educar e cuidar no cotidiano da creche: memÓrias … · realiza um olhar observador este auxilia...

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CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA MILENA MORAES DO ESTREITO EDUCAR E CUIDAR NO COTIDIANO DA CRECHE: MEMÓRIAS (AUTO) BIOGRÁFICAS SOBRE O ESTÁGIO NA EDUCAÇÃO INFANTIL ERECHIM 2019

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Page 1: EDUCAR E CUIDAR NO COTIDIANO DA CRECHE: MEMÓRIAS … · realiza um olhar observador este auxilia no desenvolvimento de uma autoavaliação da prática pedagógica diária de quem

CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

MILENA MORAES DO ESTREITO

EDUCAR E CUIDAR NO COTIDIANO DA CRECHE:

MEMÓRIAS (AUTO) BIOGRÁFICAS SOBRE O ESTÁGIO

NA EDUCAÇÃO INFANTIL

ERECHIM

2019

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MILENA MORAES DO ESTREITO

EDUCAR E CUIDAR NO COTIDIANO DA CRECHE: MEMÓRIAS (AUTO)

BIOGRÁFICAS SOBRE O ESTÁGIO NA EDUCAÇÃO INFANTIL

Trabalho de conclusão de curso de graduação

apresentado como requisito para obtenção de

grau de Licenciada em Pedagogia pela

Universidade Federal da Fronteira Sul –

Campus Erechim.

Orientadora: Professora Ma. Flávia Burdzinski

de Souza.

ERECHIM

2019

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Dedico este trabalho a toda minha família, que

esteve presente comigo, em toda minha trajetória

acadêmica, sempre me dando suporte nos

momentos difíceis, e comemorando cada

conquista. Também dedico a todas as crianças da

turma, fonte de inspiração para minhas reflexões,

agradeço imensamente a oportunidade de

protagonizar seus interesses.

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AGRADECIMENTOS

Sou muita grata pela oportunidade de cursar Pedagogia em uma instituição pública,

como a Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS, campos Erechim- RS, sendo esta uma

Universidade conceituada e com professores qualificados, que contribuíram imensamente na

minha formação.

Agradeço a toda minha família, principalmente meus pais, Joaquim José Moraes do

Estreito e Adriane Moraes do Estreito que sempre me incentivaram a estudar e adquirir mais

conhecimento, obrigada por todas as lutas que travaram por mim para que hoje pudesse estar

aqui. Também agradeço ao meu marido Lucas de Gregori, que me apoiou em todos os

momentos de minha jornada acadêmica, obrigada por me dar força, por não me deixar desistir,

por nunca reclamar pelos finais de semana em que passava estudando e você jogando vídeo

game. Sem dúvidas, vocês são o meu alicerce e sou eternamente grata por estarem ao meu lado

em todas os momentos nas conquistas, alegrias, aprendizados e também nas dificuldades.

Aos amigos e amigas sou grata por estarem ao meu lado, em especial aqueles que sempre

vibraram com minhas conquistas e choraram minhas mágoas, amigos que a vida acadêmica me

proporcionou.

Agradeço imensamente a minha orientadora a professora Ma. Flávia Burdzinski de

Souza, por compartilhar todo o seu conhecimento comigo, por sempre me apoiar, orientar,

incentivar e cobrar meu crescimento, obrigada por fazer florescer em mim uma nova

profissional, seus ensinamentos levarei sempre ao meu lado para toda minha vida.

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Ao Contrário, As Cem Existem

A criança

é feita de cem.

A criança tem cem mãos

cem pensamentos

cem modos de pensar

de jogar e de falar.

Cem sempre cem

modos de escutar

de maravilhar e de amar.

Cem alegrias

para cantar e compreender

cem mundos

para descobrir

cem mundos para inventar

cem mundos para sonhar.

A criança tem

cem linguagens

(depois cem, cem, cem)

Mas roubaram-lhe noventa e nove.

A escola e a cultura

lhe separam a cabeça do corpo.

Dizem-lhe:

de pensar sem as mãos

de fazer sem a cabeça

de escutar e não falar

de compreender sem alegrias

De amar e maravilhar-se

Só na Páscoa e no Natal.

Dizem-lhe:

de descobrir um mundo que já existe

E de cem roubaram-lhe noventa e

nove.

Dizem-lhe:

que o jogo e o trabalho

a realidade e a fantasia

a ciência e a terra

a razão e o sonho

são coisas

que não estão juntas.

Dizem-lhe enfim:

que as cem não existem.

A criança diz:

ao contrário, as cem existem.

Lóris Malaguzzi (2016, p. 5)

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RESUMO

O presente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) teve sua construção desenvolvida sobre a

temática “Memórias (auto) biográficas a respeito do estágio Curricular Supervisionado na

Educação Infantil: reflexões sobre a indissociabilidade entre educar e cuidar no cotidiano da

creche”. O tema surgiu por meio das reflexões construídas durante e após o Estágio Curricular

Supervisionada em Educação Infantil, realizado no oitavo semestre do Curso de Pedagogia da

Universidade Federal da Fronteira Sul- UFFS, campus Erechim-RS. Tal estudo tem como

problemáticas de pesquisa: “O que significa educar e cuidar na Educação Infantil? Como se

efetiva a educação e o cuidado dentro das ações pedagógicas da creche?”. Busca-se por meio

deste trabalho investigar de que maneira os conceitos de cuidar e educar estão sendo

desenvolvidos de modo indissociável no cotidiano da creche com os bebês e as crianças bem

pequenas. Para atingir o objetivo proposto, foram utilizados como caminho metodológicos uma

abordagem qualitativa, com o uso de pesquisa bibliográfica, documental, de campo e (auto)

biográfica, envolvendo assim o educar e cuidar na creche em todos os seus âmbitos tanto em

estudos teóricos desenvolvidos por pesquisadores, quanto em ações pedagógicas realizadas no

cotidianas da creche. Dessa forma, este estudo se estrutura em quatro capítulos. O primeiro

apresenta a metodologia utilizada para desenvolver a pesquisa. O segundo capítulo teoriza sobre

a Educação Infantil no Brasil, seu percurso histórico, princípios, leis e normativas. No terceiro

capítulo buscou-se investigar os conceitos de educar e cuidar, apresentando o percurso histórico

e seus processos indissociáveis na creche. Nesse capítulo também se realizou averiguação dos

trabalhos que já foram realizados sobre este mesmo tema no âmbito da Biblioteca Brasileira de

Teses e Dissertações. O quarto capítulo desenvolve a reflexão dos dados produzidos, refletindo

sobre as atuações no Estágio Curricular Supervisionado em Educação Infantil, assim como

traçando um paralelo com as referências encontradas na pesquisa bibliográfica e no estado de

conhecimento. Por fim os resultados pertinentes da pesquisa possibilitaram compreender que,

educar e cuidar não podem ser concebidos separadamente, muito pelo contrário são

indissociáveis. Educar e cuidar estão implícitos em todas as ações do cotidiano da creche, sendo

parte fundamental dos planejamentos dos professores aliado aos acolhimentos, ao

reconhecimento das crianças como sujeitos históricos e de direitos, a organização de espaços e

previsão de tempos (estendidos) para viver a jornada escolar.

Palavras-chave: Educação Infantil. Creche. Educar e Cuidar. Acolhimento.

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SUMÁRIO

POR QUE EDUCAR E CUIDAR NA CRECHE? INTRODUZINDO O ASSUNTO

.................................................................................................................................................. 10

1 CAMINHOS METODOLÓGICOS ....................................................................... 13

2 CONTEXTO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: AS

CRIANÇAS E A CRECHE ................................................................................................... 20

2.1 DO ASSISTENCIALISMO Á EDUCAÇÃO COMO DIREITO DA

CRIANÇA............................................................................................................................21

2.2 CONTEXTO ATUAL DA EDUCAÇÃO INFANTIL......................................27

3 EDUCAR E CUIDAR NA CRECHE..................................................................... 33

3.2 EDUCAR E CUIDAR: PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS NA CRECHE ....... 37

3.3 O QUE REVELAM AS PESQUISAS SOBRE EDUCAR E CUIDAR NA

CRECHE?.............................................................................................................................41

4 REFLEXÕES QUE PERMEIAM O EDUCAR E O CUIDAR NA CRECHE:

MEMÓRIAS (AUTO) BIOGRÁFICAS SOBRE O ESTÁGIO NA EDUCAÇÃO

INFANTIL ............................................................................................................................... 46

4.2 RECONHECER A CRIANÇA COMO UM SUJEITO HISTÓRICO E DE

DIREITOS É PREMISSA PARA CUIDAR E EDUCAR....................................................57

4.2.1 Musicalização e os Bebês e as Crianças Bem Pequenas .......................... 61

4.3 É IMPORTANTE TER ESPAÇOS ACOLHEDORES, SEGUROS E

ACONCHEGANTES PARA EDUCAR E CUIDAR AS CRIANÇAS................................64

4.3.1 O espaço do sono e das refeições .............................................................. 64

4.3.2 Canto temático: Cantores ......................................................................... 66

4.3.3 Espaços de projeção para brincar com luz e sombra ............................. 69

4.4 PENSAR SOBRE A RELAÇÃO ENTRE TEMPO E CRIANÇAS NA

EDUCAÇÃO INFANTIL É UM FATOR ESSENCIAL PARA CUIDAR E EDUCAR .... 71

ISSO NÃO ACABA POR AQUI: CONSIDERAÇÕES DE UM NÃO FINAL .... 80

REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 84

APÊNDICES ............................................................................................................... 91

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POR QUE EDUCAR E CUIDAR NA CRECHE? INTRODUZINDO O ASSUNTO

É necessário iniciar esta reflexão compreendendo que a Educação Infantil é um direito

da criança, premissa que se configura em um curto tempo de existência, pois o atendimento em

creches e pré-escolas passou a ser considerado um direito às crianças apenas após a

promulgação da Constituição Federal de 1988, e também após este contexto social e político de

nosso país, que se começou a produzir normativas, legislações, orientações e materiais, a fim

de realizar melhorias na qualidade da educação destinada às crianças.

O Parecer CNE/CEB 20/2009 que faz a Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais

para Educação Infantil (DCNEI) é atualmente um documento norteador para as ações

educativas nas escolas de Educação Infantil, mostrando o empenho em melhorar cada vez mais

esta primeira etapa da Educação Básica, sendo assim

[...] o campo da Educação Infantil vive um intenso processo de revisão de concepções

sobre educação de crianças em espaços coletivos, e de seleção e fortalecimento de

práticas pedagógicas mediadoras de aprendizagens e do desenvolvimento das

crianças. Em especial, têm se mostrado prioritárias as discussões sobre como orientar

o trabalho junto às crianças de até três anos em creches e como assegurar práticas

junto às crianças de quatro e cinco anos que prevejam formas de garantir a

continuidade no processo de aprendizagem e desenvolvimento das crianças, sem

antecipação de conteúdos que serão trabalhados no Ensino Fundamental (BRASIL,

2009b, p. 2).

Ainda é preciso caminhar muito para que haja ainda mais melhorias na Educação

Infantil, voltadas exclusivamente as crianças. Para tanto, durante a caminhada acadêmica

muitos diálogos, reflexões e inquietações surgiam sobre as crianças na Educação Infantil; esta

trajetória de construção acadêmica levou-me a pensar e decidir o tema central deste Trabalho

de Conclusão de Curso (TCC), que começou a ser dialogado após a realização do Estágio

Curricular Supervisionada em Educação Infantil, desenvolvido com bebês e crianças bem

pequenas. A escolha deste tema teve como princípio a indissociabilidade entre educar e cuidar

no cotidiano da creche.

Vivenciando os conceitos de educar e cuidar no estágio em Educação Infantil, pude

perceber quão importante é que os profissionais da educação tenham conhecimento de como

estes conceitos estão totalmente entrelaçados cotidianamente na creche. Assim, quando se

realiza um olhar observador este auxilia no desenvolvimento de uma autoavaliação da prática

pedagógica diária de quem atua na Educação Infantil, como em meu caso. Compreendendo

assim, o educar e cuidar em todas as suas instâncias.

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Nesse sentido, a imagem de capa deste TCC, ilustra uma ação pedagógica desenvolvida

em prol do respeito ao tempo e as condições da criança naquele momento em que vivia pela

primeira vez uma experiência de projeção com luzes coloridas no chão. A criança C,

participante da pesquisa, precisou ser acolhida, ser amparada para poder se sentir segura num

espaço novo, o que demonstra a preocupação em cuidar e educar as crianças em sua

integralidade, fatos que aparecem em todos os momentos da jornada escolar e não só nos que

envolvem o cuidado físico e biológico; esse e outros momentos são narrados no trabalho com

o intuito de deixar visível como às ações pedagógicas na creche são indissociadas de cuidado e

educação.

Partindo dessas premissas, o presente trabalho, intitulado Educar e Cuidar no Cotidiano

da Creche: Memórias (auto) Biográficas sobre o Estágio na Educação Infantil, pretende buscar

reflexões acerca de que maneiras o educar e cuidar seriam desenvolvidos de modo indissociável

ao cotidiano da creche com os bebês e as crianças bem pequenas. Para isso traçou-se alguns

objetivos como: (I) Apresentar o contexto histórico e atual da Educação Infantil; (II) Conceituar

educar e cuidar de acordo com as normativas legais e pesquisas da área; (III) Compreender o

cuidado e a educação de modo indissociável no cotidiano escolar da creche; (IV) Relacionar os

conceitos de educar e cuidar as ações cotidianas com bebês e crianças bem pequenas, por meio

das reflexões de episódios e práticas pedagógicas.

O presente trabalho divide-se em quatro capítulos. O primeiro capítulo Caminho

Metodológicos apresentará a metodologia do TCC, o qual realizou uma pesquisa com

abordagem qualitativa com o uso de pesquisa bibliográfica, documental, de campo e (auto)

biográfica; a pesquisa bibliográfica e documental possibilitou refletir sobre os conceitos bases

do trabalho e pesquisa de campo e (auto) biográfica sobre as ações pedagógicas realizadas no

cotidiano da creche durante o estágio em Educação Infantil. Para a construção deste capítulo,

foram utilizados autores como Borges e Silva (2011), Ludke e André (1989), Gil (2002),

Ferreira (2002), Souza (2014) e Passeggi (2011).

O segundo capítulo tem como título Contexto Histórico da Educação Infantil no Brasil:

As Crianças e a Creche. Inicialmente apresenta a Educação Infantil no Brasil, trazendo

elementos históricos e culturais que refletem diretamente no cotidiano atual, bem como

abordando o assistencialismo em seu percurso histórico. O capítulo também desmistifica e

apresenta novos conceitos, legislações que evidenciam a criança como um ser que produz

história, cultura, que cria, interage, que possui seus próprios desejos e preferências. Para

sustentar as discussões foram utilizados alguns autores como: Bujes (2001), Didonet (2001),

Andrade (2010), Kuhlmann (2011), Goes (2012), Oliveira (2005); além de legislações e

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normativas federais como a Constituição Federal (BRASIL, 1988), o Plano Nacional de

Educação (BRASIL, 2001), a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017) e o Parecer

CNE/CEB 20/2009 que faz a Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação

Infantil (BRASIL, 2009b).

O terceiro capítulo discutirá sobre os conceitos e significados de educar e cuidar, tendo

como título Educar e Cuidar na Creche, enfatizando todo o percurso histórico do educar e

cuidar até concepções atuais, mostrando que um influencia o outro. Educar e cuidar são

premissas que devem se fazer presentes no cotidiano da Educação Infantil, principalmente nas

creches, pois atendem bebês e crianças bem pequenas, que merecem respeito e atenção

constante em suas primeiras experiências de vida; por isso o capítulo apresenta as produções já

realizadas sobre o educar e cuidar no âmbito da pesquisa da pós-graduação no Brasi. Para

embasar teoricamente, serão consultados autores como Kuhlmann Jr. (2000), Montenegro

(2001), Tiriba (2005), Kramer (2005), Signorette (2002), Didonet (2003) e Silva (2014).

O último capítulo Reflexões que permeiam o educar e o cuidar: memórias (auto)

biográficas sobre o estágio na Educação Infantil trará reflexões sobre as práticas pedagógicas

desenvolvidas no Estágio Curricular Supervisionado em Educação Infantil; neste capítulo,

optou-se por utilizar fotografias e vídeos das crianças que retratassem o tema pesquisado. As

imagens das crianças foram devidamente autorizadas pelas famílias, conforme o Termo de

Consentimento Livre e Esclarecido, encontrado no apêndice deste trabalho. Para dar suporte,

as discussões utilizam autores como Ritscher (2013), Kramer (2010), Souza (2007), Horn e

Gobbato (2015), Stacciolli, (2013) e Angotti (2006).

Por fim, apresentam-se as considerações finais como um ponto de partida deste trabalho,

demonstrando que estas não acabam aqui, pelo contrário possibilitam e apontam caminhos para

a continuidade da pesquisa.

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1 CAMINHOS METODOLÓGICOS

A criança é feita de cem.

A criança tem cem mãos

cem pensamentos

cem modos de pensar

de jogar e de falar (...)

(Fragmento do poema de Loris Malaguzzi, 2016, p. 5).

Início este capítulo trazendo um trecho provocador do poema “As cem linguagens da

criança”, de Loris Malaguzzi, que reflete a abordagem deste trabalho de conclusão de curso.

Neste fragmento consta que a criança é formada por cem linguagens, cem modos de pensar,

cem modos de agir, cem modos de investigar e descobrir o mundo que a cerca; desta maneira,

se faz necessário compreendê-la em sua totalidade, entender o que é ser criança, relembrar sua

criança interior para olhar com outros olhos a criança de hoje. Para tanto, pesquisar sobre e com

a participação das crianças é cada vez mais importante e necessário.

Nesta perspectiva, a pesquisa se constitui de uma parte importante para a formação

acadêmica; é por meio dela que se pode buscar conhecimento, resolver problemas, aprender e

conhecer o assunto estudado, assim como aborda Minayo que “a pesquisa é um caminho

sistemático que busca indagar e entender o tema de estudo, desvendando os problemas da vida

cotidiana, através da relação da teoria com a prática” (2000 apud Ferreira, 2015, p. 114). Nesta

sistemática do caminho de construção da pesquisa que a metodologia se faz necessária.

As autoras Borges e Silva abordam ainda que o papel fundamental da pesquisa é

expressar “as dificuldades e as necessidades de intervirmos na realidade, especialmente porque

somos pesquisadores e temos a oportunidade com isso de auto-politização no enfrentamento

dos problemas investigados” (2011, p. 35). Desta maneira o presente trabalho, busca responder

as problemáticas de pesquisa: “O que significa educar e cuidar na Educação Infantil? Como se

efetiva a educação e o cuidado dentro das ações pedagógicas da creche?”.

Na realização da pesquisa científica, a metodologia escolhida para desenvolver o

presente projeto tem uma abordagem qualitativa, com o uso de procedimentos da pesquisa

bibliográfica, documental, de campo e (auto)biográfica. Conforme Ludke e André “a pesquisa

qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte de dados e o pesquisador como seu principal

instrumento” (1989, p. 11).

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Para construir os três primeiros capítulos, foi realizada uma pesquisa bibliográfica,

sendo utilizado obras, teses, dissertações e artigos, que abordam os temas: a história da

Educação Infantil, educar, cuidar e creche. Segundo Gil a

principal vantagem da pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador

a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia

pesquisar diretamente. Essa vantagem torna-se particularmente importante quando o

problema de pesquisa requer dados muito dispersos pelo espaço (2002, p. 44).

Durante a pesquisa bibliográfica, foram realizados levantamentos do que já havia sido

pesquisado e publicado sobre o tema educar e cuidar, elaborando assim o estado de

conhecimento sobre a temática da pesquisa. O estado de conhecimento determina

[...] o desafio de mapear e de discutir uma certa produção acadêmica em diferentes

campos do conhecimento, tentando responder que aspectos dimensões vêm sendo

destacados e privilegiados em diferentes épocas e lugares, de que formas e em que

condições têm sido produzidas certas dissertações de mestrado, teses de doutorado

[...] (FERREIRA, 2002, p. 257).

