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CARLOS JOAQUIM EINLOFT EDUCAÇÃO AMBIENTAL E PERCEPÇÃO DE RISCOS: UMA ABORDAGEM LÚDICA Dissertação apresentada à Universidade Federal de Viçosa, como parte das exigências do Programa de Pós Graduação em Extensão Rural, para obtenção do título de Magister Scientiae. VIÇOSA MINAS GERAIS – BRASIL 2013

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CARLOS JOAQUIM EINLOFT

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E PERCEPÇÃO DE RISCOS: UMA ABORDAGEM LÚDICA

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Viçosa, como parte das exigências do Programa de Pós Graduação em Extensão Rural, para obtenção do título de Magister Scientiae.

VIÇOSA MINAS GERAIS – BRASIL

2013

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CARLOS JOAQUIM EINLOFT

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E PERCEPÇÃO DE RISCOS: UMA ABORDAGEM LÚDICA

Dissertação apresentada à Universidade Federal de Viçosa, como parte das exigências do Programa de Pós Graduação em Extensão Rural, para obtenção do título de Magister Scientiae.

Aprovada em 2 de julho de 2013.

Prof. Dr. Marcelo Leles Romarco de Oliveira

Profa. Dra. Lourdes Helena da Silva

Prof. Dr. José Ambrósio Ferreira Neto (orientador)

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(…) If you should go skating

On the thin ice of modern life Dragging behind you the silent reproach

Of a million tear-stained eyes Don't be surprised when a crack in the ice

Appears under your feet. You slip out of your depth and out of your mind

With your fear flowing out behind you As you claw the thin ice.

Roger Waters, Pink Floyd

The thin ice - The wall

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iii

AGRADECIMENTOS

Diante de uma vida inteira repleta de ocasiões propícias e pessoas disponíveis a me acolher e

amparar, seria injusto nomear algumas e deixar outras de fora. Entretanto, faz-se mister um

exercício de agradecimento à misteriosa mecânica da vida através de algumas pessoas,

especialmente.

A Ariadne, pelo companheirismo e compreensão de todas as horas.

A Alice e Lucas pelos ensinamentos diários.

Aos irmãos Zé Armando e Ernani, pelo amparo incondicional, de diferentes formas.

Aos amigos do Centro Espírita Irmã Scheilla pelo apoio constante e sustentação espiritual.

A Beatriz e Mirian, pelo entendimento, amparo e estímulo.

Aos companheiros do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural, especialmente a Renata,

Telma, Carla, Natan, Poliana, Fátima, Patrícia, Kamil, Camelo, Álvaro e Roseni pela amizade,

gentileza e generosidade com as quais sempre me distinguiram.

Ao Professor Ambrósio pela orientação e diversas oportunidades apresentadas.

Aos Professores Rennan, Lourdes Helena, Nora, Norberto, Marcelo Leles, Sheila, France e Ana

Louise pelo aporte de valiosos conhecimentos em aulas e em momentos informais.

A Carminha e Romildo, pela preocupação, interesse, amizade e constante vontade de nós

impulsionar à frente.

Aos amigos Lani, Eufran, Rita e Maisa, por participarem da gênese de todo o processo.

Aos participantes das reuniões da pesquisa de campo, pela generosidade e desprendimento.

A todos que, direta ou indiretamente, me auxiliaram a chegar a este momento, muito obrigado.

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BIOGRAFIA

Natural de Viçosa, Carlos Joaquim Einloft graduou-se em 2003 em Administração: Habilitação

em Cooperativismo pela Universidade Federal de Viçosa, tendo, a partir de então, dedicado-

se ao trabalho como diagramador e designer gráfico. Neste mister teve a oportunidade de

participar da elaboração de jogos lúdicos didáticos de viés ambiental, todos atendendo a

demandas específicas manifestadas por atores que não eram, necessariamente, os seus

usuários finais. Dessa forma, todo o trabalho realizado foi feito sem a participação direta das

pessoas que deveriam ser a motivação primeira da criação destas atividades. Duas dezenas

de jogos depois, surgiu a oportunidade de melhor sedimentar o trabalho de elaboração de

instrumentos lúdicos através do amparo teórico-metodológico e empírico, sistematizado e

orientado, uma vez aprovada a proposta de ingresso no Programa de Pós-Graduação em

Extensão Rural como estudante de Mestrado no ano de 2011.

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RESUMO

EINLOFT, Carlos Joaquim. M.Sc., Universidade Federal de Viçosa, julho de 2013. Educação ambiental e percepção de riscos: uma abordagem lúdica. Orientador: José Ambrósio Ferreira Neto.

Num contexto de incertezas, mudanças e complexidade, como são as sociedade hodiernas

sob a égide da modernidade, onde a informação não é escassa, mas os atores sociais,

individuais e coletivos, no mais das vezes, carecem da capacidade de torná-la subsídio para a

tomada de decisões, a percepção se mostra a chave para a ressignificação do entorno.

O trabalho conjuga 3 eixos referenciais, a saber: a educação ambiental, os riscos e as práticas

lúdicas. No primeiro deles, temos a educação ambiental em sua vertente crítica, que busca a

superação das visões biocêntrica e antropocêntrica, em favor de uma visão globalizante, que

não separa a natureza da sociedade, mas a considera como um todo, englobando, inclusive,

as múltiplas dimensões da vida humana e as suas relações intrínsecas com o meio. No

segundo eixo, temos os riscos como condição inerente à sociedade moderna, e o conceito de

sociedade do risco como aquela que se ocupa em gerir os riscos que ela própria criou. Os

riscos são comumente classificados como tecnológicos, ambientais e sociais. Os tecnológicos

são aqueles originados na própria atividade humana e das estruturas criadas para favorecer o

desenvolvimento econômico e social, resultantes da intensificação da atividade produtiva e

do aumento do potencial de destruição de algum evento natural. Os riscos ambientais são

aquele que surgem ou são transmitidos pelo ar, água, solos ou pela cadeia alimentar até o

homem e se relacionam com o clima, a hidrologia ou à morfologia de um ambiente. Os riscos

sociais são aqueles resultantes dos mecanismos de diferenciação social e da fragmentação

urbana e estão relacionados com a saúde e segurança públicas, a violência, a educação e a

liberdade dos indivíduos. No terceiro eixo temos as práticas lúdicas, que trazem em sua

capacidade de gerar diversão o seu maior trunfo, na medida em que se tornam valiosos

instrumentos para a abordagem e fixação de diferentes temáticas, mesmo as mais

complexas.

Utilizamos na pesquisa empírica uma abordagem qualitativa através da técnica de análise de

conteúdo temático do material resultante de entrevistas em grupo focalizadas. Emergiram

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daí diferentes posicionamentos acerca das questões relativas ao risco, à convivência,

estratégias, escolhas, dentre outros, além dos princípios norteadores que permitiram a

construção do jogo “Percepção do risco: construindo um novo olhar”.

Como não se pode ensinar riscos a partir de uma lista, uma vez que eles são tantos quantas

forem as visões de mundo, impressões, experiências, vivências e percepções sobre cada um

dos infinitos elementos constituintes da vida cotidiana, o próprio grupo entrevistado sugeriu

que o que precisaria mudar é o olhar, a capacidade de ver algo novo no que se vê no dia a

dia.

Dessa forma, o jogo trata o risco sob uma visão educativa abrangente, que coloca o usuário

como sujeito ativo no processo de construção e compartilhamento do conhecimento

construído com seus pares visando a autonomia crítica, a capacidade de problematização

reflexiva sobre as questões acerca de sua realidade socioeconômica e ambiental no sentido

de apropriar-se dela, ressiginificá-la e, eventualmente, fazer escolhas que levem a situações

melhores.

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vii

ABSTRACT

EINLOFT, Carlos Joaquim. M.Sc., Universidade Federal de Viçosa, July 2013. Environmental education and risks perception: a playful approach. Advisor: José Ambrósio Ferreira Neto.

In a context of uncertainty, change and complexity, as are the “hodiernas” societies under the

aegis of modernity, where the information is not scarce, but the social actors, individual and

collective in most cases lack the ability to make it the base for decision making, the

perception proves itself to be the key to the redefinition of the surroundings. The work

combines three referencing axes namely: environmental education, the risks and playful

practices. In the first, we have environmental education in its critical stance, seeking to the

overcome of anthropocentric and biocentric views in favor of a broad vision that does not

separate the nature of society, but considered as a whole, encompassing even the multiple

dimensions of human life and its intrinsic environmental relationship. In the second axis,

there are risks as a inherent condition to the modern society, and the society risk concept as

one that engages in managing risks that it itself created. Risks are commonly classified as

technological, environmental and social. The technology risks are those originating from own

human activity and structures designed to promote economic and social development,

resulting from the intensification of production and increasing the potential destruction of

some natural event. The environmental risks are those that arise or are transmitted to

humans by the air, water, soil or food chain, and are related to climate, hydrology or

morphology of a particular environment. Social risks are those arising from the mechanisms

of social differentiation and urban fragmentation, and are they related to public health and

safety, violence, education and freedom of individuals. In the third axis are placed the playful

practices which bring in their ability to generate amusement your greatest asset, to the

extent that they become valuable tools for addressing and fixing various issues, even the

most complex ones. We have used a qualitative approach on empirical research by using the

technique of material content analysis resulting from focused group interviews. This has

resulted in different positions related to the risk, to living, strategies, choices, among others,

in addition to the guiding principles that have enabled the construction of the game "Risk

perception: building a new look." Because risk can not be teached from a list, given that they

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are much as many worldviews, impressions, experiences and perceptions about each of the

infinite elements of everyday life, the respondent group itself suggested that what have to be

changed is the is the looking, the ability to see something new in what is sawn in everyday

life. Thus, the game consider the risk under a comprehensive educational vision that places

the user as an active subject in the process of building and knowledge sharing with peers built

targeting critical autonomy, the ability to problem-reflective on issues about socioeconomic

and environmental reality towards appropriating it, give it a new meaning, and eventually

make choices that lead to better situations.

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SUMÁRIO

RESUMO .................................................................................................................................. v

ABSTRACT ............................................................................................................................. vii

1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 1

2. OBJETIVOS DA PESQUISA ................................................................................................... 6

2.1. Objetivo geral ............................................................................................................. 6

2.2. Objetivos específicos ................................................................................................. 6

3. REFERENCIAL CONCEITUAL ................................................................................................ 7

3.1. Educação ambiental ................................................................................................... 7

3.2. Práticas lúdicas como forma de Educação Ambiental ............................................. 10

3.3. Risco, percepção e exposição .................................................................................. 13

3.3.1. Risco ............................................................................................................... 13

3.3.2. Percepção de risco e informação .................................................................. 15

3.3.3. Exposição e vulnerabilidade .......................................................................... 19

4. METODOLOGIA DA PESQUISA ......................................................................................... 22

4.1. Desenho do estudo .................................................................................................. 22

4.2. Sujeitos ..................................................................................................................... 23

4.3. Coleta e análise dos dados ....................................................................................... 25

4.3.1. Análise de conteúdo temática ....................................................................... 28

4.4. Aspectos éticos ........................................................................................................ 29

5. RESULTADOS ................................................................................................................... 31

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5.1. Iniciativas de educação ambiental e risco ............................................................... 31

5.2. A educação ambiental como possibilidade de ressignificação crítica ..................... 31

5.3. A visão de risco dos participantes ........................................................................... 33

5.3.1. A pré-análise .................................................................................................. 33

5.3.2. A exploração do material ............................................................................... 34

5.3.3. Tratamento dos resultados, inferências e interpretação ............................. 34

5.3.4. Análise temática ............................................................................................ 35

5.3.4.1. A percepção de risco dos entrevistados .............................................. 35

5.3.4.2. Risco x condição financeira.................................................................. 36

5.3.4.3. Risco x segurança pública .................................................................... 36

5.3.4.3.1. A questão das drogas ................................................................ 37

5.3.4.3.2. Outras questões acerca da segurança pública .......................... 39

5.3.4.4. Como as pessoas e grupos vêm os riscos ............................................ 39

5.3.4.5. Porque as pessoas se colocam em situação de risco? ........................ 42

5.3.4.6. Por que alguns riscos são aceitos e outros são rejeitados? ................ 44

5.4. Subsídios para o jogo ............................................................................................... 45

5.5. O jogo ‘percepção do risco: construindo um novo olhar’ ....................................... 50

6. CONCLUSÕES ................................................................................................................... 55

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 57

ANEXOS ................................................................................................................................ 61

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1. INTRODUÇÃO

Quatro momentos distintos da história recente trazem à tona a educação ambiental

como tema emergente diante da crescente degradação do meio ambiente. O primeiro

deles foi a Conferência de Estocolmo1, em 1972, onde o termo educação ambiental surge

pela primeira vez, apontado como estratégia de informação dirigida a atores sociais

individuais e coletivos, atribuindo-lhes, inclusive, sua parcela de responsabilidade no

combate à degradação ambiental que, por ignorância ou indiferença, causa danos

irreparáveis ao meio ambiente. A Declaração sobre o Ambiente Humano, documento final

resultante desta Conferência, advoga a premente necessidade do avanço do

desenvolvimento no sentido de crescimento econômico, mas, pela primeira vez,

apresenta a necessidade de que este desenvolvimento seja aliado à preservação do meio

ambiente, e para tal, estabelece princípios gerais de ação.

O segundo momento foi o Encontro de Belgrado2, em 1975, do qual resultou a Carta de

Belgrado, que estabelece a necessidade de uma ética global, de indivíduos e sociedade,

identificando o local do homem na biosfera e das suas relações complexas, num contexto

de intensas transformações. Além disso, estabelece primeiramente os objetivos e as

diretrizes gerais da educação ambiental, define o público geral e traça a meta ambiental

de “melhorar todas as relações ecológicas, incluindo a relação da humanidade com a

natureza e das pessoas entre si” (CARTA DE BELGRADO, 1994).

Já em 1977 ocorreu na Georgia, ainda na então União Soviética, o terceiro evento,

chamado Conferência de Tbilisi3, com o foco na própria educação ambiental, que recebeu

uma ‘função capital’ de dilatação da compreensão dos problemas ambientais por parte

dos indivíduos de todas as idades, níveis socioeconômicos etc., que deveriam, a partir de

então, se envolver ativamente no processo de resolução dos problemas ambientais por

meio de uma postura crítica, proativa e emancipadora. Esta conferência adiciona ao

debate a questão da interdependência e solidariedade entre as comunidades nacionais e

1 Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano ou Conferência de Estocolmo, Suécia: fortaleceu o debate sobre Desenvolvimento e Ambiente e foi um passo importante para a construção de uma educação voltada para as questões socioambientais. 2 Promovido pela UNESCO, o Encontro de Belgrado é considerado um marco conceitual para questões ambientais, sobretudo para a educação ambiental propriamente dita. 3 Conferência Intergovernamental de Tbilisi, Georgia: estabeleceu os princípios norteadores da educação ambiental e remarca seu caráter interdisciplinar, crítico, ético e transformador.

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‘entre todo o gênero humano’, universalizando a responsabilidade de todos no que diz

respeito à questão ambiental.

O quarto evento, em 1992 no Rio de Janeiro, a Rio 924;5, modifica a forma de pensar o

tema desenvolvimento, adjetivando-o como sustentável. Desloca os seres humanos para

uma posição central para este desenvolvimento, atribuindo-lhes ‘direito a uma vida

saudável e produtiva, em harmonia com a natureza’. E, para tanto, apresenta a

necessidade da disponibilidade de informação à população bem como a sua participação

nos processos de tomada de decisão. Vemos aqui uma proposta que busca alterar valores

e condutas, e mesmo a estrutura de poder vigente em níveis local e regional. O

documento final resultante desta Conferência conclama, ainda, a adesão e cooperação

solidária internacional na esfera do desenvolvimento sustentável.

No Brasil, o artigo primeiro da Lei 9.795, de 27 de abril de 1999, institui a Política Nacional

de Educação Ambiental e nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) do Ministério da

Educação, o meio ambiente é considerado uma ‘questão social urgente’, juntamente com

a ética, a saúde, a orientação sexual, o trabalho, o consumo e a pluralidade cultural, todos

esses temas considerados transversais no modelo de ensino brasileiro. Desta maneira

o Brasil é considerado um dos países com maior variedade de experiências em Educação Ambiental, com iniciativas originais que, muitas vezes, se associam a intervenções na realidade local. Portanto, qualquer política nacional, regional ou local que se estabeleça deve levar em consideração essa riqueza de experiências, investir nela, e não inibi-la ou descaracterizar sua diversidade (BRASIL, 1997).

Este mesmo documento declara, entretanto, que apesar dessa posição de vanguarda nas

experiências em educação ambiental, no Brasil ela se encontra ainda longe de ser aceita,

adotada e desenvolvida, uma vez que sua implantação implicaria em mudanças sociais e

políticas profundas em toda a sociedade.

