docencia do ensino superior

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Rua Dr. Moacir Birro, 663 Centro Cel. Fabriciano MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: [email protected] SUGESTÕES DE REFERÊNCIAS PARA O CURSO DE DOCENCIA DO ENSINO SUPERIOR Selecionamos para você uma série de artigos, livros e endereços na Internet onde poderão ser realizadas consultas e encontradas as referências necessárias para a realização de seus trabalhos científicos, bem como, uma lista de sugestões de temas para futuras pesquisas na área. Primeiramente, relacionamos sites de primeira ordem, como: www.scielo.br www.anped.org.br www.dominiopublico.gov.br SUGESTÕES DE TEMAS 1. A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO NA DOCÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR 2. AS MÚLTIPLAS DIMENSÕES DO TRABALHO DOCENTE, A PARTIR DA ANÁLISE CRÍTICA DO CONTEXTO EM QUE SE REALIZA SUA PRÁTICA EDUCATIVA 3. A DOCÊNCIA E A SUA ATUAÇÃO DE FORMA COMPETENTE, 4. A DOCÊNCIA, A SENSIBILIDADE ÉTICA E A CONSCIÊNCIA POLÍTICA DA IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO NO PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL 5. A ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA PARA COMPREENSÃO DA REALIDADE EDUCACIONAL BRASILEIRA NA CONTEMPORANEIDADE 6. QUALIDADES ESSENCIAIS PARA A AUTORIDADE DOCENTE DEMOCRÁTICA 7. A PREOCUPAÇÃO COM A QUALIDADE DO ENSINO SUPERIOR 8. A PREPARAÇÃO PEDAGÓGICA DE DOCENTES E A LDB 9394/96 9. SEM DOCÊNCIA NÃO HÁ DISCÊNCIA 10. O ABSOLUTISMO DO EDUCADOR

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SUGESTÕES DE REFERÊNCIAS PARA O CURSO DE

DOCENCIA DO ENSINO SUPERIOR

Selecionamos para você uma série de artigos, livros e endereços na Internet

onde poderão ser realizadas consultas e encontradas as referências necessárias

para a realização de seus trabalhos científicos, bem como, uma lista de sugestões

de temas para futuras pesquisas na área.

Primeiramente, relacionamos sites de primeira ordem, como:

www.scielo.br

www.anped.org.br

www.dominiopublico.gov.br

SUGESTÕES DE TEMAS

1. A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO NA DOCÊNCIA PARA O ENSINO SUPERIOR

2. AS MÚLTIPLAS DIMENSÕES DO TRABALHO DOCENTE, A PARTIR DA ANÁLISE CRÍTICA DO CONTEXTO EM QUE SE REALIZA SUA PRÁTICA EDUCATIVA

3. A DOCÊNCIA E A SUA ATUAÇÃO DE FORMA COMPETENTE,

4. A DOCÊNCIA, A SENSIBILIDADE ÉTICA E A CONSCIÊNCIA POLÍTICA DA IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR UNIVERSITÁRIO NO PROCESSO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

5. A ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE PESQUISA PARA COMPREENSÃO DA REALIDADE EDUCACIONAL BRASILEIRA NA CONTEMPORANEIDADE

6. QUALIDADES ESSENCIAIS PARA A AUTORIDADE DOCENTE DEMOCRÁTICA

7. A PREOCUPAÇÃO COM A QUALIDADE DO ENSINO SUPERIOR

8. A PREPARAÇÃO PEDAGÓGICA DE DOCENTES E A LDB 9394/96

9. SEM DOCÊNCIA NÃO HÁ DISCÊNCIA

10. O ABSOLUTISMO DO EDUCADOR

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11. A APRENDIZAGEM NO ENSINO SUPERIOR

12. A TITULAÇÃO DOS PROFESSORES DENTRO DO ÂMBITO DO ENSINO SUPERIOR: título e o significado de caráter

13. A AFETIVIDADE NO ENSINO SUPERIOR

14. O DESENVOLVIMENTO NO ENSINO SUPERIOR

15. A PEDAGOGIA NO ENSINO SUPERIOR: dimensão conceitual, procedimental e atitudinal

16. O ENSINO SUPERIOR POR EXCELÊNCIA

17. O ENSINO E A EDUCAÇÃO SUPERIOR CONTEXTUALIZADA

18. RELAÇAO PROFESSOR X ALUNO NO ENSINO SUPERIOR

19. IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA PEDAGÓGICA NO ENSINO SUPERIOR

20. A DIFÍCIL RELAÇÃO ENSINO-APRENDIZAGEM NO ENSINO SUPERIOR

21. O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM E O PROFESSOR DE ENSINO SUPERIOR

22. A DIDÁTICA NO ENSINO SUPERIOR

23. UM AMBIENTE DE ENSINO E APRENDIZAGEM SUPERIOR BASEADO EM WEB SEMÂNTICA E WEB SERVICES

24. INFLUÊNCIAS NO PROCESSO ENSINO APRENDIZAGEM: o ensino superior

25. O ESTADO DA ARTE DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

26. O ENSINO SUPERIOR E A QUALIDADE DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

27. A FORMAÇÃO DO EDUCADOR E OS RESULTADOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

28. A IMPORTÂNCIA DA DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR NA FORMAÇÃO DO EDUCADOR DO FUTURO

29. A UNIVERSIDADE E SUA RELAÇÃO COM A ESCOLA BÁSICA

30. O MEC E A DOCÊNCIA SUPERIOR: políticas públicas

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ARTIGOS PARA LEITURA, ANÁLISE E UTILIZAÇÃO COMO FONTE OU REFERENCIA

Educação & Sociedade

Print version ISSN 0101-7330

Educ. Soc. vol.20 n.68 Campinas Dec. 1999

doi: 10.1590/S0101-73301999000300002

A REFORMA DO ENSINO SUPERIOR NO CAMPO DA FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: As políticas educacionais e

o movimento dos educadores

Helena Costa Lopes de Freitas*

RESUMO

O presente trabalho apresenta as discussões que têm orientado o debate acerca da

formação dos profissionais da educação, recuperando a trajetória do movimento dos

educadores na luta pela sua formação e pela profissionalização do magistério –

representada na atualidade pela Associação Nacional pela Formação dos

Profissionais da Educação (Anfope) – nos últimos 20 anos. A construção coletiva em

torno da base comum nacional, em oposição às políticas de formação, e a proposta

de escola única de formação, que materializa os princípios da Anfope para a

reorganização dos cursos de formação dos profissionais da educação nas

universidades, vêm orientando o debate atual na resistência às políticas oficiais de

aligeiramento e fragmentação da formação profissional.

Palavras-chave: Formação de professores, base comum nacional, profissionais da

educação, políticas de formação

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Introdução

As reformas educativas levadas a efeito em nosso país e nos outros países da

América Latina desde o final da década de 1970, com o objetivo de adequar o

sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva e aos novos rumos do

Estado, vêm reafirmando a centralidade da formação dos profissionais da educação.

Nesse contexto, debatem-se diferentes propostas para a formação, fundadas em

projetos políticos e perspectivas históricas diferenciadas, o que faz com que a

formação desses profissionais seja tratada ou como elemento impulsionador e

realizador dessas reformas, ou como elemento que cria condições para a

transformação da própria escola, da educação e da sociedade.

No quadro das políticas educacionais neoliberais e das reformas educativas, a

educação constitui-se em elemento facilitador importante dos processos de

acumulação capitalista e, em decorrência, a formação de professores ganha

importância estratégica para a realização dessas reformas no âmbito da escola e da

educação básica (Aguiar 1997, Freitas 1994, 1995).

A importância dada à questão da formação pelas políticas atuais tem por objetivo

equacionar o problema da formação para elevar os níveis de "qualidade" da

educação nos países subdesenvolvidos, qualidade que, na concepção do Banco

Mundial, é determinada por vários fatores, entre os quais situam-se o tempo de

instrução, os livros didáticos e a melhoria do conhecimento dos professores

(privilegiando a capacitação em serviço sobre a formação inicial e estimulando as

modalidades a distância). À formação geral, garantida no Ensino Médio a baixo

custo, seria agregada a formação para a docência, oferecida em cursos curtos de

formação inicial centrados na capacitação pedagógica (Torres 1996, p. 165).

Em nosso país, a implementação dessas concepções via políticas de formação vem

se dando desde o final dos anos 80 e se consolida na década de 1990, em

decorrência dos acordos firmados na histórica Conferência de Ministros da

Educação e de Planejamento Econômico, realizada no México, em 1979, e na

Conferência de Jontien, em 1990, na Tailândia. Várias iniciativas foram tomadas, em

especial na América Latina e no Caribe, como tentativa de responder à crise de

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acumulação do capitalismo, no sentido de "elevar o nível de satisfação das

necessidades básicas de aprendizagem", pilar do plano de ação Educação Para

Todos que fundamentou, em nosso país, o Plano Decenal. A "qualidade" da

educação e da escola básica passa a fazer parte das agendas de discussões e do

discurso de amplos setores da sociedade, e das ações e políticas do MEC, que

busca a cooptação para criar consensos facilitadores das mudanças necessárias na

escola básica e, principalmente, no campo da formação de professores (Freitas

1994).

As concepções que orientam tais mudanças vêm sendo questionadas ao serem

confrontadas com a produção teórica e prática da área educacional e do movimento

dos educadores que, desde o final dos anos 70, com o processo de democratização

da sociedade, passa a colocar novas exigências para a melhoria da escola básica e

para a formação de professores. A Associação Nacional pela Formação dos

Profissionais da Educação (Anfope) – que se organiza a partir de 1983 como

Comissão Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Conarcfe) –, no

movimento de reformulação dos cursos de formação do educador, vem contribuindo

com essa discussão, construindo coletivamente uma concepção sócio-histórica de

educador em contraposição ao caráter tecnicista e conteudista que tem

caracterizado as políticas de formação de professores para a escola básica em

nosso país. Ela tem, na concepção de base comum nacional, em oposição à

concepção de currículo mínimo, o instrumento que marca a resistência às políticas

de aligeiramento, fragilização e degradação da formação e da profissão do

magistério.

Faz parte também dessa trajetória na luta pela formação a definição de uma política

nacional global de formação dos profissionais da educação e valorização do

magistério, que contemple de forma prioritária no quadro das políticas educacionais,

e em condições de igualdade, a sólida formação inicial no campo da educação,

condições de trabalho, salário e carreira dignas e a formação continuada como um

direito dos professores e obrigação do Estado e das instituições contratantes.

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Este trabalho analisa, em um primeiro momento, as reformas no campo da formação

de professores a partir da LDB 9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional, destacando a posição da Anfope e do movimento dos educadores em

relação a elas. Em seguida, são retomados os pontos principais da política nacional

de formação dos profissionais da educação, enfatizando as condições da formação

inicial a base comum nacional e a intervenção no processo de discussão das

diretrizes curriculares para os cursos de formação. Por último, é discutida a proposta

de escola única de formação, uma alternativa de reorganização e estruturação dos

cursos de formação de profissionais da educação no interior das faculdades e dos

centros de educação e das universidades.

As políticas atuais para a formação dos profissionais da educação

A aprovação da nova LDB, em dezembro de 1996, representou o marco da

institucionalização de políticas educacionais que já vinham sendo gestadas e

implantadas pelo MEC1 e pelo governo anterior. As medidas no campo da formação,

regulamentadas pelo CNE, têm se caracterizado por aprovações pontuais de

pareceres e resoluções que vão conformando a reforma universitária no campo da

formação. Destacam-se a Resolução 02/97 (antigos Esquema I e II, agora

revigorados), que estabelece a possibilidade de complementação pedagógica para

qualquer graduado/bacharel que queira atuar na educação básica; a

regulamentação do curso normal em nível médio, sem que tenha sido definido o

caráter transitório e datado dessa instância de formação bem como a política de

formação em nível superior dos estudantes que finalizam esse curso; a

regulamentação dos cursos seqüenciais que oferecem diploma e concorrem com os

tradicionais cursos de graduação, abrindo a possibilidade de retomada das antigas

licenciaturas curtas de 1.600 horas.

No quadro dessas políticas, destaca-se ainda a elaboração das Diretrizes

Curriculares para a graduação, que fincará as bases para a organização curricular

dos cursos de formação dos profissionais da educação.

A LDB instituiu também as bases para a definição de novas políticas que vêm sendo

regulamentadas pelo Conselho Nacional de Educação, com a criação de novas

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instituições: os Institutos Superiores de Educação, instituição específica para

formação de professores para a educação básica, o Curso Normal Superior, para

formação de professores de 1a a 4a série e educação infantil, e a formação dos

especialistas nos cursos de pedagogia.

Posteriormente, o Decreto 2.032 de agosto de 1997, que alterou o sistema federal

de Ensino Superior e a organização acadêmica das IES, regulamenta essa nova

instituição e seu lugar no "concerto" do Ensino Superior brasileiro. O decreto

estabelece que as Instituições de Ensino Superior podem assumir diferentes

formatos: universidades, centros universitários, faculdades integradas, faculdades e

institutos superiores ou escolas superiores. Com essas distinções, e mantendo-se a

exigência da pesquisa apenas nas universidades, institucionaliza-se a distinção

entre universidades de ensino e universidades de pesquisa, mantida no Plano

Nacional de Educação elaborado pelo relator da Comissão de Educação e Cultura,

reservando para os Institutos Superiores de Educação, uma instituição de quinta

categoria, segundo a própria hierarquização formulada pelo MEC para as IES, a

formação dos quadros do magistério.

A recente regulamentação dos Institutos Superiores de Educação, pelo Parecer no

115/99 da Câmara de Ensino Superior do CNE, deixa clara a concepção de

formação de professores que permeia as propostas atuais, ao estabelecer que a

preparação dos profissionais para atuar na educação básica se dará

fundamentalmente em uma instituição de ensino de caráter técnico-profissional.

As implicações dessa forma de organização do Ensino Superior para a formação

dos profissionais da educação têm sido anunciadas e denunciadas tanto pelas

diferentes entidades acadêmicas – Anfope, Anped, Anpae, Fórum de Diretores das

Faculdades de Educação das Universidades Públicas Brasileiras – quanto por

estudiosos da área (Aguiar 1997, Anfope 1998, 1999, Kuenzer 1998).

Para efeito de análise, retomamos aqui algumas dessas questões, centrando a

discussão nas condições de formação, buscando identificar seus fundamentos no

quadro atual. No campo das possibilidades da organização curricular e dos estudos

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a serem oferecidos, pode-se identificar uma situação discriminatória em relação aos

demais cursos de graduação. Senão vejamos.

É um curso de caráter técnico-profissionalizante. A carga horária para integralização

do curso – 3.200 horas – pode ser reduzida, dependendo da experiência e da

formação anterior dos estudantes, podendo chegar até a 1.600 horas. Com isso,

constata-se que, pela primeira vez, se abre a possibilidade de aproveitamento, em

nível superior, dos estudos realizados em nível anterior de escolaridade,

desqualificando e banalizando o rigor necessário que deveria ser exigido dos

estudos superiores.

Outra característica discriminatória é a exigência de qualificação do corpo docente –

10% de mestres e doutores –, que contrasta com a exigência de qualificação nas

universidades – 30% de mestres e doutores –, caracterizando uma desqualificação

dos formadores de professores, com sérias implicações no ensino e nos estudos

desenvolvidos nessas instituições.

As diretrizes curriculares que orientarão a elaboração dos currículos e os estudos

tomarão por base as diretrizes para a educação básica, ao contrário do processo

que tem orientado a elaboração das diretrizes para os cursos de graduação, que

toma como parâmetros e princípios orientadores os conhecimentos científicos da

área de formação. Essa forma de organização nos leva a afirmar que os estudos

que aí se desenvolverão, separados da pesquisa e da produção de conhecimento

nas áreas de formação – tanto nas disciplinas de conteúdo das áreas específicas da

docência quanto na área educacional –, adquirirão caráter técnico e instrumental,

retirando do profissional da educação a possibilidade de desenvolver-se como

"intelectual responsável por uma área específica do conhecimento, atribuindo-se a

ele uma dimensão tarefeira, para o que não precisa se apropriar dos conteúdos da

ciência e da pesquisa pedagógica" (Kuenzer apud Aguiar 1999).

Tais características apontam para a constituição de uma instituição formadora de

caráter pós-médio, e não superior. Assim, em vez de se buscar o que há de mais

avançado em termos de propostas de organização curricular e experiências em

curso nas IES, em particular nos cursos de pedagogia, coloca-se como horizonte o

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aligeiramento da formação pelo rebaixamento das exigências e das condições de

formação.

Esse rebaixamento das exigências em vários níveis – corpo docente, carga horária –

, aliado às pressões dos sistemas de ensino estaduais e municipais para a

qualificação de seus docentes até 2007, em cumprimento à LDB e na ausência de

política de expansão qualificada do Ensino Superior público, que demandaria maior

volume de recursos financeiros, tem causado a proliferação de cursos de 1.600

horas e a criação de numerosas instituições privadas que se beneficiam dessas

condições "ideais" para seu crescimento e expansão, nem sempre com a qualidade

necessária.

É contra essa política que a Anfope tem se posicionado, mais especificamente

contra o caráter da formação que essas instituições têm possibilidade de oferecer,

em decorrência de sua organização. Desde o IV Encontro Nacional, de 19892,

quando do processo de elaboração da LDB e, posteriormente, em 1994, durante o

VII Encontro Nacional, a Anfope vem se posicionando contrariamente a essas

iniciativas que já começavam a se configurar como alternativas para a organização

dos cursos de formação de professores, pois indicavam "uma reformulação às

avessas, desconsiderando as atuais instituições formadoras como locus de

produção do conhecimento e agências responsáveis pela formação de profissionais

da educação3".

Ao contrário do que afirmam alguns autores (Libâneo e Pimenta 1999), a Anfope tem

assumido historicamente uma posição contrária a qualquer proposta que vise criar

centros específicos de formação de professores, separados dos centros e dos

cursos que formam os profissionais da educação e pretendam separar a formação

de professores da formação dos demais profissionais da educação e do ensino, ou

dos especialistas.

Tal posição tem se mantido historicamente e tem fundamentado as posições da

entidade nos diversos fóruns em que é discutida a criação dos Institutos Superiores

de Educação, como lugar específico da formação exclusiva de professores,

separado da universidade. Essa posição foi reafirmada no processo de elaboração

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do Plano Nacional de Educação da sociedade brasileira (1997), e nos quatro

seminários nacionais realizados de 1996 a 1999, promovidos conjuntamente pela

Anfope e pelo Fórum de Diretores das Faculdades/Centros de Educação das

Universidades Brasileiras.4

Nos diferentes documentos, a Anfope tem se posicionado a respeito dessa temática,

em particular reiterando a denúncia de que

A proposta mantém as dicotomias e as fragmentações na formação de profissionais

da educação quando se dedica, em sua formulação, à formação de professores e

não de educadores, enfatizando exclusivamente o conteúdo específico, as

metodologias e o projeto pedagógico da escola, reforçando, portanto, a concepção

conteudista, tecnicista do professor, reduzindo-o a um prático com pleno domínio da

solução de problemas da prática cotidiana da escola e da sala de aula, alijado da

investigação e da pesquisa sobre as condições concretas que geram esses

problemas. (Anfope 1999)

É exatamente nesse campo que hoje se trava o debate nacional sobre a formação

dos profissionais da educação, suas concepções, seu conteúdo e forma, que vai

dando lugar a regulamentações, propostas, documentos e formulações oficiais.

A criação de novos cursos e instituições – como os Institutos Superiores de

Educação e o Curso Normal Superior5 – específicos para a formação de professores

é parte da estratégia adotada pelo governo brasileiro, em cumprimento às

exigências dos organismos internacionais, para o que seria a segunda etapa da

reforma educacional: a reforma no campo da formação de professores. Essa

segunda etapa cumpre dois objetivos básicos:

a) adequar as instituições formadoras e os conteúdos da formação aos objetivos da

reforma da educação básica em curso, garantindo a aplicação dos princípios da

reforma na sala de aula e na escola;

b) para cumprir com eficiência esse objetivo, não é necessário nem desejável que a

formação ocorra nas universidades e nos centros em que a produção de

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conhecimento é parte integrante da formação profissional; é preciso, portanto,

separar a formação de professores da formação dos demais profissionais da

educação e da pós-graduação acadêmica. No caso do Brasil, é preciso separar a

formação de professores do curso de pedagogia, reservando-o como um curso de

excelência para formar profissionais da educação qualificados no campo da

produção de conhecimento. Com essa política, desarticulam-se as faculdades e os

centros de educação como instituições formadoras de educadores, profissionais de

caráter amplo para atuar na docência, instituições que vêm se constituindo como

centros produtores de conhecimento, geradores de novas idéias que contestam e

fazem a crítica da educação, da escola e do ensino e das políticas moldadas pelas

diferentes reformas educacionais.

Mello (1999), ao definir elementos da política para formação inicial de professores,

deixa explícito que "é preciso dar prioridade à formação de professores na

perspectiva e no âmbito da política de educação básica, independentemente da

problemática do ensino superior como tal (...)"6. Afirma que seria

inviável para o poder público financiar a preços das universidades "nobres" a

formação de seus professores de educação básica que se contam em mais de

milhão. Com um volume de recursos muito menor, um sistema misto de custo baixos

tanto públicos quanto privados, configura um ponto estratégico de intervenção para

promover melhorias sustentáveis a longo prazo na escolaridade básica. (Idem, p. 8;

grifos nossos)

Esse documento explicita alguns parâmetros orientadores das políticas do Banco

Mundial para a educação básica (Torres 1996) e também as medidas e as políticas

governamentais no campo da formação de professores, nos próximos anos, dentre

os quais se destacam:

a) Aprofundamento do processo de "ajuste" estrutural, enxugamento dos recursos do

Estado para a educação e conseqüente privatização;

b) distribuição, centralização e focalização dos recursos para experiências que se

adeqüem aos princípios da reforma educativa em curso;

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c) a massificação7 e o caráter de capacitação pedagógica (pragmatismo e o retorno

ao tecnicismo) na formação de professores,

• ênfase na capacitação pedagógica de professores feita em instituições específicas,

exclusivas, sem história e orientadas pelos parâmetros da reforma educativa em

curso que necessita "aterrissar na sala de aula";

• rebaixamento das exigências de qualificação do corpo docente das instituições

formadoras de professores;

• retirada da formação de professores das faculdades de educação (curso de

pedagogia) e das universidades, desarticulando-as como centros de formação de

professores, com propostas orientadas por parâmetros acadêmicos e científicos no

campo da pesquisa e da formação de profissionais com amplo domínio do

conhecimento crítico sobre a educação e a sociedade, em condições de elaborar

propostas alternativas às propostas oficiais atuais;

• diretrizes curriculares para a formação fundadas nas diretrizes curriculares para a

educação básica e educação infantil, e não em diretrizes curriculares de caráter

acadêmico, tal como para os cursos de graduação nas IES; é preconizada uma

"sintonia fina" entre as agências formadoras e a reforma educativa.

d) o individualismo e a responsabilidade pessoal no processo formativo:

• desenvolvimento profissional: situa a responsabilidade pela formação continuada

no próprio professor, que deve autogerir sua formação continuada, seu

desenvolvimento profissional, em contraposição a uma concepção de formação

continuada como direito do profissional e dever do Estado e demais instituições

contratantes;

• certificação de competências: um novo conceito que orienta a formação

profissional – não há direito ao trabalho garantido pelo curso de formação. O

exercício do magistério fica condicionado à conclusão de curso em instituição

credenciada e à avaliação para certificação de competências docentes;

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• avaliação dos professores vinculada à avaliação de desempenho dos alunos no

Saeb ou outras formas, para ascensão na carreira.

Na questão específica da formação de professores para educação infantil e séries

iniciais, a situação criada pela LDB é ainda mais complexa e reacende algumas das

polêmicas discussões da década de 1970, ao estabelecer permanência da formação

desses professores em nível médio, ao criar o Curso Normal Superior em

substituição ao curso de pedagogia e localizar a formação dos especialistas no

curso de pedagogia, separada da formação de professores – no Curso Normal

Superior.

Não é demais reafirmar que o curso de pedagogia, em grande parte das IES, desde

meados da década de 1980, constituiu-se como um curso de graduação plena,

licenciatura e bacharelado, com projeto pedagógico próprio, responsável pela

formação de profissionais para a educação básica, eliminando a fragmentação das

antigas habilitações, e possibilitando sua inserção em outros campos profissionais.

É, hoje, o único curso de formação de profissionais da educação que tem essa

organização, com projeto pedagógico específico, sob total responsabilidade das

faculdades/centros de educação, superando as dicotomias entre bacharelado e

licenciatura, formação pedagógica e formação específica, presentes nos demais

cursos de licenciatura.

O CNE, ao regulamentar os Institutos Superiores de Educação, ignorou essa

trajetória e regulamentou a formação de professores de educação infantil e de 1a a

4a série no Curso Normal Superior, criando o clima propício para que,

posteriormente, fosse regulamentada a formação de professores para esses níveis

de ensino exclusivamente no Curso Normal Superior, tal como estabelece o Parecer

970/99, da Câmara de Educação Superior, aprovado em 10/11/1999, com apenas

sete (dos doze) conselheiros presentes e um voto em contrário, declarado em

separado pelo conselheiro Jacques Velloso. Sua aprovação foi antecedida de muita

mobilização em nível nacional, de amplos setores da área educacional. Centenas de

instituições, entidades, conselhos de cursos e educadores enviaram manifestação

ao Conselho Nacional, entre a reunião de outubro e a reunião de novembro do CNE,

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rejeitando o parecer e solicitando audiência pública para o trato dessa questão. A

constatação de que não foi introduzida qualquer modificação na minuta

originalmente apresentada à Câmara de Ensino Superior e a insensibilidade diante

das centenas de manifestações de todo o país são dados reveladores da força dos

interesses que orientam a definição das políticas educacionais em nosso país e das

concepções que informam as propostas de formação de professores.

O conteúdo do Parecer 970/99, por outro lado, opõe-se frontalmente aos estudos

desenvolvidos pela Comissão de Especialistas de Pedagogia, que, ao definir as

diretrizes curriculares para o curso, estabelece a docência como base da identidade

profissional de todo educador. Essa oposição a uma construção coletiva e histórica

no campo da formação de professores demonstra que as decisões no campo da

formação vêm respondendo aos interesses de determinados setores, tanto no CNE

quanto no MEC, que pretendem colocar os cursos de formação de professores como

responsabilidade apenas dos Institutos Superiores de Educação, afastados dos

bacharelados e, no que tange à formação de professores para as séries iniciais e a

educação infantil, afastada da formação dos demais profissionais do ensino no curso

de pedagogia – que se transformaria em um bacharelado (ou pedagogia stricto

sensu, uma nova formulação), retirando, portanto, desses cursos e das faculdades

de educação a responsabilidade pela formação dos profissionais da educação

(Anfope 1999)8.

Ao estabelecer que o curso de pedagogia formará os especialistas separadamente

da docência, retomando as já superadas habilitações, a regulamentação do CNE

contraria o movimento real9, a produção teórica na área10 e a própria LDB, que

estabelece, em seu artigo 67, a experiência docente como pré-requisito para o

exercício das demais funções do magistério.

Com isso, retorna agora, em um patamar mais elaborado11, a figura do pedagogo

"especialista", em oposição à concepção de profissional da educação, educador de

caráter amplo que tem na docência, no trabalho pedagógico, a base de sua

formação e de sua identidade profissional. Essa concepção de pedagogo stricto

sensu, superada tanto pela produção teórica da área quanto pela prática

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15

democrática da organização do trabalho pedagógico nas escolas públicas, articula-

se à concepção de professor "tarefeiro", formado com ênfase nos conteúdos

específicos.

Essa concepção favorece as políticas governamentais que apontam para uma

formação diferenciada entre professores e demais profissionais da educação, e

ainda dá espaço para a formação de profissionais para funções de gestão do

sistema educacional descoladas do âmbito escolar, numa perspectiva hierarquizada.

Nas circunstâncias atuais da escola básica, esse profissional é ressignificado pelo

Estado, talvez como um profissional a seu serviço na escola e nos sistemas de

ensino para que, diante de professores formados em bases tecnicistas e

pragmatistas, possa atuar firme e decisivamente no sentido de fazer cumprir as

metas da reforma e das políticas educacionais que a embasam.

O fato de o curso de pedagogia constituir-se sob total e exclusiva responsabilidade

das faculdades/centros de educação tem permitido seu aprimoramento e

aperfeiçoamento na direção de tomar a prática educativa e a educação como objeto

de estudo na formação de profissionais para atuação na educação básica – na

formação de crianças de 0 a 10 anos –, identificando, no trabalho pedagógico

escolar e não-escolar, elementos constitutivos da formação humana em sua

dimensão omnilateral12.

É essa especificidade que devemos garantir para o curso de pedagogia, cuja "crise"

somente se aprofundará com a separação da formação de professores, a retomada

das habilitações e a fragmentação na formação dos especialistas.

O que está em jogo, hoje, para o conjunto dos educadores e para a sociedade

brasileira é a defesa do campo educacional e, nele, do curso de pedagogia e das

faculdades/centros de educação, como espaços de formação do profissional da

educação básica estudioso da educação, em condições de exercer sua prática em

ambientes formais e não-formais, escolares e não-escolares, e em todos os espaços

em que se desenvolva o trabalho educativo.

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16

Sintetizando, podemos afirmar que o conjunto dessas políticas materializadas nas

normatizações e nos referenciais dá contorno à reforma do ensino superior no

campo da formação de professores, feita às avessas, à revelia e à margem do

movimento dos educadores, das IES, e dos cursos de formação, como parte da

reforma mais geral do ensino superior e da reforma do Estado, desencadeada pelo

atual governo.

No que tange às concepções de formação, assistimos ao retorno da concepção

tecnicista do educador (neotecnicismo), tal como anunciado por Freitas (1992), com

ênfase nos aspectos pragmatistas da formação. A opção por esse modelo de

formação atende aos princípios de flexibilidade, eficiência e produtividade dos

sistemas de ensino, negando toda a trajetória do movimento dos educadores em sua

luta pela melhoria das condições de sua formação profissional, retirando das

faculdades/centros de educação a experiência construída historicamente de

formação de professores e de produção de conhecimento na área educacional,

sobre a escola, o ensino e o trabalho pedagógico em suas múltiplas dimensões.

Portanto, reafirmar as formulações e concepções históricas do movimento passa a

ser uma exigência, para os educadores, na discussão das diretrizes curriculares, nas

reformulações curriculares e na organização de novos cursos de formação, de forma

que possam constituir-se em norte para as ações no campo da formação dos

profissionais da educação.

A concepção de formação e a base comum nacional

A questão da formação do educador sempre foi examinada pela Anfope de forma

contextualizada, por entendê-la

inserida na crise educacional brasileira, que por sua vez constitui uma das facetas

de uma problemática mais ampla, expressão das condições econômicas, políticas e

sociais que configuram uma sociedade profundamente desigual e injusta que vem

esmagando a grande maioria da população e relegando-a a uma situação de

exploração e miséria.13

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17

Há hoje uma consciência generalizada de que a formação de professores é um

desafio relacionado com o futuro da educação básica, esta, por sua vez,

intimamente vinculada com o futuro de nosso povo e a formação de nossas

crianças, jovens e adultos. No entanto, as perspectivas de que essa formação ocorra

em bases teoricamente sólidas e fundada nos princípios de uma formação de

qualidade e relevância social são cada vez mais remotas, no quadro das políticas

educacionais implementadas.

A redução dos recursos públicos para a educação pública, o asfixiamento das

universidades públicas, a trágica realidade da escola pública – exposta no

documento "Retrato da Escola"14, elaborado pela CNTE – vão evidenciando a

impossibilidade de resolução desses problemas nos marcos das relações sociais

vigentes. A consciência dessa situação por parte dos educadores exige o

desvelamento dos reais fundamentos das propostas de formação de professores em

curso em nosso país. Assumir com radicalidade as propostas de profissionalização

do magistério, dando-lhes o conteúdo que o movimento dos educadores vem

construindo ao longo de sua história, este parece ser o desafio atual.

Nesse contexto, é importante explicitar as contradições presentes nas propostas

oficiais, aprofundando a discussão de uma política nacional global de formação dos

profissionais para a educação. A luta pela igualdade das condições de formação,

que se configura como um direito dos sujeitos e um dever do Estado, está em

contradição com as – e em oposição frontal às – políticas atuais que propugnam a

igualdade de oportunidades ou eqüidade, que se configura como um dever dos

sujeitos e um direito do Estado.

A igualdade das condições de formação supõe fundamentalmente a possibilidade de

estudos em cursos e instituições que recusem a fragmentação e as dicotomias entre

a formação de professores e os demais profissionais da educação, rejeitando,

portanto, as propostas atuais que reforçam o aligeiramento no conteúdo e no tempo

da formação. A definição das bases da formação no contexto de uma política global

de formação ganha, nesse contexto, importância crucial, como forma de expressar

as diferentes concepções de educação e de educador que estão em debate nas

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18

circunstâncias atuais. Esta tem sido a preocupação central da Anfope na última

década, período em que as reformas neoliberais causaram impacto de forma mais

direta na educação, na escola pública e na formação de professores.

Na definição dessa política devem se articular a formação inicial com a formação

continuada e as condições de trabalho e salários dignos e justos, entendendo que a

"implantação de uma política de formação inicial e continuada deve colocar em

questão a responsabilidade dos estados em relação à mesma, bem como o

financiamento para sua implementação"15. Paralelamente e em estreita

dependência, entende-se que a profissionalização do educador supõe a valorização

dos profissionais, o que requer condições adequadas para o exercício da profissão,

carreira e o desenvolvimento de uma política salarial unificada. Entende-se ainda a

formação continuada como um direito dos professores e dever do Estado e das

agências contratantes.

Na perspectiva de uma educação crítica e transformadora, deve-se também

reafirmar a concepção sócio-histórica de educador, definida pelo movimento dos

educadores e defendida pela Anfope, concepção de formação do profissional de

caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade de seu tempo, com a

consciência crítica que lhe permita interferir e transformar as condições da escola,

da educação e da sociedade, um educador que, enquanto profissional do ensino (...)

tem a docência como base da sua identidade profissional, domina o conhecimento

específico de sua área, articulado ao conhecimento pedagógico, em uma

perspectiva de totalidade do conhecimento socialmente produzido que lhe permita

perceber as relações existentes entre as atividades educacionais e a totalidade das

relações sociais, econômicas, políticas e culturais em que o processo educacional

ocorre, sendo capaz de atuar como agente de transformação da realidade em que

se insere. (Conarcfe 1989)

É essa concepção, reafirmada e aprimorada ao longo da trajetória de construção

coletiva dos educadores, que tem orientado estudos que foram dando forma e

conteúdo às idéias, proposições e propostas de reestruturação curricular,

particularmente nos cursos de pedagogia de numerosas instituições em nosso

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19

país,16 em resposta aos ideais dos educadores na luta pela democratização da

escola, da educação, pela valorização e profissionalização do magistério.

A produção teórica do movimento dos educadores evidencia concepções avançadas

sobre a formação do educador, não apenas por destacar seu caráter sócio-histórico,

mas principalmente por contribuir com a construção de propostas de superação das

dicotomias presentes na formação de professores e dos especialistas, entre

bacharelados e licenciaturas e entre pedagogia e demais licenciaturas. Esta é uma

exigência dada pela democratização das relações entre os sujeitos no trabalho

pedagógico e na construção de novos projetos coletivos. A explicitação da dimensão

social da educação e da escola torna evidência a estreita vinculação entre a forma

de organização da escola na sociedade capitalista e a formação do educador, fato

que coloca em oposição os projetos conservadores da sociedade atual e o projeto

histórico que busca a superação do capitalismo e anuncia a concepção de futuro da

humanidade que pretendemos.

Essas concepções encontraram sua forma mais elevada na elaboração da base

comum nacional que vem sendo construída cotidiana e coletivamente nas propostas

concretas de organização curricular nas diferentes IES de nosso país, articulando a

unidade dos educadores em torno de princípios norteadores da formação.

O conteúdo da formulação da base comum nacional é um instrumento de luta e

resistência contra a degradação da profissão do magistério, permitindo a

organização e reivindicação de políticas de profissionalização que garantam a

igualdade de condições de formação. É ainda um elemento unificador da profissão,

ao defender que a docência é a base da formação de todos os profissionais da

educação, pois permite assumir com radicalidade, ainda hoje, nas condições postas

para a formação de professores, a formulação de Saviani (1982): formar o professor

e o especialista no educador.

A idéia de base comum nacional, que se originou no I Encontro Nacional, realizado

em 1983, em contraposição à idéia de formação do pedagogo generalista, contém

um conjunto de princípios norteadores que vêm sendo construídos, retomados,

ressignificados na trajetória da entidade e na construção prática das transformações

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20

curriculares que se desenvolvem nas diferentes IES. Princípios que são orientadores

do exame, da análise e das propostas de estrutura e organização curricular e

institucional dos cursos de formação de profissionais da educação, os quais podem

ser assim sistematizados:

a) sólida formação teórica e interdisciplinar sobre o fenômeno educacional e seus

fundamentos históricos, políticos e sociais, bem como o domínio dos conteúdos

específicos a serem transmitidos pela escola, que permita a apropriação do

processo de trabalho pedagógico;

b) unidade teoria/prática que implica assumir uma postura em relação à produção de

conhecimento que impregne a organização curricular dos cursos; tomar o trabalho

como princípio educativo na formação profissional, revendo-se os estágios e sua

relação com a rede pública e a forma de organização do trabalho docente na escola;

e ênfase na pesquisa como meio de produção de conhecimento e intervenção na

prática social;

c) gestão democrática como instrumento de luta contra a gestão autoritária na

escola, entendida como superação do conhecimento de administração enquanto

técnica, a fim de apreender o significado social das relações de poder que se

reproduzem no cotidiano da escola, nas relações entre os profissionais, entre estes

e os alunos, assim como na concepção e elaboração dos conteúdos curriculares;

d) compromisso social e político do profissional da educação, com ênfase na

concepção sócio-histórica de educador, estimulando a análise política da educação

e das lutas históricas dos profissionais professores articuladas com os movimentos

sociais;

e) trabalho coletivo e interdisciplinar entre alunos e entre professores como eixo

norteador do trabalho docente na universidade e da redefinição da organização

curricular; a vivência e a significação dessa forma de trabalho e da produção de

conhecimento permitem a apreensão dos elementos do trabalho pedagógico na

escola e das formas de construção do projeto pedagógico-curricular de

responsabilidade do coletivo escolar;

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21

f) formação inicial articulada à formação continuada, assegurando solidez teórico-

prática na formação inicial e diálogo permanente entre o locus de formação inicial e

o mundo do trabalho, por intermédio de programas e projetos de educação

continuada, correspondendo à concepção de uma formação em redes de

conhecimento e saberes, incluindo os programas de pós-graduação (Anfope 1998)17.

Esses princípios orientadores, construídos e reafirmados a cada Encontro Nacional,

configuram-se também instrumento de análise e discussão das políticas atuais no

campo da formação de professores. Eles têm orientado a atuação dos educadores

nas últimas décadas e nos últimos dois anos vêm referenciando o movimento e as

discussões, em nível nacional, das diretrizes curriculares para os cursos de

formação dos profissionais da educação.

As diretrizes curriculares e a escola única de formação: Uma proposta em construção

O processo de elaboração das diretrizes curriculares para os cursos de graduação,

desencadeado pelo MEC e pelo CNE em 1997, insere-se no processo de "ajuste"

das universidades às novas exigências dos organismos internacionais, em particular

do Banco Mundial e do FMI,18 e visa adequar a formação de profissionais ao

atendimento das demandas de um mercado globalizado. No campo da formação de

professores, o processo de elaboração das diretrizes expressa as contradições

presentes nas discussões atuais, trazendo à tona os dilemas e as dicotomias no

processo de formação: professor x generalista, professor x especialista e

especialista x generalista19.

Coerente com as formulações históricas da entidade, a Anfope reafirma em seu

documento que propõe as diretrizes para os cursos de formação dos profissionais da

educação, as universidades e suas faculdades/centros de educação como o locus

privilegiado da formação dos profissionais da educação para atuação na educação

básica e no Ensino Superior. Nessa discussão, vem dando ênfase a duas questões

fundamentais: a) a necessidade de repensar as estruturas das faculdades/centros

de educação e a organização dos cursos de formação em seu interior, e b) a

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22

necessidade de superar a fragmentação entre as habilitações no curso de

pedagogia e a dicotomia entre a formação dos pedagogos e dos demais licenciados.

A decisão de formular diretrizes exclusivamente para formação de professores20, em

separado da elaboração das diretrizes para o curso de pedagogia, retirando do

debate a formação dos profissionais da educação não é uma questão menor; pelo

contrário, é uma questão do conteúdo da formação, que envolve concepções de

escola, educação, sociedade e educador que assumimos e que fundamentam e

informam as propostas de organização curricular e institucional no campo da

formação.

Entendidas como elementos norteadores gerais das organizações curriculares, por

conta da flexibilidade que propugnam, as diretrizes podem apontar e reforçar o

aligeiramento, colocando em risco a sólida formação teórica no campo de

conhecimento específico, necessária para a formação científica e crítica dos

profissionais. Contraditoriamente, abrem a possibilidade da construção de novas

alternativas no campo institucional e acadêmico nas instituições de ensino superior.

No meio dessas contradições, cabe ao movimento dos educadores dar conteúdo e

forma a esse debate, redirecionando-o para o resgate das concepções presentes

hoje nas diretrizes para o curso de pedagogia e em grande parte dos cursos de

pedagogia, socializando-as para o conjunto dos cursos de formação.

As políticas atuais, que reforçam o aligeiramento e o caráter pragmático e

conteudista da formação e da profissionalização do magistério, exigem a

socialização de propostas de organização curricular para os cursos de formação dos

profissionais da educação. É com esse objetivo que a Anfope resgata a idéia de

escola única de formação, formulada por essa mesma associação em 199221 e

aprofundada no IX Encontro Nacional, em 98.

Essa proposta de escola única de formação – única porque o conteúdo da formação

é articulado e comum a todos os profissionais da educação para todos os níveis (e

não como modelo único de formação ou como local específico de formação) – é uma

das muitas possibilidades na direção de concretizar alternativas às formas atuais de

estrutura dos cursos de formação. Acreditamos ser necessário continuar defendendo

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23

a multiplicidade de experiências em termos de organização curricular dos cursos de

formação, que sejam acompanhadas em seu desenvolvimento, socializadas e

debatidas amplamente pela comunidade da área. Esse parece ser um bom caminho,

em oposição ao modelo único de formação, para a construção de caminhos

alternativos à formação de professores/profissionais da educação, com vistas ao

aprimoramento da educação e da escola públicas em nosso país.

Do ponto de vista da Anfope, deve ser entendida como uma das propostas

possíveis, resultante de um esforço coletivo, e proposta geradora de reflexões a

serem ampliadas. Como já se apontava em 1992, ela traz, em si, elementos teóricos

de grande complexidade e busca dar forma e estrutura ao conteúdo acumulado nas

reflexões e experiências coletivas. No entanto, entendemos também que, como uma

das propostas possíveis, deve ser estudada tanto na perspectiva de uma proposta

futura, quanto na perspectiva de uma proposta em construção.

Nas circunstâncias atuais, em que a proposta dos Institutos Superiores de Educação

e do Curso Normal Superior marca uma reforma universitária imposta no campo da

formação, é possível e mesmo desejável que diferentes propostas de organização

curricular, oriundas de iniciativas individuais, de entidades ou instituições, possam

ser amplamente divulgadas e socializadas, para que possam constituir-se em

referência para o movimento dos educadores que, em cada instituição, poderá

construir caminhos alternativos fundados em concepções de educação, educador e

sociedade explícitas e presentes nos projetos pedagógicos dos cursos de formação.

O papel das faculdades e dos centros de educação

Apesar das deliberações e pareceres que negam a priorização dessas instituições

como responsáveis pela formação, entendemos que as universidades e suas

faculdades/centros de educação constituem-se no locus privilegiado da formação

dos profissionais da educação para atuação na educação básica e no ensino

superior. Entretanto, as exigências cada vez mais presentes no campo da formação

de professores nos colocam também o desafio de repensar as estruturas atuais das

faculdades/centros de educação e a organização dos cursos de formação em seu

interior, no sentido de superar a fragmentação entre as habilitações no curso de

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24

pedagogia e a dicotomia entre a formação dos pedagogos e dos demais licenciados,

considerando-se a docência como a base da formação e da identidade profissional

de todos os profissionais da educação.

As áreas e os âmbitos de atuação das faculdades/centros/departamentos de

educação inserem-se na formação inicial dos profissionais da educação, formação

em nível de pós-graduação lato e stricto senso e formação continuada, presencial e

a distância.

Na proposta de escola única, as várias instâncias formadoras são articuladas na

faculdade/centro/departamento de educação e concebidas como programas

articulados e supradepartamentais, sendo cada um dos programas, unidades com

responsabilidades de pesquisa, ensino e extensão, articuladas em uma coordenação

colegiada.

Mesmo considerando a universidade como o locus privilegiado para a formação de

professores, não se pode desconhecer, no entanto, a existência de dificuldades

oriundas da estrutura atual que devem ser encaradas como inibidoras e limitadoras

de passos mais avançados na direção de novas estruturas de formação. Entre essas

dificuldades, apontamos algumas que já em 1992 foram destacadas pela Anfope e

que se mantêm, na atualidade, em grande parte das instituições: restrições

orçamentárias que impedem a busca de alternativas criadoras no sentido de romper

as barreiras das diferentes unidades da universidade; distanciamento entre

faculdades/centros de educação e os institutos, tanto de ordem físico-espacial

quanto de objetivos, interesses e intenções no campo da pesquisa, do ensino e da

extensão; falta de recursos humanos para dar conta das responsabilidades

atribuídas às faculdades de educação em relação às licenciaturas; fragmentação e

departamentalização nas próprias faculdades de educação (que ainda não foram

superadas, apesar das possibilidades da LDB); resistências em assumir co-

responsabilidades, levando a uma luta por poder, prestígio e na busca de identidade

entre faculdades e institutos; desprestígio e desvalorização da profissão do

magistério, o que leva os estudantes a optar pelo bacharelado, e só depois pela

licenciatura, impossibilitando a criação de cursos de formação de professores com

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25

propostas pedagógicas próprias; dificuldades em romper a atual estrutura e a carga

didática das disciplinas das licenciaturas, limitadas às psicologias, fundamentos,

didática e práticas de ensino, com algumas inovações no campo de disciplinas de

instrumentalização e projetos.

Se essas limitações são impeditivas de novas construções curriculares, todos os

esforços deveriam ser direcionados para superá-las. Somente sua superação pode

auxiliar a enfrentar a tentativa de retirada dos cursos de formação de seu interior ou

a criação de novas unidades acadêmicas – Institutos Superiores de Educação – ou

outras instituições, caminhos que certamente aprofundarão e perpetuarão os

problemas já existentes.

Experiências em curso em várias instituições apontam para a superação dos

departamentos como forma organizacional do ensino e da pesquisa no interior das

faculdades de educação, com a criação de núcleos, áreas temáticas ou outras

formas de organização, que alteram significativamente a forma de produção de

conhecimento no interior dos cursos e programas das unidades universitárias.

