encarando os desafios da vida

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Encarando os desafios da vida: uma conversa com adolescentes Simone G. Assis Renata P. Pesce Joviana Q. Avanci Kathie Njaine

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Encarando os desafios da vida:

uma conversa com adolescentes

Simone G. Assis

Renata P. Pesce

Joviana Q. Avanci

Kathie Njaine

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Equipe de pesquisadores

Simone G. Assis – coordenação

Renata Pires Pesce

Joviana Quintes Avanci

Raquel de V. C. Oliveira

Lucimar Câmara Marriel

Juaci Vitória Malaquias

Nilton César dos Santos

Luciane Ramos de Moraes

Sheila Santos

Consultoria

Kathie Njaine

A pesquisa que deu origem a este texto foi financiada majoritariamente pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF,

recebendo o apoio do Departamento de Epidemiologia e Estatística da ENSP/Fiocruz. Também contou com bolsistas do Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/CNPq e do Programa PIBIC do CNPq/Fiocruz.

Capa: Margareth de Vasconcellos Carvalhaes de Oliveira

Editoração Eletrônica: Tatiana Lassance Proença/SDE/ENSP/FIOCRUZ Revisão: Mara Lúcia Pires Pesce

Impressão: Multimeios/CICT

Estagiários

Renata Alves Pereira da Silva

Anderson Martins Silva

Apoio Técnico

Marcelo Silva da Motta

Marcelo da Cunha Pereira

Jerônimo Rufino dos Santos Júnior

CDD – 305.23 A848e Assis, Simone Gonçalves de Encarando os desafios da vida: uma conversa com adolescentes./ Simone Gonçalves de Assis. -- Rio de Janeiro: FIOCRUZ/ENSP/CLAVES/CNPq, 2005. 38p. il. 1. Adolescente.2.Resiliência.3.Risco.4.Proteção.I.Fundação Oswaldo Cruz. II. Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde “Jorge Careli”. III.Fundo das Nações Unidas para a Infância. IV. Pesce, Renata. V.Avanci, Joviana Q. VI. Njaine, Kathie.

Ficha catalográfica

AgradecimentosCoordenadoria da Metropolitana II – Secretaria Estadual de Educação do Rio de JaneiroSecretaria Municipal de Educação de São Gonçalo/RJ

Escolas públicas e particulares que participaram da pesquisa

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O que é RESILIÊNCIA?

Como surgiu a pesquisa

Conhecendo mais sobre resiliência

Problemas que atravessam a vida dos adolescentes

Dificuldades de ser pobre

Problemas de saúde na família

Brigas e separação dos pais

Crescer numa família violenta

Perda dos pais e dos irmãos

Problemas com amigos e na escola

Violência urbana e medo da cidade

Proteção e afeto ajudando a vencer os desafios

O afeto que constrói o sentimento de segurança

O apoio que lança para a vida

A importância da família

Índice

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O ‘calor’ das amizades que aquece o coração

A proteção da escola e da comunidade

Descobrindo caminhos para enfrentar as dificuldades

Três maneiras de lidar com problemas

Encarando os problemas com muita arte e humor

O que é meu; o que é seu e o que é de cada um

Gostar de si e satisfazer-se com a vida

Sentir-se competente

Os mistérios e a crença na ajuda espiritual

A dificuldade de vivenciar transtornos emocionais

O comportamento do adolescente e as normas sociais

“Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”

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Agradecimento Especial

Aos adolescentes do município de São Gonçalo/RJ, que foram os principais protagonistas destelivro. Suas opiniões, sentimentos, confissões e idéias sobre suas histórias contribuíram para quecompreendêssemos melhor o mundo dos jovens.

Com certeza outros jovens se identificarão com algumas experiências relatadas neste livro que buscaconversar sobre essa força tão potente que existe em cada um de nós e que é capaz de nos ajudar asuperar as dificuldades da vida.

Conhecer nossas potencialidades é uma maneira de nos conhecermos melhor para lidarmos comconfiança nos momentos bons e difíceis da vida.

Nunca deixe que lhe digam

Que não vale a pena

Acreditar no sonho que se tem

Ou que seus planos nunca vão dar certo

Ou que você nunca vai ser alguém

Se você quiser alguém em quem confiar

Confie em si mesmo

Quem acredita sempre alcança

Mas é claro que o sol

Vai voltar amanhã

Mais uma vez, eu sei

Mais uma vez – Renato Russo

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Apresentação

Por que alguns garotos e garotas experimentam situações de traumas, de medo e de violência econseguem tocar a vida pra frente, construindo caminhos positivos; enquanto outros adolescentespassam por iguais situações de traumas, abusos e decepções e encontram mais dificuldades emsuperá-las, se entregando mais facilmente aos problemas?

Ainda não existe uma resposta definitiva para essa pergunta que tantas vezes nos fazemos. Mas aciência têm tentado encontrar alguns caminhos para respondê-la. Para essa capacidade de superartraumas, violências e contrariedades que umas pessoas têm e outras nem tanto, a Psicologia chamouresiliência. Na verdade, os psicólogos tomaram esse nome emprestado da Física já que resiliência é olimite de deformação máxima que um corpo é capaz de agüentar sem sofrer alterações permanentes– é como um colchão onde a gente se deita e afunda e, depois que a gente levanta, ele volta à suacondição de uso.

