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resultado de 12 meses de pesquisa do grupo MIDCID - PPGCC - Uniso Sorocaba/sp

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  • MDIA & CIDADE

    Paulo Celso da Silva

    Wilton Garcia

    Organizadores

  • 2

    Paulo Celso da Silva

    Wilton Garcia

    Organizadores

    MDIA & CIDADE

    Carlos Fernando Leite Cecilia Noriko Ito Saito

    Daniela Ferreira Lima de Paula Fabio Ramos Melo

    Felipe Parra Joana Fernandez

    Jos Francisco B. Calderon Mauro Maia Laruccia

    Osmar Siqueira Roger dos Santos

    Sandra Yukari Shirata Lanas Paulo Celso da Silva

    Thfani Postali Wilton Garcia

    Sorocaba, 2014

    Grupo de Pesquisa: Mdia, Cidade e Prticas Socioculturais MidCid

  • 3

    Agora, estamos descobrindo que,

    nas cidades, o tempo que comanda

    ou vai comandar, o tempo dos homens lentos...

    A cidade o lugar onde h mais mobilidade

    e mais encontros.

    Milton Santos A natureza do espao, 1996, p. 255-260

  • 4

    Autores 2014

    A reproduo no autorizada desta publicao, total ou em parte, constitui violao do copyright (Lei 5.988)

    Todos os direitos reservados.

    Projeto Editorial: Wilton Garcia

    Reviso: Carlos Fernando Leite

    Desenho da capa: So.k Ttulo: Osasco Tcnica: leo sobre papel Ano: 2014

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Silva, Paulo Celso da e Garcia, Wilton (orgs.)

    Mdia & cidade / Paulo Celso da Silva e Wilton Garcia (organizadores)

    Sorocaba: MidCid, 2014.

    Vrios autores

    100 pgs.

    ISBN 978-85-89909-47-1

    Bibliografia

    1. Comunicao 2. Cultura 3. Mdia 4 Cidade 5. Contemporneo

    CDD 302

    Conselho Editorial

    Cecilia Noriko Ito Saito Mauro Maia Laruccia Paulo Celso da Silva

    Wilton Garcia

    Sorocaba, 2014

  • 5

    SUMRIO

    Apresentao 6 Paulo Celso da Silva Wilton Garcia Prefcio 8 Rosalina Burgos A comunicao na cidade: 7 movimento no espao pblico Sandra Yukari Shirata Lanas Paulo Celso da Silva A pichao e outras inscries 18 como canal popular de comunicao urbana Thfani Postali Paulo Celso da Silva Cidades conectadas: 32 estudos contemporneos Osmar Siqueira Wilton Garcia Cidade digital: 43 imagens de Sorocaba no aplicativo Instagram Daniela Ferreira Lima de Paula Fabio Ramos Melo Mauro Maia Laruccia Refletir sobre o pensar: 56 um ensaio Wilton Garcia Carlos Fernando Leite Jos Francisco B. Calderon Representao e corpo, 69 materialidade e transcendncia Cecilia Noriko Ito Saito Roger dos Santos EXPERIMENTAES POTICAS 79 (Im)previstos 80 Daniela F. Lima de Paula Umbra 89 Felipe Parra Imerso 93 Joana Fernandez

  • 6

    Apresentao

    Saudades do futuro no uma alegoria.

    o desejo de ultrapassar a eternidade das coisas e dos homens.

    Armando Corra da Silva Saudades do futuro (1993)

    Talvez, essa seja a inspirao de todos ns, urbanoides do sculo XXI:

    ultrapassar! Dizia um amigo que ontem tarde, foi a quinze dias e ria muito com a ultrapassagem. Dessa forma, a cidade vai sendo esquadrinhada na

    velocidade que cada um consegue desenvolver.

    Diz Milton Santos que a cidade dos Homens Lentos, aqueles que

    esto fora da lgica do capital e, portanto, podem percorr-la com ritmo e

    visibilidade que faltam queles que, motorizados, ficam parados no trnsito

    espera da ordem de prosseguir para os prximos dois metros. Ou outros,

    velozes em suas mquinas, nada observam, olham sem ver.

    Assim com a mdia, tanta informao em todos os lugares. Parados no

    trnsito, navegam em celulares, tablets, pelo rdio do carro ou GPS,

    conservando o imvel motor em funcionamento.

    Mdia e Cidade, dessa forma, so modos complementares de

    ultrapassar coisas e homens na eternidade dos momentos que vivemos, nicos

    e intransferveis, deixam como resultado, a saudade ou poderamos avanar.

    Deixam a nostalgia, que a saudade do que no aconteceu de fato, feito uma

    saudade em potncia que mdia e cidade nos reservam.

    Prof. Dr. Paulo Celso da Silva Coordenador do PPGCC UNISO Universidade de Sorocaba/SP/BR

  • 7

    MidCid

    Grupo de Pesquisa Mdia, Cidade e Prticas Socioculturais

    Fundado em meados de 2012, o MidCid promove uma agenda mensal

    de encontros acadmicos, com seus pesquisadores, alunos e professores, que

    participam de estudos, discusses, leituras e debates, sobre determinado tema

    ou assunto, a partir dos campos contemporneos da comunicao e da cultura,

    os quais abrangem a diversidade de olhares e experincias. Esses campos da

    esfera do simblico portam significaes e oferecem novos referenciais nas

    leituras que se estabelecem sobre o cotidiano na contemporaneidade.

    As atividades do Grupo de Pesquisa MidCid Mdia, Cidade e Prticas

    Socioculturais so executadas por pesquisadores da Uniso e de outras

    universidades e instituies nacionais e estrangeiras, e por pesquisadores

    visitantes. O MidCid parte do trabalho de ensino e pesquisa que vem sendo

    realizado na ps-graduao.

    Os estudos articulam-se com a Linha de Pesquisa do Programa da Ps-

    Graduao em Comunicao e Cultura da Uniso que esto em

    desenvolvimento no campo das mdias. As atividades se desenvolvem

    apoiadas na viso multidisciplinar com o intuito de produzir e divulgar

    conhecimentos relevantes na contemporaneidade. Considerando que a cidade

    o locus, por excelncia, da circulao das Prticas Sociais, busca-se pensar os modos como tais fenmenos delimitam o espao (concreto ou imaginrio) e

    condicionam a gerao de sentidos nos ambientes urbanos.

    O MidCid objetiva realizar trabalhos de integrao entre pesquisadores e

    estudantes de diferentes nveis interessados nas questes ligadas pesquisa

    em comunicao com seus desdobramentos em Mdia, Cidade e Prticas

    Socioculturais. Assim, investiga os mltiplos fenmenos de comunicao que

    pontuam o espao urbano, especialmente os que se relacionam arte,

    cincia, ao corpo, cultura popular, ao consumo, as instituies, s novas

    tecnologias. E propomos a produo de cursos, seminrios, conferncias,

    eventos multimiditicos e publicaes de artigos e livros.

    Registro no CNPq: http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/3050092199393304

  • 8

    Prefcio

    Rosalina Burgos1

    Mdia & Cidade rene uma importante mostra do percurso de trabalho e debate realizado pelo Grupo de Pesquisa Mdia, Cidade e Prticas

    Socioculturais MidCid, junto ao Programa de Mestrado em Comunicao e

    Cultura da Uniso.

    Seu espectro temtico permite entrever mltiplas abordagens

    terico-conceituais acerca da relao entre comunicao, cultura e espao

    urbano, resultante da composio transversal do prprio Grupo de Pesquisa,

    cuja formao atual existe desde meados de 2012.

    Partindo da anlise das formas de manifestao dos movimentos

    sociais nos espaos pblicos, ou ainda, sobre processos de (re)significao do

    prprio corpo no mundo do consumo, Mdia & Cidade nos convida a percorrer caminhos interpretativos sobre a sociedade contempornea em suas diversas

    formas de linguagem e expresso.

    Tendo como substrato a materialidade e fruio das imerses nos

    contedos socioculturais da cidade, a obra contribuio inegvel busca de

    entendimento sobre este complexo universo de investigao cientfica e criao

    artstica: a cidade e seus atores ou agentes sociais, numa mirade de

    paisagens que denotam (geo)grafias apreendidas em insurgncias imagtico-

    sonoras. o que podemos encontrar nos temas abordados nos artigos e,

    tambm, nos ensaios de Experimentaes Poticas que encerra Mdia & Cidade, abrindo-a para inusitadas reflexes artstico-filosficas sobre a relao entre ser e estar na urbanidade.

    Por sua vez, as contribuies tericas aqui reunidas permitem

    avanar na compreenso sobre o vertiginoso processo de insero e

    fragmentao da cidade e das prticas citadinas nos circuitos virtuais,

    apontando para a urgncia e necessidade de compreenso sobre a relao

    local-global em suas mltiplas dimenses. 1 Gegrafa. Doutora em Geografia Humana pela Universidade de So Paulo. Docente do Curso

    de Licenciatura em Geografia da UFSCar Campus Sorocaba.

  • 9

    Nesse sentido, com base na cidade de Sorocaba, uma parte dos

    artigos se dedica a investigar inovaes tecnolgicas inseridas

    compulsoriamente na cotidianidade, a exemplo do uso do aplicativo Instragram

    para captura e projeo das imagens da cidade nas redes sociais virtuais.

    Noutra perspectiva, possvel mergulhar nos interstcios do urbano

    partindo das inscries contidas na pichao e outros grifos, aproximando

    extremos de uma realidade difusa e diversa: a cidade digital ora se conecta,

    ora se aparta do cho propriamente dito das manifestaes sociais

    contemporneas que, contraditoriamente, seguem condensando a novidade e

    o abandono, o grotesco e o sublime, prprios do urbano.

    Aos interessados nas questes que concernem comunicao e

    cultura e temticas relativas sociedade urbana na atualidade, esta obra

    convite para um profcuo dilogo com pesquisadores e especialistas de

    diversas reas do conhecimento, artistas, gestores e educadores. Suas

    pginas denotam a inquietude que move a busca pela compreenso das

    transformaes socioculturais desta sociedade, cuja complexidade requer

    caminhos interpretativos que renam mltiplos olhares.

    Mdia & Cidade, por fim, provoca questionamentos e instiga a busca por novas descobertas acerca dos nveis e desnveis de uma realidade

    constituda pelas contingncias da materialidade inerente cidade, bem como

    sobre as dimenses objetivas e subjetivas da virtualidade que a projeta para

    alm do seu prprio espao e tempo.

    Sorocaba, outubro de 2014.

  • 10

    A comunicao na cidade: movimento no espao pblico

    Sandra Yukari Shirata Lanas2 Paulo Celso da Silva3

    Resumo Este artigo, ao abordar movimentos sociais contemporneos, pretende oferecer subsdios e dados que levem reflexo da importncia dos espaos urbanos na comunicao, no caso estudado a escala da cidade. Experincias nacionais e internacionais pretendem dar conta da complexidade dos fenmenos contemporneos que so engendrados pela relao global-local e, muitas vezes, respostas globais no oferecem resultados satisfatrios para as demandas locais. Assim tambm com a cidade enquanto locus comunicacional na conformao de espaos pblicos.