A educação ambiental, dentre outros fatores, pode se constituir numa forma de apoio

para a sociedade no processo de tomada de consciência sobre o meio ambiente e sua

4 Primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92), Brasil: suas discussões estavam centradas na busca de alternativas para conciliar o desenvolvimento socioeconômico e industrial com a conservação da biodiversidade e do meio ambiente como um todo. 5 Destacamos apenas estes quatro eventos e não os seus sucessores em função de serem neles onde surge o termo educação ambiental e são consolidadas o corpo de ideias e conceitos que abarcam o tema, que são, efetivamente, aqueles mais importantes para este trabalho.

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complexidade. Por meio de uma postura reflexiva, ela pode contribuir para o

desenvolvimento de posicionamentos ante as demandas ambientais para fazer frente aos

desafios que se impõem no sentido de aliar estilos de vida e de produção hodiernos com

a preservação do meio ambiente e ainda garantir a sua continuidade para as gerações

futuras.

Dentre a multiplicidade de temas discutidos nas questões ambientais, um assunto

emergente é o risco, característica indelével da modernidade. Assim, a compreensão

sobre o meio ambiente, suas complexidades e interações com a atividade humana, por

meio da informação adquirida e assimilada, pode se constituir tanto em um fator

determinante para a sustentabilidade ambiental das atividades socioeconômicas no longo

prazo, quanto da percepção da própria exposição e vulnerabilidade a diferentes riscos.

Dessa forma, o enfrentamento e a mitigação dos eventuais efeitos negativos de

determinado risco ao qual se está exposto tornam-se mais exequíveis à medida que se

conta com maior volume de informação, do qual é possível extrair conhecimento sobre a

presença do homem no meio e dos efeitos desta inter-relação intrínseca, papel que pode

ser cumprido por boas práticas de educação ambiental, isto é, práticas capazes de

estimular a autonomia problematizadora dos indivíduos. Assim, a disponibilidade de

informações em quantidade e qualidade pode permitir o conhecimento acerca da

paisagem de riscos da qual se faz parte.

A educação ambiental pode instrumentalizar o ‘olhar’6 sobre a realidade, justamente

quando permite a transformação das informações em conhecimento objetivo sobre os

diferentes fatores que permeiam a vida, incluindo-se aí os riscos. Isto é, a percepção do

risco, em termos de exposição e vulnerabilidade, relaciona-se com a informação

disponível e com o conhecimento dela decorrente. Essa informação gera, ainda, níveis de

confiança distintos por parte da população vulnerável dirigidos às fontes das informações

– pesquisadores, decisores políticos ou executores das políticas públicas –, proporcionais

à qualidade das decisões tomadas baseadas no seu manejo.

A sociedade está imersa num contexto de incertezas, mudanças e complexidade. A

incerteza é a incapacidade de predizer com exatidão o curso dos acontecimentos futuros,

6 Para Laplantine (2004) ver é apenas receber imagens enquanto olhar é buscar a significação das variantes.

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como a disponibilidade de recursos naturais e serviços ambientais suficientes, as

mudanças dos ambientes naturais, as mudanças ambientais induzidas pela ação humana

e mesmo sobre os processos sociais. As mudanças se referem às condições ambientais,

socioeconômicas e políticas do mundo hodierno, em constante transformação. A

complexidade diz respeito à interveniência e concorrência de múltiplos fatores na

formação de um determinado risco, podendo, a própria complexidade, se constituir num

risco em si mesma. Nesse contexto de incertezas, mudanças e complexidades, é

necessária a renovação e a circulação constante de informação de risco para informar ou

reforçar a memória de risco das populações, no sentido de se criar um estado de atenção

permanente capaz de atenuar os efeitos negativos da eventual objetivação de algum

desastre potencial.

Assim, o problema emergente é a própria percepção de risco, pela inexatidão intrínseca

das informações a ele relacionadas – uma vez que toda predição é baseada em modelos

que são apenas aproximações à realidade –, bem como pela desatualização e mesmo pela

completa ausência de qualquer informação.

Temos aí, dois extremos: por um lado, um volume cada vez maior de informação

disponível, que promove mudanças para além das atividades produtivas, chegando às

organizações sociais e aos processos políticos e, por outro, o não acesso a essas

informações por parte significativa da sociedade. O que se vê, é, portanto, uma grande

quantidade de informação que não necessariamente se traduz em conhecimento para a

tomada de decisão por parte dos decisores políticos ou executores de políticas públicas,

aumentando, dessa forma, a vulnerabilidade a determinado risco que uma parcela da

sociedade pode estar exposta.

Entretanto, a informação de risco, catalisada em conhecimento por meio da educação

ambiental, pode também gerar na população um aumento significativo da percepção da

própria exposição e vulnerabilidade ao risco. Por outro lado, o aumento do conhecimento

sobre a existência e exposição a determinados riscos não os elimina e nem elimina a

exposição, mas pode ajudar a promover uma mudança postural que atenue os seus

efeitos negativos através de medidas preventivas que diminuam a vulnerabilidade. E,

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nesse sentido, as práticas de educação ambiental podem explicitar a exposição e auxiliar

na diminuição da vulnerabilidade.

Desta forma, apresentamos como motivação para a pesquisa a seguinte questão: Como a

Educação Ambiental pode influenciar na construção da percepção de riscos? Essa

pesquisa se dará em duas dimensões: a primeira analítica, conceitual e teórica, que

servirá de sustentáculo para a emergência da segunda, a dimensão prática, que será a

própria construção da atividade lúdica em atendimento ao objetivo geral proposto a

seguir.

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2. OBJETIVOS DA PESQUISA

2.1. Objetivo geral

A partir de uma reflexão teórica e conceitual sobre questões ambientais, práticas

lúdicas e o conceito de sociedade do risco, desenvolver uma atividade lúdica de

educação ambiental que auxilie na percepção de riscos.

2.2. Objetivos específicos

Analisar como as pessoas percebem os riscos ambientais;

Identificar experiências públicas de Educação Ambiental envolvendo percepção de

riscos em instituições como o Instituto Estadual de Florestas (IEF) e a Defesa Civil

de Minas Gerais;

Evidenciar como a Educação Ambiental, ao possibilitar a percepção de riscos

ambientais, possibilitaria a percepção de outras formas de risco.

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3. REFERENCIAL CONCEITUAL

3.1. Educação Ambiental

A Política Nacional de Educação Ambiental, em seu artigo primeiro, dispõe sobre a

educação ambiental e define-a da seguinte maneira:

Entendem-se por educação ambiental os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo, essencial à sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade (LEI 9.795, 1999:1).

Esta definição nos remete à construção de valores, conhecimentos, habilidades etc.,

necessários para a sustentabilidade no longo prazo com qualidade de vida. Coloca,

entretanto, estas ações objetivas nas mãos do ator social que, a partir de um

determinado processo de educação ambiental, seria capaz de promover mudanças em

sua realidade imediata, melhorar o seu meio e, consequentemente, a sua própria vida.

O item II do artigo 4º da mesma Lei define como um dos princípios básicos da educação

ambiental “a concepção do meio ambiente em sua totalidade, considerando a

interdependência entre o meio natural, o socioeconômico e o cultural, sob o enfoque da

sustentabilidade” (LEI 9.795, 1999:2). E no item I do artigo 5º, dentre os objetivos da

educação ambiental está “o desenvolvimento de uma compreensão integrada do meio

ambiente em suas múltiplas e complexas relações, envolvendo aspectos ecológicos,

psicológicos, legais, políticos, sociais, econômicos, científicos, culturais e éticos” (LEI

9.795, 1999:2). Essa totalidade não dissocia o homem do seu meio, mas relaciona-o a

todas as suas dimensões, integrando natureza e sociedade, inclusive sob a perspectiva de

que o homem é sujeito e objeto de transformações ocorridas em ambas, pelas inter-

relações por ele mediadas.

Para Dias (2006) “a educação ambiental é um processo que permite às pessoas aprender

como funciona o ambiente, como dele dependemos, e com ele interagimos, promovendo

a sua sustentabilidade”. Este autor afirma, portanto, a dependência da vida humana ao

sistema natural, isto é, dos recursos naturais e dos serviços ambientais, além da

necessidade de compreender o seu funcionamento visando a sua sustentabilidade

através da educação ambiental. A Carta de Belgrado (1975) já havia estabelecido, três

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décadas antes, a necessidade de compreensão sobre o meio ambiente, declarando como

meta que a educação ambiental deverá

Formar uma população mundial consciente e preocupada com o meio ambiente e com os problemas associados e que tenha conhecimento, aptidão, atitude, motivação e compromisso para trabalhar, individual e coletivamente, na busca de soluções para os problemas existentes e para a prevenção de novos (CARTA DE BELGRADO, 1975).

Assim, uma proposta que envolva educação ambiental deve contemplar o alcance da

“sinergia social”, termo cunhado por Ruth Benedict (FADIMAN, 1979 apud BROTTO, 1999)

e que se refere ao grau de cooperação e harmonia interpessoal numa sociedade,

relacionado à ação cooperativa dos elementos, que resultaria num efeito global maior do

que todos os elementos somados separadamente.

Entretanto, Santos (2009) pondera que, para a construção de uma sociedade ambiental e

humanamente sustentável é necessário “superar tanto a visão biocêntrica como a visão

antropocêntrica, que concebem o ser humano dissociado do meio ambiente em que

vive”. Em detrimento a essas visões antagônicas surge a visão globalizante, “que entende

existir uma interação entre a sociedade e a natureza; é preciso que a primeira se dedique

a gerir a natureza em busca de uma relação mais equilibrada e inclusiva” (SANTOS,

2009:7). Além disso, Carvalho (2008) nos alerta para a importância da superação da visão

dicotômica entre natureza e sociedade, pois assim as relações de interação permanente

entre a vida humana social e a vida biológica da natureza tornam-se mais evidentes.

Dessa forma escapa-se da armadilha dos extremos, onde ou o homem é senhor do

mundo natural ou o seu desagregador, como se toda e qualquer ação humana sobre o

meio ambiente fosse necessariamente nociva.

Assim, temos um panorama de ampliação do raio de ação da educação ambiental,

superando a visão estrita e heteronômica de um conteúdo a ser aprendido em livros ou

cartilhas, para uma leitura e percepção de mundo que se constrói através da prática

cotidiana, além de deixar de enfocar o plano meramente conservacionista dos aspectos

ecológicos para envolver também os aspectos culturais, históricos, sociais e econômicos.

Por outro lado, Lopes e Tenório (2011) alertam para a tendência reducionista que grassa

nas práticas de educação ambiental, isto é, ambiente significando natureza, e problema

ambiental significando problema ecológico, derivando dessa visão dois graves problemas:

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em primeiro lugar, o desprezo pelas dimensões políticas, éticas e culturais da questão, o que acarreta uma visão fragmentada e acrítica da questão ambiental; e, em segundo, a utilização de metodologias não participativas, prescritivas e de baixa criatividade, ao tratar a população em geral e os moradores de comunidades como meros receptáculos de suas propostas ambientalmente corretas (LOPES e TENÓRIO, 2011:133 – grifo dos autores).

No primeiro problema apontado, ignora-se o ambiente, o cenário onde se dão os modos

de vida em todas as esferas da vida social pública ou particular e, no segundo, impõe-se

de cima para baixo, ignorando a possibilidade de criação dialógica da atividade de

intervenção social. Ambos os problemas levantados se referem à não localização da

dimensão humana no centro dos projetos de intervenção social, uma prática

heteronômica – isto é, sentidos e orientações construídos externamente à realidade

objetiva do público a ser envolvido – e etnocêntrica. O conhecimento não se estende de

uma fonte que o domina para uma que o ignora, mas se constitui nas relações homem-

mundo, relações de transformação, se aperfeiçoando na problematização crítica das

relações (FREIRE, 2006).

A educação ambiental é um processo de intervenção social que visa, em último termo,

algum processo de mudança. Entretanto, não se pode ignorar as múltiplas dimensões

humanas, as identidades e representações dos indivíduos ou grupos sociais e os seus

aspectos culturais, pasteurizando o processo de intervenção social em moldes

mecanicistas e invasivos (EINLOFT et al., 2011).

Dessa forma, a educação ambiental pode ser um veículo de construção e

compartilhamento de saberes acerca do meio em que um dado grupo social se insere, por

meio da ressignificação dos elementos constituintes do seu entorno e da problematização

das múltiplas dimensões da vida social. Isto é, a educação ambiental não visa resolver

problemas objetivos imediatos, mas estimular a capacidade de problematização para que

surjam comportamentos autônomos que busquem as soluções para se evitar ou mitigar

determinadas situações-problemas, dentre os quais figuram os diferentes tipos de riscos

e vulnerabilidades.

É justamente por meio dessa capacidade autônoma de problematização, de

ressignificação, de construção de “valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e

competências” (LEI 9.795, 1999:1) que o indivíduo poderá vir a ser capaz de identificar

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potenciais fatores de ameaça a seu modo de vida, à reprodução de suas condições de

sobrevivência e de se tornar capaz de fazer frente aos desafios que o meio lhe impõe.

3.2. Práticas lúdicas como forma de Educação Ambiental

Dentre as várias ferramentas de que se dispõe na educação ambiental, os jogos se

destacam das demais por seu caráter lúdico, isto é, pela diversão, e também pela

possibilidade de troca de experiências, pelo estímulo ao espírito de cooperação e pela sua

importância no desenvolvimento da criatividade e da capacidade de concentração. Esses

fatores facilitam a assimilação de conceitos, mesmo os mais complexos, como os que se

relacionam à educação, em especial a ambiental, e ao uso racional e sustentável dos

recursos naturais em favor do desenvolvimento sustentável.

Segundo Rojas (s/d),

a palavra lúdico vem do latim ludus e significa brincar. Neste brincar estão incluídos os jogos, brinquedos e divertimentos e é relativa também à conduta daquele que joga, que brinca e que se diverte. Por sua vez, a função educativa do jogo oportuniza a aprendizagem do indivíduo, seu saber, seu conhecimento e sua compreensão de mundo (ROJAS, s/d:6).

Segundo a autora, a ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade e

não pode ser vista apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita a

aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para uma boa saúde

mental, prepara para um estado interior fértil, facilita os processos de socialização,

comunicação, expressão e construção do conhecimento. Brotto (1999) trabalha essa

construção do conhecimento de forma coletiva ou cooperativa e propõe uma

interessante comparação entre situações opostas, na qual se evidencia claramente a

vantagem da situação cooperativa sobre a competitiva na construção coletiva em todos

os aspectos abordados (Quadro 1).

Concordamos com Brotto (1999), quando afirma que o jogo ou a prática lúdica de

qualquer natureza, deve ser capaz de desenvolver as “coopetências”, termo por ele

cunhado que significa “competências compartilhadas”, fundamentais para a chamada

construção dialógica do conhecimento, para as práticas coletivas de cooperação e

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participação, para o desenvolvimento da autonomia e até, em última análise, para a

melhoria das condições de vida das pessoas. Mais importante do que o aspecto de

competição que os jogos normalmente evocam, é a própria dinâmica de jogar, que

permite uma abordagem distinta da realidade e a reapropriação do próprio meio através

da sua ressignificação e problematização reflexiva.

Quadro 1. Comparação entre situação cooperativa e competitiva nos jogos

Situação cooperativa Situação competitiva

Percebem que o atingimento dos objetivos é, em parte, consequência da ação de outros membros

Percebem que o atingimento de seus objetivos é incompatível com a obtenção dos objetivos dos demais

São mais sensíveis às solicitações dos outros São menos sensíveis às solicitações dos outros

Ajudam-se mutuamente com frequência Ajudam-se mutuamente com menor frequência

Há maior homogeneidade na quantidade de contribuições e participantes

Há menor homogeneidade na quantidade de contribuições e participantes

A produtividade em termos qualitativos é maior A produtividade em termos qualitativos é menor

A especialização de atividades é maior A especialização de atividades é menor Fonte: Adaptado de BROTTO (1999).

Numa palavra, jogar é mais importante do que vencer. O resultado do jogo deve estar

além da mera vitória. Assim, o lúdico em forma colaborativa, através do

compartilhamento das experiências individuais no sentido da construção social de uma

percepção comum, surge como uma importante e promissora forma de sociabilidade.

Ressaltamos, entretanto, não se tratar aqui de generalizar no termo “jogo” aquilo que

hoje se convencionou chamar de esporte, uma vez que sob sua aparente beleza subjazem

outros interesses, como aqueles voltados para a busca do alto desempenho, para a

superação do outro ou mesmo para a sua negação. Debortoli e Oliveira (2012), citando

Hobsbawn e Ranger (1984), afirmam que o esporte, no contexto da modernidade,

tornou-se um processo e um produto, ligados primordialmente a interesses econômicos.

Decorre daí sua mercantilização “como produto privilegiado da indústria cultural

mitificando os ideais esportivos como sinônimos de saúde, beleza e sucesso individual”

(DEBORTOLI e OLIVEIRA, 2012:24).