A teoria da resiliência pode ser uma pista para prevenção da violência. Contudo, o que temos apren-dido com este conceito, é que a resiliência não é um atributo que nasce com o sujeito, mas sim umaqualidade que nasce da relação da pessoa com o meio em ela vive; e que pode fortalecê-la parasuperar as dificuldades e violências vividas. Desta forma, a resiliência pode ser trabalhada e estimu-lada por qualquer grupo social ou instituição (escolas, comunidades, profissionais, familias) no senti-do de potencializar respostas positivas pelos adolescentes às adversidades. Saber por quê uns e nãotodos têm mais dificuldades de superar e reagir positivamente às violências sofridas consiste emnosso desafio.

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Acreditamos que ao responder essas questões, podemos encontrar caminhos para ajudar o Brasil eos adolescentes brasileiros a enfrentar e interromper o chamado ciclo da violência que atinge milhõesde crianças e adolescentes, muitas das quais sofrem processos traumáticos e reagem negativamen-te, prejudicando suas próprias vidas. Por isso, o Fundo das Nações Unidas para a Infância, UNICEF,tem o prazer de ter apoiado este estudo realizado pelo CLAVES (Centro Latino-Americano de Estu-dos de Violência e Saúde Jorge Careli) sobre essa capacidade chamada resiliência.

Para o UNICEF, entender a resiliência significava ouvir os adolescentes. E foi exatamente isso o queo CLAVES fez. Afinal, é fundamental ouvir garotos e garotas se quisermos dar um ‘basta’ a essaviolência que assusta, que torna ainda mais dura a vida e às vezes chega a destruir o futuro de muitosmeninos e meninas pelo Brasil.

O estudo ouviu 1.923 adolescentes, como você, com idades entre 12 e 19 anos, em um município declasse popular no Rio de Janeiro. E, para você, o que pode ajudar um adolescente a superar traumase situações adversas, que milhões de adolescentes em todo o Brasil enfrentam todos os dias?

Boa leitura.

Marie-Pierre Poirier

Representante do UNICEF no Brasil

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O que é RESILIÊNCIA?

Meu pai e minha mãe estavam querendo se separar (...) foi muito ruim (...) eume sentia triste (...) ficava calado e quando ficava longe de um, eu sentia saudade dooutro. (Rogério)

Como podemos sentir no depoimento do Rogério, a tristeza pela separaçãodos pais marcou fortemente um momento de sua vida. Rogério não se deixou abaterpor esse momento e conseguiu superar essa tristeza. Assim como ele, todos os ado-lescentes passaram por uma situação difícil em suas vidas. Mas nem todos enfrentaram os problemas damesma forma.

Dar a volta por cima e tentar superar as adversidades da vida é o que chamamos de “resiliência”. Ésobre essa força para seguir em frente, apesar dos problemas que a vida nos coloca, que queremos conver-sar com você.

Esse livro mostra que todos somos capazes de enfrentar e superar constantemente as situaçõesdifíceis, principalmente quando buscamos apoio dentro de nós e nas outras pessoas. Mas isso não significaque ser resiliente é ser resistente a tudo na vida.

Pessoas de qualquer idade passam por problemas que causam tristezas e decepções. Algumas mos-tram mais potencial para superar e construir caminhos positivos apesar dessas circunstâncias. Outras têmmais dificuldade e podem se entregar mais facilmente aos problemas. O que acontece e por que algumaspessoas – e não todas – são mais facilmente atingidas pelas adversidades?

?

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Como surgiu a pesquisa

O Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF e pesquisadores do Cen-tro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde Jorge Careli da Fundação OswaldoCruz se uniram para compreender como meninos e meninas lidam com as dificuldades ecomo alguns problemas podem afetar sua saúde física e mental.

Dificuldades enfrentadas durante a infância podem marcar a vida de todos. Masé importante apostar na promoção da saúde de crianças e adolescentes, dizem os pesquisadores do mundointeiro, para que na vida adulta as pessoas sejam capazes de compreender melhor os problemas, buscarsoluções e ter mais autonomia e confiança.

A pesquisa sobre resiliência buscou então conhecer dois lados da vida dos adolescentes:

A adversidade – situações difíceis de vida que enfrentam.

A proteção – condições internas e externas que ajudam uma pessoa

a se reconstruir diante do sofrimento causado por uma adversidade.

Para isso os pesquisadores, em 2003, entrevistaram 1923 adolescentes entre 11 e 19 anos de idade(7ª/8ª séries e 1º/2º anos do ensino médio), de 38 escolas públicas e particulares do município de SãoGonçalo, no Estado do Rio de Janeiro. São esses jovens de todos os níveis sociais, raças e religiões, as“estrelas” que mostram, neste livro, como é possível compreender e estimular em cada um o potencial desuperação das adversidades que a vida impõe. Como protagonistas de suas próprias vidas, também ensi-nam como na adolescência pode-se viver momentos de alegria e de emoção.

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Conhecendo mais sobre resiliência

A capacidade de dar a volta por cima nos problemas nasce da mistura quecada pessoa faz de suas características individuais (ousadia, temor ou timidez, porexemplo) e aquilo que recebe de seu ambiente familiar e social (segurança ou insegu-rança). O adolescente interage continuamente com o meio em que vive e essa troca éo principal ponto que pode ajudá-lo a lidar positivamente com as adversidades.

Todos os meninos e meninas possuem capacidade para superar as dificuldades em maior ou menorgrau. Mas alguns estão mais vulneráveis a algumas situações que causam sofrimento e dor, reduzindo acapacidade de superação. Estar ou sentir-se vulnerável reduz a força para enfrentar os problemas. Masquando a pessoa está ou se sente fortalecida e resiliente tem mais coragem para lidar com as situaçõesdesfavoráveis de vida e sair delas com mais força.

Para entender melhor o que é resiliência é importante pensar que:

Superar as dificuldades não significa escapar sem marcas das situações difíceis.

