educaÇÃo especial na perspectiva da educaÇÃo … · especial apoiou-se na defesa de uma...

15
EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: DESAFIOS DIÁRIOS DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO NO ENSINO REGULAR. Cristiane dos Reis Cardoso Mestranda em Educação pela Unifal/MG Resumo: O texto relata a experiência de implantação de uma sala de recursos multifuncional (SRM) numa escola de ensino fundamental na cidade de Alfenas/MG, ocorrida durante o ano de 2016. Inicialmente o texto apresenta um percurso legal da Educação Especial e documentos norteadores do atendimento educacional especializado (AEE), em seguida abordamos como ocorreu a organização no que diz respeito a rotina profissional no referido espaço de atuação docente, que já estando funcionando a mais de dois anos e ainda apresenta muitos obstáculos a serem superados para que haja assim um perfeito funcionamento. Diante do trabalho realizado ao longo do ano, foram detectadas dificuldades relacionadas aos critérios de encaminhamento dos alunos para atendimento, à participação da comunidade escolar, assim como uma inexistência de debates e discussões quanto aos processos de parcerias com demais profissionais (médicos, fonoaudiólogos, psicólogos) que atende os alunos, quanto na dificuldade de parcerias mais efetivas com os professores regentes de turma. As reflexões feitas a partir dos dados observados servem de alerta para podermos analisar de que maneira a implantação da sala de recurso pode estar ocorrendo nos diversos contextos escolares, e também para podermos pensar em novos direcionamentos na criação e implantação de serviços que auxiliem de fato o processo de aprendizagem dos alunos com deficiência na perspectiva inclusiva. Palavras-chave: Sala de recursos, Educação Especial, Ensino Regular. Introdução A educação especial é uma área de estudo relativamente nova. Nos últimos 20 anos é que passamos a vivenciar, no Brasil, um fortalecimento da inclusão escolar como organizadora das metas para a escolarização das pessoas com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Essa nova perspectiva exige que se institua um amplo debate sobre as diretrizes da escola brasileira, sua organização pedagógica e seus profissionais, no sentido de favorecer avanços no cenário educacional, com vasta promulgação legal e jurídica. Marcos legais foram sendo implementados, destacamos a Constituição Federal (BRASIL, 1988); Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (BRASIL, 1990), em 1996 a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), na qual é incluído um capítulo legislativo exclusivo para tratar sobre a temática educacional de alunos com necessidades educacionais especiais (NEE) nas escolas brasileiras.

Upload: truongdung

Post on 20-Jan-2019

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO

INCLUSIVA: DESAFIOS DIÁRIOS DO ATENDIMENTO

EDUCACIONAL ESPECIALIZADO NO ENSINO REGULAR.

Cristiane dos Reis Cardoso

Mestranda em Educação pela Unifal/MG

Resumo: O texto relata a experiência de implantação de uma sala de recursos multifuncional

(SRM) numa escola de ensino fundamental na cidade de Alfenas/MG, ocorrida durante o ano

de 2016. Inicialmente o texto apresenta um percurso legal da Educação Especial e

documentos norteadores do atendimento educacional especializado (AEE), em seguida

abordamos como ocorreu a organização no que diz respeito a rotina profissional no referido

espaço de atuação docente, que já estando funcionando a mais de dois anos e ainda apresenta

muitos obstáculos a serem superados para que haja assim um perfeito funcionamento. Diante

do trabalho realizado ao longo do ano, foram detectadas dificuldades relacionadas aos

critérios de encaminhamento dos alunos para atendimento, à participação da comunidade

escolar, assim como uma inexistência de debates e discussões quanto aos processos de

parcerias com demais profissionais (médicos, fonoaudiólogos, psicólogos) que atende os

alunos, quanto na dificuldade de parcerias mais efetivas com os professores regentes de

turma. As reflexões feitas a partir dos dados observados servem de alerta para podermos

analisar de que maneira a implantação da sala de recurso pode estar ocorrendo nos diversos

contextos escolares, e também para podermos pensar em novos direcionamentos na criação e

implantação de serviços que auxiliem de fato o processo de aprendizagem dos alunos com

deficiência na perspectiva inclusiva.

Palavras-chave: Sala de recursos, Educação Especial, Ensino Regular.

Introdução

A educação especial é uma área de estudo relativamente nova. Nos últimos 20 anos é

que passamos a vivenciar, no Brasil, um fortalecimento da inclusão escolar como

organizadora das metas para a escolarização das pessoas com deficiência, transtornos globais

de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.