Para tanto, o estado de conhecimento é um grande instrumento de levantamento sobre o

tema a ser pesquisado, pois consegue mostrar o que está sendo e o que já foi produzido e

discutido, não apenas para quem o concretiza, mas também para quem pode utilizar,

aprofundando ainda mais saberes, por meio dos trabalhos sobre o objeto de estudo proposto.

A pesquisa do estado de conhecimento foi utilizada teses e dissertação da Biblioteca

Brasileira Digital de Teses e Dissertações (BDTD), buscando pelos descritores: “Educar e

cuidar”, sendo encontrados seiscentos e quatorze resultados; devido ao grande número de

trabalhos encontrados, foram elencados alguns critérios de seleção para o que seria lido e

discutido neste TCC. O primeiro critério foi selecionar trabalhos entre os anos de 2009 até 2018,

pelo fato de que a atual versão das Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Infantil

(DCNEI), documento que normatiza a etapa e trouxe mudanças e transformações nas

concepções que cercam a Educação Infantil, teve sua publicação e revisão no ano de 2009. O

segundo critério foi dar ênfase em trabalhos que abranjam a creche, nível da Educação Infantil

a qual essa pesquisa se constitui.

Nesta seleção foram analisados seis trabalhos, que estão relacionados no quadro a

seguir:

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Quadro 1: Dissertações e Teses referentes ao Estado de Conhecimento

PESQUISA DE ESTADO DE CONHECIMENTO

T

E

S

E

S

&

D

I

S

S

E

R

T

A

Ç

Õ

E

S

Autor (a) Título Nível de

Trabalho e

Ano da

Defesa

Universidade

ANDRADE, Cristine

Batista

Entre o saber e o poder: o

trabalho de cuidar e

educar

Tese

2009

UNICAMP

MENILCE, Antonia

Da Silva

O cuidar/educar nas

narrativas de professoras

de uma creche de rio

branco/AC

Dissertação

2014

UFMT

SANTANA, Fabiane

Cristina

Cuidar e educar da

primeira infância

tendências investigativas

na produção acadêmica

paulista

Dissertação

2011

PUC

SHEN, Luize

Do cuidar ao educar na

educação infantil: efeitos

de sentidos

Dissertação

2014

UFRGS

OLIVEIRA, Maria

das Graças

A relação entre a família

e a creche pública no

cuidado e na educação

das crianças

Tese

2011

UNICAMP

LINS, Claudemir

Cunha

O hibridismo nas práticas

docentes no centro de

educação infantil: entre o

cuidar e o educar

Dissertação

2014

USP

Fonte: Construído pela autora

O estado de conhecimento serviu para ampliar as discussões dos capítulos do TCC,

principalmente o terceiro e quarto capítulos, momentos em que foram apresentados e discutidos

os resultados das pesquisas sobre educar e cuidar na creche, e a produção dos dados realizados,

a fim de ampliar o entendimento conceitual sobre o tema da pesquisa.

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Além da pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental foi usada na medida em que

foram procurados legislações e documentos federais que abranjam a temática de pesquisa, a

fim de ajudar na construção do segundo e terceiro capítulo do TCC. A Constituição Federal de

1998, a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, a Resolução CNE/CEB nº 5/2009, o Parecer

CNE/CEB n.20/2009 que fixam e revisam as DCNEI, a Lei nº: 8.069/1990 que fixa o Estatuto

da Criança e do Adolescente, a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017), e o Plano

Nacional de Educação (BRASIL, 2001), foram alguns dos documentos utilizados. A pesquisa

documental é necessária, para auxiliar na compreensão de documentos sobre a temática.

Segundo Gil as fontes de uma pesquisa documental podem ser diversas, “[...] como

cartas pessoais, diários, fotografias, gravações, memorandos, regulamentos, ofícios, boletins,

etc”. O autor também relata que,

a pesquisa documental apresenta uma série de vantagens. Primeiramente, há que se

considerar que os documentos constituem fonte rica e estável de dados. Como os

documentos subsistem ao longo do tempo, tornam-se a mais importante fonte de dados

em qualquer pesquisa de natureza histórica (GIL, 2002, p. 46).

A segunda etapa deste trabalho se constitui na pesquisa de campo sobre o educar e cuidar

na Educação Infantil. Conforme Gil (2002), a pesquisa de campo tem grandes vantagens, dentre

elas os resultados serem mais fidedignos e ter maior envolvimento do pesquisador, pois como

o pesquisador tem um maior nível de participação, o autor relata que na pesquisa de campo,

“estuda-se um único grupo ou comunidade em termos de sua estrutura social, ou seja,

ressaltando a interação entre seus componentes. Dessa forma, o estudo de campo tende a utilizar

muito mais técnicas de observação” (GIL, 2002, p. 53).

A metodologia da pesquisa de campo deste projeto foi por meio de narrativas (auto)

biográficas. De acordo com Souza (2014), as narrativas (auto) biográficas se configuram em

uma pesquisa que é recolhida de forma oral e escrita. Para tanto,

a consolidação dessa abordagem de pesquisa vem sendo marcada por diversos estudos

empreendidos nos diferentes programas de pós-graduação, na criação e

desenvolvimento de grupos de pesquisa e associações cientificas sobre tal objeto no

país, nas edições de diferentes congressos sobre a temática, publicações de livros e

revistas que tem se dedicado ao (auto) biográfico como modos de socialização de

experiências em contextos de formação e de aprendizagens sociais e profissionais

(SOUZA, 2014, p. 41).

Souza continua destacando a importância de se utilizar desta metodologia, afirmando

que, as

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narrativas (auto)biográficas, construídas e/ou coletadas em processo de pesquisa ou

em práticas de formação, centram-se nas trajetórias, percursos e experiências dos

sujeitos, são marcadas por aspectos históricos e subjetivo frente às reflexões e análises

construídas por cada um sobre o ato de lembrar, narrar e escrever sobre si (SOUZA,

2014, p. 43).

Passeggi também aborda a questão da importância de se utilizar da metodologia de

narrativas (auto) biográficas. Assim, destaca que, “um dos princípios fundadores das escritas

de si como prática de formação é a dimensão autopoiética da reflexão biográfica. Ao narrar sua

própria história, a pessoa procura dar sentido às suas experiências e, nesse percurso, constrói

outra representação de si: reinventa-se” (PASSEGGI, 2011, p. 147). Deste modo, pensando em

reinventar-me que também escolhi essa metodologia.

A escolha do grupo e da comunidade da pesquisa de campo se deu após a realização do

Estágio Curricular Supervisionado em Educação Infantil, do Curso de Pedagogia - Licenciatura,

Campus Erechim/RS, da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), realizado no ano de

2018, durante 25 dias; nesses 25 dias, cinco foram de observação, dez de monitoria e dez de

intervenção, ou seja, de regência de classe, na turma de Berçário II, na faixa etária de 1 e 2 anos

de idade, na Escola de Educação Infantil Favinhos de Mel, da cidade de Getúlio Vargas/ RS,

onde atuo como professora regente da Educação Infantil.

Durante o estágio teve-se como preocupação proporcionar experiências a partir do

interesse das crianças, deixando-as serem protagonistas do currículo. Para tanto, foi utilizado

as narrativas (auto) biográficas desenvolvidas nesse processo, para contar sobre o cotidiano das

vivências na creche com os bebês e as crianças bem pequenas.

As narrativas evidenciam episódios que exemplifiquem como educar e cuidar na creche

podem se tornar indissociáveis na realização do trabalho pedagógico; para dar visibilidade ao

trabalho foram usados imagens e vídeos das ações desenvolvidas, bem como descrição das

ações e falas das crianças que participaram do processo de estágio.

Para desenvolver a pesquisa com ética e respeito aos participantes, foi utilizado o termo

de livre consentimento e esclarecimento para as famílias, para a escola e professora de música,

que aparece em algumas imagens e vídeos de propostas desenvolvidas. No documento enviado

as famílias1 e a professora de música, foram descritos os objetivos da pesquisa e a importância

de utilizar a imagem das crianças, mantendo o sigilo dos nomes, por isso as crianças serão

1 É importante salientar que uma das famílias que fazia parte da turma, não pode ser localizada, pelo fato de terem

mudado de município, sendo assim, a assinatura do Termo de livre consentimento e esclarecimento não pode ser

coletada. Por isso, as imagens que a criança aparece serão borradas, para preservar sua identidade, mantendo o

respeito pela criança.

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identificadas nesse trabalho usando letras do alfabeto de forma aleatória. No documento da

escola, o termo de livre consentimento e esclarecimento pede permissão para utilizar do nome

e imagens das dependências da escola. Cópias dos termos encontram-se nos apêndices deste

trabalho.

Utilizar a pesquisa com as crianças tem uma grande importância, pois é possível destacar

que o tema central deve ser a preocupação com seus interesses e a suas visões, vendo-as como

informantes competentes e “sujeitos capazes de fazer indicações para os rumos epistemológicos

e teóricos- metodológicos da pesquisa cientifica, bem como capaz de opinar e provocar

mudanças sociais e culturais” (RODRIGUES; BORGES; SILVA, 2014, p. 280); o que vem ao

encontro do reconhecimento das crianças como sujeitos históricos e de direitos (BRASIL,

2009a, BRASIL, 2009b).

Ferreira expressa à importância de se pesquisar com crianças, afirmando que:

Levar mais longe o reconhecimento das crianças como sujeitos é adotar uma

concepção de pesquisas com crianças em que elas são vistas como atores sociais

implicados nas mudanças e sendo mudados nos mundos sociais e culturais em que

vivem, e como protagonistas e repórteres competentes das suas próprias experiências

e entendimentos - elas são, portanto, as melhores informantes do seu aqui e agora

(FERREIRA, 2008, p. 149).

Para tanto, é imprescindível destacar que quando realizamos pesquisa com as crianças

o pesquisador deve deixar com que elas sejam protagonistas e os atores da pesquisa; assim este

trabalho aliado aos registros fotográficos fornece ainda mais suporte para compreender a

temática estudada, fato que pretende ser evidenciado no decorrer dos capítulos.

A organização dos dados produzidos no Estágio Curricular Supervisionado em

Educação Infantil foi realizada por meio de categorias, uma maneira metodológica de refletir e

responder a problemática de pesquisa. De acordo com Bardin (2016), o processo de categorizar

os dados da pesquisa é uma forma de classificar por gêneros, agrupamentos e diferenciações.

Além do mais, a autora esclarece que as categorias de análise são maneiras de organizar e de

agrupar todos os dados que foram produzidos para uma melhor efetivação, sendo assim:

Classificar os elementos em categorias impõe a investigação do que cada um deles

tem em comum com os outros. O que vai permitir o seu é a parte comuns existentes

entre eles. É possível, contudo, que outros critérios insistam em outros aspectos de

analogia, talvez modificando consideravelmente a repartição anterior (BARDIN,

2016, p. 148).

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Deste modo, elencaram-se quatro categorias que abordam aspectos essenciais à

compreensão do tema de pesquisa, e que buscam responder a problemática levantada sobre: a)

Educar e cuidar como forma de acolhimento das crianças; b) O reconhecimento da criança como

um sujeito histórico e de direitos; c) A importância de espaços acolhedores, seguros e

aconchegantes; d) A relação entre tempo e acolhimento das crianças na Educação Infantil; Essas

quatro categorias deram origem a quatro proposições que constituem os subtítulos do quarto e

último capítulo do TCC. As proposições são frases afirmativas usadas com o intuito de deixar

evidentes os princípios que constituem um trabalho que educa e cuida de maneira indissociável

na creche (SOUZA, 2012).

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2 CONTEXTO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL: AS

CRIANÇAS E A CRECHE

A escola e a cultura

lhe separam a cabeça do corpo.

Dizem-lhe:

de pensar sem as mãos

de fazer sem a cabeça

de escutar e de não falar

de compreender sem alegrias

de amar e de maravilhar-se

só na Páscoa e no Natal.

Dizem-lhe:

de descobrir um mundo que já existe

e de cem roubaram-lhe noventa e nove.

(Fragmento do poema de Loris Malaguzzi, ano 2016, p. 5).

A escola faz parte da criança, afinal muitas delas iniciam sua vida escolar desde bebês.

Malaguzzi escreve neste trecho, reflete muitos cenários escolares; cenários que dizem para a

criança que não precisa descobrir um mundo que já é existente, em que é necessário pensar,

mas sem as mãos, sem poder tocar, sem poder mover-se do lugar. Esse trecho faz a reflexão

sobre as circunstâncias que acabam desmotivando as crianças a frequentar a escola, ou até

impossibilitando que evoluam com pensamentos e ações próprias, algo extremamente sério,

pois se sabe que a criança aprende tocando, olhando, investigando com todo o seu corpo.

O que hoje devemos compreender é que a escola não pode ser como uma gaiola, como

Rubem Alves (2002) descreve em um de seus poemas, há escolas que são como gaiolas, mas

as crianças são como pássaros; algumas escolas prendem seus pássaros e não os permitem voar,

deixando-os “sob controle”. Pássaros engaiolados sempre possuem donos que os levam para

onde quiserem, e então estes deixam de ser pássaros, pois a essência dos pássaros são os voos.

Por isso o autor questiona a existência das escolas que são asas, que não deixam seus pássaros

engaiolados; estas escolas amam ver seus pássaros voarem, mas ensinar os pássaros a voar, isto

ela não pode, pois, o voo já nasce com os pássaros, o voo não pode ser ensinado, mas sim

encorajado.

Desse modo, tanto Malaguzzi (2016) quanto Rubem Alves (2002), descrevem o quanto

é importante as escolas reconhecerem as essências e naturezas das crianças, permitindo que as

crianças sejam crianças e vivam sua infância, investigando, pesquisando e descobrindo o mundo

com suas asas, seus voos, maravilhando-se em cada nova descoberta.

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No contexto da creche também percebemos muitos espaços que são como gaiolas;

espaços esses que não permitem aos bebês e crianças bem pequenas ter suas linguagens

reconhecidas e acolhidas. Por isso, em meio a toda esta reflexão é preciso compreender como

surgiu a creche, o contexto histórico desse espaço diz muito sobre as concepções que cercam a

educação das crianças nos dias atuais.

Nesta perspectiva, é importante analisar todo o contexto histórico da Educação Infantil

no Brasil, até chegar ao atual cenário que vivenciamos; analisando documentos que normatizam

a primeira etapa da educação básica sendo um dos principais caminhos. Assim, este capítulo

aborda toda a trajetória de atendimento as crianças na Educação Infantil, mapeando seu

processo histórico.

Com o intuito de embasar teoricamente as ideias, foram utilizados autores como: Bujes

(2001), Didonet (2001), Andrade (2010), Kuhlmann (2011), Goes, (2012), Oliveira (2005),

além de documentos e normativas federais como a Resolução CNE/CEB 5/2009 que fixa as

Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (BRASIL, 2009a) e sua revisão

(BRASIL, 2009b), Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos

fundamentais das crianças (BRASIL, 2009c), Constituição Federal (BRASIL, 1988), Plano

Nacional de Educação (BRASIL, 2001) e Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2017).

2.1 DO ASSISTENCIALISMO À EDUCAÇÃO COMO DIREITO DA CRIANÇA

Para compreender como a Educação Infantil é percebida nos dias atuais, se faz

necessário conhecer um pouco da sua história. Precisamos analisar e conhecer este percurso

histórico da Educação Infantil, pois como defende Cruz “a História não é simplesmente a soma

de fatos, datas e nomes a serem memorizados” (2000, p. 9), muito pelo contrário o que a autora

destaca é que a história não pode ser esquecida, e que por meio dela é possível conhecer e

compreender o presente.

A história nos descreve que por muito tempo, a educação voltada para a criança,

inicialmente era responsabilidade das famílias e dos grupos sociais que elas frequentavam.

Assim, segundo Bujes

era junto aos adultos e outras crianças com os quais convivia que a criança aprendia a

se tornar membro deste grupo, a participar de tradições que eram importantes para ele

e a dominar conhecimentos que eram necessários para a sua sobrevivência material e

para enfrentar as exigências da vida adulta (2001, p. 13).

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Com o passar dos anos começaram a surgir as primeiras instituições de atendimento à

infância, do início até a metade do século XIX; este período se destacou por iniciar algumas

ideias sobre a infância, em função disso se refletiu em modelos de organizações destas

instituições, e o que realizariam com as crianças enquanto estivessem neste local. O surgimento

destes atendimentos nestas instituições esteve totalmente interligado ao desenvolvimento da

vida tanto urbana quanto industrial. Para tanto, compreende-se que a história das instituições

de Educação Infantil não pode ser compreendida distante da história das famílias e da sociedade

(ANDRADE, 2010).

O surgimento destas instituições que visavam o atendimento de crianças, segundo Bujes

(2001), se relaciona com o surgimento da escola e do pensamento moderno; a autora também

destaca que por intermédio das mudanças no interior das organizações familiares, perante o

desenvolvimento de teorias norteadas a compreensão da natureza da criança, inclinadas pela

sua inocência e pelas tendências às más condutas, que acabou nascendo essas instituições. Bujes

argumenta

[...] que se pode perceber é que existiram para justificar o surgimento das escolas

infantis uma série de ideias sobre o que constituía uma natureza infantil, que, de certa

forma, traçava o destino social das crianças (o que elas viriam a se tornar) e justificar

a intervenção dos governos e da filantropia para transformar as crianças

(especialmente as do meio pobre) em sujeitos úteis, numa sociedade desejada, que era

definida por poucos. De qualquer modo, no surgimento das creches e pré-escolas

conviveram argumentos que davam importância a uma visão mais otimista da infância

e de suas possibilidades, com outros objetivos do tipo corretivo, disciplinar, que viam

principalmente nas crianças uma ameaça ao progresso e à ordem social (BUJES, 2001,

p. 15).

O que se pode analisar ainda é que a imersão das crianças nestas instituições educativas

partia de mudanças políticas, sociais e econômicas, que aconteciam na sociedade, muitas vezes

excludentes e conservadores das classes mais pobres que eram “moldadas” pela burguesia, fato

observado com a revolução industrial, episódio que teve grande impacto na sociedade, fazendo

com que a classe operária tivesse que se submeter ao regime das fábricas e das máquinas. Desta

maneira, com a revolução surgiu a necessidade de abrir postos de trabalho para as mulheres,

inserindo-as no mercado de trabalho, mudando a forma de a família cuidar e educar seus filhos

(PASCHOAL; MACHADO, 2009).

Com o surgimento das indústrias modificou-se ainda mais a estrutura social vigente,

principalmente os hábitos e costumes que permeavam a família; pelo fato das mães trabalharem

nas indústrias as crianças acabavam muitas vezes sozinhas, não tendo ninguém para estar com

elas durante a jornada de trabalho. Para tanto, as mães tinham que optar por dois vieses, que

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seria deixar seus filhos sozinhos em casa ou utilizarem o trabalho das conhecidas mães

mercenárias; estas mães que não escolhiam pelo trabalho nas indústrias vendiam seus serviços

de cuidadoras e também abrigavam os filhos das mulheres que trabalhavam (PASCHOAL;

MACHADO, 2009).

Assim, com a inserção das mulheres ao mercado de trabalho, veio a necessidade de

local para deixar seus filhos; que deu início e expansão às instituições, que inicialmente previam

atender a classe baixa, para que as mães das crianças pudessem trabalhar e expandir sua atuação

para além do contexto doméstico. Didonet afirma que

as referências históricas da creche são unânimes em afirmar que ela foi criada para

cuidar das crianças pequenas, cujas mães saíam para o trabalho. Está, portanto,

historicamente vinculada ao trabalho extradomiciliar da mulher. Sua origem, na

sociedade ocidental, está no trinômio mulher-trabalho-criança. Até hoje a conexão

desses três elementos determina grande parte da demanda (2001, p. 12).