As adversidades deixam feridas mais ou menos profundas e duradouras, de

acordo com a forma como cada um reage às situações adversas.

A capacidade de resiliência varia ao longo da vida. Uma pessoa capaz de superar

uma situação difícil em um momento pode não ter a mesma capacidade em outras

situações ou em outros momentos.

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Problemas que atravessam a vida dos adolescentes

QueiraBasta ser sincero e desejar profundo

Você será capaz de sacudir o mundo, vaiTente outra vez

TenteE não diga que a vitória está perdida

Se é de batalhas que se vive a vidaTente outra vez – Raul Seixas, Paulo Coelho e Marcelo Motta

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As adversidades podem afetar o crescimento e desenvolvimento de crianças e adolescentes, mesmoaquelas ocorridas antes do nascimento. Todos os adolescentes da pesquisa de São Gonçalo passaram porvárias situações de vida difíceis. Mas cada um deles reagiu de um jeito próprio a cada problema enfrentado,de acordo com o seu temperamento e com o apoio recebido de outras pessoas.

Existem situações mais prejudiciais ao desenvolvimento do ser humano e que podem acarretar danosgraves em outras etapas da vida. As experiências consideradas muito dolorosas para crianças e adolescen-tes são as guerras e as catástrofes naturais que matam, mutilam e deixam traumas para sempre em suasvidas. Mas, outras experiências também podem marcar negativamente suas vidas: o abandono, as doençase mortes na família, os conflitos e a separação dos pais, a ausência prolongada da mãe ou do pai, a situaçãode pobreza e a convivência com a violência, seja ela física, psicológica ou sexual.

Qualquer adversidade se torna gravemente prejudicial quando altera a capacidade da pessoa sentirou manifestar afeto e manter a convivência com os outros. Passar por muitos problemas pode comprometerbastante a vida de um adolescente; porém, um único problema grave, por vezes, pode derrotar um jovem. Afase da vida em que ocorrem os problemas também faz diferença: algumas coisas são insuportáveis quandose é criança e mais facilmente manejáveis ao se tornar adolescente (e vice-versa). Tudo isto mostra comopode ser tão diferente a forma como cada pessoa percebe e encara os problemas que vivencia: uma mesmasituação pode ser vivida como adversidade por uma pessoa e como desafio para outra. Por isso é importan-te pensar sobre as dificuldades e nas maneiras positivas ou negativas de enfrentá-las.

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Dificuldades de ser pobre

Viver em condições econômicas difíceis é um risco para o de-senvolvimento de crianças e adolescentes. Pode levar o jovem e suafamília a ter problemas de saúde, dificuldades na escola e na vidasocial. A desigualdade social e econômica pode levar também à faltade emprego constante, moradia precária, discórdias e violências. En-fim, pode afetar a qualidade de vida de meninos e meninas.

Adolescentes cujos pais têm mais estudos vivem menos problemas econômicos. Mais da metade dosalunos de São Gonçalo já teve seus pais desempregados e já viveu sérios problemas financeiros na família,tendo sofrido mais agressões físicas cometidas pelo pai, mãe e irmãos, bem como vivenciado mais violênciaentre pais, na escola e na comunidade. Também se mostram mais vulneráveis à humilhação e passaram poroutras formas de violência psicológica.

A pobreza costuma afetar a capacidade da família de supervisionar melhor os filhos: nas mais pobres,o relacionamento dos filhos com o pai mostrou-se bem conflituoso, contribuindo para a violência familiar.

É legal saber que pobreza e resiliência não andam juntas!

Ter elevada capacidade de superar dificuldades é uma

característica tanto de pessoas pobres como ricas.

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Problemas de saúde na família

Os problemas de saúde na família são situações altamente estressantesna vida dos adolescentes de São Gonçalo. A maioria deles passou por diferen-tes tipos de problemas médicos em suas famílias. As mortes de parentes próxi-mos, as doenças ou acidentes de familiares e a morte de animal de estimaçãoforam os problemas mais citados pelos jovens da pesquisa. Também forammencionadas doenças graves vividas pelos próprios adolescentes e problemasde deficiência física ou mental na família.

Outro problema que deixa conseqüências graves é o consumo de álcool e drogas por familiares.Adolescentes cujos familiares tinham problemas com álcool e drogas já se embriagaram mais, consumirammais maconha e apresentaram mais problemas psicológicos. Esses adolescentes geralmente têm mais bai-xa auto-estima, estão mais insatisfeitos com suas vidas e têm mais dificuldade de relacionamento com osoutros. A violência também está mais presente nesses jovens, com muitos relatos de agressões físicas everbais cometidas contra os membros da família, geralmente pelo pai alcoolizado.

Adolescentes mais resilientes relatam problemas de saúde na família na mesma intensidade que osmenos resilientes. Mas, os adolescentes mais resilientes olham mais adiante, dizendo coisas como: “a gentetem que superar, vai fazer o quê?”.

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Brigas e separação dos pais

Conflitos na família podem causar sérios danos para meninos e meninas.Os pais são muito importantes para equilibrar esses conflitos, mas, muitasvezes, eles são seus principais causadores. Quase metade dos adolescentesentrevistados alegou que os motivos para as desavenças são as discussõespor causa dos filhos. Foram muitos os relatos de separação dos pais, novoscasamentos da mãe ou do pai e o nascimento de irmãos, que vão disputar aatenção e o carinho dos pais.