Repensar tais estruturas também pode ser um caminho interessante para a

construção de novas proposições para a formação de professores.

Os cursos e programas de formação de professores

As faculdades ou centros de educação, em estreita articulação com os

institutos/faculdades/departamentos das áreas específicas e mantendo vinculação

orgânica com os sistemas públicos de ensino, são responsáveis, no interior das IES,

pela construção do projeto pedagógico próprio dos cursos e programas de formação

dos profissionais da educação. Já existem numerosas experiências nesse sentido,

especialmente nas instituições que experienciam os Fóruns de Licenciaturas como

forma de articular e integrar toda a formação de professores da instituição.

A proposta em discussão prevê que os cursos atualmente existentes para atender à

formação inicial para a educação básica – educação infantil, Ensino Fundamental e

Ensino Médio –, à formação continuada e à formação de professores para os cursos

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técnicos/profissionalizantes e superior desdobrem-se em programas de formação de

professores, com as seguintes características:

Programa de formação de profissionais para educação básica – curso de pedagogia:

docência das séries iniciais do ensino fundamental – 1a a 4a série e educação

infantil, ou outras modalidades, contemplando as dimensões de gestão e

organização do trabalho pedagógico escolar e pesquisa, de plena responsabilidade

das faculdades/centros/departamentos de educação;

Programa de formação de profissionais para a educação básica: cursos de

licenciatura para a docência de 5a a 8a série, Ensino Médio, em estreita vinculação e

interface com os institutos das áreas específicas;

Programa de formação de profissionais da educação para gestão e coordenação

pedagógicas na escola básica (esse programa, presente no curso de pedagogia,

seria articulado aos cursos/programas de formação de professores das áreas

específicas e aberto a todos os estudantes, que poderiam cursá-lo

concomitantemente ou após a formação específica, dependendo da estrutura

organizacional da instituição formadora);

Programa de formação pedagógica para portadores de diploma de Ensino Superior,

considerando-se a necessária revisão da Resolução 02/97 de modo a ampliar o

mínimo necessário no que tange aos conhecimentos das áreas específicas e

pedagógico-didáticos;

Programas de formação continuada, para profissionais da educação básica;

Programas de educação a distância;

Programas de formação em educação sindical, educação especial, educação de

jovens e adultos, produção de material didático, novas linguagens, multimídia, entre

muitas outras modalidades que abranjam o campo de atuação do pedagogo, como

ênfases nos demais cursos ou articulados em outra forma, dependendo da

instituição;

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27

Programas de pós-graduação stricto e latu sensu em educação.

Todos esses programas articulam-se entre si, a partir da concepção de base comum

nacional. Com essa organização, abre-se a oportunidade para que certas atividades

sejam vivenciadas conjuntamente por todos os alunos dos programas, inclusive no

nível dos conteúdos formativos das áreas de fundamentos e outros da base comum

nacional – como os relativos à iniciação à pesquisa, práticas pedagógicas, vivências

e estágios profissionais, gestão e organização do trabalho pedagógico e do trabalho

escolar, por exemplo.

Importante ressaltar também que o corpo docente não é exclusivo de um ou outro

programa, mas é altamente desejável que se movimente entre os programas de

formação inicial e a pós-graduação.

Em cada instituição, as faculdades/centros/departamentos de educação, em parceria

com os institutos/centros/departamentos das áreas específicas, poderão constituir

colegiado próprio, com a participação de professores e estudantes, buscando

incorporar professores da rede pública e entidades sindicais de professores. Esse

colegiado é responsável pela definição da política global de formação nos cursos e

programas de formação dos profissionais da educação. Os atuais Fóruns de

Licenciaturas e Comissões de Graduação dos cursos de pedagogia, onde existirem,

poderiam constituir-se conjuntamente como esse colegiado, responsáveis pela

definição e pela articulação dessa política, buscando articulação também com as

Comissões de Pós-graduação, no que diz respeito à pesquisa e à articulação da

formação de profissionais para o Ensino Superior.

Esse espaço institucional de formação – tenha a denominação de escola única ou

qualquer outra –, desde que incorpore os conteúdos da formação dos atuais cursos

de pedagogia à nova estrutura curricular e organizacional, abre perspectivas

inovadoras para a formação de professores, no interior das IES, baseando-se nas

experiências atualmente existentes – consolidadas e em desenvolvimento – e

constituindo-se como o novo que avança para formas superiores de organização.

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28

As alternativas que se desenham no cenário educacional postas pelo quadro das

atuais políticas para a formação de professores desafiam-nos a pensar propostas

concretas que possam consolidar a base comum nacional em uma perspectiva de

saídas alternativas à atual estrutura dos cursos de formação, em oposição às

propostas atuais dos Institutos Superiores de Educação e do Curso Normal Superior.

Pensar essas alternativas é colocar em movimento as concepções e práticas que

orientam o pensamento mais avançado no campo da formação de professores,

garantindo as atuais formas e aprimorando-as na busca por uma educação com

bases sólidas voltada para a formação humana.

NOTA: Ao terminar este artigo, tomamos conhecimento do Decreto Presidencial no

3.276 de 6 de dezembro de 1999, regulamentando a formação de professores para

a educação básica, e estabelecendo que a formação de professores para as séries

iniciais e educação infantil se dará exclusivamente nos Cursos Normais Superiores.

Assim, de forma autoritária, violenta, é imposta pelo governo e pelo MEC a reforma

no campo da formação. Vencidos e derrotados na discussão aberta e democrática e

pela construção teórica da área, impõe pela força da lei a discussão vencida. O

medo da derrota, em virtude das pressões dos setores privatistas e dos

compromissos com os ajustes das agendas internacionais, atropelou o próprio CNE,

que vinha discutindo a questão.

Só o tempo e a realidade podem confirmar ou rejeitar a validade de certas idéias.

Nada nem ninguém mais.

Notas

1. Dentre essas medidas anteriores à LDB, destacamos a Portaria das Licenciaturas

(Esquema I), posteriormente transformada em Resolução 02/97 aprovada pelo CNE,

o PL 370 da autonomia universitária, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), escolha de dirigentes

universitários, Parâmetros Curriculares Nacionais, Sistema de Avaliação da

Educação Básica, Exame Nacional de Cursos, entre outras.

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29

2. Cf. IV Encontro Nacional da Comissão Nacional de Reformulação dos Cursos de

Formação do Educador (Conarcfe) 1989.

3. Cf. Anfope 1994, p. 28.

4. Cf. Documento "Construindo uma política nacional global de formação dos

profissionais da educação", Anfope, out. de 1997.

5. Esse curso, pensado inicialmente na LDB como parte integrante dos Institutos

Superiores de Educação, recebeu tratamento diferenciado pelo CNE quando a

minuta de Resolução foi devolvida ao Conselho pelo ministro, com a recomendação

de que a sua criação pudesse estar separada da criação dos ISE, podendo,

portanto, existir em qualquer instituição de ensino superior, ou seja, nas

universidades, já que, pelo Parecer 115/99, as faculdades integradas e as

faculdades isoladas com cursos de licenciaturas deverão se transformar em

Institutos Superiores de Educação.

6. Documento distribuído às comissões de especialistas das diferentes áreas

encarregadas de elaborar as diretrizes para as licenciaturas. Guiomar N. Mello,

"Formação inicial de professores para a educação básica: Uma (re)visão radical

(versão preliminar para discussão interna)". São Paulo, out./nov. 99 (Mimeo).

7. Veja-se a proliferação de cursos de formação de professores em 1.600 horas,

com aval dos poderes públicos estaduais.

8. Boletim Anfope no 8, abril 99.

9. Tendo perdido na discussão democrática e aberta com a comunidade da área no

processo de elaboração das diretrizes curriculares, o CNE e o MEC tentam impor

essa concepção de maneira arbitrária e autoritária, como forma de regulamentar a

nova instituição de formação de professores. Infelizmente, encontram guarida em

elaborações teóricas de educadores que, talvez de forma desavisada, sob o manto

do novo, apresentam idéias que reforçam as políticas neoliberais para a escola

pública. Essas idéias estão presentes na produção teórica de alguns estudiosos da

área da Didática. Cf. Libâneo e Pimenta 1999 (voto em separado).

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10. Estudos recentes na área da administração e supervisão educacional reafirmam

a docência como base da formação desses profissionais. Ver especialmente Ferreira

1999.

11. A concepção que orienta a separação da formação de professores da formação

dos especialistas manifesta no Parecer 970 da CES e nas propostas atuais é a

mesma – guardadas as devidas especificidades e nomenclaturas – que orientou, na

década de 1970, a concepção de Valnir Chagas, deslocando a formação dos

especialistas para a pós-graduação e deixando o curso de pedagogia

exclusivamente para formação de professores.

12. Para recuperar a história real de constituição dos cursos de pedagogia, é preciso

que nos remetamos também às experiências dos cursos nas diversas IES,

reconhecidos como experiências inovadoras no campo da formação. A sua história e

as reformulações ocorridas nos anos 80 e 90 confundem-se, de forma positiva e

significativa, com as lutas do movimento dos educadores pela sólida formação dos

profissionais da educação, entendidos aqui os pedagogos e os licenciados, pela

democratização da sociedade e pela valorização da educação e da escola públicas.

13. Cf. Anfope, Documento Final VI Encontro Nacional, Belo Horizonte, 1992.

14. Documento-pesquisa da Confederação Nacional dos Trabalhadores da

Educação. Entregue ao MEC em 6/11/1999, na Marcha em defesa da escola e da

educação públicas.

15. Ver Anfope Regional Sudeste/Estadual RJ, Textos-base 1998.

16. As proposições e os princípios da Anfope e o reconhecimento à contribuição que

a entidade e os educadores vêm dando a essa temática podem ser constatados pela

referência a ela no documento dos Pró-Reitores de Graduação, de maio de 1996.

17. Cf. Anfope, Documento Final IX Encontro Nacional, Campinas, 1998.

18. O trabalho de Celi Z Taffarel, "Diretrizes curriculares e plano nacional de

graduação: Do ataque às consciências ao amoldamento subjetivo", Recife, 1999,

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mimeo, apresentado no IV Encontro Nacional de Formação dos Profissionais da

Educação, traz uma análise detalhada sobre a inserção do processo de elaboração

das diretrizes curriculares no quadro das novas demandas do processo de

globalização.

19. O próprio MEC constituiu a Comissão de Especialistas de Pedagogia e somente

tempos depois constituiu o GT Licenciaturas, separado dos bacharelados.

20. Cf. Boletim Anfope nº 11, agosto 1999.

21. Essa proposta surge das contribuições da professora Marlene Ribeiro,

posteriormente detalhadas em seu artigo "Formação unificada do profissional de

ensino: Uma proposta da Faculdade de Educação da Universidade do Amazonas".

Em Aberto nº 54, 1992.

The reform of superior teaching in the field of professionals ubbringing of

basic education: The educational policies and the teachers movement

ABSTRACT: This work presents the discussion that have oriented the debate about

the formation of educational professionals, recuperating the trajectory of the

movement of the educators in the struggle for transformation and professionalization

of teaching as represented actually by the National Association for the Professional

Educators Formation (Anfope), during the last 20 years. The collective construction

of common national base in opposition to the formation policies and the proposal of a

single school of formation which materializes Anfope's principles for the

reorganization of the courses of education professional formation in the universities,

have oriented the actual debate of resistence to the official policies that propugnes

hastening and fragmentation in the professional teaching formation.

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_______. "Diretrizes curriculares para os cursos de formação dos profissionais da educação". Reunião anual da ANPEd, 1998, (Mimeo).

ANFOPE REGIONAL SUL. "Conclusões do Encontro Regional e Estadual." Rio de Janeiro, 1998, (Mimeo).

ANFOPE REGIONAL SUDESTE/ESTADUAL RJ. "Conclusões do Encontro Regional e Estadual. Rio de Janeiro, 1998, (Mimeo).

* Professora da Faculdade de Educação, Unicamp e presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope). Email: [email protected]

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Educação & Sociedade Print version ISSN 0101-7330

Educ. Soc. vol.27 no.96 Campinas Oct. 2006

doi: 10.1590/S0101-73302006000300010

ARTIGOS

DIRETRIZES CURRICULARES DO CURSO DE PEDAGOGIA NO BRASIL: disputas de projetos no campo da formação do profissional

da educação

Márcia Angela da S. AguiarI;

Iria BrzezinskiII; Helena Costa L. Freitas

III;

Marcelo Soares Pereira da SilvaIV

; Ivany Rodrigues Pino

V

IProfessora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e atual presidente da Associação

Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED). E-mail: [email protected] IIProfessora da Universidade Católica de Goiás (UCG) e conselheira do Centro de Estudos Educação

e Sociedade (CEDES). E-mail: [email protected] IIIProfessora aposentada da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e atual presidente da

Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE). E-mail: [email protected]

IVProfessor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e atual presidente do Fórum de Diretores

de Faculdades/Centros de Educação das Universidades Públicas Brasileiras (FORUMDIR). E-mail: [email protected]

VProfessora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e atual

presidente do Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES). E-mail: [email protected]

RESUMO

Neste artigo, os autores analisam as novas diretrizes curriculares do curso de

pedagogia, objeto de normatização do Conselho Nacional de Educação (CNE), em

2005, a partir do debate feito à luz do acervo de conhecimentos teórico-práticos

sistematizados pelas principais entidades do campo educacional (ANFOPE, ANPED,

CEDES, FORUMDIR, ANPAE).1 Evidenciam, criticamente, alguns dos problemas e

das tensões que marcam a trajetória desse curso ao longo da história da educação

brasileira. Focalizam, no âmbito das políticas educacionais, em especial, o

movimento dos educadores pela definição das diretrizes curriculares para a

formação dos profissionais da Educação Básica, que reflete posições de ordem

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epistemológica, pedagógica e política atinentes às visões e aos projetos

educacionais em disputa, no Brasil, nas últimas décadas. A problematização das

diretrizes curriculares concorre para ampliar a compreensão da complexidade do

campo da pedagogia e dos desafios teórico-práticos com que as instituições de

ensino superior, em particular as universidades, deparam-se para materializar a

reforma do curso de pedagogia, na esteira das novas regulamentações legais e na

perspectiva de uma formação cidadã.

Palavras-chave: Pedagogia e curso de pedagogia. Políticas educacionais.

Diretrizes curriculares de pedagogia. Profissionais da educação. Formação de

professores. Política de formação.

ABSTRACT

Based on the debate conducted in the light of the theoretical-practical knowledge

acquired by the main organisms of the educational field (ANFOPE, ANPED, CEDES,

FORUMDIR, ANPAE), the authors analyze the new curriculum guidelines of the

pedagogy course, which was regulated by the Conselho Nacional de Educação

(CNE – Brazilian Council for Education) in 2005. They critically highlight some of the

problems and tensions that have marked the trajectory of this course along the

history of Brazilian education. Within the educational policies, they more particularly

focus on the educator movement for the definition of curriculum guidelines for the

training of basic education professionals, which reflects some epistemological,

pedagogical and political positions related to the educational visions and project in

dispute, in Brazil, these last decades. Problematizing the curriculum guidelines helps

understanding better how complex the field of pedagogy is and what theoretical-

practical challenges face the higher education institutions, more particularly

universities, in order to concretize the reform of the pedagogy course to comply with

the new legal regulations but also from the point of view of a citizen training.

Key words: Pedagogy and pedagogy course. Educational policies. Pedagogy

curriculum guidelines. Education professionals. Teacher training. Training policies.

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Introdução

Resultam das diferentes interpretações do campo da pedagogia e das disputas

político-pedagógicas dos atores sociais, nos diversos contextos sócio-históricos, as

várias identidades atribuídas ao curso de pedagogia, no Brasil. Essas identidades

revelam, grosso modo, conflitos atinentes ao estatuto teórico e epistemológico da

pedagogia e do curso de pedagogia, sobretudo no que se refere às concepções de

licenciatura e bacharelado e seus desdobramentos na configuração curricular desse

curso. Sem dúvida, as visões controvertidas a respeito dessas concepções têm

predominado no debate e se manifestam mais claramente nas propostas que

vinculam ou separam licenciatura e bacharelado, ora vistos como cursos distintos,

ora como dimensões de uma estrutura única de curso.2 Nos debates que pontuaram

as duas últimas décadas, sobre as propostas de reformulações curriculares do curso

de pedagogia, essas posições conflituosas se tornam mais visíveis nas proposições

de diretrizes curriculares emanadas das comissões de especialistas do curso de

pedagogia3 e em artigos sobre tal temática divulgados em livros e revistas de

circulação nacional.

Como observam Aguiar e Melo (2005a), considerando as interpretações

diferenciadas sobre a pedagogia, as diversas identidades atribuídas ao curso de

pedagogia no Brasil abrangem desde uma concepção de licenciatura separada do

bacharelado, de corte positivista, a uma concepção de curso de estrutura única,

envolvendo a relação intrínseca entre ambos, com base num enfoque globalizador.

Os diferentes sentidos dados historicamente à pedagogia e ao curso de pedagogia

materializados no currículo expressam, como observam essas autoras, abordagens

sobre teoria-prática, conteúdo-forma e objeto-sujeito e reportam-se às questões

epistemológicas e socioculturais que permeiam o debate sobre a modernidade.

Hodiernamente, ainda se manifesta no campo teórico a visão tecnicista, sob a forma

do neotecnicismo (Freitas, 1992; 1995), em confronto com outros enfoques

tradicionais e críticos.

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No plano da definição das políticas educacionais, em especial daquelas voltadas

para a normatização das bases curriculares dos cursos de graduação, entre estes o

de pedagogia, esses conflitos se expressam de forma permanente, traduzindo

perspectivas diferenciadas dos atores envolvidos. Considerando tais tensões que

atravessam as lutas sociopolíticas e a produção acadêmica da área, o presente

texto (re)visita o curso de pedagogia, apontando para algumas questões recorrentes

ao longo de sua história, e que são (re)atualizadas no contexto político da reforma

da educação superior no país, que se manifestam inclusive nas novas diretrizes

curriculares do curso de pedagogia.

A formação do educador no curso de pedagogia: os embates das últimas

décadas

As políticas educacionais do regime autoritário monitoradas pelas Leis da Reforma

Universitária (1968) e do Ensino de 1º e 2º Graus (1971), com evidente interesse de

servir ao mercado, definiram um modelo de formação de professores

compartimentado em dois loci da universidade: de um lado, a faculdade de

educação ou unidade acadêmica equivalente, responsável pelo curso de pedagogia

e a formação pedagógica dos licenciandos, e, de outro, os institutos de conteúdos

específicos, onde se formavam bacharéis e licenciados.

Naquele contexto, as reformulações propostas para o curso de pedagogia

encontram razões, especialmente, na indefinição dos conteúdos básicos do

currículo, portanto na falta de especificidade do curso, pelo fato de a área de saber

da pedagogia ser campo de aplicação de outras ciências, e no reducionismo

simplista, manifestado no preceito legal de "treinar" pedagogos para

desempenharem algumas tarefas não-docentes na escola.

A respeito do "treinar" pedagogos, Brzezinski (1994, p. 91) mostra desacordo ao

assim expressar-se:

Essa prática autoritária, inculcadora de uma ideologia alienante que buscava

transportar para a organização escolar, cuja natureza exige um trabalho coletivo, as

relações fragmentadoras, particularizadas inerentes às organizações do trabalho

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produtivo, dominou o sistema educacional brasileiro, por duas décadas. De maneira

mais precisa, dominou a "capacitação de recursos humanos para a educação", a

qual inclui formação de professores e especialistas, sob a égide da Teoria do Capital

Humano.

Com base nestas "diretrizes" e na fundamentação doutrinária e técnica das duas leis

já citadas, o CFE passou a elaborar indicações para definir "o papel e os campos de

estudos próprios da Faculdade de Educação ou unidade equivalente" (Chagas,

1976, p. 9). Este autor, também idealizador e relator de um conjunto de indicações

no CFE, atribuía a ele a autoria de um novo "sistema de formação de professores"

que deveria deitar por terra, de uma vez por todas, o Esquema 3+1. Seu intento,

contudo, não foi alcançado, mas ele conseguiu aprovar no CFE um "pacote

pedagógico", composto por diversas indicações que, não fosse a resistência dos

educadores mobilizados nacionalmente, teria se consolidado como sistema.

Nessa ocasião, a Valnir Chagas (1976) interessava provocar mudanças estruturais

nas licenciaturas e propugnava a extinção do curso de pedagogia, quando aprovou

no CFE as Indicações n. 67/68/1975 e n. 70/71/1976, que discorriam,

respectivamente sobre Estudos Superiores de Educação, Formação Pedagógica das

Licenciaturas, Preparo de Especialistas em Educação e Formação de Professores

de Educação Especial. A Indicação n. 69/1976, que versava sobre Formação do

Professor para os Anos Iniciais da Escolarização em Nível Superior, não foi

homologada. Segundo a ideologia da época, o "pacote pedagógico" de Chagas

referia-se à "Formação de Recursos Humanos da Educação", que incluía o preparo

para as funções docentes e não-docentes da escola de 1º e 2º graus.

A homologação das quatro supramencionadas indicações foi recebida pelos

educadores como mais uma arbitrariedade do poder que desconhecia práticas,

pesquisas e estudos desenvolvidos pelos profissionais que se debruçavam sobre as

questões da formação em seu cotidiano. Rapidamente, a mobilização nacional para

a reformulação dos cursos de pedagogia tomou impulso à medida que foram

suscitados debates acerca do corpus doutrinário e técnico das indicações do CFE.

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Ponto de partida da mobilização foi a realização do I Seminário de Educação

Brasileira (1978) na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), organizado

com a objetivo de divulgar resultados da pesquisa "Análise do currículo e conteúdo

programático dos cursos de pedagogia com vistas a propostas alternativas de

reformulação", o qual se transformou em marco histórico no Movimento dos

Educadores que aspirava subverter a tradicional ordem de "cima para baixo" nas

decisões sobre as questões educacionais.

Dois anos após, a USP sediou a I Conferência Brasileira de Educação (CBE),

também um grande movimento que teve como tônica os questionamentos contra as

políticas educacionais da ditadura. Nessa CBE,4 em 2 de abril de 1980, foi instalado

o Comitê Pró-Formação do Educador, que passou a funcionar na Universidade

Federal de Goiás (UFG).

O Movimento dos Educadores toma vulto e demonstra sua força, como resistência

ao poder instituído, durante toda a década de 1980, por meio de debates, embates e

manifestações públicas por intermédio de ações sob o ponto de vista

epistemológico, político e didático-pedagógico. Sob o enfoque epistemológico, as

ações dos educadores visavam à redefinição e à busca da identidade do curso de

pedagogia no elenco dos cursos de formação de professores. Sob o ponto de vista

político, em face do processo de "abertura democrática" os educadores acreditavam

na transformação político-social da sociedade brasileira, historicamente necessária.

"Movidos pela consciência coletiva, deflagraram a luta pela valorização do

magistério, assim como por um profissionalismo que fora entorpecido pelo

utilitarismo cego das políticas educacionais" (Brzezinski, 2005, p. 12). Sob a

perspectiva didático-pedagógica pretendiam apresentar uma proposta nacional de

mudanças estruturais no curso de pedagogia, que rompesse com a camisa-de-força

imposta pelo currículo mínimo. Perspectiva logo redimensionada, visto que as

mudanças deveriam abranger todo o "sistema de formação de professores", ao se

considerar que a formação pedagógica do professor mantém sua base teórico-

epistemológica no campo educacional e a base da identidade do profissional da

educação encontra-se na docência: todos são professores (grifos nossos)

(Comissão Nacional, 1983, p. 5).

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A literatura da área evidencia os muitos avanços e conquistas que advieram desses

embates enfrentados na década da "abertura democrática". No conjunto das

conquistas, podem-se destacar, em especial, a aceitação da base comum nacional

organizada em eixos curriculares que, com a evolução dos estudos epistemológicos,

foram tomando a dimensão de "(...) princípios norteadores que fundamentam a base

comum nacional e expressam a concepção sócio-histórica da educação construída

na práxis educacional" (ANFOPE et al., 2005, p. 1); as reformulações curriculares

feitas pela maioria das universidades públicas e particulares (que não se pautam

pela lógica do lucro), que adotaram a docência como base da identidade do curso de

pedagogia e extinguiram as habilitações; a intensa produção científica dos

educadores socializada em periódicos e livros e a permanente participação no

Fórum em Defesa da Escola Pública.

O movimento pela construção das diretrizes de formação

O movimento de discussão e elaboração das diretrizes da pedagogia tem um marco

importante em 1998, quando a Comissão de Especialistas de pedagogia, instituída

para elaborar as diretrizes do curso, desencadeou amplo processo de discussão, em

nível nacional, ouvindo as coordenações de curso e as entidades – ANFOPE,

FORUMDIR, ANPAE, ANPED, CEDES, Executiva Nacional dos Estudantes de

pedagogia. O resultado desse processo foi a elaboração do Documento das

Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia e seu encaminhamento ao CNE, em

maio de 1999,5 após uma grande pressão de todos esses segmentos junto à SESU

e à Secretaria de Ensino Fundamental, do Ministério da Educação, que resistiam em

enviá-las ao CNE, na tentativa de construir as diretrizes para o curso normal

superior, criado pela LDB e prestes a ser regulamentado.

Seguido de um conjunto de assinaturas representativas dos diferentes segmentos, o

documento foi encaminhado ao CNE e permaneceu, ao longo de oito anos,

aguardando a definição e regulamentação de outros pontos ainda polêmicos com

relação à formação, como o próprio curso normal superior, que até o momento não

possui suas próprias diretrizes.6 Para a criação dos inúmeros cursos hoje existentes,

foram elaborados pela Comissão de Ensino de Pedagogia e pela Comissão de

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Especialistas Formação de Professores, em 2001, os indicadores para autorização e

reconhecimento.

Neste intervalo entre maio de 1999 e junho de 2004, as várias iniciativas do MEC

com relação à formação de professores e ao próprio curso de pedagogia (Parecer

da Câmara do Ensino Superior – CES n. 133/01, Resoluções n. 01 e 02/2002, que

instituem Diretrizes para Formação de Professores) causaram mais transtornos do

que encaminhamentos positivos para tais cursos, a tal ponto que hoje a diversidade

de estruturas exigirá provavelmente do Poder Público um acompanhamento

rigoroso, bem como processos de avaliação da formação oferecida, de modo que se

preservem as iniciativas positivas e se estabeleçam metas para o aprimoramento da

qualidade de outras.

As iniciativas do MEC induziram também a uma política de crescimento

desordenado do ensino superior privado. Cabe destacar a crescente expansão dos

cursos normais superiores e do próprio curso de pedagogia, principalmente em

instituições privadas, em sua grande maioria sem história e sem compromisso

anterior com a formação em quaisquer de seus níveis e modalidades. Dados oficiais

do INEP/MEC (2006) revelam que existem na atualidade 1.437 cursos de pedagogia

e 1.108 cursos normais superiores, sem considerar os inúmeros ises e cursos de

licenciatura criados também nesse período.

Os educadores e suas entidades acompanharam de perto este movimento, e

estiveram presentes, em todo este período, mobilizando-se por meio de encontros,

reuniões, documentos, orientados sempre pelo princípio fundamental que desde a

promulgação da LDB se firmara junto ao MEC, SESU e CNE: as discussões das

diretrizes da pedagogia se inserem na discussão das orientações, políticas e

Diretrizes da Formação dos Educadores da Educação Básica, não podendo,

portanto, serem aprovadas fora deste contexto. Esta formulação corresponde a uma

expectativa histórica dos educadores de construir uma política nacional de formação

e, em seu interior, um sistema articulado e integrado de formação dos profissionais

da educação, contemplando todas as modalidades e os níveis até a pós-graduação

e a formação continuada. É indicadora ainda da compreensão de que essa formação

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somente atingirá níveis qualitativamente elevados se desenvolvida de forma

integrada e articulada para todos os níveis de ensino, nas instituições universitárias.

Nessa direção, a ANFOPE, em documento de 1998, reafirma, com clareza, seus

princípios ao indicar as diretrizes para a formação dos profissionais da educação:

A ANFOPE reafirma ainda que as Universidades e suas Faculdades/Centros de

Educação constituem-se o lócus privilegiado da formação dos profissionais da

educação para atuação na educação básica e superior. Reafirma também a

necessidade de repensar as estruturas das Faculdades/Centros de Educação e a

organização dos cursos de formação em seu interior, no sentido de superar a

fragmentação entre as Habilitações no curso de pedagogia e a dicotomia entre a

formação dos pedagogos e dos demais licenciandos, considerando-se a docência

como a base da identidade profissional de todos os profissionais da educação.

(ANFOPE, 1998)

No período em foco, várias discussões ocorreram e documentos foram organizados

com o objetivo de interferir na política de formação dos educadores. Em decorrência

das pressões das entidades, em junho de 1999, a SESU/MEC institui o GT

Licenciaturas, composto por educadores da área e pela ANFOPE, que após amplas

discussões, tanto nas reuniões da ANPED como no Congresso Estadual Paulista de

Formação do Educador,7 elaborou o Documento Norteador para Elaboração das

Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação de Professores.8 Esse

documento chegou a ser discutido com representantes das entidades das áreas

específicas das licenciaturas, em um processo que começava a romper as

resistências, mas foi "engavetado" pelo MEC, que decidiu elaborar outro documento

enviado ao CNE, o qual foi aprovado em 2001 e 2002 como as Diretrizes para os

Cursos de Formação Inicial de Professores para a Educação Básica.9 Já naquele

momento, a ANFOPE e a Comissão de Especialistas de pedagogia, da SESU/MEC,

apontavam com clareza a necessidade de tratar, simultaneamente e de forma

integrada, a formação de todos os profissionais da educação, licenciados e

pedagogos. A recusa do MEC foi sempre uma tônica desses debates e embates.

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44

Em agosto de 1999, a ANFOPE manifestava-se firmemente com relação a essa

reivindicação junto ao CNE e ao MEC. Em novembro desse ano, durante o IV

Seminário Nacional e o I Encontro Nacional dos Fóruns de Licenciaturas, realizados

conjuntamente, em Recife, pela ANFOPE e FORUMDIR, ocorreu a recusa à

proposta da conselheira Eunice Durhan (do CNE), que pretendia eliminar a

possibilidade de formação de docentes para as séries iniciais e educação infantil dos

cursos de pedagogia (cf. Carta de Recife, ANFOPE/FORUMDIR, 5/11/1999).

Logo após, em dezembro de 1999, é desencadeada uma ampla mobilização

nacional contra o Decreto n. 3.276/99, que estabeleceu a exclusividade dos cursos

normais superiores para a formação dos professores para esses níveis de ensino. O

conteúdo desse decreto, em razão de pressão das universidades e entidades dos

educadores com relação ao governo federal, foi alterado em 2000 mediante o

Decreto n. 3.554, que substituiu o termo preferencialmente no lugar do

exclusivamente.10

Em maio de 2000, anterior à realização do X Encontro Nacional de Didática e Prática

de Ensino (ENDIPE), acontece o V Seminário Nacional da ANFOPE e FORUMDIR e

o II Encontro Nacional dos Fóruns das Licenciaturas, com posicionamentos sobre a

aludida questão. Na 52ª Reunião Anual da SBPC, em Brasília, em julho de 2000, a

Carta do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, firmada por 12 associações

e fóruns de educadores, reafirma a necessidade de manter, nos cursos de

graduação plena, pedagogia, a formação de professores para as séries iniciais e

educação infantil, entre outros temas.

Durante as audiências públicas regionais e nacional do CNE, que se sucederam

entre fevereiro e abril, para discussão das diretrizes de formação de professores, as

entidades signatárias – ANPED, ANFOPE, ANPAE e FORUMDIR – reafirmam

novamente, em cuidadosos e extensos documentos, a necessidade do

estabelecimento de diretrizes nacionais específicas para os cursos de pedagogia,

considerando a proposta da Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia de

1999.

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45

Durante consulta ao setor acadêmico, no âmbito do programa especial do CNE

"Mobilização Nacional por uma Nova Educação Básica", em 7 de novembro 2001,

novamente as entidades da área apresentam ao CNE o documento Posicionamento

Conjunto das Entidades, reafirmando as diretrizes curriculares para o curso de

pedagogia, que aprofunda e explicita as diretrizes de 1999.

Esse documento serviria de base para a Proposta de Diretrizes Curriculares

Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia,11 elaborada pela Comissão

de Especialistas de Pedagogia e pela Comissão de Especialistas de Formação de

Professores, e enviada ao CNE em abril de 2002.

Em maio de 2002, são aprovadas as Diretrizes para Formação de Professores. Em

junho de 2002, o CNE constitui Comissão Bicameral com a finalidade de estabelecer

diretrizes operacionais para a formação de professores para a Educação Básica e

apresentar estudo sobre a revisão das Resoluções CNE/CP n. 02/97, que dispõe

sobre os programas especiais de complementação pedagógica de bacharéis, e

CNE/CP n. 01/99, que dispõe sobre os institutos superiores de educação.

No contexto da disputa eleitoral, essa Resolução passa despercebida pela área e,

mesmo após uma reunião ampla convocada durante a Reunião Anual da ANPED,

em razão dos rumores da existência de Minuta de Resolução alterando os cursos de

pedagogia, o seu conteúdo não foi socializado naquele momento.

No entanto, no antigo CNE novos movimentos vão se gestando com o fim de

assegurar as mudanças que alguns setores propugnavam para o campo da

formação. Vem, do Conselho Estadual de São Paulo, o "modelo" de estrutura dos

cursos de formação. Nesse estado é gestada a idéia12 que se materializaria,

posteriormente, no âmbito da Comissão Bicameral, na Minuta de Resolução,

somente divulgada publicamente em julho de 2003, durante o Congresso Estadual

Paulista de Formação do Educador, mobilizando as entidades para ampliar o

debate, que vem a acontecer em outubro, durante a reunião da ANPED.

Novas diretrizes curriculares do curso de pedagogia e as proposições das

entidades do campo educacional

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As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, consubstanciadas

nos Pareceres CNE/CP n. 05/2005, 01/2006 e na Resolução CNE/CP n. 01/2006,

demarcam novo tempo e apontam para novos debates no campo da formação do

profissional da educação no curso de pedagogia, na perspectiva de se aprofundar e

consolidar sempre mais as discussões e reflexões em torno desse campo.

Esse aprofundamento exige, no entanto, que se delineiem de forma mais clara e

precisa os contornos e as perspectivas que essa formação poderá assumir em

decorrência das diretrizes aprovadas.

As DCN-Pedagogia definem a sua destinação, sua aplicação e a abrangência da

formação a ser desenvolvida nesse curso. Aplicam-se: a) à formação inicial para o

exercício da docência na educação infantil e nos anos iniciais do ensino

fundamental; b) aos cursos de ensino médio de modalidade normal e em cursos de

educação profissional; c) na área de serviços e apoio escolar; d) em outras áreas

nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. A formação assim definida

abrangerá, integradamente à docência, a participação da gestão e avaliação de

sistemas e instituições de ensino em geral, a elaboração, a execução, o

acompanhamento de programas e as atividades educativas (Parecer CNE/CP n.

05/2005, p. 6).

Abre-se, assim, amplo horizonte para a formação e atuação profissional dos

pedagogos. Tal perspectiva é reforçada nos artigos 4º e 5º da Resolução CNE/CP n.

01/2006, que definem a finalidade do curso de pedagogia e as aptidões requeridas

do profissional desse curso:

Art. 4º - O curso de Licenciatura em pedagogia destina-se à formação de

professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos

iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade

Normal, de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar e em outras

áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.

Parágrafo único. As atividades docentes também compreendem participação na

organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando:

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I - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de tarefas

próprias do setor da Educação;

II - planejamento, execução, coordenação, acompanhamento e avaliação de projetos

e experiências educativas não-escolares;

III - produção e difusão do conhecimento científico-tecnológico do campo

educacional, em contextos escolares e não-escolares.

Delineia-se, pois, que a formação no curso de pedagogia deverá assegurar a

articulação entre a docência, a gestão educacional e a produção do conhecimento

na área da educação. Com essa explicitação, o legislador afasta a possibilidade de

redução do curso a uma formação restrita à docência das séries iniciais do ensino

fundamental, aproximando-se, dessa forma, das propostas de diretrizes

apresentadas pela Comissão de Especialistas de Pedagogia de 1999. Todavia, faz-

se necessário demarcar a compreensão desses elementos constitutivos da

formação do pedagogo.

A docência nas DCN-Pedagogia não é entendida no sentido restrito do ato de

ministrar aulas. O sentido da docência é ampliado, uma vez que se articula à idéia

de trabalho pedagógico, a ser desenvolvido em espaços escolares e não-escolares,

assim sintetizado no Parecer CNE/CP n. 05/2005 (p. 7):

Entende-se que a formação do licenciado em pedagogia fundamenta-se no trabalho

pedagógico realizado em espaços escolares e não-escolares, que tem a docência

como base. Nesta perspectiva, a docência é compreendida como ação educativa e

processo pedagógico metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-

raciais e produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da

pedagogia.

Dessa forma, a docência, tanto em processos educativos escolares como não-

escolares, não se confunde com a utilização de métodos e técnicas pretensamente

pedagógicos, descolados de realidades históricas específicas. Constitui-se na

confluência de conhecimentos oriundos de diferentes tradições culturais e das

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ciências, bem como de valores, posturas e atitudes éticas, de manifestações

estéticas, lúdicas, laborais. (Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 7)

Tomados sob essa perspectiva o trabalho docente e a docência implicam uma

articulação com o contexto mais amplo, com os processos pedagógicos e os

espaços educativos em que se desenvolvem, assim como demandam a capacidade

de reflexão crítica da realidade em que se situam. Com efeito, as práticas educativas

definem-se e realizam-se mediadas pelas relações socioculturais, políticas e

econômicas do contexto em que se constroem e reconstroem. Nessa perspectiva,

Aguiar e Melo (2005a) afirmam:

(...) escapando aos reducionismos da visão teoricista (aplicação instrumental da

teoria na prática), e do praticismo (prioridade ao saber tácito, construído na prática

imediata cotidiana) na sala de aula, tem-se o entendimento de que a docência é o

fulcro de articulação dos diversos conhecimentos – aportes teóricos da pedagogia e

das Ciências da Educação e de outros conhecimentos especializados e daqueles

produtos das práticas escolares e não-escolares refletidas. Lugares onde ela se

(re)produz internamente nas suas especificidades, construindo novas alternativas de

práticas pedagógicas diante de problemáticas existentes. Neste sentido, a docência

constitui uma das mediações para a construção do discurso de síntese da

pedagogia, articulada intrinsecamente com a pesquisa. Assim, a relação docência-

pesquisa é um princípio epistemológico da prática.

Destarte, a partir do horizonte vislumbrado para a formação do profissional da

educação no curso de pedagogia, as Diretrizes Curriculares Nacionais definem os

pilares e os contornos dessa formação:

A educação do licenciado em pedagogia deve, pois, propiciar, por meio de

investigação, reflexão crítica e experiência no planejamento, execução, avaliação de

atividades educativas, a aplicação de contribuições de campos de conhecimentos,

como o filosófico, o histórico, o antropológico, o ambiental-ecológico, o psicológico, o

lingüístico, o sociológico, o político, o econômico, o cultural. O propósito dos estudos

destes campos é nortear a observação, análise, execução e avaliação do ato

docente e de suas repercussões ou não em aprendizagens, bem como orientar

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práticas de gestão de processos educativos escolares e não-escolares, além da

organização, funcionamento e avaliação de sistemas e de estabelecimentos de

ensino. (Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 6)

Como se depreende, a perspectiva que se apresenta para o curso de pedagogia é

de uma formação que favoreça a compreensão da complexidade da escola e de sua

organização; que propicie a investigação no campo educacional e, particularmente,

da gestão da educação em diferentes níveis e contextos. A pesquisa, a produção do

conhecimento no campo pedagógico e o estudo das ciências que dão suporte à

pedagogia e a própria reflexão sobre a pedagogia como ciência certamente deverão

estar presentes no processo formativo a ser desenvolvido nesse curso,

concomitantemente ao estudo a respeito da escola, da prática educativa e da gestão

educacional. Evidências encontradas nas DCN-Pedagogia, na medida em que no

Parecer CNE/CP n. 05/2005 (p. 6-7) está assim indicado:

Para a formação do licenciado em pedagogia é central o conhecimento da escola

como uma organização complexa que tem a função social e formativa de promover,

com eqüidade, educação para e na cidadania. (...) Também é central, para essa

formação, a proposição, realização, análise de pesquisas e a aplicação de

resultados, em perspectiva histórica, cultural, política, ideológica e teórica, com a

finalidade, entre outras, de identificar e gerir, em práticas educativas, elementos

mantenedores, transformadores, geradores de relações sociais e étnico-raciais que

fortalecem ou enfraquecem identidades, reproduzem ou criam novas relações de

poder (...). Finalmente é central a participação na gestão de processos educativos,

na organização e funcionamento de sistemas e de instituições de ensino, com a

perspectiva de uma organização democrática, em que a co-responsabilidade e a

colaboração são os constituintes maiores das relações de trabalho e do poder

coletivo e institucional, com vistas a garantir iguais direitos, reconhecimento e

valorização das diferentes dimensões que compõem a diversidade da sociedade,

assegurando comunicação, discussão, crítica, propostas dos diferentes segmentos

das instituições educacionais escolares e não-escolares.

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50

A formação proposta para o profissional da educação do curso de pedagogia é

abrangente e exigirá uma nova concepção da educação, da escola, da pedagogia,

da docência, da licenciatura. Uma nova compreensão que situe a educação, a

escola, a pedagogia, a docência, a licenciatura no contexto mais amplo das práticas

sociais construídas no processo de vida real dos homens, com o fim de demarcar o

caráter sócio-histórico desses elementos.

O curso de pedagogia define-se como um curso de licenciatura e, neste sentido, o

mencionado Parecer explicita que a formação para o exercício da docência nas

áreas especificadas constitui um de seus pilares. Em contrapartida, ao se

compreender e definir o curso de pedagogia como uma licenciatura, não se pode

incorrer no equívoco de organizá-lo curricularmente como um curso circunscrito ao

campo das metodologias de ensino e dos conteúdos relativos aos saberes

específicos para o exercício da docência na educação infantil, nos anos iniciais do

ensino fundamental, no curso da modalidade normal no ensino médio ou, ainda, nos

cursos de formação profissional na área da educação que começam a se fazer

presentes em nossa realidade. Até mesmo porque, como já se destacou, também,

em outros momentos, o exercício da docência desenvolve-se no contexto mais

amplo da educação, da escola e da própria sociedade, e, sendo assim, a formação

para tal exercício profissional deve fornecer elementos para o domínio desse

contexto.

A compreensão da licenciatura nos termos das DCN-Pedagogia implicará, pois, uma

sólida formação teórica, alicerçada no estudo das práticas educativas escolares e

não-escolares e no desenvolvimento do pensamento crítico, reflexivo fundamentado

na contribuição das diferentes ciências e dos campos de saberes que atravessam o

campo da pedagogia. Essa sólida formação teórica, por sua vez, exigirá novas

formas de se pensar o currículo e sua organização, para além daquelas concepções

fragmentadas, parcelares, restritas a um elenco de disciplinas fechadas em seus

campos de conhecimento. Ao contrário, as DCN-Pedagogia apontam para uma

organização curricular fundamentada nos "princípios de interdisciplinaridade,

contextualização, democratização, pertinência e relevância social, ética e

sensibilidade afetiva e estética" (p. 1).

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Desse modo, os núcleos que definirão a estrutura do curso de pedagogia – núcleo

de estudos básicos; núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos; núcleo

de estudos integradores – devem se integrar e articular ao longo de toda a

formação, a partir do diálogo entre os diferentes componentes curriculares, por meio

do trabalho coletivo sustentado no princípio interdisciplinar dos diferentes campos

científicos e saberes que informam o campo da pedagogia.

Por sua vez, a formação para a gestão educacional, como indicada nas DCN-

Pedagogia, traz uma contribuição importante rompendo com visões fragmentadas e

fortemente centralizadas da organização escolar e dos sistemas de ensino. Nos

debates sobre a formação do pedagogo vários estudos evidenciaram como a divisão

do curso de pedagogia em habilitações, como preconizado no Parecer CFE/CP n.

262/1969, acabou por contribuir para que se instalassem, na organização dos

processos de trabalho na escola e nos sistemas de ensino, modelos caracterizados

pela divisão pormenorizada do trabalho educativo; pela dicotomização das funções

de planejamento, concepção, controle e avaliação, de um lado e, do outro, das

funções de implementação, de realização do trabalho planejado; pela reprodução de

estruturas e práticas de poder excludentes, também, no contexto das práticas

educativas.

Por certo, esses modelos de organização da educação não são determinados

apenas pela formação desenvolvida nos cursos que formam profissionais da

educação, mais especificamente, nos cursos de pedagogia. No entanto, essa

formação desempenha um papel importante na produção das condições históricas

para a manutenção ou superação desses modelos, e, neste sentido, contribuindo

para a afirmação da gestão democrática da educação como elemento central na

direção dessa superação.

Ao se indicar o campo de atuação do licenciado em pedagogia, as DCN-Pedagogia

compreendem, assim, a gestão educacional:

Gestão educacional, entendida numa perspectiva democrática, que integre as

diversas atuações e funções do trabalho pedagógico e de processos educativos

escolares e não-escolares, especialmente no que se refere ao planejamento, à

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administração, à coordenação, ao acompanhamento, à avaliação de planos e de

projetos pedagógicos, bem como análise, formulação, implementação,

acompanhamento e avaliação de políticas públicas e institucionais na área de

educação. (Parecer CNE/CP n. 05/2005, p. 8)

Definida nestes termos, superam-se de maneira definitiva aqueles modelos de

organização curricular estruturados para formação por "habilitação", que culminavam

na formação dos denominados "especialistas em educação", como o supervisor, o

orientador, o administrador, o inspetor educacional, entre outros. Eis como essa

questão fica definida no artigo 14 da Resolução CNE/CP n. 01/2006:

Art. 14. A Licenciatura em pedagogia, nos termos dos Pareceres CNE/CP n. 5/2005

e n. 3/2006 e desta Resolução, assegura a formação de profissionais da educação

prevista no art. 64, em conformidade com o inciso VIII do art. 3º da Lei n. 9.394/96.

§ 1º Esta formação profissional também poderá ser realizada em cursos de pós-

graduação, especialmente estruturados para este fim e abertos a todos os

licenciados.

§ 2º Os cursos de pós-graduação indicados no § 1º deste artigo poderão ser

complementarmente disciplinados pelos respectivos sistemas de ensino, nos termos

do parágrafo único do art. 67 da Lei n. 9.394/96.

E o Parecer CNE/CP n. 3/2006 esclarece de forma mais definitiva as dúvidas sobre

a eventual observância do disposto no artigo 64 da Lei n. 9.394/1996, ao enfatizar,

de um lado, que a licenciatura em pedagogia, realiza a formação para

administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional, em

organizações (escolas e órgãos dos sistemas de ensino) da educação básica e, de

outro lado, estabelece as condições em que a formação pós-graduada para tal deve

ser efetivada. Desse modo, o Parecer reitera a concepção de que a formação dos

profissionais da educação, para funções próprias do magistério e outras, deve ser

baseada no princípio da gestão democrática (obrigatória no ensino público,

conforme a CF, art. 206-VI; LDB, art. 3º-VIII) e superar aquelas vinculadas ao

trabalho em estruturas hierárquicas e burocráticas.

