dto personalidade

29
Trabalho realizado por :

Upload: joana-catarino

Post on 24-Dec-2015

11 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

teoria geral direito civil

TRANSCRIPT

Page 1: Dto Personalidade

Trabalho realizado por :Ana Rita Fidalgo nº 985

Sandra Pereira nº 983

Page 2: Dto Personalidade

Indíce

TemasPáginas

I Introdução 3

II Noção e Características dos Direitos de Personalidade 4

III Limites dos Direitos de Personalidade 6

IV Críticas aos Direitos de Personalidade 7

V Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada 8

VI O Interesse na Privacidade e no interesse da sua Tutela 9

VII Conteúdo do Direito à Reserva da Intimidade da Vida Privada 10

VIII Figuras Afins do Direito à Reserva da Intimidade da Vida Privada 12

IX Titularidade do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada 13

X Regime de Protecção da Intimidade da Vida Privada 14

XI Outros Casos de Conflito 17

XII Consequências da violação do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada 18

XIII Conclusão 19

XIV Bibliografia 20

2

Page 3: Dto Personalidade

I Introdução

Este trabalho realizado no âmbito da disciplina de Teoria Geral do Direito Civil I incide sobre uma temática cada vez mais actual – a dos Direitos de Personalidade. Dentro do vasto e complexo conjunto dos Direitos de Personalidade resolvemos debruçarmo-nos mais especificamente sobre o Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada.

Para introduzir este tema vamos abordar o mundo dos Direitos da Personalidade na sua generalidade, salientando as suas características e algumas das controvérsias que têm suscitado na doutrina portuguesa.

Posteriormente, vamos referir as várias questões intrinsecamente ligadas ao Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada, como, por exemplo, a compreensão dos conceitos “vida privada”, “intimidade”, entre outros.

Em suma, é sobre este quadro geral que o nosso trabalho incide, pretendendo equacionar alguns dos aspectos mais relevantes desta temática.

3

Page 4: Dto Personalidade

II Noção e Características dos Direitos de Personalidade

Apesar dos seus antecedentes históricos, os Direitos de Personalidade só adquirem um estatuto autónomo no século XIX, ou seja, só a partir desta época é que são agrupados como categoria autónoma e integrados no seio do Direito Privado.

Com efeito, a proliferação dos meios técnicos que possibilitam a intromissão na vida privada, nomeadamente o incremento de escutas, de gravações não autorizadas, de fotografias com tele-objectivas, entre outras, fizeram com que a problemática da defesa da personalidade estivesse cada vez mais em voga.

Posto isto, vamos esclarecer o que significa exactamente o conceito de “direitos da personalidade”. Direitos de personalidade são, portanto, direitos que constituem atributo da própria pessoa e que incidem sobre bens da sua personalidade física, moral e jurídica. São direitos essenciais à própria noção de personalidade.

Em suma, como Adriano de Cupis afirma, os direitos de personalidade são “ o minimum necessário e imprescindível do conteúdo da personalidade”.

Visto o conceito, impõe-se a sua caracterização, sendo de destacar as seguintes características:

● Gerais: significa que todos os seres humanos são titulares de direitos de personalidade, na exacta medida em que são direitos inerentes a todos as pessoas.

● Absolutos: estatui que o titular dos direitos de personalidade pode invocar e fazer valê-los contra todos, isto é, impõe um dever geral de respeito.

● Pessoais: são direitos insusceptíveis de avaliação pecuniária. Contudo, há que ressalvar que o facto de serem direitos não patrimoniais, não impede que tenham reflexos patrimoniais, como por exemplo quando fundamentam a responsabilidade civil.

● Indisponíveis: o titular não pode renunciar ou limitar os respectivos direitos de personalidade de forma contrária aos princípios da ordem pública.

● Intransmissíveis: não podem ser objecto de cessão definitiva quer em vida, quer em morte.

● Tutela Penal: o Código Penal sanciona atitudes violadoras dos direitos de personalidade, tendo um capítulo “Dos Crimes contra Reserva da Vida Privada”que inclui, nomeadamente, o homicídio, a calúnia, a

4

Page 5: Dto Personalidade

difamação, a introdução em casa alheia, a violação do segredo de correspondência, a violação do segredo profissional, são alguns exemplos.