Essa nova perspectiva exige que se institua um amplo debate sobre as diretrizes da

escola brasileira, sua organização pedagógica e seus profissionais, no sentido de favorecer

avanços no cenário educacional, com vasta promulgação legal e jurídica.

Marcos legais foram sendo implementados, destacamos a Constituição Federal

(BRASIL, 1988); Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (BRASIL, 1990), em 1996 a

promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996), na qual é incluído

um capítulo legislativo exclusivo para tratar sobre a temática educacional de alunos com

necessidades educacionais especiais (NEE) nas escolas brasileiras.

Para tanto, é na compreensão do princípio promulgado pela Declaração de Salamanca

(UNESCO, 1994), que o Brasil busca efetivar a implementação de suas ações educacionais

inclusivas.

Já no âmbito específico deste estudo, em abril de 2007, foi publicado o Edital nº 01 do

“Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais”, visando a organização de

espaços com recursos necessários ao atendimento às necessidades educacionais especiais de

alunos, para distribuição de equipamentos e materiais didáticos para implantação de salas de

recursos multifuncionais nas escolas de educação básica da rede pública de ensino (BRASIL,

2007). É estabelecido nesse documento que

[...] a organização da oferta do atendimento educacional especializado,

complementar ou suplementar à escolarização, é indispensável para que os alunos

com deficiência e/ou com altas habilidades/superdotação tenham igualdade de

oportunidades por meio de acesso ao currículo e do reconhecimento das diferenças

no processo educacional (BRASIL, 2007, p. 01).

Ações estas que são reafirmadas recentemente, pelo Decreto n. 6.571 de 17 de

setembro de 2008 (BRASIL, 2008), denominado Política Nacional de Educação Especial na

Perspectiva da Educação Inclusiva, que avança nas discussões da inclusão escolar ao

regulamentar a possibilidade de atendimentos educacionais especializados aos alunos com

NEE decorrentes de deficiências, transtornos globais do desenvolvimento, e altas habilidades

ou superdotação no próprio espaço da escola regular.

Para Bazon et al (2014), esta mesma legislação vem possibilitar a oferta do

atendimento especializado aos alunos, com o oferecimento de recursos e procedimentos

apropriados, facilitando a acessibilidade e a eliminação de barreiras e, assim, efetivando a

promoção da formação integral dos mesmos, visando assim o término da segregação ou

exclusão.

De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação

Inclusiva (Brasil, 2008) o Atendimento Educacional Especializado (AEE), define o sistema de

apoio à escolarização desses alunos como

[...] o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados

institucionalmente, prestado de forma complementar ou suplementar à formação dos

alunos no ensino regular”. O referido decreto especifica que o AEE poderá ser

ofertado pelos sistemas públicos de ensino ou pelas instituições especializadas e

define a Sala de Recursos Multifuncionais (SRM) como “ambientes dotados de

equipamentos, mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos para a oferta do

atendimento educacional especializado (BRASIL, 2008).

Assim de acordo com Garcia (2006, p. 301), verifica-se que a análise da legislação

dessa época possibilita perceber que a organização do trabalho pedagógico na educação

especial apoiou-se na defesa de uma abordagem educacional de atendimento e na crítica à

homogeneização da escola do ensino regular.

Deste modo, concepção da educação inclusiva compreende o processo educacional

como um todo, pressupondo a implementação de uma política estruturante nos sistemas de

ensino que altere a organização da escola, de modo a superar os modelos de integração em

escolas e classes especiais. A escola nesta perspectiva, deve cumprir sua função social,

construindo uma proposta pedagógica capaz de valorizar as diferenças, com a oferta da

escolarização nas classes comuns do ensino regular e do atendimento as necessidades

educacionais específicas dos seus estudantes.

Contudo a medida que o debate da educação inclusiva ganha força tanto legal, quanto

na literatura, precisamos ter maior atenção para percebermos até que ponto estamos

avançando para a inclusão dos alunos deficientes. Neste sentido, Patto (2008) nos diz que “se

fala o tempo todo em incluir, mais precisamos refletir em que termos, este é o cerne da

questão”.

Neste sentido, Jacobo (1999) salienta, que em relação ao sujeito “especial”, que, por

ser ele assim considerado quando a escola o inclui, imediatamente se levantam vozes

inconformadas exigindo sua exclusão. Freitas (2006) completa, a educação inclusiva veio

revelar que a educação no mundo todo vem excluindo cada vez mais os alunos, ao invés de

incluir, contudo a educação inclusiva para este autor introduz um novo olhar, uma nova

maneira de ser ver, de ver os outros e a educação e nos alerta que,

para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada com base no

entendimento de que ela que precisa ser capaz de atender as necessidades de seus

membros, assim sendo, a inclusão significa a mudança da sociedade (FREITAS,

2006, p. 167).

