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DM setembro | 2014 Teresa Regina Gomes Alves MESTRADO EM ENSINO DA MATEMÁTICA NO 3º CICLO DO ENSINO BÁSICO E SECUNDÁRIO Ensino da Matemática para a Vida Criação de cenários de aprendizagem com recurso a robots DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

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DM

setembro | 2014

Teresa Regina Gomes AlvesMESTRADO EM ENSINO DA MATEMÁTICA NO 3º CICLO DOENSINO BÁSICO E SECUNDÁRIO

Ensino da Matemática para a VidaCriação de cenários de aprendizagem com recurso a robotsDISSERTAÇÃO DE MESTRADO

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ORIENTAÇÃOElci Alcione Almeida dos Santos

Teresa Regina Gomes AlvesMESTRADO EM ENSINO DA MATEMÁTICA NO 3º CICLO DOENSINO BÁSICO E SECUNDÁRIO

Ensino da Matemática para a VidaCriação de cenários de aprendizagem com recurso a robotsDISSERTAÇÃO DE MESTRADO

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i

Dedico este trabalho:

Ao meu porto seguro, a minha família.

Às estrelas que iluminam o meu céu apesar de já

não estarem presentes…

Ao meu príncipe, o meu filho Tomás.

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“Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as

possibilidades para a sua produção ou a sua construção. Quem

ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender.”

Paulo Freire

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iii

Agradecimentos

À Professora Doutora Elci Alcione Almeida dos Santos, pela sua

disponibilidade, espírito amigo, sabedoria e preciosa colaboração ao longo da

orientação desta investigação. Obrigada pela liberdade de escolhas que me permitiu,

pela partilha do seu conhecimento tão qualificado, pela sua genuinidade e pela sua

entrega a este trabalho.

À minha Família por todo o apoio, carinho e compreensão prestados ao longo

da realização deste trabalho e, sobretudo, pelas faltas de tempo e de atenção que os

possa ter feito sentir.

Às Alunas que participaram neste estudo. Obrigada por serem espontâneas,

verdadeiras e me ajudarem a ver com o coração.

A todos os que, de forma direta ou indireta, tornaram possível mais uma das

minhas conquistas.

MUITO OBRIGADA!

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Índice

1 Introdução ................................................................................................................... 1

1.1.1 A minha experiência pessoal com alunos da Matemática Funcional /

Matemática para a Vida ..................................................................................................................... 2

1.1.2 As dificuldades sentidas ........................................................................................................ 3

2 Enquadramento teórico ........................................................................................... 9

3 Metodologia de investigação ................................................................................ 34

4 Análise e interpretação dos dados ...................................................................... 44

1.1 Motivação da investigação ................................................................................................... 2

1.2 Objetivo e questões de investigação ................................................................................ 6

1.3 Metodologia do estudo ........................................................................................................... 6

1.4 Organização do trabalho ....................................................................................................... 7

2.1 A educação de crianças com necessidades educativas especiais em

Portugal ..................................................................................................................................................... 9

2.2 Tipos de necessidades educativas especiais............................................................. 15

2.3 Adaptações curriculares ..................................................................................................... 17

2.4 A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais ......................... 20

2.5 Educação especial ou educação inclusiva? ................................................................ 23

2.6 Objetivos da educação inclusiva ..................................................................................... 25

2.7 A formação de professores e a educação inclusiva ............................................... 26

2.8 O Currículo Específico Individual e a Matemática Funcional / Matemática

para a Vida ............................................................................................................................................ 28

2.9 As Necessidades Educativas Especiais e a Matemática ....................................... 29

2.10 As tecnologias na educação especial ............................................................................ 31

3.1 Natureza do estudo ............................................................................................................... 34

3.2 Caracterização das alunas ................................................................................................. 36

3.3 Criação do cenário de aprendizagem ........................................................................... 38

3.4 Recolha dos dados ................................................................................................................. 41

3.5 Análise dos dados .................................................................................................................. 42

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v

5 Considerações finais ............................................................................................... 75

5.1 A promoção da autonomia de alunos com NEE com a criação de cenários

de aprendizagem ............................................................................................................................... 76

5.2 Os robots na aprendizagem da Matemática para a Vida..................................... 79

5.3 O trabalho de grupo na aprendizagem da Matemática para a Vida .............. 82

5.4 Reflexão final ........................................................................................................................... 83

Referências ....................................................................................................................... 87

Anexos ................................................................................................................................ 92

Anexo A – Ficha de diagnóstico .................................................................................................. 92

Anexo B – Cenário implementado ............................................................................................. 95

Anexo C – Fotografias ...................................................................................................................... 98

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Resumo

A Matemática para a Vida é uma disciplina dos Currículos Específicos

Individuais que pretende ajudar os alunos com Necessidades Educativas Especiais

a desenvolver aptidões que aumentem as suas competências pessoais e sociais e que

facilitem a sua integração na sociedade. A matriz curricular visa a promoção da

autonomia de modo a termos alunos capazes de enfrentar o dia a dia sozinhos.

A presente investigação procurou conhecer mais sobre a forma como alunos

com Necessidades Educativas Especiais (NEE) aprendem a Matemática para a Vida,

de que forma atribuem significados, o que abrangem esses significados e qual

o papel dos robots na construção dessa aprendizagem.

Utilizou-se uma abordagem qualitativa com recurso à observação participante.

O estudo envolveu a criação de um cenário de aprendizagem composto por um robot

e elementos com formas geométricas distintas, tendo como participantes duas

alunas com NEE. A recolha de dados foi feita por observação direta, registos áudio

e vídeo e análise dos trabalhos desenvolvidos pelas alunas.

Da análise dos dados concluiu-se que o uso dos robots permitiu uma

aproximação da escola às reais necessidades dos alunos com NEE,

proporcionando-lhes novas oportunidades de aprendizagem e momentos de

descoberta e partilha. Ao trabalharem com o robot, as alunas adquiriram novas

competências e, como consequência das suas pequenas conquistas, ganharam mais

autonomia, tornando-se capazes de tomar decisões face aos desafios enfrentados.

A utilização do robot contribuiu ainda para o estímulo da criatividade, além de ter

permitido a construção do conhecimento de acordo com o ritmo individual das

alunas, ao possibilitar novas formas de pensar e de aprender.

Palavras-chave: Necessidades Educativas Especiais; Robot; Cenários de

Aprendizagem; Matemática para a Vida.

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vii

Abstract

Mathematics for Life aims to provide students with Special Educational

Needs (SEN) the ability that allows them to have a life as close as possible to that of

other children. These students need to develop social competences that permit them

to be autonomous and facilitate their adaptation to real life situations, in order they

can be able to face day to day challenges by themselves.

The purpose of this research study was to learn more about how students

with Special Educational Needs learn Mathematics for Life, how they build meanings

and understand these meanings, and the role of robots in this learning process.

A qualitative, participant observation approach was used in this study. This

study involved the creation of a learning scenario where a robot and a variety of

elements with different geometric shapes were used, having as participants two

special educational need students. Data collection was done by direct observation,

audio and video recording, and the examination and analysis of the students’ work.

From the analysis of the obtained results, it is possible to conclude that the

use of robots contributed for a better adaptation of the school to the real needs and

capabilities of the students with special educational needs, giving them new learning

opportunities and moments of discovery and sharing. Working with robots,

students have acquired new skills and, as a result of their achievements, they have

gained more autonomy, thereby becoming more able to make decisions regarding

the challenges they have faced. The use of robots not only contributed to an increase

in their creativity, but also allowed the students to build their knowledge according

to their own rhythm, by giving them new ways of learning and thinking.

Key-words: Special Educational Needs; Robots; Learning Scenarios; Mathematics for

Life.

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Lista de figuras

Página

Figura 4.1 Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 1 da ficha de diagnóstico. 45

Figura 4.2 Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 2 da ficha de diagnóstico. 46

Figura 4.3 Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 4 da ficha de diagnóstico. 46

Figura 4.4 Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 6 da ficha de diagnóstico. 46

Figura 4.5 Fazendo medições utilizando uma régua. 55

Figura 4.6 As alunas a cortarem o papel autocolante para forrar as caixas que representavam elementos do cenário.

55

Figura 4.7 A aluna de 7º ano a recortar a planificação de banco de jardim. 57

Figura 4.8 A aluna de 8º ano a recortar a planificação de um prisma triangular. 60

Figura 4.9 Construção do robot pela aluna de 7º ano. 63

Figura 4.10 Construção do robot pela aluna de 8º ano. 63

Figura 4.11 Exploração do software - primeiras tentativas de programação. 64

Figura 4.12 Caracterização do autocarro. 69

Figura 4.13 Base que suportava a estrutura do autocarro. 69

Figura 4.14 A escolha da aluna de 8º ano. 70

Figura 4.15 A escolha da aluna de 7º ano. 70

Figura 4.16 Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 1 após o trabalho desenvolvido. 73

Figura 4.17 Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 2 após o trabalho desenvolvido. 74

Figura 4.18 Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 4 após o trabalho desenvolvido. 74

Figura C1 Uma das casas da aluna de 7º ano. 99

Figura C2 Uma das casas da aluna de 8º ano. 99

Figura C3 Experiências de programação. 99

Figura C4 Casa da aluna de 8º ano depois de colados todos os elementos. 100

Figura C5 Casa da aluna de 7º ano depois de colados todos os elementos. 100

Figura C6 O jardim, com casas, mesas e bancos. 101

Figura C7 A aluna de 8º ano a fazer o convite para a colega. 101

Figura C8 O cenário. 102

Figura C9 O autocarro caracterizado junto do cenário. 102

Figura C10 O autocarro preparado para percorrer a rua. 103

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1

1 Introdução

Ensinar é um desafio pois nunca sabemos até que ponto as estratégias que

adotamos vão funcionar. Temos consciência que não existe um estratagema que

chegue da mesma forma a todos os alunos de uma turma. Com os alunos de

currículos funcionais deparamo-nos com os mesmos problemas. Temos a agravante

das suas dificuldades serem tão acentuadas que a maior parte dos conhecimentos

que todos os outros alunos têm, porque foram conquistando ao longo da vida

pessoal e escolar, e pondo em prática no seu dia a dia, ainda não estarem adquiridos.

O professor tem de ser paciente e nunca cruzar os braços. É preciso procurar

material, ler, ir ao encontro das necessidades dos alunos e fazer com que se sintam

parte integrante deste processo. A evolução é sempre lenta mas lá vem o dia em que

ouvimos a tão esperada resposta e nos sentimos realizados. Uma conquista pequena

por vezes tem o sabor de uma grande vitória.

As nossas expetativas não podem ser elevadas mas isso não significa que

trabalhemos menos, pelo contrário, saber as dificuldades que nos esperam é lutar

ainda mais por estes alunos que merecem todo o nosso respeito e apoio pois disso

depende a sua integração de uma forma mais ou menos autónoma na sociedade.

Trabalhar com este tipo de alunos não é igual a trabalhar com uma turma do

ensino regular. Quando se tem pela frente uma turma que vai fazer exame sabemos

que no fim vamos ter de prestar contas. Os resultados dos alunos vão ser analisados

e vão-nos cobrar se os objetivos mínimos não forem atingidos. Com estes alunos de

Currículos Específicos Individuais (CEI) ninguém nos cobra nada uma vez que o que

se espera, devido à situação, é muito pouco. É importante proporcionar momentos

de aprendizagem de acordo com as suas limitações, mas que sejam motivadores

e impulsionadores do seu desejo de conhecer. Temos de puxar por eles porque, por

vezes, sabem mais do que aquilo que demonstram e precisam de oportunidades.

O primeiro passo é ganhar a sua confiança. É preciso ir mais longe, falar com o

coração para tocar no coração. Fazer com que as nossas palavras façam sentido

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e sejam como música para os seus ouvidos. Uma música que ficará a ecoar ao longo

dos dias e da vida numa constante repetição. Tal como a todos os alunos, mas

principalmente a estes, temos de proporcionar situações de aprendizagem para que

aprendam a ler, escrever, contar, resolver problemas mas, acima de tudo, a viver, no

verdadeiro sentido da palavra.

Durante o primeiro semestre, depois de muitos diálogos, de modo

a encontrar pontos de interesse comuns, decidimos construir uma rua. Para

a construção das casas, bancos de jardins, árvores e outros elementos que as alunas

resolveram introduzir na rua, utilizámos sólidos geométricos. Foi necessário medir,

planificar e, à medida que foram construindo, emergiram os conceitos de perímetro,

aresta, área e de unidades de medida.

1.1 Motivação da investigação

1.1.1 A minha experiência pessoal com alunos da Matemática

Funcional / Matemática para a Vida

Trabalhar com alunos da Matemática Funcional implica um envolvimento

muito grande e uma mudança de mentalidades e de atitudes. Temos de encarar

a educação e instrução destes alunos num contexto permanente de integração

e inclusão que nos desafiam a toda a hora. Os alunos com NEE têm necessidades

básicas iguais às dos alunos do ensino regular. Não vivemos em liberdade se não

formos capazes de respeitar os que são diferentes de nós. Trabalhar com alunos com

NEE severas é compreender as nossas limitações, explorar novos caminhos com

coragem e sair da nossa zona de conforto. O inventor do telefone, Graham Bell,

afirmou um dia que “se caminharmos apenas por caminhos já traçados, chegaremos

apenas onde os outros já chegaram”. Não podemos ter receio de seguir um caminho

diferente se acharmos que esse percurso nos levará ao sucesso.

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O primeiro passo para que as respostas sejam adequadas às necessidades dos

alunos é envolver professores, pais e outros profissionais da educação no

desenvolvimento e implementação de estratégias que vão ao encontro das

necessidades específicas do aluno. É preciso trabalhar em equipa, trocar ideias

e contribuir para um ambiente de entreajuda onde reine a confiança, o respeito

mútuo e a participação ativa. A responsabilidade deve ser partilhada entre todos os

que estão envolvidos na educação destes alunos.

Desde o início da minha prática pedagógica tive contato com alunos com NEE,

algumas mais severas do que outras. Primeiro como professora do ensino regular e

depois como docente do apoio pedagógico acrescido. Como docente de uma turma

com alunos com NEE foi-me pedido pouco e limitei-me a adaptar estratégias.

Mais tarde, como professora do apoio pedagógico acrescido deparei-me com várias

dificuldades pois não recebia grandes informações acerca dos alunos e tinha que

ajudá-los a ultrapassar dificuldades e a alcançar o sucesso. Contudo, foram

dificuldades ultrapassáveis pois as necessidades destes alunos não eram severas.

A minha maior dificuldade surgiu quando tive de trabalhar com os alunos da antiga

Matemática Funcional, atual Matemática para a Vida. São alunos com grandes

dificuldades de aprendizagem a quem temos de dar muito de nós e fazer sentir que

a escola e as aprendizagens que se trabalham são úteis para a vida.

1.1.2 As dificuldades sentidas

A família é o primeiro contexto de desenvolvimento do ser humano.

O acompanhamento dos pais é muito importante para o desenvolvimento dos

alunos. É importante a partilha de sucessos, dúvidas e inquietações para se

incentivar o envolvimento dos pais na educação das crianças e numa escola

verdadeiramente inclusiva. Quando os pais não exercem o seu papel a tarefa dos

educadores é dificultada. Mais do que as outras crianças, os alunos com NEE têm de

ser estimulados e viver num ambiente rico que propicie o seu desenvolvimento e os

torne mais fortes. Por vezes protegemos demasiado as crianças com NEE. Contudo,

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4

temos de ser cuidadosos pois estes alunos têm de passar por situações que os

incentivem a resolver problemas e a tomar decisões de forma a se tornarem

minimamente autónomos.

Quando se trabalha com alunos com NEE procura-se fazer com que tenham

vivências próximas das outras crianças tanto a nível escolar como ao nível da

ocupação dos tempos livres. Temos de dotá-los de competências sociais que lhes

permitam ser autónomas e facilitem a sua adaptação ao contexto real.

O professor de educação especial participa em reuniões para discutir os casos

dos alunos, disponibiliza textos de apoio, sugere estratégias de ensino, colabora na

adaptação curricular e está sempre disponível para ajudar. Contudo, dentro da sala

de aula somos nós e o aluno e é aí que surgem as grandes dúvidas. Por vezes

preparamos atividades que julgamos interessantes e motivadoras e estes alunos não

correspondem. Sentimos que todo o trabalho, pelo menos naquela aula, foi em vão.

A teimosia que demonstram não nos permite obrigá-los a entrar numa atividade

contra a sua vontade. Têm de sentir algum interesse pela atividade a desenvolver

para que se produzam aprendizagens significativas.

A legislação faz apelo à diversificação de estratégias e a um ensino por níveis

diferenciados que tenham em conta o “caso concreto” mas as práticas mantêm-se

tradicionais e por vezes o apoio ao aluno serve para lhe dar mais do mesmo. Quando

vêm para a aula de cariz funcional estão cansados e saturados de uma escola que

não faz qualquer sentido e não corresponde às suas verdadeiras necessidades.

Quando se trabalha com estes alunos durante um único ano letivo, entre

adaptação, procura de estratégias e aplicação das mesmas, apercebemo-nos que

estamos a chegar ao fim. Se o nosso trabalho com estes alunos for continuado

começamos a perceber as reais dificuldades e sentimos a necessidade de procurar

novas estratégias, investir em formação, perceber como é que aprendem e o que os

motiva para sermos capazes de ajudá-los.

Quando se trabalha com estes alunos durante um único ano letivo, entre

adaptação, procura de estratégias e aplicação das mesmas quando nos apercebemos

estamos a chegar ao fim. Se o nosso trabalho com estes alunos for continuado

começamos a sentir mais dificuldades. Precisamos de procurar novas estratégias,

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investir em formação, perceber como é que aprendem e o que os motiva para sermos

capazes de ajudá-los.

O meu grande desafio passou a ser dar a estas alunas ferramentas suficientes

para serem capazes de enfrentar o dia a dia sozinhas. A minha grande alegria seria

saber que um dia estas meninas, tal como todos os jovens, eram capazes de

desenvolver uma consciência crítica, escolher o caminho a seguir, trabalhando erros

e construindo a tolerância. Adorava saber que lutam pela concretização dos seus

sonhos e que lhes foi oferecida uma nova oportunidade se fracassassem. O valor de

qualquer ser humano, como refere Augusto Cury (2013), não se mede pela

quantidade de aplausos que recebe e que é visível exteriormente, mas sim na

personalidade que ninguém consegue ver.

É um trabalho de muita paciência e dedicação. Às vezes parece que já esgotei

todos os recursos mas elas ainda não chegaram lá. É começar/recomeçar a cada aula.

Nunca desistir e estar atento aos interesses e motivações das alunas, mudando

planos de trabalho à última da hora. É um desafio constante na procura de soluções

que por vezes não sabemos se existem. O que para outros alunos parece óbvio para

estas alunas é tão difícil. Acima de tudo é preciso prepará-las para lidarem com

factos concretos, enfrentar contrariedades, pedir desculpa, cair e levantar.

Alguns colegas olham para os alunos com NEE com desapreço, não gostam de

trabalhar com alunos que apresentam grandes dificuldades. Os sucessos destes são

tão pequenos que a valorização pessoal do professor alcança-se no anonimato da

sala de aula. Aprendemos a valorizar as pequenas vitórias e com o passar do tempo

conseguimos mais facilmente ver o invisível aos olhos pois estes alunos, com o

passar do tempo, tornam-se transparentes. Não podemos desistir da nossa atividade

mesmo que às vezes o nosso trabalho e todo o tempo dispendido pareçam em vão.

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1.2 Objetivo e questões de investigação

Optei por um trabalho desta natureza com as minhas alunas dos currículos

funcionais por sentir que a criação de algo conjunto poderia ser uma experiência a

que estas atribuiriam algum valor, uma vez que não estão acostumadas a trabalhar

em equipa.

Em virtude do exposto, o objetivo deste estudo é compreender como alunos

com NEE aprendem a Matemática para a Vida.

Para conduzir o trabalho de investigação, foram elaboradas três questões:

1. Como é que a criação de um cenário de aprendizagem pode promover a

autonomia de alunos com NEE?

2. Qual o papel dos robots na aprendizagem da Matemática para a Vida?

3. Como é que o trabalho de grupo pode contribuir para a aprendizagem da

Matemática com alunos com NEE?

1.3 Metodologia do estudo

Segundo Denzin & Lincoln (1994), os métodos qualitativos são ricos e

analisam fenómenos que não podem ser traduzidos em números. Optei pela

observação participante como abordagem metodológica de investigação pois o meu

grande objetivo era compreender comportamentos e processos. Pretendia perceber

de que forma os alunos com NEE constroem significados e o que comportam esses

significados. Neste sentido observei como duas alunas com NEE, que frequentam a

Matemática Funcional/Matemática para a Vida, aprendem.

Todo o trabalho foi sendo desenvolvido com base numa pesquisa bibliográfica

que lhe dá fundamento.