Em 1826, foram criadas as chamadas salas de asilo. De acordo com Oliveira “era comum

nas salas de asilo o agrupamento de até cem crianças comandadas por um adulto por meio de

um apito” (2005, p. 61). Estas salas de asilo tinham como finalidade o provimento de cuidados

e educação moral e intelectual de crianças de 3 a 6 anos de idade (ANDRADE, 2010).

No Brasil, conforme Azevedo (2013), aos poucos começou a surgir novos olhares para

as crianças brasileiras que até então, eram percebidas pela sociedade com descaso, em especial,

as crianças que pertenciam às classes menos favorecidas, visando apenas para elas cuidados

necessários para sua sobrevivência. No decorrer da história, foi se trazendo mudanças de forma

significativa no que diz respeito ao desenvolvimento pessoal e intelectual da criança,

principalmente ao final do século XIX. Segundo Nascimento,

no Brasil, a efervescência das ideias pedagógicas modernas advindas dos países ditos

de primeiro mundo, durante os finais do século XIX e início do século XX, fez com

que médicos, juristas, intelectuais e religiosos voltassem seus olhares sobre a infância

brasileira, particularmente sobre a infância pobre. Com o ideal de modernizar o país

nos moldes europeus, a infância foi vista como um dos principais focos de atenção

(2015, p. 17440- 17441).

Assim, estas instituições de atendimento as crianças no Brasil que começavam a emergir

fora do ambiente familiar, tinham um caráter de política assistencialista e filantrópica

articuladas por interesses médicos, políticos, jurídicos e pedagógicos, com o foco em atender

crianças pobres com vulnerabilidades sociais, objetivando moldá-las conforme o contexto

social vigente. Santaclara destaca que

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as instituições de educação infantil também eram apresentadas como parte dos grupos

dedicados a programas sociais, abrindo precedentes à vinculação com as políticas

assistenciais, tendo em vista que a economia social mantinha um estreito vínculo com

a educação popular (2005, p. 21-22).

O autor Kuhlmann Júnior também salienta que,

[...] a história das instituições pré-escolares não é uma sucessão de fatos que se

somam, mas a interação de tempos, influências e temas, em que o período de

elaboração da proposta educacional assistencialista se integra aos outros tempos da

história dos homens (KUHLMANN, 2001, p. 81).

A implantação da primeira creche visando atender as crianças das classes operárias

surgiu no Brasil no ano de 1889, no Rio de Janeiro juntamente a fábrica de Fiação e Tecidos

Corcovado. Apenas por volta de 1918, 29 anos após, surgiu à primeira creche no Estado de São

Paulo, sendo resultado de muitas opressões dos movimentos operários (GOES, 2012).

Já em 1899, foi fundado o Instituto de Proteção e Assistência à Infância; a primeira

escola de Educação Infantil de Belo horizonte foi em 1908. Em 1922, aconteceu o Primeiro

Congresso Brasileiro de Proteção à Infância, em que foram debatidos temas relacionados à

educação moral e higiênica, com destaque na mulher como cuidadora (OLIVEIRA, 2005).

Desta forma, a Educação Infantil tornou-se um tema de incumbência social coletiva, e

não mais apenas da família. A criança passar a ser compreendida com um novo olhar, passando

a ser percebida como um sujeito de direitos, com lugar no mundo pelas suas características

específicas, o que dá início a reflexão de que não há um único modelo específico de infância.

Sem dúvidas é necessário, compreender que existem diversas infâncias, estando no plural, pois

existindo diferentes sujeitos, diferentes modos de se pensar, diferentes culturas, há de haver

diferenças que merecem destaque no plural (GOES, 2012).

Este novo olhar modifica o modo de pensar a Educação Infantil, principalmente com o

rompimento da ideia assistencialista vinculada à creche. Desta forma, a primeira versão da Lei

de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 20 de dezembro de 1961, reconhece pela

primeira vez a menção da educação de crianças pequenas, em seus artigos:

Art. 23. A educação pré-primária destina-se aos menores até sete anos, e será

ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância.

Art. 24. As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos serão

estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com os

poderes públicos, instituições de educação pré-primária (BRASIL, 1961).

Nesse contexto histórico, percebemos que as escolas de Educação Infantil tinham a

nomenclatura de maternais (nome advindo da extensão da figura materna) e jardins-de-infância

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(nome originado na ideia de que é preciso cultivar as crianças – esperar florescer, como as flores

de um jardim). Estes espaços foram criados no Brasil, no final do século XIX, idealizados por

Friedrich Froebel2. Segundo Alves,

os ‘jardins de infância’, primeiros espaços escolares destinados às crianças pequenas

[...] Concebiam a criança como uma sementinha e as professoras como ‘jardineiras’,

responsáveis por cuidar e regar a ‘plantinha’ para que seu potencial de

desenvolvimento não fosse prejudicado (2011, p. 03).

Kuhlmann Júnior (2011) destaca ainda que estes jardins, que surgiam no Brasil tinham

como objetivo atender crianças entre 0 a 6 anos; a partir da década de 80, a legislação vem

afirmar outro lugar para a educação das crianças, inicialmente com a Constituição Federal de

1988 relata que a educação seria um direito social e por isto passa a ser uma obrigação garantir

uma educação de qualidade a todos os brasileiros, posteriormente com o Estatuto da Criança e

do Adolescente (ECA) de 1990, que reafirma o direito à educação, visando o pleno

desenvolvimento de crianças e adolescentes (BARROS, 2007). A Constituição Federal de 1988

destaca em seu artigo 205 que: “A educação direito de todos e dever do Estado e da família,

será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para

o trabalho” (BRASIL, 1988).

Segundo Nascimento por meio da

constituição de 1988 as creches e pré-escolas passaram a compor os sistemas

educacionais. Essa determinação constitucional ganha estatuto legal mais definindo

apenas oito anos depois, com a LDB 9.394/96, quando esta reconhece as instituições

de atendimento às crianças como parte do sistema educacional [...] do ponto de vista

legal, a partir da promulgação da Constituição de 1988, todas as crianças passaram a

serem consideradas sujeitos de direito à vida, saúde, alimentação, educação, lazer,

cultura, dignidade, respeito, liberdade, convivência familiar e comunitária. De objeto

de tutela para sujeito de direitos, de apenas crianças para cidadãos de pouca idade

(2015, p. 17451).

A Constituição Federal de 1988 surge para orientar as creches e pré-escolas e organizar

políticas públicas para atender crianças de 0 a 6 anos; a partir desta legislação, a criança passa

a ser vista como um sujeito que é social, afetivo e que precisa de uma pedagogia específica,

necessitando ser acolhida pela sociedade em espaços que possibilitem seu pleno

2 Friedrich Froebel foi um dos primeiros educadores a refletir o início da infância como uma fase decisiva na

formação das pessoas, como também destacava a importância de se envolver as crianças nas experiências

deixando-as expressarem seus sentimentos durante as mesmas (FERRARI, 2008).

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desenvolvimento, aguçando seus interesses sobre o mundo, e assim oportunizando a ampliação

de suas vivencias (LOPES ET. AL., 2005).

Outro aspecto importante para a história da Educação Infantil, é que na década de 1990,

começou a ampliação de estudos sobre a pré-escola e deram início as pesquisas sobre a creche,

conforme afirma Barbosa “foram publicados livros que tratam da história das crianças no Brasil,

apresentados teses sobre as instituições de atendimento as crianças pequenas respectivas

propostas educacionais e também outras publicações sob forma de coletânea de artigos” (2006,

p. 17).

Barbosa frisa ainda que podemos analisar a trajetória dos artigos publicados sobre

Educação Infantil, na revista Cadernos de Pesquisas, da Fundação Carlos Chagas, entre 1971 a

1991, que:

-g na década de 1970, os artigos publicados enfocavam as crianças em idade pré-

escolar, e não a creche ou a pré-escola como instituição;

- as publicações começam tratando o tema da pré-escola (principalmente como

preparatória para o ensino fundamental) para depois, apenas no final da década de

1980, incluírem as creches;

- os artigos mostram a politização – papel do Estado, da sociedade civil e dos

movimentos sociais – dos temas de creche e pré-escola a partir dos anos 1980;

- houve uma ampliação do número de artigos publicados com essa temática a partir

da década de 1970, o que pode ser constatado pelo levantamento quantitativo

(BARBOSA, 2006, p. 18).

Observar-se que a trajetória de pesquisa sobre a creche demorou alguns anos para

iniciar, diferentemente da pré-escola que já possuía mais pesquisas, porém com aspectos de

preparação para o ensino fundamental, os quais constataram serem concepções diferentes; que

caracteriza as pesquisas sobre a creche ainda como recentes e em expansão.

Em meio a este contexto, começou a ampliação de vagas na Educação Infantil por volta

de 1990, especificamente na faixa etária de 0 a 3 anos, entretanto sendo ainda insuficiente. No

período de 1995 ao ano de 1999, de acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra

de Domicílios (PNAD), obteve-se um alcance maior de atendimento de 0 a 3 anos, passando de

7,6% a 9,2% em 1999, tendo uma ampliação de 1,6% nas matriculas. Já a pré-escola neste

mesmo período teve uma ampliação de 53,5% em 1995, para 60,2% em 1999, perfazendo uma

ampliação de 6,7% (MELLO, 2016).

Com a ampliação de oferta e procura, alguns programas foram sendo desenvolvidos

como o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), a partir de

movimentos sociais que envolvia a:

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União dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME), o Movimento Interforuns

de Educação Infantil do Brasil (MIEIBI) e Confederação Nacional de Trabalhadores

(CNTE) em diálogo com o MEC e o Congresso Nacional, finalmente foram

vinculadas fontes de financiamento para creches e pré-escolas nos sistemas de ensino

e foi garantida a inclusão das creches e pré-escolas conveniadas com o poder público

municipal (MELLO, 2016, p. 118).

Esses movimentos sociais garantiram que a Educação Infantil tivesse o financiamento

pelo FUNDEB no ano de 2007; houve um aumento significativo na frequência das matriculas

da educação infantil, em relação aos dados do PNAD entre os anos de 2005 e 2007, o aumento

para a faixa etária de 0 a 3 anos no segmento da creche cresceu 13% em 2005, havendo uma

taxa de cobertura em 2007 de 17,1%. E na pré-escola na faixa etária de 4 a 6 anos, uma taxa de

72% em 2005, passou para 77,6% em 2007, tendo um percentual de aumento de 5,6% (MELLO,

2016).

No atual cenário da Educação Infantil, destacam-se as reflexões realizadas sobre essa

etapa como espaço coletivo de educação, de direito das crianças, ainda são recentes. O que pode

auxiliar a compreender as funções atuais são os documentos que norteiam a etapa, e que

surgiram após a Constituição Federal de 1998 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional de 1996, como a Resolução CNE/CEB nº 5/2009 e o Parecer CNE/CEB n.20/2009

que fixam e revisam as DCNEI (BRASIL, 2009ª; BRASIL, 2009b), a Base Nacional Comum

Curricular (BRASIL, 2017), o Plano Nacional de Educação (BRASIL, 2014) e as Legislações

estaduais e municipais, contextos legais atuais que serão discutidos no próximo subcapítulo.

2.2 CONTEXTO ATUAL DA EDUCAÇÃO INFANTIL

Frente às transformações históricas e sociais na Educação Infantil, hoje é reconhecida

como a primeira etapa da Educação Básica, como apontado no artigo 5º da Resolução CNE/CEB

nº 5 de 2009

[...] primeira etapa da educação básica, oferecida em creches e pré-escolas, às quais

se caracterizam como espaços institucionais não domésticos que constituem

estabelecimentos educacionais públicos ou privados que educam e cuidam de crianças

de 0 a 5 anos de idade no período diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e

supervisionados por órgão competente do sistema de ensino e submetidos a controle

social (BRASIL, 2009a, p. 18).

A Educação Infantil como primeira etapa da Educação Básica, objetiva o

desenvolvimento integral das crianças, se organizando em creche e pré-escola. A creche atende

crianças de 0 a 3 anos e 11 meses de idade, e a pré-escola atende crianças de 4 a 5 anos e 11

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meses; nessa perspectiva, as creches e pré-escolas são estabelecimentos educacionais tanto

públicos como privados que educam e cuidam das crianças de 0 a 5 anos de idade, por

intermédio de profissionais com formação específica, conforme legislação educacional

(BRASIL, 2009a; BRASIL, 2009b) conceito que contrapõem a ideia assistencialista.

Desta maneira, ao refutar uma política assistencial, o que passa a orientar o currículo da

Educação Infantil como eixos norteadores são: as interações e a brincadeira, concepção também

destacada pela Base Nacional Comum Curricular, que define

a interação durante o brincar caracteriza o cotidiano da infância, trazendo consigo

muitas aprendizagens e potenciais para o desenvolvimento integral das crianças. Ao

observar as interações e brincadeiras entre as crianças e delas com os adultos, é

possível identificar, por exemplo, a expressão dos afetos, a mediação das frustrações,

a resolução de conflitos e a regulação das emoções (BRASIL, 2017, p. 33).

A interação faz parte da concepção epistemológica de como se aprende na educação

infantil; interagir e brincar devem ser aspectos prioritários na condução da educação das

crianças. O documento Brinquedos e Brincadeiras de Creche: Manual de Orientação

Pedagógica aborda cinco tipos de interações que existem no cotidiano da creche: a) As crianças

e as professoras/adultos: no qual enriquecem o brincar das crianças em toda sua complexidade;

b) As crianças entre si: em que por meio das diversas brincaderias a cultura infantil e a cultura

lúdica aparecem, podendo ser crianças de idades iguais e diferentes, como por exemplo, bebês

brincarem com crianças maiores; c) As crianças e os brinquedos: cita que ocorre por meio de

diferentes formas de brincar podendo ser objetos ou brinquedos; d) As crianças e o ambiente:

refere-se as questões de se ter um ambiente estruturado para a criança, como por exemplo, haver

moveis e objetos ao alcance das mesmas, promovendo a interação e autonomia; e) E por fim,

as crianças, as intituições e as famílias: no qual a união destas, possibilita vínculos que

favorecem o respeito mútuo e a confiabilidade, gerando assim, espaços de trabalhos

colaborativos e de identificação da cultura popular das crianças e de sua familia, de suas

brincadeiras e brinquedos favoritos (BRASIL, 2012).

Parecer CNE/CEB 20/2009 que faz a Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais

para Educação Infantil (DCNEI) estabelece três princípios básicos para as propostas

pedagógicas da Educação Infantil, que devem ser respeitados, sendo eles:

Éticos: da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao

bem comum, ao meio ambiente e às diferentes culturas, identidades e singularidades.

Políticos: dos direitos de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à

ordem democrática.

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Estéticos: da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da liberdade de

expressão nas diferentes manifestações artísticas e culturais (BRASIL, 2009b, p. 19).

Estes princípios afirmam que as crianças têm totais e plenos direitos de expressar suas

curiosidades, desejos, interesses, de participar de forma ativa em ações educativas para o

exercício da sua cidadania, de exercer sua liberdade e sensibilidade sobre as coisas que as

cercam, que seja valorizada na sua criatividade, sendo compreendida em todas as suas esferas

(BRASIL, 2009b); princípios que quando cumpridos também estão efetivando cuidados e

educação.

A criança compreendida como um sujeito histórico e de direitos, centro do planejamento

educativo dos profissionais que atuam na etapa, é uma definição traçada pelas DCNEI

(BRASIL, 2009a, BRASIL, 2009b), fato que reforça os conceitos abordados nos princípios.

Assim ela se desenvolve, ao viverem diversas experiências em seu cotidiano, tanto com outras

crianças quanto com adultos. A Revisão das DCNEI afirma que “nessas condições ela faz

amizades, brinca com água ou terra, faz de conta, deseja, aprende, observa, conversa,

experimenta, questiona, constrói sentidos sobre o mundo e suas identidades pessoal e coletiva,

produzindo cultura” (BRASIL, 2009b, p. 6-7).

Quando os professores partem desta premissa de colocar a criança como centro do

planejamento, as crianças passam a ser “[...] vistas como ativas na construção de suas próprias

vidas, as vidas dos que as rodeiam e das sociedades em que vivem. As crianças não são apenas

os sujeitos passivos dos processos da estrutura social” (JAMES; PROUT apud AGOSTINHO,

2015, p. 68).

Ao organizar o ambiente de sala de aula também é necessário que as escolas

proporcionem espaços seguros, limpos e acolhedores, para que as crianças possam realizar

novas descobertas, fazer explorações, investigações, expressando seus interesses nesses

ambientes para que assim, possam se sentir acolhidas (BRASIL, 2009b). O documento

“Critérios para um atendimento em creches que respeite os direitos fundamentais das crianças”,

afirma que:

Nossas crianças têm direito a um ambiente aconchegante, seguro e estimulante.

Nossas crianças têm direito ao contato com a natureza.

Nossas crianças têm direito ao movimento em espaços amplos.

Nossas crianças têm direito à proteção, ao afeto e à amizade.

Nossas crianças têm direito a expressar seus sentimentos (BRASIL, 2009c, p. 13).

É preciso destacar que este documento, expressa muitos direitos das crianças na

Educação Infantil, fornecendo um norte aos educadores, além de ser um material de fácil acesso

e compreensão, por estar disponível online no site do Ministério da Educação.

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Estes critérios aqui selecionados expressam o que se espera de um espaço e de um

ambiente de qualidade, em que a criança se sinta segura, pois assim as mesmas terão

oportunidades de serem protagonistas de seu aprendizado. Seguindo na mesma relevância dos

critérios como também na organização dos espaços, de acordo com Faria “a leitura atenta deste

documento, que em minha opinião traz bases para uma pedagogia da educação infantil, indica

a necessidade de repensar a organização espacial comumente adotada entre nós inspirada em

um único tipo de escola/sala de aula [...]” (2001, p. 74-75) o que reforça a ideia de que as

instituições de Educação Infantil, precisam repensar os espaços e analisar se enquadram nestes

critérios.

Nesse sentido, Agostinho abordar que

os adultos têm a responsabilidade de disponibilizarem, equiparem, organizarem e

planejarem a utilização de espaços da instituição. A organização de espaços diversos

e plurais rompe com a lógica do uniforme, igual, oportuniza vivências heterogêneas

para o grupo de crianças, distanciando-se de uma perspectiva homogeneizadora que

prevê que todos façam a mesma coisa ao mesmo tempo, rompendo assim com a

práticas adultocêntricos e com os modelos escolares, respeitando ritmos e escolhas

pessoais, enriquecendo as práticas da Educação Infantil com atividade significativa e

prazerosas para as crianças e adultos (2015, p. 85).

Esta citação de Agostinho avigora a ideia da importância da organização dos espaços na

Educação Infantil para atender a pluralidade das infâncias que ali habitam, descentralizando a

figura do professor como o centro do processo educativo, como aquele que detêm o

conhecimento.

Algo bem relevante também sobre a Educação Infantil, que vários estudos já estão

trazendo, diz respeito à concepção de aprender pela experiência. Aprender pela via da

experiência exige um planejamento com continuidade, interação e brincadeira, pois como o

histórico da creche e da pré-escola esteve durante muito tempo vinculado principalmente ao

ensino fundamental, se trazia várias atividades, sobre vários assuntos (superficiais e sem

sentido) e não se desenvolvia a continuidade delas. Para tanto, é necessária que se tenha

continuidade, pois segundo Augusto “a diversidade de experiências é pano de fundo para as

elaborações das crianças, mas é a continuidade que promove a exploração, a investigação, a

sistematização de conhecimentos e a atribuição de sentido” (2015, p. 116).

Para dar continuidade às propostas, a escuta das crianças é fundamental; escutar suas

falas, seus interesses, colocadas como protagonistas do currículo, fato que exige um olhar

sensível, uma escuta ativa para o que as crianças produzem, orientando o desenvolvimento do

planejamento a partir das hipóteses que estão produzindo. Parafraseando Fochi (2015) a

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observação também precisa estar presente na Educação infantil com os bebês e as crianças bem

pequenas, e esta observação precisa ser como uma escuta, vinculada a uma reflexão.

