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PREZADOS LEITORES É com muita felicidade que ultrapassamos a primeira década de publicações científicas vinculadas à Sociedade Mineira de Anestesio- logia – SAMG. Neste ano de 2011, serão mantidas publicações com temas variados e relevantes para a educação continuada aos nossos associados. Além de iniciarmos um novo projeto, publicaremos os trabalhos apresentados na 45ª Jornada de Anestesiologia do Sudeste Brasileiro – JASB. Lembramos que nossas publicações continuam sendo indexadas na base de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciên- cia da Saúde (LILACS). Para acesso às normas de publicação, artigos publicados e envio de trabalhos a serem submetidos à avaliação da Comissão Editorial, as informações estão disponibilizadas no site da SAMG < www.samg.org.br > ( Site SAMG – janela educação continuada – biblioteca – RMA) e no site RMMG < http://rmmg.medicina.ufmg.br > . Finalmente, agradecemos aos que iniciaram, mantiveram e evo- luíram este excelente veículo de informação continuada da Sociedade Mineira de Anestesiologia e anelamos um futuro ainda mais próspero para as publicações da anestesiologia mineira. Comissão editorial CONSELHO EDITORIAL DO SUPLEMENTO DA SOCIEDADE DE ANESTESIOLOGIA DE MINAS GERAIS Coordenadores: Dr. Emerson Seiberlich Rezende Dr. Wagner Fernandes Júnior Membros: Dr. Daniel Câmara de Rezende Dr. Fabiano Souza Araújo Dr. Marcelo de Paula Passos Dr. Tolomeu Artur Assunção Casali Dr. Wendell Valadares Campos Pereira Contatos: Sociedade de Anestesiologia de Minas Gerais Rua: Eduardo Porto, 575 - B. Cidade Jardim CEP: 30.380-060 – Belo Horizonte, MG - Brasil Telefone: (31) 3291 0901 Email: [email protected] Rev Med Minas Gerais. 2011; 21(2Supl3): S1-S72 UMA PUBLICAÇÃO DA Associação Médica de Minas Gerais – AMMG • Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais – CRM-MG • Cooperati- va Editora e de Cultura Médica Ltda. – Coopmed • Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais – FCMMG • Faculdade de Medicina da UFMG – FM/UFMG • Federação Nacional das Coopera- tivas Médicas – Fencom • Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais – SES/MG • Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte – SMSa/ BH • Sindicato dos Médicos do Estado de Minas Gerais – Sinmed-MG • Unimed-BH Cooperativa de Trabalho Médico Ltda – Unimed-BH. Diretoria Executiva do Conselho Gestor Francisco José Penna – Presidente Helton Freitas – Diretor Financeiro Marcelo Gouvea Teixeira – Diretor de Relações Institucionais Conselho Gestor Ajax Pinto Ferreira (Coopmed) • Amélia Maria Fernandes Pessôa (Sinmed-MG) • Ciro José Buldrini Filogônio (Fencom) • Cláudio de Souza (CRM-MG) • Francisco José Penna (FM/UFMG) Helton Freitas (UNIMED-BH) • José Côdo Albino Dias (AMMG) • Lucas Viana Machado (FCMMG) • Marcelo Gouvea Teixeira (SMSa-BH) Nery Cunha Vital (SES/MG) Editor Administrativo Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite Revisão Magda Barbosa Roquette de Pinho Taranto Secretária Suzana Maria de Moraes Miranda Normalização Bibliográfica Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite Projeto gráfico: José Augusto Barros Produção Editorial: Folium Tiragem: 7.000 exemplares Indexada em: LILACS – Literatura Latino- -Americana em Ciências da Saúde; PERIODICA - Indice de Revistas Latinoamericanas; LATINDEX - Sistema Regional de Información en Linea para Revistas Científicas de América Latina, el Caribe y Portugal. Versão online: http://rmmg.medicina.ufmg.br/ Início da Publicação: v.1, n.1, jul./set. 1991 Correspondências e artigos Revista Médica de Minas Gerais Faculdade de Medicina da UFMG Av. Prof. Alfredo Balena, 190 – Sala 12 30130-100 – Belo Horizonte. MG. Brasil Telefone: (31) 3409-9796 e-mail (artigos): [email protected] e-mail (correspondências): [email protected] 21 / 2-S3 Editorial

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Prezados Leitores

É com muita felicidade que ultrapassamos a primeira década de publicações científicas vinculadas à Sociedade Mineira de Anestesio-logia – SAMG. Neste ano de 2011, serão mantidas publicações com temas variados e relevantes para a educação continuada aos nossos associados. Além de iniciarmos um novo projeto, publicaremos os trabalhos apresentados na 45ª Jornada de Anestesiologia do Sudeste Brasileiro – JASB.

Lembramos que nossas publicações continuam sendo indexadas na base de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciên-cia da Saúde (LILACS). Para acesso às normas de publicação, artigos publicados e envio de trabalhos a serem submetidos à avaliação da Comissão Editorial, as informações estão disponibilizadas no site da SAMG < www.samg.org.br > (Site SAMG – janela educação continuada – biblioteca – RMA) e no site RMMG < http://rmmg.medicina.ufmg.br > .

Finalmente, agradecemos aos que iniciaram, mantiveram e evo- luíram este excelente veículo de informação continuada da Sociedade Mineira de Anestesiologia e anelamos um futuro ainda mais próspero para as publicações da anestesiologia mineira.

Comissão editorial

CoNseLHo editoriaL do sUPLeMeNto da soCiedade de aNestesioLoGia de MiNas Gerais

Coordenadores:Dr. Emerson Seiberlich Rezende

Dr. Wagner Fernandes Júnior

Membros:Dr. Daniel Câmara de Rezende

Dr. Fabiano Souza AraújoDr. Marcelo de Paula Passos

Dr. Tolomeu Artur Assunção CasaliDr. Wendell Valadares Campos Pereira

Contatos:Sociedade de Anestesiologia de Minas Gerais

Rua: Eduardo Porto, 575 - B. Cidade JardimCEP: 30.380-060 – Belo Horizonte, MG - Brasil

Telefone: (31) 3291 0901Email: [email protected]

rev Med Minas Gerais. 2011; 21(2supl3): s1-s72

UMA PUBLICAÇÃO DA Associação Médica de Minas Gerais – AMMG • Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais – CRM-MG • Cooperati-va Editora e de Cultura Médica Ltda. – Coopmed • Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais – FCMMG • Faculdade de Medicina da UFMG – FM/UFMG • Federação Nacional das Coopera-tivas Médicas – Fencom • Secretaria de Estado da Saúde de Minas Gerais – SES/MG • Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte – SMSa/BH • Sindicato dos Médicos do Estado de Minas Gerais – Sinmed-MG • Unimed-BH Cooperativa de Trabalho Médico Ltda – Unimed-BH.

Diretoria Executiva do Conselho Gestor

Francisco José Penna – Presidente • Helton Freitas – Diretor Financeiro • Marcelo Gouvea Teixeira – Diretor de Relações Institucionais •

Conselho Gestor

Ajax Pinto Ferreira (Coopmed) • Amélia Maria Fernandes Pessôa (Sinmed-MG) • Ciro José Buldrini Filogônio (Fencom) • Cláudio de Souza (CRM-MG) • Francisco José Penna (FM/UFMG) • Helton Freitas (UNIMED-BH) • José Côdo Albino Dias (AMMG) • Lucas Viana Machado (FCMMG) • Marcelo Gouvea Teixeira (SMSa-BH) • Nery Cunha Vital (SES/MG) •

Editor Administrativo Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite

Revisão Magda Barbosa Roquette de Pinho TarantoSecretária Suzana Maria de Moraes Miranda

Normalização Bibliográfica Maria Piedade Fernandes Ribeiro Leite

Projeto gráfico: José Augusto Barros

Produção Editorial: Folium

Tiragem: 7.000 exemplaresIndexada em: LILACS – Literatura Latino--Americana em Ciências da Saúde; PERIODICA - Indice de Revistas Latinoamericanas; LATINDEX - Sistema Regional de Información en Linea para Revistas Científicas de América Latina, el Caribe y Portugal.Versão online: http://rmmg.medicina.ufmg.br/Início da Publicação: v.1, n.1, jul./set. 1991Correspondências e artigosRevista Médica de Minas Gerais Faculdade de Medicina da UFMG Av. Prof. Alfredo Balena, 190 – Sala 1230130-100 – Belo Horizonte. MG. BrasilTelefone: (31) 3409-9796e-mail (artigos): [email protected] (correspondências): [email protected]

21/2-S3

Editorial

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21/2-S3

1 • Editorial

3 • Antifibrinolítico em cirurgia cardíaca: como e quando usar? Antifibrinolytic in cardiac sur-gery: how and when to use?

Marden Fernando Miranda Ra-mos, Alexandre de Castro Morais, Jonas Alves de Santana, Renata de Andrade Chaves, Emerson Seiberlich

9 • Avaliação Cardiovas-cular Perioperatória para Cirurgia Não CardíacaPreoperative Cardiovascular Evaluation for Noncardiac Surgery

Fernando José Buitrago, Jonas Alves Santana, Leandro Ferreira Guimarães, Maurício Delage Henriques, Waldívio Marcos de Almeida Júnior

29 • Boletim eletrônico de anestesia: a anestesio-logia na era digitalElectronic report of anesthesia: the anaesthesiology in the digital age

Leonardo Padovani Trivelato, Fábio Maciel Rosa Pereira, Débora Nathália Smidarle, Rafael Diogo Smidarle

35 • Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologistDiastolic dysfunction and its im-portance to the anesthesiologist

Jaci Custódio Jorge, Ana Luiza Murta Timponi de Moura, Nicole Silvestre Monteiro

41 • Riscos profissionais em anestesiologiaOccupationalhazards in anes-thesiology

Alexandre Almeida Guedes

50 • Uso correto do mo-nitor de consciênciaProper use of the monitor of consciousness

Luciana Freitas Queiroz, Lorena Jrege Arantes, Neuber Martins Fonseca, Beatriz Lemos da Silva Mandim, Roberto Araújo Ruzzi, Neise Apoliany Martins, Paulo Ricardo Rabello de Macedo Costa

59 • Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutivaProtective mechanical ventila-tion in obstructive pulmonary disease patients

Renata de Andrade Chaves, Emerson Seiberlich, Jonas Alves de Santana, Marden Fernando Miranda Ramos, Alexandre de Castro Morais

64 • SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscularSUGAMMADEX – New horizons for the reversal of neuromuscular blockade

Roberta Bernardes Rodrigues, Izabela Fortes Lima, Joaquim Belquior Silva

Normas de Publicações

sumário

Artigos de Revisão

Atualização Terapêutica

Capa: Logomarca da Sociedade de Anestesiologia de Minas Gerais

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S3-S8 3

artiGo de revisão

Instituição:Hospital SocorBelo Horizonte, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Marden Fernando Miranda RamosRua: Marquês do Lavradio, 469/115Bairro: João PinheiroCep: 30530-110Belo Horizonte, MG – BrasilE-mail: [email protected]

1 Anestesiologista do Hospital SOCOR e do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Belo Horizonte, MG – Brasil.2 Anestesiologista do Hospital Nossa Senhora das Graças e Hospital UNIMED de Sete Lagoas. Sete Lagoas, MG – Brasil.3 Anestesiologista do Hospital Municipal Odilon Behrens e Hospital Risoleta Tolentino Neves. Belo Horizonte, MG – Brasil.4 Instrutor do CET/SBA do Instituto de Previdência dos Ser-vidores do Estado de Minas Gerais – IPSEMG, Anestesiolo-gista do Hospital SOCOR, Hospital das Clínicas da UFMG e do Hospital Vera Cruz. Belo Horizonte, MG – Brasil.

resUMo

O sangramento pós-operatório continua sendo uma das principais complicações em cirurgia cardíaca. A etiologia desse sangramento é multifatorial, com hiperfibrinólise e disfunção plaquetária desempenhando papel fundamental. Tendo em vista essas cau-sas, as drogas antifibrinolíticas têm sido preconizadas. Desde a retirada da aprotinina do mercado, o ácido epsilon-aminocaproico e o ácido tranexâmico passaram a ser os únicos representantes disponíveis dessa classe de drogas. Essas medicações diminuem a perda de sangue e agem na resposta inflamatória associada ao procedimento cirúrgi-co. A eficácia variável dessas drogas ocorre devido aos vários esquemas terapêuticos e níveis séricos existentes. Recentemente têm surgido alguns questionamentos na literatura a respeito das complicações, doses, vias de administração e melhor momento para administração desses agentes.

Palavras-chave: Hemorragia; Cirurgia Torácica; Fibrinólise; Fibrinolisina; Aprotinina; Ácido Tranexâmico; Ácido 6-Aminocapróico.

aBstraCt

The postoperative bleeding remains a major complication in cardiac surgery. The etiology of this bleeding is multifactorial, with hyperfibrinolysis and platelet dysfunction playing a key role. Given these causes antifibrinolytic drugs have been recommended. Since the withdrawal of aprotinin in the market, epsilon-aminocaproic acid and tranexamic acid be-came the sole representatives of this class of drugs available. These medications reduce blood loss and act on the inflammatory response associated with surgery. The variable efficacy of these drugs is due to multiple drug regimens and serum available. Recently some questions have arisen in the literature regarding the complications, doses, routes of administration and timing for administration of these agents.

Key words: Hemorrhage; Thoracic Surgery; Fibrinolysis; Fibrinolysin; Aprotinin; Tranexamic Acid; 6-Aminocaproic Acid.

iNtrodUção

Cirurgia cardíaca tem como uma das principais complicações o sangramento pós-operatório aumentado, que persiste nos dias atuais, apesar dos avanços na téc-nica cirúrgica e no manejo anestésico, como importante causa de morbimortalida-de. Entre os pacientes submetidos a esse tipo de cirurgia, estima-se que 50 a 60% recebem algum hemoderivado durante o período perioperatório. Tais pacientes são responsáveis, de maneira geral, pelo consumo de cerca de 20% dos produtos de ban-

Antifibrinolytic in cardiac surgery: how and when to use?

Marden Fernando Miranda Ramos1, Alexandre de Castro Morais1, Jonas Alves de Santana2, Renata de Andrade Chaves3, Emerson Seiberlich4

Antifibrinolítico em cirurgia cardíaca: como e quando usar?

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Antifibrinolítico em cirurgia cardiaca: como e quando usar?

minogênio, cujos níveis podem persistir elevados até duas horas após o final do bypass.4,6

Verifica-se então a transformação de um evento desti-nado à hemostasia local em evento iatrogênico, sistêmico e que tem como resultado a coagulopatia de consumo.

aProtiNiNa e o estUdo Bart

A aprotinina foi introduzida na cirurgia cardíaca em 1989 por Bidstrup et al.7 Eles mostraram que al-tas doses dessa droga reduziam dramaticamente o sangramento em pacientes submetidos à cirurgia de revascularização miocárdica.4,8

A aprotinina inibe uma variedade de serinas proteases que estão particularmente envolvidas na cascata hemostática e na resposta inflamatória. A aprotinina inibe a fibrinólise por ligação direta com a plasmina. Outra função dessa medicação que contri-bui para a redução do sangramento microvascular é minimizar a disfunção plaquetária.8,9

Em novembro de 2007, foi concluído o estudo Blood conservation using Antifibrinolytics: a Randomi-zed Trial in high-risk cardiac surgery patients (BART)10, que mostrou alto índice de mortalidade associado ao uso de aprotinina em comparação com os análo-gos da lisina em cirurgia cardíaca. Esse resultado foi seguido por outros grandes estudos observacionais associando a aprotinina a aumentado risco de dano renal, infarto do miocárdio, choque e morte. Em fe-vereiro de 2008, dois outros estudos observacionais também publicaram achados similares. Como conse-quência, a comercialização da aprotinina foi suspen-sa e os análogos da lisina passaram a ser os antifibri-nolíticos disponíveis na prática clínica atual.6,9

FarMaCoLoGia do áCido traNexâMiCo e áCido ePsiLoN-aMiNoCaProiCo

Os análogos da lisina inibem a fibrinólise por blo-quearem competitivamente e com alta afinidade os locais de ligação da lisina no plasminogênio, impedin-do, com isso, a formação do complexo entre plasmino-gênio, fibrina e ativador tecidual do plasminogênio (Fi-gura 1). Os representantes deste grupo incluem o ácido tranexâmico (TXA) e o ácido epsilon-aminocaproico (EACA). Esses agentes compartilham características comuns: baixo peso molecular, hidrofilia, eliminação renal em grande parte na forma inalterada e baixo cus-

co de sangue.1 Além disso, esses pacientes frequente-mente necessitam de reintervenção cirúrgica, o que contribui para o aumento dos custos econômicos.

A etiologia do sangramento em cirurgia cardíaca é multifatorial, com hiperfibrinólise e disfunção pla-quetária desempenhando papel fundamental.2 A uti-lização do bypass cardiopulmonar promove ativação do sistema de hemostasia com progressivo consumo dos fatores de coagulação e ativação plaquetária.3 A perda sanguínea aumentada expõe os pacientes aos riscos de instabilidade hemodinâmica, hipotermia, coagulopatia dilucional e aos riscos inerentes à trans-fusão de hemoderivados.

Apesar das modificações nas técnicas de bypass cardiopulmonar, utilização de materiais menos bior-reativos nos circuitos de circulação extracorpórea, o emprego de estratégias farmacológicas com o intuito de atenuar esses distúrbios hemostáticos é necessá-rio.3 Neste contexto, o uso de drogas antifibrinolíticas tem sido preconizado.

saNGraMeNto assoCiado ao ByPass CardioPULMoNar: PatoGêNese

A superfície endotelial constitui a única conheci-da capaz de manter a fluidez do sangue e integridade vascular a partir da indução e produção equilibrada de fatores pró e anticoagulantes. O contato do sangue com superfícies sintéticas inicia o processo de coagu-lação através da geração de trombina.4 Dessa manei-ra, a utilização de um agente anticoagulante é neces-sária durante o período de circulação extracorpórea. Heparina não fracionada, embora não seja totalmente satisfatória, é o agente utilizado universalmente.

Clivagem de protrombina em trombina pode ocorrer através de várias vias e gera um fragmento (F1.2) que pode ser usado como um marcador da produção de trombina.4 Alguns autores têm demonstrado que níveis de F1.2 aumentam discretamente com o início do bypass cardiopulmonar, elevando-se gradualmente até a libera-ção do clamp aórtico, permanecendo altos por algum período após o final da circulação extracorpórea.5

A meia-vida da trombina no sangue é de ape-nas 30 segundos.4 Entretanto, durante o período de bypass, trombina é gerada continuamente e quanti-dades variáveis circulam apesar do uso de heparina. Como resultado, ocorre estímulo às células endote-liais dos pequenos vasos nos sítios de trauma cirúrgi-co, que passam a produzir ativador tecidual do plas-

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S3-S8 5

Antifibrinolítico em cirurgia cardiaca: como e quando usar?

Ácido epsilon-aminocapróico

O EACA tem sido usado em cirurgia cardíaca desde 1962. Diversos estudos têm mostrado variada redução na perda de sangue pós-operatória com essa droga, com diminuição média de 200 mL. O número de pro-dutos sanguíneos requeridos durante ou após cirurgia cardíaca com CEC em uso de EACA é inconsistente. Vários autores mostram limitado ou sem benefício o uso do EACA nesta situação. O EACA tende a reduzir o risco relativo de reoperações por sangramento, embo-ra este achado não seja estatisticamente significativo.4,6

A eficácia variável do EACA em reduzir a perda de sangue em cirurgia cardíaca pode ser justifica-da pelos vários esquemas de doses e níveis séricos ideais existentes. As doses de bolos variam de 50 a 150 mg/kg, seguidos de uma dose de manutenção de 1 2 g/h ou 12,5-30 mg/kg/h. A quantidade de droga adicionada à solução de priming do circuito de circu-lação extracorpórea tem acentuada variação. Várias pesquisas mostram que a dose deve ser de 5 g ou 75 mg/kg.4,6,13 A concentração alvo do EACA para inibir efetivamente a fibrinólise durante a CEC varia entre 130-260 µg/mL, mas na maioria dos esquemas tera-pêuticos a concentração média no sangue está bem acima desses valores.3,4

Tendo em vista que a excreção do EACA é quase totalmente realizada pelo rim, disfunção renal resulta em altos níveis plasmáticos da droga após a CEC.6

Ácido tranexâmico

O TXA diminui significativamente a perda de san-gue pós-operatória, com notável variação (50-460 mL). A perda de sangue perioperatória total reduz, em média, 440 mL. A redução de reoperações por sangramento não tem significância estatística. O TXA é eliminado rapidamente em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com CEC quando dado em uma única dose de bolos. Portanto, infusão contínua ou bolos repetidos são necessários. Da mesma forma que o EACA, disfunção renal resulta em altas concen-trações plasmáticas depois da CEC.6

Os esquemas de doses ótimas para o TXA são baseados em estudos dose-resposta empíricos e mo-delos farmacocinéticos. Horrow et al.14 recomendam dose de bolos de 10 mg/kg por 30 minutos depois da indução anestésica e antes da incisão da pele, seguido por infusão contínua de 1 mg/kg/h por 12 horas. Tais

to, além de possuírem tempo de meia-vida plasmático muito próximo, em torno de duas horas. O TXA é seis a 10 vezes mais potente in vitro do que o EACA. Os ní-veis plasmáticos dessas drogas reduzem-se tanto pelo processo de eliminação renal quanto pela distribuição entre os compartimentos corporais. Aproximadamen-te 75% de ambas as drogas são excretadas pelos rins e o clereance é quase igual ao da creatinina.3,4,6

Uso CLíNiCo e dosaGeM dos aNáLoGos da LisiNa

Como descrito anteriormente, a perda de sangue não cirúrgico que se registra na cirurgia cardíaca com circulação extracorpórea (CEC) é devida a uma combinação de excessiva fibrinólise e disfunção pla-quetária adquirida. O uso das drogas antifibrinolíti-cas pode reduzir essa perda de sangue quando usa-das profilaticamente, pois inibem, como o próprio nome diz, a fibrinólise, além de diminuírem a ativa-ção plaquetária induzida pela plasmina, preservan-do, portanto, a função plaquetária.6

Figura 1 - Ativação da fibrinólise: a ativação do plasminogênio pelo ativador tecidual do plasmin-ogênio (t-PA) resulta na formação da plasmina, que degrada a fibrina em produtos de degradação da fibrina (PDF). Inibição da fibrinólise: em presença de análogos de lisina (ácido tranexâmico ou ácido epsilon-aminocapróico), estes ocupam o sítio de ligação da lisina, impedindo a ligação da plasmina (ou plasminogênio) à fibrina.Fonte: Adaptado de Fergusson; Levi11 e Santos et al.12

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Antifibrinolítico em cirurgia cardiaca: como e quando usar?

sido atribuídos ao EACA. Não obstante, essas compli-cações podem ser associadas ao uso prolongado de altas doses dessa medicação.4,6

teraPia CoM aNtiFiBriNoLítiCos assoCiada à redUção de CitoCiNas Pró-iNFLaMatórias

O sangue exposto a superfícies estranhas do circuito da CEC, endotoxemia e lesão por isquemia--reperfusão têm contribuído para a resposta infla-matória associada às cirurgias cardíacas. Os fatores associados a essa resposta são a ativação do comple-mento, da coagulação e do sistema fibrinolítico. Inter-leucina 6 e 8 (IL-6 e IL-8) são duas citocinas pró-infla-matórias que estão sabidamente aumentadas durante e após cirurgia cardíaca com CEC. A elevação dos níveis dessas citocinas depois da CEC são associadas a aumento do risco de lesão orgânica e morte.8

Greilich et al.8 acompanharam 60 pacientes com-parando os níveis séricos de D-dímero (marcador de fibrinólise), IL-6 e IL-8 antes, durante e depois da cirurgia cardíaca com CEC. Os pacientes receberam EACA, aprotinina ou solução salina em regimes de doses similares. Esse estudo demonstrou que o EACA reduziu com significância estatística os níveis de D--dímero e IL-8 em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com CEC. Esses resultados foram equivalen-tes aos obtidos com aprotinina. Já os níveis de IL-6 também foram reduzidos com as duas medicações, mas sem significância estatística. Os resultados en-contrados indicam que os efeitos dos antifibrinolíti-cos sobre as IL-6 e IL-8 (citocinas pró-inflamatórias) são devidos à inibição da ativação excessiva da plas-mina ou à formação do D-dímero, ou a ambos.8

A ativação do complemento pela plasmina pro-duz anafilatoxinas (C3a e C5a), que ativam leucócitos e esses irão liberar citocinas pró-inflamatórias. Pes-quisa feita por Syrovets et al.18 demonstrou que a plas-mina pode também induzir diretamente a liberação de citocinas pró-inflamatórias (IL-1α, IL-1β e TNF-α) por monócitos.8

A supressão da formação de D-dímero pode con-tribuir para a redução das citocinas pró-inflamatórias. Estudos in vitro sugerem que monócitos expostos a fragmentos de D-dímero iniciam a síntese e liberação de IL-6. Esses resultados reforçam que a fibrinólise contribui para a resposta inflamatória.8

autores concluíram que esse esquema foi suficiente para diminuir sangramento depois da CEC e que altas doses não providenciaram benefícios hemostáticos adicionais. Dowd et al.15 sugeriram uma dose de bolos de 12,5 mg/kg seguidos por uma infusão contínua de 6,5 mg/kg/h associados a 1 mg/kg da droga dissolvida na solução de priming do circuito da CEC.4,6

A concentração alvo do TXA para inibir efetiva-mente a fibrinólise durante a CEC é de 10-20 µg/L.3

Efeitos colaterais

Os análogos da lisina inibem a fibrinólise sem su-primir a geração de trombina. Portanto, existe uma preocupação com os efeitos pró-trombóticos dessas drogas e o aumento do risco de eventos vasculares. Em cirurgia cardíaca com CEC, a infusão dessas dro-gas depois da heparinização e através de um cateter venoso periférico tem sido recomendada. Contudo, revisões sistemáticas e metanálises não confirmam essas preocupações. Em contraste com a aprotinina, o uso de EACA e TXA não foi associado a aumento de insuficiência renal, infarto do miocárdio e choque quando comparado com o grupo sem tratamento no estudo observacional de Mangano et al.16

Os mais frequentes efeitos adversos relatados com o uso do TXA são sintomas gastrointestinais menores, como náusea e vômito, especialmente quando admi-nistrado em altas doses ou injetado rapidamente. A administração de TXA foi associada à alta incidência de convulsões. Avaliação feita por Martin et al.17 em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com CEC mostrou aumento de convulsões associado ao uso de TXA quando comparado com altas doses de apro-tinina (4,6% versus 1,2%, respectivamente). Ender et al. avaliaram três grupos que usaram: altas doses de aprotinina, altas doses de TXA e baixas doses de TXA. Tal trabalho mostrou taxas de convulsões de 1,6% no grupo da aprotinina, 2,9% no grupo do TXA baixas doses e 13,3% no grupo do TXA altas doses. Fibrilação atrial persistente também foi associado ao uso de TXA segundo Martin et al.17(7,9% grupo TXA versus 2,3% no grupo da aprotinina).3,6

O EACA pode produzir microglobulinúria devido a bloqueio reversível e não prejudicial nos sistemas de reabsorção tubular renal. Necrose tubular aguda, disfunção renal induzida por mioglobina, trombose glomerular e obstrução do trato urinário superior têm

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S3-S8 7

Antifibrinolítico em cirurgia cardiaca: como e quando usar?

têm sido publicados trabalhos avaliando a eficácia desses agentes quando utilizados por via tópica.19

Além da reduzida absorção sistêmica, potencial-mente com menos efeitos adversos, outra razão para a administração tópica dos antifibrinolíticos seria a ação direta sobre o foco de aumento da atividade fibrinolí-tica. Sabe-se que em condições fisiológicas o pericár-dio humano contém grandes quantidades de ativador tecidual do plasminogênio, o que garante a fluidez do líquido pericárdico e previne a formação de aderên-cias. Diante disso, alguns autores têm demonstrado que, em pacientes submetidos à cirurgia cardíaca, os níveis de complexo antitrombina/trombina e produtos de degradação da fibrina estão significativamente au-mentados no líquido da cavidade pericárdica em rela-ção aos níveis sistêmicos, demonstrando a magnitude da atividade fibrinolítica local.19

Em 2009, Abrishami et al.19 publicaram um tra-balho de revisão no qual foram avaliados estudos comparando a administração tópica de agente anti-fibrinolítico e placebo. Os antifibrinolíticos utilizados foram aprotinina e ácido tranexâmico. Nenhum es-tudo utilizou EACA. Entre as pesquisas comparando aprotinina e placebo houve diminuição no sangra-mento pelo dreno nas primeiras 24 horas em favor do grupo aprotinina, embora a necessidade de transfu-são de concentrado de hemácias não tenha sido es-tatisticamente significante entre os dois grupos. Em relação ao uso do ácido tranexâmico versus placebo, os resultados foram semelhantes em favor do grupo TXA quanto ao conteúdo do dreno nas primeiras 24 horas e à não significância estatística persistindo quanto ao uso de concentrados de hemácias.19

O uso tópico do EACA também foi avaliado por Breda et al.20 em cirurgia de revascularização miocár-dica, comparando seu uso com placebo (n=53). Os resultados mostraram redução do sangramento pelo dreno nas primeiras 24 horas e menos necessidade de transfusão de hemoderivados no grupo EACA, am-bos com significância estatística. Apesar do limitado número de pacientes incluídos no estudo, os autores concluíram que o EACA tem efeito positivo em rela-ção à diminuição do sangramento e necessidade de hemotransfusão quando utilizado por essa via.

Efeitos adversos sobre o pericárdio, como aumen-to de aderências, assim como a real eficácia desses agentes administrados por via tópica, precisam ser avaliados por pesquisas com número mais alto de pa-cientes antes que tal prática se torne rotina.

aNtiFiBriNoLítiCos: Uso Pré-iNCisão x Pós-HePariNização

Sabe-se que, entre os antifibrinolíticos disponí-veis atualmente, há risco teórico em relação ao au-mento na incidência de eventos tromboembólicos quando são administrados a pacientes não heparini-zados. Isso ocorre porque tais agentes têm forte efeito inibitório sobre a fibrinólise enquanto a geração de trombina persiste.2

Em cirurgia cardíaca há quatro momentos cru-ciais em que a fibrinólise é desencadeada: incisão da pele, esternotomia, pericardiotomia e circulação ex-tracorpórea. A maioria das avaliações sobre eficácia dos agentes antifibrinolíticos utiliza infusão de tais drogas iniciada antes da incisão da pele, ou seja, pré--heparinização.