Assim, com base nas discussões este estudo lança como objetivo geral analisar o

processo de (implantação) da sala de recurso multifuncional (SRM) de uma escola pública

estadual do ensino fundamental I na cidade de Alfenas/MG.

O método: reconhecendo o cenário da implantação

A escola estadual Dirce Moura Leite está situada na região central da cidade de

Alfenas/ MG, sua clientela são de alunos cujas famílias são de classe socioeconômica baixa

em sua maioria e uma pequena parcela pertencentes a classe média, atendendo alunos do 1º

ao 5º ano do ensino fundamental I. É importante dizer que a escola fica localizada em uma

área central privilegiada e de fácil acesso, aos arredores da mesma estão localizados vários

supermercados, farmácias, diversos tipos de loja, restaurantes, etc.

A organização do espaço físico é inadequada a clientela atendida, pois seu espaço

físico possui muitas escadas, ausência de área verde, um prédio em anexo ao qual as crianças

precisam sair de um prédio e atravessar a rua para chegar ao outro para lanchar e fazer a

educação física, quando chove as merendeiras levam a comida até as salas de aulas, para que

os alunos não precisem se deslocar na chuva.

O local em que é servido a merenda é pequeno e mesmo possuindo um toldo em dias

de chuva torna-se impossível a permanência dos alunos no local. Outro fator preocupante é no

que diz respeito a sala de informática que foi desativada para que o espaço físico passasse a

servir de refeitório para os alunos. Os banheiros não são adaptados para os alunos deficientes,

nem as salas de aula, a escola possui uma biblioteca localizada no prédio anexo, a sala é

mofada e pouco arejada, como fica no prédio em anexo, existe uma sala pedagógica no prédio

principal que possui muitos livros e jogos para os alunos que estudam no prédio principal não

tenham que se deslocar até a biblioteca do prédio anexo.

No total a escola possui 12 salas de aula que atende 4 primeiros anos, 3 segundos anos,

4 terceiros anos, 4 quartos anos e 4 quintos anos, além de oferecer educação de tempo

integral, num total a escola em 2016 atendeu uma população de 525 alunos ao todo.

Conhecendo a sala e os sujeitos da relação pedagógica inclusiva.

A sala de recurso multifuncional era situada no segundo andar do prédio principal, na

última sala do corredor (Figura 1). Durante 2 anos e três meses essa foi sua localização, em

2016 com a mudança na gestão solicitamos a direção a possibilidade de remanejamento da

sala para outro espaço mais acessível para os alunos, visto que para serem atendidos na SRM,

era preciso subir uma escadaria para chegar no segundo andar.

Figura 1 – Sala de recurso multifuncional localizada no segundo andar do prédio principal.

Após 2 meses e meio conseguimos mudar a SRM do prédio principal, para o prédio

em anexo. O espaço da nova sala é amplo, conseguimos montar um cantinho da leitura com

tapete e almofadas, organizar os jogos e materiais concretos de um lado da sala dispostos em

cima das carteiras e de fácil acesso para os alunos, além disso contávamos com um notebook,

um computador de mesa e uma mesa pedagógica (Figura 2). Com relação a espaço físico e

materiais, a sala se tornou uma das mais bem equipadas da cidade.

A B

Figura 2 – Sala de recurso multifuncional localizada no prédio anexo. A) visão ao entrar na sala B) Visão do

fundo da sala.

O número de alunos deficientes matriculados na escola foi bem variado, sendo 20 na

parte de manhã e quase 30 no turno da tarde, com relação ao diagnóstico dos alunos atendidos

tínhamos: G 40.8 epilepsia, F 70.9 retardo mental leve, F 84.9 transtornos globais não

especificado; F 90.9 Transtorno hipercinético não especificado; F 81.8 Outros transtornos do

desenvolvimento das habilidades escolares; F 90.0 déficit de atenção e hiperatividade; G 80

Alteração de substancia branca periventricular nas regiões pariental, occipital e temporal, com

predomínio occipital; F 70 Deficiência Intelectual; F 81.3 Transtorno misto de habilidades

escolares; F 84.0transtorno do espectro autista; F 84.5 síndrome de asperger, além dos alunos

que não tinham laudo médico e apresentavam muitas dificuldades escolares.