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Recolhi dados de natureza qualitativa que foram sendo obtidos através de

observações diretas, registos de áudio e vídeo e dos próprios trabalhos realizados

pelas alunas. Fiz um diário de bordo onde relatei aquilo que fui ouvindo, vendo e

experienciando no decurso da investigação.

1.4 Organização do trabalho

Este trabalho está estruturado em cinco capítulos. No primeiro capítulo faço

alusão à motivação da investigação e falo da minha experiência pessoal com alunos

da Matemática para a Vida. É também neste capítulo que refiro o objetivo e questões

da investigação, a metodologia do estudo e a forma como organizei o trabalho.

O segundo capítulo é dedicado ao enquadramento teórico. Ao longo deste

capítulo faço uma retrospetiva acerca da educação de alunos com NEE em Portugal

e exponho a opinião de diversos autores acerca da educação especial. Estes estudos

têm contribuído para a inclusão destas crianças nas escolas em classes regulares

com vista a uma integração plena na sociedade. Subdividi este capítulo em vários

subcapítulos:

− A educação de crianças com necessidades educativas especiais em

Portugal;

− Tipos de necessidades educativas especiais;

− Adaptações curriculares;

− A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais;

− Educação especial ou educação inclusiva;

− A formação de professores e a educação inclusiva;

− O Currículo Especícifico Individual e a Matemática Funcional/Matemática

para a Vida;

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− As necessidades educativas especiais e a Matemática;

− As tecnologias em educação especial.

No terceiro capítulo apresento a metodologia utilizada na investigação, faço

a caracterização das alunas e falo da criação do cenário. É ainda neste capítulo que

apresento os métodos utilizados na recolha dos dados e na sua posterior análise.

O quarto capítulo é dedicado à análise e interpretação dos dados. A análise

começou a ser feita pela observação direta que esteve presente ao longo da

investigação, pelos registos efetuados no diário de bordo e pela análise das

gravações áudio e vídeo efetuadas.

As considerações finais acerca do trabalho desenvolvido são feitas no quinto

e último capítulo. É ainda neste capítulo que faço uma reflexão sobre a minha

experiência ao longo de toda esta investigação, referindo o que aprendi e os meus

objetivos futuros.

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2 Enquadramento teórico

2.1 A educação de crianças com necessidades educativas especiais

em Portugal

A evolução da história da Educação Especial tem sido marcada por diferentes

conceções e práticas. Na considerada pré-história da educação especial os

deficientes eram ignorados, perseguidos e por vezes abandonados.

Na Idade-Média as crianças diferentes eram mantidas longe da sociedade

pois julgava-se que estavam possessas por demónios. Havia uma política de exclusão

destas crianças e não se permitia o seu convívio com a sociedade em geral e muitos

menos com as outras crianças ditas normais. Ficavam isoladas em hospitais ou

conventos destinados a esse fim.

As pessoas portadoras de deficiência, durante os séculos XVII e XVIII,

beneficiavam de um apoio dado por instituições de caridade onde recebiam

assistência juntamente com delinquentes.

Com as filosofias mais humanistas e complacentes de Locke e Rosseau, no

século XVIII, assiste-se a uma mudança na forma de olhar para as crianças diferentes

e em vez de as votarem ao abandono e ao isolamento passou-se a tentar moldá-las

para serem capazes de sociabilizar. As estratégias passavam por cantar para

acalmar o monstro que estas crianças tinham dentro de si ou por rituais exorcistas.

A época de institucionalização, onde surgem as primeiras instituições

destinadas a cegos e surdos, surge no final do século XVIII e início do século XIX.

Estes locais eram quase sempre criados por privados e com pouca ajuda por parte

do Estado. Pretendia-se esconder e ocupar estes indivíduos que a sociedade

considerava estranhos e incapazes de conviver com os outros. Deviam estar longe

da vida coletiva e das escolas. Não se considerava possível que aprendessem na

escola comum.

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Embora muito arcaico este sistema educativo paralelo, que se desenvolveu

no século XIX, foi um grande progresso e marcou um ponto de viragem na educação

de crianças com deficiências orgânicas e funcionais. Estas, embora não sendo as

únicas, são as que mais padecem da exclusão da escola regular.

No século XIX, o médico Jean Marc Itard (1774 -1838), mais conhecido como

o “pai da Educação Especial”, através da sistematização das necessidades educativas

de crianças que não possuíam uma situação educativa normal, desenvolveu

programas específicos com vista à sua integração na sociedade. Anos mais tarde, a

teoria psicanalista de Freud, os testes para a medição da capacidade intelectual de

Galton, o conceito de “idade mental “ e os testes de inteligência de Binet e Simon

vieram originar uma mudança positiva e contribuíram para a criação de escolas

especiais.

O objetivo geral agora era o de isolar estas crianças que, excluídas dos

programas de educação públicos, cresciam em ambientes impessoais longe de

interações que seriam benéficas para o seu desenvolvimento. Passou-se de uma

política de exclusão para uma política de segregação que se manteve durante

décadas pois, apesar das escolas públicas começarem a aceitar alguma

responsabilidade na educação destas crianças não faziam nada por elas. Ou as

deixavam nas classes regulares e não lhes davam qualquer apoio específico ou as

colocavam em classes especiais longe das outras crianças.

Com as duas grandes guerras assiste-se a uma fase de introspeção em que o

empenhamento e esperança fazem renascer valores como igualdade, liberdade e

justiça. A sociedade e os pais em particular passam a olhar para estas crianças e para

a sua educação/instrução de outra forma. Estas reformulações levaram a repensar

a função da escola perante as crianças com necessidades educativas.

É responsabilidade da sociedade facultar a toda a criança com NEE,

independentemente da gravidade do seu problema, uma educação apropriada,

pública e gratuita que se adeque às suas necessidades e caraterísticas específicas.

Em Portugal, nos anos 40, o Ministério da Educação criou nas escolas

regulares classes especiais que eram complementadas por outras estruturas da

competência da Segurança Social. Até aos anos 60 esta oferta continuou escassa e é

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nesta altura que os pais começam a organizar-se criando associações sem fins

lucrativos que estavam estruturadas por categorias de deficiência e pretendiam

ajudar os seus filhos em termos educativos. Surgem assim os primeiros centros de

reabilitação e escolas especiais para colocar crianças deficientes em função da sua

limitação.

No decorrer da década de 70 e início dos anos 80 assiste-se ao ponto alto dos

estabelecimentos de educação especial pois é nessa altura que o setor da Educação

Especial passa para a tutela do Ministério da Educação. Com o objetivo de

impulsionar a inclusão familiar, social e escolar de crianças com deficiência criaram-

se, em 1972, as Divisões do Ensino Especial do Básico e do Secundário e em 1976, as

“Equipas de Ensino Especial Integrado” que se destinavam a crianças capazes de

acompanhar os currículos em vigor. A presença nas salas de aula destas crianças,

que possuíam deficiências de várias ordens, não comprometia nem provocava

alterações no processo de ensino-aprendizagem.

A Lei de Bases do Sistema Educativo Português e mais precisamente o

Decreto – Lei 319/91, de 23 de Agosto, são bem explícitos na afirmação da

necessidade e da importância de ser dada a toda a criança as mesmas oportunidades

de educação.

O artigo 7º da Lei de Bases do Sistema Educativo proclama a importância de

garantir que as crianças com NEE, provenientes de deficiências físicas e/ou mentais,

sejam inseridas em contextos facilitadores da sua aprendizagem e que as suas

capacidades sejam desenvolvidas de forma plena.

Com a publicação da Lei nº 46/86, de 14 de outubro, que veio normalizar a

educação especial, a ideia de educação inclusiva e integrada foi fortemente revista.

O principal objetivo passa a ser a reintegração e/ou inclusão destas crianças na

sociedade e no artigo 18º da Lei de Bases do Sistema Educativo podemos ler que

cabe, preferencialmente aos estabelecimentos de ensino regular, garantir a

educação destes alunos. A sua integração trouxe alterações quer a nível dos métodos

de ação quer a nível do próprio suporte educativo embora não seja exigido que estes

acompanhem os currículos em vigor. A atenção dada aos alunos com NEE tem vindo

a aumentar e publicação da Lei de Bases do Sistema Educativo foi o ponto de partida

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para a promulgação de vários diplomas que aprovam medidas que se destinam a

orientar a ação junto destas crianças.

Com o objetivo de detetar precocemente e de poder dar um encaminhamento

e apoio mais adequado às crianças e jovens com problemas educativos de diferentes

ordens criaram-se, com o Despacho Conjunto 38/SEAM/SERE/88, as “Equipas de

Educação Especial”. Cabe às escolas a missão de orientar e acompanhar os alunos

com dificuldades sendo que estas devem ser detetadas o mais precocemente

possível de modo a se tomarem as medidas necessárias ao seu sucesso educativo

(Decreto-Lei nº 43/89, de 3 de Fevereiro).

O artigo 9º do Decreto-Lei nº 9/89, de 2 de maio, destaca a relevância de se

favorecer o desenvolvimento de competências que atenuem as limitações

características de um aluno portador de deficiência. Com vista a alcançar os

melhores sucessos foram estabelecidos, no artigo 11º do Decreto-Lei nº 286/89, os

princípios gerais de reestruturação curricular onde se determina que o

acompanhamento destes alunos deve ser feito pelos serviços de psicologia e

orientação escolar.

A Convenção sobre os direitos da criança foi assinada por Portugal a 26 de

janeiro de 1990 e, apesar de se destinar a todas as crianças, refere particularmente,

no seu artigo 23º, que as crianças com deficiência têm direito a uma educação que

vise, dentro das suas limitações, uma integração plena na sociedade. A necessidade

e importância de se apoiarem estes alunos e as suas famílias oferecendo-lhes a

possibilidade de, gratuitamente, cumprirem a escolaridade obrigatória estão

consagradas no Decreto-Lei nº 35 /90 de 25 de janeiro.

Dando cumprimento ao disposto no artigo 26º da Lei de Bases do sistema

Educativo foram criados, pelo Decreto-Lei nº 190/91 de 17 de maio, os Serviços de

Psicologia e Orientação (SPO) que são unidades especializadas na área educativa e

que se encontram presentes nas escolas.

A área de trabalho da educação especial é requalificada e ampliada com a

entrada em vigor do Decreto-Lei nº 319/91, de 23 agosto, que renova um conjunto

de leis que vêm fortalecer a noção de que cabe à escola regular assegurar a educação

dos alunos com NEE com o objetivo de uma integração total na sociedade.

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O “Regime Educativo Especial” (REE) veio modificar os contextos em que se

processa o ensino-aprendizagem dos alunos com NEE ao atribui às escolas a tarefa

de elaborar estratégias que visem a resolução dos problemas destes alunos antes de

os encaminharem para os serviços de educação especial.

Ficou consagrada na lei a possibilidade de criação de equipamentos especiais

de compensação, adaptações materiais e curriculares, condições especiais de

matrícula, de frequência e de avaliação, adequações à organização das turmas

(relativamente ao número de alunos), apoio pedagógico acrescido e ensino especial.

Esta última medida é talvez a mais importante uma vez que os alunos que

necessitam de adaptações curriculares, aprendizagem de técnicas específicas para

aceder ao currículo regular, aprendizagem sistematizada de competências que

promovam a sua autonomia e integração pessoal ou currículos alternativos passam

a ter um acompanhamento educativo individualizado. Os alunos podem beneficiar

de uma ou mais destas medidas consoante o seu caso concreto e dá-se sempre

prioridade a medidas integradoras. Medidas mais restritivas podem ser aplicadas

no caso das menos restritivas serem insuficientes para fazer face às dificuldades do

aluno.

Os apoios educativos com base num professor especializado colocado num

estabelecimento de ensino onde deve trabalhar não apenas com o aluno mas com a

escola, a turma e os professores são consagrados pelo Despacho Conjunto

nº 105/97. As implicações práticas deste decreto passam pela colocação de

professores de apoio nas escolas que vêm substituir as Equipas de Educação

Especial e pela estratégia de apoio ao professor.

Um marco muito importante na educação de crianças com NEE foi a

Declaração de Salamanca (1994), que proclama uma escola para todos onde

crianças e jovens com NEE tenham direito à educação, se sintam integrados e se

promovam aprendizagens significativas capazes de irem ao encontro das suas

necessidades específicas. É a partir deste ponto que grandes alterações começaram

a ser visíveis a nível nacional e internacional.

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O Despacho Conjunto nº 891/99 de 19 de outubro, regulamenta o apoio

integrado no âmbito da intervenção precoce dirigida a crianças até aos seis anos de

idade. Esta Intervenção Precoce está centrada na criança e no seu contexto familiar.

Em janeiro de 2008 foi publicado o Decreto-Lei nº 3/2008 (que revogou o

Decreto-Lei nº 319 de 1991) que define os apoios especializados a prestar aos

alunos com NEE. São assim criadas condições que permitem a adequação do

processo educativo às necessidades de cada aluno. A partir desta altura a orientação

para a inclusão é ainda mais clara. Temos de oferecer oportunidades aos nossos

alunos para adquirirem competências que os ajudem a se tornarem autónomos,

partes integrantes da sociedade e felizes.

Na Região Autónoma da Madeira contamos ainda com Decreto Legislativo

Regional nº 33/2009/M, nomeadamente no artigo 28º, ponto 2, alínea e que

regulamenta a medida educativa Currículo Específico Individual (CEI). No artigo

33º - Currículo Específico Individual, do mesmo decreto podemos ler que :

“ 1 — O currículo específico individual no âmbito da educação especial pressupõe

alterações significativas no currículo comum, substitui as competências definidas

para cada nível de educação e ensino, e efectua-se ouvido o parecer do conselho

escolar ou conselho de turma e mediante a proposta dos diferentes técnicos

especializados envolvidos.

2 — As alterações referidas no número anterior consistem na introdução,

substituição e/ou eliminação de objectivos e conteúdos, em função do nível de

funcionalidade da criança ou jovem.

3 — O currículo específico individual inclui conteúdos que promovem a autonomia

pessoal e social do aluno e dá prioridade ao desenvolvimento de actividades de cariz

funcional centradas no contexto de vida, na comunicação e na organização do

processo de transição para a vida pós-escolar.

4 — Compete ao conselho escolar, ao conselho executivo e aos serviços da Direcção

Regional de Educação Especial e Reabilitação orientar e assegurar o

desenvolvimento curricular proposto.”

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A Portaria nº 1B/2013 regula o ensino de alunos com CEI em processo de

transição para a vida ativa e veio alterar a matriz curricular dos alunos com CEI.

A história da educação especial pode ser dividida em três épocas: a primeira,

a pré-história da educação especial, essencialmente asilar; a segunda numa vertente

de assistência social, com algumas preocupações educativas e a terceira, que se vive

atualmente, que se preocupa com a integração dos deficientes na escola e na

sociedade (Correia, 1993; Candeias, 2009).

A integração é, sem margem para dúvidas, a principal medida defendida pela

Lei de Bases do Sistema Educativo e por todos os diplomas que têm sido publicados.

As escolas têm de se reestruturar para atender a todos os alunos.

2.2 Tipos de necessidades educativas especiais

O conceito necessidades educativas especiais está hoje em dia generalizado

a grande parte dos países desenvolvidos que se preocupam com esta matéria.

Portugal não é exceção e a legislação portuguesa, mais precisamente o

Decreto-Lei 319/91, de 23 de agosto, dão-lhe especial atenção. O grande objetivo é

a integração e a igualdade de direitos ou seja, a não discriminação por razões de raça,

religião, opinião, caraterísticas intelectuais e físicas de qualquer criança em idade

escolar.

Segundo Brennan (1988), uma necessidade educativa especial caracteriza-se

pela existência de um problema seja ele de carácter físico, sensorial, intelectual,

emocional, social ou qualquer combinação destes problemas que afete a

aprendizagem ao ponto de ser necessário fazer alterações curriculares para que o

aluno possa receber uma educação adequada. Tal necessidade educativa pode

classificar-se de ligeira a severa e pode ser permanente ou manifestar-se durante

uma fase do desenvolvimento do aluno.

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Para Correia (1993) o conceito de NEE abrange crianças e adolescentes que

não conseguem acompanhar o currículo normal devido a problemas sensoriais,

físicos, intelectuais e emocionais ou que têm dificuldades de aprendizagem

relacionadas com fatores orgânicos ou ambientais.

Verifica-se alguma falta de conhecimento, em parte, devido à ausência de

informação correta quando se fala em crianças com problemas de várias ordens.

Todos os alunos com NEE têm direito a uma educação pública gratuita

adequada às suas necessidades educativas e ao seu ritmo de aprendizagem.

As necessidades educativas especiais podem ser divididas em permanentes ou

temporárias (Correia, 2008).

As NEE temporárias exigem a modificação parcial do currículo escolar,

adaptando-o às caraterísticas do aluno num determinado momento do seu

desenvolvimento e percurso educacional. Problemas ligeiros ao nível do

desenvolvimento das funções superiores: desenvolvimento motor, percetivo,

linguístico e socioemocional ou problemas relacionados com a aprendizagem da

leitura, da escrita e do cálculo são considerados NEE temporárias (Correia, 1997).

Estes alunos desenvolvem-se em ritmos mais lentos nas áreas que apresentam

dificuldades comparativamente aos alunos normais. As suas problemáticas, embora

ligeiras, interferem com a aprendizagem.

Relativamente às NEE permanentes exigem adaptações generalizadas do

currículo escolar, adaptando-o às caraterísticas do aluno durante grande parte ou

todo o seu desenvolvimento e percurso educacional. Crianças cujas alterações no

desenvolvimento foram provocadas por problemas orgânicos, funcionais ou por

défices socioculturais e económicos graves e que apresentam problemas do foro

sensorial, intelectual, processológico, físico, emocional e outros problemas de saúde

estão incluídas neste grupo.

As crianças são elegíveis para os serviços de educação especial através de

dois critérios: se possuem uma ou mais deficiências ou se a sua condição o requerer.

A criança é considerada com NEE quando: tem deficiência mental; é surda ou tem

problemas de audição; é cega ou portadora de visão parcial ou reduzida; tem

problemas motores; tem outros problemas de saúde; tem problemas da linguagem

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e fala; tem perturbações emocionais; tem dificuldades de aprendizagem; tem

traumatismo craniano ou autismo (Correia, 1997).

Segundo o Warnock Report (1978), podemos dividir as necessidades

educativas em três categorias: a necessidade de se encontrarem meios específicos

de acesso ao currículo; a necessidade de ser facultado a determinadas

crianças/aluno um currículo especial ou modificado e a necessidade de dar uma

particular atenção ao ambiente educativo em que decorre o processo de

ensino/aprendizagem. Estas categorias estão relacionadas com o grau de deficiência

das crianças e com as diferentes adequações que podem precisar de forma a serem

corretamente orientadas educacionalmente.

2.3 Adaptações curriculares

Todos os anos as escolas recebem alunos com dificuldades de aprendizagem.

Esses alunos têm um aproveitamento escolar baixo que por vezes os leva a

rejeitarem as atividades que se desenvolvem na sala de aula porque se sentem

angustiados por não acompanharem o ritmo normal da turma. Este é um problema

sério que cresce com a criança ou jovem. Com o objetivo de se ultrapassarem as

dificuldades é necessário conhecer os alunos e desenvolver estratégias específicas

que lhes proporcionem planos de apoio adequados que lhes despertem o interesse

e os preparem para a vida ao invés de os afastarem cada vez mais da escola (Correia,

1997; Felizardo, 1994). O grande objetivo é promover o sucesso educativo e isso só

será possível se a maneira de atuar quando estamos perante alunos com

características particulares na sua forma de aprender for repensada.

É necessário diferenciar as estratégias às necessidades de cada aluno e

encontrar respostas que se adequem às dificuldades de cada um. Se tratarmos todos

da mesma maneira vamos aumentar as desigualdades existentes. Cada aluno tem de

ser visto no contexto social em que está incluído (Rebocho, Saragoça, & Candeias,

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2009). Oferecer a estes alunos aulas extra, dando-lhe mais do mesmo, não é uma boa

opção. O caminho é diversificar, imaginar, sonhar, criar, incentivar atividades que

gerem situações facilitadoras da aprendizagem. É um caminho longo a percorrer

todos os dias onde muitas vezes teremos de viver do sonho. O percurso tem de ser

flexível e o professor tem de se adaptar às diversas etapas da situação individual do

aluno por forma a responder às suas necessidades.

Esta caminhada nem sempre é aliciante para os nossos alunos e é nosso dever

ajudá-los a encontrar respostas para a sua individualidade e diferença no seio de

uma escola que nem sempre corresponde às suas expetativas. Estes objetivos só

serão alcançados se forem introduzidas no sistema modificações apropriadas.

As respostas educativas a serem implementadas têm de partir do currículo comum

e, a partir das necessidades individuais de cada aluno devem ser feitas adaptações

de forma a conseguir integrá-los, com sucesso, nas classes normais. É uma tarefa por

vezes complexa pois não se encontra qualquer referência aos alunos com NEE nos

programas das disciplinas curriculares. O currículo homologado pelo Ministério da

Educação destina-se a alunos regulares que representam uma fração do universo

dos estudantes das nossas escolas. Para ser aplicado a alunos concretos é necessário

realizar adaptações curriculares diversificadas para que todos os alunos realizem

com sucesso as aprendizagens preconizadas no currículo (Felizardo, 1994;

Rodrigues, 2003).