● Tutela Civil: no ordenamento jurídico português o preceito fundamental da lei ordinária no que toca aos direitos de personalidade é o Artigo 70º do Código Civil

Artigo 70ºNº1: A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física e moral.

Nº2: Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida.

● Consagração na CRP: A Constituição da República Portuguesa protege determinados direitos de personalidade (Artigo 24º: direito à vida; Artigo 25º: direito à integridade pessoal; entre outros).

5

Page 6: Dto Personalidade

III Limites dos Direitos de Personalidade

Os limites dos direitos de personalidade podem ser de duas ordens:

- Limites intrínsecos;- Limites extrínsecos;

Os limites intrínsecos são aqueles que são demarcados por lei ao estabelecer o conteúdo dos direitos de personalidade, enquanto os limites extrínsecos surgem da conciliação dos direitos de personalidade com outras situações protegidas.

6

Page 7: Dto Personalidade

IV Críticas aos Direitos de Personalidade

Várias são as críticas e polémicas subjacentes ao conceito de direitos de personalidade, porém, cingir-nos-emos a apenas duas questões essenciais:

A ) Direitos de personalidade são direitos subjectivos?

A doutrina divide-se relativamente a esta questão:

Por um lado, aqueles que negam a existência de direitos de personalidade como verdadeiros direitos subjectivos podemos destacar o Professor Cabral Moncada, segundo ele “o que o Homem traz já consigo, ao nascer, são certos interesses e fins, inerentes à sua natureza humana (…). Mas esses fins e interesses, como a vida, a integridade da pessoa, a liberdade, a propriedade (…), não surgem na forma de direitos, mas sim de “valores” que, reconhecidos, se tornam a essência de direitos.”

Por outro lado, existem autores, como os Professores Paulo Mota Pinto e Carvalho Fernandes que conseguem vislumbrar nos direitos de personalidade traços característicos do conceitos de direitos subjectivos, por outras palavras, consideram que os direitos de personalidade são direitos subjectivos atribuídos, uma vez que se traduzem em poderes cedidos pela ordem jurídica para a tutela de interesses próprios de certa pessoa.

B ) Existe um Direito Geral de Personalidade?

Nesta polémica identificam-se duas perspectivas essenciais:

A Escola de Lisboa considera que não existe Direito Geral de Personalidade, sendo esta teoria preconizada pelo Professor Oliveira Ascenção, pelo que se entende que o conceito de direito geral de personalidade é inútil, na exacta medida em que os problemas suscitados relativamente à personalidade podem ser resolvidos com base nos Direitos Especiais de Personalidade.

Além disso, o Professor Oliveira Ascenção, considera que a existência de um Direito Geral de Personalidade é uma impossibilidade lógica, visto que o ser humano seria uma objecto de si próprio, ou seja, configura uma situação em que a pessoa é, simultaneamente, sujeito e objecto de um direito.

A perspectiva da Escola de Coimbra é favorável à existência de um direito geral de personalidade, incidindo sobre todas as manifestações da personalidade. Este direito geral, segundo esta visão, é o princípio superior dos direitos que respeitam a particulares modos de ser da personalidade humana.

7

Page 8: Dto Personalidade

V Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada

Pode afirmar-se que protecção do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é algo relativamente recente, sendo fruto do desenvolvimento das tecnologias e do intercâmbio de informação. De facto, os direitos de inviolabilidade de domicílio e da correspondência sempre foram reconhecidos nas anteriores constituições portuguesas.

No entanto, apenas no Código Civil de 1866 se dera maior abrangência ao direito à reserva sobre a intimidade da vida privada no seu artigo 80º.

Paralelamente, existiam já instrumentos internacionais protectores de tal direito, destacando-se:

A Declaração Universal dos Direitos do Homem no artigo 12º “Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a protecção da lei.”.

O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos no artigo 17º “ Nº1 – Ninguém será objecto de intervenções arbitrárias ou ilegais na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem de atentados ilegais à honra e à sua reputação; Nº2 – Toda e qualquer pessoa tem o direito à protecção da lei contra tais intervenções ou tais atentados.”.