Em contraponto a isso temos as práticas e relações compartilhadas, colaborativas,

cooperativas, possibilitando múltiplas formas de sociabilidade que geram solidariedade e

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engajamento e possibilidades de aprendizagem diversas, nas quais “o sentido é todos

serem capazes de se envolver na produção coletiva do jogo, que é também a

[re?]produção coletiva da própria vida cotidiana” (DEBORTOLI e OLIVEIRA, 2012:32).

Dessa forma, por meio de dinâmicas relativamente simples, acessíveis a diferentes extratos

etários e níveis de educação formal, podemos alcançar resultados surpreendentes no que

se refere à assimilação de conhecimentos, ao aprofundamento de discussões sobre a

intervenção e interação do homem com a natureza e seu meio, e a busca de soluções

exequíveis para os problemas que se lhes apresentam. Muito mais do que a abordagem

individual de problemas práticos imediatos, trata-se de estimular o desenvolvimento da

capacidade de problematização dessas situações objetivas, por meio de um enfoque

emancipador, que permita a modificação de determinados padrões de comportamento,

valores sociais e culturais. A dinâmica lúdica participativa permite aos envolvidos

perceberem de forma mais consistente a maneira pela qual o conhecimento teórico

encontra lugar no mundo real, somando-se ao seu conhecimento tradicional, tanto na

apreensão de uma dada situação ou realidade, quanto na busca de soluções factíveis, pois

conseguem perceber-se como parte de um todo maior e entender como se tornam por ele

responsáveis e capazes de modificá-lo. Para Sachs (2000), o casamento do saber prático

sobre seu próprio meio com o conhecimento acadêmico é o ponto de partida para o

estabelecimento de estratégias de ação e enfrentamento dos problemas que se lhes

apresentam.

A educação ambiental se beneficia significantemente das práticas lúdicas principalmente

porque, no dizer de Huizinga (1996), um dos importantes recursos humanos e culturais,

dentre os aspectos dos jogos, é que a maioria é divertida, e por isso, têm por fator

essencial a capacidade de estimular a fixação dos conteúdos nele explorados. O interesse

gerado pelo jogo é o principal aliado da educação ambiental no momento da discussão e

reflexão dos conteúdos, na apropriação e atribuição de significados para a realidade

imediata, bem como no planejamento de futuras ações. O despertar para o valor dos

conteúdos das temáticas trabalhadas é que faz com que o sujeito-aprendiz tenha prazer

em aprender. Aprendemos melhor quando se trata de assuntos que nos interessam e nos

quais temos prazer (ROJAS, s/d).

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As práticas participativas de forma geral, e os jogos, em especial, estimulam o ser

humano em vários sentidos quando se prioriza seu aspecto cooperativo, estimulando a

participação de todos em torno de um objetivo comum, facilitando a interação e a

emissão de opiniões de forma livre, mesmo por parte daqueles que não se sentem à

vontade para fazê-lo normalmente. Nesse sentido, esperamos que a utilização de

metodologias lúdicas como ferramenta para educação ambiental possa gerar estes

estímulos para a participação, para a construção coletiva e dialógica da percepção dos

riscos e que essa informação possa, efetivamente, se traduzir em conhecimento capaz de

melhorar a relação do homem com o meio onde se insere.

A prática lúdica na educação ambiental pode, portanto, propiciar a identificação e análise

dos riscos, suas dimensões e inter-relações com processos naturais, identificar também os

seus potenciais efeitos sobre os elementos vulneráveis – sejam eles o patrimônio material

e imaterial, atividades econômico-produtivas ou vidas humanas – e facilitar um

comportamento proativo no sentido de se amortecer os efeitos negativos da

consolidação de um determinado risco num desastre objetivo.

3.3. Risco, percepção e exposição

3.3.1. Risco

Segundo o artífice da expressão “sociedade do risco”, Ulrich Beck, o risco é uma

antecipação de um evento de consequências negativas, mas não o evento em si mesmo

(BECK, 2008a; 2008b). É, portanto, uma virtualidade, um “que vir” que pode ser

manejado, gerido e planejado para antecipar ou mitigar os seus eventuais efeitos

danosos. O autor assevera que o risco está associado às decisões humanas. Os riscos

“resultam da transformação de inseguranças e perigos em decisões” (BECK, 2008b:157). E

neste sentido há distinções importantes entre os termos risco e perigo: o primeiro, como

adrede mencionado, está relacionado à decisão, à intervenção humana, oriunda de algum

processo de tomada de decisão (inundações em áreas urbanizadas, poluição, ataques

terroristas, dentre outros); já o segundo está relacionado com causas que estão além do

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controle humano (eventos naturais como terremotos, erupções vulcânicas, dentre

outros) (LUHMANN, 1990 apud BRÜSEKE, 2007). Já para Anthony Giddens,

o risco não é apenas uma questão de ação individual. Existem ‘ambientes de risco’ que afetam coletivamente grandes massas de indivíduos – em certas instâncias, potencialmente todos sobre a face da Terra, como no caso de risco de desastre ecológico ou guerra nuclear (GIDDENS, 1991:43).

Este autor diferencia risco de perigo pela consciência da ameaça que o indivíduo tem por

uma determinada linha de ação. O risco pressupõe o perigo e não a consciência do perigo

(GIDDENS, 1991). Isto é, quando assume um ‘risco calculado’, o indivíduo está consciente

do perigo enquanto ameaça a um determinado resultado esperado. Por exemplo, há risco

de morte ao se praticar esportes radicais, mas esse risco pode ser variável conforme a

destreza e o conhecimento que o praticante possui, isto é, a informação é o diferencial. Já

o perigo está relacionado com a falta de informação para se avaliar o contexto à que se

está exposto e está, portanto, relacionado com a falta de consciência da ameaça.

Os riscos, grosso modo, podem ser agrupados em três categorias principais, os riscos

tecnológicos, os riscos naturais ou ambientais e os riscos sociais (HERCULANO, 2009). Os

riscos tecnológicos são “aqueles derivados da atividade humana e do conjunto de

estruturas de todo tipo criadas com a finalidade de favorecer o desenvolvimento

econômico e social” (CALVO GARCIA TORNEL, 2001 apud ZANIRATO et al., 2008), isto é,

são aqueles resultantes da intensificação da atividade produtiva e da modificação ou

aumento do potencial de destruição de algum evento natural. Os riscos naturais ou

ambientais são “aqueles que surgem ou são transmitidos pelo ar, água, solo ou pela

cadeia alimentar para o homem” (NOVEMBER, 2002 apud por ZANIRATO et al., 2008),

relacionados ao clima, à hidrologia ou à morfologia de um dado ambiente. Os riscos

sociais são aqueles resultantes “da segregação da sociedade e da fragmentação urbana,

que acarretam cada vez mais insegurança” (ZANIRATO et al., 2008) e estão relacionados

com a saúde, a segurança alimentar, a violência, a educação, a liberdade, dentre outros. É

possível inferir que estes riscos estão sempre inter-relacionados e que têm seus limites

indefinidos. Isto é, essas categorias de riscos não podem ser consideradas estanques, pois

um evento de uma categoria quase sempre atinge outra, uma vez que além de inter-

relacionados são interdependentes. Por exemplo, num hipotético empreendimento

condominial, a retirada de uma floresta que protege uma nascente pode privar um grupo

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social do acesso à água ao mesmo tempo em que extingue áreas de vegetação tributárias

daquele curso d’água. Isto é, uma ação humana (tecnológica) causa ao mesmo tempo um

dano social e ambiental.

Outro conceito central da obra de Ulrich Beck é “sociedade do risco”, que ele define

como uma sociedade que se ocupa, cada vez mais, em debater, prevenir e administrar os

riscos que ela mesma produziu (BECK, 2008a). A “sociedade do risco” é toda uma nova

ordem mundial global, socioeconômica e mesmo de modificações no nível pessoal,

gerada a partir da combinação dos riscos ecológicos, químicos, nucleares, genéticos e

econômicos (GUIVANT, 2001). Existe ainda uma estranha democracia no conceito de risco

que não respeita as fronteiras geopolíticas e mesmo os muros invisíveis, na qual países,

grupos de atores dos mais diversos e classes sociais são todos afetados pelos riscos

(GUIVANT, 2001), embora os efeitos sobre cada um desses atores sociais sejam variáveis.

No mundo moderno, industrializado e globalizado, o ponto de comunhão entre todos é,

justamente, o risco, ou como assevera Milton Santos, citado por Zanirato et al. (2008),

são “produtos históricos e resultantes de ações e omissões humanas e expressão do

desenvolvimento das forças produtivas e do período técnico-científico-informacional”

(ZANIRATO et al., 2008) e, portanto, são o resultado de uma construção social.

Os riscos, como virtualidades de eventos de consequências negativas, precisam, portanto,

ser previstos, visualizados, avaliados e, sobretudo, informados à sociedade,

principalmente àquele grupo que é objeto da ameaça em questão para que possa

percebê-lo, dimensioná-lo e avaliar suas possibilidades de ação e reação.

3.3.2. Percepção de risco e informação

A percepção é uma sensação pessoal, subjetiva e inerente ao indivíduo (CASPARRI et al.,

2011), que varia de acordo com a visão que a pessoa possui do ambiente, combinada com

os capitais que é capaz de mobilizar. Portanto, ela é única e variável de acordo com o

contexto socioeconômico e cultural, o local e o tempo no qual o individuo ou grupo social

está inserido.

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Para Douglas e Wildavsky (2012) os riscos devem ser abordados sob uma perspectiva

cultural, uma vez que, entendidas as dinâmicas de convívio com o risco e de sua

prevenção, estratégias específicas podem ser construídas através do contexto cultural.

Zanirato et al. (2008) citam Ortwin Renn (1992), que corrobora essa visão ao asseverar

que “os seres humanos não percebem o mundo com olhos primitivos, mas com lentes

filtradas por sentidos sociais e culturais, transmitidos por meio de processos de

socialização” (ZANIRATO et al., 2008).

Uma dada situação de risco não é, também, garantia de que a população por ele

ameaçada o perceba, mesmo com ele convivendo, uma vez que pode estar exposta ou

vulnerável a um risco mesmo sem saber de sua existência. Isto é, a situação de risco não é

capaz, sozinha, de gerar informação e conhecimento de uma potencial ameaça que

poderia redundar numa conjugação de esforços para mitigá-la ou atenuar seus efeitos.

Zanirato et al. (2008), afirmam que a percepção do risco se dá de forma subjetiva e

técnica, isto é, subjetivamente, por meio de sua construção social e, tecnicamente, pelos

especialistas que o diagnosticam e também daqueles que comunicam seus potenciais

efeitos ao público.

Dados quantitativos, informações institucionais, conhecimento da área e seus elementos

constituintes, memória midiática e história oral de desastres são alguns dos fatores que

alimentam o estoque de informações necessárias para a percepção dos riscos. A

importância do conhecimento pode ser avaliada pela ponderação de Beck (2008b) que

afirma que quanto menos se sabe sobre um determinado risco, mais se está vulnerável a

ele, o que pode causar consequências imprevisíveis. E ainda, que enquanto não se

adquirir consciência de sua ameaça, o risco não pode ser objeto de investigação,

planejamento e política. A percepção do risco é, portanto, importante tanto para o grupo

social por ele afetado, quanto para os decisores políticos responsáveis por aquela região.

Entretanto, planejamento e tomada de decisões ocorrem na esfera política, que, grosso

modo, deveria dar-se por duas formas: a proativa, através de atividades educativas e

informativas no sentido de prevenção sobre o risco, suas causas e possíveis

consequências; e a reativa, isto é, a gestão da emergência através de ações objetivas no

pós-desastre.

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Considerando-se que “los costes de respuesta y recuperación tras un desastre son más

elevados que los que conlleva la adopción de estrategias de mitigación proactivas” (FRA

PALEO, 2010a:10), torna-se justificável o investimento em ações preventivas que

amenizem os seus efeitos. A informação circulante sobre riscos e vulnerabilidades pode,

em última análise, economizar recursos humanos, físicos e financeiros num eventual

desastre, tais como a perda de vidas humanas, das infraestruturas sociais, da destruição

ou interrupção das atividades econômico-produtivas, dos transportes, de patrimônios

materiais e imateriais, impactos ambientais, dentre outros.

É necessário ressaltar, no entanto, que o simples conhecimento ou a posse de

informações acerca da própria exposição ao risco não diminui a sua ameaça, uma vez

que, em determinados contextos, a exposição a algum tipo de risco é constante e

inerente àquele contexto, como por exemplo, uma área suscetível a terremotos.

Entretanto, se a informação não pode eliminar a ameaça, pode diminuir a vulnerabilidade

ao perigo, através de medidas que possam mitigar os seus efeitos danosos na eventual

objetivação desse risco num desastre e sua complexidade. Ter um plano de ação prévio,

saber o que fazer no momento do desastre, ter água e alimentos estocados, por exemplo,

pode ser decisivo no enfrentamento dos efeitos pós-desastre.

O conhecimento dos riscos, dos fatores desencadeantes, intervenientes ou concorrentes

que o tornam complexo, impõe-se, portanto, como uma necessidade. A informação é o

veículo desse conhecimento e deve ser contínua, porque, segundo Fra Paleo (2010b), la

modificación de la percepción y la actitud de los ciudadanos y de los responsables

políticos locales es un proceso que debe reforzarse continuamente para que sea afective

e duradero” (FRA PALEO, 2010b:63).

La falta de información, y en último término de conocimiento, sea por la complejidad de los procesos naturales, por la limitada capacidad de interpretación y explicación por parte del ser humano, o por la complejidad de los procesos sociales, está limitando la eficaz planificación del riesgo, lo que incrementa la exposición e vulnerabilidad al riesgo de desastre (FRA PALEO, 2011:59).

Este autor pondera ainda que a falta de informação sobre ações de mitigação, adaptação,

prevenção e emergência reforça as relações de conflito e desconfiança entre cidadãos,

pesquisadores e decisores políticos, o que torna ainda mais incerto o cenário de sua ação

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social e limitador na capacidade de planejamento e gestão dos riscos. Essa incerteza é o

resultado da carência de informações necessárias para a compreensão dos processos, das

relações causais, dos resultados esperados e das dimensões dos efeitos (FRA PALEO,

2011). Um esquema para facilitar a dinâmica da percepção do risco pode ser observado

na Figura 1.

Figura 1. Dinâmica da percepção do risco e confiança. Fonte: elaborado pelo autor.

A dinâmica da percepção do risco exposta na Figura 1 se dá, grosso modo, da seguinte

maneira: num contexto de incertezas, complexidade e mudanças, a percepção de risco

está relacionada com a informação disponível (considerando-se a sua quantidade e

qualidade e suas diferentes origens, como a memória local coletiva, os meios de

comunicação e a informação técnica), que gera confiança ou desconfiança (nos

pesquisadores, decisores políticos ou executores de políticas públicas, por exemplo),

influenciando diretamente a vulnerabilidade ou exposição ao risco.

A incerteza pode, entretanto, ser diminuída com o aporte e a gestão adequada da

informação. Os riscos, entretanto, não poderão ser eliminados, mas, em sendo mais bem

conhecidos, poderão ter seus eventuais efeitos atenuados. O conhecimento é, portanto, a

chave para o manejo dos riscos, e seu aporte pode ser realizado por diversas práticas de

educação ambiental disponíveis e, inclusive, previstas por Lei Federal no país.

A prospecção da informação em quantidade e qualidade é um fator determinante para a

ampliação do estoque de conhecimento que se tem de uma determinada área de risco,

de seus fatores concorrentes e intervenientes, de maneira que se possa melhorar as

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análises, ampliar os sistemas de alerta e mesmo a velocidade de resposta no caso de um

eventual desastre.

Transformar as informações disponíveis em conhecimento capaz de alterar posturas

frente às ameaças do meio é também papel da educação ambiental. E mais

especificamente, as atividades lúdicas como ferramenta da educação ambiental, por meio

de sua capacidade de envolvimento pela diversão, são potencialmente mais eficazes no

processo de apreensão e fixação de determinados conteúdos ou mesmo de informação

técnica do que outros processos não lúdicos.

3.3.3. Exposição e vulnerabilidade

O ser humano, por toda a sua história, sempre correu algum tipo de risco. A naturalização

da presença e o convívio com os eventuais efeitos negativos dos riscos é, porém, uma

característica da “sociedade do risco” (BECK, 2008b). Toda infraestrutura social, aparatos

de cadeias produtivas, patrimônios materiais e imateriais estão sujeitos a

vulnerabilidades, mas o principal objeto de preocupação é o ser humano.

A ação humana é, sem dúvida, um fator concorrente em áreas de risco. A ocupação

humana se renova continuamente para um melhor aproveitamento intensivo e extensivo

do solo, dos recursos naturais e dos serviços ambientais. Ora, “el sistema natural

proporciona recursos, materias primas y servicios ambientales que sostienen la actividad

econômica” (FRA PALEO, 2010a:3).

