entrevista com brigadeiro menezes

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9 771519 559006 72 ISSN 1413-1218 R$ 16,90 Guerra Fria SR.45 PRinceSS A história épica e trágica do último dos hidroaviões gigantes da aviação comercial +JunkeRS Ju-88 + BRigadeiRo MenezeS + elaS, no coMando + Vultee Vengeance

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Publicada na edição 72 de ASAS – Revista de Cultura e História da Aviação

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Guerra FriaSR.45 PRinceSSA história épica e trágica do último dos hidroaviões gigantes da aviação comercial

+JunkeRS Ju-88+ BRigadeiRo MenezeS+ elaS, no coMando+ Vultee Vengeance

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MAJOR-BRIGADEIRO DO AR LAURO NEY MENEZES

ENTREVISTA Por João Paulo Moralez

Na sede do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica (Incaer), conversamos com uma das mais emblemáticas personalidades da Força Aérea Brasileira (FAB), cuja biogra-fia se confunde com a própria história desta. Tendo voado do Republic P-47D Thun-

derbolt ao Northrop F-5E Tiger II, o Major-Brigadeiro do Ar (Ref.) Lauro Ney Me-nezes relembra os principais fatos da sua carreira nesta entrevista inédita.

mento atualizado invejável, possui uma visão crítica e de vanguarda quanto ao papel da FAB neste século 21, bem como mantém acesa a chama e a vibração de quando era um jovem oficial na BASC.

Descendente de uma linhagem de personalidades proeminentes no Exér-cito Brasileiro, seu avô, o Marechal de Exército Manoel Félix de Menezes, combateu como 2º-tenente na Guerra de

influenciou a avaliação e implantação do primeiro caça supersônico da FAB, o Dassault Mirage IIIE; a implantação do Northrop F-5E Tiger II e do Embra-er T-27 Tucano; além de outros fatos de extrema relevância para os segmentos de ensino, pesquisa e desenvolvimento. De cabelos brancos e no auge dos seus 85 anos, o Brigadeiro Menezes, que une uma experiência ímpar a um conheci-

Na história da FAB, após o regresso do 1º Grupo de Aviação de Caça (1º

GAVCA) dos céus da Itália para a Base Aérea de Santa Cruz (BASC) em 1945, poucas personalidades impactaram tanto a trajetória da Força, a partir da-quele momento e pelas mais de quatro décadas seguintes, como o Major-Bri-gadeiro do Ar Lauro Ney Menezes. Ho-mem certo na hora certa, seu trabalho

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cutiram isso em mim, eles pensa-vam que nós tínhamos que ser soldados prontos para ação no ar, sabendo ma-nobrar a minha máquina de guerra, o meu armamento, atacar o meu inimigo e ser capaz de garantir a sobrevivência do País na sua dimensão atmosférica e estratosférica. Essa era a missão que eles trouxeram e passaram para nós.”

A mentalidade do piloto de combate extrapolava os limites da aviação de ca-ça para as demais aviações que da mes-ma forma exercem a atividade de defesa da pátria, seja no reconhecimento, ata-que, transporte e patrulha, entre outros.

“Eles não abriam mão, não aceita-vam o piloto medíocre, pois se fosse pa-ra formar o combatente, tinha que ser uma tropa de elite. Esses homens têm um valor que, até hoje, nós não reco-nhecemos por completo. Na realida-de, eles mudaram o paradigma de con-jugação. A FAB prestadora de serviço passou a ser uma força de combate e essa mentalidade se espalhou de Santa Cruz para os demais esquadrões, con-forme os tenentes, capitães e majores foram sendo promovidos e transferidos para outras unidades. A FAB, uma crí-tica construtiva que eu faço, era um ae-roclube gastando gasolina de aviação. Todo mundo voava de avião, de lá para cá, mas ninguém estava preparado pa-ra o combate. Os veteranos mudaram a Força Aérea, estabelecendo normas e padrões, deixando tudo escrito e rela-cionado, como programas de missão, formas de aferir eficiência, computa-ção de alvo e tiro, criando a FAB orga-

