ensino de matemÁtica na escola do campo: um...

12
ENSINO DE MATEMÁTICA NA ESCOLA DO CAMPO: UM PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM NO CONTEXTO DA HORTA GEOMÉTRICA Eldiamir Salete Trentin [email protected] UTFPR Câmpus DoisVizinhos Dois Vizinhos - Paraná Luciana Boemer Cesar Pereira [email protected] UTFPR Câmpus Dois Vizinhos Dois Vizinhos Paraná Resumo: Este artigo apresenta a descrição de uma pesquisa de trabalho de conclusão do curso de Licenciatura em Educação do Campo UTFPR Câmpus Dois Vizinhos. O trabalho teve como objetivo elencar as contribuições que a Etnomatemática pode trazer para o ensino de Matemática ao ser contextualizada na horta geométrica. O desenvolvimento do trabalho se deu na Escola Municipal do Campo Juscelino Kubitschek, localizado na comunidade Rio Tuna, interior do município de Francisco Beltrão, Paraná. A pesquisa é classificada como qualitativa aplicada e de cunho interpretativo, foi realizada com alunos de um 6º ano dos anos finais do Ensino Fundamental durante seis meses e contou com três etapas: 1ª etapa: Organização das medidas dos canteiros; 2ª etapa: Preparação métrica; 3ª etapa: Plantio. Ao elencar as atividades realizadas, conclui-se que a proposta de ensino contribuiu para promover o interesse maior dos educandos durante as aulas de Matemática relacionando teoria e prática, despertou o interesse dos educandos pela Matemática e ainda desenvolveu capacidades de pensar e raciocinar utilizando conceitos da geometria. Ressalta- se que é necessário que outras práticas educativas sejam realizadas na perspectiva das escolas do campo, para que se promova o ensino e aprendizagem adaptados aos contextos. Palavras-chave: Horta escolar, Ensino de Matemática, Educação do Campo, Etnomatemática.

Upload: vanthuan

Post on 08-Nov-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

ENSINO DE MATEMÁTICA NA ESCOLA DO CAMPO: UM

PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM NO CONTEXTO DA

HORTA GEOMÉTRICA

Eldiamir Salete Trentin – [email protected]

UTFPR – Câmpus DoisVizinhos

Dois Vizinhos - Paraná

Luciana Boemer Cesar Pereira – [email protected]

UTFPR – Câmpus Dois Vizinhos

Dois Vizinhos – Paraná

Resumo: Este artigo apresenta a descrição de uma pesquisa de trabalho de conclusão

do curso de Licenciatura em Educação do Campo – UTFPR – Câmpus Dois Vizinhos.

O trabalho teve como objetivo elencar as contribuições que a Etnomatemática pode

trazer para o ensino de Matemática ao ser contextualizada na horta geométrica. O

desenvolvimento do trabalho se deu na Escola Municipal do Campo Juscelino

Kubitschek, localizado na comunidade Rio Tuna, interior do município de Francisco

Beltrão, Paraná. A pesquisa é classificada como qualitativa aplicada e de cunho

interpretativo, foi realizada com alunos de um 6º ano dos anos finais do Ensino

Fundamental durante seis meses e contou com três etapas: 1ª etapa: Organização das

medidas dos canteiros; 2ª etapa: Preparação métrica; 3ª etapa: Plantio. Ao elencar as

atividades realizadas, conclui-se que a proposta de ensino contribuiu para promover o

interesse maior dos educandos durante as aulas de Matemática relacionando teoria e

prática, despertou o interesse dos educandos pela Matemática e ainda desenvolveu

capacidades de pensar e raciocinar utilizando conceitos da geometria. Ressalta- se que

é necessário que outras práticas educativas sejam realizadas na perspectiva das

escolas do campo, para que se promova o ensino e aprendizagem adaptados aos

contextos.

Palavras-chave: Horta escolar, Ensino de Matemática, Educação do Campo,

Etnomatemática.