Assim o AEE ao longo do ano de 2016, foi realizado por mim no turno da manhã e por

outra professora no turno da tarde. Salientamos que para trabalhar no AEE conforme a

Resolução nº 4/2009, art.12, “ o profissional deve ter formação inicial que o habilite para o

exercício da docência e formação continuada em educação especial” e cumpri-lo de forma

complementar ou suplementar à escolarização oferecida pelo ensino regular, considerando as

habilidades e as necessidades educacionais específicas dos estudantes.

Antes de iniciarmos o atendimento com os alunos, foi realizada uma reunião com os

pais para informá-los a respeito do trabalho realizado na sala no contra turno, assinatura do

termo de frequência ou desistência do serviço no contra turno, além da definição dos horários

para atendimentos dos alunos.

De acordo com Cavalieri (2002) o contra turno viabiliza a melhoria do desempenho

dos alunos, ajuda a suprir carências do turno regular, além de oferecer aos alunos uma

segunda oportunidade de aprendizagem, utilizando materiais e métodos diferenciados,

interessantes e eficazes.

De todos os alunos que frequentariam o AEE no período da manhã, apenas um a mãe

assinou o termo de desistência, pois o filho estudava em outra escola e não entendia o porquê

teria que ir no contraturno na antiga escola que fez do 1º ao 5º ano.

Descrição da Experiência: Atendimento educacional especializado dos desafios às

perspectivas.

O trabalho realizado na sala de recurso multifuncional na escola estadual Dirce Moura

Leite iniciou-se na terceira semana de fevereiro, devido as semanas anteriores serem para

planejamento, organização da sala e reunião com os pais.

Ao longo do ano houve uma assiduidade da grande maioria dos alunos no contra

turno, a média de alunos atendidos foi de 20 alunos, sendo 9 de outras escolas do 6º ano 9º

ano e o restante sendo alunos da própria escola onde ocorreu o atendimento. O período que os

alunos ficavam na sala era de duas horas, uma vez por semana.

Verificamos que uma das dificuldades da atuação se deu logo após a autorização dos

pais para o comparecimento no AEE, com relação aos laudos e relatórios pedagógicos

atualizados, visto que na pasta de muitos alunos estes documentos eram muito antigos. Assim,

foi necessário solicitar avaliação pedagógica atualizados dos professores regentes e avaliação

clínica dos alunos de modo a traçar o plano de intervenção e pensar possíveis orientações para

os professores regentes.

Sabemos que não é obrigatório a apresentação de laudo médico (diagnóstico clínico)

por parte do aluno com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas

habilidades/superdotação, uma vez que o AEE se caracteriza por atendimento pedagógico e

não clínico. Por isso, não se trata de documento obrigatório, mas, complementar, quando a

escola julgar necessário.

Neste sentido, temos o artigo 9º contido na Resolução CNE/CEB, nº 4/2009, que

prescreve a elaboração do plano de AEE, atribuindo-o aos professores que atuam na SRM, em

articulação com os demais professores do ensino regular, com a participação das famílias e

em interface com os demais serviços setoriais da saúde, da assistência social, entre outros

quando necessários.

Realidade da sala de recurso: da exclusão a inclusão?

Após conversa com os responsáveis para informar sobre o AEE e a diferença de aulas

de reforço e da organização dos horários de atendimentos, passei a fazer a avaliação inicial

dos alunos. Nesta avaliação e de posse dos documentos que a escola tinha dos alunos, fiz os

encaminhamentos para ter laudos atualizados de todos os alunos, além dos relatórios

pedagógicos dos professores.

Ressalta-se que para obter os laudos médicos aqui na cidade de Alfenas/MG o

procedimento é feito da seguinte forma: caso os pais não tenho convênio médico ou condições

de pagar uma avaliação particular, os professores regentes fazem um relatório pedagógico do

aluno, ao qual, constam as queixas relativas a sua aprendizagem e encaminham para a

supervisora que marca uma reunião com os pais para informar o que a escola está observando

e solicitar os documentos para o encaminhamento do aluno para a avaliação com a equipe do

SERDI1(Serviço Especializado de Reabilitação em Deficiência Intelectual) que agendará uma

avaliação para o aluno.

Nesta avaliação o aluno passará por uma triagem com psicólogo, fonoaudiólogo,

assistente social para verificar o porquê o aluno está apresentando as dificuldades escolares,

este serviço atende os alunos da rede municipal e estadual da cidade.