A intensificação dos processos produtivos acarreta uma série de riscos biológicos, como

pragas, doenças, ameaças à saúde humana pelo uso intensivo de biocidas e

fitossanitários; afetam também as atividades econômico-produtivas e mesmo a

segurança alimentar, além do avanço da ocupação sobre as áreas verdes, remanescentes

de maciços florestais, expondo o solo à degradação por erosão e ao lixiviamento das

camadas mais ricas em nutrientes, além de liberação intensa de dióxido de carbono. Isto

é, na modernidade industrial, a intensificação do modelo de exploração característico da

sociedade do risco expõe grupos sociais dos mais diversos a riscos tecnológicos,

ambientais e sociais, todos com consequências que variam de superficiais a imprevisíveis.

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Além dos riscos citados, outros riscos também ameaçam as atividades produtivas e a vida

cotidiana dos grupos sociais, como os riscos econômicos, de saúde e de segurança

pública, uma vez que, como já afirmado, os riscos não respeitam limites geográficos,

natureza da atividade laboral, classe social, opção política, etnia ou ideologia.

Beck (2008a) aponta o nível de exposição de risco como a principal desigualdade da

sociedade moderna. Isto é, determinados atores sociais podem mobilizar capitais de uma

maneira tal que minimizem para si a exposição ao risco em detrimento da maximização

para outrem (BECK, 2008a), escolhendo para si uma alimentação e hábitos mais

saudáveis, uma moradia mais segura, acesso a informação em quantidade e qualidade.

Por outro lado, às classes economicamente menos favorecidas resta uma maior

vulnerabilidade a diferentes riscos, como a água contaminada, a insegurança pública, a

incerteza quanto ao futuro, o não acesso à educação, a renda insuficiente, a insegurança

alimentar, dentre outros.

A vulnerabilidade está relacionada com a fragilidade do sistema e sua incapacidade de

superar os eventuais efeitos negativos de uma crise (ZANIRATO et al., 2008), isto é, está

na sua gestão. Enquanto a exposição pode chegar a ser ‘democrática’, por expor a todos,

a vulnerabilidade está relacionada com a capacidade de gerir o risco. E para gerir os riscos

é preciso o manejo adequado das informações sobre a paisagem de risco, tanto aquelas

informações técnicas advindas do ambiente acadêmico, quanto dos saberes locais

relacionados àquele contexto onde se reproduz as condições de existência e

sobrevivência, à cultura e gênero de vida, as suas desigualdades, vantagens e

potencialidades.

A convivência e a exposição ao risco são condições inerentes à sociedade moderna, e,

nem sempre podem ser evitadas por uma série de fatores contextuais e socioeconômicos.

Entretanto, a percepção do risco pode ser um fator determinante para a capacidade de

atuar de maneira preventiva e defensiva atenuando a vulnerabilidade aos efeitos

negativos de um eventual desastre.

A ludicidade como forma de abordagem na educação ambiental, articulada com a

informação de risco, pode gerar um aumento na sua percepção e visualização, por meio

da compreensão e entendimento dos riscos em sua complexidade, naturalizando a

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capacidade de problematização dos atores. Isto é, justamente o aspecto lúdico, divertido,

da atividade, pode potencializar a capacidade de apreensão de informações de risco, que,

eventualmente, pode gerar a combinação de esforços dos atores envolvidos no sentido

de mitigar ou atenuar seus efeitos negativos. A articulação teórica destes temas, somada

à visão empírica, permite uma discussão conceitual e prática sobre como as pessoas e

instituições veem e objetivam cada um destes temas.

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4. METODOLOGIA DA PESQUISA

4.1. Desenho do estudo

O estudo foi realizado em duas dimensões, sendo a primeira analítica e teórica sobre os

conceitos apresentados no referencial teórico, assim como a articulação entre estes

temas. Isto é, fez-se uma revisão da literatura pertinente aos temas abordados e ainda

uma análise das bases de dados virtuais disponíveis nos sites de diversas instituições

públicas e da sociedade civil de Minas Gerais num primeiro momento, e, posteriormente,

outras de fora do estado, e mesmo do país, a saber: Secretaria de Estado de Meio

Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD), Instituto Estadual de Florestas (IEF),

Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), Fundação Estadual do Meio Ambiente

(FEAM), Defesa Civil de Minas Gerais, Ambiente Brasil, Associação Mineira de Defesa do

Ambiente (AMDA), Biodiversitas, Centro Mineiro de Referência em Resíduos, Instituto

Ciência Hoje, Conservation International Brasil, Companhia de Saneamento de Minas

Gerais (COPASA-MG), Educação Ambiental em Ação, Envolverde - jornalismo &

sustentabilidade, Greenpeace Brasil, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

Recursos Renováveis (IBAMA), O Instituto Ambiental (OIA), Instituto Terra de Preservação

Ambiental (ITPA), Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ), SOS Mata Atlântica, Planeta

Sustentável, Projeto Manuelzão, Ministério do Meio Ambiente (MMA), Instituto rã-bugio

para conservação da biodiversidade, Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas

(REDE), World Wide Fund for Nature (WWF-Brasil) e Instituto Socioambiental (ISA) (Anexo

1). Esta análise foi feita no sentido de prospectar a existência de atividades de educação

ambiental, eventualmente alguma proposição que aborde a temática dos riscos, assim

como também a existência da abordagem de algum aspecto lúdico como ferramenta

destas atividades.

Na segunda dimensão, de natureza empírica, foi adotada a técnica de aplicação dos

grupos focais, cuja escolha se deu em função da sua característica básica de permitir a

livre expressão dos participantes, em caráter qualitativo e com maior aprofundamento

dos temas abordados (NETO, 2002). A articulação dessas dimensões materializou-se na

elaboração de um instrumento lúdico auxiliar na percepção de riscos por meio de um

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processo de construção social do conhecimento, através da troca de saberes e

experiências.

A opção metodológica da pesquisa qualitativa se deu em função da sua possibilidade em

adequar-se aos objetivos propostos, profundamente apoiados no referencial teórico

escolhido, mas também fortemente ligados à realidade empírica que subsidia o

atingimento do objetivo principal deste trabalho, que é a produção de um instrumento

lúdico que auxilie a percepção de riscos.

A pesquisa empírica realizada não tencionou, portanto, a quantificação de quaisquer

dados, mas, através de depoimentos que se referem à realidade que cada um dos sujeitos

participantes vivencia em seu dia a dia, explorar o conjunto de opiniões, crenças e

representações que cada um deles possui sobre o tema enfocado, assim como a outros

correlatos. Também se faz necessário ressaltar aqui que não se desejou fazer qualquer

tipo de generalização utilizando-se dos sujeitos da pesquisa como algum tipo de

amostragem significativa ou representativa de determinada população.

4.2. Sujeitos

A definição dos sujeitos da pesquisa se deu em razão da sua vivência ou experiência com

situações de risco, fator que os homogeneíza, bem como em razão de sua multiplicidade

no que diz respeito à formação e origem de cada um, o que os torna um grupo bastante

heterogêneo, aumentado o leque de possibilidades. Isto é, os perfis definidos foram de

pessoas que mobilizam conjuntos de capitais sociais, culturais e econômicos diferentes

entre si, mas todos com alguma vivência em situação de risco direta ou indireta.

Após a definição de que as pessoas a serem convidadas a participar do processo o seriam

em razão de seus perfis, como adrede mencionado, foram convidados estudantes

graduandos e pós-graduandos, profissionais inseridos no mercado, professores, agentes

de saúde, agentes de endemia, agentes penitenciários, trabalhadores autônomos,

políticos, líderes comunitários formais e informais, donas de casa, além de um funcionário

da companhia elétrica local, profissionais liberais e estrangeiros.

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Os convites formais foram feitos e naquele momento foi verificada junto a cada um, a

disponibilidade de horários e dias da semana mais convenientes para participar das

reuniões sem prejuízo de suas atividades normais. A maioria dos participantes optou por

reuniões semanais nas segundas-feiras, entre as 19 e 20h30min.

Segundo Neto (2002), o número de participantes está ligado diretamente com o objetivo

da realização do grupo focal, isto é, se o objetivo é conseguir o maior número possível de

opiniões sobre um determinado tema, deve-se optar por um número maior de

participantes; se, por outro lado, a intenção for um maior aprofundamento das questões

apresentadas, deve-se optar por um número menor, para que todos tenham a

oportunidade de expor suas ideias, refletir sobre o confronto das opiniões e que tudo isso

posso acontecer dentro do período de tempo estipulado para a reunião.

Figura 2. Participantes dos grupos focais.

O grupo que se consolidou e esteve presente em todas as reuniões se compôs de 12

pessoas, reunindo uma considerável multiplicidade de perfis (Figura 2). Entretanto, as

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reuniões foram realizadas com aproximadamente 8 pessoas de cada vez, em razão das

eventuais faltas de alguns participantes. Na maior parte dos casos, os perfis eram

compostos por pessoas com vivências de risco múltiplas, pela sua própria multiplicidade

identitária (Quadro 2).

Quadro 2. Perfil de convivência com riscos dos participantes do grupo focal

Participante Perfil

Entrevistado 1 Engenheiro florestal, atividade laboral em meio rural e florestal, estrangeiro. Residente em área de risco de violência.

Entrevistada 2 Dona de casa, 3 filhos, proprietária rural, natural da Bahia. Residente em área de risco de violência.

Entrevistado 3 Professor do ensino médio, 1 filho, músico, nativo e residente em Viçosa. Atua como professor na rede particular e como músico em shows esporádicos.

Entrevistada 4 Comerciante, administradora, 2 filhos, estudante de direito, membro do Conselho Municipal Antidrogas e do Conselho de Segurança Pública. Cuidadora de familiar portador de sofrimento mental.

Entrevistado 5 Agente do sistema prisional do estado. Ex-agente de saúde em Viçosa. Residente em área de risco de violência.

Entrevistado 6 Engenheiro agrônomo. 2 filhos. Motociclista. Natural de São Paulo. Atua como consultor em áreas rurais e florestais.

Entrevistado 7 Zelador, 1 filho. Motociclista. Portador de dislipidemia. Residente em área de risco de violência.

Entrevistado 8 Líder comunitário. Vereador. Motociclista.

Entrevistado 9 Estudante de pós-graduação na UFV. Natural do Ceará.

Entrevistado 10 Agente do sistema prisional no setor de trânsito de presos. Ex-agente de endemias em Viçosa. Líder comunitário. Trabalha como eletricista de baixa e alta tensões. Residente em área de risco de violência.

Entrevistado 11 Comerciante, músico, 3 filhos, ex-alcoólatra, voluntário numa clínica para dependentes químicos. Motociclista.

Entrevistada 12 Agente de saúde, 1 filho, líder comunitária de caráter informal. Residente em área de risco de violência.

Fonte: dados da pesquisa

4.3. Coleta e análise dos dados

Não existem fórmulas para a definição do número de reuniões a serem realizadas nem

tampouco nenhuma relação de amostragem. Este número surgiu em função da dinâmica

de evolução das reuniões em relação aos objetivos propostos, isto é, foram realizadas

tantas reuniões quantas foram necessárias para que se esgotassem satisfatoriamente

todos os temas que deveriam ser abordados. Assim, foram realizadas 5 entrevistas, nos

meses de janeiro e fevereiro de 2013, todas elas realizadas nas dependências do

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Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa, em Viçosa, Minas

Gerais. A escolha desse local se deu em razão do conforto possibilitado pela sua estrutura

física e da comodidade para todos os participantes, assim como para garantir a qualidade

das gravações. O local é amplo, limpo, arejado, claro, com baixo nível de ruídos, de fácil

localização e acesso por parte de todos. Em função de as reuniões serem realizadas

sempre no começo da noite, foi disponibilizado lanche, acessível a todos ao longo das

reuniões, para aqueles que eventualmente estariam ali vindos diretamente de seu

trabalho.

Visando sempre a construção de um clima de confiança, foram explicitados logo de início,

ainda na primeira reunião, os objetivos da pesquisa, garantido a todos a

confidencialidade a respeito de sua participação, o que seriam feitos com os dados

resultantes, além de uma rápida apresentação de cada um. Em todas as reuniões, visando

melhorar a comunicação e a confiança, todos utilizaram crachás com os seus nomes. A

entrevista foi conduzida por um mediador, responsável por introduzir os temas e

subtemas a serem debatidos, motivar o debate, controlar o tempo de cada questão e

interagir com os participantes. As reuniões contaram também com a presença de um

relator, responsável por registrar alguns elementos das reuniões, como as ideias gerais, as

expressões faciais e corporais ligadas a algumas falas, e outros elementos que possam

contribuir quando da análise posterior.

Para otimizar a qualidade do material a ser gravado, e, posteriormente, facilitar o

processo de transcrição fidedigna das entrevistas, foram utilizados equipamentos de

gravação digital de áudio e vídeo, a saber: uma filmadora com tripé posicionada

estrategicamente de modo a captar os rostos de todos os participantes, um gravador de

áudio em posição central em relação aos participantes, e uma câmera fotográfica para o

registro de alguns momentos em foto. Desta forma, foram captados integralmente e com

qualidade todos os depoimentos, bem como as expressões faciais, a linguagem corporal,

os silêncios eloquentes, dentre outras expressões, que garantiram a fidedignidade da

transcrição.

O roteiro do debate foi construído em função dos objetivos da pesquisa, através da

pontuação dos temas a serem discutidos, utilizando-se algumas questões chaves assim

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como alguns desdobramentos para o seu aprofundamento (Anexo 2). Nas primeiras 4

entrevistas foram abordadas diretamente as questões relacionadas ao risco, como por

exemplo: o que é, sua relação causal com múltiplos fatores, como a situação financeira,

saúde, segurança pública, condições de trabalho; os porquês de as pessoas viverem em

áreas de risco; como as pessoas e os grupos percebem os riscos; fatores que podem

evidenciar ou mascarar a presença de um risco; comportamentos individuais e coletivos

frente aos riscos; estratégias de convivência com os riscos; porque alguns riscos são

aceitos e outros rejeitados, dentre outras. Na última reunião foi feita uma breve

exposição sobre a educação ambiental no sentido de relacionar os riscos sobre esta

perspectiva, e em seguida foram abordadas questões diretamente relacionadas à

informação e ao compartilhamento de saberes sobre os temas; como deveriam ser

organizadas, e quais os tipos de informações que deveriam constar no jogo; a dinâmica

do jogo, dentre outros.

Desta forma, foi possível a prospecção, a partir do diálogo e do debate mediado entre os

participantes, das informações relacionadas aos temas elencados. Os temas propostos

pelo mediador foram expostos à apreciação do grupo, sem buscar a convergência das

opiniões, sendo permitido, e até estimulado, o conflito de ideias, no sentido de buscar a

multiplicidade de opiniões, para uma eventual reflexão mais rica sobre cada temática

abordada. Ou ainda, no dizer de Minayo (2010),

O que se procura é exatamente a cartografia das opiniões, argumentos e pontos de vistas, concordantes ou conflituosos, críticos ou resignados. O grupo permite, ainda, o aprofundamento das influências recíprocas entre os falantes, ou seja, a reflexividade das opiniões (MINAYO, 2010: 173-174).

De posse das informações obtidas na pesquisa do referencial teórico conjugadas àquelas

prospectadas nos grupos focais, foi definido o tipo de dinâmica a ser desenvolvida para a

exploração da temática da percepção do risco, de modo a que se selecionasse aquela que

melhor se adequasse à necessidade do jogo de se configurar em um instrumento lúdico-

informativo. Isto é, a escolha da dinâmica do jogo considerou a necessidade em aliar-se a

diversão à capacidade de transmitir informações e mesmo de estimular a sua reflexão.

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4.3.1. Análise de conteúdo temática

Nas reuniões foram realizados debates dos quais emergiram dados subjetivos acerca das

realidades vivenciadas pelos sujeitos da pesquisa, que constituem representações dessas

mesmas realidades, formadas por “ideias, crenças, maneiras de pensar, opiniões,

pensamentos, maneiras de sentir, maneiras de atuar, condutas, projeções para o futuro,

razões conscientes ou inconscientes de determinadas atitudes e comportamentos”

(MINAYO, 2012:65). Dessa forma, e uma vez mais, ressalta-se que não se pretende contar

opiniões, palavras ou expressões utilizadas, mas sim a exploração do sentido do conteúdo

expresso em palavras pelos sujeitos participantes. Daí a opção da análise de conteúdo,

definida por Bardin (2011) como

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) dessas mensagens (BARDIN, 2011:48).

Isto é, a análise de conteúdo vai se constituir em uma espécie de decodificação para além

dos conteúdos manifestos em palavras, a busca da compreensão dos significados das

falas, que está muito além do mero alcance descritivo da mensagem, para atingir,

mediante inferência, uma interpretação mais profunda (GOMES, 2011).

No processo de análise de conteúdo é necessária a eleição de unidades de recorte do

material disponível, que são, em nosso caso, as falas dos participantes dos grupos focais.