    Palavras Chave: Comunicao, Cidade, Espaos Pblicos Resumen En este artculo, al tratar de los movimientos sociales contemporneos, planea ofrecer subsidios y datos que lleven a reflexin sobre la importancia de los espacios urbanos en la comunicacin, en el caso estudiado la escala es de la ciudad. Experiencias nacionales e internacionales tienen pretenden dar cuenta de la complejidad de los fenmenos contemporneos engendrados por la relacin global-local y, a menudo las soluciones globales no ofrecen resultados satisfactorios para las exigencias locales. As tambin con la ciudad comprehendida como locus comunicacional en la conformacin del espacio pblico.

    Palabras clave: Comunicacin, Ciudad, Espacios Pblicos. Abstract This article, by dealing with contemporary social movements, amy to offer subsidies and data to reflect on the importance of urban spaces in communication, in the studied case it is the scale of the city. National and international experiences are intended to account for the complexity of contemporary phenomena engendered by the global-local relationship and often global solutions do not offer satisfactory results for the local requirements. So also with the city as a communication comprehended locus in shaping the public space. Keywords: Communication, City, Public Spaces. 2 Arquiteta e Urbanista, docente no curso de Arquitetura e Urbanismo (Universidade de

    Sorocaba) Doutoranda na rea de Planejamento Urbano e Regional FAU/USP. Pesquisadora no Grupo de Pesquisa MidCid (Mdia, Cidade e Prticas Socioculturais) da Uniso. E-mail: [email protected]

    3 Professor e Coordenador do PPG Comunicao e Cultura, lder do Grupo de Pesquisa MidCid (Mdia, Cidade e Prticas Socioculturais) . E-mail: paulo.silva @prof.uniso.br

  • 11

    Introduo

    O Brasil um grande pas, monumental desde seu Achamento,

    documentado pela carta escrita ao rei poca de Portugal, D. Manuel I, por

    Pero Vaz de Caminha. Parte dessa grandeza se anuncia desde a descrio

    feita por aquele, e ainda que os ibricos da poca tentassem esconder estas

    informaes, a fim de poder explorar suas riquezas sem maiores interferncias,

    isto foi feito, no entanto, estabelecendo-se um padro de desequilbrio desde o

    incio de sua histria, ao menos sob o ponto de vista econmico.

    Para o urbanismo brasileiro, mesmo que incipiente no incio da sua

    histria ocidental, podem-se considerar as linguagens utilizadas para a

    comunicao geogrfica que pontuaram o espao antes do urbano: a

    linguagem falada, principalmente dos ndios catequizados, e os escritos e os

    desenhos (principalmente dos estrangeiros), que podem ser desde garatujas

    mo, croquis, mapas e cartas. Em um tempo em que adentrava selvas, muitas

    vezes sem bssolas, orientados por ndios que liam os acidentes geogrficos

    mais comuns das paisagens e outras caractersticas eletivas que eram

    anotadas e desenhadas por estrangeiros, na maioria das vezes, pois os

    primeiros brasileiros eram pouqussimos letrados.

    1. Espao e poltica

    A questo urbana resolvida poca pela obedincia s verticais ordens

    militares, sem opo de contestao, mas resolvida primeiramente pelos

    engenheiros militares e depois pelos homens bons, ou seja, grandes

    proprietrios, ricos e brancos, nas cmaras municipais, (instaladas pelo imprio

    portugus quando as localidades eram elevadas condio de Vila), contribuiu

    enormemente para a falta da participao popular e democrtica generalizada

    do povo brasileiro para as questes do espao urbano. Nesse sentido, o

    espao urbano brasileiro no incio de nossa histria, conforme nos indica

    Lefebvre (2008, p. 44) um agente da manipulao poltica, inclusive de sua

    representao que se apresenta como estratgia de classes e seus

    representantes.

  • 12

    Seja por falta de possibilidades, tanto sociais quanto informacionais, o

    espao urbano brasileiro foi conformado por 500 anos de baixssimo grau de

    participao democrtica pela sua populao; e as decises geralmente sobre

    a conformao desses espaos urbanos, e os recursos destinados para tais

    obras estavam mais atrelados at o final do sculo XX s percepes e

    necessidades das classes dominantes.

    Obviamente a mudana de um costume de 500 anos acerca de decises

    de como conformar, utilizando recursos pblicos, o espao urbano no

    modificado facilmente. No sculo XX praticamente samos de uma sociedade

    escravocrata, agrcola, rural, para uma sociedade que recebeu mais imigrantes

    de outros pases, muitos advindos de situaes de guerra civil, e recebeu a

    implantao de indstrias de base. O crescimento do espao urbano,

    entretanto, no veio acompanhado de melhor qualidade de vida urbana para as

    populaes de baixa renda.

    Articulaes polticas permitiram a volta de eleies diretas, os servios

    pblicos foram privatizados, com nfase nos sistemas virios e nas

    comunicaes. Informao era e ainda importante, para a sade, para a

    educao, para os negcios, para o desenvolvimento econmico. Passou-se

    da valorizao exacerbada da linha telefnica pblica, durante a expanso da

    telefonia brasileira nos anos 1970 a 1990, para proprietrios de chips e

    aparelhos celulares, no incio do sculo XXI.

    Vieram os planos diretores municipais, obrigatrios para municpios com

    mais de 20.000 habitantes, que para ser validados necessria a realizao de

    audincias pblicas com a populao local, para expor diagnsticos e

    propostas aos rumos do desenvolvimento fsico territorial destes municpios,

    com a conotao da funo social da cidade e da propriedade urbana. Os

    planos diretores municipais, as obrigatrias audincias pblicas,

    paulatinamente fizeram um retrato, mas acurado dos problemas urbanos mais

    especficos de cada localidade e sua populao; e contriburam para se

    levantar tecnicamente o problema habitacional e a ocupao de reas de risco

    e/ou de preservao permanente (APP).

  • 13

    Avanos foram feitos nos ltimos anos pelo programa federal Minha Casa Minha Vida, de 2009, particularmente ligados aprovao do Estatuto da Cidade (2001) e questo da propriedade urbana agora ter a meno jurdica

    funo social da propriedade urbana.

    2 A cidade e o urbano

    Henri Lefebvre conceitua a questo da cidade e o urbano, separando-a

    primeiro da questo industrializao; uma vez que faz a periodizao histrica

    do Urbanismo em trs fases: a era agrria, a industrial, a urbana. E que a era

    urbana, est s comeando; sendo que o urbano, um continente que se

    descobre e que se explora medida que construdo. (LEFEBVRE, 2008, p.

    81).

    Para uma anlise do que o espao urbano, Caiado, em 2003,

    questionava a dicotomia rural-urbano, baseada na lei do permetro-urbano,

    (utilizada pelo IBGE desde 2010); aps anlise de informaes coletadas no

    Plano Municipal Unificado/1999 do Sistema Estadual de Anlise de Dados

    (SEADE), o pesquisador afirma que em todos os municpios paulistas havia

    ocupaes urbanas em reas rurais: loteamentos sem aprovao, loteamentos

    aprovados por lei especial, grandes equipamentos de lazer e indstria, e

    processos de conturbao com outros municpios. Trazem tona a

    necessidade de novas questes instrumentais de anlise para a representao

    de uma realidade mais complexa de uma sociedade urbana, cada vez mais

    metropolitana, principalmente no Estado de So Paulo. Trata-se, portanto, da

    definio das formas de comunicao de parmetros instrumentais e jurdicos

    inclusive, para se fazer um ajuste mais contemporneo ao que est

    acontecendo nas bordas entre o antigo campo e a rea urbanizada (ou do que

    considerado permetro urbano).

    2.1. Reivindicao da cidadania

    O artista Eduardo Srur, conhecido por suas intervenes nos espaos

    pblicos urbanos, fez a instalao A Arte Salva, em que boias foram lanadas

    em frente ao Congresso Nacional, propondo o resgate da conscincia cvica

    por meio da arte socializada, em espao fsico e virtual.

  • 14

    Na ocupao irregular de rea particular prxima do Rodoanel, na zona

    norte de Osasco, SP, no h gua e luz na maioria dos barracos, embora haja

    numerao deles, afirma a matria do jornal Estado em abril de 2014. Como

    se faz a comunicao de resolues, com tantas pessoas? "Aqui, todas as

    decises so coletivas", garante Ventura, ento presidente da Frente Popular

    de Favelas de Carapicuba. Depois de uma invaso da ocupao no incio de

    fevereiro/2014, pela Guarda Municipal de Osasco, que investiu contra a

    Comunidade Nelson Mandela, segundo os moradores sem qualquer aviso

    prvio, e acabou expulsa a pedradas. "Chegaram atirando, mano, foi tiro de

    tudo, de borracha, de calibre 12, de 38", conta um dos mandelenses que tem

    no celular o vdeo do momento em que o contingente bateu em retirada pelo

    Portal D'Oeste II, o bairro vizinho. ", bala demais", mostra. Ao menos dois

    ocupantes ficaram feridos. "Agora eles vo ter que responder na corregedoria

    por tentativa de homicdio qualificado e abuso de poder", diz Carlos Eduardo

    Ventura, o lder mais experiente.

    A comunicao no influencia apenas tecnicamente a mensurao da

    dicotomia antiga campo x cidade, mas tem consequncias impactantes na

    visibilidade dos processos de ocupao urbana, pelos grupos desprivilegiados

    econmica e socialmente. A premncia da sada de uma precariedade

    econmica onde o preo da terra, e do morar j seja um coletivo urbano, faz

    com que a comunicao linear traga manifestaes concretas.

    3 Mudanas

    3.1. A hora da verdade

    Experincia distinta de participao no espao urbano podemos

    encontrar no documento A hora da verdade (A time for truth), que foi elaborado pela Los Angeles Comission, formada por treze cidados e presidida

    e organizada pelo ex-Secretrio de Comrcio Mickey Kantor e que indica, entre

    outros informes, que a cidade atingiu a cifra de 40% da populao vivendo na

    misria; resultado, como indica o informe, de dcadas de lento crescimento do

    emprego e desemprego maior que a mdia nacional e com quase 30% de

    empregados recebendo menos do que necessitam para sobreviver (KANTOR,

    2013, p. 1).

  • 15

    A lista de dificuldades e melhorais pela qual necessita Los Angeles ainda

    inclui um problema crnico de comunicao urbana, motivado pelo trnsito

    excessivo que, conforme a Comisso, a cidade estadunidense com mais

    congestionamentos e a quarta no mundo e, para piorar a situao, se todos os

    projetos de melhorias do transporte pblico fossem colocados em prtica, nada

    resolveriam de efetivo.

    A educao formal segue as mesmas condies dos demais setores

    com a expectativa de que menos de 60% dos alunos completem a graduao

    superior. O documento questiona: Como podero competir em um mercado

    global em que a formao e os salrios andam juntos? (KANTOR, 2013, p. 13).