Canudos, enquanto o General de Exército Lauro de Menezes, seu pai, também te-ve atuação de destaque ao longo da sua carreira. Assim, herdeiro dessa tradi-ção familiar da vida militar, ao contrá-rio do pai e do avô, o jovem Menezes optou por erigir a sua carreira na avia-ção, na recém-criada FAB: “eu saí aspi-rante e fui selecionado para fazer o cur-so de caça na BASC. O 1º GAVCA havia chegado da guerra em 1945 e, evidente-mente, eu era cadete ainda. Não posso me esquecer do impacto ao ver 19 avi-ões P-47D voando no Campo dos Afon-sos, todos liderados pelo Coronel Nero Moura. Eu saí de forma, fui para a pista e fiquei debaixo do avião do Nero, que tinha o número ‘1’ pintado em preto no motor. Eu, pequenininho, quando che-guei embaixo do P-47D andava sem en-costar nas asas. Ele era enorme, carrega-va a mesma quantidade de combustível que um Douglas C-47, e eu cheguei à conclusão que não conseguiria voar um avião daquele tamanho.

“Quando eu me dei conta, já esta-va servindo em Santa Cruz. Ao retor-narem para o Brasil, os veteranos do 1º GAVCA enfrentaram aqui uma verda-deira guerra, que era a de mostrar que a FAB não era uma organização voltada para a prestação de serviço, mas a pro-teção dos céus do Brasil. Eles vieram da guerra, com toda aquela experiência e sofrimento, e se propuseram a criar a mentalidade do piloto de combate, do soldado do ar, do homem que guarnece uma máquina de guerra. Não tem nada de levar correspondência ou transpor-tar pessoas. Eles pensavam assim e in-

Na Escola de Aeronáutica, em 1945, o então Cadete Menezes em voo solo no

Fairchild PT-19, sobrevoan-do o Campo dos Afonsos.

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nizada. No Brasil, não existia a figura do ‘esquadrão’ e do ‘grupo’. Santa Cruz funcionava organizadamente como na guerra, com o comandante, o oficial de operações, os quatro membros do Esta-do-Maior do esquadrão, comandantes de esquadrilhas e de elementos. A ad-ministração era feita pela base. Nós, vo-ávamos e combatíamos. Essa mudança foi feita a duríssimas penas, eles paga-ram um preço que você não pode ima-ginar, porque a FAB não entendia, mui-ta gente lutava contra.”

Ao sair da Escola de Aeronáutica, no lendário Campo dos Afonsos, em 1948 o então Aspirante Menezes, jun-to com outros 23 alunos, ingressou no 3º Estágio de Seleção de Pilotos de Ca-ças (ESPC). O 1º GAVCA era dividido no 1º/1º GAVCA, que operava os P-47D Thunderbolt recebidos novos de fábrica ao fim da 2ª Guerra Mundial, e o 2º/1º GAVCA, voando os P-47 trazidos da Itália e mais uma frota de North Ame-rican AT-6.

No ESPC, Menezes voou aproxima-damente 130 horas nos AT-6 e outras 100 horas nos P-47D, concluindo as-

sim o curso de piloto de caça no 2º/1º GAVCA. A formação continuou ain-da pelo ano seguinte, no 1º/1º GAVCA, para onde foi transferido, realizando a preparação para tornar-se líder de ele-mento, comandando duas aeronaves, e líder de esquadrilha (quatro aeronaves), além de treinar, exaustivamente, mano-bras táticas de combate, aperfeiçoando--se como piloto de caça. Entre os seus mentores estavam nomes como o do próprio Nero Moura, Rui Moreira Lima, José Rebelo Meira de Vasconcelos, Josi-no Maia de Assis, Renato Goulart Pe-reira e Hélio Langsch Keller. Por ser um piloto de destaque e extremamente bem qualificado, após um período no 1º/1º GAVCA, Menezes foi selecionado para ser instrutor no ESPC, voando as aero-naves AT-6 com os recém-chegados as-pirantes da Escola de Aeronáutica.

“Outro período que me deixou mui-to impactado, voltado para a importân-cia do próximo passo, outra lição que os veteranos incutiram em mim, era a maneira de passar o bastão, de como eu formo o meu seguidor, como Nero fazia para levar os homens dele para a guerra,

sua forma de agir, que tipo de imagem o líder tem que dar ao seu ala para di-zer que ele vai voar contigo sem saber se vai voltar. Esse tipo de coisa eu chamo de doação, de entrega. Quando eu fui designado instrutor, levei um susto e fi-quei muito feliz, pois, pela primeira vez, me dei conta de que eu era o responsá-vel pelo que viesse. Essa noção de com-promisso e fazer acontecer também mu-dou a minha personalidade. Eu passei a entender, o que a gente entende hoje, que este país não vai crescer enquanto nós não dermos um jeito na nossa edu-cação e formação. Na aviação de caça era o mesmo, pois o piloto de combate só seria excelente se ele tivesse instru-tores que dissessem como é que se faz e que cobrassem dele. Eu era um jovem de cabelo preto, mas com mentalidade de cabelo grisalho.”

