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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS PROJETO A VEZ DO MESTRE ALESSANDRO RAMALHO CAJUEIRO Orientadora: MARIA ESTHER DE ARAUJO OLIVEIRA Rio de Janeiro / RJ 2008 A IMPORTÂNCIA DA PSICOMOTRICIDADE DOS JOGOS E BRINCADEIRAS NA APREENSÃO DO CONHECIMENTO: UMA PERSPECTIVA CONSTRUTIVISTA DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

ALESSANDRO RAMALHO CAJUEIRO

Orientadora: MARIA ESTHER DE ARAUJO OLIVEIRA

Rio de Janeiro / RJ

2008

A IMPORTÂNCIA DA PSICOMOTRICIDADE DOS JOGOS E

BRINCADEIRAS NA APREENSÃO DO CONHECIMENTO:

UMA PERSPECTIVA CONSTRUTIVISTA

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO

DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS

PROJETO A VEZ DO MESTRE

ALESSANDRO RAMALHO CAJUEIRO

Rio de Janeiro / RJ

2008

Monografia apresentada à Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento da Universidade Cândido Mendes, como requisito parcial para a conclusão do curso de Especialização em Psicomotricidade. Orientadora: Profª Maria Esther de Araujo Oliveira.

A IMPORTÂNCIA DA PSICOMOTRICIDADE DOS JOGOS E

BRINCADEIRAS NA APREENSÃO DO CONHECIMENTO

UMA PERSPECTIVA CONSTRUTIVISTA

AGRADECIMENTOS

A todos os professores e professoras da Universidade Cândido Mendes.

Dedico este trabalho aos meus pais e aos meus verdadeiros amigos.

RESUMO

Trata sobre a contribuição dos brinquedos e brincadeiras no desenvolvimento

da psicomotricidade de alunos da Educação Infantil nas aulas de Educação

Física. Discorre sobre a necessidade da consideração, por parte de

professores e demais educadores, do espaço lúdico das crianças como uma

importante manifestação construtiva do conhecimento da criança. Aborda

alguns aspectos fundamentais na estruturação do processo psicopedagógico,

tendo em vista a construção do conhecimento e do saber por parte da criança

através do uso de brinquedos e brincadeiras. Apresenta sugestões e

recomendações para educadores, no sentido adaptarem as suas práticas e

ferramentas pedagógicas à aprendizagem infantil desenvolvida por meio de

brinquedos e brincadeiras.

Palavras-chave: Brincadeiras; Brinquedo; Construtivismo; Educação Física;

Psicomotricidade.

METODOLOGIA

Para a produção da monografia, foi realizado um levantamento bibliográfico

para se obter elementos teóricos capazes de embasar o entendimento a

respeito da evolução histórica dos conceitos sobre Psicomotricidade e

Construtivismo.

De acordo com Lakatos e Marconi (2001, p. 43), uma pesquisa bibliográfica

pode ser definida como um levantamento da bibliografia já publicada sobre um

assunto “em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita”.

Assim, para o embasamento teórico da pesquisa, recorrer-se-á à exploração

bibliográfico-descritiva em livros, artigos científicos e revistas especializadas,

além de documentos eletrônicos de fontes fidedignas.

A finalidade da pesquisa bibliográfica “é colocar o pesquisador em contato

direto com tudo aquilo que foi escrito sobre determinado assunto” (LAKATOS;

MARCONI, 2001, p. 43).

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................... 07

1 A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR............................................ 10

1.1 O Porquê do Brincar....................................................................... 13

1.2 O Brincar e o Aprender.................................................................. 14

2 O BRINQUEDO................................................................................. 17

3 A BRINCADEIRA COMO OPORTUNIDADE DE DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR.....................................

21

3.1 Concepções Sobre a Origem do Conhecimento e a Natureza da Aprendizagem.................................................................

22

3.2 O Interacionismo Construtivista de Piaget e o Sócio-Interacionismo de Vygotsky...............................................................

27

CONCLUSÃO........................................................................................ 34

BIBLIOGRAFIA.................................................................................... 35

7

INTRODUÇÃO

A escolha da temática aqui estudada foi motivada pela preocupação com

questões ligadas às práticas de professores de Educação Física atuantes em

escolas de ensino básico, fundamentalmente naqueles aspectos relacionados

com os meios utilizados no desenvolvimento da psicomotricidade dos alunos

adotados por esses profissionais nas suas aulas.

Diante das velozes transformações na sociedade observadas nas últimas

décadas, ficou evidente que as necessidades educacionais da sociedade

brasileira aumentam em progressão geométrica e para muito além da

educação escolar, enquanto que os meios dispostos para o desenvolvimento

da psicomotricidade parecem ainda não ter encontrado o seu verdadeiro e

produtivo caminho em meio às exigências de um mundo em vias de integração

econômica global.

Se há uma área em que o sistema educacional avançou pouco, foi quanto à liberdade de atuação corporal dos alunos. Nesse aspecto, o ambiente escolar continua muito restrito, submetendo os alunos a reduzidos espaços físicos de aproximadamente meio metro quadrado, o equivalente aos limites de sua carteira escolar (FREIRE; SCAGLIA, 2003, p. 7)

Felizmente, boa parte dos educadores parece ter consciência, atualmente, que

é pela liberdade das ações e concepções, pelas incertezas do fazer e do

pensar (elementos contidos explicitamente em jogos e brincadeiras) que o ser

humano vai organizando a consciência de si mesmo e desenvolvendo suas

estruturas psíquicas para interagir com a realidade na qual ele está inserido.

8

Assim, com o olhar voltado para essas novas exigências profissionais, este

trabalho monográfico investigou como se processa a construção do

conhecimento por meio do desenvolvimento da psicomotricidade estimulado

pela aplicação de jogos e brincadeiras nas aulas de Educação Física,

procurando delimitar virtudes e deficiências dessa prática dentro da perspectiva

construtivista descrita por Jean Piaget.

A busca de alternativas para (re) dimensionar a atuação do docente diante das

atuais necessidades e perspectivas educacionais do século XXI implica na

adoção de ângulos de observação mais abrangentes, que considerem cada

vez mais presentes e influentes as inevitáveis conseqüências da economia

globalizada e da transmissão instantânea de informações na vida dos

indivíduos, tenham acesso direto a elas ou não.