    Contudo, a Comisso enviar um estudo com indicativos prticos do que

    possvel ser feito, visto que acredita nas potencialidades da cidade e conclui

    afirmando que encaminhar os estudos para enfrentar os problemas presentes.

    Mas: O objetivo de tais medidas ser garantir que outra comisso no emita

    um relatrio, daqui 25 anos, com muitos dos mesmos problemas listados

    novamente (KANTOR, 2013, p. 19).

    3.2. Londres, o melhor lugar para crescer

    A experincia cidad em Londres (Inglaterra), iniciada em 2013 e

    publicada em julho de 2014 por David Robinson e Will Horwitz, intitula-se

    Changing London, A vision for Londons next Mayor. The best place in the world to grow up (Mudando Londres, uma viso da cidade para o prximo prefeito). Essa iniciativa recebeu cerca de 150 posts com ideias e propostas para melhorar a capital Inglesa. E o objetivo propor uma viso possvel para

    o prximo prefeito de Londres: uma cidade reorientada para nossas crianas,

    garantindo prxima gerao um conjunto de direitos (ROBINSON; HORWITZ,

    2014, p. 23).

    Os autores so taxativos em lembrar que participaram da encosta

    crianas e jovens que lamentavam a escassez de confeitarias e os custos das

    consolas de games, mas foram contundentes em exigir tambm escolas

    decentes, melhores transportes e habitao, mais o que fazer, a desigualdade

  • 16

    reduzida e mais oportunidades (ROBINSON; HORWITZ, 2014, p. 24), nada

    diferindo daquilo que os adultos indicavam como mudanas necessrias.

    3.3 Comunicao e cidade: estudos contemporneos

    Outro estudo sobre a comunicao e as cidades que merece ateno

    intitulado The scaling of human interactions with city size. Nele, os autores, indicam a importncia da relao entre o tamanho da cidade e sua vida

    socioeconmica. O estudo levantou e analisou uma enorme quantidade de

    dados annimos na rede inalmbrica de Portugal e Reino Unido, para tentar

    determinar um padro entre as redes sociais que criamos e a escala da cidade,

    e concluram que quanto maior a cidade em que se vive, maior sero as

    relaes e as ligaes.

    Assim, a cidade, enquanto locus comunicacional e interacional, tem as chances da ampliao de suas ideias e conhecimentos para seus moradores e

    frequentadores; apenas isso j seria bastante interessante em termos de

    melhoria da vida urbana atravs da comunicao.

    Contudo, pode ser interessante refletir acerca de outro conjunto de

    ideias que, no limite, complementa a proposta da participao comunitria nas

    decises sobre o espao urbano, exatamente por contrariar, ou seja,

    dialeticamente, a comunidade pode, tambm dificultar o trabalho e as relaes

    na cidade, quando o peso das decises apenas o da populao.

    O planejador urbano Reuben Duarte em seu blog, no post de 10/06/2014

    questionava o peso decisrio de todos os envolvidos e interessados no

    planejamento da cidade e, como resultado, os peritos so mais hostilizados na

    hora das negociaes, e a populao local indica que aqueles que moram h

    muito tempo na rea sabem mais das necessidades que os planejadores.

    Sem dvida, aceita o Blogger, que planejadores erram e se equivocam,

    mas as propostas leigas, geralmente, tem custo altssimo para o poder pblico

    na hora da adaptao do que foi planejado e daquilo que foi acatado das

    demandas comunitrias. A comunidade nem sempre considera as ocorrncias

    de mdio e longos prazos, o senso comum exige aplicaes e resultados

  • 17

    imediatos, no sendo assim, tem a percepo que os resultados foram

    insatisfatrios.

    Dessa forma, podemos pensar em, ao menos, duas reflexes

    importantes para a relao entre a comunicao e a cidade. A primeira delas

    diz respeito a descentralizao em escala macro, uma tendncia generalizada

    que as tecnologias de comunicao e informao facilitaram bastante o trnsito

    das ideias e conhecimentos e, sem dvida nenhuma, a socializao desses

    conhecimentos em redes sociais. O barateamento dos custos da comunicao

    e das transmisses foi um dos pilares e continua sendo da globalizao e

    tambm da descentralizao que segue.

    O outro ponto importante destacado a sabedoria das multides contra

    a tecnicidade dos peritos. Ainda que seja positiva tal situao, tambm inclui

    desvantagens tais como a impossibilidade do groupthik, ou seja, aquelas ideias fora da zona de conflito que, seguramente, dificultariam as decises, das quais,

    so exemplos, os movimentos NIMBY (Not In My Back Yard, que significa no em meu quintal), uma expresso utilizada na rea do planejamento e do

    urbanismo.

    Por fim, se o planejador ser ou no uma figura descartvel nas

    situaes futuras, isso depender de como ser a composio das foras

    polticas e sociais nos espaos especficos e como essa composio particular

    dialogar com processos mais totalizantes da globalizao na busca de

    solues; incluise a, o que ser feito com os dados e conhecimentos

    disponveis e socializados.

    3.4 De volta ao Brasil

    O Brasil, apesar de ter tido uma dcada de desenvolvimento econmico

    positivo, ainda precisa de novas leis e/ou paradigmas para o desenvolvimento

    do espao urbano para sua sociedade? Como fazer chegar a visibilidade, a

    efetividade da legislao urbanstica a quem mais precisa dela? Como produzir

    esta comunicao, que suporte miditico seria mais adequado? Mas a

    populao no est resolvendo seu problema? preciso mais recurso

    financeiro do governo? Ele est chegando a quem precisa de fato?

  • 18

    Pelos protestos de junho de 2013, verificamos que os espaos pblicos

    podem ser velozmente apropriados pela populao, pelo fenmeno da

    comunicao em massa. Em junho de 2013, ocorreram diversas manifestaes

    contguas aps o aumento anunciado de R$ 0,20 centavos na tarifa de nibus

    metropolitano So Paulo pela Prefeitura Municipal de So Paulo. A partir da,

    brasileiros de vrias partes do pas, e em outros pases tambm, protestaram,

    solidarizando-se contra com o aspecto econmico e injusto de quem pouco

    ganha para pagar e sobreviver.

    Desde 2003, e a cada binio, realizam-se sistematicamente

    Conferncias Municipais nas Cidades que queiram faz-las. A sociedade civil

    organizada se rene e debate temas relativos s prioridades, para tentar

    estabelecer polticas pblicas que possibilitem a implantao de medidas

    visando melhoria da qualidade de vida das pessoas.

    Nas Conferncias Municipais, de acordo com regras estabelecidas, so

    eleitos por segmentos da sociedade (por exemplo os Movimentos Populares,

    ONGs, Acadmicos) vrios delegados, que representaro sua cidade na

    conferncia estadual das cidades, e depois por sua vez, so eleitos dentre

    todas as cidades, os delegados que iro representar na conferncia nacional,

    seu estado federativo. Em novembro de 2013, aps um processo de

    aproximadamente seis meses, discutiram-se propostas de prioridades para o

    Ministrio das Cidades com os temas de: saneamento ambiental, mobilidade

    urbana e trnsito, capacitao e assistncia tcnica, financiamento da poltica

    urbana, participao, controle social e conselhos temticos municipais, poltica

    territorial e regularizao fundiria, habitao de interesse social e

    desenvolvimento econmico.

    Concluso

    A Cidade Rebelde, para uma usar uma expresso do gegrafo David Harvey, que despontou pelo Brasil, em 2013, e j vinha despontando em outras

    partes do mundo, coloca-se como um processo em progresso. As novas

    configuraes miditicas surgidas atravs do uso macio das mdias mveis e

    de aparatos tradicionais (cmeras, filmadoras) utilizados em conjunto com

  • 19

    distribuio em rede, trouxe para o citadino uma fora que estava em potncia

    e aflorou.

    De um pas no qual as decises tinham uma nica direo de cima

    para baixo a cidade mostrou que transformar o modus operandi das prticas sociais uma das prioridades para a construo de um espao urbano que

    atenda melhor maior parcela da sociedade brasileira; e a comunicao tem

    um papel importante para isto.

    As mdias convencionais e as alternativas, assim como as academias e

    seus grupos de investigao de fatos e fatores so chamados a

    compreenderem o que se passa e a melhor maneira de veicular os

    acontecimentos.

    Contudo, ao menos com relao s academias e seus grupos de

    investigao, a eles caberia antecipar e no apenas alardear posteriormente,

    assim teramos a comunicao sempre como projeto, tendo o global e o local

    como concretos para compreender o agora e projetar o futuro. Parodiando

    Milton Santos que aceitava o futuro como tendncia, teramos a

    comunicao como tendncia, tendo em vista que a leitura do presente est

    feita de maneira a clarificar e no clarividenciar as aes na cidade.

    Foram mostrados exemplos de como a participao da cidadania pode

    ajudar a indicar tendncias para os novos prefeitos ou mesmo para trabalhar

    em prol de toda a comunidade pensando como ser em 2020 e escolher,

    politicamente, que no queremos repetir as mesmas lamentaes de hoje

    nesse futuro to prximo.

    Ainda nessa proposta do futuro, Londres quer ser a melhor cidade do

    mundo para uma criana crescer. Nos prximos meses, assim que comear a

    campanha eleitoral na capital inglesa, saberemos como o trabalho foi

    apropriado politicamente e, em seguida, seus discursos miditicos e suas

    aes efetivas no espao.

  • 20

    Referncias

    CAIADO, Aurlio Srgio Costa. Fim da dicotomia rural-urbano? um olhar sobre os processos scio-espaciais. Revista So Paulo em perspectiva. n. 17. p. 114-124, 2003.

    CONFERNCIA NACIONAL DAS CIDADES. Disponvel em , acesso em 26/4/14.

    DUARTE, Reuben. The fall of planning expertise. Disponvel em . Acesso em 13.06.2014.

    LEFEBVRE, Henri. Espao e poltica. Trad. Margarida M. de Andrade e Srgio Martins. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

    KANTOR, Mickey (org.)LOS ANGELES 2020 COMMISSION. A time for truth. Los Angeles CA/EUA):Los Angeles City Council, 2013.

    ROBINSON, David & HORWITZ, Will. Changing London, A vision for Londons next Mayor: the best place in the world to grow up. E-book disponvel em change-london.org.uk, 2014.

    RESK, Felipe. Favela com 7 mil barracos se forma s margens do rodoanel. Disponvel em . Acesso em 26/4/2014.

    SCHLAPFER. Markus, et al. The scaling of human interactions with city size. Journal Royal Society. Interface 11: 20130789, 2014.Disponvel em http://dx.doi.org/10.1098/rsif.2013.0789. Acesso em 10.08.2014.