A partir da publicação do Decreto-Lei nº 3/2008 é dada uma orientação clara

para a inclusão, promoção do sucesso educativo, autonomia, promoção da igualdade

e preparação para a integração na vida da sociedade. As seis medidas educativas

propostas, nomeadamente: apoio pedagógico acrescido, adequações curriculares

individuais, adequações no processo de matrícula, adequações no processo de

avaliação, currículo específico individual e tecnologias de apoio dão orientações

claras para a tão aclamada inclusão.

A maioria dos alunos com NEE segue um currículo normal, com ou sem apoio,

e com recurso esporádico a pequenas adaptações. Essas adaptações passam pela

eliminação, introdução ou modificação de algum objetivo, conteúdo ou atividade do

currículo regular; priorização de certas áreas curriculares ou conteúdos de acordo

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com o processo de aprendizagem do aluno ou modificação do tempo previsto para

atingir os objetivos de aprendizagem. Segundo Correia (1997) adaptação curricular

é qualquer modificação ou alteração de todo e qualquer componente do currículo,

desde os objetivos à avaliação. Não se trata apenas de cortar mas também de

acrescentar ou modificar. As finalidades da educação e as necessidades educativas

dos alunos são referências a não perder de vista (Cruz, 2009).

Existem currículos que são de tal forma adaptados que os seus domínios

curriculares são baseados nos diferentes ambientes da vida quotidiana e visam,

acima de tudo, desenvolver as habilidades de autonomia pessoal e social. São os

currículos funcionais.

Estes currículos só são implementados com sucesso quando se reúne um

conjunto de fatores essenciais que passam pelas atitudes favoráveis das tutelas na

organização de ambientes específicos de aprendizagem, na atribuição de meios e na

organização de programas.

A avaliação dos alunos sujeitos a estes currículos funcionais não está

centrada nos resultados finais nem naquilo que o aluno não consegue fazer. Desloca

o seu foco para o processo relacional, dando grande ênfase às pequenas

aprendizagens e ao desenvolvimento. Tem de ser uma avaliação inclusiva, funcional

e dinâmica uma vez que está centrada na compreensão do potencial de

aprendizagem e na relação professor aluno que origina o processo educativo

(Candeias, 2009).

É da responsabilidade da escola a elaboração de um Plano Educativo

Individualizado (PEI) para os alunos com NEE. O PEI baseia-se numa avaliação a

vários níveis realizada por uma equipa multidisciplinar e deve descrever o nível

atual de desempenho da criança, especificando défices detetados; definir objetivos

a longo e curto prazo; descrever os serviços a serem prestados para implementação

do programa de intervenção educacional; determinar o nível de integração na classe

regular; definir a duração do plano e os critérios objetivos e específicos de avaliação

do mesmo. Este Plano Educativo Individualizado deve ser elaborado, aprovado e

reavaliado pelo menos uma vez por ano pela equipa multidisciplinar que o elaborou

e com a participação dos pais.

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20

No caso das problemáticas mais graves é necessário elaborar também um PIT

(Plano Individual de Transição) para promover a integração do aluno na vida

profissional ou numa instituição de carácter ocupacional.

Grande parte destes alunos cumpre a escolaridade obrigatória em escolas

regulares integrados em turmas com alunos sem NEE. Esta aproximação só é

possível quando o grau de deficiência do aluno não é elevado e se observa que as

medidas de educação especial são suficientes. Caso contrário é necessário

encaminhar o aluno para uma instituição de educação especial que se encontre

preparada para responder de forma adequada às suas necessidades. A integração

em turmas do ensino regular é sempre privilegiada uma vez que os alunos com NEE

quando integrados em turmas com alunos sem NEE desenvolvem-se num ambiente

mais rico que lhes oferece mais oportunidades de desenvolvimento e crescimento.

2.4 A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais

Atualmente a educação que os alunos com NEE recebem está mais adequada

às suas reais necessidades se comparada com a forma como se lidava com as

diferenças, em ambiente de sala de aula e na própria sociedade, há alguns anos

(Correia, 2008). A legislação tem vindo a sofrer alterações que visam atenuar as

desigualdades existentes e a educação dos alunos com NEE está cada vez mais

próxima da que é dada aos alunos ditos “normais”. A integração destes alunos em

classes regulares tem sido fundamental para o atenuar destas diferenças. Os apoios

suplementares, de que por vezes beneficiam, auxiliam na aquisição de competências

essenciais.

A inclusão é, nos dias de hoje, um dos grandes objetivos da educação.

A promoção de experiências de aprendizagem efetivas para todos os alunos e

principalmente para os alunos com NEE está reforçada na legislação (Rebocho,

Saragoça, & Candeias, 2009) e faz parte integrante do dia a dia da escola global.

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Quando incluídos em turmas regulares é-lhes oferecida a oportunidade de

interagir com outros indivíduos e de ficarem melhor preparados para a vida em

sociedade. Procura-se que, no meio da diversidade, as crianças possam encontrar

respostas para a sua individualidade e se desenvolvam em todas as vertentes num

meio que não pode ser restritivo mas, pelo contrário, facilitador de aprendizagens

significativas que vão ao encontro das suas necessidades educativas. Não nos

podemos esquecer que estas crianças têm grandes limitações pedagógicas e por

vezes mais dificuldades de aprendizagem. Integrar passa, mais do que colocar numa

classe regular, por articular a integração física com a integração social e académica,

reduzindo os preconceitos e estigmas (Candeias, 2009; Cruz, 2009). A escola

inclusiva que é a escola para todos, que aceita e congrega os alunos

independentemente das suas problemáticas e responde a necessidades

diferenciadas tem vindo a tornar-se uma realidade embora ainda haja muito

caminho a percorrer. É necessário mudar mentalidades, valores, crenças, atitudes e

comportamentos e motivar os professores dando-lhe instrumentos facilitadores de

práticas que aumentem as suas competência na área da integração e os ajudem a

lidar com a diversidade. O desafio da inclusão é de todos.

O princípio da inclusão passou a merecer um maior interesse por parte de

todos a partir da “Conferência mundial sobre necessidades educativas especiais:

Acesso e qualidade”. Desde esta conferência que se realizou em Salamanca, em junho

de 1994, onde foi assinada a Declaração com o mesmo nome sobre os princípios, a

política e as práticas na área das necessidades educativas especiais e o respetivo

enquadramento de ação nada ficou como dantes. Reconheceu-se a necessidade de

se criarem escolas para todos, onde todos se sintam incluídos nas suas diferenças e

sejam apoiados nas aprendizagens que facilitem a sua integração na vida ativa. Além

da sua integração na classe regular o aluno com NEE deve receber apoio adequado

às suas dificuldades específicas (Bairrão, Felgueiras, Fontes, Pereira, & Vilhena,

1998, Correia, 1997). Para isso pode ser necessário receber apoio fora da classe

regular sempre que se sinta que as necessidades pedagógicas e sociais do aluno não

estão a ser satisfeitas na classe regular. O conceito de inclusão deve olhar para a

criança como um todo com vista a um desenvolvimento integral (Bjorklund, 2012;

Correia, 2008).

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Não nos podemos esquecer que as vertentes – académica, socio emocional e

pessoal – devem ser desenvolvidas para proporcionar à criança a maximização de

todo o seu potencial e aprendizagens significativas que vão ao encontro das suas

necessidades e caraterísticas, respeitando o seu ritmo, o limite das suas capacidades

mas tendo em vista à otimização do seu potencial.

Correia (1997) defendeu um modelo de inclusão progressiva, baseada em

três níveis de inclusão, que se orientam por atividades que se desenvolvem em

ambiente escolar. Podemos considerar a inclusão total, moderada e limitada.

As atividades comparticipadas vão aumentando à medida que a gravidade do

problema vai diminuindo. Na inclusão total estão inseridos a maioria dos alunos com

NEE que participam em atividades académicas e sociais. Um número menor de

alunos, com situações moderadas, está no segundo nível de inclusão – inclusão

moderada. Participam em atividades sociais e em algumas académicas. O último

grupo de alunos, em que se incluem as situações severas, estão em inclusão limitada

e participam apenas em atividades sociais.

Segundo Correia (2005) uma escola inclusiva é aquela onde toda a criança é

respeitada e lhe são dadas ferramentas para aprender sem metas preestabelecidas,

não lhe é imposto um limite mas antes pelo contrário esse limite é desafiado para

que desenvolva ao máximo as suas capacidades. O principal objetivo da escola

inclusiva é acolher alunos com NEE nas escolas da sua residência e, sempre que

possível, integrados em turmas regulares.

Uma grande ajuda para os alunos com NEE são os docentes especializados

em Educação Especial que estão presentes em todas as escolas regulares e

trabalham em conjunto com os docentes da turma com vista à promoção do sucesso

escolar destes alunos. O ponto de partida são as caraterísticas das crianças e o plano

de atuação deve ser adaptado a cada caso em particular.

A educação inclusiva, no verdadeiro sentido da palavra, é sem qualquer

margem para dúvida um ideal a alcançar. Somos todos diferentes mas as nossas

diferenças complementam-nos e em conjunto podemos transformar a sociedade

num local inclusivo onde a tolerância e a cooperação sejam palavras de ordem e

onde a diversidade seja valorizada. A dimensão social da inclusão e os ganhos para

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as crianças com necessidades educativas especiais em termos de suporte social e

psicológico são imensuráveis.

O grande desafio que se coloca à sociedade, em geral, e à escola, em particular,

é encontrar soluções para uma escola que defenda os direitos destes alunos e

responda às suas necessidades promovendo o seu sucesso escolar. É preciso

assegurar um conjunto de pressupostos (legislação, apoios, recursos,…) para que a

inclusão não passe apenas pela colocação dos alunos com NEE nas salas de aula

regulares (Forest & Pearpoint, 1997). Todos têm direito a uma educação de

qualidade, dentro do princípio da igualdade de oportunidades, que os prepare para

um dia poderem participar ativamente na sociedade onde vão ser inseridos.

2.5 Educação especial ou educação inclusiva?

A Secretária Geral do Conselho Nacional de Educação, Berta Macedo, afirmou

no decorrer do ano de 1998 que toda a educação é especial, varia é a especialidade.

Não posso estar mais de acordo. As crianças e jovens têm interesses, capacidades e

necessidades educativas diferentes e portanto todos são especiais, cada um à sua

maneira (Candeias, 2009).

A educação inclusiva é um conceito muito abrangente que envolve a

educação para todos. Esta escola que se pretende inclusiva e preparadora para vida,

capaz de dar resposta a diferentes alunos, com necessidades diversas, por vezes

muito específicas necessita do apoio da educação especial para, com base nas

oportunidades presentes na lei, oferecer aos alunos que assim o necessitem

aprendizagens que façam sentido e promovam a sua integração primeiro na escola

e futuramente na sociedade (Forest & Pearpoint, 1997). Exigem-se mudanças a nível

do relacionamento pessoal e social e novas práticas pedagógicas. Só faz sentido falar

de uma escola inclusiva se esta noção sair do papel e fizer parte da vida de cada um

de nós refletindo-se nas nossas ações. A escola inclusiva é um desafio atual. Segundo

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Rodrigues (2003) a escola que durante anos trabalhou em termos de seleção, tem

de enfrentar o grande desafio de se transformar numa estrutura inclusiva.

A importância que se atribui à educação especial, de acordo com Kauffman

(2002), é um bom indicador da qualidade de um sistema de educação.

Quanto mais dificuldades tem o aluno mais recursos têm de estar envolvidos

no seu processo de ensino e aprendizagem e mais exigências se colocam a todos os

que trabalham com ele.

Quando se aplica o termo especial à educação estamos a falar dos recursos

que temos de disponibilizar para podermos responder eficazmente às dificuldades

dos alunos com NEE. O termo especial vai permitir elaborar um conjunto de

respostas educativas que visam responder eficazmente às necessidades específicas

de cada aluno e contribuir para maximizar o seu potencial.

A educação especial e a educação inclusiva não podem funcionar uma sem a

outra. Têm de caminhar lado a lado para que os alunos com NEE adquiram

aprendizagens essenciais que lhes deem alguma autonomia e facilitem a sua

integração na sociedade. A educação especial tem de ser inclusiva e só se pode falar

em educação especial, na verdadeira conceção da palavra, se esta trabalhar a

inclusão. Ensinar alunos com NEE numa escola onde o seu percurso escolar é

pensado, onde se trabalham competências pessoais e sociais onde se desenvolvem

competências para a vida e se trabalha a integração é contribuir para uma educação

inclusiva e promover o bem-estar de toda uma sociedade. Só desta forma se

cumprirá a missão da escola de formar indivíduos autónomos, minimamente

preparados para a resolução das situações do dia a dia e capazes de interagir na

sociedade global em que vivemos (Correia, 2008).

Page 35: Ensino da Matemática para a Vida Criação de cenários de ...€¦ · Ensino da Matemática para a Vida Criação de cenários de aprendizagem com recurso a robots DISSERTAÇÃO

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2.6 Objetivos da educação inclusiva

O grande objetivo da educação é facilitar a integração dos indivíduos na

sociedade. Educando desde o início uma criança com NEE em contato com outras

crianças sem problemas estamos a prepará-la para uma integração plena na

sociedade pois desta forma adquire competências que só podem ser conquistadas

na interação com os seus pares (Rodrigues, 2003).

Quando os alunos com NEE estão integrados numa turma do ensino regular

cabe ao professor promover um ambiente educativo que proporcione a todos

oportunidades de crescimento social e emocional. A experiência educativa só será

bem-sucedida e gratificante se o aluno se sentir bem no meio educativo. Este

ambiente positivo que revela afeto é essencial para a promoção da autoestima

(Correia, 2005; Fonseca, 1995). Só desta forma todos terão direito a uma educação

igual e de qualidade que respeite as suas necessidades e caraterísticas e facilite a

integração na vida ativa para que se movam na sociedade a que pertencem com a

maior autonomia e independência possíveis.

Do mesmo modo, é através da educação inclusiva que a criança normal

aprender a aceitar a diferença e a interagir com outras crianças NEE.

Com a educação inclusiva é possível trabalhar a igualdade de oportunidades.

A filosofia inclusiva obriga-nos a olhar para o aluno como um todo dando ênfase não

só aos aspetos académicos mas também aos aspetos sociais e da cidadania (Cruz,

2009).

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26

2.7 A formação de professores e a educação inclusiva

Os professores procuram dar resposta aos inúmeros desafios da inclusão

mas a sua formação de base nem sempre é suficiente para se alcançar a qualidade

educativa pretendida.

Pede-se muito ao professor do ensino regular quando se espera que este ao

mesmo tempo que prepara alunos para exame desenvolva estratégias e atividades

de ensino individualizado para o(s) aluno(s) do ensino especial, no mesmo ambiente

de sala de aula. Os professores do ensino regular só podem oferecer uma

educação/instrução adequadas às necessidades das crianças com o apoio de

especialistas. Devem receber informação acerca das limitações dos alunos bem

como dos objetivos estabelecidos para os mesmos de forma a adotarem estratégias

que respondam da melhor forma às suas necessidades físicas e educativas.

Faltam informações acerca de medidas ativas que os professores possam

tomar e que permitam compreender as necessidades das crianças com NEE que são

incluídas em classes regulares. Para se mudarem atitudes e mentalidades é

necessário facilitar informações (Bjorklund, 2012; Cruz, 2009). Só desta forma os

educadores se sentirão menos apreensivos quando se depararem com alunos

diferentes.

É difícil responder às necessidades educativas de alunos com NEE quando

muitas vezes não se conhece a verdadeira natureza do seu problema e as

implicações práticas no seu processo educativo contudo, a integração é, sem

margem de dúvida, benéfica. Permite aos alunos desenvolver valores, atitudes e

comportamentos importantes para viverem em sociedade.

É importante que os professores tenham conhecimento das problemáticas

dos alunos e das estratégias que podem utilizar para ultrapassar as dificuldades que

vão surgindo.

É urgente uma formação que dê algumas ferramentas e aumente as

competências dos professores ao responder a algumas questões que surgem

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27

naturalmente quando se põe em prática a educação inclusiva. Sem qualquer

preparação será mais difícil prestar o apoio adequado aos alunos (Lewis, 1999).

É necessário que os professores desenvolvam competências pessoais e

relacionais para serem capazes de trabalhar em equipa e cooperar com toda a

comunidade com vista ao desenvolvimento de um bom clima de aprendizagem onde

prevaleçam valores como a tolerância, a solidariedade e a interajuda. A colaboração

e cooperação entre os diferentes intervenientes numa escola inclusiva é essencial

(Rebocho, Saragoça, & Candeias, 2009). Por vezes precisamos de ajuda nas

alterações a fazer ao currículo ou na gestão de um clima social e emocional que

favoreça o desenvolvimento. O conceito de educação inclusiva não se pode restringir

a uma sala de aula mas a toda uma escola (Pierangelo & Jacoby, 1995). A legislação

faz apelo à diversificação de estratégias e a um ensino por níveis diferenciados que

tenham em conta o “caso concreto” de cada aluno mas as práticas mantêm-se

tradicionais e por vezes, por desconhecimento, o apoio ao aluno serve para lhe dar

mais do mesmo.

Normalmente não temos qualquer conhecimento acerca das variadas NEE e

sentimos muitas dúvidas quanto à eficácia das nossas estratégias. Não existem

receitas mas aprende-se muito com a troca de experiências, partilha de

conhecimentos e debate de casos concretos.

Só um professor que possui competências que lhe permitam ultrapassar as

conceções tradicionais da educação e da aprendizagem pode ser um construtor de

contextos de aprendizagem impregnados de qualidade educativa e capazes de

desenvolver as potencialidades das crianças. Os professores têm de dar atenção às

necessidades de todos os alunos nas suas diferenças e particularidades tentando

responder a cada um individualmente.

A abordagem dos alunos com NEE deve ser centrada no seu potencial e não

apenas nas suas dificuldades (Candeias, 2009). Os professores têm de estar

despertos para as diferentes vertentes do conceito de ensino especial: o

desenvolvimento da criança e a necessária adequação curricular bem como as

indispensáveis adaptações do programa de acordo com as diferentes caraterísticas

de cada aluno.

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De acordo com o Despacho Conjunto nº 105/97, de 30 de maio, o professor

do apoio tem de ter uma formação especializada e conhecimentos que lhe permitam

ser um implementador de mudanças que facilitem o desenvolvimento de uma

verdadeira escola inclusiva onde reine a igualdade. É preciso valorizar as

oportunidades de formação e desenvolvimento profissional.

2.8 O Currículo Específico Individual e a Matemática

Funcional / Matemática para a Vida

O artigo 16º, no nº 2, alínea e), do Decreto – Lei nº 3/2008, prevê a elaboração

do Currículo Específico Individual (CEI) que não pode ser implementado num

ambiente de sala de aula. Na região, a medida educativa Currículo Específico

Individual está contemplada no Decreto Legislativo Regional nº 33/2009/M,

nomeadamente no artigo 28º, ponto 2, alínea e). A Portaria nº 1B/2013 regula o

ensino de alunos com CEI em processo de transição para a vida ativa e veio alterar

a matriz curricular dos alunos com CEI.

Para estes alunos, que apresentam défice cognitivo, com autonomia nas

deslocações, alimentação e higiene pessoal, foi criada a Sala de Aprendizagens

Funcionais (SAF). Os alunos estão integrados numa turma regular onde frequentam

algumas disciplinas e em alguns tempos letivos vão para a SAF onde desenvolvem

as competências constantes do CEI que estão de acordo com as suas necessidades e

visam uma melhor integração na sociedade.

O CEI prevê modificações consideráveis no currículo comum das quais

constam a introdução, substituição e ou eliminação de objetivos e conteúdos, de

acordo com o nível de funcionalidade do aluno. A prioridade é desenvolvimento de

atividades de cariz funcional centradas no contexto de vida, na comunicação e na

organização do processo de transição para a vida pós–escolar. Os alunos de CEI

possuem disciplinas como a Matemática para a Vida, Atividades Socialmente Úteis,

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Experiências Laborais e Participação Cívica entre outras de cariz mais prático e

funcional.

O objetivo é a construção da cidadania e o desenvolvimento individual de cada

aluno, promovendo a autonomia pessoal e social (Bauke, Seegers, Ruijssenaars &

Vermeer, 2004). É necessário desenvolver atividades com aplicabilidade e

centradas nos contextos de vida dos alunos que devem ser realizadas, sempre que

possível, em contextos reais para que os alunos lhes atribuam significado.