Um segmento de conteúdo considerado como base para a categorização e posterior

análise é definido por Bardin (2011) como ‘unidade de registro’. Esta autora afirma que a

unidade de registro pode variar muito em seus critérios de distinção e que, no mais das

vezes, estes recortes são feitos em nível linguístico através da ‘palavra’, o que permite a

sua contagem para efeitos quantitativos e outras análises e o ‘tema’, que permite

interpretações no nível semântico, isto é, dos significados das expressões. Este segundo

recorte é o que adotaremos, o que categoriza o trabalho como análise de conteúdo

temática.

A autora define o tema como “a unidade de significação que se liberta naturalmente de

um texto analisado segundo critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura”

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(BARDIN, 2011:135). Esta definição é o núcleo abalizador das análises feitas neste estudo,

propondo o referencial teórico adotado como os pilotis de sustentação das

interpretações dos significados dos conteúdos manifestos nas entrevistas em grupo

focalizadas.

Dessa forma, os procedimentos metodológicos adotados para a análise do conteúdo

foram a pré-análise e categorização, na qual se buscou ‘impregnar-se’ pelo conteúdo

selecionado, isto é, as falas das entrevistas, através das gravações de áudio e vídeo e da

leitura exaustiva e compreensiva do material, buscando o entendimento do conjunto do

corpo de texto como um todo, para em seguida proceder-se ao processo de

categorização por unidades de significação para posterior interpretação, em nosso caso

por afinidade temática; após a fase de pré-análise e categorização foi realizada a

inferência, que é um momento de dedução lógica do conteúdo em análise,

decodificando-se textualmente as diversas expressões contidas nas falas, no sentido de

explicitar-se o significado do seu conteúdo; e, finalmente, foi realizada a interpretação,

que é um procedimento que busca ir além do material por apoiar-se nos referenciais

teóricos. No dizer de Gomes (2011) “chegamos a uma interpretação quando conseguimos

realizar uma síntese entre: as questões de pesquisa; os resultados obtidos a partir da

análise do material coletado, as inferências realizadas e a perspectiva teórica adotada”

(GOMES, 2011:91).

4.4. Aspectos éticos

Foram observados todos os itens do Protocolo de Pesquisa exigidos pelo Comitê de Ética

em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Viçosa (CEP) e este órgão

aprovou o projeto de pesquisa através do ofício nº 175/2012/CEP/07-12P1, em

consonância com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (Anexo 3).

Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo

4) depois de o ler e, ou, escutar a sua leitura, no qual foram informados dos riscos e

benefícios da participação na pesquisa, assim como de todas as demais informações

relevantes a ela relacionadas por exigência do referido protocolo de pesquisa. No

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entanto, todos os participantes autorizaram o uso de suas imagens nos trabalhos

resultantes dessa pesquisa, desde que acadêmicos. Foi-lhes garantido, por outro lado,

que as informações prestadas não poderão ser diretamente associadas ao nome ou à

pessoa de cada um dos participantes.

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5. RESULTADOS

5.1. Iniciativas de educação ambiental e risco

A despeito das diretrizes7 do Programa Nacional de Educação Ambiental – ProNEA

(PRONEA, 2005) que preconizam o envolvimento e a participação social considerando as

múltiplas dimensões da sustentabilidade ambiental (ecológica, social, ética, cultural,

econômica, espacial e política), a maior parte do que se encontra nas bases de dados

virtuais disponíveis nos sites das diversas instituições públicas e da sociedade civil (item

4.1) são projetos que não envolvem diretamente a participação das pessoas nos

processos de construção social do conhecimento.

Assim, não obstante a existência de muitas iniciativas de se trabalhar a educação ambiental

em diversas instituições nacionais ligadas ao poder público ou à sociedade civil, o que se vê

são os tradicionais mecanismos de reprodução de informações ambientais, em muitos

casos de viés apenas ecológico e conservacionista, não considerando o ambiente em suas

complexas relações entre natureza e sociedade, e tampouco a participação das pessoas no

processo.

No que diz respeito à percepção de riscos, sejam eles ambientais, tecnológicos ou sociais,

ocorre o mesmo. São criados panfletos, cartilhas, roteiros de atividades e campanhas,

capacitações, oficinas de criatividade, mas sem a necessária e preconizada participação

dos sujeitos na elaboração e desenvolvimento de quaisquer iniciativas.

5.2. A educação ambiental como possibilidade de ressignificação crítica

Há uma grande incoerência em algumas ações educativas que pretendem auxiliar em

processos de ressignificação da relação do sujeito com o ambiente quando, na prática, as

ações instrumentais se traduzem em mero atendimento de demandas realizadas somente

por sujeitos especialistas que estão de fora da realidade objetiva onde pretendem atuar,

7 Transversalidade e interdisciplinaridade; descentralização espacial e institucional; sustentabilidade socioambiental; democracia e participação social; aperfeiçoamento e fortalecimento dos sistemas de ensino, meio ambiente; e outros que tenham interface com a educação ambiental (PRONEA, 2005).

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que no mais das vezes agem de forma etnocêntrica, invasiva, até mesmo violentando

aspectos relacionados aos modos de vida locais.

Max Weber cunhou a expressão “gaiola de ferro” para referir-se à crescente busca da

racionalidade instrumental a qualquer preço, por parte da sociedade moderna, como

meios para se chegar a fins independentemente de valores, de moral ou ética, no

contexto das relações sociais (WEBER, 1983), e o quanto essa busca pode gerar em

transtornos sociais. Ora, o homem, como diria Paulo Freire (2007), só se educa no contato

com o outro. Adquirimos nosso caráter humano a partir do momento em que

conseguimos reconhecer e significar aquilo que nos cerca. Esses significados são

construções sociais oriundas das relações de troca e dos vínculos que estabelecemos

durante a vida, e é nessa esfera que nos instrumentalizamos para transformarmos a

nossa realidade.

Para a superação do tradicional e heteronômico modelo de construção de práticas de

educação ambiental, é preciso que se considere uma concepção educativa abrangente,

como a educação defendida por Paulo Freire, da construção do conhecimento “com o

sujeito” e não “para o sujeito”. Um dos caminhos para superação desse modelo está,

portanto, atrelado a processos participativos que tragam o usuário final do instrumental

para a sua dinâmica de construção e isto é, dentre outros aspectos, característica da

educação ambiental crítica.

Para Brasil (2005) a educação ambiental crítica é uma abordagem não hegemônica, que

permite a autonomia reflexiva do educando, que busca e recebe informações que lhe instiguem a ponderar, avaliar, ressignificar as opções que tem pela frente, para assumir novas atitudes perante o mundo, perante a vida. Abandona a postura tradicional dominante na educação ambiental, que reforça as características hierárquicas e autoritárias, que opera com perspectivas prescritivas e normativas, deixando pouca margem de manobra para a reflexão do educando decidir suas escolhas perante o vasto leque de opções e caminhos para a sustentabilidade (BRASIL, 2005:9-10).

Dessa forma, a educação ambiental coloca-se como uma força transformadora e libertária

ao trazer o sujeito para a dimensão central, permitindo-lhe a livre expressão de suas

ideias, valores, crenças, no encontro com as subjetividades de outros sujeitos, o que

permite o amadurecimento de uma opinião, mudanças de ideias, de posicionamento, o

exame de cada questão por diversos ângulos, considerando mesmo a multiplicidade de

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posicionamentos de que cada pessoa pode ser capaz de produzir em função de seus

valores, crenças e opiniões socialmente construídos. A educação ambiental deverá sim

propor temáticas para estudo e consideração, mas sem, entretanto, limitar-se às

questões técnicas e objetivas relacionadas a este ou aquele problema específico, mas

priorizar a capacidade crítica dos sujeitos envolvidos em suas atividades.

5.3. A visão de risco dos participantes

5.3.1. A pré-análise

Nesta fase se deu a organização do material objeto da análise e, assim, iniciou-se a leitura

exaustiva e a transcrição fidedigna das falas dos entrevistados prospectadas em cada um

dos grupos focais realizados. Neste momento busca-se uma visão do todo, ao mesmo

tempo em que surgem indicadores para a formação de direcionamentos para análise

posterior. É o momento de “ordenar e organizar o material secundário e o material

empírico e impregnar-se das informações e observações de campo. É preciso investir na

compreensão do material trazido do campo, dando-lhe valor, ênfase, espaço e tempo”

(MINAYO, 2012b). Neste momento foi definido o quadro de análise com o critério de

classificação dos elementos aberto8, isto é, as falas foram agrupadas por temática

seguindo o roteiro do grupo focal, mas sem, necessariamente, ficarem exclusivamente

presas a ele. Por sua dinamicidade, o grupo focal permite adaptações ou pequenas

mudanças de curso dentro do próprio roteiro no momento mesmo em que acontece a

entrevista e isso deve ser considerado para a categorização das respostas.

A criação das categorias de agrupamento se deu em função do próprio roteiro para a

realização dos grupos focais resultando, dessa forma, nas seguintes categorias: (a)

percepção inicial de risco; (b) risco e condição financeira; (c) risco e segurança pública /

drogas; (d) risco e trabalho; (e) como as pessoas e grupos vêm os riscos; (f) porque as

pessoas se colocam em situação de risco; (g) escolha entre riscos; (h) o que pode

evidenciar ou mascarar a presença de um risco; (i) naturalização da convivência com o

risco / sensação de imunidade; (j) áreas de risco; (k) por que alguns riscos são aceitos e 8 No quadro fechado as categorias seriam criadas previamente, não sendo passiveis de serem criadas ao longo da análise.

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outros são rejeitados; (l) problemas e transferência de responsabilidades; (m) educação e

informação / mudança de mentalidade; (n) riscos que mais afligem os entrevistados; (o)

medidas pessoais necessárias para facilitar a convivência com esses riscos; (p) sobre a

atribuição de qualidades de especialista ao cidadão comum.

O estudo não abrange a totalidade das falas, uma vez que para sua análise foram

agrupados pelos núcleos de sentido que se referem às temáticas abordadas, sendo

deixados de lado aqueles fragmentos a elas não diretamente relacionados ou que não

contribuíssem diretamente para o estudo. Para a análise temática (item 5.3.4) as

categorias foram reagrupadas em função da interpretação baseada no corpo teórico do

estudo, evitando assim, a repetição exaustiva de conceitos e argumentos.

5.3.2. A exploração do material

Bardin (2011) preconiza que a fase de exploração é a aplicação sistemática dos

direcionamentos tomados na pré-análise. Isto é, os procedimentos de análise e

categorização são sistematicamente colocados em prática. Os depoimentos e falas são

agrupados pelos seus núcleos de sentido, conforme adrede elencado, na preparação para

a fase seguinte, de inferências e interpretação.

5.3.3. Tratamento dos resultados, inferências e interpretação

As inferências são considerações objetivas levando-se em conta a perspectiva simbólica

dos conteúdos manifestos. Gomes (2012) assevera que a inferência é o processo de

decodificação da dimensão sintática do ‘como é dito’ para a dimensão semântica do ‘o

que é dito’, isto é, o conteúdo subjacente ao que se estava sendo dito pelos sujeitos da

pesquisa.

A interpretação, por sua vez, consiste no confronto das inferências, dos objetivos da

pesquisa e do arcabouço teórico no qual se apoia. Nas análises seguiremos sempre o

mesmo padrão, com a inferência precedendo a descrição (a fala do entrevistado ou

trecho da entrevista) para em seguida vir a interpretação apoiada no referencial teórico.

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5.3.4. Análise temática

5.3.4.1. A percepção de risco dos entrevistados

A primeira manifestação a respeito da percepção pessoal do significado do termo risco

feita por um dos entrevistados já mostra a percepção do risco como um acontecimento

futuro, algo que pode vir a acontecer, que não se trata do evento em si. Ele completa

dizendo que normalmente o risco é um evento de consequências negativas. E ainda, ele

tenta fazer uma diferenciação entre risco e perigo bastante interessante, atrelando a esse

segundo conceito o componente decisório.

Eu acho que risco é uma coisa que quando você tem uma probabilidade de alguma coisa... ah... como se diz... negativa... normalmente é negativo, aconteceria, por exemplo, andar no trânsito é um risco, porque você poderia bater, ter acidente, poderia acontecer, existe a probabilidade de acontecer, não quer dizer que vá acontecer... que é diferente de... se você anda sem capacete no trânsito, de moto, é um perigo, porque se você vai com certeza vai acontecer alguma coisa (Entrevistado 1).

Ora, essas definições são exatas segundo Ulrich Beck (2008a; 2008b), o que nos leva a

crer que o entrevistado possuía conhecimento prévio da matéria em questão ou que sua

impressão pessoal sobre o tema é, coincidentemente, a mesma do autor alemão. E mais

ainda, para este autor, os riscos “resultam da transformação de inseguranças e perigos

em decisões” (BECK, 2008b:157), exatamente a mesma definição do entrevistado. Este

componente decisório, além de ser tratado por Beck, como acima exposto, é também

abordado com perspectivas similares por outros autores, como Luhmann (1990) citado

por Brüseke (2007) e Giddens (1991).

Os entrevistados reforçam ainda a questão do componente decisório da ação humana em

sua potencialidade para aumentar ou diminuir os níveis de determinados riscos e o fato

de alguns deles independerem da vontade ou mesmo da decisão e que são, em verdade,

inerentes à própria vida humana. Douglas e Wildavsky (2012) já afirmaram em sua obra

‘Risco e Cultura’ que os riscos são mesmo inerentes não apenas à vida humana, mas a

cada estilo de vida de acordo com as construções sociais inerentes a cada sociedade. Isto

é, diferentes sociedades constroem o risco e o percebem de diferentes maneiras.

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5.3.4.2. Risco x condição financeira

A melhora das condições econômicas do país e o consequente aumento de renda foram

considerados por um entrevistado como um fator que aumenta a exposição de risco. Esta

questão da condição financeira como determinante do risco causou alguma controvérsia

entre os entrevistados, alguns concordando e outros não. Os demais entrevistados

convergiram em suas manifestações mais ou menos da mesma maneira, envolvendo

ainda valores familiares, educação formal e algumas ressalvas contextuais. A tônica da

discussão está bem representada pelo depoimento a seguir:

Em algumas situações eu creio que sim. Por exemplo, pessoas com condições financeiras melhores, ela vai... morar num lugar mais seguro... é um exemplo! Em outros casos não. Em outros casos o conhecimento ajuda a pessoa a não estar suscetível a um tipo de risco. Por ser muito abrangente o tema né... em umas situações sim, em outras eu creio que não (Entrevistado 3).

A ideia hegemônica surgida aqui é a de que, pobres ou ricos, todos estão expostos a

riscos. Estes, no entanto, se diferem em alguns aspectos, isto é, existem aqueles

chamados ‘riscos democráticos’ (GUIVANT, 2001; BECK, 2008b), que ameaçam a todos,

indistintamente, assim como outros riscos que não se enquadram nessa categoria

democrática, uma vez que, como afirmou o mesmo Beck, a exposição ao risco está

substituindo a classe como a principal desigualdade da sociedade moderna (BECK, 2008a).

5.3.4.3. Risco x segurança pública

Para o Entrevistado 7, morador de um bairro que, segundo ele mesmo, é considerado por

muitos de seus moradores como território de traficantes, o sistema de segurança público

é falho e não assegura à população o resguardo a determinadas ameaças. Para ele, se o

cidadão cumpre com seu dever ao denunciar crimes à polícia ou ao Ministério Público,

coloca-se, voluntariamente, à mercê da vingança do denunciado, uma vez que o poder

público é incapaz de prover segurança ao denunciante. A entrevistada 12 revela já ter

sido ameaçada no cumprimento de suas obrigações como agente de saúde. O fragmento

a seguir mostra o dilema do Entrevistado 7 diante de uma situação em que se sente na

obrigação de denunciar ao mesmo tempo em que sabe que pode ser alvo de alguma

represália posterior:

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Acreditar também, que os traficantes, os usuários, eles é um risco pra gente... é! Mas não pode esquecer também que a gente acreditar na segurança pública cegamente é um risco pra gente, entendeu, porque às vezes “ó, o rapaz tá roubando”... você tá vendo, você chama a policia, a polícia primeiramente chega no local, você tem que dar as caras, “olha, roubou aqui na minha casa”, te leva em frente [ao ladrão], põe num júri, na frente ali de um assaltante, um traficante, um usuário, o que que acontece? Você tá se expondo! Amanhã ou depois ele cumpre a pena e sai, é um risco que você correu, tá correndo, ele vai querer ir atrás... (Entrevistado 7).

Para Douglas e Wildavsky (2012) a estrutura social funcionante depende de uma

combinação de confiança e medo. Há aqui um claro exemplo do que preconizam os

autores na medida em que é demonstrada desconfiança nas chamadas estruturas de

apoio social, como a justiça, a polícia e outras esferas do poder público constituído. O

medo das consequências incertas de determinadas situações colocam o individuo frente a

uma escolha, a um julgamento sobre se aquele risco deve ser enfrentado ou não. Ora, um

julgamento simplista poderia afirmar com facilidade que a ‘obrigação moral’ do individuo

é fazer a denúncia, mas a teoria cultural vem mostrar que “diferentes características da

vida social provocam diferentes respostas ao perigo” (DOUGLAS e WILDAVSKY, 2012:8). O

medo e a desconfiança, portanto, dada a realidade contextual, podem ser fatores mais

determinantes do que a consciência do chamado ‘dever cidadão’ em fazer a denúncia e

colocar-se, daí em diante, em uma situação de risco permanente.