  • 21

    A pichao e outras inscries como canal popular de

    comunicao urbana

    Thfani Postali4 Paulo Celso da Silva5

    Resumo A cidade apresenta ao observador, vrias inscries em seu trajeto pelas ruas e avenidas. Edifcios deixam marcas na paisagem, estimulam os sentidos estticos pela exuberncia, beleza, feiura de suas formas e interpretaes. Assim tambm com a pichao, uma marca urbana contempornea incorporada por cidades em quase todo o mundo. Dessa forma, este artigo tem o objetivo de apresentar o panorama das inscries urbanas e suas especificidades. Vale-se para isso de autores como Rubem Alves, Jung Mo Sung, Luiz Beltro, Ciro Marcondes, Gustavo Lassala, no percurso terico do pensamento comunicacional e, principalmente, na teoria da folkcomunicao. Palavras Chave: Pichao; Cidade; Cultura Urbana; Folkcomunicao. Resumen La ciudad presenta a los observadores, variadas inscripciones por el trayecto hecho en calles y avenidas. Rascacielos marcan el paisaje, estimulan nuestros sentidos estticos por su exuberancia, belleza o fera, de sus formas y interpretaciones. As tambin con el grafiti, marca urbana contempornea incorporada por ciudades, en casi, todo el mundo. Este artculo tiene por objetivo presentar el panorama del grafiti sus especificidades. Sern utilizados autores como Rubem Alves, Jung Mo Sung, Luiz Beltro, Ciro Marcondes, Gustavo Lassala en el camino terico del pensamiento comunicacional y, principalmente, de la Folkcomunicacin. Palabras Clave: Grafiti, Ciudad, Cultura Urbana, Folkcomunicacin. Abstract The city presents to observers, varied entries for the ride made in streets and avenues. Skyscrapers dot the landscape, stimulate our aesthetic senses for its exuberance, beauty or ugliness, its forms and interpretations. So too with graffiti, urban contemporary brand embedded by cities, almost everyone. This article aims to present the picture of graffiti and their specificities. They will be used as Rubem Alves authors, Jung Mo Sung, Luiz Beltro, Ciro Marcondes, Gustavo Lassala in the theoretical way of thinking and communication principally of Folkcomunicacin. Keywords: Graffiti, City, Urban Culture, Folkcomunicacin. 4 Mestre em Comunicao e Cultura pela Uniso. Professora da Uniso. Pesquisadora do Grupo

    de Pesquisa MidCid. Email: [email protected] 5 Professor do PPG-Comunicao e Cultura da Uniso. Pesquisador do Grupo de Pesquisa

    MidCid. Email: [email protected]

  • 22

    Introduo

    Compreender as cidades contemporneas se tornou um desafio

    multidisciplinar, o que inclui estudos na comunicao e cultura, campo desta

    investigao. Ao longo de suas histrias, as cidades tornaram-se centros de

    elementos, formas, informaes, condies geogrficas, saturao entre outras

    qualidades que fizeram e fazem cada espao possuir caractersticas prprias.

    Este artigo tem como objetivo apresentar as inscries urbanas,

    conhecidas popularmente como pichaes e que so especficas de cada

    ambiente social. Para tanto, se respaldou em tericos como Rubem Alves,

    Jung Mo Sung, Luiz Beltro, Ciro Marcondes, Gustavo Lassala, entre outros

    que julgamos fundamentais para a construo deste pensamento. Como base

    terica para explicar o discurso popular, utilizamos a teoria da folkcomunicao

    que se trata por natureza e estrutura de um processo artesanal e horizontal,

    que pode ser entendido como o conjunto de procedimentos de intercmbio de

    informaes, ideias, opinies e atitudes dos pblicos marginalizados urbanos e

    rurais [...] (BELTRO, 1980, p. 24).

    Assim, procuramos apresentar as inscries aplicadas nos ambientes

    das cidades como comunicaes especficas que retratam contedos diversos

    e particulares de cada ambiente.

    A cultura Urbana

    em especial nos grandes centros urbanos, que podemos observar um

    maior nmero de pichaes expostas, em maioria, em locais de grande fluxo

    de pessoas, como as marginais, avenidas e demais vias principais. Todavia,

    antes de falarmos sobre o contexto contemporneo, cabe-nos refletir sobre o

    desenvolvimento das cidades industriais que tiveram um crescimento rpido e

    desenfreado, resultado do processo maior como a industrializao, que

    provocou o deslocamento dos moradores dos ambientes rurais para os

    urbanos, em busca de melhoria nas condies de vida.

    No final do sculo XIX e ao longo do XX, intensificou-se o trnsito de

    pessoas em busca das facilidades que as cidades e a urbanizao oferecem e,

    ainda, dentro da lgica do modelo de produo capitalista, a imposio das

  • 23

    ideias de crescimento contnuo e de bem estar para todos, o que na prtica se

    mostrou como acumulao e concentrao de muitos recursos, ganhos, bens

    culturais para poucas pessoas, j que, desde seus incios, o modo de produo

    capitalista acumulativo e no distributivo. E, como sistema socioeconmico,

    est baseado na produo para um mercado consumidor, na poltica

    monetria, na gesto privada da produo e tambm dos servios e na relao

    com o capital financeiro (indstria-bancos para garantir e/ou ampliar

    investimentos).

    Sendo assim, os valores criados e desenvolvidos no sistema capitalista

    favorecem uma minoria em detrimento da imensa maioria. Como apresenta

    Jung Mo Sung (2010), os desejos so apresentados como necessidades

    (comer, beber, morar, sade), o que provoca confuso j que o sentido de

    necessidade esquecido, ficando em evidncia apenas a produo de desejos

    infinitos. Com isso, o capitalismo transformou o modo de perceber o mundo, a

    ideia de trabalho resumiu-se ao ganho do dinheiro que gasto nos momentos

    de lazer. A publicidade, junto ao marketing e os meios de comunicao,

    encarregam-se de despertar desejos nos indivduos que percebem o consumo

    como necessidade.

    Imagem: Mensagem na porta de uma loja de culos localizada no Lincoln Road Mall, Miami Beach, FL, jun. de 2013. "Voc no pode comprar felicidade, mas pode comprar novos culos, que quase a mesma coisa". Foto de Thfani Postali.

  • 24

    A sociedade de consumo foi descrita por Victor Lebow (1955, p. 3) como

    uma exigncia da maneira de viver na qual sempre se deve adquirir mais e

    mais, sem o que nossa satisfao espiritual no estaria completa, um

    verdadeiro ritual de consumir, queimar, gastar, substituir, descartar velozmente

    tudo.

    Com esses valores, os indivduos buscam reconhecimento social pelo

    ter, o que os leva a imitar o desejo de consumo dos ricos consumidores dos

    pases ricos". Isso pode levar a modelo que mais prejudicaria a busca por uma

    sociedade com melhor distribuio dos recursos e mais humanidade (SUNG,

    2010, p. 13), alm da ameaa ao meio ambiente causada pela obsesso pelo

    consumo.

    Reduzir o consumo cria uma contradio e questiona as (j citadas)

    bases do sistema econmico capitalista. A resistncia pode ajudar na criao

    de outras solidariedades, a cidad por exemplo, e ainda outras liberdades e

    possibilidades auxiliadas pelas comunicaes, tais como as informaes em

    tempo (quase) real, as reinvindicaes em massa, as chamadas para

    concentraes, atitudes artsticas no espao urbano, entre tantas.

    Essas condies tm se tornado temrio das pichaes praticadas nas

    cidades. Partcipes da alienao geral na sociedade capitalista, a prtica da

    pichao oferece tambm a possibilidade de uma retomada da conscincia

    social a partir da descoberta do discurso ideolgico presente nas coisas e

    fatos.

    Para tanto, devemos esclarecer que a palavra alienante refere-se a um

    sentido de processo externo ao ser humano, ou seja, uma ideia que pertence a

    outrem e que transferida propositalmente a fim de que se torne natural

    (ALVES, 2008).

    Assim, os indivduos que percebem o processo alienante procuram

    formas para se comunicar com a massa, a fim de despertar a reflexo sobre os

    problemas que envolvem o ambiente formado por inmeros grupos sociais que

    se distinguem em etnia, grupos de associao, prticas culturais e,

    principalmente, condio econmica.

  • 25

    A comunicao popular das cidades

    O discurso capitalista traz em seu bojo a lgica do consumo irrefletido,

    ou seja, ocorre em um processo alheio conscincia das pessoas, portanto

    alienante, o que leva os indivduos a assimilar a felicidade ao consumo, no qual

    seu trabalho necessrio unicamente para o consumo e, o seu lazer como

    recompensa disso.

    Em contato com as propostas tericas da folkcomunicao verificamos

    que, mesmo nas sociedades de classes, encontramos o que Beltro traduziu

    socialmente como lderes-comunicadores (1980), aqueles que recebem,

    interpretam e retransmitem as informaes de interesse e que sensibilizem seu

    grupo social ou comunidade para as intervenes na realidade imediata. A

    ttulo de exemplo, podemos citar Silvrio de Jesus, um dos fundadores, em

    2005, do Movimento Periferia Ativa, o qual lembrado pelos companheiros

    como: um exemplo de liderana comunitria. Com simplicidade e conversa

    fcil, ele vivia o dia-a-dia da periferia, percebia os problemas do bairro e

    transformava isso em organizao. (PERIFERIA ATIVA, p. 2).

    No protesto de Julho de 2014, voltado para reivindicar melhores

    condies de sinal inalmbrico para as periferias, os diversos lderes-

    comunicadores indicaram para as operadoras de celular uma cartografia da

    qualidade do sinal nas periferias de So Paulo. A estratgia foi dividir os grupos

    e entregar as cartas, nas principais sedes, e ao mesmo tempo. Um grupo foi

    at a Anatel na Vila Mariana (Zona Sul), outro fez protesto na Avenida Giovanni

    Gronchi, local da sede da TIM, no Morumbi (Zona Oeste); outro grupo na porta

    da operadora OI na Vila Olmpia (Zona Oeste) e ainda nas sedes das

    operadoras Vivo e claro, no Itaim Bibi (Zona Sul). As reivindicaes incluam:

    mais antenas e investimentos principalmente nas periferias de So Paulo e

    regio metropolitana, barateamento de tarifas, melhor qualidade de

    atendimento para reclamaes e cancelamentos de planos (SEM-TETO

    FAZEM PROTESTOS 2014).

    Em se tratando do espao urbano, podemos considerar como veculos

    folk canais como a msica, as inscries em muros e tapumes, ambientes

    pblicos, discursos em praas e eventos, notas de dinheiro, folhetos, cartazes

  • 26

    expostos em espaos pblicos e at inscries nos interiores e exteriores de

    transportes (nibus e trens) que levam as mensagens para alm da cidade.

    De todas essas possibilidades comunicativas, vamos nos ater nas

    inscries em muros e tapumes dos centros urbanos. De acordo com Beltro,

    na cidade contempornea, incisos e desenhos acompanham as geraes

    como expresso do pensamento e dos desejos dos menos favorecidos [...]

