entrevista dep. jailson para o jornal diarinho

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DIARINHO “Nós mexemos com os bagres grandes da casa” Jailson Lima www.diarinho.com.br 9 Entrevistão Sábado e domingo, 29 e 30 de outubro de 2011

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Entrevista para o jornal diarinho

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Page 1: Entrevista Dep. Jailson para o Jornal Diarinho

DIARINHO

“Nós mexemos com os bagres grandes da casa”

Jailson Lima

www.diarinho.com.br9

EntrevistãoSábado e domingo, 29 e 30 de outubro de 2011

Page 2: Entrevista Dep. Jailson para o Jornal Diarinho

DIARINHO

Deputado estadual pelo PT

Jailson Lima

“Nós mexemos com os bagres grandes da

casa”

ENTREVISTÃO

Com a precisão de médico e o tino de fiscalizador, Jailson Lima (PT) soube diagnosticar uma grande ferida nos cofres públicos. Sem anestesia ou curativo, o deputado estadual foi logo colocando o dedo no machucado. Primeiro as denúncias dos supersalários de servidores (ativos e inativos) da assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc). Depois, o maior escândalo envolvendo um órgão estadual nos últimos anos: as aposentadorias irregulares por invalidez.

Através das investigações de Jailson, veio a triste constatação de que os cofres públicos tiveram um prejuízo de milhões de reais, numa “falha” justamente da instituição que deveria fiscalizar os recursos – entre as tantas prerrogativas que cabem ao poder legislativo. Inicialmente, a Alesc se posicionou na defensiva e tentou justificar os supersalários recebidos pelos “marajás” da assembleia. Depois, os salários foram ajustados pro teto, que equivale a pouco mais de R$ 20 mil que os parlamentares recebem por mês.

Com a coragem de quem descobriu uma fraude que vem de décadas e o ímpeto de quem cumpriu seu papel (mesmo contra pessoas do alto escalão político), Jailson recebeu os jornalistas Cláudio Eduardo e Gabriele Lindner e encarou o Entrevistão do DIARINHO. Sob os cliques de Minamar Junior, o deputado não teve papas na língua. Respondeu cada uma das perguntas de forma objetiva e com a sinceridade de quem não tem o rabo preso.

10 Sábado e domingo, 29 e 30 de outubro de 2011www.diarinho.com.br

Entrevistão [email protected]

Eu ousaria afirmar que o Colombo estará com a Dilma em 2014 nas eleições

DIARINHO – Hoje as denúncias de aposentadorias irregulares de servidores da assembleia legisla-tiva já tomaram grandes dimen-sões. Como começou essa luta?

Jailson – Tomaram uma di-mensão nacional tendo em vista o descalabro que se construiu nessa assembleia legislativa nos últimos 30 anos. O fato de eu ser médico e ter sido perito judicial e hoje ser o primeiro secretário da assembleia me permitiu ter acesso a uma série de informações que até então eram negadas. No mandato passado eu já tinha feito uma série de questio-namentos, mas a assembleia tem um espírito de corpo muito forte. Então, este ano, nós conseguimos reduzir os salários para o teto cons-titucional de mais de 120 servido-res. Isso reduziu em aproximada-mente R$ 5 milhões só na folha de pagamento desses que ganhavam mais de R$ 20 mil de salário. Ti-nha 11 deputados aposentados cuja aposentadoria maior chegava a R$ 36 mil. Hoje ninguém ganha mais que o salário de deputado que é R$ 20.046. A partir daí eu comecei a verificar que aqui chegava uma série de pedidos para se aposentar por invalidez permanente, assim como uns já estavam aposentados e queriam o reconhecimento de invalidez permanente. Aí comecei a ir atrás. E durante vários tempos vinham algumas denúncias como teve em 1982, 83, que chamaram de CPI de Bengala. Mas, na reali-dade, é um debate extremamente tenso. Aqui a gente acaba mexendo com um conjunto de pessoas que não são peixinhos pequenos. Nós