Embora as brigas comumente antecedam ao momento de separação dos pais, o rompimento e o novoarranjo familiar podem acabar por ajudar o adolescente. Muitas famílias, após a separação, até brigammenos e ficam mais afetuosas. Outras famílias que ficam juntas, mesmo vivendo em conflito, podem preju-dicar o adolescente se no dia-a-dia o relacionamento for agressivo e humilhante, e se o cuidado com osfilhos for pouco. Nessa situação, os adolescentes costumam ter pouco amor próprio, problemas emocionaise fazem uso de bebidas alcoólicas e outras drogas; também surgem várias dificuldades na escola e norelacionamento com professores.

A resiliência do adolescente não se abala só porque seus pais brigam ou se separam. Mas, entre osjovens com mais dificuldades de superação de problemas, o conflito familiar é super valorizado, impedindo-os de olhar para frente, para o próprio futuro.

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Crescer numa família violenta

A violência na família traz muito sofrimento para o adolescente, atingindo igual-mente famílias ricas e pobres. Quando ela é praticada pelos pais, de quem se esperaafeto e proteção, o trauma pode ser ainda maior.

Uma das formas de violência mais difícil de detectar e mais prejudicial para aformação da pessoa é a psicológica, que ocorre quando as pessoas humilham, de-monstram falta de interesse, fazem muitas críticas, colocam sentimento de culpa,desencorajam, ignoram sentimentos ou cobram excessivamente o adolescente. Meta-de dos adolescentes da pesquisa já passou por esse problema e seu potencial deresiliência ficou comprometido: desvalorizam-se e se sentem pouco capazes de supe-rar os problemas.

Outro tipo de violência muito comum nas famílias dos adolescentes de São Gonçalo é a física, ocorri-da entre os pais, deles em relação aos filhos e entre os irmãos. Embora sofrer violência física na família nãoaltere a capacidade de resiliência, adolescentes vítimas desse tipo de violência tendem a passar por váriosoutros tipos de problemas, como por exemplo, uso de drogas e envolvimento em brigas.

A violência sexual, por sua vez, prejudica ainda mais os adolescentes quando envolve pais, irmãos ououtros familiares. Adolescentes com mais dificuldades para superar problemas vivenciaram mais experiên-cias sexuais envolvendo os pais.

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Perda dos pais e dos irmãos

A morte dos pais ou de outros familiares é um dos acontecimentos maistraumatizantes na vida de crianças e adolescentes.

A primeira preocupação das pessoas é apoiar o adolescente para que rea-ja com coragem à perda de um dos pais ou de um irmão. Nessas horas é muitoimportante sentir a segurança do amor de outras pessoas. Quando a família trans-mite afeto e tranqüilidade, o menino e a menina enfrentam e superam com mais facilidade a dor da perda deuma pessoa querida. Quando a família “morre” junto com a pessoa que se foi, ou quando encontra um“culpado” pelo sofrimento, o convívio familiar fica afetado.

A sociedade também precisa ajudar às famílias nesse momento, oferecendo meios ou apoio de insti-tuições que ajude-as a continuar cuidando dos filhos, diminuindo as conseqüências da perda. Apoiar famíliasnos momentos em que estão muito vulneráveis deveria ser uma preocupação constante.

Os adolescentes de São Gonçalo que perderam os pais ou os irmãos passaram por mais problemaspsicológicos do que aqueles que não vivenciaram essa dor. Mas, o potencial de resiliência é igual tanto paraos que perderam como para os que não passaram por esse sofrimento.

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Problemas com amigos e na escola

Separar-se de amigo próximo por traições, brigas, mudanças de cidade oumorte, gostar de alguém sem ser correspondido e sofrer com o fim de um namo-ro trazem muito sofrimento para o adolescente. Embora não alterem a resiliênciado adolescente, podem estimular o uso de bebidas e drogas, problemas psicoló-gicos, baixa auto-estima e envolvimento com várias formas de violência.

Problema de relacionamento com colegas de escola é outra fonte deestresse. Essa forma de violência, conhecida pelos pesquisadores como “bullying”, ocorre em escolas detodo o Brasil e do mundo. São comportamentos prepotentes e agressivos entre colegas, com humilhações,ameaças, agressões, perseguições, roubos e destruição de pertences. É também comum discriminar o outropor ser negro, pobre ou por ser considerado feio, colocando apelido e “esculachando”. Adolescentes maisvelhos e do sexo masculino são os “campeões” nesse tipo de atitude.

Outra fonte de sofrimento para alguns adolescentes é a necessidade de ser bem sucedido na escola.Tirar notas ruins ou ser reprovado pode provocar angústia e sentimento de incompetência. Freqüentemente,o aluno não é o único responsável por fracassar na escola. Diretores, professores e familiares tambémpodem ajudar ou dificultar o desenvolvimento escolar do jovem.

A escola pode também se tornar um grande problema para o adolescente, quando se torna um localdesagradável, injusto e inseguro. Os problemas na escola não diminuem o potencial de resiliência dos jo-vens, mas aqueles que passam por mais dificuldades escolares usam mais drogas e álcool e desafiam maisas regras sociais. Sofrem ainda mais problemas psicológicos e têm mais baixa auto-estima. Também sãomais vítimas de todas as formas de violência na família, na escola e na localidade e vivem mais dificuldadeno relacionamento na família, com amigos e professores.

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Violência urbana e medo da cidade

A violência das grandes cidades causa temor em todos. Nas comuni-dades com maiores dificuldades sociais e econômicas o problema da violên-cia às vezes se agrava. Nessas localidades muitas vezes faltam postos desaúde, escolas, moradias adequadas, segurança e as ações criminosas sãomais freqüentes. As famílias dessas comunidades sofrem muitas agressõese seus jovens estão expostos a vários riscos de vida, tendo principalmenteseu direito de ir e vir violado.