    (1980, p. 227). Porm, no podemos nos referir s inscries apenas como

    manifestaes de grupos desfavorecidos, pois diversos grupos procuram

    exteriorizar suas ideologias utilizando a pichao.

    Lassala ressalta que a pichao a forma que deve ser considerada

    como "produto das primeiras manifestaes de expresso visual humana, visto

    que o ser humano, por meio de sua necessidade de se expressar, usou como

    primeiro suporte a parede" (2010, p. 46). As pictografias de cenas de caa,

    animais, utenslios entre outros, foram as primeiras imagens representativas da

    comunicao humana, antecedendo os cdigos ideogrficos e a linguagem

    escrita.

    De acordo com Lassala, a pichao surgiu do registro de nomes nas

    paredes, sendo praticada na cidade de Pompia - Itlia, h mais de 1.500

    anos. J as frases de protestos, de reflexo, foram uma constante na Frana,

    em meados do sculo XX, contra a opresso e a rigidez de um modelo social

    que os jovens consideravam ultrapassado. Assim, podemos considerar a

    pichao resistiva, fruto da rigidez que imperava no modelo fordista, industrial,

    assumido e reproduzido pelas sociedades capitalistas. Munidos de tinta, os

    ativistas procuravam registrar frases legveis e de fcil entendimento para a

    massa urbana, j que tratavam dos problemas sociais surgidos nas cidades em

    transformao, principalmente nos pases desenvolvidos, nos quais o modelo

    de acumulao j caminhava para a flexibilizao.

    A expresso proibido proibir, utilizada nas barricadas dos estudantes

    em Paris correu o mundo. Inclusive no Brasil, no mesmo ano de 1968, foi tema

    da letra de Caetano Veloso que dizia: E eu digo no ao no/ E eu digo/

    proibido proibir/ proibido proibir. No ano anterior, o compositor baiano tinha

    apresentado, no 3 festival da TV Record, a cano Alegria, Alegria que, em

  • 27

    ritmo da que se acentuava no Brasil, mas com leveza em suas denncias,

    destoava das palavras de ordem de outras canes de protesto da poca. A

    Coca-Cola, a banca de Revista, o jornal O Sol, as mdias, tudo indicado e

    criticado com leveza (FAVARETTO, 1996, p. 18-20). Podemos dizer que foi

    algo muito parecido com uma das propostas do grafite nos EUA, o qual

    trabalharam no nvel dos signos, sem objetivo, sem ideologia e sem

    contedo... e ataca a mdia na sua forma, isto , no seu modo de produo

    difuso (LASSALA, 2007, p. 16).

    No Brasil, os maiores registros de pichao ocorreram durante a

    ditadura militar, entre os anos de 1964 e 1985. Na ocasio, ativistas

    procuravam protestar contra o regime e expressar opinies a favor da

    democracia.

    Junto com o uso da pichao como ferramenta de protesto, surge o

    grafite nos Estados Unidos, por volta de 1970, quando afroestadunidenses,

    jamaicanos e porto-riquenhos comearam a praticar o Hip Hop, movimento que

    envolve manifestaes culturais como msica, dana, MCs, rappers, grafite,

    entre outros elementos, utilizados com o intudo de diminuir a violncia

    exercida pelas gangues dos guetos Nova Iorquinos. Assim, o grafite j surgiu

    como ferramenta de protesto e esforo para provocar a reflexo sobre os

    problemas sociais. importante esclarecer que no Brasil e alguns outros

    pases, o grafite percebido como diferente de pichao, o primeiro

    considerado arte, estando presente em diversos locais autorizados da cidade.

    Todavia, em outros territrios, considerado pichao, portanto, ilegal.

    De modo geral, as inscries so produzidas a contragosto das classes

    dominantes e procuram exprimir ideias, protestos, solues, lamentos, crtica

    politica local e/ou externa, frases religiosas, de amor ou repulsa a algum ou

    simplesmente, o registro de alguma pessoa ou grupo. Referindo-se as

    manifestaes que apresentam contedos ideolgicos, Beltro (1980, p. 227)

    sustenta que essas inscries desafiam, estimulam, excitam e incitam os

    transeuntes ao. Ou seja, se comunicam com a populao por meio de um

    meio possvel de ser utilizado por aqueles que tm o acesso aos meios de

    comunicao convencionais (rdio, televiso, revista, jornal), porm, no so

    representados por eles.

  • 28

    Para que haja maior esclarecimento sobre o nosso objeto de estudo,

    listaremos alguns conceitos de inscries urbanas e suas finalidades. De

    acordo com Lassala (2010), h pelo menos oito conceitos, que apresentaremos

    a seguir.

    O Stiker se refere a Adesivos colados em placas, hidrantes, postes,

    viadutos, portas de lojas entre outros elementos que possibilitam a fixao.

    Esse material exige que o criador tenha conhecimento de informtica e saiba

    manipular softwares grficos. Sua composio faz uso de linguagens

    publicitrias, tais como slogans, personagens, logotipos, o que torna o material

    possuidor de bastante apelo visual. Nem sempre os Stiker conseguem se

    comunicar com a maioria urbana, j que retratam smbolos e mensagens

    especficas dos grupos que os criaram. Em cidades que possuem grandes

    reas tursticas, como Miami Beach, o Stiker a inscrio mais utilizada nos

    ambientes mais bem cuidados. Isso ocorre pelo fato de ser a prtica mais

    eficaz quanto a tempo de fixao.

    Imagem: Stikers fixados em placas da Collins Av. Miami Beach, FL, jul. de 2014. Foto de Thfani Postali.

  • 29

    O Letreiro um elemento, geralmente, recomendado ou produzido pelo

    proprietrio do local, que tem como objetivo informar sobre alguma situao. O

    mais comum de se observar em vias de bastante movimento, so os recados

    de proibido estacionar, sujeito a guincho. Outras frases comuns so as de

    venda de produtos ou servios. Os letreiros normalmente so produzidos em

    muros, portas de lojas, portes de garagem e placas artesanais, portanto,

    possuem a inteno de se comunicar com a populao urbana.

    O Grafite uma manifestao contempornea, oriunda do movimento

    Hip Hop e que procura, muitas vezes, expressar crtica social. De acordo com

    Lassala (2010, p. 31) os grafiteiros tm a expectativa de trazer populao a

    desmistificao dos cones e smbolos da cultura dominante, trazendo em seu

    bojo a denncia e a crtica social.

    Em grande parte dos casos, essas inscries so realizadas em locais

    abandonados ou deteriorados, fazendo com que a imagem da manifestao

    seja mais positiva que as outras. Reconhecido hoje como arte, tambm

    possvel encontrar grafite em muros particulares e pblicos que foram

    autorizados, escolas, centros educacionais e culturais, galerias de arte, interior

    de bares, lojas e demais propriedades particulares. Essa aceitao se deu pelo

    fato de o grafite possuir maior elaborao. O grafite um elemento criado para

    a comunicao, de incio a um pblico especfico, entretanto, podemos

    observar que hoje pretende provocar a reflexo de todos.

    A Pichao, que o termo mais usual, principalmente para tratar de

    quase todos os elementos aqui apresentados, est relacionada transgresso.

    De acordo com Lassala (2010), ela no define um padro esttico em relao

    forma e contedo, portanto, a inscrio mais fcil de ser produzida.

    Geralmente se utiliza apenas uma cor de tinta.

  • 30

    Imagem: Pichao localizada na rua Sarutai, Sorocaba, So Paulo, abril de 2014. Foto de Thfani Postali.

    Cabe ressaltar que os suportes em que ela realizada, tais como muros,

    monumentos, espaos pblicos e privados, rvores e espaos internos como

    transporte pblico, banheiros e escolas no so autorizados, o que a refora

    como manifestao delinquente. Por ser de fcil produo, a forma que mais

    se diversifica quanto ao contedo, sendo produzida no s por grupos

    marginalizados, mas por outros que procuram expressar suas ideologias,

    sejam polticas ou religiosas. Recados romnticos tambm so bastante

    comuns por meio da pichao. Assim, a pichao a manifestao em que

    mais podemos encontrar comunicao com a urbe.

    Lassala diferencia os termos pichao de pixao. Para o autor, o

    segundo um tipo especifico de pichao cuja prtica torna-se mais

    caracterstica e difcil de ser realizada. Desenvolvida por grupos de So Paulo,

    a pixao possui letras que so entendveis apenas pelos grupos que a

    praticam ou conhecem. Uma de suas funes a disputa entre os grupos que

    procuram pixar locais de difcil acesso, muitas vezes, se arriscando para a

    realizao. Para o autor, a manifestao percebida como negativa, como

  • 31

    poluio urbana, especialmente porque parecem rabiscos sem lgica,

    produzidos em espaos no autorizados. Portanto, no possuem comunicao

    macia.

    O Grapixo uma fase intermediria entre pixao e o grafite, pois se

    utiliza da TAG Reta que a fonte desenvolvida pelos pixadores de So Paulo e

    de tintas e formas utilizadas pelo grafite. Assim, so produzidas com contornos,

    sombreamentos e preenchimento com cores vivas. Esse conceito tambm se

    relaciona com o grafite quanto a sua aceitao, pois por ser mais elaborado,

    muitas vezes produzido em locais autorizados e em conjunto com grafiteiros.

    Devido a sua relao com o grafite, pode tambm possuir interesse em se

    comunicar.

    Bomb outra tcnica possvel de ser vista nos ambientes urbanos.

    Desenvolvida nos Estados Unidos, durante a segunda metade do sculo XX,

    tambm se relaciona com as produes de grafite e pichao, entretanto, est

    mais prxima da pixao, pois praticada geralmente em suportes no

    autorizados. De acordo com Lassala (2010), se assemelha com o grafite, j

    que possui formas arredondadas com contornos, preenchimento e traos para

    simular volume, com o uso de duas ou mais cores. A tcnica bomb no possui

    comunicao direta com a populao, j que seu intuito marcar territrio de

    gangues ou indivduos separados.

    Outra manifestao que tem ganhado visibilidade nos grandes centros

    urbanos o Estncil, que uma tcnica que reproduz imagens com o apoio de

    uma matriz de impresso. Com o uso de tinta spray, o suporte permite registrar

    uma mesma imagem ou frase por diversas vezes. Essa prtica carrega

    comunicao direta, pois possui contedos ideolgicos. Na cidade de So

    Paulo, possvel observar diversas manifestaes de grupos ativistas como os

    vegetarianos; j em Montevideo UY, podemos observar movimentos a favor da

    unio entre pessoas do mesmo sexo, sistema educacional, entre outros.

  • 32

    Imagem: Parede com Estncil localizada no centro de Montevideo, UY, mai. de 2011. Foto: Thfani Postali.

    Por fim, existe a miscelnea que a mescla das prticas apresentadas.

    Isso tem se tornado cada vez mais comum nos grandes centros urbanos. A

    mistura realizada por diferentes interventores (de letreiros, stikers, grafite,

    pichao, bomb, pixao entre outros), faz o suporte confuso e que atrapalha a

    comunicao.