mexemos com os bagres grandes da casa. À medida que nós levan-tamos isso, em que eu verifiquei que aqui tínhamos uma epidemia de doenças cardíacas graves em pacientes jovens, gente aposentada com 22 anos de idade e com sete dias de trabalho, gente que se apo-sentou antes de entrar assembleia, que já tava com o atestado de in-validez permanente. Epidemia de doenças de reumatismo, de espon-dilite anquilosante, que não dá em 1% da população. Aqui 11% dos aposentados eram por espondilite anquilosante. Aí nós começamos a observar a verdadeira fraude que se construiu, tendo em vista que a aposentadoria por invalidez perma-nente dá alguns privilégios: você não paga imposto de renda – sone-gação fiscal; você se aposenta com o salário integral – não tem des-conto, o que é outra fraude; alguns compraram apartamentos, imóveis financiados e aí quitavam; outros recebiam seguro, pelo seguro de vida que tinham, pela aposenta-doria por invalidez permanente. E grande parte disso construído por gente da procuradoria jurídica da assembleia legislativa, que era quem conhecia os mecanismos de como fazer. E aí você tem trâmites. O cara chega com o atestado, tinha gente que se aposentou sem ser com o atestado médico, passa pelo Recursos Humanos da assembleia, depois passa pela assessoria jurí-dica da assembleia, depois passa pela mesa diretora, vai pro Tribunal de Contas e o tribunal diz ok. Ob-servem quanta gente foi enganada. Uns por má fé, outros sem terem

má fé. Mas aqui se construiu uma forma de aposentadorias pra apa-drinhamento político de outros que entraram no lugar desses.

DIARINHO – Inicialmente, a postura da Alesc foi de defen-der os supersalários com unhas e dentes. Gelson Merisio (PSD) lavou as mãos por se tratar de decisões anteriores ao período que ele presidia a assembleia; e a procuradoria garantiu que iria defender os salários dos servido-res acima do teto dos deputados. Por que essa omissão justamente do líder do legislativo?

Jailson – Eu não diria que o pre-sidente Merísio foi omisso. Eu acho que ele foi um presidente que assu-miu o papel dele e o que tem que ser feito está sendo feito. Ele não se dobrou ao espírito de corpo da casa. Acontece que aqui na assem-bleia o que mais se escutava – se escutava, não se escuta mais – é que isso sempre foi assim. Chega-ram a me dizer que o dia que eu fosse embora daqui tudo ia voltar ao normal, como se o normal fos-se essas malandragens todas, essa falcatrua. Num primeiro momento, o que a procuradoria jurídica dizia pro Merísio? ‘Não, tá tudo ok, não tem nada de irregular’. Só que eu fi-quei aproximadamente oito meses

me aprofundando em documentos e relatórios aqui, pra não errar. Então, quando você tinha uma justificativa jurídica, eu tinha uma resposta técnica e clara com docu-mentos pra provar. E à medida que a gente foi mostrando, debatendo... Contra fatos não há argumentos. Com fatos há um conjunto real, e essa realidade representou o desvio de R$ 360 milhões em aposentado-rias indevidas nesse período, sem considerar o custo dos 120 que en-traram nesse período. Porque aqui também disseram que a média do salário dos aposentados era de R$ 6 mil. Primeiro que não é verdade;

segundo que, sobre as aposentadorias, você tem 13º; você tem os encargos sociais sobre isso tudo, você tem vale-refeição, tem

o auxílio pra quem faz pós-graduação, uma série de nuances que tem nesse conjunto. Então, nisto não me enrolaram em absolutamente nada, porque consi-derei as agregações desse período.

DIARINHO – De todas as his-tórias escabrosas envolvendo as aposentadorias irregulares, qual delas deixou o senhor mais indig-nado?