2.9 As Necessidades Educativas Especiais e a Matemática

A investigação na área da Matemática com alunos com NEE não é recente. Têm

sido feitos vários estudos com alunos com défice cognitivo, com Síndrome de Down,

cegos e de diversas instituições de educação especial. Todas estas observações

pretendem compreender de que forma podemos contribuir para ajudar os alunos

com NEE a alcançarem o sucesso educativo, promovendo a igualdade de

oportunidades e lutando pela construção de uma sociedade cada vez mais inclusiva

onde estes alunos, quando adultos, possam estar integrados pois desenvolveram

capacidades pessoais e sociais que lhes permitem estar preparados para a vida em

sociedade.

Uma investigação sobre os alunos cegos nas aulas de Matemática foi feita por

Nuno Santos, Cláudia Ventura e Margarida César, docentes da Universidade de

Lisboa, no decorrer do ano de 2005. Referiram a importância de proporcionarmos a

todos os alunos, independentemente da sua condição, experiências de

aprendizagem que promovam competências essenciais para a sua integração na

sociedade e constataram a importância da utilização de materiais manipulativos que

podem fazer toda a diferença na capacidade de tranformar limitações em

potencialidades.

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Outro estudo, realizado por Cristina Santos, Cláudia Ventura e Margarida César

(2008) numa instituição de educação especial observou as práticas utilizadas pelos

professores na planificação e na realização de atividades na área da Matemática.

Constataram que o desenvolvimento de capacidades, na área da Matemática, foi

assente na valorização dos saberes que os alunos já possuíam e nos seus pontos de

interesse pessoais bem como na interação entre os elementos do grupo.

As aprendizagens são tão mais significativas quanto mais os alunos as vivenciarem

e se envolverem.

Martins (2011) apresentou um estudo sobre a resolução de problemas

multiplicativos no âmbito da área curricular da Matemática em alunos considerados

com défice cognitivo. Ao longo da investigação explorou diferentes procedimentos

a adotar para otimizar as operações cognitivas de alunos com défice cognitivo, na

resolução de situações problemáticas multiplicativas. Os alunos foram envolvidos

nas tarefas e, enquanto procuravam a solução, exploraram e desenvolveram os seus

conhecimentos. Constatou a importância do papel do professor na orientação dos

alunos na descoberta do saber e confirmou a importância da promoção de

estratégias centradas no reforço positivo e da autoconfiança.

Anabela Silva (2012) investigou as práticas educativas inclusivas da

aprendizagem da Matemática, numa sala de aprendizagens funcionais para

compreender a importância das aprendizagens funcionais, na área da Matemática,

para a inclusão de alunos com Síndrome de Down. A autora investigou de que forma

as atividades funcionais e todas as outras tarefas de cariz funcional que estão

associadas podem contribuir para o crescimento escolar e inclusão dos alunos com

Síndrome de Down. Concluiu que as atividades funcionais ajudam os alunos a

desenvolver competências matemáticas mas também a aumentam a autonomia, o

respeito pelas opiniões dos colegas e a crítica . Estas atividades de cariz funcional só

são exequíveis em salas de atividades funcionais com um acréscimo de meios

humanos e materiais.

Na Região Autónoma da Madeira, Pereira (2013) realizou um estudo onde

pretendia comprender as perceções dos professores da região acerca do potencial

das TIC na evolução da aprendizagem de crianças com discalculia. Refere a

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importância do aluno se identificar com o ensino e poder participar ativamente na

sua construção. Os alunos devem utilizar a sua experiência e o seu conhecimento e

é ao professor que cabe a tarefa de, com diferentes recuros educativos, tornar a

aprendizagem da Matemática fascinante procurando estratégias que lhe permitam

superar as suas dificuldades. Cabe ao professor direcionar os caminhos, dar as pistas

e contribuir para o desenvolvimento pessoal e social dos alunos. É nosso dever

ajudar os alunos no desenvolvimento do espírito crítico para que se tornem

responsáveis e conhecedores dos seus deveres e dos seus direitos. Na opinião desta

autora ainda temos um longo caminho a percorrer com vista à inovação e aplicação

de recursos TIC, no ensino da Matemática.

A investigação que tem sido feita na área da Matemática com a alunos com NEE

permite-nos encontrar caminhos alternativos que facilitem a inclusão destes alunos

na escola com vista à integração plena na sociedade. A educação Matemática dos

alunos com NEE não deve ter menor qualidade mas debater-se pela superação de

dificuldades.

2.10 As tecnologias na educação especial

As exigências dos alunos com NEE são maiores que as dos outros mas a

educação especial não se pode resumir a uma vertente mais simplificada do ensino

tradicional andando a reboque deste. As soluções para os problemas têm de ser

diretamente proporcionais à sua dimensão. Inovar é permitir que as tecnologias

facilitem a aprendizagem dos nossos alunos, tenham eles NEE ou não (Nwabude,

2012).

Os computadores são ferramentas com um grande potencial desde que bem

explorados. Podem ser utilizados tanto para ensinar como para promover a

aprendizagem no sentido em que um aluno, quando necessita de adquirir ou

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desenvolver um determinado conceito para poder continuar a usar a tecnologia,

está a ser incentivado a aprender.

As tecnologias não solucionam os problemas da educação e só a combinação

de recursos humanos e materiais torna a aprendizagem efetiva. As tecnologias

educacionais são a face da complexidade dos processos pedagógicos. A procura por

soluções é uma realidade diária de todos os docentes e principalmente daqueles que

lidam com alunos com dificuldades e para quem a escola faz pouco sentido ou não

responde às suas verdadeiras necessidades (Peltenburg, Heuvel-Panhuizen

& Robitzsch, 2010).

O desafio que se coloca atualmente é a integração de todas as ferramentas de

que dispomos para se criarem práticas capazes de motivar os alunos, ajudando-os

na descoberta e facilitando a aprendizagem e a consolidação de conhecimentos.

Os alunos com NEE têm baixa autoestima por não estarem plenamente

integrados e sentem receio de participar ativamente nas aulas. A tecnologia auxilia

na motivação e contribui para a socialização e consequente inclusão social. O seu

uso no ensino especial proporciona aos alunos estímulos para desenvolver aptidões

intelectuais, ajudando-os a pensar e a tomar decisões. A maioria dos alunos mostra

mais interesse em aprender quando são participantes ativos na descoberta.

Promove-se a cooperação, o diálogo e a troca de ideias. O processo é conduzido ao

ritmo de cada um. O uso das tecnologias encoraja a participação ativa, levando-os à

descoberta das suas potencialidades e auxiliando o seu contínuo desenvolvimento

intelectual (Resnick, 2002). Estes desenvolvem capacidades de investigação e de

lidar de forma crítica com a informação aumentando a iniciativa, a criatividade e a

autoconfiança.

Ao professor cabe a tarefa de proporcionar o acesso à informação e aos

recursos, ensinando a investigar, selecionar, analisar e relacionar. O seu papel passa

a ser de orientação na procura do saber e do conhecimento sem nunca esquecer os

seus objetivos. O professor detentor do saber que apenas transmitia informação

deixa de fazer qualquer sentido.

As tecnologias educativas, quando bem utilizadas, intensificam o processo de

ensino-aprendizagem e servem muitas vezes de suporte dos conhecimentos.

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São recursos pedagógicos e meios de motivação capazes de ajudar na socialização e

inclusão. Através das tecnologias o acesso ao conhecimento e à aprendizagem é

facilitado (Resnick, 2002).

Em Portugal, a nível do ensino, o uso e a investigação com Tecnologias de

Informação e Comunicação (TIC) estão muitos desenvolvidos. O mesmo não se pode

dizer do uso dos robots. Na minha investigação tomei conhecimento de alguns

estudos que dão conta de experiências de utilização de robots na sala de aula, mas

nenhum destes estudos visava diretamente alunos com NEE.

Rocha (2006) apresentou um estudo onde destacou a importância dos robots

na aprendizagem de técnicas de programação, uma vez que os alunos podem testar,

em tempo real, o programa desenvolvido. Desta forma é possível, através da

experimentação, corrigir erros e antecipar respostas.

Um outro estudo foi apresentado por Oliveira, Fernandes e Fermé (2007) e

visou analisar a importância dos robots na aprendizagem da Matemática, mais

precisamente das funções.

A utilização dos robots em sala de aula está ainda pouco estudada e os

primeiros passos neste sentido foram dados na Universidade da Madeira que tem

sido uma grande impulsionadora deste estudo e a responsável pela introdução deste

elemento nas escolas através do Projeto DROIDE. Segundo Santos, Fermé e

Fernandes (2007) o uso de robots na aula de Matemática promove a discussão entre

alunos e entre estes e o professor bem como a participação e a colaboração na

resolução das tarefas propostas. Quando se assiste a uma maior participação dos

alunos a qualidade do que estes aprendem também aumenta.

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3 Metodologia de investigação

Na investigação educacional as opções metodológicas a utilizar são variadas.

A escolha deve fazer-se em função da natureza do problema que se pretende estudar.

A metodologia de investigação envolve todo o processo usado para orientar a

investigação e esclarece a forma como todo o trabalho foi conduzido até se atingir o

objeto estudado.

O método surge da necessidade de encontrar a melhor forma de alcançar o

objetivo do estudo proposto.

3.1 Natureza do estudo

Esta investigação foi feita em contexto natural segundo uma metodologia

qualitativa. Comecei o meu estudo com base nos meus conhecimentos e na minha

experiência. Participei nas atividades assumindo um papel integrante no grupo, pois

a investigação qualitativa obriga a uma partilha com as pessoas que são objeto de

investigação. Só desta forma é possível extrair informações que sejam úteis e

suscetíveis de uma interpretação mais profunda.

Segundo Denzin & Lincoln (1994) os métodos qualitativos são muito ricos e

permitem analisar fenómenos que não podem ser descritos numericamente.

A investigação qualitativa, em educação, é frequentemente designada por

naturalista, uma vez que o investigador participa naturalmente na investigação e

recolhe dados descritivos resultantes da observação das pessoas e dos seus

comportamentos naturais através da interação.

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A investigação qualitativa não tenta excluir a interação do investigador mas

pelo contrário olha para ela como uma ajuda na produção do saber. Sem esta

interação não lhe seria possível fazer a recolha dos dados necessários à investigação

Flick (2005).

É uma preocupação dos investigadores qualitativos os efeitos que a

subjetividade pode ter nos dados que produzem (LeCompte, 1987). Esta

preocupação não tem grande razão de ser uma vez que as descrições detalhadas dos

acontecimentos ajudam a criar teoria, descrição e compreensão que dão utilidade a

qualquer estudo.

Não é possível eliminar todos os efeitos que um investigador produz num

sujeito mas reconhecer essas influências pode ajudar a interpretar os resultados.

Não nos podemos esquecer que, à medida que o tempo passa, a relação com os

sujeitos se torna menos formal.

A importância da investigação qualitativa no estudo de questões

educacionais é inquestionável. É utilizada na investigação pedagógica com o

objetivo de otimizar o que se faz pois os professores que agem como investigadores

ao mesmo tempo que dão as aulas estão a observar-se a si próprios e ganham uma

visão mais ampla pois, se por um lado entram no mundo do sujeito, por outro lado

ficam de fora registando o que vai acontecendo e aprendendo o modo de pensar do

sujeito.

A investigação qualitativa é descritiva e está mais interessada no processo do

que nos resultados. Nesta investigação envolvi-me no mundo das alunas para poder

interagir com elas de forma a conhecer a forma como aprendem. Trabalhei com

descrições, comparações e interpretações tentando atribuir sentido ou interpretar

os acontecimentos segundo a perspetiva das alunas.

O meu grande objetivo era compreender como alunos com NEE aprendem a

Matemática para a Vida. Tentei observar comportamentos para perceber de que

forma estes alunos constroem significados e o que comportam esses significados.

Perante este problema a investigação qualitativa foi a que se revelou mais adequada.

O meu foco de interesse foi a aprendizagem das duas alunas que observei no seu

ambiente natural para compreender melhor as ações e a forma como as coisas

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acontecem. Como método de recolha de dados recorri à observação participante

com o objetivo de não separar os acontecimentos do seu contexto e evitar que

perdessem significado.

3.2 Caracterização das alunas

A aluna de 8º ano tem como diagnóstico Funcionamento Intelectual Muito

Inferior conduzindo, entre outras coisas, a um ritmo de aprendizagem muito lento,

com avanços e retrocessos constantes. Apresenta dificuldades ao nível da

concetualização, conhecimentos gerais, aritmética, organização percetiva,

visualização espacial e coordenação visuo-motora. Demonstra, ainda, dificuldades

na compreensão e interpretação de situações práticas decorrentes do quotidiano.

Apresenta ainda dificuldades em cumprir normas e regras de socialização. Sofre de

epilepsia, o que não facilita o seu processo de ensino-aprendizagem. Para além disso,

tem um problema de visão - hipermetropia associado a astigmatismo e nistagmos.

Os nistagmos são oscilações repetidas e involuntárias dos olhos em algumas

posições. Normalmente, para se conseguir ver uma imagem são executados dois

tipos de funções: uma fixa a imagem e outra permite-nos visualizá-la. No caso desta

aluna isso não se verifica pois ela não consegue executar a função de estabilização

da imagem. Assim sendo, a imagem que visualiza está sempre em movimento,

dificultando imenso qualquer tipo de atividade seja ela do quotidiano ou escolar.

A nível de posicionamentos é uma criança que apresenta, por vezes, um

padrão muito fechado, ao nível da flexão do tronco e membros superiores, criando

posturas patológicas nos vários posicionamentos que adquire (sentada e em pé).

A motricidade fina está comprometida, com tremores acentuados quando lhe

são apresentadas atividades mais precisas. Esta descoordenação dificulta a

orientação de movimentos quer ao nível da escrita (caligrafia), quer ao nível das

atividades de vida diária que exijam maior precisão. A simples tarefa de copiar

torna-se bastante difícil de concretizar e muito cansativa para a aluna. Primeiro

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porque tem de fazer um esforço suplementar para estabilizar a imagem e segundo

porque os seus tremores dificultam a própria tarefa.

A aluna de 7º ano tem Síndrome de Down, uma das síndromes mais comuns

entre os seres humanos que é causada pela existência de três cromossomos 21 (um

a mais do que o normal, trissomia do 21).

Tal como a maioria das pessoas com síndrome de Down a aluna é menor que

os seus pares e apresenta um desenvolvimento físico e mental mais lento com

dificuldades na linguagem.

Ostenta as características físicas das crianças com Síndrome de Down entre

elas: achatamento da parte de trás da cabeça, inclinação das fendas palpebrais,

língua proeminente, ponte nasal achatada, orelhas ligeiramente menores, boca

pequena, tónus muscular diminuído e mãos e pés pequenos.

Esta aluna, se tivesse sido alvo de uma intervenção atempada, ininterrupta e

apropriada, poderia estar mais desenvolvida e ter adquirido mais competências em

diversas áreas. O facto de ser órfã de mãe e do seu pai ter casado novamente faz com

passe muito tempo na casa da avó que, devido à idade avançada, a protege e pouco

estimula. Está provado que o desenvolvimento das crianças com síndrome de Down

está relacionado com os estímulos precoces, com o incentivo das pessoas com quem

convive diariamente e com o enriquecimento do ambiente no qual está inserida.

A aluna gosta de estar em casa da avó, com quem passa grande parte da semana, mas

a idade avançada da avó não lhe permite apoiar e estimular a neta da melhor forma.

Está bem adaptada à escola onde é acarinhada por todos. Passa muito tempo a

conversar com as auxiliares da ação educativa afastando-se um pouco dos seus

colegas de turma. Contudo, considero que a aluna é aceite e apoiada pelos seus pares

e pelos adultos que a rodeiam.

As maiores dificuldades desta aluna estão na aquisição, relacionação e

aplicação de conhecimentos bem como na apreensão, memorização e compreensão.

Consegue fazer a análise, síntese e avaliação de situações desde que não seja

necessário raciocínio lógico e abstrato. Domina o vocabulário fundamental mas

apresenta grandes dificuldades na expressão oral e escrita. Tem dificuldades na

organização de materiais e a ausência do material necessário para as atividades

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letivas é muito comum. Apresenta capacidade em reter o que transmitido mas é

necessário reforçar e consolidar as aprendizagens pois é muito distraída e tem

dificuldades de concentração. Não revela autonomia nem iniciativa.

Uma educação adequada e estimulante é benéfica para todos e os alunos com

síndrome de Down não são diferentes. Além das competências escolares é na escola

que se processa o desenvolvimento socio afetivo e o processo de socialização.

O convívio com a turma tem ajudado esta aluna a desenvolver as suas capacidades.

Nota-se uma evolução na socialização com os colegas da sua idade.

Em consonância com a legislação, e por proposta dos Conselhos de Turma do

ano anterior, da docente de Educação Especial e dos Encarregados de Educação, as

alunas, no presente ano letivo, usufruem de aulas individualizadas de Língua

Portuguesa e de Matemática, com um cariz mais funcional priviligiando o

desenvolvimento de competências que promovam a sua autonomia pessoal e social.

Paralelamente, beneficiam de Apoio Especializado da Educação Especial, em

conformidade com a Legislação.

Estas aulas individualizadas de Língua Portuguesa e Matemática com um

cariz funcional têm-se revelado de suma importância para as alunas que têm

problemas que afetam negativamente a sua realização escolar e pessoal.

3.3 Criação do cenário de aprendizagem

A criação de cenários é algo que todos os professores fazem, de forma mais

ou menos consciente, quando preparam as suas aulas. Tentamos prever um

conjunto de situações que teremos de criar para envolver os alunos na

aprendizagem. Um cenário é uma história sobre pessoas e as atividades por si

desenvolvidas com o objetivo de facilitar o processo de ensino-aprendizagem

(Fernandes, et al., 2013).

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Segundo Carroll (2000) cenários são histórias sobre pessoas e as atividades

que elas desenvolvem. Todos os cenários têm um enredo e incluem sequências de

ações e eventos que os intervenientes fazem e que lhes vão sucedendo. Trata-se de

uma situação hipotética de ensino-aprendizagem composta por diversos elementos

decorrentes do contexto que deve ter em conta a fase de preparação, de realização

e de integração. Dependendo do contexto, o cenário de aprendizagem é o conjunto

de ações que o aluno deverá realizar para desenvolver uma ou mais competências.

Os cenários são flexíveis e estão sujeitos a alterações.

De acordo com Wollenberg, Edmunds e Bucke (2000) com um cenário de

aprendizagem pretende-se ajudar as pessoas a modificar maneiras de pensar as

situações de forma a serem capazes de enfrentar melhor as incertezas e a perceber

as consequências das suas decisões.

Qualquer cenário de aprendizagem pode ser visto como uma atividade que

possui um objeto que constitui o seu motivo que deve estar subordinado à

satisfação de uma necessidade. Os professores e os alunos devem estar despertos

para identificar as suas necessidades de modo a criar motivos e definir novos

objetos orientadores das suas atividades. É necessário introduzir nos cenários

mecanismos de reflexão propícios à partilha de dificuldades e à procura de soluções

conjuntas de forma a analisar, perceber e discutir problemas de forma a procurar

soluções.

A ideia da construção de uma rua onde se deslocaria o robot teve início com

um diálogo acerca dos interesses das alunas e do conhecimento prévio das suas

dificuldades em atribuir significados e interiorizar alguns conceitos.

Estas alunas têm muita imaginação e começaram por pensar em tudo o que

encontravam quando se deslocavam para a escola. Referiram as casas, os jardins, o

parque infantil, as árvores, os carros. Como já haviamos trabalhado o tema dos

poliedros em anos anteriores e feito uma ficha de diagnóstico, procurei fazer a

associação entre cada um destes elementos e os sólidos geométricos que tínhamos

de trabalhar. Seguiu-se um diálogo acerca dos objetos que temos à nossa disposição,

que se assemelham a poliedros e não poliedros, e que nos poderiam ser úteis na

construção do nosso projeto. Elas chegaram à conclusão que poderiam utilizar

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prismas retangulares para construir as casas e cones para as árvores. De maneira

natural os conteúdos que pretendia trabalhar, e muitos outros, foram surgindo.

Para completar o cenário (Anexo B) queriam introduzir veículos que se

deslocariam na rua. Sugeri então que se utilizasse um robot. Elas ficaram muito

curiosas e quiseram saber como era um robot. Apresentei-lhes o robot e passaram

a explorá-lo para perceber como se deslocava. Desta interação surgiu a ideia de que

o robot poderia ser um autocarro e fazer paragens para a entrada e saída de

passageiros. Perguntei-lhes quem gostaria de levar no autocarro. Como gostam

muito de conversar acerca de personagens de telenovelas e outros artistas da

televisão, logo surgiu como possíveis passageiros os seu artistas preferidos. Tive de

saber quem eram para poder interagir com elas.

Como as duas alunas têm aulas em separado foi necessário combinar alguns

dias em que nos pudéssemos reunir em conjunto. Aproveitando esta situação e

depois de combinado o dia, as alunas escreveram uma carta/convite, que fomos

enviar aos correios, onde se convidavam uma à outra para participar na aplicação

final do projeto. Foi necessário fazer pagamentos e trocos pois além de pagarem o

envio da carta aproveitámos para comprar uma revista de onde selecionámos os

passageiros do autocarro e aproveitei para trabalhar o dinheiro.