1 INTRODUÇÃO

A Educação do Campo é também identificada como uma reflexão pedagógica do

contexto do campo, desse contexto, o campo não é apenas lugar de produção de

alimentos e grãos, mas, lugar também, de diálogo com a teoria que busca conhecer a

realidade e traçar projetos de educação para os sujeitos.

Na Educação Matemática, há uma tendência que prioriza o trabalho com a

cultura e a identidade e pode trazer essas reflexões pedagógicas do contexto do campo

para a sala de aula. Essa tendência é conhecida como Etnomatemática.

A Etnomatemática é uma das ferramentas importantes para o ensino e

aprendizagem do educando, pois valoriza o saber matemático intuitivo/cultural

aproximando o mesmo no universo em que está inserido. Esse Mérito da

Etnomatemática traz uma nova visão de Matemática e Educação Matemática, que passa

a ser vista como atividade humana determinada socioculturalmente pelo contexto que

são realizadas. (D’AMBRÓSIO, 1995)

Diante disso, para melhorar a construção do conhecimento matemático do

educando, pensou-se como uma das alternativas de ensino, inserir uma horta no

ambiente escolar com suporte da Etnomatemática, a fim de relacionar os conhecimentos

ensinados em sala de aula com os conhecimentos práticos dos alunos.

A horta inserida no ambiente escolar torna-se um laboratório vivo de

possibilidades no desenvolvimento de diversas atividades pedagógicas, unindo a teoria e

a prática. Para Irala e Ferandez (2001), as atividades que podem ser desenvolvidas com

o auxílio da horta escolar, podem proporcionar ao professor uma maneira de relacionar

os diversos conteúdos colocando-os em prática de modo interdisciplinar.

Desta maneira, acredita-se que o trabalho com situações problemas que

relacionem o cotidiano do aluno leva-os a repensar as suas práticas no campo,

associando-as à Matemática, e assim construindo uma aprendizagem mais dinâmica,

incentivando a participação, interesse e motivação do aluno.

Mostrou-se a toda comunidade escolar e circundante como é possível obter uma

prática de ensino diferenciada, sem substituir a Matemática acadêmica. Para tanto,

utilizou-se para nortear à pesquisa a seguinte problemática: Quais as contribuições que a

Etnomatemática poderá trazer para o ensino de Matemática ao ser contextualizada na

horta geométrica?

A fim de responder esse questionamento, foi realizado uma pesquisa de

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) do curso de Licenciatura em Educação do

Campo da UTFPR – Câmpus Dois Vizinhos. O desenvolvimento do trabalho se deu na

Escola Municipal do Campo Juscelino Kubitschek, localizado na comunidade Rio Tuna,

interior do município de Francisco Beltrão, Paraná.

2 CAMINHOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa é classificada como qualitativa aplicada e de cunho

interpretativo. Os sujeitos da pesquisa foram alunos de um 6º ano dos anos finais do

Ensino Fundamental da Escola Municipal Juscelino Kubitschek, localizado na

comunidade Rio Tuna, interior do município de Francisco Beltrão, Paraná.

Num primeiro momento foi realizada uma conversa com a educadora de

Matemática da escola, convidando-a para participar da pesquisa, e orientar a

pesquisadora em quais conteúdos/conceitos e qual turma será mais interessante estar

aplicando a ação, conforme as seguintes etapas:

1ª etapa: Organização das medidas dos canteiros;

2ª etapa: Preparação métrica;

3ª etapa: Plantio;

Durante 06 meses os educando da turma junto com o professor regente e a

pesquisadora estiveram realizando atividades que viessem a contribuir/somar no ensino

e aprendizado dos mesmos.

A aplicação teórica e prática dos conceitos matemáticos, confrontados com os

conhecimentos empíricos dos educandos, estabeleceram algumas estratégias e

sequências de trabalhos pedagógicos que auxiliaram os educadores responsáveis pelo

aprendizado dos mesmos, de forma a apresentar um melhor resultado.

3 EDUCAÇÃO DO CAMPO, ETNOMATEMÁTICA, HORTA ESCOLAR E

GEOMETRIA: TECENDO APROXIMAÇÕES

3.1 Educação do Campo X Etnomatemática

O ensino, de um modo geral, não proporciona uma educação contextualizada,

que possibilita uma formação adequada ao modo de viver, pensar e produzir dos

sujeitos do campo (DUARTE E TASCHETTO, 2013).