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53

Tal posicionamento ainda é justificado pelo Parecer CNE/CP n. 5/2005 que, ao

considerar o caráter colegiado da organização escolar, prevê que todos os

licenciados possam ter oportunidade de ulterior aprofundamento da formação

pertinente, ao longo de sua vida profissional. Supera, assim, a interpretação

baseada em legislação anterior (Lei n. 5.540/1968 e currículos mínimos) que

restringia a formação para as funções já mencionadas aos licenciados de

pedagogia. A propósito dessa questão, o Conselho designou comissão para emitir

parecer sobre diretrizes para a formação dos profissionais da educação com relação

aos artigos 64 e 67, parágrafo único, da Lei n. 9.394/96.

Certamente, um desafio que fica para os educadores brasileiros é se articularem

para uma intervenção efetiva na definição das orientações que regerão a formação a

ser desenvolvida nos cursos de pós-graduação destinados à "formação dos

profissionais para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação

na educação básica", de modo que venha a contribuir, igualmente, para o

fortalecimento da gestão democrática da educação e da escola e a construção de

uma educação pública de qualidade.

Novos e maiores desafios para o campo da formação

Outras questões também estão no horizonte das modificações necessárias no

âmbito da formação dos educadores profissionais da educação, entre as quais

podemos destacar a inclusão, no texto da Lei da Reforma do Ensino Superior, do

papel da universidade e das faculdades, dos centros de educação e departamentos

de educação, na formação dos educadores, professores e profissionais para a

educação básica; a revisão urgente da LDB (artigo 64) e da Resolução n. 01/99, no

que tange à criação dos ISEs e do Curso Normal Superior, como condição para a

instituição de um sistema orgânico de formação de professores no país; revisão das

Diretrizes Curriculares para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica.

Considerando ainda o grande número de ISEs e Cursos Normais Superiores criados

nos últimos anos, bem como de cursos especiais de formação, tanto no âmbito da

iniciativa privada como no âmbito de instituições públicas, é fundamental a definição

de procedimentos que garantam de imediato:

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54

O desenvolvimento de processos de avaliação institucional, que antecedam a

processos de reconhecimento e criação de novos processos de autorização

para tais cursos/instituições e que considerem condições efetivas de realização

das atividades propostas, seja em disciplinas, estágios ou atividades

complementares etc.

Um estudo rigoroso do número de vagas ofertadas nessas instituições –

principalmente considerando que a grande maioria oferece vagas no período

noturno, ao qual acorrem estudantes trabalhadores, nem sempre professores

em exercício, impedindo a realização dos estágios e da formação prática e

teórica com a qualidade necessária às exigências da educação de crianças,

jovens e adultos.

Com a aprovação das Diretrizes, não se extinguem as polêmicas que acompanham

as discussões sobre seu caráter e a identidade do curso de pedagogia. O

enfrentamento dessas questões não é tarefa para uma ou outra entidade, mas

desafio para a área da educação, para a investigação e a pesquisa

interdisciplinares, compartilhadas a muitas mãos. Outros desafios emergem de sua

aprovação, entre eles o principal é o de caminhar na perspectiva de construir

efetivamente cursos e percursos de formação no campo da educação e da

pedagogia, para formar profissionais que atuarão na educação básica, na formação

de crianças, jovens e adultos, na gestão e organização dos espaços escolares e na

elaboração de formas criativas e criadoras para a educação escolar e não-escolar.

As perspectivas que se descortinam para a efetivação de uma política global de

formação dos educadores, no país, são promissoras. As motivações para o debate e

para a vivência de novas e criativas experiências curriculares nos cursos de

pedagogia e licenciaturas são elevadas nos meios acadêmicos. As entidades

representativas de importantes segmentos da área – a ANFOPE, o FORUMDIR, a

ANPED e o CEDES –, as diretrizes da pedagogia e a política de formação dos

profissionais da educação estarão presentes e, certamente, serão objeto de análise

e de proposições nos encontros, seminários e congressos que serão realizados no

horizonte próximo, com a disposição renovada de firmar, reafirmar e propor,

coletivamente, princípios e encaminhamentos que orientarão suas ações concretas.

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55

Tem sido esse o compromisso histórico que pauta a agenda dessas entidades, pois

sabem que somente de forma coletiva, solidária e crítica será possível enfrentar

aqueles desafios que ainda não estão ao nosso alcance e na esfera de nossa

decisão.

Notas

1. Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), Fórum de Diretores de Faculdades/Centros de Educação das Universidades Públicas Brasileiras (FORUMDIR), Associação Nacional de Política e Administração da Educação (ANPAE), entre outras.

2. A respeito dessa discussão, consultar Aguiar e Melo (2005a; 2005b).

3. Proposta de Diretrizes Curriculares de Pedagogia elaborada por uma Comissão de Especialistas de Pedagogia, resultante de ampla consulta às universidades e de consensos construídos com as entidades ANPED, ANFOPE, CEDES, FORUMDIR e ANPAE, em 1999.

4. A presença de cerca de 200 pessoas, que representavam a maioria dos estados brasileiros, no painel sobre a Reformulação do Currículo da Pedagogia e das Licenciaturas na I CBE (Anais, 1980, p. 209-217), comprova que em muitos estados germinava a idéia de organização dos educadores em torno dessas reformulações (cf. detalhes em Brzezinski, 1994).

5. Consultar <www.mec.gov.br>.

6. O único documento disponível e não aprovado data de maio de 2000.

7. Realizado em Águas de Lindóia, São Paulo.

8. Disponível em: <www.mec.gov.br>.

9. Consultar <www.mec.gov.br/cne>.

10. Conferir <www.mec.gov.br/cne>.

11. Estes documentos podem ser encontrados no site da ANFOPE: <http://lite.fae.unicamp.br/anfope>.

12. Aprovada no CEE-SP a Indicação n. 22/2002, que estabelece distinção entre os cursos de pedagogia licenciaturas e pedagogia bacharelado, dando cumprimento ao estabelecido no artigo 64 da LDB.

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Educação & Sociedade

Print version ISSN 0101-7330

Educ. Soc. vol.20 n.68 Campinas Dec. 1999 doi: 10.1590/S0101-73301999000300013

FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO: Visão crítica e

perspectiva de mudança

José Carlos Libâneo* Selma Garrido Pimenta**

RESUMO

O artigo apresenta breve análise crítica do histórico da formação dos profissionais

da educação no Brasil, explicitando as ambigüidades do curso de pedagogia desde

sua criação até a atualidade, o percurso dos cursos de formação de professores e o

impacto dos debates promovidos em instituições, entidades e movimentos em torno

da questão. Na seqüência, o texto analisa a natureza e a identidade da pedagogia

como área de conhecimento do campo educacional e as questões relacionadas com

o exercício profissional dos pedagogos e dos professores. Indica, finalmente,

sugestões de organização institucional e de possíveis percursos de formação

desses profissionais que apontam para uma mudança do quadro atual.1

Palavras-chave: Pedagogia, teoria pedagógica, formação de profissionais da

educação, formação pedagógica, formação docente

Introdução

Há cerca de 20 anos, por iniciativa de movimentos de educadores e, em paralelo, no

âmbito do Ministério da Educação, iniciava-se um debate nacional sobre a formação

de pedagogos e professores, com base na crítica da legislação vigente e na

realidade constatada nas instituições formadoras. O marco histórico de detonação

do movimento pela reformulação dos cursos de formação do educador foi a I

Conferência Brasileira de Educação realizada em São Paulo em 1980, abrindo-se o

debate nacional sobre o curso de pedagogia e os cursos de licenciatura. A trajetória

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desse movimento destaca-se pela densidade das discussões e pelo êxito na

mobilização dos educadores, mas o resultado prático foi modesto, não se tendo

chegado até hoje a uma solução razoável para os problemas da formação dos

educadores, nem no âmbito oficial nem no âmbito das instituições universitárias.

A discussão sobre a identidade do curso de pedagogia, que remonta aos pareceres

de Valnir Chagas na condição de membro do antigo Conselho Federal de Educação,

é retomada nos encontros do Comitê Nacional Pró-formação do Educador, mais

tarde transformada em Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da

Educação, e é bastante recorrente para pesquisadores da área. Estes já apontavam,

em meados dos anos 80, a necessidade de se superar a fragmentação das

habilitações no espaço escolar, propondo a superação das habilitações e

especializações pela valorização do pedagogo escolar:

(...) a posição que temos assumido é a de que a escola pública necessita de um

profissional denominado pedagogo, pois entendemos que o fazer pedagógico, que

ultrapassa a sala de aula e a determina, configura-se como essencial na busca de

novas formas de organizar a escola para que esta seja efetivamente democrática. A

tentativa que temos feito é a de avançar da defesa corporativista dos especialistas

para a necessidade política do pedagogo, no processo de democratização da

escolaridade. (Pimenta 1988)

O curso de pedagogia – sem entrar agora no mérito de sua função, isto é, de formar

professores ou especialistas ou ambos – pouco se alterou em relação à Resolução

no 252/69. Experiências alternativas foram tentadas em algumas instituições e o

antigo CFE expediu alguns pareceres sobre "currículos experimentais", mas nenhum

deles, a rigor, apresenta algo realmente inovador. Possíveis "novidades" no

chamado "curso de pedagogia" seriam, por exemplo, a atribuição, ao lado de outras,

da formação em nível superior de professores para as séries iniciais do Ensino

Fundamental, supressão das habilitações (administração escolar, orientação

educacional, supervisão escolar etc.) e alterações na denominação de algumas

disciplinas. Alterações geralmente inócuas, pois na maior parte dos casos foi

mantida a prática da grade curricular e os mesmos conteúdos das antigas

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disciplinas, por exemplo, Organização do trabalho pedagógico manteve o conteúdo

da anterior Administração escolar.

Em relação aos cursos de licenciatura, também não houve nenhuma mudança

substantiva desde a Resolução no 292/62 do CFE, que dispunha sobre as matérias

pedagógicas para a licenciatura. O que se tentou foram diferentes formas de

organização do percurso da formação, umas mantendo o 3+1 já presente em 1939,

outras distribuindo as disciplinas pedagógicas ao longo do curso específico. Quanto

ao local da formação pedagógica, em alguns lugares ela foi mantida nas faculdades

de educação, em outros, foi deslocada, total ou parcialmente, aos

institutos/departamentos/cursos.

Atualmente, a atuação do Ministério da Educação e do CNE na regulamentação da

LDB no 9.394/96 tem provocado a mobilização dos educadores de todos os níveis de

ensino para rediscutir a formação de profissionais da educação. A nosso ver, não

bastam iniciativas de formulação de reformas curriculares, princípios norteadores de

formação, novas competências profissionais, novos eixos curriculares, base comum

nacional etc. Faz-se necessária e urgente a definição explícita de uma estrutura

organizacional para um sistema nacional de formação de profissionais da educação,

incluindo a definição dos locais institucionais do processo formativo. Na verdade,

reivindicamos o ordenamento legal e funcional de todo o conteúdo do Titulo VI da

nova LDB.

Resumidamente, o disposto no Titulo VI da nova LDB é o seguinte:

a) Cursos de licenciatura plena para formar professores de educação básica, em

universidades e Institutos Superiores de Educação:

• Curso Normal Superior (licenciatura para formar docentes de educação infantil e

séries iniciais do Ensino Fundamental) e licenciaturas para formar professores de 5a

a 8a e Ensino Médio);

• programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação

superior;

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• programas de educação continuada.

b) Cursos de graduação e pós-graduação em pedagogia para formar profissionais

da educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação

educacional.

c) Cursos de preparação para o magistério de Ensino Superior.

Pelo Edital no 4, de 3/12/97, a SESu/MEC designou comissões de especialistas para

elaboração de diretrizes curriculares dos cursos superiores, incluindo as

licenciaturas onde coubesse. Em 6/5/99, a Comissão de Especialistas de ensino de

Pedagogia (designada pela Portaria SESu/MEC no 146, de março de 1998) tornou

pública sua proposta de diretrizes curriculares para o curso de pedagogia. O mesmo

órgão, por meio da Portaria no 808, de 8/6/99, designou um Grupo de Trabalho para

elaboração das diretrizes curriculares para todas as licenciaturas, reconhecendo a

necessidade de orientações normativas gerais para a parte curricular referente à

formação pedagógica. Os debates ocorridos nesse GT resultaram no Documento

Norteador para a Elaboração de Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação

de Professores (1999), já encaminhado à SESu. Todavia, foram manifestadas nas

reuniões de trabalho diferentes posições sobre a formação dos profissionais da

educação, não incluídas no corpo do referido documento. O objetivo deste texto é

apresentar uma dessas posições, que expressa a proposta de um sistema nacional

de formação dos profissionais da educação.

A proposta básica é a de que a formação dos profissionais da educação para

atuação na educação básica far-se-á, predominantemente, nas atuais faculdades de

educação, que oferecerão curso de pedagogia, cursos de formação de professores

para toda a educação básica, programa especial de formação pedagógica,

programas de educação continuada e de pós-graduação. As faculdades de

educação terão sob sua responsabilidade a formulação e a coordenação de políticas

e planos de formação de professores, em articulação com as pró-reitorias ou vice-

reitorias de graduação das universidades ou órgãos similares nas demais

Instituições de Ensino Superior, com os institutos/faculdades/departamentos das

áreas específicas e com as redes pública e privada de ensino.

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O curso de pedagogia destinar-se-á à formação de profissionais interessados em

estudos do campo teórico-investigativo da educação e no exercício técnico-

profissional como pedagogos no sistema de ensino, nas escolas e em outras

instituições educacionais, inclusive as não-escolares.

Os cursos de formação de professores e os programas mencionados, abrangendo

todos os níveis da educação básica, serão realizados num Centro de Formação,

Pesquisa e Desenvolvimento Profissional de Professores – CFPD, que integrará a

estrutura organizacional das faculdades de educação e destinar-se-á à formação de

professores para a educação básica, da educação infantil ao Ensino Médio.

Distinguindo O Curso De Pedagogia (Stricto Sensu) E O Curso De Formação De Professores Para As Séries Iniciais Do Ensino Fundamental2

Tornou-se lugar-comum no discurso de educadores, especialmente os que atuam

em faculdades de educação, a identificação dos cursos de pedagogia com os cursos

de formação de professores das séries iniciais do Ensino Fundamental, ainda que

boa parte deles também se destine a formar docentes para as disciplinas

pedagógicas da habilitação ao magistério em nível de 2o grau.

Para tornar essa problemática mais clara convém, primeiramente, rememorar as

ambigüidades que vem acompanhando o curso de pedagogia e cursos de

licenciatura.3 Quando foi criado o curso de pedagogia, em 1939, ele se destinava a

formar bacharéis (técnicos de educação) e licenciados em pedagogia, inaugurando o

que veio a denominar-se esquema 3+1, com blocos separados para o bacharelado e

a licenciatura. Os professores dos antigos primário e pré-primário eram formados em

Curso Normal nos institutos de educação, ao passo que o professores para os

antigos cursos ginasial e colegial eram formados nas faculdades de Filosofia,

Ciências e Letras.

O Parecer no 251/62 estabelece para o curso de pedagogia o encargo de formar

professores para os cursos normais e "profissionais destinados às funções não-

docentes do setor educacional", os técnicos de educação ou especialistas de

educação", e anuncia a possibilidade de, no futuro, formar o "mestre primário em

nível superior". Nesse mesmo ano, o Parecer no 292/62 fixa as matérias

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pedagógicas dos cursos de licenciatura para o magistério em escolas de nível médio

(ginasial e colegial), mantendo, na prática, a separação entre bacharelado e

licenciatura ou, ao menos, as disciplinas "de conteúdo" e as disciplinas

"pedagógicas". Embora algumas análises apontem para a impropriedade de formar,

nessa época, técnicos de educação para um campo de trabalho inexistente, talvez o

que tenha faltado fosse a regulamentação da profissão de pedagogo.4

O Parecer no 252, de 1969, definiu a estrutura curricular do curso de pedagogia que

vigorou até pouco tempo atrás, com a promulgação da LDB de 1996. A resolução

normativa que acompanha o parecer estabelece com mais precisão a função desse

curso: formar professores para o ensino Normal e especialistas para as atividades

de orientação, administração, supervisão e inspeção no âmbito das escolas e dos

sistemas escolares. Permite também ao licenciado exercer o magistério nas séries

iniciais, dentro da habilitação para o ensino Normal (isto é, não se previu uma

habilitação específica para se lecionar nas séries iniciais). O currículo mínimo

compreendia uma parte comum a todas as habilitações e outra diversificada, em

função da habilitação específica escolhida pelo aluno. A lista de habilitações incluía,

pelo menos, oito tipos de atividades, em função das quais se ofereciam as opções

curriculares.5 Consolidava-se, assim, a idéia de formação específica de técnicos em

educação, definindo o exercício profissional do pedagogo não-docente. Uma das

justificativas para a oferta das habilitações (administração escolar, supervisão

escolar,6 orientação educacional, entre outras) e para a profissionalização do

pedagogo era a ampliação do atendimento às necessidades de escolarização

básica, que tinha um forte apelo na política educacional da época.

O Parecer no 252, justamente por explicitar melhor a natureza de um curso de

pedagogia – e, não por acaso, no contexto da ditadura militar – recebeu inúmeras

críticas no final da década de 1970 e no período seguinte. O conteúdo dessas

críticas é amplamente conhecido e não precisa ser reproduzido aqui. Em virtude das

finalidades e dos limites deste texto, queremos apenas destacar algumas delas.

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A crítica de que o curso de pedagogia de 1969 era "tecnicista" parece pertinente, a

levar em conta o discurso oficial da época. Essa crítica é sintetizada por Silva (1999)

nos seguintes termos:

Com a aprovação da (...) Lei da Reforma Universitária, triunfam os princípios de

racionalidade, eficiência e produtividade no trato do Ensino Superior. A tradição

liberal de nossa universidade fica interrompida e nasce o que alguns irão passar a

chamar de universidade tecnocrática, ainda que mesclada de nuanças do

pensamento liberal.

A esses aspectos foram agregadas as críticas à fragmentação da formação do

pedagogo, à divisão técnica do trabalho na escola, à separação entre teoria e

prática, à separação entre o pedagogo especialista e o trabalho docente.7

Não nos parece problemática hoje a ênfase que o Parecer deu à necessidade de se

formarem técnicos de educação nem ao reconhecimento de tarefas específicas a

serem realizadas nas escolas para acompanhamento do ensino. Sem deixar de

reconhecer que, de fato, houve uma fragmentação muito grande das tarefas, isso

não poderia ter comprometido a existência de especialistas na escola. A nosso ver,

a divisão de funções corresponde a uma lógica da organização escolar e, mais

ainda, essas funções implicariam uma formação específica, dada a complexidade

envolvida no desempenho dessas funções. Dessa forma, o que nos parecem

problemáticos são os seguintes aspectos: a) o caráter "tecnicista" do curso e o

conseqüente esvaziamento teórico da formação, excluindo o caráter da pedagogia

como investigação do fenômeno educativo; b) o agigantamento da estrutura

curricular que leva ao mesmo tempo a um currículo fragmentado e aligeirado; c) a

fragmentação excessiva de tarefas no âmbito das escolas; d) a separação no

currículo entre os dois blocos, a formação pedagógica de base e os estudos

correspondentes às habilitações.8

A questão mais relevante, todavia, é o esvaziamento dos estudos sistemáticos de

educação e a descaracterização profissional do pedagogo. Quanto ao esvaziamento

da teoria pedagógica, Pimenta (1998) faz a seguinte constatação:

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(...) há um contingente maciço de egressos dos cursos de pedagogia que,

curiosamente, não estudaram pedagogia (sua teoria e sua prática), pois esses

cursos, de modo geral, oferecem estudos disciplinares das ciências da educação

que, na maioria das vezes, ao partirem dos campos disciplinares das ciências-mãe

para falar sobre educação, o fazem sem dar conta da especificidade do fenômeno

educativo e, tampouco, sem tomá-lo nas suas realidades histórico-sociais e na sua

multiplicidade – o que apontaria para uma perspectiva interdisciplinar e

multirreferencial.

Quanto à descaracterização profissional do pedagogo, subsumido ao "professor",

sua formação passa a ser dominada pelos estudos disciplinares das áreas das

metodologias. Estas, ao voltarem seus estudos diretamente à sala de aula, espaço

fundamental da docência, ignoram os determinantes institucionais, históricos e

sociais (objeto de estudo da pedagogia). Desse modo, a pedagogia, ciência que tem

a prática social da educação como objeto de investigação e de exercício profissional

– no qual se inclui a docência, embora nele se incluam outras atividades de educar –

não tem sido tematizada nos cursos de formação de pedagogos (cf. Pimenta 1998).

Por essas razões, por volta dos anos 1983-84, com base na crítica à fragmentação e

à divisão técnica do trabalho na escola, algumas faculdades de educação

suprimiram do currículo as habilitações, passando a ter apenas duas habilitações –

professor das séries iniciais do 1o grau e professor de cursos de habilitação ao

magistério –, descartando boa parte da fundamentação pedagógica do curso. Fora

das faculdades, em decorrência dessas mudanças curriculares e da difusão das

propostas do movimento pela reformulação da formação do educador, as

Secretarias de Educação retiraram das escolas ou deixaram de contratar

profissionais pedagogos, prejudicando o atendimento pedagógico-didático às

escolas e comprometendo o exercício profissional do pedagogo. Além disso, com a

descaracterização dos pedagogos-especialistas como profissionais, as associações

de pedagogos (por exemplo, Associação Nacional de Orientadores Educacionais,

Associação Nacional de Supervisores Educacionais) se autodissolveram, resultando

na perda do espaço de discussão teórico-prática da pedagogia e do exercício

profissional do pedagogo existente nessas associações.

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Essa análise mostra como se chegou a uma descentralidade do enfoque da

pedagogia como estudo da ciência da educação. Entretanto, não se pode dizer que

a desvalorização social e acadêmica desse campo de conhecimentos tenha sido

resultado apenas da legislação tecnicista do período 1962-80 e do movimento pela

reformulação dos cursos de formação do educador.9 Na verdade, já nos anos 20,

com o movimento da Educação Nova, os estudos pedagógicos sistemáticos

começaram a perder espaço, com base em um reducionismo psicológico. A

pedagogia vai adquirindo a conotação de operacionalização metodológica do ensino,

com base no que se propõe a formação dos técnicos de educação e a formação de

professores, consolidando o privilégio das dimensões metodológica e organizacional

em detrimento das dimensões filosófica, epistemológica e científica. Sobre isso

escreveu Libâneo (1998):

Ainda que o Parecer 252/69 mantenha a denominação "curso de pedagogia", seu

conteúdo deixa entrever que o termo "pedagógico" tem o sentido de metodológico,

técnico, administrativo, no mesmo tom da linguagem dos "profissionais da educação"

da década de 20. Além disso, pesa-lhe a herança do passado em que estudos

pedagógicos referem-se quase sempre à preparação de professores, o que explica,

ainda hoje, em algumas faculdades de educação, a identificação do termo

"pedagogia" com a formação de professores para as séries iniciais do Ensino

Fundamental, com o que a pedagogia tende a reduzir-se à prática do ensino.

A tendência que parece ser dominante hoje entre os educadores – ao menos no que

diz respeito aos seguidores das propostas mais recentes da Anfope – é esta: o curso

de pedagogia destina-se à formação do professor de 1a a 4a (que muitos chamam de

professor normalista de nível superior). Ou seja, acabou aquele curso de pedagogia

concebido em 1939 e parcialmente mantido em 1962 e 1969.10 Como se sabe,

aquelas propostas giram em torno do lema: a formação de todo educador deve ter

como base a docência. A defesa desse lema e as propostas de formação que dele

decorrem têm dificultado uma discussão mais aberta da questão, colocando o

debate na contramão das necessárias mudanças na formação de professores. A

nosso ver, as propostas atuais da Anfope trazem como conseqüências:

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• a identificação de estudos sistemáticos de pedagogia com a licenciatura (formação

de professores para as séries iniciais do Ensino Fundamental) e, por conseguinte,

redução da formação de qualquer tipo de educador à formação do docente;

• a descaracterização do campo teórico-investigativo da pedagogia e das ciências da

educação, eliminando da universidade os estudos sistemáticos do campo científico

da educação e a possibilidade de pesquisa específica e de exercício profissional do

pedagogo; o que leva ao esvaziamento da teoria pedagógica, acentuando o

desprestígio acadêmico da pedagogia como campo cientifico;

• eliminação/descaracterização do processo de formação do especialista em

pedagogia (pedagogo stricto sensu), subsumindo o especialista (diretor de escola,

coordenador pedagógico, planejador educacional, pesquisador em educação etc.)

no docente;

• identificação entre o campo epistemológico e o campo profissional, como se as

dificuldades naquele campo levassem ipso facto à crise do outro;

• segregação do processo de formação de professores da 1a à 4a em relação às

demais licenciaturas.

O documento ora concluído pela Comissão de Especialistas de ensino de pedagogia

– Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia – reforça esses problemas. Com

efeito, o documento define o pedagogo como:

Profissional habilitado a atuar no ensino, na organização e na gestão de sistemas,

unidades e projetos educacionais e na produção e difusão do conhecimento, em

diversas áreas da educação, tendo a docência como base obrigatória de sua

formação e identidade profissionais.

Define como áreas de atuação profissional: a docência na educação infantil, nas

séries iniciais do Ensino Fundamental e nas disciplinas da formação pedagógica do

nível médio, podendo atuar, ainda, na organização de sistemas, unidades, projetos

de experiências educacionais escolares e não escolares; na produção e difusão do

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conhecimento cientifico e tecnológico do campo educacional; nas áreas emergentes

do campo educacional.

Como se vê, nada muito diferente do que sempre existiu na legislação anterior, a

não ser o destaque que se dá à formação de professores de educação infantil e das

séries iniciais do 1o grau (já prevista no Parecer 252/69). O documento não utiliza o

termo "habilitações" (embora refira-se ao pedagogo como profissional "habilitado"),

mas menciona a diversificação na formação do pedagogo para atender às diferentes

demandas sociais por intermédio da "formação diferenciada, composta pelas

diferentes opções oferecidas aos alunos". Ou seja, são previstas áreas de atuação

do pedagogo não-docente (outras habilitações?), tendo a docência como base

comum da formação.

Verifica-se que a proposta de diretrizes curriculares para o curso de pedagogia, tal

como aparece no documento da Comissão de Especialistas, reincide nos mesmos

problemas já tão criticados: o "inchaço" do currículo, pretensões ambiciosas quanto

à diversidade de profissionais a serem formados, aligeiramento da formação (dada a

impossibilidade real, no percurso curricular, de conciliar formação de profissionais

docentes e não-docentes), empobrecimento na oferta de disciplinas (já que, para

atender ao menos seis das áreas de atuação previstas, será necessário reduzir o

número de disciplinas, a fim de respeitar o total de 3.200h do curso). Além do mais,

fica evidente a impossibilidade de se dar ao curso o caráter de aprofundamento da

ciência da educação para formar o pesquisador e o especialista em educação.

Por que discordamos das posições defendidas hoje pela Anfope e da proposta de diretrizes curriculares da Comissão de Especialistas

Há temas de grande relevância na pauta de discussões da Anfope, como a

exigência de formação em nível superior dos professores da 1a à 4a série, a

valorização profissional do professor, a postulação da base comum nacional, a

gestão democrática na escola. Todavia, temos discordâncias bastante explícitas em

relação à tese principal defendida atualmente por essa entidade – a docência como

base da formação de todo educador.

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Com efeito, o princípio que se tornou o lema e o apelo político da Anfope é

conhecido: a docência constitui a base da identidade profissional de todo educador,

todos os cursos de formação do educador deverão ter uma base comum: são todos

professores. Conforme já afirmamos, esse princípio levou à redução da formação do

pedagogo à docência, à supressão em alguns lugares da formação de especialistas

(ou do pedagogo não diretamente docente), ao esvaziamento da teoria pedagógica

em virtude da descaracterização do campo teórico-investigativo da pedagogia e das

demais ciências da educação, à retirada da universidade dos estudos sistemáticos

do campo científico da educação e, em conseqüência, da formação do pedagogo

para a pesquisa específica na área e para o exercício profissional.

Certamente não estamos sozinhos, ao menos em relação aos estudiosos que não

gravitam no âmbito de influência da Anfope, ao afirmar que as modificações

curriculares decorrentes das teses do movimento de reformulação dos cursos de

formação dos profissionais da educação acabaram por comprometer características

positivas do curso de pedagogia regido pela Resolução CFE no 252/69. A

sobrecarga no currículo de disciplinas ligadas à formação de professores das séries

iniciais do antigo 1o grau levou à diminuição do peso das disciplinas teóricas

(fundamentos da educação, currículo, avaliação, teorias da educação) e,

especificamente, das disciplinas que identificavam mais o exercício profissional do

pedagogo. Muitos pedagogos se perguntam hoje: onde estão os especialistas de

planejamento da educação, de administração de sistemas, gestão escolar,

formulação de políticas públicas para a educação, avaliação educacional e avaliação

da aprendizagem, pesquisa pedagógica específica etc.? Os atuais cursos estão

formando profissionais competentes nessas áreas? É viável formar num mesmo

curso, com duração de quatro anos, o professor profissionalmente competente de 1a

a 4a série e, ao mesmo tempo, o pedagogo stricto sensu, também profissionalmente

competente naqueles campos profissionais mencionados? Essas perguntas podem

ser dirigidas tanto à Anfope quanto à Comissão de Especialistas da pedagogia que,

grosso modo, encamparam as teses da Anfope.

Nosso entendimento é de que a tese da identificação do curso de pedagogia com a

formação de professores – ou seja, uma licenciatura – foi gestada em razão de

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circunstâncias históricas peculiares da história da educação deste país.11 Os

legisladores, em todos esses anos desde 1939, tentaram equacionar a formação do

pedagogo stricto sensu e a formação de professores num curso só, o curso de

pedagogia, mas que, na verdade, teria como suporte a formação de professores

para as séries iniciais do sistema de ensino. Após a legislação de 1962 e 1969, o

conselheiro Valnir Chagas, que deixou sua marca no pensamento sobre formação

de professores nesse período, formulou a indicação no 70/76 sobre a preparação em

nível de graduação dos especialistas em educação. Para justificar sua nova

proposta, Chagas afirma: "O caminho é sempre o mesmo, de restabelecer em novo

plano a linha tradicional, hoje tão nítida como há um século, e habilitar o especialista

no professor". O raciocínio inscrito no mencionado parecer deixa entrever a

identificação do termo pedagógico com o termo metodológico, e da expressão

formação pedagógica com formação docente. Entendemos, assim, que a tese de

que a formação de todo educador deve ter por base a docência precisa ser

entendida dentro de posicionamentos localizados de intelectuais, em momentos

históricos específicos da educação brasileira. Com isso queremos dizer que tudo o

que é histórico é mutável e que conquistas históricas, por mais aguerridas que

tenham sido, não podem ser cristalizadas. A redução do trabalho pedagógico à

docência não pode, portanto, constituir-se em algo imutável. Nem mesmo chega a

ser uma questão de cunho epistemológico ou conceitual. As novas realidades estão

exigindo um entendimento ampliado das práticas educativas e, por conseqüência, da

pedagogia. Além disso, no mundo inteiro existem cursos específicos de pedagogia

(em alguns lugares denominados "ciências da educação") distintos dos cursos de

formação de professores.

O desdobramento das vicissitudes do curso de pedagogia nestes últimos 20 anos

pode ser explicado a partir de fatos notórios. O Brasil viveu 21 anos de ditadura

militar, cujo impacto político e social afetou vários campos, mormente o da

educação. A contestação do regime se fazia necessária, e contra ele mobilizaram-se

muitos militantes políticos, profissionais, intelectuais, organizações de esquerda. A

grande luta nesses anos precisou ser muito mais política do que técnica, a fim de

desenvolver a consciência política das pessoas, criar espaços democráticos,

incentivar a prática de assembléias, reuniões, movimentos e desenvolver formas

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participativas de gestão. Ora, os que ocupavam esses espaços eram sobretudo os

sociólogos, filósofos e militantes políticos. Também os pedagogos se engajaram na

resistência à ditadura militar. No entanto, muitos deles deixaram de lado seu

trabalho específico – ligado aos aspectos internos das práticas escolares e dos

processos de ensino e aprendizagem –, incorporando o discurso sociológico, mas

distanciando-se da problemática teórico-prática de sua área. Não que os pedagogos

não devessem ter um ideário político e se alinhar aos demais intelectuais na luta

política maior. O problema foi o fato de muitos deles não terem compreendido que a

própria ação pedagógica dentro das escolas e das salas de aula era também uma

prática política, sem prejuízo da sua inserção nas lutas políticas mais amplas.

A nosso ver, a abordagem sociologizada da formação do educador, assumida pelo

movimento pela formação de educadores, gerou uma visão "militante" do profissional

da educação. De acordo com essa abordagem, bastaria ao professor ter uma visão

política, globalizante, das relações entre educação e sociedade, compromisso

político etc., que o resto viria por acréscimo. É verdade que essa ênfase no

compromisso político correspondia às características daquele momento histórico,

mas é necessário reconhecer que esse empenho na construção de um projeto

nacional democrático precisava ter correspondência com práticas pedagógico-

didáticas, curriculares, no interior do processo de ensino e aprendizagem, nas

práticas de ensino. Foi um grande equívoco dissolver o específico da prática

educativa nas salas de aula (a aprendizagem, o crescimento cognitivo dos alunos

etc.) na prática política. Faltou entender que um trabalho bem feito com as crianças

no interior das salas de aula também é um ato político, e dos mais nobres. O

discurso especificamente pedagógico foi, assim, afastado das discussões, e em

alguns casos chegou a ser rechaçado, em decorrência do preconceito que sempre

se alimentou contra a pedagogia como campo de conhecimento e contra os

pedagogos de profissão. Na prática, essa tendência resultou, em vários lugares, na

negação explícita do campo próprio de estudos da pedagogia (e por decorrência, da

didática). É em boa parte por isso que a licenciatura para a formação de professores

de 1a a 4a passou a ser chamada inadequadamente de pedagogia.

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Para além de razões históricas, pensamos que a identificação do pedagogo com o

docente incorre num equívoco lógico-conceitual. A pedagogia é uma reflexão teórica

baseada nas práticas educativas e sobre elas. Investiga os objetivos sociopolíticos e

os meios organizacionais e metodológicos de viabilizar os processos formativos em

contextos socioculturais específicos. Todo educador sabe, hoje, que as práticas

educativas ocorrem em muitos lugares, em muitas instâncias formais, não-formais,

informais. Elas acontecem nas famílias, nos locais de trabalho, na cidade e na rua,

nos meios de comunicação e, também, nas escolas. Não é possível mais afirmar

que o trabalho pedagógico se reduz ao trabalho docente nas escolas. A ação

pedagógica não se resume a ações docentes, de modo que, se todo trabalho

docente é trabalho pedagógico, nem todo trabalho pedagógico é trabalho docente.

Por exemplo, o MST faz um trabalho pedagógico mas não necessariamente um

trabalho docente, a não ser quando reúne suas crianças nas salas de aula para a

escolarização formal ou os militantes para estudar o aprimoramento de práticas

agrícolas, os direitos trabalhistas de lavradores etc.). O pedagógico e o docente são

termos inter-relacionados mas conceitualmente distintos. Portanto, reduzir a ação

pedagógica à docência é produzir um reducionismo conceitual, um estreitamento do

conceito de pedagogia. A não ser que os defensores da identificação pedagogia-

docência entendam o termo pedagogia como metodologia, isto é, como

procedimentos de ensino, prática do ensino, que é o entendimento vulgarizado do

termo. Mas pensar assim significa desconhecer os conceitos mais elementares da

teoria educacional. A pedagogia é mais ampla que a docência, educação abrange

outras instâncias além da sala de aula, profissional da educação é uma expressão

mais ampla que profissional da docência, sem pretender com isso diminuir a

importância da docência. E não existe suporte teórico, conceitual, para justificar essa

idéia de "docência ampliada", argumento usado por muitos colegas para justificar

essa identificação reducionista de faculdade de educação com formação de

professores.

É claro que esse reducionismo, descaracterizando a pedagogia como campo

teórico-investigativo e identificando-a com uma licenciatura, teve conseqüências na

discussão sobre o papel das faculdades de educação. Muitos não aceitam essa

ligação, mas creio que nossa argumentação ajuda a entender a questão. Uma vez

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dispensadas as habilitações e reduzindo-se o papel das faculdades de educação a

proporcionar licenciatura para formar professores para as séries iniciais e para o

curso Normal, não se teria mais o curso de pedagogia (stricto sensu). Ou seja, já

não teria sentido a existência das faculdades de educação, bastando transformá-las

em centros de formação de professores. Não estaria aí a origem da criação dos

Institutos Superiores de Educação?

A proposta de curso de pedagogia (diferenciado do curso de licenciatura para

formação de professores de 1a a 4a) atribui a denominação "pedagogia" ao campo

teórico-investigativo da educação (em conexão com as demais ciências da

educação) e ao campo técnico-profissional de formação do profissional não

diretamente docente, e de "pedagogo" ao profissional formado nesse curso.

Dissolve-se, assim, a designação "pedagogia" para identificar o curso de formação

de professores para as séries iniciais do Ensino Fundamental, postulando-se a

regulamentação do curso de pedagogia destinado a oferecer formação teórica,

científica e técnica para interessados em aprofundamento na teoria pedagógica, na

pesquisa pedagógica e no exercício de atividades pedagógicas específicas –

planejamento de políticas educacionais, gestão do sistema de ensino e das escolas,

formação de professores, assistência pedagógico-didática a professores e alunos,

avaliação educacional, pedagogia empresarial, animação cultural, produção e

comunicação nas mídias, movimentos sociais e outros campos de atividade

educacional, inclusive as não-escolares. A nosso ver, a ruptura da herança da

identificação de um currículo de estudos sistemáticos de pedagogia com um

currículo de licenciatura para formar professores para as séries iniciais do Ensino

Fundamental corrige o esvaziamento da teoria pedagógica no Brasil, decorrente da

histórica ambigüidade produzida pelos legisladores, desde o final dos anos 30 até

hoje, entre a formação do pedagogo stricto sensu e a formação do professor das

séries iniciais do Ensino Fundamental.12

Desejamos destacar a importância da formação de profissionais da educação para

atuar em contextos não-escolares. É acentuada a consciência atual da importância e

da necessidade da intervenção participante e eficaz desses profissionais no âmbito

das práticas socioculturais, tendo em vista que processos pedagógicos informais

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estão sempre implícitos nas práticas, efetivadas no plano coletivo e comunitário.

Assim, tanto nas iniciativas de programas de educação popular, dirigidos aos mais

heterogêneos segmentos da população não formalmente escolarizada, quanto nas

propostas de intervenção pedagógica nas atividades de cunho cultural,

desenvolvidas pelos novos e sofisticados meios de comunicação de massa,

passando pela necessária liderança nos diversos movimentos sociais, a presença e

a participação de profissionais da educação se fazem relevantes e imprescindíveis.

Até hoje pouco se cuidou da preparação formal e sistematizada de agentes e

lideranças culturais que se especializassem no exercício de funções pedagógicas

nesses ambientes não-escolares, levando-se em conta sua importância como

mediadores da educabilidade, necessária e capilarmente presente mesmo no

processo informal de consolidação de uma cultura que seja articulada com uma

proposta de construção da cidadania. Assim, reivindica-se, com toda a legitimidade,

a presença atuante de profissionais dotados de capacitação pedagógica para

atuarem nas mais diversas instituições e ambientes da comunidade: nos

movimentos sociais, nos meios de comunicação de massa, nas empresas, nos

hospitais, nos presídios, nos projetos culturais e nos programas comunitários de

melhoria da qualidade de vida. Essa participação pedagógica também exige

preparação prévia, sistemática e qualificada (cf. Severino 1999).

Reiteramos, pois, o entendimento de que os profissionais da educação formados

pelo curso de pedagogia atuarão nos vários campos sociais da educação,

decorrentes de novas necessidades e demandas sociais a serem reguladas

profissionalmente. Tais campos são: as escolas e os sistemas escolares; os

movimentos sociais; as diversas mídias, incluindo o campo editorial; a área da

saúde; as empresas; os sindicatos e outros que se fizerem necessários. Em todos

esses campos de exercício profissional, desenvolverá funções de gestão e

formulação de políticas educacionais; organização e gestão de sistemas e de

unidades escolares; de projetos e experiências educacionais; de planejamento,

coordenação, execução e avaliação de programas e projetos educacionais, relativos

às diferentes faixas etárias (criança, jovens, adultos, terceira idade); na produção e

difusão do conhecimento científico e tecnológico do campo educacional e outras.

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A favor de um curso específico de pedagogia

Conforme vimos considerando, as faculdades de educação sediariam, de forma

articulada, o curso de pedagogia e a formação inicial e continuada de professores. O

que é esse curso de pedagogia? Trata-se de curso para a realização da

investigação em estudos pedagógicos, tomando a pedagogia como campo teórico e

como campo de atuação profissional. Como campo teórico, destina-se à formação

de profissionais que desejem aprimorar a reflexão e a pesquisa sobre a educação e

o ensino da pedagogia, propriamente dita. Como campo de atuação profissional,

destina-se à preparação de pesquisadores, planejadores, especialistas em

avaliação, gestores do sistema e da escola, coordenadores pedagógicos ou de

ensino, comunicadores especializados para atividades escolares e extra-escolares,

animadores culturais, de especialistas em educação a distância, de educadores de

adultos no campo da formação continuada etc.

A ampliação do campo educacional e, por conseqüência, da atuação pedagógica é

uma realidade constatada por muitos autores. Já argumentamos anteriormente

sobre a idéia de que a atividade pedagógica perpassa, hoje, toda a sociedade,

extrapolando o âmbito escolar formal, abrangendo esferas mais amplas de

educação informal e não-formal. Não faz sentido, pois, o reducionismo da ação

pedagógica à docência, ainda que esta seja também uma genuína prática

pedagógica.

O curso de pedagogia proposto tem correlatos em praticamente todos os países do

mundo, embora em alguns lugares, especialmente na Europa, receba a designação

de "ciências da educação". Poder-se-ia perguntar: por que não chamar esse curso

de ciências da educação e não de pedagogia? Libâneo aponta, em publicação

recente (1998), quatro posições a respeito desse assunto e sobre a denominação

"ciências da educação" escreve:

(..) tal denominação (...) é criticada por provocar dispersão no estudo da

problemática educativa, levando a uma postura pluridisciplinar ao invés de

interdisciplinar. Ou seja, a autonomia dada a cada uma das ciências da educação

levaria a enfoques parciais da realidade educativa, comprometendo a unidade

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temática e abrindo espaço para os vários reducionismos (sociológico, psicológico,

econômico...), como aliás a experiência brasileira tem confirmado.

Em concordância com vários autores (entre outros, Sarramona e Marques 1985,

Vilsaberghi 1983, Estrela 1992), Libâneo assume que a pedagogia se apóia nas

ciências da educação, mas não perde com isso sua autonomia epistemológica e não

se reduz ao campo conceitual de uma ou outra, nem ao conjunto dessas ciências.

A pluridimensionalidade do fenômeno educativo não elimina sua unicidade, que

permite "estabelecer um corpo cientifico que tem o fenômeno educativo em seu

conjunto como objeto de estudo, com a finalidade expressa de dar coerência à

multiplicidade de ações parcializadas" (Sarramona e Marques 1985). Nessa

concepção, a pedagogia promove a síntese integradora dos diferentes processos

analíticos que correspondem a cada uma das ciências da educação em seu objeto

específico de estudo.

Também Pimenta (1996) discute detidamente a questão recorrendo a vários autores,

argumentando pela necessidade de a pedagogia postular sua especificidade

epistemológica, de modo a não se conformar com uma mera posição de campo

aplicado de outras ciências que também estudam a educação. Com base nisso,

firma sua posição de que a pedagogia tem sua significação epistemológica

assumindo-se como ciência da prática social da educação.

Diferentemente das demais ciências da educação, a pedagogia é ciência da prática.

(...) Ela não se constrói como discurso sobre a educação, mas a partir da prática dos

educadores tomada como referência para a construção de saberes, no confronto

com os saberes teóricos. (...) O objeto/problema da pedagogia é a educação

enquanto prática social. Daí seu caráter específico que a diferencia das demais

(ciências da educação), que é o de uma ciência prática – parte da prática e a ela se

dirige. A problemática educativa e sua superação constituem o ponto central de

referência para a investigação.

Ainda desenvolvendo o assunto, Pimenta recorre a Jean Houssaye que nega que a

pedagogia possa ter sua origem nas ciências da educação, "porque estas não

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podem fornecer a prática, indispensável à elaboração pedagógica. (...)

Freqüentando o curso de ciências da educação, os futuros práticos poderão adquirir

saberes sobre a educação e sobre a pedagogia, mas não estarão aptos a falarem

sobre saberes pedagógicos" (Houssaye 1995).

Defendemos, pois, a criação do curso de pedagogia, um curso que oferece

formação teórica, científica e técnica para interessados no aprofundamento da teoria

e da pesquisa pedagógica e no exercício de atividades pedagógicas específicas

(planejamento de políticas educacionais, gestão do sistema de ensino e das escolas,

assistência pedagógico-didática a professores e alunos, avaliação educacional,

pedagogia empresarial, animação cultural, produção e comunicação nas mídias

etc.).13

A existência desse curso tem como suporte algumas premissas:

– O fenômeno educativo sujeita-se à pluralidade de abordagens, à medida que a

educação é objeto de várias ciências que o abordam de seu enfoque específico. O

estudo da educação tem um caráter de multirreferencialidade – abarca tanto

modalidades educativas escolares quanto extra-escolares, como os movimentos

sociais, a educação ambiental, educação comunitária, educação de grupos sociais

marginalizados e de minorias sociais. Não é que se descarte o fato de que a

educação escolar seja, ainda hoje, a forma histórica predominante de prática

educativa. Mas, mesmo em benefício de uma educação escolar mais aberta e mais

articulada com outras instâncias educativas fora de seu marco próprio, a idéia é a de

que o educativo não se restrinja ao escolar, uma vez que abrange as relações mais

amplas entre o indivíduo e o meio humano, social, físico, ecológico, cultural,

econômico.

– Se, por um lado, a compreensão ampliada da educação fortalece as ciências da

educação pelo fato de a pedagogia não ser a única área científica que tem a

educação como objeto de estudo, por outro, não descaracteriza a especificidade da

pedagogia como uma das ciências da educação. Com efeito, cada uma das

chamadas ciências da educação (sociologia da educação, psicologia da educação,

lingüística aplicada à educação, economia da educação etc.) aborda o fenômeno

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educativo da perspectiva de seus próprios conceitos e métodos de investigação, ao

passo que a pedagogia se distingue por estudar o fenômeno educativo em sua

totalidade, inclusive para integrar os enfoques parciais daquelas ciências em função

de uma aproximação global e intencionalmente dirigida aos problemas educativos.