Jailson – Eu diria que o conjunto da obra. Mas o mais indignado que dá pra gente ver mesmo é a grande maioria desse povo se aposentan-do numa faixa etária abaixo dos 40 anos de idade. O maratonista que aposentou-se aqui com 34 anos de idade, com seis anos de trabalho [

O maratonista a que ele se refe-re é Gaizito Nuernberg, que não podia trabalhar por problemas cardíacos. Mas, no início do mês, correu a Maratona Caixa de Santa Catarina. Aos 63 anos, ele percor-reu 10 quilômetros em 1 hora, 3 minutos e 24 segundos]. Quando a gente vê isso... É de uma imora-lidade. Quando a gente vê tantas pessoas necessitando... Olha, R$ 360 milhões dá pra fazer quase 290 mil cirurgias num mutirão em San-ta Catarina! Quantas pessoas não seriam salvas com isso? O conjunto da obra eu acho que representa a grande mácula do poder público. O importante é que a assembleia está revendo isso, não está escondendo. E o que também foi observado é que somente a assembleia de Santa Catarina tem esse cenário, nenhu-ma outra tem esse cenário das apo-sentadorias do jeito que tá aí.

DIARINHO – Em algum mo-mento o senhor foi perseguido ou acuado por algum deputado ou por servidores relacionados na lista dos supersalários da Alesc?

Jailson – O que distribuíram com carta anônima a meu respei-to é algo inconcebível. Eu mesmo, através de um ato que a gente so-licitou, em torno de 600 cartas fo-ram recolhidas, onde disseram que eu tinha altos salários, funcionários fantasmas, sendo que eu tenho três servidores aqui. Divulgaram no Alto Vale, a minha região, que eu peguei diária da assembleia – ro-dou e-mail, Facebook, Twitter – pra passear na enchente em Rio do Sul. Eu tive duas diárias durante os pe-

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DIARINHO Sábado e domingo, 29 e 30 de outubro de 2011www.diarinho.com.br

19Entrevistã[email protected]

RAIO-XNome: Jailson Lima da SilvaNaturalidade: Siderópolis/SCIdade: 53 anosEstado civil: casadoFilhos: doisFormação: médico perito do trabalho

e reumatologista Trajetória profissional: na juventu-

de atuou no Movimento Estudantil da Universidade Federal de Santa Catarina. Mas só ingressou efetivamente na vida pública em 1992, quando disputou pela primeira vez a prefeitura de Rio do Sul. Não ganhou. Na eleição seguinte, con-correu ao cargo de prefeito novamente e por pouco mais de 300 votos não foi eleito. Em 2000, enfim Jailson venceu a eleição e assumiu o comando do muni-cípio. Em 2006, foi eleito deputado es-tadual. Com 33.129 votos na disputa de 2010, Jailson foi reconduzido à assem-bleia legislativa, e hoje ocupa o posto de primeiro secretário da mesa diretora.

CostumavamdizerquedeputadonenhummexiacomTribunaldeContasoudeJustiçaporquetinhamedo.Esseéonossopapel.

ríodos das enchentes pra acompa-nhar a região: fui a Brusque, Gas-par, fui a diversos lugares, não fui a Itajaí. Só o que eu produzi em eco-nomia nessa casa com a redução do teto salarial, dá as diárias dos 40 deputados pelos quatro anos. E o que eu faço é muito transparente e eu assumo claramente.

DIARINHO – E a pensão vita-lícia pra ex-governadores? Existe alguma forma da assembleia criar mecanismos pra acabar com essa regalia?

Jailson – Essa é uma luta que está sendo feita principalmente pelo deputado Padre Pedro (PT), que já foi pra justiça. É inconcebí-vel que uma pessoa que trabalhe três meses como governador incor-pore uma aposentadoria vitalícia de R$ 24 mil, R$ 25 mil. Eu con-cordaria se ele tivesse feito a con-tribuição previdenciária sobre isso, assim como se aqui na assembleia tivesse uma aposentadoria. Os 11 ex-deputados que tem aqui, vários deles se aposentaram incorporando o salário de deputado, por uma lei que fizeram aqui. Mas não contri-buiram por isso. Se eles tivessem contribuído em 30 anos de presta-ção de serviço sobre esse valor, não tem problema, eles contribuiram financeiramente pra isso. Então, logicamente que a gente é contra e vamos tentar derrubar isso.

