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EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: CONHECENDO AS ORIGENS DA CAPOEIRA MUNHOZ, Raquel Fantinelli CEF/UFSCar CARMO, Clayton da Silva PPGE/UFSCar; NEFEF; SPQMH; SEESP COLLOCA, Edson Aparecido SEESP; NEFEF; SPQMH Eixo Temático: Motricidade Escolar Resumo O presente estudo teve o objetivo de investigar a possibilidade da introdução do conteúdo Capoeira nas aulas de Educação Física, particularmente identificar as contribuições da abordagem do contexto histórico para o trabalho pedagógico com o referido conteúdo. A abordagem utilizada é de cunho qualitativo e os procedimentos metodológicos adotados foram intervenção em uma turma de 4ª série do Ensino Fundamental de uma escola pública estadual com o conteúdo capoeira, e concomitantes registros de observação em diários de aula. Os dados foram tratados em acordo com a análise de conteúdo. Palavras chave: Educação Física Escolar; Capoeira; Contexto Histórico. Introdução O presente estudo foi realizado em decorrência de uma solicitação da disciplina curricular optativa de Fundamentos da Capoeira, do curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Esta disciplina, que teve encontros semanais, indicou a realização de intervenção com o conteúdo capoeira em um espaço educativo a fim de apresentar tal conteúdo aos interessados e observar como seria o desenvolvimento do mesmo. Salientamos que o grupo que frequentava as aulas da disciplina oferecida pelo Departamento de Educação Física e Motricidade Humana era pequeno e composto quase que totalmente por alunos da Educação Física. Fizemos jogos a respeito da Capoeira, aprendemos diversos golpes, discutimos textos que diziam respeito à história da Capoeira e como tem sido difícil a preservação de suas raízes. Tivemos também a oportunidade de assistirmos a vídeos e filmes que complementaram a nossa formação. Como parte da avaliação da disciplina deveríamos realizar uma intervenção sobre a temática Capoeira em algum espaço educativo e a partir desta desenvolvemos este estudo.

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EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR: CONHECENDO AS ORIGENS DA

CAPOEIRA

MUNHOZ, Raquel Fantinelli – CEF/UFSCar

CARMO, Clayton da Silva – PPGE/UFSCar; NEFEF; SPQMH; SEESP

COLLOCA, Edson Aparecido – SEESP; NEFEF; SPQMH

Eixo Temático: Motricidade Escolar

Resumo

O presente estudo teve o objetivo de investigar a possibilidade da introdução do

conteúdo Capoeira nas aulas de Educação Física, particularmente identificar as

contribuições da abordagem do contexto histórico para o trabalho pedagógico com o

referido conteúdo. A abordagem utilizada é de cunho qualitativo e os procedimentos

metodológicos adotados foram intervenção em uma turma de 4ª série do Ensino

Fundamental de uma escola pública estadual com o conteúdo capoeira, e concomitantes

registros de observação em diários de aula. Os dados foram tratados em acordo com a

análise de conteúdo.

Palavras chave: Educação Física Escolar; Capoeira; Contexto Histórico.

Introdução

O presente estudo foi realizado em decorrência de uma solicitação da disciplina

curricular optativa de Fundamentos da Capoeira, do curso de Licenciatura em Educação

Física da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Esta disciplina, que teve

encontros semanais, indicou a realização de intervenção com o conteúdo capoeira em

um espaço educativo a fim de apresentar tal conteúdo aos interessados e observar como

seria o desenvolvimento do mesmo.

Salientamos que o grupo que frequentava as aulas da disciplina oferecida pelo

Departamento de Educação Física e Motricidade Humana era pequeno e composto

quase que totalmente por alunos da Educação Física. Fizemos jogos a respeito da

Capoeira, aprendemos diversos golpes, discutimos textos que diziam respeito à história

da Capoeira e como tem sido difícil a preservação de suas raízes. Tivemos também a

oportunidade de assistirmos a vídeos e filmes que complementaram a nossa formação.

Como parte da avaliação da disciplina deveríamos realizar uma intervenção sobre a

temática Capoeira em algum espaço educativo e a partir desta desenvolvemos este

estudo.