– Um currículo de pedagogia, além de contemplar como objeto de investigação a

pluralidade das práticas educativas, concentra sua temática investigativa nos

saberes pedagógicos, com a contribuição das ciências da educação, na forma de

inter-relação entre os saberes científicos. Ou seja, assume-se o entendimento de

pedagogia como ciência da prática social da educação para daí se definirem

saberes pedagógicos (cf. Pimenta 1997). A integração de conhecimentos pela inter-

relação entre saberes decorre não apenas da pluralidade que caracteriza o

fenômeno educativo, mas também de uma tendência irrefreável das ciências no

mundo contemporâneo buscarem a integração entre os saberes, sem perder de

vista a especificidade disciplinar.

O currículo terá uma forte orientação para a pesquisa, seja como prática acadêmica,

seja como atitude. Ressaltem-se, aí, os vínculos entre o ensino e a pesquisa, a

pesquisa como forma básica de construção do saber, em confronto, em

questionamento, com os saberes já estabelecidos e como instrumento para

desenvolvimento das competências do pensar.

– Tal concepção de pedagogia deveria transpassar toda a formação pedagógica nos

cursos de formação de professores, da educação infantil ao Ensino Médio.

Os cursos de formação de professores da educação básica: A defesa de um local institucional específico para formar professores

A atividade docente vem se modificando em decorrência de transformações nas

concepções de escola e nas formas de construção do saber, resultando na

necessidade de se repensar a intervenção pedagógico-didática na prática escolar.

Um dos aspectos cruciais dessas transformações, os quais têm se evidenciado em

avaliações educacionais como o Saresp (1996, 1997 e 1998), é o investimento na

qualidade da formação dos docentes e no aperfeiçoamento das condições de

trabalho nas escolas, para que estas favoreçam a construção coletiva de projetos

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pedagógicos capazes de alterar os quadros de reprovação, retenção e da qualidade

social e humana dos resultados da escolarização.

Tem sido unânime a insatisfação de gestores, pesquisadores e professores com as

formas convencionais de se formar professores em nosso país. Realizados em dois

níveis de ensino – Médio e Superior –, os atuais cursos não dão conta de preparar o

professor com a qualidade que se exige hoje desse profissional. No nível médio,

realiza-se a formação dos professores das quatro séries iniciais do Ensino

Fundamental e, em alguns casos, a formação dos professores para a educação

infantil. Às vezes esses profissionais são formados no nível superior (nos atualmente

chamados cursos de pedagogia). Os professores para as séries seguintes do Ensino

Fundamental e para o Ensino Médio são formados no nível superior, recorrendo ao

velho esquema dos cursos de bacharelado e licenciatura. Conforme mencionamos

anteriormente, essas modalidades de formação já demonstraram historicamente seu

esgotamento (em nosso país e em vários outros).14 Dentro desse quadro, o

aprimoramento do processo de formação de professores requer muita ousadia e

criatividade para que se construam novos e mais promissores modelos educacionais

necessários à urgente e fundamental tarefa de melhoria da qualidade do ensino no

país.

A LDB no 9.394/96, em seu art. 62, estabelece como regra que a formação dos

docentes para a educação fundamental e para a educação infantil far-se-á em nível

superior. A elevação da formação docente em nível superior, reivindicação antiga

dos educadores em nosso país e já consolidada em grande parte dos países

desenvolvidos, fica assim contemplada. No mesmo art. 62, no entanto, admite-se

como formação mínima para as séries iniciais e para a educação infantil, "a

oferecida em nível médio, na modalidade Normal". Nesse caso, em nada superaria a

situação historicamente vivida em relação à habilitação específica do magistério. Por

outro lado, as disposições transitórias da referida lei (Título IX, art. 87, parágrafo 4o)

determinam que, até o final da Década da Educação (2007), "somente serão

admitidos professores habilitados em nível superior ou formados por treinamento em

serviço". Incorpora-se, dessa forma, avanço mundialmente consolidado de formação

docente em nível superior. A LDB institui, também, a possibilidade de que a

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formação dos professores para todos os níveis de escolaridade ocorra nos Institutos

Superiores de Educação, não necessariamente universitários. A partir de então,

aceleram-se algumas alterações no cenário da formação de professores, o que

aponta para a urgência de um posicionamento quanto à formação dos professores

como profissionais da educação. As inovações curriculares – interdisciplinaridade,

sala-ambiente, ciclos de aprendizagem e outras – requerem dos professores novas

exigências de atuação profissional e, em conseqüência, novos saberes

pedagógicos, que nem sempre tiveram lugar em sua formação.

Que professor queremos formar?

Na sociedade contemporânea, as rápidas transformações no mundo do trabalho, o

avanço tecnológico configurando a sociedade virtual e os meios de informação e

comunicação incidem com bastante força na escola, aumentando os desafios para

torná-la uma conquista democrática efetiva. Não é tarefa simples nem para poucos.

Transformar as escolas em suas práticas e culturas tradicionais e burocráticas – as

quais, por meio da retenção e da evasão, acentuam a exclusão social – em escolas

que eduquem as crianças e os jovens, propiciando-lhes um desenvolvimento

cultural, científico e tecnológico que lhes assegure condições para fazerem frente às

exigências do mundo contemporâneo, exige esforço do coletivo da escola –

professores, funcionários, diretores e pais de alunos –, dos sindicatos, dos

governantes e de outros grupos sociais organizados.

Não se ignora que esse desafio precisa ser prioritariamente enfrentado no campo

das políticas públicas. Todavia, não é menos certo que os professores são

profissionais essenciais na construção dessa nova escola. Entendendo que a

democratização do ensino passa pela sua formação, sua valorização profissional,

suas condições de trabalho, pesquisas e experiências inovadoras têm apontado

para a importância do investimento no desenvolvimento profissional dos professores.

O desenvolvimento profissional envolve formação inicial e contínua articuladas a um

processo de valorização identitária e profissional dos professores. Identidade que é

epistemológica, ou seja, que reconhece a docência como um campo de

conhecimentos específicos configurados em quatro grandes conjuntos, a saber:

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conteúdos das diversas áreas do saber e do ensino, ou seja, das ciências humanas

e naturais, da cultura e das artes; conteúdos didático-pedagógicos (diretamente

relacionados ao campo da prática profissional); conteúdos relacionados a saberes

pedagógicos mais amplos (do campo teórico da prática educacional) e conteúdos

ligados à explicitação do sentido da existência humana (individual, sensibilidade

pessoal e social).15 E identidade que é profissional. Ou seja, a docência constituiu

um campo específico de intervenção profissional na prática social – não é qualquer

um que pode ser professor.

Uma visão progressista de desenvolvimento profissional exclui uma concepção de

formação baseada na racionalidade técnica (em que os professores são

considerados mero executores de decisões alheias) e assume a perspectiva de

considerá-los em sua capacidade de decidir e de rever suas práticas e as teorias

que as informam, pelo confronto de suas ações cotidianas com as produções

teóricas, pela pesquisa da prática e a produção de novos conhecimentos para a

teoria e a prática de ensinar. Considera, assim, que as transformações das práticas

docentes só se efetivam na medida em que o professor amplia sua consciência

sobre a própria prática, a da sala de aula e a da escola como um todo, o que

pressupõe conhecimentos teóricos e críticos sobre a realidade.16 Dessa forma, os

professores contribuem para a criação, o desenvolvimento e a transformação nos

processos de gestão, nos currículos, na dinâmica organizacional, nos projetos

educacionais e em outras formas de trabalho pedagógico. Por esse raciocínio,

reformas gestadas nas instituições, sem tomar os professores como

parceiros/autores, não transformam a escola na direção da qualidade social. Em

conseqüência, valorizar o trabalho docente significa dotar os professores de

perspectivas de análise que os ajudem a compreender os contextos históricos,

sociais, culturais, organizacionais nos quais se dá sua atividade docente.

Nas últimas décadas assistimos a uma ampliação das oportunidades de acesso à

escola, em que pesem as diferenças entre as regiões. Poder-se-ia concluir que o

país tem uma escola que realizou a inclusão social de todos? Não nos parece, pois

a essa ampliação quantitativa, em grande parte resultante da reivindicação dos

educadores e da população, não correspondeu a melhoria das condições de

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trabalho, de jornada, de organização e funcionamento, de formação e valorização do

professor, fatores essenciais para a qualidade do ensino. Sem isso, a escola

quantitativamente ampliada permanece excludente. Ao desenvolver um ensino

aligeirado, impossibilita a inserção social de crianças e jovens de classes sociais

mais pobres em igualdade de condições com aqueles dos segmentos

economicamente favorecidos, acentuando a exclusão social.

Uma escola que inclua, ou seja, que eduque todas as crianças e jovens, com

qualidade, superando os efeitos perversos das retenções e evasões, propiciando-

lhes um desenvolvimento cultural que lhes assegure condições para fazerem frente

às exigências do mundo contemporâneo, precisa de condições para que, com base

na análise e na valorização das práticas existentes que já apontam para formas de

inclusão, se criem novas práticas: de aula, de gestão, de trabalho dos professores e

dos alunos, formas coletivas, currículos interdisciplinares, uma escola rica de

material e de experiências, como espaço de formação contínua, e tantas outras. Por

sua vez, os professores contribuem com seus saberes específicos, seus valores,

suas competências, nessa complexa empreitada, para o que se requer condições

salariais e de trabalho, formação inicial de qualidade e espaços de formação

contínua.

Dada a natureza do trabalho docente, que é ensinar como contribuição ao processo

de humanização dos alunos historicamente situados, espera-se dos processos de

formação que desenvolvam conhecimentos e habilidades, competências, atitudes e

valores que possibilitem aos professores ir construindo seus saberes-fazeres

docentes a partir das necessidades e desafios que o ensino como prática social lhes

coloca no cotidiano. Espera-se, pois, que mobilizem os conhecimentos da teoria da

educação e do ensino, das áreas do conhecimento necessárias à compreensão do

ensino como realidade social, e que desenvolvam neles a capacidade de investigar

a própria atividade (a experiência) para, a partir dela, constituírem e transformarem

os seus saberes-fazeres docentes, num processo contínuo de construção de suas

identidades como professores.17

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Em síntese, dizemos que o professor é um profissional do humano que: ajuda o

desenvolvimento pessoal/intersubjetivo do aluno; um facilitador do acesso do aluno

ao conhecimento (informador informado); um ser de cultura que domina de forma

profunda sua área de especialidade (científica e pedagógica/educacional) e seus

aportes para compreender o mundo; um analista crítico da sociedade, portanto, que

nela intervém com sua atividade profissional; um membro de uma comunidade de

profissionais, portanto, científica (que produz conhecimento sobre sua área) e

social.18

Esse profissional deve ser formado nas universidades, que é o lugar da produção

social do conhecimento, da circulação da produção cultural em diferentes áreas do

saber e do permanente exercício da crítica histórico-social.

Centro de Formação, Pesquisa e Desenvolvimento Profissional de Professores (CFPD): Uma proposta

Tendo argumentado sobre a especificidade da pedagogia e da formação de

pedagogos stricto sensu, não identificados com professores, e explicitado a

importância da formação destes, ampliada para o conceito de desenvolvimento

profissional, passamos a propor a nossa visão da formação de professores. Um

ponto de vista radical sobre essa questão leva ao enfrentamento do desafio da

definição dos locais institucionais para a formação desses profissionais e de

orientações explícitas sobre a organização curricular, assegurando um suporte legal

de marcos institucionais e curriculares nacionais. Dessa forma, acreditamos que são

necessárias decisões por parte das instâncias normativas do sistema educacional

que considerem o tratamento global da questão, revendo os locais institucionais de

formação – de modo a superar os evidentes (e consensuais) problemas e impasses

que têm marcado a formação de professores tanto nas faculdades de educação

como nos institutos/departamentos/cursos das universidades – e estabelecendo

orientações mais específicas para a organização curricular dos cursos,

contemplando a formação pedagógica e a específica no âmbito dos saberes

disciplinares.

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Por isso, sugerimos que a Faculdade (Centro) de Educação incorpore em sua

estrutura, ao lado do curso de pedagogia, o Centro de Formação, Pesquisa e

Desenvolvimento Profissional de Professores – CFPD – que terá quatro objetivos:

a) formação e preparação profissional de professores para atuar na educação

básica: educação infantil, Ensino Fundamental (1a a 8a série) e Ensino Médio;

b) desenvolver, em colaboração com outras instituições (Estado, sindicatos etc.), a

formação contínua e o desenvolvimento profissional dos professores;

c) realizar pesquisas na área de formação e desenvolvimento profissional de

professores;

d) preparação profissional de professores que atuam no Ensino Superior.

Esses objetivos configuram um projeto pedagógico próprio para a formação e o

desenvolvimento profissional de professores.

Por que em um centro específico e nas faculdades de educação?

A inserção na estrutura das faculdades (centros) de educação do CFPD pretende

ser uma virada de rumo na formação de professores. É preciso uma mudança

radical nas formas institucionais e curriculares de formação de professores,

superando o atual esquema do bacharelado e da licenciatura, que não responde

mais às necessidades prementes de qualificação profissional para um tempo novo.

Centrar a formação de professores numa instituição modelar como têm sido as

faculdades de educação e atribuir-lhe a responsabilidade de concatenar, no âmbito

das universidades, as políticas e planos de formação de professores, em estreita

articulação com os institutos, faculdades ou departamentos das áreas especificas,

pode ser garantia não apenas de melhoria da qualidade de formação, mas da

profissionalidade do professorado, de modo que se configurem sua identidade e seu

estatuto profissional.

As faculdades de educação têm sido, ao longo destas décadas, local da produção

do conhecimento sobre educação e ensino que, na maioria das vezes, tem sido

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ignorado pelos institutos/departamentos/cursos específicos. No entanto, os

problemas encontrados nas atuais faculdades de educação e que exigem destas

uma reformulação, referem-se, a nosso ver, de um lado, à ambigüidade nelas

presente quanto ao tratamento das "ciências da educação" dissociadas das

questões referentes à profissionalidade docente e, de outro, à ambigüidade dos

cursos de pedagogia que, ao se restringirem à formação dos professores das séries

iniciais do Ensino Fundamental ou à formação técnico-burocrática dos

"especialistas", conforme tratamos no item anterior, perderam sua especificidade de

produção do conhecimento na área educacional. Há que se considerar, ainda, a

desigualdade de importância entre os saberes constitutivos da docência na

formação dos professores, privilegiando aqueles relacionados às competências

didático-pedagógicas do ensino (metodologias e práticas de ensinar), considerados

de modo fragmentado e dissociados das áreas específicas e apenas disciplinares e

os relacionados aos saberes pedagógicos mais amplos. Estes, via de regra,

desarticulados daqueles. Por sua vez, os institutos/departamentos/cursos, via de

regra, desenvolvem os conteúdos específicos das áreas, ignorando a docência

como atividade profissional de seus egressos e, portanto, ignorando os

conhecimentos pedagógicos/educacionais necessários à mediação profissional dos

especialistas em atividades de ensinar.

Considerem-se, também, as enormes dificuldades que ambos, faculdades de

educação e institutos, encontram para valorizar e efetivar a pesquisa sobre ensino e

docência nas respectivas instituições, por tratarem de área tradicionalmente menos

prestigiada na comunidade científica nacional e internacional. Já há um consenso

em algumas universidades, faculdades de educação, institutos, comunidades

científicas e nas áreas de ensino e entidades de educadores, de que a formação de

professores precisa se constituir em um projeto pedagógico próprio, articulado entre

diferentes instâncias de formação de professor. O que favoreceria, inclusive, a

valorização dessa área na comunidade científica, em termos de verbas para

projetos, pesquisas, experiências inovadoras e até articulação entre as instâncias de

formação inicial e os locais sociais de exercício da profissão docente.

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Um centro específico de formação, pesquisa e desenvolvimento profissional de

professores possibilitaria a superação da hoje dicotômica visão da docência. O

exercício profissional em um dado nível do ensino configura uma dimensão de uma

totalidade que é a docência. Em qualquer nível (e local: escolar e não-escolar) em

que ocorra, a docência configura uma visão de conjunto, de totalidade (à

semelhança do médico que, em qualquer campo de ação que atue, é médico!) e um

processo contínuo. Os atuais cursos de formação não lidam com essa categoria. Os

professores que atuam nas séries finais do Ensino Fundamental ignoram a

problemática e as questões essenciais da docência nos demais segmentos, o que

traz problemas insuperáveis nos resultados do ensino e do processo formativo, pois

seus profissionais operam a docência como um conjunto de "gavetas fragmentadas

e justapostas", negando a característica de complexidade do fenômeno ensino.

Em que o CFPD avança na discussão sobre a formação de professores

A institucionalização do CFPD possibilita a incorporação dos princípios que os

educadores construíram ao longo dos últimos anos (explicitados nas pesquisas, nas

experiências, na vivência profissional, nos movimento de educadores pela formação

profissional e em diversos fóruns de debates):

• introduz o conceito de desenvolvimento profissional, superando uma visão

dicotômica da formação inicial e da formação contínua;

• toma a pesquisa como componente essencial da/na formação. Incorpora as

recentes contribuições da formação do professor/pesquisador baseadas na

epistemologia da prática, propondo percursos de formação teórico/práticos, nos

quais a pesquisa é tanto formação do docente como este também se forma como

pesquisador19 (ver o item IV.c. experiência e prática profissionais: uma formação

integrada, Documento Norteador);

• a formação é especialmente voltada para a profissionalidade docente e para a

construção da identidade do professor. Experiências bem-sucedidas (especialmente

as realizadas em alguns cursos de pedagogia) mostram que os cursos que se

voltaram para tematizar a formação e o exercício da docência como objeto de

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formação e pesquisa podem se constituir em espaços mais férteis na produção de

conhecimento e mais compromissados com a prática social da docência;

• investe em sólida formação teórica nos quatro campos que constituem os saberes

da docência;

• considera a prática social concreta da educação como objeto de reflexão/formação;

• considera a visão de totalidade do processo escolar/educacional;

• constitui um projeto pedagógico coletivo e interdisciplinar para a formação,

desenvolvendo em igualdade de importância os quatro campos dos saberes da

docência (conteúdos formativos, conforme o Documento Norteador);

• eleva a formação de todos os professores ao Ensino Superior;

• valoriza a atividade intelectual, crítica e reflexiva da docência como elemento de

melhoria da qualidade da formação profissional dos professores;

• apresenta currículo e percursos de formação abertos, permitindo um vai-e-vem

entre as várias instituições da universidade que desenvolvem conteúdos formativos

para a docência.

• O CFPD assegurará ainda:

• um sólido curso de graduação em que estará presente a unidade

ensino/pesquisa/extensão, elevando o estatuto da formação de professores e

assegurando a valorização profissional, situando todos os professores no mesmo

nível de formação e salários;

• a ampliação da responsabilidade das faculdades de educação e o reconhecimento

da importância do seu papel na formação de professores, assim como a redefinição

das responsabilidades dos institutos/faculdades/departamentos das áreas do

conhecimento, na formação dos professores dentro de um projeto mais explícito de

formação profissional do professorado;

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• a eleição da prática como elemento integrante de todo o percurso de formação,

constituindo um princípio epistemológico da formação (e não um apêndice);

• a incorporação de contribuições de experiências bem-sucedidas de formação em

nosso país.

A formação de professores para qualquer um dos níveis de ensino no CFPD estará

assentada na compreensão de que a escolaridade constitui um processo contínuo e

uma totalidade, superando a atual fragmentação. Além disso, possibilitará que os

graduados complementem e ampliem sua formação para atuar em diferentes níveis

de ensino.

Com base em diagnósticos de necessidades e demandas, o CFPD oferecerá

programas para atendimento específico, por exemplo, na formação inicial para

professores leigos, para a população indígena; desenvolvimento profissional de

professores que já atuam nos sistemas escolares e outros. Tais programas poderão

ser objeto de convênios com Secretarias de Educação, sindicatos etc. Por seu

potencial formativo, integrarão o projeto pedagógico de formação inicial do CFPD.

Formação teórico-prática articulada na formação inicial e contínua

As investigações recentes sobre formação de professores apontam como questão

essencial o fato de que os professores desempenham uma atividade teórico-prática.

É difícil pensar na possibilidade de educar fora de uma situação concreta e de uma

realidade definida. A profissão de professor precisa combinar sistematicamente

elementos teóricos com situações práticas reais. Por essa razão, ao se pensar um

currículo de formação, a ênfase na prática como atividade formadora aparece, à

primeira vista, como exercício formativo para o futuro professor. Entretanto, em

termos mais amplos, é um dos aspectos centrais na formação do professor, em

razão do que traz conseqüências decisivas para a formação profissional.

Atualmente, em boa parte dos cursos de licenciatura, a aproximação do futuro

professor à realidade escolar acontece após ele ter passado pela formação "teórica",

tanto na disciplina especifica como nas disciplinas pedagógicas. O caminho deve ser

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outro. Desde o ingresso dos alunos no curso, é preciso integrar os conteúdos das

disciplinas em situações da prática que coloquem problemas aos futuros professores

e lhes possibilitem experimentar soluções. Isso significa ter a prática, ao longo do

curso, como referente direto para contrastar seus estudos e formar seus próprios

conhecimentos e convicções a respeito. Ou seja, os alunos precisam conhecer o

mais cedo possível os sujeitos e as situações com que irão trabalhar. Significa tomar

a prática profissional como instância permanente e sistemática na aprendizagem do

futuro professor e como referência para a organização curricular.

Significa, também, a articulação entre formação inicial e formação continuada. Por

um lado, a formação inicial estaria estreitamente vinculada aos contextos de

trabalho, possibilitando pensar as disciplinas com base no que pede a prática; cai

por terra aquela idéia de que o estágio é aplicação da teoria. Por outro, a formação

continuada, a par de ser feita na escola a partir dos saberes e experiências dos

professores adquiridos na situação de trabalho, articula-se com a formação inicial,

indo os professores à universidade para uma reflexão mais apurada sobre a prática.

Em ambos os casos, estamos diante de modalidades de formação em que há

interação entre as práticas formativas e os contextos de trabalho. Com isso, institui-

se uma concepção de formação centrada na idéia de escola como unidade básica

da mudança educativa, em que as escolas são consideradas "espaços institucionais

para a inovação e a melhoria e, simultaneamente, como contextos privilegiados para

a formação contínua de professores" (Escudero e Botia 1994).

Sobre formar professores no curso de pedagogia

A tendência predominante hoje no Brasil e expressa na LDB, de formação de

professores para a educação infantil e as séries iniciais do Ensino Fundamental em

nível superior, representa uma conquista dos educadores brasileiros, amplamente

tematizada nas Conferências Brasileiras de Educação (CBEs), a partir de 1981.

Desde então a formação desses professores no Ensino Superior tem sido

experimentada em cursos de pedagogia. Alguns desses cursos implantaram

propostas inovadoras de formação com importantes resultados sociais e

profissionais, principalmente quando sua clientela é composta de professores que já

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atuam nos sistemas de ensino. Tem sido freqüente nesses cursos tomar a prática

docente como objeto de formação teórico-prática, contribuindo para ampliar o

conhecimento no campo da formação de professores. Outros cursos mantiveram a

formação dos professores de 1a a 4a série apenas como uma habilitação ao lado de

outras. Estes, à guisa de pretenderem formar especialistas e professores, acabam

por não dar conta de uma formação de qualidade em nenhum caso, conforme

procuramos demonstrar. Outros, ainda, muito poucos, formam pedagogos para a

educação escolar (em geral, coordenadores pedagógicos) e, aqui e ali, preparam os

pedagogos para atuar em outros espaços sociais da educação, como os

movimentos sociais, a educação de jovens e adultos, os meios de comunicação etc.

Esses profissionais, em grau maior ou menor, desenvolvem a pesquisa em áreas

diversas da prática educativa.

Dados de pesquisa têm mostrado que, no primeiro caso, os cursos de pedagogia se

transformaram em ótimos cursos de formação de professores. Entendemos que

essas experiências bem-sucedidas não apenas devem continuar, como devem ser

apoiadas financeira e institucionalmente, pelos setores públicos e governamentais,

pelas agências de fomento e de financiamento de pesquisas para que sistematizem

o conhecimento produzido com base na experiência praticada e desenvolvam mais

pesquisas sobre formação de professores, fortalecendo assim teórica, científica e

politicamente a área. Há razões suficientes para afirmar que esses cursos, do ponto

de vista curricular e metodológico, mobilizam os saberes pedagógicos e os saberes

das áreas específicas para, na confluência com a experiência dos professores-

alunos, contribuírem à formação teórico-prática dos mesmos. São, pois, excelentes

cursos de formação de professores, embora, a nosso ver, não sejam cursos de

formação de pedagogos stricto sensu.

Por outro lado, do mesmo modo que rejeitamos a redução do curso de pedagogia à

formação de professores para a educação infantil e as séries iniciais do Ensino

Fundamental, não nos pareceu oportuna a designação de Escola Normal Superior

dada a esses cursos na legislação mais recente do Conselho Nacional de Educação.

A argumentação que desenvolvemos até aqui acentua nossa posição contrária à

extinção do curso de pedagogia, como também contrária à autonomização de uma

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Escola Normal Superior. A nosso ver, a institucionalização da Escola Normal

Superior significa a reedição da antiga Escola Normal cuja concepção está

ultrapassada. A legislação recente do CNE não só não acrescenta nada de novo,

como também não incorpora inovações e funções já bastante difundidas na

produção de conhecimento na área, como a interligação entre formação inicial e

continuada, o desenvolvimento profissional dos professores, a pesquisa-ação, a

unidade do processo formativo dos professores de todos os níveis e modalidades de

ensino. Desse modo, é lastimável que o CNE esteja legislando aos pedaços,

levando à fragmentação da legislação e dos próprios cursos, desconsiderando a

idéia de um sistema integrado e articulado de formação dos profissionais da

educação e a rica investigação teórica produzida na universidade e nas escolas.

Concluindo

Entendendo que a análise crítica da realidade existente é imprescindível para sua

transformação, pretendemos, com o presente artigo, colaborar para essa análise,

oferecendo perspectivas e alternativas até então pouco exploradas na literatura

sobre os cursos de pedagogia e de formação de professores. Em decorrência,

entendemos que "modelos únicos" não apenas não respondem à diversidade e à

desigualdade de nosso país, como representam autoritarismos que ferem a

capacidade e a competência dos educadores brasileiros de apresentarem propostas

efetivamente compromissadas com a qualidade social da educação para nosso país.

Assim, este artigo traz contribuições para o alargamento da consciência dos

educadores, de modo que em suas práticas institucionais concretamente situadas

gestem propostas que confiram à pedagogia e à formação de professores o estatuto

de importância científica, social e cultural, num país em que é comum serem jogadas

fora conquistas duramente conseguidas na construção da democracia escolar e

educacional.

Notas

1. As idéias aqui expostas são desdobramentos da declaração de voto em separado

firmada pelos autores e anexada ao Documento Norteador para a Elaboração das

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Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação de Professores, elaborado pelo

Grupo de Trabalho designado pela SESu/MEC, através da Portaria nº 808, de

8/6/1999, e encaminhado em 16/9/1999. O GT foi constituído pelos professores-

doutores: Antônio Joaquim Severino (coordenador), Helena Costa Lopes de Freitas,

José Carlos Libâneo, Luís Carlos de Menezes e Selma Garrido Pimenta. Na

declaração de voto é destacada a necessidade e a relevância de se enfrentar uma

das questões cruciais da educação nacional, que é a organização de um sistema

nacional de formação dos profissionais da educação, conforme o Título VI da LDB nº

9.394/96, incluindo, portanto, a formação de professores, de pedagogos

especialistas e de profissionais para outras tarefas sociais da educação, uma vez

que o Documento Norteador refere-se tão-somente à formação de professores.

2. O reforço da expressão stricto sensu seria desnecessário já que pedagogia é,

antes de tudo, um campo de conhecimentos cujo objeto é o fenômeno educativo e o

curso que lhe corresponde refere-se, obviamente, a uma seqüência de estudos

relacionada com esse objeto. Entretanto, está sendo utilizada aqui para se distinguir

do curso de formação de professores para as séries iniciais, uma identificação longe

de ter um suporte teórico-conceitual para avalizá-la.

3. Em publicação recente, Silva (1999) descreve e analisa o percurso do curso de

pedagogia no Brasil, com base nas regulamentações e propostas de estrutura

curricular, visando, justamente, estudar sua busca de identidade. Em publicação

anterior, Brzezinski (1998) faz uma radiografia da formação de professores. Cf.,

também, Libâneo 1999 (2º edição). Em relação especificamente às licenciaturas, há

vários trabalhos relevantes, entre outros, Castro (1974), Candau (1987), Bernardo

(1989), Silva (1991), Freitas (1992), Lüdke (1994), Gatti (1998).

4. Silva (op. cit.) relata em seu livro conclusões do Congresso Estadual de

Estudantes de Pedagogia, realizado em São Paulo em 1967, em que estes

reivindicavam a exclusividade de exercício profissional para o licenciado em

pedagogia em cargos e funções como orientador educacional, diretor de escola

média, inspetor de Ensino Médio, técnico em educação, professor de recursos

audiovisuais em educação, técnico de recursos audiovisuais em educação,

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pesquisador educacional, assistente técnico-pedagógico. Os estudantes

recomendavam, também, a criação, em caráter efetivo, de cargos e funções para

suprir, com os licenciados em pedagogia, necessidades educacionais da realidade

brasileira, tais como: planejamento educacional, TV educativa, educação de adultos,

formulação de uma filosofia da educação, reformulação de política educacional,

educação de excepcionais, desenvolvimento de recursos humanos, atividades

comunitárias, avaliação de desempenho em escolas e empresas, administração de

pessoal, educação sanitária. Chegaram, inclusive, a recomendar a participação do

pedagogo na formação, adaptação e aperfeiçoamento do funcionalismo público

paulista.

5. As habilitações não se reduziam a essas oito, podendo ser criadas outras por

iniciativa do CFE e dos próprios estabelecimentos. É interessante notar que as

habilitações reclamadas pelos estudantes em 1967 (Cf. nota 5) foram incorporadas

pelo relator no Parecer.

6. Cabe lembrar que algumas dessas habilitações já existiam no nível pós-médio,

nos então Institutos de Educação, criados nos anos 30.

7. Diferentes posicionamentos de pesquisadores em relação a essas críticas e

inclusive ao papel dos pedagogos já se faziam sentir ao longo dos anos 70 e 80. À

época em que discutia a identidade do curso de pedagogia e do profissional

pedagogo, foram produzidas no programa de pós-graduação da PUC-SP três teses

sobre os especialistas de educação. Tais teses, posteriormente transformadas em

livro (Silva Jr. 1985, Pimenta 1988, Paro 1988), deram (e ainda dão) suporte à

atuação profissional dos pedagogos, ao recolocarem a prática da coordenação, da

administração e da supervisão pedagógicas diante das novas demandas sociais,

com base na crítica à tradição desses campos. Esses autores não endossaram a

licenciatura na pedagogia, criticaram a fragmentação das habilitações, mas

propuseram a redefinição do curso de pedagogia e do pedagogo na escola e no

sistema de ensino.

8. Algumas dessas questões são analisadas por Silva (op. cit.). Segundo ela, a

variedade de especializações do curso de pedagogia decorrente de pretensões

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demasiadamente ambiciosas dos legisladores, resultou num "inchaço" do currículo,

levando a duas ordens de dificuldades: primeira, a de atender simultaneamente às

necessidades de formação de docentes e não-docentes; segunda, a de dar as

condições de oferta de numerosas disciplinas para as várias habilitações e as

múltiplas práticas de ensino. A situação se agrava, segundo a autora, à medida que,

além da formação do professor para o ensino normal e dos especialistas, o Parecer

assegura ainda o direito ao magistério nas séries iniciais do 1º grau. "Adicionar às

demais incumbências do curso de pedagogia a formação, também, desses

profissionais, é superestimar as possibilidades do curso e/ou desconhecer as

necessidades de formação desses docentes." Conclui a autora que um "inchaço" de

tais proporções leva inevitavelmente à desqualificação de qualquer curso.

9. É necessário registrar que a trajetória do movimento pela reformulação dos cursos

de formação do educador não manteve sempre a posição de minimizar o caráter

teórico da pedagogia. Nos anos 1983-89, a pedagogia foi assumida como uma

licenciatura destinada à formação de docentes para as disciplinas pedagógicas do 2º

grau e à formação de especialistas "de forma integrada", possibilitando uma ação

conjunta desses profissionais na escola. Admitia-se, também, a criação de áreas de

concentração em docência para as séries iniciais do 1º grau, educação pré-escolar,

educação de adultos, educação comunitária etc. Mas, especialmente, afirmava-se

em 1986: "O curso de pedagogia tem uma destinação prática: formar profissionais

da educação. (...) O curso de pedagogia tem também uma função teórica, não

menos importante, de transmissão, crítica e construção de conhecimento sobre a

ciência da educação". Mais tarde é que vai se firmando a idéia de identificar o curso

de pedagogia com a formação de professores, reiterando a famosa tese de Valnir

Chagas na sua Indicação nº 70/76, de "habilitar o especialista no professor".

Mostraremos, mais adiante, como esse entendimento acabou por tornar-se bastante

limitado e empobrecedor da formação.

10. No Parecer 252/69, uma frase do relator revela uma das ambigüidades da

concepção de curso de pedagogia que, segundo ele, "outra coisa não é senão o

desenvolvimento em anos do que se estuda em meses para a licença comum do

magistério". Da lógica desse raciocínio, depreende-se que o curso de pedagogia

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deveria ser mais do que uma licenciatura, ou seja, seria um curso de estudos

sistemáticos da educação para formar seja professores do curso normal seja

especialistas de educação. Não preponderantemente para formar o professor das

séries iniciais do Ensino Fundamental, ou seja, uma licenciatura.

11. Libâneo, no livro Pedagogia e pedagogos, para quê? (1998, pp. 38-43, 91-95,

97-127), tenta refazer detalhadamente esse percurso da história do curso de

pedagogia e de sua descaracterização como área específica de conhecimento e

como campo de exercício profissional.

12. Ao explicitar a identidade profissional do pedagogo, escreve Carvalho (1996), ex-

diretora da Faculdade de Educação da USP: "O ensino e a pesquisa (...) são os

objetivos fundamentais de nossa faculdade. (...) Nós temos que ser realmente

técnicos em Educação e técnicos na pesquisa em Educação. Técnico em um

sentido amplo, sem a conotação pejorativa que este termo adquiriu nos anos 80.

Técnico (...) no sentido de conhecimento específico de ponta. (...) O curso, na minha

opinião, deveria proporcionar aos seus alunos esta dupla visão, esta dupla

formação. A escolha em ser um pesquisador ou um profissional da educação

deveria ser do aluno no final do curso. Durante os 4 anos ele deveria ser preparado

para as duas funções".

13. Há quem argumente que o curso de pedagogia para formar especialistas e

cientistas da educação separa a teoria da prática, a teoria educacional da docência,

o trabalho pedagógico do conteúdo. Do nosso lado, argumentamos que a

pedagogia, como área específica de conhecimento, tem seus próprios conteúdos,

formas e métodos. Os conteúdos da pedagogia (ou do trabalho pedagógico) não são

os conteúdos das matérias. Quem entende assim está fazendo uma identificação

descabida entre pedagogia e metodologia, trabalho pedagógico e trabalho

metodológico, como se fossem sinônimos. Ora, é evidente que a pedagogia, como

campo científico, tem seu conteúdo próprio, suas formas conexas ao conteúdo e aos

métodos, por mais que tais conteúdo e métodos tenham origem em boa parte das

demais ciências da educação. Mas isso não constitui nenhum problema

epistemológico, pois não se trata de uma exclusividade da pedagogia. Dificilmente

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uma ciência prescindirá do campo conceitual e de práticas metodológicas de outras.

Sobre a relação teoria e prática, nossa proposta tem como suporte a unidade teoria

e prática, ou seja, todas as disciplinas estarão referidas à prática e vice-versa, além

de se prever o estágio específico onde couber. Gostaríamos, além disso, de levantar

a suspeita de que em muitos casos a experiência de sala de aula não precisa ser

salvo-conduto para o exercício profissional do pedagogo. Os objetos de estudo da

pedagogia escolar, por exemplo, são a escola e o ensino. É óbvio que não se pode

dispensar o futuro pedagogo do estágio na escola e na sala de aula, para aproximar-

se da realidade. Nem por isso ele precisa ser obrigatoriamente professor, nem

desempenhar estágio de ensino como professor. É claro que o objeto final a ser

conhecido pelo pedagogo escolar é o ensino, mas isso não exclui o entendimento de

que um diretor de escola, um coordenador pedagógico possuem também seu objeto

imediato, no caso, a administração e a gestão da escola e a coordenação e a

assistência pedagógico-didática.

14. França, Espanha, Portugal, Inglaterra, Canadá e Estados Unidos, dentre outros,

têm considerado os professores como atores centrais na formulação e no

desenvolvimento de inovações que objetivam um ensino de qualidade social, no qual

a disseminação do conhecimento e de elementos substanciais da cultura é

fundamental. Constata-se também o tratamento indissociado, nessas políticas, da

questão da formação e do desenvolvimento profissional dos docentes, envolvendo o

Estado, as universidades, as escolas e os sindicatos/associações científicas, bem

como políticas de valorização efetiva das condições de formação, de trabalho e

valorização profissional dos professores, envolvendo carreira e salários.

15. Conforme explicitados no Documento Norteador para a Elaboração das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação de Professores, 1999, item III (Conteúdos formativos a serem desenvolvidos).

16. Ver item IV (Do processo formativo) do Documento Norteador para a Elaboração das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Formação de Professores, 1999.

17. Ver à propósito Pimenta 1997 e 1999.

18. A partir de colaborações de Isabel Alarcão, na 22ª Reunião Anual da Anped. 1999.

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19. Ver Garrido, Fusari, Moura e Pimenta 1998, pp. 48-49.

Educational professional upbringingi: Critical view and changing perspectives

ABSTRACT: The article presents brief critical analysis of the historical of the formation of the education professionals in Brazil, clearing the ambiguities of the course of pedagogy from its creation to the present time, the trajectory of the courses of teachers' formation and the impact of the debates promoted in the institutions, entities, movements, around the subject. In the sequence, the text analyzes the nature and the identity of the pedagogy as an area of knowledge of the educational field and the subjects related to the professional exercise of pedagogues and teachers. It finally indicates suggestions of institutional organization and some possible trajectories of those professionals' formation that point for a change of the current picture.

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* Professor titular da Universidade Católica de Goiás. Email: [email protected]

** Professora titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

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Educação & Sociedade Print version ISSN 0101-7330

Educ. Soc. vol.20 n.68 Campinas Dec. 1999 doi: 10.1590/S0101-73301999000300002

A REFORMA DO ENSINO SUPERIOR NO CAMPO DA FORMAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO BÁSICA: As políticas educacionais e

o movimento dos educadores

Helena Costa Lopes de Freitas*

RESUMO

O presente trabalho apresenta as discussões que têm orientado o debate acerca da

formação dos profissionais da educação, recuperando a trajetória do movimento dos

educadores na luta pela sua formação e pela profissionalização do magistério –

representada na atualidade pela Associação Nacional pela Formação dos

Profissionais da Educação (Anfope) – nos últimos 20 anos. A construção coletiva em

torno da base comum nacional, em oposição às políticas de formação, e a proposta

de escola única de formação, que materializa os princípios da Anfope para a

reorganização dos cursos de formação dos profissionais da educação nas

universidades, vêm orientando o debate atual na resistência às políticas oficiais de

aligeiramento e fragmentação da formação profissional.

Palavras-chave: Formação de professores, base comum nacional, profissionais da

educação, políticas de formação

Introdução

As reformas educativas levadas a efeito em nosso país e nos outros países da

América Latina desde o final da década de 1970, com o objetivo de adequar o

sistema educacional ao processo de reestruturação produtiva e aos novos rumos do

Estado, vêm reafirmando a centralidade da formação dos profissionais da educação.

Nesse contexto, debatem-se diferentes propostas para a formação, fundadas em

projetos políticos e perspectivas históricas diferenciadas, o que faz com que a

formação desses profissionais seja tratada ou como elemento impulsionador e

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realizador dessas reformas, ou como elemento que cria condições para a

transformação da própria escola, da educação e da sociedade.

No quadro das políticas educacionais neoliberais e das reformas educativas, a

educação constitui-se em elemento facilitador importante dos processos de

acumulação capitalista e, em decorrência, a formação de professores ganha

importância estratégica para a realização dessas reformas no âmbito da escola e da

educação básica (Aguiar 1997, Freitas 1994, 1995).

A importância dada à questão da formação pelas políticas atuais tem por objetivo

equacionar o problema da formação para elevar os níveis de "qualidade" da

educação nos países subdesenvolvidos, qualidade que, na concepção do Banco

Mundial, é determinada por vários fatores, entre os quais situam-se o tempo de

instrução, os livros didáticos e a melhoria do conhecimento dos professores

(privilegiando a capacitação em serviço sobre a formação inicial e estimulando as

modalidades a distância). À formação geral, garantida no Ensino Médio a baixo

custo, seria agregada a formação para a docência, oferecida em cursos curtos de

formação inicial centrados na capacitação pedagógica (Torres 1996, p. 165).

Em nosso país, a implementação dessas concepções via políticas de formação vem

se dando desde o final dos anos 80 e se consolida na década de 1990, em

decorrência dos acordos firmados na histórica Conferência de Ministros da

Educação e de Planejamento Econômico, realizada no México, em 1979, e na

Conferência de Jontien, em 1990, na Tailândia. Várias iniciativas foram tomadas, em

especial na América Latina e no Caribe, como tentativa de responder à crise de

acumulação do capitalismo, no sentido de "elevar o nível de satisfação das

necessidades básicas de aprendizagem", pilar do plano de ação Educação Para

Todos que fundamentou, em nosso país, o Plano Decenal. A "qualidade" da

educação e da escola básica passa a fazer parte das agendas de discussões e do

discurso de amplos setores da sociedade, e das ações e políticas do MEC, que

busca a cooptação para criar consensos facilitadores das mudanças necessárias na

escola básica e, principalmente, no campo da formação de professores (Freitas

1994).

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As concepções que orientam tais mudanças vêm sendo questionadas ao serem

confrontadas com a produção teórica e prática da área educacional e do movimento

dos educadores que, desde o final dos anos 70, com o processo de democratização

da sociedade, passa a colocar novas exigências para a melhoria da escola básica e

para a formação de professores. A Associação Nacional pela Formação dos

Profissionais da Educação (Anfope) – que se organiza a partir de 1983 como

Comissão Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Conarcfe) –, no

movimento de reformulação dos cursos de formação do educador, vem contribuindo

com essa discussão, construindo coletivamente uma concepção sócio-histórica de

educador em contraposição ao caráter tecnicista e conteudista que tem

caracterizado as políticas de formação de professores para a escola básica em

nosso país. Ela tem, na concepção de base comum nacional, em oposição à

concepção de currículo mínimo, o instrumento que marca a resistência às políticas

de aligeiramento, fragilização e degradação da formação e da profissão do

magistério.

Faz parte também dessa trajetória na luta pela formação a definição de uma política

nacional global de formação dos profissionais da educação e valorização do

magistério, que contemple de forma prioritária no quadro das políticas educacionais,

e em condições de igualdade, a sólida formação inicial no campo da educação,

condições de trabalho, salário e carreira dignas e a formação continuada como um

direito dos professores e obrigação do Estado e das instituições contratantes.

Este trabalho analisa, em um primeiro momento, as reformas no campo da formação

de professores a partir da LDB 9.394/96, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional, destacando a posição da Anfope e do movimento dos educadores em

relação a elas. Em seguida, são retomados os pontos principais da política nacional

de formação dos profissionais da educação, enfatizando as condições da formação

inicial a base comum nacional e a intervenção no processo de discussão das

diretrizes curriculares para os cursos de formação. Por último, é discutida a proposta

de escola única de formação, uma alternativa de reorganização e estruturação dos

cursos de formação de profissionais da educação no interior das faculdades e dos

centros de educação e das universidades.

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As políticas atuais para a formação dos profissionais da educação

A aprovação da nova LDB, em dezembro de 1996, representou o marco da

institucionalização de políticas educacionais que já vinham sendo gestadas e

implantadas pelo MEC1 e pelo governo anterior. As medidas no campo da formação,

regulamentadas pelo CNE, têm se caracterizado por aprovações pontuais de

pareceres e resoluções que vão conformando a reforma universitária no campo da

formação. Destacam-se a Resolução 02/97 (antigos Esquema I e II, agora

revigorados), que estabelece a possibilidade de complementação pedagógica para

qualquer graduado/bacharel que queira atuar na educação básica; a

regulamentação do curso normal em nível médio, sem que tenha sido definido o

caráter transitório e datado dessa instância de formação bem como a política de

formação em nível superior dos estudantes que finalizam esse curso; a

regulamentação dos cursos seqüenciais que oferecem diploma e concorrem com os

tradicionais cursos de graduação, abrindo a possibilidade de retomada das antigas

licenciaturas curtas de 1.600 horas.

No quadro dessas políticas, destaca-se ainda a elaboração das Diretrizes

Curriculares para a graduação, que fincará as bases para a organização curricular

dos cursos de formação dos profissionais da educação.

A LDB instituiu também as bases para a definição de novas políticas que vêm sendo

regulamentadas pelo Conselho Nacional de Educação, com a criação de novas

instituições: os Institutos Superiores de Educação, instituição específica para

formação de professores para a educação básica, o Curso Normal Superior, para

formação de professores de 1a a 4a série e educação infantil, e a formação dos

especialistas nos cursos de pedagogia.

Posteriormente, o Decreto 2.032 de agosto de 1997, que alterou o sistema federal

de Ensino Superior e a organização acadêmica das IES, regulamenta essa nova

instituição e seu lugar no "concerto" do Ensino Superior brasileiro. O decreto

estabelece que as Instituições de Ensino Superior podem assumir diferentes

formatos: universidades, centros universitários, faculdades integradas, faculdades e

institutos superiores ou escolas superiores. Com essas distinções, e mantendo-se a

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exigência da pesquisa apenas nas universidades, institucionaliza-se a distinção

entre universidades de ensino e universidades de pesquisa, mantida no Plano

Nacional de Educação elaborado pelo relator da Comissão de Educação e Cultura,

reservando para os Institutos Superiores de Educação, uma instituição de quinta

categoria, segundo a própria hierarquização formulada pelo MEC para as IES, a

formação dos quadros do magistério.

A recente regulamentação dos Institutos Superiores de Educação, pelo Parecer no

115/99 da Câmara de Ensino Superior do CNE, deixa clara a concepção de

formação de professores que permeia as propostas atuais, ao estabelecer que a

preparação dos profissionais para atuar na educação básica se dará

fundamentalmente em uma instituição de ensino de caráter técnico-profissional.

As implicações dessa forma de organização do Ensino Superior para a formação

dos profissionais da educação têm sido anunciadas e denunciadas tanto pelas

diferentes entidades acadêmicas – Anfope, Anped, Anpae, Fórum de Diretores das

Faculdades de Educação das Universidades Públicas Brasileiras – quanto por

estudiosos da área (Aguiar 1997, Anfope 1998, 1999, Kuenzer 1998).

Para efeito de análise, retomamos aqui algumas dessas questões, centrando a

discussão nas condições de formação, buscando identificar seus fundamentos no

quadro atual. No campo das possibilidades da organização curricular e dos estudos

a serem oferecidos, pode-se identificar uma situação discriminatória em relação aos

demais cursos de graduação. Senão vejamos.