Assim, a problemática deste estudo reside em demonstrar como uma o

desenvolvimento da psicomotricidade pode atuar favoravelmente na integração

comunitária da criança e do adolescente, despertando sua responsabilidade

para com a coletividade, estimulando sua consciência para a importância da

saúde física, mental e espiritual e sendo um meio facilitador para a superação

de desafios e limites, influenciando positivamente na auto-estima e no

autoconceito dos alunos.

O estudo desse tema se justifica na medida em que as exigências educativas

da sociedade contemporânea cada vez mais se relacionam a diferentes

dimensões da vida das pessoas, para além da escola. Nesse sentido, o

desenvolvimento das habilidades motoras deve estar diretamente relacionado

com os elementos cognitivos, sociais e afetivos do educando.

Nessa perspectiva, o objetivo geral deste trabalho está voltado para a análise

dos processos pelos quais o desenvolvimento da psicomotricidade, obtido por

meio de jogos e brincadeiras, auxilia na construção do conhecimento da

criança.

9

Para tanto, foi realizada uma revisão de literatura sobre Psicomotricidade e

Construtivismo, buscando identificar quais os elementos contidos em jogos e

brincadeiras mais capazes de auxiliar o desenvolvimento da psicomotricidade

de crianças em idade escolar e, paralelamente, investigar de que forma os

jogos e brincadeiras podem ajudar na socialização da criança e na sua

adaptação ao seu meio físico e social.

A hipótese a ser comprovada ou refutada com a pesquisa bibliográfica é a de

que a efetividade da prática pedagógica da Educação Físicia para crianças

está vinculada à capacidade do educador desenvolver a psicomotricidade dos

alunos, e que a promoção de adequações no sistema comunicativo

estabelecido em sala de aula dentro de uma visão construtivista permite ao

educador otimizar a sua performance, influenciando positivamente no processo

de aquisição do conhecimento e no desempenho extra-classe de seus alunos.

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1 A IMPORTÂNCIA DO BRINCAR

O homem, diferente dos animais, é um ser totalmente dependente nos seus

primeiros anos de vida. Esta dependência se refere à preservação da vida e ao

desenvolvimento da sua inteligência e sensibilidade (SCHÜTZ, 2007, p. 1).

A nutrição e o cultivo destes diferentes aspectos da personalidade humana

dependem dos estímulos a que ela for submetida. A preocupação com a saúde

da criança tem que englobar também sua estrutura psicológica, caso contrário

ela dificilmente se tornará um adulto equilibrado, capaz de construir sua

personalidade e seu caráter e de se relacionar em sociedade de forma

harmoniosa (SCHÜTZ, 2007, p. 1).

Não basta apenas desenvolver o físico, é preciso alimentar o não-físico. Não

basta zelar pela qualidade dos alimentos que farão crescer o corpo, é preciso

zelar pela qualidade das oportunidades que estão sendo oferecidas à criança

para o seu crescimento intelectual, para o desenvolvimento da sua

personalidade e para a moldagem do seu caráter.

Quanto mais a criança for colocada em situações rigidamente estruturadas e conduzidas, menor a possibilidade de ela chegar a encontrar seu próprio modo de ser, sua vocação, sua natural afetividade. Sua espontaneidade é comprometida pela necessidade de cumprir tarefas predeterminadas e de ter um desempenho que lhe assegure uma boa colocação dentro da escala de valores situados entre o êxito e o fracasso (SCHÜTZ, 2007, p. 2).

Felizmente, boa parte dos educadores parece ter consciência, atualmente, que

é pela liberdade das ações e concepções, pelas incertezas do fazer e do

pensar (elementos contidos explicitamente em uma brincadeira) que o ser

humano vai organizando a consciência de si mesmo e desenvolvendo suas

estruturas psíquicas para interagir com a realidade na qual ele está inserido.

11

Segundo Haddad e Johansson (1995, p. 48), brincar terá o enfoque enquanto

ação livre ou supervisionada dependendo da forma como foi divulgada pelos

discípulos froebelianos: Schrader-Breymann e Bertha von Marenholz-Büllow. A

primeira cria a Casa Pestalozzi-Fröbel, norteando para o brincar livre,

causando forte influência à Suécia e, a segunda, encaminha-se para a diretriz

dos dons froebelianos, sendo apoiada pelos americanos.

Schrader-Breymann é contrária à firmeza de atitudes disciplinadoras, faz com

que o jardim de infância se torne uma continuação do lar, ao acrescentar

tarefas domésticas como parte do currículo, o qual, em conjunto com as

brincadeiras, representam a base do desenvolvimento da criança na visão

sueca (HADDAD; JOHANSSON, 1995, p. 48).

Já Marenholz-Büllow destaca os dons, ignorando o simbolismo das

brincadeiras interativas e a ação livre da criança, fazendo com que a instituição

se torne similar com a escola (HADDAD; JOHANSSON, 1995, p. 49).

Na análise dessa obra, é possível entender que a perspectiva adotada pelos

autores aponta claramente para a natureza complementar dessas duas

correntes, concluindo que a criança, enquanto brinca, manifesta crenças,

sentimentos e linhas de raciocínio interativo, onde a brincadeira incita a

participação de vários elementos reais e/ou inventados. Ao brincar, a criança

liberta e desenvolve a sua imaginação.

Haddad e Johansson (1995, p. 49) concluem que é através das brincadeiras

que a criança aprende a viver em comunidade e a conviver consigo mesma. A

boa construção da sua auto-estima e do seu auto-conceito estão, desse modo,

diretamente relacionados ao êxito desse processo. Concluem ainda que a

brincadeira na educação infantil proporciona à criança formas de exprimir suas

idéias, seus sentimentos e seus conflitos. Brincar não é apenas a linguagem

natural da criança, mais a mais valiosa delas.

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Para Friedmann (1998, p. 30), a brincadeira é, no universo infantil, uma

oportunidade fundamental para apreensão da arte da convivência com pessoas

muito diferentes entre si.

A brincadeira atenua o egocentrismo infantil pelo livre exercício de compartilhar idéias, regras, objetos e brinquedos. Tornando-se autônoma ao resolver seus conflitos e ao experimentar papéis, gerando e ampliando as bases da sua personalidade (FRIEDMANN, 1998, p. 33).