Paulinho
Texto
316
Paulinho
Nota como Carimbo

A presente pesquisa teve o objetivo de investigar a possibilidade da introdução

do conteúdo Capoeira nas aulas de Educação Física, particularmente identificar as

contribuições da abordagem do contexto histórico para o trabalho pedagógico com o

referido conteúdo.

Questão de pesquisa que orientou este estudo foi: Quais as contribuições da

abordagem do contexto histórico para o trabalho pedagógico com a Capoeira na

Educação Física escolar?

Um pouco sobre a história da capoeira

Zum, zum, zum, Besouro Magangá

Batendo nos soldados da polícia militar

Zum, zum, zum, Besouro magangá

Quem num pode com mandinga

não carrega patuá (...) 1

Considerada como luta, dança, esporte e jogo, a Capoeira tem suas origens

históricas imprecisas. A falta de documentação é a principal causa dessa imprecisão que

margeia o surgimento da Capoeira, o que é resultado da queima de documentos que se

referia à escravidão comandada por Ruy Barbosa, que era Ministro da Fazenda do

governo de Deodoro da Fonseca. Esse apagão na história foi justificado pelo governo de

então por ser vergonhoso ao país a tão extensa e intensa fase da escravidão

(GONÇALVES JUNIOR, 2009). Apesar de haver divergências sobre seu surgimento as

referências de Areias (1983) e Gonçalves Junior (2009), os quais defendem a ideia de

que a capoeira originou-se no Brasil a partir do povo africano e afro-brasileiro

escravizado pelos colonizadores, visando libertação.

Desenvolvida como forma dos negros combaterem a escravidão, esta prática era

a principal arma que os negros possuíam contra seus opressores, os colonizadores, que

principalmente através dos capitães de mato os vigiava, punia e caçava em caso de

fugas. Entende-se ai porque alguns autores a consideram como dança, pois os negros

não podiam praticá-la abertamente e executavam-na de forma velada, transformando os

golpes certeiros em aparentes passos de dança. Os escravos que conseguiam escapar das

fazendas em que eram tratados como mercadorias, se juntavam aos outros escravos

fugitivos e viviam em quilombos, lugares em que se organizavam de forma a viverem

de subsistência e para muitos fugitivos um lugar de liberdade (AREIAS, 1983).

1 Cantiga de domínio público.

Paulinho
Texto
317

Depois da libertação dos escravos, que ocorreu em 1888, os negros continuaram

a ser fortemente perseguidos pelo regime político da época (Brasil República,

instaurado em 1889), o que acarretava em punições severas para aqueles que

cultivassem a cultura negra no país, incluindo as rodas de capoeira (GONÇALVES

JUNIOR, 2009).

Nas palavras de Abib (2004):

Os castigos sofridos pelos capoeiras eram terríveis: centenas de chibatadas

aplicados em plena praça pública, para “servir de exemplo”. Isso, quando não

eram mandados ao “Calabouço”, um terrível presídio localizado no Morro do

Castelo, onde, além das chibatadas, os presidiários sofriam com a falta de

água, com a comida estragada e com as condições desumanas do cárcere

(p.101).

Essas punições se fizeram também porque, depois da libertação dos escravos, a

maioria dos negros não tinham trabalho e nenhuma forma de sustento, o que levou

muitos à marginalização. Foi nessa época também que os capoeiras, praticantes da

Capoeira, eram considerados ameaça à sociedade, decorrente das brigas em que se

envolviam e pelo preconceito racial (REIS, 2000).

Apenas no início do governo de Getúlio Vargas, na década de 1930, que são

extintas as leis contra a cultura afro-brasileira e é a partir dessa etapa histórica que a

Capoeira começa a poder ser livremente praticada. Em 1937, Mestre Bimba consegue o

alvará para o Centro da Cultura Física Regional, na Bahia, e é o primeiro mestre de

Capoeira a abrir uma academia da modalidade (GONÇALVES JUNIOR, 2009).

Capoeira como conteúdo da Educação Física Escolar

Para um melhor entendimento do termo conteúdo dentro da Educação Física

escolar tem-se como referência uma definição utilizada por Coll et. al (2000), que

define conteúdo como formas de saberes culturais, habilidades, linguagens, atitudes, ou

seja, características que, assimiladas são fundamentais para o desenvolvimento e

socialização do aluno.