    Percebemos, ento, que existem inmeras formas de inscries

    praticadas nos grandes centros urbanos, sejam prticas que visam comunicar

    com a populao em geral, ou que tm como funo comunicar

    especificamente com o grupo social. Alguns exemplos que podemos tratar

    como comunicao mais geral so as frases pichadas ou realizadas com uso

    de estncil, que apresentam a frase bastante comum sorria, voc est sendo

    manipulado se referindo ao universo televisivo.

    Outras inscries que podemos observar com frequncia so as

    pichaes, os grapixos e uso de estncil que fazem apelo ao amor. Um

    movimento que teve bastante repercusso foi o do artista plstico paulistano

    Ygor Marotta, que, em 2009, comeou a registrar tags nos orelhes pblicos de

  • 33

    So Paulo, com a frase mais amor, por favor. O movimento teve repercusso

    em diversas regies do Brasil, sendo posteriormente aplicado em pichaes,

    cartazes, stikers e outras formas de inscrio urbana. Tambm possvel

    observar registros que chamam a ateno para a preservao do meio

    ambiente. Na cidade de Sorocaba, interior de So Paulo, possvel observar

    na Avenida Santa Cruz, a frase em Grapixo Salve a Natureza, em um muro

    de obras realizadas por uma grande construtora.

    Isso leva a crer que as inscries urbanas continuam sendo eficazes

    veculos de comunicao entre grupos e a massa. Logo, as mudanas sociais

    propiciam novas formas de produzir contedos.

    Consideraes finais

    Como pudemos observar, nem todas as inscries possuem

    compromisso direto com a comunicao ideolgica. Dos oito conceitos

    apresentados, possvel identificar que apenas o Grafite, a Pichao, o

    Grapixo e o Estncil podem ter a finalidade de comunicar diretamente com o

    grosso da populao. Esses elementos culturais so compostos por frases e

    imagens, ou ambos que, segundo Beltro (1980), cumprem o papel da

    comunicao, pois carregam as quatro funes principais da comunicao:

    informar, opinar, fornecer elementos da educao e divertir (227). Iniciamos

    este artigo apresentando o discurso dominante das cidades industrializadas,

    pois em muitas inscries urbanas, podemos identificar contedos que

    resistem a esse discurso. Os agentes-comunicacionais ou lderes-

    comunicadores como coloca Beltro (1980), so indivduos que apontam que,

    nem sempre a comunicao provoca a alienao total das pessoas, j que o

    receptor recebe a informao a partir de seu repertrio cultural, ou seja, de

    acordo com o seu grupo ou classe social, etnia, educao e contatos que teve

    ao longo de sua vida. Deste modo, a teoria da folkcomunicao aponta e

    existncia de indivduos que so capazes de captar a comunicao a partir de

    outras vivncias, sentindo-se responsveis por despertar as pessoas dos

    discursos dominantes. Cabe ressaltar que nem sempre esses contedos so

    positivos. Temos ideia de que o lder-comunicador, por ser livre para produzir o

    contedo, apresenta aquilo que de seu interesse ou de seu grupo.

  • 34

    Todavia, possvel perceber uma concentrao de inscries urbanas

    que procuram apresentar as condies de alienao, preservao ao meio

    ambiente, o apelo ao amor, situaes comuns da vida coletiva. Portanto, talvez

    possamos considerar que as inscries urbanas sejam os veculos de

    comunicao mais eficazes, quando grupos diversos pretendem alcanar a

    urbe.

    Referncias

    ALVES, Rubem. O que religio? So Paulo: Brasiliense, 2008. BELTRO, Luiz. Folkcomunicao: a comunicao dos marginalizados. So Paulo: Cortez, 1980.

    MARCONDES Filho, Ciro. Ideologia. So Paulo: Global, 1994. LASSALA, GUSTAVO. Pichao no pixao. Introduo anlise de expresses grficas urbanas. So Paulo: Altamira Editorial, 2010.

    LASSALA, GUSTAVO. Os tipos grficos da pichao: desdobramentos visuais. Dissertao de Mestrado apresentado na Universidade Presbiteriana Mackenzie, Mestrado em Educao, Arte e Histria da Cultura, 2007.

    LEBOW, Victor. Price competition in 1955. Disponvel em Acesso em 10. jul. 2014.

    PERIFERIA ATIVA, Comunidades em Luta. QUEM FOI SILVRIO DE JESUS?. Coluna Histrias da quebrada, EDIO 1, maio de 2013. Disponvel tambm em www.periferiaativa.org. Acesso em 20 jun. 2014.

    SEM TETO FAZEM PROTESTO CONTRA M QUALIDADE DAS OPERADORAS DE CELULAR. Disponvel em Acesso em 1 jul. 2014.

    SUNG, Jung Mo. Desejo, mercado e religio. 4 ed. So Paulo: Fonte Editorial, 2010.

    YGOR MAROTTA. Disponvel em: . Acesso em 07 jul. 2014.

  • 35

    Cidades conectadas: estudos contemporneos

    Osmar Siqueira6 Wilton Garcia7

    Resumo O presente texto trata das relaes entre a cultura emergente nos espaos digitais e o varejo eletrnico. A reflexo visa a estimular um pensar sobre processos de transformao na forma de consumo de bens e servios que a sociedade contempornea atravessa. Sendo assim, o texto aborda alguns pontos que caracterizam e diferenciam o consumo em lojas virtuais do consumo nos espaos fsicos das cidades, a partir dos estudos contemporneos. Palavras-chave: Varejo eletrnico. Cidade. Estudos Contemporneos. Rede social. Consumo.

    Resumen Este texto se ocupa de las relaciones entre la cultura emergente en los espacios digitales y el comercio minorista. La reflexin tiene como objetivo estimular la reflexin sobre los procesos de transformacin en la forma de consumo de bienes y servicios que la sociedad contempornea est experimentando. De este modo, el texto se analizan algunos puntos que caracterizan y diferencian a consumo en el consumo de las tiendas virtuales en los espacios fsicos de las ciudades, de los estudios contemporneos. Palabras clave: Electronic Retail. City. Estudios Contemporneos. Red social. Consumo

    Abstract This text deals with the relationships between the emerging culture in the digital spaces and retailing. The reflection aims to stimulate thinking on transformation processes in the form of consumption of goods and services that contemporary society is experiencing. Thus, the text discusses some points that characterize and differentiate consumption in virtual shops consumption in physical spaces of cities, from contemporary studies. Keywords: Electronic Retail. City. Contemporary Studies. Social network. Consumption. 6 Graduado em Sistemas de Informao (2005), ps-graduado em Gesto Estratgica de

    Negcios (2007) e mestrado do Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Cultura pela Universidade de Sorocaba. Pesquisador do Grupo de Pesquisa MidCid. Atua como Assessor de Relaes Nacionais e Internacionais da Universidade de Sorocaba. http://superpanoptico.wordpress.com Email: [email protected]

    7 Artista visual. Professor do PPG-Comunicao e Cultura da Uniso. Pesquisador do Grupo de Pesquisa MidCid. Autor do livro Feito aos poucos_anotaes de blog (2013), entre outros. Email: [email protected]

  • 36

    No es una metfora potica

    decir que la inteligencia artificial que est a su servicio

    soborna y sensualize a nuestros rganos pensantes

    (VARGASLLOSA, 2013, p. 210)

    Aps o perodo da histria no qual o homem comercializou suas

    mercadorias atravs do escambo, surgiu a moeda e a mercadoria se tornou

    independente da fora de trabalho, ou seja, passou a ter valor de acordo com a

    lei da oferta e da procura. A partir desse momento surgiram os

    estabelecimentos comerciais, popularmente conhecidos como loja.

    Tais estabelecimentos podem ser encontrados em ruas ou em centros

    comerciais, conhecidos no Brasil como shopping centers. Lojas de shopping centers ou localizadas prximas s ruas de maior movimento so os principais locais, nos quais produtos divulgados pelos meios de comunicao so

    expostos nas vitrines, em forma de mercadorias ressemantizadas. Isto , com

    significados que no so o seu original.

    O conceito contemporneo de loja tambm deve contemplar a

    alternativa virtual, ou seja, a loja virtual. Trata-se de uma pgina na internet, um

    website, com um programa de computador composto por uma sequncia de instrues interpretadas e executadas por um processador que gerencia

    pedidos (carrinho de compras). Um nmero crescente de empresas oferecem

    bens e/ou servios em lojas virtuais, sendo que a transao deve ocorrer

    integralmente pela internet desde a escolha da mercadoria at o pagamento.

    Por isso, surgem algumas questes:

    x Elementos facilitadores do processo de compra on-line e a exposio a contedos publicitrios na internet, particularmente nas redes sociais, podem potencializar o desejo de usurios-interatores pelo consumo?

    x Lojas virtuais podem substituir determinados segmentos de lojas fsicas por completo?

    x Quais so as possveis consequncias dessa mudana na forma de consumir, para a sociedade?

  • 37

    Pode-se acessar lojas virtuais de qualquer lugar, por meio de aparelhos

    eletrnicos portteis com acesso a internet; buscar uma determinada

    mercadoria e finalizar uma compra digitalmente, sem que haja qualquer contato

    com a mercadoria no-presente. Essa seria uma noo de cidades conectadas.

    Lvy (1996, p. 21) afirma que quando uma pessoa, uma coletividade, um ato,

    uma informao se virtualizam, eles se tornam no-presentes, se

    desterritorializam. A conexo, aqui, realiza a aproximao virtual.

    E essa desterritorializao pode ocorrer em sistemas de comrcio

    eletrnico, ao viabilizar a comunicao entre cliente e negociador, via

    aplicaes de conversao em tempo real, e-mail ou telefone, contexto que indica uma relao social e tecnolgica da cincia. Em alguns casos, a

    informao (CASTELLS, 2000), que chega at o usurio-interator, por exemplo,

    origina-se de programas que simulam o raciocnio de um profissional

    especializado na rea relacionada ao comrcio em questo.

    O varejo eletrnico introduz novas caractersticas a uma forma de

    comrcio que teve incio h mais de dois sculos. Entre as novas

    caractersticas pode-se mencionar a possibilidade do usurio-interator

    visualizar a mercadoria na tela de dispositivos eletrnicos que acessam a

    internet. A internet, por sua vez, deve ser vista/lida como a tecnologia que

    tornou possvel introduzir tais inovaes ao segmento de conectividade.

    Essas novas caractersticas do varejo eletrnico tornaram a funo

    vendedor desnecessria. No varejo eletrnico, o prprio consumidor faz o

    pedido da mercadoria, que entregue, diretamente, na sua residncia. Como

    observa Lvy (1996, p. 62) esse novo meio coloca em risco classes de

    profissionais. Comerciantes podem passar a ser vistos como intermedirios

    parasitas da informao ou da transao, passando a ter seus papis habituais

    ameaados. A funo dos correios e as transportadoras, assim, continua sendo

    de suma importncia para ambos os meios de comrcio. Tanto a venda direta

    quanto o varejo eletrnico tm os correios e transportadoras como meios para

    o transporte de mercadorias. A funo dos correios e transportadoras continua

    sendo de suma importncia para ambos os meios de comrcio.