5.3.4.3.1. A questão das drogas

O problema das drogas está permanentemente na pauta de discussão sobre segurança

pública. Sua logística de produção e comercialização, envolvendo cartéis internacionais de

tráfico de drogas, torna-se, talvez, um dos maiores flagelos das sociedades modernas pela

extrema violência com a qual os empresários do crime gerenciam seu negócio.

Entretanto, as drogas em si mesmo e seus usuários são mais considerados como um

problema de saúde pública em decorrência das vidas interrompidas e do prejuízo à

sociedade daí advindo do que uma questão de segurança. Dessa forma, a abordagem

feita pelos entrevistados se deu no sentido da convivência das pessoas, dos familiares

com esse problema tão incrustado no meio social.

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Um entrevistado considera o álcool a pior de todas as drogas, a ‘porta de entrada’ para o

uso de outras substâncias e considera a educação familiar e formal como determinante

na criação de um senso norteador capaz de colocar o indivíduo a salvo desta ameaça. Ele

baseia sua fala na sua experiência pessoal como alcoólatra e voluntário numa clínica de

recuperação de dependentes químicos.

Eu trabalho também como voluntário na [Clínica de Recuperação] (clínica de recuperação de dependentes químicos da cidade de Viçosa). Sou dependente químico, e trabalho com dependentes químicos. Há 8 anos que eu já lido muito nessa área [voluntário na clínica], e quando falou em droga aqui eu acho que todo mundo já pensou nisso né, em maconha, cocaína, no crack, e na verdade a gente tem que pensar no caso do álcool, que é a porta de entrada de todas as drogas e que qualquer rapazinho de 14 anos [hoje em dia] tá tomando cerveja... aí eu volto no assunto que a Entrevistada 2 falou de educação, o que o Entrevistado 7 falou de liberdade... aí já dá uma outra [dimensão]... porque, pra você não deixar seu filho chegar no crack, é mais do que obrigação nossa [pais] tentar educar pra afasta-lo disso. Mas não deixar o meu filho, ainda mais que ele tá estudando lá em [cidade universitária] hoje, tomar um copo de cerveja, aí você... eu trabalhando com dependente químico aqui e meu filho vai pra [cidade universitária] e passa [no vestibular], ele passou lá, e o nome da república é “Rei de Copos”... quer dizer... é um jovem de 20 anos... então é muito difícil (Entrevistado 11).

Outros entrevistados, uma na ativa, e outros dois que já atuaram como agentes de saúde

antes de seus empregos atuais, destacam a falta de apoio da coordenação do serviço de

saúde municipal no enfrentamento da problemática das drogas, citando exemplos de

serem procurados por alguns indivíduos da população a que assistem em programas

como o combate ao tabagismo, que manifestam o desejo de tratar dependências por

outras substâncias. Isto é, procuram o PSF para pedir apoio sobre seu problema de

dependência química e a estrutura não está preparada para recebê-los. Destacam ainda o

problema das internações judiciais como uma solução viável para auxiliar os dependentes

químicos, mas que não se traduz em um serviço universalizado e disponível a todos em

tempo hábil. Por fim, falam da própria frustração e sensação de impotência diante das

desgraças pessoais de algumas pessoas de suas comunidades que têm a oportunidade de

assistir de perto.

[A gente] Convive com o álcool, quando nós fizemos um PS (Programa de Saúde) e no trabalho de tabagismo né, aí um pessoal que já teve problema, outros recuperados, oncologistas, pra dar um [apoio]... e tal, aí quando a gente passava as pessoas falavam assim “mas ô [nome da agente], meu problema não é só com cigarro, ah, eu tenho um problema com isso, eu tenho problema com bebida, mas a gente não tem um apoio”, então lá a gente trabalha com muitos etílicos né, que é a [o vício da] bebida, do álcool. E não tem suporte, entendeu,

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é difícil demais. A pessoa te pede uma ajuda, e é cada vez mais, tem mais... jovens então, assim... num tá tendo jeito... (Entrevistada 12).

Zanirato et al. (2008) definem os riscos sociais como aqueles resultantes “da segregação

da sociedade e da fragmentação urbana, que acarretam cada vez mais insegurança”

(ZANIRATO et al., 2008) e estão relacionados com a saúde, a segurança alimentar, a

violência, a educação, a liberdade, dentre outros. Isto é, esta modalidade de riscos está

relacionada mesmo com a posição que os indivíduos ocupam na estrutura social, pelas

suas maiores exposição e vulnerabilidades a diferentes tipos de risco (BECK, 2008a). O

que resta para os menos economicamente afortunados num contexto de modernidade

criadora de oportunidades e avanços, é o que Giddens (1991) chamou de ‘lado sombrio’

da modernidade, que são os chamados efeitos perversos da estrutura social no sistema

econômico capitalista.

5.3.4.3.2. Outras questões acerca da segurança publica

Além desses depoimentos, outros relacionados às diversas atividades laborais e

cotidianas dos entrevistados se avolumam. Destacamos a seguir algumas inferências

feitas a partir de suas falas sem, no entanto, transcrevê-las em sua literalidade.

A Entrevistada 12 relata casos de precisar ajudar a conter incêndios em residências, ser

chamada por causa de falta d’água, dentre outras situações, e, finalmente, diz que a

estratégia do governo em contratar agentes de saúde moradores da comunidade onde

atuarão se dá em função do seu conhecimento da área, que os faz importantes

informantes para as esferas superiores, mas, por outro lado, os coloca na incômoda

situação de serem acionados mesmo por questões que estão fora do seu foco de ação, na

maioria das vezes incorrendo em situações de risco à sua segurança pessoal e integridade

física. Ela afirma viver num estado de tensão permanente.

O Entrevistado 1 faz uma importante consideração a respeito das atividades laborais dos

agentes prisionais e de saúde. Os primeiros trabalham sob grande proteção, alerta

máximo, inclusive portando armamento. Os segundos trabalham a descoberto de

proteção à sua integridade física. Dessa forma, para ele, eventualmente, poderiam

ocorrer problemas até mais sérios com os agentes de saúde do que com os prisionais. E

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ainda, o Entrevistado 1 vê os riscos como normais, dada a natureza de seu trabalho, e diz

procurar agir de forma a eliminá-los, adotando procedimentos e equipamentos de

segurança e faz críticas a quem deixa de fazer o mesmo.

O Entrevistado 7 relata estar exposto a dois tipos de riscos distintos em seu trabalho: o

primeiro é relacionado à sua segurança pessoal e integridade física, uma vez que é

zelador de um condomínio de classe média e, muitas vezes precisa fazer frente a

situações com indivíduos nem sempre bem intencionados. O segundo é a sua estabilidade

no emprego, uma vez que é cobrado além das suas funções, mesmo fora do horário de

trabalho, muitas vezes para socorrer questões particulares das unidades autônomas, isto

é, dos apartamentos do condomínio.

O Entrevistado 3 diz que as escolas, tidas como local seguro e, por isso mesmo, em sua

maioria, destituídas de aparatos ou estratégias de segurança, estão vulneráveis a atos

extremos, como o ataque de atiradores, fato muitas vezes observados nos EUA e,

recentemente, em Realengo, no RJ. Além disso, relata o suicídio de um jovem aluno seu,

como uma tragédia que não pôde ser identificada a tempo surpreendendo a todos.

Raciocina que todas as profissões têm seus próprios riscos e relata também ameaças e

intimidações que seu pai, médico plantonista sofre no hospital onde trabalha.

O Entrevistado 11 fala dos riscos econômico-financeiros de se manter uma atividade

comercial. Ele pondera que o negócio pode, hipoteticamente, encerrar-se a qualquer

momento e que os funcionários seriam dispensados, implicando em risco direto para ele

próprio e para seus funcionários. Além desses riscos, ele narra episódios de contratação

de pessoas com antecedentes criminais que colocaram, literalmente, a sua integridade

física em risco. E ainda, sobre determinados negócios de compra e venda de

equipamentos pesados que envolvem uma logística interestadual, grandes somas

financeiras e, portanto, muito risco.

Para Beck (2008b), a sociedade do risco é aquela que se ocupa de gerir e manejar os

riscos por ela própria criados. Vemos aqui claramente declarações que explicitam uma

série de riscos laborais diretos ou indiretos, de cuja consciência todos os entrevistados se

mostram senhores. Falam do risco, da sua inevitável convivência, e mesmo de sua

impotência diante de determinadas eventualidades. Entretanto, fazem também

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referência ao conhecimento, a técnicas, à expertise para o desempenho dessas tarefas no

sentido de prevenir a objetivação de riscos potenciais em desastres. Nesse sentido,

podemos nos reportar á ideia de “sistemas peritos” de Giddens (1991) como sistemas de

excelência técnica ou competência profissional que são os dinamizadores de sentidos de

confiança social. O autor se refere àquele sentimento de fé que se tem no conjunto dos

ambientes material e social em que vivemos (GIDDENS, 1991), mas, nesse caso específico,

vemos aqui alguns relatos dos entrevistados que destacam a confiança em si próprios no

desempenho de suas tarefas, aliados à desconfiança que têm pelos empregadores, por

outros profissionais, pelas instituições e poderes públicos constituídos, e demais fatores

externos, principalmente quanto a eventos ou circunstâncias inesperadas.

5.3.4.4. Como as pessoas e grupos vêm os riscos

A ideia hegemônica que surge neste tema pode ser resumida pelo depoimento do

Entrevistado 3, que fez duras críticas às políticas públicas e poderes constituídos,

negligentes e inoperantes, que não abarcam a complexidade dos problemas sociais e seus

riscos relacionados. E indo além, critica também a postura da própria população

desmobilizada e desinteressada em pressionar o poder público para as providências

necessárias.

Agora o que eu penso é o seguinte, olha, tem uma série de fatores, né, primeiro que nós temos políticas públicas equivocadas, e isso aí todo mundo já tá cansado de saber! Outra situação que a gente pode observar é o seguinte: não há mobilização social, nós não temos no Brasil esse costume. [...] Então, por exemplo, nós que estamos sentindo isso na pele em Viçosa, a gente não está... estamos vulneráveis à violência, qualquer pessoa aqui pode, a qualquer momento, ser assaltada, a polícia é deficiente... há algum tipo de pressão em relação a isso? População mobilizada pra isso? (Entrevistado 3).

Existe também um tom de perplexidade e revolta com algumas posturas que são

assumidas por algumas pessoas na medida em que ignoram os problemas e os riscos

sociais do entorno que não estão a elas diretamente relacionados, como algo que não

lhes interessa. Os entrevistados defendem a ideia de que as pessoas tendem a não se

importar com aqueles riscos que não as afetam diretamente, apoiando-se na ideia de que

“alguém irá resolver esse problema em algum momento oportuno”. Os entrevistados

apontam uma falta de comprometimento das pessoas como a origem do problema e que

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sua solução estaria na mobilização e participação popular na discussão e resolução dos

problemas. Por fim, um dos entrevistados diz que é preciso que desenvolva estratégias

diferenciadas para se lidar com diferentes tipos de riscos a que se expõe em seu dia a dia.

Isto é, as pessoas vão responder às ameaças adaptando-se a cada situação, sem,

necessariamente, responderem com um comportamento padrão.

Como adrede mencionado, a ideia de confiança, segundo Giddens (1991), é a fé que se

tem no conjunto dos ambientes material e social em que vivemos. Especificamente para

esta interpretação, podemos afirmar que a ideia consensual dentre os entrevistados é,

justamente, a falta de fé nas estruturas sociais funcionantes enquanto esferas

competentes capazes de lidar com a complexidade dos problemas. Isto é, todas as

instituições formais e informais, nas esferas particular e pública, de maior ou menor

porte, tenderiam a deixar o problema de lado, como se ele pudesse ser resolvido por si

só. Soma-se a isto, também, a crença numa representação mítica da ciência como capaz

de resolver todos os problemas gerados pela sociedade moderna, isto é, em algum

momento, surgirá algo ou alguém capaz de resolver todas as questões. E ainda, a ideia

consensual entre os entrevistados parece convergir para o chamado “retorno da

incerteza” (GIDDENS et al., 1997), isto é, um sentimento de desconfiança oriundo de uma

crise institucional profunda da sociedade industrial moderna, cujos efeitos negativos

parecem sair do controle ou de níveis ‘aceitáveis’, causando um sentimento de

desconfiança geral.

5.3.4.5. Porque as pessoas se colocam em situação de risco?

O Entrevistado 3 se questiona sobre o porquê de um jovem, de origem socioeconômica

estável, educado e instruído, opta por se colocar em situações de risco por meio do uso

de álcool e drogas. Para ele o conhecimento é determinante da escolha, mas, mesmo

assim, alguns jovens fazem escolhas equivocadas.

Para o Entrevistado 11 as pessoas escolhem o risco usando álcool e drogas, ou mesmo

comida em excesso pela busca do prazer da saciedade. Para o Entrevistado 8, a cultura

local é determinante para colocar-se, voluntariamente, numa situação de risco, citando

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como o exemplo o tabagismo e o etilismo. Para ele, não obstante as inúmeras

informações que se têm disponíveis, as pessoas escolhem fumar ou beber pela força da

representação social envolvida nessas atividades. Dessa forma, ele acredita que os riscos

são contextuais, podendo ser criados voluntariamente em cada grupo social.

O Entrevistado 7 sofre de dislipidemia (colesterol alto) e mesmo assim tem hábitos

alimentares que não são condizentes com essa moléstia. Procura compensar com

atividades físicas regulares, mas admite conhecer claramente o problema e persistir no

comportamento de risco.

O histórico da minha família é um histórico de colesterol altíssimo! O meu chegou a 313. [...]. Todo mundo com problema de colesterol! Agora, eu sou apaixonado por coxinha, empadinha, quibe, churrasco, na minha família todo final de semana, praticamente... num mês tem 4 semanas, 2 vezes por mês, churrasco! Churrasco com uma gordurinha... É um risco? Aí eu combato, tomo remédio, eu faço academia, eu corro, jogo bola... [...]. Não é falta de informação! (Entrevistado 7).

Alguns entrevistados exemplificam casos de falta de escolha, como vítimas de violência

familiar que não tem alternativa senão continuar vivendo junto ao agressor, ou algumas

ocupações laborais que são desempenhadas de forma precária e insalubre por

necessidade extrema para se garantir a subsistência. Um dos entrevistados, inclusive,

narra parte de sua rotina de trabalho assumindo riscos econômicos no presente para

tentar garantir um futuro para si e para sua família mais confortável sob o ponto de vista

material. Para ele, é simplesmente uma questão de necessidade, mas que preferiria ter

uma vida mais tranquila. O Entrevistado 5 considera o fator financeiro como um

determinante para justificar a convivência com o risco, citando o adicional noturno ou de

insalubridade como um valor pecuniário agregado ao salário para justificar os riscos ou o

horário. Para ele, o pagamento legitima o risco que se corre.

Para Douglas e Wildavsky (2012) a preocupação exclusiva das pessoas na época moderna

é a escolha e a priorização de riscos reais, baseando-se em julgamentos morais e outros

critérios objetivos e subjetivos. Os autores destacam métodos como o da preferência

revelada, baseando-se na aceitação de determinados riscos que as pessoas aceitam

correr em função de um alto número de casos já ocorridos ou mesmo numa função direta

de custo benefício, sob uma perspectiva econômica. Outro método destacado pela autora

é o da preferência expressa, que está relacionado a um trabalho inquisitivo, através de

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informações colhidas junto à população. E ainda, o método dos padrões naturais, no qual

se pretende transferir a decisão sobre os riscos da população para a natureza, baseando-

se na aceitabilidade de níveis de convivência com o risco que humanos ou animais

tenham vivenciado no passado sejam aceitos também no presente ou no futuro.

Ora, segundo os autores, o tipo de avaliação mais comumente utilizado, e que faria

mesmo mais sentido em se considerando a vida moderna é a avaliação de custo-benefício

ou risco-utilidade. De fato parece tratar-se aqui numa avaliação entre o risco que se corre

em determinada atividade e o que se tem de retorno, como por exemplo, a projeção

social, a satisfação pessoal, ou mesmo pela falta de alternativa viável.

5.3.4.6. Por que alguns riscos são aceitos e outros são rejeitados?

A começar da Entrevistada 12, os entrevistados narram episódios de escolha entre riscos,

uma vez que não se podem furtar à convivência com todos, avaliando as possibilidades e

consequências de cada um no sentido de se optar por uma escolha que lhes pareça

menos dramática. Para a Entrevistada 12, as situações da vida obrigam à escolha

permanente entre riscos. Ela não vê situações de segurança total, e acredita que as

decisões são sempre tentando procurar o menor risco. O Entrevistado 5 diz que a vida de

todos é como o adágio popular “dos males, o menor”.