Segundo a mesma autora, é pelo simbólico jogo da brincadeira que a criança

descobre o mundo e seus mecanismos. O brincar permite que suas

dificuldades inconscientes venham à tona e possam ser trabalhadas pelo

educador, o que possibilita à criança refletir sobre sua situação, dando-lhe

oportunidade de obter soluções mais satisfatórias para os seus conflitos.

Assim, a criança revive e reorganiza mais satisfatoriamente suas dificuldades

inconscientes, podendo então desenvolver a consciência da sua experiência

psicomotora.

Friedmann (1998, p. 33) afirma que as mesmas estruturas psíquicas criadas e

desenvolvidas por uma criança para a solução de desafios contidos em uma

brincadeira serão utilizadas pelo indivíduo adulto no enfrentamento dos

conflitos e responsabilidades inerentes à sua condição de relativa

independência.

Assumindo que esse indivíduo precisa poder ser responsável por cumprir a lei e as normas de convivência social, precisa poder se alimentar, poder se vestir, poder prover seu futuro e ainda, em algumas fases da vida, prover o sustento de outras pessoas, fica evidenciada a importância da brincadeira na construção do ser humano enquanto ator social (FRIEDMANN, 1998, p. 33).

Pela complexidade desse processo e forma com que ele está relacionado com

o período de vivência escolar, é fundamental a conscientização e empenho dos

professores e demais educadores para que o ambiente escolar seja adequado

ao processamento dessas experiências.

13

Para isso, é preciso se livrar das amarras remanescentes do modelo de escola

implementado e praticado no Brasil no período da ditadura militar (1964-1985).

Um modelo que desestimulava qualquer prática educativa que promovesse

quaisquer tipos de associações de idéias e debates temáticos não-relacionados

com a manutenção da realidade sócio-política.

A escola rígida, autoritária e disciplinadora foi a tônica mais contraproducente,

uma vez que foi herdada de um modelo ainda mais inadequado, aquele

instalado na arcaica sociedade brasileira anterior ao período de modernização

da era Juscelino Kubitschec de Oliveira.

Nesse período, a criança brincando não era respeitada na escola, nem

considerada como estando no seu processo de aprendizagem. Era tida como

se estivesse perdida em um mundo imaginário, não percebendo a realidade.

Inserida no contexto da sua brincadeira, a criança era vista como em um

estado de incapacidade permanente.

Essa percepção de que a criança, ao brincar, está fora da realidade, em um

mundo totalmente imaginário, não condiz com os estudos atuais da Psicologia

e Pedagogia. Basta um educador razoavelmente preparado lançar um olhar

atento sobre as várias espécies de brincadeiras desenvolvidas pelas crianças

para perceber como, através delas, as crianças interagem, se organizam e se

constituem como indivíduos de acordo com sua percepção e aquisição sócio-

cultural. A importância do brincar é óbvia.

1.1 O Porquê do Brincar

O brincar proporciona a oportunidade de desenvolvimento. Brincando, a

criança ensaia, descobre, cria, imagina, pratica e verifica suas habilidades.

Brincar é um ato indispensável para o desenvolvimento da saúde física,

emocional e intelectual da criança.

14

Ao se cultivar a arte de brincar, considerando-o (o brincar) como um dom

natural e estimulando-o devidamente, o processo pedagógico contribuirá,

futuramente, para a eficiência das reações e realizações do adulto.

Através da brincadeira, se estimula a imaginação, a curiosidade, a iniciativa e a

autoconfiança. Oferece a possibilidade de apreensão, ampliação e progressão

da linguagem, do pensamento, da concentração e da atenção.

Para Kishimoto (1997, p. 20), a brincadeira pode ser apreciada sob duas

vertentes: auto-expressão e auto-realização. Como auto-expressão se

apresentam atividades livres, construções, dramatizações, música, artes

plásticas, entre outras. Em auto-realização está o brinquedo ordenado, aquele

que tem uma proposta e por isso necessita de determinado desempenho.

Quanto mais simples os recursos materiais, mais fantasia a brincadeira exige.

Quanto mais sofisticados os recursos, maior é o desafio apresentado. Dessa

forma, a brincadeira é sempre uma oportunidade para que a criança interaja,

faça escolhas e tome decisões. Na observação desse processo, se percebe a

importância para a saúde mental do ser humano a ludicidade contida em uma

brincadeira (SCHÜTZ, 2007, p. 2).

É preciso, então, que se proporcione o espaço lúdico para as brincadeiras da

criança, pois é neste espaço que poderá ocorrer a expressão mais autêntica do

seu ser, é o espaço da prática do vínculo afetivo com o mundo, com as

pessoas e com os objetos. É o universo mágico que a faz feliz.

1.2 O Brincar e o Aprender

Quando se é feliz, se aprende melhor. À primeira vista, o faz-de-conta poderia

ser considerado uma brincadeira em que a criança estivesse em um mundo só

seu, imaginário.

15

Porém, com um olhar mais atento, percebe-se nesta atividade que as crianças

agem e reagem organizadamente umas com as outras, criando, reformulando e

partilhando significados, estabelecendo, assim, a importância dessa brincadeira

para o seu desenvolvimento psicológico.

Na brincadeira do faz-de-conta uma criança cria inúmeras significações para os

objetos. Modifica os limites do ambiente físico conforme as exigências da

brincadeira em andamento. Interpreta personagens, cria histórias, jogos e

representações com regras a serem seguidas pelos participantes da

brincadeira. Cria modelos de comportamento para animais, objetos,

personagens. Considera os objetos como seres animados, dotando-os de

identidade e personalidade próprios (AZEVEDO, 2008, p. 1).

Ao brincar num mundo imaginário, a criança tanto revive experiências do seu

cotidiano, quanto expressa desejos que, naquele instante, são importantes no

seu processo de desenvolvimento.

Vygotsky (1991, p. 107) afirma que a capacidade da criança subordinar os

objetos e sua própria ação ao campo do significado, no mundo imaginário,

denota um adiantamento no desenvolvimento infantil.

Para uma criança pequena, essa maneira de se comportar exige uma

transformação radical de sua organização psicológica. O autor observa ainda

que uma criança pequena age de acordo, apenas, com seu campo perceptivo

imediato, e, por conta disso, seu comportamento é restringido pelas situações

ambientais, pela situação na qual ocorre a brincadeira, pelos objetos presentes.