Infelizmente observou-se que algumas avaliações foram feitas de maneira equivocadas

como foi o caso de um aluno que em 2014 foi diagnostico pela psicóloga da equipe como

tendo transtorno do Espectro Autista F84.9 passando a ser acompanhado por professor de

1É o Serviço Especializado de Reabilitação em Deficiência Intelectual (SERDI) executado pela Apaes com

convênio com o SUS e que tem como finalidade exclusiva o atendimento em saúde das pessoas com Deficiência

Intelectual e do Transtorno do Espectro do Autismo.

apoio ao longo desse ano e do ano seguinte. Ao iniciar o trabalho na SRM solicitei a mãe do

aluno uma avaliação atualizada e realizei o encaminhamento para a equipe, que após

questionar o porquê do laudo atualizado, agendou o teste Wisc IV2 e como resultado a equipe

concluiu que o aluno não apresentava déficit intelectual.

Tanto esse caso, como o de outros três ao solicitar um laudo atualizado, além da

equipe questionar o porquê, o resultado do teste Wisc IV aplicado em todos, não condizia com

os laudos anteriores. Deste modo, ao longo do ano foram feitos vários encaminhamentos para

a equipe e muitos resultados não condiziam com as observações realizadas na escola e no

cotidiano do aluno.

Sabemos que a SRM é um espaço destinado ao atendimento dos alunos com

deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação,

mais tendo horário nada impede que alunos com dificuldades acentuadas frequentem esse

serviço de modo a ter suas dificuldades trabalhadas. Neste sentido, os alunos mais

comprometidos que foram avaliados e não apresentaram para a equipe nenhuma deficiência,

receberam atendimento na SRM.

Esse tipo de prática, de acordo com Oliveira (2008) faz com que a SRM se distancie

de seu papel, no ensino inclusivo, ao ser destinado a uma população que poderia estar

freqüentando outro tipo de atendimento, como a sala de reforço. A educação especial estaria

atuando com um público que não seria de sua responsabilidade, mas que não é atendida de

forma diferenciada pelo ensino comum e sim pela falta da oferta de outros atendimentos

específicos, a SRM passa a ser a única opção da escola para auxiliar esses alunos mais

comprometidos e que não são considerados deficientes.

Após as avaliações iniciais e encaminhamentos para obter laudos atualizados, os

alunos foram atendidos semanalmente na SRM por um período de duas horas. Neste

atendimento, era pensado a aula com objetivos, as atividades que o aluno iria realizar, os

recursos necessários e a avaliação (se o aluno alcançou ou não os objetivos propostos).

Já outro desafio compreendido também como perspectiva proveniente da experiência é

a necessidade de uma discussão e parceria de trabalho com os demais profissionais da escola,

para que possa chegar a um consenso comum no que diz respeito a superação desse desafio.

Assim tendo feito o levantamento e encaminhamento dos alunos, no horário de módulo

2 A Escala Wechsler de Inteligência para Crianças – 4a Edição (WISC-IV) – é um instrumento clínico de

aplicação individual que tem como objetivo avaliar a capacidade intelectual das crianças e o processo de

resolução de problemas. Elaborado para a faixa etária 6 anos e 0 meses a 16 anos e 11 meses , é composto por

15 subtestes, sendo 10 principais e 5 suplementares, e dispõe de quatro índices, à saber: Índice de Compreensão

Verbal, Índice de Organização Perceptual, Índice de Memória Operacional e Índice de Velocidade de

Processamento, alem do QI Total.

informei a direção, supervisores e professores regentes e de apoio minhas observações de

modo que trabalhando em equipe pudéssemos ter resultados mais significativos.

Dessa maneira, o professor da sala de recurso deve atuar em conjunto com o professor

da classe comum na definição de metodologias diferenciadas para que os alunos, nela

incluídos, possam ter acesso ao currículo e as demais atividades da escola, neste sentido Duk

(2005) nos diz

[...] o professor da sala de recursos multifuncionais deverá participar das reuniões

pedagógicas, do planejamento, dos conselhos de classe, de elaboração do projeto

pedagógico, desenvolvendo ação conjunta com os professores das classes comuns e

demais profissionais da escola para a promoção da inclusão escolar (DUK, 2005,

p.18).