Acrescentando à compreensão de conteúdo Darido (2005), a partir de Zabala

(1998) o aborda em três dimensões: procedimental, atitudinal e conceitual. A dimensão

procedimental esta ligada ao fazer relacionado às aulas de Educação Física; a dimensão

conceitual aborda o conceito desse fazer, seu entendimento, suas origens; por fim a

Paulinho
Texto
318

dimensão atitudinal relaciona as duas outras dimensões aos valores externos que o aluno

pode ter em função do conteúdo, discutindo temas sociais que surgem do mesmo.

A dimensão procedimental refere-se à prática da Capoeira, tanto se tratando dos

golpes quanto da musicalidade presente nas rodas e a dimensão atitudinal pode ser

trabalhada quanto aos aspectos culturais que margeiam o tema, tanto no berço da

Capoeira quanto nas mudanças que vem sofrendo com o passar do tempo (IORIO;

DARIDO, 2005).

Além das dimensões que são sugeridas à Educação Física no âmbito escolar,

para Iório e Rangel (2005), tal componente curricular deve apresentar o tema

pluralidade cultural, por abordar a partir desse termo diversas culturas inseridas na

sociedade e por poder através dessa apresentação lecionar aos alunos sobre a origem das

mesmas. A pluralidade cultural é também destacada pelo Parâmetros Curriculares

Nacionais - PCN (BRASIL, 1998) em dois pontos: primeiro - valorização da

diversidade de culturas; segundo – rejeição ao preconceito e discriminação de etnia,

gênero, religião. Conforme segue:

(...) valorizar as diversas culturas presentes na constituição do Brasil como

nação, reconhecendo sua contribuição no processo de constituição da

identidade nacional. (...) repudiar toda discriminação baseada nas diferenças

de raça/etnia, classe social, crença religiosa, sexo e outras características

individuais e sócias (BRASIL, 1998, p.143).

A Educação Física, portanto tem o papel também de focar as diferenças

culturais. Percebe-se então que a Capoeira, além de proporcionar ricos conhecimentos

aos alunos dá margem às discussões relacionadas à pluralidade cultural, através de

abordagens sobre a origem da Capoeira, seus praticantes, sobre os instrumentos e as

músicas a serem tocadas na roda, à escravidão e a marginalização dos negros, dentre

outras vertentes que podem e devem ser discutidas nas aulas de Educação Física

(IORIO; RANGEL, 2005).

Concordando com a utilização do conteúdo Capoeira à pluralidade cultural,

deve-se também apresentar as possíveis faces desse conteúdo nas dimensões abordadas

anteriormente. Dessa forma temos Soares et al. (1992) para sustentar a dimensão

conceitual da Capoeira, “(...) a Educação Física brasileira precisa, assim, resgatar a

capoeira enquanto manifestação cultural, ou seja, trabalhar com sua historicidade, não

desencarná-la do movimento cultural e político que a gerou” (p. 76).

Paulinho
Texto
319

Reforçando a importância da diversificação da cultura corporal, fugindo dos

esportes tradicionais, Gonçalves Junior (2007) afirma que os esportes, tais como

voleibol, futebol, handebol advém de uma cultura eurocêntrica e estadunidense e são

quase hegemônicos no contexto das aulas de Educação Física, deixando-se de lado

outras manifestações que se fazem presentes na cultura brasileira, tais como jogos,

danças, lutas e brincadeiras, inclusive provenientes de diferentes povos, como africanos,

indígenas e orientais.

Deste modo, nota-se que a presença da Capoeira na Educação Física escolar

pode proporcionar aos professores uma variedade grande de temas a serem discutidos e

trabalhados com os alunos, com a possibilidade de sempre relacionar este conteúdo a

vida social a qual os mesmos estão inseridos, aproximando a história da realidade

desses alunos que também recebem vantagem ao aprender a Capoeira, tanto em valores

socioculturais quanto à motricidade.

Metodologia

Contexto da Intervenção

A intervenção e coleta de dados dessa pesquisa ocorreu com uma turma de 4ª

série/5º ano de uma Escola Estadual localizada na cidade de São Carlos, interior do

estado de São Paulo. Sendo que participaram das aulas 18 alunos que tinham uma faixa

etária de aproximadamente 9, 10 anos.