Na ludicidade, a criança realiza a substituição de um objeto real por outro

objeto, uma ação real por outra ação. Os objetos e ações reais são

subordinados à significação. Mas essas ações ainda ocorrem no faz-de-conta

como ocorrem na realidade. E os objetos que substituem outros objetos ou

coisas são similares aos objetos ou coisas reais.

16

A criança em idade pré-escolar ainda necessita de um elemento que lhe dê

suporte para lidar com o campo do significado. Daí porque os temas mais

comuns das brincadeiras de faz-de-conta de crianças nessa faixa etária são

temas vinculados a seu cotidiano: a criança brinca assumindo os papéis de

personagens que lhe são familiares (mãe, pai, filho, motorista etc.). Os animais

e os objetos representados fazem parte da realidade que a criança conhece

(AZEVEDO, 2008, p. 1).

O brinquedo traz em si a possibilidade do desenvolvimento da aprendizagem

através do fazer para aprender, ou seja, a experimentação e relacionamento de

seu conhecimento prévio com novas situações e necessidades, podendo

construir novas significações.

A criança, ao se deparar com situações-problema irá procurar soluções e

alternativas. Ela poderá crescer e se desenvolver, desde que estas situações

estejam adequadas à capacidade cognitiva de sua idade. Ao brincar, a criança

alcança níveis em seu desempenho psicomotor só equiparados à sua

motivação interna, própria (AZEVEDO, 2008, p. 1).

Portanto, para obter essa motivação o educador precisa criar um ambiente

atrativo, instigador. Os componentes materiais de uma brincadeira estimulada

(pedagógica) assumem importância vital. A participação ativa da criança

somente ocorrerá quando o brinquedo oferecer atividades dinâmicas que

despertem a sua curiosidade e interesse. É necessário que o brinquedo tenha

afinidade com a realidade da criança. O brinquedo precisa ser significativo.

17

2 O BRINQUEDO

O brinquedo ideal convida a brincar. O brinquedo facilita a concepção da idéia,

proporciona o enriquecimento da contextualização, instigando a motivação e o

desejo de superação no domínio das técnicas para o seu manuseio. A criança,

ao interagir com o brinquedo, vivencia mundos imaginários, cria, inventa,

descobre, observa umas coisas, experimenta outras, compara e reinventa.

Vygotsky (apud ROMERO, 2008, p. 2) afirma que através do brinquedo a

criança aprende a “agir numa esfera cognitivista, sendo livre para determinar

suas próprias ações”. Para o autor, “o brinquedo estimula a curiosidade e a

autoconfiança, proporcionando desenvolvimento da linguagem, do

pensamento, da concentração e da atenção”.

Ao desenvolver sua imaginação, suas habilidades se desenvolvem, tornando

seu mundo interior mais enriquecido. A criança passa a se comunicar mais e

melhor, podendo, cada vez mais, evoluir na relação com o mundo ao seu redor.

Com o tempo estes limites vão se expandindo e seus brinquedos deixam de ser somente uma identificação com os adultos e passam a refletir momentos individuais da sua vida. Até então, a criança só reproduz uma situação, a separação entre a ação e o objeto só ocorre quando ela reproduz a situação quando o objeto está ausente ou alguns objetos começam a ser substituídos por outros (AZEVEDO, 2008, p. 4).

O brinquedo tem a capacidade de traduzir o real para o mundo infantil.

Ameniza o impacto causado pelo tamanho e pela força dos adultos, reduzindo

a sensação de impotência da criança.

O brinquedo traduz o real para a realidade infantil. Suaviza o impacto provocado pelo tamanho e pela força dos adultos, diminuindo o sentimento de impotência da criança. Um ursinho de pelúcia pode ser um bom companheiro. Uma bola que convida para um pouco de exercício, um quebra-cabeças que desafia a inteligência ou um colar de “pérolas” que faz a menina sentir-se bonita e importante como a mamãe, todos são como amigos, servindo de intermediários para que a criança consiga integrar-se melhor (SCHÜTZ, 2007, p. 2).

18

Uma boneca pode ser a confidente e amiga da criança. Um patinete ou um

carrinho o transforma em um campeão de automobilismo. Um jogo de montar

ou um quebra-cabeça estimula sua inteligência e o relacionamento de

conceitos. As roupas de um adulto fazem a criança se sentir também uma

adulta (SCHÜTZ, 2007, p. 2).

Enfim, o brinquedo dá à criança a importância de um adulto. Supre a

necessidade da criança se colocar no nível de seus pais, de outros adultos e

de crianças mais velhas, que, via de regra, demonstram maior habilidade no

trato com as coisas reais.

Para Rezende e Fusari (apud KISHIMOTO, 1997, p. 25), os brinquedos e os

objetos transformados em brinquedos são como companheiros, como

mediadores numa melhor integração da criança com o meio em que ela vive.

Experimentando e vivenciando situações e soluções durante as brincadeiras, a

criança descobre como direcionar seus movimentos e ordenar suas reações no

mundo real da convivência coletiva. A criança satisfaz seu anseio de

desenvolvimento ao interagir com diversos materiais. É seduzida pelas

inúmeras possibilidades que eles possam vir a representar.

Ao ver o brinquedo, a criança é tocada pela sua proposta; reconhece umas coisas, descobre outras, experimenta e reinventa; analisa, compara e cria. Sua imaginação se desenvolve e suas habilidades também. Enriquecendo seu mundo interior, tem mais coisas a comunicar e pode, cada vez mais, participar do mundo que a cerca (SCHÜTZ, 2007, p. 3).

Não é apenas com o intuito de alcançar um objetivo que as crianças trabalham

com materiais, mas, mais pela satisfação de experimentá-los, manuseá-los e

lidar com eles. A criança adquire conhecimentos através dos brinquedos e

aprimorar habilidades é um dos melhores meios de aprendizado.

19

Para as crianças um carro de brinquedo é de verdade; a boneca pode ser a filha, a mãe, a irmã, a família; o dominó representa números e cores... Cada brinquedo tem seu espaço e seu papel no mundo infantil, e é justamente para aproveitar esses benefícios que as brinquedotecas foram criadas (MENTOR, 2008, p. 1).