O Brigadeiro Menezes permaneceu até 1953 em Santa Cruz, de onde acom-panhou com tristeza a despedida dos últimos P-47D Thunderbolt, que dei-xaram o 1º GAVCA naquele ano, trans-

A bordo do “poderoso” Re-public P-47D Thunderbolt,

o Aspirante Menezes realiza uma missão de bombar-

deio picado, quando tinha apenas 20 anos de idade.

O Brigadeiro Menezes (esquerda) exibe seu

largo sorriso após retor-nar do voo histórico a Mach 2 realizado com

o Comandante Paillard em Dijon, em 27 de julho

de 1967, a bordo de um Mirage IIIB. O Brasil co-

nhecia o seu primeiro piloto a voar o clássico

caça delta da França.

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feridos para Natal (RN), continuando a formação dos novos pilotos de caça. Por outro lado, pôde acompanhar a introdu-ção do primeiro avião a jato a ser opera-do no Brasil e nele voar – o caça bimo-tor britânico Gloster Meteor. Sendo um dos mais modernos jatos de combate na época, 60 exemplares da versão mono-place (F-8) e dez da versão biplace (TF-7) foram adquiridos e distribuídos para o 1º GAVCA.

O brigadeiro também teria um perí-odo de dois anos em Natal, para auxiliar na implantação do 2º/5º GAV “Esqua-drão Joker” com os P-47D, onde tam-bém atuou como oficial de operações. A sua visão de vanguarda e a excelên-cia com que exercia a profissão moti-varam os seus superiores a selecioná-lo como instrutor do emprego da aviação de caça na Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais da Aeronáutica (EAOAR). Levando como mote que para ensinar é preciso, antes de mais nada, saber com profundidade e riqueza de detalhes o que está sendo ensinado, o Brigadeiro Menezes buscou especializar-se no te-ma, uma vez que suas palavras influen-ciariam a carreira profissional de todos aqueles que o estavam ouvindo, muitos dos quais ocupariam cargos de decisão na FAB.

“Repentinamente, eu saí da posi-ção em que estava e fui designado para comandar o 1º/4º GAV ‘Esquadrão Pa-cau’. Eu fiquei de uma tal forma toma-

do pela vibração e pela vontade de acertar, até de copiar tentando ser igual ou melhor. Eram 28 Lockheed F--80C e T-33, 14 instrutores, 34 estagiá-rios e eu, major, quando fui designado através do boletim, imaginei que fosse imitar o Nero Moura. E para fazer is-so eu tive que me dedicar e ensinar os meus estagiários a voarem e serem pi-lotos de combate. Nessa função eu per-maneci por quatro anos (1964-1967) e o grande exemplo que eu cito, como sen-do um troféu ‘aqui do brigadeiro’, é o Aspirante Saito (hoje Tenente-Brigadei-ro do Ar Juniti Saito, atual Comandan-te da Aeronáutica), que foi o estagiário mais eficiente da turma dele, campeão de tiro e bombardeio, companheiro de grau 10, até hoje meu ami-go e que me chama de co-mandante! Foi um perío-do maravilhoso, em que eu devo ter formado de 100 a 120 pilotos de caça. Duran-te o meu comando, o 1º/4º GAV foi considerado o me-lhor esquadrão, fora dos EUA, apoiado pelo Progra-ma de Assistência Militar (MAP) norte-americano. E, durante quatro anos, eu fui aos EUA, como prêmio, levando oito F-80C do meu esquadrão para fazer uma apresentação. O 1º/4º GAV funcionava de forma mui-to organizada, como um relógio, o pessoal era ex-tremamente dedicado nas suas funções. Eu aprendi a comandar em Fortaleza e os meus aspirantes me en-

sinaram a perceber o homem que está naquele avião, como ele se sente, age, re-age, se estimula, deprime, enfim, a ges-tão do ser que está sendo preparado pa-ra entrar em combate.”