Frente a isso, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei nº

9394/96), proporciona à Educação do Campo, o direito de um sistema de ensino que

“respeite a diversidade do campo em todos seus aspectos sociais, culturais, ambientais,

políticos, econômicos, de gênero, de raça e etnia” (BRASIL, 2010).

Neto (2009, p. 34), aponta que “[...] os trabalhadores do campo sempre

produziram, pela prática, os seus conhecimentos e, esses, não podem, simplesmente, ser

desprezados [...].” Sendo assim, busca-se uma escola que esteja “no” e “do” campo,

“no: o povo tem direito de ser educado no lugar onde vive; do: o povo tem direito a uma

educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à suas

necessidades humanas e sociais (CALDART, 2002, p. 26) por que:

Não basta que a escola ali esteja, mas é necessário que ela dialogue lentamente

com a realidade do meio onde se encontra. Isso significa dizer que é uma

escola inserida verdadeiramente na realidade desses sujeitos, pronta a colher e

procurar atender às demandas específicas desses homens e mulheres e seus

filhos, população que trabalha com a terra e detêm conhecimentos específicos e

realidades profundamente diferentes daquela dos sujeitos inseridos no meio

urbano. (FARIA, 2009, p. 93).

Desse modo, a diversidade se concretiza na sociedade onde os padrões pré-

estabelecidos, exigem um esforço pessoal e coletivo, a partir dos princípios de

integração com o diálogo, a valorização e o respeito mútuo.

Por sua vez, esses conhecimentos presentes na atual Educação do Campo,

potencializam um elo para a Etnomatemática, que procura apreender o ciclo da geração,

organização intelectual e social e, a difusão desse conhecimento desenvolvido através

de uma dinâmica cultural. Pois, os princípios que a norteiam pautam-se, entre aspectos

como, o diálogo, a interlocução entre os saberes das práticas cotidianas e o

conhecimento científico. Além desses, outro vetor que potencializa as experiências da

Etnomatemática, é a organização dos tempos e espaços escolares.

Ao buscar aproximar os conteúdos da realidade dos educandos, no intuito de

ensinar e compreender a importância da cultura, dos saberes e da identidade de um

povo, a Etnomatemática torna-se uma fonte de investigação de grande relevância no

contexto da Educação do Campo, valorizando os conhecimentos e as raízes culturais.

Nesse sentido, Silva (2013) descreve que a Educação do Campo estabelece um

diálogo com a Etnomatemática e garante o modo dialógico e o respeito mútuo ao

construir um projeto de sociedade que edifica valores e sentimentos.

3.2 A relação entre a Etnomatemática e a horta escolar

Nos dias atuais as pesquisas na área da Educação Matemática, mostram que há

uma necessidade de se mudar o ensino e aprendizagem. O ensino da Matemática nas

escolas é de suma importância, mas os educandos vêm encontrando diversas

dificuldades de relacionar a Matemática acadêmica com a Matemática do dia a dia.

Para melhor construção desse conhecimento, a Etnomatemática surge como uma

alternativa para o ensino da Matemática, fazendo uma interligação entre o conhecimento

técnico relacionando com o que o educando já vem vivenciando, possibilitando uma

melhor compreensão do conhecimento acadêmico. Pois:

Indivíduos e povos têm, ao longo de suas existências e ao longo da história,

criado e desenvolvido instrumentos de reflexão, de observação, instrumentos

materiais e intelectuais [que chamo de ticas] para explicar, entender, conhecer,

aprender para saber fazer [que chamo de matema] como resposta a

necessidades de sobrevivência e de transcendência em diferentes ambientes

naturais, sociais e culturais [que chamo etnos]. (D ’AMBRÓSIO, 2005, p.50)

Assim, o educador deve buscar a interação entre a prática de ensino, trazendo os

conhecimentos adquiridos na escola para mais próximo da realidade dos educandos.

