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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA A CONSTRUÇÃO MORAL DA CRIANÇA Por: Andrea Oliveira do Espirito Santo Sampaio Orientador Professora Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2015 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A CONSTRUÇÃO MORAL DA CRIANÇA

Por: Andrea Oliveira do Espirito Santo Sampaio

Orientador

Professora Fabiane Muniz

Rio de Janeiro

2015

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

A CONSTRUÇÃO MORAL DA CRIANÇA

Apresentação de monografia à AVM

Faculdade Integrada como requisito parcial

para obtenção do grau de especialista em

Psicopedagogia Institucional.

Por: Andrea Oliveira do Espirito Santo

Sampaio

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AGRADECIMENTOS

Agradeço única e exclusivamente as

pessoas que mais amo na vida, meus

filhos, Pedro e Camila e ao meu

marido Guilherme Sampaio.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho as minhas

amadas irmãs, Ana Paula Oliveira e

Amanda Oliveira, e a minha querida

amiga e psicóloga, Flávia Freitas.

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RESUMO

Esta pesquisa teve por objetivo discutir as razões que leva a criança construir a consciência moral, ou seja, como se dá a construção moral da criança e o papel do psicopedagogo nessa construção.

Sendo assim, buscou-se reflexão por parte dos psicopedagogos e suas práticas em relação à construção moral da criança.

Conclui-se que a formação moral e ética é um processo cultural, social e histórico. Entretanto, consideramos a importante influência do educador nessa construção.

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METODOLOGIA

A metodologia utilizada foi de caráter bibliográfico considerando que alguns

teóricos foram fundamentais neste processo, dentre eles: Alicia Fernandez; De La

Taille, Paulo Freire, que possibilitaram discutir várias questões como, valores ético e

moral, a construção da autonomia e os desafios da educação para formar sujeitos

autônomos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................... 8

CAPÍTULO I - MORAL E ÉTICA ...............................................................9

CAPÍTULO II -. CONDUTA INDICIPLINAR............................................... 16

CAPÍTULO III - CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA..................................24

CAPÍTULO IV - O PAPEL DA ESCOLA E DO PICOPEDAGOGO.......... 28

CONCLUSÃO.......................................................................................32

BIBLIOGRÁFIA...........................................................................................34

INDICE........................................................................................................36

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INTRODUÇÃO

As diversas e rápidas transformações que ocorrem no mundo atualmente

exigem dos psicopedagogos uma constante reflexão sobre o rumo do nosso ofício

em toda a sua amplitude. Ainda não se é possível definir uma teoria única sobre a

formação moral e intelectual das crianças nem, tão pouco, uma prática única e

permanente.

Acreditamos que o processo de formação de valores morais e éticos não

acontece em uma única etapa da vida da criança, mas através de um processo

permanente que é influenciado diretamente pela cultura. Desta maneira,

consideramos a escola , um espaço de socialização ,um lugar privilegiado para a

formação destes valores morais e éticos.

No entanto, percebemos que em sua grande maioria, a preocupação maior ,

baseia-se na busca de aprovação no vestibular, deixando para segundo plano, a

formação de seus alunos como cidadãos críticos e conscientes.

Sabemos que a escola sozinha não poderá transformar esta realidade. Mas,

não podemos desconsiderar sua importância para a formação desses cidadãos.

A todo o tempo se tenta eleger uma forma ideal para educarmos nossos

alunos, porém, sabemos que não há um só caminho. Sob esse aspecto, procurei

trazer neste trabalho monográfico a importância dos limites e suas regras, assim

como, o difícil papel da escola em trabalhar a construção da autonomia de seus

alunos sem perder a autoridade.

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CAPÍTULO I

MORAL E ÉTICA

Neste capítulo trataremos da ética e da moral como dois aspectos, social e

histórico. Utilizou-se como autores principais que sustentam o texto (Comte-

Sponville (2003) ; (La Taille,1999)

Moral e ética são dois conceitos subjetivos, então, entenderemos abaixo os

seus significados.

“...moral e ética vêm de duas palavras – éthos, em grego, mos ou

mores, em latim – que significavam mais ou menos a mesma coisa (os

modos, os caracteres, as maneiras de viver e de agir) e que os antigos

consideravam como tradução uma da outra...” (Comte-Sponville, 2003,

p.220)

Percebemos que estes conceitos estão ligados à ideia de justiça e a maneira

de pensar e de viver das pessoas e são, quase sempre, essência de seu caráter.

Alguns escritores definem caráter como uma herança genética, ou seja,

acreditam que a pessoa nasce boa ou má.

“Se fosse possível alterar o caráter, a gente mesmo o plasmaria a bel-

prazer, seria senhor da natureza. Experimentai inspirar gosto à música

a quem careça de gosto e de ouvido. Não tereis melhor resultado do

que se empreenderes dar vista a cego de nascença.” (Voltaire, p.68)

Outros porém, acreditam na ideia de que a elite social deve definir uma moral

que estabeleça o controle sobre as ações das pessoas.

“...acredito que só cabe aos soberanos, ou àqueles autorizados por

eles, pôr-se a regulamentar os costumes dos outros.” (Descartes, Carta

a Chanut – apud: Grateloup, 2004, p.185)

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Vygotsky ressalta o papel da socialização na formação da pessoa, pois

considera as ações do outro e do grupo como propulsores da evolução do

pensamento de cada um.

Consideramos que o julgamento de valor da pessoa está ligado à sua cultura,

às suas condições sociais e ao seu momento histórico, não acreditamos que moral e

ética sejam inatas ou previamente determinadas.