É um curso de caráter técnico-profissionalizante. A carga horária para integralização

do curso – 3.200 horas – pode ser reduzida, dependendo da experiência e da

formação anterior dos estudantes, podendo chegar até a 1.600 horas. Com isso,

constata-se que, pela primeira vez, se abre a possibilidade de aproveitamento, em

nível superior, dos estudos realizados em nível anterior de escolaridade,

desqualificando e banalizando o rigor necessário que deveria ser exigido dos

estudos superiores.

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Outra característica discriminatória é a exigência de qualificação do corpo docente –

10% de mestres e doutores –, que contrasta com a exigência de qualificação nas

universidades – 30% de mestres e doutores –, caracterizando uma desqualificação

dos formadores de professores, com sérias implicações no ensino e nos estudos

desenvolvidos nessas instituições.

As diretrizes curriculares que orientarão a elaboração dos currículos e os estudos

tomarão por base as diretrizes para a educação básica, ao contrário do processo

que tem orientado a elaboração das diretrizes para os cursos de graduação, que

toma como parâmetros e princípios orientadores os conhecimentos científicos da

área de formação. Essa forma de organização nos leva a afirmar que os estudos

que aí se desenvolverão, separados da pesquisa e da produção de conhecimento

nas áreas de formação – tanto nas disciplinas de conteúdo das áreas específicas da

docência quanto na área educacional –, adquirirão caráter técnico e instrumental,

retirando do profissional da educação a possibilidade de desenvolver-se como

"intelectual responsável por uma área específica do conhecimento, atribuindo-se a

ele uma dimensão tarefeira, para o que não precisa se apropriar dos conteúdos da

ciência e da pesquisa pedagógica" (Kuenzer apud Aguiar 1999).

Tais características apontam para a constituição de uma instituição formadora de

caráter pós-médio, e não superior. Assim, em vez de se buscar o que há de mais

avançado em termos de propostas de organização curricular e experiências em

curso nas IES, em particular nos cursos de pedagogia, coloca-se como horizonte o

aligeiramento da formação pelo rebaixamento das exigências e das condições de

formação.

Esse rebaixamento das exigências em vários níveis – corpo docente, carga horária –

, aliado às pressões dos sistemas de ensino estaduais e municipais para a

qualificação de seus docentes até 2007, em cumprimento à LDB e na ausência de

política de expansão qualificada do Ensino Superior público, que demandaria maior

volume de recursos financeiros, tem causado a proliferação de cursos de 1.600

horas e a criação de numerosas instituições privadas que se beneficiam dessas

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108

condições "ideais" para seu crescimento e expansão, nem sempre com a qualidade

necessária.

É contra essa política que a Anfope tem se posicionado, mais especificamente

contra o caráter da formação que essas instituições têm possibilidade de oferecer,

em decorrência de sua organização. Desde o IV Encontro Nacional, de 19892,

quando do processo de elaboração da LDB e, posteriormente, em 1994, durante o

VII Encontro Nacional, a Anfope vem se posicionando contrariamente a essas

iniciativas que já começavam a se configurar como alternativas para a organização

dos cursos de formação de professores, pois indicavam "uma reformulação às

avessas, desconsiderando as atuais instituições formadoras como locus de

produção do conhecimento e agências responsáveis pela formação de profissionais

da educação3".

Ao contrário do que afirmam alguns autores (Libâneo e Pimenta 1999), a Anfope tem

assumido historicamente uma posição contrária a qualquer proposta que vise criar

centros específicos de formação de professores, separados dos centros e dos

cursos que formam os profissionais da educação e pretendam separar a formação

de professores da formação dos demais profissionais da educação e do ensino, ou

dos especialistas.

Tal posição tem se mantido historicamente e tem fundamentado as posições da

entidade nos diversos fóruns em que é discutida a criação dos Institutos Superiores

de Educação, como lugar específico da formação exclusiva de professores,

separado da universidade. Essa posição foi reafirmada no processo de elaboração

do Plano Nacional de Educação da sociedade brasileira (1997), e nos quatro

seminários nacionais realizados de 1996 a 1999, promovidos conjuntamente pela

Anfope e pelo Fórum de Diretores das Faculdades/Centros de Educação das

Universidades Brasileiras.4

Nos diferentes documentos, a Anfope tem se posicionado a respeito dessa temática,

em particular reiterando a denúncia de que

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A proposta mantém as dicotomias e as fragmentações na formação de profissionais

da educação quando se dedica, em sua formulação, à formação de professores e

não de educadores, enfatizando exclusivamente o conteúdo específico, as

metodologias e o projeto pedagógico da escola, reforçando, portanto, a concepção

conteudista, tecnicista do professor, reduzindo-o a um prático com pleno domínio da

solução de problemas da prática cotidiana da escola e da sala de aula, alijado da

investigação e da pesquisa sobre as condições concretas que geram esses

problemas. (Anfope 1999)

É exatamente nesse campo que hoje se trava o debate nacional sobre a formação

dos profissionais da educação, suas concepções, seu conteúdo e forma, que vai

dando lugar a regulamentações, propostas, documentos e formulações oficiais.

A criação de novos cursos e instituições – como os Institutos Superiores de

Educação e o Curso Normal Superior5 – específicos para a formação de professores

é parte da estratégia adotada pelo governo brasileiro, em cumprimento às

exigências dos organismos internacionais, para o que seria a segunda etapa da

reforma educacional: a reforma no campo da formação de professores. Essa

segunda etapa cumpre dois objetivos básicos:

a) adequar as instituições formadoras e os conteúdos da formação aos objetivos da

reforma da educação básica em curso, garantindo a aplicação dos princípios da

reforma na sala de aula e na escola;

b) para cumprir com eficiência esse objetivo, não é necessário nem desejável que a

formação ocorra nas universidades e nos centros em que a produção de

conhecimento é parte integrante da formação profissional; é preciso, portanto,

separar a formação de professores da formação dos demais profissionais da

educação e da pós-graduação acadêmica. No caso do Brasil, é preciso separar a

formação de professores do curso de pedagogia, reservando-o como um curso de

excelência para formar profissionais da educação qualificados no campo da

produção de conhecimento. Com essa política, desarticulam-se as faculdades e os

centros de educação como instituições formadoras de educadores, profissionais de

caráter amplo para atuar na docência, instituições que vêm se constituindo como

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centros produtores de conhecimento, geradores de novas idéias que contestam e

fazem a crítica da educação, da escola e do ensino e das políticas moldadas pelas

diferentes reformas educacionais.

Mello (1999), ao definir elementos da política para formação inicial de professores,

deixa explícito que "é preciso dar prioridade à formação de professores na

perspectiva e no âmbito da política de educação básica, independentemente da

problemática do ensino superior como tal (...)"6. Afirma que seria

inviável para o poder público financiar a preços das universidades "nobres" a

formação de seus professores de educação básica que se contam em mais de

milhão. Com um volume de recursos muito menor, um sistema misto de custo baixos

tanto públicos quanto privados, configura um ponto estratégico de intervenção para

promover melhorias sustentáveis a longo prazo na escolaridade básica. (Idem, p. 8;

grifos nossos)

Esse documento explicita alguns parâmetros orientadores das políticas do Banco

Mundial para a educação básica (Torres 1996) e também as medidas e as políticas

governamentais no campo da formação de professores, nos próximos anos, dentre

os quais se destacam:

a) Aprofundamento do processo de "ajuste" estrutural, enxugamento dos recursos do

Estado para a educação e conseqüente privatização;

b) distribuição, centralização e focalização dos recursos para experiências que se

adeqüem aos princípios da reforma educativa em curso;

c) a massificação7 e o caráter de capacitação pedagógica (pragmatismo e o retorno

ao tecnicismo) na formação de professores,

• ênfase na capacitação pedagógica de professores feita em instituições específicas,

exclusivas, sem história e orientadas pelos parâmetros da reforma educativa em

curso que necessita "aterrissar na sala de aula";

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• rebaixamento das exigências de qualificação do corpo docente das instituições

formadoras de professores;

• retirada da formação de professores das faculdades de educação (curso de

pedagogia) e das universidades, desarticulando-as como centros de formação de

professores, com propostas orientadas por parâmetros acadêmicos e científicos no

campo da pesquisa e da formação de profissionais com amplo domínio do

conhecimento crítico sobre a educação e a sociedade, em condições de elaborar

propostas alternativas às propostas oficiais atuais;

• diretrizes curriculares para a formação fundadas nas diretrizes curriculares para a

educação básica e educação infantil, e não em diretrizes curriculares de caráter

acadêmico, tal como para os cursos de graduação nas IES; é preconizada uma

"sintonia fina" entre as agências formadoras e a reforma educativa.

d) o individualismo e a responsabilidade pessoal no processo formativo:

• desenvolvimento profissional: situa a responsabilidade pela formação continuada

no próprio professor, que deve autogerir sua formação continuada, seu

desenvolvimento profissional, em contraposição a uma concepção de formação

continuada como direito do profissional e dever do Estado e demais instituições

contratantes;

• certificação de competências: um novo conceito que orienta a formação

profissional – não há direito ao trabalho garantido pelo curso de formação. O

exercício do magistério fica condicionado à conclusão de curso em instituição

credenciada e à avaliação para certificação de competências docentes;

• avaliação dos professores vinculada à avaliação de desempenho dos alunos no

Saeb ou outras formas, para ascensão na carreira.

Na questão específica da formação de professores para educação infantil e séries

iniciais, a situação criada pela LDB é ainda mais complexa e reacende algumas das

polêmicas discussões da década de 1970, ao estabelecer permanência da formação

desses professores em nível médio, ao criar o Curso Normal Superior em

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substituição ao curso de pedagogia e localizar a formação dos especialistas no

curso de pedagogia, separada da formação de professores – no Curso Normal

Superior.

Não é demais reafirmar que o curso de pedagogia, em grande parte das IES, desde

meados da década de 1980, constituiu-se como um curso de graduação plena,

licenciatura e bacharelado, com projeto pedagógico próprio, responsável pela

formação de profissionais para a educação básica, eliminando a fragmentação das

antigas habilitações, e possibilitando sua inserção em outros campos profissionais.

É, hoje, o único curso de formação de profissionais da educação que tem essa

organização, com projeto pedagógico específico, sob total responsabilidade das

faculdades/centros de educação, superando as dicotomias entre bacharelado e

licenciatura, formação pedagógica e formação específica, presentes nos demais

cursos de licenciatura.

O CNE, ao regulamentar os Institutos Superiores de Educação, ignorou essa

trajetória e regulamentou a formação de professores de educação infantil e de 1a a

4a série no Curso Normal Superior, criando o clima propício para que,

posteriormente, fosse regulamentada a formação de professores para esses níveis

de ensino exclusivamente no Curso Normal Superior, tal como estabelece o Parecer

970/99, da Câmara de Educação Superior, aprovado em 10/11/1999, com apenas

sete (dos doze) conselheiros presentes e um voto em contrário, declarado em

separado pelo conselheiro Jacques Velloso. Sua aprovação foi antecedida de muita

mobilização em nível nacional, de amplos setores da área educacional. Centenas de

instituições, entidades, conselhos de cursos e educadores enviaram manifestação

ao Conselho Nacional, entre a reunião de outubro e a reunião de novembro do CNE,

rejeitando o parecer e solicitando audiência pública para o trato dessa questão. A

constatação de que não foi introduzida qualquer modificação na minuta

originalmente apresentada à Câmara de Ensino Superior e a insensibilidade diante

das centenas de manifestações de todo o país são dados reveladores da força dos

interesses que orientam a definição das políticas educacionais em nosso país e das

concepções que informam as propostas de formação de professores.

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O conteúdo do Parecer 970/99, por outro lado, opõe-se frontalmente aos estudos

desenvolvidos pela Comissão de Especialistas de Pedagogia, que, ao definir as

diretrizes curriculares para o curso, estabelece a docência como base da identidade

profissional de todo educador. Essa oposição a uma construção coletiva e histórica

no campo da formação de professores demonstra que as decisões no campo da

formação vêm respondendo aos interesses de determinados setores, tanto no CNE

quanto no MEC, que pretendem colocar os cursos de formação de professores como

responsabilidade apenas dos Institutos Superiores de Educação, afastados dos

bacharelados e, no que tange à formação de professores para as séries iniciais e a

educação infantil, afastada da formação dos demais profissionais do ensino no curso

de pedagogia – que se transformaria em um bacharelado (ou pedagogia stricto

sensu, uma nova formulação), retirando, portanto, desses cursos e das faculdades

de educação a responsabilidade pela formação dos profissionais da educação

(Anfope 1999)8.

Ao estabelecer que o curso de pedagogia formará os especialistas separadamente

da docência, retomando as já superadas habilitações, a regulamentação do CNE

contraria o movimento real9, a produção teórica na área10 e a própria LDB, que

estabelece, em seu artigo 67, a experiência docente como pré-requisito para o

exercício das demais funções do magistério.

Com isso, retorna agora, em um patamar mais elaborado11, a figura do pedagogo

"especialista", em oposição à concepção de profissional da educação, educador de

caráter amplo que tem na docência, no trabalho pedagógico, a base de sua

formação e de sua identidade profissional. Essa concepção de pedagogo stricto

sensu, superada tanto pela produção teórica da área quanto pela prática

democrática da organização do trabalho pedagógico nas escolas públicas, articula-

se à concepção de professor "tarefeiro", formado com ênfase nos conteúdos

específicos.

Essa concepção favorece as políticas governamentais que apontam para uma

formação diferenciada entre professores e demais profissionais da educação, e

ainda dá espaço para a formação de profissionais para funções de gestão do

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sistema educacional descoladas do âmbito escolar, numa perspectiva hierarquizada.

Nas circunstâncias atuais da escola básica, esse profissional é ressignificado pelo

Estado, talvez como um profissional a seu serviço na escola e nos sistemas de

ensino para que, diante de professores formados em bases tecnicistas e

pragmatistas, possa atuar firme e decisivamente no sentido de fazer cumprir as

metas da reforma e das políticas educacionais que a embasam.

O fato de o curso de pedagogia constituir-se sob total e exclusiva responsabilidade

das faculdades/centros de educação tem permitido seu aprimoramento e

aperfeiçoamento na direção de tomar a prática educativa e a educação como objeto

de estudo na formação de profissionais para atuação na educação básica – na

formação de crianças de 0 a 10 anos –, identificando, no trabalho pedagógico

escolar e não-escolar, elementos constitutivos da formação humana em sua

dimensão omnilateral12.

É essa especificidade que devemos garantir para o curso de pedagogia, cuja "crise"

somente se aprofundará com a separação da formação de professores, a retomada

das habilitações e a fragmentação na formação dos especialistas.

O que está em jogo, hoje, para o conjunto dos educadores e para a sociedade

brasileira é a defesa do campo educacional e, nele, do curso de pedagogia e das

faculdades/centros de educação, como espaços de formação do profissional da

educação básica estudioso da educação, em condições de exercer sua prática em

ambientes formais e não-formais, escolares e não-escolares, e em todos os espaços

em que se desenvolva o trabalho educativo.

Sintetizando, podemos afirmar que o conjunto dessas políticas materializadas nas

normatizações e nos referenciais dá contorno à reforma do ensino superior no

campo da formação de professores, feita às avessas, à revelia e à margem do

movimento dos educadores, das IES, e dos cursos de formação, como parte da

reforma mais geral do ensino superior e da reforma do Estado, desencadeada pelo

atual governo.

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No que tange às concepções de formação, assistimos ao retorno da concepção

tecnicista do educador (neotecnicismo), tal como anunciado por Freitas (1992), com

ênfase nos aspectos pragmatistas da formação. A opção por esse modelo de

formação atende aos princípios de flexibilidade, eficiência e produtividade dos

sistemas de ensino, negando toda a trajetória do movimento dos educadores em sua

luta pela melhoria das condições de sua formação profissional, retirando das

faculdades/centros de educação a experiência construída historicamente de

formação de professores e de produção de conhecimento na área educacional,

sobre a escola, o ensino e o trabalho pedagógico em suas múltiplas dimensões.

Portanto, reafirmar as formulações e concepções históricas do movimento passa a

ser uma exigência, para os educadores, na discussão das diretrizes curriculares, nas

reformulações curriculares e na organização de novos cursos de formação, de forma

que possam constituir-se em norte para as ações no campo da formação dos

profissionais da educação.

A concepção de formação e a base comum nacional

A questão da formação do educador sempre foi examinada pela Anfope de forma

contextualizada, por entendê-la

inserida na crise educacional brasileira, que por sua vez constitui uma das facetas

de uma problemática mais ampla, expressão das condições econômicas, políticas e

sociais que configuram uma sociedade profundamente desigual e injusta que vem

esmagando a grande maioria da população e relegando-a a uma situação de

exploração e miséria.13

Há hoje uma consciência generalizada de que a formação de professores é um

desafio relacionado com o futuro da educação básica, esta, por sua vez,

intimamente vinculada com o futuro de nosso povo e a formação de nossas

crianças, jovens e adultos. No entanto, as perspectivas de que essa formação ocorra

em bases teoricamente sólidas e fundada nos princípios de uma formação de

qualidade e relevância social são cada vez mais remotas, no quadro das políticas

educacionais implementadas.

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A redução dos recursos públicos para a educação pública, o asfixiamento das

universidades públicas, a trágica realidade da escola pública – exposta no

documento "Retrato da Escola"14, elaborado pela CNTE – vão evidenciando a

impossibilidade de resolução desses problemas nos marcos das relações sociais

vigentes. A consciência dessa situação por parte dos educadores exige o

desvelamento dos reais fundamentos das propostas de formação de professores em

curso em nosso país. Assumir com radicalidade as propostas de profissionalização

do magistério, dando-lhes o conteúdo que o movimento dos educadores vem

construindo ao longo de sua história, este parece ser o desafio atual.

Nesse contexto, é importante explicitar as contradições presentes nas propostas

oficiais, aprofundando a discussão de uma política nacional global de formação dos

profissionais para a educação. A luta pela igualdade das condições de formação,

que se configura como um direito dos sujeitos e um dever do Estado, está em

contradição com as – e em oposição frontal às – políticas atuais que propugnam a

igualdade de oportunidades ou eqüidade, que se configura como um dever dos

sujeitos e um direito do Estado.

A igualdade das condições de formação supõe fundamentalmente a possibilidade de

estudos em cursos e instituições que recusem a fragmentação e as dicotomias entre

a formação de professores e os demais profissionais da educação, rejeitando,

portanto, as propostas atuais que reforçam o aligeiramento no conteúdo e no tempo

da formação. A definição das bases da formação no contexto de uma política global

de formação ganha, nesse contexto, importância crucial, como forma de expressar

as diferentes concepções de educação e de educador que estão em debate nas

circunstâncias atuais. Esta tem sido a preocupação central da Anfope na última

década, período em que as reformas neoliberais causaram impacto de forma mais

direta na educação, na escola pública e na formação de professores.

Na definição dessa política devem se articular a formação inicial com a formação

continuada e as condições de trabalho e salários dignos e justos, entendendo que a

"implantação de uma política de formação inicial e continuada deve colocar em

questão a responsabilidade dos estados em relação à mesma, bem como o

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financiamento para sua implementação"15. Paralelamente e em estreita

dependência, entende-se que a profissionalização do educador supõe a valorização

dos profissionais, o que requer condições adequadas para o exercício da profissão,

carreira e o desenvolvimento de uma política salarial unificada. Entende-se ainda a

formação continuada como um direito dos professores e dever do Estado e das

agências contratantes.

Na perspectiva de uma educação crítica e transformadora, deve-se também

reafirmar a concepção sócio-histórica de educador, definida pelo movimento dos

educadores e defendida pela Anfope, concepção de formação do profissional de

caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade de seu tempo, com a

consciência crítica que lhe permita interferir e transformar as condições da escola,

da educação e da sociedade, um

educador que, enquanto profissional do ensino (...) tem a docência como base da

sua identidade profissional, domina o conhecimento específico de sua área,

articulado ao conhecimento pedagógico, em uma perspectiva de totalidade do

conhecimento socialmente produzido que lhe permita perceber as relações

existentes entre as atividades educacionais e a totalidade das relações sociais,

econômicas, políticas e culturais em que o processo educacional ocorre, sendo

capaz de atuar como agente de transformação da realidade em que se insere.

(Conarcfe 1989)

É essa concepção, reafirmada e aprimorada ao longo da trajetória de construção

coletiva dos educadores, que tem orientado estudos que foram dando forma e

conteúdo às idéias, proposições e propostas de reestruturação curricular,

particularmente nos cursos de pedagogia de numerosas instituições em nosso

país,16 em resposta aos ideais dos educadores na luta pela democratização da

escola, da educação, pela valorização e profissionalização do magistério.

A produção teórica do movimento dos educadores evidencia concepções avançadas

sobre a formação do educador, não apenas por destacar seu caráter sócio-histórico,

mas principalmente por contribuir com a construção de propostas de superação das

dicotomias presentes na formação de professores e dos especialistas, entre

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bacharelados e licenciaturas e entre pedagogia e demais licenciaturas. Esta é uma

exigência dada pela democratização das relações entre os sujeitos no trabalho

pedagógico e na construção de novos projetos coletivos. A explicitação da dimensão

social da educação e da escola torna evidência a estreita vinculação entre a forma

de organização da escola na sociedade capitalista e a formação do educador, fato

que coloca em oposição os projetos conservadores da sociedade atual e o projeto

histórico que busca a superação do capitalismo e anuncia a concepção de futuro da

humanidade que pretendemos.

Essas concepções encontraram sua forma mais elevada na elaboração da base

comum nacional que vem sendo construída cotidiana e coletivamente nas propostas

concretas de organização curricular nas diferentes IES de nosso país, articulando a

unidade dos educadores em torno de princípios norteadores da formação.

O conteúdo da formulação da base comum nacional é um instrumento de luta e

resistência contra a degradação da profissão do magistério, permitindo a

organização e reivindicação de políticas de profissionalização que garantam a

igualdade de condições de formação. É ainda um elemento unificador da profissão,

ao defender que a docência é a base da formação de todos os profissionais da

educação, pois permite assumir com radicalidade, ainda hoje, nas condições postas

para a formação de professores, a formulação de Saviani (1982): formar o professor

e o especialista no educador.

A idéia de base comum nacional, que se originou no I Encontro Nacional, realizado

em 1983, em contraposição à idéia de formação do pedagogo generalista, contém

um conjunto de princípios norteadores que vêm sendo construídos, retomados,

ressignificados na trajetória da entidade e na construção prática das transformações

curriculares que se desenvolvem nas diferentes IES. Princípios que são orientadores

do exame, da análise e das propostas de estrutura e organização curricular e

institucional dos cursos de formação de profissionais da educação, os quais podem

ser assim sistematizados:

a) sólida formação teórica e interdisciplinar sobre o fenômeno educacional e seus

fundamentos históricos, políticos e sociais, bem como o domínio dos conteúdos

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específicos a serem transmitidos pela escola, que permita a apropriação do

processo de trabalho pedagógico;

b) unidade teoria/prática que implica assumir uma postura em relação à produção de

conhecimento que impregne a organização curricular dos cursos; tomar o trabalho

como princípio educativo na formação profissional, revendo-se os estágios e sua

relação com a rede pública e a forma de organização do trabalho docente na escola;

e ênfase na pesquisa como meio de produção de conhecimento e intervenção na

prática social;

c) gestão democrática como instrumento de luta contra a gestão autoritária na

escola, entendida como superação do conhecimento de administração enquanto

técnica, a fim de apreender o significado social das relações de poder que se

reproduzem no cotidiano da escola, nas relações entre os profissionais, entre estes

e os alunos, assim como na concepção e elaboração dos conteúdos curriculares;

d) compromisso social e político do profissional da educação, com ênfase na

concepção sócio-histórica de educador, estimulando a análise política da educação

e das lutas históricas dos profissionais professores articuladas com os movimentos

sociais;

e) trabalho coletivo e interdisciplinar entre alunos e entre professores como eixo

norteador do trabalho docente na universidade e da redefinição da organização

curricular; a vivência e a significação dessa forma de trabalho e da produção de

conhecimento permitem a apreensão dos elementos do trabalho pedagógico na

escola e das formas de construção do projeto pedagógico-curricular de

responsabilidade do coletivo escolar;

f) formação inicial articulada à formação continuada, assegurando solidez teórico-

prática na formação inicial e diálogo permanente entre o locus de formação inicial e

o mundo do trabalho, por intermédio de programas e projetos de educação

continuada, correspondendo à concepção de uma formação em redes de

conhecimento e saberes, incluindo os programas de pós-graduação (Anfope 1998)17.

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Esses princípios orientadores, construídos e reafirmados a cada Encontro Nacional,

configuram-se também instrumento de análise e discussão das políticas atuais no

campo da formação de professores. Eles têm orientado a atuação dos educadores

nas últimas décadas e nos últimos dois anos vêm referenciando o movimento e as

discussões, em nível nacional, das diretrizes curriculares para os cursos de

formação dos profissionais da educação.

As diretrizes curriculares e a escola única de formação: Uma proposta em construção

O processo de elaboração das diretrizes curriculares para os cursos de graduação,

desencadeado pelo MEC e pelo CNE em 1997, insere-se no processo de "ajuste"

das universidades às novas exigências dos organismos internacionais, em particular

do Banco Mundial e do FMI,18 e visa adequar a formação de profissionais ao

atendimento das demandas de um mercado globalizado. No campo da formação de

professores, o processo de elaboração das diretrizes expressa as contradições

presentes nas discussões atuais, trazendo à tona os dilemas e as dicotomias no

processo de formação: professor x generalista, professor x especialista e

especialista x generalista19.

Coerente com as formulações históricas da entidade, a Anfope reafirma em seu

documento que propõe as diretrizes para os cursos de formação dos profissionais da

educação, as universidades e suas faculdades/centros de educação como o locus

privilegiado da formação dos profissionais da educação para atuação na educação

básica e no Ensino Superior. Nessa discussão, vem dando ênfase a duas questões

fundamentais: a) a necessidade de repensar as estruturas das faculdades/centros

de educação e a organização dos cursos de formação em seu interior, e b) a

necessidade de superar a fragmentação entre as habilitações no curso de

pedagogia e a dicotomia entre a formação dos pedagogos e dos demais licenciados.

A decisão de formular diretrizes exclusivamente para formação de professores20, em

separado da elaboração das diretrizes para o curso de pedagogia, retirando do

debate a formação dos profissionais da educação não é uma questão menor; pelo

contrário, é uma questão do conteúdo da formação, que envolve concepções de

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escola, educação, sociedade e educador que assumimos e que fundamentam e

informam as propostas de organização curricular e institucional no campo da

formação.

Entendidas como elementos norteadores gerais das organizações curriculares, por

conta da flexibilidade que propugnam, as diretrizes podem apontar e reforçar o

aligeiramento, colocando em risco a sólida formação teórica no campo de

conhecimento específico, necessária para a formação científica e crítica dos

profissionais. Contraditoriamente, abrem a possibilidade da construção de novas

alternativas no campo institucional e acadêmico nas instituições de ensino superior.

No meio dessas contradições, cabe ao movimento dos educadores dar conteúdo e

forma a esse debate, redirecionando-o para o resgate das concepções presentes

hoje nas diretrizes para o curso de pedagogia e em grande parte dos cursos de

pedagogia, socializando-as para o conjunto dos cursos de formação.

As políticas atuais, que reforçam o aligeiramento e o caráter pragmático e

conteudista da formação e da profissionalização do magistério, exigem a

socialização de propostas de organização curricular para os cursos de formação dos

profissionais da educação. É com esse objetivo que a Anfope resgata a idéia de

escola única de formação, formulada por essa mesma associação em 199221 e

aprofundada no IX Encontro Nacional, em 98.

Essa proposta de escola única de formação – única porque o conteúdo da formação

é articulado e comum a todos os profissionais da educação para todos os níveis (e

não como modelo único de formação ou como local específico de formação) – é uma

das muitas possibilidades na direção de concretizar alternativas às formas atuais de

estrutura dos cursos de formação. Acreditamos ser necessário continuar defendendo

a multiplicidade de experiências em termos de organização curricular dos cursos de

formação, que sejam acompanhadas em seu desenvolvimento, socializadas e

debatidas amplamente pela comunidade da área. Esse parece ser um bom caminho,

em oposição ao modelo único de formação, para a construção de caminhos

alternativos à formação de professores/profissionais da educação, com vistas ao

aprimoramento da educação e da escola públicas em nosso país.

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Do ponto de vista da Anfope, deve ser entendida como uma das propostas

possíveis, resultante de um esforço coletivo, e proposta geradora de reflexões a

serem ampliadas. Como já se apontava em 1992, ela traz, em si, elementos teóricos

de grande complexidade e busca dar forma e estrutura ao conteúdo acumulado nas

reflexões e experiências coletivas. No entanto, entendemos também que, como uma

das propostas possíveis, deve ser estudada tanto na perspectiva de uma proposta

futura, quanto na perspectiva de uma proposta em construção.

Nas circunstâncias atuais, em que a proposta dos Institutos Superiores de Educação

e do Curso Normal Superior marca uma reforma universitária imposta no campo da

formação, é possível e mesmo desejável que diferentes propostas de organização

curricular, oriundas de iniciativas individuais, de entidades ou instituições, possam

ser amplamente divulgadas e socializadas, para que possam constituir-se em

referência para o movimento dos educadores que, em cada instituição, poderá

construir caminhos alternativos fundados em concepções de educação, educador e

sociedade explícitas e presentes nos projetos pedagógicos dos cursos de formação.

O papel das faculdades e dos centros de educação

Apesar das deliberações e pareceres que negam a priorização dessas instituições

como responsáveis pela formação, entendemos que as universidades e suas

faculdades/centros de educação constituem-se no locus privilegiado da formação

dos profissionais da educação para atuação na educação básica e no ensino

superior. Entretanto, as exigências cada vez mais presentes no campo da formação

de professores nos colocam também o desafio de repensar as estruturas atuais das

faculdades/centros de educação e a organização dos cursos de formação em seu

interior, no sentido de superar a fragmentação entre as habilitações no curso de

pedagogia e a dicotomia entre a formação dos pedagogos e dos demais licenciados,

considerando-se a docência como a base da formação e da identidade profissional

de todos os profissionais da educação.

As áreas e os âmbitos de atuação das faculdades/centros/departamentos de

educação inserem-se na formação inicial dos profissionais da educação, formação

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em nível de pós-graduação lato e stricto senso e formação continuada, presencial e

a distância.

Na proposta de escola única, as várias instâncias formadoras são articuladas na

faculdade/centro/departamento de educação e concebidas como programas

articulados e supradepartamentais, sendo cada um dos programas, unidades com

responsabilidades de pesquisa, ensino e extensão, articuladas em uma coordenação

colegiada.

Mesmo considerando a universidade como o locus privilegiado para a formação de

professores, não se pode desconhecer, no entanto, a existência de dificuldades

oriundas da estrutura atual que devem ser encaradas como inibidoras e limitadoras

de passos mais avançados na direção de novas estruturas de formação. Entre essas

dificuldades, apontamos algumas que já em 1992 foram destacadas pela Anfope e

que se mantêm, na atualidade, em grande parte das instituições: restrições

orçamentárias que impedem a busca de alternativas criadoras no sentido de romper

as barreiras das diferentes unidades da universidade; distanciamento entre

faculdades/centros de educação e os institutos, tanto de ordem físico-espacial

quanto de objetivos, interesses e intenções no campo da pesquisa, do ensino e da

extensão; falta de recursos humanos para dar conta das responsabilidades

atribuídas às faculdades de educação em relação às licenciaturas; fragmentação e

departamentalização nas próprias faculdades de educação (que ainda não foram

superadas, apesar das possibilidades da LDB); resistências em assumir co-

responsabilidades, levando a uma luta por poder, prestígio e na busca de identidade

entre faculdades e institutos; desprestígio e desvalorização da profissão do

magistério, o que leva os estudantes a optar pelo bacharelado, e só depois pela

licenciatura, impossibilitando a criação de cursos de formação de professores com

propostas pedagógicas próprias; dificuldades em romper a atual estrutura e a carga

didática das disciplinas das licenciaturas, limitadas às psicologias, fundamentos,

didática e práticas de ensino, com algumas inovações no campo de disciplinas de

instrumentalização e projetos.

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Se essas limitações são impeditivas de novas construções curriculares, todos os

esforços deveriam ser direcionados para superá-las. Somente sua superação pode

auxiliar a enfrentar a tentativa de retirada dos cursos de formação de seu interior ou

a criação de novas unidades acadêmicas – Institutos Superiores de Educação – ou

outras instituições, caminhos que certamente aprofundarão e perpetuarão os

problemas já existentes.

Experiências em curso em várias instituições apontam para a superação dos

departamentos como forma organizacional do ensino e da pesquisa no interior das

faculdades de educação, com a criação de núcleos, áreas temáticas ou outras

formas de organização, que alteram significativamente a forma de produção de

conhecimento no interior dos cursos e programas das unidades universitárias.

Repensar tais estruturas também pode ser um caminho interessante para a

construção de novas proposições para a formação de professores.

Os cursos e programas de formação de professores

As faculdades ou centros de educação, em estreita articulação com os

institutos/faculdades/departamentos das áreas específicas e mantendo vinculação

orgânica com os sistemas públicos de ensino, são responsáveis, no interior das IES,

pela construção do projeto pedagógico próprio dos cursos e programas de formação

dos profissionais da educação. Já existem numerosas experiências nesse sentido,

especialmente nas instituições que experienciam os Fóruns de Licenciaturas como

forma de articular e integrar toda a formação de professores da instituição.

A proposta em discussão prevê que os cursos atualmente existentes para atender à

formação inicial para a educação básica – educação infantil, Ensino Fundamental e

Ensino Médio –, à formação continuada e à formação de professores para os cursos

técnicos/profissionalizantes e superior desdobrem-se em programas de formação de

professores, com as seguintes características:

Programa de formação de profissionais para educação básica – curso de pedagogia:

docência das séries iniciais do ensino fundamental – 1a a 4a série e educação

infantil, ou outras modalidades, contemplando as dimensões de gestão e

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organização do trabalho pedagógico escolar e pesquisa, de plena responsabilidade

das faculdades/centros/departamentos de educação;

Programa de formação de profissionais para a educação básica: cursos de

licenciatura para a docência de 5a a 8a série, Ensino Médio, em estreita vinculação e

interface com os institutos das áreas específicas;

Programa de formação de profissionais da educação para gestão e coordenação

pedagógicas na escola básica (esse programa, presente no curso de pedagogia,

seria articulado aos cursos/programas de formação de professores das áreas

específicas e aberto a todos os estudantes, que poderiam cursá-lo

concomitantemente ou após a formação específica, dependendo da estrutura

organizacional da instituição formadora);

Programa de formação pedagógica para portadores de diploma de Ensino Superior,

considerando-se a necessária revisão da Resolução 02/97 de modo a ampliar o

mínimo necessário no que tange aos conhecimentos das áreas específicas e

pedagógico-didáticos;

Programas de formação continuada, para profissionais da educação básica;

Programas de educação a distância;

Programas de formação em educação sindical, educação especial, educação de

jovens e adultos, produção de material didático, novas linguagens, multimídia, entre

muitas outras modalidades que abranjam o campo de atuação do pedagogo, como

ênfases nos demais cursos ou articulados em outra forma, dependendo da

instituição;

Programas de pós-graduação stricto e latu sensu em educação.

Todos esses programas articulam-se entre si, a partir da concepção de base comum

nacional. Com essa organização, abre-se a oportunidade para que certas atividades

sejam vivenciadas conjuntamente por todos os alunos dos programas, inclusive no

nível dos conteúdos formativos das áreas de fundamentos e outros da base comum

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nacional – como os relativos à iniciação à pesquisa, práticas pedagógicas, vivências

e estágios profissionais, gestão e organização do trabalho pedagógico e do trabalho

escolar, por exemplo.

Importante ressaltar também que o corpo docente não é exclusivo de um ou outro

programa, mas é altamente desejável que se movimente entre os programas de

formação inicial e a pós-graduação.

Em cada instituição, as faculdades/centros/departamentos de educação, em parceria

com os institutos/centros/departamentos das áreas específicas, poderão constituir

colegiado próprio, com a participação de professores e estudantes, buscando

incorporar professores da rede pública e entidades sindicais de professores. Esse

colegiado é responsável pela definição da política global de formação nos cursos e

programas de formação dos profissionais da educação. Os atuais Fóruns de

Licenciaturas e Comissões de Graduação dos cursos de pedagogia, onde existirem,

poderiam constituir-se conjuntamente como esse colegiado, responsáveis pela

definição e pela articulação dessa política, buscando articulação também com as

Comissões de Pós-graduação, no que diz respeito à pesquisa e à articulação da

formação de profissionais para o Ensino Superior.

Esse espaço institucional de formação – tenha a denominação de escola única ou

qualquer outra –, desde que incorpore os conteúdos da formação dos atuais cursos

de pedagogia à nova estrutura curricular e organizacional, abre perspectivas

inovadoras para a formação de professores, no interior das IES, baseando-se nas

experiências atualmente existentes – consolidadas e em desenvolvimento – e

constituindo-se como o novo que avança para formas superiores de organização.

As alternativas que se desenham no cenário educacional postas pelo quadro das

atuais políticas para a formação de professores desafiam-nos a pensar propostas

concretas que possam consolidar a base comum nacional em uma perspectiva de

saídas alternativas à atual estrutura dos cursos de formação, em oposição às

propostas atuais dos Institutos Superiores de Educação e do Curso Normal Superior.

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Pensar essas alternativas é colocar em movimento as concepções e práticas que

orientam o pensamento mais avançado no campo da formação de professores,

garantindo as atuais formas e aprimorando-as na busca por uma educação com

bases sólidas voltada para a formação humana.

NOTA: Ao terminar este artigo, tomamos conhecimento do Decreto Presidencial no

3.276 de 6 de dezembro de 1999, regulamentando a formação de professores para

a educação básica, e estabelecendo que a formação de professores para as séries

iniciais e educação infantil se dará exclusivamente nos Cursos Normais Superiores.

Assim, de forma autoritária, violenta, é imposta pelo governo e pelo MEC a reforma

no campo da formação. Vencidos e derrotados na discussão aberta e democrática e

pela construção teórica da área, impõe pela força da lei a discussão vencida. O

medo da derrota, em virtude das pressões dos setores privatistas e dos

compromissos com os ajustes das agendas internacionais, atropelou o próprio CNE,

que vinha discutindo a questão.

Só o tempo e a realidade podem confirmar ou rejeitar a validade de certas idéias.

Nada nem ninguém mais.

Notas

1. Dentre essas medidas anteriores à LDB, destacamos a Portaria das Licenciaturas

(Esquema I), posteriormente transformada em Resolução 02/97 aprovada pelo CNE,

o PL 370 da autonomia universitária, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do

Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), escolha de dirigentes

universitários, Parâmetros Curriculares Nacionais, Sistema de Avaliação da

Educação Básica, Exame Nacional de Cursos, entre outras.

2. Cf. IV Encontro Nacional da Comissão Nacional de Reformulação dos Cursos de

Formação do Educador (Conarcfe) 1989.

3. Cf. Anfope 1994, p. 28.

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4. Cf. Documento "Construindo uma política nacional global de formação dos

profissionais da educação", Anfope, out. de 1997.

5. Esse curso, pensado inicialmente na LDB como parte integrante dos Institutos

Superiores de Educação, recebeu tratamento diferenciado pelo CNE quando a

minuta de Resolução foi devolvida ao Conselho pelo ministro, com a recomendação

de que a sua criação pudesse estar separada da criação dos ISE, podendo,

portanto, existir em qualquer instituição de ensino superior, ou seja, nas

universidades, já que, pelo Parecer 115/99, as faculdades integradas e as

faculdades isoladas com cursos de licenciaturas deverão se transformar em

Institutos Superiores de Educação.

6. Documento distribuído às comissões de especialistas das diferentes áreas

encarregadas de elaborar as diretrizes para as licenciaturas. Guiomar N. Mello,

"Formação inicial de professores para a educação básica: Uma (re)visão radical

(versão preliminar para discussão interna)". São Paulo, out./nov. 99 (Mimeo).

7. Veja-se a proliferação de cursos de formação de professores em 1.600 horas,

com aval dos poderes públicos estaduais.

8. Boletim Anfope no 8, abril 99.

9. Tendo perdido na discussão democrática e aberta com a comunidade da área no

processo de elaboração das diretrizes curriculares, o CNE e o MEC tentam impor

essa concepção de maneira arbitrária e autoritária, como forma de regulamentar a

nova instituição de formação de professores. Infelizmente, encontram guarida em

elaborações teóricas de educadores que, talvez de forma desavisada, sob o manto

do novo, apresentam idéias que reforçam as políticas neoliberais para a escola

pública. Essas idéias estão presentes na produção teórica de alguns estudiosos da

área da Didática. Cf. Libâneo e Pimenta 1999 (voto em separado).

10. Estudos recentes na área da administração e supervisão educacional reafirmam

a docência como base da formação desses profissionais. Ver especialmente Ferreira

1999.

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11. A concepção que orienta a separação da formação de professores da formação

dos especialistas manifesta no Parecer 970 da CES e nas propostas atuais é a

mesma – guardadas as devidas especificidades e nomenclaturas – que orientou, na

década de 1970, a concepção de Valnir Chagas, deslocando a formação dos

especialistas para a pós-graduação e deixando o curso de pedagogia

exclusivamente para formação de professores.

12. Para recuperar a história real de constituição dos cursos de pedagogia, é preciso

que nos remetamos também às experiências dos cursos nas diversas IES,

reconhecidos como experiências inovadoras no campo da formação. A sua história e

as reformulações ocorridas nos anos 80 e 90 confundem-se, de forma positiva e

significativa, com as lutas do movimento dos educadores pela sólida formação dos

profissionais da educação, entendidos aqui os pedagogos e os licenciados, pela

democratização da sociedade e pela valorização da educação e da escola públicas.

13. Cf. Anfope, Documento Final VI Encontro Nacional, Belo Horizonte, 1992.

14. Documento-pesquisa da Confederação Nacional dos Trabalhadores da

Educação. Entregue ao MEC em 6/11/1999, na Marcha em defesa da escola e da

educação públicas.

15. Ver Anfope Regional Sudeste/Estadual RJ, Textos-base 1998.

16. As proposições e os princípios da Anfope e o reconhecimento à contribuição que

a entidade e os educadores vêm dando a essa temática podem ser constatados pela

referência a ela no documento dos Pró-Reitores de Graduação, de maio de 1996.

17. Cf. Anfope, Documento Final IX Encontro Nacional, Campinas, 1998.

18. O trabalho de Celi Z Taffarel, "Diretrizes curriculares e plano nacional de

graduação: Do ataque às consciências ao amoldamento subjetivo", Recife, 1999,

mimeo, apresentado no IV Encontro Nacional de Formação dos Profissionais da

Educação, traz uma análise detalhada sobre a inserção do processo de elaboração

das diretrizes curriculares no quadro das novas demandas do processo de

globalização.

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19. O próprio MEC constituiu a Comissão de Especialistas de Pedagogia e somente

tempos depois constituiu o GT Licenciaturas, separado dos bacharelados.

20. Cf. Boletim Anfope nº 11, agosto 1999.

21. Essa proposta surge das contribuições da professora Marlene Ribeiro,

posteriormente detalhadas em seu artigo "Formação unificada do profissional de

ensino: Uma proposta da Faculdade de Educação da Universidade do Amazonas".

Em Aberto nº 54, 1992.

The reform of superior teaching in the field of professionals ubbringing of

basic education: The educational policies and the teachers movement

ABSTRACT: This work presents the discussion that have oriented the debate about

the formation of educational professionals, recuperating the trajectory of the

movement of the educators in the struggle for transformation and professionalization

of teaching as represented actually by the National Association for the Professional

Educators Formation (Anfope), during the last 20 years. The collective construction

of common national base in opposition to the formation policies and the proposal of a

single school of formation which materializes Anfope's principles for the

reorganization of the courses of education professional formation in the universities,

have oriented the actual debate of resistence to the official policies that propugnes

hastening and fragmentation in the professional teaching formation.

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Documentos complementares

ANFOPE. "Posição na audiência pública, convocada pelo CNE, sobre formação dos profissionais da educação. Brasília, 1998, (Mimeo).

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_______. "Diretrizes curriculares para os cursos de formação dos profissionais da educação". Reunião anual da ANPEd, 1998, (Mimeo).

ANFOPE REGIONAL SUL. "Conclusões do Encontro Regional e Estadual." Rio de Janeiro, 1998, (Mimeo).

ANFOPE REGIONAL SUDESTE/ESTADUAL RJ. "Conclusões do Encontro Regional e Estadual. Rio de Janeiro, 1998, (Mimeo).

* Professora da Faculdade de Educação, Unicamp e presidente da Associação

Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (Anfope). Email:

[email protected]

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Interface - Comunicação, Saúde, Educação Print version ISSN 1414-3283 Interface (Botucatu) vol.6 no.10 Botucatu Feb. 2002 doi: 10.1590/S1414-32832002000100005

ARTIGOS

Professores de Ensino Superior da área da Saúde e sua prática pedagógica

Maria Eugênia Castanho Professora da Faculdade de Educação, Pontifícia Universidade Católica de Campinas/Puccamp.

<[email protected]>

RESUMO

A pesquisa ouviu professores do ensino superior da área de Saúde sobre sua

prática pedagógica cotidiana, visando encontrar eventuais marcas distintivas de sua

docência. Usando a metodologia da história oral temática, foram entrevistados onze

professores/coordenadores/diretores. As entrevistas foram gravadas e

posteriormente transcritas, conferidas, textualizadas e transcriadas. Os resultados

foram divididos em três blocos: sobre tornar-se professor e sobre professores

marcantes; sobre técnicas de ensino; e sobre a função de coordenador/diretor. As

conclusões, também agrupadas nos três blocos de categorias dos quais foram

inferidas algumas considerações finais, revelaram-se promissoras para que se

pense a formação inicial e continuada dos profissionais da área da Saúde com

relação à docência universitária.

Palavras-chave: Ensino superior; Educação em Saúde; prática profissional.

ABSTRACT

For this study, we heard university level professors on the subject of their daily

pedagogical practices, with a view to finding possible distinctive features in their

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teaching. Relying of the thematic oral history methodology, we interviewed eleven

professors, coordinators and directors. The interviews were taped and later

transcribed, checked, converted into running text and re-written. The results were

split into three blocks: on becoming a teacher and on remarkable teachers; on

teaching strategies; and on coordinators and directors' duties. The conclusions, also

grouped into the three blocks, from which we drew some final inferences, proved to

be promising in relation to thinking about initial training and the continued education

of professionals from the healthcare area, in connection with the field of university

level teaching.

Key words: Higher education; healthcare education; professional practice.

RESUMEN

La pesquisa escuchó profesores de enseñanza superior del área de salud sobre su

práctica pedagógica, con el objetivo de encontrar eventuales marcas distintivas de

su docencia. Usando la metodología de la historia oral temática, fueron entrevistados

once profesores/coordinadores/directores a través de grabaciones, posteriormente

transcritas, conferidas, textualizadas y transcreadas. Los resultados fueron divididos

en tres bloques, a saber: sobre hacerse profesor y sobre profesores sobresalientes;

sobre técnicas de enseñanza y sobre la función de coordinador/director. Las

conclusiones, también agrupadas en los tres bloques de categorías de los cuales

fueron inferidas algunas consideraciones finales, se revelaron promisorias para que

se piense la formación inicial y continuada de los profesionales del área de salud con

relación a la docencia universitaria.