Convenção Europeia dos Direitos do Homem no artigo 8º “ Nº1 – Qualquer pessoa tem direito ao respeito da sua via privada e familiar, do seu domicílio e da sua correspondência.”

Com efeito, a Constituição da República Portuguesa no artigo1º consagra o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana como valor fundamental do ordenamento jurídico da comunidade, sendo este materializado, posteriormente, nos artigos 24º a 47º, inserindo-se no conjunto dos Direitos Liberdades e Garantias, dos quais se destaca o artigo 34º “Nº1 – O domicílio e o sigilo da correspondência e de outros meios de comunicação privada são invioláveis.”

8

Page 9: Dto Personalidade

VI O Interesse na Privacidade e na Necessidade da sua Tutela

Antes de mais, o conceito de “privacidade” (ou “privacy”) é de difícil definição, uma vez que é muito abrangente e pouco claro. No entanto, em primeiro lugar convém entender qual a relevância jurídica do bem “privacidade”, isto é, qual o interesse que subjaz desse bem.

Para tal, é conveniente citar Raymond Wacks que considera que esse interesse é o de evitar ou submeter a controlo o acesso ou a revelação de informação pessoal. Por informação pessoal compreendem-se factos, opiniões ou comunicações ligadas à pessoa, consideradas de conhecimento restrito, visto que são íntimas ou mesmo confidenciais.

A esta definição, Ruth Gavinson acrescenta certos elementos como sendo o interesse do anonimato “a subtracção à atenção dos outros” e a solidão “o interesse de excluir o acesso físico dos outros a si próprio”.

9

Page 10: Dto Personalidade

VII Conteúdo do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada

A primeira formulação existente sobre o conteúdo do direito à reserva da intimidade da vida privada é o acórdão 128/92 do Tribunal Constitucional versa “ o direito de cada um a ver protegido o espaço interior ou familiar da pessoa ou do seu lar contra intromissões alheias”. Assim, entendido, o direito abrangia dois elementos fundamentais: a autonomia, o exercício livre no âmbito da sus esfera pessoal e, ainda, a não difusão do conteúdo do dito direito, excepção feita caso haja consentimento.

Posteriormente este direito fora invocado nos casos de segredo bancário (Acórdão 278/99 do Tribunal Constitucional) e de testes de alcoolémia (Acórdão 319/95 do sito Tribunal). Desta forma, cada vez mais se acentuava o livre desenvolvimento da personalidade com a protecção da sua liberdade.

Apesar de muito utilizado, o conceito de “vida privada” é de difícil definição. Por um lado, a doutrina destaca três círculos distintos: respeitos dos comportamentos; respeito do anonimato e o respeito da vida em relação e, por outro lado, a jurisprudência recebe o princípio constitucional diferenciando a informação da vida privada da da vida pública.

É imperativo proceder a uma análise do interesse e conteúdo do próprio direito para o melhor compreender.

Inicialmente, é necessário destacar o interesse do direito que corresponde à vida privada, mais precisamente, no controlo da informação previsivelmente íntima sobre a pessoa, realçando, paralelamente, o direito ao anonimato e à solidão. Assim sendo, este tripé forma o núcleo duro da protecção da reserva à intimidade da vida privada, em constante oposição com o direito de informação. O entendimento constitucional aprofunda a existência desta núcleo com a distinção entre a vida pública, a vida social e mundana e a vida privada, cujo o interesse é estritamente particular.

Este ponto é fulcral para se proceder a uma caracterização abstracta do conteúdo da vida privada. Sendo que no supracitado Acórdão 128/92 o define como “no espaço próprio inviolável engloba-se a vida pessoal, a vida familiar, a relação com as outras esferas da privacidade (exemplo: amizade), o lugar próprio da vida pessoal e familiar (exemplo: lar ou domicílio), bem assim como os meios de expressão e comunicação privados (exemplos: comunicações, telefone, conversas orais, escritos pessoais, entre outros).