O Entrevistado 8 propõe a questão cultural para justificar assumir-se alguns riscos como

escolha pessoal na busca do prazer. Ele cita o prazer de dirigir carros ou motos potentes

em estradas não adequadas e a prática de esportes radicais. Ele continua e diz que além

da busca do prazer, há também que se considerar a praticidade de um deslocamento

aéreo em termos de velocidade em relação ao terrestre. A despeito do reconhecimento

de que os riscos em se viajar de avião são estatisticamente menores do que nas estradas,

ele classifica o risco como “enorme”, inclusive por sua segurança pessoal estar

totalmente depositada nas mãos da equipe de voo e no equipamento, isto é, no próprio

avião. Para ele, o fato de o controle estar nas mãos de outra pessoa faz com que o risco

pareça maior, não apenas nas viagens aéreas, mas nas terrestres também. Referindo-se a

uma viagem de automóvel, ele demonstra certa ilusão de controle ao preferir ter o

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veículo sob seu comando do que nas mãos de outro motorista. O Entrevistado 6 pilota

motos de grande cilindrada nas estradas brasileiras e se sente seguro por conta do

equipamento, da proteção que a roupa adequada oferece e de sua própria expertise.

Dessa forma, assume o risco de viajar até outro estado pelo simples prazer de se estar na

estrada. O Entrevistado 1 lembra que o conhecimento prévio coloca o indivíduo numa

situação de risco calculado. Para ele, no caso de motoristas embriagados, não se pode

também afirmar que não possuem o conhecimento prévio do risco, não se trata de risco

calculado, mas de uma total irresponsabilidade e negligência.

A ideia de sistemas peritos de Giddens (1991) novamente emerge nesta interpretação,

assim como a confiança. Ao mesmo tempo em que o Entrevistado 8 considera

fundamental a existência da logística de organização de uma viagem aérea por causa da

praticidade que proporciona aos usuários, demonstra também desconfiança nas pessoas

responsáveis pelo voo, os especialistas. Falta-lhe a ‘fé’ na expertise dos especialistas,

pessoas e sistemas (GIDDENS, 1991) para colocar a vida em suas mãos de maneira

tranquila. Ele usa o serviço, mas mostra-se desconfortável. A ideia da confiança para a

tomada de decisões está vinculada aqui a relacionamentos interpessoais através de

valores pessoais e do respeito pelo conhecimento técnico, e a sistemas abstratos em

função de ceticismo e descrédito.

5.4. Subsídios para o jogo

Como já afirmado, a pesquisa não tencionou contar respostas, ou quantificar quaisquer

dados, mas, através de depoimentos que se referem à realidade que cada um dos

participantes vivencia em seu dia a dia, explorar o conjunto de opiniões, crenças e

representações que cada um possui sobre o risco em si, e outros temas a ele

relacionados.

Particularmente na última reunião, na qual convergiram todas as impressões,

representações, experiências e relatos de vivências pessoais a respeito da temática do

risco, assim como suas estratégias de convivência com os riscos, eventuais tentativas de

evitá-los, mitigá-los ou atenuar os seus potenciais efeitos negativos, emergiram os relatos

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de caráter normativo de como deveria ser a dinâmica do jogo. Isto é, os subsídios para a

elaboração de um instrumento lúdico que tenha por premissa a capacidade de auxiliar

outras pessoas que venham a lhe utilizar a perceber os riscos do seu entorno através de

um olhar ‘diferenciado’. Isto é, o debate terminou por evoluir para o próprio processo de

construção e compartilhamento de saberes.

A primeira, e talvez uma das mais fortes assertivas sobre a relevância da utilização dos

grupos focais se deu quando de uma pergunta a respeito da dinâmica do jogo, sobre o

que poderia ser feito para sensibilizar o olhar dos jogadores para que passassem a

ressignificar o seu entorno e, eventualmente, perceber os riscos:

Eu acho que com isso aqui que a gente tá fazendo [aponta para o grupo]. Você [as pessoas] dá a sua opinião e a gente já vai começando a ver, né! Eu não sei, na minha maneira de pensar, é isso tudo que você falou. Aí a gente começa a abrir novos horizontes para outras coisas (Entrevistada 2).

E logo a seguir, completa este mesmo raciocínio:

A gente vê no jornal, ou num debate igual esse aqui, a gente vai começando a ter outros olhares pras coisas também. Você entendeu? Eu acredito muito nisso! Você que vive no seu mundo, naquele mundinho, é diferente. Quando você começa a conversar com pessoas, os assuntos, debater outras coisas... a Entrevistada 3 tava falando da comunidade, você [o mediador] tava falando da campanha do quilo, você vai abrindo novos horizontes, vai vendo a realidade que é muito diferente. Aí com isso você já vai abrindo a sua mente pra certas coisas que você achava que isso também não podia... (Entrevistada 2).

No momento em que procuramos subsídios para a construção do instrumento lúdico para

a percepção de risco, a Entrevistada 2 explicita sua opinião de que o debate que

estávamos realizando naquele momento era o que estava, justamente, provocando o

efeito de aprendizagem nela. Ao expressar-se em termos de “sair daquele mundinho” e

“abrir novos horizontes”, ela se refere explicitamente às possibilidades de construção de

um novo olhar para o mundo exterior, para as diversas situações, no contato com outras

pessoas, através da construção social de um conhecimento compartilhado. Para Freire

(2006), as relações homem-mundo são constitutivas do conhecimento em qualquer fase

do desenvolvimento. Isto é, o homem em seu mundo, relacionando-se com as situações

constrói talvez não apenas a base, como todo o corpo de seu conhecimento. E é essa

relação entre os sujeitos da pesquisa para a ressignificação do meio, presente na própria

realização da reunião, que a Entrevistada 2 diz ser necessária no jogo, para ser capaz de,

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também, permitir a ressignificação dos temas e a apropriação de conhecimentos e

saberes socialmente construídos e compartilhados.

E o Entrevistado 5 continua o raciocínio sobre a necessidade da discussão como forma de

construção negociada do conhecimento, uma vez mais, em razão do que vivenciou na sua

própria experiência de participar das reuniões. A seguir a transcrição não apenas de uma

fala, mas de um trecho bastante eloquente sobre a dinâmica do jogo, isto é, da

possibilidade de se chegar a conclusões, a respostas, ou mesmo a outras perguntas:

Eu acho que o que a Entrevistada 2 falou é muito interessante, e eu pensei que no fim ela ia colocar, o jogo tem que trazer a discussão! O jogo tem que estimular a discussão entre quem tá ali, entre os participantes (Entrevistado 5).

Mediador: Ou seja...

O jogo não vai trazer soluções! (Entrevistado 5).

Mediador: ...o jogo não vai ensinar, ele vai estimular a pessoa a chegar à conclusão!

É! (Entrevistado 5).

Exatamente! (Entrevistado 3).

A gente vai aprendendo! Aí a gente vai só aumentando o conhecimento! (Entrevistada 2).

Discutindo a respeito das possibilidades contidas na troca de saberes, na experiência do

compartilhamento dos conhecimentos construídos, vem à tona uma representação social

bastante comum sobre aprender-se com os erros, não apenas com aqueles que se

comete no curso da própria vida, mas na experiência acumulada de outras pessoas ou

grupos sociais. Dessa forma, a ideia que surge é que o jogo deverá explorar os

conhecimentos, as vivências e impressões de seus jogadores como parte da sua própria

dinâmica. O trecho a seguir explicita essas ideias:

Sim, mas a gente não precisa só aprender com os erros da gente! Claro que a gente aprende com os erros da gente. Mas também podemos aprender com os erros dos outros. E para isso precisa ter diálogo. Aí é a diferença né! Esse instrumento [o jogo] vai provocar esse diálogo... (Entrevistado 1).

Mediador: E a reflexão!

Exatamente! Porque você vai conversar com o outro para conhecer um pouco da experiência do outro, que é aonde você pode tirar aprendizado de alguma coisa (Entrevistado 1).

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Mediador: Quer dizer, então o jogo poderia ter..., os participantes poderiam exemplificar situações de risco?

Sim! Sim! (Entrevistado 1).

Mediador: Além da discussão?

Sim! (Entrevistado 1).

O Entrevistado 1 sugere, portanto, que o jogo, além de estimular a discussão entre os

participantes visando a construção do conhecimento, que os participantes venham a

contribuir com relatos pessoais a serem compartilhados para a formação de um

conhecimento comum. O Entrevistado 1 se convence de que esta estratégia de

exemplificação funcionará para o jogo exatamente por ter funcionado no curso das

reuniões do grupo focal. Várias foram as manifestações dos entrevistados acerca do

aprendizado que lhes foi possível apreender nos dias das reuniões.

A ideia da discussão parece ser um ponto chave para o jogo, como o é para o próprio grupo

focal, uma vez que poderá propiciar a reflexão sobre os temas e a eventual autonomia para a

percepção de fatos, circunstâncias ou mesmo conhecimentos que não se conseguiria sozinho.

Assim como os participantes do grupo focal não são meros expectadores do processo e nem

objetos da pesquisa, mas sujeitos parceiros na produção coletiva de um conhecimento, os

jogadores envolvidos também deverão ser considerados sob essa ótica. Deverão se apoiar

num ponto de partida do tabuleiro e a partir daí, discutir, reflexivamente, as questões

propostas no sentido de gerar o próprio conhecimento (Figura 3).

Ainda sobre a dinâmica do jogo, questionados se achavam que o jogo deveria estimular a

competição ou a cooperação, foram feitas diversas considerações, como a seguir:

Eu não vou querer falar das minhas experiências, pensando que eu vou acabar beneficiando você não! (Entrevistado 1).

É a questão do tênis e do frescobol né. No tênis cada um quer jogar forte... Isso, mas no frescobol cada um tem que ajudar o outro. Quanto mais caprichada [a bola] você jogar pro outro, mais o jogo continua. Eu acho que a questão do jogo é nesse sentido. É um ajudar mais o outro... (Entrevistado 3).

Faz sentido! Então você não vai ser... né, com a articulação toda que o jogo vai pedir, a busca do conhecimento, a vitória não é só pra você! É pra sociedade! (Entrevistado 5).

E você construiu isso junto com os outros! (Entrevistado 1).

É, você vai construir junto! (Entrevistado 3).

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Figura 3. Discussão sobre a dinâmica do jogo a ser construído.

Em se considerando que situações de risco são ameaças que, normalmente, afligem

coletividades, faz sentido o pensamento que os entrevistados desenvolvem acerca do

comportamento coletivo dentro do jogo. Sugerem que o jogo trabalhe sob uma

perspectiva comportamental altruística, de trabalho coletivo no desempenho das tarefas

do jogo, porque, sejam os resultados funestos ou benéficos, eles atingirão a maioria. O

Entrevistado 10, entusiasmado com o processo, coloca a questão da seguinte maneira:

Pro pessoal agir como equipe, porque, tipo assim, o lixo que eu joguei lá, o problema vai ser só meu? Não! Vai ser da comunidade, de todos! Se dá enchente, é problema pra várias pessoas. Aí a pessoa vai saber ali que não basta ser um, “basta eu fazer minha parte e o resto dane-se pra lá”. Quer dizer, todo mundo fazendo uma parte, e junto. Aí vai dar um outro total resultado (Entrevistado 10).

Os depoimentos expõem claramente o sucesso da proposta de utilização do grupo focal

no sentido de construção coletiva e partilha de conhecimentos e saberes, para processos

de intervenção que se proponham a serem construídos ‘com’ os sujeitos da pesquisa e

não ‘para’ objetos de pesquisa. O volume de informações coletadas é demasiado grande

para ser transcrito ou mesmo comentado nessas poucas páginas. Expusemos aqui

somente alguns pequenos trechos para ilustrar a argumentação, mas facilmente

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pudemos perceber o quanto as pessoas se sentiram afetadas pela participação em todo o

processo. Desde aqueles momentos iniciais de exposição e troca de saberes e vivências

individuais, até nos instantes finais de discussão sobre como se daria a dinâmica do jogo,

que elementos deveriam constar do jogo para que as informações pudessem ser melhor

tratadas e assimiladas pelos futuros usuários.

5.5. O jogo ‘percepção do risco: construindo um novo olhar’

Os entrevistados tiveram a oportunidade de discutir acerca do que deveria ser o jogo em

termos de sua própria dinâmica de jogabilidade, seu formato, suas regras e outros

elementos constituintes a ele diretamente relacionados. Dessa forma, prevaleceram as

ideias consensuais surgidas do debate mediado, dentre as quais: o jogo deveria gerar

discussão e, portanto, promover o compartilhamento do conhecimento construído

socialmente; o jogo deve trazer conhecimento científico e popular; a união dessas duas

ideias iniciais deveria resultar num processo de ressignificação. Sem dúvidas a técnica do

grupo focal foi determinante para a eleição desses princípios para o jogo, uma vez que os

entrevistados convergiram na ideia de que as discussões promovidas nas diversas

reuniões promoveram a apreensão de novos conhecimentos para todos os presentes e

este processo, se aplicado ao jogo, facilitaria também a apreensão do conteúdo abordado

pelo próprio tabuleiro, assim como o conhecimento compartilhado, por parte dos seus

usuários. Para além da mera apreensão de um novo conhecimento, emerge daí também a

percepção de um novo olhar sobre aquilo que já se conhece, uma vez que as vivências

compartilhadas, os enfoques distintos sobre questões comuns, iluminam ângulos

diferentes de uma mesma questão, revelando novas perspectivas.

A partir das discussões iniciais sobre riscos foi percebido pelos entrevistados que estes

são infinitos uma vez que sua percepção é construída socialmente, ligada a aspectos

culturais relativos a cada realidade de onde se origina cada indivíduo. Torna-se, dessa

forma, imperativo considerar que não se pode listar riscos para dá-los a conhecer a

outrem a partir de, digamos, uma lista. O que se pode mudar, em verdade, é o olhar que

se tem, ou sua capacidade de enxergar a mesma coisa sob diferentes ângulos. Esta

simples constatação, além de direcionar todo o desenvolvimento da dinâmica do próprio

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jogo, foi responsável pelo design do formato da trilha do tabuleiro, isto é, o olho

estilizado. Ora, se o jogo deveria permitir o surgimento, ou o despertar de um ‘novo

olhar’, isso deveria ser também representado no tabuleiro e, dessa forma, o subtítulo do

jogo ‘construindo um novo olhar’ e o próprio formato do olho emergiram como

consequência natural.

O tabuleiro (Figura 4; Anexo 5) impresso é a plataforma ideal para o jogo, uma vez que se

torna o foco central da dinâmica, onde se desenrolam todos os lances da atividade, já que

reúne os jogadores a sua volta. Além de focalizar a atenção dos participantes, trás

informações relevantes nele impressas e auxilia no processo de visualização dos temas

abordados nas discussões que a própria dinâmica estimula. Não menos importante é a

praticidade de se desenvolver a atividade de aplicação da dinâmica sem a necessidade de

apoiar-se em mídias eletrônicas, dispensando a utilização de tecnologias digitais e mesmo

a existência de energia elétrica. Esses fatores, somados ao fato de o custo de impressão

ser relativamente baixo, tornam a escolha do tabuleiro a mais viável para este jogo.

Figura 4. Tabuleiro do jogo.

Assim, o tabuleiro do jogo se constitui em uma trilha simples com 75 casas nas cores

cinza, amarelo, vermelho e azul, cada uma dessas 3 últimas correspondentes a um tipo de

instrução. Nas casas amarelas estão as chamadas questões para discussão, criadas a partir

do encontro do material empírico com o referencial teórico, onde são exemplificadas

diferentes situações de risco potencial e o jogador é convidado a expor alguma

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experiência, sua ou de outrem, acerca desta temática, além de questionar outros

jogadores a respeito do mesmo e entabular breve troca de informações. Os jogadores

que se envolverem neste pequeno debate serão bonificados avançando uma casa no

tabuleiro. As casas vermelhas são relacionadas às cartas de sorte ou azar, que trazem

elementos imponderáveis, inesperados, situações do dia a dia, em sua maioria relatadas

pelos entrevistados e que penalizam ou bonificam o jogador. Ao cair, portanto, numa

casa vermelha, o jogador deverá retirar uma das 44 cartas de sorte e azar e seguir a sua

instrução (Anexo 6). As casas azuis são as casas que abordam as chamadas informações

pertinentes, que trazem algo mais acerca da temática dos riscos, apoiadas no arcabouço

teórico que sustenta esse trabalho. Ao cair numa casa azul, o jogador apenas deverá ler

em voz alta a informação e seguir a instrução que poderá penalizar ou beneficiar o

jogador, sem precisar discutir o assunto. As informações relativas às casas amarelas e

azuis estão numa folha de instruções que acompanha o jogo (Anexo 7). As casas

representadas por essas três cores trazem, assim, informações do universo empírico dos

grupos focais e informações do universo teórico para que o encontro entre essas duas

fontes possa permitir a reflexão crítica e a discussão acerca das realidades de cada um. As

casas na cor cinza não possuem nenhuma instrução específica e estão dessa maneira para

não saturar o jogo de informações e torna-lo, por isso, assaz moroso e menos dinâmico.