  • 38

    O comrcio e a distribuio fazem viajar signos e coisas. Os meios de comunicao eletrnicos e digitais no substituram o transporte fsico, muito pelo contrrio: comunicao e transporte, como j sublinhamos, fazem parte da mesma onda de virtualizao geral (LVY, 1996, p. 51).

    A partir das leituras de estudos contemporneos (BAUMAN, 2013, 2008; CANCLINI, 2008; EACLETON, 2012; VARGAS-LLOSA, 2013), a forma de

    comunicao de lojas virtuais apresenta caractersticas distintas das vendas

    diretas e de lojas fsicas. Mercadorias do comrcio eletrnico no so dispostas

    em prateiras de corredores por onde consumidores possam caminhar, observar

    e, se necessrio, testar antes de comprar, como acontece em uma loja fsica.

    De maneira similar s vendas diretas, mercadorias de lojas virtuais so

    dispostas na tela de maneira intuitiva, por meio de um ndice digital. Em menus

    de lojas virtuais, porm, cada item pode levar a subitens, o que pode acelerar a

    busca por mercadorias. Tambm possvel buscar um produto no computador,

    de maneira similar solicitao de auxlio de um vendedor em loja fsica, ao

    encontrar dificuldade para localizar determinado item.

    Em lojas virtuais, ao localizar a mercadoria, algumas lojas apresentam

    descrio detalhada e podem usar recursos de texto, imagem e vdeo. Em

    alguns casos a descrio do produto minuciosa, imagens apresentam riqueza

    de detalhes e vdeos acrescentam outras caractersticas. A informao

    fornecida por lojas virtuais deve suprir a inexistncia de vendedores. Mesmo

    nos casos de empresas que descrevem as caractersticas de suas mercadorias

    de maneira clara, importante que seja oferecido um mecanismo eficiente de

    comunicao, como por exemplo, contato via chat e/ou telefone.

    Apesar do crescente nmero de lojas virtuais e adeptos ao comrcio

    eletrnico, a cultura contempornea do consumo excessivo, ainda, tem seu

    maior pblico no comrcio fsico. A questo comunicacional uma barreira na

    conquista de novos adeptos. Algumas lojas com menos recursos tecnolgico

    e humano no interagem com o seu pblico de maneira satisfatria, fato que

    pode ser agravado em casos que a mercadoria, por exemplo, no entregue

    no prazo determinado ou apresenta algum defeito. Lojas virtuais que recebem

    reclamaes recorrentes e contnuas entram na lista de lojas no

    recomendadas pela Fundao de Proteo e Defesa do Consumidor.

  • 39

    O segmento de comrcio eletrnico tambm apresenta deficincias na

    sua regulamentao, mas tem mostrado melhoras na proteo ao consumidor.

    Algumas caractersticas intrnsecas ao segmento passaram a ser lei no Estado

    de So Paulo no ano de 2009. E, no Brasil, por meio do Cdigo Brasileiro de

    Defesa do Consumidor no ano de 2013, De acordo com a Lei N 8.078, de 11

    de setembro de 1990.

    Com objetivos diferentes, muitas empresas esto migrando parte de

    seus esforos para as lojas virtuais, seja para iniciar um negcio, continuar no

    mercado, manter ou ampliar os lucros. Notadamente, cresce o nmero de

    empreendedores do varejo eletrnico. De acordo com Keen (2012, p. 39):

    A empresa de comrcio eletrnico social Groupon, cuja base de 35 milhes de assinantes e cujo faturamento anual em torno de US$2 bilhes, so responsveis pelo fato de a empresa ser aquela com crescimento mais rpido na historia dos Estados Unidos da Amrica.

    Algumas das vantagens de vender pela internet so os baixos custos de

    entrada, de manuteno, necessidade de um nmero menor de colaboradores

    para atingir o mesmo pblico de uma loja fsica, entre outras.

    Da mesma forma que existem lojas fsicas de diferentes tamanhos, no

    comrcio eletrnico o mesmo tambm verdade. possvel abrir uma loja

    virtual sem gastar nada, usando plataformas de comrcio eletrnico de cdigo

    aberto8, ou optar pelo desenvolvimento de lojas virtuais atravs de empresas

    especializadas. Lojas virtuais tm custo inferior s lojas fsicas com

    manuteno, pois no h aluguel, manuteno do prdio, no h custo com

    vendedores, pessoal de limpeza. O custo com consumo de gua, energia,

    telefone, tambm, inferior.

    Esses dados mostram que apesar do faturamento do comrcio

    eletrnico ser inferior ao faturamento do comrcio fsico, o percentual de

    crescimento das vendas em lojas virtuais bastante superior. O crescimento

    do faturamento do comrcio eletrnico tem aumentado medida que a

    comunicao via internet chega a um nmero crescente de indivduos.

    8 A expresso cdigo aberto, ou open source em ingls, foi criada pela OSI (Open Source

    Initiative) e refere-se a software tambm conhecido por software livre.

  • 40

    Alm do acesso internet, dispositivos mveis como smartphones e tablets digitais9, que podem ter preos menores que notenooks, tornam-se mais acessveis s classes mais baixas. Com o acesso rede de internet e um

    smartphone, possvel acessar lojas virtuais e consumir.

    O crescimento do comrcio eletrnico implica em consequncias

    socioeconmico-culturais que no so evidentes. Apesar da aparente euforia

    relacionada ao crescimento do faturamento do comrcio eletrnico no Brasil, as

    consequncias para a sociedade podem significar uma contribuio para o

    aumento da desigualdade social. Por trs do otimismo comunitarista dos

    utilitaristas digitais est uma verdade vertiginosa e socialmente fragmentada do

    sculo XX. uma verdade ps-industrial, a comunidade cada vez mais fraca e

    o exagerado individualismo de supernodes e superconectores (KEEN, 2012, p. 129).

    A possibilidade de interao propiciada pela internet permite que o

    comrcio seja mediado eletronicamente, e as redes sociais so meios

    importantes de comunicao com pblicos em potencial. O nmero de

    usurios-interatores que fazem parte e continuam aderindo aos websites de redes sociais grande, e o tempo de permanncia on-line tambm tem aumentado. Como quem divulga, o faz para um determinado pblico, redes

    sociais on-line tornaram-se interessantes para empresrios, pois dados de usurios-interatores transformam-se em informao valiosa para o mercado

    publicitrio.

    O problema que nossa cultura on-line onipresente do grtis significa que toda empresa de mdia social do Facebook ao Twitter, passando por servios de geolocalizao como Foursquare, Hitlist e Plancast dependem exclusivamente de publicidade para faturar (KEEN, 2012, p. 88).

    A prtica de investigar informaes pessoais atravs de programas, sem

    autorizao do usurio-interator, conhecida como spyware, se assemelha aos adwares na sua forma de infeco e desinstalao e, frequentemente, recebe crticas relacionadas invaso de privacidade.

    9 Tablet digital um dispositivo pessoal em formato de prancheta que pode ser usado para

    acesso internet, organizao pessoal, visualizao de fotos, vdeos, leitura de livros, jornais e revistas e para entretenimento com jogos. Apresenta uma tela sensvel ao toque.

  • 41

    Em uma traduo literal, spyware significa aplicativo ou programa espio. So tantas as inseguranas da Rede que j se est pedindo a criao

    do defensor do internauta (CANCLINI, 2005, p. 29).

    Enquanto isso, os novos meios geram desafios para os quais a maioria dos cidados no foi treinada: como usar o software livre ou proteger a privacidade no mundo digital, o que fazer para que as brechas no acesso no agravem as desigualdades histricas entre naes ou etnias, campo e cidade, nveis econmicos e educacionais? (CANCLINI, 2008, p. 30)

    O advento da internet mudou muitos aspectos da sociedade global,

    como a comunicao, que tem implicaes nos relacionamentos humanos, na

    questo da privacidade e no consumo. No caso do consumo, as mudanas

    causadas pela internet como os negcios so conduzidos tm um impacto

    direto na forma como consumidores adquirem seus bens e servios. A era do

    acesso virtual alterou e continua alterando a comunicao e interferindo nas

    culturas, de maneiras positivas e negativas.

    A tecnologia aproximou a distncia entre oferta e demanda, pois

    consumidores podem encontrar produtos dentro da regio onde vivem ou em

    locais muito distantes. Conceito similar ao sistema de venda direta ou venda

    por catlogo, que tem os correios e distribuidoras como imprescindveis no

    processo. Entre as principais diferenas de ambos os segmentos de comrcio,

    est o fato de o vendedor ser desnecessrio no comrcio eletrnico.

    Com muita rapidez, a internet deixou de ser apenas uma opo entre

    muitas, para se tornar o endereo default de um nmero crescente de homens e mulheres de todas as idades. Bauman (2008) observa que o nmero de

    pessoas com acesso internet se espalha velocidade de uma infeco

    virulenta ao extremo. Essa infeco causada por bits e bytes deve continuar colonizando a rede com pginas de diversos segmentos de lojas virtuais,

    inflamando ainda mais a deciso de usurios-interatores, pela escolha entre

    comprar em lojas virtuais ou fsicas.

    Em determinados segmentos do comrcio, ainda que o mundo virtual

    coloque os consumidores em contato com uma gama infindvel de lojas

    virtuais, a presena de uma loja fsica continua sendo vista como porto seguro.

  • 42

    Para determinados usurios-interatores lojas virtuais que tambm

    possuem lojas fsicas so como amortecedor, caso a venda pela internet no

    ocorra conforme o esperado. E a importncia das lojas fsicas ainda depende

    do que est sendo comercializado, mas esse cenrio deve continuar mudando

    medida que emergirem novas tecnologias, como, por exemplo, a utilizao da

    realidade aumentada. A tecnologia possibilita que o indivduo vivencie uma

    experincia de imerso, tendo sensaes reais de pertencer ou interagir com

    elementos que s h virtualmente, e ser usada para vendas em lojas virtuais.

    O novo ambiente econmico do varejo eletrnico, da publicidade on-line, da sociedade em rede digital muito mais favorvel aos fornecedores de espaos, aos arquitetos de comunidades virtuais, aos vendedores de

    instrumentos de transao e de navegao, que aos clssicos difusores de

    contedos.

    difcil ponderar acerca das consequncias positivas e negativas desta

    realidade, em que a vida social mediada eletronicamente e o consumo por

    intermdio de lojas virtuais aumenta a cada dia. Algumas possveis

    consequncias positivas dessa mudana na forma de consumir so a reduo

    do custo de bens e servios e o aumento no nmero de empreendedores, caso

    seja possvel competir com grandes empresas do ramo.