10

Page 11: Dto Personalidade

Podemos, assim, desta forma relatar alguns elementos constitutivos do núcleo da reserva da intimidade da vida privada:

▪ Identidade da pessoa;▪ Endereço da pessoa;▪ Número de telefone ou telemóvel da pessoa;▪ Códigos de identificação pessoais (exemplos: cartões de crédito, de sócio,

de cliente);▪ Informações clínicas da pessoa (exemplos: historial, relatórios, exames

médicos) excepção feita aos grupos sanguíneos;▪ Factos e acontecimentos privados da pessoa;▪ Elementos respeitantes à vida familiar, conjugal, amorosa e afectiva da

pessoa;▪ Locais privados da pessoa (exemplo: carro, jardim da casa);▪ Comunicações por correspondência da pessoa;▪ Objectos pessoais;▪ Informação patrimonial e financeira da pessoa;

Esta explicitação não seria correcta se se não incluísse a distinção entre intromissão/intrusão na via privada e divulgação da vida privada. No primeiro caso são englobados os fenómenos de violação do domicílio, de voyerismo, de perseguição física, de aquisição de informação sobre a vida privada. O segundo caso, engloba a revelação de informações sobre a vida pessoal de outrém, nomeadamente diários, fotografias e jornais.

11

Page 12: Dto Personalidade

VIII Figuras Afins do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida

Privada

Após a definição do conteúdo do conceito de vida privada é importante diferenciá-lo de alguns figuras conexas que existem:

1) Segredo Bancário: abrange reciprocamente um interesse geral do sistema bancário e um interesse específico do particular;

2) Segredo da Instrução: reserva da vida privada na instrução do processo penal: imposição de restrições à publicidade e necessidade de autorização do Tribunal para a realização de buscas domiciliárias e escutas telefónicas;

3) Segredo da Administração Fiscal: dever de segredo por parte dos funcionários da Administração Fiscal sobre a situação fiscal e/ou sobre aspectos pessoais dos cidadãos, apenas cessando, em caso de expressa autorização do particular, de colaboração com outras instituições públicas ou de processo judicial;

4) Segredo Profissional: segredo profissional fora instituído com o intuito de gerar uma relação de confiança entre os profissionais e os seus clientes;

5) Direito à Honra: este direito defende a “projecção vital” da pessoa, sendo um dos redutos da esfera privada, porém, é susceptível de avaliação social;

6) Direito à Imagem: ao contrário do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, o direito à imagem pode ser violado na esfera da vida pública, que se traduz num controlo da captação e divulgação de elementos visuais identificadores da pessoa;

7) Direito à Identidade Pessoal: abrange os instrumentos de identificação da pessoa, bem como o conhecimento de factos da sua vida, pelo que lhe é conferido uma protecção face à adulteração ou utilização dos mesmos;

12

Page 13: Dto Personalidade

IX Titularidade do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada

Segundo o artigo 12º da Constituição da República Portuguesa “Nº1 – Todos os cidadãos gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres consignados na Constituição.”: princípio da universalidade dos direitos constitucionais.

Contudo, há especificidades que são imperativas de concretizar:

Primeiramente os menores e incapazes gozam da titularidade do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, contudo, sendo este exercido pelos seus representantes:

Artigo 80º do Código Civil:Nº1 – Todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida

privada de outrem.Nº2 – A extensão da reserva é definida conforme a natureza do caso e condição da pessoa.

Artigo 123º do Código Civil:Salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercício de direitos.

No que concerne às pessoas casadas, cada um dos cônjuges pode apelar ao direito à reserva sobre a intimidade da vida privada face ao outro desde que não viole o dever de assistência mútua e o dever de respeito.

A mesma situação poder-se-á aplicar à relação entre trabalhadores e empregadores, pelo que o uso por parte destes de, por exemplo, câmaras de vigilância ou mecanismos de escutas telefónicas são contrários à reserva da intimidade, salvo se devidamente justificados por motivos de segurança.

No mesmo seguimento, as pessoas colectivas são também titulares do direito à reserva sobre a vida privada, desde que condizente com a natureza da sua essência, fundamentalmente no que diz respeito ao “segredo dos negócios” e à não violação da correspondência.

Para finalizar, as pessoas falecidas gozam da continuidade do seu bom nome:rt

Artigo 71º do Código Civil:Nº1 – Os direitos de personalidade gozam igualmente de protecção depois da morte do respectivo titular.