Pensando nisso, Kluger et al.2 compararam a eficá-cia do EACA pré-incisão da pele e pós-heparinização em pacientes submetidos à cirurgia de revasculariza-ção do miocárdio. Trata-se de um estudo randomiza-do, duplo-cego, placebo controlado com a participa-ção de 90 pacientes com características demográficas homogêneas. Esses pacientes foram alocados em três grupos: um placebo e dois EACA (pré-incisão e pós-heparinização). Os resultados mostraram, como esperado, redução do sangramento pós-operatório nos grupos EACA, não havendo diferença estatisti-camente significante entre esses dois grupos. Diante disso, os autores do citado trabalho recomendam a utilização do EACA após a anticoagulação devido à mesma eficácia e aos riscos teóricos de complicações trombóticas com a utilização pré-incisão.

É importante, no entanto, considerar que este es-tudo tem algumas limitações, principalmente em rela-ção ao tipo de cirurgia (CRVM) e ao antifibrinolítico investigado (EACA). Outra questão a ser lembrada é que ele não foi desenhado para comparar a incidên-cia de eventos trombóticos entre os dois grupos EACA (pré-incisão e pós-heparina). Desse modo, os resulta-dos não devem ser extrapolados para outros cenários.

Uso tóPiCo de aNtiFiBriNoLítiCos

Em razão dos riscos teóricos relacionados ao uso sistêmico dos antifibrinolíticos e a partir do reconhe-cimento das propriedades de barreira natural do pe-ricárdio, impedindo a difusão livre de substâncias,

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Antifibrinolítico em cirurgia cardiaca: como e quando usar?

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CoNCLUsão

Embora o uso de antifibrinolíticos em cirurgia cardíaca já ocorra há vários anos, algumas ques-tões, especialmente em relação à incidência de complicações trombóticas, ainda necessitam de melhor elucidação. A via de administração tópica recentemente hipotetizada como alternativa para a redução dos efeitos adversos decorrentes da ad-ministração sistêmica ainda necessita de melhor evidência científica antes de tornar-se rotina em ci-rurgia cardíaca. Alguns autores têm recomendado início da infusão de tais drogas após a hepariniza-ção plena em cirurgia de revascularização miocár-dica, sob o argumento de que tal prática não altera o resultado em termos de sangramento e, potencial-mente, diminuiria a incidência de complicações trombóticas. No entanto, investigações com outros tipos de cirurgias e destinados a testar o impacto sobre tais complicações são necessários.

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artiGo de revisão

Instituição:Hospital Nossa Senhora das GraçasSete Lagoas, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Fernando José BuitragoRua Cândido Azeredo, Centro Médico, número 21, sala 304. CEP 35700-019 Sete Lagoas, MG – BrasilE-mal: [email protected]

1 TSA-SBA, médico anestesiologista do Hospital Nossa Senhora das Graças,Hospital Municipal Monsenhor Flávio D’Amato e do Hospital Unimed de Sete Lagoas. Sete Lagoas, MG – Brasil.2 Clínico, médico anestesiologista do Hospital Nossa Se-nhora das Graças e do Hospital Unimed de Sete Lagoas. Sete Lagoas, MG – Brasil.3 Médico anestesiologista do Hospital Nossa Senhora das Graças e do Hospital Unimed de Sete Lagoas. Sete Lagoas, MG – Brasil.

resUMo

A decisão de se recomendar exames, medidas cardioprotetoras ou terapêuticas para um paciente que irá ser submetido a uma cirurgia não cardíaca, em última análise, se torna um ato de equilíbrio entre as probabilidades estimadas de eficácia versus risco. Exemplo disso é a redução do número de exames pedidos no pré-operatório após a implementação das recomendações do American College of Cardiology (ACC) Foundation/American Heart Association (AHA). Nos pacientes candidatos à cirurgia de aorta, 88% eram submetidos a teste de estresse com imagem nuclear, 24% a cateterismo cardíaco e 24% à revascularização do miocárdio (CRVM) no pré-operatório. Com a implementação das recomendações, estes números caíram para 47, 11 e 2%, respectiva-mente. Os custos gerais da avaliação pré-operatória reduziram-se de U$ 1.087 para U$ 171. Ao mesmo tempo, o desfecho perioperatório foi melhor. O índice de morte/infarto do miocárdio caiu de 11 para 4%1. O objetivo deste artigo de atualização é discutir as principais recomendações da AHA/ACC e destacar a importância de sua aplicação no dia-a-dia do anestesiologista.

Palavras-chave: Período Pré-Operatório; Assistência Perioperatória; Exame Físico; Antagonistas Adrenérgicos beta; Anestesia; Anestesiologia.

aBstraCt

The decision to recommend exams, heart-protective or therapeutic measures for a patient who will be submitted to a non-cardiac surgery, in the final analysis, becomes an act of balance between estimated probabilities of effectiveness versus risk. An example is the reduced number of exams required in the preoperative period after implementing the recommendations of the American College of Cardiology (ACC) Foundation/American Heart Association (AHA). In patients candidates for aortic surgeries, 88% were submit-ted to nuclear image stress test, 24% to cardiac catheterism and 24% were submitted to myocardial revascularization (MR) in the preoperative period. By implementing the recommendations, these numbers dropped to 47%, 11% and 2% respectively. General costs of preoperative evaluations reduced from U$1087 to U$171. At the same time, the perioperative outcome was better. The death/myocardial infarction rate dropped from 11% to 4%1.The purpose of this updating paper is to discuss the main recommendations of AHA/ACC and to highlight the importance of their implementation the day-by-day of the anesthesiologist.

Key words: Preoperative Period; Perioperative Care; Physical Examination; Adrenergic beta-Antagonists; Anesthesia; Anesthesiology.

Preoperative cardiovascular evaluation for noncardiac surgery

Fernando José Buitrago1, Jonas Alves Santana2, Leandro Ferreira Guimarães3, Maurício Delage Henriques3, Waldívio Marcos de Almeida Júnior3

Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

ficiência cardíaca (IC) no exame clínico. Baseado nes-tes fatores clínicos e no teste de esforço, os autores pro-puseram nova estratificação de risco pré-operatório.

Alguns anos depois, no final da década de 90, Lee et al.6 analisaram pacientes submetidos à cirurgia não cardíaca e indicaram seis fatores clínicos associados a complicações cardiovasculares perioperatórias. Pela primeira vez foi constatada a insuficiência renal como fator de risco. Esse estudo foi pioneiro, também, em identificar o tipo de cirur-gia como fator de risco. Os seis fatores detectados foram: cirurgia de alto risco, doença cardíaca isquêmica, histórico de IC, de doença cérebro-vascular, DM em tratamento com insulina e creatinina sérica pré-operatória > 2 mg/dL

Pode-se observar que os fatores de risco clássicos para doenças cardiovasculares como hipertensão arte-rial sistêmica (HAS), dislipidemia, tabagismo e histórico familiar de doenças cardiovasculares não aparecem nos estudos citados. É fato que tais fatores estão associados à doença arterial coronariana (DAC), mas não necessaria-mente a complicações cardiovasculares perioperatórias. Isto leva a crer que o risco de complicações não está rela-cionado à DAC em si, mas à probabilidade de a placa ate-romatosa se tornar instável durante o estresse cirúrgico.

Neste contexto, pode-se notar que os testes de esfor-ço, que são bastante sensíveis para detectar doença ate-rosclerótica coronariana, têm valor preditivo negativo muito alto, ou seja, diante de teste de esforço negativo, a probabilidade de evento cardiovascular desfavorável é muito baixa. Porém, como os testes de esforço não são suficientes para informar quais placas são de fato ins-táveis, seu valor preditivo positivo para complicações cardiovasculares perioperatórias é baixo, em média, 12% para os testes de estresse com tálio e 20% para o ecocardiograma de estresse com dobutamina9. Portan-to, diante de teste positivo, a probabilidade de evento cardiovascular adverso no perioperatório é reduzida.

Levando-se em conta todas essas evidências científicas, finalmente, em 2007, o American College of Cardiology e a American Heart Association (ACC/AHA) publicaram um im-portante guideline para avaliação cardíaca perioperatória para pacientes candidatos a cirurgias não cardíacas e orien-tações para uso de estratégias protetoras.7 Nesse mesmo ano, a Sociedade Brasileira de Cardiologia publicou sua I Diretriz de Avaliação Perioperatória.8 Em 2009, novamente a ACC/AHA publicaram atualização das recomendações do uso dos beta-bloqueadores no perioperatório incorporado ao guideline de 2007.1

A seguir, serão discutidas essas diretrizes, citando-se as classes de recomendação assim como o nível de evi-dência das recomendações (Tabela 1).

iNtrodUção

A maioria dos pacientes submetidos à cirurgia não car-díaca apresenta baixo risco cardíaco pré-operatório e não necessita de extensa avaliação com exames complemen-tares. Porém, é de fundamental importância identificar quais são aqueles com risco elevado e direcionar-lhes con-dutas adequadas para a redução da morbimortalidade.

A decisão de recomendar exames, medidas cardio-protetoras ou terapêuticas para um paciente que irá ser submetido a uma cirurgia não cardíaca, em última análi-se, se torna um ato de equilíbrio entre as probabilidades estimadas de eficácia versus risco. Exemplo disso é a re-dução do número de exames pedidos no pré-operatório após a implementação das recomendações do American College of Cardiology (ACC) Foundation/American Heart Association (AHA). Nos pacientes candidatos à cirurgia de aorta, 88% eram submetidos a teste de estresse com imagem nuclear, 24% a cateterismo cardíaco e 24% à re-vascularização do miocárdio (CRVM) no pré-operatório. Com a implementação das recomendações da ACC/AHA, estes números caíram para 47, 11 e 2%, respectivamente. Os custos gerais da avaliação pré-operatória reduziram--se de U$ 1.087 para U$ 171. Ao mesmo tempo, o desfecho perioperatório foi melhor. O índice de morte/infarto do miocárdio caiu de 11 para 4%.1

HistóriCo

Durante a década de 1960, a Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA) criou uma das primeiras clas-sificações do risco perioperatório. Essa classificação, extremamente simples, previa a extratificação dos pa-cientes, de acordo com seu estado físico, em cinco cate-gorias, sendo que em 1995 foi acrescentada a sexta.2 Na expectativa de estratificar melhor o risco cardiovascu-lar, em 1977 Goldman et al.3 criaram o primeiro escore baseado em variáveis clínicas após a análise de regres-são multivariável de 1.001 pacientes. Essa classificação de Goldman ainda é utilizada nos dias de hoje e funda-mentou a criação de outros índices, como o de Detsky4.

Analisando retrospectivamente os pacientes sub-metidos à cirurgia vascular, em 1996 Eagle et al.5 iden-tificaram cinco fatores fortemente ligados a complica-ções cardiovasculares subsequentes. São eles: idade avançada, diabetes mellitus (DM) com necessidade de tratamento farmacológico, histórico de angina, de in-farto miocárdico ou presença de onda Q patogênica no eletrocardiograma (ECG) e histórico ou sinais de insu-

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

tes riscos cardíacos. Isto se deve a fatores cirúrgicos específicos como grau de deslocamento de fluidos, níveis de estresse, duração do procedimento, perda sanguínea ou fatores inerentes ao paciente.

Os procedimentos cirúrgicos foram classificados como de alto risco (> 5%), risco intermediário (1 a 5%) e baixo risco (<1%)1,7 (Tabela 3). Apesar de a do-ença coronariana ser o maior fator de risco para mor-bidade perioperatória, procedimentos com diferen-tes níveis de estresse estão associados a diferentes níveis de morbimortalidade. Procedimentos superfi-ciais e oftalmológicos representam os de menos ris-co. Grandes procedimentos vasculares representam os de mais alto risco e são agora uma consideração à

avaliação passo a passo

Diante de uma emergência cirúrgica, a avaliação pré-operatória deve ser limitada a testes e exames que não posterguem o procedimento (classe I, nível de evidência C). A verificação dos sinais vitais, da condição volêmica, do hematócrito, eletrólitos, fun-ção renal e do ECG de superfície podem ser acessa-dos rapidamente. Avaliação mais detalhada pode ser conduzida após a cirurgia.1,7

Tratando-se de procedimentos eletivos, descobrir qual paciente necessita de mais cuidados antes de se submeter a uma cirurgia é o grande objetivo e de-safio para promover redução na morbimortalidade. Essa etapa muitas vezes deve ser discutida de forma multidisciplinar. Todas as estratégias devem resultar em baixo risco global.

Os estudos citados anteriormente mostram que a estratificação do risco cardiovascular de pacientes candidatos à cirurgia não cardíaca foi predominan-temente baseada em fatores clínicos. Sendo assim, uma boa anamnese e exame físico são importantes preditores de complicações cardíacas. Na entrevista, é imprescindível pesquisar quais as condições clíni-cas capazes de colocar o paciente em risco durante o procedimento cirúrgico. Deve-se dar atenção, primei-ramente, às condições cardíacas mais graves, como angina em repouso (instável) ou em “crescendo”, arritmias graves, IC descompensada e doença valvar grave (Tabela 2). A determinação de qualquer uma delas contraindica cirurgia não cardíaca eletiva até que sejam avaliadas e tratadas adequadamente (clas-se I, nível de evidência B).1,7

Informações mais detalhadas sobre o procedi-mento a ser realizado também são necessárias. Dife-rentes cirurgias podem estar relacionadas a diferen-

Tabela 1 - Níveis de evidência e classes de recomendação

Níveis de evidência Classes de recomendação

Nível a resultados derivados de múltiplos ensaios clínicos randomizados ou de metanálises ou revisões sistemáticas Classe i Benefício >>> risco

Procedimento/tramento ou teste terapêutico são recomendados

Nível B resultados derivados de um único ensaio clínica randomizado ou de estudos controlados não randomizados Classe iia Benefício >> risco Pode ser aplicado devido à sua

performance

Nível C resultados baseadas em séries de casos ou diretrizes baseadas na opinião de especialistas Classe iib Benefício ≥ risco Pode ser considerado

Nível d Coorte histórica, não randomizada ou estudo de caso controle Classe iii risco ≥ Benefício Pode ser prejudicial

indeterminada Continua sendo avaliado

Não é recomendado até ser mellhor estudado

Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:1761.

Tabela 2 - Condições cardíacas agudas que contrain-dicam cirurgia não cardíaca eletiva

Níveis de evidência

síndromes coronárias instáveis:- angina instável ou grave (CCs classe iii ou iv)*.- iM recente**

iC descompensada (NyHa classe iv, iC evoluindo com piora ou nova iC)

arritmias graves: - Bloqueio átrio-ventricular de alto grau- Bloqueio átrio-ventricular 2º grau mobitz tipo ii- arritmias ventriculares sintomáticas - arritmias supraventriculares com frequência ventricular não controlada (FC superior a 100 bpm em repouso)- Bradicardia sintomática- taquicardia ventricular nova identificada

doença valvar grave:- estenose aórtica grave (gradiente de pressão médio acima de 40 mmHg, área valvar menor que 1,0 cm2 ou sintomática)- estenose mitral grave (dispneia progressiva aos esforços, pré-síncope com esforço ou iC)

CCs, Canadian Cardiovascular Society; NyHa, New York Heart Association; iC, insuficiência cardíaca; FC, frequência cardíaca; iM, infarto do miocárdio.*inclui angina estável em pacientes sedentários**a American College of Cardiology National Database Library define iM re-cente como ocorrido há mais de sete dias e igual ou menos de 30 dias.Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:176.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

Os fatores clínicos de risco para complicações cardiovasculares listados nas recentes recomenda-ções da ACC/AHA são:

■ Insuficiência coronariana ■ Insuficiência cardíaca compensada ou prévia ■ Doença cérebro-vascular ■ Diabetes mellitus ■ Insuficiência renal (definida como creatinina séri-

ca pré-operatória superior a 2 mg/dL).1

As indicações de teste de estresse não invasivo e do uso de beta-bloqueadores no perioperatório vão depender do tipo de cirurgia à qual o paciente será submetido e do número de fatores clínicos de risco. As indicações precisas dessas intervenções serão discutidas mais detalhadamente adiante nos tópicos “Exames complementares” e “Estratégias cardiopro-tetoras medicamentosas”.

O resumo da avaliação pré-operatória passo a passo para pacientes candidatos à cirurgia não cardí-aca pode ser visto no fluxograma a seguir (Figura 1).

parte na decisão de se realizar uma avaliação adicio-nal. Reparação de aneurisma aórtico endovascular e endarterectomia de carótida devem ser considerados na categoria de risco intermediário em razão de suas taxas de morbidade e mortalidade perioperatórios. Vale lembrar, porém, que em longo prazo a taxa de mortalidade entre os pacientes submetidos a estes procedimentos é alta e deve ser levada em conta du-rante a condução clínica do paciente.

Na categoria de risco intermediário, morbidade e mortalidade variam dependendo da localização cirúrgica e extensão do procedimento. Alguns proce-dimentos são curtos, com mínimo deslocamento de fluidos, entretanto, outros podem estar associados a expressivas trocas volêmicas, duração prolongada e alto potencial de isquemia miocárdica e depressão respiratória pós-operatória. Portanto, o médico-assis-tente deve exercer o julgamento da avaliação correta dos riscos cirúrgicos perioperatórios e da necessida-de de estudo adicional.

O próximo passo é discriminar qual a capacida-de funcional de acordo com as atividades diárias do paciente (Tabela 4). Capacidade funcional acima de 7 equivalentes metabólicos (METs) é considerada ex-celente, de 4 a 7 METs boa e abaixo de 4 METs ruim. Boa capacidade funcional (>4 METs) dispensa a ne-cessidade de teste de estresse, desde que o paciente não tenha sintomas cardiológicos (classe I, nível de evidência B). Diante de capacidade funcional ruim, deve-se investigar outros fatores.1,7

Tabela 4 - Capacidade funcional

Consumo de oxigênio em equivalente

metabólico (Met)*tipos de atividade

1 Met

Comer, vestir-se, usar o banheiro

Caminhar dentro de casa

Pouca atividade

Caminhadas curtas (02 quarteirões) com velocidade de no máximo 4,8 km/h

4 Mets

subir escadas

Caminhar a 6,4 km/h

Correr pequenas distâncias

Limpar assoalhos ou móveis

atividades recreativas moderadas: dançar, jogar tênis em dupla

> 10 MetsParticipar de esportes extenuantes: natação, tênis individual, basquete, futebol

* Met = o consumo de oxigênio (vo2) de um homem de 40 anos, com 70 kg em repouso é de 3,5 mL/kg/min ou correspondente a 1 Met.

Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:182.1

Tabela 3 - Extratificação do risco cardíaco para cirur-gias não cardíacas

Cirurgia vascular(risco cardíaco

> 5%)

intermediário(risco cardíaco 1

a 5%)

Baixo(risco cardíaco

<1%)

Cirurgia vascular periférica

endarterectomia de carótida

Procedimentos endoscópicos ou superficiais

operações intratorácicas e intraperitoneais

operação de catarata

operações de cabeça e pescoço e urológicas

operação de mama

operações ortopédicas

operações ambulatoriais

Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:181.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

Já nos pacientes sem fatores de risco, o ECG de repouso geralmente não traz informações relevantes para o planejamento anestésico-cirúrgico. ECG anor-mal é encontrado em 62% dos pacientes com DAC co-nhecida, em 44% dos pacientes com fatores de risco e em apenas 7% dos com menos de 50 anos sem fatores de risco. A especificidade de uma anormalidade no ECG em relação a um evento cardíaco adverso pós--operatório é de apenas 26%. Além do mais, ECG nor-mal não exclui doença cardíaca.10

Sendo assim, o ECG de 12 derivações de repouso pré-operatório é recomendado para pacientes com pelo menos um fator de risco clínico que serão sub-metidos a procedimentos vasculares (classe de reco-

exaMes CoMPLeMeNtares

ECG de 12 derivações em repouso

Nos pacientes com DAC conhecida, o ECG de re-pouso pode trazer importantes informações prognós-ticas de morbidade e mortalidade de longo prazo. A magnitude e a extensão das ondas Q podem estimar de forma rude a capacidade contrátil do ventrículo es-querdo (VE). Achados como o infradesnivelamento do segmento ST maior que 0,5 mm, hipertrofia do VE com padrão strain e bloqueio completo do ramo esquerdo estão relacionados a reduzida expectativa de vida.1,7

Figura 1 - SCA, síndrome coronariana aguda; IC, insuficiência cardíaca; MET, equivalente metabólico; FC, frquência cardíaca

Fonte: Adaptado de Circulation. 2009;120:180.1

1o passo Sala de cirurgia Vigilância perioperatóriae pós operatória

Cirurgia de baixo risco?

Cirurgia de urgência?

Condição cardíaca aguda?(SCA, IC classe IV, arritimiagrave, doença valvar grave)

Prosseguir com planejamento cirúrgico

Prosseguir com planejamento cirúrgicoCapacidade funcional(>4 METs) assintomático?

Prosseguir com planejamentocirúrgico

Cirurgia vascular

Considerar testesse eles irão

mudar o manuseio

Classe I nível BCirurgia Vascular

Prosseguir com planejamento cirúrgico, controle da FC (Classe IIa nível B) ou considerar testes não invasivos (Classe IIb nível B) se irão mudar o manuseio

SimClasse I nível C

2o passo

3o passo

4o passo

5o passo

Não

Classe I nível BAvaliar e tratar Considerar Cirurgia

Não

SimClasse I nível C

Não

SimClasse I nível C

Não ou desconhecido

3 ou mais fatores de risco 1 ou 2 fatores de risco sem fatores de risco

Risco Cirúrgicointermediário

Risco cirúrgicointermediário

Classe I nível B

Sim

SCA, síndrome coronariana aguda; IC, insu�ciência cardíaca; MET, equivalente metabólico; FC, frquência cardíaca

Fonte: Adaptado de Circulation. 2009;120:180.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

A sensibilidade do teste ergométrico em detectar isquemia depende da extensão e do grau de estenose da lesão. Cerca de 50% dos pacientes com doença coronariana univascular, que atingem nível de exer-cício adequado, têm teste negativo.12 A sensibilidade e especificiade médias do teste ergométrico são de 68 e 77%, respectivamente. Esses valores se elevam para 81 e 66% no caso de lesões multivasculares e 86 e 53% diante de lesões trivasculares ou do tronco da coronária esquerda.13

Como preditor de complicações cardiovasculares perioperatórias, o teste ergométrico não se mostrou tão eficaz. McPhail et al.14 realizaram estudo com 100 pacien-tes que seriam submetidos à cirurgia vascular periférica ou de correção de aneurisma de aorta abdominal. Desta série, 30 pacientes atingiram 85% da frequência cardíaca esperada para a idade e apenas dois tiveram complica-ções no perioperatório (6%). Em contraste, 70% da amos-tra não atingiram 85% da frequência cardíaca esperada para a idade ou tiveram alterações no ECG sugestivas de isquemia durante o exame; 17 pacientes tiveram compli-cações cardiovasculares nesse grupo (24%).14

Recomendações para teste de estresse não invasivo antes de cirurgia não cardíaca

Nos pacientes ambulatoriais que têm indicação de propedêutica complementar para investigação de DAC, o teste ergométrico é o exame de escolha.1,7 Ele permite estimar com precisão a capacidade funcional, além de

mendação I, nível de evidência: B). É recomendado também para os pacientes com histórico de DAC, doença arterial periférica ou cérebro-vascular que serão submetidos a procedimentos cirúrgicos de ris-co intermediário (classe de recomendação I, nível de evidência: C). Parece razoável o ECG pré-operatório em pessoas sem fatores de risco clínico que irão se submeter a procedimentos cirúrgicos de alto risco (classe de recomendação IIa, nível de evidência: B). Nos pacientes assintomáticos que serão submetidos a procedimentos de baixo risco, independentemen-te da idade, o ECG pré-operatório não está indicado (classe de recomendação III, nível de evidência B).1,7

avaliação da função do ve

A função do VE em repouso pode ser avaliada por angiografia com radionuclídeos, ecocardiograma e ventriculografia com contraste. É de se salientar que a avaliação da função do VE, isoladamente, não é um preditor consistente de eventos isquêmicos.1,7

Porém, como dito anteriormente, a existência de qualquer grau de disfunção do VE é um fator de risco para complicações cardíacas perioperatórias. Rohde et al. puderam constatar isto em um estudo com 570 pacientes utilizando ecocardiograma trans-torácico (ETT) antes de grandes cirurgias não cardí-acas. A chance de infarto do miocárdio ou de edema pulmonar cardiogênico foi de duas vezes mais nos pacientes com algum grau de disfunção sistólica no ETT (OR 2,1, IC 1,0–4,5; p=0,05). A análise da sensibi-lidade, valor preditivo positivo, especifidade e valor preditivo negativo de qualquer grau de disfunção do VE como preditor de eventos cardíacos adversos foi de 43, 13, 76 e 94%, respectivamente.11

As recomendações para avaliação da função do VE da ACC/AHA estão listadas na Tabela 5.

teste ergométrico e capacidade funcional

O objetivo do teste ergométrico é fornecer uma medida objetiva da capacidade funcional, identificar a presença de isquemia miocárdica importante ou arritmias cardíacas, estimar o risco cardíaco periope-ratório e o prognóstico em longo prazo. Capacidade funcional ruim pode ser causada por vários fatores, entre eles, reserva cardíaca inadequada, idade avan-çada, disfunção miocárdica transitória, falta de con-dicionamento e reserva pulmonar ruim.

Tabela 5 - Recomendações para avaliação não in-vasiva da função do VE no pré-operatório

Classe iia

1. é razoável que os pacientes com dispneia de origem desconhecida se submetam à avaliação pré-operatória da função do ve (nível de evidência: C)

2. é razoável que os pacientes com insuficiência cardíaca, atual ou anterior, com piora da dispneia ou qualquer outra alteração no estado clínico se submetam à avaliação pré-operatória da função do ve, se não executada nos últimos 12 meses (nível de evidência: C)

Classe iib

1. a reavaliação da função ventricular em pacientes clinicamente estáveis, com cardiomiopatia documentada anteriormente, não está bem-estabelecida (nível de evidência: C)

Classe iii

1. avaliação da função do ve pré-operatória de rotina não é recomendada (nível de evidência: B)

Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:189.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

estudada foi predominantemente de pacientes can-didatos à cirurgia vascular.38-53 Os protocolos utiliza-dos foram bastante parecidos, mas não idênticos. A definição de teste positivo e negativo foi diferente em alguns estudos, devido à análise subjetiva da con-tratilidade segmentar do miocárdio. Por exemplo, a piora de uma anormalidade contrátil preexistente foi considerada achado positivo em alguns trabalhos e negativo em outros. Os desfechos analisados foram divididos em “leves” (arritmia, IC, isquemia) e “gra-ves” (IM e morte por causa cardíaca). A porcentagem de testes positivos variou de 5 a 50%. O valor prediti-vo positivo para eventos graves variou de 0 a 33%. O valor preditivo negativo variou de 93 a 100%.

As recomendações para a realização de testes de estresse não invasivos estão na Tabela 6.

Já nos pacientes com isquemia miocárdica im-portante diagnosticada previamente que serão sub-metidos à cirurgia não cardíaca de alto risco, é geral-mente apropriado realizar angiografia coronária ou tentar estabilizá-los com tratamento medicamentoso agressivo em vez de realizar teste de estresse. De forma geral, as indicações de angiografia coronária para os pacientes cirúrgicos são as mesmas das situ-ações não cirúrgicas.

detectar isquemia miocárdica a partir das alterações no ECG e da resposta hemodinâmica ao exercício.

Nos pacientes que têm indicação de investiga-ção complementar para DAC e são incapazes de se exercitarem, os testes de estresse farmacológico com vasodilatadores (adenosina e dipiridamol) ou cronotrópicos (dobutamina ou marcapasso), em conjunto com imagens por radionuclídeos (tálio-201 e tecnécio-99m) ou ecocardiografia, têm sido as téc-nicas mais utilizadas. Eles permitem esta avaliação a partir do aumento da relação demanda/oferta de O

2 do miocárdico. Recentemente, as indicações des-tes testes têm diminuído. Apesar de terem marcante sensibilidade para detecção de DAC, esses exames não apresentam a mesma eficácia em predizer even-tos cardíacos perioperatórios adversos, não sendo, assim, indicados para pacientes sem fatores de risco.

Eficácia dos testes de estresse não invasivos

Os exames de perfusão miocárdica por radionuclí-deo (ex: cintilografia miocárdica) permitem avaliar os defeitos reversíveis de perfusão do miocárdio e, portan-to, a extensão do miocárdio sob risco. Em série de 23 estudos que avaliaram pacientes candidatos à cirurgia vascular15-37, a porcentagem de exames com evidência de miocárdio sob risco variou de 23 a 69%. Já o valor preditivo positivo desses exames para morte ou IM perio-peratório variou de 2 a 20%. Pode-se ver que existe baixa taxa de pacientes com exames alterados que realmente cursam com complicações cardiovasculares no periope-ratório. Entretanto, devido à sua alta sensibilidade para DAC, o valor preditivo negativo é de aproximadamente 99%. Ou seja, diante de exame normal, o risco de IM ou morte por causas cardiovasculares perioperatórios é praticamente nulo. A maioria dos estudos mostra que de-feitos fixos de perfusão não têm valor preditivo positivo. Mesmo nos estudos que mostraram que esses defeitos fi-xos tinham risco aumentado em comparação com testes normais, esses riscos, ainda assim, foram mais baixos do que os riscos de um defeito reversível.

A ecocardiografia de estresse com dobutamina tem se tornado o principal método de estresse farmacológico com imagem por ultrassonografia. Com o aumento da frequência e da contratilidade cardíaca, lesões estenóticas importantes das coronárias podem ser diagnosticadas por anormalidades da contração das paredes irrigadas pelo vaso acometido.