Ritscher fundamenta que

escutar significa assumir uma postura de investigação, significa tentar se colocar na

perspectiva da criança que está querendo entender os mecanismos da linguagem, e

significa tentar compreender quais hipóteses está construindo. Escutar significa

aceitar construções que talvez não correspondam ás regras usuais da língua (2013, p.

37).

Assim, é preciso afirmar que a Educação Infantil não pode mais ser vista como

preparatória para o Ensino Fundamental, já que o currículo se movimenta pelas crianças; sendo

preciso refletir sobre a concepção pedagógica da etapa, que muitas vezes podemos observar em

sala de aula, na presença exclusiva de folhas em tamanha A4, classes e cadeiras enfileiradas

uma atrás da outra, não abrindo espaço para que as crianças sejam crianças, mas sim realizando

uma réplica do que ocorre no Ensino Fundamental. As crianças que estão na Educação Infantil

precisam brincar, explorar, investigar, ter liberdade para realizem descobertas e é por meio das

interações e brincadeiras é que elas aprendem (BRASIL, 2009a; BRASIL, 2009b; BRASIL,

2017).

Na creche não há como conter as crianças, elas precisam de tempo e espaço para

aprender, para mover-se e explorar o mundo. Agostinho afirma que é a partir do movimento

que a criança aprende é onde ela se expressa, não em classe sentadas, desta forma:

Anda, correr, pula, salta escorrega, sobe, desce, empurra, puxa, pendura-se rola,

engatinha, deita, senta, cai, espia, trepa, rasteja, pega, lança, dança. Logo depois, tudo

de novo... [...] Movimento pra as crianças é comunicar-se, interagir com o mundo, é

uma forma de linguagem, é explorar e conhecer o mundo e o próprio corpo, seus

limites e possibilidades (2016, p. 90).

A Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil destaca que:

“em especial, têm se mostrado prioritárias as discussões sobre como orientar o trabalho junto

às crianças de até três anos em creches e como garantir práticas junto às crianças de quatro e

cinco anos que se articulem, mas não antecipem processos do Ensino Fundamental” (BRASIL,

2009b, p. 2).

Sendo assim, a criança tem o direito de brincar, não apenas como diversão livre, mas

como organização intencional de propostas com continuidade, o que salienta a necessidade que

o professor tem de planejar e mediar às diversas formas de brincar. Dessa maneira vale

considerar que o professor perante as suas práticas necessita perceber as brincadeiras das

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crianças para que por meio da observação analise o interesse das crianças e possibilite a elas

novas experiências. Por fim, é possível identificar que as crianças devem ter um papel ativo na

Educação Infantil.

Para tanto, ao findar esse capítulo, observa-se que com o passar dos anos, em meio a

muitas lutas, conquistas, avanços, retrocessos, a Educação Infantil vem se constituindo como

espaço coletivo que educa e cuida as crianças. Hoje, em 2019, as crianças brasileiras de 0 a 5

anos de idade, possuem o direito a uma educação de qualidade, justa e equitativa, direito que

deve ser atendido pelas instituições de ensino e assegurada pelo Estado. Refletindo sobre a ideia

de cuidar e educar com qualidade que o próximo capítulo se estrutura.

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3 EDUCAR E CUIDAR NA CRECHE

Dentro da sala de aula

A professora se questiona

O que é educar?

O que é cuidar?

E eu lhe respondo:

Ambos são faces de uma mesma moeda

Ambos trilham um mesmo caminho

Pois, quem educa cuida

E quem cuida educa.

(Poesia autoral)

Educar e Cuidar são premissas que devem estar presentes no cotidiano da Educação

Infantil, principalmente nas creches, pelo fato de atenderem bebês e crianças bem pequenas,

que merecem respeito e atenção constantes em suas primeiras experiências de vida. Por muito

tempo, inclusive atualmente, estes conceitos ainda não estão bem compreendido, fato que

ressalta a importância de ser dialogado e entendido.

Neste capítulo será refletido sobre as concepções que permeiam um trabalho voltado a

indissocialidade entre o educar e o cuidar, utilizando diversos autores que abordam está

temática como: Kuhlmann Jr. (2000), Montenegro (2001), Tiriba (2005), Kramer (2005),

Signorette (2002), Didonet (2003), Silva (2014), além da Revisão das Diretrizes Curriculares

Nacionais para Educação Infantil, instituída pelo Parecer CNE/CEB nº 20/2009 (BRASIL,

2009b).

3.1 EDUCAR X CUIDAR: O QUE PREVALECEU HISTORICAMENTE NA CRECHE?

Percebe-se que historicamente os conceitos de educar e cuidar eram assimilados de

forma separada. Cuidar referia-se estreitamente aos cuidados com o corpo (físico),

principalmente de crianças pobres. Já educar teria relação com a formação do intelecto, dos

aspectos cognitivos (mente), explicitamente reservada para a classe social privilegiada.

Segundo Parecer CNE/CEB 20/2009 que faz a Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais

para Educação Infantil,

essa vinculação institucional diferenciada refletia uma fragmentação nas concepções

sobre educação das crianças em espaços coletivos, compreendendo o cuidar como

atividade meramente ligada ao corpo e destinada às crianças mais pobres, e o educar

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como experiência de promoção intelectual reservada aos filhos dos grupos

socialmente privilegiados (BRASIL, 2009b, p. 1).

Kuhlmann Jr. afirma que durante muito tempo, o cuidar era visto de forma negativa,

pois os profissionais que atuavam com crianças, relatavam que as práticas eram inferiores aos

aspectos educativos, assim “determinados serviços de assistência, como a alimentação e os

cuidados de higiene, pareciam representar uma ameaça ao caráter educacional das instituições”

(KUHLMANN, 2000, p. 12-13). Este fato também despertou nos profissionais a ideia de certa

inferioridade, já que não estariam educando as crianças ao prestar serviços de assistência.

Nessa perspectiva, fica evidente a ideia errônea de separação entre educar e cuidar.

Segundo Lins (2014) o histórico sobre o cuidado advém de uma ideia totalmente assistencialista

que apenas prezava o cuidado com o corpo ou por uma substituição do papel materno, entretanto

o cuidado é fundamental para o desenvolvimento humano, não contraponto o educar, mas sim,

como uma parte totalmente integrada de um mesmo processo, em que ambos participam de

forma cooperada.

Por isso compreender a história que permeia a educação das crianças, nos faz perceber

por que muitos profissionais que atuam nas creches acabam inferiorizando o cuidar. De acordo

com Montenegro (2001), até metade da década de 80, o termo usual utilizado (como atividades

assistenciais) nos textos acadêmicos e documentos oficiais, se referenciam a “guarda”; após

alguns anos é que a expressão foi substituída por “cuidar” e “cuidado”.

A partir dos anos 90, as creches e pré-escolas foram incorporadas aos sistemas de ensino,

concebidas como a primeira etapa da educação básica, para tanto, seria necessário integrar ao

cotidiano, atividades relacionadas ao educar; nessa conjuntura, o educar começa a se sobressair

ao ato de cuidar. Segundo Tiriba, muitos profissionais veem esses processos como separados,

e concebem o seu trabalho pedagógico longe dos cuidados, fato destacado na fala de uma

profissional da área:

Eu não faço isso, eu estou aqui para ensinar eu não estou aqui para cuidar”; então

a ela não cabe levar a criança ao banheiro, limpar um bumbum, colocar a criança

para escovar os dentes, colocar a criança para repousar, não cabe a ela isso, eu acho

que essa é uma questão que pode mudar, tem que mudar não é? (Joana- equipe do

programa de creches de uma Secretaria de Desenvolvimento Social) (TIRIBA, 2005,

p. 3, grifos do autor).

Essa fala está carregada de conceitos e ideias; para a professora “Joana” seu papel na

creche é “ensinar”, se ocupar da educação das crianças. Percebe-se que a professora ainda não

compreendeu que na creche não há como separar o cuidar do educar, pois ao mesmo tempo em

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que os professores, as auxiliares, estiverem realizando a higiene, alimentação, cuidados com o

corpo, estarão educando sujeitos, formando cidadãos, com sensibilidade, respeito, atenção.

Este discurso nos permite refletir sobre algumas questões: O educar é separado do

cuidar? Cuidar se relaciona somente as ações de higiene, vestimenta e alimentação? Quem foi

que disse que quem educa é o professor e quem cuida são as auxiliares? Trocar fraldas precisa

ser pedagógico? E cuidar, que significados podem conter? É imprescindível, lembrar que as

palavras possuem significados, que são construídos ao longo da história da humanidade, por

isso segundo Boff “precisamos desentranhar as palavras de sua riqueza escondida” (1999, p.

87).

Montenegro (2001) aborda que os processos de formação dos pedagogos são voltados

para o ato de educar, acabam não incluindo o cuidar. Por isso a autora realizou uma

retrospectiva histórica, compreendendo a trajetória do cuidar, pesquisando a origem

epistemológica da palavra; de acordo, com a autora cuidar e pensar tem o mesmo princípio,

ambos advêm da palavra Cogitare:

O verbo cogitare tem sua origem em co-agitare e passou a designar a agitação do

pensamento, revolver no espírito ou tornar a pensar em alguma coisa. É curioso notar

como este verbo passou a significar unicamente a atividade do pensamento, como

observou Santo Agostinho em suas Confissões: “a inteligência reivindicou como

próprio este verbo (cogito), de tal maneira que só ao ato de coligir (cogere) no espírito,

e não em qualquer parte, é que propriamente se chama pensar (cogitare)”

(MONTENEGRO, 2001, p. 73).

Para tanto, antes do século XII, cogitare e cuidare teriam o mesmo significado,

referindo-se ao pensar e ao sentir; com o passar dos anos, a utilização do termo cogitare foi

sendo restringido e trocado por pensare, por ter um sentido mais preciso. De outra forma, a

palavra cogitare se expande, tendo sinônimos como “esperar, temer, estar preocupado ou ser

solícito”, assim entrelaçando-se a significações de caráter emocional (TIRIBA, 2005, p. 4-5).

Nessa perspectiva, Montenegro continua sua pesquisa em outras línguas neolatinas,

como o Espanhol, Italiano e Francês, destacando que o verbo cuidar está vinculado a dois

significados, um destina-se a solicitude para com o outro e a outra se refere ao pensamento,

assim:

Sugerem que a conotação emocional que esta palavra passou a adquirir, e que se

evidencia também em sua sinonímia – como carinho, angústia, ansiedade, paixão,

preocupação -, advém de seu sentido primitivo de “agitar pensamentos”. A inserção

paulatina do componente emocional ao termo, ao meu ver, parece conferir

significação ao movimento atribuído ao pensamento em sua acepção original

(agitare), pois é muito provável que o que estaria proporcionando tal movimento

fossem, precisamente, emoções (MONTENEGRO, 2001, p. 76).

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A autora buscou ainda compreender elementos do cuidar nas áreas de filosofia e na

enfermagem. Segundo Montenegro (2001), para a filosofia a palavra cuidado, significa cuidar

de si, compreendendo sobre si mesmo. Entretanto na enfermagem a palavra cuidar, é entendida

como algo altruísta, tendo o sentido de cuidar do outro. Montenegro aproxima a enfermagem

com a Educação Infantil, em uma busca de compreender o significado real da palavra cuidado,

pois segundo a autora essas áreas se aproximam, utilizando um mesmo termo.

Desta forma, perante toda trajetória do significado da palavra é possível analisar, que o

cuidar é uma ação muitas vezes desprestigiada. Reflete-se que este desacordo entre o educar e

o cuidar na Educação Infantil, advém desta trajetória, representando uma cisão construída com

o passar dos anos historicamente pela sociedade ocidental. Segundo Tiriba,

[...] ao longo da modernidade, através de um processo histórico que divorciou ser

humano e natureza, separou o corpo da mente, partiu razão e emoção, elegendo aquela

como salvo conduto para a busca da verdade. Nesta lógica, o corpo assume o lugar

secundário destinado aos prazeres, aos desejos, à inconsciência [...] Nele, a cabeça

abriga a razão, a consciência, o pensamento, tomado por Descartes como a prova da

nossa existência humana. Nesta lógica, o corpo é simplesmente um portador do texto

mental (2005, p. 6).

Assim, podemos compreender por que ainda existe este descaso com o cuidar e o

enfoque no educar, a palavra cuidar com a Modernidade, trouxe novos significados na

separação entre corpo e mente o educar passou a adquirir destaque maior nas preocupações das

escolas, começando desta forma, a atribuir mais importância para a mente e o cognitivo.

Com o início de estudos mais aprofundados sobre a Educação Infantil e da

aprendizagem e desenvolvimento infantil, a indissociabilidade entre educar e cuidar entram em

pauta, assumindo o compromisso com a formação humana das crianças. De acordo com

Kramer,

o cuidado está pautado na necessidade do outro. Isso significa que quem cuida não

pode estar voltado para si mesmo, mas deve estar receptivo, aberto, atento e sensível

para perceber aquilo de que o outro precisa. Para cuidar, é necessário um

conhecimento daquele que necessita de cuidados, o que exige proximidade, tempo,

entrega (2005, p. 82).

O desenvolvimento integral das crianças requer cuidados relacionados às dimensões

afetivas, físicas, psicológicas, intelectuais e sociais (BRASIL, 2009b), isso quer dizer que se

deve priorizar tanto a qualidade dos alimentos e cuidados referente à saúde, quanto à forma

como se dispõem os moveis e brinquedos na escola. Cuidar do outro, como salienta Kramer

(2005) é entrega, zelo, atenção, empenho.

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Já o termo educar, segundo Amorim (2015) é originário do termo latim educare, que

assumiu diversos significados ao longo dos anos, em diferentes regiões geográficas e contextos

sociais e históricos. Entretanto, com o passar do tempo, adquiriu um significado de propor

vivências às crianças, para que construam significados e conhecimentos.

De acordo com Signorette, “[...] educar é abranger todos os aspectos da vida do aluno,

desde o atendimento de suas necessidades mais básicas, primárias e elementares, até as mais

elaboradas e intelectualizadas” (2002, p. 06). Com base nesses preceitos, afirma-se que educar

e cuidar são aspectos a serem concebidos de forma articulada, ao que se refere ao processo

formal da educação das crianças. Por isso, não podem mais serem tratados como adversários,

como opostos, como conceitos separados.

3.2 EDUCAR E CUIDAR: PROCESSOS INDISSOCIÁVEIS NA CRECHE

Educar e cuidar são conceitos que necessitam ser compreendidos como duas faces de

uma mesma moeda, não como lado opostos como no jogo “cara ou coroa”, mas como processos

de um único objeto, assim, sem um dos lados a moeda deixa de existir, deixa de ser moeda.

Sem um dos conceitos a educação das crianças deixa de priorizar seu desenvolvimento integral,

o papel do professor fica incompleto e o objetivo da Educação infantil não é alcançado, por isso

educar é indissociado do cuidar e vice-versa (BRASIL, 2009a; BRASIL, 2009b).

Segundo Ávila, a educação e o cuidado são “indissociados e indissociáveis. O cuidado

e a educação são, na esfera pública, o direito à educação para as crianças [...]. Por isso, o cuidar

e o educar não são maternagem, ensino, trabalho doméstico” (2002, p. 126); educar e cuidar

são aspectos que constituem o trabalho das escolas de Educação Infantil, o Referencial

Curricular Nacional para a Educação Infantil salienta que:

Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e

aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o

desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com

os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas

crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural. Neste

processo, a educação poderá auxiliar o desenvolvimento das capacidades de

apropriação e conhecimento das potencialidades corporais, afetivas, emocionais,

estéticas e éticas, na perspectiva de contribuir para a formação de crianças felizes e

saudáveis (BRASIL, 1998, p. 23).

Ser e estar com o outro requer entrega, acolhimento, cuidado, respeito, portanto

educação. Nesse mesmo contexto a Revisão das Diretrizes Curriculares Nacionais para

Educação Infantil (DCNEI) reafirma a ideia indissociável, abordando que,

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[...] educar de modo indissociado do cuidar é dar condições para as crianças

explorarem o ambiente de diferentes maneiras (manipulando materiais da natureza ou

objetos, observando, nomeando objetos, pessoas ou situações, fazendo perguntas etc)

e construírem sentidos pessoais e significados coletivos, à medida que vão se

constituindo como sujeitos e se apropriando de um modo singular das formas culturais

de agir, sentir e pensar (BRASIL, 2009b, p. 10).

A vista disso, é necessário compreender que o educar e o cuidar precisam estar lado a

lado cotidianamente nas creches, e quem precisa trazer estes conceitos para o dia a dia são todos

os profissionais da escola, e não apenas o professor. É um trabalho das auxiliares, dos

funcionários, da gestão escolar, da comunidade e de todos que atuam diretamente e

indiretamente com as crianças.

Com isto, educar e cuidar envolve toda uma visão integrada sobre o desenvolvimento

das crianças; por isso os profissionais que trabalham com os bebês e as crianças bem pequenas

devem ter um olhar diferenciado e tomar precauções com suas práticas para que as suas ações

não se tornem mecânicas, fornecendo suporte para que ambas as ações construam crianças de

identidade e de autonomia (RUIZ, 2005).

Tonucci (1980) nos permite refletir sobre esse aspecto que envolve as ações mecânicas

no contexto da creche, por meio da charge: “Uma troca de fralda”. Na imagem a professora

leva 35 segundos para trocar a fralda da criança e a sua expressão é de felicidade por este feito.

O que é significativo compreender, que há diversas atividades mecanizadas no cotidianamente

da creche, as quais acabam distanciando o professor da criança, que por sua vez, ocasiona uma

falta de disponibilidade ao próximo, uma falta de sensibilidade; como se existissem dois

mundos paralelos, a sala seria um mundo principal e os banheiros e trocadores fossem outro

mundo que não necessitasse de tanto atenção.

Charge 01: “Uma troca de fraldas”

Fonte: Livro "Com Olhos de Criança", de Francesco Tonucci (1980).

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É preciso deixar claro, que o corpo e a mente não podem ser vistos separadamente, o

que não significa “pedagogizar” como, por exemplo, a troca de fraldas, mas ter a sensibilidade

de pedir com licença, de relatar os processos de troca de faldas, tendo cuidado com a criança

neste momento que é tão íntimo. A autora Kramer (2005) apresenta que o cuidado está

vinculado a necessidade do outro, o que assim representa que quem cuida não pode estar

pautado na sua necessidade, mas receptivo, atendo e sensível para fornecer o que o outro

precisa. O cuidado com o outro exige tempo e entrega, que não aparece nos 35 segundos da

troca de fraldas da charge, pois o processo fica corrido como se estivesse em uma “competição”.

Signorette afirma que “[...] educar é abranger todos os aspectos da vida do aluno, desde

o atendimento de suas necessidades mais básicas, primárias e elementares, até as mais

elaboradas e intelectualizadas” (2002, p.06). Para tanto, o educar e o cuidar na Educação

Infantil, vai muito além de uma educação formal, mas refletir sobre as práticas e analisar se

estas estão contribuindo para todos os aspectos do desenvolvimento integral da criança.

Pode-se destacar que todos os dias são realizados atos de educar e cuidar. Na pesquisa

de Silva (2014) com professoras da Educação Infantil, a autora descreve as narrativas das

mesmas sobre o que compreendem da educação e do cuidado. A entrevistada chamada de

“Cora” expressa em sua fala este entrelaçamento do educar e do cuidar, sendo assim relata que:

“Lavar as mãos antes de pegar, guardar o livro bem direitinho, como é que tem que guardar não

rasgar [...]”. Faz parte de um todo, na creche não dá para separar educar e cuidar (SILVA, 2014,

p. 166).

Deste modo, aos poucos os professores que atuam nas creches acabam percebendo que

o educar e o cuidar fazem parte das suas práticas. Silva aponta ainda que “a prática pedagógica

é considerada como algo ativo, vivo e que por isso, deve estar constantemente associada à

teoria. Isso nos mostra o quanto as práticas das professoras são importantes, paralelas aos

conhecimentos teóricos” (2014, p. 149).