13

Page 14: Dto Personalidade

X Regime de Protecção da Intimidade da Vida Privada

(I) Protecção

Como já fora referido, o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é protegido constitucionalmente, estando integrando no grupo de “Direitos, Liberdades e Garantias”, pelo que é directamente aplicável como dispõe o Artigo 18º Nº1 da Constituição da República Portuguesa.

No entanto, o dito direito é ainda protegido civil e penalmente. No que concerne ao Direito Civil, o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada está disposto no supracitado Artigo 80º do Código Civil, formando um grupo mais lato de direitos da personalidade.

Por seu turno, a protecção penal consta da parte especial do capítulo VI do Código Penal “Dos Crimes contra a Protecção da Vida Privada” já citada, podendo destacar-se a violação do domicílio (Artigo 190º); a devassa da vida privada (Artigo 192º); a violação de correspondência ou de telecomunicações (Artigo 194º), entre outros.

É imperativo, porém, apontar outras formas de preservação do direito sobre a intimidade da vida privada, por um lado, a não aceitação de provas obtidas com a violação da vida privada, tendo reflexos no processo penal e, por outro lado, a anterior protecção, por maioridade de razão aplicar-se-á ao processo civil.

(II) Limites do Direito à reserva sobre a Intimidade da Vida Privada

A questão fulcral que se coloca no âmbito da possibilidade da limitação do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é o recurso ao consentimento.

Para melhor compreender esta realidade é necessário distinguir dois aspectos diferentes: a limitação voluntária do direito por meio do consentimento e, por seu turno, a própria contingência da esfera da vida privada, tendo especial enfâse no que respeita a figuras públicas com notoriedade. Expliquemo-nos.

O direito em causa é disponível a todas as pessoas, tendo estas a possibilidade de limitações voluntárias do seu próprio direito perante a ponderação de juízos de valor, desta forma, a limitação voluntária é revogável mediante indemnização. Trata-se de um direito absoluto e irrenunciável, coisa bem diversa da limitação voluntária, são os limites intrínsecos da notoriedade da pessoa pública, existindo neste caso uma espécie de concílio entre o direito e a realidade pública da pessoa, não sendo isto sinónimo da completa ou parcial perda do gozo do direito.

14

Page 15: Dto Personalidade

Este ponto é absolutamente essencial para a concretização das reais implicações da conformação do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada. Do que fora anteriormente referido subjaz a ideia da possível divergência entre o direito de informação e liberdade de imprensa e o direito à privacidade da vida privada.

Poder-se-á alegar o interesse público para a divulgação de informações da vida privada? Ou estas apenas dizem respeito à esfera íntima da pessoa?

Esta questão adquire maior densidade no que se refere às figuras públicas. Se a curiosidade pública é legitima pela notoriedade que a pessoa é alvo, esta

notoriedade não pode ser fundamento para a violação do direito à reserva sobre

Vida Privada34º

Liberdade informação

37º

CRP

15

Page 16: Dto Personalidade

a vida privada, podendo este ser limitado pela pessoa pública em causa mas não confinado a uma decisão dos meios de comunicação.

Para concluir pode afirmar-se que, no caso das figuras públicas existe uma ponderação entre o direito de informar e o direito à vida privada, podendo existir uma ténue limitação deste face à condição da pessoa pública em comparação com os restantes ilustres desconhecidos. Aprofundemos.

A liberdade de imprensa justifica a divulgação de informações da vida privada, caso esta advenha do exercício de uma função pública, existindo desta feita um interesse público para o conhecimento geral dessas informações. Também existe total liberdade informativa quando daí decorrem fins publicitários, comerciais ou recreativos pretendidos pela figura pública.

Bem diferente é a intromissão e publicitação da vida privada da figura pública sem o seu consentimento ou justificação do interesse público. Daqui decorre a necessidade de um nexo entre a importância da projecção da figura pública e o interesse público e, por outro lado, a própria natureza do elemento.

Para concluir, existe um núcleo duro do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada que não pode sofrer limitações, o mesmo abrange as figuras públicas caso não seja provado o nexo de causualidade entre o interesse público e o motivo pelo qual a pessoa atingiu notoriedade e merecedor de divulgação.