De 1991 a 2009, 16 estudos na literatura de língua inglesa foram publicados, nos quais a população

Tabela 6 - Recomendações para realização de teste de estresse não invasivo antes de cirurgia não cardíaca

Classe i

1.Pacientes com problemas cardíacos ativos (síndromes coronarianas instáveis, insuficiência cardíaca, arritmias importantes e doença valvar grave), candidatos à cirurgia não cardíaca devem ser avaliados e tratados antes da cirurgia (nível de evidência: B)

Classe iia

1.é razoável a realização de testes não invasivos em pacientes com 3 ou mais fatores de risco clínicos e capacidade funcional ruim (menos de 4 Mets) que necessitam de cirurgia vascular (isto é, aorta e outros grandes vasos, assim como cirurgia vascular periférica) se for mudar a conduta (nível de evidência: B)

Classe iib

1.testes de estresse não invasivos devem ser considerados para pacientes com 1 ou 2 fatores de risco clínico e capacidade funcional ruim que necessitam de cirurgia de risco intermediário, se ele for mudar a conduta (nível de evidência: B) 2.testes de estresse não invasivos devem ser considerados para pacientes com pelo menos 1 a 2 fatores de risco clínicos e boa capacidade funcional (igual ou superior a 4 Mets) que são submetidos à cirurgia vascular (nível de evidência: B)

Classe iii

1.testes de estresse não invasivo não são úteis para pacientes sem fatores de risco clínico submetidos à cirurgia não cardíaca de risco intermediário (nível de evidência: C)2.teste de estresse não invasivo não é útil para pacientes submetidos à cirurgia não cardíaca de baixo risco (nível de evidência: C)

Fonte: adaptado de Circulation. 2009;120:192.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

quatro grupos de acordo com a terapia utilizada: 1) beta-bloqueador (bisoprolol); 2) estatina (fluvasta-tina); 3) combinação de beta-bloqueador e estatina (bisoprolol e fluvastatina); 4) grupo-controle (sem beta-bloqueador e estatina). Os critérios de inclusão foram pacientes candidatos à cirurgia não cardíaca com idade superior ou igual a 40 anos e risco de mor-te e IM perioperatórios entre 1 e 6%. Os critérios de exclusão foram uso prévio de beta-bloqueadores ou estatinas, contraindicação ao uso de beta-bloqueado-res ou estatinas, cirurgia de urgência ou emergência, colesterol alto de acordo com o National Cholesterol Consensus, ter participado do mesmo estudo previa-mente, síndromes coronarianas agudas ou evidência de DAC trivascular ou do tronco da coronária esquer-da. Diferentemente do POISE, nesse estudo o beta--bloqueador foi iniciado bem antes do dia da cirurgia (21 a 53 dias antes, mediana de 34 dias). A dose inicial de bisoprolol foi de 2,5 mg/dia e se a FC fosse superior a 50 bpm, eram feitos incrementos de 1,25 a 2,5 mg até o máximo de 10 mg/dia, objetivando manter a FC entre 50 e 70 bpm. Os desfechos avaliados foram mor-tes por causas cardíacas e IM não fatal nos 30 dias de acompanhamento após a cirurgia. No grupo bisopro-lol (n=533), a incidência tanto de morte quanto de IM não fatal foram mais baixas (2,1% versus 6,0% eventos; HR 0,34, IC 95% 0,17 a 0,67; p < 0,002). Sete pacientes tiveram AVC, sendo quatro no grupo bisoprolol e três nos grupos que não receberam bisoprolol.

O estudo de Poldermans et al.56 também obteve resultados condizentes com o efeito cardioprotetor dos beta-bloqueadores. Foram analisados 770 pa-cientes de risco intermediário distribuídos em dois grupos: com teste de estresse e sem teste de estresse pré-operatório. Todos receberam beta-bloqueadores com o objetivo de manter a FC entre 60 e 65 bpm. Nos pacientes com isquemia no teste de estresse, a frequência cardíaca era controlada para manter-se abaixo do limiar de isquemia. Não houve diferença na incidência de eventos cardíacos adversos nos dois grupos. Nos pacientes com FC abaixo de 65 bpm, o risco de eventos adversos foi mais baixo (1,3% versus 5,2%; OR 0,24, IC 95% 0,09 a 0,66; p<0,003). Os autores concluíram que o teste de estresse pode ser desne-cessário para pacientes de risco intermediário, des-de que estejam medicados com beta-bloqueadores e com a FC muito bem-controlada.

Outros estudos também foram publicados nestes últimos anos, como Boersma et al.57, Mangano et al.58, Juul et al.59, Raby et al.60, Zaugg et al.61, McGory et al.62,

estratéGias CardioProtetoras MediCaMeNtosas

Terapia com beta-bloqueadores

O uso de beta-bloqueadores no perioperatório foi bas-tante analisado na última década e, apesar dos diversos es-tudos publicados, ainda divide a opinião dos especialistas.

Um dos maiores estudos sobre o assunto, o POI-SE54, avaliou a eficácia de metoprolol de liberação prolongada ou placebo iniciados 2 a 4 horas antes da cirurgia e continuado por 30 dias nos desfechos primários de morte por causas cardiovasculares, IM não fatal e parada cardíaca não fatal. Os critérios de inclusão foram idade maior ou igual a 45 anos, expectativa de internação superior a 24 horas ou presença de pelo menos um dos seguintes fatores clí-nicos: histórico de DAC, doença vascular periférica, hospitalização por IC nos últimos três anos, candida-tos a grandes cirurgias vasculares. Foram incluídos também pacientes que tinham pelo menos três des-tes sete critérios: candidatos à cirurgia torácica ou in-traperitoneal, histórico de IC, ataque isquêmico tran-sitório, DM, creatinina sérica igual ou superior a 175 micromoles/L, idade maior que 70 anos ou indicação de cirurgia de urgência ou emergência. Os critérios de exclusão foram uso prévio de beta-bloqueadores e CRVM nos últimos cinco anos sem sintomas isquê-micos. A dose utilizada de metoprolol foi de 100 mg (comprimidos de liberação lenta) no pré-operatório e no pós-operatório imediato e 200 mg nos dias sub-sequentes até completar 30 dias. Nos casos de bra-dicardia com frequência cardíaca inferior a 45 bpm ou pressão sistólica inferior a 100 mmHg, a dose do metoprolol era suspensa até que as variávies hemodi-nâmicas citadas estivessem reestabelecidas. Foram avaliados 8.351 pacientes de 190 instituições em 23 países. O total de 8.331 pacientes completou o segui-mento após 30 dias de acompanhamento. Os resul-tados mostraram discreta redução na incidência de IM não fatal no grupo metoprolol (176 [4,2%] versus 239 [5,7%]; HR 0,73, IC 95% - 0,60 a 0,89; p < 0,0017). Porém, houve mais mortes no grupo metoprolol do que no grupo placebo (HR 1,33, IC 95% - 1,03 a 1,74; p < 0,0317). A incidência de acidente vascular cerebral (AVC) foi também superior no grupo metoprolol (41 [1,0%] versus 19 [0,5%] pacientes; HR 2,17, IC 95% - 1,26 a 3,74; p < 0,0053).

No estudo DECREASE IV55, os desfechos foram diferentes. Foram aleatorizados 1.066 pacientes em

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

Classe iib:

O uso de beta-bloqueadores é incerto para pa-cientes que são submetidos tanto a procedimentos de risco intermediário ou cirurgia vascular, em quem a avaliação peroperatória identificou um único fator de risco clínico na ausência de insuficiência corona-riana (nível de evidência C).

Classe iib:

O uso de beta-bloqueadores é incerto em pa-cientes que serão submetidos à cirurgia vascular com nenhum fator de risco clínico que não es-tejam tomando beta-bloqueadores previamente (nível de evidência B).

Classe iii:

Beta-bloqueadores não devem ser dados a pacientes submetidos à cirurgia que tem con-traindicações absolutas aos beta-bloqueadores (nível de evidência C).

Classe iii:

Administração de rotina de altas doses de beta-bloqueadores na ausência de dose titulada não é útil e pode ser prejudicial a pacientes que não tomam correntemente beta-bloqueadores e que serão submetidos à cirurgia não cardíaca (nível de evidência B).

O resumo das recomendações para uso de be-ta-bloqueadores no perioperatório pode ser visto na Tabela 7:

Wiesbauer et al.63. Por fim, avaliando os riscos e bene-fícios, a AHA/ACC1 fizeram as seguintes recomenda-ções em sua última diretriz de 2009:

Classe i:

Beta-bloqueadores devem ser continuados em pa-cientes candidatos à cirurgia não cardíaca e já fazem uso deles para tratamento de outras situações em que ele esteja indicado (nível de evidência C).

Classe iia:

Beta-bloqueador para controle da FC e PA é pro-vavelmente recomendado para pacientes candidatos à cirurgia vascular que são de alto risco cardíaco de-vido à insuficiência coronariana ou achado de DAC em teste peroperatório (nível de evidência B).

Classe iia:

Beta-bloqueadores para controle da FC e PA são razoáveis para pacientes em quem a avaliação pe-roperatória para a cirurgia vascular identificou alto risco cardíaco, como definido pela presença de mais de um fator de risco clínico (nível de evidência C).

Classe iia:

Beta-bloqueadores para controle FC e PA são ra-zoáveis para pacientes em quem a avaliação perope-ratória identificou insuficiência coronariana ou alto risco cardíaco, definido pela existência de mais de um fator de risco clínico, que serão submetidos à ci-rurgia de risco intermediário (nível de evidência B).

Tabela 7 - Recomendações para terapia perioperatória com beta-bloqueadores

Cirurgiaausência de

fatores de risco1 ou mais fatores de risco insuficiência coronariana

Uso prévio de Beta-

bloqueadores

alto risco Classe iib, Nível B Classe iia, Nível B Classe i, Nível B Classe i, Nível B

risco intermediário Classe iib, Nível C Classe iia, Nível B Classe i, Nível C

Baixo risco Classe i, Nível C

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

teraPia iNterveNCioNista

Cirurgia de revascularização do miocárdio (CrvM)

Até recentemente, todas as evidências a respeito da cirurgia de revascularização coronária foram derivadas de estudos de coorte em pacientes que se apresentaram para cirurgia não cardíaca após cirurgia cardíaca bem--sucedida. Existem agora vários estudos randomizados que avaliaram o benefício geral da CRVM profilática para diminuir o risco cardíaco perioperatório de cirur-gias não cardíacas cujos resultados podem ser aplica-dos a subtipos específicos de pacientes.

O primeiro grande estudo randomizado (Corona-ry Artery Revascularization Prophylaxis) foi publica-do por McFalls et al..69. Foram selecionados, aleato-riamente, 510 entre os 5.859 pacientes com estenose significante de artérias coronárias agendados para cirurgia vascular. Estes foram submetidos ou não à CRVM antes do procedimento proposto. Os autores concluíram que a revascularização coronária em pa-cientes com sintomas cardíacos estáveis, antes de ci-rurgia vascular eletiva, não alterou significativamente os riscos de morte e IM em longo e curto prazos.

O estudo DECREASE II70 foi desenhado com o ob-jetivo de avaliar a utilidade de testes cardíacos em pacientes com fatores de risco intermediários e ade-quada terapia beta-bloqueadora submetidos à cirur-gia vascular. Morte e IM não fatal foram pesquisados 30 dias após o procedimento. Esse estudo confirmou que isquemia cardíaca extensa é um fator de risco para eventos cardíacos perioperatórios, entretanto, isto foi pouco para avaliar o verdadeiro benefício da revascularização.

O DECREASE-V71 selecionou pacientes que seriam submetidos à cirurgia vascular randomi-zados em um grupo com terapia medicamento-sa otimizada e submetidos à CRVM e outro so-mente com terapia medicamentosa otimizada sem CRVM. Não houve diferenças entre os gru-pos nos resultados combinados de morte ou IM em 30 dias ou um ano, embora tenha havido alta incidência de eventos cardíacos nos dois gru-pos. Essa pesquisa não foi dimensionada para responder definitivamente a questão do valor da revascularização pré-operatória em pacientes de alto risco; entretanto, os achados foram con-sistentes com a literatura publicada previamen-

terapia com estatina perioperatória

As evidências acumuladas até o momento sugerem que a estatina apresenta efeito protetor contra complicações cardíacas durante cirurgia não cardíaca. Hindler et al.64 conduziram meta-nálise que avaliou o efeito geral da terapia com estatina na qual foi observada redução de 44% na mortalidade. Le Manach et al.65 demonstra-ram que a suspensão pós-operatória de estatina (mais de quatro dias) foi um preditor indepen-dente de mionecrose pós-operatória.

A maioria desses dados é observacional e baseada em pacientes nos quais o tempo de início e duração da terapia com estatina não está claro.

alfa-2 agonistas

Wijeysundera et al.66 realizaram, em 2002, metanálise compreendendo 23 estudos e en-volvendo 3.395 pacientes, sobre o uso periope-ratório de agonistas alfa-2. Essa classe de medi-camentos reduziu a mortalidade (risco relativo 0,76, IC 95% 0,63 a 0,91) e a incidência de infarto do miocárdio (risco relativo 0,66, IC 95% 0,46 a 0,94) durante cirurgia vascular.

Mais recentemente, Wallace et al.67 condu-ziram estudo prospectivo, duplo-cego, em pa-cientes com DAC ou sob risco de DAC. Eles de-terminaram que a administração de clonidina teve mínimos efeitos hemodinâmicos e reduziu a mortalidade pós-operatória após seguimento por dois anos.

Bloqueadores de canais de cálcio

Metanálise publicada em 2003 envolvendo 11 estudos e 1.007 pacientes68 determinou que a tera-pia com bloqueadores de canais de cálcio no pe-ríodo perioperatório reduziu significativamente os episódios de isquemia (risco relativo 0,49, 95% IC 0,3 a 0,.8, P=0,004) e taquicardia supraventricular (risco relativo 0,52, 95% IC 0,37 a 0,72, P<0,0001), sendo associada, também, a reduzida tendência de morte e infarto do miocárdio.

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

metálico é mais comum nas primeiras duas semanas após a colocação do mesmo, porém é extremamente raro (menos que 0,1% dos casos) após quatro sema-nas.80,81 Dado que a trombose do stent irá resultar em IM ou morte na maioria dos paciente e que o risco de trombose do stent metálico diminui após endoteliza-ção do stent (que geralmente ocorre em quatro a seis semanas), parece razoável adiar cirurgia eletiva não cardíaca por quatro a seis semanas, a fim de permitir pelo menos uma endotelização parcial do stent, mas não por mais de 12 semanas, quando a reestenose pode começar a ocorrer.

Os tienopiridínicos (ticlopidina e clopidogrel) são geralmente administrados juntos com aspiri-na por quatro semanas após colocação de stent metálico. A associação deles com aspirina inibe a agregação plaquetária e reduz o risco de trom-bose do stent, porém aumenta o risco de sangra-mento. Rápida endotelização dos stents metá-licos torna rara a ocorrência de trombose e os tienopiridínicos são raramente necessários por período superior a quatro semanas após a im-plantação dos stents metálicos. Por essa razão, o adiamento da cirurgia por quatro a seis semanas após colocação de um stent metálico permite o uso apropriado dos tienopiridínicos com o obje-tivo de reduzir o risco de trombose. Entretanto, uma vez que o seu uso é interrompido, seus efei-tos não diminuem imediatamente. Sendo assim, é recomendado o adiamento da cirurgia por uma semana após a interrupção do uso dos tienopi-ridínicos. Em pacientes com stent metálico, a terapia antiplaquetária com aspirina diária deve ser continuada no período perioperatório. No cenário de cirurgia não cardíaca na qual os pa-cientes foram previamente submetidos à coloca-ção de stent metálico, o risco da interrupção de agentes antiplaquetários precocemente (dentro de quatro semanas de implantação) é significan-te comparado ao risco de hemorragia grave nos procedimentos cirúrgicos mais realizados.

PCi com stent farmacológico

A trombose de stents farmacológicos pode ocor-rer tardiamente e tem sido relatada até um ano e meio após a sua implantação, particularmente no contexto de descontinuação dos agentes antiplaquetários antes de cirurgia não cardíaca.82,83 Em janeiro de 2007, foram

te, sugerindo que a CRVM não tem benefícios em prevenir morte ou IM. As indicações para a revascularização coronária pré-operatória, por-tanto, são idênticas àquelas recomendadas pelo ACC/AHA 2004 Guideline Update for Coronary Artery Bypass Graft Surgery.

intervenção coronária percutânea (PCi)pré-operatória

Revisão da literatura sugere que PCI antes de cirurgia não cardíaca não possui valor na preven-ção de eventos cardíacos, exceto naqueles pacien-tes nos quais ela está independentemente indica-da devido a uma síndrome coronariana aguda. Entretanto, cirurgia não cardíaca não programada em pacientes submetidos previamente a uma PCI apresenta desafios especiais, particularmente em relação ao manejo de agentes antiplaquetários na-queles pacientes com stents coronarianos.

PCi sem stents: angioplastia coronária com balão

Várias avaliações têm relatado os desfechos dos pacientes submetidos à cirurgia não cardíaca após terem sido submetidos à angioplastia coronária com balão.72-78 Com base na literatura disponível, o adia-mento de cirurgia não cardíaca por período superior a oito semanas após angioplastia com balão aumenta a chance de reestenose no local e de isquemia ou IM perioperatório. Entretanto, realizar o procedimento ci-rúrgico logo após a PCI também pode ser perigoso. O adiamento da cirurgia por pelo menos duas a quatro semanas após angioplastia permite a reendotelização dos vasos no local de tratamento com balão, o que é confirmado pelo estudo de Brilakis et al.79. Terapia com aspirina deve ser continuada no perioperatório. O risco de interrupção da aspirina deve ser pesado contra o beneficio da redução de complicações rela-cionadas ao sangramento do procedimento proposto.

PCi com stent coronariano metálico

Se um stent coronariano é utilizado no procedi-mento de revascularização, o adiamento da cirurgia não cardíaca pode ser benéfico. Trombose de stent

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

Conforme esses relatos e recomendações, não é prudente o uso de stents farmacológicos para revas-cularização coronária antes de cirurgia não cardíaca iminente ou planejada, na qual é necessária a desconti-nuação dos agentes antiplaquetários.

Manejo perioperatório de pacientes com PCi prévia submetidos à cirurgia não cardíaca

Para pacientes que se submeteram à intervenção coronária com ou sem colocação de stents antes de ci-rurgia não cardíaca, planejada ou não, há incerteza so-bre o tempo que se deveria esperar para a realização de procedimento. Dado o relato de trombose tardia de stent farmacológico e as recomendações discutidas, os clínicos devem se manter vigilantes por período supe-rior a 365 dias após o implante de stent farmacológico. Os tempos de 14, 30 a 45 e 365 dias para angioplastia com balão, stent metálico e stent farmacológico, res-pectivamente, são um tanto arbitrário devido à falta de evidências de alta qualidade (Figura 2).

publicadas, pela Society for Cardiovascular Angiography and Interventions (AHA/ACC, SCAI), American College of Surgeons (ACS) e American Diabetes Association (ADA), evidências que concluíram que a interrupção prematu-ra da terapia antiplaquetária dupla aumenta significati-vamente o risco de trombose, morte e IAM.84 A fim de eliminar a interrupção prematura da terapia tienopiridí-nicca, o grupo consultivo recomendou o seguinte:

- Procedimentos eletivos nos quais há significati-vo risco de hemorragia peri ou pós-operatória devem ser adiados até que os pacientes completem curso apropriado de terapia tienopiridínica (12 meses após implantação de stent farmacológico e no mínimo um mês após a implantação de stents metálicos).

- Para pacientes tratados com stent farmacológico que serão submetidos a procedimento no qual é man-datória a descontinuação da terapia tienopiridínica, aspirina deve ser continuada sempre que possível e os tienopiridínicos reiniciados assim que possível, devido ao risco de trombose tardia do stent.

< 14 dias

Stent farmacológicoStent metal-bárico

Suspendercirurgia eletiva

Balão

> 14 dias < 365 dias

Realizar cirurgia com aspirinaRealizar cirurgia

com aspirina

< 30-45 dias> 30-45 dias > 365 dias

Suspender cirurgia eletiva

< 30-45 dias

ANGIOPLASTIA PRÉVIA

Fonte: Adaptado de Circulation. 2009;120:211.1

Figura 2 – Conduta nos pacientes com angioplastia prévia candidatos à cirurgia não cardíaca eletivaFonte: Adaptado de Circulation. 2009;120:211.1

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

a estratégia de stent metálico e terapia por quatro a seis semanas com aspirina e tienopiridínicos, com suspensão do tienopiridínico após esse período e continuação da aspirina no período perioperatório. Apesar do risco de reestenose com essa estratégia ser mais alto que com stents farmacológicos, as lesões reestenóticas, nestes casos, geralmente não acarre-tam risco de morte, mesmo quando se apresentam como uma síndrome coronariana aguda86 e podem geralmente ser tratadas com nova PCI, se necessário. Caso cirurgia não cardíaca seja iminente (dentro de duas a seis semanas) e o risco de sangramento seja alto, devem ser considerados angioplastia com balão e implante de stent metálico provisório adicionado à monoterapia antiplaquetária com aspirina e, caso ocorra reestenose, tratamento com nova PCI. Dian-te de cirurgia não cardíaca urgente ou emergente, o risco cardíaco, o risco de hemorragias e o benefício de longo prazo da revascularização coronária devem ser ponderados. E se intervenção for absolutamente necessária, deve ser considerada a CRVM.

aBordaGeNs de doeNças esPeCíFiCas

Hipertensão

No estágio 3 de hipertensão (pressão arterial sis-tólica maior ou igual 180 e pressão arterial diastólica maior ou igual 110), devem ser ponderados os bene-fícios de adiar uma cirurgia objetivando otimizar o efeito das medicações anti-hipertensivas e os risco da cirurgia com níveis pressóricos elevados. Com a utilização de agentes intravenosos de ação rápida, a pressão sanguínea pode ser adequadamente con-trolada. Ensaio clínico randomizado foi incapaz de demonstrar o benefício do adiamento de cirurgia em pacientes hipertensos tratados cronicamente, que se apresentaram para cirurgia não cardíaca com PAD entre 110 e 130 mmHg e que não apresentaram IM prévio, angina grave ou instável, falência renal, hi-pertensão induzida pela gravidez, hipertrofia do VE, CRVM prévia, estenose aórtica, arritmias pré-operató-rias, defeitos de condução ou AVC.87

Vários autores têm sugerido suspender os IECAs e antagonistas do receptor da angiotensina na manhã da cirurgia.88-90 O reinício de IECA no período perio-peratório deve acontecer somente após o paciente atingir a normovolemia, diminuindo, assim, o risco de disfunção renal perioperatória.

Deve ser considerada, no período de tempo no qual se exige, a continuação da terapia antiplaque-tária dupla para qualquer paciente que necessite de cirurgia não cardíaca, particularmente naqueles tra-tados com stents farmacológicos. Além disso, deve ser considerado continuar a terapia antiplaquetária dupla perioperatória, além do tempo recomendado, em pacientes de alto risco para as consequências de trombose do stent; como em pacientes com trombo-se prévia de stent, após implante de stent em artéria principal esquerda, após implante de stents multiarte-riais e após colocação de stent na única artéria coro-nária remanescente ou em enxerto vascular. Mesmo após a descontinuação dos tienopiridínicos, sérias considerações devem ser dadas à continuação da terapia antiplaquetária com aspirina, no período pe-rioperatório, em pacientes com implantação prévia de stent farmacológico. Se os tienopiridínicos neces-sitarem ser interrompidos antes de cirurgia de grande porte, a aspirina deve ser continuada e os tienopiridí-nicos reiniciados o mais precocemente possível. Não há evidências que warfarin, antitrombóticos ou ini-bidores da glicoproteína IIb/IIIa reduzam o risco de trombose do stent após descontinuação de agentes antiplaquetários orais.84

estratégia de PCi em pacientes que necessitam de cirurgia não cardíaca de emergência

Pacientes candidatos à revascularização coro-nária percutânea, nos quais a cirurgia não cardíaca de urgência seja necessária, requerem consideração especial.84,85 Revascularização coronária percutânea não deve ser realizada rotineiramente em pacientes que necessitem de cirurgia não cardíaca, a menos que estes possuam clara indicação para tal, seja devi-do à anatomia coronariana de alto risco, angina instá-vel, IM ou DAC com ritmo ou hemodinâmica instáveis. Se PCI é necessária, então a urgência da cirurgia não cardíaca e o risco de sangramento associado devem ser considerados. Se o risco de sangramento é baixo ou se a cirurgia não cardíaca possa ser adiada por 12 meses ou mais, uma PCI com stents farmacológicos e terapia prolongada com aspirina e tienopiridínicos podem ser considerados caso o paciente cumpra os critérios descritos no AHA/ACC/SCAI/ACS/ADA Scien-ce Advisory Group.84 Se a cirurgia não cardíaca ocor-rer dentro de um a 12 meses, deve ser considerada

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

RNI para faixa baixa ou subterapêutica e reto-mar a dose normal de anticoagulante oral ime-diatamente após o procedimento.

Terapia com heparina perioperatória é reco-mendada para pacientes nos quais o risco de san-gramento com anticoagulante oral é alto e o risco de tromboembolismo na ausência de anticoagula-ção também é elevado (valva mecânica na posição mitral; valva Bjork-Shiley; trombose ou embolia recente - menos de um ano); ou três ou mais dos seguintes fatores de risco: fibrilação atrial, embolia prévia em qualquer tempo, condição de hipercoa-gulabilidade, prótese mecânica e fração de ejeção do VE inferior a 30%.98 Para pacientes entre esses dois extremos, os médicos devem avaliar o risco e benefício da redução da anticoagulação versus a terapia com heparina perioperatoriamente.

CoNsiderações aNestésiCas e MaNejo iNtraoPeratório

Há várias abordagens a respeito do cuidado anes-tésico no paciente cardíaco, incluindo o uso de agen-tes ou técnicas anestésicas específicas. Entretanto, nenhum estudo demonstrou claramente mudança no resultado com o uso rotineiro das seguintes téc-nicas: cateter de artéria pulmonar, monitorização do segmento ST, ecocardiografia transesofágica ou nitro-glicerina intravenosa. Portanto, a escolha da técnica anestésica e monitorização intraoperatória é critério da equipe de anestesia. O manejo intraoperatório pode ser influenciado pela necessidade de monitori-zação, ventilação e analgesia pós-operatória e pelo uso perioperatório de anticoagulantes e agentes anti-plaquetários. Portanto, esses cuidados devem ser pla-nejados antes da cirurgia por equipe multidisciplinar.

Manejo da dor perioperatória

Do ponto de vista cardíaco, o manejo da dor con-siste em um aspecto crucial no cuidado perioperató-rio. Apesar de nenhum estudo controlado e rando-mizado sobre regimes de analgesia ter demonstrado melhora dos resultados, técnicas de controle de dor são associadas à mais satisfação dos pacientes e es-cores mais baixos de dor. Regime de analgesia efeti-vo deve ser incluído no plano perioperatório.

valvopatia

Na estenose aórtica grave sintomática, cirurgia não cardíaca eletiva deverá ser adiada ou cance-lada. Esses pacientes necessitam de substituição valvar previamente à cirurgia. Se a estenose aórti-ca é grave, mas assintomática, a cirurgia deve ser cancelada ou adiada caso a valva não tenha sido avaliada por exames de imagem no último ano. Por outro lado, em pacientes com estenose aórtica grave que se recusam à cirurgia cardíaca ou não são candidatos à troca valvar por outros motivos, a cirurgia não cardíaca pode ser realizada com risco de mortalidade de cerca de 10%.91,92 Se o paciente não é candidato a troca valvar, valvuloplastia aórti-ca percutânea com balão, pode ser uma opção em pacientes adultos hemodinamicamente instáveis e naqueles com estenose aórtica nos quais a troca valvar não pode ser realizada devido a várias co-morbidades importantes.93,94

Estenose mitral importante aumenta o risco de falência cardíaca. Entretanto, correção cirúrgica pré-operatória não é indicada antes de cirurgia não cardíaca, a não ser que a condição valvar deva ser corrigida com fins de prolongar a sobrevivên-cia e prevenir complicações não relacionadas à cirugia não cardíaca proposta. Quando a estenose é grave, o paciente pode se beneficiar de valvulo-plastia mitral com balão ou reparação cirúrgica aberta antes de cirurgia de alto risco.95

Em pacientes com fibrilação atrial permanente ou persistente que estão sob alto risco de trombo-embolismo, terapia pré-operatoria e pós-opera-tória com heparina intravenosa ou heparina de baixo peso molecular deve ser considerada para cobrir períodos de falha no caso de anticoagula-ção subterapêutica.

Pacientes com prótese valvar mecânica são uma preocupação devido à necessidade de pro-filaxia para endocardite96 nas cirurgias que po-dem resultar em bacteremia e também devido ao cuidadoso manejo da anticoagulação. O séti-mo consenso da American College of Chest Phy-sicians para terapia antitrombótica e trombolíti-ca97 recomenda o seguinte: para pacientes que necessitam de procedimentos minimamente invasivos (odontológicos, biópsias superficiais), a recomendação é reduzir momentaneamente o

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

vascularização em pacientes com níveis elevados de troponina, mas sem outras manifestações de IM, permanece obscuro. Até que cada uma dessas ques-tões seja abordada, a dosagem rotineira de troponina não deve ser recomendada. Vigilância perioperató-ria para síndromes coronarianas agudas com ECG e marcadores bioquímicos de rotina são desnecessá-rios em pacientes de baixo risco clínico submetidos a procedimentos de baixo risco cirúrgico.

MaNejo Pós-oPeratório e a LoNGo Prazo

Avanços na avaliação do risco pré-operatório, téc-nicas anestésicas e cirúrgicas e a melhor implementa-ção da terapia médica têm contribuído para diminuir a frequência de complicações cardiovasculares asso-ciadas à cirurgia não cardíaca. Apesar desses avan-ços, complicações cardiovasculares representam a mais comum e mais tratável consequência adversa de cirurgia não cardíaca. Os pacientes que desenvolvem infarto do miocárdio sintomático após a cirurgia têm marcante aumento do risco de morte, alcançando 40 a 70%.102 Devido à gravidade das consequências do infarto, o manejo dos pacientes deve continuar após avaliação de risco no período perioperatório.

infarto do miocárdio: vigilância e tratamento

Em contraste com elevações clinicamente silen-ciosas de troponina, a ruptura de uma placa de artéria coronariana resulta em oclusão arterial trombótica e requer intervenção rápida. Apesar da terapia fibrino-lítica ter sido administrada a pacientes com embolia pulmonar em risco de morte, logo após cirurgia não cardíaca a dose do fibrinolítico utilizado foi mais bai-xa e administrada em intervalo de tempo mais longo que o padrão para tratamento de IM agudo.103,104 So-mente um único e pequeno estudo105 avaliou o papel da angiografia e angioplastia imediatas em 48 pacien-tes em uso de aspirina e heparina intravenosa. Ele de-monstrou que essa estratégia é viável e pode ser bené-fica. Os procedimentos de reperfusão não devem ser realizados rotineiramente em caráter de urgência no pós-operatório de pacientes nos quais o IM não está relacionado à oclusão coronária aguda. Além disso, devido aos requerimentos de anticoagulação durante o procedimento e ao uso de terapia antiplaquetária pós-revascularização, o benefício do mesmo deve ser pesado frente ao risco de hemorragia.

viGiLâNCia PerioPeratória

Uso do cateter de artéria pulmonar intraoperatório e pós-operatório

O uso de cateter de artéria pulmonar pode forne-cer informação significativa no cuidado ao paciente cardíaco; entretanto, o risco potencial de complica-ções e o custo associado à inserção do cateter devem ser considerados. Protocolos práticos de cateteriza-ção de artéria pulmonar, assim como métodos de otimização de pacientes de alto risco cirúrgico, têm sido desenvolvidos e relatados.99,100 Evidências sobre os benefícios do uso de cateter de artéria pulmonar em estudos controlados podem ser equivocadas e a ASA Task force on Pulmonary Artery Catheterization99 chama a atenção, ainda, para os possíveis dos danos inerentes à sua utilização.

vigilância perioperatória de infarto do miocárdio

Infarto do miocárdio perioperatório pode ser documentado a partir da avaliação de sintomas clí-nicos, ECG seriados, marcadores cardíacos específi-cos, estudos de ventriculografia comparativos antes e após a cirurgia, estudos específicos de necrose mio-cárdica por ressonância magnética ou radioisótopos e estudos de autópsia. Durante a última década, o diagnóstico de lesão miocárdica se tornou mais sen-sível com a utilização de biomarcadores cardíacos. Medidas de troponina T ou I facilitam o reconheci-mento de pequenas lesões no miocárdio. Devido ao aumento de sensibilidade dos biomarcadores, o limiar de diagnóstico de injúria miocárdica diminuiu e a sua frequência aumentou. Com base nas evidên-cias atuais, em pacientes sem DAC documentada, a vigilância deve ser restrita àqueles pacientes que de-senvolveram sinais de disfunção cardiovascular pe-rioperatória. O diagnóstico de IM perioperatório tem valor prognóstico em curto e longo prazos.1

Entretanto, pesquisas que avaliaram elevações isoladas de troponina não demonstraram associa-ções consistentes com resultados cardiovasculares adversos e também não forneceram informações sobre o efeito do tratamento em pacientes com ní-veis elevados da enzima.101 Embora se saiba que as elevações de troponina são mais prováveis de ocor-rer em pacientes com DAC extensa, o papel da re-

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Avaliação cardiovascular perioperatória para cirurgia não cardíaca

nais e para tratamentos são as mesmas que no perío-do não operatório, mas o momento de sua realização é dependente de vários fatores, incluindo a urgência da cirurgia não cardíaca, fatores de risco específicos do paciente e considerações específicas da cirur-gia. O uso de testes pré-operatórios invasivos e não invasivos deve ser limitado àquelas circunstâncias nas quais os resultados de tais testes afetarão clara-mente o manejo do paciente. Finalmente, para vários pacientes, a cirurgia não cardíaca representa a pri-meira oportunidade de receber apropriada avaliação do risco cardíaco em curto e longo prazos. Assim, o médico prestará melhor assistência ao paciente destinando recomendações para a redução do risco cardíaco imediato perioperatório, avaliando a neces-sidade de estratificação de risco pós-operatória, bem como direcionando intervenções para modificação dos fatores de risco coronarianos. Estudos futuros devem ser dirigidos para a determinação do valor da terapia profilática de rotina versus testes diagnósticos e intervenções.