Para Bontempo (apud KISHIMOTO, 1997, p. 26), através da participação ativa

da criança, o brinquedo proporciona o desenvolvimento e a aprendizagem, o

aprender-fazendo. E quanto mais o brinquedo oferecer atividades dinâmicas e

desafiadoras, mais ele será requisitado e necessário ao amadurecimento

infantil.

A criança cresce ao procurar soluções e alternativas nas situações-problema.

Isso desde que respeitado a sua necessidade/fase de desenvolvimento, ou

seja, a sua capacidade de compreensão e assimilação. Ao brincar, a criança

obtém o nível do desempenho psicomotor equiparado com a sua auto-

motivação.

O brinquedo tem grande importância no desenvolvimento da criança, ocorrendo à simbolização através dos objetos, sendo a pré-condição para o aparecimento do jogo de papéis. O jogo de papéis se desenvolve a partir das brincadeiras da criança com o objeto e ocorre nos segundos e terceiros anos, envolvendo diversos objetos adquiridos no primeiro ano de vida e a novos objetos (AZEVEDO, 2008, p. 1).

A inteligência da criança é instigada através do brinquedo, isto porque o

brinquedo proporciona à criança a soltura da sua imaginação, causando o

afloramento da sua criatividade.

“É preciso que haja a possibilidade de ser derrotado pelo brinquedo para que

haja desafio e alegria. A alegria vem quando a gente ganha. No brinquedo a

gente exercita o que Nietzsche denominou vontade de poder” (ALVES, 2008, p.

1)

20

O brinquedo estimula, também, a atenção, a concentração e o empenho de si.

Ele distrai ao possibilitar válvula de escape na tensão causada pela pressão do

“mundo” adulto. Ao requerer a aplicação da criança na atividade, o brinquedo

proporciona a habilidade de concentração e atenção.

O brinquedo não tem regras, nem necessariamente umobjetivo a conquistar, começa e termina a qualquer momento. Ele não materializa umjogo, ele evoca um aspecto da realidade, micromundo, que a criança pode manipular deacordo com sua vontade (SILVA et al, 2005, p. 4).

É possível se perceber que o brinquedo representa um componente

importantíssimo no universo infantil, influenciando positivamente na formação

da personalidade da criança. O brinquedo traduz o mundo adulto para uma

linguagem infantil e, portanto, auxilia na formação intelectual e na moldagem do

caráter da criança.

21

3 A BRINCADEIRA COMO OPORTUNIDADE DE

DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR

Para Braga (2002, p. 2), século XXI inicia-se sob o signo da transição na

educação. O advento das redes e da multimídia, entre as demais

conseqüências da Revolução da Informação, exige alterações profundas nos

processos educacionais e nas teorias pedagógicas.

É necessário favorecer um processo educativo que fomente a intensa

participação interativa e colaborativa dos alunos. Em outras palavras, encontrar

um modelo de aprendizagem apoiada pela tecnologia em que o professor seja

o colaborador, o facilitador que privilegiará o coletivo social e não apenas o

indivíduo.

Em relação ao seu papel pedagógico, a E.F deve atuar como qualquer outra disciplina na escola e não desintegrada dela. As habilidades motoras precisam ser desenvolvidas, sem, sem dúvida, mas deve estar claro quais serão as conseqüências disso do ponto de vista cognitivo, social e afetivo. Sem se tornar uma disciplina auxiliar de outras, a atividade da E.F precisa garantir que, de fato, as ações físicas e as noções lógico-matemáticas que as crianças usará nas atividades escolares e fora da escola possam se estruturar adequadamente (FREIRE, 2004, p. 24).

Para compreender melhor estes aspectos de interação e colaboração

presentes na brincadeira que permeiam este modelo de aprendizagem

idealizado, faz-se necessário antes entender como se produz o conhecimento,

como se aprende e por conseqüência, como se pode ensinar.

Para se adaptar ao mundo, para resolver problemas para agir sobre o mundo, transformando-o, o sujeito constrói movimentos corporais específicos, dirigidos para um fim e orientados por uma intenção: são os esquemas de ação. E por esses esquemas que o ser humano se expre4ssará em todas as ocasiões de sua vida (FREIRE, 2004, p. 33).

22

Algumas correntes como o racionalismo, o empirismo e o construtivismo

empenharam-se em explicar a aquisição do conhecimento através da

combinação de três elementos básicos: o Sujeito (S); o Objeto do saber (O) e o

Conhecimento como produto do processo cognitivo (C).

3.1 Concepções Sobre a Origem do Conhecimento e a Natureza da Aprendizagem

A corrente racionalista defende a idéia de que o sujeito, ao nascer, já

apresentaria todas as possibilidades do conhecimento definidas por leis

inerentes à razão humana.

Dentro desta perspectiva, o desenvolvimento intelectual é determinado pelo

sujeito e não pelo meio, ou seja, de dentro para fora. Em síntese, o

racionalismo sustenta a teoria de que o conhecimento é anterior à experiência,

sendo fruto do exercício de estruturas racionais pré-formatadas no sujeito.

A lógica, de acordo com o racionalismo, seria uma capacidade inata do

homem. À medida que o ser humano amadurece, ele vai reorganizando sua

inteligência pelas percepções que tem da realidade. Essas percepções

dependem de capacidades que são inerentes ao indivíduo e não dos estímulos

externos.

Porém, entender o processo de aquisição de conhecimento apenas a partir da

concepção racionalista nos leva a perceber o indivíduo apenas a partir da sua

herança genética, gerando assim muitas falhas no processo educacional, uma

vez que estaria negando a teoria de que o aluno é capaz de criar novas

estruturas e a partir delas construir novos conhecimentos.

23

Ao contrário da visão racionalista, a corrente empirista defende a teoria da

tábula rasa (tábula lisa, não escrita) que significava que não existiam idéias

inatas no sujeito (BIGGE, 1977, p. 36). O desenvolvimento intelectual é

determinado pelo meio ambiente, pela força exercida sobre o mesmo. É de fora

para dentro. Nessa linha o indivíduo não nasce inteligente, são os estímulos

externos que desencadeiam reações, as quais ficam sujeitas à assimilação ou

não. O desenvolvimento da inteligência estaria nestes estímulos e não no ser

humano.