Muitos meninos e meninas de São Gonçalo já testemunharam assassinatos, tiroteios, enfrentaramsituação de perigo e insegurança na vizinhança e tiveram suas casas arrombadas ou roubadas. Adolescen-tes mais atingidos por essas formas de violência abusam comumente de drogas e praticam mais atos dedesrespeito às pessoas e ao local em que vivem.

A capacidade de superação dos problemas está presente tanto entre os que passaram por problemasde violência urbana como os que não sofreram esses traumas. Preocupa o fato de que vítimas de violênciaurbana tendem a ser também vítimas na escola e na família.

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Proteção e afeto ajudando a vencer os desafios

Jamais conseguimos liquidar nossosproblemas, sempre resta deles algum

vestígio, mas podemos dar-lhes uma outravida, mais suportável e, às vezes,

até bonita e com sentidoBoris Cyrulnik. Os patinhos feios. 2004:12

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Como vimos até agora, os problemas sempre existem na vida de todas as pessoas. Mas, o importanteé que eles sozinhos não costumam interferir na capacidade de resiliência de um adolescente. Isso aconteceporque outros fatores atuam protegendo. Esse é o assunto que vamos comentar daqui para frente, porqueele é importante para entendermos como é possível se tornar resiliente.

Receber apoio e carinho da família e dos amigos para enfrentar as adversidades é importante parafortalecer a resiliência. As experiências negativas são ainda mais dolorosas para quem conta com pouco ounenhum apoio, seja porque não consegue solicitar ajuda ou porque não a possui de fato. É o meio afetivo ea condição material que nos protegem para enfrentar as dificuldades. Essas condições precisam ser está-veis para nos dar, desde a infância, segurança e confiança no futuro.

A vida proporciona bons momentos e meios para proteger crianças e adolescentes. É preciso acredi-tar e buscar apoios em pessoas e situações que nos ajudem a resolver os problemas. Quanto mais protegi-do, menor é a chance de surgirem conseqüências negativas para a sua vida. Proteger é importante para queo adolescente consiga mais autonomia para dar seus próprios passos. Três tipos principais de proteçãoatuam desde a infância até a vida adulta.

Capacidade individual: autonomia, auto-confiança, auto-estima positiva,

ser afetivo, equilibrar os impulsos, ser maleável com as pessoas.

Apoio familiar para promover estabilidade, dar suporte às dificuldades,

ensinar a respeitar as pessoas e aprender a caminhar por si mesmo.

Apoio social para obter reforço através do bom relacionamento com amigos,

professores ou outras pessoas importantes para vida do jovem e que são

referências seguras, reforçando seu sentimento de ser querido, amado e respeitado.

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O afeto que constrói o sentimento de segurança

Receber apoio constantemente ajuda o adolescente a se sentir seguropara trilhar os caminhos da vida e a estar bem consigo e com os outros. Essesentimento de segurança tende a se conservar no decorrer da vida, mesmoquando se enfrentam momentos de doença, morte, decepção com alguém,separação na família ou qualquer outra situação dolorosa. Mas, esse senti-mento precisa ser reforçado por familiares, professores, colegas e outraspessoas importantes para que permaneça sendo uma base segura ao longoda vida.

Um futuro mais seguro não depende do destino. Quanto maior a capa-cidade de meninos e meninas aproveitarem as experiências positivas com mães e pais, avós e avôs, tias etios, irmãs e irmãos, amigas e amigos, escola e instituições, maior a possibilidade de se sentirem seguros.Mesmo quando ocorre uma situação desfavorável, se o adolescente tem desde sua infância uma “reserva”de afeto e de força, ele estará mais preparado e confiante para buscar seu caminho e superar os obstáculosque encontrar.

Quando uma pessoa passa sua infância e adolescência insegura e com pouco afeto, pode vir a setornar confiante e resiliente mais tarde em sua vida, se o ambiente em que vive lhe possibilitar outras fontesde apoio. Qualquer pessoa tem condições de dar a volta por cima e recuperar a capacidade de receber e darafeto, mas para que isso aconteça, precisa de apoio do meio e de estimular características individuais.

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O apoio que lança para a vida

Existem várias formas de ser apoiado. Uma delas é ser amado: quandotemos alguém que demonstra afeto por nós, que nos dá um abraço e que nosfaz sentir querido. Outra forma é o apoio emocional dado por pessoas que nosescutam quando precisamos conversar, em quem confiamos para falar de nos-sos problemas, que compreendam nossas dificuldades e com quem nos senti-mos à vontade. Podemos ainda encontrar apoio através de informações e con-selhos, da interação positiva com outras pessoas e da ajuda material, em casode necessidade.

A maioria dos adolescentes recebe apoio social do meio em que vive, mas entre os resilientes o apoioé bem mais presente. Quando se é resiliente, tem-se firmeza e convicção do apoio que se tem ou pode vir ater diante de uma dificuldade. Em geral, o sentimento de segurança é tanto que é fácil enumerar uma sériede pessoas as quais se pode pedir ajuda. Sentir-se apoiado é tão importante para os adolescentes muitoresilientes, a ponto de terem também melhor relacionamento com pais, amigos, professores e bom desem-penho na escola, além de maior capacidade de ajudar aos outros, de fazer amizades e de recorrer aosamigos na hora difícil.

Sentir que não tem apoio afeta a resiliência dos adolescentes de ambos os sexos. Aqueles commaiores dificuldades para enfrentar os problemas, preferem guardá-los para si, mesmo quando têm comquem contar. Têm dificuldade em dividir seus problemas e são mais inseguros para indicar pelo menos umapessoa para se abrir e contar com ela ao passar por dificuldades.