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Terapia com aspirina, beta-bloqueador e IECA, particularmente em pacientes com baixa fração de ejeção ou infarto anterior, pode ser benéfica se os pa-cientes forem rapidamente levados à sala de hemodi-nâmica.106 Extensa revisão, baseada em evidências, sobre a terapia para IM agudo pode ser encontrada no ACC/AHA Guidelines for the Management of Pa-cients with Acute Myocardial Infarcton.106 Similarmen-te, o ACC/AHA Guidelines for Unstable Angina/ Non--ST-Segment Elevation Myocardial Infarction.107

É importante reconhecer, na abordagem em lon-go prazo, que a ocorrência de IM peroperatório não fatal acarreta alto risco de eventos cardíacos futuros que frequentemente encerram-se em morte por cau-sas cardiovasculares.108,109 Pacientes que apresenta-ram IM perioperatório deveriam ter sua função do VE avaliada antes da alta hospitalar. E terapêutica medicamentosa padrão pós-infarto deveria ser pres-crita como definido pelo ACC/AHA Acute Myocardial Infarction Guidelines.105

Manejo em longo prazo

A cirurgia não cardíaca representa um período de aumento do risco cardiovascular. Os clínicos devem, portanto, aproveitar a oportunidade para assegurar te-rapia médica cardiovascular apropriada. Em recente estudo publicado no ACC/AHA 2005 Guidelines for the Manegement of Patients Whit Peripheral Arterial Disea-se110, o tratamento com estatinas objetivando lipopro-teína de baixa-densidade (LDL) em níveis inferiores a 100 mg/dL, o controle de pressão sanguínea abaixo de 140/90 mmHg, a cessação do fumo e uso de terapia antiplaquetária receberam indicação classe I.

É importante que a equipe responsável pelo cui-dado a longo prazo do paciente seja informada sobre quaisquer anormalidades cardiovasculares ou fato-res de risco para DAC identificados durante o perío-do perioperatório.

CoNCLUsão

Avaliação perioperatória bem-sucedida e adequa-do manejo dos pacientes cardíacos de alto risco sub-metidos à cirurgia não cardíaca requerem equipe cui-dadosa, além de boa comunicação entre cirurgiões, anestesistas e o clínico responsável pelo paciente. Em geral, as indicações para testes cardíacos adicio-

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artiGo de revisão

Instituição:Serviço de Anestesiologia do Hospital Felício Rocho – Fundação Felice Rosso

Endereço para correspondência:Leonardo Padovani TrivelatoRua Desembargador Jorge Fontana, 214/2.304BelvedereBelo Horizonte, MG – BrasilCEP 30320-670

1Anestesiologista do Serviço de Anestesiologia do Hospi-tal Felício Rocho, Belo Horizonte, MG – Brasil.2Anestesiologista do Serviço de Anestesiologia do Hospital Felício Rocho e do Hospital Dia da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte, MG – Brasil.3ME2 de Anestesiologia do CET/SBA do Hospital Felício Rocho, Belo Horizonte, MG – Brasil.

resUMo

A sociedade, assim como a Medicina, esteve, nas últimas décadas, questionando con-dutas e priorizando ações que melhor se adaptassem ao conceito de ser ecologicamen-te correto. Com isso, renderam-se às facilidades do mundo digital, trazendo à rotina hospitalar, entre tantas outras novidades, prontuários e boletins eletrônicos. O boletim de anestesia é um dos instrumentos de trabalho do anestesiologista, sendo um docu-mento de relevante importância por conter todas as informações relativas ao paciente e acontecimentos ocorridos na sala cirúrgica. Seu uso está fortemente vinculado à defesa do profissional em casos jurídicos, à avaliação das técnicas anestésicas utilizadas, às pesquisas epidemiológicas e ao ensino e aprendizagem de médicos especializandos. Atingir a meta de uma documentação clara e completa em cada boletim de anestesia é um desafio, especialmente em situações em que o anestesiologista é responsável pelo cuidado de múltiplos pacientes e seu foco primário de atenção está no cuidado ao paciente e no ensino a médicos especializandos. Frente a esta realidade, a era digital na anestesiologia tem apresentado promissoras soluções.Palavras-chave: Anestesiologia; Registros Médicos; Sistemas de Informação; Registros Eletrônicos de Saúde.

aBstraCt

The society, as well as medicine, has been challenging behaviors and prioritizing actions that would be better adapted to the concept of being environmentally friendly in recent decades, with facilities that have surrendered to the digital world, bringing to the hospital routine, among many other innovations, electronic records and newsletters. The report of anesthesia is one of the working tools of the anesthesiologist and a document of great significance because it contains all information relating to patients and events in the oper-ating room. Its use is strongly linked to the defense of professional legal cases, evaluation of anesthetic techniques used, the epidemiological research and teaching and learning of medical trainees. Achieving the goal of a complete and clear documentation of anesthesia in each report is a challenge, especially in situations where the anesthesiologist is respon-sible for the care of multiple patients and their primary focus of attention is on patient care and education for medical trainees. Faced with this reality, the digital age has made anesthesia promising solutions.

Key words: Anaesthesiology; Medical Records; Information Systems; Electronic Health Records.

Electronic report of anesthesia: the anaesthesiology in the digital age

Leonardo Padovani Trivelato1, Fábio Maciel Rosa Pereira2, Débora Nathália Smidarle3, Rafael Diogo Smidarle3

Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S29-S3430

Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

dispendiosa e limitada quanto à velocidade e memó-ria. No final dos anos 80, a literatura médica expe-rimentou os primeiros relatos do uso de microcom-putadores para o registro de boletins de anestesia.1 Apesar de significativos avanços no manejo cirúrgico dos pacientes com a introdução de novos fármacos anestésicos, técnicas de monitorização e ventilação mecânica, os sistemas informatizados de documen-tação anestésica evoluíram lentamente.5

Nos EUA, em 1998, apenas 1% dos departamentos de anestesia utilizava na sala cirúrgica sistemas de documentação anestésica informatizados.6 Estima-se que menos de 10% de todos os hospitais possuam tais sistemas atualmente.7 No Brasil, esses sistemas estão ainda engatinhando, podendo-se observar tentativas isoladas de alguns serviços e de algumas empresas.5

Os sistemas informatizados em anestesia permi-tem o registro automatizado de dados fisiológicos e de cuidados anestésicos e a documentação de dro-gas, fluidos e eventos em tempo real.7,8 O boletim automatizado promove registros mais completos e acurados que o relatório manual, especialmente du-rante a indução e no final dos casos, quando a aten-ção do anestesiologista está completamente focada no paciente.7 As justificativas para a implantação do boletim eletrônico são muitas e vão desde a necessi-dade de documentação detalhada e segura dos pro-cedimentos médicos e do controle dos custos na área da saúde, até a otimização do tempo e da segurança dos procedimentos anestésicos.9

Estima-se que 10 a 15% do tempo da anestesia sejam gastos com o preenchimento da ficha anes-tésica manual convencional, implicando alto risco de distração e aumento do tempo para a ação em eventos adversos no intraoperatório.10 A utilização de sistemas informatizados para coleta e gerenciamento dos dados anestésicos possibilita melhorar o atendi-mento ao paciente ao tornar o ato anestésico mais ágil e seguro.9 Outra vantagem desses sistemas é per-mitir o acesso às informações médicas do paciente a qualquer momento e em qualquer lugar em que elas sejam necessárias.11

Apesar de falhas na captura dos parâmetros monitorizados poderem ocorrer com os sistemas automáticos de registro, eles são considerados mais fidedignos que os registros manuais das fichas con-vencionais, permitindo melhores sensibilidade e especificidade na identificação de eventos adversos intraoperatórios – fortemente relacionados a morbi-dade e mortalidade perioperatórias.8,12,13 Além disso,

iNtrodUção

A sociedade, nas últimas décadas, esteve questio-nando condutas e priorizando ações que melhor se adaptassem ao conceito de ser ecologicamente cor-reta. A informática, simultaneamente, evoluiu de for-ma rápida e trouxe agilidade e praticidade às tarefas cotidianas. A Medicina, embora num processo mais lento, incorporou também tais conceitos e se rendeu às facilidades do mundo digital, trazendo à rotina hospitalar, entre tantas outras novidades, prontuários e boletins eletrônicos.

O boletim de anestesia é um dos instrumentos de trabalho do anestesiologista, sendo documento de re-levante importância por conter todas as informações relativas ao paciente e acontecimentos ocorridos na sala cirúrgica. Seu uso está fortemente vinculado à defesa do profissional em casos jurídicos, à avaliação das técnicas anestésicas utilizadas, às pesquisas epi-demiológicas e ao ensino e aprendizagem de médi-cos especializandos.1

disCUssão

A fim de orientar e padronizar as informações relevantes do boletim anestésico, a CNTSA/SBA pu-blicou as Recomendações sobre o Relatório de Anes-tesia (Anexo 1) observando rigorosamente as deter-minações do Conselho Federal de Medicina (CFM).2 Tais recomendações, já bem aceitas e solidificadas na conduta do profissional anestesiologista, atual-mente pertencem a outra pauta de discussão. Em 2007, o CFM publicou a Resolução 1821/07 aprovan-do as normas técnicas concernentes à digitalização e uso de sistemas informatizados para a guarda e manuseio de documentos dos prontuários dos pa-cientes, autorizando a eliminação do papel e a troca de informação identificada em saúde e respaldando, desta forma, os profissionais e as entidades médicas para o uso de prontuários eletrônicos e documentos médicos digitais.3

A utilização de processos de acompanhamento informatizado de pacientes e lembretes gerados au-tomaticamente em Medicina remete a pelo menos 1976.4 Até a década de 80, no Brasil, os únicos pro-gramas de armazenamento de dados perioperatórios disponíveis consistiam em cartões perfurados, sis-temas complexos para manuseio e processamento pelos profissionais. Nessa época, a tecnologia era

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S29-S34 31

Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

Outro fator limitante à implantação de tais sistemas é o seu elevado custo e a crença dos administrado-res hospitalares de que esta seja uma fonte de des-perdício de dinheiro.7 O’Sullivan et al.18, entretanto, publicaram evidências científicas de que o sistema informatizado pode reduzir o custo e melhorar o re-embolso dos procedimentos anestésicos aos hospi-tais.

Existe o temor de que os registros automáticos poderiam aumentar a exposição do médico aneste-siologista a processos legais, principalmente devido à inclusão automática de dados transitórios e artefa-tos.7,8 Há, na literatura, o relato de um caso em que o anestesiologista foi julgado porque por 93 minutos nenhum dado vital fora registrado no boletim de um paciente que apresentou sérias complicações pós--operatórias. A justificativa para tal fato teria sido a falha do sistema em capturar os dados enquanto per-maneceu aberta a janela de registro de medicações.19 Alguns sistemas, entretanto, permitem que o usuário edite ou anule dados registrados automaticamente. Os valores de frequência cardíaca, pressão arterial e oximetria são os parâmetros mais comumente in-validados.8 A documentação mais completa e menos sujeita a vieses de anotação também são fatores po-sitivos na defesa contra alegações de má-prática pro-fissional.7

A Food and Drug Administration (FDA) determina que os sistemas informatizados utilizados para criar, modificar e manter relatórios eletrônicos e para ma-nejar assinaturas eletrônicas devem também ser su-jeitos à validação. Tais sistemas devem ser validados para garantir acurácia, confiabilidade, desempenho e habilidade para discernir dados inválidos ou alterar registros.20

CoNCLUsão

Atingir a meta de uma documentação clara e completa em cada boletim de anestesia é um desafio, especialmente em situações em que o anestesiologis-ta é responsável pelo cuidado de múltiplos pacientes e seu foco primário de atenção está no cuidado ao paciente e no ensino a médicos especializandos.4,7 Frente a esta realidade, a era digital na anestesiologia tem apresentado promissoras soluções, mas ainda distantes da realidade dos nossos hospitais.

os sistemas informatizados permitem o registro de um número mais alto de dados vitais e eventos por unidade de tempo.7

Departamentos de anestesia que utilizam o siste-ma de boletim eletrônico apresentam melhor contro-le dos custos hospitalares e anestésicos, o que favo-rece a gestão mais eficiente do consumo, estoque de materiais e medicamentos e o desenvolvimento de estudos para a redução dos custos da anestesia, sem reduzir a eficiência e a qualidade do serviço. Além disso, esses sistemas permitem a criação de um ban-co de dados unificado para os registros das anestesias de um hospital, o que facilita a realização de estudos retrospectivos de qualidade ao permitir a captura de elevado número de casos observados em reduzido tempo e com resultados mais fidedignos e isentos de erros humanos.5 Os anestesiologistas tendem a atenu-ar os valores extremos nos registros manuais e, por causa desta discrepância verificada entre os dados manuais e os automaticamente registrados, o boletim manual de anestesia já não é considerado uma fonte segura de dados para fins de pesquisa.7,13

Mais do que simplesmente registrar os dados vi-tais do paciente, os sistemas informatizados para a anestesia disponíveis atualmente oferecem uma gama de funções que podem melhorar a qualidade anestésica.14 Exemplo disso são o sistema que per-mite a leitura das medicações a serem injetadas por código de barra; e dois sistemas: um padronizado de cores registrando o momento exato de sua adminis-tração e diminuindo o risco de injeção inadvertida de medicamentos15; e outro, que fornece suplementos de atualização sobre protocolos de conduta quando as escolhas farmacológicas do médico se opõem aos consensos médicos registrados.7

Apesar dos inúmeros benefícios oferecidos pelos sistemas eletrônicos de registros de anestesia, estes ainda não estão amplamente difundidos.7,8,16 Para a implantação de sistemas eletrônicos de registros de anestesia há a necessidade de aceitação dos profis-sionais usuários. Estudos indicam que anestesiologis-tas com mais de 20 anos de experiência profissional apresentam mais resistência à introdução desses sis-temas na sua rotina de trabalho.5 O método manual de entrada dos dados, o tempo gasto para produzir o boletim e a dificuldade de aprendizado para o uso do programa foram consideradas as maiores fontes de insatisfação dos usuários para alguns sistemas.17

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Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

■ Sexo ■ Raça/cor ■ Peso ■ Altura ■ Outros (de acordo com necessidades da instituição)

4.2. Informações prévias ■ Cirurgia proposta ■ Cirurgia realizada ■ Equipe cirúrgica responsável ■ Médico(s) anestesiologista(s) responsável(is) ■ Descrição da avaliação pré-anestésica e informa-

ções clínicas do paciente:

I – As informações podem ser apresentadas em modo descritivo (mais recomendado) ou a partir da uti-lização de lacunas (método dirigido);

II – sugere-se que esta sessão deva conter o mais alto número de informações possíveis sobre o paciente;

III – deve haver conclusão da avaliação e utilização do “estado físico-anestésico” (classificação da ASA), além de outros índices, se forem pertinen-tes e consagrados;

IV – as informações aqui registradas não eximem o médico anestesiologista de registrar a “visita pré--anestésica”, seja em “folha de evolução médica” do prontuário ou ficha própria da instituição

■ Descrição de medicamentos prescritos e adminis-trados e/ou procedimentos realizados após a ava-liação pré-anestésica, incluindo efeitos esperados ou não, efeitos adversos ou intercorrências

■ Espaço para anotações ■ Espaço para descrição de informações sobre

eventos ocorridos no período perioperatório ■ Espaço para assinatura do(s) médico(s) aneste-

siologista (s) responsável(is)

5 . Recomendações para a tabulação gráfica geral do boletim anestésico:

5.1. O sentido da “ficha de registro de anestesia” (tipo “retrato” ou “paisagem”) deve seguir as caracterís-ticas da instituição

5.2. Recomenda-se as utilização da relação “01 qua-drado” = 5 minutos

5.3. A interface gráfica deve ser obrigatoriamente constituída de:

I – Espaço para registro da escala de tempo contínuaII – Espaço para drogas, gases e vapores de uso contínuo

aNexo 1

A documentação mínima dos procedimentos anestésicos deverá incluir obrigatoriamente informa-ções relativas à avaliação e prescrição pré-anestési-cas, evolução clínica e tratamento intra e pós-anes-tésico.

O boletim de anestesia deve incluir: ■ Identificação do(s) anestesiologista(s) responsável

(is) e, se for o caso, registro do momento de transfe-rência de responsabilidade durante o procedimento;

■ Identificação do paciente; ■ Início e término do procedimento; ■ técnica de anestesia empregada; ■ Recursos de monitoração adotados; ■ Registro da oxigenação, gás carbônico expirado

final (nas situações em que foi utilizado), pressão arterial e frequência cardíaca a intervalos não su-periores a 10 minutos;

■ Soluções e fármacos administrados (momento de administração, via e dose);

■ Intercorrências e eventos adversos associados ou não à anestesia;

A Resolução do CFM nº 1.670/03 no seu artigo pri-meiro determina que nos ambientes em que se pra-ticam procedimentos sob “sedação consciente” ou níveis mais profundos de sedação:1. Deve estar disponível material para documentação

completa do procedimento, devendo ficar regis-trado o uso das medicações, suas doses e efeitos;

2. a “Ficha de Registro de Anestesia”, em seu original, deve ser exclusivamente utilizada como parte in-tegrante e indivisível do prontuário médico, tendo como objetivos auxiliar de forma ótima a docu-mentação cronológica e precisa de posologias, procedimentos e suas evoluções e consequências sobre o paciente tratado no âmbito do período assistido pelo(s) anestesiologista(s) responsáveis;

3. o médico anestesiologista, quando necessário, deve utilizar formulários padronizados pela ins-tituição como integrantes do prontuário médico para realizar anotações;

4. a “Ficha de Registro de Anestesia” deve ter as se-guintes informações mínimas necessárias:

4.1. Informações identificadoras do paciente ■ Nome completo ■ Data de nascimento ■ Idade atual ■ Número de identificação (número do prontuário)

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Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

c. Se for de uso contínuo, deverá ser registrado no espaço gráfico apropriado

d. Todos os medicamentos administrados devem ser descritos, inclusive aqueles utilizados pelo cirur-gião (anestésico local, adrenalina, etc.), auxiliares de cirurgia (azul de metileno) ou aqueles solicita-dos por outros (como antibióticos, manitol, etc.). Sugere-se colocar observação sobre quem indicou sua utilização (caso não seja o anestesiologista)

e. Somente medicamentos administrados devem ser des-critos na ficha de anestesia (não deve ser descrita, por exemplo, a atropina “aspirada”, mas não utilizada).

V – ProcedimentosVI – OutrosVII – Condições de alta da sala de cirurgia

■ Estado clínico ■ Patência da via aérea ■ Ventilação ■ Acessos vasculares ■ Monitorização ■ Suportes especiais ■ Outros

VIII – Destino após a alta da sala de cirurgia

5.5. A descrição da técnica anestésica deve conter:I – Tipos de anestesia (utilizar classificação recomen-

dada pela SBA) ■ Geral ■ Condutiva ■ Sedação ■ Local

5.6 A descrição do equipamento de anestesia uti-lizado deve conter:

I – Sistema de ventilação e método de absorção de CO2 (utilizar classificação recomendada pela SBA)

■ Sistemas com reabsorção de CO2

1. Circularesa. Valvularesb. Avalvulares2. Não circularesa. Valvularesb. Avalvulares

■ Sistemas sem reabsorção de CO2

1. Valvulares2. Avalvulares

III – Espaço para registro de administração de fluidos endovenosos

IV – Espaço para registro contínuo da monitorização mínima obrigatória

■ Eletrocardiografia ■ Pressão arterial ■ SpO2

■ Capnografia e capnometria

V – Espaço para registro de monitorização adicional VI – Espaço para registro contínuo dos métodos de

ventilação, incluindo oxigenoterapia ou parâme-tros do ventilador, se utilizados.

VII – Espaço para identificar eventos específicos, utili-zando a simbologia consagrada, que deve incluir:

■ Início e término da anestesia ■ Início e término da cirurgia ■ Administração de drogas ■ Mudanças de posicionamento ■ Intercorrências ■ Outros eventos, se pertinentes

5.4. Deve haver espaço próprio e suficiente para a descrição minuciosa e sequencial de procedi-mentos realizados pelo anestesiologista

I – Condições de admissão na sala de cirurgiaII – Início e término da anestesia: inicia-se na admis-

são do paciente na sala de cirurgia e termina em sua alta para a sala de recuperação pós-anestési-ca ou outro setor do hospital onde permanecerá em seu período pós-operatório inicial.

III – Início e término da cirurgia: inicia-se no momen-to da incisão ou quando iniciar-se o procedimen-to diagnóstico ou terapêutico; seu término é con-dicionado à avaliação do cirurgião

IV – Administração de medicamentos

■ Nome ■ Via ■ Dose e concentração ■ Horário ■ Efeito adverso

a. Segundo recomendação da ANVISA, a descrição de medicamentos no prontuário médico deverá utili-zar somente o nome da substância (“princípio ati-vo”) (vedado o uso de qualquer nome comercial)

b. Devem seguir ordem cronológica, utilizando sim-bologia para evidenciar no gráfico o momento de sua administração

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Boletim eletrônico de anestesia: a anestesiologia na era digital

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II – Vaporizadores (utilizar classificação recomenda-da pela SBA)

■ Universais ■ Calibrados

III – Fluxo e concentração de gases e vaporesIV – Métodos de reabsorção de CO2

V – Outros

5.7. Deve-se descrever os métodos de manutenção da patência das vias aéreas, incluindo acesso, difi-culdades e intercorrências;

5.8. Na descrição da monitorização deve constar:I – Monitorização mínima utilizada (conforme Reso-

lução CFM 1.802/06) ■ Eletrocardiografia (sugere-se descrever deriva-

ções utilizadas) ■ Pressão arterial (com a descrição do tipo de aferição) ■ Oxímetro de pulso ■ Capnografia e capnometria

II – Monitores adicionais

5.9. Descrever as proteções adotadas para o pacienteI – Posição e mudançasII – Proteções ao posicionamento (uso de coxins, pro-

teção ocular, almofadas, etc.)III – Segurança elétrica para proteger equipamentos

(ex: aterramento)IV – Outras

5.10. Fazer registro gráfico ou tendência contínua para:I – Obrigatórios

■ Gases e vapores ■ Medicamentos de uso contínuo ■ Fluidos endovenosos ■ Monitorização obrigatória e específica ■ Parâmetros ventilatórios e de oxigenoterapia ■ Intecorrências ■ Outros

5.11. Poderá haver resumos adaptados de acordo com as necessidades da instituição:

I – Medicamentos (doses totais)II – Balanço hídrico final

■ Fluidos administrados (podem ser especificados) ■ Fluidos perdidos (podem ser especificados)

5.12. Disponibilizar espaço para descrições adicionais

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artiGo de revisão

Instituição:Hospital IPSEMGBelo Horizonte, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Jaci Custódio JorgeAv. Professor Cândido Holanda, 120/301 Bairro: São Bento. CEP: 30301-340 Belo Horizonte, MG – Brasil.E-mail: [email protected]

1 Responsável pelo CET/SBA/MEC do Ipsemg – Belo Horizonte, MG – Brasil. Coordenador do Serviço de Anestesiologia do Hospital Vera Cruz. Belo Horizonte, MG – Brasil. Título Superior de Anestesiologia fornecido pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Anestesiologista do Hospital Ipsemg.2 ME3 de Anestesiologia do CET/SBA/MEC do Ipsemg.

resUMo

O objetivo deste artigo é fazer uma revisão das alterações fisiopatológicas da disfunção diastólica (DD), além de indicar as causas que originam esta doença, mostrar a impor-tância de se conhecerem as interações dos agentes anestésicos e as repercussões das alterações hemodinâmicas nos pacientes portadores de DD.

Palavras-chave: Sístole; Anormalidades Cardiovasculares; Função Atrial Esquerda; Fibrilação Atrial; Disfunção Ventricular Esquerda; Insuficiência Cardíaca Diastólica; Ecocardiografia; Hemodinâmica; Anestésicos.

aBstraCt

The aim of this paper is to review the pathophysiological changes of diastolic dysfunction (DD), besides pointing out the causes of this disease, showing the importance of knowing the interactions of anesthetics and the effects of hemodynamic changes in patients with DD.

Key words: Systole; Cardiovascular Abnormalities; Atrial Function, Left; Atrial Fibrillation; Ventricular Dysfunction, Left; Heart Failure, Diastolic; Echocardiography; Hemodynamics; Anesthetics.

iNtrodUção

Os avanços na avaliação cardiológica pré-operatória, a partir do uso cada vez mais expressivo do ecocardiograma transtorácico (ETT), têm permitido o diagnósti-co de um distúrbio muito frequente da função miocárdica, conhecido como disfun-ção diastólica (DD) do ventrículo esquerdo (VE).

Define-se como DD a alteração do relaxamento diastólico do ventrículo, carac-terizada pela redução da complacência ventricular e dificuldade do enchimento ventricular. Existem dois tipos de DD: com função sistólica (FS) preservada e DD associada à disfunção sistólica. Nesta revisão, será abordado somente o quadro clí-nico de DD com FS preservada, devido à sua alta prevalência.

ePideMioLoGia

A DD com FS preservada pode ser responsável por 40 a 50% dos quadros de insu-ficiência cardíaca (IC).1,2 A incidência desse distúrbio aumenta com a idade, atingin-do cerca de 50% da população acima de 70 anos3, havendo também alta incidência

Diastolic dysfunction and its importance to the anesthesiologist

Jaci Custódio Jorge1, Ana Luiza Murta Timponi de Moura2, Nicole Silvestre Monteiro2

Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

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Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

diaGNóstiCo e Fatores de risCo

Segundo Sanders et al.6, o ETT é o método mais eficaz para se fazer o diagnóstico de DD. Nesse estu-do, ele demonstra que pelo ETT é possível reconhecer diferentes padrões de enchimento ventricular, classi-ficados em quatro categorias distintas: enchimento ventricular normal, atraso no relaxamento ventricu-lar, restritivo e pseudonormal. O doppler de um pa-ciente saudável, em ritmo sinusal, exibe dois picos, no perfil de enchimento diastólico do VE, que ocorrem em resposta ao gradiente de pressão entre o átrio es-querdo (AE) e o VE. Um pico, protodiastólico, segue a abertura da valva mitral; e o outro pico, na diástole tardia, é devido à contração atrial. O padrão normal é caracterizado por predomínio do enchimento ven-tricular durante o enchimento protodiastólico rápido e modesto enchimento secundário à contração atrial. Isso pode ser quantificado pelas medidas da velocida-de do fluxo diastólico máximo, durante o enchimento rápido do VE, definido como onda “E”, e pela veloci-dade de fluxo máximo durante a contração atrial, de-nominado onda “A”. A relação onda E/A, em pacientes saudáveis, é maior que 1. O ETT dos pacientes com DD pode apresentar três alterações, que o anestesis-ta deve saber interpretar, baseados na relação entre as ondas “E” e “A”. O primeiro padrão de enchimento anormal é caracterizado por atraso do relaxamento ventricular, redução do gradiente de pressão entre o AE e o VE, redução do enchimento protodiastólico e mais importância relativa da contração atrial para o enchimento ventricular. Isso resulta na reversão da razão E/A (E/A < 0,8) encontrada no estágio inicial da doença. Também pode estar presente nos pacientes com hipertrofia de VE, hipertensão arterial, doença arterial coronariana e em pacientes idosos que não apresentam doenças cardiovasculares. O segundo pa-drão exibe aumento na pressão do AE que compensa o retardo no relaxamento diastólico ventricular, o que restaura o gradiente de pressão AE/VE. Em vez de o VE “sugar” o conteúdo atrial no período protodiastóli-co, o AE “empurra” esse volume sanguíneo para o VE. Essa anormalidade é conhecida como pseudonorma-lização, devido à aparência normal da razão E/A (E/A > 0,8 e < 2). Os pacientes podem apresentar dilatação do AE, devido à sobrecarga de volume e pressão, e alto risco de fibrilação atrial e fenômenos tromboem-bólicos. Para diferenciar o padrão normal do pseudo-normal, é necessário reduzir a pré-carga do pacien-

no sexo feminino (pós-menopausa). A mortalidade anual de pacientes portadores de DD varia de 9 a 28% (sendo quatro vezes mais alta que nos pacientes sãos, quando comparados com a mesma faixa etária).4 Al-gumas publicações, tais como Framingham Heart Study e o Cardiovascular Health Study, apresentaram prevalência de DD com função sistólica preservada (FEVE > 50%) em 51 e 52% dos casos de insuficiência cardíaca, respectivamente.5

FisioPatoLoGia

Normalmente, 80% do enchimento ventricular ocorrem nos dois terços iniciais da diástole - também denominado de fase enchimento protodiastólico ou enchimento rápido - e os 20% restantes, no final da diástole, ou seja, durante a sístole atrial. O grau de relaxamento diastólico do ventrículo depende da recaptação do cálcio do citoplasma pelo sarcolema via bomba ATPase Ca++. A redução da atividade des-sa bomba (por exemplo, nos quadros de isquemia miocárdica) provoca aumento do cálcio citosólico e redução do relaxamento diastólico.6

O VE sofre algumas alterações na DD, tais como: diminuição da sua cavidade, redução da complacên-cia, redução do volume diastólico final, aumento da pressão diastólica final, aumento da pressão no átrio esquerdo, limitação do enchimento protodiastólico e mais dependência da contração atrial para o en-chimento ventricular. O aumento da pressão do átrio esquerdo é transmitido de forma retrógrada para a veia pulmonar e o leito capilar pulmonar. Nesses pacientes, existe prejuízo no relaxamento diastólico isovolumétrico, na complacência do VE, no enchi-mento ventricular protodiastólico e tardio, aumen-tando, assim, a responsabilidade da contração atrial na complementação do enchimento do VE.7,8

Do ponto de vista fisiopatológico, pode-se afir-mar que o estresse anestésico-cirúrgico, com as suas alterações neuroendócrino-metabólicas (aumentos do ACTH, TSH, catecolaminas e glucagon), o aumen-to da volemia, da frequência cardíaca e da pressão arterial podem provocar instabilidade hemodinâmi-ca e até mesmo edema agudo de pulmão. Nos mo-mentos atuais, é de fundamental importância que o anestesiologista tenha melhor conhecimento da DD e de suas implicações durante o ato anestésico--cirúrgico.7-9

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Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

quando submetidos a cirurgias abertas. Já nas cirur-gias endovasculares, isso só aconteceu nos pacientes sintomáticos.