Palabras clave: Enseñanza superior, educación en área de salud; práctica

pedagógica.

Introdução

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O presente estudo procura resgatar princípios relevantes para pensar o atual ensino

na Área de Saúde e para pensar a formação de professores, trabalhando com a

história oral temática de vida de professores da área da Saúde. Esses exercem a

docência em uma institução de ensino superior de São Paulo e também atuam como

coordenadores de curso e/ou diretores de unidade acadêmica.

A história oral temática ainda é um campo metodológico bastante incipiente na

investigação educacional entre nós, diferentemente do que ocorre em outros países,

especialmente europeus, que apresentam ampla produção investigativa em torno do

tema nas áreas de Psicologia, Sociologia e Ciências da Educação (Montenegro,

1994; Nóvoa, 1995; Kramer et al., 1996). A introdução dessa metodologia no Brasil

deu-se na década de setenta, mas só nos anos noventa experimentou expansão

significativa. A multiplicação de encontros e a inclusão em programas de pós-

graduação de cursos sobre história oral mostram a vitalidade e o dinamismo da área

(Ferreira & Amado, 1996). Além disso, a bibliografia atual mostra as possibilidades

de incorporação da história oral nas investigações sobre educação (Bogdan &

Biklen, 1997).

As histórias orais temáticas têm cruzado várias disciplinas e recorrido a vários

enquadramentos conceituais e metodológicos. Como apontou Nóvoa (1995, p.19)

esse tipo de estudo deve "enriquecer-se em termos da ação, caminhando no sentido

de uma integração teórica que traduza toda a complexidade das práticas". As vidas

de professores podem revelar muito sobre os percursos profissionais, sobre a

ligação entre o pessoal e o profissional, os meandros do ato de ensinar (Nóvoa,

1995).

A finalidade da pesquisa assim orientada não é detectar particularismos, mas

representações dotadas de generalidade:

Estaremos percorrendo representações de caráter universal, onde o ser próprio

encontra-se em movimento e em relação com determinações específicas; onde a

própria razão de ser se define por algo particular e próprio de aspectos específicos

da formação social sem, no entanto, perder seu elo, sua relação com planos

gerais/universais (....) O tempo histórico não é o tempo vivido. A história escrita,

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documentada, distingue-se do acontecido; é uma representação. E nesse hiato entre

o vivido e o narrado localiza-se o fazer próprio do historiador. (Montenegro, 1994,

p.10)

A identidade do professor não é um dado adquirido, mas um lugar de lutas e

conflitos, um espaço de construção de maneiras de ser e estar na profissão. A

maneira como cada um de nós ensina está dependente daquilo que somos como

indivíduos quando exercemos o ensino (Kramer & Souza, 1996).

A inovação pedagógica como contexto

Talvez a palavra mais usada hoje no cenário educacional seja inovação. Palavra

polissêmica, usada em discursos conservadores e progressistas, inovação pode

referir-se tanto a mudanças periféricas quanto a mudanças profundas nas estruturas

do ensino.

Inovação pode ser entendida como processo planejado de desenvolver uma

mudança no sistema, cujas possibilidades de ocorrer com freqüência são poucas,

mas cujos efeitos representam um real aperfeiçoamento (Goldberg, 1995). Isso

implica rejeitar a idéia de que o conceito possa ser identificado apenas com

mudança (qualquer mudança). Mudança inovadora (introduzir alguma novidade),

mudança progressiva (mudança que implica progresso e aperfeiçoamento: relações

entre renovação e aperfeiçoamento), mudança planejada (não ser esporádica) e

processo de mudança (seqüência de etapas de novas práticas).

Goldberg (1995) considera que a renovação do sistema deve ser um processo

(contínuo e duradouro), mas que precisa ser mais que isso. Distingue entre mudança

e inovação, esta última sendo algo mais deliberado, intencional e planificado e não

algo que ocorre espontaneamente. Analisa várias conceituações mostrando que,

enfim, há diferentes possibilidades de alterar práticas dentro (e apesar) do sistema

sócio-econômico e político vigente. O que interessa é discutir a possibilidade de

inovação em ambientes acadêmicos específicos.

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Cunha (1998), numa pesquisa sobre inovação em Educação, analisou as práticas

dos professores e evidenciou que esta aparece em novas formas de conceber as

relações entre professor-aluno; teoria-prática; ensino-pesquisa; organização do

trabalho em sala de aula; concepção de conhecimento; formas de avaliação;

inserção no plano político-social mais amplo; interdisciplinaridade.

Veiga et al. (2000) encontraram características inovadoras nas atividades de ensino,

pesquisa e aprendizagem, assim sintetizadas: estão em movimento constante,

desenvolvimento histórico e ininterrupto; instigam e propiciam o descobrimento;

trabalham com múltiplas tensões presentes na auto-atividade do aluno; favorecem a

relação horizontal professor-aluno, permitindo atendimento à singularidade de cada

aluno, evitando a homogeneização; asseguram a relação ensino-pesquisa com o

trabalho como princípio educativo; são atividades coletivas permeadas por

intencionalidade; atribuem à pesquisa importante espaço de mediação entre ensinar

e aprender.

Tanto as características apontadas por Cunha (1998) quanto as descritas por Veiga

et al. (2000) revelam concepções diferentes das tradicionais, apontando para uma

nova forma de ver o conhecimento, a formação profissional e o ensino na

universidade.

A pesquisa

Tendo como contexto a discussão sobre inovação, qualidade e reformulação do

ensino, foram realizadas onze entrevistas com professores das áreas de Saúde,

sendo sete professores/coordenadores de curso e quatro professores/diretores de

unidade acadêmica: Diretor da Faculdade de Odontologia; Diretor da Faculdade de

Ciências Médicas; Diretora da Faculdade de Enfermagem; Diretor do Instituto de

Ciências Biológicas e Química; Coordenador do Curso de Odontologia;

Coordenadora do Curso de Medicina; Coordenadora do Curso de Nutrição;

Coordenadora do Curso de Ciências Farmacêuticas; Coordenador do Curso de

Fisioterapia; Coordenadora do Curso de Terapia Ocupacional; Coordenadora do

Curso de Ciências Biológicas.

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Do total de onze entrevistados, oito são nascidos na década de cinqüenta e três na

década de quarenta. Nove estudaram em escolas públicas nos estudos anteriores à

universidade, cinco exclusivamente em escola pública e quatro em instituição pública

e particular. Dois cursaram só escolas particulares. Quatro são de Campinas, dois

da cidade de São Paulo, dois de outras cidades do interior do Estado de São Paulo,

dois de outros Estados (Rio de Janeiro e Minas Gerais) e um de outro país

(Panamá). Do total, cinco estudaram na Pontifícia Universidade Católica de

Campinas/PUCCAMP, quatro na Universidade de São Paulo/USP, um na

Universidade Estadual de Campinas/UNICAMP e um na Universidade Federal do

Rio de Janeiro/UFRJ. Quanto à titulação há um pós-doutor, dois doutores, três

mestres, dois mestrandos, dois especialistas e um com apenas graduação.

Os colaboradores receberam previamente uma folha contendo questões sobre seu

ensino a fim de que refletissem sobre o foco que seria desenvolvido na entrevista.

Em seguida, foram entrevistados pela autora, com a presença de uma bolsista PIBIC

(Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica). As perguntas foram

centradas em torno de algumas categorias básicas, ressaltando que, por categoria

entende-se um conceito-chave na estrutura significativa de um texto, um conceito do

qual dependem ou ao qual se subordinam outros conceitos.

O que significa ser professor no ensino superior na área da Saúde? Como os

sujeitos se tornam professores, já que em sua graduação não há, geralmente,

disciplinas pedagógicas? Qual a influência de professores marcantes na trajetória

profissional? O que estão fazendo como professores e como coordenadores e/ou

diretores? O que se usa em termos de técnicas para ensinar? Como pensar a

formação de profissionais para o mundo de hoje?

As histórias, textualizadas e transcriadas (Bom Meihy, 1998) revelaram toda a

complexidade do que é ser professor na área de Saúde e, ao mesmo tempo,

apontaram o que se faz no interior das respectivas aulas, especialmente quanto a

técnicas de ensino.

Encontramos na vida dos entrevistados diferenças e semelhanças. Essas diferenças

e semelhanças referem-se tanto à entrada para o campo da educação e ao percurso

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profissional quanto às opiniões que emitiram com relação ao ensino e à

aprendizagem.

As questões apresentadas nas entrevistas foram agrupadas em três grandes blocos,

que passam a ser analisados.

Sobre tornar-se professor e sobre professores marcantes

Para a maior parte dos entrevistados, tornar-se professor não foi a opção inicial.

Alguns, no entanto, exerceram a monitoria com vistas à carreira acadêmica. Vários

relatam que iniciaram a docência por necessidade financeira, por estar

desempregado etc. Alguns deram aulas em cursinhos preparatórios ao vestibular,

como início de carreira. Há uma colaboradora que afirma ter sido monitora, mas que

o fato não foi determinante para o ingresso na docência.

Também aparece com freqüência a afirmação de que "virou professor de uma hora

para outra", embora uma colaboradora tivesse se dedicado pacientemente a

descrever que as coisas não se passam assim, envolvendo uma lenta e progressiva

construção.

A monitoria aparece geralmente como um degrau (o primeiro) para a docência;

inclusive um entrevistado afirmou que não fez monitoria porque não pretendia ser

professor e que hoje, como coordenador, orienta seus alunos para esta atividade

quando o interesse é por docência.

Aparece também uma causa interessante para explicar o tornar-se professor na área

da Saúde: a influência familiar. Houve um entrevistado que apontou de início esse

fator, falou de professores marcantes e voltou para a família como a grande variável

e maior influência para sua docência. Houve também o caso de um diretor que

afirmou várias vezes não ter tido qualquer preparo para dar aulas. Mas acabou por

deixar claro, com minúcias, o quanto a avó professora o influenciou e também as

freiras em cujas escolas trabalhou lecionando, ainda estudante. O que fica evidente

é que não houve preparo sistemático, intencional, mas assistemático, como

elemento da cultura que formou o contexto no qual se inseriu.

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Vários entrevistados fazem questão de realçar os cursos de formação continuada e

outros eventos na área, oferecidos pela instituição, inclusive o mestrado em

Educação, que representa contribuição significativa para a práxis pedagógica.

Dignas de registro são as considerações sobre professores marcantes. Há uma lista

bastante grande de características nos professores apontados como marcantes. Um

colaborador, por exemplo, fala de um professor que marcou como "o bom professor"

e outro como o "mau professor". E o que esteve sempre muito claro foi que

procuraria seguir o exemplo do bom professor e jamais incorrer no comportamento

do mau professor. Uma colaboradora recorda-se da professora que esteve atenta a

questões fora da alçada da sala de aula, referentes à formação emocional dos

alunos, e que, apesar de "humana" era enérgica no ensino. A entrevistada procura

repetir o modelo com seus alunos.

São considerados marcantes: professores que "passavam" o conhecimento mas

também davam "dicas" ao aluno que iam além da questão técnica, formando

"profissionais inteiros" e não apenas técnicos; professor com experiência e

disponibilidade, ensinando o verdadeiro sentido do aprendizado médico-paciente;

professor que desenvolveu o hábito de estudar, de procurar, mostrando a

responsabilidade pela educação continuada; professor com postura "perfeita" sobre

a relação médico-paciente - "sob seus conselhos", os grandes princípios foram

aprendidos a partir da análise de casuísticas, muito mais do que o currículo oficial

exigia. Professora que marcou pelo modo de dar aula, de fazer a parte prática, o

conhecimento que tinha e que transmitia; professor que era um "espelho de bom

profissional", bom professor, pessoa competente; professor marcante pela atitude de

educador, não ensinando apenas a matéria. Marcou por ensinar a postura

necessária dentro da vida a qualquer momento. Também a postura física influencia:

professora muito elegante, com amor pela matéria que ensinava, "explicava o

assunto como se fosse a única coisa bonita que existia no mundo".

Apesar da grande diversidade de características, podem ser ressaltados dois pontos

que permeiam todas as lembranças: os professores que marcaram a trajetória de

nossos colaboradores eram competentes no domínio da matéria a ser ensinada e

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aqueles que apresentavam uma postura que extrapolava o próprio domínio

específico do conhecimento.

Em resumo, no professor marcante, o profissional e o humano estiveram

irremediavelmente entrelaçados. O bom professor é entendido como o educador

atento à personalidade complexa do educando, dados que confirmam estudo

anterior desenvolvido por Cunha (1989).

Sobre técnicas de ensino

Podemos dizer que as técnicas utilizadas na área da Saúde baseiam-se, de modo

geral, em dois grandes modelos: o das aulas teóricas, em sala de aula, com grande

número de alunos presentes, e o das aulas práticas, nos laboratórios, nos

ambulatórios, nos mais variados ambientes onde se desenvolvem os estágios e

atividades práticas em geral. Esta parte prática exige uma grande carga horária e,

segundo uma entrevistada, corresponde à parcela maior de seu curso.

Nas aulas teóricas são usadas aulas expositivas, em vários casos com o apoio de

retroprojeção, projeção de slides, apresentação de esquemas e afins. Também a

lousa (para fazer desenhos ilustrativos do que está sendo ensinado) é utilizada.

Dificilmente são empregadas técnicas de trabalhos em grupo nas classes com

número grande de alunos.

Diz um outro entrevistado, que a aula é "o lugar onde o aluno faz correlações" e que

"a atitude docente deve ser no sentido de permitir que tais correlações sejam feitas".

Também é afirmado que o professor deve ser "um agente para despertar

curiosidade". Considera-se que faz diferença usar uma técnica ou outra, mas que o

emprego diferencial depende mais do número de alunos do que da estratégia

docente. Nas falas dos entrevistados, "a aula expositiva é usada para turmas

grandes", "se os alunos provêm de um bom colegial, a maioria das aulas é

expositiva e se provêm de um colegial mais deficitário, se o perfil do aluno é

diferente, se o aluno trabalha, a leitura é feita em sala de aula e é indicado um livro

texto básico".

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Um entrevistado mostrou a relação íntima que vê entre técnicas de ensino, processo

educativo e avaliação, enfatizando que quer mudar seus mecanismos de verificação

da aprendizagem. Poucos entrevistados falaram da importância do ensino com

pesquisa (proposta discutida por Paoli, 1991; Cunha, 1992 e 1995). Também foi

apontado que a prática deve estar presente desde o primeiro ano dos estudos

superiores.

A aula expositiva com retroprojeção para "apoiar o professor" é usada com relativa

freqüência. Vários entrevistados usavam apostilas próprias para seu ensino e

aboliram-nas por considerarem importante que o aluno vá aos livros. Alguns

disseram que "a recente avaliação institucional que ouviu os alunos" apontou que há

pouca indicação de leituras extra-classe. Estão "corrigindo isso", segundo seu

depoimento.

Foi possível notar muita abertura e sinceridade de parte dos entrevistados. Um deles

chegou a afirmar que "sofre-se por não ter didática, estar diante do aluno e não ter

didática". Também preocupam-se com o simplismo da avaliação que é feita, mas

declaram ter dificuldades teóricas e práticas para alterá-la. Uma entrevistada

declarou que chega a corrigir novecentas provas por bimestre!

A técnica do seminário recebe opiniões opostas: há quem afirme que não a usa

porque nela "não vê qualquer utilidade", "qualquer ponto positivo", e há quem a

utilize. Há, outrossim, formas diferentes de empregá-la. Um colaborador, por

exemplo, afirma que faz o seminário em duplas, que os dois responsáveis devem vir

preparados pois "nunca sabem qual irá falar". Assim, ambos estudam. Não houve

maiores explicações sobre o valor intelectual e pedagógico da técnica. Também foi

apontado que é importante o docente preocupar-se com a integração vertical e

horizontal de sua disciplina na estrutura curricular.

A questão da integração no ensino na área de saúde entre a parte básica e a

profissionalizante apareceu em vários depoimentos. As observações a esse respeito

são bastante variadas: alguns consideram "muito difícil" promover tal integração,

outros enxergam várias alternativas para a implementar, enquanto um colaborador

considera "extremamente simples a solução". Reporta-se ao Hospital Sara

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Kubitschek, em Brasília, onde o estudante, "examinando o paciente na companhia

de seu professor, desce para o subsolo para ver um coração, por exemplo, no

laboratório de Anatomia, se apresentar dúvidas". Avalia que isso pode ser feito sem

maiores problemas, sem necessidade de mudanças curriculares.

Sobre a função de Coordenador/Diretor

Variadas são as ações desenvolvidas ou em implantação em cada unidade e em

cada curso estudado com relação à ação de seus dirigentes. Há um movimento de

revisão ampla do currículo com maior ou menor intensidade, aqui e ali, com

resistências explícitas ou veladas. Há coordenador interessado em que "os docentes

se atualizem", estimulando a educação continuada, incentivando cursarem mestrado

"para formarem-se, não só no aspecto técnico". Há os preocupados em usar o

espaço das reuniões do departamento para discussões pedagógicas, "para

crescimento"; ou, ainda, para rever os planos e ementas, exigindo "pontualidade na

entrega" e pondo o representante de classe para "cobrar" do professor,

conclamando-o para ser o vínculo com a coordenação. Outras questões apontadas:

"elaboração e entrega dos planos de curso", "horário dos professores", "acerto da

situação de alunos do diurno e do noturno". Há também reuniões setoriais para

articular programas afins.

Há coordenador interessado em dar ao curso uma "cara nova", considerando que os

alunos devam ser "nivelados por cima" e que os professores tenham "compromisso

efetivo com seus discípulos". Insiste-se na busca de maior correlação entre teoria e

prática e em aliar o ensino com a pesquisa. Este aspecto, embora presente,

apareceu pouco no conjunto das entrevistas. Também há interesse em

"conscientizar o corpo docente a respeito do papel da educação". Há preocupação

em "mudar muita coisa no estágio", "que é onde está a carga maior". Com relação

ao planejamento, fala-se "em sair do papel para ser efetivado na realidade".

Há posições teóricas mais elaboradas como a do entrevistado que considera o

projeto pedagógico como um empreendimento coletivo, baseado na perspectiva "do

profissional que se quer formar". A preocupação é dar uma boa formação técnica "e

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145

sobretudo formar um bom profissional, com conhecimento, capacidade de reflexão,

de propor coisas, transformar".

Há também o entrevistado que declara ter como preocupação "levar ao

departamento e socializar com os colegas o enfoque ser professor". Procurar

mecanismos para "melhorar a didática dos docentes". Outros apontam, ainda, que é

necessário ao docente ficar no mínimo vinte horas na instituição, ainda que sejam

dez horas assistenciais e dez horas de docência. E, por fim, que é importante o

docente ser titulado e estar sempre envolvido com educação continuada.

Observam-se mudanças "intuitivas", sem fundamentação teórica para melhorar o

ensino, procurando levar o aluno à participação, aos trabalhos em grupo, "quando

possível". Nessa "busca intuitiva" por mudanças, percebe-se hesitação dos sujeitos.

Um deles declarou: "não sei se estou orientando corretamente". Há também, embora

tímida, uma certa preocupação interdisciplinar por parte de um ou outro docente,

com o planejamento de atividades conjuntas da sua disciplina com outra.

Discussão e desafios

O conjunto de questões que o material oferece é amplo e permite uma série de

considerações de interesse acadêmico e prático.

Com relação ao primeiro bloco de categorias - Sobre tornar-se professor e sobre

professores marcantes - a contribuição mais completa veio de uma entrevistada que

fez questão de frisar que não se "vira" professor de uma hora para outra e que, na

verdade, se constrói o ser professor. Baseando-se nos estudos de Psicologia Social

de Moreno, argumenta que essa construção dá-se basicamente em três fases: role

taking (tomar o papel de um modelo de professor), role playing (brinca-se com o

modelo, pela desenvoltura em dominá-lo) e role creative (cria-se a partir das fases

anteriores). São etapas com duração variada, cada uma delas dependendo de

diversas variáveis como maturidade, conhecimento e aprendizagem, efetivação da

ação. De fato, ser professor é um processo complexo que necessita de tempo. "Um

tempo para refazer identidades, para acomodar inovações, para assimilar

mudanças" (Nóvoa, 1995, p.16).

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No tocante a professores marcantes, pode-se notar que a postura, a atitude de

educador, não ensinando apenas o conteúdo específico, mas, também, atitudes

diante da vida, é o que se destaca como mais forte nos depoimentos. É bem

verdade que também aparecem testemunhos apontando professores muito bons

pelo grau de competência e exigência com que ensinavam suas disciplinas. Mas o

que chama a atenção é que os depoimentos mais fortes referem-se àqueles que,

além de terem um domínio muito grande do específico, têm reservas humanas

admiráveis. O que nos remete aos estudos de Nóvoa (1995, p.15) quando afirma

que "o professor é a pessoa e uma parte importante da pessoa é o professor".

Com relação ao segundo bloco de categorias - Sobre técnicas de ensino - podemos

perceber que várias técnicas são usadas, mas que este não é o ponto realmente

importante, se discutido isoladamente.

Não foi rara, quando se discutiu o tema das técnicas, a menção a questões ligadas

ao currículo. E apareceu, com freqüência, a discussão sobre (des)integração

básico/profissionalizante. Ainda se trata de um ponto não resolvido, embora tenham

sido detectadas várias ações no sentido de encaminhar soluções. Alguns

entrevistados parecem tender a uma formação mais especializada, outros para uma

mais generalista. A referência aos parâmetros curriculares do MEC é freqüente e a

sinalização é para a formação generalista exigida pelos tempos neoliberais. O que

certamente revela uma inversão no que até pouco tempo era indicado: em uma

sociedade em processo de mudança acelerada, a formação generalista parece ser

mais conveniente, pois, teoricamente, leva a uma maior flexibilidade na escala das

ocupações.

Alguns equívocos pedagógicos podem ser notados. Um exemplo é considerar que o

conhecimento é somatória e, sendo assim, os alunos devem ler "muitos livros para

memorizar, para guardar", quando a memorização deve ser compreendida como

subproduto de um trabalho de construção intelectual. Vários entrevistados falam da

importância de ler obras reputadas na área e vêm substituindo as apostilas por

livros. Também nota-se incidência na idéia de que o aluno deva exibir ao professor a

memorização e a reprodução de informações. Inclusive foi dito que "cobrar é entre

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aspas, querer saber o retorno". Também foi observada preocupação com o conceito

estreito de mercado, pensando que "é preciso olhar sempre o que o mercado está

pedindo".

Uma das questões mais sérias de caráter macroestrutural é a reflexão sobre o que o

mercado está pedindo à universidade.

É comum afirmar que o ensino de graduação deve profissionalizar para o mercado.

Não é raro exemplificar-se com o modelo americano. Mas convém lembrar que o

sistema universitário americano tem três grandes modalidades: universidades de

pesquisa, universidades de ensino e colleges ou pós-secundários profissionalizantes

- espaço acadêmico espremido entre o terceiro ano do segundo grau e o mundo

universitário. A função primordial dos colleges é formar mão-de-obra para atender às

exigências operacionais imediatas do mercado, em especial do setor técnico e

produtivo (Ristoff, 1999). Em nosso caso, ao defender a profissionalização, poder-

se-ia falar num reducionismo perigoso de todo o ensino superior, preparando para o

mercado.

Ademais, é sombrio pensar que a educação esteja em função, não da sociedade ou

do interesse público, mas do "mercado", lugar onde se vendem competências e se

compram aptidões.

No terceiro bloco de categorias - Sobre a função de coordenador/diretor - apesar da

diversidade de opiniões e de aspectos considerados, chama a atenção que alguns

têm preocupações mais amplas, reportando-se ao projeto do curso e outros pontos

de caráter macro, enquanto outros vêm se dedicando a questões mais pontuais e

ligadas a aspectos técnicos do processo, de natureza microestrutural, sem conseguir

perceber que ambas as dimensões estivessem articuladas em todos os cursos.

Muitos se reportam aos cursos esporádicos oferecidos pela instituição como

importantes momentos de reflexão e formação pedagógica e também à avaliação

institucional ora em curso como importante momento para dar indicações e

sinalizações sobre o processo de ensino e aprendizagem. Referem-se

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especialmente à indicação de bibliografia complementar, que os alunos dizem ser

deficiente e que procuram corrigir.

Oferecer educação continuada parece ser um dos pontos mais valorizados pelos

entrevistados, tendo os cursos funcionado "como um alento, como se fosse uma luz

que se abria".

Nas entrevistas de nossos colaboradores, a inovação aparece de maneira tênue,

não constituindo marca definidora da prática pedagógica desses docentes. Trata-se

de um desafio a ser vencido no ensino na área de Saúde, ao menos na realidade

investigada.

Podemos afirmar que, mesmo em tempos de racionalização, de uniformização, de

globalização e mercantilização, cada docente continua a produzir no mais íntimo de

si mesmo a sua própria maneira de ser professor. Produção cada vez mais exigente

apontando para a necessária atualização dos saberes ensinados em educação

continuada.

Não podemos prescindir de formação pedagógica para o exercício do magistério

superior. Pelo contrário, é indispensável e urgente a necessidade da discussão de

como introduzir, na formação inicial e continuada dos profissionais da área da Saúde

em nível superior, a competência pedagógica requerida para aulas de qualidade

junto a jovens que buscam o ensino superior, introduzindo inovações que atinjam as

estruturas profundas do ensino.

REFERÊNCIAS

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PAOLI, N.J. Para repensar a universidade e a pós-graduação. Campinas: Ed. da Unicamp, 1985. [ Links ]

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Recebido para publicação em: 22/05/00. Aprovado para publicação em: 07/01/02.

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Revista Brasileira de Educação Médica Print version ISSN 0100-5502 Rev. bras. educ. med. vol.31 no.1 Rio de Janeiro Jan./Apr. 2007 doi: 10.1590/S0100-55022007000100004

PESQUISA

DOCÊNCIA NO ENSINO MÉDICO: por que é tão difícil mudar?

Nilce Maria da Silva Campos Costa

Faculdade de nutrição da Universidade Federal de Goiás, Goiás, Brasil

RESUMO

Apesar do reconhecimento da necessidade de mudanças no ensino médico, a

prática docente tem-se mostrado resistente a modificações. Este trabalho de revisão

identifica os fatores que limitam mudanças na prática docente em Medicina. Entre

eles, ressaltam-se a desvalorização das atividades de ensino e a supremacia da

pesquisa, a falta de identidade profissional docente, a deficiência na formação

pedagógica do professor de Medicina, a resistência docente a mudanças e o

individualismo dos professores universitários. É necessário estimular o

desenvolvimento profissional permanente dos professores de Medicina, como

instrumento de reelaboração e de transformação desta prática.

Palavras-chave: Educação em Saúde; Educação Médica; Docentes de Medicina.

ABSTRACT

Although there is a recognized need for changes in medical teaching, professors

have shown resistance to modifications. This review identifies the factors that limit

changes in the teaching practice in medicine. Among the identified factors we

emphasize the depreciation of the teaching activities and supremacy of research, the

lack of professional identity, the deficient pedagogic education of the medical

teacher, the resistance of the teaching body to changes and the individualism of

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university professors. It is necessary to stimulate permanent professional

development of medicine professors as an instrument of re-creation and

transformation of the teaching practice.

Key-words: Health Education; Education Medical; Faculty, Medical.

INTRODUÇÃO

O ensino superior em saúde, de modo geral, e o ensino médico, em particular, têm

sido, nas últimas décadas, alvos de profundas críticas. Em vários países tem

crescido o questionamento sobre a capacidade dos cursos de Medicina em

cumprirem as finalidades gerais de seus programas, que deveriam ser "desenvolver,

no estudante, o potencial intelectual, a capacidade de análise, julgamento e

avaliação crítica, a habilidade para resolver problemas, o raciocínio crítico, a

abordagem criativa e inquiridora"1 (p. 43).

Na América Latina, na primeira metade do século 20, predominava na formação

médica a influência européia, principalmente da França e da Alemanha2. A partir de

1945, com as novas relações econômicas e culturais estabelecidas no mundo,

houve diminuição da influência européia, passando a haver influência norte-

americana na educação médica, com predominância do modelo flexneriano em

reformas sucessivas do ensino superior em saúde, modelo que continua a ter

hegemonia na formação em saúde até os dias atuais3.

Há muito tanto as reformas curriculares quanto o projeto pedagógico dos cursos de

Medicina têm sido abordados no processo de formação do médico4. Verifica-se uma

preocupação crescente com a modificação da formação médica, ocasionada pela

insatisfação com a realidade existente. Enfatiza-se cada vez mais a necessidade de

um profissional apto a atuar e a contribuir com a sociedade em um contexto de

profundas mudanças, não somente em seu próprio campo profissional, mas também

nos campos político e social4,5.

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Como reação aos questionamentos sobre a formação, observa-se uma retomada

dos estudos e debates sobre a educação médica, com propostas de mudança da

formação4,6-9.

A literatura refere-se com insistência à necessidade de formar um médico capaz de

conduzir, de forma autônoma, seu processo de aprendizagem ao longo da vida

profissional, de adaptar-se e participar das mudanças, com aptidão para raciocinar

criticamente, para analisar sistemática e logicamente os problemas e tomar decisões

fundamentadas em sua própria avaliação. Os documentos apregoam a necessidade

da formação geral e humanística, da responsabilidade do médico perante a

sociedade, da valorização da relação médico-paciente e do dever ético da

profissão10,11,12.

A Comissão Interinstitucional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem) trabalhou

durante a década de 1990 com o Projeto Cinaem, desenvolvido em etapas13-16. Na

segunda fase desse projeto15, confirmou-se a "inadequação do processo de

formação do médico", tanto em relação ao graduado quanto ao corpo docente e ao

modelo pedagógico dos cursos4 (p. 111).

Uma das alternativas usadas para tentar transformar o ensino médico tem sido a

incorporação de novas metodologias de ensino17. Entre elas ressalta-se a Problem

Based Learning (PBL)18 ou Aprendizagem Baseada em Problemas, implementada

no Brasil em 199719. Além da PBL, outras propostas metodológicas diferenciadas

como a Task Based Learning (TBL)20 ou Aprendizagem Baseada em Tarefas e a

Learning-Oriented-Teaching (LOT)21 ou Ensino Orientado para a Aprendizagem, têm

sido experimentadas em cursos de Medicina.

O que os fóruns nacionais e internacionais de educação médica têm proposto como

alternativa ao paradigma dominante de ensino é o Paradigma da Integralidade22,23,24,

cujas características são: foco na saúde e não na doença; processo ensino-

aprendizagem com ênfase no aluno e em seu papel ativo na própria formação;

prática no sistema de saúde em graus de complexidade diferentes; capacitação

docente com ênfase tanto na competência técnico-científica quanto na didático-

pedagógica; acompanhamento da dinâmica do mercado de trabalho médico

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orientado pela "reflexão e discussão crítica dos aspectos econômicos e

humanísticos da prestação de serviços de saúde e de suas implicações éticas"4 (p.

68).

Na década atual, algumas iniciativas têm tido a responsabilidade de impulsionar

mudanças no ensino médico brasileiro, como as Diretrizes Curriculares Nacionais

(DCN)10, que demonstram preocupação com a consolidação de mudanças nas

ações e na formação de recursos humanos em saúde. Outras iniciativas de

mudanças estão representadas pelo Programa de Incentivo a Mudanças

Curriculares nos Cursos de Medicina (Promed)11 e pelo Programa Nacional de

Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde)12.

A prática pedagógica é considerada o domínio específico da profissão docente, o

que define a identidade profissional do professor, pois reflete a concepção do

professor sobre as funções profissionais e o modo como devem ser

desempenhadas. Apesar das propostas de transformações nos currículos e no

ensino, as mudanças na educação médica têm esbarrado em dificuldades. A prática

docente em Medicina tem-se mostrado resistente a modificações, visto que os

professores continuam a ensinar como sabem e resistem a novas metodologias de

ensino-aprendizagem5.6.

Este trabalho procura identificar, por meio de revisão da literatura, os fatores

limitantes de mudanças na prática docente em Medicina, com base em autores que

discutem a formação de professores no ensino superior e a docência na área

médica.

FATORES LIMITANTES DE MUDANÇAS NA ATUAÇÃO DOCENTE EM

MEDICINA

Desvalorização das Atividades de Ensino e Supremacia da Pesquisa

Entre os fatores limitantes de mudanças no ensino médico, pode-se citar a

insuficiência da abordagem dos problemas educativos próprios da educação médica.

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Os professores de Medicina tendem a encarar com ceticismo ou descaso os

aspectos pedagógicos da docência universitária.

Publicações referentes à docência médica4,18,24-29 e à docência universitária30-35 são

unânimes ao considerarem a existência de uma deficiência no domínio da área

educacional, no desempenho do docente do ensino superior. Praticamente não

existe, nas escolas médicas, preparo específico para os professores no campo

pedagógico. Espera-se que o professor de Medicina seja "um profundo conhecedor

do assunto que deve ensinar, como se apenas esse aspecto assegurasse sua

competência didática", fato que contribui para a falta de qualificação pedagógica dos

docentes25 (p. 34).

A pouca valorização dada à formação pedagógica do professor universitário pode

ser atribuída ao desmerecimento das atividades de ensino nas universidades, nas

quais os estímulos para a atuação e os critérios de progressão na carreira têm-se

fundamentado mais na produção científica que no exercício da docência. Contribui

para esse fato o próprio desenvolvimento do conhecimento científico específico de

cada área, que tem se tornado cada vez mais fragmentado e incapaz de explicar a

complexidade dos fenômenos educativos.

Para os professores de Medicina, a docência é considerada uma atividade

secundária à profissão médica, e o trabalho docente "não se configura como uma

profissão"25 (p. 32). Um fator que contribui para essa constatação é que o critério de

contratação dos docentes nos cursos médicos é centrado, principalmente, na

qualidade de seu desempenho em sua área técnica de atuação.

Além disso, os professores de Medicina, freqüentemente, são contratados pelo

trabalho desenvolvido em pesquisa e publicações científicas e não pela capacidade

de ensinar, conforme observam Finucane e Rolfe27, McLeod et al.28 e McLean29,

fator que os leva a se afastarem das atividades docentes. Pesquisar e ensinar "não

são atividades incompatíveis, mas competem no tempo disponível do

docente/pesquisador"4 (p. 154-155).

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Apesar de as instituições de ensino serem basicamente formativas e, dessa forma, a

formação oferecida aos estudantes deveria constituir a variável de maior

importância, o ranking é feito com base em indicadores de produção científica ou

técnica e, assim, o potencial formativo fica secundarizado. Muitas vezes, "os

professores vêem a si mesmos mais como pesquisadores (no campo científico) ou

como profissionais (no campo aplicado) do que como professor de fato"34 (p. 114).

Entidades que incentivam/promovem a educação médica, como a Organização

Mundial da Saúde (OMS), recomendam que o desenvolvimento docente se torne

integrado ao processo de reforma curricular. Consideram também que, nas escolas

médicas, as atividades de ensino deveriam ter o mesmo valor dado às atividades de

pesquisa, e os indicadores de competência em ensino deveriam ser estabelecidos e

considerados29.

Com esta realidade, atrair e reter professores qualificados na área médica continua

um desafio, pois apenas recentemente os professores universitários vêm se

tornando conscientes de que a atividade docente, como a pesquisa e a prática de

qualquer profissão, exige capacitação própria e específica. A desvalorização das

atividades relacionadas à formação docente, portanto, prejudica a qualidade do

ensino ministrado32,36-40.

Falta de Profissionalização Docente

A docência universitária "exige não apenas domínio de conhecimentos a serem

transmitidos por um professor como também um profissionalismo exigido para o

exercício de qualquer profissão"38 (p. 30).

A profissionalidade da docência reside nas exigências intelectuais e habilidades

práticas que seu exercício implica. Os professores são reconhecidos como

profissionais justamente pelo domínio técnico demonstrado na solução de

problemas, ou seja, devem conhecer os procedimentos adequados de ensino e sua

aplicação41. Afinal, os professores são profissionais não apenas porque sabem ou

recebem um salário, mas principalmente porque o trabalho que executam exige

vários conhecimentos e competências, e é de grande relevância social34.

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Muito esforço tem sido feito para formar bons médicos, mas pouca atenção tem sido

dada ao conceito de desenvolvimento profissional do médico que atua como

professor. Isso pode ser atribuído ao fato de a falta de aplicação técnica de grande

parte do conhecimento pedagógico, juntamente com a natureza ambígua e, por

vezes, conflituosa de seus fins, ter levado a se considerar o ensino como uma

profissão "somente em um sentido muito fraco e limitado"41 (p. 95).

A identidade dos docentes de Medicina freqüentemente evolui com o tempo e a

experiência. O modo como os profissionais se tornam aptos a desempenhar seu

papel é um processo que ocorre ao longo da vida, se inicia na graduação41,42,43 e

tem estimulado investigações como a realizada por Stone et al.44 para identificar

como os professores da área clínica do curso de Medicina, considerados excelentes

por seus pares, estabelecem sua identidade profissional como médico e como

docente.

Historicamente, a docência tem sido assumida como profissão genérica e não como

ofício, por ser considerada socialmente uma "semiprofissão", com alguns traços

característicos, como o predomínio do conhecimento objetivo, ou seja, o conteúdo

específico de disciplinas: "Saber, ou seja, possuir um certo conhecimento formal, era

assumir a capacidade de ensiná-lo"45 (p. 13.) No momento, essas características

históricas são consideradas insuficientes, embora não se discuta que sejam

necessárias18.

Atuar como professor significa desenvolver funções de natureza distinta. Envolve

desde as funções de rotina, que podem ser aprendidas por treinamento, até funções

mais complexas, de tomada de decisão, que resultam, principalmente, de

características pessoais do professor e têm caráter imprevisível, por ocorrerem de

acordo com as exigências do momento, e refletem a dimensão interior e a teoria

implícita na atuação dos professores41.

A identidade profissional dos professores de Medicina (o que sentem sobre o que

são, sobre o que sabem; os livros que lêem ou escrevem, os colegas com quem se

relacionam, os congressos que freqüentam, as conversas profissionais que mantêm,

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etc.) costuma estar mais centrada em suas especialidades científicas do que em sua

atividade docente.

Para Nóvoa46, o termo mais adequado seria "processo identitário", por realçar a

mistura dinâmica que caracteriza a maneira como cada um se sente e se diz

professor, pois a "identidade não é um dado adquirido, não é uma propriedade, não

é um produto. [...] é um espaço de construção de maneiras de ser e de estar na

profissão". O autor denomina "segunda pele profissional" as características próprias

que os docentes adquirem a partir da experiência: o modo próprio de organizar as

aulas, de movimentar-se na sala, de dirigir-se aos alunos, de utilizar os recursos

pedagógicos.

Segundo Zabalza34, existem três dimensões na definição do papel do docente de

ensino superior: 1) dimensão profissional: elementos que definem a profissão, como

a construção da identidade, os dilemas do exercício profissional e as necessidades

de formação inicial e permanente; 2) dimensão pessoal: tipo de envolvimento e de

compromisso pessoal, ciclos de vida dos docentes, situações e problemas pessoais

que acompanham o exercício profissional, fontes de satisfação e insatisfação no

trabalho; 3) dimensão administrativa: condições contratuais, sistemas de seleção e

promoção, incentivos e obrigações vinculadas à atuação profissional.

Petra et al.47, em contrapartida, consideram os três domínios de conhecimentos

docentes: o ideológico, que determina as normas, os valores e os objetivos

existentes em educação; o empírico, que conecta os fenômenos da realidade

educacional; e o domínio tecnológico: dos métodos, técnicas e estratégias

educacionais.

Stone et al.44 ressaltam que, para o indivíduo sentir-se como profissional, devem

ocorrer mudanças tanto externas como internas, subjetivas. Externamente,

aprendem-se novas informações e desenvolve-se um novo grupo social, enquanto

se adquirem os conhecimentos específicos da profissão. Na transformação

profissional interna, a profissão passa a ser vista como um chamado ou como uma

conceituação subjetiva associada ao papel desempenhado. O terceiro e último fator

a ser considerado na profissionalização é o mentoring, ou seja, o fato de

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profissionais experientes darem assistência aos iniciantes. Todos esses elementos

estão presentes na formação da identidade dos médicos que, recém-formados,

aprendem informações novas, integram-se em um novo grupo de especialistas, são

monitorados como residentes, o que geralmente não ocorre com os médicos que

optam pela docência.

Conforme afirmam Batista e Ribeiro48, enfrentar a questão da profissionalização do

professor de Medicina é um trabalho árduo, visto que demanda esforço para

localizar as diferentes situações que perpassam a categoria docente, mapear os

conflitos e as contradições que permeiam a prática dos professores, além de

"compreender a complexidade que envolve as funções de ensino, de educação e

saúde nesta sociedade" (p. 7).

Para McLean29, embora se acredite na existência de critérios que determinem a

eficácia e a eficiência em docência, eles são vagos e de difícil implementação.

Apesar de estudos48 apresentarem propostas de atividades para os cursos de

Medicina incentivarem o desenvolvimento da identidade do médico como professor,

a identidade profissional docente não pode ser pensada separada da perspectiva da

formação docente, em vista da interdependência de ambos os fatores. Afinal, a

atividade docente nas universidades necessita ser encarada de forma profissional e

não amadorística, pois, além das competências específicas para o exercício de uma

profissão, existem as competências próprias do docente universitário, seja em

determinada área do conhecimento, seja no domínio da área pedagógica, seja no

imprescindível exercício da dimensão política da docência universitária, em outras

palavras, na visão de educação, de homem e de mundo do professor.

Desvalorização da Formação Docente do Professor de Medicina

O corpo docente é o alicerce fundamental sobre o qual devem ser instituídas as

bases das mudanças introduzidas na educação médica, e a docência universitária

tem constituído tema relevante de pesquisa na área educacional e na área de

educação médica18,30,32,36-40,49-53.

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No Brasil, na terceira fase do Projeto Cinaem16, que se centrou no processo de

formação e na docência médica, houve consenso acerca do "despreparo da maioria

dos docentes que, na quase totalidade, são especialistas, não havendo modelo de

identificação para o propósito da formação geral do médico"5. Afirmou-se a

importância do corpo docente das escolas médicas como "um dos elementos

centrais do êxito das reformulações necessárias à educação médica" e recomendou-

se que os cursos médicos promovessem "a excelência dos médicos para a

docência", e, dessa forma, contribuíssem para a transformação da formação16 (p.

11).

De modo geral, a formação do professor começa antes mesmo de sua formação

acadêmica e prossegue durante toda a vida profissional, estando baseada em

processos complexos principalmente porque a prática educativa se constitui na

tensão entre as determinações estruturais da sociedade e as exigências do sistema

de ensino54.

A atuação do docente da área médica restringe-se, geralmente, à reprodução dos

modelos considerados válidos, aprendidos anteriormente, e à sua experiência

prática cotidiana26,27. Os professores têm idéias, atitudes e comportamentos sobre o

ensino provenientes da formação recebida durante o período em que foram alunos.

Nessa formação existe uma dimensão inconsciente e não inteiramente racional que

se enquadra no que Mizukami55 denomina "teoria prática de ensino", pois os

professores "operam na base de várias teorias da prática e, quer estejam ou não

conscientes de tais teorias, seu trabalho é racional, pelo fato de ser intencional" (p.

43).

A influência que essa formação incidental exerce é considerável, posto que os

docentes a adquirem de forma nãoreflexiva, como algo natural, escapando, assim, a

críticas e transformando-se em um conceito espontâneo sobre o que seja

ensinar56,57. Entre os limites dessa formação, Venturelli18 cita a improvisação como

"la mejor forma de eternizar las limitaciones de un método que el tiempo ha

sobrepasado", pois limita a discussão e a reflexão sobre as práticas executadas e,

com isso, a possibilidade de enriquecimento teórico com leituras e ampliação da

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visão de mundo do docente. Benedito58 acrescenta que, embora não se deva

desconsiderar a capacidade autodidata do professorado, a formação proporcionada

pela experiência é insuficiente (p. 23).

Na verdade, aprende-se a ser professor universitário "mediante um processo de

socialização em parte intuitiva, autodidata ou [...] seguindo a rotina dos outros"58 (p.

131). Nesse processo, têm papel mais ou menos importante a experiência própria

como aluno, o modelo de ensino predominante no sistema universitário e as reações

dos estudantes. O professor passa da experiência passiva como aluno ao

comportamento ativo como professor "sem que lhe seja colocado, em muitos casos,

o significado educativo, social e epistemológico do conhecimento que transmite ou

faz seus alunos aprenderem"59 (p. 153).

Para Venturelli18, se as instituições de ensino médico reconhecessem o fato de que

o médico sabe Medicina, mas não foi formado para ensinar, poderiam contribuir para

mudar a situação, direcionando os professores atuais e futuros a um caminho "de

aprendizaje, de real formación docente", o que permitiria "poner la educación del

futuro profesional de la salud en una dirección altamente propicia" (p. 23).

Existem diferentes concepções de formação docente em saúde: a da formação

como processo de reflexão e a da formação como treinamento didático/exercício

docente60. Esse tema é considerado complexo por "expressar tensões entre

perspectivas teórico-metodológicas que buscam contribuir para a formulação de

políticas de formação que extrapolem as meras situações de capacitação e

atualização"60 (p. 17). De qualquer modo, a formação docente permanente é

imprescindível para favorecer a evolução da formação médica, fato reconhecido

atualmente não só pelos cursos que usam novas estratégias de ensino, mas até

mesmo pelos tradicionais61.

Apesar dos vários paradigmas sobre a formação inicial dos docentes, existe um

"escasso desenvolvimento teórico e conceptual da formação permanente ou

desenvolvimento profissional dos docentes" (p. 32)62. Giroux63 aponta como uma das

maiores ameaças para a atuação dos professores o desenvolvimento de ideologias

instrumentais de formação com ênfase na abordagem tecnocrática para a

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preparação docente e para as práticas em sala de aula, que prejudicam tanto a

natureza do ensino quanto os alunos que, "em vez de aprenderem a refletir sobre os

princípios que estruturam a vida e a prática em sala de aula, [...] aprendem

metodologias que parecem negar a própria necessidade de pensamento crítico" (p.

159). O autor propõe, como forma de reestruturar a atividade docente, considerar os

professores como "intelectuais transformadores", educadores e críticos das teorias

tecnocráticas e instrumentais da educação, podendo propiciar o repensar das

tradições e das condições que os têm impedido de assumir um papel ativo e

reflexivo.

Gimeno Sacristan59 considera que o processo de renovação pedagógica que

preconiza o papel central para os professores no planejamento de sua prática deve

partir da análise das condições objetivas do trabalho profissional dos docentes, "para

propiciar saídas realmente libertadoras, ao mesmo tempo que se é consciente das

dificuldades objetivas do plano" (p. 109).

A crítica generalizada ao tradicionalismo e à racionalidade técnica tem conduzido à

emergência de propostas alternativas sobre o papel do professor, com a visão da

formação em uma perspectiva mais ampla e mais humana. Na verdade, as teorias

tradicionais de formação de professores foram colocadas em discussão porque os

cursos de formação, ao desenvolverem um currículo formal, têm contribuído de

forma insatisfatória para a geração de uma nova identidade profissional docente.