As aulas abordaram o conteúdo Capoeira, com enfoque no contexto histórico da

origem desse conteúdo e foram planejadas com tempo para discussão do grupo, antes e

após a aula. Antes sempre com o objetivo de tratar do contexto histórico da Capoeira;

após a aula, o tempo de discussão tinha como objetivo analisar as dúvidas dos alunos e

também para que professora/pesquisadora pudesse compreender o que os alunos

assimilaram da aula. O Professor da turma também auxiliou na revisão dos planos de

aula com eventuais sugestões de modificações.

Vale ressaltar que o professor efetivo de Educação Física da turma em questão

esteve presente em todas as aulas da Escola Estadual em que se realizou o estudo, bem

como atuando como tutor da disciplina Fundamentos da Capoeira, do curso de

Licenciatura em Educação Física da UFSCar, de forma a compartilhar os vários

momentos da intervenção e coleta de dados dessa pesquisa.

Paulinho
Texto
320

Os alunos estavam cientes que as aulas faziam parte de um estudo acadêmico e

tanto ele como seus responsáveis permitiram a divulgação de dados coletados (registros

de observações e fotos) através de um termo de consentimento livre e esclarecido.

O bairro no qual se situa a instituição é localizado em uma área periférica da

cidade. A escola possui uma ampla estrutura que ocupa o espaço de quase um

quarteirão. O pátio interno (coberto) é amplo e com várias saídas que se iniciam nele

para as salas de aula, sala de vídeo, sala dos professores, banheiros, entrada e saída dos

alunos na escola, acesso ao pátio externo, quadras de areia, quadra coberta, um

parquinho recém construído que tem balanços, um escorregador e uma ponte de

madeira. Nas aulas de Educação Física são mais comumente utilizados a quadra coberta,

a quadra de areia, o pátio externo e, eventualmente, o parquinho. Nesse estudo

desenvolvemos a intervenção na quadra e na sala de vídeo.

Procedimentos Metodológicos

Para um melhor entendimento desse estudo esclarecemos que o mesmo é de

caráter qualitativo. A pesquisa qualitativa, segundo Lüdke e André (1986):

(...) tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o

pesquisador como seu principal instrumento. (...) 2. Os dados coletados

são predominantemente descritivos. (...) 3. A preocupação com o

processo é muito maior do que com o produto. (...) 4. O 'significado' que

as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo

pesquisador. (...) 5. A análise dos dados tende a seguir um processo

indutivo. Os pesquisadores não se preocupam em buscar evidências que

comprovem hipóteses definidas antes do início dos estudos. As

abstrações se formam ou se consolidam basicamente a partir da inspeção

dos dados num processo de baixo para cima (p. 11).

No decorrer das intervenções foram feitos diários de aula, para registrar os

acontecimentos da aula segundo visão da pesquisadora, de forma que essas anotações

nos ajudaram nos processos didáticos das aulas seguintes, pois segundo Zabalza (2004),

o diário de aula além de ser utilizado como recurso para registrar o curso das aulas,

também é utilizado como recurso para que o professor possa analisar e avaliar seus

processos pedagógicos. Nesse estudo os registros realizados nos diários de aula foram

prioritariamente utilizados como material de análise de dados.

Os dados obtidos em tal registro foram submetidos a análise de conteúdo,

conforme propõe Bardin (2002), que a considera como: “(...) um conjunto de técnicas

de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de

Paulinho
Texto
321

descrição de conteúdos” (p.31). Bardin (2002) categoriza os dados a partir de seu

contexto escrito, ou seja, são investigados de acordo com o texto obtido. Após essa

categorização dos dados é previsto que também exista uma análise documental, que

auxilie o pesquisador na organização das classificações que surgiram da categorização.

Por fim, Bardin (2002) expõe a técnica de codificação dos dados, onde as informações

coletadas já desmembradas e organizadas oferecem a possibilidade de construir

resultados.