Nesta perceptiva, então o educar e cuidar estão entrelaçados a cada ato do professor,

pois ao realizar a troca de fraldas ou ao colaborar com a criança para controlar os esfíncteres,

ao auxiliar um bebê a alimentar-se, nas escolhas do que vestir, nas atenções referentes aos

adoecimentos, tudo está vinculado a educação e ao cuidado. Segundo a Revisão das DCNEI,

não são apenas práticas que respeitam o direito da criança de ser bem atendida nesses

aspectos, como cumprimento do respeito à sua dignidade como pessoa humana. Elas

são também práticas que respeitam e atendem ao direito da criança de apropriar-se,

por meio de experiências corporais, dos modos estabelecidos culturalmente de

alimentação e promoção de saúde, de relação com o próprio corpo e consigo mesma,

mediada pelas professoras e professores (BRASIL, 2009b, p. 6).

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Desta maneira é nítido, perceptível que não existe um modo de se trabalhar com os bebês

e com as crianças bem pequenas, sem estar evidenciando o respeito entre educar e cuidar, e não

apenas priorizando os aspectos ligados ao bem-estar físico, mas como também aos aspectos

cognitivos, emocionais e afetivos. Como afirma Silva, são conceitos presentes nas práticas

diárias dos profissionais que estão diretamente ligadas com as crianças:

O cuidar e o educar são intrínsecos, não existem fragmentação nesse processo, se há

uma atividade educativa para ser realizada pelas crianças, há também todo um

processo, de cuidado para que essa ação se efetive, por exemplo, ao se trabalhar com

pinturas o educador precisa ensinar os cuidados para que não ocorram acidentes: não

pode colocar tinta na boca, ter cuidado para não deixar cair nos olhinhos, enfim o

educador precisa estar atento para aproveitar todo instante para realizar um ato

educativo, isto dignifica olhar á criança como um todo (2014, p. 23).

Diante desse preceito, devemos refletir sobre a importância da formação dos educadores

que atuam na Educação Infantil, para que não minimizem as ações de cuidados a caráter

“pedagogizantes”, ou seja, não tratem as crianças como sujeitos que precisam de ensinamentos

o tempo todo, que precisam ser dirigidas em suas ações, que precisam de explicações simplórias

sobre tudo que irá acontecer no cotidiano educativo. Educar e cuidar são atender de modo

acolhedor os anseios, as singularidades, as características dos bebês e crianças bem pequenas

na creche.

Segundo Craidy e Kaercher

[...] a dicotomia, muitas vezes vividas entre cuidar e o educar deve começar a ser

desmistificada. Todos os momentos podem ser pedagógicos e de cuidados no trabalho

com crianças de 0 a 5 anos. Tudo dependerá da forma como se pensam e se procedem

as ações. Ao promovê-las proporcionamos cuidados básicos ao mesmo tempo em que

atentamos para a construção da autonomia, dos conceitos, das habilidades, do

conhecimento físico e social (2001, p. 70).

Em todos os momentos do cotidiano escolar, a criança está sempre em constante

aprendizado, por isto desmistificar essa dicotomia é um fator que merece estar presente no

planejamento.

Didonet também descreve que “não há conteúdo ‘educativo’ na creche desvinculado dos

gestos de cuidar. Não há um ‘ensino’, seja um conhecimento ou um hábito, que utilize uma via

diferente da atenção afetuosa, alegre, disponível e promotora de progressiva autonomia da

criança” (2003, p. 9). Assim, um conceito está unido ao outro, pois a cada gesto dos educandos

há ensinamento, educar e cuidar estão presentes, não tendo superioridade, mas sim

entrelaçamento.

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Para superar a dicotomia entre o educar e cuidar, Assis (2008) sugere que haja a

mudança de entendimento do que seja educar, para alguns profissionais, que ultrapasse o olhar

que consiste em reproduzir práticas comuns que estão no ensino fundamental e em outras etapas

da educação, pois enquanto estas práticas permanecerem, o cuidar e o educar estarão

continuamente em segundo plano.

Nesse mesmo sentido, Kramer (2005) propõe que o cuidar não deve estar vinculado

apenas para as crianças pequenas, pelo fato de que considera o cuidar como um objetivo, como

uma natureza e especificidade que deveria permear a Educação Infantil. Sobre este olhar “[...]

o cuidado é, portanto, considerado tão importante quanto à educação, pois a professora que

cuida, educa, e a que educa cuida, ambas são inerentes à profissão docente na Educação

Infantil” (apud ASSIS, 2008, p. 98).

Cuidar e educar é impregnar a ação pedagógica de consciência, estabelecendo uma

visão integrada do desenvolvimento da criança com base em concepções que

respeitem a diversidade, o momento e a realidade peculiares à infância. Desta forma,

o educador deve estar em permanente estado de observação e vigilância para que não

transforme as ações em rotinas mecanizadas, guiadas por regras (FOREST; WEISS,

2007, p. 2).

Para tanto, é necessário que o professor organize de maneira sensível e ética, situações

que promovam oportunidades de aprendizagem que garantam o desenvolvimento integral da

criança, nos diferentes espaços da Educação Infantil. Já que os primeiros anos de vida são

marcados pelas descobertas, experiências e aprendizados, que essencialmente ocorrem na

interação permeada assim, pela afetividade e pela estruturação de sua autonomia (SILVA,

2014).

3.3 O QUE REVELAM AS PESQUISAS SOBRE EDUCAR E CUIDAR NA CRECHE?

O estado de conhecimento faz parte do processo da pesquisa científica, por meio deste,

é possível pesquisar sobre um assunto e saber o que já está sendo desenvolvido sobre ele. Deste

modo, o pesquisador pode iniciar seus estudos pelo que já foi descoberto ou aprofundando ainda

mais a problemática de pesquisa de um determinado assunto. Morosini caracteriza o estado de

conhecimento como a

identificação, registro, categorização que levem à reflexão e síntese sobre a produção

científica de uma determinada área, em um determinado espaço de tempo,

congregando periódicos, teses, dissertações e livros sobre uma temática específica”,

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ajudando na “contribuição para a presença do novo na monografia (MOROSINI,

2014, p. 155).

Morosini (2014) ainda aborda que o Estado de conhecimento possibilita uma vasta e

ampla compreensão do que se está sendo investigado, sendo primordial para a pesquisa; sendo

assim, a elaboração do Estado de Conhecimento permite um mapeamento das ideias que já são

existentes, fornecendo segurando sobre o assunto que se está estudado. Pois, por meio deste

assunto é que norteará os passos da investigação realizada, por intermédio de outras produções

intelectuais.

Partindo destas afirmações, nesta sessão serão evidenciados os resultados encontrados

do que já foi pesquisado sobre educar e cuidar na creche. A pesquisa do estado de

conhecimento, como já citada no capítulo 1, foi realizada em teses e dissertações da Biblioteca

Brasileira Digital de Teses e Dissertações. Para tanto, a seguir será apresentado um quadro

categorizando o autor, ano, universidade e objetivos encontrados nos trabalhos.

Quadro 2: Resultados do descritor “Educar e Cuidar”

RESULTADO DO DESCRITOR “EDUCAR E CUIDAR”

AUTOR ANO E

UNIVERSIDADE

TÍTULO TIPO OBJETIVO

ANDRADE,

Cristine

Batista

2009

UNICAMP

Entre o saber e

o poder: o

trabalho de

cuidar e educar

Tese Analisar as relações e as

condições de trabalho entre

monitoras e professoras

mediante do educar e do cuidar.

MENILCE,

Antonia Da

Silva

2014

UFMT

O cuidar/educar

nas narrativas

de professoras

de uma creche

de rio

branco/AC

Dissertação Compreender concepções e

práticas narradas sobre o cuidar e

o educar pelas professoras de

uma creche de Rio Branco/AC.

SANTANA,

Fabiane

Cristina

2011

PUC

Cuidar e educar

da primeira

infância

tendências

investigativas

na produção

acadêmica

paulista

Dissertação Analisar as tendências

investigativas da produção

acadêmica paulista tendo como

temática o educar e o cuidar da

primeira infância em instituições

de educação infantil, sendo

produzidas entre os anos de 1997

e 2009.

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SHEN, Luize 2014

UFRGS

Do cuidar ao

educar na

educação

infantil: efeitos

de sentidos

Dissertação Analisar a Educação Infantil no

processo de escolarização, por

meio de efeitos de sentidos

produzidos pelo sujeito-

professora sobre as suas práticas

realizadas na escola.

OLIVEIRA,

Maria das

Graças

2011

UNICAMP

A relação entre

a família e a

creche pública

no cuidado e na

educação das

crianças

Tese Analisar como acontece as

relações entre as famílias e as

creches públicas e como esta

construção se ocorre no

cotidiano.

LINS,

Claudemir

Cunha

2014

USP

O hibridismo

nas práticas

docentes no

centro de

educação

infantil: entre o

cuidar e o

educar

Dissertação Estudar as práticas docentes no

Centro de Educação infantil do

municio de São Paulo

apresentando relações hibridas

entre educar e cuidar neste

contexto educacional.

Fonte: Construído pela autora

Mediante as teses e dissertações pode-se averiguar que os autores buscaram trazer a

importância de educar e cuidar no contexto da creche. Os resultados encontrados nos trabalhos

elencam diversas referências bibliográficas que expressam a indissociabilidade do educar e

cuidar, entretanto expressam que ainda há necessidade deste assunto ser mais estudado,

dialogado e investigado por todos que fazem parte da comunidade escolar, principalmente

professores e auxiliares.

A tese Entre o saber e o poder: o trabalho de cuidar e educar aborda questões

pertinentes ao presente trabalho de conclusão de curso. A autora apresenta indagações sobre

como educar e cuidar ocorre separadamente, mais especificamente como o educar fica a cargo

das professoras e o cuidar destinado às monitoras, ocorrendo uma hierarquia de poder entre

estes profissionais, que em sua grande maioria são mulheres. Para que a autora encontrasse

respostas utilizou a pesquisa de campo e realizou entrevistas para analisar o setor público

(escola municipal) da educação infantil; realizando sua pesquisa em uma creche da cidade de

Campinas entre 2003 a 2006, analisando sobre como as professoras e as monitoras construíam

suas trajetórias e representações sobre o trabalho na creche. A autora conclui sua tese relatando

que as relações tanto sociais quanto de poder no trabalho ente professoras e monitoras mostram-

se antagônicas, ao mesmo momento que ambas estão inteiramente ligadas a uma mesma teia de

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interdependências, ainda existe esta subdivisão de afazeres. Assim, ainda nos dias de hoje

existem conflitos e tensões em salas de aula (ANDRADE, 2009).

O cuidar/educar nas narrativas de professoras de uma creche de Rio Branco/AC, a

autora em sua dissertação, buscou compreender as concepções e as práticas narradas por

professoras de uma creche em Rio Branco/AC; realizando uma pesquisa qualitativa, sendo que

sua produção de dados esteve vinculada a entrevistas semiestruturadas e observações

momentâneas das práticas de quatro professoras. Neste trabalho a autora utilizou as DCNEI

como documento base para a Educação Infantil, com a pesquisa concluiu-se que nas narrativas

pesquisadas ainda existem conflito sobre o tema educar e cuidar, e que os profissionais que

trabalham na creche não conseguem perceber o entrelaçamento entre estes conceitos (SILVA,

2014).

“Cuidar e educar da primeira infância tendências investigativas na produção

acadêmica paulista”, é um trabalho de pesquisa que analisou as tendências investigativas de

produções acadêmicas paulistas tendo a temática principal sobre educar e cuidar na primeira

infância em instituições de Educação Infantil, analisando as produções entre os anos de 1997

até 2009. A autora em sua dissertação traz argumentos teóricos sobre a primeira infância das

crianças de como o educar e o cuidar estão interligados com a mesma, analisando uma reflexão

acerca das implicações que são envolvidas nas produções cientificas. Na conclusão, a autora

expressa que, o educar e o cuidar, possuem algumas tendências que foram reveladas como, seu

carater indissociável, as concepções sobre a criança como sujeito social e histórico, altamente

dotado de cultura e reconhecimento da função da Educação Infantil. descreve ainda que o

educar e cuidar devem estar ligados a projetos de democratização da sociedade, com objetivos

de emancipação dos sujeitos (SANTANA, 2011).

Com base em análises discursivas de fotografias e entrevistas com professoras, tanto

gravadas quanto descritas, a dissertação “Do cuidar ao educar na educação infantil: efeitos de

sentidos” foi uma pesquisa realizada entre os anos de 2012 e 2013, em uma escola municipal

de Educação Infantil de Novo Hamburgo, local em que a própria pesquisadora atuava como

professora; a mesma descreve momentos de educar e cuidar que acontecem cotidianamente, ou

seja, momentos de rotina das crianças, como o dormir, escovar os dentes, e nas brincadeiras,

dentro outros momentos que são realizados todos os dias. A conclusão que a autora traz refere-

se que o educar e o cuidar estão no cotidiano da Educação Infantil, no brincar das crianças;

podendo compreender que no ato do brincar as crianças atravessam os modos de como são

cuidadas e educadas, quanto sujeitos infantis com suas especificidades. Para tanto, os

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professores complementam o brincar na medida em que cuidam brincando e brincando educam

(SEHN, 2014).

Em “A relação entre a família e a creche pública no cuidado e na educação das

crianças”, a autora aborda sobre a importância da família e da escola estarem unidas em prol

das crianças. Ela realizou ainda investigações em duas escolas de educação infantil da cidade

de Belo Horizonte/MG, em turmas com crianças de zero até três anos de idade. As metodologias

basearam-se em analisar os espaços que as escolas destinavam para a união entre a família e a

escola, buscado a noção de cuidado e de educação; a coleta de dados aconteceu por meio de

observações, gravações, entrevistas semiestruturadas e questionários, vindo de encontro como

a construção deste trabalho de conclusão de curso. Na conclusão da pesquisa a autora evidencia

que percebeu que as famílias valorizavam as ações de educação e de cuidado, em que eram

desenvolvidas na creche. Nas creches pesquisadas houve levantamentos sobre o que as famílias

buscavam nas creches, e buscou-se mostrar a elas ações de educação e de cuidado (OLIVEIRA,

2011).

Na dissertação: “O hibridismo nas práticas docentes no centro de educação infantil:

entre o cuidar e o educar”, o autor inicialmente contextualiza historicamente a creche e como

educar e cuidar foram inseridos no sistema educacional, refletindo sobre como o professor

utiliza destes conceitos em seu trabalho docente, utilizando autores como Kishimoto, Kuhlmann

e Rosemberg. A metodologia escolhida pelo autor refere-se à qualitativa de cunho etnográfico,

sendo composto por anotações de diário de campo, aulas filmadas e fotografias. O estudo teve

o intuito de analisar minuciosamente os mecanismos de estruturavam as relações entre o cuidar

e educar. Assim o autor, destaca que estes conceitos são híbridos, ou seja, se complementam;

por isso o trabalho docente precisa estar vinculado sobre as relações hibridas entre o educar e o

cuidar, em que o professor esteja atento as suas práticas cotidianas e as suas escolhas aos

projetos pedagógicos (LINS, 2014).

Cabe aqui destacar que estes trabalhos encontrados e apresentados nesta seção, também

servirão como subsídios para a construção da análise do próximo capítulo deste trabalho.

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4 REFLEXÕES QUE PERMEIAM O EDUCAR E O CUIDAR NA CRECHE:

MEMÓRIAS (AUTO) BIOGRÁFICAS SOBRE O ESTÁGIO NA EDUCAÇÃO

INFANTIL

Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho,

a realidade e a fantasia,

a ciência e a imaginação,

O céu e a terra, a razão e o sonho,

são coisas que não estão juntas.

Dizem-lhe: que as cem não existem.

A criança diz: ao contrário,

as cem existem.

(Fragmento do poema de Loris Malaguzzi, 2016, p. 5)

Este capítulo foi construído a partir da produção de dados realizadas no Estágio

Curricular Supervisionado na Educação Infantil da Universidade Federal da Fronteira Sul –

Campus Erechim/RS, do curso de Pedagogia, desenvolvido na Escola de Educação Infantil

Favinhos de Mel, do município de Getúlio Vargas/RS, no segundo semestre do ano de 2018,

com uma turma de Berçário II, composta de 12 crianças na faixa etária de 1 e 2 anos.

As discussões que compõem este capítulo evidenciam processos que ocorreram nas

ações pedagógicas com as crianças, levando em consideração os aspectos indissociáveis de

educar e cuidar, com: a ênfase na criança como centro do planejamento educativo; a

organização dos espaços educativos, planejados para acolher as crianças; o aumento do tempo

para as atividades da jornada integral; ações que deram origem a quatro categorias de análise

que se tornam exemplos de aspectos fundamentais para iniciar reflexões sobre as funções da

Educação Infantil.

As categorias são apresentadas como proposições necessárias para que educar e cuidar

se desenvolvam de maneira indissociável na Educação infantil. As proposições são frases

afirmativas, formadas a partir da reflexão da produção dos dados, material empírico da análise

realizada e trazem ideias essenciais para construir uma escola que acolhe, que respeita e que

trabalha pela e com as crianças (SOUZA, 2012).

Para embasar teoricamente os conceitos de educar e cuidar nas ações cotidianas com

bebês e crianças bem pequenas, por meio das análises dos episódios de práticas pedagógicas,

foram utilizados autores que refletissem sobre estas questões como: Ritscher (2013), Kramer

(2010), Souza (2007), Horn e Gobbato (2015), Stacciolli, (2013), Angotti (2006), além dos

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documentos Brinquedos e Brincadeiras de Creche: Manual de Orientação Pedagógica,

(BRASIL, 2012) e das DCNEI (BRASIL, 2009a) e sua revisão (BRASIL, 2009b).

Por motivos éticos e conforme acordo elaborado no Termo de Livre Consentimento e

Esclarecido assinado pelos pais, as identidades das crianças foram preservadas; por isso, serão

usadas letras do alfabeto para diferenciar cada participante: A, B, C, D, E, F, G, H e I.

Para viabilizar as reflexões, serão utilizadas imagens que demonstrem as experiências

desenvolvidas durante o estágio em Educação Infantil, pois acredita-se que a fotografia como

instrumento de documentação, permite fornecer pistas para pensar, investigar, interpretar o

mundo, perceber necessidades, relações, intercâmbios estabelecidos, afinal: “A documentação

fotográfica pode revelar todas as questões através dos rostos, dos olhos, da boca, dos gestos,

das posturas, dos pequenos sinais, que são as espias dos sentimentos, das tensões, dos esforços,

do prazer, do desejo, das expectativa (HOYUELOS apud FOCHI, 2015, p. 79).

Como também foram realizados registros em forma de gravações, mídia essencial para

deixar visíveis as interações mantidas pelos bebês e as crianças bem pequenas, elaborou-se no

decorrer dos subtítulos QR codes - um código de barras, tendo este determinado nome pelo fato

de que pode ser acessado rapidamente; é necessário baixar o aplicativo3 QR code e ler o código

de barras com o celular, assim poderão ser assistidos os vídeos.

As situações narradas fazem parte do projeto: “Bebês e crianças bem pequenas

investigando luz, som e sombra”, que foi desenvolvido com o intuito de proporcionar

experiências que viessem ao encontro dos incisos I, VIII e XII do Artigo 9º das DCNEI

(BRASIL, 2009a), além de trazer para o estudo temáticas que despertavam interesse e

curiosidade no grupo de crianças que faziam parte da turma. Desta forma, durante os dias que

constituíram a monitoria4, podem-se observar nos vídeos que as crianças encantavam-se pelas

luzes, sons e sombras, manifestando desejo em explorar, pesquisar, investigar e descobrir mais

sobre estes recursos.