É importante também distinguir a DD da IC diastó-lica. A DD é um estágio no qual o relaxamento anor-mal ou redução da complacência do VE é compensa-do pelo aumento da pressão no AE, o que mantém a pré-carga de VE adequada.6 Esses pacientes podem ser classificados como estágio A ou B pela American College of Cardiology e a American Heart Association (ACC/AHA), desde que sejam assintomáticos. A pro-gressão para IC diastólica, estágio C e D ACC/AHA, é caracterizada por sinais e sintomas de IC, com FEVE > 50%, na ausência de doença valvular e com evi-dências de DD ao ETT.6 Esses autores sugerem que a realização do ETT na avaliação pré-operatória de rotina de pacientes portadores de DD isolada assin-tomáticos, quando submetidos a cirurgias vasculares abertas, pode ser de estimado valor prognóstico.

São considerados fatores de risco para insuficiên-cia cardíaca diastólica: mulher hipertensa com mais de 70 anos, hipertensão sistólica isolada, diabetes mellitus, insuficiência renal crônica, hipertrofia de VE, isquemia do miocárdio prévia, fibrilação atrial, ganho de peso recente (sobrecarga volêmica), intole-rância ao exercício e valores do BNP (Brain Natriure-tic Peptide) > 120 pg/mL.8

CaUsas

Entre as causas da disfunção diastólica, pode-se citar aquelas relacionadas à hipertrofia miocárdica patogênica (tendo como causa primária a miocardio-patia hipertrófica ou podendo ser secundária à hiper-tensão arterial sistêmica), relacionadas ao envelheci-mento (miocardioesclerose), à fibrose isquêmica e à miocardiopatia restritiva (distúrbios infiltrativos e doenças de armazenamento) e relacionadas aos dis-túrbios endomiocárdicos (fibrose endomiocárdica).11

iMPLiCações PerioPeratórias e CUidados aNestésiCos

A DD é considerada precursora da insuficiência cardíaca diastólica, é também um preditor de risco in-dependente para dificuldade de desmame do bypass cardiopulmonar12 e é reconhecida como um marca-dor precoce em potencial de isquemia miocárdica,13,14

te, usando nitroglicerina ou manobra de Valsalva, e assim revelar um padrão de relaxamento retardado (onda E < A). No terceiro padrão, chamado restritivo, o enchimento protodiastólico está anormalmente au-mentado (pressões de enchimento elevadas), a con-tratilidade do AE está diminuída e a razão E/A > 2, refletindo avanço no estágio da doença. É encontrado em pacientes com grave disfunção diastólica, no está-gio final das miocardiopatias dilatadas e na conges-tão pulmonar. Similar à pseudonormalização, a doen-ça restritiva pode ser reversível ou irreversível, sendo distinguidas uma da outra a partir da redução da pré--carga, conforme descrito anteriormente. Nesse estu-do, os autores informam que pacientes com restrição do enchimento diastólico têm mais complicações do que os com padrão de enchimento pseudonormal ou relaxamento anormal e que a IC sintomática aumenta a morbidade pós-operatória em pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas. Entretanto, o valor prognós-tico da DD isolada assintomática no pós-operatório ainda não é bem-estabelecido.6,10

Flu et al.10 demonstraram, em trabalho recente-mente publicado, que pacientes portadores de DD isolada assintomática têm risco aumentado de even-tos cardiovasculares em 30 dias e em longo prazo, quando submetidos à cirurgia vascular aberta. Foram selecionados 1.005 pacientes, avaliados previamente pelo ETT, que seriam submetidos à cirurgia vascular, sendo 649 (65%) submetidos à cirurgia aberta e 356 (35%) à cirurgia endovascular. A maioria tinha idade média de 67 anos (77%). A disfunção ventricular es-tava presente em 506 pacientes (50%), sendo que 403 (80%) eram assintomáticos e 103 (20%), sintomáti-cos. Dos assintomáticos, 209 (52%) tinham disfunção diastólica isolada e os demais assintomáticos, 194 (48%), tinham disfunção sistólica. Para os dois tipos de procedimentos houve ajuste adicional de medica-mentos (beta-bloqueadores, estatinas, bloqueadores de receptores de angiotensina e diuréticos), sem al-teração no valor prognóstico de disfunção do VE em 30 dias de evolução. Em 30 dias, 164 (16%) pacientes faleceram, sendo 107 (11%) deles por eventos cardio-vasculares. Desse total, 15 (3%) tinham função de VE normal, 21 (10%) tinham DD assintomática, 31 (16%) disfunção sistólica assintomática e 40 (39%) tinham insuficiência ventricular sintomática. Dos 107 pacien-tes, 48 (52%) tiveram isquemia miocárdica ou infar-to agudo do miocárdio. No presente estudo, houve aumento da mortalidade cardiovascular em 30 dias nos pacientes com DD ou sistólica assintomáticas,

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Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

tido na DD (redução do limiar arritmogênico) e isso deve ser levado em conta na escolha de agentes ino-trópicos ou de outras drogas. Fármacos lusitrópicos, como a milrinona, podem trazer particular benefício no desmame do bypass cardiopulmonar. Além disso, beta-bloqueadores e bloqueadores do canal de cálcio não di-idropiridínicos têm sido propostos para a pre-venção e tratamento das taquiarritmias e consequen-te redução do consumo de oxigênio pelo miocárdio, prevenindo, assim, isquemia perioperatória,5,6,15,21,22

Os principais efeitos do envelhecimento no siste-ma cardiovascular são os aumentos da rigidez arte-rial e da rigidez do miocárdio, comprometimento da responsividade beta-adrenérgica, prejuízo da função endotelial, redução da função do nó sinoatrial, redu-ção da responsividade dos barorreceptores e a resul-tante redução acentuada da reserva cardiovascular.8

Segundo Muravchick et al.21, os idosos têm eleva-do tônus simpático em repouso e, com o envelheci-mento, há redução da resposta inotrópica e cronotró-pica à estimulação adrenérgica e beta-agonista. Além disso, eles possuem mais intolerância à variação da volemia: o aumento pode gerar congestão pulmonar e a redução pode acarretar hipotensão arterial. Nor-malmente, eles se apresentam, no dia da cirurgia, depletados de volume, devido à redução da ingesta hídrica, uso de diuréticos e alterações da função re-nal. Portanto, a indução anestésica no paciente idoso pode vir acompanhada de profunda hipotensão arte-rial, devido a todos os fatores que levam à depleção volêmica, à redução do tônus simpático basal e sua maior dependência da pré-carga para a manutenção do seu débito cardíaco. Da mesma forma, pequenas reduções no retorno venoso, como aquelas que ocor-rem na ventilação com pressão positiva, perda do vo-lume sanguíneo efetivo ou drogas venodilatadoras, levam ao comprometimento significativo do DC. É de grande relevância manter, em pacientes idosos, frequência cardíaca entre 60 e 80 bpm e evitar altera-ções bruscas na pressão arterial sistêmica. A utiliza-ção de drogas, como vasopressores e/ou vasodilata-dores em baixas doses, pode amenizar as alterações fisiológicas relacionadas à anestesia, trazendo gran-des benefícios ao paciente com DD. A finalidade é preservar a distensibilidade vascular, evitar reduções na pré-carga e na pressão de perfusão coronariana e manter o débito cardíaco com o mínimo trabalho do miocárdio. De acordo com esses autores, pacien-tes com DD toleram menos a reposição volêmica rápida. Esses pacientes devem ser hidratados de

O anestesista deve estar apto a identificar o pa-ciente de risco, as situações de risco e as drogas que afetam a função diastólica do coração, seja no perío-do perioperatório ou na unidade de cuidados intensi-vos. No período perioperatório, existe a possibilida-de de ocorrência de descompensação de disfunção diastólica crônica ou indução de disfunção diastólica aguda. A fibrilação atrial, isquemia miocárdica, sepse e insuficiência renal são fatores que podem precipitar esse quadro, sendo que a hipertensão não controlada está presente em 50% dos casos.15 Por isso, completa assistência pré-operatória para estratificação de risco desses pacientes se torna mandatória. É relevante, principalmente nos idosos, questionar sobre a capa-cidade funcional e ter como referência o guideline publicado pela ACC/AHA para avaliação de pacientes cardiopatas submetidos à cirurgia não cardíaca16. Na investigação diagnóstica, devem ser solicitados ECG de 12 derivações, o ETT, radiografia de tórax, ampla revisão laboratorial, incluindo eletrólitos séricos, pep-tídeo natriurético tipo-B (BNP).8,17

Evidências sugerem que pressões de enchimen-to diastólico do VE elevadas podem ser o fator mais importante para piores prognósticos do que simples-mente a existência do atraso do relaxamento ou alte-rações na pós-carga. 18

Além disso, independentemente da função sistóli-ca, também são consideradas preditores de mortali-dade em cirurgia cardíaca, preditores de mais longo tempo de internação hospitalar e de mais permanên-cia na UTI após cirurgia cardíaca. Estudos também observaram alta incidência de readmissão na UTI, com necessidade de reintubação, naqueles pacientes que apresentavam disfunção diastólica e aumento no tamanho do átrio esquerdo.19,20

Apesar de não haver alguma estratégia para me-lhorar a função diastólica agudamente, alguns cui-dados específicos são necessários no manejo desses pacientes. É de fundamental importância prevenir e tratar imediatamente os distúrbios do ritmo cardíaco, precipitados por hipo ou hipercalemia, hipovolemia ou anemia, uma vez que eles diminuem o tempo diastólico, reduzindo também o tempo de enchimen-to ventricular e a perfusão coronariana.15,21,22 O fluxo sanguíneo coronariano é maior durante o relaxamen-to isovolumétrico, por isso o retardo no relaxamento compromete a perfusão coronariana no início da di-ástole22. Estratégias de proteção do miocárdio são de grande importância. Como mencionado previamente, o controle do cálcio no miocárdio está comprome-

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Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

que, mesmo sem diagnóstico prévio da DD, o aneste-siologista deve partir do princípio de que os pacien-tes idosos, hipertensos, diabéticos, coronariopatas, com insuficiência renal crônica, fibrose isquêmica e distúrbios infiltrativos do miocárdico são todos poten-cialmente portadores de alterações do relaxamento diastólico do VE. Fica também esclarecido que são pacientes que não toleram as variações da frequência cardíaca, da pressão arterial e, principalmente, da vo-lemia. Os agentes anestésicos inalatórios (isoflourano, sevoflurano e desflurano) não têm influência significa-tiva no relaxamento diastólico do ventrículo esquerdo.

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Os anestésicos voláteis prolongam o relaxamento isovolumétrico do VE de maneira dose-dependente, prejudicam o inotropismo, o lusitropismo e fazem vasodilatação arterial e venosa. Porém, em modelos animais com cardiomiopatia, apesar de produzirem efeitos inotrópicos negativos, foi observado melhora no enchimento e no relaxamento do VE. Isso se deve, provavelmente, a reduções na pré e na pós-carga.9

Em estudo recentemente publicado, Sarkar et al.9 avaliaram e compararam os efeitos do isoflurano, sevoflurano e desflurano na função diastólica de pacientes com relaxamento diastólico anormal, que seriam submetidos à cirurgia cardíaca, a partir da ecocardiografia transesofágica perioperatória. Parâ-metros hemodinâmicos foram medidos e compara-dos antes e depois da administração de tais drogas. Eles demonstraram que, em concentrações clínicas (aproximadamente 1 CAM), isoflurano, sevoflurano e desflurano reduzem a pressão arterial e a resistência vascular sistêmica, provocando melhora no índice de relaxamento diastólico do VE. Os autores atribuíram essa melhora à significativa redução da pós-carga provocada por esses agentes, já que outros trabalhos sugerem que os anestésicos inalatórios não alteram as propriedades viscoelásticas intrínsecas do mio-cárdio. Isso sugere que os efeitos positivos dos anes-tésicos inalatórios no relaxamento ventricular po-dem, no futuro, influenciar o manejo perioperatório dos pacientes com DD previamente diagnosticada.

CoNCLUsão

A realização do diagnóstico de DD assintomática na avaliação pré-operatória pelo cardiologista, a partir da realização do ETT, está ganhando cada vez mais im-portância. Não obstante, este artigo de revisão mostra

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Disfunção diastólica e sua importância para o anestesiologista

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artiGo de revisão

Instituição:Hospital Ascomcer Juiz de Fora, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Av. Independência, 3.500Bairro: CascatinhaJuiz de Fora, MG – BrasilCEP: 36 025-290Email: [email protected]

1Coordenador do Serviço de Anestesiologia do Hospital Ascomcer, Anestesiologista do HU–CAS (UFJF), da Rede FHEMIG e do Centro de Restauração Plástica, Juiz de Fora, MG –Brasil; Professor da disciplina de anestesiolo-gia da Faculdade de Medicina de Barbacena, Barbacena, MG – Brasil.

resUMo

Anestesiologistas são submetidos a uma série de riscos ocupacionais em decorrência do local de trabalho e atividade profissional, tais como toxicidade de gases anesté-sicos, exposição ocupacional a sangue e secreções (risco de doenças infecciosas), alergia ao látex e risco de exposição às radiações ionizantes. Outros riscos envolvem a eletrocussão, fogo e explosão. E novos riscos têm sido identificados: drogadição e burnout. Não é fácil mensurá-los, podendo os mesmos ter sérias consequências para o anestesiologista. A prevenção desses riscos inclui reconhecimento precoce da situação pelos profissionais da equipe, melhora nas condições de trabalho e no reconhecimento profissional.

Palavras-chave: Anestesia; Anestesiologia/recursos humanos; Anestesicos/toxicidade; Exposição Ocupacional/prevenção & controle; Condições de Trabalho; Riscos Ocupa-cionais; Saúde do Trabalhador.

aBstraCt

Anesthesiologists face a range of occupational hazards due to the workplace and profes-sional activity, as toxicity of anesthetic gases, occupational blood and human secretions exposure( risk of infectious diseases), latex allergy and risk related to the exposure to ionizing radiation. Another hazards involves electrification, fire and explosion and new risks have been identified: drug-addiction and burnout. It’s difficult to measure them, and they can have serious consequenses for the anesthesiologists. Their prevention includes early tracking by the members of the team, the improvement of working conditions and better professional recognition.

Key words: Anesthesia; Anesthesiology/human resources; Anesthetics/toxicity; Occupa-tional Exposure/prevention & control; Working Conditions; Occupational Risks; Occupa-tional Health.

iNtrodUção

Não é recente a ideia de que o local de trabalho das pessoas apresenta situações de risco, responsáveis por acidentes e doenças. O ambiente de trabalho, mesmo com os diferentes modelos gerenciais de organização, possui riscos inerentes. Algu-mas das situações mais comuns de risco à geração de danos associados à produção são expostas na Tabela 1 a seguir1:

Occupationalhazards in anesthesiology

Alexandre Almeida Guedes1

Riscos profissionais em anestesiologia

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Riscos profissionais em anestesiologia

como o DNA. Exemplos: Raios-X, raios gama, nêu-trons e partículas α e β.

■ Não ionizantes: dotadas de baixa energia, incapa-zes, portanto, de ionizarem átomos / moléculas. Exemplo: laser.

Exposição ocupacional de anestesiologistas aos Raios-X

Amplamente utilizados na Medicina (radiologia simples e intervencionista e nos procedimentos ra-dioterápicos), não raro os anestesiologistas são solici-tados a realizar anestesia nesses procedimentos.

A exposição ocupacional crônica pode ocasionar diversos malefícios, como alterações cromossômicas (neoplasias diversas, como de tireoide e leucemias), catarata, destruição celular e alterações fetais nas ges-tantes expostas (malformações, neoplasias e morte).

Entre as medidas de proteção utilizadas, citamos:

■ Manter a maior distância possível da fonte emis-sora: a diminuição da exposição é proporcional ao quadrado da distância da fonte (lei do quadra-do do inverso). E, apesar disso, salienta-se que os Raios-X podem ser refletidos pelo paciente e estruturas adjacentes, contribuindo para a disper-são desses raios na circunvizinhança.

■ Utilizar mandatoriamente os equipamentos de proteção individual: aventais de chumbo dentro

A sala de operações (SO) e diversos outros fato-res tornam a prática da anestesiologia uma atividade dotada de diversos agentes agressores. E os estudos confirmam o fato de que o trabalho em centros cirúr-gicos é um risco ocupacional.2

O objetivo desta revisão é apresentar as prin-cipais características de risco em que a prática da anestesiologia expõe aqueles que se dedicam profis-sionalmente a ela.

exPosição oCUPaCioNaL às radiações

Considerações iniciais

Radiação é uma forma de energia que se propaga de um ponto a outro no espaço (eletromagnética) ou num meio físico, material (mecânica). A utilização de certas radiações na Medicina, com finalidades diagnóstico-terapêuticas, não é recente e tem sido progressivamente mais utilizada.3-5

As radiações podem ser:

■ Ionizantes: dotadas de alta energia e que transfe-rem esta energia para as partículas que são en-contradas em sua trajetória, capazes, assim, de io-nizarem, isto é, “arrancarem” elétrons de átomos ou moléculas, produzindo íons e radicais livres, que podem pertencer a partes vitais da célula, tal

Tabela 1 - Situações mais comuns riscos

Categorias de situações de risco Principais características da exposição Principais características dos efeitos clínicos

QUíMiCos depende da toxicologia da substância depende da toxicologia da substância

BioLóGiCos Parasitos, bactérias, vírus e outros microrganismos Malária, leptospirose, doenças do aparelho digestivo, tétano, infecções respiratórias

FísiCos

ruído excessivodesconforto térmicovibração excessivaalterações de pressãoiluminação excessiva ou deficienteradiações ionizantes e não ionizantesdescargas elétricas

Hipoacusia, surdez, estresseHipertermia, golpe de calor, gangrenaMicrolesão articularBarotraumas, doença descompressiva, intoxicações, embolia traumática pelo arFadiga visualeritema, queimaduras, conjuntivite foto traumática, catarata, câncerQueimadura, fibrilação ventricular

MeCâNiCos equipamentos sem proteção para o trabalhador, quedas, acidentes de trânsito traumatismos em geral

erGoNÔMiCos Planejamento inadequado do local de trabalho, postura anormal do corpo

Fadiga, lombalgia, artrose da coluna vertebral, hérnia discal

PsiCossoCiais relações e organização do trabalho não favorável ao trabalhador estresse, fadiga, desgaste e lesões traumáticas

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Riscos profissionais em anestesiologia

■ Transferência inadvertida de calor: queimaduras e lesões na pele e principalmente nos olhos, oca-sionando queimadura de córnea e retina, lesões no nervo óptico e catarata. Importante lembrar o grave risco de ignição de tubos traqueais, o que não é objetivo desta revisão.

Recomendações para minimizar o risco ocupacional

■ Utilização de óculos especialmente desenhados para proteção contra este tipo de radiação, a to-dos os presentes na sala cirúrgica.

■ Número mínimo de pessoas na sala cirúrgica. ■ Uso do dispositivo por pessoal treinado este tipo

de radiação. ■ Manter a luz da sala cirúrgica acessa (miose reduz

o risco de lesão na retina). ■ Remover joias, colares, brincos e anéis, para mini-

mizar a reflexão do laser para fora do sítio cirúrgico. ■ permitir renovação contínua do ar da sala cirúrgica.

exPosição oCUPaCioNaL a Gases aNestésiCos2

A SO pode se contaminar por resíduos de agentes inalatórios de diversas formas: falha ao desligar as válvulas de controle de fluxo, máscaras faciais mal--adaptadas, flushing do circuito respiratório, enchi-mento de vaporizadores, cânulas traqueais sem ba-lonete, sistemas respiratórios de anestesia pediátrica, amostragem sidestream dos analisadores de gases, falhas ou inexistência de sistemas de eliminação das SOs e escapes diversos (canisteres, anéis de vedação, mangueiras, etc.).

São riscos ocupacionais citados na literatura: ■ Em mulheres expostas: risco aumentado de abor-

tamento espontâneo e de anormalidades congê-nitas no feto, câncer (cervical), doenças hepáti-cas e renais.

■ Em homens expostos: risco aumentado de hepa-topatias, risco de anomalias congênitas na prole.

A mutagenicidade e a carcinogênese não fo-ram confirmadas, podendo talvez existir somen-te em exposições improváveis de serem reprodu-zidas em humanos.

dos padrões técnicos, protetores de tireoide e gô-nadas, óculos, luvas e mangas protetoras.

■ Princípio da mínima exposição possível para se atingir o efeito desejável (as low as reasonably achievable), já que não existe nível mínimo de exposição plenamente seguro. Se disponíveis, uti-lização de anteparos móveis de chumbo, quando disponíveis.

■ Monitorização individual da exposição por meio de dosímetros individuais. A dose máxima reco-mendada é de 100 m rem / semana ou 5 rem / ano (no Sistema Internacional de Unidades, a unidade de dose de radiação é o Sievert, sendo que 1 rem equivale a 0,01 Sv). Apenas para se ter ideia, uma radiografia simples de tórax produz radiação em torno de 0.25 rem cada.

■ Atenção especial a certos procedimentos (angio-grafia digital com subtração de imagens e proce-dimentos hemodinâmicos) sabidamente maiores emissores de Raios-X.

Laser

Laser é a sigla para light amplification by stimu-lated emission of radiation, ou seja, é a radiação ele-tromagnética emitida por um dispositivo utilizando amplificação da luz por emissão de radiação esti-mulada. Diversos são os tipos e a maioria dos lasers utilizados na sala de cirurgia são os mais perigosos do ponto de vista ocupacional. Diferentemente dos Raios-X, a distância da fonte emissora não altera sig-nificativamente a intensidade da radiação.

Sua empregabilidade em cirurgias ganhou po-pularidade, pois concentra grande quantidade de energia numa pequena e precisa área, permitindo dissecções precisas, coagulação de pequenos vasos, mantém as condições de esterilidade e provoca me-nos resposta inflamatória.

Entre os riscos ocupacionais, destacam-se

■ Vaporização de tecidos: forma gases e fumaça, que podem conter pequenas partículas (podem conter DNA de vírus), contribuindo para a polui-ção ambiental, possível mutagenicidade, risco de embolia gasosa e redução da visibilidade do campo operatório.

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Riscos profissionais em anestesiologia

Chung et al.9 procuraram identificar os agentes presentes na fumaça decorrente da ressecção tran-suretral de próstata. Entre os diversos constituintes, três agentes químicos (1,3-butadieno, vinil-acetileno e acrilonitrilo) são muito tóxicos e carcinogênicos.9 As implicações da inalação crônica desses agentes precisam ser mais bem estudadas.

Entre as medidas de precaução estão a sucção, filtração e evacuação apropriada da fumaça cirúrgi-ca10, medidas, infelizmente, negligenciadas ou pou-co empregadas no nosso meio.

Risco da exposição cutânea em decorrência da manipulação de fármacos

Durante a atividade diária do anestesiologista, di-versos agentes farmacêuticos são manipulados manual-mente antes de serem administrados aos pacientes. Des-ta forma, o sistema imune pode sensibilizar-se frente à exposição cutânea (dermatite de contato, por exemplo), deixando aquele profissional em risco de desenvolver reações de hipersensibilidade a determinado fármaco.

Newman11, em recente autorrelato de caso, des-creve uma grave reação alérgica ocorrida enquanto ele, um residente de anestesiologia, manipulava suc-cinilcolina e tiopental. Testes cutâneos posteriores in-dicaram hipersensibilidade a todos os bloqueadores neuromusculares.

Postulou-se que a sensibilização ocorreu e anti-corpos da classe IgE foram direcionados ao radical de amônio quaternário (comuns a todos estes fárma-cos e ainda encontrados em outros produtos, como produtos químicos de uso doméstico, certos cosmé-ticos e de tratamento capilar e xaropes antitussíge-nos). Esse autor enfatiza o potencial risco ocupa-cional para os profissionais de saúde envolvidos na manipulação de fármacos.

Alergia ao látex

O látex é um produto muito presente no cotidia-no dos profissionais de saúde, que estão no grupo de risco à exposição ocupacional, fato já considerado como um grave problema de saúde pública12. Proteí-nas do látex são os agentes alergênicos encontrados em quantidades variáveis nas luvas cirúrgicas, a prin-cipal fonte de antígenos entre esses profissionais. A exposição e sensibilização podem decorrer de12:

Os profissionais das salas de recuperação tam-bém são expostos, embora os níveis de resíduos se-jam menores que os da SO.

Embora existam relatos negativos quanto aos efei-tos da exposição ocupacional prolongada a resíduos desses gases, há ainda muitas controvérsias. Dados contraditórios são encontrados na literatura, mesmo nos trabalhos das forças-tarefas de renomadas insti-tuições reguladoras internacionais.

A literatura cita alguns padrões de exposição má-ximos aos resíduos de agentes inalatórios:

■ 25 partes por milhão (ppm) para óxido nitroso (como agente único).

■ 2 ppm para halogenados (ou 0.5 ppm quando o óxido nitroso for usado simultaneamente).

■ 100 ppm para óxido nitroso. ■ 50 ppm para enflurano ou isoflurano. ■ 10 ppm para halotano.

Como se vê, os diferentes valores citados refletem a dificuldade em ajustar os padrões.

exPosição oCUPaCioNaL a aGeNtes QUíMiCos

Exposição ao polimetilmetacrilato (pmma)

Trata-se de agente comumente utilizado para ci-mentação óssea em ortopedia. Quando do preparo, concentrações elevadas já foram detectadas diluídas no ar da SO, o que expõe o pessoal desse ambiente a riscos ocupacionais, como irritação da pele, queima-duras, reações alérgicas, irritação ocular e cefaleia.6

Exposição à fumaça cirúrgica proveniente do campo operatório

A cauterização elétrica ou a laser de tecidos hu-manos produz diversos aerossóis (hidrocarbonetos complexos, material orgânico e, em alguns casos, células tumorais viáveis ou partículas virais7) que normalmente são lançados na SO, sendo passíveis de serem inalados pelo pessoal aí presente, o que, fa-talmente, pode acarretar risco ocupacional: sintomas de irritação das vias aéreas (tosse crônica, estridor, congestão, exacerbação do broncoespasmo, cefaleia fadiga e irritação ocular).8

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Riscos profissionais em anestesiologia

aGressões PsiCoLóGiCas ao aNestesioLoGista eM deCorrêNCia da atividade ProFissioNaL

Profissionais de saúde experimentam níveis epidêmicos de estresse, falta de satisfação com o trabalho e burnout ou síndrome do esgotamento profissional.17

A anestesiologia, em particular, é considerada por alguns como uma especialidade extremamen-te estressante18 e vários são os fatores de agressão ocupacional15,19:

■ Condições de trabalho inadequadas e insuficientes. ■ Poluição da SO (sonora ambiental). ■ Longas jornadas de trabalho. ■ Trabalho noturno e privação do sono. ■ Aumento da necessidade de produção. ■ Burocracia e regulação da atividade profissional:

sobrecarga de responsabilidades. ■ Redução do tempo disponível com seus pacientes. ■ Redução dos ganhos remuneratórios. ■ Rápida expansão do conhecimento médico: ne-

cessidade de permanente atualização e falta de tempo para tal.

■ Assistência a pacientes extremamente graves. ■ Imagem pública de a anestesiologia ser uma espe-

cialidade inferior às outras. ■ Árduo processo de formação: tornam os residen-

tes em anestesiologia particularmente propensos.

Adicionalmente, a própria personalidade do anes-tesiologista pode contribuir para o desgaste psíquico. Estudo que investigou este tema constatou que eles são mais reservados, sérios, inteligentes, assertivos, conscienciosos, autossuficientes e tensos quando comparados aos médicos de outras especialidades.20

As consequências são diversas: estresse, ansieda-de, transtornos do humor, problemas pessoais (rela-ções pessoais prejudicadas e abuso de substâncias/ drogadição), ideias suicidas e suicídio, afastamento precoce e permanente do trabalho, doenças físicas, síndrome burnout, redução da sua performance pro-fissional e remuneração, da vigilância a seus pacien-tes, da relação médico-paciente e, em decorrência disso, a ocorrência de má-prática, erros e demandas judiciais na especialidade.

Burnout é uma síndrome psíquica relacionada ao trabalho, isto é, um tipo de resposta prolongada a estresses emocionais e interpessoais crônicos no tra-balho e que foi descrita inicialmente em 1970. Mani-

■ Contato com pele e mucosas. ■ Inalação de aerossóis formados pela ligação das

proteínas do látex com poeira ou talco. ■ Ingestão. ■ Injeção parenteral. ■ Inoculação por ferimentos (por exemplo, derma-

tite de contato nas mãos dos anestesiologistas).

Os casos de alergia ao látex têm sido cada vez mais relatados13 e as manifestações clínicas variam de der-matite de contato (a mais comum e que não é imuno-logicamente mediada) à reação anafilática clássica.12

PoLUição soNora Na saLa CirÚrGiCa

A literatura é bastante contundente de que a ex-posição ocupacional a ruídos não deva exceder 90 dB por oito horas diárias de trabalho.14

Nas SOs, os níveis sonoros podem estar elevados, aproximando-se ou mesmo ultrapassando o nível máximo permitido, sendo diversas as fontes poluido-ras: ventiladores dos aparelhos de anestesia, cardios-cópios, oxímetros de pulso, aspiradores, conversas, queda de materiais / equipamentos, instrumentos cirúrgicos como serras e furadeiras, aparelhos de ar--condicionado e música na SO.15

A poluição sonora pode acarretar uma série de efeitos indesejáveis15:

■ Prejuízo à comunicação dentro da sala cirúrgica e à capacidade de ouvir alarmes: aumenta o risco de condutas inadequadas ou negligentes.