Análise dos dados

Os dados foram organizados em categorias temáticas que, segundo Bardin

(2002, p.153):

Funciona por operações de desmembramento do texto em unidades, em

categorias segundo reagrupamentos analógicos. Entre as diferentes

possibilidades de categorização, a investigação de temas, ou análise temática,

é rápida e eficaz de se aplicar a discursos diretos (significações manifestas) e

simples.

Com tal procedimento, foram elencadas quatro categorias de análise (quadro 1) a

partir de unidades de contexto identificadas nos diários de aula construídos. Assim: “As

categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem um grupo de elementos (unidades de

registro, no caso da análise de conteúdo) sob um título genérico” (BARDIN, 2002,

p.117).

Prossegue o autor afirmando que as unidades de contexto: (...) serve de unidade

de compreensão para codificar a unidade de registro e corresponde ao segmento da

mensagem, cujas dimensões (superiores a unidade de registro) são ótimas para que

possa compreender a significação exata da unidade de registro (BARDIN, 2002, p.107).

As quatro categorias são: A) Contextualização histórica da Capoeira; B)

Percepções de ensino e aprendizagem; C) Participação do professor titular de Educação

Física; D) Envolvimento dos alunos em relação ao conteúdo Capoeira.

Para facilitar a identificação dos dados na análise dos dados, em cada unidade de

contexto extraída dos diários de campo, apresentaremos a expressão DIÁRIO, seguida

de número romano do respectivo diário, vírgula e número arábico da unidade de

significado, associado a letra maiúscula da respectiva categoria temática, por exemplo

“DIÁRIO I, 10A”, correspondendo ao diário de campo “I”, unidade de contexto “10”,

Paulinho
Texto
322

categoria “A”. No caso da unidade de contexto referir-se não a uma convergência, mas a

uma divergência acrescentaremos a letra “d” minúscula.

Quadro 1: Categorias temáticas relacionadas com as unidades de contexto

Diários de aula

Categorias I II III IV

A) Contextualização da Capoeira 2, 4, 5, 8 5, 6 3, 9, 12,

15, 21

1, 5, 6, 15,

17

B) Percepções de ensino e

aprendizagem

3, 6, 9, 10,

12, 15, 16,

18

2, 7, 9, 12,

14, 15, 17,

22

1, 2, 5, 6,

8, 11, 19

3, 7, 9, 12,

13, 20

C) Participação do professor

titular de Educação Física

11 1, 10, 20,

21

16, 17 14, 21

D) Interesse dos alunos em

relação ao conteúdo Capoeira

1, 7, 13,

14, 17

3, 4, 8, 11,

13, 16, 18,

19

4, 7, 10,

13, 14, 18,

20, 22

2, 4, 8, 10,

11, 16, 18,

19, 22d

A) Contextualização da Capoeira

Essa categoria envolve momentos onde buscamos situar os alunos em relação ao

tempo histórico de origem e desenvolvimento do conteúdo Capoeira através do diálogo,

de jogos e também da apresentação de instrumentos característicos, como o berimbau.

Seguindo com a aula, fizemos mais uma questão aos alunos antes de passar

um vídeo sobre a Capoeira e a questão foi se eles sabiam alguma coisa sobre

a origem da Capoeira e sem exceções eles me afirmaram: “foram os

indígenas” (DIÁRIO I, 2A).

Antes de iniciar as atividades ficamos ali mesmo e sentados, começamos a

conversar novamente a respeito da origem da Capoeira e alguns disseram ter

sido na África, sendo que a maioria comentou que os escravos provenientes

da África que criaram a Capoeira no Brasil (DIÁRIO II, 5A). A partir disso

comentamos mais um pouco sobre a história dos escravos, sobre os

quilombos, e sobre o processo de abolição da escravidão, sendo que o Brasil

foi um dos últimos países a realizá-la (DIÁRIO II, 6A).

A atividade seguinte foi um pega-pega, onde os pegadores eram os policiais

do período da primeira república e os fugitivos os capoeiras que eram

proibidos de praticar Capoeira (DIÁRIO III, 12A).

Para que as crianças também pudessem entender o contexto da música,

enquanto gingavam explicamos que ao som do berimbau eram cantadas

algumas cantigas que diziam respeito aos personagens da Capoeira, mas que

também cantaríamos outras músicas (DIÁRIO IV, 17A).