3 Para baixar o programa, basta abrir sua loja de aplicativos do celular e digitar: “QR Code”. Em seguida

aparecerá o aplicativo para baixar em seu celular de forma gratuita, posteriormente basta abrir o programa e focar

na imagem do QR Code que automaticamente o vídeo estará disponível para assistir.

4 A monitoria se constituía uma das partes do Estágio em Educação Infantil, este tinha a duração de 10

dias, em cada dia no planejamento da professora regente eram realizadas diversas experiências com continuidade,

para observar quais seriam os interesses expressos pelas crianças e assim desenvolver as intervenções do projeto

de estágio.

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4.1 EDUCAR E CUIDAR PRECISAM SER CONCEBIDOS COMO FORMAS DE

ACOLHIMENTO DAS CRIANÇAS

Como já discutido nesse trabalho, educar e cuidar são indissociáveis (BRASIL, 2009b),

assim é primordial compreender que para que isso aconteça conjuntamente é preciso acolher

outro, estar sensivelmente aberto para se dispor ao outro. Falar em acolhimento é pensar no

educador italiano, Gianfranco Staccioli que afirma:

Acolher uma criança é, também, acolher o mundo interno da criança, as suas

expectativas, os seus planos, as suas hipóteses e as suas ilusões. Significa não deixar

passar, como se fosse tempo inútil, o tempo que a criança dedica às atividades

simbólicas e lúdicas, ou o tempo empregado para tecer relações “escondidas” com

outras crianças (STACCIOLLI, 2013, p. 28).

Com esta afirmação é perceptível a importância que o professor possui a cada acolhida

que realiza com as crianças, tendo um olhar sensível e uma escuta ativa para poder acolher de

fato, observando cada criança, suas necessidades, suas características e suas demandas. Acolher

não tem relação somente com o início do ano letivo, com os períodos de “adaptação”, em que

as escolas geralmente organizam situações para receber as crianças; acolher é um método de

trabalho que deve estar presente no dia a dia das escolas infantis (STACCIOLLI, 2013).

Nesta perspectiva, se faz necessário que o professor acolha as crianças e todas as suas

formas de expressão, de maneira que possa escutá-las e olhá-las sensivelmente, pois segundo

Ritscher,

escutar significa assumir uma postura de investigação, significa tentar se colocar na

perspectiva da criança que está querendo entender os mecanismos da linguagem, e

significa tentar compreender quais hipóteses está construindo. Escutar significa

aceitar construções que talvez não correspondam ás regras usuais da língua (2013, p.

37).

Além de estar atento a tudo o que norteia as crianças, o professor precisa estar disposto

para que isto aconteça. No poema do italiano Gianni Rodari, encontramos uma analogia sobre

um homem de orelha verde, que apesar de velho consegue conservar a sensibilidade da escuta;

o poema relata que devemos ter orelhas verdes, para escutar tudo o que acontece ao nosso redor,

para escutar as crianças e nunca perder o encanto de suas primeiras, novas e continuas

experiências. Assim, este poema nos faz refletir sobre o que é ser professor de Educação

Infantil:

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Imagem 01: Poema: O homem da orelha verde

Fonte: Construção da autora, 2019.

Ser um professor da(s) infância(s) é estar disponível como o homem das orelhas verdes;

é ter orelhas de criança para que assim, possa se aproximar delas e compreender sua essência,

seus desejos, suas singularidades, pois quando o adulto esquece como é ser criança, muitas

vezes perde a sensibilidade, não escuta e nem observa as crianças. Por isso, o poema se

aproxima muito da ideia de acolhimento; uma escola da infância é uma escola da orelha verde,

uma escola da infância, tem o compromisso de garantir a todas as crianças possibilidades de

vivenciarem diversas experiências reais, variadas, globais e complexas (RITSCHER, 2013).

Pensando nessa premissa de acolhimento, muitas situações desenvolvidas no estágio

vieram ao encontro dessa ideia, por isso serão narrados aqui alguns episódios. O primeiro diz

respeito à experiência com amido de milho e a projeção de um vídeo virtual chamado de

“caleidoscópio”; nesta experiência a sala de aula foi toda organizada para acolher as crianças,

no chão havia um papel pardo circunscrevendo o espaço de exploração, para que as crianças

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pudessem perceber o espaço destinado à situação, também havia bacias com amido de milho e

água, o vídeo foi reproduzido em cima dos objetos dispostos no chão.

Quando as crianças chegaram à sala, ficaram deslumbradas pelas imagens que

apareciam no vídeo, aos poucos elas começaram a se aproximar do espaço. A criança A foi a

primeira criança a encostar-se às bacias com o amido de milho; logo em seguida a criança B,

se aproximou, a criança C estava um pouco receosa em pisar no papel pardo que estava fixado

no chão, pelo fato das imagens estarem aparecendo nele também, então a mesma estendeu a

mão para a professora para que se sentisse segura em andar por cima do papel pardo.

Neste momento é possível perceber o quanto os professores que atuam com os bebês

precisam estar atento a tudo o que acontece. A criança C não expressou seus sentimentos pela

fala, mas sim, suas expressões faciais e corporais, traziam à tona seu receio em pisar naquele

espaço e procurou segurança na professora. Tristão ressalta a

importância das professoras de crianças pequenas olharem, ouvirem e sentirem os

meninos e as meninas dos grupos pelo quais são responsáveis, aprendendo a auscultar

seus ritmos e suas cadências, de forma a não se deixarem levar pela voracidade de

uma rotina que automatiza ações e homogeneíza pessoas. Volto à discussão do

determinante para a prática pedagógica de perceber cada uma das crianças como um

ser único e especial, que não está pré-definido, mas está aberto para a surpresa e para

o maravilhamento que vão se mostrando ao longo da jornada educativa de quem olha

com interrogação para a pequena criança (2004, p. 5).

Cada criança é única, e cada uma sente o ambiente de um modo, é por este motivo que

o professor precisa estar sensível, para notar os detalhes que acontecem com os bebês e as

crianças bem pequenas, acolhendo assim seus mundos internos e suas demandas (STACCIOLI,

2013).

Desta maneira, destaca-se aqui que estar sensivelmente aberto para ouvir as crianças,

não é uma tarefa simples, principalmente para com os bebês e as crianças bem pequenas, pois

muitas ainda não verbalizam o que sentem. Então, o professor precisa ouvi-las percebendo suas

expressões tanto faciais quanto corporais. Parafraseando Cruz (2009), é necessário viabilizar

uma escuta sensível para com a criança, escutar, seus desejos, seus temores, alegrias e

decepções.

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Imagem 02 – Fotografia do espaço acolhendo as crianças

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

As crianças exploravam o espaço mexendo no amido de milho e observando cada

imagem que refletia no mesmo. A criança B por alguns instantes mexeu com as mãos no

material, mas depois não o fez mais, percebeu-se então, que ela não estava mais à vontade para

mexer com as mãos, por este motivo, foi entregue a criança um pincel

com o intuito de que realizasse a exploração com um instrumento. Logo a criança começou

novamente no amido de milho, refletindo assim que a estratégia de usar um instrumento de

mediação para a exploração foi positiva. Além disso, percebi nessa situação que cada criança

tem sua individualidade, e os professores necessitam estarem atentos as especificidades de cada

uma, proporcionando outros elementos para que a criança também possa se envolver pelas

situações propostas.

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Imagem 03- Fotografia das crianças vivenciando o espaço

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Esta experiência proporcionada no estágio percebe-se que o acolhimento foi planejado

e (re)planejado; sendo assim, se faz necessário que o professor pense em tudo o que é proposto

nas acolhidas, como, por exemplo, o conteúdo das bandejas para exploração. Pois sabe-se que

os bebês e as crianças bem pequenas ainda exploram o mundo pelo paladar, pensou-se em

colocar o amido de milho neste espaço, pois por ser um alimento, se as crianças o explorassem

com o paladar o seu gosto e textura, não faria nenhum mal.

O inciso I do artigo 8º, do Parecer CNE/CEB 20/2009, descreve que a educação

percebida de modo integral, entende “[...] o cuidado como algo indissociável ao processo

educativo” (BRASIL, 2009b, p. 9). É por este fato que se pensa em todos os detalhes que

envolvem este acolhimento.

Outra situação que demonstra o acolhimento como forma de educar e cuidar foi o

replanejamento do espaço do sono das crianças; como forma de acolhimento, foi convidada

uma professora da escola para cantar e tocar violão. No primeiro contato com esta professora

as crianças estavam um pouco receosas, entretanto conforme ela começava a cantar as músicas,

as crianças batiam palmas e sorriam, expressando que estavam gostando deste momento. No

primeiro momento cantaram-se as músicas sentadas no tatame, em seguida as crianças seguiram

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para a sala do sono, cada criança pegava a sua mamadeira e seguia para o seu colchonete

identificado com a sua foto. Algumas crianças já conseguiam tirar os sapatos para dormir, outras

necessitavam de ajuda; a professora começou a cantar e a tocar uma música muito suave, e cada

criança aos poucos foi terminando o leite de suas mamadeiras e adormecendo com a canção.

No segundo momento quando a professora entrou pela porta as crianças já começaram

a gritar: “Viva, hee”, conforme a professora cantava as crianças faziam gestos, cantavam, e

alguns chegaram perto do violão para passar a mão nas cordas fazendo som, também dançavam

e cantavam as músicas propostas, assim como pediam músicas que conheciam como

“tomatinho vermelho”, “o alface”, entre outras. Em seguida cantaram-se novamente músicas

suaves para que as crianças pudessem dormir.

A música é essencial para as crianças, segundo a Revisão das DCNEI, no artigo 9º,

inciso II, “a imersão das crianças nas diferentes linguagens e o progressivo domínio por elas de

vários gêneros e formas de expressão: gestual, verbal, plástica, dramática e musical” (BRASIL,

2009a, p. 4), são ações que devem ser favorecidas pelo currículo da Educação Infantil.

Imagem 04- Fotografia das crianças no momento de musicalização aliado ao sono

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Outra experiência planejada para o acolhimento do sono das crianças foi a utilização do

projetor para mostrar vídeos e músicas virtuais, em um dia foi colocado um vídeo virtual de

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uma árvore com muitas flores, com sons de pássaros, quando as crianças chegaram na sala do

sono, ficaram surpresas, começaram a pular e a dar gritos de felicidades, alguns expressando

sua felicidade pelas suas expressões corporais e faciais, e outras crianças além disto falavam:

Criança E: “A to feliz”

Criança A: “O pipi”

Criança D: “Isso aqui é a arvole?” (olhando para o vídeo).

As crianças também começaram a passar a mão no telão e ficavam olhando admirados

para o vídeo. Logo após, foram pegando as suas mamadeiras deitando nos colchonetes, alguns

foram antes dos outros, respeitando a individualidade de cada um. O som dos passarinhos foi

deixado e aos poucos cada criança foi adormecendo.

Imagem 05- Fotografia das crianças nos momentos de sono

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Em todos estes momentos da jornada da escola, é crucial que se pense na criança, são

momentos que não podem ser vistos como algo secundário, e por tanto devem ser planejados

em conjunto. De acordo com Horn e Gobbato é

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[...] igualmente importante é planejar os espaços para atender às rotinas de cuidados

corporais, pois devemos acolher com dignidade as necessidades de sono, higiene e

alimentação dos bebês e das crianças bem pequenas, dando-lhes oportunidade para

que participem desses momentos ativamente, agindo com o tempo de que necessitam

para gradativamente irem realizando essas ações com maior independência (2015, p.

74).

Para Faria “o fato de fazermos determinadas atividades todos os dias, como dormir,

comer, banhar-se, etc., não autoriza a profissional de educação infantil a fazê-las iguaizinhas

todas às vezes, mas sim a desafiar a cumprir estes rituais, com intencionalidade, no conjunto

das ações educativas” (2001, p.71). Isto representa que os momentos que ocorrem

cotidianamente, não precisam ser monótonos, carregados de proibições, de “nãos”, “não pode

isto”, “não pode aquilo”, mas sim espaços com ricas experiências que agregam tanto na vida

das crianças quanto na vida do professor.

Outro espaço organizado foi o das refeições, para os momentos de lanche e almoço.

Afinal como afirma Gianfranco Staccioli, é preciso

[...] preparar bem os ambientes [...]. Quanto mais forem pensados em função das

atividades e da autonomia das crianças, mais fazem surgir situações interessantes,

relações que permitem que as crianças se sentem bem, contextos que possibilitem

aos adultos perceber a riqueza da vida infantil e também seus efeitos na construção

do conhecimento (2013, p. 34).

A ideia de que o professor planeje a acolhida das crianças nestes momentos é essencial,

pois como ficam a maior parte do tempo na escola, é necessário haver um aconchego, uma

segurança que permita que as crianças se sintam bem e saibam que aquele momento não só

alimenta o corpo, mas as emoções, os afetos, os cheiros que nos compõem enquanto humanos.

Assim os lanches e almoços também eram detalhadamente planejados de forma

acolhedora, por isso todos os dias na mesa havia uma tolha e no centro dela um vaso com flor

feita de tecido para receber as crianças nos momentos de refeição. Realizou-se a escolha desta

flor, por um momento em que vivenciei; uma mulher na rua estava vendendo sua arte passando

de pessoa em pessoa, para ajudá-la comprei aquela flor, no mesmo instante considerei em levar

a flor feita de tecido para escola, assim embelezando ainda mais a mesa utilizada pelas crianças

até por que, ainda não se tinha flor naquele vaso.

Para o lanche a professora auxiliar preparava-o na cozinha e levava para mesa,

geralmente no lanche tinha alguma fruta e bolachas. Então, para fortalecer mais a autonomia, a

professora passava o prato com as frutas e se a criança gostasse pegava, se não gostasse não

precisaria pegar, compreendendo que cada criança é um ser individual e como tal, tem gostos

diferentes.

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Nos horários de almoço a mesa era organizada novamente com a toalha e o vaso, logo

após eram dispostos os pratos de plásticos para cada criança, e copos para que a criança que

sentisse sede pudesse usar; ao lado de cada prato foi disposto guardanapos para que as crianças

pudessem limpar a boca e as mãos no final da refeição, depois cada uma colocava no lixo o seu

papel, o guardanapo foi inserido no intuito de oferecer um instrumento para as crianças poderem

se limpar, pois usavam a roupa e o corpo para isso. Também pensando em proporcionar

momentos que a criança tenha independência.

Nesses momentos as crianças iam narrando os acontecimentos, demonstrando o quanto

era significativo para elas:

Criança G: “Agola pega o guadapano”.

Criança F: “Faz assim” (demonstrando para o colega como se limpava a boca com o

guardanapo).

Criança F: “Joga lixo, fofi” (seguindo para o lixeiro jogar fora o guardanapo).

Como na escola havia espelhos no refeitório, muitas das crianças iam até a frente do

espelho, observavam cada movimento que faziam para limpar a boca e verificavam como havia

ficado. Neste momento reforço a ideia de que educar e cuidar, estão entrelaçados ao

acolhimento das crianças.

Por meio destas fotografias, percebe-se quão importante é o fato de pensar no

acolhimento do cotidiano da Educação Infantil; quando a criança está inserida em um contexto

acolhedor, o “leque” de possibilidades de explorarem tudo o que está ao seu redor, sem receios,

sem medos se abre. Desta forma, os professores precisam se incumbirem da tarefa de planejar

todos os dias estes momentos da jornada na escola, o que não representa apenas os primeiros

horários da manhã, mas sim o dia todo: chegadas, partidas, espaços, materiais, refeições,

higiene, deslocamentos, brinquedos, etc

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Imagem 06- Fotografia das crianças no momento de lanche e almoço

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

.

Para poder ver mais fotografias e gravações,

destes momentos de acolhidas é só acessar este QR

Code, e assim encantar-se com as explorações

vivenciadas pelos bebês e crianças bem pequenas.

4.2 RECONHECER A CRIANÇA COMO UM SUJEITO HISTÓRICO E DE DIREITOS É

PREMISSA PARA CUIDAR E EDUCAR

Muitas pesquisas têm surgido sobre as crianças e suas maneiras de viver a(s) infância(s)

(KRAMER, 2010; KUHLMANN Jr, 2000; ANGOTTI, 2006; RITSCHER, 2013;

FERNANDES, 2004), fato que traz mudanças significativas ao meio educacional, pois se

mudamos nosso modo de pensar e conceber as crianças, também mudamos nosso modo de

educá-las.

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A criança produz sua história, produz sua cultura, pensa, sente, brinca, aprende, explora

o mundo ao seu redor por meio de inúmeras linguagens; desta forma, na atualidade é

considerada como um sujeito histórico, um sujeito de direitos, um “[...] sujeito social,

investigado, observado e compreendido a partir de perspectivas investigativas e teóricas

distintas” (SOUZA, 2007, p. 07).

O professor na Educação Infantil precisa compreender que cada criança é única, e tem

o compromisso de entender as suas singularidades, mantendo-as vivas e conscientes, para que

assim, durante a suas jornadas escolares não sejam desrespeitadas e nem colocadas sob

situações das quais não conseguem resolver; por meio das práticas de educar e cuidar, deve ser

assegurada seu pleno desenvolvimento pelas vias da integração perante seus aspectos físicos,

cognitivos, emocionais, afetivos e sociais (ANGOTTI, 2006).

Os professores que atuam com os bebês e as crianças bem pequenas5 necessitam pensar

nos momentos de acolhidas, para que assim contemplem as necessidades das diversas crianças

que compõem o espaço educativo. Quando o professor reconhece de fato que a criança é um

sujeito, de direitos, que possui uma história, passa a enxergá-la com outros olhos, assim, uma

proposta ocorrida no estágio que ilustra este conceito, aconteceu quando se explorou luz e

sombra no pátio da escola.

Nessa situação, foram fixadas imagens de animais, flores e folhas, em cima de uma rede

de tule, colocados no pátio interno da escola, para que a luz solar projetasse nas imagens e as

sombras aparecessem no chão. A ideia era que as crianças brincassem com as sombras. As

crianças identificaram algumas imagens como a do cachorro, porém enquanto as crianças

vivenciavam este momento, percebi que quando o sol refletia as imagens mudavam de tamanho,

sabendo que foram impressas em tamanho grande, assim compreendi que na próxima

experiência teria que realizar a impressão dessas imagens ainda maior.

Entretanto nessa primeira experiência, o que mais chamou a atenção das crianças foram

as sombras da árvore que tinha no pátio interno, assim compreendi que as crianças estavam

demonstrando mais atenção para as sombras já existentes neste ambiente; elas já frequentavam

esse ambiente desde o início do ano, mas ainda não haviam percebido as sombras ali existentes.

Assim, pode-se identificar a ampliação na percepção perante as investigações realizadas, e por

meio da continuidade desta experiência.

5 Conforme divisão etária da BNCC compreende-se que bebês são crianças de 0 a 1 ano e 6 meses e

crianças bem pequenas de 1 ano e 7 meses a 3 anos e 11 meses (BRASIL, 2017).

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Imagem 07- Fotografia da primeira exploração com as sombras no pátio

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Neste primeiro convite para exploração de luz e sombra, consegui realizar diversas

reflexões, pois apenas proporcionando a experiência pode-se notar que as imagens diminuíam

quando refletidas no sol. Segundo Ritscher “após ter delimitado o ambiente e o programa de

acordo com o estilo acolhedor, é necessário gerenciar, manter, reorganizar e renovar

constantemente. São necessários cem olhos, antenas, fato, agilidade, flexibilidade, firmeza [...]”

(2013, p. 19). Desta maneira, é imprescindível estar atento a tudo o que está acontecendo no

momento de planejar essas acolhidas com as crianças, desenhando caminhos de continuidade

que tenha ela como centro, que tenham suas ideias reconhecidas.

Em outro momento realizei a impressão das imagens maiores e as crianças conseguiram

identificar melhor as sombras fazendo diversos desenhos; perceberam também as suas próprias

sombras e começaram a desenhar nelas. O detalhe mais importante é que as crianças por elas

mesmas foram identificando suas sombras, sem precisar que alguém ficasse falando para que

observassem, pois foram investigando aos poucos todas as possibilidades de se encantarem com

o espaço.