Estudiosos de vários países têm manifestado preocupação com a necessária

mudança no trabalho docente. O ensino tradicional vem paulatinamente dando lugar

a práticas alternativas que se propõem levar ao desenvolvimento global dos

educandos49,64.

O conceito mais utilizado por investigadores, formadores de professores e

educadores diversos para se referirem às novas tendências da formação de

professores é o da "prática reflexiva"65,66, proposta por Schön66,67 e que causou

grande interesse e influência nos trabalhos direcionados à prática profissional

docente. Schön67 sugere a incrementação das práticas reflexivas e o estímulo a sua

introdução na formação docente, para que os professores possam aprender a partir

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da análise e da interpretação de sua própria atividade. O professor reflexivo, que

pensa-na-ação, se interroga sobre as alternativas possíveis para determinado

momento e avalia seus resultados.

Entre os obstáculos à implantação da prática reflexiva encontram-se a epistemologia

dominante na universidade e o currículo prescritivo. Nóvoa46, ao defender a

formação docente como um processo interativo e dinâmico, apregoa a necessidade

de estímulo a uma perspectiva crítico-reflexiva, que forneça ao professor meios de

desenvolver um pensamento autônomo e de compreender a globalidade do sujeito.

Para verificar a eficácia e eficiência de cursos de capacitação docente, Godfrey et

al.68 pesquisaram as mudanças ocorridas nas atividades de ensino de dois grupos

de professores de Medicina: um constituído pelos que participaram de um curso de

docência; e o outro integrado por docentes em lista de espera pelo curso,

considerado Grupo Controle. Após um período de 8-10 meses, os professores

responderam ao mesmo questionário aplicado antes do curso, e a maioria dos

participantes relatou mudanças positivas na prática pedagógica, maiores que as do

Grupo Controle.

O caminho aberto pela necessidade da reflexão como modelo de formação docente

propõe uma série de intervenções que torna possível, em nível teórico e prático, um

novo modo de formar professores. Apesar das críticas feitas à proposta de Schön, é

inegável sua contribuição para uma nova visão da formação. O ponto principal da

crítica a Schon é que o conhecimento pode e vem da prática, mas não há como

situá-lo exclusivamente nela. Esta crítica, na verdade, deve ser dirigida à

racionalidade técnica, que defende a idéia de que os profissionais solucionem

problemas através de meios técnicos. O questionamento a este tipo de

profissionalização é que, quando se esgotam o repertório teórico e os instrumentos

construídos como referenciais, o profissional não sabe como lidar com a situação.

Resistência Docente a Mudanças

Outro fator que limita mudanças no ensino médico é a resistência dos professores a

transformações. Um dos aspectos que podem contribuir para essa resistência é que

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as tentativas de mudança ocasionam certa sensação de insegurança, o chamado

"mal-estar docente", visto que os professores já se encontram adaptados "a um

trabalho bem definido – o ensino, a transmissão de conhecimentos"69 (p. 11).

Existem vertentes diferenciadas de prática pedagógica64,70. Schmidt et al.64

consideram a prática pedagógica "repetitiva", em que as ações docentes parecem

acontecer "sem dúvidas e reflexões", e a prática pedagógica "reflexiva", que se

preocupa com mudanças qualitativas no processo de ensino e procura

instrumentalizar-se com um conhecimento crítico e aprofundado da realidade (p. 23).

Cunha30 emprega outra nomenclatura para as práticas/concepções de ensino: uma

"reprodutiva", na qual "prepondera a reprodução do conhecimento cientificamente

acumulado", e outra, "emergente", que concebe o conhecimento como um processo

"onde a dúvida e a incerteza são estímulos à produção do aprendiz" (p. 389).

Estarão os professores da área da saúde aptos a classificar sua própria prática

docente? Estarão preparados para a implementação da prática reflexiva ou

necessitam de orientação, estímulo e cooperação?

Ten Cate et al.21 consideram que os professores de Medicina apresentam

dificuldades de compreender as concepções curriculares subjacentes aos currículos

e de colocá-las em prática. O autor apregoa a necessidade de que as propostas

sejam bem claras para auxiliar os docentes a refletir sobre a prática cotidiana,

analisar as atitudes/reações dos alunos, desenvolver e implementar novos métodos

de ensino e compreender por que determinadas estratégias não conseguem

estimular a aprendizagem.

Apesar das dificuldades que os professores de Medicina apresentam em relação às

questões educativas, Swick71 considera que, se por um lado, as mudanças trazem

inevitavelmente desafios e sentimentos de perda, por outro, também oferecem a

oportunidade de reconstruir o ensino médico em direção às necessidades da

sociedade.

Clack72 concorda em que a resistência docente é um fator limitante de mudanças no

ensino médico e relata o papel positivo da avaliação realizada em um curso de

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Medicina do Reino Unido que, ao mudar seu currículo, realizou uma investigação

com egressos sobre o ensino ministrado. Foram devolvidos 78% dos questionários e

apontadas as deficiências em vários aspectos da formação, com um efeito imediato

de implementar algumas alterações práticas no currículo para corrigir as deficiências

apontadas.

Aliás, a avaliação tem sido um instrumento usado para efetivar mudanças em cursos

de Medicina e Odontologia73,74 e é considerada válida para avaliação curricular. Não

basta, entretanto, apenas aplicar instrumentos de avaliação. Para Wolfhagen75, o

sucesso dos processos avaliativos encontra-se no desejo de adotar uma atitude

crítica, de analisar a situação existente, na oportunidade de discutir e dialogar, na

disponibilidade de executar um plano de ação e de coletar dados continuamente.

Individualismo da Ação Docente

O individualismo presente na docência universitária é apontado por Bireau31 como

um dos obstáculos à formação docente. A autora assinala que os docentes do

ensino superior são dominados pela "síndrome de ensinar à minha maneira", um dos

fatores que os leva a adotar estilos pedagógicos que têm tanto de pessoal como de

empírico. E acrescenta que cada docente "é rei e senhor do conteúdo a ministrar".

Para Zabalza34, os professores universitários agem como se cada um fosse uma

espécie de "célula fechada e autônoma".

O individualismo não é exclusividade dos professores de Medicina, tendo sido

reconhecido em outros países como uma característica da docência

universitária34,47,76. Estudo realizado concomitantemente em universidades francesas

e alemãs evidencia a falta de integração e o individualismo em que se processa a

docência. A distribuição das disciplinas entre os professores leva em conta as

pretensões e as preferências de cada docente, e não se aprofunda a discussão dos

conteúdos e/ou métodos pedagógicos31.

Para Petra et al.47, quando os professores agem de forma individual, independente,

tendem a desenvolver principalmente o domínio técnico da função docente, pois os

demais, o ideológico e o empírico, geralmente são proporcionados pela reflexão

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sobre o trabalho realizado. O autor pondera que, se os gestores do ensino dessem

mais atenção a todos os domínios do conhecimento docente, mais professores

poderiam se desenvolver.

Investigação realizada sobre as práticas educativas de professores de Medicina de

uma instituição federal de ensino superior76 observou o individualismo e o

predomínio da racionalidade técnica na ação do professor. Quando a racionalidade

técnica é norteadora da prática, fica subentendido que o que se requer dos

professores é que executem atividades preestabelecidas para a consecução de

determinados objetivos. Para isto, o docente aplica métodos e adere a rotinas

cristalizadas: não faz parte do seu exercício profissional o questionamento do

ensino, mas tão-somente seu cumprimento eficaz.

A racionalidade técnica implanta a figura do expert, que, com sua eficiência e

domínio das técnicas derivadas do conhecimento científico, legitima os "objetivos

que ficam fora do debate tanto para os professores como para a sociedade"41.

O individualismo presente na prática docente universitária é um dos entraves ao

desenvolvimento dos professores desse nível de ensino, pois vivem "tão

intensamente a autonomia ideológica, científica, didática, que se torna inexpressivo

qualquer processo que tenda a romper esse status quo"34 (p. 118).

Segundo Costa76, "o currículo estruturado em disciplinas é o meio ideal para cultivar

o professor que trabalha isoladamente, pois cada disciplina existe de forma

independente e sem comunicação com as demais" (p. 123). Em outras palavras, a

forma de organização dos currículos tende a legitimar o isolamento da ação docente

e deve ser considerada quando se pensa em transformar a formação de

profissionais de saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

São vários os desafios a serem enfrentados pelos estudiosos da educação médica,

principalmente se há objetivos de mudanças na prática docente. Um dos itens

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considerados básicos é a formação dos professores, visto que precisam de uma

visão global da profissão docente e não apenas de sua especialidade médica.

Com a ressignificação do papel docente, de transmissor de conhecimentos para

mediador e facilitador da aprendizagem dos alunos, é importante ter clareza teórica

sobre pontos como: o que significa ser um bom professor? O que é entendido por

excelência em docência?

Assim, encontrar estratégias práticas adequadas ao fazer docente constitui uma

tarefa essencial para a formação do educador. Afinal, a docência médica deve ser

vista em um continuum que só cessa ao final da vida profissional, e seria desejável

que todos os professores – sejam os que se dedicam à pesquisa, sejam os que se

preocupam com o ensino – juntassem forças para o desenvolvimento permanente da

docência médica.

As iniciativas vêm, em geral, de indivíduos isolados ou de pequenas equipes, e só

em casos muito raros a instituição se interessa por elas. Afinal, se mudanças

efetivas no papel do professor de Medicina são desejadas, deve-se pensar com a

clareza que oportunize a geração de propostas concretas, que passam

obrigatoriamente pela incorporação institucional do desenvolvimento pedagógico

permanente dos docentes da área da saúde.

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Endereço para Correspondência Nilce Maria da Silva Campos Costa Rua 15 nº 220/100 Setor Oeste 74140-035 Goiânia-Goiás

Recebido em: 29/07/2005 Reencaminhado em: 24/10/2006 Aprovado em: 25/01/2007 Conflito de Interesse: Declarou não haver.

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Química Nova Print version ISSN 0100-4042 Quím. Nova vol.29 no.6 São Paulo Nov./Dec. 2006 doi: 10.1590/S0100-40422006000600040

EDUCAÇÃO

A FORMAÇÃO DO PÓS-GRADUANDO EM QUÍMICA PARA A DOCÊNCIA EM NÍVEL SUPERIOR

Agnaldo ArroioI; Ubirajara Pereira Rodrigues Filho

II; Albérico Borges Ferreira da Silva

II, *

IDepartamento de Metodologia do Ensino e Educação Comparada, Faculdade de Educação,

Universidade de São Paulo, Av. da Universidade, 308, 05508-040 São Paulo - SP, Brasil IIDepartamento de Química e Física Molecular, Instituto de Química de São Carlos, Universidade de

São Paulo, CP 780, 13560-970 São Carlos - SP, Brasil

ABSTRACT

The article presents a brief analysis on chemistry post-graduate students' perception

on teaching in higher education. This study was done based on the context of

students' formation in chemistry post-graduate programs and makes suggestions on

how to improve the formation process of post-graduate students in order to decrease

the rupture between teaching and research in chemistry post-graduate programs.

Keywords: post-graduation; higher education; teaching.

INTRODUÇÃO

O ensino superior, em geral, é focado na figura do professor e no seu conhecimento.

As aulas geralmente são expositivas, leituras de texto e seminários; dificilmente

debate-se sobre os procedimentos metodológicos do ensino superior1. Nos últimos

anos tem-se intensificado a exigência de titulação de Mestrado e Doutorado, visando

a melhoria do ensino, o que não garante uma orientação pedagógica para a prática

docente. Um outro problema segundo Vasconcelos2 seria a falta de um "projeto

educacional claramente expresso e definido ao qual todos os seus docentes

pudessem se filiar". O processo de construção do projeto de curso seria um espaço

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de reflexão e/ou o início de uma orientação pedagógica no ensino superior. No

entanto, o que ainda estaria orientando a prática docente seriam as suas

experiências, enquanto estudantes, inspiradas nos professores que tiveram durante

sua formação.

A qualificação de professores para o exercício da docência no Ensino Superior,

apesar de não ser uma prioridade estabelecida com rigor no contexto das Políticas

Educacionais nos últimos anos, torna-se a cada dia mais necessária, uma vez que o

professor deve assumir o complexo histórico de constituição da sua área de atuação.

Tendo o conhecimento específico de sua área de atuação como instrumento de

mediação na relação entre a universidade e a sociedade, o professor necessita

possuir um domínio aprofundado deste conhecimento específico para que possa

introduzir o aluno no domínio dos métodos da ciência.

Em conjunto ao domínio do conhecimento específico de sua área, é primordial,

também, que o professor do ensino superior tenha profunda competência

pedagógica, como sendo um requisito importante para trabalhar a formação de seus

alunos.

A universidade está enfrentando uma crise, referente ao seu quadro de professores

com desempenho no ensino. A referida crise não reside apenas na escassez de

massa crítica, mas sobretudo no cumprimento da exigência de qualificação, de

titulação e de formação pedagógica necessárias ao exercício da docência.

Segundo Pimenta e Anastasiou3, nas Instituições de Ensino Superior, em geral,

predomina o despreparo e até um certo desconhecimento científico do processo de

ensino e de aprendizagem, este mesmo processo do qual os professores são os

responsáveis. Nota-se, hoje, que a admissão de professores, mesmo por critérios de

concurso, prática louvável nas universidades públicas, é feita sem levar muito em

consideração se o candidato domina ou não o campo de conhecimento pedagógico

e as relações entre este com as disciplinas técnico-científicas e outras afins, o que

dificulta uma prática pedagógica eficiente. Valoriza-se por demais a produção

científica, mesmo em se tratando da contratação de um docente e não de um

pesquisador. A maioria dos professores contratados não tem muito domínio do

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campo pedagógico, o que vem dificultar a prática do ensino com pesquisa. Para

Maldaner4 este despreparo pedagógico dos professores universitários é fruto de sua

própria formação.

O esgotamento do modelo fragmentado de conceber o homem, pelo menos em tese,

mesmo que sua utilização ainda balize diversas práticas acadêmicas, e a

necessidade de lidar com o humano com base em parâmetros mais amplos,

relacionando suas diferentes facetas, trazem para a universidade o desafio de

formar profissionais para o nosso tempo e para um novo tempo5. Essa realidade

exigiria da universidade uma reformulação na política de formação docente.

Para o melhor desempenho pedagógico dos professores, principalmente daqueles

que se encontram em estágio probatório, a universidade precisa intensificar

programas já existentes de acompanhamento pedagógico que possam oferecer

cursos de aperfeiçoamento em didática e metodologia do Ensino Superior, realizar

encontros, estabelecer mecanismos de diálogo com os departamentos didáticos, no

sentido de tentar superar a antiga dicotomia entre a formação técnico-científica e a

formação pedagógica. É necessário que a política de formação pedagógica de

professores universitários deva se preocupar, também, com as questões de valores

éticos. Entende-se que a competência na docência se encontra indissoluvelmente

ligada com os sentimentos de valores, isso porque a exigência da ação pedagógica,

relacionada com a formação, sempre implica um dever-fazer e um dever-ser. Assim,

os professores inseridos na docência no Ensino Superior precisam estar preparados

para trabalhar o conhecimento científico com os estudantes em formação, como

também para influenciar a conduta destes através da cultura da ética e da cidadania.

DOCÊNCIA

Atualmente, mais do que nunca, muitos profissionais das mais diferentes áreas

buscam a docência no ensino superior como uma forma alternativa e/ou conjugada

de inserção no mercado de trabalho. Apesar da legitimidade dessa busca, a vivência

com a prática docente no âmbito universitário, ao ocorrer de maneira informal sem a

devida apropriação de saberes didático-pedagógicos, pode se revelar difícil e

problemática, levando à insatisfação em relação à própria prática pedagógica, receio

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de avaliações negativas do trabalho realizado (tanto por parte da instituição como do

corpo discente), insegurança em relação ao melhor caminho a adotar com uma

determinada turma e/ou aluno, sentimento de estar perdido e sozinho sem saber por

onde começar, nem tampouco onde chegar (aquela impressão desagradável de que

os alunos "não estão nem aí" para os conteúdos da disciplina). Essa experiência

negativa tende a suscitar um sentimento de fracasso e desânimo frente às inúmeras

situações e desafios vivenciados no cotidiano da sala de aula.

São essas dificuldades e desafios, no entanto, que abrem espaço para que cada vez

mais se reconheça que a docência no âmbito universitário é uma profissão que,

como tantas outras, pressupõe formação profissional específica. O processo de

ensino-aprendizagem, a despeito do nível de formação em que ocorre e longe do

que o senso comum imagina, exige por parte do docente a aquisição de um conjunto

de competências específicas, que vão muito além do domínio de um saber

historicamente acumulado. Saber um determinado conteúdo não é sinônimo de

saber ensinar esse mesmo conteúdo. O domínio de um determinado conteúdo, e o

do respectivo saber fazer (saberes profissionais diversos), não se transformam

automaticamente em saber didático que permita ao professor exercer com

competência seu papel no ensino. Isso significa dizer que aqueles que escolhem

exercer a atividade docente precisam adquirir, desenvolver e construir esses

conhecimentos e habilidades específicas6.

A atividade docente é uma atividade de educação. Considerando a educação como

prática social, então a atividade docente é também uma prática social. Para exercer

a atividade docente é requerido preparo e segundo Benedito apud Pimenta e

Anastasiou3, "o professor universitário aprende a sê-lo mediante um processo de

socialização em parte intuitiva, autodidata ou (...) seguindo a rotina do 'outros'".

Muitas vezes a ausência de uma formação continuada, principalmente no que se

refere a ações pedagógicas, leva o professor universitário a rememorar-se de suas

experiências no ensino superior; isso, de certa forma, torna-se uma orientação de

sua prática. Assim, as experiências que foram vivenciadas enquanto estudante, que

são assimiladas nas conversas aleatórias com colegas e/ou que são observadas nos

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exemplos ou em obras de educadores reconhecidos em sua área de atuação,

marcariam ou conduziriam as ações educativas do futuro professor.

Já o ensino superior de Química, teria uma prática docente semelhante aos demais

profissionais da educação, pois não faltariam conhecimentos pedagógicos,

principalmente pelos docentes egressos de cursos de graduação com licenciatura. O

que poderíamos dizer é que muitas práticas educativas seguem uma pedagogia

tradicional, centrando o ensino no professor. As aulas limitar-se-iam à exposição do

conteúdo pelo professor e ao aluno competiria fazer anotações, estudar para as

provas e/ou elaborar os trabalhos de "pesquisa bibliográfica" propostos pelo

professor. Este tipo de ensino está baseado em um pressuposto simples e "natural":

de que o bom aluno aprende "naturalmente", enquanto o mau aluno é aos poucos

ejetado pelo sistema educacional. Ora, isto nada mais é que a aplicação cômoda da

Lei de Seleção Natural, postulada por Darwin, na Educação. Reflexo de séculos de

mentalidade pouco ou nada democrática, este modelo se reproduz até hoje, com

defensores em todos os níveis e classes sociais.

FORMAÇÃO

A formação de professores constitui-se em um tema de grandes e intensos debates

na esfera educacional e no seio das universidades, uma vez que há uma ebulição de

diferentes vertentes que buscam verdades em um quadro ainda tão nebuloso quanto

incerto. Existe uma significativa preocupação, em termos de investigações, com o

preparo do professor para atuar nas séries iniciais do ensino fundamental, opondo-

se a raras iniciativas em relação à formação do professor para o ensino superior7.

Por outro lado, embora o tema oportunize o surgimento de variadas correntes

filosóficas, seu conteúdo nos instiga constantemente ao diálogo e à proposição de

alternativas inovadoras para a formação das competências que possibilitarão ao

professor se tornar um verdadeiro profissional.

De acordo com a Lei Federal 9394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

diretrizes e bases da Educação Nacional, a formação docente para o nível superior

se dá nos cursos de mestrado e doutorado.

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"Art. 66 – A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de

pós-graduação, principalmente em programas de mestrado e doutorado".

Ela também evidencia a necessidade da experiência em docência para o exercício

do profissional da educação.

"Art. 67 - Parágrafo único – A experiência docente é pré-requisito para o exercício

profissional de quaisquer outras funções de magistério nos termos das normas de

cada sistema de ensino".

Assim, é extremamente relevante para o pós-graduando a oportunidade de vivenciar

atividades relacionadas à docência em seu processo de formação, pois, através da

reflexão sobre suas experiências, pode romper com o continuísmo tão arraigado em

nossos cursos. A maior dificuldade para o recém-formado, no sentido de

desenvolver atividades inovadoras, está relacionada ao medo de errar, sendo assim

é mais seguro simplesmente reproduzir os modelos tradicionais vivenciados.

As mudanças na educação tornam-se tarefas muito complexas mediante a

multiplicidade de interesses. Por outro lado, os programas de pós-graduação visam

a formação de pesquisadores, conforme o conceito de mestrado8

"Sua finalidade é dar ao aluno uma visão geral para o desenvolvimento de trabalhos

científicos e tecnológicos de forma que possa iniciar-se profissionalmente em uma

área de pesquisa"

E, também, pelo de doutorado:

"Deverá propiciar ao aluno maturidade que lhe permita prosseguir como pesquisador

independente, após a obtenção do título".

Estes conceitos indicam o compromisso dos programas de pós-graduação na

formação de recursos humanos para a pesquisa e não necessariamente para a

docência.

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Para o estágio de docência da CAPES9, disciplinas como "Prática de Ensino" e

"Preparação Pedagógica", o Programa de Aperfeiçoamento de Ensino (PAE-USP),

etc., apresentam-se como algumas alternativas que vem sendo desenvolvidas por

universidades na tentativa de aprimorar a formação do pós-graduando para a

docência no ensino superior.

A preocupação com a formação do pós-graduando para a docência em nível

superior é justificável pelo simples fato de que o grau de qualificação, e não apenas

a titulação, é essencial para subsidiar a qualidade em qualquer profissão, ainda mais

quando estamos nos referindo aos processos educacionais.

PESQUISA

Por acreditarmos na formação do pós-graduando para a docência em nível superior

como sendo um processo, consideramos ser necessário investigar as concepções

sobre o tema sob a perspectiva dos alunos de pós-graduação, em formação, com o

intuito de colaborar para o aperfeiçoamento deste processo. Trata-se de um estudo

preliminar que visa também incentivar os alunos a refletirem sobre o tema, além de

obter informações sobre suas concepções a respeito do mesmo. Este tema merece

uma atenção especial dos pesquisadores e professores, pois as concepções que

estes alunos possuem, que por sua vez foram forjadas em sua educação formal e

informal, serão as mesmas que estarão, em geral, representadas em sua atividade

docente, pelas quais eles serão os futuros formadores. Estas representações estão

arraigadas em suas concepções, que se não forem discutidas, debatidas e refletidas

serão perpetuadas durante sua atuação profissional.

Para efetivar este trabalho, a coleta de dados foi feita através de resposta escrita a

um questionário (Anexo 1) elaborado para esta finalidade, bem como por anotações

durante um workshop sobre "Docência no Ensino Superior", realizado em outubro de

2004.

Os 40 alunos participantes da pesquisa fazem pós-graduação (mestrado e

doutorado) nos programas de Pós-Graduação em Físico-Química e Química

Analítica do Instituto de Química de São Carlos (IQSC), Universidade de São Paulo

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(USP), e participaram do Programa de Aperfeiçoamento de Ensino (PAE) da USP

como bolsistas e voluntários, no segundo semestre de 2004. Dos alunos

participantes 70% são oriundos de cursos de bacharelado e não possuem

licenciatura ou outra formação pedagógica, e 90% realizaram seu curso de

graduação em instituições públicas de ensino.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os dados que aqui passaremos a analisar foram organizados objetivando uma visão

geral das percepções dos participantes. De acordo com a análise dos resultados,

75% dos alunos participantes declararam que não se sentem preparados para

exercer a função docente no ensino superior, ante a 25% que se declararam

preparados para tal função. Dentre os que se declararam não preparados, a maioria

apontou a "insegurança", a "falta de preparação" e "ainda não me sinto seguro

apesar de algumas experiências" como os principais motivos, ao passo que os que

se sentiam preparados apenas declaram estar preparados.

De forma geral nota-se que existe a preocupação com a carreira docente quanto a

sua preparação/formação para tal, o que justifica a insegurança declarada na maior

parte das respostas. A preocupação com a falta de formação/preparação é algo

importante e evidencia uma mudança no que se refere à docência no ensino

superior, pois ainda resiste o pensamento de que a atividade docente não requer

formação na atividade de ensinar para o nível superior.

A atividade docente requer preparo que não se esgota nos cursos de formação,

mesmo tendo uma contribuição muito relevante enquanto conhecimento

sistematizado do processo ensino-aprendizagem, e desta forma possibilitando a

criação e identificação de uma prática transformadora. Sendo o professor o agente

desta prática transformadora, é necessário que possua uma sólida formação

também pedagógica, o que certamente lhe assegura maior segurança perante o

desenvolvimento da atividade docente.

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Quando questionados sobre o programa de pós-graduação, ou seja, se este visa a

formação nas três áreas de atuação da Universidade, pesquisa-ensino-extensão, as

opiniões se dividem: 55% acreditam que sim e 45% que não.

Atuação nas três áreas:

"em alguns grupos (de pesquisa) não, na instituição (como um todo) somente

atividades isoladas"

"visa necessariamente a pesquisa e extensão"

"acredito que a pesquisa sim; as outras, exceto por iniciativas isoladas"

"parcialmente o programa visa, mas deixa a desejar"

As respostas enfatizam que as atividades de pesquisa e extensão universitária são

desenvolvidas não como parte do programa e sim como iniciativas isoladas por

professores, alunos e grupos de pesquisa, porém as atividades de ensino não são

mencionadas nem como atividades isoladas e muito menos como atividades

vinculadas ao programa de pós-graduação.

Diante da falta de preparação e insegurança apontadas anteriormente, e a não

integração da pesquisa, do ensino e da extensão, os alunos foram questionados

quanto ao que seria necessário para aperfeiçoamento de sua formação docente.

Algumas atividades foram sugeridas em suas respostas com uma certa freqüência,

por isso agrupamos em algumas categorias de acordo com a Figura 1.

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A carência de disciplinas relacionadas à área de educação fica evidenciada pelas

"disciplinas didáticas" e "cursos específicos", talvez por serem menos privilegiadas

dentre a tríade pesquisa, ensino e extensão, assim como a falta de preparação já

apontadas anteriormente. Ficam visíveis, de acordo com as colocações dos alunos,

as necessidades apontadas em relação à preparação/formação docente.

Muitas das percepções sobre a ação docente se dão de forma empirista, uma vez

que suas experiências enquanto aluno irão moldar sua formação e se refletir em sua

prática. Essas experiências irão subsidiá-los na formação de modelos bons e/ou

maus. Baseando-se em sua experiência como aluno de ensino superior, foi

perguntado o que caracterizaria um bom e um mau professor. Com esta pergunta,

visou-se identificar quais destas características foram marcantes em sua vida

acadêmica, pois estas estariam relacionadas em sua atuação, ou pela repetição das

mesmas ou pela tentativa de superá-las.

Características apontadas do bom professor: "ter um bom conhecimento de sua

área"; "domina a matéria e sabe transmitir"; "transmite o conhecimento de forma

simples"; "ele passa os conceitos"; "passa ao aluno todas as informações"; "torna o

conteúdo fácil de ser assimilado"; "tem boa didática"; "comprometido com o ensino";

"possui confiança e aula articulada" e "prende atenção do aluno".

Pelas respostas acima, o bom professor, predominantemente, está estritamente

relacionado com o conhecimento através do conteúdo, ou seja, é necessário

dominar o conteúdo específico e transmití-lo como uma competência docente que

garantiria o desempenho dele. Este professor domina o conteúdo e tem o

compromisso e a necessidade de transmití-lo aos alunos. Sendo assim, cabe ao

aluno estudar e dominar o conteúdo que será transmitido nessa ação docente.

A transmissão do conhecimento acumulado é sim algo importante na ação docente,

mas esta ação não se resume somente a uma simples transmissão. A ação docente

é muito centrada na figura do professor, não aparecendo registro sobre a

aprendizagem do aluno. O processo relatado é de ensino e não ensino–

aprendizagem, onde o professor é o agente responsável e a figura central na

educação. É necessário que o foco se desloque da figura do professor para o

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processo, onde neste processo os dois participantes, tanto o professor quanto o

aluno, se envolvam em uma relação com o conhecimento que será compartilhado,

construído e elaborado por ambos.

A ênfase dada à relação do professor com os conteúdos específicos, nas respostas

sobre o bom professor, evidencia que a discussão e a relação entre o ensinar e o

aprender tem sido relevada no processo de formação pelos professores

universitários, tendo como conseqüência um comprometimento nas relações com os

processos de ensino- aprendizagem e desenvolvimento dos alunos e a ausência de

uma reflexão sistematizada sobre suas práticas educativas.

Ainda baseados em suas experiências como alunos do ensino superior, foram

questionados sobre o que consideram como uma boa aula.

Características apontadas de uma boa aula: "uma aula dada com prazer,

descontraída"; "seguro da sua disciplina (conteúdo), inspira confiança"; "quando o

professor gosta do que faz"; "quando transmite o conhecimento sem ser exaustivo";

"quando traz novos conhecimentos ou explica de maneira mais prazerosa"; "clara,

concisa, e com conteúdo bem dimensionado ocupando o tempo da aula"; "quando o

professor passa o seu conhecimento, entretém a classe por dinâmica"; "possui

dinâmicas e metodologias diferenciadas, fugindo um pouco das aulas tradicionais

para o aluno participar" e, "quando o professor apresenta um bom material didático e

explica o conteúdo através de exercícios e resolução de problemas".

A boa aula é dependente do "bom professor", pois as questões permanecem ainda

centradas na figura do professor detentor do conhecimento, buscando transmitir

novos conhecimentos de forma diferenciada da maneira "tradicional". Cabe ao

professor propor algo diferenciado, pois a aula é de sua responsabilidade dando a

impressão de que o aluno não faz parte da aula. O papel do aluno seria de um

cliente que irá receber a aula que será "dada" pelo professor.

Nas respostas sobre uma boa aula, ainda aparece alguma consideração em relação

ao aluno quando é mencionado "para o aluno participar". Assim, a figura do aluno

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aparece como alguém que participa do processo e não somente como alguém que

irá receber o resultado do processo que se desenvolve na sala de aula.

As características de um mau professor, segundo as respostas abaixo, dizem

respeito à sua falta de compromisso com o ensino.

O mau professor: "não sabe transmitir; às vezes nem domina o conteúdo"; "as

informações são passadas superficialmente"; "não passa aos alunos os conceitos

básicos"; "ausente, não tem tempo para o aluno"; "possui conhecimento somente

para si, não sabe transmití-lo"; "não segue a risca o cronograma de ensino";

"descaso com o ensino" e, "não aceita críticas e faz pouco para mudar".

As características destacadas para um mau professor também aparecem centradas

na figura do professor, não fazendo menção ao processo de aprendizagem e estão

muito relacionadas com o conteúdo do conhecimento. Quando o professor está

aberto para aprender continuamente, deixa de se comportar como dono do saber e

não mais se centraliza como figura principal, sendo coadjuvante juntamente com o

aluno, como parte de um processo.

De acordo com a legislação vigente, a formação docente para o nível superior dá-se

em cursos de pós-graduação; sendo assim, perguntamos aos alunos qual seria a

função de um programa de mestrado e de doutorado.

Função do programa de pós-graduação: "no mestrado fazer pesquisa, é o início de

um treino para ser um futuro professor do ensino superior e no doutorado o

amadurecimento como pesquisador"; "mestrado para aperfeiçoar na pesquisa e o

doutorado para dar ênfase na pesquisa"; "no mestrado preparar uma linha de

pesquisa e o doutorado ênfase na pesquisa"; "mestrado é a preparação para o

doutorado"; "mestrado é preparação para a formação acadêmica de pesquisa.

Doutorado visa ser um pesquisador independente"; "o mestrado forma

pesquisadores e não se preocupa com o lado do ensino, até porque isso não é

cobrado" e, "o mestrado e o doutorado ensinam o aluno a pesquisar".

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Temos aí, novamente, apenas uma vertente da tríade pesquisa, ensino e extensão,

pois tanto o programa de mestrado quanto o de doutorado visam a

formação/preparação para a pesquisa, de acordo com as respostas dos alunos. O

ensino e a extensão não são abordados nas respostas referentes à função dos

programas de pós-graduação. Logo, a formação docente que é designação dos

programas de pós-graduação, conforme a Lei Federal 9394/96, não acontece em tal

processo de formação. É interessante registrar que, segundo os dados colhidos, o

estágio no PAE, que já foi destacado como uma atividade relevante para a formação

do pós-graduando para a docência no ensino superior, não aparece como parte

integrante do programa de mestrado e doutorado e sim, como uma atividade isolada

para complementar a formação que não ocorre no programa de pós-graduação.

Talvez porque o docente admitido na universidade como professor tenha seu plano

de carreira baseado em suas atividades de pesquisa, este seja um dos fatores que

supervalorizam a pesquisa e não o ensino. Entretanto, nas respostas mostradas

anteriormente, existe uma nítida separação entre a pesquisa e o ensino, por isso foi

solicitado aos alunos para comentarem como era a relação entre ensino e pesquisa

no programa de pós-graduação que cursavam, e como acreditavam que poderia ser

esta relação.

Relação entre ensino e pesquisa: "a relação é satisfatória"; "para melhorar a relação,

deve-se ter mais disciplinas para a área de educação"; " acredito que essa relação

ainda seja subjugada, ensino e pesquisa devem caminhar juntos"; "muito mais

pesquisa do que ensino"; "não existe uma relação direta, deveria existir uma parceria

entre os programas específicos com os programas voltados para área da educação";

"o ensino não tem uma atenção tão grande quanto a pesquisa, talvez pudessem ser

desenvolvidos conjuntamente e equilibradamente"; "relação muito breve, deveria

oferecer mais disciplinas obrigatórias voltadas para a educação"; " a pesquisa é

bastante estimulada" e, "mais pesquisa que ensino, os professores estão mais

preocupados em publicações do que com o ensino".

Parece-nos assim que, na universidade, as vertentes de pesquisa e ensino são

tratadas diferentemente quando deveriam fazer parte de um processo integrado de

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forma indissociável. Ensino e pesquisa são encarados separadamente como

atividades próprias e, às vezes, até polarizadas, mesmo quando as duas atividades

estão diretamente relacionadas ao conhecimento e sua produção.

A dicotomia existente está baseada em posturas divergentes assumidas pelo

professor enquanto profissional do ensino superior que, de um lado, se apresenta

como "inovador", quando faz pesquisa, e de outro, como "conservador", quando

leciona. Por que não transpor a inovação para a docência? Por que não romper com

essa esquizofrenia?

Até agora estamos analisando algumas características relevantes no processo de

preparação/formação do pós-graduando para a docência e temos notado alguns

problemas que efetivamente não colaboram para tal formação. Como conseqüência

destes problemas podemos ter algumas distorções na formação docente para o

ensino superior. Quando questionados sobre o que seria lecionar no ensino superior,

estas distorções ficam evidenciadas.

Lecionar no ensino superior: "é poder transmitir conhecimento para o crescimento

das pessoas"; "é saber repassar a informação de forma simples e eficaz"; "é ensinar

aos alunos como construir seu próprio conhecimento"; "direcionar os diversos

assuntos, para uma área específica"; "dar aulas em um nível mais elevado"; "tentar

desenvolver no aluno a capacidade de busca e relevância das informações frente à

uma idéia que se deseja confirmar" e, "ter conhecimento mais profundo sobre uma

determinada área; ter uma boa didática de forma a facilitar o entendimento do aluno

e interesse pela pesquisa".

Lecionar no ensino superior não é simplesmente transmitir o conhecimento

acumulado, é uma atividade que vai além dessa transmissão de conteúdos. É uma

atividade recíproca que envolve o professor e o aluno através de um processo de

ensino-aprendizagem que tem como principal característica a unidade, na qual o

professor precisa estar preparado para tanto. Por isso, deve ser mais do que apenas

não ser incompetente, deve ser também competente, assumindo que a competência

não se restringe a uma matéria ou um objeto, ou seja, ela passa a ser um conjunto

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de múltiplas determinações e características exigidas do professor e também do

aluno, pelo nosso tempo.

Sobre a relação ensino e pesquisa, os alunos ainda foram questionados sobre como

traduziriam enquanto docentes em uma IES, sua experiência na pesquisa em sala

de aula: "mostraria para os alunos os benefícios que a pesquisa me proporcionou

durante toda minha vida acadêmica, ou seja, as habilidades e conhecimento

adquiridos"; "relataria as principais dificuldades, os problemas encontrados no

método científico, as soluções empregadas; mostraria como um profissional pode

atuar na área de pesquisa"; "como forma de aula extra sobre pesquisa, no qual a

minha pesquisa seria um exemplo; explicaria como é realizada uma pesquisa na

universidade sobre um determinado assunto e, principalmente, qual a importância

desse tipo de pesquisa para a sociedade"; "traduziria em exemplos práticos do dia-a-

dia"; "muito proveitosa, pois é na sala de aula que o professor se auto analisa

percebendo seus defeitos e qualidades e também buscando sempre a melhora do

seu desempenho"; "citando exemplos e estimulando a auto-formação do aluno";

"tentar relacionar a pesquisa científica com o ensino, enfocando em sala de aula os

aspectos importantes que possam despertar também o interesse dos alunos pela

ciência" e, "uma vez que o resultado de uma pesquisa pode ser reportado na forma

de um artigo da literatura e que, em seguida, esta informação serve de base para os

conteúdos do livro-texto e também para alguns processos que ocorrem no dia-a-dia

profissional de um químico, trabalharia de modo a mostrar estas relações..."

De acordo com as respostas dos alunos, a pesquisa em geral aparece de forma

desvinculada do ensino, a relação entre as duas seria apenas como uma

demonstração durante as aulas de como se faz pesquisa e não, a incorporação da

pesquisa no ensino.

Ensinar não se restringe apenas à transmissão do conhecimento acumulado, assim

como a pesquisa é uma busca por respostas aos problemas existentes através da

produção de novos conhecimentos. Como o ensino e a pesquisa fazem parte da

atividade docente no ensino superior, a sala de aula apresenta-se como um rico

potencial a ser explorado pela pesquisa durante as atividades de ensino, ou seja, a

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pesquisa do ensinar deveria ser realizada por todos os professores dentro da

perspectiva da "indissociabilidade".

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Atividades como PAE, cursos de extensão e disciplinas ajudam o aluno a iniciar-se

e/ou consolidar-se nessa escolha profissional, à medida em que sua idéia central é

oferecer oportunidades e espaços para a reflexão sistemática, o intercâmbio

produtivo e a construção coletiva, de modo a assegurar o aprimoramento do saber

docente no ensino superior em todas as suas dimensões, respeitando sua

especificidade e pluralidade.

Para concluir nossa reflexão referente ao processo de formação profissional do pós-

graduando, e em particular à prática docente no ensino superior, apontamos a

necessidade de contemplar as demandas sugeridas pelos alunos, principalmente no

oferecimento de disciplinas/cursos da área de educação, como espaço para que

possam refletir sobre a atividade docente em nível superior, bem como possibilitar a

criação de uma identidade docente antes da prática.

A incorporação e sistematização destas atividades nos programas de pós-graduação

possibilitam criar elos entre o ensino e a pesquisa por meio de programas de

formação de recursos humanos para a pesquisa e a docência. Sendo assim, poder-

se-ia criar um espaço de reflexão e de problematização daquilo que tradicionalmente

não se debate, que são os procedimentos metodológicos no ensino superior.

Considerando uma perspectiva problematizadora e crítica, a vivência docente para o

pós-graduando auxilia a busca da superação das contradições e limitações da

prática docente no ensino superior, uma vez que as ações educam mais que os

discursos.

O estágio no processo de formação do pós-graduando para a docência em nível

superior pode estimular se bem direcionado, em uma perspectiva crítico-reflexiva,

levando os pós-graduandos a um pensamento autônomo e favorecendo uma

dinâmica de auto-formação diferente de uma formação autodidata. O estágio

também possibilita interações de troca, compartilhamento dos saberes, re-

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elaboração e re-significação do conhecimento entre os pares e um profissional

sênior na docência. Portanto, o estágio é um espaço que possibilita a criação e

recriação de diferentes práticas docentes.

A formação deve ser vista como um processo contínuo, baseado em uma vertente

de crescimento, isto é, não se deve entender a formação do pós-graduando como

uma somatória de disciplinas científicas com disciplinas pedagógicas e sim, como

um amadurecimento ao longo da formação inicial continuando em formação

posterior. Valorizando assim a experiência profissional, buscando através de uma

diversificação dos modelos e das práticas pedagógicas vigentes com a instituição de

novas relações dos professores com os saberes pedagógico e científico.

Acreditamos que, desta forma, a postura inovadora que norteia as atividades do

pesquisador transcendam para as atividades de ensino, rompendo com esta

dicotomia que separa o pesquisador do professor.

Cabe ressaltar, ainda, que um maior diálogo entre orientador e orientando sobre a

carreira docente e sua atividade fim poderia em muito contribuir para que as

próximas gerações de professores universitários pudessem levar a cabo o desafio

que lhes será colocado, ou seja, o de melhorar cada vez mais o ensino superior.

Neste espaço democrático de discussão poder-se-ia abordar os desafios de uma

profissão que exige de seus profissionais um perfil eclético de professor-orientador-

administrador e, mais recentemente, de inovador tecnológico.

Acreditamos na formação como investimento pessoal visando a construção de uma

identidade também profissional, que será fruto de um processo contínuo. Portanto, a

formação do pós-graduando em Química para a docência no ensino superior não

pode ser reduzida simplesmente ao cumprimento de disciplinas, deve-se também

promover oportunidades de vivência docente durante este processo, por meio de

uma integração destas atividades no programa de formação e não apenas como

atividades isoladas.

REFERÊNCIAS

1. Silva, T. T.; Identidades terminais, Vozes: Petrópolis, 1996. [ Links ]

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3. Pimenta, S. G.; Anastasiou, L. das G. C.; Docência no ensino superior, Cortez: São Paulo, 2002. [ Links ]

4. Maldaner, O. A.; Quim. Nova 1999, 22, 289. [ Links ]

5. Batista, S. H. S. da S.; Batista, N. A.; Em Formação docente: Rupturas e Possibilidades; Severino, A. J.; Fazenda, I. C. A., orgs.; Ed. Papirus: São Paulo, 2002. [ Links ]

6. Schön, D. A. Em Os professores e a sua formação; Nóvoa, A., coord. 2ª ed.; Dom Quixote: Lisboa, 1995. [ Links ]

7. André, M.; Simões, R. H. S.; Carvalho, J. M.; Brzezinki; I.; Educ. Soc. 1999, 68, 301. [ Links ]

8. http://www.iqsc.usp.br/iqsc/ensino/posgraduacao/docs/normas, acessada em Maio 2005.

9. Feitosa, J. P. A.; Quim. Nova 2002, 25, 153. [ Links ]

Recebido em 19/5/05; aceito em 21/12/05; publicado na web em 22/8/06

Anexo 1

Questionário usado para a coleta de dados Você se sente preparado para exercer a função docente no ensino superior? Na sua opinião, o programa de pós-graduação que você realiza visa a formação docente, ou seja,

visa uma formação nas três áreas de atuação da Universidade pesquisa-ensino-extensão? O que seria necessário para aperfeiçoar sua formação docente? Baseado na sua experiência como aluno de ensino superior, o que caracteriza um bom professor?

E um mal professor? Procure ser objetivo e conciso. Ainda baseando-se em sua experiência como aluno do ensino superior, o que você considera como

uma boa aula? Que tipo de atividades poderiam contribuir na sua formação docente para o ensino superior? Na sua opinião, qual é a função de um programa de mestrado? E qual seria a de um programa de

doutorado? Como é a relação entre ensino x pesquisa no seu programa de pós-graduação? E como você

acredita que poderia ser esta relação? O que é lecionar no ensino superior? Como você traduziria, se fosse docente em uma IES, sua experiência na pesquisa em sala de

aula?

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Cadernos de Pesquisa Print version ISSN 0100-1574

Cad. Pesqui. no.118 São Paulo Mar. 2003

doi: 10.1590/S0100-15742003000100003 TEMA EM DESTAQUE

FORMAÇÃO E PROFISSÃO DOCENTE: ALGUNS APORTES

DOCÊNCIA NA UNIVERSIDADE: professores inovadores na USP

Helena Coharik Chamlian Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo Departamento de Metodologia do Ensino e

Educação Comparada, E-mail: [email protected]

RESUMO

O artigo trata de pesquisa realizada com um grupo de professores inovadores da

Universidade de São Paulo tendo como objetivo procurar subsídios para a formação

do professor universitário. Esses docentes foram entrevistados, solicitando que

detalhassem melhor suas experiências inovadoras; explicassem as razões pelas

quais haviam introduzido modificações em sua forma de trabalho; explicitassem as

relações entre sua atividade de docência e de pesquisa, expressassem o papel que

atribuíam ao ensino na universidade, bem como a forma pela qual sua trajetória

acadêmica havia se cumprido até então. A diversidade de experiências relatadas e,

ao mesmo tempo, a convergência de visões a respeito de suas funções de ensino e

de pesquisa na universidade permitem-nos afirmar que, mais do que uma formação

pedagógica específica, a sensibilização para as dificuldades do ensino e a

valorização institucional dessa atividade consistiriam em grande avanço para a

formação do professor.

PROFESSOR UNIVERSITÁRIO – FORMAÇÃO DE PROFESSORES –

UNIVERSIDADE – ENSINO-PESQUISA – INOVAÇÃO EDUCATIVA

ABSTRACT

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This article relates a research made with innovator teachers of the University of São

Paulo, which aim was to search elements to rethink the educational formation

provided to university teachers. A group of these teachers was interviewed, in order

to obtain details about the nature of their innovations, to explain the reasons why

they introduced changes in their teaching, to explicit the relationship between their

teaching and research activities and to define the function that they had attributed to

teaching at the university. They were also asked to inform the way which their

academic trajectory had been carried out until then. The diversity of the collected

experiences and, at the same time, the convergence of ideas about the functions of

teaching and research led us to affirm that, more than a specific teaching education,

it would be a great improvement to teacher education, to become aware of teaching

difficulties, accompanied by institutional valorization of this activity

PROFESSORS – TEACHER EDUCATORS – UNIVERSITIES – INNOVATION

...o ensino e a pesquisa não se confundem [...] com o aprendizado de uma profissão.

Sua grandeza e seu infortúnio estão em constituírem ou um refúgio ou uma

missão.Lévi-Strauss, 1955, p. 46

Nos últimos anos, verifica-se um novo movimento de expansão de vagas nos cursos

de graduação das universidades públicas, especialmente no Estado de São Paulo.

Ele procura responder a vários tipos de pressão, dentre os quais se destaca o

próprio crescimento do ensino público de nível médio. Embora seja um movimento

de proporções limitadas ele é suficiente para que a questão da reposição/formação

do corpo docente das universidades seja objeto de discussão, corroborando a

tendência, também observada, de que a questão da formação do professor

universitário vem saindo dos bastidores para ocupar a cena pública.