Paulinho
Texto
323

A partir destas unidades de contexto que compõe essa categoria percebe-se que

houve contextualização histórica, seja retomando em diálogo o que já se tinha visto em

outras aulas, seja acrescentando novas informações.

B) Percepções de ensino e aprendizagem

Essa categoria se refere às percepções de ensino e aprendizagem observadas

durante a intervenção e registradas em diários de aula, ou seja, relatos acerca da didática

de ensino, da compreensão dos alunos, das situações de aula vivenciadas.

Foi a partir de então que nos sentimos mais confortáveis nas aulas, ao saber

que eles estavam demonstrando compreensão das atividades e das conversas

que tivemos (DIÁRIO I, 9B).

Durante a primeira aula notamos que os alunos gostaram da temática e todos

quiseram participar da mesma. Mostraram-se interessados na história, mas o

que pareceu mais fasciná-los foram os golpes executados durante a prática da

Capoeira (DIÁRIO I, 18B).

Pedimos para que interrompessem a ginga (ver Fig. 1) e explicamos como

fazer o golpe meia lua de frente com ambas as pernas e fizemos o movimento

para que eles pudessem visualizar. Dissemos que nossos pés deveriam

realizar uma trajetória que desenhasse uma meia lua no espaço, o que pareceu

facilitar o entendimento deles quanto à realização do movimento e quanto ao

nome do golpe (DIÁRIO II, 12B).

O jogo “pique capoeira”, em que os capoeiras deveriam pegar a chave da

senzala e os capitães de mato pegar o chicote, ambos passando pelo campo

de jogo do grupo oposto, nos pareceu simples e pensamos que eles o

executariam facilmente, mas não foi isso que aconteceu (DIÁRIO III, 6B).

Fig. 1: Alunos realizando a ginga da Capoeira

Paulinho
Texto
324

Com base nestas unidades de contexto nota-se que, embora tenha ocorrido

compreensão e aprendizagem dos alunos de vários movimentos característicos da

Capoeira e interesse no conhecimento da história desta prática, ocorreram também

dificuldades, particularmente em relação a dinâmica de jogos.

C) Participação do professor titular de Educação Física

Essa categoria refere-se a efetiva participação do professor titular de Educação

Física da escola com a qual realizamos a intervenção nessa escola pública. As unidades

de contexto nos mostram que o professor da escola e os pesquisadores não precisam

exercer funções segmentadas, mas podem e devem ser complementares, a fim de

melhorar a prática profissional e acadêmica de ambos, ganhando com isso a área de

Educação Física (intervenção e pesquisa), a escola, a universidade e os alunos de ambas

instituições.

O professor titular da escola nos trouxe alguns gizes para que os alunos

pudessem desenhar um triângulo para servir de processo educativo ao

aprendizado da ginga da Capoeira e, nesse momento, comentou com os

alunos que desenhassem um rosto, dando destaque aos olhos – base do

triângulo – e a boca – outro vértice (DIÁRIO I, 11C).

Durante a aula, o professor titular da escola providenciou um rádio e algumas

músicas típicas de Capoeira, o que facilitou o envolvimento dos alunos na

aula e o aprendizado rítmico das palmas durante a realização da roda de

Capoeira (DIÁRIO II, 20C).

(...) pretendíamos demonstrar a defesa de Capoeira denominada negativa,

mas em conversa com o professor titular da escola ele sugeriu uma defesa

mais simples, resolvemos conjuntamente então explicar e demonstrar a

esquiva e então professor titular da escola contou história relacionada ao

golpe benção que seria feito de modo combinado àquela defesa (DIÁRIO III,

16C).

Formamos a roda de Capoeira e o professor titular da escola representou a

figura do “Mestre” (ver Fig. 2), posicionando-se com o berimbau na

“entrada” da roda, onde os capoeiras se cumprimentam e entram para realizar

o jogo. Explicou aos alunos o porquê dos Mestres preferirem se posicionar de

frente para a porta dos recintos onde se encontram, evitando serem

surpreendidos sem visualização do acesso de outras pessoas no local

(DIÁRIO IV, 14C).