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A importância da família

A família tem como função básica apoiar e proteger filhas e filhos.Para que isso aconteça de forma constante, a família precisa ter equilíbrioemocional. Isso não quer dizer que ela é isenta de problemas, mas sim queela tem potencial para encontrar alternativas para solucionar os conflitossem deixar grandes marcas das experiências difíceis vividas. Ela pode aju-dar o jovem a desenvolver seu potencial de resiliência quando oferece:

Respeito no dia a dia da família e nas relações entre seus membros;

Educação, dando exemplo, ensinando as normas sociais e não sendo violenta;

Supervisão, acompanhando cotidianamente o adolescente.

Os adolescentes mais resilientes comumente têm bom relacionamento com irmãos, pai e mãe.Vivenciam mais respeito, alegria, afeto, união, compreensão e confiança em suas famílias. Têm tambémmelhor relacionamento com avós, tios e primos, mostrando possuir um apoio social maior. Sentem-se maistranqüilos, sem muitos problemas e são menos vezes vítimas de maus-tratos. São ainda mais supervisiona-dos pelos pais, que sabem aonde vão quando saem e com quem estão. Os adolescentes com mais dificulda-des de lidar com situações difíceis mostraram convívio familiar mais problemático.

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O ‘calor’ das amizades que aquece o coração

Na adolescência as amizades ocupam lugar importante na vida afetivae social. Grande parte dos adolescentes de São Gonçalo diz ter muitosamigos e um bom relacionamento entre eles.

Os jovens mais resilientes expressam entusiasmo e alegria ao falardos amigos da escola, da comunidade e da igreja e quase todos dizem sesentir bem e feliz na companhia dos amigos, que os aceitam do jeito quesão. Inclusive existe troca de confidências e de apoio nos momentos denecessidade. A facilidade de se relacionar com as pessoas e de se preocu-par com o outro é uma marca desse grupo. Oferecer ajuda e aconselhar os amigos fazem com que se sintamqueridos por todos.

Os adolescentes menos resilientes têm um círculo de amizade menor, são mais reservados e criticammais o jeito dos amigos. Alguns falam ter envolvimento com pessoas que cometem delitos, com brigasseveras e comportamento agressivo.

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A proteção da escola e da comunidade

A escola pode proteger o jovem, se houver espaço para diálo-go, valorização individual, incentivo ao trabalho coletivo, autoridade semautoritarismo da direção, afeto, respeito entre alunos, professores ediretores e participação da família e da comunidade. O desempenhodos alunos e das alunas cresce quando a escola é capaz de ensinarvalores e criar um ambiente de confiança para aprender.

Os adolescentes com maior potencial de resiliência sentem-sebem e protegidos na escola, são mais participativos e se relacionammelhor com colegas e professores. Os menos resilientes mostram mais indiferença e sentimento de injustiçae discriminação em relação à escola e aos professores. Professores e funcionários que sejam sérios, compe-tentes e capazes de incentivar os adolescentes a superarem suas dificuldades de forma afetiva são essen-ciais para que uma escola se torne protetora para seus alunos.

Quando a comunidade oferece serviços públicos de qualidade como creches, escolas, postos desaúde, segurança e habitação ela também oferece proteção às suas crianças e adolescentes. Infelizmente,na realidade brasileira, especialmente nas áreas mais carentes, essa capacidade de proteger ainda estálonge de acontecer. No entanto, a união dos membros de algumas comunidades tem demonstrado o quantoelas são capazes de reduzir o descaso governamental, tomando em suas próprias mãos uma parcela deresponsabilidade de proteção das pessoas mais vulneráveis que ali moram. Se houver um clima de interessee confiança entre os vizinhos, comerciantes e demais pessoas da localidade, pode-se melhorar a proteçãode toda a comunidade.

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Descobrindo caminhos para enfrentar as dificuldades

É isso aí você não pode pararesperar o tempo ruim vir te

abraçar acreditar que sonhar sempreé preciso é o que mantém os irmãos vivo

o pensamento, é a força criadora irmãoo amanhã é ilusório, porque ainda

não existe o hoje é real, é a realidade quevocê pode interferir mas a oportunidade de

mudança, tá no PRESENTEnão espere o futuro mudar a sua vida

porque o futuro, será a conseqüência do presenteA vida é desafio – Racional Mc´s

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Três maneiras de lidar com problemas

As pessoas costumam tomar três tipos de atitudes quando se depa-ram com um problema: enfrentá-lo direta e ativamente, refletir sobre ele eevitá-lo. A escolha de um ou outro modo pode ajudar ou dificultar a suaresolução e agravar ou diminuir suas conseqüências.

Os adolescentes resilientes encontram maneiras positivas de lidarcom as dificuldades. Costumam entrar direto no “olho do furacão”. Tomamatitudes concretas para encontrar a raiz do problema e tentar solucionar a questão e, principalmente, bus-car informações e apoio nas pessoas ou instituições. Procuram ajuda de pais ou outros adultos, amigos eatravés da própria pessoa envolvida no problema. Conversam imediatamente sobre o problema quando eleaparece e depois não se preocupam mais com ele.

Pensar e “ruminar” sobre o problema que se está passando é também muito comum entre os adoles-centes, que buscam dentro de si uma solução. Tanto os mais resilientes quanto os menos resilientes mos-tram igual capacidade de reflexão. Porém, um adolescente que só recorre a essa forma de enfrentar asdificuldades tende a ter mau desempenho na escola e no relacionamento com as pessoas. Também vive maisdificuldades emocionais e costuma usar mais drogas.

Fugir dos problemas é uma outra estratégia de enfrentá-los, mesmo que provoque sofrimento emoci-onal e pessimismo diante da situação. Felizmente, a maioria dos adolescentes não lida com as dificuldades

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dessa forma, a não ser em algumas poucas situações. Os adolescentes mais resilientes evitam os proble-mas em algumas situações específicas, não transformando essa maneira de agir em algo constante.