Ainda em Fortaleza, num dos pon-tos mais altos da sua carreira na FAB, foi surpreendido com o recebimento de uma mensagem dizendo que ele deveria se apresentar ao ministro da Aeronáu-tica. A bordo do “seu” F-80C, no iní-cio de 1967, prontamente foi ao Rio de Janeiro respondendo à solicitação que havia recebido. “Eu fui procurar o mi-nistro, que na época era o Eduardo Go-mes, e falei diretamente com o ajudante de ordens dele. Meu nome não estava na

Durante o seu comando na BASC, o Brigadeiro Menezes voou diversas vezes nos Embraer AT-26 do 1º GAVCA. Na foto, aparece em pé, o sexto da esquerda para a direita. Foi no Xavante, já no comando do CTA, que completou a marca de 8 mil horas de voo na FAB.

O cartão-postal enviado ao Brasil

um dia antes de atingir duas vezes a velocidade do som.

Além do Mirage III, o Bri-gadeiro Menezes voou o English Electric Lightning T.Mk. 5 em 11 de março de 1969. Mais caro que o Mirage, a FAB teria que in-vestir pesadamente na cons-trução de uma nova infra-estrutura para operar o caça britânico, que na época só poderia voar a partir da Base Aérea do Galeão. 75

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agenda, havia alguma coisa de errado, mas eu fui falar com o Eduardo, que por sua vez disse o seguinte: ‘quem mandou te chamar deve ter sido o ministro Már-cio de Souza e Mello, que está no andar de baixo e acabou de ser designado pe-lo presidente (Marechal Artur da Cos-ta e Silva)’. Como eu estava em Forta-leza, tinha ficado desligado disso tudo. Então eu, tenente-coronel ‘idiota’, des-ci e fui falar com o Brigadeiro Márcio, que me questionou: ‘Menezes, você já foi a Brasília?’. Eu disse que não havia ido a Brasília, que naquela época era re-cém-criada, principalmente por não ha-

ver querosene de aviação para o F-80C disponível em todo o lugar. Era algo muito restrito e nós não viajávamos com essa fa-cilidade. E ele voltou a me ques-tionar: ‘você conhece algum de-putado?’. Respondi: ‘Brigadeiro, o senhor vai ficar surpreso, mas eu nunca vi um deputado’. ‘E se-nador?’, indagou ele. Mais uma vez, sem graça, eu falei que eu não tinha passado perto de um senador na minha vida. ‘E você se incomoda em sair de Fortale-za?’ Claramente, disse que esta-va em serviço ativo na FAB, que iria para onde fosse designado. E o ministro me surpreendeu: ‘é que eu quero te convidar para

ser o meu assessor parlamentar’. Eu fi-quei olhando e ele continuou: ‘o que é, não gostou?’. E eu respondi: ‘brigadeiro, agora eu não entendi nada. Eu não co-nheço Brasília, nem deputado e senador. Como é que eu serei o seu assessor par-lamentar?’. E ele finalizou: ‘É exatamen-te por isso!’.” O Major-Brigadeiro do Ar Márcio de Souza e Mello permaneceria em seu cargo de 15 de março de 1967 a 29 de novembro de 1971, sendo um dos responsáveis pelo gigantesco salto tec-nológico e estratégico que a FAB teve naquela época.

“Ele era um homem rigoroso com

ele próprio, estudioso, voltado para a sua carreira e, evidentemente, um pen-sador de cultura profissional grau 10. Era um homem muito adiantado e avançado para a época, pensava gran-de, e achava que a FAB deveria ter a di-mensão do Brasil e ocupar o seu espaço. E, muitas vezes, não tinha quem sentas-se e o entendesse. Era um sonhador, que pensava com os pés no chão.”

Ao mesmo tempo em que era asses-sor parlamentar, o Brigadeiro Menezes também atuou como assessor de pla-nejamento estratégico. Na visão do en-tão ministro, a FAB tinha como com-promisso a garantia da sobrevivência da nação com base no domínio do es-paço aéreo e ninguém poderia garantir esse domínio se não fizesse o controle total, exclusivo e eficiente. “Ele conce-beu o que ele chamou de SISDACTA, o Sistema de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo, unificado. Ele precisa-va dos meios, então criou sistemas de controle, radares e outros componentes de apoio. E a arma, ele pediu que fizés-semos um estudo para saber qual era o melhor avião disponível. Dessa forma, fui designado para ser o chefe da Co-missão de Estudos do Projeto da Aero-nave de Interceptação (CEPAI). Para o Brigadeiro Márcio, a aeronave tinha que ser supersônica, então foram avaliados cinco modelos – o Dassault Mirage IIIE, English Electric Lightning, Lockheed F-104 Starfighter, Saab Draken e depois, por pressão dos norte-americanos, voa-mos o Northrop F-5A. Obviamente nós optamos pelo Mirage III, o avião estava por cima, inclusive por conta da Guerra dos Seis Dias.”