Para que possa viver em sociedade, o homem precisa recorrer à sua razão

para resolver seus conflitos. E para que possa viver racionalmente, o homem precisa

recorrer à vida social.

Wallon deu destaque especial à importância do outro na formação da

identidade da pessoa. É através da oposição ao outro e da identificação com o outro

que eu me reconheço como “eu”. É através da aprovação e admiração do outro por

mim que consigo também admirar a mim mesmo. É através do espelhamento no

outro que amplio minhas possibilidades de ser. “A expulsão e incorporação do outro

são movimentos complementares e alternantes no processo de formação do eu”.

(Galvâo, 1995, p.55)

Através da identificação do outro com seu semelhante e, ao mesmo tempo,

pelo reconhecimento das diferenças, podemos aprender a respeitá-lo e a respeitar a

nós mesmos. Aprender assim a viver neste mundo.

Entendemos que a sociedade precisa de regras morais para sobreviver e que

o homem se desenvolve numa cultura que tem regras pré-estabelecidas. Através da

razão, os homens criam e recriam suas leis. E é com essa razão que respeitam ou

desrespeitam as leis estabelecidas.

Estas leis, impostas e ao mesmo tempo criadas pela sociedade, são onde se

encontram discussões sobre moral e ética.

Vamos tentar entender como a moral e a ética, estão presentes na vida das

pessoas.

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O psicólogo Yves de La Taille pesquisa o tema do desenvolvimento moral

desde a década de 1980 e nos traz a idéia de quatro dimensões que permeiam as

ações do homem.

A primeira dimensão é da ciência, da tecnologia, da arte e da economia, seria

a dimensão do saber fazer.

A segunda dimensão seria política e jurídica. Esta é a dimensão das leis

sociais e é reguladora da primeira dimensão.

A terceira seria a dimensão moral. Ele nos diz que não há sociedade sem

moral e que uma sociedade moralmente fraca é uma sociedade em crise. A

responsabilidade moral diz respeito a princípios interiores e regula a dimensão

política e jurídica. Esta seria a dimensão do pensar sobre a regra: porque existe,

porque respeitá-la, porque não respeitá-la...

A quarta e última dimensão seria a dimensão ética, reguladora maior de todas

as outras. Enquanto a dimensão moral diz respeito a como agir, a dimensão ética diz

respeito a como viver. Para La Taille, a ética pode ser entendida como o próprio

sentido da vida, o sentido que cada um dá para a vida.

Quando falamos de uma pessoa moralmente responsável, pensamos em

alguém que consiga agir de acordo com seus princípios, pensando sobre seus atos,

suas conseqüências e se responsabilizando por elas.

O que torna adultos moralmente autônomos? A resposta de Piaget a esta

pergunta era a de que os adultos reforçam a heteronomia natural das

crianças, quando usam recompensas, e estimulam o desenvolvimento da

autonomia quando intercambiam ponto de vista com as crianças. Não pode

haver moralidade quando se considera apenas o próprio ponto de vista.

(Kami,1999,p.103)

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Viver em sociedade é praticar a capacidade de respeitar e se respeitar.

Porém sabemos que não nascemos com essa capacidade, aprendemos durante a

vida. É preciso aprender o valor do respeito, é preciso aprender a conviver.

Para entender como acontece o processo de construção moral, buscamos

aos estudos de Jean Piaget.

Piaget (1932 apud ARAÚJO, 1996, p.103) define a moral como “um sistema

de regras, e a essência de toda moralidade deve ser procurada no respeito que o

indivíduo adquire por estas regras”. A partir dessa definição, Piaget escolheu o jogo

para suas pesquisas.

De acordo com Piaget:

Os jogos de regras representam uma atividade interindividual, regulada por

certas normas que, embora geralmente herdadas das gerações anteriores,

podem ser modificadas pelos membros de cada grupo de jogadores. Em

segundo lugar, embora tais normas não tenham em si um caráter moral, o

respeito a elas devido é, ele sim, moral (e envolve questões de justiça e

honestidade). Finalmente, tal respeito provém de mútuos acordos entre os

jogadores, e não de mera aceitação de normas impostas por autoridades

estranhas à comunidade de jogadores. (1992, apud La Taille,1999

p.50)

Piaget queria entender como a criança internaliza a regra e como ela reage

frente às situações de conflito que ocorrem frequentemente nas brincadeiras em

grupos.

Piaget definiu três fases diferentes no desenvolvimento moral do sujeito. A

primeira seria a fase da anomia, ou seja, o não entendimento e a rejeição das

regras.

A segunda seria a heteronomia. A pessoa heterônoma aceita regras impostas

por outras pessoas ou instituições, mesmo sem saber a origem exata destas regras

e o porque delas existirem.

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No início do desenvolvimento moral, quando a criança ainda está

submetida a uma relação de coação, tudo é dever e obediência ao dever.

Encontra-se este sentimento do sagrado, ilustrado pela interpretação da

imutabilidade das regras (mesmo as dos jogos) e pela opção pelas

sanções expiatórias, expressão de uma autoridade que tem legitimidade

para impor sofrimentos diversos aos infratores. (La Taille, 1992, p.60).

A terceira fase seria quando a pessoa conquista a capacidade de se

autogovernar. Agora ela toma decisão sozinha, por acreditar que está fazendo o

melhor para si e para os outros, e não pelo medo de sanções ou pelo ganho de

recompensas. É o que Piaget chama de autonomia moral.

Para Piaget, a moralidade vem da razão. É a razão que permite que a pessoa

reconheça o respeito mútuo como valor para si e decida, livremente, dedicar-se a

ele.