■ Redução da eficiência mental, da memória, da capacidade de realizar tarefas mais complexas inerentes à atividade do anestesiologista, como monitorização e vigilância adequada.

■ Redução da capacidade produtiva, da acuidade auditiva e aumento da irritabilidade, do estresse, da liberação de catecolaminas, da frequência car-díaca e da pressão arterial.

Por outro lado, a música dentro da SO pode ser be-néfica. Em recente editorial, Nociti descreve que a mú-sica relaxante (seleção e volume adequados) apresen-ta vantagens aos pacientes e, possivelmente, a todo o pessoal do ambiente cirúrgico, tais como a redução do nível de ansiedade pré-operatória, do consumo de an-siolíticos, ansiólise intraoperatória (comparável à dos benzodiazepínicos), melhor analgesia pós-operatória e mobilização mais precoce dos pacientes.16

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Riscos profissionais em anestesiologia

■ Vírus da hepatite B (VHB): principal agente respon-sável pela transmissão de infecção a profissionais de saúde, os quais apresentam prevalência soroló-gica muito superior à da população em geral.

■ Vírus da hepatite C: maioria absoluta dos casos é pós-transfusional.

■ Vírus HIV: embora represente um dos maiores pro-blemas de saúde da atualidade, em função de seu caráter pandêmico e de sua gravidade, não há, até o momento, relato de transmissão durante anestesia.27

■ Influenza-vírus e outros vírus do sistema respiratório. ■ Mycobacterium tuberculosis.

Estima-se que o VHB seja responsável por 1 milhão de mortes anualmente e que existam 350 milhões de portadores crônicos no mundo.28 De maneira seme-lhante às outras hepatites, as infecções causadas pelo VHB são habitualmente anictéricas e a cronificação (persistência do vírus por mais de seis meses) ocorre em aproximadamente 5 a 10% dos indivíduos adultos infectados. Uma particularidade da cronificação é a possibilidade de evolução para o câncer hepático, in-dependentemente da existência de cirrose.29 A Tabela 2, a seguir, mostra as recomendações para a profilaxia da hepatite B após exposição ocupacional a material biológico, de acordo com o Ministério da Saúde29:

aBUso de sUBstâNCias e droGadição eNtre aNestesioLoGistas

O abuso de uma substância é caracterizado por efeitos adversos significativos decorrentes do repeti-do uso desta substância. Já na adição, o uso contínuo de uma dada substância acarreta fortes impactos, tais como sintomas de abstinência, a necessidade de pro-gressivas quantidades do fármaco (o que acarreta crescente procura pelo agente) e as infrutíferas ten-tativas do drogadito de autocontrolar seu uso.6 Entre os fatores causais desse grave problema, citam-se15:

■ Agressões psicológicas em decorrência da ativi-dade profissional.

■ Facilidade de obtenção de fármacos psicoativos. ■ Desejo de experimentação aliado ao sentimento

de “domínio” sobre o fármaco. ■ Baixa autoestima. ■ Predisposição genética. ■ Coexistência de desordens psiquiátricas (especial-

mente depressão).

festações clínicas são usualmente pouco específicas e incluem fadiga, transtornos alimentares e do sono, cefaleia e instabilidade emocional21. É considerada presente quando o profissional, a partir de atributos mensuráveis descritos em 199022, refere altos escores de exaustão emocional (sensação subjetiva de fadiga ou estado mental confuso-estupor), baixa realização pessoal (sensação de frustração com o trabalho rea-lizado) e despersonalização (tentativa do profissional de se separar de seu trabalho, como um mecanismo de defesa, gerando reação negativa, insensibilidade ou afastamento excessivo de seus pacientes).

De Oliveira et al.23, em recente artigo sobre o tema, mostram que aqueles envolvidos com direção de ser-viços de anestesiologia são também particularmente susceptíveis ao burnout. Hyman et al. confirmam que, num cenário multiprofissional de assistência de saú-de, os médicos (especialmente os residentes) apresen-tam os mais altos escores globais dessa síndrome.24

Estudos constatam, ainda, que o estresse ocu-pacional converge para o estabelecimento de uma situação de fator de risco para a hipertensão arterial sistêmica (HAS)25 e outras doenças físicas. Pesquisas comparando grupos de médicos anestesiologistas com os de outras especialidades concluíram que os primeiros estão submetidos a estresse que provoca mais número de alterações psicológicas do que os de-mais. No mesmo estudo foi encontrado percentual de 22% de hipertensão arterial, 68% de ansiedade, 50% de transtornos do sono, além de gastrite, dores angi-nosas e outros sintomas.26 A solução para o tema não é simples e envolve planejamentos em nível institucio-nal e de políticas nacionais de saúde ocupacional.

risCo oCUPaCioNaL de doeNças iNFeCCiosas

A transmissão de agentes infecciosos para o anes-tesiologista pode ser decorrência da combinação entre o contato com sangue, secreções e líquidos corporais dos pacientes, de acidentes com materiais perfurocortantes e/ou de ferimentos preexistentes no profissional (especialmente mãos) e, ainda, inalação de aerossóis.15

Diversos patógenos são passíveis de serem adqui-ridas pelo exercício da atividade ocupacional15:

■ Família herpes-vírus (varicela-zoster, herpes sim-ples, citomegalovírus, Epstein-Barr).

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Riscos profissionais em anestesiologia

ser imediata e totalmente afastado de suas ativida-des laborais; e suporte psiquiátrico e familiar são es-senciais. O tratamento é sempre muito difícil, assim como a sua reintegração à especialidade.

risCo oCUPaCioNaL de eLetroCUssão

À medida que, progressivamente, mais equipa-mentos eletroeletrônicos são incorporados ao arse-nal médico na SO, o risco de choques elétricos no pessoal e nos pacientes aí presentes aumentou subs-tancialmente.15,33,34

Os impactos da eletrocussão sobre tais vítimas na SO são bem conhecidos e podem variar de peque-nas e desagradáveis sensações de choque elétrico a queimaduras diversas, lesões teciduais e disritmias cardíacas graves, incluindo a fibrilação ventricular.

Entre as medidas de proteção gerais, citam-se: ■ Manutenção periódica do material eletroeletrôni-

co e da rede de abastecimento elétrica da SO por pessoal especializado (engenharia clínica).

■ Utilização de material e instalação elétrica em conformidade com as normas técnicas vigentes.

■ Cabos intactos e com três fios (um deles é o fio- - terra).

■ Aterramento mandatório dos equipamentos (fio- - terra).

■ Não utilização de adaptador múltiplo.

O abuso/drogadição ocorre mais frequentemente entre os médicos do que na população em geral e, entre esses, os anestesiologistas são os mais sujeitos, especialmente os residentes.30 Estudos retrospecti-vos internacionais indicam prevalência de 1 a 2% de anestesiologistas vítimas de abuso/drogadição. No Brasil, estudo de 2005 revelou prevalência em torno de 12,5% entre esses profissionais, muito superior ao restante da população médica (3%).15

São citados diversos agentes envolvidos6,15: álcool, opioides (morfina, meperidina, fentanil, sufentanil), maconha, cocaína, benzodiazepínicos, propofol (em doses subanestésicas, especialmente nos últimos 10 anos31), tiopental e agentes inalatórios. Wilson et al.32 pesquisaram o abuso de agentes inalatórios em pro-gramas de residência de anestesiologia nos Estado Unidos, concluindo que o problema é de acentuada prevalência, que a taxa de mortalidade nos envolvi-dos é alta e confirmam que o abuso não é restrito apenas a agentes venosos32. Aliás, abuso/drogadição contribui diretamente para elevado índice de morta-lidade e também de suicídio. Entre anestesiologistas, há quem destaque mais elevada ocorrência desses eventos, quando comparados aos demais médicos, fato este que necessita de estudos metodologicamen-te mais apurados, pois os resultados dos estudos so-bre este ponto são conflitantes e questionados.6

Confirmado o quadro em questão (o que é geral-mente difícil de ser feito), o anestesiologista deverá

Tabela 2 - Recomendações para a profilaxia da hepatite B após exposição ocupacional

situação vacinal e sorológi-ca do profissional exposto

Paciente-fonte:HBsag positivo

Paciente-fonte:HBsag negativo

Paciente-fonte:HBsag desconhecido ou não testado

Não vacinado imunoglobulina anti-hepatite tipo B + iniciar vacinação

iniciar vacinação iniciar vacinação

Com vacinação incompleta imunoglobulina anti-hepatite tipo B + completar vacinação

Completar vacinação Completar vacinação

Previamente vacinado:

Com resposta vacinal conhecida e adequada

Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica Nenhuma medida específica

sem resposta vacinal após a 1ª série (3 doses)

imunoglobulina anti-hepatite tipo B + 1ª dose da vacina da nova série de 3 doses

iniciar nova série de vacina (3 doses) iniciar nova série de vacina (3 doses)

sem resposta vacinal após a 2ª série (6 doses)

imunoglobulina anti-hepatite tipo B(2 x)

Nenhuma medida específica imunoglobulina anti-hepatite tipo B(2 x)

resposta vacinal desconhecida testar o profissional de saúde: se resposta vacinal adequada, nenhuma medida específica; se resposta vacinal inadequada, imunoglobulina anti-hepatite tipo B + 1ª dose da vacina contra hepatite B.

testar o profissional de saúde: se resposta vacinal adequada, nenhuma medida específica; se resposta vacinal inadequada, fazer segunda série de vacinação.

testar o profissional de saúde: se resposta vacinal adequada, nenhuma medida específica; se resposta vacinal inadequada, fazer segunda série de vacinação.

Fonte: Brasil. Ministério da saúde29

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Riscos profissionais em anestesiologia

materiais. O risco relacionado à exposição a radia-ções ionizantes está mais bem controlado devido às rigorosas normas de proteção implementadas. O am-biente da SO envolve riscos de eletrocussão, fogo e explosão. Novos riscos têm sido identificados, como drogadição e burnout.

A frequência desses riscos ocupacionais é difícil de ser avaliada, mas eles podem trazer sérias conse-quências a pacientes e anestesiologistas. Já a preven-ção envolve o reconhecimento precoce do proble-ma, a busca por melhores condições de trabalho e de reconhecimento profissional.

A Tabela 3, a seguir, apresenta uma síntese do as-sunto objetivo deste artigo35:

CoNCLUsão

Há uma série de riscos ocupacionais relaciona-dos à prática da anestesia. A toxicidade dos agentes inalatórios, particularmente do óxido nitroso, foi des-tacadamente mais expressiva no passado. Os agen-tes mais tóxicos foram abandonados e medidas de proteção (sistemas de evacuação, ventilação das SO, circuitos fechados de anestesia) diminuíram conside-ravelmente tais riscos.35

Risco ocupacional de doenças hemotransmissí-veis também reduziu, graças à melhor observância às regras de segurança preconizadas.

O risco de alergia ao látex tem diminuído à me-dida que ocorre a substituição do látex por outros

Tabela 3 - Natureza, fatores e prevenção

Natureza do risco Fatores de risco Medidas preventivas

Gases anestésicos Concentrações de uso elevadasausência de sistema de evacuação ou ventilaçãoventilação manualUso de circuitos abertos

evitar uso de agentes mais tóxicossistema de evacuação de gases anestésicosventilação da soUso de circuitos com reinalação de gases

esgotamento profissional

estressePrivação de sonoaumento da carga de trabalhoausência de controle da atividade

Melhora do reconhecimento profissionalComunicação entre colegas de trabalhoMelhora das condições de trabalhoPossibilidade de educação continuada e formação profissional

toxicomania disponibilidade de substâncias ilícitasBusca de efeitos recreativosBusca por melhora da capacidade física e psíquica

informação e ensino de estudantesControle da liberação e utilização de opioidesLimitar fatores de risco e reintegração após tratamento

acidente decorrente de exposição a sangue

Contaminação por agentes hemotransmissíveisausência ou má-utilização dos meios de proteção e segurançaNão respeito às recomendações de proteção

emprego de equipamentos de proteção individual: luvas, óculos...Utilização de material de segurança, prevenção da contaminação (vacinação, acompanhamento sorológico, quimioprofilaxia)

alergia ao látex aerossóis alergênicosContato cutâneo

evitar uso de luvas com talco e de látex

radiações ionizantes exposição prolongadaausência de meios de proteçãodispositivos médicos deficientes

emprego de meios de proteçãovigilância por meio de dosímetrosrespeito à regulamentação

eletrocussão dispositivos elétricos não adaptados, choques elétricos, queimaduras.

respeito à regulamentação

explosão e incêndio Gases inflamáveisMá-utilização dos equipamentos

evitar os fatores de risco e de dispositivos defeituosos

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artiGo de revisão

Instituição:Serviço de Anestesiologia (CET/SBA) da Universidade Federal de Uberlândia. Uberlândia, MG – Brasil.

Endereço para correspondência:Neuber Martins FonsecaRua: Antônio Luiz Bastos, 300Bairro: Morada da Colina Uberlândia, MG – BrasilCEP 38.401-116E-mail: [email protected]

1Médica em Especialização em Anestesiologia do 3o ano do CET/SBA da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia(UFU). Uberlândia, MG – Brasil.2Médica em Especialização em Anestesiologia do 2o ano do CET/SBA da Faculdade de Medicina da UFB. Uberlân-dia, MG – Brasil.3Professor doutor da disciplina de Anestesiologia e responsável pelo CET/SBA da Faculdade de Medicina da UFU. Membro da Comissão de Normas Técnicas e Segu-rança da Sociedade Brasileira de Anestesiologia. Título Superior de Anestesiologia pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia TSA/SBA. Uberlândia, MG – Brasil.4Corresponsável pelo CET/SBA da UFU. Título Superior de Anestesiologia pela Sociedade Brasileira de Anestesiolo-gia TSA/SBA. Uberlândia, MG – Brasil.5Instrutor do CET/SBA da UFU. Título Superior de Aneste-siologia pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia TSA/SBA. Uberlândia, MG – Brasil.

resUMo

O índice bispectral (BIS) é um parâmetro multifatorial que permite a monitorização da componente hipnótico da anestesia. O BIS provê medidas quantificáveis do efeito de anestésicos no cérebro que correlacionam com a profundidade da anestesia. A monito-rização da profundidade anestésica na indução e manutenção da anestesia geral previ-ne consciência e despertar intraoperatório, permite titular a quantidade de anestésicos adequada para promover a rápida recuperação da anestesia e evitar efeitos adversos da superdosagem dos fármacos. Desde sua introdução, a monitorização com BIS vem se tornando comum na prática anestésica. Esta revisão tem o objetivo de elucidar o papel do BIS na monitorização da hipnose na anestesia geral. Foi realizada revisão sobre o conceito de anestesia geral e monitorização da profundidade anestésica com o uso do BIS, bem como atualizações dos benefícios de seu emprego para a qualidade da anes-tesia, interpretação dos artefatos e drogas que podem interferir na sua utilização.

Palavras-chave: Hipnose Anestésica; Hipnóticos e Sedativos; Anestésicos/adminis-tração & dosagem. Análise Espectral; Monitorização Intra-Operatória; Consciência no Peroperatório; Processamento de Sinais Assistido por Computador; Eletroencefalogra-fia/instrumentação.

aBstraCt

The bispectral index (BIS) is a multifactorial parameter that allows monitoring of the hypnotic component of anesthesia. The BIS provides quantifiable measures of the effect of anesthetics in the brain that correlate with the depth of anesthesia. Monitoring anesthetic depth during induction and maintenance of general anesthesia prevents intraopera-tive awakening and conscience and allows to holder the amount of anesthetic agents appropriate to promote a speedy recovery of anesthesia and avoid adverse effects of an overdose of drugs. Since its introduction, the BIS monitoring is becoming acommonplace in anesthetic practice. This review has the objective of elucidating the role of BIS monitor-ing in hypnosis of general anesthesia. A literature review was conducted on the concepts of general anesthesia and monitoring of anesthetic depth using the BIS. Moreover, recent articles on studies of BIS and its benefits in the quality of general anesthesia as well as the presence of artifacts and drugs that may interfere in its utilization.

Key words: Hypnosis, Anesthetic; Spectrum Analysis; Monitoring, Intraoperative; Intra-operative Awareness; Hypnotics and Sedatives; Anesthetics/ administration & dosage; Signal Processing, Computer-Assisted; Electroencephalography/instrumentation

Proper use of the monitor of consciousness

Luciana Freitas Queiroz1, Lorena Jrege Arantes2, Neuber Martins Fonseca3, Beatriz Lemos da Silva Mandim4, Roberto Araújo Ruzzi4, Neise Apoliany Martins5, Paulo Ricardo Rabello de Macedo Costa5

Uso correto do monitor de consciência

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Uso correto do monitor de consciência

Uma abordagem moderna do que é anestesia de-fine que condição sine qua non de estado anestésico é a inconsciência ou a falta de processamento do pensamento. A dificuldade em definir a profundida-de da anestesia ocorre porque o nível de inconsciên-

cia não pode ser medido diretamente, o que pode ser medido é a resposta à estimulação. A profundidade da anestesia é determinada pelo estímulo aplicado, a medida da resposta e a concentração da droga no local de ação que desencadeia a resposta (Tabela 1).1

A certeza de que as drogas anestésicas alteram o eletroencefalograma (EEG) já existe desde o início de século e estudos com utilização do clorofórmio e éter mostraram que os anestésicos alteram a atividade do EEG de ondas rápidas de baixa voltagem para ondas lentas de alta voltagem e postularam que o EEG pode-ria ser usado para medir os efeitos da anestesia.4

Assim, pode-se inferir que o estado de consciên-cia por meio do registro do EEG, embora não possa ser diretamente medido, pode ser empiricamente aferido por técnicas espectrais, como o índice bis-

iNtrodUção

A anestesia é caracterizada por um complexo de múltiplos estímulos, respostas diversas e interação com medicamentos que levam à maior probabilida-de de não responsividade aos estímulos nocicepti-vos. Pode ser definida com base em dois componen-tes farmacológicos fundamentais: o efeito hipnótico e o analgésico. O componente de hipnose pode ser criado pelos anestésicos venosos ou inalatórios, en-quanto que a analgesia é alcançada com a utilização de opioides ou anestésicos locais. A combinação dos dois componentes resulta em um estado de incons-ciência e reduz a resposta hemodinâmica ao intenso estímulo noceptivo.1 Prys-Roberts2, em editorial em 1987, definiu anestesia como estado de inconsciên-cia induzido por medicamentos em que o paciente não percebe nem se lembra do estímulo doloroso. O estímulo nociceptivo foi definido como agente mecâ-nico, químico, térmico ou radiação como causa de potencial dano à célula. É conduzido pelo sistema nervoso somático ou visceral e a resposta ao estímulo pode ser conduzida pelo sistema somático ou autonô-mico. Respostas somáticas incluem atividade motora e sensitiva. Prys-Roberts dividiu resposta autonômi-ca em quatro categorias: respiração, hemodinâmica, sudomotor e hormonal. A resposta ventilatória pode ocorrer mesmo se não há resposta motora à estimula-ção cirúrgica. Elevada concentração de anestésicos venosos ou inalatórios é necessária para a supressão da resposta ventilatória se comparada com a res-posta somática ao estímulo noceptivo. A resposta hemodinâmica consiste em resposta autonômica ao estímulo, ou seja, aumento do tônus simpático, com elevação da pressão arterial e frequência cardíaca. A resposta sudomotora consiste na sudorese, enquanto que a resposta hormonal consiste em atividade de ca-tecolaminas e corticosteroides. Assim, observou-se que a profundidade da anestesia é de difícil defini-ção, mas que o estímulo cirúrgico nociceptivo induz a uma variedade de respostas reflexas que podem ser moduladas independentemente.2

Kissin3, em 1993, expandiu, refinou e contribuiu para a definição de anestesia, indicando que variado espectro de ações farmacológicas de diversas drogas pode ser utilizado para induzir ao estado de aneste-sia e que essas ações incluem analgesia, ansiólise, amnésia, inconsciência, supressão da resposta somá-tica motora, cardiovascular e resposta hormonal ao estímulo cirúrgico.

Tabela 1 - Componentes necessários para definir a profundidade da anestesia

CoMPoNeNtes

estímulo aferente

resposta eferente

Concentrações equilibradas de analgésicos

Concentrações equilibradas de hipnóticos

Concentrações equilibradas de outras drogas (por exemplo, β-bloqueadores, relaxantes musculares, anestésicos locais)

interação de superfície relativa à concentração da droga e à probabilidade da resposta ao estímulo dado

adaptado de: Miller´s anesthesia

Tabela 2 - Avaliação modificada de observação de vigília e escala de sedação

escala responsividade

5 responde prontamente ao nome falado em tom normal

4 resposta letárgica ao nome falado em tom normal

3 responde somente se o nome é chamado em voz alta e/ou várias vezes

2 responde somente após leve insistência ou agitação

1 responde somente após estímulo doloroso no músculo trapézio

0 Nenhuma resposta depois de estímulo doloroso no músculo trapézio

adaptado de: Miller´s anesthesia

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utilização dos medicamentos, despertar mais rápido e melhor recuperação da anestesia geral.7

O índice bispectral (BIS) é um complexo parâme-tro composto pela combinação de tempo, frequência e componentes de ordem espectral derivados de infor-mações clínicas que medem o componente hipnótico da anestesia. Desde a década passada, o BIS tem sido modificado com base em informações novas sobre a resposta do EEG a recentes anestésicos e à combina-ção deles, bem como tem incorporado novas tecnolo-gias. No processo de sinalização para gerar um valor de BIS, sinais originários da região frontal são digita-lizados e, a seguir, filtrados para evitar interferência de artefatos. O EEG segue três caminhos de análise: análise de poder espectral, análise bispectral e análise baseada no tempo da supressão para criação de mo-delos padrões de EEG. Este sinal sofre a transformação rápida de Fourier para atingir o bispectrum. A soma desses parâmetros dá origem ao BIS, que é constituído de escala de zero a 100 (Tabela 3).1,9-13

Para compreender o funcionamento do BIS como uma variável derivada do ECG, torna-se necessário compreender as alterações funda-mentais que ocorrem nele durante a indução de anestesia geral com agentes venosos como pro-pofol ou inalatórios como sevoflurano. Durante a sedação com o paciente de olhos fechados, há a predominância de ondas α (8 a 13 Hz). Níveis superficiais de anestesia são acompanhados por redução das ondas α e aumento de ondas β (13 a 30 Hz). O aprofundamento do plano anestési-co induz o surgimento de ondas d (0 a 4 Hz) e q (4 a 8 Hz) à medida que há simultâneo decrésci-mo das α e β em todas as regiões. Todas essas mudanças são revertidas na mesma ordem com o retorno da consciência. O BIS é um número adimensional que varia de zero (isoelétrico) a 100 (totalmente acordado). Ele é a soma ponde-

pectral (BIS) ou por potenciais evocados, tais como os potenciais evocados auditivos (AEPs). Apesar da medida do nível de consciência não ser direta, após vários estudos foi possível deduzir que essas medi-das são preditivas das respostas do estado anestésico (Tabela 2).1

A consequência da profundidade anestésica inadequada é a consciência no intraoperatório, que chega à incidência na população geral de 0,1% e na população de risco a incidência é de 1 a 1,5%. Exis-tem evidências de que a monitorização adequada da hipnose durante a anestesia provavelmente reduz significantemente o risco de consciência intraopera-tória, entretanto, não diminui totalmente o risco. Um espectro de atividade cognitiva, incluindo consciên-cia, formação de memória inconsciente e sonhos têm sido relatados durante a administração de drogas que são utilizadas para induzir e manter a anestesia geral. Em adição, ocorre uma gama de respostas físicas e fisiológicas que podem indicar percepção da dor à estimulação cirúrgica com ou sem consciência.1,5

A indução da anestesia geralmente consiste em injeção intravenosa de hipnóticos (por exemplo, pro-pofol, tiopental e etomidato). O pico de concentra-ção plasmática ocorre geralmente em menos de 30 segundos e diminui rapidamente à medida que é cap-tada por outros tecidos, criando um gradiente de con-centração entre o tecido cerebral e o sangue, de tal modo que a droga difunde-se rapidamente de volta ao sangue, de onde ela é redistribuída para outros te-cidos que ainda estão captando a droga.1 As rápidas mudanças de concentrações plasmáticas causam uma flutuação correspondente ao grau de depressão do sistema nervoso central (SNC): a profundidade da anestesia aumenta rapidamente (causando perda de consciência) e depois diminui com o declínio das concentrações plasmáticas.1

A monitorização da profundidade anestésica na indução e manutenção da anestesia geral previne consciência e despertar intraoperatório, permite titu-lar a quantidade de anestésicos adequada para pro-mover rápida recuperação da anestesia e evitar efei-tos adversos da superdosagem dos fármacos.6 O BIS prevê medidas quantificáveis do efeito de anestésicos no cérebro que correlacionam com a profundidade da anestesia7 e valores de BIS superiores a 60 podem manter memória preservada.8

Estudos multicêntricos randomizados realçaram que o uso do monitor BIS para guiar a administração de drogas anestésicas leva a melhor e mais eficiente

Tabela 3 - BIS e níveis de hipnose

índice Bis estado Hipnótico

100 Consciente

80 sonolento

70 Hipnose superficial

55 Hipnose intermediária

40 Hipnose profunda

0 supressão da onda

adaptado de: vianna PtG.9

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baixa probabilidade de memória quando comparada com anestesia sem monitorização do BIS. Este estudo revelou que valores de BIS superiores a 60 podem man-ter memória preservada durante a anestesia geral.8

O uso do monitor BIS é útil também durante o des-pertar da anestesia geral e pode prevenir extubação traqueal precoce e suas consequências, principalmen-te em pacientes com algum grau de retardo mental.7

Em outubro de 1996, a Food and Drug Adminis-tration (FDA) aprovou o BIS como uma medida dos efeitos hipnóticos das drogas anestésicas e sedativas. Desde sua introdução, a monitorização com BIS vem se tornando comum na prática anestésica.1,8 No en-tanto, uma série de relatos na literatura tem demons-trado situações clínicas e artefatos que podem inter-ferir nos valores observados com o BIS.10

aNestésiCos e oUtros FárMaCos QUe PodeM aLterar os vaLores do Bis

Há diversos registros na literatura em que os valores apurados pelo BIS não coincidem com o efeito espera-do do anestésico ou com o estado clínico do paciente. São descritas alterações paradoxais do BIS em pacien-tes sob o uso de óxido nitroso (N

2O). Puri et al.14 des-creveram redução do BIS de 90 para 30 em paciente submetida à troca de valva mitral cinco minutos após a interrupção da administração desse inalatório.

De modo semelhante, Rampil et al.15 demonstraram redução paradoxal do BIS seis minutos após a retirada da administração de N

2O de um valor médio de 95 a 81 para 30 a 50. Esse fato pode ser atribuído a um fe-nômeno eletroencefalográfico de retirada e supressão peculiar ao uso de N

2O, no qual sete a 10 minutos após a interrupção súbita da administração deste inalatório, uma rajada de ondas q e d de baixa frequência ocorre difusamente no registro do EEG, um padrão muito si-milar ao dos níveis profundos de anestesia.

O óxido nitroso tem ação cortical fraca, uma vez que ele age principalmente pela ativação das vias noradrenérgicas inibitórias descendentes no sistema nervoso central e medula espinhal. Esse efeito é com-pletamente indetectável pelo algoritmo do BIS. É em função disso que o N

2O demonstrou, em muitos estu-dos, perda de consciência sem promover mudanças consideráveis nos valores do BIS.10

A ketamina é frequentemente usada em baixas doses como adjuvante para prover analgesia perio-

rada de três descritores: o parâmetro Betaratio reflete sedação leve, o SynchFastSlow detecta níveis cirúrgicos de anestesia, enquanto o Burst-Suppression predomina em níveis profundos de anestesia (Tabela 1).9,10

Glass et al.11 propuseram um estudo para exami-nar a relação entre valores de BIS, concentração de drogas e aumentos progressivos dos níveis de seda-ção quando propofol, midazolam, isoflurano e alfen-tanil eram administrados em pacientes voluntários de forma controlada. Receberam anestésicos 72 pa-cientes e, como aumento da concentração plasmáti-ca, criou-se estado de inconsciência subjetivo. Foram medidos os valores de BIS, concentração sanguínea da droga, nível de sedação subjetiva e escala de me-mória. O BIS estava intimamente correlacionado com a concentração da droga e também com a medida clínica de sedação. Nenhum paciente sedado com alfentanil perdeu a consciência e eles tiveram alte-rações mínimas no BIS, confirmando que o BIS não é sensível a baixas concentrações de opioides. Fica-ram inconscientes 50 a 95% dos voluntários, com va-lores de BIS de 67 a 50, respectivamente.11

Flaishon et al.12 examinaram o comportamento do BIS em pacientes cirúrgicos quando doses de propo-fol (2 mg/kg) ou tiopental (4 mg/kg) com uso conco-mitante de relaxante muscular eram administradas. Nenhum paciente com valores de BIS inferiores a 58 estavam conscientes e valor abaixo de 65 significava probabilidade menor que 5% de retorno da consciên-cia em 50 segundos.12

Clinicamente, é usado um adesivo unilateral fron-totemporal que fornece a propriedade de sensor do BIS. O monitor mostra o valor do BIS e valores inferio-res a 55 são recomendados durante anestesia geral.1

Em estudo para avaliar a função de memória na anestesia com monitorização do nível de consciência, a concentração de drogas para manter valores de BIS entre 50 e 60 não necessariamente está associada à

Tabela 4 - Tipos de ondas do EEG com relação en-tre a frequência e o estado de alerta e sono

delta (sono profundo, sedação profunda) (0 - 4 hz)

teta (4 - 8 hz)

alfa (olhos fechados, relaxado) (8 -13 hz)

Beta (acordado e alerta) (13 - 30 hz)

Burst suppression (sedação muito profunda e hipotermia)

adaptado de: vianna PtG.9

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estudo, Iselin-Chaves et al.21 sugerem que a relação entre o componente hipnótico da anestesia e o BIS é independente da presença de opioide. Entretanto, o nível de consciência e, portanto, o BIS são afetado por estímulos álgicos e essa resposta é abolida tanto pela administração do opioide como pelo aumento da concentração do hipnótico.

Hans et al.22 evidenciaram que a variação do BIS foi significativamente menor quando as concentrações plasmáticas de sufentanil foram elevadas de 0,5 µg/mL para 1 µg/mL durante infusão de propofol. Esses es-tudos mostram que os opioides parecem modificar a resposta da consciência aos estímulos dolorosos.