DIARINHO – Como a base go-vernista é maioria absoluta na assembleia, a bancada de oposi-ção consegue, de fato, fazer opo-sição ao governo de Raimundo Colombo(PSD)?

Jailson – Não, aqui é um rolo compressor. A gente faz oposição no debate político, esse é o nosso

papel. A gente faz o bom comba-te propositivamente, até mesmo porque o governo Colombo já está mais governo dilmista do que outra coisa. Ele tá na nossa base de apoio federal. Isso está mais do que claro pelos passos que estão sendo dados aqui. Agora, de qualquer maneira, nós vamos continuar cobrando os investimentos que não estão sendo feitos: na Saúde... Hoje mesmo [a entrevista foi feita na última se-gunda-feira, fim da tarde] tivemos audiência pública sobre Segurança, onde a gente tá vendo uma verda-deira guerra entre polícia Civil e polícia Militar, enquanto a popula-ção está sem ser atendida por ques-tões mínimas. Eu diria que é mais problema de vaidade de corpos do que problemas efetivos existentes entre as instituições. Enquanto isso a população fica à deriva.

DIARINHO – No início do ano, o governador fez todo um alvoroço de que cortaria despesas, inclu-sive suspendendo o contrato de locação do avião do governo. No entanto, já no início do ano fez um tour pela Europa. Agora está em viagem pela Ásia. Até que ponto estas viagens são necessá-rias? Vale o investimento do povo pra que Colombo e parte da sua equipe acumulem carimbos no passaporte?

Jailson – Eu vou te dizer uma coisa: a gente tem que chegar além das fronteiras. Eu sou um deputado que fez várias viagens à China. E, no entanto, recebi dia 29 uma co-menda de um estado-irmão de San-ta Catarina. A Comenda da Amiza-de do Rio Amarelo, só sete pessoas receberam isso [fala enquanto mostra, orgulhoso, as páginas de uma revista com fotos dos que

receberam a honraria chinesa]. Tem da Coreia, da Alemanha, um americano... Pelas relações que a gente tem construído. Agora nós assinamos um protocolo com o

hospital da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pra po-der ir estudantes pra lá, residentes e vice-versa. Viviam dizendo que o presidente Lula só viajava. O que deu a sustentação econômica pro Brasil na crise? Além do consumo interno, o comércio internacional e o Brasil ser visto do jeito que é. Eu não sou crítico em relação às viagens, desde que elas deem re-sultados. Desde que elas sejam re-lações de necessidades. Agora, por exemplo, ele foi pro Japão ver o projeto Jica, que nos foi apresenta-do aqui na assembleia. Tem depu-tado acompanhando, inclusive. É um projeto que prevê redução das cheias, são R$ 200 milhões iniciais e o governo da Dilma já disse que vai dar 50% da contrapartida do estado. Então, se a gente encami-nhar pra fazer isso evoluir, quantas famílias deixarão de ser inundadas com as cheias? E aí não adianta, tem que ir, porque os investimen-tos são empréstimos internacio-nais, e o governo japonês, através da Jica, permite o empréstimo de R$ 200 milhões pra esse processo.

Se for em viagens de trabalho, eu não sou contra. Eu costumo dizer o seguinte: o prefeito, o governador, o deputado que só fica dentro da sua área, ele não enxerga o mundo

e não vê a velocidade em que isso anda. Acho que isso é investimento, não é despesa.

DIARINHO – Em con-trapartida às viagens pro exterior, Colombo tem ido a Brasília? O senhor acha que apesar de ter feito de tudo pra que José Serra (PSDB) derrubasse Dilma Rousseff (PT) na última

eleição, Colombo tem se esforça-do pra manter uma boa relação com a presidente?