De acordo com os estudos de Piaget, punições e recompensas não são

efetivas na construção da autonomia moral. O sistema de punições e recompensas

só reforça a heteronomia. A criança que sabe que terá um castigo, provavelmente,

avalia pagar ou não por isso. Quando age para ganhar recompensas, a criança não

está agindo de acordo com o que pensa, mas sim em função de um premio.

As relações de coação são sempre desiguais em poder e têm força contrária

ao desenvolvimento da autonomia moral. O sujeito “coagido” não tem a possibilidade

de legislar. “por mais que os pais procurem não ser autoritários, as dependências

vital, afetiva e cognitiva de seus filhos pequenos definem uma relação assimétrica”

(La Taille, 1992, p.59).

A partir dos conceitos de relação de coação e relação de cooperação, Piaget

afirma as origens, respectivamente, do dever e do bem. Para ele, as pessoas

precisam desenvolver estes dois aspectos da moralidade: o dever e o bem.

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Na heteronomia, o dever determina o bem (é bom o que é conforme as

regras aprendidas), na autonomia, o bem determina o dever (deve-se agir

de uma determinada forma porque é bom). (La Taille, 1992, p.60).

Podemos concluir então, de acordo com as teorias de Piaget, que é somente

na construção de relações de cooperação que nos encaminhamos para a

construção de uma sociedade mais justa.

É na vivência das relações de cooperação que podemos desenvolver noções

de justiça. A moral que buscamos é a moral da justiça e do respeito entre as

pessoas.

Para Durkheim, toda regra moral tem um caráter de obrigatoriedade ou seja, o

dever precisa parecer bom para que seja obedecido. “Perseguir um fim que nos

deixa frios, que não nos parece bom, que não toca nossa sensibilidade, é

psicologicamente impossível”. (DURKHEIM apud: LA TAILLE, 1992, p.55).

Durkheim considera a sociedade como uma força grandiosa. Para ele, a

sociedade nos impõe as leis que devem ser respeitadas: “elas não são nossa obra,

e, por conseguinte, conformando-nos a elas, obedecemos a uma lei que não

fizemos” (Durkheim apud La Taille, 1992, p.56). Durkheim acredita que a autonomia

moral esteja, então, em conhecer as leis morais, saber o sentido de sua existência e

respeitá-las por convicção e não por submissão.

Durkheim ainda defende que a educação moral é parte integrante de toda a

vida coletiva; o desenvolvimento moral das crianças depende da ação dos adultos; a

moral deve ser precisa e as regras inflexíveis; a criança precisa conhecer o porque

das regras; deve-se desenvolver na criança o gosto pela regularidade; defende

também a ideia de que o desenvolvimento moral e intelectual da criança se dá pela

interiorização da cultura vigente, de fora para dentro. É neste ponto que está a maior

discordância entre os dois autores.

Piaget concorda com Durkheim num ponto essencial: a moral é um fato

social, e, portanto, uma consciência puramente individual não seria capaz

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de elaborar e respeitar regras morais. Todavia, Piaget recusa-se a pensar

a sociedade como um “ser” (“ser coletivo”). Para ele, assim como não

existe O Indivíduo, pensado como unidade isolada, também não há A

Sociedade, pensada como um todo ou um ente ao qual uma só palavra

pode remeter. Existem, isto sim, relações interindividuais, que podem ser

diferentes entre si e, decorrentemente, produzir efeitos psicológicos

diversos. (La Taille, 1992, p.58).

As relações de cooperação são equilibradas em poder e requerem, dos

sujeitos, a compreensão do pensamento do outro para que possam realizar acordos.

Nas relações de cooperação, as regras não são pré-estabelecidas, mas sim

construídas pelos sujeitos através destes acordos que fazem, portanto favorecem o

desenvolvimento do respeito e da autonomia moral. “Para Piaget, as relações entre

crianças promovem a cooperação, justamente por se configurarem como relações a

serem constituídas entre seres iguais” (La Taille, 1992, p.59).

É inegável o papel da Razão nas condutas morais individuais: somente sua

presença pode explicar porque certas pessoas, em certos momentos,

tomam decisões que contrariam a moral do grupo a que pertencem ou se

erguem contra autoridades até então incontestadas... Não se está

afirmando que tais decisões são puramente individuais no sentido em que

não teriam sido de forma alguma influenciadas por fatores culturais; mas

há de se reconhecer que ocorre uma elaboração racional cujos resultados

dão força e coragem ao indivíduo para se comportar de maneira desviante.

Ou seja, eles estão certos de estarem agindo de modo correto. (La Taille,

1992, p.69)

Portanto, acreditamos que as relações de cooperação facilitam o exercício

deste raciocínio e contribuem para o sentimento do bem, na medida em que exigem

que as pessoas troquem pontos de vista, considerem e ponderem a posição do

outro, admitam as diferenças, negociem e aprendam a respeitar e a fazer-se

respeitar.

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CAPÍTULO II

CONDUTA INDICIPLINAR

Este capítulo estuda a falta de disciplina por parte dos alunos. Utilizou-se

como autores principais que sustentam o texto, Bakthin (2000); Cadorin 2001;

Estrela (1994); Gallo (1999); La Taile (1999)

A falta de disciplina é um dos maiores problemas educacionais que a escola

encontra, e quem está diretamente vivenciando este problema é o professor.