CoNdições CLíNiCas QUe PodeM aFetar o Bis

Diversos relatos têm demonstrado que o BIS pode ser um índice da atividade cerebral e não apenas um monitor dos níveis de consciência. Langeron et al.23 relataram um caso de elevação dos valores de BIS em um paciente de 84 anos após a correção de um episódio de hipoglicemia grave (1,15 mmol.L-1). Pou-cos minutos após a infusão de glicose a 30%, rápido aumento no BIS foi verificado sem que outro evento, como alterações hemodinâmicas ou ventilatórias, es-tímulos neurológicos ou alterações nas taxas de infu-são dos sedativos, tivessem ocorrido.

Em outras situações clínicas que determinem que-da do débito cardíaco e, como consequência dimi-nuição, da perfusão cerebral, têm sido descritas redu-ções nos valores do BIS. England24 descreveu um caso de queda acentuada nos valores do BIS em uma pa-ciente que apresentou choque hipovolêmico durante uma cirurgia para troca de valva tricúspide. Durante a esternotomia, houve laceração do átrio direito, com queda súbita da pressão arterial. Cerca de dois mi-nutos após o evento, os valores do BIS apresentaram redução, enquanto o parâmetro Burstsuppression se elevou. Esse atraso na resposta do BIS pode ser decor-rente do tempo de resposta inerente ao algoritmo do aparelho, ao fenômeno de autorregulação e também ao atraso entre queda da pressão arterial, redução do fluxo cerebral e disfunção neuronal.24

A hipotermia é outro fator que pode alterar os valores do BIS. Mathew et al.25, num estudo prospec-tivo, avaliaram 100 pacientes submetidos à cirurgia cardíaca com bypass cardiopulmonar. Foi observada

peratória ou prevenir hiperalgesia pós-operatória. Em contraste a outros agentes anestésicos, ela pro-duz uma anestesia dissociativa, com efeitos excitató-rios ao EEG. Doses de 0,25 a 0.5 mg/kg são suficientes para produzir inconsciência, sem reduzir, no entanto, os valores do BIS.16 Quando administrada com outros agentes venosos, como propofol, é relatado signifi-cativo aumento nos valores do BIS, apesar de níveis profundos de anestesia. Nestas condições, a relação entre a monitorização e o grau de hipnose é modi-ficada, a qual poderia enviesar a administração de agentes hipnóticos guiada pelo BIS.17

Os diversos anestésicos inalatórios determinam al-terações peculiares sobre o EEG. Desse modo, os va-lores de BIS não são os mesmos com concentrações equipotentes de diferentes anestésicos.13 Schwab et al.18 avaliaram 33 pacientes que receberam anestesia inalatória de forma randomizada com sevoflurano ou halotano. Eles avaliaram o BIS antes e durante aneste-sia com 1 e 1.5 CAM. Os valores de BIS em pacientes acordados não foram diferentes nos dois grupos. Com 1 CAM, com ou sem bloqueadores neuromusculares, e com 1.5 CAM, os valores de BIS para pacientes anes-tesiados com halotano excederam aqueles dos pa-cientes anestesiados com sevoflurano. Tal achado in-dica que o BIS apresenta valores droga-específicos.1 É preciso cautela para utilizar o BIS em pacientes anes-tesiados com halotano para evitar aprofundamento desnecessário do plano anestésico.13

Detsch et al.19 estudaram os efeitos induzidos nos valores do BIS a partir do aumento da concentração de isoflurano em 70 pacientes submetidos à cirurgia abdominal e anestesiados com isoflurano, óxido nitroso e sufentanil. Os resultados desse estudo in-dicam que o aumento da concentração desse ina-latório pode induzir elevação paradoxal no BIS em alguns pacientes. É possível que essa alteração nos valores do BIS esteja associada aos padrões eletroen-cefalográficos pré-burst contínuos, que consistem em atividades de alta frequência.19

Em relação aos opioides e seus efeitos nos valores do BIS, os estudos são controversos. Uma série de tra-balhos tem relatado a insensibilidade do BIS à admi-nistração dos opioides. Guignard et al.20 perceberam que a variação da concentração de remifentanil de 2 a 16 ng/mL não determinou alterações nos valores do BIS durante a infusão alvo-controlada de propo-fol. No entanto, o opioide foi capaz de prevenir o au-mento do BIS associado a laringoscopia e intubação orotraqueal de modo dose-dependente. Em outro

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aLterações reLaCioNadas ao MoNitor

Para que o BIS seja um monitor confiável do nível de consciência transoperatória, ele deve sofrer influ-ência previsível dos diferentes fármacos utilizados na prática clínica, bem como apresentar boa repro-dutibilidade intra e interpaciente. Com o objetivo de averiguar a reprodutibilidade dos valores do BIS in-terpaciente, foi conduzido um estudo no qual foram utilizados concomitantemente no mesmo paciente dois monitores de BIS-XP. Salientou-se que durante cerca de 10% do tempo de observação, os resulta-dos dos dois monitores foram diferentes, sendo que em 6% do tempo houve períodos sustentados de 30 segundos ou mais em que as diferenças de leituras foram de 10 ou mais unidades. Esse estudo sugere que BIS-XP não proporciona reprodutibilidade con-sistente e que os anestesiologistas não devem utilizar exclusivamente os valores do BIS para estimar o grau de profundidade anestésica.30

Outros fatores a serem considerados durante a monitorização com o BIS são as diferentes versões do algoritmo. As versões mais antigas e a mais recente (BIS-XP) podem apresentar valores diferentes, segun-do alguns trabalhos. Dahaba31, em um estudo que vi-sava a verificar os efeitos do bloqueio neuromuscular com mivacúrio em pacientes monitorizados com di-ferentes versões do BIS (convencional A-2000 e BIS–XP), percebeu que o início de ação do bloqueador desencadeou diferentes respostas nos valores do BIS. Aqueles monitorados com a versão antiga apresen-taram aumento nos valores, enquanto os do BIS-XP declinaram. Tais diferenças podem ocorrer em fun-ção da inclusão nos modelos mais recentes de meca-nismos que atenuam as interferências e a atividade eletromiográfica, resultando em valores mais baixos nas versões mais novas.31

Além disso, fatores como impedância e posicio-namento dos eletrodos devem ser considerados. Podem ocorrer valores elevados do BIS quando, por mau posicionamento, limpeza inadequada da pele ou má-aderência, a impedância dos eletrodos fica aumentada. Os eletrodos específicos para o BIS ga-rantem baixa impedância na captação do sinal, mas apresentam custo elevado. Hemmerling e Harvey.32 sugeriram o uso de eletrodos de eletrocardiograma (ECG) como uma opção acessível e barata para subs-tituir os eletrodos específicos, tendo encontrado boa

significativa associação entre temperatura corporal (aferida por meio de um termômetro nasal) e valores do BIS, independentemente da idade dos pacientes. Estimou-se redução de 1.12 pontos no BIS para cada grau centígrado de queda na temperatura.

Além disso, há estudos que sugerem que o posi-cionamento do paciente altera os valores do BIS, uma vez que pode interferir no fluxo sanguíneo cerebral. Abdullah e Almarakbi26 verificaram que há significa-tivo aumento do BIS nas posições de cefalodeclive quando comparadas as posições neutras (médias de 47 x 40), enquanto as posições de cefaloaclive signifi-cativamente reduzem o BIS (39 x 41).

iNterFerêNCias de eQUiPaMeNtos eLétriCos

Há diversos relatos de dispositivos elétricos que podem causar interferências e alterar os va-lores do BIS. Durante um procedimento endoscó-pico de seios nasais foram descritos dois casos de elevação do BIS em função do campo eletro-magnético criado pelo aparelho endoscópico. Tais sistemas elétricos podem criar vibrações, simulando ondas de ECG encontradas na aneste-sia superficial. Uma vez captadas pelos eletrodos do BIS, tais vibrações são traduzidas em valores elevados, que não refletem o estado clínico de anestesia.27 De forma semelhante, há evidências de aumento súbito do BIS em pacientes subme-tidos à artroscopia de ombro a partir do início do uso de shaver, provavelmente decorrente das vibrações por ele produzidas.28 O monitor do BIS apresenta uma barra que indica a qualidade do sinal e que pode revelar a presença de artefato. No entanto, nem sempre isso ocorre. Há registros de elevação falsa do BIS quando uma manta tér-mica foi colocada sobre a cabeça do paciente. Não havia sinais clínicos que indicassem plano anestésico superficial e a barra de sinal mostrava ótima qualidade, sem sinais de interferência por atividade muscular. Quando o fluxo de ar quen-te na manta foi desligado, houve redução do BIS de 90-70 para 55-35. Especulou-se que a vibração gerada pela circulação do ar próximo da cabeça dos pacientes tenha sido responsável pelas alte-rações observadas.29

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pulação e não estão associadas à disfunção cerebral. O gene responsável por essa alteração localiza-se na porção distal do cromossomo 20.37 Há relato de um voluntário totalmente consciente que exibia valores baixos de BIS (40) em duas ocasiões diferentes. Um EEG de 16 derivações mostrou baixa voltagem gene-ticamente determinada.38

Como o algoritmo do BIS foi construído a partir de amostras de EEC em pacientes sem a variante, es-pera-se que esse padrão não seja reconhecido pelo monitor. Em função desses casos, torna-se importan-te confirmar o valor do BIS em todos os pacientes an-tes da indução anestésica.13

Desordens neurológicas

Pacientes com doença de Alzheimer, quando acordados, apresentam valores de BIS mais baixos do que indivíduos idosos, na mesma faixa etária, usa-dos como controle. Apesar do resultado desse estu-do, são necessárias novas investigações para atestar a validade do BIS no diagnóstico de demência.39

Além disso, tem-se descrito que os valores de BIS tanto durante anestesia com sevoflurano a 1% quan-to no despertar anestésico são significativamente mais baixos em crianças com encefalopatia hipóxica quando comparadas com crianças normais.40

De modo interessante, o BIS tem sido utilizado em alguns estudos com o intuito de prever desfecho neu-rológico em pacientes graves. Myles et al. encontra-ram forte correlação entre traçados anormais de BIS e desfecho neurológico ruim.41 De modo semelhante, em outro trabalho, 24 horas após a retirada completa dos sedativos o valor médio do BIS foi de 43 em pa-cientes internados em unidades de terapia intensiva que não acordaram após injúria cerebral grave, en-quanto valores médios de 63 foram apurados no gru-po de pacientes comatosos que despertaram. Desse modo, o BIS parece ser útil para avaliar prognóstico neurológico em pacientes com injúria cerebral.42

CoNCLUsão

Revelou-se que níveis profundos de hipnose sem analgesia não previnem a resposta hemodinâmica a um estímulo nociceptivo e que níveis profundos de analgesia não garantem inconsciência. O sinergismo entre hipnóticos e analgésicos é utilizado diariamente na prática dos anestesiologistas e garante a supressão

concordância de valores entre os sensores originais e os de ECG, após o preparo adequado da pele com álcool e o uso de um adaptador para conectar os sensores ao monitor. Em estudo prévio semelhante, foi apresentada comparação entre os valores do BIS obtidos por eletrodos de ECG e os originais. Nessa pesquisa, a preparação foi realizada com pasta abra-siva e encontrou-se boa correlação entre os valores captados pelos sensores originais e os de ECG.33

Além disso, deve-se considerar a disposição dos eletrodos durante a monitorização. Os sensores do BIS foram desenvolvidos como uma faixa única composta de três a quatro eletrodos que são coloca-dos na fronte dos pacientes. Essa montagem difere do padrão de EEG convencional que utiliza 10 a 20 eletrodos dispersos pela cabeça. Apesar dessa dis-posição não usual, tem sido descrita a efetividade desse padrão de monitorização. Shiraishi, em estudo envolvendo 25 pacientes submetidos a clipagens de aneurismas cerebrais não rotos, utilizou, em cada paciente, os eletrodos do BIS na posição occipital e frontal e comparou os valores obtidos nas duas posi-ções. Percebeu-se forte correlação entre os valores encontrados nas duas montagens, o que sugere que os eletrodos do BIS podem ser colocados na região occipital nos casos em que o campo operatório difi-culte a utilização frontal usual.34

A atividade eletromiográfica (EMG) e os bloque-adores neuromusculares (BNM) podem influenciar significativamente na monitorização do BIS.13 Estu-do conduzido em pacientes sedados em unidades de terapia intensiva destacou que os valores do BIS podem ser superestimados em função da alta ativida-de muscular.35 Recentemente, novos eletrodos foram desenvolvidos (BIS XP Quatro®. model A2000v.3.12; Aspect Medical Systems, Inc., Newton, MA,USA) com o intuito de melhorar a aquisição de sinal pela adição de um filtro.36

Padrões aNorMais do eeG QUe PodeM aFetar o Bis

EEG de baixa voltagem

As variantes geneticamente determinadas de EEG de baixa voltagem são definidas como EEG de am-plitude < 20 mV por todas as regiões do crânio. Essas variantes são normais e ocorrem em 5 a 10% da po-

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artiGo de revisão

Instituição:Hospital Governador Israel PinheiroBelo Horizonte, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Renata de Andrade ChavesRua Almandina, nº 15, apto 802Bairro: Floresta.Belo Horizonte, MG – BrasilCep: 31010-080

1Anestesiologista do Hospital Municipal Odilon Behrens e do Hospital Risoleta Tolentino Neves. Belo Horizonte, MG – Brasil.2Instrutor do CET/SBA do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), Aneste-siologista do Hospital SOCOR, Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e Hospital Vera Cruz. Belo Horizonte, MG – Brasil.3Anestesiologista do Hospital Nossa Senhora das Graças e Hospital UNIMED-Sete Lagoas. Sete Lagoas, MG – Brasil.4Anestesiologista do Hospital SOCOR, e do Hospital das Clínicas da UFMG. Belo Horizonte, MG – Brasil.

resUMo

Justificativas e objetivos: várias doenças cursam com diminuição do calibre das vias aéreas, sejam elas superiores ou inferiores. Entre elas encontram-se a asma, a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC), a fibrose cística, a bronquiectasia e a bronquiolite, sendo seus maiores expoentes a asma e a DPOC.1 O objetivo desta revisão é buscar evi-dências científicas que norteiem a ventilação mecânica protetora para os pacientes com doença pulmonar obstrutiva e sugerir estratégias para se ventilá-los adequadamente. Método: foi realizada revisão da literatura com base em artigos que englobam o uso de estratégias de ventilação mecânica em pacientes com doença pulmonar obstrutiva, com enfoque em asmáticos e portadores de DPOC. Conclusões: diferentes modalidades ven-tilatórias não se mostraram superiores, sendo necessária sempre a monitorização dos padrões de pressão e volumes impressos ao paciente - pressão de platô, a ser mantida abaixo de 30-35 cm de água; pressão de pico, que não deve ultrapassar 50 cm de água; e o volume pulmonar ao final da inspiração, que deve ser inferior a 1,4L. A aplicação de PEEP extrínseca não representa benefícios clínicos em pacientes sedados, não hipoxê-micos e bem adaptados à ventilação mecânica, mesmo na presença de autoPEEP.

Palavras-chave: Asma; Estado Asmático; Respiração Artificial; Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica.

aBstraCt

Justifications and objectives: Several diseases develop with the reduction of either upper or lower airway caliber. Among them are asthma, chronic obstructive pulmonary disease (COPD), cystic fibrosis, a bronchiectasis and bronchiolitis, with asthma and COPD as the most important ones.1 The objective of this review is to search scientific evidence which guide protective mechanical ventilation for patients with obstructive pulmonary disease and suggest strategies to provide appropriate ventilation. Method: A review of the literature was carried out based on scientific papers which deal with the use of strategies of mechanical ventilation in patients with obstructive pulmonary disease, focusing on asthma and COPD patients. Conclusions: Different ventilation modalities were not better, with the need to monitor patterns of pressure and volume delivered to the patient: plateau pressure, maintained below 30-35 cm of H2

O; peak pressure, which should not be over 50 cm of H

2O; and the pulmonary volume at the end of inspiration, which should be lower

than 1.4L. Application of extrinsic positive end-respiratory pressure (PEEP) does not rep-resent medical benefits to sedated, non-hypoxemic patients well adapted to mechanical ventilation, even in the presence of auto-PEEP.

Key words: Asthma; Status Asthmaticus; Respiration, Artificial; Pulmonary Disease, Chronic Obstructive.

Protective mechanical ventilation in obstructive pulmonary disease patients

Renata de Andrade Chaves1, Emerson Seiberlich2, Jonas Alves de Santana3, Marden Fernando Miranda Ramos4, Alexandre de Castro Morais4

Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutiva

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Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutiva

tratamento, inclusive nas exacerbações.3,5 A espiro-metria é essencial para estabelecer o diagnóstico e a gravidade da DPOC, sendo indicada para todos os fu-mantes acima de 40 anos, quer apresentem sintomas ou não. A limitação de fluxo é definida com relação FEV1/CV pós-prova broncodilatadora abaixo de 0,7 e deve ser sempre correlacionada aos dados clínicos do paciente.3

asMa

A asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas, da qual diferentes células e elementos ce-lulares participam. A inflamação crônica é associada à hiperresponsividade das vias aéreas, levando a epi-sódios recorrentes de chieira, dispneia, rigidez toráci-ca e tosse, especialmente à noite ou no início do dia. Os episódios são associados à obstrução das vias aé-reas, com reversão espontânea ou após tratamento.6

A asma representa um problema mundial, com cerca de 300 milhões de pessoas afetadas. Sua preva-lência ainda é subestimada, principalmente devido ao fato de não haver precisa definição da doença em âmbito global, estando em torno de 1-18% da popu-lação em diferentes países.6 A mortalidade por asma nos Estados Unidos é de cerca de 4.000 mortes por ano (15 por 1.000.000) e os gastos com o controle da doença são muito elevados.6,7

O diagnóstico de asma é clínico, não havendo testes sanguíneos, radiográficos ou histopatológi-cos que o confirmem. Em alguns casos, alterações nas provas de função pulmonar podem corroborar o diagnóstico. Os sintomas costumam ser variáveis, intermitentes, piores à noite e induzidos por fatores desencadeantes. Durante uma crise, o paciente co-mumente irá apresentar chieira e redução da função pulmonar, seja diminuição do peak flow, seja um pa-drão obstrutivo na espirometria.8

Fisiopatologia da asma

O principal achado fisiológico da asma são episó-dios de obstrução das vias aéreas, caracterizados por obstrução ao fluxo expiratório. O principal achado patogênico é a inflamação das vias aéreas, associada algumas vezes a alterações estruturais.

A redução nas vias aéreas é a via final comum, le-vando aos sintomas e alterações fisiológicas da asma.

iNtrodUção

Várias doenças cursam com diminuição do cali-bre das vias aéreas, sejam elas superiores ou inferio-res. Entre elas encontram-se a asma, a doença pul-monar obstrutiva crônica (DPOC), a fibrose cística, a bronquiectasia e a bronquiolite, sendo seus maiores expoentes a asma e a DPOC.1

doeNça PULMoNar oBstrUtiva CrÔNiCa

A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) denomina um grupo de entidades nosológicas res-piratórias que acarretam obstrução crônica ao fluxo aéreo de caráter fixo ou parcialmente reversível, ten-do como alterações fisiopatológicas de base, graus variáveis de bronquite crônica e enfisema pulmonar.2 É principalmente associada ao tabaco, apesar de so-mente um em cada quatro fumantes desenvolver a doença.2,3 Estima-se que 5,5 milhões de pessoas se-jam acometidas por DPOC no Brasil, 10,1 milhões nos Estados Unidos e 52 milhões em todo o mundo, ten-do sido essa doença responsável por 2,74 milhões de óbitos em 2000, representando gastos elevados para os sistemas de saúde.2,4

Fisiopatologia da DPOC

A limitação ao fluxo expiratório é a principal ca-racterística fisiopatológica da DPOC. Ao contrário do que ocorre com o paciente sadio, cuja mecâni-ca respiratória trabalha na parte favorável da curva de complacência pulmonar, o paciente portador de DPOC respira com volumes próximos da capacidade pulmonar total, principalmente por causa da hiperin-suflação dinâmica. Apesar de otimizar o fluxo expi-ratório num primeiro momento, essa hiperinsuflação tem efeito deletério, visto que força o sistema respira-tório a operar na parte plana da curva de complacên-cia, em que pressões progressivamente mais fortes geram aumentos de volume cada vez mais reduzidos. Cria-se assim um mecanismo “restritivo”, no qual o aumento do volume respiratório é limitado pelo au-mento do esforço.1,5

Em pacientes com DPOC, os testes de função pul-monar são usados para estabelecer o diagnóstico, quantificar a gravidade da doença, estimar prognós-tico, monitorizar a função pulmonar e a resposta ao

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Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutiva

Entre os fatores que contribuem para essa redução, estão: a contração da musculatura lisa das vias aére-as, principalmente mediada por neurotransmissores e mediadores broncoconstritores; edema das vias aéreas, causado por derrame microvascular; espes-samento das vias aéreas, devido ao remodelamento; e hipersecreção brônquica.6

veNtiLação MeCâNiCa No PaCieNte CoM doeNça PULMoNar oBstrUtiva

Pacientes portadores de doença pulmonar obstru-tiva (DPO) representam desafios complexos no que concerne à ventilação mecânica. Entre as peculiarida-des da sua ventilação, estão o aumento na resistência das vias aéreas, a hiperinsuflação dinâmica, a assin-cronia paciente-ventilador, o aumento da secreção e da demanda ventilatória, as alterações nas trocas ga-sosas e a disfunção cardiovascular por ela causada.1 A combinação desses fatores acarreta o risco de de-senvolvimento de autoPEEP ou PEEP intrínseca (PE-EP

i), definida como pressão alveolar positiva ao final da expiração. A PEEPi normalmente não é detectada, porque não é registrada no manômetro do ventilador, em equilíbrio com a atmosfera. Exame físico, incluin-do palpação e ausculta do tórax para detecção de expiração persistente após início da próxima respira-ção, pode confirmar a existência da PEEPi, mas sua ausência não a exclui.9 O reconhecimento da PEEPi é de vital importância para o manejo da população com doença pulmonar obstrutiva porque pode cau-sar alterações tanto no sistema respiratório quanto no circulatório.10 A autoPEEP pode ser classificada em autoPEEP estática e autoPEEP dinâmica. A autoPEEP estática pode ser medida por meio da manobra de oclusão da válvula de exalação ao final da expiração, retardando-se o início do próximo ciclo respiratório.

Essa medida requer que o paciente não execute esfor-ço respiratório e expressa a média das pressões alveo-lares ao final da expiração de diferentes unidades em contato com as vias aéreas proximais, sendo calculada pela diferença entre a PEEP total e a PEEP extrínse-ca.11,12 (Figura 1)

Já a autoPEEP dinâmica pode ser medida a partir da deflexão da pressão esofagiana no ponto de fluxo zero, sendo sempre menor que a autoPEEP estática, visto que a autoPEEP dinâmica reflete os alvéolos com reduzida constante de tempo de esvaziamento e expiração rápi-da, e não a totalidade dos alvéolos (Figura 2).12

Figura 1 - Manobra de oclusão do ramo expiratório para estimar a autoPEEP. As válvulas são ocluídas no final da expiração. Quando o fluxo chegar a zero, a pressão representará a PEEP total. Subtaindo-se a PEEP externa, se aplicada, da PEEP total, obtém-se a auto PEEP (Adaptado do International Journal of COPD 2007;2(4):447.12)

Figura 2 - AutoPEEP dinânica e estática. Na autoP-EEP dinâmica, o fluxo inspiratório começa assim que a pressão nas aéreas é maior que a pressão na região pulmonar com menor autoPEEP, isto é, com a menor constante de tempo (no exemplo, a autoPEEP dinâmica é 5). Na autoPEEP estática, a oclusão ao final da expiração permite o equilíbrio entre asdife-rentes regiões pulmonares e a autoPEEP medida entre todas as regiões (no exemplo, a autoPEEP é 10) (Adaptado do International Journal of COPD 2007;2(4):448.)

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Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutiva

presença de autoPEEP.2,12 Deve ser utilizada em ca-sos selecionados e somente se proporcionar desin-suflação pulmonar. Se optado pelo seu uso, deve ser mantida entre 75 e 85% da PEEPi estática, para assim evitar piora da hiperinsuflação dinâmica.11,12

A medida do volume pulmonar ao final da inspi-ração (VIF) consiste na medida da quantidade de ar exalada durante prolongado período em apneia, até que nenhum fluxo expiratório seja detectado11. O VIF compreende o volume corrente ofertado no ciclo an-terior mais o volume adicional resultante da hiperin-suflação, conforme demonstrado na Figura 3.

Nas situações em que o VIF é inferior a 1,4L, não foram observadas complicações decorrentes de hi-perinsuflação. É a técnica mais fidedigna para avaliar a hiperinsuflação pulmonar, porém sua relevância é contestada, devido à dificuldade de execução.11

Tanto o modo volume-controlado quanto o modo pressão-controlada podem ser utilizados na ven-tilação do paciente com DPO. Na ventilação modo pressão-controlada, é importante monitorizar o volu-me minuto e o volume corrente, visto que alterações na impedância do sistema respiratório podem oca-sionar grandes alterações desses volumes e, conse-quentemente, da PaCO

2 e do pH arterial. Já no modo volume-controlado existe o risco de liberação de al-tas pressões inspiratórias quando ocorrer alteração importante da impedância, tornando a monitoriza-ção dessas pressões imprescindível.2

As estratégias ventilatórias consistem em cor-rigir as anormalidades nas trocas gasosas e iden-tificar e prevenir a hiperinsuflação dinâmica.12 Os principais parâmetros a serem avaliados na mecânica pulmonar são a pressão de platô (Pplatô), a pressão de pico (Ppico) e o volume pulmonar ao final da inspiração.11

A redução do volume minuto (VE) representa a estratégia ventilatória mais eficiente no controle da hiperinsuflação dinâmica. Pode-se reduzi-lo di-minuindo a frequência respiratória (f) ou o volume corrente (VC), associado à máxima redução possí-vel da relação tempo inspiratório/tempo expiratório, recomendando-se que seja inferior a 1:3. Os ajustes do volume minuto devem ter por meta o ajuste do pH arterial entre 7,20 e 7,40, e não da PaCO

2, pois dessa maneira evitam-se a hiperventilação e possível dese-quilíbrio ácido-básico.2,10-12 Pratica-se, nesses casos, hipercapnia permissiva.13

A pressão de platô, se comparada à pressão de pico inspiratório, apresenta melhor correlação com a pressão alveolar verdadeira e, consequentemente, com a hiperinsuflação pulmonar e o barotrauma. Deve-se mantê-la abaixo de 30-35 cm de água tanto na asma quanto na DPOC. A pressão de pico inspi-ratório, apesar da interpretação limitada, não deve ultrapassar 50 cm de água.11,12

A PEEP extrínseca não apresenta benefícios clí-nicos em pacientes sedados, não hipoxêmicos, em ventilação mecânica e bem adaptados, mesmo na

Figura 3 - O volume expirado durante uma apneia prolongada pode ser utilizado para determinar o volume de ar aprisionado nos pacientes com doença pulmonar obstrutiva. A diferença entre o volume ao final da inspiração e o volume corrente representa o volume de ar aprisionado. CRF= capacidade residual funcional, VC= volume corrente, V apris= volme aprisionado, VIF= volume ao final da inspiração (Adaptado de Respira-tory Care 2005;50(2):252.1)

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Ventilação mecânica protetora no paciente com doença pulmonar obstrutiva

riores, sendo necessária sempre a monitorização dos padrões de pressão e volumes impressos ao paciente: pressão de platô, a ser mantida abaixo de 30-35 cm de água; pressão de pico, que não deve ultrapassar 50 cm de água; e o volume pulmonar ao final da ins-piração, que deve ser inferior a 1,4L. A aplicação de PEEP extrínseca não representa benefícios clínicos em pacientes sedados, não hipoxêmicos e bem adap-tados à ventilação mecânica, mesmo em caso de au-toPEEP. Somente deve ser utilizada em casos selecio-nados e exclusivamente se representar diminuição da hiperinsuflação pulmonar, devendo ser mantida entre 75 e 85% do valor medido da PEEP

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11. Barbas CSV, Pinheiro BV, Vianna A, et al. III Consenso Brasileiro

de Ventilação Mecânica: Ventilação mecânica na crise de asma

aguda. J Bras Pneumol. 2007; 33(Supl. 2):S106-10

12. Reddy RM, Guntupalli KK. Review of ventilator techniques to op-

timize mechanical ventilation in acute exacerbation of chronic

obstructive pulmonary disease. Int J COPD. 2007; 2(4):441-52.

Na Tabela 1 segue uma orientação sobre a venti-lação mecânica no paciente com doença pulmonar obstrutiva.

CoNCLUsão

A maioria dos estudos realizados em pacientes com doença pulmonar obstrutiva, seja DPOC ou asma, é realizada em pacientes com falência respi-ratória. As recomendações dos especialistas e as atu-ais evidências para ventilação protetora no paciente com DPO são, portanto, retiradas desses estudos e aplicadas à prática clínica.

Assim, com base na literatura, é possível concluir que, em paciente com doença pulmonar obstrutiva, é essencial realizar ventilação mecânica protetora, visando corrigir anormalidades gasosas e identificar e prevenir a hiperinsuflação dinâmica. Diferentes modalidades ventilatórias não se mostraram supe-

Tabela 1 - Ventilação mecânica no paciente com doença pulmonar obstrutiva

Parâmetros da ventilação Comentários

ventilação pressão-controlada ou volume-controlado

Não há evidência sobre o melhor modo ventilatório.

o importante é o controle rígido do volume corrente e das pressões nas vias aéreas.

volume corrente: 5 a 7 mL/kg de peso corporal predito

diminui a morbidade e mortalidade.

Cálculo do peso corporal predito em quilogramas.14

sexo masculino: 50 + 0,91 x (altura em centímetros – 152,4)sexo feminino: 45,5 + 0,91 x (altura em centímetros – 152,4)

Controle rígido das pressões nas vias aéreas2

Ppico < 50 cm/H2oPplato < 35 cm/H2oautoPeeP < 15 cm/H2o

avaliação constante da mecânica respiratória.

Parâmetros protetores contra o dano aos alvéolos.

Fr: 7 a 11 incursões por minutoFluxo inspiratório elevadorelação i:e inferior 1:3

elevação do tempo expiratório, reduzindo o aprisionamento do ar alveolar.

PeeP extrínseca tentativa de reduzir a hiperinsuflação pulmonar.

deve ser mantida entre 75 e 85% da PeePi estática.

Hipercapnia permissiva2 tentativa de manter controle rígido das pressões nas vias aéreas.

avaliação constante da gasometria arterial.