A partir deste momento queriam que o autocarro andasse e começamos a

aprofundar a noção de tempo e as horas propriamente ditas. Trabalharam a

interpretação de horários e passaram a compreender a diferença entre as horas, os

minutos e os segundos.

Todo o trabalho desenvolvido foi muito importante para estas alunas que

estavam a trabalhar com vista a alcançar objetivos comuns. Reconheciam-se uma na

outra e a motivação que revelavam era diferente e contagiante.

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41

3.4 Recolha dos dados

Segundo Boutin (2008) o investigador, quando se envolve no mundo dos

sujeitos a investigar, alcança um nível de compreensão elevado das situações que

não poderia alcançar se não participasse ativamente na vida coletiva. O método

qualitativo auxilia os educadores a se tornarem mais sensíveis a fatores que

influenciam o seu trabalho e a interação com os outros.

A recolha de dados foi feita entre os meses de novembro de 2013 e março de

2014 em ambiente de sala de aula. O estudo baseou-se na observação e a maior parte

dos dados recolhidos são descritivos. Fui fazendo descrições, registos de conversas

e diálogos e tentando perceber comportamentos enquanto recolhia dados no

contacto direto com as alunas que se encontram no seu próprio ambiente de sala de

aula. Com estes dados e apoiada na literatura construi o meu diário de bordo onde

tomei notas detalhadas e precisas, coloquei os meus pareceres sobre os comentários

das alunas e as suas respostas que se revelaram úteis para a compreensão de

algumas situações.

As gravações de áudio e vídeo das aulas foram muito importantes porque

possibilitaram um olhar mais atento sobre aspetos relevantes que passariam

desapercebidos sem essas gravações. Permitiram refletir sobre os acontecimentos e

verificar a construção da aprendizagem destas alunas e também da minha atuação

em sala de aula.

Antes da construção do cenário havia aplicado uma ficha diagnóstica

(Anexo A) sobre os polígonos e sólidos geométricos para poder ter um termo de

comparação quando terminasse a criação do projeto. Embora não precisasse de

termos de comparação queria ter algo de concreto para dar a conhecer aos pais e à

comunidade escolar. Como trabalhei esta ficha foi natural que as alunas associassem

alguns sólidos geométricos a objetos do dia a dia e acabassem por sugerir que as

árvores fossem cones, por exemplo.

Durante esta investigação foram trabalhados diversos conteúdos com foco na

geometria, nomeadamente os polígonos e a sua classificação quanto ao número de

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lados. Pedi às alunas que identificassem, em objetos variados e em modelos

geométricos, figuras planas: quadrado, retângulo, triângulo e círculo. Os termos

prisma, pirâmide, cilindro, cone e esfera e o vocabulário relativo a sólidos

geométricos (face, aresta, vértice, base, face lateral) passaram a ser utilizados

naturalmente, pelas alunas, o que antes não se verificava.

Foram trazendo caixas de cartão e construiram, em ambiente de sala de aula,

várias casas com a forma sólidos geométricos. Utilizando cartolinas fizeram árvores,

piscinas, bancos de jardim…. Tieram necessidade de efetuar medições, e então

começámos a trabalhar as medidas de comprimento. A linguagem própria foi sendo

introduzida de uma maneira informal por meio de expressões: é “maior” / é mais

“pequeno”; é mais “comprido” / é mais “curto” e para verificar recorreram a diversos

instrumentos de medida – fitas métricas (de vários tipos) e réguas. Mediram

comprimentos de objetos, das próprias divisões e de elementos da sala de aula.

Para desenvolver a noção de tempo utilizaram instrumentos da vida corrente

relacionados com o mesmo: relógios, horários de autocarros e programação

televisiva. O robot, que foi transformado no autocarro, que se deslocava na rua,

tendo de fazer paragens com determinada duração, foi a principal motivação das

alunas para aprenderem a utilidade prática das unidades de tempo. Foram feitas

várias experiências relativamente à duração do percurso e alterações de modo a que

o robot fizesse o percurso pretendido.

O facto de serem as alunas as criadoras de tudo e das decisões passarem por

elas fez com que não se esquecessem dos conceitos e das noções trabalhadas.

3.5 Análise dos dados

De acordo com Bogdan & Bilken (1994) os investigadores dão extrema

importância aos significados pois tentam compreender as experiências na

perspetiva das pessoas em estudo. Pretendem perceber de que forma as pessoas

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constroem significados e o que comportam esses significados com o objetivo de

otimizar o seu trabalho. As formas de investigação qualitativa podem ser muito

distintas mas todas têm como objetivo compreender os sujeitos com base nos seus

pontos de vista. Ao investigador qualitativo interessam as diferentes realidades e

não apenas uma realidade.

Segundo Boutin (2008), ao observar os indivíduos no seu ambiente natural o

investigador pode compreender melhor as ações e a forma como as coisas

acontecem. Estas não podem ser separadas do seu contexto para que não percam

significado. O investigador participa nas atividades assumindo um papel integrante

no grupo. Tem acesso às ideias dos que investiga e vive as mesmas situações que

estes compreendendo um fenómeno que lhe é exterior.

Após a recolha de dados, analisei as gravações e os registos das aulas de uma

forma descritiva. À medida que os dados recolhidos se foram reunindo as conclusões

foram-se tornando mais evidentes.

Na análise dos dados tentei centrar a minha investigação na descoberta não

de um mas de vários aspetos relevantes para perceber de que forma as alunas

estavam a construir a sua aprendizagem e como poderia contribuir para ser um

elemento impulsionador e facilitador dessas mesmas aprendizagens.

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44

4 Análise e interpretação dos dados

A análise dos dados foi feita com base nas gravações vídeo e áudio, nos

registos das aulas e no material elaborado pelas alunas.

A construção e implementação do cenário foi um trabalho de várias aulas que

se iniciou com um diálogo, onde pude aferir os interesses das alunas, e perceber até

que ponto estariam interessadas e motivadas para este tipo de projeto. Decidiram

pela construção de uma rua. Construiriam casas e teriam um veículo a percorrê-la.

Quando lhes disse que trabalhariam em conjunto ficaram entusiasmadas. Começou

como que uma competição saudável. Ambas queriam mostrar o seu melhor trabalho

e apresentar a casa mais bonita e a árvore mais alta.

Prof.: Para construirmos a nossa rua temos de pensar em tudo aquilo que

encontramos quando andamos pela cidade.

Aluna de 8º ano: Casas, carros, jardins, cafés, parque infantil…

Prof.: Muito bem. E no jardim, o que temos?

Aluna de 8º ano: Árvores, bancos, relva.

Prof.: Temos de trazer algum material de casa que possa ser reciclado e nos

ajude a elaborar este trabalho. Lembra-se de alguma coisa?

Aluna de 8º ano: Caixas de sapatos e de cereais?

Prof.: Sim, muito bem. Mas existem outras coisas que não podemos fazer

utilizando material reciclado e que vamos ter de fazer por nós próprias, com

cartolina. O que acha?

Aluna de 8º ano: Não sei, parece difícil….

Prof.: Eu estou aqui para ajudar.

Aluna de 8º ano: E a xxxxxx (aluna de 7º ano) também vai fazer?

Prof.: Sim, cada uma vai fazer o seu trabalho e depois juntamos tudo para

termos uma rua bonita.

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Aluna de 8º ano: Vai ser fixe.

Antes de começarem a construir a rua onde se desenrolaria a atividade final

as alunas fizeram uma ficha de diagnóstico com a qual pretendia verificar

conhecimentos anteriores.

Não conheciam o nome dos sólidos geométricos e só com ajuda foram

conseguindo preencher a tabela da ficha de diagnóstico. Revelaram dificuldade em

associar os sólidos geométricos a objetos de uso corrente como se pode verificar

pela Figura 4.1. Deixaram a tabela muito incompleta apesar de terem sido

informadas de que todos os objetos tinham correspondência.

Na hora de fazer corresponder as planificações aos respetivos sólidos as

alunas não faziam ideia do que era uma planificação e pediram a minha colaboração.

Dei uma explicação breve e algumas sugestões de modo a tentar ajudar mas não

foram capazes de aplicar corretamente como elucida a Figura 4.2.

Figura 4.1: Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 1 da ficha de diagnóstico.

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46

Quando foi necessário preencher os espaços em branco com os elementos

dos sólidos geométricos observei que as alunas ocuparam os espaços sem pensar

naquilo que estavam a fazer. Não sabiam identificar os elementos e fizeram o

preenchimento rapidamente. A Figura 4.3 permite-nos constatar esse facto.

Quando lhes pedi que constassem o número de figuras planas que

observavam sentiram muitas dificuldades em diferenciar os retângulos dos

Figura 4.2: Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 2 da ficha de diagnóstico.

Figura 4.3: Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 4 da ficha de diagnóstico.

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quadrados. A distinção entre triângulos e círculos revelou-se fácil como se verifica

na Figura 4.4.

A aluna de 7º ano teve mais facilidade em realizar a ficha de diagnóstico.

O facto de saber ler e escrever dá-lhe mais autonomia e observei que conhecia já

algum vocabulário relativo aos sólidos geométricos.

A aluna de 8º ano depende totalmente de mim para fazer a leitura dos

exercícios e escrever as respostas. Tem uma linguagem mais limitada e verifiquei

que a maioria dos termos utilizados na ficha eram novidade.

Qualquer uma delas revelou grande dificuldade em identificar os sólidos

geométricos, atribuir-lhes o nome e associá-los à sua planificação.

Queriam começar a construção da rua e questionavam-me por diversas vezes

se já poderiam trazer o material para começarmos a trabalhar. O meu objetivo inicial

era consolidar conhecimentos e ajudar as alunas a perceberem a distinção entre

quadrados e retângulos. Comecei por falar da rua e trabalhar estes conceitos como

se pode ver no diálogo seguinte.

Prof.: As caixas de cereais e de sapatos que vamos utilizar são parecidas a um

sólido geométrico. Sabe como se chama esse sólido?

Aluna de 7º ano: [Silêncio] Não sei.

Prof.: Que forma têm as faces de uma caixa de cereais? Que polígonos são as

faces de uma caixa de cereais?

Aluna de 7º ano: Quadrados.

Figura 4.4: Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 6 da ficha de diagnóstico.

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Prof.: Porquê?

Aluna de 7º ano: Não sei.

Prof.: [desenha um retângulo e um quadrado] Qual é a diferença?

Aluna de 7º ano: Não sei, são iguais.

Prof.: Vamos medir os lados contando as quadrículas do caderno. [Contamos

quantos quadradinhos media cada lado do retângulo e do quadrado]

Aluna de 7º ano: Ah! Um tem os lados todos com as mesmas medidas.

Prof.: Esse polígono chama-se quadrado.

Aluna de 7º ano: E o outro? É o retângulo?

Prof.: Sim, tem os lados iguais dois a dois.

Continuámos a trabalhar as diferenças entre quadrados e retângulos e com o

passar do tempo as alunas consolidaram estes conceitos. Passaram a ser mais

críticas no que diz respeito à classificação dos polígonos e os conhecimentos

adquiridos ajudaram a distingui-los mesmo quando a diferenciação não era clara.

Embora não demonstrassem grandes dificuldades em distinguir os

triângulos dos restantes polígonos, continuámos a trabalhar as suas classificações

falando dos triângulos para se evitar que mais à frente surgissem dúvidas

relativamente a este conceito.

Prof.: [Desenha um triângulo] E este polígono, como se chama?

Aluna de 7º ano: Triângulo.

Prof.: Porquê?

Aluna de 7ºano: Tem três lados iguais.

Prof.: Não têm de ser necessariamente iguais. Para ser um triângulo tem de

ter três lados mas esses lados até podem ser todos diferentes.

Desenhei diversos triângulos: isósceles, escalenos e equiláteros para

justificar a minha afirmação e a aluna poder visualizar o que se estava a falar. Dando

continuidade à aula desenhei um círculo.

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Prof.: E aqui, o que temos?

Aluna de 7º ano: Uma bola.

Prof.: Não é uma bola, embora seja circular está representado no plano.

A bola que está a considerar tem três dimensões e chama-se esfera. O que

temos aqui representado é um círculo.

Aluna de 7º ano: Ah! Pensei que era tudo igual.

Prof.: Não, existem diferenças. Umas figuras estão representadas no plano e

outras no espaço. E então, agora já sabe que figuras geométricas são as faces

das caixas de cereais?

Aluna de 7ºano: Retângulos.

Prof.: Muito bem. Então as bases das caixas de cereais são que polígonos?

Aluna de 7º ano: Também são retângulos.

Prof.: As caixas de cereais são prismas retangulares. São sólidos que têm

duas bases e essas bases são retângulos.

Aluna de 7º ano: Sexta-feira já podemos construir a rua e as casas?

E a xxxxxx (aluna de 8º ano) vem à nossa aula?

Prof.: Sim, vamos começar mas não sei se a xxxxxx (aluna de 8º ano) vem

pois não combinei nada com ela e pode ser muito em cima da hora.

Com o passar das aulas as alunas foram fixando os nomes dos polígonos e

foram sendo capazes de os identificar.

Não associavam os sólidos geométricos à sua planificação e desconheciam os

conceitos de face, vértice e aresta. Aproveitei para utilizar estes termos à medida

que íamos desenvolvendo as nossas atividades. Levei sólidos geométricos que fui

identificando pelo nome, repetindo as suas características e mostrando os seus

diversos elementos com vista a facilitar a aprendizagem.

Prof.: Temos estado a observar poliedros. Os poliedros são sólidos

geométricos que têm as faces todas planas. Pode dar exemplo de um poliedro

que seja fácil de encontrar nas nossas casas?

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Aluna de 8º ano: Caixa de cereais.

Prof.: Falei em faces. Sabe o que são?

Aluna de 8º ano: São os lados.

Prof.: Sim, as faces são… E os vértices e as arestas?

Aluna de 8º ano: Não sei…

Prof.: As arestas são as linhas que resultam do encontro de duas faces e os

vértices são os pontos que resultam da interseção de duas arestas.

Levei poliedros que as alunas estiveram a observar e manusear. Contámos o

número de faces, vértices e arestas para cada um deles e fomos trabalhando estes

conceitos de uma forma descontraída. Não exerci qualquer pressão para que

fixassem estes termos novos. Observei que ao fim de algum tempo já os utilizavam

intuitivamente. A aluna de 7º ano com mais facilidade comparativamente à aluna de

8º ano. Quando estavam juntas sentiam-me muito bem em usar aquilo que tinham

aprendido.

Aluna de 7º ano: Professora, o que tem nesse saco? São sólidos? Vamos

construir?

Aluna de 8º ano: Ontem eu estive a ver tantos com a professora.

Aluna de 7º ano: E eu professora, não me mostra?

Prof.: A xxxxxx (aluna de 8º ano) viu os mesmos sólidos que já lhe tinha

mostrado. Não tenho outros.

Aluna de 8º ano: Esses são de madeira? São da professora?

Prof.: Não são meus, são da escola.

Aluna de 7º ano: Podemos mexer?

Prof.: Sim. Cada uma de vocês vai pegar num sólido geométrico, escrever o

nome no caderno e por baixo o número de faces, vértices e arestas.

Alunas: [ao mesmo tempo] Vou acabar primeiro.

Prof.: Não é preciso pressa. Depois vão ter de trocar e tenho aqui mais…

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Deixei-as trabalharem sozinhas e observei que já sabiam identificar, em cada

um dos sólidos, as faces, as arestas e os vértices. Enganavam-se a contar, porque não

tinham método e acabavam por repetir ou por saltar algum elemento, mas estavam

a identificar bem o que tinha sido pedido. Quando acabaram compararam os

resultados e corrigiram com a minha ajuda.

Numa primeira fase tentei que distinguissem as pirâmides dos prismas e os

cilindros dos cones. Só depois de perceber que estes conceitos já estavam

consolidados, porque era natural para elas fazerem esta distinção, é que trabalhei a

classificação em função do polígono da base.

Prof.: Qual é a grande diferença entre estes dois grupos de sólidos?

Aluna de 7º ano: Não sei. São todos de madeira.

Aluna de 8º ano: Não, aquele é de plástico.

Prof.: Não quero a diferença em termos do material que são feitos mas sim

em termos das suas características. Por exemplo, este sólido [prisma

retangular] pode ser virado ao contrário e fica igual. Já este [pirâmide

triangular] se o voltarmos ao contrário não se segura…

Alunas: [em simultâneo] É um bico.

Aluna de 8º ano: O outro não tinha um bico desses, era igual em cima.

Prof.: É por aí. Estes sólidos têm duas bases iguais e são chamados de prismas.

As bases são dois polígonos quaisquer e as faces laterais são retângulos.

E os outros?

Aluna de 7º ano: Tem um bico…

Aluna de 8º ano: [na dúvida] Não tem retângulos.

Prof.: Não tem retângulos porque a sua base era um triângulo. Poderia ter

um retângulo, veja [mostrando uma pirâmide retangular].

Aluna de 8º ano: Mas aos lados.

Prof.: Já percebi. Como termina em vértice, as faces laterais não podem ser

retângulos. Está certíssimo. Então vejamos, estes sólidos são chamados de

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pirâmides. A sua base é um polígono e as faces laterais são triângulos que se

unem no vértice da pirâmide.

Aluna de 7º ano: Ali tem mais uma pirâmide [referindo-se ao cone].

Prof.: Estes sólidos (cilindro e cone) ficaram separados por algum motivo.

Observem a sua base.

Alunas: É uma bola!

Prof.: O quê? Não vejo aqui nenhuma bola!

Aluna de 7º ano: [Folheia o caderno] É um círculo.

Prof.: Assim sim. Temos uma base que é um círculo. E novamente dois sólidos

diferentes.

Aluna de 8º ano: Já sei! Um tem duas bases e o outro acaba em bico.

Prof.: Muito bem. Então temos um cilindro que tem duas bases em forma de

círculo e um cone que tem apenas uma base circular e termina em vértice.

Alunas: É como o gelado…

Prof.: Certíssimo!

Após este trabalho inicial de compreensão passámos à construção

propriamente dita onde as alunas tiveram de, numa primeira fase, trazer caixas para

forrarmos com papel autocolante e caracterizar de forma a se parecerem com casas.

Precisavam medir para poder cortar as dimensões certas de papel e a partir

daí aproveitei para introduzir as medidas de comprimento. Falámos dos

instrumentos de medida: régua e fitas métricas (de metal e de plástico) que as alunas

prontamente reconheceram e estivemos a medir a nossa altura, a largura da porta,

o comprimento do quadro e tudo aquilo que elas decidiram medir. Foram mudando

de instrumento de medição consoante o caso e aproveitei para falar das unidades de

medida.

Prof.: Quando queremos medir que instrumentos podemos utilizar?

Aluna de 7º ano: Uma régua.

Aluna de 8º ano: Medir o quê?

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Prof.: Tem razão, os tipos de metros variam consoante as necessidades. Por

exemplo, pensem no vosso pai, quando quer fazer alguma medição em casa.

O que é que utiliza?

Aluna de 8º ano: O meu pai mede tábuas com uma coisa assim (fazendo o

gesto como se estivesse a desenrolar uma fita métrica de aço)…

Prof.: Muito bem, isso chama-se uma fita métrica de aço. É uma ferramenta

igual a esta (mostrando uma fita).

Aluna de 8º ano: Sim.

Aluna de 7º ano: Nunca vi…

Notei que a aluna de 8º ano ficou interessada por estarmos a falar de alguma

coisa que se relacionava com o seu próprio ambiente familiar. Afinal já tinham visto,

em casa, aquilo que estávamos a falar na sala de aula, a ser usado por uma figura de

referência, o seu pai. Como a aluna de 7º ano referiu nunca ter visto uma fita métrica

de aço falei-lhe da fita métrica usada pelas costureiras uma vez que ela passa muito

tempo com a avó e já me tinha contado que a avó sabe costurar.

Prof.: Mas com certeza já viu alguém a utilizar uma fita métrica destas

(mostrando uma fita métrica das utilizadas pelas costureiras).

Aluna de 8º ano: Sim, a minha mãe.

Aluna de 7º ano: Sim, a minha avó. Quando quer medir a roupa pede-me

para ir buscar a fita que está numa caixinha.

Prof.: Muito bem, são diferentes tipos de metros mas com a mesma função.

Vimos aqui dois mas ainda existem mais. Por exemplo, em algumas lojas

podemos encontrar o metro de madeira e o metro articulado devem ter

construído quando estavam no primeiro ciclo.

Alunas: Não, acho que não.

Prof.: Então vamos construir um metro articulado numa próxima aula e

quando tivermos tempo vamos à loja de ferragens ver o metro de madeira

que lá utilizam. Mas agora, vamos começar por medir, utilizando a régua, as

nossas caixinhas. O metro é a unidade principal das medidas de comprimento

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mas quando queremos medir coisas mais pequenas podemos usar a régua

por uma questão de nos facilitar o trabalho.