De acordo com Estrela:

O tempo que o docente gasta na manutenção da disciplina, o desgaste

provocado pelo trabalho num clima de desordem, a tensão provocada pela

atitude defensiva, a perda do sentido da eficácia e diminuição da auto-

estima, levam a sentimento de frustração e desânimo e ao desejo de

abandono da profissão. (1994, p.97)

Muitos professores não conseguem atuar de forma organizada, devido a este

comportamento indisciplinado dos alunos. Entendem que a família deveria

proporcionar condições para que as crianças possam se relacionar socialmente em

outros ambientes.

Num momento de aviamento e de desvalorização do trabalho do professor

em todos os níveis, a pedagogia da autonomia nos apresenta elementos

constitutivos da compreensão da prática docente enquanto dimensão social

da formação humana... Freire adverte-nos para a necessidade de

assumirmos uma postura vigilante contra todas as práticas de

desumanização. (Oliveira,1996, apud: Freire, 1996, p.11)

Para Estrela (1994) a indisciplina pode ser uma reação do aluno decorrente a

falta de interesse, insatisfação, inadaptação, frustrações ou revolta. Para ela é

importante que se discuta com os alunos a importância das regras e sua importância

nos ambientes sociais, principalmente dentro da escola. Os alunos devem envolver-

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se efetivamente na elaboração dessas regras, para que possam ter sentido para ele.

Quando participam da sua elaboração, a tomam como sua, e por isso têm o

compromisso de cumpri-la. O aluno deve ter a possibilidade de expor suas idéias e

críticas com a intenção de apontar e discutir situações ocorridas dentro da instituição

e possíveis soluções.

Vejamos outro conceito de indisciplina que envolve até mesmo a

prática dos professores dado por Casamayor, apud, Aquino (2006).

Entende-se por indisciplina, os comportamentos disruptivos graves que

supõem uma disfunção da escola. Os comportamentos indisciplinados

simplesmente obedecem a uma tentativa de impor a própria vontade sobre

a do restante da comunidade. Se for um aluno dizemos que ele é difícil,

indisciplinado, diferente... Se for o professor, dizemos simplesmente que é

autoritário. Também se entende por indisciplina as atitudes ou

comportamentos que vão contra as regras estabelecidas, as normas do

jogo, o código da conduta adotado pela escola para cumprir sua missão:

educar e instruir (p.15)

A relação professor-aluno é fundamental para o desenvolvimento da

autonomia. Juntamente com o psicopedagogo, os professores devem avaliar a

conduta indisciplinar, ouvindo seus descontentamentos, refletir sobre a situação e

intervir, pois esta situação muitas vezes propiciar ao aluno seu afastamento da sala

de aula, a falta de compreensão e interesse por conteúdos, bem como interferência

no seu processo de aprendizagem.

Não se adquire postura por meio de discurso. Exemplificando: não é com

intermináveis aulas de ética, nas quais um professor apresenta e repete os

preceitos morais da sociedade, que o aluno conseguirá assumir, em sua

vida, posturas moralmente corretas pautadas por estes preceitos. (Gallo,

1999, pg. 29)

Na busca da organização do ambiente de aprendizado, historicamente

destaca-se a repressão pelo medo, pelo uso da força e pelo discurso vazio. Este é

um caminho que não acreditamos formar sujeito autônomo, capaz de desempenhar

seus direitos e deveres na sociedade. Pelo contrário, alimenta-se a heteronomia, já

que, neste caso, as regras são impostas de fora para dentro.

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Assim, o indivíduo age de determinada forma, não pelo entendimento direto

da importância de sua atuação, mas sim em função de prêmios ou punições que

poderá obter.

A formação do aluno jamais acontecerá pela assimilação de discursos, mas

sim por um processo microssocial em que ele é levado a assumir posturas

de liberdade, respeito, responsabilidade, ao mesmo tempo em que percebe

essas mesmas práticas nos demais membros que participam deste

microcosmo com que se relaciona no cotidiano. Uma aula de qualquer

disciplina constitui-se, assim, em parte do processo de formação do aluno,

não pelo discurso que o professor possa fazer, mas pelo posicionamento

que assume em seu relacionamento com os alunos, pela participação que

suscita neles, pelas novas posturas que eles são chamados a assumir. É

claro que esse processo não fica confinado à sala de aula; todas as

relações que o aluno trava no ambiente escolar – com outros alunos, com

funcionários, com o staff administrativo, enfim, com toda a comunidade –

são passos na construção de sua personalidade.

Para formar integralmente o aluno não podemos deixar de lado nenhuma

dessas facetas: nem a sua instrumentalização, pela transmissão dos

conteúdos, nem sua formação social, pelo exercício de posturas e

relacionamentos que sejam expressão da liberdade, da autenticidade e da

responsabilidade. A esse processo global podemos, verdadeiramente,

chamar de educação”. (Gallo, 1999, p.20)

Contudo, na busca da construção da autonomia moral dos alunos, deve-se

cuidar para que o limite entre a autonomia e a anomia não seja transposto.

É importante incentivar a atuação direta do sujeito sobre as regras que regem

seu cotidiano, porém não se pode esquecer que estas regras devem ser pautadas

em princípios éticos, que fazem parte da filosofia da instituição. É importante que

estes princípios sejam debatidos na comunidade escolar, mas não se pode abrir

mão deles.

Retomando o que dissemos antes, acreditamos que a organização do

ambiente social é fundamental para o desenvolvimento da aprendizagem. Porém, a

organização que se dá através das práticas opressivas não é considerada positiva

para a formação sujeito.

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Muitos alunos se sentem desmotivados em ir à escola, não conseguem

construir conhecimentos. Isso contribui para a falta de disciplina, crianças que não

se interessam pela aula, ficam dispersas e tumultuam a sala de aula e isto interfere

no seu processo de ensino-aprendizagem, criando um ciclo vicioso.