Jailson – A presidente Dilma, o nosso governo federal, está aten-dendo o nosso estado de uma for-ma republicana, como ninguém. Se a gente observar, só agora nas cheias o volume de recursos libera-dos do fundo de garantia, os inves-timentos pros municípios de cala-midade, de emergência. Se ele for reclamar disso... O investimento de R$ 28 milhões que vai ser dado pro projeto Jica, 70 mil casas que se-rão construídas em Santa Catarina até 2014, com recurso do governo federal, porque até agora não tem um centavo do estado anunciado pra isso. Independente das relações políticas que tiveram, a eleição passou. Nós temos que estar admi-nistrando pro povo como um todo e, logicamente, em 2012, 2014, nós vamos ser adversários do Colombo. É muito pouco provável que esteja-mos juntos nos municípios ou no estado. Mas isso não impede que em 2014 a base do governo Colom-bo, através do PSD, esteja apoian-

do a Dilma. Eu ousaria afirmar que o Colombo estará com a Dilma em 2014 nas eleições.

DIARINHO – O senhor comba-teu os supersalários na Alesc. Já tem alguma situação engatilhada pra ser sua próxima luta enquan-to deputado?

Jailson – Eu sou um deputado paz e amor, eu não gosto de briga, nem de conflitos [falou com leve tom irônico, já que a fala contra-diz a postura aguerrida que teve pra derrubar os supersalários e as aposentadorias irregulares da assembleia]. Mas logicamente que a gente vai continuar. Por exemplo, a compra do prédio pelo Ministé-rio Público, aqui em Florianópolis, é uma coisa vergonhosa. Com-praram um prédio em caráter de emergência, sem licitação, por R$ 52 milhões. Hoje o município tem terrenos, o estado tem terrenos, que poderiam doar pro Ministério Público pra fazer uma construção, com licitação normal. O Ministério Público, que era pra estar dando o exemplo nesse momento, não deu. Porque, primeiro, não tem que ter uma compra dessa em caráter de urgência, porque isso permite que a compra seja sem licitação. No dia a dia, a gente tá aqui pedindo os salários do Tribunal de Justiça, do Tribunal de Contas de Santa Catarina – que é outra coisa cala-mitosa e vergonhosa. É um poder independente dentro do Tribunal de Contas, onde nós vimos um que recebeu em fevereiro R$ 78 mil de salário, trabalhando seis horas por dia. E, se bobear, tem dois meses de férias. Nós estamos solicitando sobre todos os órgãos, não somente da assembleia legislativa. Costuma-vam dizer que deputado nenhum mexia com Tribunal de Contas ou de Justiça porque tinham medo. Esse é o nosso papel. Se estamos mexendo aqui, e aqui estamos fa-zendo uma cirurgia, os outros po-deres também têm que passar por este procedimento cirúrgico.

DIARINHO – Já que o senhor é um combatente dos gastos desne-cessários com folhas de pagamen-to no poder legislativo estadual, como avalia a manutenção do projeto de descentralização atra-vés das secretarias de Desenvol-vimento Regional (SDR)? Manter estas estruturas é realmente ne-cessário?

Jailson – Eu sou contra. A maioria das secretarias regionais é uma coisa inoperante. O Colom-bo, quando era adversário do Luiz Henrique [ex-governador que en-cabeçou o projeto de descentrali-zação através das SDRs], o que ele dizia? Que as secretarias regionais eram um guarda-roupa com cabi-des de empregos. Eu acho que ele só não desmonta essas secretarias com vergonha e pelos compromis-sos políticos que tem. Porque con-tinua sendo cabide de empregos. A gente anda pelo estado e vê um monte de ex-vereador, ex-prefeito, tudo pendurado nesses cargos e com uma capacidade resolutiva ex-tremamente pequena.