Aluna de 8º ano: Nunca medi…

Prof.: Vou ensinar. Coloque a extremidade da régua, o correspondente ao

zero, na extremidade da aresta. Use a mão esquerda para que nem a régua

nem a caixa se movam e o último número da régua que fica na direção da

aresta que quer medir é a medida dessa aresta. Então, quanto mede esta

aresta?

Aluna de 8º ano: Mede 7 e… (Figura 4.5)

Prof.: Vamos ver, então temos uma aresta que mede 7,1 centímetros. Agora

escolha outra aresta e meça sozinha.

Aluna de 8º ano: [Tentando medir] Estou pondo mas ela [régua] está

fugindo.

Prof.: Tem de segurar com firmeza. Não pode ser ao de leve.

Aluna de 8.º ano: Ah! Mede 5 vírgula 1, 2, 3, 4, 5. Mede 5,5 centímetros.

Prof.: Agora meça o comprimento da mesa.

Aluna de 8º ano: Não dá… A mesa é grande, a régua não chega!

Prof.: Então, por esse motivo temos de utilizar outro instrumento. Uma fita

métrica.

Aluna de 8º ano: O meu pai tem!

A aluna de 8º ano, atendendo ao seu problema de visão, tem grandes

dificuldades em estabilizar a imagem que visualiza e por vezes sente-se muito

cansada quando tem que realizar trabalhos que exijam concentração. Refere por

diversas vezes que está muito cansada. Fiquei muito surpreendida ao verificar que,

apesar desta tarefa exigir bastante dela, não desistiu e tentou superar as suas

dificuldades.

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Medimos também a nossa altura e as dimensões de alguns objetos presentes

na sala de aula usando a fita métrica antes de começarmos a medir as caixas que

tínhamos de forrar com papel autocolante. As alunas revelaram alguma dificuldade

em cortar o papel autocolante seguindo a linha e cortavam sempre mais um

pedacinho com medo que faltasse e a caixa não ficasse bem forrada. Quando tiveram

de colar o papel autocolante para forrar as caixas sentiram-se mais à vontade e não

revelaram receio. A Figura 4.6 elucida esta parte do trabalho.

Adoraram ver as caixas forradas a representarem as casas (Figuras C1 e C2

no Anexo C) e trataram logo de colar figuras geométricas (quadrados e retângulos)

que serviam de portas e janelas. Atendendo ao tamanho que pretendíamos que as

casas tivessem optámos por fazê-las todas desta forma. Não era fácil fazer caixas de

cartolina com aquelas dimensões. Seria necessário efetuar muitas colagens e

ficariam muito fracas. Não me preocupei com esse facto porque outros elementos

Figura 4.5: Fazendo medições utilizando uma régua.

Figura 4.6: As alunas a cortarem o papel autocolante para forrar as caixas que representavam elementos do cenário.

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que podíamos encontrar no exterior das casas: árvores, bancos, piscinas, telhados,

foram feitos pelas alunas em cartolina. As alunas forraram ainda algumas mesas de

jardim para aproveitar as caixas de medicamentos que tinham trazido.

Perguntei às alunas por onde queriam começar, qual o sólido que queriam

fazer em primeiro lugar. Não fizeram questão de começar por nenhum em especial

e optamos por fazer as mesas e os bancos. Comecei por levar caixas de

medicamentos que abrimos para ver o que se entendia por planificação foram

fazendo no caderno esboços do que iam observando. As alunas revelavam interesse

e uma curiosidade muito grande por tudo o que se estava a passar. Falavam uma

com a outra, trocavam ideias e imaginavam o produto final.

Antes de passarmos à construção propriamente dita quis que as alunas

classificassem as pirâmides e os prismas de acordo com a sua base.

Prof.: Temos estado a ver e a representar no caderno as planificações das

caixas de medicamentos que a professora trouxe. Que tipo de prisma são as

caixas de medicamentos?

Aluna de 7º ano: São prismas retangulares.

Prof.: As faces dos prismas retangulares que polígonos são?

Aluna de 7º ano: Retângulos.

Prof.: Muito bem. Agora vamos construir prismas retangulares nesta

cartolina. Vão representar o quê na nossa rua?

Aluna de 7º ano: As mesas e os bancos.

Prof.: Muito bem!

Aluna de 7º ano: Já podemos fazer e recortar para depois colar?

Prof.: Sim, mas é preciso cuidado para acertar tudo.

As alunas desenharam em cartolina as planificações dos bancos e mesas

(cubos e prismas retangulares) cortaram, dobraram e construíram os sólidos como

se pode observar na Figura 4.7. Ficaram muito entusiasmadas e radiantes ao verem

o que fizeram.

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No início revelaram alguma dificuldade em efetuar medições e em conseguir

passar para a cartolina a planificação que tinham feito no caderno. O facto de não

terem a ajuda das quadrículas não facilitou. Fui-lhes dando algumas estratégias que

adotaram de modo a tudo correr na perfeição.

Depois de termos feito as mesas e os bancos foi necessário passar à

construção de mais elementos. Estas alunas esquecem-se com facilidade do que foi

falado e surpreenderam-me ao prontamente se lembrarem do que já tinham dito

como se pode ver pela transcrição.

Prof.: Já temos as casas, as mesas e os bancos no jardim. O que vamos fazer

mais para embelezar a nossa rua?

Aluna de 8º ano: Uma piscina e plantas.

Prof.: Que forma terá a sua piscina? E que plantas podemos fazer usando

sólidos geométricos?

Aluna de 8ºano: A piscina é redonda.

Prof.: Redonda? Então que sólido pode representar a nossa piscina?

Aluna de 8º ano: Um cilindro.

Prof.: Certo, e as árvores e arbustos?

Aluna de 8º ano: Não sei.

Prof.: Vamos pensar nos sólidos geométricos e ver o que podemos aproveitar

para fazer as árvores.

Figura 4.7: A aluna de 7º ano a recortar a planificação de um banco de jardim.

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Aluna de 8º ano: Podem ser árvores? Pinheirinhos?

Prof.: Sim, muito bem. E que sólido geométrico vai representar o pinheirinho?

Aluna de 8º ano: [procura no caderno] Estes…

Prof.: Como se chamam?

Aluna de 8º ano: Cones.

Prof.: Muito bem.

A aluna de 7º ano optou por fazer uma piscina com a forma de um prisma

retangular e as suas árvores eram constituídas por um cone sobre um cilindro.

A grande dificuldade das alunas surgiu quando lhes lancei o desafio de

fazerem a planificação para as árvores e para a piscina de forma cilíndrica.

Precisávamos de planificar e construir cilindros e cones. As alunas nunca o tinham

feito e ficaram logo com algum receio:

Aluna de 8º ano: Tantas cartolinas….

Prof.: Hoje vamos construir as árvores e as piscinas.

Aluna de 8º ano: Não sei fazer.

Prof.: Vamos fazer da mesma forma que fizemos para construir as mesas e os

bancos. Temos de fazer a planificação, cortar e depois construir.

Aluna de 8º ano: Mas não temos nenhum para abrir como fizemos com as

outras caixas. [referia-se às caixas de medicamentos que abrimos para ver

como seria a planificação dos prismas retangulares]

Prof.: Então vamos à oficina de aprendizagem e fazemos uma pesquisa.

Aluna de 8º ano: Sim.

A aluna de 7º ano teve a mesma atitude e combinamos também ir à oficina.

A oficina de aprendizagem é uma sala de estudo que os alunos, em regime de

voluntariado, utilizam para estudar, fazer pesquisas na internet e esclarecer dúvidas

com os professores das diferentes disciplinas que estão disponíveis de acordo com

um horário preestabelecido. É um espaço onde podemos acompanhar os nossos

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alunos na descoberta do “aprender a aprender” dando-lhes o apoio necessário com

vista à conquista da autonomia e ao subsequente sucesso.

Na oficina de aprendizagem as alunas pesquisaram várias planificações de

cones e cilindros. A aluna de 8º ano aproveitou para pesquisar a planificação de um

prisma triangular uma vez que queria colocar um telhado com essa forma numa das

casas que estava a construir.

Após a pesquisa colocaram as imagens que escolheram num documento que

me enviaram por correio eletrónico. Imprimi e na aula seguinte ampliamos algumas

planificações para podermos trabalhar.

As alunas ficaram muito entusiasmadas com o facto de serem elas a construir

e até duvidaram se seriam capazes.

Prof.: Vamos continuar então com a aula anterior. Temos de construir os

elementos em falta. Na última aula estivemos a pesquisar as planificações e

já tenho aqui para podermos fazer os nossos sólidos.

Aluna de 7ºano: Mas eu não sei fazer… é na cartolina?

Prof.: Sim, tem de ser em cartolina, para ficar mais resistente. E estou aqui

para ajudar.

Aluna de 7º ano: A xxxxxx (aluna de 8º ano) também vai fazer?

Prof.: Sim. Cada uma de vocês vai fazer alguns sólidos para embelezar as

casas que construíram e depois fazemos alguns sólidos para o jardim público.

Aluna de 7º ano: Sim, mas não sei se consigo…

Prof.: Vamos começar então…

A aluna de 8º ano mostrou alguma resistência, teve receio de não ser capaz

mas, quando lhe disse que a colega já tinha começado e estava tudo a correr bem, já

mostrou mais interesse e começou por fazer um telhado com a forma de um prisma

triangular como se pode observar na Figura 4.8.

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60

Prof.: Então, estão a gostar?

Aluna de 7º ano: Sim, está muito fixe e eu pensei que não se conseguia fazer

na cartolina…

Aluna de 8º ano: Sim professora. Já disse à minha mãe que estamos a fazer

casas.

Prof.: Ainda bem. Agora temos de pensar no nosso autocarro que vai

percorrer estas ruas e para isso vamos precisar de estudar as horas.

Aluna de 7ºano: As horas? Mas eu não sei as horas…

Aluna de 8º ano: Porque é que o autocarro precisa das horas?

Prof.: O autocarro não precisa das horas, quem precisa de saber as horas

somos nós. Ter a noção das horas e saber usar um relógio é muito importante.

É necessário para ver o horário de um autocarro, tomar um antibiótico.

No caso do autocarro temos de saber quanto tempo demora o seu percurso

para podermos definir as paragens, a sua duração e evitarmos que ultrapasse

a mesa e caia no chão. Se não tivermos a noção de tempo, não seremos

capazes de programar o autocarro para fazer as curvas.

Aluna de 7º ano: E ele tem de fazer curvas?

Prof.: Sim, como é que o autocarro vai até ao fim de uma rua e volta para trás?

Tem de fazer inversão de marcha no fim da rua e para isso é necessário que

faça a curva. Não podem acontecer acidentes. O robot não é nosso, temos de

ser muito cuidadosas.

Figura 4.8: A aluna de 8º ano a recortar a planificação de um prisma triangular.

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61

Alunas: Mas eu quero usar o robot…

Prof.: Mas vão usar, temos é de aprender as horas primeiro para podermos

programar o autocarro de modo a fazer o percurso e as paragens que

queremos. Não pode haver acidentes.

Nas aulas seguintes trabalhámos a noção de tempo. Estivemos a ver as horas

em relógios analógicos e digitais, a ver a diferença e a relação entre uma hora, um

minuto e um segundo. Inicialmente estas noções eram totalmente abstratas e não

faziam qualquer sentido. Com o passar do tempo começaram a ser capazes de

perceber que um tempo de aula tem duração inferior a uma hora

(45 minutos) e que dois tempos são 90 minutos e têm uma duração superior a uma

hora. Dividimos o relógio em quartos de hora e as alunas começaram a identificar

um quarto de hora, meia hora e três quartos de hora. Aprenderam a contar de 5 em

5, a ler as horas e a colocar os ponteiros nos relógios. Pedi-lhes que trouxessem um

relógio para poderem ver as horas. Foi uma aprendizagem muito lenta que foi sendo

feita de uma forma descontraída e intercalada com a construção dos sólidos que

levou muitas aulas.

Inicialmente perguntavam-me, quando tocava feriado, se já tinha passado

uma hora. Explicava que a duração das aulas se media em minutos e íamos ao

horário e ao relógio ver a hora de entrada, a hora do primeiro toque e a hora de saída.

Um dia surpreenderam-me quando ao dar o toque de feriado do segundo tempo me

disseram prontamente: “já passaram 5 minutos”. Fiquei admirada pela forma

espontânea e natural como falaram da noção de tempo que até então era abstrata e

fazia pouco sentido.

Durante algumas aulas as alunas trabalharam individualmente na construção

dos sólidos, na aprendizagem das horas e utilização de elementos relacionados com

as mesmas: horários de autocarros, programações televisivas e resolução de

situações problemáticas envolvendo o conceito de tempo.

As construções ficavam na sala e as alunas comparavam o trabalho que

faziam e tentavam aperfeiçoá-lo. A cada aula tentavam identificar o que estava feito

de novo e muitas vezes revelavam terem estado a pensar no que se estava a fazer

pois traziam ideias para o seu trabalho.

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62

O robot contribuiu para que as alunas sentissem a necessidade de aprender

as horas e noção de tempo para poderem pô-lo a fazer o percurso definido

anteriormente, pois havia-lhes dito que só conseguiriam programar o robot quando

soubessem as horas.

Aluna de 7º ano: Tanta coisa professora. O que é isso?

Prof.: O que é que vos disse que iam utilizar e para isso tinham de saber as

horas e compreender a diferença entre horas, minutos e segundos?

Alunas: (em simultâneo) O robot! Altamente.

Quando viram todas aquelas peças e tiveram de seguir o manual para

conseguir montar o robot sentiram algumas dificuldades e alguma desmotivação.

Queixaram-se que as peças eram muito pequenas e parecidas e a aluna de 8º ano,

devido aos seus problemas, teve algumas dificuldades em conseguir colocar

corretamente as peças que exigiam mais precisão. Expliquei como estava orientado

o manual da construção e como devia ser feita a seleção das peças que, apesar de

muito semelhantes, têm diferenças consideráveis não podendo ser substituídas por

outra.

Ao fim de algum tempo perceberam como tudo funcionava e já avançavam à

minha frente sem ser necessária grande orientação. Seguiam o manual e

selecionavam as peças necessárias a cada ponto conforme as Figuras 4.9 e 4.10.

Fui ajudando a aluna de 8º ano a colocar corretamente algumas peças quando

solicitava a minha ajuda. Quanto à aluna de 7º ano, revelou-se autónoma e,

ultrapassadas as dúvidas iniciais, conseguiu efetuar a construção sozinha. Ficaram

radiantes quando viram o resultado final e quiseram saber como é que o robot

andava. Revelavam uma grande vontade de aprender.

Alunas: E agora? Não anda! A professora que ponha [a andar].

Prof.: O que foi que vos disse que teriam de fazer?

Alunas: Dizer ao robot o que ele tinha de fazer.

Prof.: Então é isso. Vou-vos mostrar como se programa o robot.

Alunas de 7º ano: O que é isso?

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Prof.: O robot é como um Lego. Tem inúmeras peças que nós juntamos de

acordo com um manual e depois de construído é uma máquina que, ao lhe

darmos as instruções de uma forma percetível para ele será capaz de realizar

funções básicas pré-programadas. Para lhe “dizermos” o que queremos que

ele faça temos de falar numa linguagem que ele conheça. E essa linguagem é

a que se trabalha neste programa que se chama Mindstorms NXT.

Aluna de 7º ano: Isso parece difícil.

Aluna de 8º ano: O meu irmão é que ia gostar disso. Ele está no curso de

informática.

Prof.: Não é difícil e de qualquer modo estou aqui para vos ajudar. Vou dar

exemplos e só depois é que vão fazer sozinhas.

Começamos por explorar o software e as diferentes funções disponíveis

fazendo experiências muito simples, com cada uma das diferentes funções

individualmente, para que as alunas percebessem como funcionava a programação

do robot.

Inicialmente sentiram muitas dificuldades e mostraram algum desinteresse.

Tentei que percebessem que a programação estava relacionada com a maneira como

nós humanos faríamos o percurso. Andámos à volta da mesa para compreendermos

a forma como agimos quando queremos dobrar uma esquina, ou seja, mudar de

direção. Exploraram o software e foram fazendo experiências até perceberem como

teriam de fazer. A Figura 4.11 mostra uma das tentativas de programação até as

alunas serem bem-sucedidas.

Figura 4.10: Construção do robot pela aluna de 8º ano. Figura 4.9: Construção do robot pela aluna de 7º ano.

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Prof.: Vamos fazer uma experiência. Eu vou andar à volta desta mesa e vocês

vão-me dizer o que é que eu fiz.

Aluna de 8º ano: Vai andar.

Prof.: Sim, mas será que vou estar continuamente em movimento ou vou ter

de efetuar algumas paragens? (começo a fazer o percurso)

Alunas: A professora está a andar e agora parou.

Prof.: Vou voltar ao início e vão dizer novamente o que estou a fazer.

Alunas: Anda, pára, anda, pára, anda,….

Prof.: E parei porquê?

Aluna de 7º ano: Para dar a volta.

Aluna de 8º ano: Porque sempre a andar não dá para virar.

Prof.: Então é assim que têm de pensar relativamente ao robot. Pensem como

se fossem vocês a fazer o percurso.

Alunas: Podemos mexer e alterar?

Prof.: Sim, força. Façam as experiências que acharem necessárias. Estou aqui

para ajudar. Trabalhem em conjunto e pensem no resultado que pretendem.

As alunas começaram a reconhecer que as tarefas do nosso dia a dia podem

ser descritas de forma sequenciada e que podem ser estruturadas. Isso, aliado ao

facto de serem agora elas a programar, motivou-as muito mais. As alunas estavam

desejosas de aprender mais, pensavam naquilo que tinham de fazer, com haveriam

Figura 4.11: Exploração do software - primeiras tentativas de programação.

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de solucionar os problemas. Observei-as a pensar de uma forma mais abrangente,

não se limitavam ao aqui e agora, falavam do que se passou e do que pretendiam.

Com a utilização do robot pude verificar que o conceito de tempo deixou de ser

abstrato e passou a ter significado. As alunas tornaram-se capazes de utilizar este

conceito de uma forma natural.

A partir do momento que compreenderam a maneira de programar foi uma

questão de tempo e de experimentação. Fizeram várias experiências e

posicionavam-se em lugares estratégicos de forma a mudar a trajetória do robot, se

necessário, como se pode ver na Figura C3 do Anexo C.

Só se aprende fazendo, questionando e alterando. Dei liberdade e espaço às

alunas para fazerem as experiências necessárias à compreensão e estive sempre

presente de forma a poder orientá-las na construção do seu conhecimento. As aulas

em que trabalharam com o robot e o computador foram uma animação e o saber

adquirido significativo. As alunas trocavam ideias, partilhavam opiniões e acima de

tudo eram intervenientes ativos na construção do seu próprio conhecimento.

Observá-las neste processo de decoberta foi muito gratificante e permitiu-me ver

que estas alunas possuem muito mais conhecimentos do que aquilo que

demonstram normalmente.

Aluna de 7º ano: Não trouxe o computador e o robot?

Prof.: Hoje não. Agora vamos organizar a nossa rua e pensar na

caracterização do robot. Se queremos que seja um autocarro vamos ter de

trabalhar o seu aspeto exterior.

Aluna de 7º ano: A xxxxxx (aluna de 8º ano) ainda não chegou.

Prof.: A partir de agora a xxxxxx (aluna de 8º ano) não vem à sexta-feira, vai

fazer uma experiência pré-profissional na escola onde teve aulas no 1º ciclo.

Aluna de 7º ano: E ela já não vem mais? Não gostou de trabalhar com o robot?

Eu gosto de trabalhar com ela.

Prof.: Ela gosta muito de trabalhar consigo e com o robot mas terá de ser

noutros dias sem ser na sexta-feira.

Aluna de 7º ano: Ah, está bem. Eu gosto muito de trabalhar com ela.

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As alunas sentiam-se muito bem ao trabalharem em conjunto. Estavam em

pé de igualdade, não tinham receio de falhar e o facto de se identificarem com o seu

par proporcionou aprendizagens significativas. Somos seres sociais e aprendemos

com os outros. Sentiam-se à vontade e como tinham interesses em comum

tornaram-se mais independentes, sendo capazes de tomar a iniciativa e investigar

por si próprias mais do que aquilo que era pedido.

Prof.: Cada uma de vocês fez algumas casas e agora temos de organizar e

colar à volta das casas os últimos sólidos que construíram.

Aluna de 7º ano: As árvores?

Prof.: Sim, vamos colar o que falta nas cartolinas para as casas e arredores

ficarem prontos. Vamos também fazer um jardim em conjunto antes de

começar na caracterização do autocarro.

Aluna de 7º ano: Já sei como pode ser o autocarro.

Prof.: Como?

Aluna de 7º ano: Um quadrado.

Prof.: Ai, ai. Um quadrado? Não se enganou? Um quadrado não pode levar

passageiros…

Aluna de 7º ano: Um, um,…, prisma retangular.

Prof.: Muito bem. E de que cor vai ser?

Aluna de 7º ano: Azul. Mas a professora tem de trazer o robot para

medirmos.