Paulinho
Texto
325

Fig. 2: Professor titular de Educação Física da escola representando o “Mestre” de Capoeira e explicando

aos alunos a formação da roda.

A partir destas unidades de contexto observa-se que o envolvimento do professor

titular da escola foi efetivo.

D) Interesse dos alunos em relação ao conteúdo Capoeira

Por fim temos nessa categoria demonstração de interesse dos alunos nas aulas

realizadas durante a intervenção com o conteúdo Capoeira, a efetiva participação, as

curiosidades e dúvidas que apresentaram, bem como aprendizagens demonstradas.

Conforme as unidades de contexto extraídas dos diários de campo que seguem:

Alguns mencionaram ser difícil relacionar o braço com a perna no momento

de realizar a ginga, movimento característico do conteúdo Capoeira (DIÁRIO

I, 14D).

Os alunos demonstraram interesse em conhecer o contexto histórico da

Capoeira e também queriam saber como realmente ela era praticada e

utilizada na época em que surgiu (Diário I, 7D).

Quando o sinal tocou, eles não perceberam e continuaram na roda de

Capoeira (ver Fig. 3), até mesmo alguns acompanhando com as palmas

(DIÁRIO II, 18D).

Enquanto todos estavam tentando fazer o aú, uma dupla de alunos, Robson e

Renan, estavam jogando Capoeira com fluência, realizando a ginga,

movimentos de ataque e de defesa, sem que indicássemos isso na aula

(DIÁRIO IV, 10D).

Paulinho
Texto
326

Alguns minutos antes do sinal tocar encerramos a roda e sentemos com os

alunos para saber o que mais gostaram das aulas e o que não gostaram

também. A maioria disse em coro: “gostei dos golpes”; Mário: “eu gostei da

história da polícia”; Renato: “gostei de a estrelinha ser aú” (DIÁRIO IV,

19D).

Fig. 3: Alunos praticando Capoeira em roda.

O interesse demonstrado pelos alunos durante as aulas foi bastante positivo, mas

ocorreu também, em alguns momentos desinteresse por parte de alguns, os quais se

dispersaram, no diário de campo 4, por exemplo, há registro de observação em que

pedimos aos alunos que praticassem movimentos de ataque e defesa de modo

combinado, porém duas alunas faziam outros movimentos não relacionados a atividade

proposta (DIÁRIO IV, 22Dd).

Considerações

Retomando o objetivo desse estudo, o de investigar a possibilidade da

introdução do conteúdo Capoeira nas aulas de Educação Física, particularmente

identificar as contribuições da abordagem do contexto histórico para o trabalho

pedagógico com o referido conteúdo, consideramos, a partir da análise de dados

anteriormente realizada, que a introdução do conteúdo Capoeira foi bem aceita pelos

alunos, os quais demonstraram interesse, inclusive a contextualização histórica daquilo

que é praticado, no caso, a Capoeira, favoreceu a introdução de tal conteúdo.

Paulinho
Texto
327

Quando, por exemplo, o professor titular de Educação Física da turma conta a

história de um golpe de Capoeira para depois os alunos o realizarem, notamos que os

alunos fizeram mais facilmente o movimento, pois compreenderam sua origem e

atribuíram significado.

Consideramos também que a participação efetiva do professor titular da turma

foi um fator positivo durante as aulas, pois os alunos se envolviam mais com a aula

percebendo que o próprio professor deles participava ativamente da mesma.

Acreditamos, como Freire (2005), que o ato de educar envolve necessariamente

o de educar-se, sendo necessária a afetividade, a humildade, o gosto pelo ensinar e

aprender, a busca incansável pela competência e pela esperança engajada na

transformação nossa (somos seres inconclusos, condicionados, mas não determinados),

da Educação Física, da Educação em geral e do mundo.

Entendemos que nossa intervenção e pesquisa foi uma aproximação inicial do

conteúdo Capoeira nas aulas de Educação Física junto a uma turma de alunos do Ensino

Fundamental – Ciclo I, e que há necessidade de trabalhos e estudos mais prolongados,

efetivos e aprofundados, nossa e de outros colegas educadores.

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Paulinho
Texto
328
Paulinho
Caixa de texto
Paulinho
Caixa de texto

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Paulinho
Texto
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