Porém, antes mesmo de haver si-do iniciado o processo de escolha, ain-da em 1967, o Brigadeiro Menezes teve a oportunidade de voar na França, em Dijon, o Mirage IIIB, sendo o primeiro brasileiro a voar o clássico delta fran-cês. A recomendação do próprio Briga-deiro Márcio era que o voo fosse feito a Mach 2, ou seja, duas vezes a velocida-de do som, experimentando o caça nas mais variadas situações. Após perío-do de adaptação, o Brigadeiro Menezes voou o Mirage IIIB realizando um vasto

Durante a sua carreira, o Brigadeiro Menezes foi agraciado com a Ordem do Mérito Aeronáutico, Ordem do Mérito Naval (Comendador), Mérito Santos--Dumont, Mérito Rio Branco, Mérito Tamandaré, Medalha do Pacificador, Medaille Aéronautique (França), Ordem Militar de Aviz (Portugal), Servicios Distinguidos (Peru) e Legião de Honra (França).

Em abril de 1975, no F-5B 4802, o Briga-deiro Menezes prepara-se para fazer seu voo solo, qualificando-se para participar

da missão de translado dos F-5E para o Brasil, a Operação Tigre.

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tipo de missões para conhecer a aerona-ve, incluindo a decolagem com foguetes auxiliares.

Mas ainda faltava o voo a Mach 2.Para o Brigadeiro Menezes, 27 de ju-

lho de 1967 tornou-se um marco na sua vida. A bordo de um Mirage IIIB, atin-giu Mach 2,03 (2.486km/h), ocasião em que enviou para o ministro da Ae-ronáutica a seguinte mensagem: “asas brasileiras cruzam a França a Mach 2”. A FAB adquiriu 16 Mirage IIIE/D e, de-pois do Brigadeiro Menezes, em 23 de maio de 1972, oito pilotos de caça da FAB foram até a França receber o curso no Mirage IIIE, ficando conhecidos co-mo os “Dijon Boys”. “O Mirage custava muito mais barato do que o Lightning, que saía quase que pelo dobro do valor. O F-104 não tinha quase armamento e o Draken era um avião feito na Sué-cia para a Suécia, ninguém mais opera-va. Quem escolheu o avião foi a comis-são, não houve interferência externa. A escolha da base foi feita pelo Brigadeiro Márcio. Havia uma pequena pista perto de Anápolis e eu comentei com o minis-tro, que solicitou que eu fosse até lá ve-rificar. Eu constatei que o local não era apropriado, mas o Brigadeiro Márcio pediu para que o levássemos até lá. Nós fomos de helicóptero até Goiânia e Aná-polis, junto com um engenheiro, que ao ver a área propôs ‘desmontar’ um pe-queno morro para construir a base. O ministro solicitou que fosse feito um pouso no local, desembarcou, pegou um pequeno galho seco, enfiou no chão di-zendo: ‘essa base será aqui’. E a base é lá, em Anápolis.”

Outro projeto crucial na história da

FAB em que o Brigadeiro Me-nezes se envol-veu de modo marcante, foi o da implanta-ção dos caças Northrop F--5E Tiger II, ja-to de combate multifuncional adquirido pe-la FAB em 1973, compreendendo 36 F--5E e seis F-5B. “O grupo que trabalhou no programa do F-5 era subordinado a mim e foi o Coronel Euro Campos Duncan Rodrigues o encarregado que efetivamente fez a escolha do avião, to-mou as iniciativas, etc. E, na época, era o melhor avião para aquilo que nós que-ríamos fazer.”