Prof.: Sim, vamos começar no que temos para fazer hoje e para a semana

compramos o material e começamos. Temos falar com a xxxxxx (aluna de

8º ano) porque o autocarro é das duas e temos de ouvir a sua opinião.

Aluna de 7º ano: Quando a vir vou falar com ela.

Prof.: Ok

Nessa aula colámos as árvores e as piscinas (cones e cilindros) que tinham

sido construídas em último lugar e organizamos o exterior das casas bem como um

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jardim com árvores, mesas e bancos. O resultado deste trabalho pode ser visto nas

Figuras C4, C5 e C6 do anexo C.

À medida que iam colando os sólidos fomos falando acerca dos seus nomes e

dos diferentes elementos que os constituem. Fiquei surpreendida pois as alunas

ainda se lembravam e utilizavam os termos de forma correta. Todo o trabalho

revelou-se de extrema importância na capacidade destas alunas fixarem vocabulário.

Tínhamos estado a usar esses termos aquando da construção dos sólidos

geométricos mas sempre de uma forma descontraída. Nunca as pressionei a usarem

qualquer tipo de vocabulário embora o usasse sempre que necessário. A aluna de

7º ano demonstrou mais facilidade em adquirir e aplicar os conceitos mas, o facto

de estarem a trabalhar em conjunto fez com que a aluna de 8º ano se reconhecesse

no seu par e passasse a usar o mesmo vocabulário.

Aluna de 8º ano: Professora, passe-me a cola.

Prof.: Para quê? Para colar as árvores e as piscinas é melhor colocar fita-cola

de dupla face que fica mais bem colado.

Aluna de 8º ano: Não, é para colar este vértice que está meio aberto.

Prof.: Ok, tome. Coloque pouca cola para não ficar a cartolina toda suja.

Depois comece a cortar a a fita-cola.

Aluna de 8º ano: Colo nas bases?

Prof.: Sim, em cada base colocamos fita-cola para as árvores e as piscinas

ficarem bem seguras.

Aluna de 8º ano: Vou por as árvores maiores, as que têm o tronco com a

forma de cilindro atrás.

Prof.: Muito bem, concordo…. Assim as árvores mais pequeninas não ficam

escondidas.

A aluna de 7º ano também se mostrou à vontade quando foi para organizar o

seu trabalho e usou os termos corretos.

Aluna de 7º ano: O que vamos fazer hoje? A professora não trouxe o robot e

o computador?

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Prof.: Não podemos fazer todos os dias o mesmo. Além do mais vocês já

conseguiram programar o robot e fizeram tantas experiências que já estão

peritas. Agora vamos acabar as casas e o nosso jardim.

Aluna de 7º ano: Sim, ainda não colei as árvores e a piscina.

Prof.: Então vamos começar.

Aluna de 7º ano: Não tenho cola.

Prof.: Não vamos usar a cola. Tem aqui fita-cola de dupla face para utilizar.

Aluna de 7º ano: Colamos nas bases que vão ficar no chão?

Prof.: Sim.

Aluna de 7º ano: Eu gosto destas árvores com forma de cone. Posso colocar

mais uma?

Prof.: E das outras. As que têm um tronco cilíndrico?

Aluna de 7º ano: Também gosto, mas um pouco menos.

Depois de as alunas terem acabado as casas, os arredores e o jardim, era

chegada a hora de caracterizar o autocarro. Estavam muito entusiasmadas pois

queriam que os passageiros do autocarro fossem artistas de programas que viam na

televisão.

Aluna de 8º ano: Hoje vamos colar os artistas das telenovelas? A professora

trouxe o robot e cartolinas.

Prof.: Não, ainda não caracterizámos o robot para se parecer com um

autocarro. Temos de fazer uma caixinha para colocar no robot e ele ficar

parecido a um autocarro. Só depois é que podemos colocar os passageiros.

Lembra-se de ter dito que já tinha pensado na forma que devíamos dar ao

autocarro?

Aluna de 7º ano: Sim, um prisma retangular.

Prof.: Então vamos ter de encontrar maneira de colocar o robot dentro de um

prisma retangular. Como vamos fazer?

Aluna de 7º ano: Temos de medir.

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Prof.: E mais? Vamos fazer uma caixinha fechada ou fazemos de maneira a se

poder abrir?

Aluna de 7º ano: É melhor de abrir para podermos usar os fios.

Prof.: Sim, nem me tinha lembrado disso. Temos de poder passar o programa

para o robot e é melhor se podermos destapar a caixinha que vamos fazer.

Mãos à obra!

As alunas fizeram várias tentativas até a versão final. Acabaram por fazer

uma caixa aberta que encaixa numa base com a mesma forma de maneira a

podermos retirar a parte superior como se pode observar nas Figuras 4.13 e 4.14.

Ficaram encarregues de trazer as revistas para escolherem os passageiros do

autocarro mas esqueciam-se sempre.

Como os horários mudaram nem sempre era fácil encontrar uma aula em que

as duas alunas tivessem disponibilidade e decidimos fazer um convite onde cada

aluna convidava a outra para vir à aula onde se decidiria quem eram os passageiros

do autocarro e faríamos a construção final do cenário onde este se deslocaria.

O convite foi feito por cada uma das alunas separadamente e pode ser visto na Figura

C7 do anexo C. Depois de acabado colocaram num envelope, preencheram as

moradas do remetente e do destinatário e fomos ao correio enviar.

Nos correios as alunas tiveram que dizer o que pretendiam e pagar a quantia

pedida. Como estávamos no exterior aproveitámos para comprar uma revista de

onde se escolheriam os passageiros do autocarro. Como têm muita dificuldade em

Figura 4.12: Caracterização do autocarro. Figura 4.13: Base que suportava a estrutura do autocarro.

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selecionar quantias exatas para efetuar pagamentos aproveitei esta oportunidade

para trabalhar este conteúdo.

Na aula seguinte as alunas estiveram a escolher os passageiros do autocarro

de entre os artistas presentes na revista que comprámos quando fomos aos correios.

Viveram esta atividade com muita intensidade. Falavam com entusiasmo das

personagens das telenovelas e do papel que desempenhavam. Tiveram muita

dificuldade em escolher as suas personagens preferidas. Acabaram por escolher e o

resultado pode observar-se nas Figuras 4.14 e 4.15.

O autocarro tinha as personagens que gostavam e agora já só falavam do dia

em que íamos construir o cenário e colocar o autocarro na rua a fazer o percurso.

As alunas estavam muito entusiasmadas.

Quando chegou o dia tão esperado chegaram à sala muito cedo e começaram

logo a preparar o material. Tivemos de mudar de sala e foi necessário levar as

construções. Demonstraram uma desenvoltura muito grande e fizeram muita coisa

sem ser necessário dizer. Revelaram uma autonomia diferente daquela que se

observava no início. Subiam, colocavam o material, vinham buscar o que faltava e

sempre dispostas a fazer mais. Estavam radiantes poruq era uma criação delas.

Mostraram às assistentes operacionais do piso para onde fomos e explicaram o

trabalho que tinham feito. Aplicaram os termos corretos e perante a admiração das

ouvintes ainda se sentiam mais felizes.

Figura 4.14: A escolha da aluna de 8º ano. Figura 4.15: A escolha da aluna de 7º ano.

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Prepararam o cenário sozinhas e depois de tudo organizado pedi-lhes que

programassem o robot para fazer o percurso. O cenário e o autocarro caracterizado

podem ser vistos nas figuras C8, C9 e C10 do Anexo C.

O programa que tinham não estava adequado, em termos de tempo, ao

percurso que o autocarro tinha de fazer uma vez que tinham feito as experiências na

nossa sala de aula. Trabalhámos a programação sobre uma mesa mais pequena e

naquele dia o autocarro tinha de se deslocar, fazer paragens para entrarem

passageiros e continuar o percurso até ao fim da rua.

As alunas demonstraram autonomia suficiente e só pediram a minha ajuda

para pequenos ajustes relacionados com a mudança de direção. Quanto ao resto

foram totalmente independentes e revelaram grande confiança nelas próprias.

Normalmente estão sempre a pedir ajuda mas naquele dia não queriam, o trabalho

era delas e eu estava ali para ver.

Prof.: Há qualquer coisa que não ficou bem. O autocarro esteve quase no

jardim desta casa. O que correu mal?

Alunas: O tempo. Foi muito…

Prof.: Querem ajuda?

Alunas: Não!

Aluna de 7º ano: Não podemos experimentar?

Prof.: Sim, façam as vossas experiências.

As alunas foram alterando o programa até que o autocarro fez o percurso que

tinha sido pensado. Nessa altura não cabiam em si de contentes. Os seus rostos

brilhavam de satisfação e a alegria enchia a sala. Fiquei surpreeendida ao observar

as alunas a discutir ideias, partilhar opiniões e acima de tudo a pensarem de uma

forma diferente. Não estavam a conseguir que o autocarro fizesse o percurso que

tinham pensado por causa do tempo que ainda não estava correto mas não

desistiram, pelo contrário, continuaram a experimentar. Observavam atentamente

o que se estava a passar, o que tinha corrido mal e tentavam solucionar o problema.

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O desenvolvimento de todo este trabalho marcou muito estas alunas. No

início eram totalmente dependentes de mim, não tomavam qualquer decisão sem

aprovação mas no dia de construíram o cenário estavam muito à vontade e

revelaram-se totalmente autónomas. O cenário era fruto do seu trabalho e

representava o que tinham estado a fazer ao longo de várias aulas. Quando as

assistentes operacionais, que têm por aquelas alunas um carinho especial, lhes

perguntaram o que representava tudo aquilo explicaram o que tinham feito e

utilizaram os conceitos que tinham assimilado. Queriam mostrar o autocarro e

retirar a parte de cima para mostrar que aquele autocarro era um robot. Com aquele

robot/autocarro aprenderam as horas e sentiam-se tão contentes a explicar o que

eram capazes de fazer que até gaguejavam. As duas alunas revelam muitas

dificuldades de aprendizagem mas quando estão a trabalhar em grupo num projeto

do seu interesse aprendem com mais facilidade visto que, trabalhar em grupo,

quando o grupo nos aceita tal como somos, é uma tarefa gratificante e sentimo-nos

reconhecidos. Damos, recebemos e aprendemos com isso. Estas alunas raramente

trabalham em grupo e esta experiência revelou-se impulsionadora de

aprendizagens significativas. Não receavam colocar questões, dizer o que sentiam

ou o que estavam a pensar e isso ajudou-as a evoluir ao seu ritmo com sucesso.

Quando chegou o fim da aula tiveram de arrumar e dei-lhes autorização de

levarem as casas que tinham feito. Ficaram muito satisfeitas mas o que realmente

queriam era o autocarro (robot). Foi o que as motivou e o grande impulsionador de

algumas aprendizagens significativas e com grande utilidade prática.

Voltei a aplicar a ficha de diagnóstico que tinha dado no início e constatei que

as alunas já conseguiam associar objetos de uso corrente a sólidos geométricos. De

acordo com a Figura 4.16. Embora ainda não façam a correspondência de todos os

objetos, comparativamente com os resultados da primeira aplicação, as falhas foram

muito pequenas o que me permite afirmar que todo o trabalho desenvolvido foi

proveitoso. Estas alunas esquecem-se com facilidade das coisa e não conseguiriam

fixar as soluções da ficha mesmo que esta estivesse em seu poder. A ficha, aplicada

no início do trabalho, ficou sempre comigo para poder fazer comparações. O facto

de ser a mesma ficha e atendendo às acaracterísticas destas alunas não tem qualquer

influência no resultado final.

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73

Quanto ao conhecimento das planificações e dos elementos dos sólidos

geométricos os progressos foram visíveis. As alunas uniram os sólidos geométricos

às suas planificações sem revelarem dúvidas (Figura 4.17) e preencheram as

etiquetas com os elementos dos sólidos geométricos corretamente como se pode

observar na Figura 4.18.

Fizeram a ficha com relativa facilidade, sem colocarem questões e os

resultados foram animadores. Quanto à aluna de 8º ano precisou da minha ajuda

para fazer a leitura da ficha e para escrever o nome dos sólidos geométricos.

Limitei-me a ler as questões e dizer-lhe de que forma se escrevia o nome do sólido

que me pedia. Na questão número um, identificou de forma correta os nomes de

todos os sólidos apesar de nem sempre colocar todos os objetos que lhe

correspondiam. A aluna de 7º ano, como sabe ler e escrever, é mais independente e

resolveu a ficha rapidamente e sem colocar dúvidas. Notei uma grande confiança no

decorrer da atividade.

Figura 4.16: Resposta da aluna de 7º ano à questão n º1 após o trabalho desenvolvido.

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Os resultados finais foram satisfatórios e verifiquei que todo o trabalho valeu

a pena. As alunas aprenderam de uma forma lúdica, ao seu ritmo e fazendo

atividades que gostavam.

Figura 4.17: Resposta da aluna de 8º ano à questão nº 2 após o trabalho desenvolvido.

Figura 4.18: Resposta da aluna de 7º ano à questão nº 4 após o trabalho desenvolvido.

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5 Considerações finais

Ensinar alunos dos Currículos Funcionais é um desafio para todos os dias.

É necessário um grande envolvimento para contribuirmos de forma plena para a

inclusão destes alunos, em quem a sociedade raramente coloca grandes expetativas.

Não podemos cruzar os braços e nos limitarmos a ver passar o tempo até que os

alunos atinjam a escolaridade obrigatória e sejam encaminhados para um Centro de

Atividades Ocupacionais (CAO) ou um Centro de Atividades Profissionais (CAP).

Temos de fazer mais por eles. Não podemos deixar que o diagnóstico de NEE termine

com os sonhos e diminua a vontade de viver de quem se vê limitado e com poucos

recursos.

Durante muitos anos as crianças não iam à escola e aprendiam no contato

com os adultos, por observação das atividades que estes desenvolviam e com o

propósito de, um dia mais tarde, enfrentarem o dia-a-dia sozinhas. As razões pelas

quais tinham de aprender eram óbvias e só pela experiência e pelo exemplo

conseguiam avançar na vida.

Atualmente quando se pensa nos alunos com NEE assiste-se a um

afastamento da escola das suas verdadeiras necessidades. É necessário que as

razões para aprender determinados conteúdos sejam claras e é importante

possibilitar aos alunos oportunidades de aprendizagem. Eles assimilam muito mais

do que possamos imaginar sem que lhes ensinemos, desde que lhes proporcionemos

momentos de descoberta e de partilha.

As aulas destas alunas são individuais e tento sempre adotar estratégias que

as motivem para a aprendizagem. Estão habituadas a um método de ensino

tradicional e embora me tenha tentado desviar deste método de ensino nunca

desenvolvi um projeto comum desta natureza. A alegria e o entusiasmo das alunas

quando estávamos a trabalhar em conjunto era contagiante. Com este projeto

desenvolveram capacidades que lhes serão úteis para a vida e, acima de tudo,

aprenderam a confiar em si próprias e nas suas capacidades. Quanto a mim cresci a

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nível pessoal e profissional. Esta investigação veio complementar a minha formação

de base e contribuiu para a minha formação.

5.1 A promoção da autonomia de alunos com NEE com a criação de

cenários de aprendizagem

Hoje em dia a falta de autonomia e de responsabilização é muito comum nos

nossos alunos. Este facto deve-se a alguns pais que, na tentativa de facilitar a vida

aos filhos, poupando-os a preocupações, os protegem demais e acabam por não lhes

dar oportunidades de crescimento. As palavras de Valter Hugo mãe, no prefácio do

livro “O menino de Deus” (Costa, 2014), quando diz: “…os filhos são realidades

profundamente delicadas que não suportamos ver sofrer, magoar, desiludir”

refletem esta realidade. Este problema é mais visível nos alunos da Educação

Especial que, devido às suas características individuais, são apoiados na realização

de muitas tarefas que seriam capazes de fazer sozinhos mesmo que inicialmente

com supervisão. Os pais de alunos com NEE tentam, compreensivamente, proteger

os filhos de todos os perigos, frustrações e dificuldades. Por vezes, esquecem-se de

promover a capacidade dos seus filhos, nossos alunos, encararem o crescimento da

sua autonomia de forma natural. Na escola a situação não é diferente. Os alunos com

NEE continuam a ser protegidos por toda a comunidade escolar. Os professores, com

receio que estes alunos não consigam atingir os objetivos propostos e se sintam

inferiorizados face aos colegas, por vezes exigem-lhes pouco e dão-lhes todo o apoio

possível não deixando espaço ao crescimento. Os alunos com NEE, tal como os

colegas da turma onde estão integrados, têm motivação e interesses variáveis e as

variantes de empenho e interesse são mais acentuadas. Por vezes, a falta de tempo

faz com que não preparemos, com a devida antecedência e o rigor exigido, as

atividades que têm de ser diversificadas para evitar a monotonia e serem veículos

motivadores e impulsionadores de aprendizagens.

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O mundo terá sempre dificuldades e perigos a espreitar. É preciso dar a

possibilidade aos alunos com NEE de adquirirem competências pessoais de domínio

da autonomia, através de pequenas conquistas, e evitar que cresçam num ambiente

de superproteção que inibe as suas atitudes e os torna incapazes de tomar decisões

sozinhos.

A autonomia consquista-se. Pude observar este facto ao longo da minha

investigação. A criação de um cenário de aprendizagem é um processo que resulta

da troca de ideias e da colaboração entre os intervenientes. Todo este processo teve

como base os interesses das alunas e as suas verdadeiras necessidades com o

objetivo de criar trajetórias que facilitassem a aquisição das competências

requeridas. Durante este procedimento as alunas passaram a ter responsabilidade

por algumas tarefas e aos poucos pela sua aprendizagem. Pude observá-las a pensar,

tomar decisões, fazer opções e percebi que a autonomia foi sendo conquistada e

trabalhada à medida que deixei de transmitir os conhecimentos e criei condições

favoráveis à aprendizagem. Todo o trabalho estava centrado nas alunas e no

desenvolvimento das suas capacidades. A relação de respeito pelos interesses e

dificuldades de cada uma que se estabeleceu, estimulou a criatividade e ajudou-as a

construírem o conhecimento ao seu ritmo. Tal como disse Freire (2002) pude

constatar que para a construção da autonomia não basta dar liberdade, é necessário

exercer a capacidade de aprender de forma crítica e estimular a curiosidade.

Criar os espaços, as casas, as árvores, as mesas, os bancos, possibilitou a

reflexão e a compreensão das opções que foram sendo tomadas ao longo de todo o

processo e ajudou as alunas a descreverem situações. Em conversa com os outros

professores destas alunas tinha constatado a sua dificuldade em justificar escolhas,

opiniões, em recontar uma história. Todos verificámos que esta situação foi

melhorando à medida que as alunas foram tomando consciência das suas

capacidades. Como referido em Carroll (2000) o conceito de cenário tem grande

flexibilidade e ao descrever situações minimalistas favorece a reflexão e a

compreensão das implicações das decisões tomadas nas diversas dimensões.

A criação do cenário ajudou-as a assimilar os conceitos que foram sendo

tratados. À medida que decorriam as aulas fui usando os termos que queria que

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aprendessem. Foram interiorizando esses conceitos de modo que ao fim de algum

tempo eram elas que os utilizavam sem nunca lhes ter feito essa exigência. A criação

do cenário exigiu uma sequência de ações que tinham de ir controlando. Precisavam

de saber o que estava feito, os materiais que ainda faltavam, quais as planificações

em falta, as cores das cartolinas que queriam trabalhar e essa responsabilização,

embora que vigiada, deu-lhes autonomia e obrigou-as a pensar mais à frente.

Perceberam que eram importantes, que tinham capacidade para tomar decisões de

forma consciente e eram as grandes responsáveis sobre a maneira como o nosso

projeto ia decorrer. Para minha grande satisfação pude observar que continuavam

a aprender fora da sala de aula uma vez que pediam ajuda às respetivas professoras

da Educação Especial para pesquisar.

Mais uma vez pude confirmar que os professores marcam bastante os seus

alunos e são impulsionadores de muitas aprendizagens embora este processo esteja

mais do lado dos alunos do que dos professores. A influência direta dos professores

sobre o que os alunos aprendem diminui à medida que avançamos na escolaridade.

A minha mudança de postura, passando a adotar o papel do professor facilitador da

aprendizagem, ajudou as alunas a pensarem e a aprenderem a pensar. Tal como

refere Almeida (2002) é necessário proporcionar aos alunos situações em que têm

de pôr em prática capacidades, atitudes e comportamentos de maior autonomia.

Procurei dar espaço para as alunas poderem agir sozinhas de forma a ganharem

confiança e irem treinando a sua independência. Estimulei-as a tomarem atitudes e

a não cruzarem os braços.

A criação do espaço onde se desenrolou a atividade final revelou-se de

extrema importância pois, ao longo da sua construção, observei um processo

ininterrupto e individual de construção de conhecimento. As novas informações

foram sendo assimiladas e as alunas foram integrando conceitos de uma forma

informal, mostrando-se cada vez mais autónomas face aos desafios. A robótica

associada à educação e mais precisamente à Matemática incentiva o aluno a ser

curioso e promove a imaginação. Estas experiências de responsabilização e tomada

de decisão favorecem a construção da autonomia.