16

Page 17: Dto Personalidade

XI Outros Casos de Conflito

Para além do latente conflito acima apresentado e aprofundado, outros podem surgir, não com a mesma densidade, mas de igual valor analítico.

Podem existir conflitos entre o direito à reserva da vida privada e o direito de criação cultural (Artigo 42º da Constituição da República Portuguesa). Este conflito toma alguma premência quando a criação cultural fora inspirada na realidade pessoal e contenha informações identificadoras da pessoa. É isto que se sucede, quando, por exemplo, as figuras públicas são alvo de caricaturas, existindo duas conformações de direitos possíveis: a existência da remodelação da obra artística retirando-lhe os elementos identificadores ou se restringe levemente o direito à vida privada da pessoa visada.

Para completar este ponto falta ainda referir os possíveis conflitos entre o direito à vida privada e o processo de realização da justiça, nomeadamente informações sobre testemunhas, exames pessoais ou ainda sobre a vida privada na prisão.

Finalmente o interesse histórico pode conflituar com o dito direito na medida em que o trabalho historiográfico pode revelar elementos pessoais, devendo manter-se o rigor científico e o espaçamento temporal necessário.

17

Page 18: Dto Personalidade

XII Consequências da Violação do Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada

Como já fora referido o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada é tutelado civil e penalmente, estando consagrado como princípio constitucional. Desta forma, é natural que existam consequências da violação do dito direito que iremos abordar sucintamente:

A) Responsabilidade Civil

Nos termos do Artigo 483º Nº1 do Código Civil, a violação do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada origina uma obrigação de indemnização por parte da parte lesante.

Tendo em conta que os danos provenientes da violação da privacidade são, em regra, irreversíveis, ou seja, não é possível colocar a vítima na situação em que estaria sem a ocorrência do facto danoso, a responsabilidade civil aqui abordada visa oferecer uma compensação pela lesão sofrida.

B) Providências Não Especificadas

O Artigo70º Nº2 do Código Civil prevê a existência de providências adequadas às circunstâncias do caso de forma a evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já sofrida, exemplos, apreensões, publicação de sentença em jornais, supressão de passagens de um livro, entre outros.

18

Page 19: Dto Personalidade

XIII Conclusão

Este trabalho pretendeu fazer uma abordagem ao Direito à Reserva sobre a Intimidade da Vida Privada, enquadrando-o no conjunto dos Direitos de Personalidade.

Assim sendo, podemos concluir que este direito é de maior importância, no sentido em que, por um lado, cada vez mais é objecto de estudo e, por outro, os conflitos emergentes da violação deste direito têm aumentado bastante nos últimos tempos. De facto, a emergência e a proliferação de novas tecnologias, bem como todas as possibilidades que daí advêm tornam imperioso um estudo mais aprofundado desta temática, pelo que as imagens, mesmo não legendadas, colaboram para uma maior precisão do alcance desse desenvolvimento.

Todas estas questões levam-nos a afirmar que é necessário que os ordenamentos jurídicos tenham instrumentos eficazes quanto à protecção da intimidade de cada pessoa. Aliás, como o professor Paulo Mota Pinto refere, só esses instrumentos de tutela jurídica podem “evitar que cada um de nós se sinta a viver numa «casa de cristal», com «paredes de vidro» que não pode sequer embaciar a seu gosto, para proteger os domínios mais íntimos da existência”.

19

Page 20: Dto Personalidade

XIV Bibliografia

Ascensão, José Oliveira, Direito Civil Teoria Geral, volume I, Coimbra Editora, 2ª edição, 2000.

Fernandes, Luís Carvalho, Teoria Geral do Direito Civil, volume I, Lex, 2ª edição, 2000.

Mendes, João de Castro, Teoria Geral do Direito Civil, volume I, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Reimpressão, 1997.

Pinto, Carlos Mota, Teoria Geral do Direito Civil, Coimbra Editora, 3ª edição actualizada, 1999.

Paulo Mota Pinto, O Direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra 69, pág. 479-586, 1993.

Paulo Mota Pinto, A Protecção da vida privada e a Constituição, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra 76, pág. 153-204, 2000.

20