No biênio de 1974/1975, o Brigadei-ro Menezes comandou a mítica BASC, o ninho da aviação de caça da FAB, oca-sião em que teve a chance de acompa-nhar a transição entre o Embraer AT-26 Xavante, que estava no 1º GAVCA ape-nas para manter a qualificação dos pi-lotos, e os novíssimos F-5E Tiger II. As-sim, também esse capítulo, de extrema relevância para a FAB, teve a assinatura do brigadeiro. Com o objetivo de parti-cipar da Operação Tigre, que translada-va em voo os F-5 dos EUA para o Bra-sil, o então comandante da BASC fez o curso do caça, vindo a solar o F-5B

“FAB 4802”, em abril de 1975, fato que o preparou para realizar, em outubro da-quele ano, a sétima missão da Operação Tigre, liderando quatro F-5E do 2º/1º GAVCA.

Mas, se por um lado carregava no sangue a vibração de pertencer à FAB e ser piloto de combate, o Brigadeiro Menezes tinha como objetivo passar os seus conhecimentos, visão e entusiasmo para os jovens cadetes que anualmente ingressavam na Força. Aliás, ser instru-tor e preparar as futuras gerações sem-pre foram funções de sua preferência. Assim, em 8 de março de 1979, já como brigadeiro do ar, assumiu o comando da Academia da Força Aérea (AFA), uma das mais importantes instituições de ensino da América Latina.

“Hoje, 53 oficiais-generais da FAB foram meus cadetes, então eu comando a Força por osmose (disse, sorrindo). São os generais do ano 2000, era assim que eu falava com os 1.349 cadetes. Foi um

Ao lado do então ministro da Aeronáutica, Brigadei-ro Délio Jardim de Matos, na cerimônia de entrega do Embraer T-27 Tucano na Academia da Força Aérea.

Em 9 de outubro de 1975, o tão aguardado pouso na BASC trazendo dos EUA o F-5E “FAB 4844”, liderando uma esquadrilha de quatro ae-

ronaves na Operação Tigre.

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Page 8: Entrevista com Brigadeiro Menezes

período muito especial, em que eu fiz tudo o que pude fazer.” Uma cena mais do que natural em Pirassununga, no pá-tio de estacionamento das aeronaves, era ver o comandante da AFA embar-cando num Neiva T-25 Universal ou Ae-rotec T-23 junto com os cadetes em mis-são de instrução. “Nós voamos, em dois anos, 110 mil horas. Em um único dia, chegamos a fazer 756 voos.”

E foi graças ao Brigadeiro Menezes que em Pirassununga, após a desativa-ção da Esquadrilha da Fumaça em 1976, surgiria a Esquadrilha Cometa Branco. Equipada com seis T-25, várias apresen-tações foram feitas em solenidades na AFA e nas cidades mais próximas da re-gião, a partir de 10 de julho de 1980, to-talizando 55 exibições, até a sua desati-vação em 1983. Sua atitude acabou por reacender na FAB a chama de possuir novamente um time de demonstrações aéreas, apresentando-se dentro e fora do território nacional, e em 21 de outubro de 1982 foi criado o Esquadrão de De-monstrações Aéreas (de fato, recriando a Esquadrilha da Fumaça, cujo nome popular foi retomado), que recebeu os seus primeiros Embraer T-27 Tucano no ano seguinte.

“Outro período que eu fui bastan-te feliz foi durante a direção do Centro Técnico Aeroespacial (de abril de 1981 a janeiro de 1984), com todos aqueles pro-jetos importantes. Entre outros progra-mas estava o do T-27, que eu ‘briguei’ muito com o Ozires Silva para fazer um avião que nós precisávamos na época. Ele foi o primeiro, não sei se foi o único, projeto totalmente custeado pela FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos). A

Embraer não ti-nha dinheiro pa-ra custear o T-27, então eu fui à FINEP, junto com o Brigadeiro Nelson de Sou-za Taveira, então chefe da Comis-são de Avaliação e Controle do T-27, e conse-gui a verba. Em

1983, a Fumaça já havia recebido o Tu-cano, mas a regra era de não levar as aeronaves para a AFA ainda. Então, o primeiro T-27 de série voltado para ins-trução, não a demonstração, era o ‘FAB 1303’ e, quando ele ficou pronto, o bri-gadeiro assanhado aqui pegou a aero-nave e levou até Pirassununga. Foi uma emoção muito grande, uma realização que você só se dá conta depois.”

Aquele voo histórico, comandado pelo Brigadeiro Me-nezes, teve a par-ticipação do então ministro da Aero-náutica, Brigadei-ro Délio Jardim de Matos, posicionado no assento trasei-ro, e o deslocamen-to até Pirassununga foi acompanhado por outros quatro T-27, nas cores da Fumaça.