O desenvolvimento do empirismo ocorreu na Inglaterra, principalmente nos

séculos XVII e XVIII, com Jonh Locke (1632-1704), determinando que todas as

idéias chegam à pessoa através dos sentidos, sendo a experiência sensorial a

fonte do conhecimento: os órgãos dos sentidos receberiam a estimulação do

mundo exterior e os nervos a conduziriam ao cérebro.

A prática pedagógica relacionada à teoria empirista coloca o professor como

detentor do conhecimento, atuando no sentido de gerar os estímulos para

tornar o aluno inteligente e conhecedor dos conteúdos que ele domina.

Baseado neste pressuposto, a inteligência é concebida como uma faculdade

capaz de armazenar e acumular conhecimento.

Para Piaget, “a percepção oferece-nos, pois, um novo caso de incontestável transição entre as estruturas orgânicas e cognoscitivas”. È “isso que lhe empresta interesse epistemológico, como contacto cognoscitivo mais imediato entre o sujeito e os dados do meio”. O fortalecimento das habilidades humanas não é, portanto, nenhuma mágica. Se, do ponto de vista biológico, mostram-se frágeis, no plano cultural compensam amplamente tais fragilidades. Aquilo que, num primeiro momento (em especial, no bebê), é apenas sensação, nas crianças e nos adultos é experiência interiorizada, imaginação, compreensão, consciência (FREIRE; SCAGLIA, 2003, p. 133)

24

O empirismo, aliado ao positivismo que, por sua vez propõe como ideal de

objetividade a utilização de uma metodologia experimental com vistas à

elaboração de leis gerais, e destes com alguns aspectos da perspectiva

funcionalista, advinda dos estudos da Biologia, fundaram a base

epistemológica e metodológica para o desenvolvimento do behaviorismo,

propiciando a emergência do pressuposto de que todo conhecimento provém

da experiência, ponto de partida das teorias comportamentalistas.

No geral, as teorias comportamentalistas, como o próprio nome já sugere, dão

ênfase ao estudo do comportamento ou as reações observáveis de um

organismo através de respostas a estímulos do meio ambiente, também

observáveis.

O behaviorismo defende a crença da possibilidade do controle objetivo do

estímulo do meio ambiente na determinação de respostas do indivíduo a tais

estímulos. Em síntese, aprender significa, segundo o behaviorismo, exibir

comportamento apropriado; o objetivo da educação nesta perspectiva é treinar

os estudantes a exibirem um determinado comportamento. Para Freire (1985,

p. 38):

A pedagogia para os empiristas é diretiva. O aluno aprende, se e somente se, o professor ensina. O professor acredita no mito da transferência do conhecimento. O professor possui o saber e detém o poder estabelecido por hierarquia: O professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes. O educando recebe passivamente os conhecimentos, tornando-se um depósito do educador (FREIRE, 1985, p. 38).

Os estudos efetuados pelos comportamentalistas foram realizados,

fundamentalmente, em animais. Darwin, citado por Bigge (1977, p. 86), afirma

ainda que não há diferença fundamental entre o homem e os animais

superiores em suas facilidades mentais e físicas. Assim, para ele o

conhecimento reduz-se a respostas musculares, físicas, e como tal, não é um

exercício mental.

25

O principal expoente do behaviorismo foi J. Watson (1878-1958) que defendia

ser possível o controle total do comportamento humano. O trabalho de Watson

influenciou diretamente psicólogos da época, como Pavlov e Thorndike. Ivan

Petrovich Pavlov, contribui com seu famoso condicionamento pavloviano

(condicionamento clássico) que diz que todo comportamento consiste em

algumas reações biologicamente estabelecidas (reações incondicionadas). A

condição para que ocorra a resposta é a associação repetida de dois ou mais

estímulos (BIGGE, 1977, p. 86).

Já a teoria da aprendizagem de Thorndike é chamada teoria da ligação S-R ou

conexionismo. Pressupõe que, pelo condicionamento, respostas específicas

venham a se ligar com estímulos específicos. Thorndike achava, ainda, que o

principal caminho para a formação de conexões do tipo S-R era através de

ensaio e erro ao acaso.

A partir da década de 50 o principal estudioso do Behaviorismo passa a ser

Skinner. Além de um grande talento para a experimentação Skinner teve uma

contribuição teórica fundamental. Ele tornou operacional o conceito de reforço,

a partir do conceito de condicionamento operante, no qual toda história das

experiências passadas é objetivamente considerada e não apenas os

estímulos diretos do ambiente.

No condicionamento operante os professores são considerados arquitetos e

construtores do comportamento dos alunos, são também responsáveis por

fazer com que as crianças pronunciem e escrevam respostas adequadamente.

Os objetivos de aprendizagem são divididos em um grande número de

pequenas tarefas e reforçadas uma a uma.

Também é importante que o intervalo entre a resposta e o estímulo reforçado

seja pequeno para fixação da aprendizagem. Segundo Skinner (apud BIGGE,

1977, p. 154): “a chave para ensinar a pensar eficientemente, assim como a de

qualquer comportamento, é o feedback imediato”.

26

Se para Skinner seria possível uma tecnologia manipuladora do

comportamento, tão precisa quanto a física e a biologia, então o homem, para

ele não pode ser autônomo. As conseqüências disto na prática pedagógica,

logo se fizeram perceber.

Um exemplo disso são os tutoriais dito cursos on-line, cujo ensino é sempre

privilegiado, no sentido de que o conhecimento pode ser passado ao aluno.

Nesta prática, o aluno é visto como um ser passível a manipulação, portanto

passivo e controlado pelo ambiente.

Papert (1994, p. 123) combate amplamente esta prática, que expressa a

crença de que a via para a aprendizagem melhor deve ser o aperfeiçoamento

da instrução, ou seja, softwares educativos que tentam privar o aluno de fazer,

de construir, de experimentar, em suma de ser um aprendiz ativo no processo

da própria aprendizagem, mas pelo contrário sempre privilegiam um ensino

cada vez melhor.

Apesar de concluirmos que o comportamentalismo é uma teoria de base

mecanicista, são muitos os cursos on-line que ainda utilizam este modelo. Uma

possível razão pode ser pelo fato dele ser muito similar ao modo como a

instrução acontece normalmente em sala de aula, onde o instrutor tem um

conjunto de objetivos de lição: aplicar uma aula expositiva, usar exemplos,

proporcionar oportunidades para a prática e testar o conhecimento retido pelos

alunos, sem proporcionar nenhum tipo de interação.