Sabe-se que ninguém desenvolve um projeto sem parcerias, por isso que se faz tão

importante um trabalho participativo com todos envolvidos. Por saber da importância que

uma gestão escolar tem no contexto educacional, primeiramente procurei o apoio da direção e

da supervisão escolar a fim de obter um melhor esclarecimento do trabalho na SRM e um

auxilio no que diz respeito a orientação com os professores

De uma maneira geral os alunos foram agrupados em duplas ou em trios de acordo

com sua faixa etária e nível de aprendizagem. Apenas 3 alunos mais comprometidos foram

atendidos individualmente, a fim de que a intervenção fosse feita de maneira mais direta e de

acordo com seu ritmo.

Neste sentido, além do plano de aula que poderia ser semanal ou quinzenal

dependendo do aluno e de suas especificidades, o professor da sala de recurso faz o PDI

(plano de desenvolvimento individual) juntamente com o professor regente e a família, de

modo a traçar as estratégias para que o aluno possa se desenvolver da melhor maneira

possível.

O PDI de acordo com Poker et al. (2013) é um documento elaborado pelo professor do

AEE com o apoio do coordenador pedagógico da unidade escolar. O PDI serve para registrar

os dados da avaliação do aluno e o plano de intervenção pedagógico especializado que será

desenvolvido pelo professor na SRM.

Como o PDI tem várias informações separadas por área, a primeira parte que é a

caracterização do aluno com o resumo da sua história de vida e escolarização, além da parte

especifica do professor da sala de recurso eu que fiz. No que diz respeito à parte de sondagem

dos professores regentes de turma alguns realizaram junto com a supervisora e outros que

tinham a professora de apoio, esta ficou responsável pelo seu preenchimento.

O momento que poderíamos sentar todas juntas para preencher o relatório PDI seria a

reunião semanal de módulo, mais infelizmente esse espaço na maioria das vezes era utilizado

para dar recados ou para planejamento da rotina da sala de aula. Neste momento então, eu me

reunia com a professora da sala de recurso do turno da tarde, trocávamos informações sobre

os alunos e sobre as intervenções que estávamos realizando. Foi através desses nossos

encontros semanais que conseguimos juntamente com o apoio da direção mudar a sala de

recurso do segundo andar do prédio principal para uma sala no prédio anexo.

Sousa e Prieto (2001, p. 114) afirmam que “a educação especial não

pode ser oferecida sem o devido planejamento e as condições técnicas e materiais, pois, se

isso ocorrer, muitos alunos ficam sem um efetivo atendimento educacional”. Assim a

mudança do espaço físico da SRM aconteceu após 2 meses e meio de aula e como o espaço

era maior, mais ventilado e iluminado, todos os alunos gostaram muito e observou-se uma

melhora na concentração e desempenho dos mesmos nas atividades que propúnhamos.

Outra dificuldade que encontramos ao longo do ano foi conciliar um momento para

conversar com os professores regentes dos alunos, principalmente dos alunos matriculados em

outras escolas, desde modo ao longo do ano de 2016 consegui visitar as outras escolas e

conversar com os supervisores apenas uma vez, em outros momentos que precisávamos trocar

alguma informação está ocorreu por meio de email. Para Brasil (2010), a articulação

pedagógica entre os professores, que atuam no AEE e os professores das classes do ensino

regular, para promover as condições de participação e aprendizagem dos alunos, é de extrema

importância para o êxito da educação inclusiva.

De acordo com (Brasil 2008), o AEE, é “[...] o conjunto de atividades, recursos

de acessibilidade e pedagógicos organizados institucionalmente, prestado de forma

complementar ou suplementar à formação dos alunos no ensino regular” (BRASIL,

2008). Especificando também que a SRM são “ambientes dotados de equipamentos,

mobiliários e materiais didáticos e pedagógicos para a oferta do atendimento educacional

especializado” (BRASIL, 2008), algo que tem destoado a realidade das escolas públicas.

Para compreender melhor a proposta da SRM, de acordo com Brasil (2008)

[...] a União prestará apoio técnico e financeiro aos sistemas públicos de ensino dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na forma deste Decreto, com a

finalidade de ampliar a oferta do atendimento educacional especializado aos alunos

com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou

superdotação, matriculados na rede pública de ensino regular (BRASIL, 2008, s/p.).

Como se vê, a legislação educacional prescreve que o AEE deve ser organizado

preferencialmente pela oferta de SRM, de forma complementar ou suplementar, e

não mais substitutiva, para que os alunos não interrompam seus percursos escolares na classe

comum, mas tenham supridas, ao mesmo tempo, suas demandas de escolarização,

considerando-se esse atendimento como o mais adequado para esses alunos. Mais

infelizmente da maneira como tem ocorrido sua implantação, o sucesso ou não dos alunos

parece ficar a cargo da SRM e de um único professor.