Cabe ao professor desenvolver uma prática pedagógica estimulante de modo

que o aluno aprenda com prazer, pois assim contribuirá para que os alunos fiquem

mais participativos.

A escola, visando que seus alunos construam autonomia moral, precisa

proporcionar este espaço de discussão, onde o aluno seja sujeito ativo. Para tanto,

faz-se necessária a promoção do diálogo entre os vários atores do cotidiano escolar.

Aqui, trazemos um pouco da teoria de Bakthin (2000) que nos lembra que o

verdadeiro diálogo só acontece quando existem trocas ricas entre os indivíduos

envolvidos. Além disso, a construção de um sujeito está diretamente relacionada às

trocas que estabelece com os outros.

Para que o diálogo aconteça é preciso que se considere o “outro” como um

sujeito de direitos, capaz de produzir conhecimento, soluções e transformar a sua

realidade. Isto quer dizer que, na escola, o aluno precisa ser ouvido com atenção.

Ele precisa perceber o ambiente escolar como um espaço seu, como um espaço de

múltiplas interações, onde sua voz seja considerada e onde ele precise também

ouvir e refletir sobre pontos de vista diferentes do seu, onde o confronto entre as

diferenças seja um ponto de partida para o debate e a busca de um consenso.

Segundo Bakhtin (2000), o diálogo propicia o desenvolvimento do

pensamento, ou seja, as práticas sociais impulsionam o conhecimento.

Sendo assim trata-se de um desafio para o professor servir de modelo, tendo

bastante coerência e firmeza em suas atitudes.

Para Tiba (1996, p.123): “interação é a palavra da moda. Ensinar é um dividir

que soma, que enriquece professor e aluno. O abuso do poder pelo saber é

medíocre, já que a ignorância pode ser transitória”. Com isso podemos perceber que

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o papel do professor não deveria ser mais aquela figura autoritária detentora do

saber, hoje ele deve ensinar e aprender. Juntos professor, psicopedagogo e aluno

devem caminhar para a construção do conhecimento. O aluno deve ter a sua vez de

expor opiniões, experiências, e estar mais atuante na escola.

2.1 LIMITES: UM PROBLEMA CONTEMPORÂNEO

Utilizei o dicionário da Língua Portuguesa, Aurélio, para elucidar a palavra

limite, que traz em alguns de seus significados: linha de demarcação, fronteira, parte

ou ponto extremo. Sendo assim, entendemos que para se viver em sociedade é

necessário que sejam estabelecidos limites, pautados em regras claras.

La Taille (1999) afirma que o convívio social exige regras, para que seja

possível a vida em sociedade.

Colocar limites é uma maneira de ajudar à criança a modificar seu

comportamento sem prejudicar sua auto-estima. Consiste, fundamentalmente, em

“delimitar o terreno”, para que a outra pessoa possa diferenciar o que é permitido e o

que é proibido.

Estudos realizados por Yves De La Taille (1998) indicam a presença de três

conceitos de limites: o limite a ser imposto, o limite a ser transposto e o limite a ser

respeitado.

O primeiro, limite a ser imposto, é "... um tipo bem específico de limite que a

criança precisa construir para aprender a se defender: aquele que preserva sua

intimidade" (De La Taille, 1998, p. 12).

O segundo, limite a ser transposto, diz respeito aos desafios que a criança

precisa superar. "... não é a pura maturação biológica que explica o

desenvolvimento, mas sim as múltiplas interações com o meio físico e social" (De LA

TAILLE,1998, p. 14).

No terceiro conceito, limite a ser respeitado, La Taille aponta dois tipos: o

primeiro é em relação ao limite do próprio corpo, onde é necessário respeitar as

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fronteiras "... situar sua liberdade em relação às leis físicas" (De La Taille, 1998, p.

52). O segundo tipo de limite a ser respeitado tem origem externa, é imposto pela

sociedade, garante o bem-estar de todos e são adquiridos através da convivência

social. (De La Taille, 1998, p. 94)

Sabemos que a criança pequena tem necessidades básicas, seu organismo

estabelece um ritmo biológico, que por sua vez, demanda a construção de uma

rotina.

Segundo Tiba (1996), a alimentação é um dos ritmos mais importantes nos

primeiros dias de vida da criança.

É preciso que os pais entendam essa necessidade e construam uma rotina

com seus filhos. Para Tiba:

Lidar com esse ritmo biológico de um modo que não o desrespeite é a

primeira providencia para obter disciplina. Depois, quanto mais os filhos

crescem, mais recursos terão os pais de adequar o ritmo biológico ao

ambiente.

Entendida como um conjunto de comportamentos que leva ao melhor

resultado possível, beneficiando a todos, a disciplina estabelece seu

caminho nos primeiros meses de vida da criança. (1996, p.32)

A capacidade da criança de se relacionar bem em sociedade está inicialmente

ligada à orientação que os pais dão no sentido de aceitar os limites determinados,

desde pequenos. Para Rossini:

Quanto mais cedo começarmos a estabelecer os limites, melhor. Não que na

adolescência isto seja tarefa impossível, mas é mais complexa, pois o

adolescente já tem a base da vida adulta formada. Por isso, o ideal é que os

limites sejam incorporados às atitudes das crianças. (2001, p.20).

Um dos aspectos que envolvem as questões sobre limites, é a construção da

autonomia da criança.