Ao passar o co-mando do CTA, em 17 de janeiro de 1984, o Brigadeiro Menezes entrou pa-ra a reserva e assu-miu a presidência da então Telecomuni-cações Aeronáuticas S.A., empresa vincu-lada ao Ministério da Aeronáutica, respon-sável pelo controle de tráfego aéreo de área, de aproxima-ção, de aeródromo e do Serviço de Prote-

ção ao Voo. Em 4 de abril de 1987, assu-miu a presidência da Infraero, liderando um corpo de mais de 5 mil funcionários e 57 aeroportos (15 internacionais). Seu mandato se encerrou em 23 de abril de 1990, momento em que passou a atuar como consultor aeronáutico para em-presas nacionais e internacionais. De 1995 a 2009, atuou ainda como presi-dente da Associação Brasileira de Pilo-tos de Caça (ABRA-PC).

Atualmente, vive no Rio de Janeiro, onde continua na atividade de consultor aeronáutico.Q

O autor agradece o imprescindível apoio do escritor, pesquisador e professor Fernando A. Murat Menezes, que viabi-lizou a parte iconográfica desta matéria, bem como pelo fornecimento de outras informações relevantes à carreira e vida de seu pai. Agradecimentos também ao Coronel Aviador R1 Aparecido Camaza-no Alamino.

Entre dois veteranos do 1º GAVCA que combateram no Teatro de Opera-ções do Mediterrâneo durante a 2ª Guerra Mundial. À esquerda, o Brigadeiro Rui Moreira Lima, com 94 missões de combate. À direita, o lendário Coronel Nero Moura, comandante do 1º GAVCA na Itália, com 62 missões.

Aos 85 anos, o Brigadeiro Menezes tem a incrível marca de 8.650 horas de voo. Dessas,

2.012 são em aeronaves de caça, 1.070 em aeronaves supersôni-cas. Das 14 aeronaves voadas, a

lista inclui o P-47D Thunder-bolt, Gloster Meteor TF-7 e F-8,

Lockheed F-80 Shooting Star e TF-33, Embraer AT-26 Xavante, English Electric Lightning T.Mk.

5, Dassault Mirage III e Nor-throp F-5B/E/F.

JOÃO

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ORA

LEZ

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Page 9: Entrevista com Brigadeiro Menezes

Ivan N. Kozhedub foi o maior de todos os ases dos Aliados na 2ª Guerra Mundial, com mais de 60 vitórias confirmadas em combates aéreos –

incluindo um caça a jato alemão Me-262. Apesar disso, sua autobiogra-fia não tem edição disponível no Ocidente, nunca tendo sido publica-

da em língua portuguesa. Nascido numa família camponesa, participou da luta da Força Aérea soviética para se impor diante da toda-poderosa

Luftwaffe e, enfim, sobrepujá-la, abrindo caminho para o fim do regime de terror nazista de Adolf Hitler. Um dos dois únicos pilotos soviéticos a serem agraciados três vezes com a maior comenda militar de seu país, a medalha de Herói da União Soviética, Kozhedub participaria, após o conflito mundial, da Guerra da Coreia. Esta obra resgata sua história,

sendo de valor inquestionável para todo leitor de aviação e de sua histó-ria, permitindo uma visão pessoal e íntima de uma das forças determi-

nantes da 2ª Guerra Mundial, a Força Aérea soviética.

EM BREVE!

De autoria de David Landau, ex-editor chefe do mais antigo diário de Israel, Haaretz, este livro é a primeira biografia completa de Ariel Sharon, o mais dra-mático e marcante líder militar e político de Israel nos últimos 40 anos. Sua vida, de fato, espelha muito a própria história moderna de Israel. Comandan-te do Exército israelense desde a criação deste, em 1948, Sharon tomou parte não apenas na Guerra de Independência, mas também na Crise de Suez (1956) e nas Guerras dos Seis Dias (1967) e do Yom Kippur (1973). Após deixar a car-reira militar, tornou-se um destacado líder político. Tendo apoiado os assenta-mentos judeus na Cisjordânia e Gaza ocupadas, ao se tornar primeiro-minis-tro, liderou uma histórica mudança da política israelense, incluindo a retirada da Faixa de Gaza. Esta biografia mostra como a liderança de Sharon transformou Israel e como as suas opiniões foram moldadas pela natureza mutável da sociedade israelense.