Neste sentido Mantoan (2006, p.17) nos fala “os professores do ensino regular

consideram-se incompetentes para lidar com as diferenças em sala de aula, especialmente para

atender os alunos com deficiência”. Este sentimento decorre do fato de que, grande parte dos

professores que atuam nas classes comuns do ensino regular, não teve em sua formação

inicial, disciplina sobre o assunto.

Deste modo, a gestão da escola Dirce Moura Leite solicitou que fizemos um momento

de formação para os dois turnos da escola de modo a auxiliá-los nesse processo de inclusão

dos alunos deficientes. Observamos neste momento com os professores e em algumas

situações com os alunos que não frequentavam a SRM, que eles não entendiam o que era feito

nesse atendimento.

Tezzari (2002) destaca a evidência da concepção de educação especial, considerada

como algo fora e separado da educação comum, em que ainda se delegava ao professor

especializado o “poder” de realizar um trabalho adequado com os alunos com dificuldades ou

deficiência. Para Oliveira (2008), seria necessária a transformação da cultura escolar,

especialmente no que se refere ao pertencimento da SRM ao meio escolar.

Deste modo, o sucesso do trabalho colaborativo é o compromisso de todos, exigindo

transformações principalmente para os professores, implicando um processo de mudança

identitária na forma como cada docente visualiza a profissão. Este novo olhar da

profissionalidade docente, segundo Nóvoa (1991, p. 23), não consiste no entendimento do

professor de forma isolada, mas sim “inserido num corpo docente e numa organização

escolar, sua atuação passa a ser menos individual”, compartilhando metas, decisões,

instruções, responsabilidades, avaliação da aprendizagem, resoluções de problemas, e a

administração da sala de aula.

Assim, juntamente com a professora da SRM do período vespertino montamos um

vídeo (Figura 3) para que fosse apresentado a priori para os professores podendo ser passado

para os alunos em sala de aula também para conversar a respeito da temática.

Figura 3 – Quadros do vídeo apresentado aos professores.

Neste vídeo informamos o que é o atendimento educacional especializado, para que

serve, o porque se ter esse serviço no ensino regular, quem pode ser atendido, quem pode

realizar o atendimento, qual a finalidade, onde que acontece o AEE, o que são as SRM,

produção de matérias concretos, ressaltamos que o AEE não é reforço escolar, e colocamos

fotos dos alunos realizando as atividades na SRM (todas as imagens com autorização do

responsável legal).

Encerramos nosso ano letivo apresentando esse vídeo para os professores e com a

proposta de ao iniciarmos o ano, repassá-lo novamente para que a nova equipe conhecesse o

serviço e o espaço de modo a torna-lo de fato pertencente a escola e não algo a parte.

Considerações Finais

Este relato de experiencia teve como objeto de estudo o Atendimento

Educacional Especializado, ofertado aos alunos, público-alvo da Educação Especial em Sala

de Recursos Multifuncional. O objetivo geral da pesquisa consistiu em analisar o processo de

implementação da sala de recurso multifuncional de uma escola pública estadual do ensino

fundamental na região do sul de MG

Entende-se que este estudo é de suma importância por apresentar a rotina que acontece

nas escolas e nas salas de recursos multifuncionais. Percebe-se que existe um interesse

político grande da DESP em garantir a escolarização de crianças com deficiência nas escolas

comuns, porém, ainda existem muitas incertezas sobre se as crianças estão ou

não tendo uma educação adequada que dê fato estejam incluindo e não as integrando ao

sistema regular de ensino.

Pode-se, portanto, concluir que por mais que a equipe gestora apoia-se o trabalho na

SRM em muitos casos a organização do trabalho pedagógico, encaminhamentos para

avaliações médicas, conversas com a família parece ficar sob a responsabilidade do professor

de SRM.

Assim, a visão que se tem é que o aluno deficiente continua a ser de responsabilidade

apenas do professor da sala de recurso, a escola pouco muda com a chegada dos alunos

deficientes ao ensino regular, em muitos casos a integração ainda impera e a SRM, ao mesmo

tempo em que é um lugar onde se circunscreva escolarização desses alunos, serve para evitar

mudanças na escola.

A articulação entre os professores do ensino comum e especial ainda precisa avançar

muito, visto que as condições de organização do serviço conspiram contra essa parceria,

seja porque um atua no contra turno do outro, seja porque eles trabalham em escolas

diferentes e, mesmo quando eles trabalham na mesma escola e no mesmo período, suas

atividades estão em conflito com as possibilidades de encontro.