Quase sempre adolescentes pouco resilientes tendem a preferir essa forma de enfrentamento dasdificuldades. Tendem a evitar o problema sendo pessimistas e usando álcool e drogas para esquecer dificul-dades com os colegas e com o próprio futuro. Sentem-se incapazes de mudar a situação em que se encon-tram, além de tristes, fracos e indecisos. O nervosismo e a impaciência muitas vezes marcam sua atitude,agindo sem pensar, com vontade de brigar e bater na pessoa que causou o estresse ou que tentou controlá-lo.

Quando se é resiliente busca-se a resolução ativa do problema em quase todas as situações, sóevitando-o quando ele está além do seu alcance ou quando ele é impossível de ser solucionado. Já umadolescente menos resiliente age pouco de forma direta pois carece de apoio e sente insegurança diante deuma situação difícil, preferindo fugir das dificuldades.

Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gostaQue hoje eu me gosto muito mais

Porque me entendo muito mais tambémE que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora

É se respeitar na sua força e féE se olhar bem fundo até o dedão do pé

Eu apenas queria que você soubesse – Gonzaguinha

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Encarando os problemas com muita arte e humor

Muitas pesquisas vêm mostrando que trabalhar com arte ou pra-ticar esporte são experiências muito importantes para fortalecer aresiliência, juntamente com a capacidade de encarar com humor asadversidades da vida.

Nem todos possuem talentos artísticos e esportivos que possamajudar a lidar com a dor causada pelo sofrimento vivido em algumasituação. E ter esses dons também não é garantia de que as dificuldades irão desaparecer totalmente, masa criação artística e a disciplina do esporte ajudam a organizar a mente, a expressar e elaborar o sofrimentoe a recriar a vida a cada dia.

O bom humor, por sua vez, nem sempre é visto pelos outros como positivo. Uma pessoa pode utilizaro humor como uma maneira irônica e destrutiva para se defender e atingir outras pessoas, ultrapassando oslimites do bom senso. Essa maneira de encarar os problemas pode ou não aliviar seu sofrimento interno,mas estará reforçando a distância e a dificuldade de relacionamento com as pessoas. Mas o melhor do bomhumor é quando ele é capaz de amenizar a dor através do riso, da brincadeira, da descontração e de falarsobre o problema com mais facilidade.

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O que é meu; o que é seu e o que é de cada um

Muita coisa ainda está para ser descoberta pela ciência sobre ainfluência da biologia e da cultura em que vivemos nas características deinteligência e temperamento de cada pessoa.

Parte das diferenças de temperamento de cada pessoa tem a vercom a sua genética. Outra parte é influenciada pelo modo como é criadae como ela expressa o cuidado que recebeu: de forma mais segura eafetuosa ou de forma mais instável e indiferente. Todos estes ‘temperos’se misturam na vida e podem ser positivos, principalmente se a criançateve o afeto da família e enfrentou poucas situações estressantes.

As características individuais são importantes para formação da capacidade de resiliência de cadaum, mas ainda pouco se sabe sobre a relação entre resiliência e biologia, já que o ambiente em que se vivetem profunda influência nessa relação. Isso significa que todos podemos nos transformar no curso de nos-sas vidas, dentro de nossos limites e possibilidades.

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Gostar de si e satisfazer-se com a vida

Possuir uma elevada auto-estima é fundamental para promover acapacidade de superação de problemas. Os adolescentes que possuemuma elevada auto-estima são mais resilientes, têm melhores relaciona-mentos na família e na escola, mais elevadas notas em português e mate-mática e participam mais em sala de aula. Sentem-se mais competentes,valorizam-se mais, estão mais contentes consigo mesmos e aceitam maiso corpo que têm. Gostar de si está intimamente relacionado a gostar davida que se leva. Meninas e meninos mais resilientes têm mais prazer emviver.

Adolescentes menos resilientes mostram comportamento oposto, sentindo-se mais desencorajadosna escola e incompreendidos pelos professores que reforçam seus sentimentos de incompetência. Tambémnão estão muito satisfeitos com a aparência física, mostrando revolta e valorizando muito mais os defeitosdo que as qualidades. Sentem-se diferentes dos outros, geralmente colocando-se como “menos” inteligen-tes, interessantes, bonitos. A timidez e o desânimo fazem parte do cotidiano desses adolescentes. A faltade satisfação com a vida é outro ponto que se destaca entre os que têm menos habilidade de superação dosproblemas. Esses jovens mostram vários sintomas de sofrimento emocional.

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Sentir-se competente

Sentir-se competente é uma importante característica que prote-ge o adolescente contra o surgimento de problemas emocionais e decomportamento, trazendo uma sensação de bem estar psicológico. Estáintimamente ligado à resiliência. Uma pessoa é considerada competentepela sociedade em que vive quando é capaz de interagir de forma eficazcom outras pessoas e com o seu ambiente social e de obter resultadospositivos frente à metas pré-determinadas como, por exemplo, bom de-sempenho acadêmico e ser confiante na tomada de decisões.

Adolescentes resilientes têm mais confiança em si, acreditando que vão terminar os estudos e conse-guir emprego. Também sabem mais o que fazer para alcançarem os sonhos e metas que têm na vida. Dizempossuir “força de vontade”, “coragem” e “persistência” para “seguir em frente” e “correr atrás dos objeti-vos”. Defendem com freqüência suas idéias e opiniões e conseguem perceber que seus planos estão evolu-indo, enquanto os jovens menos resilientes acham que estão parados ou retrocedendo.