Cabe também ao professor, facilitar e organizar as experiências articulando os

conhecimentos populares e os acadêmicos dando oportunidades aos educandos

relacionar com sua própria cultura.

Nesse sentido, a implantação de uma horta no ambiente escolar, é possível

desenvolver, acompanhar, dinamizar e avaliar ações destinadas á educação, através da

oferta de subsídios para conteúdos pedagógicos que resultam no desenvolvimento de

atitudes dos alunos em relação aos hábitos alimentares saudáveis.

Morgado e Santos (2008) descreve que, além dos fatores ambientais e hábitos

saudáveis, o objetivo deve vir de encontro com o contexto social, onde os alunos

possam ter oportunidades de estar ocupando seu tempo com atividades que contribua

para seu crescimento como pessoa e cidadão. Pois a escola por ser um espaço social,

passa a ser um instrumento de socialização de culturas e democratizações o que incidem

para um melhor processo de socialização.

3.3 A horta escolar e o ensino de geometria

A Horta por ser um laboratório vivo, oportuniza o educador desenvolver

diferentes atividades didáticas a partir de sua construção. Além de proporcionar a

produção de alimentos para uma melhor promoção de saúde.

No contexto da disciplina de Matemática, Irala e Fernandez ao elencar o papel

da hora na escola relatam que:

A matemática pode ser um exemplo com o estudo das diferentes formas dos

alimentos cultivados, além disso, o estudo do crescimento e desenvolvimento

dos vegetais pode ser associado com o próprio desenvolvimento. Isto é, a

importância da terra ter todos os nutrientes para que a semente se desenvolva

em todo o seu potencial, livre de qualquer doença. Essas atividades também

asseguram que a criança e a escola resgatem a cultura alimentar brasileira e,

consequentemente, estilos de vida mais saudáveis.(IRALA E FERNANDEZ,

2001, p. 4)

Além disso, também podemos relacionar as formas geométricas apresentadas

pelos canteiros da horta, perfazendo um elo de ligação entre o conteúdo de geometria e

a horta escolar. Pois os conteúdos trabalhados em sala de aula devem partir de situações

que facilitam o entendimento. Segundo as Diretrizes da Educação Básica do Paraná

(PARANÁ, 2008, p.31) “para a geometria é importante partir de “objetos que tenham

relação com as formas geométricas usuais”.

Neste sentido, Duval (1995) compreende que a geometria, pode e deve ser um

campo de desenvolvimento do processo cognitivo. Processo esse que se dá de três

formas, sendo elas:

a) Visualização: observação e ou verificação subjetiva da realidade;

b) Construção: ações e resultados são ligados aos objetos representados

matematicamente;

c) Raciocínio: Discurso e explicação do que foi observado e construído.

Ao trabalhar a geometria contextualizada em uma escola do campo, o educador

deve ter claro que este vai muito além de uma simples medição de terra. Para que a

aprendizagem de fato ocorra, deve-se ter uma significação dos conceitos e formas

apresentadas no decorrer do processo.

Coelho (1996) apresenta a aprendizagem da geometria atual, como um processo

natural indutiva, onde os aspectos intuitivos de redescoberta e da posterior

generalização devem ser conhecidos para depois construir a prova dedutiva. Ou seja, ao

apresentar o ensino de geometria, cabe ao professor averiguar as necessidades dos

alunos em relação às propriedades geométricas presentes no seu dia a dia, tornando o

conhecimento “acadêmico” atrativo e prazeroso de se ensinar e aprender.

Sendo assim, fica evidenciada a importância da horta para o ambiente escolar, tanto

para o estímulo de alimentos saudáveis, como para um resgate da aparência lúdica do

ambiente, destacando sempre a participação dos educandos neste processo.

4 AÇÃO DIDÁTICA NO CONTEXTO DA HORTA GEOMÉTRICA

O objetivo geral desta pesquisa foi elencar as contribuições da Etnomatemática

para o ensino de Matemática no contexto de uma horta geométrica.

Para tanto, o trabalho foi realizado em 3 (três) etapas que serão descritas na

sequência dessa secção.