Fica evidente a necessidade de mais pesquisas a fim de contribuir para um melhor

conhecimento dessa realidade de modo a ajudar a divulgar experiencias existentes e contribuir

para que de fato esses alunos sejam incluídos no ensino regular e tenham seus direitos

educacionais respeitados e garantidos.

Referências Bibliográficas

BAZON, F. V. M. et al. ENSINO COLABORATIVO NA EDUCAÇÃO INCLUSIVA:

Desafios e perspectivas formativas. In: VI CBEE Congresso Brasileiro de Educação

Especial e IX encontro nacional de pesquisadores da educação especial. São Carlos/SP. v.

1. 2014.

BRASIL. Ministério da Educação. Resolução nº 4, de 02 de outubro de 2009. Institui

DiretrizesOperacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica,

modalidadeEducação Especial. Secretaria de Educação Especial. Disponível em:

<portal.mec.gov.br/dmdocuments/rceb004_09.pdf>. Acesso em: Jan. 2017

_______. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Inclusão. 2008.

Ministério da Educação. Disponível em: <www.portal.mec.gov.br.>. Acesso em: 20 fev.

2014.

_______. Ministério da Educação. Edital Nº 01, de 26 de abril de 2007. Programa de

Implantaçãodas Salas de Recursos Multifuncionais. Secretaria de Educação

Especial.Disponívelem:<http://www.portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/2007_salas.pdf>.Acesso

em: Jan. 2017.

_______. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, LDB

9.394, de 20 de dezembro de 1996.

_______. Estatuto da Criança e do Adolescente. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm Acesso em: jan. 2014.

_______. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm acesso em: jan. 2014.

CAVALIERI, A. M. V. A Educação Integral: uma nova identidade para a escola brasileira?

Educ. Soc., Campinas, vol. 23, n. 81, 2002.

DUK, C. Educar na diversidade: material de formação docente. Brasília: Ministério de

Educação, Secretaria de Educação Especial, 2005. 266p.

FREITAS, S. N. A formação de professores na educação inclusiva: construindo a base de todo

o processo. In: RODRIGUES, D. (Org.). Inclusão e educação: doze olhares sobre a educação

inclusiva. São Paulo: Summus, 2006. pp.161- 181.

GARCIA, R. M. C. Políticas para educação especial e as formas organizativas do trabalho

pedagógico. Revista Brasileira Educação Especial, Marília, Set.-Dez. 2006, v.12, n.3,

pp.299-316.

JACOBO, B. Consideraciones generales a la educación especial. Revista Contexto e

Educação, nº 55, jul./set. 1999, pp. 125 – 139.

MANTOAN, M. T. E. Inclusão escolar: o que é? Por quê? Como fazer?. São Paulo:

Moderna, 2006.

NÓVOA, António. A Formação Contínua entre a Pessoa-Professor e a Organização-

Escola, Inovação, Porto, v.4, n.1, p. 63-76, 1991.

OLIVEIRA, M. A. de. Educação inclusiva: uma análise crítica da prática pedagógica de uma

professora de sala de recursos. 128f. 2008. Dissertação (Mestrado em Psicologia do

Desenvolvimento e Aprendizagem). Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências,

Bauru.

PATTO, M. H. S. Políticas atuais de inclusão escolar: reflexão a partir de um recorte

conceitual. In: BUENO, J. G. S.; MENDES, G. M. L.; SANTOS, R. A. dos. Deficiência e

escolarização: novas perspectivas de análise. Araraquara, SP: Junqueira & Marin; Brasília,

DF: Capes, 2008. p. 25-42.

POKER, R. B. et al. Plano de desenvolvimento individual para o atendimento

educacional especializado. São Paulo: Cultura Acadêmica; Marilia: Oficina Universitária,

2013.

SOUSA, S. M. Z. L. PRIETO, R. G. Atendimento educacional aos portadores de

deficiência mental da rede municipal de São Paulo: caracterização e análise das SAPNES.

Revista Brasileira de Educação Especial. v. 7, n. 1, 2001.

TEZZARI, M. L. “A SIR chegou. ”Sala de Integração e Recursos e a Inclusão na Rede

Municipal de Ensino de Porto Alegre. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação),

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.

UNESCO, Declaração mundial sobre educação para todos: satisfação das necessidades

básicas de aprendizagem. Jomtien, 1990.