DIARINHO – Como médico, o

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DIARINHO20 Sábado e domingo, 29 e 30 de outubro de 2011www.diarinho.com.br

Entrevistão [email protected]

Então,odeputadômetro,àmedidaqueeleslançaram,eulanceiosonegômetro.EuqueroverquemsonegamaisnaFacisc.

senhor vê alguma saída pra me-lhorar a saúde de Santa Catarina?

Jailson – Não é a questão da Saúde de Santa Catarina apenas. É a questão do Brasil. Nós, além da aprovação da emenda 29, que é a que regulamenta a saúde do Bra-sil, temos que definir as fontes de investimentos e as origens dos re-cursos pra isso. E aí eu defendo tri-butação das grandes fortunas e do capital especulativo financeiro que roda no Brasil. Se a Europa está fazendo isso, por que não temos que fazer? Na realidade, quando se defendia a CSS [Contribuição So-cial para a Saúde], nada mais era do que você controlar a sonegação fiscal desse país. Mesmo que seja 0,0001%. Mas é controle da sone-gação fiscal no país. Então, nós temos é que definir claramente a origem dos recursos, e nós precisa-mos de pelo menos R$ 50 bilhões a mais no orçamento do Brasil pra se garantir as questões da Saúde. Porque nós temos o maior sistema de Saúde do mundo e o mais de-mocrático. Não tem nenhum ou-tro país do mundo que tenha um sistema gratuito, que atenda 200 milhões de pessoas. Nós temos o maior programa de distribuição de medicamentos retrovirais do mundo, pra Aids. Quem paga isso? Agora, medicamentos pra hiperten-são e diabetes, que pega o rico e pega o pobre. São 11 medicamen-tos. Só Santa Catarina tem 1390 farmácias que distribuem. Quem paga isso? Nós temos o país com o maior número de cirurgias car-díacas do mundo, 99% pelo SUS [Sistema Único de Saúde]. Só no ano passado foram consumidos no sistema de tratamento de pacientes crônicos, de doenças renais, hemo-diálise, quase R$ 2 bilhões. É tudo público. Então, quando a popula-ção reclama – e reclama muitas ve-zes – é da falta de resolução dos serviços na ponta. Porque nós te-mos que melhorar muito a gestão e com isso melhorar o sistema. Mas, o SUS é um sistema muito jovem, é muito recente. Por isso tem que ter paciência.

DIARINHO – Com essas dispu-tas internas que já são históricas no PT de Santa Catarina, quando o senhor acredita que o partido vá conseguir eleger pela primei-ra vez um governador no nosso estado? Com o fortalecimento de Ideli Salvatti na esfera federal, será que ela deve esquecer os desentendimentos e alavancar a candidatura de Cláudio Vignatti pra 2014?

Jailson – Eu acho o seguinte: a gente tem que ter paciência. O PT já cometeu muitos equívocos. Mas, mesmo cometendo equívocos, tem muitas virtudes e o fez cometer muito mais acertos. Nós somos o primeiro partido que reelegeu o sucessor do sucessor. O PT cres-ceu na sua história. Somos a maior bancada federal do Brasil, a maior bancada de deputados estaduais do Brasil e a segunda maior no Senado. Nós crescemos muito. Os conflitos que nós temos em Santa Catarina – e que os outros partidos também têm – eu acho que cabe muito aos dirigentes terem mais

humildade. Calçarem as sandálias da humildade. Porque, muitas ve-zes, essas brigas levam ao desgas-te, ao desperdício de tempo.

DIARINHO – Hoje tem municí-pios em que o PT cogita alianças com o DEM e com o PSDB, como em Itajaí, por exemplo. Pra elei-ções municipais vale tudo?

Jailson – Infeliz do cidadão que não rever a sua história. O PT cresceu. E pra crescer, democra-ticamente, tem compressões com lógicas locais. Desde que você não transgrida os princípios, eu não vejo problema. Porque em determi-nados lugares o PT tem uma dire-ção local. Por exemplo, que é o de não ser vice nem do PSDB nem dos Democratas. Compõe, desde que o PT esteja na majoritária, porque essa foi a resolução do partido.