Para que todas estas descobertas acontecem, foi necessário refletir sobre a criança, de

como ela era capaz, reconhecer ainda ela como um sujeito histórico e de direitos (BRASIL,

2009a).

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Imagem 08- Fotografia das crianças explorando pela segunda vez luz e sombra

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Criança A: “A bileta”.

Criança G: “Olha o cachorro, au, au, au”.

Desta forma ficou nítido compreender, que quando as crianças exploram todo o

ambiente novamente, permite-se a elas novas descobertas e investigações, como descobrir suas

sombras refletidas no chão; assim, cabe aqui a premissa da continuidade, já descrita neste

trabalho. Augusto (2015) aborda toda está questão de que a continuidade permite que as

crianças verdadeiramente explorem, investiguem a cada novo momento produzam novos

significados. Sendo que nesta experiência em um primeiro momento as crianças se encantaram

com as sombras daquele espaço, chamando a suas atenções; mas na segunda vivência

aconteceram outras inúmeras explorações, como a descobertas de suas sombras. Em ambas as

situações as crianças de certo modo “ignoraram” as sombras que havia confeccionado para

explorar e me mostraram outros caminhos de exploração, os quais só pude perceber por

reconhecer suas potencialidades.

Para tanto a continuidade das propostas, significa escutar as crianças, escutar suas falas,

seus interesses e verdadeiramente coloca-las como protagonistas do currículo, mantendo o olhar

sensível. Ritscher (2013) e Staccioli (2013) salientam que quando os adultos escutam as

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crianças, assumem uma postura de investigação, de compreenderem as hipóteses formuladas

pelas crianças desta forma, escutar representa se colocar na perspectiva criança. Todavia,

quando educamos e cuidamos estamos reconhecendo a criança como sujeito, um sujeito

histórico e de direitos, que precisa ser vista como um sujeito que produz cultura e história

(BRASIL, 2009a; BRASIL, 2009b).

Ao compreender a criança como sujeito de direitos, salienta-se que um de seus direitos

é ter espaços que as acolham, que sejam limpos, seguros (BRASIL, 2009c), sendo assim cabe

ao professor organizar estes espaços na Educação infantil, pensando em como garantir que os

direitos das crianças sejam respeitados.

4.2.1 Musicalização e os Bebês e as Crianças Bem Pequenas

Nesta turma, os bebês e as crianças bem pequenas tinham um gosto aguçado para

instrumentos musicais, assim, projetou-se um vídeo virtual de alguns artistas fazendo música

com instrumentos feitos de materiais alternativos, como: chocalhos feitos de garrafas pet e

sementes, tampinhas também de garrafas pet, tambores e madeiras reutilizáveis para poderem

batucar, preparou-se o espaço com diversos instrumentos musicais, também feitos de materiais

alternativos.

Em um primeiro momento algumas crianças ficaram observando o vídeo chegando bem

perto da tela e passando a mão no mesmo, enquanto outras já seguiram para bater nos tambores

e chacoalhar, os chocalhos feitos de tampas de garrafa pet. As crianças expressavam sua

felicidade ao explorar o ambiente, falas também sugiram no momento:

Criança D: “Olha os meninos ali”.

Criança F: “Bati fofi” (mostrando o bastão para tocar no tambor).

O som teve muito impacto nas crianças, pois conforme ouviam a batida da música as

crianças ficavam empolgadas batendo mais forte nos tambores. Correia afirma “que seja

considerado, para um trabalho cotidiano com música, a oferta de instrumentos musicais

alternativos e originais, com atenção e acuidade sonora, possibilitando que os bebês e as

crianças pequenas possam explorar de forma livre estes materiais oferecidos” (2016, p. 221).

Essa colocação enfatiza a importância dos instrumentos originais e alternativos para as crianças

explorarem e investigarem o som que os mesmos fazem.

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Imagem 09- Fotografia das crianças vivenciando os instrumentos alternativos

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

A criança tem o pleno direito de expressar seus gestos, interesses e anseios, o professor

precisa estar atento a tudo isto e colocar em pauta no seu planejamento. Por isso que está

experiência foi planejada, pois ao ouvir o que as crianças queriam pode ser proposto um convite

a vivenciarem um momento enriquecido de sons.

Na próxima fotografia, fica evidente este conceito de colocar a criança como centro do

planejamento, no que diz respeito à altura e a distribuição dos instrumentos alternativos; é

possível observar que todos estão encima de uma caixa de papelão baixa, coberta por um tecido

preto (pensando no princípio estético do espaço conforme apontam as DCNEI – BRASIL,

2009a), o que permitia o acesso das crianças por todos os lados da caixa, assim as crianças

podiam pegar os instrumentos alternativos que quisessem, tendo liberdade e autonomia. Os

tambores também eram da altura das crianças, permitindo o manuseio.

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Imagem 10- Fotografia das crianças vivenciando os instrumentos alternativos

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Para tanto, é imprescindível perceber a premissa de quando o professor reconhece a

criança como um sujeito histórico e de direitos, começa a vê-la de modo diferenciado, refletindo

sobre quais são essas as crianças? Do que elas são capazes? Pelo que se interessam? Como

planejar? Por onde começar?. Assim, pensa em seus gostos, em seus interesses, nos materiais

que irá disponibilizar, de que modo os organizará, projetando a criança como centro do

planejamento e possibilitando verdadeiramente momentos cheios de significâncias.

Para poder ver mais fotografias e gravações,

destes momentos de reconhecimento das crianças

como sujeitos históricos e direitos, é só acessar este

QR Code, e encantar-se com as explorações

vivenciadas pelos bebês e crianças bem pequenas.

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4.3 É IMPORTANTE TER ESPAÇOS ACOLHEDORES, SEGUROS E ACONCHEGANTES

PARA EDUCAR E CUIDAR AS CRIANÇAS

A escola é território de diversas experiências, para que estas experiências aconteçam é

necessário um determinado espaço para que as crianças possam ambientá-lo e assim

enriquecerem suas aprendizagens.

Os espaços precisam ser pensados, de forma que contem a história de quem vive lá;

assim, compreender o significado da palavra espaço é essencial, já que este se refere a locais

nos quais são realizadas experiências, caracterizando-se pelos móveis, pela decoração, por

materiais didáticos e pelos objetos que pertencem ao mesmo. Outro termo que pode ser

significativo nesse contexto, refere-se à palavra ambiente, que corresponde a um espaço físico

e as diversas relações que se estabelecem neste espaço, como as relações de afeto e interpessoais

das pessoas que estão envolvidas neste processo, no caso, o adulto e criança (HORN E

GOBBATO, 2015).

Para tanto, é preciso de fato deixar que as crianças ambientem os espaços de forma

significativa, para que ampliem suas aprendizagens. Desta forma, podem-se destacar aqui

alguns espaços que foram organizados pensados nas crianças, pensando no seu bem-estar, no

seu acolhimento, refletido sobe quem são as crianças e principalmente pelo o que já são capazes

de fazer.

4.3.1 O espaço do sono e das refeições

Um espaço que sofreu mudanças e transformações no decorrer do processo do estágio,

pensando nos bebês e as crianças bem pequenas, foi o espaço do sono. Primeiramente realizei

o rebaixamento de teto e a inclusão de luzes de led pequenas na sala, com o objetivo de deixar

o espaço mais aconchegante, mais próximo das crianças, acolhendo elas de maneira mais intima

para o sono. A ideia era que o espaço trouxesse mais segurança, pois este momento muitas

vezes era caracterizado como um ato mecânico do cotidiano.

A porta que dava entrada para a sala do sono também foi modificada, foi fixado um

tecido com um espaço aberto, assim cada vez que as crianças seguiam para sala do sono,

adentravam de um modo diferenciado, que possibilitasse novas experiências corporais, sendo

assim algumas entravam apoiando-se nas paredes, outras entravam engatinhando, outras

pulando e desafiando-se, enfim cada criança foi encontrando o seu modo de passar pela mesma,

entendendo que cada criança tem seu tempo, sua individualidade.

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Imagem 11- Fotografia da organização do espaço do sono

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Como está descrito no documento “Critérios para um atendimento em creches que

respeite os direitos fundamentais das crianças” (BRASIL, 2009c), aqui já citado, os espaços

necessitam transmitir a segurança, proteção, afeto, espaços que sejam amplos, estimulantes para

que a total liberdade de expressões, fato objetivado com essa transformação.

Outra reflexão importante a se fazer sobre os espaços é a mesa organizada para receber

as crianças nos lanches e almoços, sendo pensado em cada detalhe para este fosse seguro, limpo,

aconchegante, pois como os bebês e as crianças bem pequenas vinham em turno integral na

escola, passavam a maior parte de seu tempo nela e fazia necessário trazer este aconchego em

todos os momentos do dia das crianças.

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Imagem 12- Fotografia da mesa organizada para receber as crianças

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Desta forma, o espaço precisa ser pensando e (re)pensado a cada momento, refletindo

sobre as crianças que ambientam este. Assim os espaços escolares são ambientados de relações,

experiências e construções; o desafio que é proposto na Educação Infantil para os professores,

é fomentar essa ambientação por parte da criança, para que assim, possa haver uma relação

entre o sujeito/ambiente.

4.3.2 Canto temático: Cantores

Outro espaço organizado na sala de referência foi o dos “cantores”, onde as crianças

tinham plena liberdade para atuarem, havendo uma ação ativa em todos os momentos. O espaço

foi criado a fim de atender a experiência, que promovesse o conhecimento de si por meio da

ampliação de experiências sensoriais, corporais e expressivas; assim havendo a expressão da

individualidade e respeito pelos ritmos de cada criança, descrita no inciso I do artigo 9º das

DCNEI, que havia sido assinalado pela professora em entrevista no início do processo de

estágio (BRASIL, 2009a).

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Tocar, cantar, dançar, testar suas habilidades manuais, ouvir sua voz no microfone, dizer

“oi” “oi” inúmeras vezes só para rir e perceber o som saindo pelas caixas de amplificação,

comunicar-se com os outros, foram exemplos de situações vividas pelas crianças nesse local.

Ao brincar neste espaço as crianças puderam criar diversos contextos, ampliando suas

brincadeiras e interações.

Imagem 13- Fotografia do Canto temático dos Cantores

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Segundo Horn (2015) no instante que o professor, neste caso referindo-se a ele como o

parceiro mais experiente, alia-se a um espaço que promove a descentralização da sua própria

figura e que incentive as iniciativas infantis; neste momento automaticamente abre espaço para

grandes possibilidades de aprendizados sem precisar de uma intervenção direta. Aspecto

possível de ser observado neste espaço, quando se é colocado os desejos e interesses de

investigações das crianças, desta maneira se descentraliza a figura do professor e abre-se espaço

para que os bebês e as crianças bem pequenas realizam verdadeiras aprendizagens e

descobertas.

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Imagem 14- Fotografia das crianças interagindo com o espaço

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Sem dúvidas, era possível ver as diversas interações que estavam fazendo neste

ambiente, sendo acolhidas a se sentirem em um grande show, as crianças tocavam os tambores,

chacoalhavam os padeiros e viravam de um lado para o outro o instrumento pau de chuva.

Interagindo e aprendendo com os instrumentos disponibilizados de maneira segura, acolhedora,

limpa e atraente (BRASIL, 2012; BRASIL, 2009b).

Cabe aqui refletir ainda que a forma como o espaço está organizado, impulsiona as

relações, assim quando a criança observa, toca, investiga e desbrava o espaço, o ambienta de

maneira que suas investigações se tornam parte delas mesmas. Mas para que tudo isso seja

possível, é fundamental que o professor escute; como aqui já destacamos esta escuta precisa ser

tão profunda a ponto de fazer algo com o que se ouve ter uma ação entre o que se escuta o que

se faz (FRIEDMANN, 2017). O professor necessita ter uma visão transformadora em relação à

escuta.

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4.3.3 Espaços de projeção para brincar com luz e sombra

Refletindo sobre os espaços, de como necessitam ser organizados para os bebês e as

crianças bem pequenas, no estágio organizou-se espaços de brincadeiras com o uso

retroprojetor. Em um primeiro momento o retroprojetor foi colocado em uma mesa, ligado e

quando as crianças chegaram à sala notaram-se as expressões de encantamento, espanto,

alegria, em verem aquele espaço.

Neste dia deixei que as crianças explorassem o instrumento e o espaço da maneira que

queriam, com objetos da sala, com seus próprios corpos, partindo da curiosidade de cada um.

Além das expressões, falas também surgiram durante a vivencia:

Criança D: “Vamo colocar a coler lá”.

Criança F: “Peguei a mão, peguei a mão”.

Imagem 15- Fotografia das crianças explorando o espaço do retroprojetor

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Em um segundo momento, dando continuidade a experiência permitiu-se que as

crianças estabeleçam outros significados, pois a continuidade aliada ao espaço, proporciona aos

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bebês e as crianças bem pequenas inúmeras possibilidades de explorações, pesquisas,

investigações, e descobertas novas a cada novo momento vivenciado (AUGUSTO, 2015).

Então, foi disponibilizado para as crianças, réguas de modelos diferentes e também as

imagens utilizadas para a exploração das sombras no pátio interno da escola, que já eram

conhecidas, o que reforça a ideia de continuidade. Quando as crianças chegaram à sala de aula

o espaço já havia sido todo estruturado, o retroprojetor desta vez havia sido colocado no chão,

para que as crianças tivessem total acesso a ele, pois na outra vez foi percebido que ficou alto

para alguns. Ao observarem o espaço organizado, sorrisos começaram a surgir, pois já tinham

conhecimentos prévios tanto do retroprojetor quanto das imagens e assim foi possível

realizarem outras explorações com o mesmo, interagindo bastante e analisando todas as

sombras refletidas na parede.

Imagem 16- Fotografia das crianças explorando novamente o espaço

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

As crianças necessitam explorar os espaços com todo o seu corpo, com todo o seu

movimento, com suas indagações e hipóteses. Para

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a criança, o espaço é o que sente, o que vê, o que faz nele. Portanto, o espaço é sombra

e escuridão; é grande, enorme ou, pelo contrário, pequeno; é poder correr ou ter de

ficar quieto; é esse lugar onde pode ir olhar, ler, pensar.

O espaço é em cima, embaixo, é tocar ou não chegar a tocar; é barulho forte, forte

demais ou, pelo contrário, silêncio, são tantas cores, todas juntas ao mesmo tempo ou

uma única cor grande ou nenhuma cor...

O espaço, então, começa quando abrimos os olhos pela manhã em cada despertar do

sono; desde quando, com a luz, retomamos ao espaço (BATTINI apud FORNERO,

1998, p. 231).

Assim, quando o professor planeja os espaços, precisa considerar a liberdade corporal

das crianças, seus anseios em explorar cada vez mais os espaços, possibilitando aos bebês e as

crianças bem pequenas o empoderamento, para explorem os espaços de sua maneira, gerando

conhecimentos sobre o meio e sobre si mesmo. Ser e estar no espaço demanda de muita

investigação, requer sensibilidade para permitir-se estar lá.

Para poder ver mais fotografias e gravações,

destes momentos dos espaços proporcionados das

crianças, é só acessar este QR Code, e encantar-se com

as explorações vivenciadas pelos bebês e crianças bem

pequenas.

4.4 PENSAR SOBRE A RELAÇÃO ENTRE TEMPO E CRIANÇAS NA EDUCAÇÃO

INFANTIL É UM FATOR ESSENCIAL PARA CUIDAR E EDUCAR

Este subcapítulo tem como intuito explanar o tempo aliado ao cuidar e o educar, quando

se diz respeito ao tempo este possui muitas definições, para tanto é necessário estudá-lo e

compreendê-lo, principalmente pelos profissionais que atuam diretamente com as crianças e as

proporcionam diversas experiências. Aqui não falamos em um tempo Chronos, mas no tempo

da experiência, do significado, do sentido para a criança, um tempo longe da flecha e da

velocidade, um tempo de respeito (MACEDO, 2010; ZAVALLONI, 2015).

A reflexão sobre o tempo é crucial para poder pensar no que acontece no cotidiano da

creche com os bebês e as crianças bem pequenas. Assim é possível destacar as ideias de

Zavalloni (2015), que discute a necessidade de desacelerarmos os tempos dentro da escola; o

autor nos mostra os ritmos acelerados que vivemos no cotidiano, sendo meras justificativas para

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as atividades do dia a dia que poderiam ser revistos. Algo que o autor refere-se que dentro da

escola não podemos pensar nas atividades da jornada como perda de tempo, mas sim encarar

as ações como ganhas, como conquista, seja na acolhida das crianças ou de momentos das

práticas fixas (jornada) do cotidiano. Deste modo, o autor enfatiza a ideia de trilhar o caminho

da Pedagogia do Caracol dentro da escola, pois

a pedagogia atual e, por conseguinte os professores, podam a criatividade da criança

com a pressa de acabar os programas [...] Redescobrindo a “pedagogia da lentidão”,

penso que cada um de nós poderia parar em meio ao frenesi metropolitano e admirar

as maravilhas escondidas, para melhorar a qualidade de vida (ZAVALLONI, 2015, p.

40).

Para tanto, o autor alerta que dentro das escolas necessita haver está Pedagogia da

lentidão, oportunizando tempo para as experiências, não as fazendo com pressa e nem correndo

com o “tempo flecha” (ZAVALLONI, 2015).

Deste modo, durante o estágio proporcionou-se experiências para os bebês e as crianças

bem pequenas prevendo o uso do tempo, dando tempo para que interagissem, para manifestar

desejos, para deslocar-se, para subir, descer, para pedir, ir ao banheiro, beber água, para viver

a vida cotidiana. Algumas experiências como o espaço com as sombras no pátio interno, os

momentos das músicas com a professora convidada, as vivências com o retroprojetor, os

momentos de lanches e almoços, são situações que exemplificam o aumento do planejamento

referente ao tempo, pois se reconheceu que as crianças precisam da lentidão do caracol

(ZAVALLONI, 2015), para viver a jornada na creche diferente do que ainda há nas escolas de

Educação Infantil, em que as crianças lancham e almoçam em 10 minutos, e quando terminam

a professora limpa seus rostos correndo (ou às vezes nem tem tempo para limpar), pois o tempo

de comer acabou e já se inicia outro momento.

Outra experiência vivenciada com bastante tempo foi com a luz negra, todas as

experiências com a mesma, foram de grande valia, pois as crianças se envolveram em todos os

momentos. No primeiro contato com a luz negra e a tinta neon, as crianças ao chegarem à sala

e se prepararem com aquele espaço, já começaram a falar com sorrisos:

Criança F: “olha que legal”.

Criança E: “Olha, a luz”.

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Todos estavam encantados com esta experiência, a princípio as crianças começaram a

pintar com os pinceis, mas em seguida colocaram os dedos nos potes, pintavam e desenhavam

no plástico transparente que havia sido fixado em uma mesa.

As crianças expressaram o que estavam pensando e sentindo naquele determinado

momento, por meio dos rabiscos realizados pela tinta neon no plástico transparente, afirmando

que as “crianças gostam de fazer marcas para expressar sua individualidade e as tintas nas artes

plásticas, são ferramentas que cumprem essa finalidade” (BRASIL, 2012, p. 22).

Imagem 17- Fotografia das crianças vivenciando a luz negra com tinta neon

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Refletindo sobre o tempo e como as crianças necessitariam vivenciar outros momentos

com luz negra, aliou-se o tempo à continuidade (AUGUSTO, 2015), assim possibilitando aos

bebês e as crianças bem pequenas novas oportunidades de investigação da luz negra. Assim a

luz negra foi novamente explorada, porém agora com os elementos da natureza congelados com

a tinta neon. Desta forma, as crianças auxiliaram colocando as flores e as folhas das árvores nos

potes, a criança D ficou indagado perguntando: “Você vai colocar as flozinhas aí, vai”, logo

após começaram a auxiliar para colocarem as tintas neon, a primeira a colocar foi à criança H

falou: “Depois eu né fofi”, e cada um que colocava as tintas as crianças sorriam expressando a

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felicidade em que estavam; por fim foi colocada a água e depois posto no congelador na

geladeira.