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A educação do pensamento, da razão e da lógica eram já defendidas por

Piaget (1977) que afirmava não ser suficiente preencher a memória de

conhecimentos úteis para se fazer homens livres mas sim formar inteligências ativas.

A autonomia não nasce connosco, é alcançada quando existem condições favoráveis

à sua realização e é obtida com treino. Este treino passa por abandonarmos a atitude

de transmissores de conhecimentos e passarmos a ser criadores de condições que

favoreçam a autonomia dos alunos. Contudo, se os alunos não se quiserem envolver

neste processo e estiverem à espera de receber o conhecimento de forma passiva as

aprendizagens voltarão a estar centradas no professor como transmissor do saber.

As alunas mostraram-se responsáveis e interessadas em tomarem decisões e

observei o despertar nestas alunas com NEE da consciência da importância que cada

um de nós tem sobre aquilo que quer saber e que é capaz de fazer.

5.2 Os robots na aprendizagem da Matemática para a Vida

A aprendizagem não pode ser vista como um processo isolado sem qualquer

influência de fatores externos. Pelo contrário, temos de olhar para os nossos alunos

num contexto pessoal e social cada vez mais informatizado e exigente.

A comunidade escolar não acreditava que aquelas alunas fossem capazes de

desenvolver um projeto daquela dimensão e muito menos que fossem capazes de

programar robots. Verifiquei, como já havia referido Lewis (1999), que o uso da

tecnologia em alunos com NEE é uma força de equalização que permite contornar

as dificualdades e vem facilitar o acesso àquilo que é garantido a todas as pessoas.

Só alunos motivados e interessados conseguem atribuir significados e os

robots tiveram um papel muito importante neste processo. Com os alunos de CEI

não podemos pensar na quantidade de informação e consequente conhecimento

mas sim na sua importância e utilidade prática. São passos pequeninos mas

essenciais para uma integração mais fácil na sociedade.

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Com a utilização dos robots as alunas evoluíram na sua forma de pensar, a

sua mente ficou mais aberta e observei-as mais recetivas às novas aprendizagens.

Como havia referido Lewis (1999) a robótica é uma ferramenta que proporciona

novas formas de pensar e de aprender e ajuda os alunos na construção de

significados.

Com a construção do robot as alunas trabalharam a parte motora e

conseguiram fazer a leitura das instruções de uma forma surpreendente. A aluna de

8º ano, que não sabe ler, conseguiu fazer a leitura das instruções para a construção

do robot de uma forma impressionante e exercitou a sua motricidade fina que está

pouco desenvolvida.

Com a utilização do robot as alunas sentiram a necessidade de aprender a

noção de tempo e interligaram os conhecimentos de forma consciente. Quando

estiveram a programar o robot verificaram que se não tivessem a noção de tempo

não conseguiam definir durante quanto tempo queriam que este se deslocasse e qual

a duração do percurso e das paragens. Já tinha tentado motivá-las para a

importância de aprender as horas quando lhes falava dos horários dos autocarros,

das programações televisivas, dos intervalos de tempo entre as tomas de um

antibiótico mas nada tinha funcionado. Todas estas tarefas eram feitas com

supervisão de um adulto e as alunas não sentiam necessidade de aprender. Sabiam

que alguém as ajudaria e não estavam motivadas. Como queriam utilizar o robot e

programá-lo e tinham consciência de que isso tinha de ser feito com os seus

conhecimentos, era imperativo aprenderem alguns conceitos para poderem pô-los

em prática.

O robot foi a grande motivação que estas alunas tiveram para aprender a

noção de tempo e a porem em prática. O robot era a grande novidade. Mais ninguém

tinha construído um robot, feito a sua caracterização para ser um autocarro e

decidido o que este iria fazer. Eram as únicas e contavam a toda a gente o que se

estava a passar na aula de Matemática. As alunas falavam em todas as aulas da

construção de um robot, de uma rua e de um autocarro. A alegria e motivação eram

contagiantes e esse era o tema de conversa nos intervalos. Outros alunos vinham ter

comigo e perguntavam se era realmente verdade que aquelas duas alunas tinham

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construído um robot. As alunas sentiam-se especiais e valorizadas porque

perceberam que os colegas estavam curiosos e também queriam trabalhar com os

robots. Elas eram o centro das atenções e quando falavam do trabalho que estavam

a fazer sentiam-se importantes.

Com a utilização do robot observei um ambiente de trabalho que estimulou a

análise, a crítica, a partilha de ideias e a procura de novas descobertas como havia

referido Papert (1997). A capacidade destas alunas programarem um robot

surpreendeu todos mas, tal como afirma Paulo Freire (2002), todos os alunos têm

um conjunto de conhecimentos adquiridos de forma natural através de uma

aprendizagem autoguiada que se forem explorados são a base para aprendizagens

muito importantes. A utilização do robot foi determinante para a criação de um

ambiente criativo que deu às alunas oportunidade de fazer o seu próprio caminho.

Através das suas dúvidas e dos seus sucessos foram ajudando a desenhar a

investigação e deram forma a todo este projeto. Exploraram novos conceitos e novas

formas de pensar. Aprenderam a experimentar com base em resultados obtidos e na

procura de respostas para os seus problemas. A aprendizagem foi acontecendo

nesta tentativa de descoberta pois as alunas iam à procura do conhecimento pela

necessidade que se foi criando. A sua motivação ajudou-as a procurar relações da

Matemática no mundo. Só conseguiram programar o robot quando perceberam

como elas próprias fariam o percurso. Foram à procura do conhecimento pela

necessidade que se foi criando e esse conhecimento é consistente porque as alunas

aprenderam por si.

É muito interessante verificar como as alunas, que desconheciam totalmente

qualquer linguagem de programação, aprenderam a programar mesmo que de uma

forma muito simples. Este facto evidencia ainda mais as potencialidades dos robots

como mediadores da aprendizagem. O desenvolvimento das alunas foi evidente.

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82

5.3 O trabalho de grupo na aprendizagem da Matemática para a

Vida

Trabalhar em grupo é criar um esforço conjunto para resolver um problema.

Com o trabalho de grupo torna-se possível a troca de conhecimentos e o

desempenho de todos pode ser melhorado. Aumenta-se a criatividade e a motivação,

a troca de ideias e experiências e aumenta-se a responsabilização individual devido

à abordagem diferente que se dá aos problemas e aos desafios a ultrapassar.

As alunas, ao trabalharem em grupo, tiveram de partilhar opiniões aprendendo a

respeitar, escolher, avaliar e decidir. Foi um treino de competências essenciais para

a vida e nada melhor que treinar essas capacidades na escola.

De acordo com Fernandes, Fermé e Oliveira (2007), só aprendemos se

conseguirmos atribuir significado à produção do conhecimento e este significado é

tão mais importante quanto mais participativos formos. Puxamos uns pelos outros

e as experiências não formais são capazes de produzir significados importantes.

É na prática que se atribuem significados aos conceitos. Quando estavam a trabalhar

em grupo as alunas sentiam-se confortáveis, trocavam ideias, discutiam opiniões e

esta partilha aumentava o seu conhecimento. Inicialmente sentiram algum

desconforto pois não estavam habituadas a trabalhar em grupo. Quando começaram

a ver o que poderiam fazer se unissem esforços começaram a trabalhar

verdadeiramente em equipa, a tomar decisões e a assumir responsabilidades pelo

seu trabalho.

Cresceram muito com o trabalho em equipa. Erravam, discutiam o erro,

percebiam esse erro e tentavam corrigi-lo o que possibilitou e evidenciou um grande

progresso nestas alunas. Aprendi com elas que por mais dificuldades que se tenha

somos sempre capazes de ir mais além. Com passos pequeninos aprenderam a

aprender e a construir o seu conhecimento num trabalho de equipa onde ambas

ganharam com as situações únicas que vivenciaram.

As alunas eram o centro de todo o processo e ao trabalharem em grupo

tiveram oportunidade de crescer enquanto pessoas e desenvolver talentos.

Aceitaram as suas limitações e tomaram conhecimento das suas habilidades

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enquanto grupo que trabalhava com a mesma finalidade. Pude observar que quando

estavam a trabalhar em grupo sentiam-se bem e trocavam ideias. Como refere Zilli

(2004) a robótica educacional pode desenvolver, entre outras competências, as

relações intrapessoais e interpessoais e a representação e comunicação. Pensavam

sobre a maneira de funcionamento das coisas, faziam experiências, observavam e

tentavam corrigir os erros. A interação entre as alunas e as alunas-robot aconteceu

tanto nível social, cognitivo como afetivo.

No ambiente livre e autónomo de aprendizagem que se criou as alunas

sentiam-se à vontade para mostrar o que sabiam e investigar sem medo. Notou-se

um ambiente de responsabilidade partilhada que veio melhorar a organização, a

criatividade, a participação e um entusiasmo crescente propício à aprendizagem.

Não havia o receio de arriscar ou de dizer algo incorreto. A postura na turma base

mudou, passaram a estar mais integradas e sociabilizaram de uma forma natural

pois tomaram consciência da importância que tinham ao serem as protagonistas de

um projeto que suscitava curiosidade nos seus colegas. Através deste projeto

passaram a ter voz na turma.

Acima de tudo, agradou-me observar que além dos conceitos trabalhámos

valores como a amizade, o trabalho de grupo e a resolução de problemas num

ambiente de sala de aula propício ao desenvolvimento intelectual, afetivo e social,

assente num clima de respeito mútuo, de diálogo, de troca de ideias e opiniões que

permitiu que as alunas participassem com liberdade e aceitassem as ideias uma da

outra.

5.4 Reflexão final

Com este trabalho de investigação houve um crescimento conjunto de todos

os intervenientes. Aprendi e cresci com as minhas alunas. Construíram o

conhecimento ao seu ritmo e pude orientá-las na magnífica descoberta do saber.

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84

Estamos a falar de duas alunas que raramente recebem elogios e que passaram a

sentir-se consideradas. Acabaram por revelar-se extraordinárias e capazes de coisas

que nunca tinham feito ao adquirirem competências a diversos níveis.

Para mim fica uma experiência de vida que nunca esquecerei. Os alunos com

NEE merecem um ensino com qualidade e temos de encontrar formas de responder

às suas limitações educativas. Temos de caminhar lado a lado com eles na

construção de uma escola e de uma sociedade cada vez mais inclusiva e lutar pela

igualdade de oportunidades. É necessário permitir que estes alunos interajam num

meio estimulador e motivador derrubando fronteiras e oferecendo possibilidades

de crescimento. Todos os alunos aprendem de maneira diferente. O essencial é criar

ambientes educativos ricos onde o aluno passe a ser um agente ativo na sua

aprendizagem. É preciso diluir o preconceito ao máximo e atuar de forma a

promover o desenvolvimento humano.

Temos de trabalhar com sensibilidade e com o objetivo de chegar ao coração.

Existem sentimentos que prejudicam a aquisição de conhecimentos. É impensável

que um aluno com medo e cheio de ansiedade aprenda. O medo paralisa.

A aprendizagem de coisas tão básicas mas essenciais passa muito pelo afeto.

É importante estimular emoções que revitalizem a aprendizagem e nos estimulem a

vencer obstáculos.

Temos de acreditar nos nossos alunos e naquilo que podemos fazer por eles.

Eles são uma aposta viável desde que lhes proporcionemos as aprendizagens

adequadas às suas necessidades específicas. Ser diferente não é ser inferior mas ter

direito à igualdade de oportunidades e a ser respeitado nas suas especificidades e

particularidades. Vivemos numa sociedade fechada sobre si mesma, que não é

sensível à diferença e limitamo-nos a catalogar os outros vendo apenas se se

enquadram no dito tipo “padrão”. Limitamo-nos a agir e não pensamos na dor que

sente quem é diferente quando o diagnóstico das suas limitações deita por terra

todos os sonhos e esperanças de uma vida. A importância da sua participação numa

escola e numa sociedade inclusivas é inquestionável. A escola e a sociedade são de

todos e se não aceitarmos a diferença e fizermos o que está ao nosso alcance para

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atenuar o sofrimento de quem é colocado de parte estamos a contribuir para um

mundo preconceituoso que apenas investe no indivíduo “padrão”.

As expetativas dos pais não podem ser defraudas dizendo-lhes que o dia de

amanha será sempre cor-de-rosa, sem lutas e desafios a ultrapassar mas é

imperativo que lhes demos a mão e não os deixemos desorientados a fazer um luto

permanente à procura de uma culpa que não existe. A escola tem de ajudá-los a

percorrer o caminho, nem sempre fácil, da valorização das pequenas conquistas.

Temos de oferecer a todos oportunidades de aprendizagem que os façam crescer

enquanto pessoas e lhes permitam uma integração o mais fácil possível numa

sociedade que não está preparada para viver lado a lado com a diferença.

O futuro só faz sentido quando trabalharmos no aqui e agora com o que temos

e não com o que poderíamos ter. Temos de olhar juntos para o futuro com o coração

pois só desta forma seremos capazes de ver e caminhar para um futuro risonho e

colorido para todos.

Na relação de respeito que se estabeleceu entre mim e as alunas e entre as

próprias alunas despertaram-se interesses e objetivos e saímos mais ricas desta

troca de ideias e partilha de opiniões.

Tinha tentado ao longo de outros anos que compreendessem alguns dos

conceitos que tivemos oportunidade de trabalhar ao longo da minha investigação e

o resultado não tinha sido o esperado. Sabiam aplicar naquele instante mas esse

conhecimento não ficava interiorizado. Não estavam a atribuir significados àquelas

aprendizagens. Com a ajuda do cenário de aprendizagem e com recurso ao robot as

alunas envolveram-se de tal maneira na construção de significados e no

desenvolvimento de capacidades que os conteúdos foram sendo assimilados sem

que se apercebessem, de uma forma natural e espontânea.

Observei que se foram tornando cada vez mais autoconfiantes e autónomas,

capazes de pensar por si próprias e de procurar resolver os seus problemas. Estas

são competências de extrema importância para um dia mais tarde serem capazes de

enfrentar sozinhas o dia a dia em sociedade.

O trabalho não está terminado, pelo contrário. As capacidades necessárias a

uma integração plena no mundo em que terão de viver tem de ser continuado e as

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competências adquiridas têm de continuar a ser trabalhadas para não se correr o

risco de todo o trabalho ser em vão.

Sinto cada vez mais que o trabalho dos alunos na aprendizagem é essencial e

insubstituível mas a responsabilidade de promover as suas aprendizagens é nossa.

Temos de construir com os alunos contextos que os ajudem na descoberta do saber

e o mais importante é estimular a aprendizagem de “aprender a aprender”.

Com os alunos dos Currículos Específicos Individuais as pequenas conquistas

têm o sabor das grandes vitórias e cada passo dado é mais um degrau conquistado

na difícil escada da felicidade para estes alunos de quem, erradamente e por vezes,

pouco se espera. Todo o trabalho desenvolvido vale a pena ainda que seja por um só

aluno.

Pretendo continuar a minha descoberta e luta pela igualdade de

oportunidade neste mundo tão igual ao nosso mas que trava lutas tão desiguais para

poder ter acesso a tudo o que tem direto. Vou continuar a investigar e a desenvolver

projetos para tornar o ensino mais adequado e atraente à diversidade de alunos que

abrange. Espero que surjam oportunidades de aperfeiçoamento e que possa

continuar a sonhar e a pôr em prática esses sonhos sem crenças limitadoras nem

medos sendo capaz de reinventar o hoje com vista a um amanhã melhor...

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Anexos

Anexo A - Ficha de diagnóstico

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1. Na figura estão desenhados alguns objetos de uso corrente.

A cada um deles pode associar-se um sólido geométrico. Completa a tabela:

2. Associa a letra que representa cada sólido ao número correspondente à sua planificação.

2013/2014

Escola Básica e Secundária de Santa Cruz

Departamento de Ciências Exatas e da Natureza e Tecnologias

Ficha de trabalho Data: ___/11/2013 Conteúdos: Sólidos Geométricos Prof: Regina Alves

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3. Observa a figura.

3.1 Com que planificação podes construir um prisma triangular? __________________

3.2 E um prisma pentagonal? ___________________

4. Acaba de preencher as etiquetas. Base Vértice Aresta Face lateral

5. Observa:

Em quais estes sólidos:

5.1 a base é um círculo? ________________________________________________________

5.2 a base é um polígono? ______________________________________________________

5.3 as faces laterais são triângulos? _______________________________________________

5.4 as faces laterais são retângulos? _______________________________________________

6. Conta e completa :

Triângulos Quadrados Círculos Retângulos

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Anexo B – Cenário implementado

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Preparando para a vida: a Geometria e os robots

Contexto/ambiente: Este projeto terá a duração de um semestre e será

implementado na disciplina de Matemática para a Vida a duas alunas de Currículos

Específicos Individuais.

As aulas serão preferencialmente de grupo e as tarefas serão realizadas com

o apoio da professora titular da turma. A primeira fase será de diálogo de modo a

aferir interesses comuns, delinear o projeto e a forma de o por em prática. Pretende-

se trabalhar com os poliedros, a noção de tempo e o dinheiro.

As alunas terão contato pela primeira vez com um robot NXT e com o seu

ambiente de programação. Terão de construir um robot e programá-lo para

percorrer um determinado percurso. O robot será caracterizado por elas de acordo

com os seus interesses, de forma a estar bem enquadrado na sua criação e a fazer

um percurso predefinido.

Para quê?: Com a criação do cenário de aprendizagem pretende-se trabalhar

diversos conteúdos com foco na geometria, nomeadamente os polígonos e a sua

classificação quanto ao número de lados bem como os sólidos geométricos e as suas

propriedades. Para a construção dos poliedros será necessário identificar as

unidades de medida e utilizar instrumentos de medição. Construir e programar um

robot seguindo as instruções fornecidas pelo manual, que representará o veículo

que utilizarão para percorrer a rua, bairro ou cidade. Pretende-se que sejam capazes

de identificar as horas e representar medidas de tempo. Será ainda estudado o

dinheiro, com o intuito de reconhecer as notas e moedas de euro e realizar

contagens do mesmo.

Enredo e sequência das atividades: Num primeiro momento será proposto a

identificação de objetos que as alunas veem no percurso até a escola e que podem

ser associados a formas geométricas. Na sequência, pretende-se lançar o desafio

para a construção de um lugar (cidade, escola, rua) que será concebido utilizando

elementos construídos pelas alunas. Enquanto fazem planificações e constroem

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poliedros vão trabalhar a classificação dos mesmos e seus elementos.

Inevitavelmente será necessário falar de medidas de comprimento, o que será

salutar para abordar o tema sobre medidas.

Em simultaneo será apresentado um robot, que as alunas vão montar e

programar, que será introduzido no cenário com o principal objetivo de trabalhar a

noção de tempo. Elas deverão decidir qual o veículo que o robot representará e

caracterizá-lo. Inicialmente serão lançados alguns desafios de programação para

que as alunas possam começar o seu trabalho e trocar ideias.

Em outro momento as alunas deverão fazer um convite que enviarão uma à

outra por correio. Para isso terão de deslocar-se, com a professora, à estação dos

correios, efetuar o pagamento, selecionar a quantia exata ou verificar se o troco está

correto.

Finalmente, para a aplicação final do projeto voltarão a ter de programar o

robot, para percorrer o local criado por elas com os objetos que construíram.

Porquê?: A implementação do cenário pretende contribuir para o desenvolvimento

de novas competências, proporcionando a estas alunas novas oportunidades de

aprendizagem e momentos de descoberta e de partilha. Espera-se que as alunas

ganhem mais autonomia, tornando-se capazes de tomar decisões e enfrentar

desafios, de colaborar com os colegas e com outros intervenientes em assuntos

relativos ao ensino da Matemática e desenvolvam capacidades para usar a

Matemática em combinação com outros saberes, na compreensão de situações reais.

Interdisciplinariedade: Ao longo do projeto desenvolver-se-ão conhecimentos

específicos das áreas curriculares da Matemática, da Informática, da Língua

Portuguesa bem como da Educação Visual e Expressão Plástica.

Recursos e Materiais: Robot da Lego, modelo NXT; Instruções de montagem do

robot; computador; cartolinas; réguas e esquadros; material de escrita; papel

autocolante; tesouras; cola; câmara de vídeo e máquina fotográfica.

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Anexo C – Fotografias

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Figura C1: Uma das casas da aluna de 7º ano. Figura C2: Uma das casas da aluna de 8º ano.

Figura C3: Experiências de programação.

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Figura C4: Casa da aluna de 8º ano depois de colados todos os elementos.

Figura C5: Casa da aluna de 7º ano depois de colados todos os elementos.

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Figura C6: O jardim, com árvores, mesas e bancos.

Figura C7: A aluna de 8º ano a fazer o convite para a colega.

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Figura C8: O cenário.

Figura C9: O autocarro caracterizado junto do cenário.

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Figura C10: O autocarro preparado para percorrer a rua.