4.1 Primeira etapa: Organização das medidas dos canteiros

Duração: 2h/aula

Objetivos:

Medir as dimensões dos canteiros;

Trabalhar conceitos matemáticos relacionados ao espaço da horta;

Calcular a área e o perímetro das figuras geométricas representadas pelos

canteiros da horta.

Conteúdos trabalhados: grandezas e medida (área, perímetro, comprimento da

circunferência, figuras geométricas planas).

Eixo temático da Educação do Campo:

Organização dos saberes escolares

Trabalho divisão social e territorial

Materiais utilizados:

Fita métrica; Barbante; Tesoura; Tabela para anotar os dados;

Nessa primeira etapa foi realizada a organização dos canteiros. Os alunos junto à

pesquisadora foram a campo medir os canteiros e anotaram os resultados encontrados

em uma tabela (figura 1). Para medir os mesmos, foi utilizada a fita métrica como

instrumento de medida.

Figura 1: Tabela realizada pelos alunos

Fonte: Arquivos da Autora

Os alunos com um barbante contornavam os canteiros e em seguida ao colocá-lo

em linha reta realizavam a medição encontrando seu perímetro.

No caso dos canteiros que representavam: retângulo e losango, foi calculada a

medida do perímetro e, o comprimento da circunferência do canteiro circular. Nesta

etapa também foi realizada a medição das diagonais do retângulo, do losango e do

diâmetro da circunferência. A figura 2 mostra o momento das medições.

Figura 2: Alunos realizando as medições

Fonte: Arquivos da Autora

Neste sentido, (D’AMBROSIO, 2001, p.30-32) ao elencar a dimensão cognitiva

da Etnomatemática, destaca que “as ideias de comparar, classificar, quantificar, medir,

explicar, generalizar, inferir são características da espécie humana”. E ainda na

dimensão educacional da Etnomatemática espera-se que essas ideias favoreçam o

interesse dos educandos pela atividade.

Sendo assim, desenvolver aulas práticas para que o aluno melhor associe o

conteúdo ao conhecimento trabalhado em sala de aula, pode aumentar o interesse dos

educandos em relação aos conteúdos curriculares, por conseguirem traçar um elo entre o

conhecimento científico com o seu dia a dia.

Saber problematizar os aspectos da vida ao que é essencial aos povos do campo,

ou seja, o eixo trabalho e divisão social proposto pela DCE- Campo (PARANÁ, 2007)

oportuniza inúmeras possibilidades de seleção de conteúdos para cada ano escolar e

para as diversas modalidades de ensino.

Ao visualizar na prática os conteúdos apresentados em sala, os conceitos

tornam-se mais fáceis, pois na medida em que ele vai observando e correlacionando

com o seu dia a dia, constroem a história, que para Duval (1995), Fiorentini e Lorenzato

(1995) é de extrema importância, principalmente quando relacionados com a cultura

popular.

Conforme Sant' Anna et al (1995), para que o ensino seja desencadeado em sala

de aula, é preciso que o professor o desenvolva através do uso de certos procedimentos

didáticos, os quais se constituem pelas várias formas de atuação do professor e dos

alunos, para atingir os objetivos de ensino pretendidos.

Nesse sentido:

A natureza do conhecimento que o professor deverá ensinar vai

indicar uma forma de se relacionar com os alunos, de como organizar

o espaço de aprendizagem, de como eleger os instrumentos que

poderão propiciar melhor aprendizagem dos conteúdos a serem

ensinados (CASTRO E CARVALHO, 2001, p.56.).

Diante do exposto, percebe-se que ao realizar a prática com os educandos,

conforme Paulo Freire (1987), a teoria sem a prática vira “verbalismo”, assim como a

prática sem teoria, vira ativismo. No entanto, quando se une a prática com a teoria tem-

se a práxis, a ação criadora e modificadora da realidade.

4.2 Segunda etapa: Preparação métrica

Duração: 2h/aula

Objetivos:

Reconhecer a inscrição e circunscrição de polígonos regulares em outros

polígonos;

Dividir uma figura geométrica na forma de outras figuras geométricas.