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De acordo com Piaget, o homem é submetido a influencia do meio, (1932,

apud LA TAILLE, 1999, p.50) de que “o homem é um ser essencialmente social,

impossível, portanto, de ser pensado fora do contexto da sociedade em que nasce e

vive”. Piaget entende que a inteligência só se desenvolve mediante as interações

sociais, sendo a família e a escola ambientes em que o homem mais interage.

Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio família significa: pessoas

aparentadas que vivem na mesma casa, particularmente pai, mãe e os filhos.

Normalmente a criança cresce neste contexto, até que ela mesma forme sua família.

É a família que transmite sua cultura e ensina a criança viver em sociedade.

Sendo assim espera-se que os pais, eduquem seus filhos, até que cheguem à

idade adulta. É na família que a criança aprende os valores socialmente aceitos, é

onde o indivíduo aprende a cultura do seu lar.

Para Cruz (1997, p.33):

A família é formadora do indivíduo; ela determina em parte o

desenvolvimento e organiza a vida afetiva e social da criança. Além disso, é

na família que o filho começa a discernir entre o sim e o não, o certo e o

errado, a conhecer e dominar regras, valores e normas, bem como a sofrer

as conseqüências ao quebrá-las.

A família é quem vai propiciar as primeiras interações da criança com o meio.

É onde são estabelecidos os primeiros contatos com o mundo e o primeiro modelo

de desenvolvimento, é quem deverá desenvolver a construção de limites para que

ao longo deste processo a criança consiga desenvolver autonomia para conviver em

sociedade.

De acordo com Vigotsky (apud Oliveira, 2002) o sujeito constrói o seu

conhecimento de acordo com o seu contexto histórico. Para ele, ao construir seu

meio, atribuindo-lhe a cada momento significado, a criança é por ele constituída;

adota formas culturais de ação que transformam sua maneira de expressar-se,

pensar, agir e sentir. O contexto de cada lugar ao qual o sujeito está inserido é que

determinará a sua forma de comportar-se.

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De certo, a educação moral não se constrói apenas no âmbito escolar, pois a

família, normalmente, é a base para essa educação. Assim, quanto mais forte for a

parceria família-escola, melhores chances se tem de desenvolver valores

considerados fundamentais do processo educativo.

A instituição educacional e a família são reconhecidas como as principais

responsáveis pela educação das crianças. Cabe a escola a responsabilidade de

comprometer-se com a formação social e cultural do aluno, informando-o de seus

direitos e deveres.

De acordo com Cadorin (2001, p.21):

A escola é um espaço onde se formam jovens e são construtores da

sociedade na qual vivem e exercem cidadania. Par atingir esse objetivo é

necessário que as pessoas estejam empenhadas em atuar no seu

cotidiano.

É na escola que os conflitos ocorrerão, e a criança aprenderá a se posicionar

diante das suas vontades e a ceder também. Aos poucos a criança aprende a

reconhecer o limite de cada um.

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CAPITULO III

CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA

Este capítulo estuda a importância da construção da autonomia no

desenvolvimento do aluno. Utilizou-se como autores principais que sustentam o

texto Araujo ( 1996 ) ; La Taille (1999); Paulo Freire (1996); Zagury ( 2001); Zagury

(2003).

A autonomia não pode ser confundida com licenciosidade, a criança não pode

fazer tudo o que quer. Para Paulo Freire (1996), tanto o autoritarismo quanto a

licenciosidade não levam à liberdade, mas sim à bagunça, ao “laissez-faire”. Por isso

percebemos que os limites são pontos importantes na formação da moral da

criança.

De acordo com o dicionário da Língua Portuguesa Aurélio, autonomia significa

faculdade de se governar por si mesmo. Direito ou faculdade que tem uma nação de

se reger por leis próprias.

Portanto, entende-se que uma criança autônoma é aquela capaz de tomar

decisões por si mesma. Porém, antes de adquirir essa autonomia, é preciso que ela

compreenda a necessidade de justiça e de responsabilidade, independente de

autoridade ou punições impostas.

Araújo afirma que:

A autonomia, portanto, pode ser compreendida como resultante do

processo de socialização que leva o indivíduo a sair do seu egocentrismo,

característico dos estados de heteronomia, para cooperar com os outros e

submeter-se (ou não) conscientemente às regras sociais, e isso será

possível a partir do tipo das relações estabelecidas pelo sujeito com os

outros. (1996, p.108)

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O sujeito autônomo vai adquirindo essa consciência, quando compreende as

regras.

A capacidade da criança de se relacionar bem na sociedade esta, inicialmente

ligada a orientação que os pais, seus primeiros referencias, dão no sentido de seguir

regras.

De acordo com Zagury:

É fundamental acreditar que dar limite aos filhos é iniciar o processo de

compreensão e apreensão do outro. Ninguém pode respeitar seus

semelhantes se não aprender quais são seus limites, e isso inclui

compreender que nem sempre se pode fazer tudo que se deseja na vida.

(2001, p.17).

Colocar limites de forma clara e objetiva, é uma maneira de ajudar a criança a

modificar seu comportamento sem prejudicar sua auto-estima.

La Taille afirma que:

Se a criança perceber que os pais e professores não mudam em nada seu

comportamento quando há infração, que nunca punem, nunca ameaçam,

deixará de sentir o medo e a angustia que, num primeiro momento de vida,

inspiram as boas ações. Mais ainda, se percebe que nem mesmo colocam

regras claras, proibições, achará que tudo é permitido, que todas as ações

são legítimas. (1999)

Freire (2007) afirma que o diálogo também é importante em qualquer relação

seja pais e filhos, professor e aluno:

“É no respeito às diferenças entre mim e eles ou elas, na coerência entre o

que eu faço e o que digo, que me encontro com eles ou com elas”(p.152)

Precisamos estar atentos aos comportamentos das crianças, intervir com

autoridade sempre que necessário. Porém não devemos confundir autoridade com

autoritarismo.