Jovens pouco resilientes não persistem muito quando algo que planejou não deu certo, mostrando-semais desanimados em relação aos seus problemas e se vendo com pouca capacidade de “olhar para frente”.

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Os mistérios e a crença na ajuda espiritual

A espiritualidade é um importante fator de proteção para a saúde física epsicológica do indivíduo. Comumente está ligada à crença religiosa, mas paraalguns também pode ser entendida como uma forma de se posicionar eticamen-te frente aos diversos mistérios e problemas da vida.

Adolescentes resilientes se envolvem mais com religião e expressam acrença e a confiança que têm em Deus como uma força que os sustentam e osajudam a lidar com os desafios e as perdas sofridas. Também a companhia depessoas da igreja tem função positiva, comumente servindo como apoio nosmomentos difíceis. Nos jovens mais capazes de superarem suas dificuldadesconstatam-se menos problemas emocionais e de saúde, menos consumo de drogas e álcool e maior satisfa-ção com suas vidas.

Entre aqueles adolescentes com pouca habilidade para enfrentar os problemas se constatam hábitose características opostas.

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A dificuldade de vivenciar transtornos emocionais

Frente às adversidades é comum que uma pessoa tenha uma sensação de so-frimento mental, que pode existir em um determinado momento ou se tornar um com-portamento mais freqüente, comprometendo a qualidade de vida e de resiliência deum adolescente. Os repetidos conflitos na família ou na escola podem causar rea-ções que imobilizam todo o mundo psicológico do adolescente, provocando sofrimen-to mental e até físico.

Adolescentes mais resilientes dão poucos sinais

de que vivenciam problemas emocionais.

No entanto, o sofrimento emocional está mais presente entre adolescentes pouco resilientes, quetendem a dormir mal, a perder o interesse pelas coisas, a ter dificuldade de pensar com clareza e de tomardecisões e relatam mais se sentirem inúteis. Também têm mais medo e pensamentos de acabar com aprópria vida, bem como têm baixa auto-estima, precário apoio social e relacionamentos complicados compais, amigos e professores.

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O comportamento do adolescente e as normas sociais

O período da adolescência na cultura ocidental é visto como umafase de desafios, de confrontos e de busca pela liberdade. A adolescên-cia é um momento super importante para aprender a conviver e a res-peitar as normas sociais. Compreender e agir de acordo com as leis dasociedade são atitudes mais comuns entre as meninas e os meninosque têm mais facilidade de superar os problemas.

Adolescentes menos resilientes tendem mais a falsificar assina-tura de pessoas em documentos escolares ou de identidade; danificarobjetos como carteiras escolares, vidraças, pichar paredes; brigar com outros grupos de jovens; furtarobjetos; e portar arma branca e de fogo.

Esses adolescentes foram menos protegidos ao longo de suas vidas, possuindo mais baixa auto-estima e sendo menos ligados em religião. Na família, enfrentaram mais dificuldades de relacionamento,mais problemas de saúde, vivenciaram mais prisões de parentes, perda de pessoas queridas causada pordoenças ou assassinatos. Foram pouco supervisionados pelos pais e sofreram várias formas de violência nafamília. Mostraram ainda mais dificuldades na escola e na comunidade, onde convivem com mais violênciaque os jovens mais resilientes.

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“Levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima”

Ali onde eu choreiQualquer um chorava

Dar a volta por cima que eu deiQuero ver quem dava

Reconhece a quedaE não desanima

Levanta, sacode a poeiraDá a volta por cima

Volta por cima – Noite ilustrada

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É possível promover maneiras que ajudem meninas e meninos a se tornarem mais resilientes paraenfrentar as dificuldades da vida. Qualquer pessoa pode dar um apoio: alguém da família, professores,amigos, uma pessoa religiosa, um vizinho ou alguém próximo em quem o adolescente sente confiança eafeto.

Acreditar nas suas próprias forças é uma maneira legal de enfrentar os problemas também. Para issotemos que procurar nos conhecer melhor e descobrir nosso potencial que muitas vezes não exploramos. Ecomo diz o velho samba é possível levantar, sacudir a poeira e dar a volta por cima das dificuldades.

As experiências difíceis também nos ajudam a crescer, a entender melhor o mundo, as pessoas e anós mesmos. E nos ensinam a viver com mais intensidade e a valorizar os momentos de alegria.

Mas não podemos esquecer que é necessário aprender a ajudar os outros a superar também suasdificuldades e a descobrir suas forças internas.

A resiliência pode ser promovida também em grupos como família, escola e comunidades. É possívelprocurar e cobrar das autoridades meios que protejam a família, a escola e a comunidade das adversidadessócio-econômicas.

Os adolescentes e suas comunidades têm o direito de se organizarem para exigir serviços de qualida-de para o bem-estar daqueles que nela habitam. É também possível para uma sociedade que se preocupacom seus membros, prevenir que eventos negativos aconteçam e marquem gravemente a vida das pessoas,bem como atuar mais rapidamente para reduzir as conseqüências de catástrofes.

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Lembre-se que você é o grande protagonista de sua

própria história e pode ajudar a si mesmo, aos outros

e a sociedade, criando, mudando e transformando o mundo.

Experimente começar aqui e agora.

Vivemos esperandoDias melhores

Dias de paz, dias a maisDias que não deixaremos para trás

Vivemos esperandoO dia em que seremos melhores

Melhores no amor, melhores na dorMelhores em tudo

Vivemos esperandoO dia em que seremos para sempre

Vivemos esperandoDias melhores para sempreDias melhores para sempre

Dias Melhores – Jota Quest

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