Conteúdos trabalhados: grandezas e medida (área, perímetro, comprimento da

circunferência, figuras geométricas planas, figuras inscritas e circunscritas).

Eixo temático da Educação do Campo:

Organização dos saberes escolares.

Trabalho divisão social e territorial

Materiais utilizados:

Fita métrica; Barbante; Tesoura; Palito de churrasco; Tabela para anotar os

dados.

Na segunda etapa foi realizada a preparação métrica dos canteiros. Em um

primeiro momento os educandos do 6º ano, junto com a pesquisadora, retomaram a

tabela feita (figura 1) com as medidas dos canteiros.

Com as medidas em mãos, o primeiro traçado da figura geométrica plana inscrita

foi no canteiro de forma retangular. Para a construção, os alunos utilizaram a medida

dos lados do retângulo dividido por dois, demarcaram o ponto com palito de churrasco e

com o barbante inscreveram um losango, como mostra a figura 3.

Figura 3: Alunos realizando a inscrição

do losango no retângulo

Fonte: Arquivos da autora

Figura 4: Hexágono inscrito no

canteiro circular.

Fonte: Arquivos da autora.

Em seguida, foi realizada a inscrição do hexágono no canteiro circular. Para isso,

utilizou-se a medida do comprimento da circunferência divida por 6 (seis), tendo em

vista que o hexágono possui seis lados de medidas iguais.

Demarcaram os pontos com palito de churrasco e, com o barbante traçaram o

hexágono, as diagonais e marcaram o centro. Na figura 4 está a foto do canteiro depois

de realizada as demarcações.

E por fim, foi realizada a inscrição do quadrado no canteiro em forma de

losango. Com as medidas de comprimento dos lados do losango, foi calculado o ponto

médio de cada e assim, com palitos de churrasco e barbante demarcado o quadrado.

Dessa forma, ensinar Matemática vai muito mais além do que um simples

repasso de conteúdos didáticos. Caldart (2002) descreve que a Educação do Campo

exige do professor um esforço de busca da realidade do educando para através dela e

com ela a fim de programar seus conteúdos e problematiza-los, levando em conta as

diretrizes curriculares da educação e a realidade em que ambos estão inseridos.

Neste âmbito a Etnomatemática é uma ferramenta que auxilia na restauração da

dignidade cultural e do exercício da cidadania (FANTINATO, 2004). Pois, ao enxergar

a Matemática como uma produção cultural, contextualizada; analisa e desmistifica o

caráter universal no contexto da vida cotidiana

Nesta etapa podemos citar também, Duval (1995), quando apresenta a segunda

forma de aprendizagem cognitiva. Onde após observar e conhecer a realidade constrói

ações, com resultados futuros, interligados a Matemática contextualizada, minimizando

as dificuldades encontradas pelos alunos, no que se refere à interpretação de figuras

geométricas, bem como a interpretação destas.

4.3 Terceira etapa: Plantio

Duração: 3h/aula

Objetivos:

Comparar as dimensões dos espaçamentos entre uma muda e outra;

Trabalhar conceitos matemáticos relacionados ao espaço da horta como

quantidade de mudas;

Estimular a capacidade motora dos alunos, com o plantio da horta;

Conteúdos trabalhados: grandezas e medida (área, perímetro, espaçamento,

profundidade, comprimento da circunferência, figuras geométricas planas, figuras

inscritas e circunscritas).

Eixo temático da Educação do Campo:

Organização dos saberes escolares

Trabalho divisão social e territorial

Materiais utilizados:

Ferramentas de trabalho agrícola; Mangueira para a irrigação; Mudas de alface

crespa, roxa e lisa; Mudas de cebolinha; Mudas de almeirão; Mudas de salsinha; Mudas

de beterraba; Sementes de cenoura;

Nesta etapa, os educandos junto com a pesquisadora e educadores da escola,

realizaram o plantio das mudas de hortaliças.

Inicialmente a pesquisadora realizou os cálculos de quantas mudas seria

necessário para o plantio conforme as áreas dos canteiros.