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3.1 AUTORIDADE E AUTORITARISMO

No passado, os pais e professores acreditavam que as crianças lhes deviam

obediência cega. As relações eram pautadas no medo e nas imposições de regras.

A autoridade vem sendo sistematicamente colocada como algo pernicioso.

Na verdade, negativa não é a existência de autoridade, mas sim a

existência do autoritarismo, que é o exercício exacerbado e sem medida da

autoridade. (Zagury, 2003, p.87).

Segundo o Dicionário da Língua Portuguesa Aurélio autoridade significa,

pessoa que exerce o poder; autoritarismo: poder absoluto e arbitrário que se exerce

com tirania.

Pais e professores precisam ter autoridade, sempre agindo com coerência,

explicando os motivos e ouvindo a criança.

Zagury (2001) afirma que o sujeito autoritário exerce autoridade a partir do

seu ponto de vista.

É preciso, portanto entender como ter autoridade sem ser autoritário, pois

para o desenvolvimento de um sujeito autônomo é necessário que os limites não se

excedam.

De acordo com Ramos (2003), a criança precisa ter capacidade de se

adequar as regras, de acordo com seu desenvolvimento. Se faz necessário o

entendimento dessas regras, avaliar cada caso como especifico, levando em conta a

personalidade de cada criança.

De acordo com La Taille (1999), a criança precisa ser estimulada a traçar

caminhos que as leve a uma vida social equilibrada.

Para Ramos (2003), a educação tem a função de orientar em direção ao uso

inteligente da liberdade. Canalizá-la de modo que frutifique em benefício do outro e

da própria pessoa.

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Família e escola caminham juntas, enquanto a família tem a função de educar

seus filhos, a escola complementa essa educação. Para Tiba (1996), a família teria

a responsabilidade pela formação do indivíduo, e a escola por sua informação.

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CAPÍTULO IV

O PAPEL DA ESCOLA E DO PSICOPEDAGOGO

Este capítulo estuda a importância da escola e do psicopedagogo para a

formação moral e ética dos alunos. Utilizou-se como autores principais que

sustentam o texto Alicia Fernandez ( 2012 ) e Paulo Freire (1996).

“O ser humano, ao nascer,

está provido de capacidade

para...quer dizer,

possibilidades abertas sem

um conteúdo determinado

nem fixado previamente ”

Alícia Fernández

Sabemos que a educação escolar não pode se responsabilizar sozinha com o

compromisso de transformação. Mas, não se pode desconsiderar sua importância

para a formação moral e ética dos sujeitos. A escola deve ter como meta real a

formação integral do aluno, conscientes do mundo em que vivem, reflexivos e

participativos.

A formação do educando, depende da ação do educador. Sua postura ética,

suas exigências , suas formas de se relacionar com os alunos e com os outros

profissionais da escola, sua fala, sua abordagem dos conteúdos, seu olhar.

O educador é exemplo, é referência, sua presença interfere de forma singular

na formação do educando.

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É por esta ética inseparável da prática educativa, não importa se

trabalhamos com crianças, com jovens ou com adultos, que devemos lutar.

E a melhor maneira de por ela lutar é vivê-la em nossa prática, é

testemunhá-la, vivaz, aos educandos em nossas relações com eles.

(Freire, 1996, p.15)

Percebemos a grande responsabilidade dos cursos de formação de

professores em trabalhar as questões ética, histórica, social e política com o

educador.

Somente quem valoriza os direitos do cidadão tem consciência da realidade,

pode projetar e realizar um trabalho na escola no sentido da transformação social.

Na escola, enquanto o aluno estuda, está também se formando como sujeito

ético, moral e social. Todos os aspectos da vida escolar interferem nessa formação:

as relações na comunidade escolar entre professores, funcionários e aluno; o

cuidado com o meio-ambiente; o conteúdo selecionado para estudo, abordagem

deste conteúdo; as metodologias; entre outros. O trabalho na escola não se

restringe à instrução.

Cabe a escola a responsabilidade de comprometer-se com a formação social

e cultural do aluno, informando-o de seus direitos e deveres.

De acordo com Cadorin (2001, p.21):

A escola é um espaço onde se formam jovens e são construtores da

sociedade na qual vivem e exercem cidadania. Par atingir esse objetivo é

necessário que as pessoas estejam empenhadas em atuar no seu

cotidiano.

É na escola que os conflitos ocorrerão, e a criança aprenderá a se posicionar

diante das suas vontades e a ceder também. Aos poucos a criança aprende a

reconhecer o limite de cada um.

É através da experiência de relações de cooperação, que se favorece o

desenvolvimento da autonomia moral. Nas relações de cooperação, as regras não

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são pré-estabelecidas, mas sim construídas pelos sujeitos através dos acordos que

fazem. Para realizar estes acordos, os sujeitos precisam enxergar o outro como igual

em direitos, e tentar compreender seu ponto de vista. Assim, favorecem o

desenvolvimento do respeito mútuo.

Na escola, as relações de cooperação devem ser privilegiadas. As crianças

precisam ter espaço para conviver e tentar resolver seus conflitos através de

soluções próprias. Nestes momentos, precisam ter oportunidade de expressar suas

idéias, seus descontentamentos, ouvir os outros envolvidos, refletir sobre a situação

e levantar hipóteses de soluções.