Para exemplificar o exposto acima, citaremos a seguir instruções do jogo contidas na

folha de instruções do tabuleiro (uma casa azul e uma casa amarela) além de uma carta

de sorte e azar, e o processo pelo qual elas foram criadas. A casa 1, de cor azul, trás o

seguinte texto: “Investir em estratégias de mitigação de um risco é mais barato do que os

custos da recuperação depois do desastre. Os efeitos podem ser muitos e variados, como

a perda de vidas humanas, das infraestruturas sociais, da destruição ou interrupção das

atividades econômico-produtivas, dos transportes, de patrimônios materiais e imateriais,

impactos ambientais, dentre outros. Avance 2 casas”. As casas azuis referem-se às

chamadas informações pertinentes, e são, em sua maioria, referentes a informações

retiradas do universo teórico relacionado com o trabalho, ou de outros materiais satélites

relacionados com a convivência com riscos. Esta informação específica, por exemplo, está

relacionada com a obra “Riesgos natures em Galicia. El encuentro entre naturaleza y

sociedade” de Fra Paleo (2010a). Estão ali, portanto, presentes algumas informações para

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leitura em voz alta e uma instrução para avanço ou retrocesso de casas, mas ressaltamos

que as casas azuis não objetivam o debate, senão uma reflexão imediata sobre o tema

abordado. Nas casas de cor vermelha, relativas às cartas ‘sorte e azar’, podem-se

encontrar textos como o seguinte: “Mesmo sabendo dos perigos, seus vizinhos atiram lixo

nas ruas e isso tem provocado a proliferação de insetos e roedores nas casas da

vizinhança, inclusive na sua. Fique uma rodada sem jogar”. Ora, essa situação refere-se a

um prejuízo coletivo causado por algumas pessoas, e é fiel a um depoimento realizado

pela Entrevistada 12, acerca de uma experiência vivenciada por ela em sua prática diária

como agente de saúde. Esta situação relaciona-se, segundo os entrevistados, com uma

sensação de imunidade, talvez combinada com transferência de responsabilidade e

mesmo com a naturalização da convivência com riscos. Como exemplo final sobre as

informações contidas nas cartas e folha de instruções, relacionadas às cores na trilha do

tabuleiro, citamos o texto de uma das casas amarelas, que pretendem conjugar o

universo empírico com o teórico: “Em alguns momentos da vida, as pessoas são obrigadas

a escolher entre situações de risco, repetindo o ditado popular ‘dos males, o menor’.

Você já se viu nessa situação? Conte sua experiência para seus companheiros. Questione-

os sobre se também já passaram por algo parecido”. Este trecho refere-se a um

depoimento também da Entrevistada 12 em que narra episódios em que se vê na

situação de escolher entre situações ameaçadoras, avaliando cada uma de acordo com

sua percepção e preferência. Este comentário acabou desencadeando outras

manifestações dos entrevistados acerca de alguns episódios de escolha entre riscos que

cada um vivenciou. Ora, esta situação é totalmente condizente com a teoria cultural dos

riscos, quando se afirma que a escolha e a priorização de riscos reais, baseiam-se em

julgamentos morais e outros critérios objetivos e subjetivos (DOUGLAS e WILDAVSKY,

2012).

A intenção de cruzar a informação teórica com a empírica, permitindo-lhes alguma

simetria, faz com que os assuntos sejam abordados de maneira dialógica pelos jogadores

que, expondo as suas vivências, visões de mundo, opiniões acerca dos mais variados

assuntos e situações, propicia a chamada construção social do conhecimento. A respeito

desse encontro de múltiplas subjetividades, Isayama e Viana (2012) consideram que

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as possibilidades de criar e recriar cultura no jogo permitem a vivência de valores externos a ele, por isso o jogo reproduz papéis sociais vividos no mundo exterior, denunciando a realidade, da mesma forma que a alimenta. Daí, o jogo também pode ser uma vivência educativa, que cria tensão com o racional, com o produtivo, criando linhas de fuga, apontando alternativas (ISAYAMA e VIANA, 2012:114).

Para Saraiva (2012) a dinâmica do jogo “transforma os participantes de acordo com os

papeis assumidos, concedendo-lhes possibilidades e alternativas à medida em que [os

jogadores] se envolvem com os eventos do jogo” (SARAIVA, 2012:9).

Criar tensão com o racional, ou ainda, problematizar as situações que são vividas, muitas

delas já naturalizadas como eventos corriqueiros na vida dos indivíduos, é uma

alternativa que parece muito importante, ainda mais quando se pensa em atividades não

invasivas ou mecanicistas e heteronômicas, mas que prezem pela autonomia crítica, pela

valorização das trocas experienciais, da sinergia social que se pode alcançar na construção

social no encontro de múltiplas subjetividades.

O jogo como dimensão da cultura [...] se constitui como produção humana por meio de processos que incorporam valores, saberes, motivações e desejos de cada um dos sujeitos, atribuindo sentidos e significados às diferentes experiências. Toda e qualquer produção cultural, na sua dimensão estética, simbólica e prática, pode agregar diferentes funções sociais (ISAYAMA e VIANA, 2012:124).

Dessa forma, o jogo ‘Percepção do risco: construindo um novo olhar’ coloca-se,

primeiramente, como um instrumento lúdico informativo, mas, também, e talvez mais

importante, seja a sua dupla natureza no que diz respeito à construção coletiva do

conhecimento. Isto é, no processo de elaboração do jogo foram utilizadas informações

extraídas dos pilotis teóricos de sustentação deste estudo e das experiências compartilhadas

nos grupos focais e, além disso, mesmo a dinâmica, regras e elementos constituintes foram

discutidos com os entrevistados, numa primeira construção social. Emergiu das reuniões

aquilo que veio a se tornar a sua segunda natureza de construção social do conhecimento,

inerente ao fator colaborativo do compartilhamento dos saberes para se avançar no jogo.

Isto é, o debate, a troca de experiências, as múltiplas narrativas, são exigência para o

desenrolar dinâmico do jogo. O jogo coloca-se, dessa forma, acima de tudo, como um

catalizador para discussões, pois o espaço, a comunidade, o meio, são produtos das práticas

sociais que permitem a produção e a reprodução da vida social e, portanto, devem ser

considerados, pensados, problematizados, também por uma perspectiva participativa.

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6. CONCLUSÕES

Segundo Huizinga (1999), a essência do elemento lúdico é a diversão, o prazer, a alegria,

mas também estão presentes a tensão, o movimento, a mudança. Estes elementos

conferem sentido à atividade lúdica e a soma ou a união de tais elementos é capaz de atrair

sobremaneira a atenção dos indivíduos, configurando-se no grande trunfo da atividade

lúdica. Aliando-se a isto a capacidade de problematização reflexiva que a educação

ambiental promove, no sentido de permitir ao individuo a sua autonomia crítica diante do

seu entorno e sua capacidade de ressignificação de todas as questões inerentes à sua vida,

tem-se uma importante ferramenta para instrumentalizar o olhar para a percepção crítica

de todas as esferas objetivas da vida, dentre elas os problemas socioambientais.

Nesse sentido abordar a temática dos riscos através de um instrumento lúdico ancorado

em princípios da educação ambiental num momento em que as consequências da

modernidade avolumam-se sobre os atores individuais e coletivos parece ser uma

alternativa assaz relevante, na medida em que a proposta escapa das tradicionais

propostas heteronômicas, que alheiam o sujeito humano do seu processo de construção.

Os jogos se mostram bastante eficazes no sentido de abordar os mais diversos temas

junto a sujeitos dos mais diversos extratos etários e fases do desenvolvimento cognitivo e

isto já vem sendo explorado de forma significativa. A inovação da nossa proposta é a

elaboração do recurso lúdico como algo construído de forma polissêmica com os sujeitos,

de modo a gerar um instrumento que seja plástico, adaptável a cada situação. Além disso,

o jogo conta também com a participação dos jogadores, não no sentido de seguir

estritamente aquilo que está proposto em suas regras, mas com a participação objetiva e

a discussão da realidade de cada um diante dos riscos como determinante do progresso

da partida. Uma das vantagens que se destaca de maneira indelével, é o fato que, com

essa participação, o mesmo jogo jamais será jogado da mesma maneira.

Assim, ao abordarmos os sujeitos e as temáticas valendo-nos da metodologia do grupo

focal, conseguimos significar uma série de conteúdos, ressignificar uns tantos outros, e

ainda, no confronto das ideias, das crenças, dos valores, das representações de cada um,

gerar um conhecimento prático sobre riscos que pode ser aproveitado no jogo como

exemplificação para o processo de modificação do próprio olhar dos sujeitos jogadores. A

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metodologia utilizada para abordagem ao universo empírico foi determinante do sucesso

dessa proposta, e mais, a sua característica básica de estimular a exposição e a discussão

das ideias foi destacada pelos próprios participantes das reuniões como um elemento

fundamental na construção da própria dinâmica do jogo.

Compreendemos que qualquer ser humano é capaz de intervir na melhoria da sua própria

realidade, de fazer modificações profundas em sua vida objetiva e mesmo no meio em

que está inserido. Portanto, não pretendemos, com nossa proposta, substituir a iniciativa

de qualquer um, mas propor um instrumental que estimule esse processo que se ancore,

sobretudo, no respeito às crenças, aos saberes, às representações e às identidades dos

atores envolvidos.

Os jogos e outras formas lúdicas podem ser mais bem utilizados em diferentes aplicações

na educação formal e complementar, valorizando-se mais a vivência da dinâmica em si, a

qualidade das trocas de experiências e saberes compartilhados neste espaço de diálogo,

do que os resultados absolutos em termos de vitória ou derrota.

Para além da questão meramente utilitária e instrumental da atividade lúdica, é possível a

construção social do conhecimento que virá a ser compartilhado naquele momento mesmo

da vivência, através de dinâmicas que realmente envolvam o sujeito nesse processo,

valorizando a sua capacidade de problematização reflexiva, de participação solidária, e

mesmo de democratização cultural. E mais, quando se procura diminuir a distância entre

quem cria e quem utiliza o jogo, como foi o caso do presente estudo, a atividade lúdica

torna-se mais bem fundamentada pela realidade empírica daqueles que a utilizarão, isto é,

a aproximação com a realidade, a apropriação das questões do meio, torna o processo de

problematização reflexiva que se pretende atingir muito mais exequível.

O próximo passo é tornar o jogo universal, superando as especificidades regionais

relativas ao universo empírico, para que a dinâmica possa ser aplicada a diferentes

contextos, sem necessariamente ser adaptada a cada nova realidade. Esperamos com isso

contribuir para a capacidade autônoma de problematizar e perceber riscos por parte de

indivíduos de diferentes realidades, uma vez que os riscos são cada vez mais uma

constante em meio a diferentes culturas, realidades, meios de vida de diferentes atores

sociais em múltiplas espacialidades.

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ANEXO 1

Lista dos sites visitados:

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Defesa Civil de Minas Gerais. Disponível em <http://www.defesacivil.mg.gov.br/>. Acessado em maio de 2013.

Ambiente Brasil. Disponível em <http://www.ambientebrasil.com.br/>. Acessado em maio de 2013.

Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA). Disponível em <http://www.amda.org.br/home>. Acessado em maio de 2013.

Biodiversitas. Disponível em <http://www.biodiversitas.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Centro Mineiro de Referência em Resíduos. Disponível em <http://www.cmrr.mg.gov.br/>. Acessado em maio de 2013.

Instituto Ciência Hoje. Disponível em <http://cienciahoje.uol.com.br/>. Acessado em maio de 2013.

Conservation International Brasil. Disponível em <http://www.conservation.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Companhia de Saneamento de Minas Gerais (COPASA-MG). Disponível em <http://www.copasa.com.br/>. Acessado em maio de 2013.

Educação Ambiental em Ação. Disponível em <http://www.revistaea.org/>. Acessado em maio de 2013.

Envolverde – jornalismo & sustentabilidade. Disponível em <http://envolverde.ig.com.br/>. Acessado em maio de 2013.

Greenpeace Brasil. Disponível em <http://www.greenpeace.org/brasil>. Acessado em maio de 2013.

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA). Disponível em <http://www.ibama.gov.br/>. Acessado em maio de 2013.

O Instituto Ambiental (OIA). Disponível em <http://www.oia.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Instituto Terra de Preservação Ambiental (ITPA). Disponível em <http://www.institutoterra.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

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Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ). Disponível em <http://www.ipe.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

SOS Mata Atlântica. Disponível em <http://www.sosmatatlantica.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Planeta Sustentável. Disponível em <http://planetasustentavel.abril.com.br/>. Acessado em maio de 2013.

Projeto Manuelzão. Disponível em <http://www.manuelzao.ufmg.br/>. Acessado em maio de 2013.

Ministério do Meio Ambiente (MMA). Disponível em <http://www.mma.gov.br/sitio/>. Acessado em maio de 2013.

Instituto rã-bugio para conservação da biodiversidade. Disponível em <http://www.ra-bugio.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE). Disponível em <http://www.rede-mg.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

World Wide Fund for Nature (WWF-Brasil). Disponível em <http://www.wwf.org.br/>. Acessado em maio de 2013.

Instituto Socioambiental (ISA). Disponível em <http://www.socioambiental.org/>. Acessado em maio de 2013.

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ANEXO 2

Roteiro das perguntas utilizadas nos grupos focais

1. De uma forma geral, o que podemos entender por risco?

2. Citar exemplos de situações de risco* e seus condicionantes. Escalas dos riscos.

* (ambientais, sociais e tecnológicos + escalas [termos a serem esclarecidos])

3. Áreas de risco e áreas de influência. O que são?

4. Porque as pessoas vivem em áreas de risco?

5. Como pessoas e grupos percebem os riscos?

6. O que pode evidenciar ou mascarar a presença de um risco?

7. Como são os comportamentos (individuais e coletivos) frente ao risco.

8. Porque alguns riscos são aceitos e outros rejeitados?

9. Medidas para facilitar a convivência com o risco. O que fazer?

10. Você se considera exposto a algum risco? Como lida com isso?

11. Sobre o risco relatado, como tomou consciência de sua presença?

12. Faz algo para diminuir a própria exposição?

13. De forma geral, o que podemos entender por educação ambiental?**

** (EA crítica leva à autonomia, à capacidade de ressignificação do entorno)

14. Já participou de algum programa de educação ambiental?

15. Como tratar riscos sob uma perspectiva de educação ambiental?

16. Qual a melhor forma de informar / compartilhar saberes sobre os temas?

17. Que tipo de informação deverá ter o jogo?

18. Como organizar a informação a ser utilizada no jogo?

19. Como se dará a dinâmica do jogo?

Observações:

- 1 mediador + 1 operador/anotador;

- 10 a 15 minutos por questão, se a discussão for produtiva, redimensionar (nº de questões, tempo dedicado a cada uma);

- as questões 13, 14 e 15 foram convertidas em rápida exposição conceitual feita pelo mediador.

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ANEXO 3

Parecer do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos

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ANEXO 4

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Eu,____________________________________________, li e/ou ouvi a leitura dos esclarecimentos que foram feitos sobre o estudo do qual concordei em participar. A explicação que recebi foi suficiente para que eu compreendesse que:

a) Não há riscos ao participar da pesquisa porque me foi garantido que as informações prestadas são confidenciais, ou seja, minha privacidade será garantida e nenhuma informação que prestei poderá ser diretamente associada ao meu nome ou à minha pessoa;

b) Há benefícios gerados pelo estudo, mas esses são coletivos e referidos à produção de conhecimentos que terei acesso;

c) Não receberei qualquer benefício financeiro para participar do estudo e também não terei qualquer tipo de despesa;

d) Poderei, a qualquer momento e sem necessidade de justificar minha decisão, interromper minha participação no estudo;

e) Autorizo o pesquisador a utilizar fotografias dos grupos focais nas quais eu apareça apenas em trabalhos acadêmicos – Sim ( ) / Não ( );

f) Os dados e informações do estudo têm fins acadêmicos e após a sua finalização as fotos, gravações e transcrições serão armazenados em meio digital pelo pesquisador, garantindo a privacidade dos informantes.

Autorizo o registro de minha voz e imagem, gravados em meio digital, por ocasião da realização de grupos focais para a pesquisa “Educação Ambiental e percepção de riscos: uma abordagem lúdica”. Estou ciente que tenho garantia de que as gravações se destinam exclusivamente para fins acadêmicos e não podem ter suas transcrições divulgadas publicamente ou em outros trabalhos, senão naqueles resultantes da própria pesquisa.

Voluntário (Entrevistado/a): __________________________________________________

Local e data: ______________________________________________________________

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ANEXO 5

Tabuleiro do jogo

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ANEXO 6

Cartas de sorte e azar e informações nelas contidas

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ANEXO 7

Folha de instruções das casas do tabuleiro e informações nela contidas