DIARINHO – O senhor pretende concorrer à prefeitura de Rio do Sul no ano que vem?

Jailson – Nós vamos ter candi-datos na maioria dos municípios do Alto Vale, mas hoje eu não devo ser candidato a prefeito em Rio do Sul. O meu papel é continuar cons-truindo o partido, como tenho fei-to, tentando unificar as tendências do partido. Eu costumo dizer que todas as tendências são a minha, porque a minha tendência é o Par-tido dos Trabalhadores. Então va-mos ter candidato. O nosso candi-dato em Rio do Sul chama-se Jean de Liz (PT), que foi meu secretário de Cultura. Um jovem militante do PT, presidente da Câmara Júnior Nacional hoje.

DIARINHO – O senhor acha certo os cofres públicos terem de bancar, através das diárias, a ida dos deputados a cada canto do mundo? Recentemente houve al-gumas denúncias de que o senhor recebia diárias até pra ir pra casa. Isso realmente acontece?

Jailson – Essas diárias são as da enchente, as que eu citei antes. Nós temos que entender que um deputado é um empregado do povo e ele tem que ter estrutura pra tra-balhar. O telefone aqui é pago pela assembleia; o carro é um elemento de transporte... Se eu estou numa empresa e sou vendedor, a empre-sa me concede o carro. As diárias, como eles denunciaram, que foram duas, eu tô indo a Brasília. Já fui a Brasília sem diária e não reclamei. Durante as enchentes, teve uma viagem, porque você tem que pedir as diárias antecipadamente, fiquei quatro dias em Brasília e paguei do meu bolso. Já fiz devoluções de diárias que não usei. Agora, se eu vou executar o meu trabalho, eu acho que tenho que receber as diárias, porque isso é um custo. O importante é que aqui eu execute o meu trabalho com responsabilida-de. E aí eu quero te perguntar [fala em direção a um dos repórteres] e fica pro povo responder: estou ou não cumprindo com o meu papel aqui quando, depois de 30 anos, le-vantei o que nunca se levantou? Es-tou ou não cumprindo meu papel aqui à medida que a gente reduz o salário de 122 pessoas que ganha-vam mais que um deputado? Isso

representa uma economia de R$ 5 milhões no ano. Se eu ficar aqui 40 anos, eu não vou gastar isso em diária. E se você verificar, eu não estou entre os deputados que mais tiram diária nessa casa. Eu estou de uma forma mediana pra menos. Então, quando eu tiver que tirar uma diária, é de minha responsa-bilidade tirar, e vou tirá-la sem pro-blema porque tenho como justifica-tiva o trabalho que executo.

DIARINHO – Ainda nessa ques-tão das diárias, o senhor acha que nessas andanças pra criação do PSD os cofres públicos possam ter bancado parte das viagens da turma de Colombo na luta pra ar-recadar assinaturas pelo estado? Até que ponto os catarinenses sa-íram prejudicados com o envolvi-mento de parte dos comandantes do estado nessa empreitada de viabilizar a criação de um novo partido?

Jailson – O PSD que tem que responder. Mas, logicamente, que cada deputado e as pessoas do governo, nos seus trabalhos polí-ticos nas regiões, construíram as relações pra ter em Santa Catari-na o novo partido. O nosso esta-do é o que tem o PSD mais sólido do Brasil, não é São Paulo. Ficou com o governador e o maior nú-mero de prefeitos e deputados es-taduais. Na execução política da sua função, eu diria que não vejo problemas. O problema é se saiu especificamente pra isso, aí é o questionamento.

DIARINHO – Pela sua luta con-tra os supersalários, dá pra con-cluir que o senhor defende uma redução nos gastos do dinheiro público. Este ano, houve um sur-to – assegurado por decisão do tribunal Superior Eleitoral (TSE) – de aumento de cadeiras nos le-gislativos municipais. O senhor é favorável a esse aumento em mas-sa do número de vereadores?