    A consequncia negativa pode ser a diminuio do nmero de vagas de

    trabalho, pois de acordo com pesquisa do Instituto de Pesquisa Econmica

    Aplicada, das quase 5 mil empresas comerciais que vendem pela internet,

    cerca de mil tem menos de 20 empregados. O nmero de colaboradores

    necessrios para manter uma loja virtual parece ser inferior ao nmero de

    funcionrios necessrios para manter uma loja fsica.

    Apesar disso, o movimento observado entre os empresrios,

    consumidores e usurios-interatores parece ser de migrao para o virtual,

    tendncia que no deve ser revertida no futuro, uma vez que os gastos de

    investimento e manuteno do varejo eletrnico so, sensivelmente, menores.

    Nos anos vindouros devem surgir, de maneira exponencial, comrcios apenas

    virtuais altamente especializados.

  • 43

    Conforme exemplifica Bauman (2008), na Coreia do Sul grande poro

    da vida social j , como parte da rotina, mediada eletronicamente; ou melhor,

    a vida social dos sul-coreanos j se transformou em vida eletrnica ou no que Bauman (2008) chama de cibervida, e a maior parte dela se passa na

    companhia de um computador, um iPad ou um celular. Na Coreia do Sul, levar uma vida social eletronicamente mediada no mais uma opo, mas uma

    necessidade do tipo pegar ou largar.

    Conforme relata Lvy (1996), o mercado on-line no conhece distncias geogrficas. Computadores com acesso internet esto, em princpio,

    igualmente prximos uns dos outros para o comprador potencial, alm desse

    tipo de mercado ser mais transparente que o mercado clssico. Ainda segundo

    Lvy, essa transparncia deveria beneficiar os consumidores, os pequenos

    produtores e acelerar a desterritorializao ou virtualizao da economia. Alm

    desta desterritorializao, o crescimento acelerado do segmento pode causar a

    desmaterializao do mercado clssico.

    Assim, a sociedade contempornea incorporou o consumo exagerado e

    a exposio da vida pessoal como parte da cultura. Usurios-interatores agora

    esto em exposio permanente, somos apenas imagens de ns mesmos

    neste mundo novo transparente. Como paradoxo, a irrealidade absoluta seria

    uma possvel presena real e, como seres humanos, mesmo se assim

    desejarmos no temos mais direito privacidade e solido. A progresso

    para uma sociedade mais pblica parece inevitvel.

    Nessa mesma linha da exposio permanente tambm est a

    publicidade on-line. Afinal, quanto maior o tempo gasto na internet, maior o contato com a publicidade e, provavelmente, maior ser o desejo pela

    aquisio de mercadorias e servios. Se a sociedade consume mais tendo o

    melhor preo e a facilidade de comprar sem sair de casa, a problemtica sobre

    o meio ambiente torna-se maior, especialmente para as prximas geraes. As

    tecnologias digitais emergentes tm um papel fundamental para o sistema

    econmico globalizado, pois delas depende a parcela economicamente ativa

    da populao.

  • 44

    Para uma parcela da sociedade contempornea, muitas atividades so

    organizadas em rede, ao invs de em estruturas verticais. O que faz a

    diferena so as tecnologias de rede. Existem diversos tipos de rede, mas a

    conexo entre todas elas sejam os mercados financeiros, a poltica, a cultura,

    a mdia, as comunicaes, etc. , nova por causa das tecnologias digitais

    emergentes.

    No modelo contemporneo de rede digital, muitas indstrias distriburam

    a produo e o investimento por todo o planeta, em busca dos lucros mais

    imediatos. Uma parte da produo industrial passou a contar com a mo de

    obra de regies com baixos salrios, talvez os mais baixos do mundo. As

    tecnologias digitais emergentes tambm podem passar a ser usadas para

    comercializar mercadorias dos locais onde so produzidas para qualquer lugar

    do mundo. A eventual substituio do comrcio fsico pelo varejo eletrnico

    tambm pode contribuir, assim como ocorre com a produo industrial

    automatizada, que usada mo de obra barata, com o aumento do desemprego.

    Responder s perguntas listadas na problematizao deste estudo no

    cabe nas suas pretenses limitadas, pois tratam de temas complexos da

    contemporaneidade. O fato que a internet est mudando a maneira como um

    nmero crescente de pessoas se comunicam e consomem (LEMOS, 2004).

    So muitos os fatores que levam a essas mudanas, tais como a ampliao do

    nmero de pessoas com acesso rede, o incremento no nmero de lojas

    virtuais, o aumento do tempo que pessoas passam conectadas internet.

    Preos competitivos, comodidade e confiabilidade esto tambm diretamente

    ligados ao aumento no nmero de usurios-interatores que consomem no

    varejo eletrnico.

    Mas pode ser, tambm, que esse fenmeno da comunicao, via

    internet, seja usado para transformar o mundo em um lugar melhor, para um

    nmero crescente de pessoas, pois uma ferramenta de comunicao de

    grande potencial, que pode ser usada pelo povo e para o povo. As cidades

    conectadas legitimam esse tipo de ao, que transversaliza o cotidiano

    tecnolgico. Cada vez mais, assistimos variedade de aes possveis e

    inimaginveis sobre esse tipo de debate, em que a cidade, a tecnologia e o

    consumo entrelaam os caminhos.

  • 45

    Consideraes finais

    Em sntese, realizamos um ensaio reflexivo sobre comunicao, cultura

    e consumo da sociedade contempornea. De um tempo para c, no

    saberamos precisar o incio, ao acessar os websites mais comentados do momento, comunicar com amigos, conhecidos e/ou desconhecidos da internet,

    assim como comprar uma quantidade crescente de mercadorias em lojas

    virtuais nacionais e estrangeiras. As cidades conectadas potencializam esse

    viver tecnolgico experimentado pelas facilidades do mundo virtual.

    Essas so questes instigantes a respeito do que pode vir a ser

    sociedade do futuro. Sabendo-se que, o futuro no algo determinado, e sim

    uma pgina em branco na qual a sociedade escreve a histria com decises e

    omisses que em algum momento sejam elas boas ou ruins impactam a

    parcela da populao, que faz parte do sistema contemporneo.

    Referncia

    BAUMAN, Zygmunt. Danos colaterais. Rio de Janeiro: Zahar, 2013. ______. Vida para consumo: a transformao das pessoas em mercadoria. Rio de Janeiro: Zahar. 2008.

    CANCLINI, Nstor Garca. Leitores, espectadores e internautas. So Paulo: Iluminuras, 2008.

    CASTELLS, M. A sociedade em rede: a era da informao: economia, sociedade e cultura. So Paulo: Paz e Terra, 2000.

    EACLETON, Terry. Marx estava certo. Bonsucesso-SP: Nova Fronteira, 2012. KEEN, Andrew. Vertigem digital: por que as redes sociais esto nos dividindo, diminuindo e desorientando. Rio de Janeiro: Zahar, 2012.

    LEMOS, A. Cibercultura: tecnologia e vida social na cultura contempornea. 2. ed. Porto Alegre: Sulina, 2004.

    LVY, Pierre. Cibercultura. So Paulo: Editora 34. 1999. ______. O que o virtual? So Paulo: Editora 34, 1996. SPYER, Juliano. Para entender a internet: noes, prticas e desafios da comunicao em rede. No zero, 2009. Disponvel em: . Acesso em: 20 jun. 2013.

    VARGAS-LLOSA, Mario. A civilizao do espetculo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

  • 46

    Cidade digital: imagens de Sorocaba

    no aplicativo Instagram Daniela Ferreira Lima de Paula10

    Fabio Ramos Melo11 Mauro Maia Laruccia12

    Resumo Este trabalho prope um olhar crtico acerca de comunicao e imagem a partir do aplicativo Instagram ao se debruar sobre as imagens compartilhadas com a hashtag Sorocaba. Reflete-se sobre as paisagens digitais criadas pelo usurio-interator inserido na sociedade hipermiditica. As reflexes apontadas neste trabalho no buscam encerrar o tema, mas apontar desfechos intrigantes ao relacionar imagem, cidade, cultura digital e participao. Palavras-chave: Comunicao. Cultura Digital. Instagram. Sorocaba. Resumen Este trabajo propone una mirada crtica sobre la comunicacin y la imagen desde la aplicacin Instagram para estudiar las imgenes compartidas con el hashtag Sorocaba. Se refleja en los paisajes digitales creados por el usuario-interactor insertada en la sociedad hipermedia. Las consideraciones expuestas en el presente documento no busca contener el tema, pero apuntando resultados interesantes relacionados con la imagen, la ciudad, la cultura y la participacin digital. Palabras clave: Comunicacin. La cultura digital. Instagram. Sorocaba Abstract This paper proposes a critical look about communication and image from the Instagram app to look into the shared images with the hashtag Sorocaba. It reflects about digital landscapes created by the user-interactor inserted in hypermediatic society. The considerations outlined in this paper do not seek to enclose the subject, but pointing intricate outcomes relate to the picture, city, digital culture and participation. Keywords: Communication. Digital culture. Instagram. Sorocaba.

    10 Mestranda em Comunicao e Cultura pela Universidade de Sorocaba Uniso. Graduada

    em Administrao de Empresas pela ESAMC. Fotgrafa. E-mail: daniellasilva2112@gmail. 11 Mestrando em Comunicao e Cultura pela Universidade de Sorocaba Uniso. Ps

    Graduado em comunicao com o mercado pela ESPM. Graduado em Propaganda e Marketing pela Esamc. E-mail: [email protected]

    12 Doutor em Comunicao e Semitica pela Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, Professor do Programa de Ps-Graduao em Comunicao e Cultura da Universidade de Sorocaba. E-mail: [email protected]

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    Introduo

    Este texto nasce dos encontros e reflexes realizados no grupo de

    pesquisa Mdia, Cidade e Prticas Socioculturais (MidCid) do programa de

    mestrado em Comunicao e Cultura da Uniso. A inteno articular as

    discusses provenientes do grupo s pesquisas desenvolvidas pelos autores.

    Para tanto, optamos por lanar um olhar sobre as imagens produzidas e

    compartilhadas na mdia social a partir do aplicativo Instagram, e vinculadas a

    hashtag (#) Sorocaba. Tambm, verificar quais contedos imagticos so

    veiculados pelos usurios-interatores da cidade.

    As tecnologias integradas aos espaos de nosso dia-a-dia proporcionam

    uma visualidade na vida das cidades, expressada tanto pelos registros

    imagticos como pelos rastros geolocalizados na rede. A ideia seria justapor

    essas imagens, ao aproximarmos fenmenos culturais nas marcaes

    localizadoras de presena nos ambientes online. Assim, criar e registrar experincias nos espaos urbanos. A fotografia, neste espao, pode ser

    entendida como consumo de informao sem experincia (SONTAG, 2004),

    alm de emergir traos visuais dos espaos cotidianos de representao da

    subjetividade e da experincia nas cidades.

    Os dispositivos em rede de localizao espacial, como o Instagram,

    alm de indicarem o onde estou ou o que fao aqui, representam, ainda que

    de natureza diversa, a promoo de lugares e experincias conectada com o

    atual do fluxo de dados e inf