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Rev Med Minas Gerais 2011; 21(2 Supl 3): S64-S72 64

atUaLização teraPêUtiCa

Instituição:Hospital Life CenterBelo Horizonte, MG – Brasil

Endereço para correspondência:Roberta Bernardes RodriguesRua Leopoldina 352/1302Bairro: Santo AntônioCep: 30330–230Belo Horizonte, MG - BrasilEmail: [email protected]

1Anestesiologista do Hospital das Clínicas de Universida-de Federal de Minas Gerais – UFMG, Hospital Life Center e Hospital Luxemburgo. Belo Horizonte, MG – Brasil.2Anestesiologista do Hospital Life Center e Hospital Vila da Serra. Belo Horizonte, MG – Brasil.3Anestesiologista do Hospital Luxemburgo. Coordenador do Serviço de Anestesiologia do HGIP–IPSEMG. Belo Horizonte, MG – Brasil.

resUMo

O sugamadex é uma droga nova e revolucionária desenvolvida como antagonista seletivo dos agentes bloqueadores neuromusculares (ABNM) esteroides (rocurônio > vecurônio >> pancurônio). O medicamento é uma γ-ciclodextrina modificada e hidrossolúvel que forma um composto estável com o ABNM na razão de 1:1. Ele se liga ao ABNM livre no plasma, criando um gradiente de concentração que desloca o ABNM dos receptores nicotínicos na junção neuromuscular, levando à reversão completa e duradoura do BNM. O sugamadex não se liga às proteínas ou a qualquer outro receptor no organismo, o que lhe confere ótimo perfil de tolerância. O suga-madex pode ser usado na reversão do BNM profundo, promovendo recuperação mais rápida em relação à succinilcolina. Seu emprego pode diminuir a necessidade de monitorização do BNM, a incidência de bloqueio residual e ainda evitar os efeitos adversos causados pelos anticolinesterásicos e anticolinérgicos. Entretanto, tam-bém há limitações em relação à utilização do sugamadex. Ele impede o uso dos AB-NMs esteroides durante 24 horas, caso seja necessário novo BNM, e pode aumentar o risco do emprego desnecessário e indiscriminado dos ABNMs. Além disso, faltam dados da sua utilização em alguns grupos populacionais e de seu uso em larga esca-la. Por fim, deve-se considerar também o fator econômico, visto que se trata de uma droga nova e de valor ainda elevado no mercado

Palavras-chave: Bloqueio Neuromuscular; Bloqueadores Neuromusculares/farmacolo-gia; gama-Ciclodextrinas/farmacologia; Economia Farmacêutica.

aBstraCt

Sugammadex is a novel and unique compound designed as a selective antagonist of steroi-dal neuromuscular blocking agents (NMBA) (rocuronium>vecuronium>>pancuronium). The drug is a modified water-soluble γ-cyclodextrin that forms a stable complex at a 1:1 ratio with the NMBA. It combines with the NMBA creating a concentration gradient favoring the movement of the NMBA from the nicotine receptors of the neuromuscular junction leading to the complete and lasting reversal of the neuromuscular blockade (NMB). Sugamadex does not bind to plasma proteins or any other receptors system in the body what provides him a great tolerance profile. Sugamadex can be used in the reversal of deep neuromuscular blockade with a faster recovery time in relation to succinylcholine. Its use can diminish the necessity of monitoring of the NMB, the incidence of residual blockade and still prevent the adverse effects caused by the anticholinesterase and anticholinergic drugs. However, there are limitations regarding the use of Sugammadex. It hinders the use of the steroidal NMBA during 24 hours if a new NMB must be restablished and it can increase the risk of unneces-sary and indiscriminate use of the NMBA. Moreover, there is a lack of data regarding the its use in some population groups and in large scale. Finally, the economic factor must be also considered, since it is a new drug with a still raised value in market.

SUGAMMADEX – New horizons for the reversal of neuro-muscular blockade

Roberta Bernardes Rodrigues1, Izabela Fortes Lima2, Joaquim Belquior Silva3

SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscular

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SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscular

ração) e recuperação prolongada continuam surgin-do.7-11 Em geral, as taxas de incidência de bloqueio residual com pancurônio vão de 20 a 50% e com ABNM de ação intermediária (vecurônio, rocurônio e atracúrio) de 16% a mais de 50% (dependendo da definição considerada, se TOF>0,7 ou TOF>0,9, res-pectivamente).9,12,13

Por essas razões há a necessidade clínica de uma droga com capacidade de reverter o BNM profundo com melhor perfil de segurança e tolerância.5

MoNitorização do BLoQUeio NeUroMUsCULar

Devido à variabilidade da duração do BNM e sabendo-se que o exame clínico é inadequado para determinar seu grau de recuperação, seria importan-te a monitorização da profundidade do bloqueio em todos os pacientes.7

A monitorização é feita a partir do estímulo de um nervo motor periférico com um impulso elétrico externo (o estimulador de nervo periférico). Existem basicamente cinco padrões de estimulação, que são: TOF (sequência de quatro estímulos ou train-of-four), estimulação tetânica, PTC (contagem pós-tetânica), double burst (ou dupla salva de tétano) e contração simples.3 O TOF e o PTC são os dois padrões de estí-mulos usualmente empregados.1,14,15

No TOF são aplicados quatro estímulos supramá-ximos em intervalos de 0,5 segundo pelo período de dois segundos (2Hz). Essa frequência é rápida o sufi-ciente para causar depleção dos estoques de ACh e lenta o bastante para não levar à mobilização dos es-toques. É então observado o número de respostas. O grau de fadiga é diretamente proporcional ao grau de bloqueio. Quando estão bloqueados 70-75% dos re-ceptores nicotínicos de ACh, a quarta resposta (T4) é reduzida. As demais respostas são reduzidas quando ocupadas as respectivas porcentagens de receptores: T3 (80-85%), T2 (85-90%) e T1(90-98%). No entanto, mais precisão da profundidade do BNM é obtida pela razão da amplitude da quarta resposta (T4) para a da primeira (T1), ou seja, a relação TOF T4/T1 ou sim-plesmente relação TOF. Essa medida é feita por equi-pamentos especiais (mecanografia, eletromiografia e aceleromiografia).14,16

O PTC baseia-se na potencialização pós-tetânica. Após alguns segundos do término de um estímulo te-

Key words: Neuromuscular Blockade; Neuromuscular Blocking Agents/pharmacology; gamma-Cyclodextrins/pharmacoloygy; Economics, Pharmaceutical.

iNtrodUção

Desde a introdução do bloqueio neuromuscular (BNM) na prática clínica em 1942 por Griffith e Jo-hnson, que sugeriram que a d-tubocurarina era dro-ga segura para produzir relaxamento muscular, já se passaram sete décadas.1,2 Durante todo esse período, vários novos agentes bloqueadores neuromusculares (ABNM) foram desenvolvidos no intuito de superar seu antecessor, em busca do agente considerado ”ide-al”, ou seja, que não apresentasse efeitos adversos, de rápido início de ação, curta duração, não cumulativo e com término de ação completo e definitivo.3,4 Entretan-to, esse ideal ainda não foi alcançado. Daí a necessida-de contínua de novas opções que tornem o bloqueio neuromuscular (BNM) previsível e seguro.

A reversão dos ABNMs adespolarizantes usualmen-te é feita por um inibidor da colinesterase (neostigmina, piridostigmina ou edrofônio) que, a partir da inibição dessa enzima, impede a degradação da acetilcolina (ACh), aumentando sua disponibilidade na fenda sináp-tica. Porém, esse aumento da ACh não ocorre de forma seletiva apenas nos receptores nicotínicos da JNM, mas há o aumento também em receptores nicotínicos de gânglios autonômicos e muscarínicos do sistema ner-voso simpático e parassimpático. Isto provoca diversos efeitos colinérgicos indesejados, como bradicardia, náusea, vômitos, broncoespasmos, aumento de secre-ções brônquicas e câimbras abdominais. Para tentar diminuir esses efeitos, associa-se uma droga antico-linérgica (atropina ou glicopirrolato).1-5 Esses agentes antimuscarínicos também estão associados a efeitos adversos como midríase, boca seca, aumento da pres-são intraocular, broncodilatação e taquicardia.6

Além disso, agentes anticolinesterásicos não são capazes de reverter BNM profundos. Eles possuem efei-to-teto devido aos níveis limitados de ACh na JNM, po-dendo ocasionar reversão incompleta do bloqueio ou mesmo recurarização, visto que sua duração de ação pode ser mais curta do que a atividade do ABNM.1,2,5

Bloqueadores de ação prolongada e, em baixo grau, de ação intermediária estão associados a BNM residual. Relatos de fraqueza pós-operatória, recupe-ração incompleta, efeitos ventilatórios indesejáveis (hipoxemia, alteração da resposta ventilatória hipó-xica, disfunção faríngea, aumento do risco de aspi-

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As ciclodextrinas são oligossacarídeos cíclicos hidrossolúveis com núcleo lipofílico. São bem co-nhecidas por sua habilidade de formar complexos de inclusão com várias moléculas, sendo usadas como ingredientes na indústria alimentícia (especialmente como portadores de sabor, vitaminas e outros).2,20 Sua estrutura tridimensional lembra um cone trunca-do e oco ou uma rosquinha com uma cavidade hidro-fóbica e um exterior hidrofílico2 (Figura 2).

FARMACODINÂMICA

Mecanismo de ação

O mecanismo de ação do sugamadex é único.17 Ele liga-se seletiva e irreversivelmente ao rocurô-nio ou vecurônio livres no plasma, encapsulando a molécula do ABNM na proporção de 1:1. Esse sequestro reduz a quantidade de ABNM livre dis-ponível, o que cria um gradiente favorecendo seu deslocamento do receptor nicotínico na JNM para o plasma, resultando na reversão do bloqueio.18-22 Esse deslocamento resulta no aumento da concen-tração total do ABNM no plasma (tanto livre quan-to ligado ao sugamadex).19,21 O complexo hóspede--hospedeiro (rocurônio-sugamadex) é estável, inativo e não metabolizado, sendo excretado do organismo de acordo com as propriedades farma-cocinéticas do sugamadex.23

tânico (o que aumenta muito a quantidade de ACh livre na fenda sináptica), aplica-se o estímulo simples padronizado contínuo e conta-se o número de con-trações musculares evocadas. Quanto menor esse número, mais intenso é o bloqueio. É preconizado es-tímulo simples de 1 Hz três segundos após o término do estímulo tetânico de 50 Hz por cinco segundos. A PTC é útil na vigência de bloqueio adespolarizante total profundo e uma resposta indica que, apesar de profundo, está próximo de ser detectável (< 100%).3

Relação TOF ≥ 0,9 é considerada definição de re-cuperação do BNM pela maioria dos especialistas.

o sUGaMadex

O sugamadex (anteriormente conhecido como ORG 25969) é o mais novo agente desenvolvido para reverter seletivamente o BNM como antagonista dos bloqueadores aminoesteroides (sendo sua seletivida-de decrescente: rocurônio > vecurônio >> pancurô-nio) - Figura 1.

O medicamento é uma gama-ciclodextrina (SU refere-se a sugar - açúcar - e GAMADEX refere-se à gama-ciclodextrina) modificada e hidrossolúvel, que forma um composto estável na razão de 1:1 com a molécula do ABNM.2 O sugamadex, portanto, age como uma droga carreadora inerte e não possui efei-tos sobre a acetilcolinesterase ou sobre qualquer re-ceptor do organismo.17-19

Figura 1 - Estrutura da γ-ciclodextrina sintética sugamadex.

Fonte: Naguib M, Lien CA.1

Figura 2 - Complexo rocurônio-sugamadex.Fonte: Naguib M, Lien CA.1

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FARMACOCINÉTICA

O sugamadex possui propriedades farmacociné-ticas lineares no intervalo de dose de 1 a 16 mg/kg. O volume de distribuição no estado de equilíbrio é de 11 a 14 L (0,16-0,20 L/kg) e na fase terminal de 18 L (0,26 L/kg).23 A droga na forma livre ou como com-plexo com o rocurônio não de liga às proteínas ou eritrócitos e também não sofre metabolismo.23

A excreção renal da droga inalterada tem sido a única forma de eliminação observada do sugama-dex.23 De acordo com a maioria dos estudos, em pa-cientes saudáveis, a meia-vida de eliminação (t β) é de 1,8 hora.23 A maior parte do sugamadex é excreta-da na urina nas primeiras oito horas e 90% em 24 ho-ras.19,23 Sua depuração plasmática é de 84 a 138 mL/min em adultos com função renal normal.23

A farmacocinética do rocurônio é alterada quan-do associado ao sugamadex proporcionalmente, ou seja, o complexo rocurônio-sugamadex obedece à farmacocinética do sugamadex e o rocurônio livre mantém suas propriedades.23

Populações especiais

■ Nefropatas: a eliminação do sugamadex e do complexo sugamadex-rocurônio foi significativa-mente atrasada em pacientes com dano renal gra-ve (ClCr <30 mL/mim) comparada à função renal normal (ClCr > 80 mL/min). No entanto, a eficácia do sugamadex não foi alterada e não houve recor-rência do bloqueio. Sua eliminação por hemodi-álise apresentou níveis inconsistentes. O uso de sugamadex em pacientes com dano renal grave não é recomendado.23

■ Hepatopatas: a via hepática não faz parte do me-tabolismo e excreção do sugamadex e seu uso não foi avaliado em hepatopatas. É aconselhada cautela para o uso nesses pacientes.23

■ Idosos: baseado na farmacocinética, os valores de sugamadex foram similares entre um pacien-te idoso (75 anos) e um adulto (40 anos), ambos com função renal normal.23

■ Crianças: os valores de clearance, volume de dis-tribuição e meia-vida de eliminação aumentaram com a idade.29 Atualmente, o sugamadex não é recomendado para menores de dois anos, devido à falta de dados nessa faixa etária.23

reversão do bloqueio neuromuscular

O sugamadex reverte os ABNMs esteroides (rocu--rônio>vecurônio>>pancurônio), mas não os benzi-lisoquinolínicos (mivacúrio, atracúrio, cisatracúrio) ou succinilcolina.5 Em estudos, a droga foi efetiva de maneira dose-dependente em diferentes estágios de recuperação (intervalos de 0,1-16 mg/kg) na reversão imediata de 0,6 a 1,2 mg/kg de rocurônio e 0,1 mg/kg de vecurônio em pacientes cirúrgicos ou voluntários ASA I a III.15,18,19,24 A reversão do bloqueio induzido pelo rocurônio ocorreu com o sugamadex, indepen-dentemente da anestesia ter sido mantida com propo-fol ou sevoflurano.25,26

O bloqueio residual ocorreu com doses de sugamadex mais baixas do que as recomendadas (<2 mg/kg) em al-guns pacientes da fase II dos estudos de ajuste de dose.27,28

efeitos adversos

Não foi relatado efeito clinicamente importante do sugamadex na pressão arterial, frequência cardía-ca, intervalo QT, frequência respiratória, temperatura corporal, peso, hematologia, função renal, função hepática, análises bioquímicas ou urinárias em vo-luntários saudáveis.5,17,23 Testes de segurança, toxico-logia de dose repetida, potencial de genotoxidade, toxidade na reprodução, tolerância local ou compa-tibilidade alimentar não revelaram perigo específico do sugamadex em humanos.23

A disgeusia (gosto metálico ou amargo) foi o efei-to adverso mais comum, principalmente com doses acima de 32 mg/kg (o dobro da dose máxima reco-mendada).5,23 Após administração repetida de suga-madex, o equivalente a 48-480 vezes a dose clínica recomendada (4 mg/kg), houve retenção em dentes de ratos jovens (porém não de adultos).23

A administração de toremifeno, ácido fusídico ou flucloxacilina pode afetar a eficácia do sugamadex. Pode haver atraso na reversão do bloqueio e reco-menda-se aguardar seis horas de pós-operatório para administração de ácido fusídico ou flucloxacilina, se não for possível monitorizar a recorrência do blo-queio, especialmente nos primeiros 15 minutos.23 A administração do sugamadex no mesmo dia de uma dose de contraceptivo oral combinado ou somente progestogênio equivale a uma dose perdida do con-traceptivo (consultar na bula do mesmo para instru-ções relevantes à dose perdida).23

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SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscular

Alguns trabalhos randomizados, duplo-cego e multicêntricos demonstram que o sugamadex é significa-tivamente mais rápido do que a neostigmina na reversão do bloqueio profundo e moderado. Em pesquisa realiza-da com pacientes ASA I a IV maiores de 18 anos, foi feita a reversão do bloqueio induzido pelo rocurônio após o aparecimento 1-2 PTC com 4 mg/kg de sugamadex (n=37) e com 70 mcg/kg de neostigmina mais 14 mcg/kg de gli-copirrolato (n=37). O tempo médio para recuperação de TOF de 0,9 foi de 2,9 min no grupo do sugamadex contra 50,4 min no grupo neostigmina-glicopirrolato.30 O tempo para atingir TOF de 0,9 após 0,6 mg/kg de rocurônio foi significativamente mais curto com 4 mg/kg de sugama-dex (1,8 minuto) do que com 70 mcg/kg de neostigmine mais glicopirrolato (17,4 minutos) ou 1 mg/kg de edrofô-nio mais 10 mcg/kg de atropina (5,5 minutos). O mesmo foi observado para TOF de 0,8 e 0,7.31

Estudo randomizado, duplo-cego e multicêntrico comparando o uso do rocurônio/sugamadex com o cisa-tracúrio/neostigmine no BNM moderado (reaparecimen-to de T2) demonstrou que, no grupo rocurônio 0,6 mg/kg - sugamadex 2 mg/kg, a recuperação de TOF 0,9 é cinco vezes mais rápida que no grupo cisatracúrio 0,15 mg/kg- neostigmine 50 mcg/kg + glicopirrolato 10 mcg/kg.32 O mesmo foi constatado ao avaliar-se o TOF de 0,8 e 0,7.32

■ Gestantes: não há dados para uso em gestantes e é recomendada cautela. Não é esperado que dose única de sugamadex em mulheres que estão ama-mentando prejudique a criança.23

■ Sexo, raça e peso corporal: não foram encontra-das diferenças clinicamente relevantes.23

EFICÁCIA TERAPÊUTICA

Diversos trabalhos foram realizados nos últimos anos demonstrando que o sugamadex pode ser admi-nistrado para a reversão do BNM em vários momentos após a administração do rocurônio ou vecurônio em doses diversas (rocurônio de 0,6 – 1,2 mg/kg e vecurô-nio de 0,1 mg/kg), bem como sob diversos regimes de manutenção da anestesia (venosa ou inalatória).

Na maioria dos estudos foi considerado variável primária de eficácia o tempo da administração do sugamadex para alcançar TOF de 0,9. No estudo que analisou o uso da succinilcolina (em que a avaliação do TOF não é apropriada), esta variável foi o tempo da administração do ABNM até a recuperação espon-tânea (ou seja, 0,1 de T1). As variáveis secundárias incluíram o tempo para alcançar TOF de 0,8 e 0,7.

Figura 3 - A. Recuperação da intensidade de contração e da razão TOF após administração de 1,2 mg/kg de rocurônio, seguido de 16 mg/kg de sugamadex após três minutos. A recuperação de T1 de 90% e razão do TOF de 0,94 ocorreu em 110 segundos. O tempo decorrido entre a administração do rocurônio e a recupera-ção de 90% de T1 foi de quatro minutos e 47 segundos. B. Efeito da administração de 1,0 mg/kg de succini-lcolina (Sch) comrecuperação espontânea de 90% de T1 ocorreu após nove minutos e 23 segundos.Fonte: Naguib M.2

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SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscular

apenas uma avaliação visual do TOF. Nesse estudo 50 pacientes tiveram suas anestesias com rocurônio e foram monitorizados com o TOF, que só poderia ser avaliado visualmente pelo anestesista. Após as ci-rurgias, ao reaparecimento visual da segunda contra-ção, foi administrado em um grupo sugamadex 2 mg/kg e em outro neostigmine 50 mcg/kg. A extubação baseava-se no aparecimento visual de quatro contra-ções à estimulação do nervo periférico e em achados clínicos. Após a extubação, o período de recupera-ção inseguro (até atingir um TOF de 0,9) foi medido nos dois grupos. A média no grupo sugamadex foi de 1,7 minuto (0,7-3,5) e no grupo neostigmine foi de 13,3 minutos (3,5-28,9). Os valores médios do TOF na detecção visual do quarto estímulo foram de 0,34 (0,0-0,56) no grupo neostigmine e 0,86 (0,64-1,04) no grupo sugamadex. Isto demonstra que existe um hia-to entre a observação visual e o valor real do TOF e que esse hiato é menor com o uso do sugamadex.36

Demonstrou-se que o sugamadex é um agente de reversão rápido, seguro e com tempos de recupera-ção similares para crianças, adolescente, adultos e para um pequeno grupo de menores de dois anos. O tempo médio para alcançar o TOF de 0,9 com 2 mg/kg de sugamadex foi de 0,6 min em bebês, 1,1-1,9 min em crianças, adolescentes a adultos, enquanto com o placebo foi de 19,6-29,5 min.29

Em estudo comparando paciente com função re-nal normal e aqueles com dano grave, a eficácia do sugamadex foi semelhante na reversão do bloqueio. O tempo médio para alcançar TOF de 0,9 com 2 mg/kg de sugamadex foi de 1,6 min nos pacientes nor-mais e 2,0 min nos nefropatas.37

Recentemente, McDonnell et al.38 publicaram um relato de caso no qual uma paciente de 33 anos, sem história prévia de alergias, que seria submetida à vi-deolaparoscopia para investigação de infertilidade apresentou, durante a indução anestésica, reação anafilática grave ao rocurônio com colapso cardio-vascular. Após 19 minutos de massagem cardíaca e cinco doses de adrenalina (totalizando 4 mg) sem sucesso, foram dados à paciente 500 mg de sugama-dex (6,5 mg/kg) quatro minutos após a última dose de adrenalina, o que levou à recuperação do estado hemodinâmico em aproximadamente 45 segundos após o bolus de sugamadex. Apesar dos autores não terem encontrado causa clara para o ocorrido e de não haver evidência científica, o potencial uso do su-gamadex no manejo do choque anafilático induzido por rocurônio merece ser citado.38

Segundo Lee et al.33, em estudo randomizado, du-plo-cego e multicêntrico, quando comparada a rever-são do bloqueio profundo pelo sugamadex (dose de 16 mg/kg) três minutos após a administração de 1,2 mg/kg de rocurônio com a recuperação espontânea após 1,0 mg/kg de succinilcolina, o tempo necessário é de aproximadamente 2,5 minutos (ou seja, 40%), menor no grupo do rocurônio.

Outro autor relata, em trabalho randomizado e duplo-cego, que o sugamadex promove reversão do vecurônio mais rapidamente que o neostigmine. Nes-se estudo foi utilizada dose de indução de 0,1 mg/kg de vecurônio. Os pacientes foram divididos em dois grupos: sugamadex 2 mg/kg ou neostigmine 50 mcg/kg mais glicopirrolato 10 mcg/kg. Ao final da cirurgia, no reaparecimento de T2 no TOF, o bloqueio foi re-vertido e o tempo para alcançar o TOF de 0,9 foi de 2,7 e 17,9 min, respectivamente. O mesmo foi obser-vado para o TOF de 0,8 e de 0,7.34

Estudos randomizados ressaltaram que, apesar do sevoflurano prolongar o efeito dos ABNMs, a re-cuperação do BNM com sugamadex independe do regime de manutenção da anestesia. Em um ensaio, os pacientes receberam 0,6 mg/kg de rocurônio na indução anestésica e a anestesia foi mantida aleato-riamente com propofol ou sevoflurano. Na aparição de T2 no TOF, foram administrados 2 mg/kg de su-gamadex. Não houve diferença significativa entre os grupos para o tempo de recuperação das relações TOF de 0,7 (1,3 e 1,3 minutos, respectivamente), 0,8 (1,5 e 1,5 minutos) e 0,9 (1,8 e 1,8 minutos).25 Em ou-tro trabalho, o sugamadex em dose ≥ 4 mg/kg promo-veu rápida reversão do BNM profundo induzido por rocurônio ou vecurônio em anestesia mantida com sevoflurano. Os pacientes (n=102) foram divididos em dois grupos: rocurônio 0,9 mcg/kg ou vecurônio 0,1 mcg/kg. Ao final da cirurgia, após 1-2 PTC, esses pacientes receberam as seguintes doses únicas de sugamadex: 0,5; 1,0; 2,0; 4,0 ou 8,0 mg/kg. O efeito dose-resposta para atingir TOF de 0,9 foi crescente, de acordo com a dose. No grupo rocurônio (0,5 mg/kg) 79,8 min; (4 mg/kg) 1,7 min (8,0 mg/kg) 1,1 min; e no grupo vecurônio (0,5 mg/kg) 68,4 min; (4 mg/kg) 3,3 min; (8 mg/kg) 1,7 min. Houve, ainda, BNM recorrente na monitorização em cinco pacientes sem repercussões clínicas (todos esses pacientes haviam recebido dose de sugamadex abaixo de 1 mg/kg).35

Trabalho randomizado e duplo-cego salientou que o sugamadex permite a reversão do BNM mode-rado mais segura que o neostigmine, quando é feita

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SUGAMADEX – Novos horizontes para a reversão do bloqueio neuromuscular

disCUssão

Apesar de ter melhor perfil de tolerância em re-lação à succinilcolina, o rocurônio não é indicado como agente de primeira linha para uso em intuba-ção de sequência rápida devido à sua ação duradou-ra.39 O uso de sugamadex poderia, teoricamente, en-curtar o período de ação do rocurônio2, podendo ser usado para reverter rapidamente o seu efeito em uma situação “não intuba, não ventila”. Entretanto, devi-do a essa situação não poder ser estudada de forma ética, somente a experiência clínica do sugamadex poderá ajudar a indicar seu uso como um agente de reversão de emergência.2 Ou seja, num futuro próxi-mo poderia ser possível eliminar a succinilcolina da indução em sequência rápida.40

O uso do sugamadex poderá diminuir a necessi-dade da monitorização de rotina do bloqueio neu-romuscular, pois foi demonstrado que é possível detectar visualmente duas respostas ao TOF para a administração de 2 mg/kg da droga ou 1-2 respos-tas na PTC para administração de 4 mg/kg. Afinal, mesmo quando disponível, poucos anestesiologistas usam essa monitorização de rotina na prática.41

O uso do sugamadex diminui o risco de efeitos adversos associados aos anticolinesterásicos e anti-colinérgicos atualmente utilizados. Além disso, nos estudos feitos até o momento, o sugamadex parece não ter efeitos hemodinâmicos e o bloqueio residual nas doses recomendadas é infrequente.5

Entre as limitações do sugamadex está a impossibi-lidade do uso de BNMs esteroides no caso de necessi-dade de recurarização dentro de 24 horas. Além disso, não exerce efeito sobre os ABNMs não esteroides.2,5

Algumas questões têm sido levantadas por diver-sos autores, como o fato da facilidade de reversão po-der levar ao uso desnecessário e indiscriminado de altas doses de ABNM, o que colocaria os pacientes em risco e esconderia níveis inadequados de anes-tesia e analgesia.5,40 No entanto, cabe a cada aneste-siologista lembrar que os ABNMs devem ser usados, como qualquer outra droga, nas doses suficientes re-queridas em cada situação. Esta nova droga pode me-lhorar a qualidade da anestesia, que muitas vezes é realizada com bloqueio insuficiente devido ao receio quanto às condições e atrasos no despertar.41

Conforme já foi feito em outros países, são neces-sárias análises farmacoeconômicas baseadas nos custos hospitalares e de aquisição do sugamadex no nosso país.2,5,42 A indústria farmacêutica é um dos res-

TOLERÂNCIA

O sugamadex foi bem tolerado e a maioria dos efeitos adversos foram classificados como suaves e moderados.15,18,27,29,31 A disgeusia (gosto amargo ou metálico na boca) foi incomum nas doses recomen-dadas, mas foi o efeito adverso mais frequente em altas doses.5

Efeitos adversos com incidência acima de 2% e que ocorreram pelo menos duas vezes mais que no grupo placebo incluíram movimento, caretas ou chu-par o tubo traqueal (8% vs 1,4% no placebo) e tosse (2,8% vs 1,4%), o que pode refletir reversão extrema-mente rápida do bloqueio. A consciência peropera-tória foi incomum e a relação desse evento com o sugamadex é desconhecida.23 O BNM residual ou re-corrente foi incomum e quando ocorreu foi, na maio-ria, em indivíduos que receberam dose mais baixas que as recomendadas (< 2 mg/kg de sugamadex).23A frequência de reações alérgicas ou hipersensibilida-de foi baixa (< 1%) e verificou-se principalmente com doses acima das recomendadas (> 16 mg/kg).23O su-gamadex, em geral, foi bem tolerado por pacientes com doença cardíaca e pulmonar (incluindo asma, DPOC e bronquite).5,23

DOSAGEM E ADMINISTRAÇÃO

Deve ser administrado em injeção endovenosa única em bolus e de forma rápida (em 10 segundos) sob supervisão de um anestesiologista.5,23 Recomen-da-se o monitoramento apropriado do nível de BNM.5

As doses recomendadas de sugamadex são: 2 mg/kg com recuperação espontânea de pelo menos T2 no TOF, 4 mg/kg se a recuperação atingiu pelo menos 1 a 2 PTC ou 16 mg/kg para reversão imediata de blo-queio profundo.23 Se for necessário recurarizar o pa-ciente, deve-se aguardar 24 horas para o uso de AB-NMs esteroidais ou optar por benzilisoquinolínicos.

O uso de sugamadex não é recomendado em pa-cientes com hipersensibilidade conhecida à droga ou quaisquer excipientes e nos portadores de insuficiên-cia renal grave.5,23 O uso em recém-nascidos e bebês (< 2 anos), devido à falta de dados disponíveis, ainda não é recomendado.23

A dose em pacientes obesos deve ser baseada no peso corporal ideal.23 As doses para crianças e ado-lescentes (2-17 anos) deve ser a mesma do adulto, as-sim com para idosos.23

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Outros problemas relacionados ao uso do sugama-dex ainda devem ser elucidados.41,45 Um deles refere-se à incidência de hipersensibilidade à droga, que só será verdadeiramente conhecida com o seu uso em larga escala. Quando a FDA emitiu a carta de “não aprova-do” em agosto de 2008, baseou-se no potencial de re-ações alérgicas/hipersensibilidade, e não na falta de eficácia da droga.5 Outro problema refere-se aos gru-pos estudados até então, que não incluíram pacientes debilitados (ASA IV), com doenças neuromusculares (ex: miastenia grave), gestantes e bebês.17

Não há dúvidas de que o sugamadex é uma droga revolucionária cujo impacto na prática anestésica tem sido comparada por muitos ao surgimento do propo-fol.2 Enfim, deve-se lembrar que a boa prática da anes-tesiologia jamais deve ser comprometida pela disponi-bilidade de excelentes drogas e antagonistas.40,41,45

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