Se não é o ambiente o único responsável, se o sujeito como corpo, mente e

consciência também tem parte ativa no processo do desenvolvimento então é

na interação do sujeito com o ambiente que o desenvolvimento se dá. Este é o

entendimento da corrente interacionista que surge no início deste século tendo

como principais nomes Jean Piaget e Lev Vygotsky.

27

3.2 O Interacionismo Construtivista de Piaget e o Sócio-

Interacionismo de Vygotsky

Jean Piaget foi um dos primeiros estudiosos a pesquisar cientificamente como

o conhecimento era formado na mente de um pesquisador, tomando aqui a

palavra pesquisador o seu sentido mais amplo, uma vez que seus estudos

iniciaram-se com a apreciação de bebês. Piaget observou como um recém-

nascido passava do estado de não reconhecimento de sua individualidade

frente o mundo que o cerca indo até a idade de adolescentes, onde já há o

início de operações de raciocínio mais complexas.

De suas observações, posteriormente sistematizadas com uma metodologia de

análise, denominada o Método Clínico, Piaget estabeleceu as bases de sua

teoria, chamada Epistemologia Genética.

Essa teoria pode ser considerada como uma fusão das teorias já existentes,

pois Piaget não acredita que todo o conhecimento seja, a priori, inerente ao

próprio sujeito (apriorismo), nem que o conhecimento provenha totalmente das

observações do meio que o cerca (empirismo). Segundo o autor:

O conhecimento não precede, em suas origens, nem de um sujeito consciente de si mesmo nem de objetos já construídos (do ponto de vista do sujeito) que a ele se imporiam. O conhecimento resultaria de interações que se produzem a meio caminho entre os dois, dependendo, portanto, dos dois ao mesmo tempo, mas em decorrência de uma indiferenciação completa e não de intercâmbio entre formas distintas (PIAGET, 1972, p. 14).

De acordo com suas teorias, o conhecimento, em qualquer nível, é gerado

através de uma interação radical do sujeito com seu meio, a partir de estruturas

previamente existentes no sujeito. O sujeito interage com o meio, respondendo

a estímulos externos, observando, organizando e construindo um

conhecimento.

28

Ao construir o conhecimento o sujeito atua sobre o objeto modificando-o e ao

mesmo tempo recebe a atuação do objeto enquanto trabalha na construção.

Esta prática reconhece o aluno como não-neutro, detentor de conhecimentos

prévios e de uma história capaz de agregar conhecimentos em sua relação

com o professor que é um orientador e co-participante do processo.

A relação entre estas duas partes S / O se dá através de um processo de dupla

face, denominado por Piaget de adaptação, o qual é subdividido em dois

momentos: a assimilação e a acomodação. Por assimilação, entende-se as

ações que o indivíduo irá tomar para poder internalizar o objeto, interpretando-o

de forma a poder encaixá-lo nas suas estruturas cognitivas, ou seja, quando a

criança tem novas experiências (vendo ou ouvindo coisas novas) ela tenta

adaptar esses novos estímulos às estruturas cognitivas que já possui. O

próprio Piaget (1996, p. 13), define assimilação como:

[...] uma integração à estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, isto é, sem serem destruídas, mas simplesmente acomodando-se à nova situação (PIAGET, 1996, p. 13).

Já a acomodação acontece quando a criança não consegue assimilar um novo

estímulo, ou seja, não existe uma estrutura cognitiva que assimile a nova

informação em função das particularidades desse novo estímulo. Diante deste

impasse, restam apenas duas saídas: criar um novo esquema ou modificar um

esquema existente.

Ambas as ações resultam em uma mudança na estrutura cognitiva. Ocorrida a

acomodação, a criança pode tentar assimilar o estímulo novamente, e uma vez

modificada a estrutura cognitiva, o estímulo é prontamente assimilado.

Segundo as palavras de Piaget (1996, p. 18):

[...] chamaremos acomodação (por analogia com os “acomodados’’ biológicos) toda modificação dos esquemas de assimilação sob a influência de situações exteriores (meio) ao quais se aplicam (PIAGET, 1996, p. 18).

29

Destas sucessivas e permanentes relações entre assimilação e acomodação

(não necessariamente nesta ordem) o indivíduo vai "adaptando-se" ao meio

externo através de um interminável processo de desenvolvimento cognitivo.

Por ser um processo permanente, e estar sempre em desenvolvimento, esta

teoria foi denominada de "Construtivismo", dando-se a idéia de que novos

níveis de conhecimento estão sendo indefinidamente construídos através das

interações entre o sujeito e o meio.

Para que um ambiente de ensino seja construtivista é fundamental que o

professor conceba o conhecimento sob a ótica levantada por Piaget, ou seja,

que todo e qualquer desenvolvimento cognitivo só será efetivo se for baseado

em uma interação muito forte entre o sujeito e o objeto.

É imprescindível que se compreenda que sem uma atitude do objeto que

perturbe as estruturas do sujeito, este não tentará acomodar-se à situação,

criando uma futura assimilação do objeto, dando origem às sucessivas

adaptações do sujeito ao meio, com o constante desenvolvimento de seu

cognitivismo.

Desta forma, para o desenvolvimento de um conhecimento, na forma como

Piaget teorizou, existem alguns pressupostos básicos de sua teoria que devem

ser levados em conta. A primeira das exigências é que o ambiente permita, e

até obrigue, uma interação muito grande do aprendiz com o objeto de estudo.

Esta interação, contudo, não significa apenas o apertar de teclas ou o escolher

entre opções de navegação, a interação deve passar além disto integrando o

objeto de estudo à realidade do sujeito, dentro de suas condições, de forma a

estimulá-lo e desafiá-lo, mas ao mesmo tempo permitindo que as novas

situações criadas possam ser adaptadas às estruturas cognitivas existentes,

propiciando o seu desenvolvimento. Segundo Becker (1993, p. 122):

30

A aprendizagem do aluno só acontece na medida em que este age sobre os conteúdos específicos e age na medida em que possui estruturas próprias, previamente construídas ou em construção. Portanto, “a construção do conhecimento envolve conteúdos específicos e conteúdos estruturais” (BECKER, 1993, p. 122).