Jailson – O salário de vereador e de deputados, a luta surgiu da classe trabalhadora. Sabe por quê? Porque o trabalhador, pra poder representar politicamente, ou ele deixa o tra-

balho ou fica na câmara. Você tem nos poderes públicos, basicamente, representantes de quem tem poder aquisitivo e dos órgãos corporativos. Você pode ter numa assembleia ou numa câmara de vereadores 10 pi-caretas e 14 pessoas sérias. O que é mais prejudicial? O importante é que você não tenha aumento dos custos. Então, eu não me importo que au-mente, desde que você não tenha que aumentar os custos da casa. Em Rio do Sul, já teve 13 vereadores. Agora são 10 e estava se propondo novamente 13. Fizeram um movi-mento. Eu não era contra os 13 e, in-

clusive, o PT propôs que se reduzisse o salário dos vereadores e se elimi-nasse os assessores, que lá é um por vereador. É uma forma. Porque per-mite que a sociedade participe mais democraticamente. Senão, por que sempre os mesmos? E aí você faz a discussão apenas numérica, não do ponto de vista qualitativo. E isso não é bom pra democracia. O importante é debater se a representação é quali-tativa ou não. Se ela é resolutiva ou não.

DIARINHO – O ranking do de-putadômetro deve voltar pro ar, por estes dias, no site da Facisc [federação das Associações Em-presariais de Santa Catarina]. O que o senhor achou desta ferra-menta?

Jailson – Primeiro: o que é a Facisc? Uma entidade empresarial. Eu aqui represento quem? Segun-do: eu fui o deputado que mais apareceu na mídia até agora, no estado de Santa Catarina, inclusive

com matéria no Fantástico [repor-tagem sobre as irregularidades em aposentadorias por invalidez na Alesc], no entanto, era um dos deputados pior avaliado pelo de-putadômetro. Perdi pro Parizzotto, rapaz! [Narcizo Parizotto era o presidente do PTB estadual, mas, recentemente, foi destituído do posto pelo líder nacional do parti-do, o ex-deputado federal Roberto Jefferson. Hoje Parizotto está no PSD]. Perdi pro Altair Guidi, que é um dos aposentados. [O deputa-do estadual do PPS é um dos que aparece na listinha dos supersa-lários denunciados por Jailson. Ele acumulava o salário de de-putado com o de ex-deputado] Porque, como primeiro secretário da assembleia, eu fiquei enfurna-do, estudando documentos. Aqui não passa um projeto sem eu ter que ler. O que vem de documen-to... Na mesa diretora você não participa das reuniões das comis-sões, que dá ponto. Pela Facisc eu sou um dos piores deputados que tem aqui. Eu não sei quantos vocês procuraram aqui pra entre-vistar, mas vieram me entrevistar por causa do meu trabalho. En-tão, o deputadômetro, à medida que eles lançaram, eu lancei o sonegômetro. Eu quero ver quem sonega mais na Facisc. Por que não, já que eles têm o deputadô-metro? Não é a presença física que constitui trabalho. O que constitui trabalho é o que você produz de resultado nisso. Eu aprovei aqui o projeto de lei da transparência pra todos os órgãos de Santa Catarina. O governo vetou. Eu tô indo ago-ra lá no governo pra discutir isso. Vetou porque o Tribunal de Contas e o Tribunal de Justiça pediram que vetasse. Que interesse é esse? Então eu quero ver o tal do depu-tadômetro, porque provavelmente eu não vou tirar uma nota muito boa. E vou continuar questionan-do, porque aqui eu represento o trabalhador, o contingente da so-ciedade catarinense, e não vai ser a Facisc ou a Fiesc [federação das Indústrias do Estado de Santa Ca-tarina] que vai qualificar o serviço de um deputado.