O psicopedagogo deve e pode ajudar em muito a criança a crescer através de

vivências justas e democráticas. Ele, ao valorizar o aluno como sujeito ativo, coloca-

se como parceiro que pode e quer cooperar para seu desenvolvimento pleno.

Permite também que o aluno, após ter refletido, tome suas decisões, tanto nos

processos cognitivos quanto nos processos morais. O que possibilita ao aluno a

reflexão crítica sobre a realidade, a possibilidade de levantar hipóteses para a

solução de problemas.

Mesmo sabendo que a escola objetiva o trabalho baseado em resultado no

vestibular, sabemos que ainda há possibilidade de um espaço diferenciado.

O olhar do psicopedagogo pode valorizar mais a construção de alguns

conhecimentos do que outros, dedicando mais tempo e profundidade de discussão.

No caso do professor, o que ajuda muito é a seleção dos temas de estudo, pois

determinados saberes podem ser mais relevantes que outros para a formação do

sujeito pleno.

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Alicia Fernández afirma que:

Manter vivo e fecundo nosso fazer supõe desenvolver a própria capacidade

de atenção, atravessando as resistências pessoais e as resistências às

teorias que nos sustentam. Para pensar algo novo precisamos pensar de

modo novo e para atender a novas questões devemos estar disposto a

flexibilizar e transformar nossa própria modalidade atencional. ( 2012, p.205)

Acreditamos na formação integral do aluno. O alunos precisa se sentir como

um sujeito ativo, participante, e a escola, precisa ceder este espaço de

desenvolvimento e de criação.

Acreditamos que o processo de formação de valores morais e éticos é

permanente, histórico e cultural. Consideramos então a escola, enquanto espaço de

socialização que é, como um lugar privilegiado para a formação destes valores.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levando em conta o acelerado processo de transformação tecnológica e

social em que estamos vivendo, nas discussões deste trabalho tentei refletir sobre o

significado da formação moral e ética em nossa sociedade. O tempo destas

mudanças atropela o tempo das relações e da reflexão sobre as ações.

É notória a crise de valores que se revela em desrespeito, violência e

desonestidade.

Concluí que este é, realmente, um processo cultural, social e histórico. Por

isso, considerando os valores de nossa sociedade, tentei entender o que a escola

pode tomar para si tendo em vista contribuir para a construção de uma sociedade

mais justa. Ainda que muitos possam apontar esta intenção como mera utopia,

acredito que é nesta direção que devemos tentar caminhar e, não simplesmente

aceitar a realidade como determinada.

Ainda acredito que este debate seja fundamental para a formação do

educador, pois, antes de conhecer os processos de ensino-aprendizagem, precisa

tomar consciência de sua participação ativa na formação moral dos educandos. O

educador deve estar consciente de que, intencionalmente ou não, age sobre o

mundo transformando-o. O mesmo se pode dizer do educando.

A partir do diálogo com os autores, fui formando para mim mesma algumas

concepções sobre a formação moral. No entanto, enquanto, por um lado, ia

construindo a idéia da ética como fator social e cultural, por outro lado, acredito na

essência da humanidade.

.

Vivemos um momento de revisão da educação escolar, onde o

psicopedagogo e o professor sào desafiados a todo instante. Diante disso,

percebemos que não há regras que descreva a atuação desses profissionais,

portanto, há necessidade de se manter num processo permanente de

desenvolvimento profissional.

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A prática educativa é algo muito sério. Lidamos com gente, com crianças,

adolescentes ou adultos. Participamos de sua formação. Ajudamo-los ou

os prejudicamos nesta busca. Estamos intrinsecamente a eles ligados no

seu processo de conhecimento. Podemos concorrer com nossa

incompetência, má preparação, irresponsabilidade, preparo cientifico e

gosto do ensino, com nossa seriedade e luta contra injustiças, contribuir

para que os educandos vão se tornando presenças marcantes no mundo.

(Freire, 2002,p.47)

É fundamental que a escola trabalhe noções de limites e respeito mútuo com

o educando, investindo na construção de um sujeito autônomo, permitindo espaço

de criação e ação.

É na escola, interagindo com o outro, que as crianças aprendem a construir

conjuntamente regras de convivência. É através principalmente, do trabalho do

professor e com o apoio do psicopedagogo, que se estimula e possibilita o

desenvolvimento da aprendizagem.

A família servirá como primeiro modelo para a construção de valores, é quem

organiza o ambiente para que a criança possa se desenvolver, fazendo com que

entendam e respeitem os valores e a cultura da sociedade a que pertence.

A família necessita resgatar alguns aspectos da educação de seus filhos,

passando pela construção da autoridade.

Essa etapa foi cumprida com muita alegria, porém esse estudo, é só o

começo, estou iniciando uma nova especialização, desta vez em Clinica, pois o

desejo de aprender mais sobre estas e outras perguntas, me estimulou e vou seguir

em frente.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ........................................................................................... 8

CAPÍTULO I

MORAL E ÉTICA ..............................................................................................9

CAPÍTULO II

CONDUTA INDICIPLINAR.................................................................................16

2.1 – Limites: um problema contemporâneo.......................................................20

CAPÍTULO III

CONSTRUÇÃO DA AUTONOMIA.....................................................................24

3.1 – Autoridade e autoritarismo.......................................................................26

CAPÍTULO IV

O PAPEL DA ESCOLA E DO PICOPEDAGOGO..............................................28

CONCLUSÃO............................................................................................,....32

BIBLIOGRÁFIA...............................................................................................34

ÍNDICE..........................................................................................................36

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