O desenvolvimento das estruturas da inteligência é analisado por Piaget por

períodos denominados estágios, os quais se desenvolvem em ordem

seqüencial, num processo contínuo de construção progressiva do pensamento

lógico.

Segundo Piaget, na fase do estágio sensório-motor, o campo da inteligência da

criança aplica-se a situações e ações concretas. Trata-se do período em que

há o desenvolvimento inicial das coordenações e relações de ordem entre

ações. É também o período da diferenciação entre os objetos e o próprio corpo.

A fase em que as crianças começam a reproduzir imagens mentais é o Estágio

pré-operatório. Elas usam um pensamento intuitivo que se expressa numa

linguagem comunicativa, mas egocêntrica, porque o pensamento delas está

centrado nelas mesmas.

Já no estágio operatório concreto as crianças são capazes de aceitar o ponto

de vista do outro, levando em conta mais de uma perspectiva. Podem

representar transformações, assim como situações estáticas. Têm capacidade

de classificação, agrupamento, reversibilidade e conseguem realizar atividades

concretas, que não exigem abstração.

E por último, o estágio das operações formais é a fase de transição para o

modo adulto de pensar. É durante essa fase que se forma a capacidade de

raciocinar sobre hipóteses e idéias abstratas. Nesse momento, a linguagem

tem um papel fundamental, porque serve de suporte conceitual.

31

Outro aspecto relevante nas teorias construtivistas é a quebra de paradigmas

que os conceitos de Piaget trazem, é a troca do repasse da informação para a

busca da formação do aluno; é a nova ordem revolucionária que retira o poder

e autoridade do mestre transformando-o de todo poderoso detentor do saber

para um educador-educando, segundo as palavras de Paulo Freire, e esta

visão deve permear todo um ambiente construtivista.

Para Becker (1997, p. 13):

Nesta acepção, a aprendizagem como parte do processo mais amplo da educação não pode ser unidirecional no sentido educador-educando, pois como tal seria domesticadora e não libertadora; deve transitar em ambos os sentidos, dialeticamente, de tal modo que o educador, além de ensinar, passa a aprender e o educando, além de aprender, passa a ensinar (BECKER, 1997, p. 13).

Assim, o professor construtivista é aquele que questiona e coloca desafios

constantemente para os alunos, deve ter sempre perguntas a fazer. Se o

professor não faz perguntas, ele não tem curiosidades, e, por conseguinte, não

tem novidades.

Se o professor conhece o aluno através dos questionamentos, ele terá sempre

perguntas a fazer e o aluno estará assim construindo suas estruturas,

desenvolvendo a sua inteligência. Essa comunicação é dita por Paulo Freire de

teoria dialógica e é fundamental no desenvolvimento intelectual.

Em uma abordagem construtivista, o erro é também uma importante fonte de

aprendizagem, o aprendiz deve sempre se questionar sobre as conseqüências

de suas atitudes e a partir de seus erros ou acertos ir construindo seus

conceitos, ao invés de servir apenas para verificar o quanto do que foi

repassado para o aluno foi realmente assimilado, como é comum nas práticas

empiristas.

32

Toda vez que se pensa sobre algo, se constrói conhecimento e isto significa

refazer aquela estrutura que estava ali até aquele momento. Ainda segundo

Freire, a condição para que os professores passem da visão empirista ou

apriorista para o construtivismo está na interação, também conhecida por

Piaget como colaboração.

Essa interação se dá através do entendimento compartilhado e da solução

conjunta de problemas. Tem-se assim a possibilidade de uma epistemologia

construída na superação do senso comum.

Enfim, um ambiente de aprendizagem que vai proporcionar justamente isso, a

atuação e interação, é preciso ter além de uma conduta de acordo com as

descobertas de Piaget, considerar o pensamento de Vygotsky que julga

decisivo para a aprendizagem, além da atividade mental e suas conseqüentes

funções psíquicas, a realidade histórico-cultural do indivíduo, levando em conta

seu tempo e seu espaço.

Nesse sentido, as atividades em grupo ou em duplas nos nas aulas devem ser

valorizadas, pois favorecem a criação de Zonas de Desenvolvimento Proximal,

que se traduz. Para Menezes (1993, p. 166):

Na distância entre o nível de desenvolvimento real que se costuma determinar através da solução independente de problemas e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (MENEZES, 1993, p. 166).

Ainda segundo Menezes (1993, p. 113):

Esta concepção vem permitindo mudanças no ambiente de aprendizagem, principalmente quanto à adoção de metodologias voltadas para o reconhecimento da identidade cultural do aluno (MENEZES, 1993, p. 113).

33

Portanto, é imprescindível, para o facilitador, o conhecimento sobre o aluno, a

sua história, o seu meio, a sua forma e o seu estilo de interagir e construir o

conhecimento. A partir disso, é possível atuar na sua zona de desenvolvimento

proximal, levando-o a dar passos de seu nível de desenvolvimento real, para o

nível de desenvolvimento potencial.

34

CONCLUSÃO

O estudo dos processos de construção de conhecimento e de aprendizagem

por meio do desenvolvimento da psicomotricidade em aulas de Educação

Física proporcionado por jogos e brincadeiras demonstram que muitas escolas

ensinam ainda com a mesma didática empregada há mais de meio século.

Apesar de teóricos como Vygotsky, Freire e Piaget apontarem para a ênfase na

aprendizagem em processos educacionais, ou seja, com foco em que aprende,

sabe-se que a realidade, em muitas instituições, dá-se maior ênfase ao ensino

e, portanto, ao professor, tido como detentor do conhecimento e representante

dos valores institucionais hierárquicos.

A repetição contida nos jogos e brincadeiras aperfeiçoam as assimilações

presentes na construção do conhecimento. Assim, a criança se senter

estimulada a seguir adiante, experimentando, inovando, tentando dominar

novas técnicas e atingir novos níveis e patamares.

O papel do professor é criar condições para que o alunopossa inovar e

experimentar rumo ao desconhecido, conhecendo e superando os seus limites,

incorporando novas técnicas e novos modos não automáticos nas suas

práticas.

Por meio das brincadeiras e jogos a criança se torna capaz de desenvolver

possibilidades particulares emergentes, concretizando ações que antes eram

meras potencialidades, auxiliando na contrução do conhecimento acerca do

seu corpo e das formas de utilizá-lo.

35

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