função desse exame, lhes forem determinadas. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994).

Explícita, assim, no caso, a competência do TCM/GO para a matéria.

II - REQUERIMENTOS: Ante o exposto, este Ministério Público de Contas requer: a) de início, seja deferida medida cautelar, em caráter liminar, sem a oitiva

das partes, para determinar ao senhor João Flávio de Souza, Pregoeiro, ao senhor Fernando Machado, Secretário Municipal de Saúde de Goiânia, e ao senhor Paulo Garcia, Prefeito de Goiânia, a imediata suspensão do Pregão Presencial nº 019/13, sob pena de aplicação de multa fundada no art. 47-A, X, da LOTCM, comunicando-se os responsáveis pelos meios mais céleres disponíveis (eletrônico, fac-símile etc.);

b) seja deferido o prazo de 15 (quinze) dias para que os responsáveis se pronunciem a respeito das irregularidades apontadas nesta representação,

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Fls.:

consoante art. 246, § 4°, do Regimento Interno, e art. 56, §3º, da Lei Estadual nº 15.958/07 (LOTCM), com alerta de que os vícios apontados podem caracterizar infrações previstas no art. 47-A, VIII, XVI e XXII, da LOTCM, puníveis com multa;

c) seja fixado prazo para que a responsável apresente todo procedimento administrativo do Pregão nº 019/13 para fiscalização, contendo todos os documentos relativos às licitações dessa natureza arrolados na IN nº 15/12 deste Tribunal, sob pena de incorrer em infração e multa previstas no art. 47-A, XIII, da LOTCM;

d) ao fim, confirmados os vícios apontados nesta representação, seja determinada a anulação do Pregão Presencial nº 019/13, sob pena de multas pelas infrações previstas no art. 47-A, VIII, X, XVI e XXII, da LOTCM, sem prejuízo de apuração de outras infrações, aplicação de demais sanções legais e de débito por despesas irregulares decorrentes de contratos derivados do referido pregão.

Pede deferimento.

Goiânia, 19 de dezembro de 2013.

FABRÍCIO MACEDO MOTTA Procurador de Contas

Marco Aurélio