Na sequência, já com as medidas de área calculadas, foi definido o que iria ser

plantado em cada canteiro geométrico e, assim, realizar o plantio, junto com os

educandos, mostrando como foram realizados os cálculos e como as diversas mudas

devem ser plantadas e cuidadas.

Figura 5: Alunos realizando o plantio das hortaliças

Fonte: Arquivos da autora.

Enquanto era realizado o plantio das mudas (figura 5), pode-se perceber que ao

realizar esta atividade a terceira etapa do processo elaborado por Duval (1995) se

concluiu, pois exigiu de cada educando um raciocínio além do que já está vindo

realizando.

Assim, todo educador que esta em constante busca para melhorar sua práxis de

ensino, proporciona ao educando oportunidades de relacionar-se com sua própria

cultura, ou seja, a Matemática deixa de ser mecânica e fria, pois os conteúdos

aprendidos tornam-se palpáveis e visíveis aos olhos do aprendiz.

De acordo com a DCE – Campo (PARANÁ, 2007) a cultura é entendida como

produção humana que se constrói a partir das relações do ser humano com a natureza,

com o outro e consigo mesmo.

D’Ambrosio (2001), aponta que a construção do conhecimento só acontece

quando o ensino da Matemática faz uma interligação entre o conhecimento técnico com

o vivenciado no dia a dia.

Corroborando com esse paradigma, a educação, em especial dos povos do

campo, só se concretiza quando a ciência e a etnomatemática se correlacionam dando

significado ao ensino curricular.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente proposta de ensino buscou relacionar a Etnomatemática e a horta

geométrica com situações vivenciadas pelos alunos, apresentando experiências e

envolvendo os conceitos matemáticos.

A proposta objetivou também, incentivar os educandos a participarem e

conseguirem observar na prática o contexto da Matemática, dando significado e

condições satisfatórias para que compreendam e se apropriarem dos objetos de

conceitos.

Ao elencar as atividades realizadas, conclui-se que a proposta de ensino

contribuiu para promover o interesse maior dos educandos durante as aulas de

Matemática relacionando teoria e prática despertar o interesse dos educandos pela

Matemática, desenvolvendo capacidades de pensar e raciocinar utilizando conceitos da

geometria.

Ressalta- se que é necessário que outras práticas educativas sejam realizadas na

perspectiva das escolas do campo, para que se promova o ensino e aprendizagem

adaptados aos contextos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. LDB : Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional : lei no 9.394, de 20

de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. – 5. ed.

– Brasília : Câmara dos Deputados, Coordenação Edições Câmara, 2010.

CALDART, R. S. Por uma educação do campo: traços de uma identidade em

construção. In: Educação do Campo: identidade e políticas públicas – caderno 4.

Brasília: Articulação Nacional “Por uma Educação do Campo”, 2002.

CASTRO, A. D. de. CARVALHO, A. M. P. de. Ensinar a Ensinar: Didática para a

Escola Fundamental e Média. São Paulo: Lummi Produção visual e Assessória Ltda.,

2001.

COELHO, M. I. P. O Cabri-géomètre na resolução de problemas. Estudo sobre

processos evidenciados e construção de conhecimentos por alunos do 6º ano de

escolaridade. Lisboa: APM, 1996.

D’AMBROSIO, U. Etnomatemática e Currículo: tensões e desafios no contexto

escolar. 1995. Anais... UFOP. Disponível em

http://www.ufop.br/downloads/parte_06___mesa_redonda___anais_relme_26.pdf.

Acessado em 06 de janeiro de 2014.

D’AMBROSIO, U. Etnomatemática: um elo entre as tradições e a modernidade. 2.ed.

Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

D’AMBROSIO, U. Etnomatemática e Educação. In. KNIJNIK, G.; OLIVEIRA, C. J.

de; WANDERER, F (Org.). Etnomatemática: currículo e formação de professores.

Santa Cruz do Sul: Editora EDUNISC, 2005, p. 39-52.