Imagem 18- Fotografia das crianças preparado os potes os materiais da natureza e a tinta neon

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

No outro momento ao chegarem à sala e observarem que o gelo estava brilhando com a

luz negra, já seguiram para mexer, conforme manuseavam o gelo e diziam:

Criança I: “Tá gilado fofi”.

Criança G: “Ai, ai, gilado”.

Também começavam a realizar tentativas de puxas as flores e as folhas dizendo:

Criança A: “Vou pega a florzinha”.

Criança D: “Pega a florzinha para mim, fofi”.

Sendo imprescindível que as crianças tenham contato com o mundo físico, com

transformações e experimentos, como, por exemplo, nessa experiência com a água congelada,

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que proporcionou novas interações para as crianças. Assim segundo o documento “Brinquedos

e Brincadeiras de Creches”:

[...] o mundo físico é entendido como a forma cognitiva da criança experimentar

situações em que percebe pelos sentidos físicos (visão, audição, tato, paladar, olfato)

como é a realidade á sua volta. Ao brincar, a criança explora e experimenta o que se

pode fazer com a água ou com terra e vai compreendendo o mundo ao seu redor (BRASIL, 2012, p. 44).

Imagem 19- Fotografia da exploração dos materiais da natureza congelados com tinta neon

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Outra experiência ainda com a luz negra, foi com tecido neon como fundo; no centro

deste tecido, que era grande, foram dispostos pedaços de madeira, cones de linha, fitas neon e

rolos de fita realizando diversas investigações. A criança E, ao explorar as fitas, começou a

levá-las dentro do cone para bem perto da luz negra percebendo que está brilhava muito mais,

logo após a criança G começou a levar as madeiras perto da luz e também analisando que este

material não brilhava tanto como as fitas neon. Assim, fazendo as comparações. Ao brincarem

com as madeiras começavam a empilhá-las como também descobriram que batendo nas

madeiras faziam barulho falando:

Criança I: “Faz barulho” (com sua expressão facial de espanto).

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Criança E: “Escuta fofi”.

Criança G: “Balulo”.

Imagem 20- Fotografia das crianças investigando os a luz negra e os diversos materiais

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Pode-se então perceber o quanto é importante que as crianças possam explorar a luz

negra com diversos materiais, realizando diversas investigações, com tempo, com continuidade

(AUGUSTO, 2015), não às pressas. Aqui foi possível perceber que as situações foram bem

exploradas, por haver está continuidade da luz negra. Assim, neste episódio “perdeu-se” tempo

explorando em vários momentos a luz negra, com isto ganhou-se conhecimento, como

Zavalloni nos aponta “o verdadeiro propósito da viagem não é, portanto, “chegar”, mas

“caminhar” não é a “meta”, mas o “percurso”, não é “onde”, mas “como”” (2015, p.61).

Nesta perspectiva, outros momentos foram planejados com o uso de um tempo maior,

como, por exemplo, lavar as mãos e o escovar os dentes, momentos que eram feitos diariamente

e não poderia ser descartados desta ideia de tempo e continuidade.

Assim, nos momentos que se seguiam para o banheiro lavar as mãos as crianças já

falavam:

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Profº: “Agora vamos lavar as mãos”.

Criança E: “Agora vamo lava as mãos” (repetindo as palavras da professora).

Criança F: “Eba, eba” (expressando sua felicidade).

Algumas não conseguiam alcançar a pia, por mais que o móvel tivesse um tamanho mais

baixo, então a professora auxiliava no momento de lavar as mãos com a água, em seguida cada

criança pegava um papel, secavam as mãos e colocavam o mesmo no lixo, tudo isso exige mais

tempo para ser vivido com respeito à criança, do jeito correto de lavar as mãos, com água e

sabão. Exige um tempo maior para secar, para se deslocar até o banheiro, exigindo tempo do

planejamento também.

Imagem 21- Fotografia das crianças nos momentos de lavarem as mãos

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

Essas ações necessitam da ajuda do adulto, exige tempo, disponibilidade em estar com

o outro; tempo que tem que ser inserido no planejamento, na previsão do dia. Por isso, essas

ações da jornada das crianças precisam ser pensadas pelo professor, com tempo e calma. Assim,

o espaço do banheiro, por exemplo, não pode ser um momento feito às pressas o professor pega

o sabonete passa nas mãos das crianças, esfrega, lava na água e seca, correndo contra o tempo,

em questão de segundos, pois já está na hora de realizar outra atividade. De acordo com Horn

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e Gobbato “todos os espaços que acolhem os bebês durante a jornada na creche devem ser

planejados com foco educativo, visando à iniciativa da criança pequena e ao respeito aos seus

ritmos” (2015, p. 74).

Outro momento planejando no estágio foi à escovação dos dentes que realizam todos os

dias. O que é sem dúvidas, muito importante para as crianças, principalmente os bebês e as

crianças bem pequenas, para que desde a infância possam compreender o quão é necessário

realizar a escovação; nestes momentos passava-se a pasta nas escovas e as crianças iniciavam

a escovação.

Cada criança escovava seus dentes de formas diferentes e de direções diferentes, mesmo

que a professora já havia as mostrado maneiras de escovação adequada aos dentes superiores e

inferiores, como também a língua, as crianças seguiam cada uma a sua maneira, porém a

professora reforçava o que já havia sido demonstrado, pois não há como exigir que as crianças

aprendessem com poucas manifestações, elas precisam de tempo para internalizar as ações.

Nestes momentos algumas crianças falavam “Tem que tirar a sujeira”, expressando que queria

estar com seus dentes limpos. Por fim, as crianças lavavam a boca com ajuda, pois alguns ainda

não alcançavam a pia do banheiro, cada uma pegava um papel toalha para se secar e colocavam

no lixo.

Imagem 22- Fotografia das crianças realizando a escovação dos dentes

Fonte: Arquivo pessoal, 2018.

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Outro aspecto que precisa ser refletido é que cada criança possui o seu tempo, o seu

ritmo, por isso, é preciso pensar que nem todos vão dormir no mesmo horário, nem comer na

mesma velocidade; quando apressamos as crianças, ferimos o seu direito de ser respeitada,

como já mencionado. Por isto, cabe ao professor compreender cada criança, novamente

reforçando a ideia de aumentar o tempo destinado a determinados momentos.

Deste modo, é necessário então proporcionar as crianças diferentes experiências,

possibilitando a construção de novos saberes, com tempo, com continuidade e sem esquecer

que o educar e o cuidar devem estar sempre no planejamento do professor, estando ambos, lado

a lado.

Para poder ver mais fotografias e gravações,

destes momentos em que foram proporcionadas

experiências com tempos maiores as crianças, é só

acessar este QR Code, e encantar-se com as

explorações vivenciadas pelos bebês e crianças bem

pequenas.

Assim conclui-se esse capítulo reforçando que educar e cuidar na creche perpassam por

ações de respeito e sensibilidade às crianças, ações que promovam o acolhimento, a extensão

do tempo, a organização de espaços e materiais adequados, limpos, aconchegantes, tudo isso a

fim de evidenciar o seu reconhecimento como sujeito de direitos.

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ISSO NÃO ACABA POR AQUI: CONSIDERAÇÕES DE UM NÃO FINAL

O presente trabalho de conclusão de curso discutiu e analisou de que maneira educar e

cuidar estão presentes na creche, mais especificamente nas memórias (auto)biografias sobre

o estágio desenvolvido na Educação Infantil. Ao desenvolver este trabalho, por meio desta

metodologia de narrativas (auto)biografias, buscou-se narrar a própria história, fornecendo

sentido as próprias experiências, como afirma Passeggi (2011) nesse processo elabora-se outra

representação de si própria e assim reinventa-se. Foi literalmente uma viagem a si mesmo.

O que significa educar e cuidar na Educação Infantil? Como se efetiva a educação e o

cuidado dentro das ações pedagógicas da creche? São problemáticas que deram origem e

acompanharam o desenvolvimento dessa pesquisa, são problemáticas que devem continuar me

acompanhando na minha trajetória profissional, pois hoje estas não são indagações com

respostas prontas, encontradas em um manual, muito pelo contrário são perguntas que ainda

precisam ser refletidas, por isso considero que aqui nesse trabalho pude encontrar respostas

provisórias, que daqui algum tempo poderão ser mudadas.

Por meio de muitas leituras e pesquisas de autores que abordavam a ideia do educar e

do cuidar, constatou-se que estes são conceitos que não podem ser pensados separadamente,

sendo estes indissociáveis. Representam duas faces de uma mesma moeda, como mencionado

no trabalho, uma moeda não tem lados opostos como no jogo “cara ou coroa”, mas é um único

objeto, assim, sem um dos lados a moeda deixar de existir, deixa de ser moeda.

Entretanto, nesta busca incessante em compreender mais sobre o educar e cuidar,

percebi o motivo pelo qual o termo “cuidar” é tão desvalorizado no contexto da creche.

Evidenciou-se então, a separação dessas funções, instaurando uma hierarquia dentro das

escolas; a professora regente fica a cargo do chamado “educar” e as auxiliares ficam destinadas

ao “cuidar”, como se cuidar não tivesse relação com o “trabalho pedagógico”. Porém é

imprescindível haver uma compreensão, de que estes conceitos caminham juntos, ao mesmo

tempo em que educamos/cuidamos e vice-versa, por isso são conceitos/ações que devem ser

percebidos por ambas as partes (professores e auxiliares), pois possuem papeis fundamentais

nas vidas dos bebês e crianças bem pequenas, não existindo sobreposições de funções. Ao ser

desmistificada esta ideia errônea sobre estes conceitos, as escolas de Educação Infantil como

um todo precisam compreender que o educar e cuidar estão implícitos no dia a dia como algo

integrado.

Outra reflexão se refere a uma reestruturação das escolas de Educação Infantil,

precisando trazer átona questões pertinentes a este local, inclusive o da escola que participou

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dessa pesquisa. Primeiramente é pertinente compreender que os espaços da escola precisam ser

(re)pensados. É imprescindível possibilitar salas mais amplas, janelas baixas, móveis da altura

das crianças, havendo livre e total acesso aos materiais ali disponíveis, como também é

fundamental pensar que estes espaços precisam ser organizados de maneira a atender as

necessidades das crianças que o ambientalizam, pensando em seu bem-estar, no seu

acolhimento, refletindo inúmeras vezes sobre quem são as crianças e principalmente pelo o que

já são capazes de fazer.

Momentos do cotidiano também precisam ser refletidos, como os destinados a lanches

e almoços, as crianças precisam ter total autonomia nestes momentos, os utensílios de cozinha

e os alimentos necessitam estar ao alcance delas para que possam se servirem. Nos horários de

sono, para as crianças que não querer dormir é preciso haver mais profissionais que estejam

disponíveis a atendê-las. Os intervalos dos profissionais dentro da escola da infância também

precisam ser revistos, pois deixar poucos profissionais nesses momentos da jornada integral na

escola demonstra de certo modo uma falta de acolhimento às necessidades das crianças.

Desta forma, a escola como um todo precisa rever seu cotidiano, precisa pensar sobre

seus tempos, precisa urgentemente desacelerar. A leitura de Zavalloni (2015) demonstrou que

dentro das escolas existe a presença de ritmos e tempos acelerados, porém quando “perdemos

tempo” conversando, admirando, esperando, respeitando, ganhamos, e conquistamos

aprendizados significativos para a vida das crianças. Quando desaceleramos, verdadeiramente

colocamos as crianças como centro do planejamento educativo (BRASIL 2009a, 2009b).

Um fato evidente com esse TCC foi à importância do planejamento, entretanto, nem

sempre é fácil planejar, é preciso realizar inúmeras reflexões e em muitos momentos refazer o

que já se planejou, sendo assim é imprescindível destacar aqui a flexibilidade dos

planejamentos, sem esquecer que é preciso planejar a partir do cotidiano das crianças, a partir

dos interesses delas. Ostetto (2000) enfatiza que planejar refere-se ao um contexto educativo,

em que engloba situações tanto que desafiem a criança e tragam significância, assim

favorecendo a exploração, a descoberta e o conhecimento do mundo.

Outra questão pertinente a ser abordada, refere-se à necessidade de ouvir as crianças,

foi por meio da escuta que as preposições descritas neste trabalho puderam ser desencadeadas.

Escutar as crianças é reconhecê-las enquanto sujeitos participantes do processo de

aprendizagem, é respeitar suas ideias, suas hipóteses e reconhece-las como sujeitos capazes e

pensantes.

Os episódios aqui narrados procuraram evidenciar o educar e o cuidar, mostrando ações

pedagógicas com os bebês e as crianças bem pequenas pautadas nestes conceitos; estas ações

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demonstraram que o educar e cuidar ocorre de maneira unificada, sem esquecer-se de escutar

as crianças, de atender seus interesses e seus anseios investigativos, isso também é cuidar, é

educar. Cuidar o outro de maneira sensível, ética, permitindo a participação no processo.

Para tanto, a partir destas diversas reflexões realizadas neste trabalho de conclusão de

curso, fica pertinente evidenciar que a Educação Infantil, não pode representar momentos em

que a criança fica horas sentada, ou com brinquedos de plásticos industrializados, os quais não

promovam investigações e explorações de qualidade. Tonucci (1997) expressa em uma charge,

o sentimento das crianças ao serem mantidas em cercados, o que pode ser comparado as salas

“de aulas”, em que as crianças são engaioladas em quatro paredes, permanecem grande parte

de seu tempo e do dia num único espaço. E o adulto?, em muitos casos nem percebe essa

condição de “prisão”, em que as crianças vivem.

Charge 02: O cercadinho

Fonte: Tonucci, 1997, p. 29

A charge permite pensar no poema de Rubem Alves (2002). Queremos escolas gaiolas?

Ou escolas asas? O que temos desejamos e efetivado no cotidiano infantil? Para isto, é

necessário ter um olhar sensível, uma escuta ativa para o que as crianças produzem, os seus

interesses, seus gostos e desgostos.

Por fim, conclui-se que é preciso mostrar para as crianças que estas são capazes de

desenvolver suas próprias ações, tomando atitudes que realcem seus desejos e reconheçam sua

autonomia; o educar e cuidar estejam totalmente intrigados de forma indissociável no cotidiano

da escola infantil. Que os bebês e as crianças bem pequenas tenham liberdade de explorarem,

investigarem, pesquisarem; que os professores, auxiliares e demais profissionais que atuam com

crianças, possam refletir sobre os espaços, os tempos, as formas de acolher, sobre educar e

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cuidar. Que a escola, família e profissionais não esqueçam a importância do olhar sensível e da

escuta ativa, fatores necessários para reconhecer as crianças como sujeitos de direitos, pois são

produtoras de cultura. Que o respeito, a desaceleração, a integralidade das crianças faça parte

dos processos educativos. Que essa pesquisa não cesse aqui, porque isso é um “NÃO FINAL”.

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APÊNDICES

UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL - UFFS

CAMPUS ERECHIM/RS

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARAS AS

FAMÍLIAS

PARTICIPAÇÃO NO ESTUDO

A minha participação no referido estudo, será por meio da utilização de imagem das

crianças, organizada pela pesquisadora Milena Moraes do Estreito, discente do curso de

licenciatura em Pedagogia da UFFS- Campus Erechim, e sua orientadora: Prof.ª Flávia

Burdzinski de Souza, que servirá como base para reflexões e produção de dados para sua

pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

SIGILO E PRIVACIDADE

Estou ciente de que a privacidade da criança será respeitada, ou seja, seu nome ou

qualquer outro dado ou elemento que possa, de qualquer forma, me identificar, será mantido

em sigilo. A pesquisadora se responsabiliza pela guarda e confidencialidade dos dados. Assim,

concordo que o material e as informações obtidas relacionadas as crianças, possam ser

publicados em aulas, congressos, eventos científicos, palestras ou periódicos científicos. Porém,

as crianças não devem ser identificadas, tanto quanto possível, por nome.

CONTATO

A pesquisadora responsável pela pesquisa é Milena Moraes do Estreito, discente da

Universidade Federal da Fronteira Sul- Campus Erechim, e com ela poderei manter contato

pelo endereço eletrônico: [email protected], caso necessite tirar dúvidas sobre o

trabalho.

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DECLARAÇÃO

Declaro que li e entendi todas as informações presentes neste Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido. Todas as minhas perguntas foram respondidas e eu estou satisfeito (A) com

as respostas, assim manifesto meu livre consentimento em participar.

Getúlio Vargas, ___/___/______

E-mail e/ou telefone do participante: _________________________________

Assinatura do responsável: ________________________________________

Pesquisadora: (Milena Moraes do Estreito)

Contato pelo e-mail: [email protected]

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL - UFFS

CAMPUS ERECHIM/RS

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA ESCOLA

PARTICIPAÇÃO NO ESTUDO

A minha participação no referido estudo, será por meio da utilização de imagem das

dependências da escola e a utilização do nome da escola, organizada pela pesquisadora Milena

Moraes do Estreito, discente do curso de licenciatura em Pedagogia da UFFS- Campus

Erechim, e sua orientadora: Prof.ª Flávia Burdzinski de Souza, que servirá como base para

reflexões e produção de dados para sua pesquisa de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC).

CONTATO

A pesquisadora responsável pela pesquisa é Milena Moraes do Estreito, discente da

Universidade Federal da Fronteira Sul- Campus Erechim, e com ela poderei manter contato

pelo endereço eletrônico: [email protected], caso necessite tirar dúvidas sobre o

trabalho.

DECLARAÇÃO

Declaro que li e entendi todas as informações presentes neste Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido. Todas as minhas perguntas foram respondidas e eu estou satisfeito (A) com

as respostas, assim manifesto meu livre consentimento em participar.

Getúlio Vargas, ___/___/______

E-mail e/ou telefone da diretora: __________________________________________

Assinatura da diretora: __________________________________________________

Pesquisadora: (Milena Moraes do Estreito)

Contato pelo e-mail: [email protected]

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL - UFFS

CAMPUS ERECHIM/RS

LICENCIATURA EM PEDAGOGIA

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA

PROFESSORA

PARTICIPAÇÃO NO ESTUDO

A minha participação no referido estudo, será por meio da utilização de minha imagem,

organizada pela pesquisadora Milena Moraes do Estreito, discente do curso de licenciatura em

Pedagogia da UFFS- Campus Erechim, e sua orientadora: Prof.ª Flávia Burdzinski de Souza,

que servirá como base para reflexões e produção de dados para sua pesquisa de Trabalho de

Conclusão de Curso (TCC).

SIGILO E PRIVACIDADE

Estou ciente de que a privacidade da criança será respeitada, ou seja, seu nome ou

qualquer outro dado ou elemento que possa, de qualquer forma, me identificar, será mantido

em sigilo. A pesquisadora se responsabiliza pela guarda e confidencialidade dos dados. Assim,

concordo que o material e as informações obtidas relacionadas as crianças, possam ser

publicados em aulas, congressos, eventos científicos, palestras ou periódicos científicos. Porém,

as crianças não devem ser identificadas, tanto quanto possível, por nome.

CONTATO

A pesquisadora responsável pela pesquisa é Milena Moraes do Estreito, discente da

Universidade Federal da Fronteira Sul- Campus Erechim, e com ela poderei manter contato

pelo endereço eletrônico: [email protected], caso necessite tirar dúvidas sobre o

trabalho.

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DECLARAÇÃO

Declaro que li e entendi todas as informações presentes neste Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido. Todas as minhas perguntas foram respondidas e eu estou satisfeito (A) com

as respostas, assim manifesto meu livre consentimento em participar.

Getúlio Vargas, ___/___/______

E-mail e/ou telefone do participante: ______________________________________

Assinatura do responsável: ______________________________________________

Pesquisadora: (Milena Moraes do Estreito)

Contato pelo e-mail: [email protected]