DUARTE. C; TASCHETTO R. Educação do campo e Etnomatemática: um diálogo

Entre Deleuze, Guattari e Wittgenstein. 2013. Anais...UNOCHAPECÓ. Disponível

em:http://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/pedagogica/article/viewFile/1583/9

02. Acessado em 19 de dezembro de 2013.

DUVAL, R. Sémiosis et pensée humaine: registres sémiotiques et apprentissages

intellectuels. Bern: Peter Lang, 1995.

FANTINATO, M. C. de C. B. Contribuições da Etnomatemática na Educação de Jovens

e Adultos: Algumas Reflexões Iniciais. Etnomatemática: Papel, valor e significado.

Org. RIBEIRO, J. P. M., DOMITE, M. do C. e FERREIRA, R. Natal. Abril, 2004.

FARIA, A. R. O eixo educação do campo como ferramenta de diálogo entre saberes e

docência. In: ROCHA, A. M. I.; MARTINS, A. A. Educação do Campo: desafios para

a formação de Professores. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

FIORENTINI, D.; LORENZATO, S. Investigação em Etnomatemática – percursos

teóricos e metodológicos. 2. Ed. Campinas: Autores Associados, 2007.

FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.

IRALA, C. H.; FERNANDEZ, P. M. Manual para Escolas: a escola promovendo

hábitos alimentares saudáveis. 2001. Disponível em

http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/horta.pdf acessado em 25 de fevereiro de

2014.

MORGADO, F. S.; SANTOS, M. A. A. A Horta Escolar na Educação Ambiental e

Alimentar: Experiência do Projeto Horta Viva nas Escolas Municipais de

Florianópolis. EXTENSIO: Revista Eletrônica de Extensão, Santa Catariana, n. 6, 2008.

NETO, A. J. de M. Formação de professores para a Educação do Campo: projetos

sociais em disputa. In: ROCHA, A. M. I.; MARTINS, A. A. Educação do Campo:

desafios para a formação de professores. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação.

Departamento de Diversidade. Coordenação da Educação do Campo. Cadernos da

Escola Itinerante – MST. Itinerante: a Escola dos Sem Terra – Trajetórias e

Significados. Ano I, número 2. Curitiba: SEED. 2008.

PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Educação.

Diretrizes Curriculares da Educação do Campo. Curitiba: SEED, 2006.

SANT'ANNA, F. M.; ENRICONE, D.; ANDRÉ, L.; TURRA, C. M. Planejamento de

ensino e avaliação. 11. ed. Porto Alegre: Sagra / DC Luzzatto, 1995.

SILVA, J. P. da. Conexões entre Etnomatemática e Educação do Campo: Um estudo

no Colégio Estadual Assentamento Virgilândia. 2013. Monografia (Licenciatura em

Educação do Campo). Planaltina, DF. Disponível em

http://bdm.bce.unb.br/bitstream/10483/5450/1/2013_JaciPereiradaSilva.pdf acessado

em 18 de dezembro de 2013.

TEACHING OF MATHEMATICS IN COUNTRY SCHOOL: A

PROCESS OF IMPLEMENTING TEACHING IN THE CONTEXT

OF GEOMETRIC HORTA

Abstract: This article presents a description of a research work on the completion of the

Bachelor's Degree in Education from the Field - UTFPR - Campus Two Neighbors. The

study aimed to list the contributions that the Ethnomatematics can bring to the teaching

of Mathematics to be contextualized in the geometric horta. The development work took

place at the Municipal School of Juscelino Kubitschek Field, located in the community

Tuna River, within the municipality of Francisco Beltran, Parana. Research is

classified as applied qualitative and interpretive nature, was carried out with a 6th

grade students of the final year of elementary school for six months and included three

steps: Step 1: Organization of the measures of the beds; Step 2: Preparation metric;

Step 3: Planting. To list the activities, it is concluded that the proposed teaching

contributed to promoting greater interest of the students during mathematics lessons

relating theory and practice, aroused the interest of students in mathematics and further

developed capacities to think and reason using concepts of geometry. It is noteworthy

that it is necessary that other educational practices are carried out in the context of

coutry schools so that they promote the teaching and learning adapted to the contexts.

Key-words: School Horta; Teaching Mathematics; Country Education;

Ethnomathematics.