Desde que nos propusemos a enfrentar esta questão, nosso principal foco tem sido

o de considerar a especificidade da atuação do docente de nível superior e os

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contextos institucionais que a determinam. Além disso, parece-nos temerário pensar

em intervir nessa formação sem ter delimitado um campo teórico específico e

adequado, que sirva de ponto de referência e de confronto para a própria

intervenção. Nessa perspectiva, o estudo das principais concepções sobre

universidade, formuladas ao longo de sua história, é fundamental para perceber de

que modo nelas se articulam as funções de ensino e pesquisa que, por sua vez,

norteiam as ênfases predominantes nas diversas organizações institucionais. Soma-

se a essa preocupação a tentativa de compreender como as universidades,

caudatárias de tradições seculares, vêm convivendo com fenômenos mais recentes,

tais como: a sua expansão e diversidade de funções, a massificação do ensino e a

sua própria reprodutibilidade.

De modo geral, podemos dizer que os problemas relacionados à questão do ensino

nas universidades, em toda a parte, têm suas raízes no chamado "éthos

acadêmico", que é a identificação fundamental do trabalho universitário com a

pesquisa. Essa é, também, a lógica da própria organização institucional da

universidade e a fonte de prestígio na atividade acadêmica1.

Definimos, portanto, como questão teórica central para nossa investigação sobre a

formação do professor universitário, a necessidade de compreensão da relação

ensino/pesquisa na universidade e suas decorrências para o exercício da função

docente.

Assistimos hoje à convivência de duas visões de universidade que ilustram as

contradições e os confrontos que esse nível de ensino enfrenta. A primeira delas

está ligada à sua concepção original de associação entre ensino e pesquisa e ao

caráter mais cultural que profissional atribuído a seus ensinamentos, exatamente por

suas atividades de pesquisa. A segunda visão está relacionada às evoluções

reclamadas pela conjuntura socioeconômica, necessitando de profissionais cada vez

mais qualificados e com perfis de formação mais flexíveis.

Um levantamento sobre a situação dos sistemas universitários pelo mundo,

publicado pela revista The Economist (Bireaud,1994), aponta para as contradições

entre as expectativas do universo acadêmico em relação ao trabalho na

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universidade, inclusive do ponto de vista dos agentes financeiros, voltadas

eminentemente para a pesquisa, e as expectativas da maioria de seu público, que

espera usufruir dos resultados dela gerados, por meio de um ensino e de uma

formação profissional de boa qualidade, que nem sempre se concretizam.

Concordamos com Bireaud, quando afirma que a existência e a natureza da

formação pedagógica dos professores de ensino superior são elementos desse

confronto. Além disso, segundo a mesma autora (1995), o modelo pedagógico

tradicional da universidade, traduzido pela "aula magistral" e pelas formas de

controle e avaliação, ainda não teve sua lógica rompida, a despeito da incorporação

de inovações de natureza tecnológica, representadas pela utilização dos meios e

recursos audiovisuais e da informática. Essa lógica é a da transmissão de um saber

que, para Lyotard (1986, p.58-9), "encontra a sua legitimidade em si próprio", porque

é fruto da pesquisa.

Para Santos (1997), tanto o modelo pedagógico quanto a pesquisa e o saber

produzidos na universidade apresentam sinais de degradação, porque a própria

idéia de universidade está em crise. A crise da universidade manifesta-se de

diversas formas e para este autor pode ser qualificada em três amplos aspectos,

entre si relacionados: crise de hegemonia, crise de legitimidade e crise institucional,

frutos da crise da própria modernidade.

No caso brasileiro, para pensarmos na versão nacional dessa crise, devemos

considerar a escassez de nossa tradição universitária – já que a universidade é de

história recente em nosso país, não tendo ainda completado um século –, e suas

relações com a estrutura econômica, política e social. Verificamos, obviamente, as

intensas repercussões produzidas sobre a universidade brasileira, pela forma como

nos estruturamos como sociedade moderna, na fase atual do capitalismo

organizado, que acirram suas contradições e aceleraram sua crise.

O ensino superior no Brasil apresenta-se hoje com uma estrutura de proporções

consideráveis, se comparado ao que era há 40 anos. Esse aumento de oferta

ocorreu especialmente pela atuação majoritária da iniciativa privada, que viu na

profissionalização de ensino superior um mercado lucrativo a ser explorado. O poder

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público, por sua vez, tendo alcançado o momento forte de expansão na década de

60 e primeira metade dos anos 70, retraiu os investimentos para a oferta de vagas e

cursos de graduação e concentrou sua ação no investimento à pesquisa,

favorecendo a implementação de cursos de pós-graduação.

A reforma universitária de 1968 estabeleceu como princípio norteador, para o

desenvolvimento da universidade brasileira, a indissociabilidade entre ensino e

pesquisa. Este princípio, formal e obrigatório, acabou por transformar todos os

professores universitários em professores pesquisadores2. A despeito do grande

avanço que tal medida significou para a estruturação das universidades, ela também

tem produzido "uma grande burocratização da pesquisa e uma enorme

desvalorização da atividade docente" (Nogueira, 1989, p.36)3.

Com a implementação dos cursos de pós-graduação, por sua vez, procurava-se

oferecer uma das vias pelas quais esse tipo de professor pesquisador poderia ser

formado. Argumentava-se, então, que tais cursos teriam como objetivo a formação

do professorado competente para atender à expansão do ensino superior,

assegurando, ao mesmo tempo, a elevação dos níveis de qualidade. De fato, no que

diz respeito às universidades, e também a muitas instituições isoladas de ensino

superior, os cursos de pós-graduação tornaram-se, de lá para cá, a principal fonte de

formação do professorado do ensino superior. Mas, além disto, estes cursos tinham

também como objetivo o estímulo ao desenvolvimento da pesquisa científica, por

meio da preparação adequada de pesquisadores.

Mediante medidas concretas, os diversos planos nacionais de pós-graduação

acentuaram cada vez mais esse último objetivo. Porém, os cursos de pós-graduação

continuaram a ser, ainda que de forma secundária, a via preponderante de formação

do professor universitário.

Com a expansão do sistema de ensino superior, a tarefa de gestão e controle desse

sistema, por parte do governo federal, torna-se cada vez mais complexa, uma vez

que a diversidade das instituições existentes e a qualidade do ensino oferecido

passam a exigir normas disciplinadoras e orientadoras. É com esse caráter que se

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recomenda, por exemplo, a criação da disciplina Metodologia do Ensino Superior

como uma disciplina pedagógica, na pós-graduação4.

Mais recentemente, no início de 1999, uma medida adotada pela Coordenação de

Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior – Capes – passou a tornar

obrigatório o estágio supervisionado na docência como parte das atividades dos

bolsistas de mestrado e de doutorado sob sua tutela, apontando para a necessidade

de alguma formação de caráter pedagógico para aqueles que, realizando cursos de

pós-graduação, têm na atividade docente em nível superior um campo de trabalho

possível.

O sistema superior privado paulatinamente, também, passou a oferecer cursos após

a graduação, denominados cursos de pós-graduação lato sensu, que não conduzem

à obtenção do mestrado e do doutorado, mas que, de algum modo, ofereciam uma

espécie de aperfeiçoamento e preparação à atividade docente nessas instituições. A

disciplina Metodologia do Ensino Superior era parte integrante da maioria dos

currículos desses cursos.

Na USP, o equivalente a essa preocupação reside na iniciativa da reitoria da

universidade de introduzir, nos anos 90, um Programa de Aperfeiçoamento do

Ensino – PAE –, criando bolsas de monitoria para os pós-graduandos como parte de

sua formação. Mais recentemente, esse programa passou a incluir ainda uma etapa,

preliminar e obrigatória, de preparação pedagógica para todos os candidatos à

monitoria.

Essas preocupações estiveram presentes no momento em que nos dispusemos a

investigar a ótica de alguns professores da USP, que haviam participado de um

encontro sobre experiências inovadoras de ensino na universidade sobre a função

docente por eles praticada e, conseqüentemente, sobre suas percepções a respeito

da necessidade de formação pedagógica específica para o exercício dessa função.

Tivemos como pressuposto que o conhecimento de práticas bem-sucedidas no

ensino de graduação, concebidas para solucionar problemas peculiares enfrentados

pelos professores, nos auxiliariam a compreender melhor a natureza do trabalho que

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desenvolviam e o contexto de sua preocupações. De qualquer modo, sempre

tivemos claro que, quaisquer que elas fossem, dependiam de uma percepção

precisa sobre a função do ensino e sobre o papel que a universidade deve

desempenhar na formação de seus alunos.

As entrevistas foram realizadas durante o ano de 1994, quando o novo momento de

expansão da graduação da Universidade de São Paulo – USP – ainda era incipiente.

Podemos dizer que tal expansão ainda não afetou drasticamente as práticas

vigentes na universidade e os elementos obtidos nos depoimentos continuam

extremamente relevantes para as questões que, neste momento, compõem o

cenário para a discussão sobre a formação do professor universitário.

Este artigo procura, portanto, apresentar os resultados da investigação realizada,

buscando contribuir com essa discussão. O exemplo da USP ilustra o trabalho

cotidiano dos professores que constroem a profissão docente no ensino superior.

AS ESPECIFICIDADES DO CAMPO INVESTIGADO

Cientes das dificuldades de generalizar os resultados de pesquisa, tal como a que

empreendemos, consideramos necessário explicitar as particularidades da USP,

palco de atuação de nossos entrevistados.

A criação da Universidade de São Paulo, em 1934, significou, como é sabido, um

grande avanço em termos da concepção de universidade no Brasil, pela função

atribuída à Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, e pela vinda de missões de

professores estrangeiros, alguns já eminentes em seu campo e outros que viriam a

sê-lo, para nela trabalharem5.

A Faculdade de Filosofia foi pensada, inicialmente, como uma instituição de altos

estudos, de caráter geral e não profissionalizante e que, como elemento integrador

da universidade, reuniu as escolas de formação profissional como a Faculdade de

Direito, a Faculdade de Medicina e a Escola Politécnica.

Os professores estrangeiros que por ela passaram, especialmente até 1939,

deixaram sua marca causando, segundo Antunha (1974), a moratória do rígido

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sistema de cátedras, implantado no ensino superior do país, desde as suas origens6.

Além disso, a missão estrangeira produziu um "grande impacto pedagógico no meio

relativamente acanhado da época e contribuiu para a implantação efetiva da

investigação e dos altos estudos em setores até então absolutamente

desconhecidos em nosso meio" (Antunha, 1974, p.45-6).

A conjugação dessas duas medidas, a nosso ver, permitiu que, na sua origem, a

Universidade de São Paulo adquirisse um caráter distinto das demais instituições de

ensino superior existentes e, desde logo, definisse sua vocação para a investigação

do saber, concretizada pela dedicação plena à atividade de pesquisa. Ao longo de

toda sua história, parece-nos que tal vocação não foi menosprezada, e poderíamos

mesmo afirmar que se há uma idéia ou concepção que defina a USP ela está

necessariamente vinculada à sua vocação para a pesquisa.

A Prof. Maria Isaura Pereira de Queiroz (1995), procura demonstrar como o

surgimento da USP somou outras reivindicações, além da de formação de bons

profissionais, que era o caso das grandes escolas. Segundo ela, a expansão da

pesquisa, e a conseqüente ampliação do saber, passou a ser reconhecida como

uma função tão importante quanto a constituição de um conjunto de profissionais de

alto nível. Esta maneira de pensar poderia ser demonstrada pela defesa da

dedicação plena às atividades, como meio de desenvolvimento das ciências; pela

organização, já em 1948, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência –

SBPC – e, mais tarde, pela mesma intenção de proteger a expansão do

conhecimento e a iniciativa, ligada à USP, pela criação da Fundação de Amparo à

Pesquisa do Estado de São Paulo – Fapesp –, que se concretizou em 1962.

Ainda, segundo Antunha (1974), a filosofia de universidade que caracterizou a USP

nos anos de sua fundação pode ser resumida nos seguintes princípios: a)

universalidade de campo; b) idéia de integração; c) autonomia universitária. A

despeito de todas as vicissitudes pelas quais esses princípios possam ter passado

na existência concreta da instituição, eles sempre estiveram presentes como

concepção de universidade7.

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A Reforma Universitária de 1968 não alterou substancialmente essa filosofia, ao

contrário, enfatizou alguns desses aspectos. Assim, estabeleceu como princípios:

unidade de patrimônio e de administração; estrutura orgânica com base em

departamentos, reunidos ou não em unidades mais amplas; unidade de funções de

ensino e de pesquisa, vedada a duplicação de meios para fins idênticos ou

eqüivalentes; racionalidade de organização, universalidade de campo, pelo cultivo

das áreas fundamentais dos conhecimentos humanos; flexibilidade de métodos e

critérios, com vistas às diferenças individuais dos alunos, às peculiaridades regionais

e às possibilidades de combinação de conhecimentos para novos cursos e

programas de pesquisa (art. 11, Lei n. 5.540/68).

Com a reforma, os cursos de pós-graduação foram disciplinados e passaram a

exercer duas funções importantes para a universidade: o desenvolvimento da

pesquisa e a formação de seus quadros docentes.

A dimensão da USP, em 1994, quando realizamos as entrevistas, colocava-a entre

uma das maiores universidades do país, sendo reconhecida como centro de

excelência e sendo, sozinha, responsável por quase 50% de toda a pesquisa

realizada no Brasil8. Nesse sentido, compreender como a questão do ensino,

especialmente de graduação, é articulada no conjunto de atividades de seus

professores, parece-nos extremamente relevante para nosso tema de estudo. Para

tanto, apresentaremos alguns dados diretamente envolvidos com a atividade

docente na USP, no momento em que nossa investigação foi realizada,

compreendendo o número de cursos de graduação e de pós-graduação oferecidos,

o número de alunos de graduação e de pós-graduação matriculados, bem como o

total de docentes por regime de trabalho, que podem auxiliar-nos a ilustrar a

dimensão do problema.

Em 1994, a USP contava com um total de 47 entidades e 210 departamentos, que

ofereciam o seguinte agrupamento de cursos de graduação e de pós-graduação.

Verifica-se, portanto, que o grande esforço da USP, do ponto de vista do ensino,

concentra-se na pós-graduação. Do total de 604 cursos regularmente ministrados

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em 1994, 474 (78,4%) destinavam-se à pós-graduação, enquanto os cursos de

graduação representavam 21,6% do total.

A distribuição dos alunos por esses mesmos cursos era a seguinte:

Podemos observar, pelos dois últimos quadros, que, embora o número de alunos de

pós-graduação seja inferior aos de graduação, eles já constituem um volume

bastante considerável. Esse dado é ainda mais importante se observarmos que os

alunos de pós-graduação têm, obrigatoriamente, um docente orientador, por eles

responsável.

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Nesse sentido, o número de docentes atuando é importante para melhor avaliarmos

o quadro do desempenho da atividade de ensino na universidade.

Verificamos, portanto, que 49,74% dos docentes da USP concentravam-se na

categoria MS3 (professor assistente doutor). Destes, 75,71% encontravam-se em

regime de dedicação integral à docência e à pesquisa – RDIDP. Esse dado reforça,

a nosso ver, a tendência à valorização da pós-graduação na USP, uma vez que só

trabalham nesse nível docentes com, no mínimo, título de doutor. Ora, as categorias

MS1 e MS2, compostas por graduados e mestres, juntas perfazem 20,30% do total

de docentes e é de se supor que boa parte do ensino de graduação esteja sob sua

responsabilidade, uma vez que não podem trabalhar na pós-graduação.

Desse modo, do ponto de vista do ensino, a USP demonstra estar encaminhando

seus esforços não mais para a graduação, mas sim para a pós-graduação. Esse

percurso tem algumas causas e também decorrências.

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O trabalho de Queiroz já apontava, para o ano de 1984, que tão grande tinha sido o

desenvolvimento do ensino superior no Estado de São Paulo, que a quantidade dos

diplomados pela USP representava 8,65% do total. Portanto, não podia mais ser

considerada a instituição provedora de profissionais para a região e para o país.

Porém, acrescentava, "o próprio crescimento e funcionamento da USP foi dando

impulso a outros objetivos que ganharam vulto cada vez maior: a formação de

cientistas, por exemplo, acompanhada e acompanhando a expansão e o

aprofundamento das pesquisas" (Queiroz, 1995, p.20).

Parece-nos que a expansão dos cursos de pós-graduação traduz essa direção.

Nesse sentido, é de se supor que a ênfase na formação de cientistas e na ampliação

do saber concentra os esforços da atividade na universidade. Esta situação se

traduz na expressão "valorização da pesquisa", em referência às principais funções

atribuídas à universidade: ensino, pesquisa e extensão.

A atividade docente, por sua vez, embora pressuponha a pesquisa, não se limita a

ela, e a sua valorização tem-se constituído em fonte de tensão para a maioria dos

docentes que depositam, também na atividade de ensino, o objetivo de seu

trabalho9.

Essa tensão tem sido expressa, nos últimos anos, por ações de natureza diversa,

por exemplo, freqüentes tentativas de reformulação curricular dos cursos de

graduação, pela discussão sobre a finalidade desses cursos, pela busca de modelos

metodológicos alternativos para a atividade docente em sala de aula.

Foi com base nessas percepções que nos pusemos a campo para a realização das

entrevistas com os docentes da USP, e o esforço realizado nesse sentido é o que

relataremos a seguir.

A PESQUISA10

Como já dissemos, entrevistamos um grupo de professores que participou do

Seminário sobre Experiências Inovadoras de Ensino11, realizado na Faculdade de

Educação, em 1991. Eles se dispuseram a relatar sua experiência como professores

da universidade, explicando as inovações introduzidas em sua docência e as razões

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pelas quais haviam introduzido essas modificações. Perguntamos, ainda, como

percebiam as relações entre seu trabalho de ensino e de pesquisa e o papel que

atribuíam ao ensino na universidade, bem como se cumprira sua trajetória

acadêmica até então, especialmente quanto ao ensino e se, de início sentiam-se

aptos para tal atividade.

Nesse sentido, estávamos menos preocupados em conhecer e descrever as ações

inovadoras e mais atentos às razões que levaram aqueles docentes a mudar sua

prática, bem como às relações entre essas mudanças e uma concepção de ensino

na universidade. A proposição de questões sobre sua própria preparação para a

atividade docente e sobre a maneira pela qual encaravam a formação de novos

professores, baseados em sua própria experiência, pretendia estabelecer uma

interlocução que permitisse pensar de forma mais plural sobre o tema.

Os relatos dos professores entrevistados sobre as dificuldades que enfrentaram

como docentes e as tentativas para solucioná-las caracterizaram-se, na maior parte

das vezes, como verdadeiros relatos de vida e de percurso profissional. A maior

parte desse percurso foi realizada na própria universidade, e muitos dos

entrevistados incluíram experiências de colegas e até das unidades em que

trabalhavam em seus exemplos, o que, de certa forma, ampliava o campo de suas

considerações. Nesse sentido, esses relatos apresentaram alguns elementos

significativos sobre as transformações ocorridas na vida acadêmica da USP,

especialmente nos últimos 30 anos. Desse modo, além dos objetivos inicialmente

previstos, o material obtido tem um rico potencial para ser explorado como fonte de

conhecimento da memória recente da universidade.

Descrição dos dados

Foram entrevistados, durante o período de novembro de 1994 a junho de 1995, 18

professores, de um total de 53 experiências relatadas no encontro. Do ponto de vista

estatístico, os entrevistados representaram 34% do universo inicial. Dadas as

características da investigação, consideramos o retorno razoável, uma vez que um

dos nossos pressupostos era o de que os professores deveriam participar

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voluntariamente, sem pressão de nossa parte, e sobretudo sem se sentirem

constrangidos ou avaliados.

Conversamos com dez professores do sexo feminino e oito do sexo masculino. A

idade média do grupo concentra-se entre 45 e 50 anos, havendo apenas um

professor12 com mais de 60 anos e outro com menos de 40. Solicitamos, ainda, que

os professores preenchessem uma ficha que continha dados pessoais, incluindo

informações sobre sua formação. Três deles não o fizeram, de modo que os quadros

a seguir somente serão relativos às informações obtidas pelas fichas.

Caracterização do grupo pesquisado

Os dados relativos à formação são interessantes porque a amostra, composta

aleatoriamente por aqueles que se dispuseram a colaborar, reproduziu a distribuição

dos docentes por áreas na universidade. O quadro a seguir ilustra essa observação:

Desse modo, as áreas mais representadas na amostra foram a de ciências humanas

e a da saúde, as duas mais numerosas da universidade.

No que diz respeito à titulação, surgiu um componente extremamente interessante: a

categoria mais numerosa foi a de professores doutores (seis entrevistados),

repetindo o que acontece na universidade. Entretanto, as categorias de professor

titular (quatro entrevistados) e de livre-docente (três entrevistados), se somadas,

ultrapassaram o número de doutores.

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Essa composição do grupo permite-nos algumas suposições: a primeira delas seria

a de que os professores, nos estágios mais avançados da carreira universitária,

estariam mais livres, do ponto de vista da produção do conhecimento ou da pressão

da carreira, para se debruçarem sobre as questões de ensino. Ou, ainda, a de que

com maior tempo de experiência no ensino, se sentiram mais seguros para

experimentar novas fórmulas de ensinar.

O tempo de magistério na universidade, a nosso ver, reforça essas suposições.

Como podemos perceber, a maior parte da amostra possuía entre 15 a 25 anos de

experiência na universidade, o que nos faz supor que não passaram incólumes

pelas questões implícitas na atividade de ensino.

A nosso ver, outro elemento complementar para esse conjunto de suposições diz

respeito aos cargos e funções ocupados pelos professores entrevistados. Quatro

deles eram chefes de departamento, um era vice-chefe, quatro estavam vinculados a

comissões de ensino na graduação e na pós-graduação e um era vice-diretor. Ora,

esses postos naturalmente tendem a encaminhar as reflexões de seus ocupantes

para questões mais gerais da vida da universidade e, no caso das comissões de

ensino, diretamente para a natureza das atividades desenvolvidas pelos cursos sob

sua direção. Para nós, essas correspondências não são ocasionais, mas refletem o

perfil do trabalho desenvolvido pelos docentes.

As entrevistas realizadas, por sua vez, permitiram configurar ainda melhor a

trajetória acadêmica desses docentes. O relato das dificuldades enfrentadas como

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professores permitiu-nos perceber que a maior parte delas dizia respeito à

necessidade de um tratamento mais adequado ao conteúdo desenvolvido, tendo em

vista a melhor assimilação por parte do aluno, e a questões relativas aos processos

e critérios de avaliação.

As soluções encontradas por eles foram as mais diversificadas, abrangendo desde

experiências completas de reformulação curricular até a introdução de pequenas

inovações na prática cotidiana em sala de aula.

Arrolaremos a seguir os tipos de inovações descritos nas entrevistas:

reformulação curricular;

modificação nas características das atividades de estágio, encaminhando os

alunos para a vivência de situações mais concretas ou para a iniciação à

pesquisa;

criação de disciplina optativa como caminho de transição entre a formação do

especialista e a formação do professor;

criação de laboratório de brinquedos para servir de estímulo à pesquisa no

ensino;

desenvolvimento de cursos em estreita relação com as necessidades do

mercado de trabalho, ou ainda, utilizando as próprias instalações industriais

como sala de aula;

reformulação das atividades de laboratório através da proposição de

problemas cujas soluções são desconhecidas até pelo próprio professor,

introduzindo uma questão de investigação real e não simulada;

criação de oficinas para redação científica;

utilização de recursos tecnológicos, como a informática ou multimídia, para o

desenvolvimento de conteúdos em sala de aula;

adoção de recursos didáticos alternativos à aula expositiva;

tratamento didático do conteúdo, organizado por unidades completas;

utilização de exercícios programados substituindo a prova final única.

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Além da diversidade inerente a essas experiências foi possível observar o exercício

da criatividade desses professores que, diante de situações de crise, ou que assim

lhes pareciam, souberam encontrar soluções para seus problemas, apoiados ou não

em teorias pedagógicas, mas sem dúvida na sua reflexão sobre os problemas de

formação em sua área de conhecimento.

A avaliação que fizeram de suas experiências foi, na grande maioria das vezes,

extremamente positiva. Todos eles afirmaram que aprenderam com elas e,

sobretudo, que muitas delas alteraram profundamente o rumo de suas práticas

docentes e até de suas investigações.

Muitos deles afirmaram, ainda, que se tornaram mais seguros como professores e

mais bem capacitados para enfrentar situações adversas. Conseguiram, inclusive,

perceber melhor sua função como pesquisadores.

Quanto à função do ensino na universidade, houve unanimidade no grupo em

relação à sua importância. Para alguns, o ensino é a verdadeira razão de ser da

universidade. Outros afirmaram que o ensino é indissociável da pesquisa. Não

houve nenhuma afirmação categórica, nesse grupo, sobre a primazia da pesquisa

em detrimento da atividade de ensino.

A maior parte concordou, entretanto, que na universidade a atividade de pesquisa é

supervalorizada, e que na realidade ela se sobrepõe ao ensino. Para o Prof.

Bayardo, por exemplo, já existiam critérios suficientemente explícitos que permitem

avaliar o trabalho científico, ao passo que não havia nem a consideração sobre os

tipos de critérios para avaliar a atividade de docência. Diante disso, a prática

cotidiana da vida acadêmica tem seu rumo previamente traçado: pesquisar, escrever

e publicar. Trata-se de uma verdadeira lei de sobrevivência para aqueles que

querem perseguir a carreira universitária na USP.

Apesar disso, todos concordaram que a universidade deve ser um centro de

produção, de reprodução e de irradiação do saber. Trata-se, portanto, neste

momento, de um ajuste de rumos, de modo que todas as suas funções sejam

plenamente exercidas.

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Análise dos depoimentos

Iremos, neste momento, destacar algumas idéias apresentadas pelos entrevistados,

procurando aproximá-las das questões que nortearam a investigação.

Um grupo significativo dos entrevistados apontou como experiência inovadora a

participação em processo de reformulação curricular, seja dirigindo o processo, seja

introduzindo e trabalhando uma nova disciplina. Esses elementos nos fizeram supor

que houve, nos últimos 20 anos, um movimento no sentido de ajuste dos conteúdos

ensinados às transformações ocorridas em diversos campos do conhecimento. Uma

outra dedução a ser feita é de que participar do processo era também uma forma de

responder às preocupações com a atividade de ensino na universidade.

Os relatos demonstraram, por sua vez, que nesse processo foi aumentando a

percepção de que reformular currículo não era suficiente, se não implicasse também

mudança de mentalidade do professor sobre o papel do ensino na universidade.

A esse respeito reproduzimos as seguintes observações:

O bom professor precisa ser um bom cidadão, ensinar a pensar, a criticar, a ser

curioso. Tem que ser motivado para motivar o aluno. A universidade perdeu um

pouco essa perspectiva... (Lígia Marcondes)

A minha primeira constatação é de que o departamento não tinha um projeto para a

graduação. O curso era uma soma de disciplinas, o que me choca como docente,

porque eu também sou assim, é que nenhum docente se sente responsável pelo

fracasso da graduação. Ele normalmente acha que sua disciplina é ótima, que o

aluno não tem base, e remete essa questão para o colégio. Ele não aceita que

individualmente é o responsável pela graduação. Esse é o maior problema e por isso

é que a participação dos alunos foi fundamental... (Maria de Fátima Tálamo)

O que me chama a atenção é que nos últimos 20 anos as formas de comunicação

nacionais e internacionais mudaram radicalmente. E se a gente olha a forma como

os cursos se desenvolvem na universidade, as modificações foram modestas. Então,

esse descompasso tem que acontecer... Falta uma análise mais criteriosa do

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porquê, e uma maneira de canalizar essas inadequações, que são pontuais, para

uma reforma mais produtiva, que não seja cosmética, pois tirar e pôr disciplina é

cosmético, e não chega ao ponto essencial que é o de se perguntar: qual o papel da

universidade? Se o papel dela continua sendo apenas o de transferir informações...

(Bayardo Torres)

Um outro movimento que pode ser deduzido dos relatos dos professores foi uma

busca de integração maior entre as atividades de ensino, pesquisa e extensão; o

movimento foi elaborado no âmbito dos departamentos e das unidades e,

especialmente, no trabalho particular dos docentes.

Esse é o caso especial das disciplinas com uma interface profissionalizante maior e

muitos dos professores que nelas trabalham procuraram estabelecer uma ponte

entre a formação e o mercado de trabalho, aproveitando para prestar assistência à

comunidade e utilizando-se dessa relação como fonte para a reflexão em seu

campo, na tentativa de estabelecer maior articulação entre a teoria e a prática.

Alguns depoimentos revelam essa tendência:

Esse projeto (minicursos) monta uma trilogia que tem a ver com ensino, pesquisa e

prestação de serviço. Ele serve para nós, professores de prática, para estarmos

discutindo a nossa prática... e, também do ponto de vista de nossas pesquisas... Nós

estamos usando nossos cursos como referencial para nossas pesquisas. (Glaúcia

Marote Ferro)

Assim teríamos na escola uma escala: estágios, residência e a empresa júnior. A

avaliação do projeto pode ser feita, portanto, a partir de três elementos: a melhoria

na qualidade dos projetos, o interesse demonstrado por empresas que nos procuram

oferecendo vagas e pela colocação dos alunos recém-formados. Além das

avaliações formais do programa, estamos notando uma melhoria, uma evolução dos

alunos. (Júlio Marcos Filho)

Eu me formei em 1968, e até 1980, quando voltei para a universidade, tive uma

vivência fora da escola. Durante um determinado período eu levei os meus alunos a

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freqüentar permanentemente a fábrica porque eu achava que os conceitos de

planejamento e controle de produção e as questões propostas nos livros eram muito

distantes da prática, já que o cotidiano tem variáveis que o livro não contempla.

(José Benedito Sacomano)

Dar aula é uma das coisas que eu mais gosto... É o espaço que sintetiza minha

produção teórica, todas essas assessorias... Daí a importância para um profissional

da universidade de fazer tanto o trabalho de pesquisa como o de extensão... (Tizuko

M. Kishimoto)

Um outro tema muito presente nos relatos foi o da relação dos professores com a

utilização dos recursos multimídia e a informática para a solução de questões de

ensino particulares, como o desenvolvimento de um conteúdo específico, e também

para responder a exigências de uma população escolar cada vez mais familiarizada

com esses recursos. O fenômeno vem se incorporando à atividade universitária nos

últimos anos.

Todas as experiências em termos de ensino modificam, desde que o interesse seja

melhorar. Esta experiência deu uma dimensão das possibilidades do esforço que o

professor faz para modificar a atitude dos alunos perante a disciplina. Eu senti que

houve uma receptividade muito boa por parte deles, reconhecendo o esforço para

modernizar e se responsabilizando em dar a contrapartida. Eu me senti mais otimista

como professor e abandonei em definitivo a perspectiva de que os alunos não estão

interessados. (Antonio Salatino)

Minha perspectiva como professora mudou na medida em que eu percebi que era

preciso aprender mais. Não podia usar instrumentos, técnicas ultrapassadas. Porque

a gente fica aqui na USP o resto da vida, e eu não posso usar o slide de 30 anos

atrás... (até posso, desde que no contexto apropriado) [...] Eu acho que com o vídeo

e com a multimídia e com a quantidade de informações que batem no aluno por

minuto, eles exigem do professor um maior conhecimento, maior atualização...

(Sheila W. Ornestein)

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No que diz respeito à sua preparação para a docência universitária, a maioria

revelou não se considerar preparada, no início da carreira, para assumir a função.

Observamos, por outro lado, que para superar sua insegurança, alguns buscaram

imitar professores que admiravam, outros foram instruídos por seus orientadores ou

colegas, outros procuraram fazer cursos extracurriculares, outros, ainda, foram se

iniciando aos poucos como docentes voluntários ou trabalhando em aulas práticas e

seminários. As seguintes considerações refletem um pouco essas situações:

Eu não estava, mas a estrutura da USP está madura para não dar responsabilidade

ao novato. Ele pode dar aulas práticas, por exemplo, até que gradativamente possa

assumir a responsabilidade pelas aulas... A independência em termos pedagógicos

só acontece quando o professor está preparado para a livre docência... (Antonio

Salatino)

Uma outra percepção importante extraída dos relatos é a consciência desses

professores de que trabalham em centros de excelência e a responsabilidade que

isso representa. Além disso, manifestaram o sentimento de não estarem plenamente

satisfeitos e o desejo de aperfeiçoar ainda mais sua atuação. Desse modo, se

inicialmente nossa hipótese de pesquisa era a de que os professores inovadores

possuíam uma visão sobre o papel do ensino também como parte do "éthos

acadêmico" na universidade, com os depoimentos, ela foi plenamente confirmada.

Há algum tempo atrás, saiu no Jornal da USP um artigo do Hugo Armelin em que ele

comenta que a USP é uma universidade de pesquisa. Eu tenho aqui um colega mais

exagerado, que diz que não estamos aqui para formar arquitetos, mas para educar

pessoas, passar para elas um conhecimento universal e quem quiser ter um

conhecimento profissional faz estágio, se forma e vai trabalhar em um escritório...

Quer dizer, a USP é uma universidade de pesquisa. Os alunos que aqui entram

podem e devem sair ótimos arquitetos, mas a gente vai mais além. Eu acho que o

nosso papel é de educação e de transmitir um conhecimento para o

desenvolvimento científico. Eu acho que é esse o papel do nosso ensino, essa é a

proposta da USP. (Sheila W. Ornstein)

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Na USP, ainda temos a pesquisa primeiro, em segundo lugar o ensino e a extensão

em terceiro. A pesquisa deve estar muito entrosada com o ensino, e as pró reitorias

trabalhando isoladas não promovem isso. A própria carreira é uma questão

estrutural que se reflete no comportamento... Um bom pesquisador, Antonio

Cândido, por exemplo, se impôs pela sua obra e, também, porque foi um bom

professor... (Lígia Chiappini)

A concepção de ensino por eles expressa é a que rege a universidade em seus

moldes atuais, ou seja, a que vincula as atividades de ensino e pesquisa como

indissociáveis. Talvez possamos dizer que esses professores souberam encontrar

as vias para realizar tal vínculo em seu trabalho cotidiano, concebendo-o mais como

uma missão do que como uma tarefa burocrática.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Retomando as hipóteses iniciais que conduziram a investigação, ou seja, procurar,

na experiência de professores bem-sucedidos, indícios da necessidade, ou não, de

formação pedagógica para o professor de ensino superior, temos condição de dizer,

pelo conjunto de respostas, que mais do que uma formação pedagógica, em sentido

estrito, a necessidade está no despertar da valorização da tarefa de ensino.

Na diversidade de soluções encontradas pelos entrevistados, pudemos perceber

que uma disciplina voltada para a formação pedagógica estrita dificilmente daria

conta de preencher a variedade de necessidades que cada curso e que cada

professor apresentavam. Os próprios professores entrevistados foram reticentes

quanto à introdução de uma disciplina dessa natureza no âmbito da pós-graduação,

quando convidados a apresentar sugestões para uma formação mais adequada do

professor universitário. Pareceu-lhes mais evidente sugerir um acompanhamento do

trabalho do jovem professor e uma introdução gradativa no assumir a tarefa de

ensino.

Nesse sentido, podemos dizer que esses professores mantiveram-se fiéis à tradição

artesanal de formação de professores na universidade que, por sua vez,

correspondeu basicamente à sua própria experiência de formação. Vale recordar

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aqui a entrevista concedida a Annie Bireaud por Pierre Lena13: ele salienta a

importância do ensino, função primordial da universidade, e considera indispensável

que para exercê-la haja um conhecimento sobre o "empreendimento universitário".

Quanto à formação pedagógica, ele se diz cético em relação ao fato de que a

pedagogia é algo que se possa aprender e encara a formação pedagógica mais

como uma sensibilização aos problemas de comunicação. À fórmula "formação

pedagógica" ele preferiria uma expressão como "sensibilização à dificuldade

pedagógica". Quanto às modalidades de formação ele prefere cultivar "o

companheirismo que faz passar progressivamente dos bancos escolares ao quadro

negro" (apud Bireaud,1994, p.6-7).

A ampliação quantitativa dos contingentes universitários, por outro lado, dificilmente

permitirá que a tradição artesanal seja mantida. Embora eficiente e necessária, ela

não impedirá a implementação de outras soluções para enfrentar a questão da

reprodutibilidade da universidade. Os rumos que as universidades vêm assumindo,

inclusive no contexto internacional, diante das novas exigências que o fenômeno da

massificação do ensino superior tem colocado para as instituições universitárias,

fazem com que, segundo Bireaud (1995), o tema formação do professor de ensino

superior saia dos bastidores, para fazer parte do cenário14.

No caso brasileiro, a alternativa de introduzir, nos cursos de pós graduação, uma

disciplina específica de formação, que geralmente tem sido denominada

Metodologia de Ensino Superior, é a solução considerada, aparentemente, como a

mais viável.

Um estudo de Berbel (1994), de amplitude nacional, sobre a maneira pela qual a

disciplina Metodologia do Ensino Superior era organizada e ministrada, revela que,

salvo raras exceções, ela apresentava-se como disciplina que reproduzia as

temáticas das disciplinas pedagógicas das licenciaturas, e acentuava seu caráter

pragmático de orientação para a condução da atividade docente em sala de aula,

com especial ênfase na utilização de recursos tecnológicos, para suporte das

exposições. Podemos dizer que, com isso, os programas dessa disciplina assumiam

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um caráter prescritivo e normativo, mal, aliás, que assola a maioria das disciplinas

que têm constituído o campo da formação do professor em geral, no país.

Pensamos que uma disciplina dessa natureza envolve um domínio preciso do

conteúdo da área, aspecto que consideramos fundamental para o profissional que

dela se encarregue. Essa, aliás, não é uma questão relativa apenas à Metodologia

do Ensino Superior, na qual obviamente a questão é crucial, mas a toda e qualquer

metodologia do ensino.

A nosso ver, a precaução de nossos entrevistados, ao responder sobre uma

formação pedagógica específica, foi devida, justamente, à dificuldade de se

vislumbrar um profissional que fosse, ao mesmo tempo, especialista em sua área de

conhecimento e altamente inclinado para as questões de ensino em sua disciplina15.

Além disso, nossa preocupação, referente às concepções de universidade que

sustentavam as ações dos docentes entrevistados, está relacionada à maneira de

concebermos o próprio ensino. Para nós, a atividade docente sustenta-se sempre

por algumas convicções que induzem a procedimentos, a atitudes e ao próprio

tratamento do conteúdo ensinado. Essas convicções, por sua vez, têm sua raiz em

visões de mundo, de sociedade e de educação, que se refletem e se traduzem na

organização institucional.

Nesse sentido, a compreensão do contexto institucional da universidade, não só em

nosso país, como em muitos outros, permitiu-nos perceber que, mesmo para os

professores que valorizam a tarefa de ensinar, o "éthos acadêmico" do vínculo entre

ensino e pesquisa, como concepção de universidade, é muito presente. E, nesse

sentido, para que os professores universitários levem em conta os aspectos

pedagógicos é necessário o reconhecimento institucional de sua importância, como

foi muito bem destacado pelo professor Bayardo, um de nossos entrevistados.

Embora, do ponto de vista da atuação docente na universidade, permaneça ainda a

questão de encontrar um ponto de equilíbrio entre as diversas funções que fazem

parte de seu trabalho cotidiano16.

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Parece-nos que a compreensão dos princípios que regem a atividade universitária,

no contexto específico em que se atua, pode auxiliar na formação do professor

universitário. Promover essa compreensão pode ser tão importante para o ensino

quanto oferecer uma formação pedagógica. A nosso ver, a simples introdução de

uma disciplina de caráter pedagógico, sem ter claros os pressupostos dessa

atividade e no que deveria consistir a prática, significaria reduzir as possibilidades de

reflexão sobre a natureza da atividade docente no ensino superior, tarefa essencial

para a formação desse profissional, cuja autonomia ainda representa o poder de

decidir sobre os rumos de sua atividade17.

Temos sistematicamente combatido a tendência da prescrição pura e simples no

campo da formação do professor em geral. As decorrências de uma simplificação

dessa natureza serão ainda mais graves no caso da introdução indiscriminada de

disciplinas pedagógicas em cursos de pós-graduação, pois podem produzir um novo

consenso, já presente nas licenciaturas, de que a formação pedagógica não passa

de um receituário rapidamente adquirido e que pouca influência produz na formação

em nível de pós-graduação.

Acreditamos que a primeira tarefa da formação pedagógica seria a de promover uma

sensibilização à dificuldade pedagógica. Tal sensibilização tanto poderia ocorrer

mediante a freqüência de disciplinas ou programas com essa finalidade, bem como

poderia ser desenvolvida por uma equipe que congregasse professores mais

experientes e iniciantes, de modo que as experiências fossem confrontadas e

analisadas. Este, tudo indica, já seria um grande passo para a reflexão sobre a

atividade de ensino no contexto da universidade.

Pelo conjunto de respostas dos professores inovadores, pudemos perceber que

todos foram unânimes na valorização da tarefa de ensino na universidade, e, em

razão dela, buscaram seus caminhos. Os meios utilizados nessa busca foram os

mais variados, as soluções que encontraram, também. Mas parece-nos que pouco

valeria conhecer os caminhos se não estivessem prontos a enxergá-los, ou seja, se

não estivessem atentos e preocupados com os resultados de seu trabalho docente.

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REFERÊNCIAS

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BERBEL, N. A. Metodologia do ensino superior: realidade e significado. Campinas: Papirus, 1994. [ Links ]

BIREAUD, A. Éditorial. Recherche et Formation, n. 15, 1994. [ Links ]

________. Enseignement supérieur université. Recherche et Formation, n. 15, 1994. [ Links ]

________. Os Métodos pedagógicos no ensino superior. Porto: Porto Editora, 1995. [ Links ]

CARDOSO, I. de A. R. A Universidade da comunhão paulista: o projeto de criação da Universidade de São Paulo. São Paulo: Cortez; Campinas: Autores Associados, 1982. [ Links ]

FAVE-BONNET, M. F. Quelle formation pédagogique pour les enseignants du supérieur? Le métier d'enseignant-chercheur: des missions contraditoires? Recherche et Formation, n.15, 1994. [ Links ]

LYOTARD, J. F. O Pós-Moderno. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986. [ Links ]

NOGUEIRA, M. A. Universidade, crise e produção do saber. In: BERNARDO, M. (org.). Pensando a educação. São Paulo: Unesp, 1989. p. 36-37. [ Links ]

PAIVA, E.; LIMA, M. À Espera da reforma. Veja, São Paulo , p.41, 15 jul. 1998. [ Links ]

QUEIROZ, M. I. P. de. Um Perfil da USP. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados, jun.1995.(Documentos.) [ Links ]

SANTOS, B. de S. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 1997. [ Links ]

THE ECONOMIST. A Survey of Universities. Londres: The Knowledge Factory. oct. 4th 1997. [ Links ]

USP. Anuário Estatístico – 1995. São Paulo: USP, 1996. [ Links ]

NOTAS

1 O trabalho de Wladmir Kourganoff, "A face oculta da universidade", escrito nos anos 70, explorou a questão da relação entre ensino e pesquisa como foco principal para sua discussão sobre a concepção e o funcionamento da universidade francesa.

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2 A propósito das implicações da indissociabilidade entre ensino e pesquisa para o ensino universitário, ver também o trabalho de Fave-Bonnet (1994).

3 Para este autor, o tema da indissociabilidade é considerado, por alguns, como verdadeiro mito, por outros, como a razão de ser e a própria forma de sobrevivência da universidade. "Na forma como está posto hoje, tal vínculo entre ensino e pesquisa – que deveria existir como propósito da instituição universitária, não necessariamente como dever de todos e de cada um dos professores...".

4 Para alguns cursos de pós-graduação, como no caso da área médica, essa disciplina é obrigatória.

5 A título de ilustração, relacionamos alguns dos professores que auxiliaram a consolidação da USP, nos primeiros anos de sua fundação: Luiggi Fantappié, Gleb Wataghin, Paul Arbousse Bastide, Claude Levy-Strauss, Fernand Braudel, Giuseppe Ungaretti, Roger Bastide, Fidelino de Figueiredo.

6 O sistema de cátedras, herdado da tradição universitária portuguesa, caracterizava-se como um pequeno feudo, no qual seu titular, o catedrático, era investido de todos os poderes e de todos os privilégios. Nomeado por concurso, permanecia no cargo de forma vitalícia e só a ele era atribuída a liberdade de pesquisa e de ensino.

7 Com esta observação, não pretendemos alimentar o "mito liberal democrático" de criação da USP, apontado por Irene Cardoso em seu trabalho: A Universidade da comunhão paulista, de 1982. A autora frisa que é mito porque se trata de uma invocação que realça o espírito de liberdade de pensamento, de ensino, de pesquisa que teria presidido a criação da universidade, escamoteando-se o fato de que foi criada sob a ditadura de Vargas, e que os liberais que contribuíram para sua fundação colocaram-se contra a liberdade de pensamento e de expressão.

8 Artigos posteriores publicados na imprensa davam conta de que "a produção científica é extremamente concentrada. [...] A produção de teses de doutorado da Universidade de São Paulo, em um ano é a mesma que a de todas as [universidades] federais somadas" (Paiva, 1998).

9 As entrevistas que realizamos descrevem bem como essas tensões ocorrem, e apresentam a opinião dos professores sobre ela.

10 A investigação foi financiada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq – e este texto incorpora parte do relatório de pesquisa apresentado.

11 Os trabalhos inscritos foram agrupados nos seguintes temas: Experiências de Interdisciplinariedade; Recursos Tecnológicos; Integração no Mercado de Trabalho; Renovação Curricular; Interação Professor/Aluno em Sala de Aula e em Laboratórios; Experiências para Melhoria e Avaliação do Desempenho Docente. Embora a realização das entrevistas obedecesse essencialmente à anuência dos professores, cada um dos temas mencionados foi contemplado.

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12 A relação dos professores entrevistados é a seguinte: Glaúcia D'Olim Marote Ferro (FE), Júlio Marcos Filho (Esalq), Liliana Forneris (IB), Lígia Maria Marcondes Machado (IP), Maria de Fátima G. M. Tálamo (ECA), Antonio Salatino (IB), Beatriz Kilikian (EP), André Francisco Pilon (FSP), Tibor Rabockay (IQ), Bayardo Baptista Torres(IQ), Cilene Aparecida Cortardi Ide (EE), Tizuko Morchida Kishimoto (FE), Massayuki Nakagawa (FEA), Ligia Chiappini Moraes Leite (FFLCH); Sheila Walbe Ornstein (FAU); Roberto Martins Gonçalves (EESC), José Benedito Sacomano (EESC). A pedagoga Nídia Pavan Cury (Centro de Técnicas Pedagógicas da EESC) foi entrevistada e incluída no grupo pela relevância das atividades que desenvolvia para os objetivos da pesquisa. Trataremos neste artigo de caracterizar o grupo de entrevistados como um todo, sem apresentar o nome de cada um deles. Identificaremos apenas os professores cujas falas serão reproduzidas, a partir das gravações realizadas e cuja divulgação foi autorizada.

13 Pierre Lena é professor de física na universidade, nela engajado na carreira clássica. Interessou-se pela formação no ensino dos professores-pesquisadores, coordenando entre os anos de 1983 a 1986 uma comissão cujos trabalhos inspiraram, em grande parte, a criação da monitoria na França. A monitoria corresponde a uma bolsa especial para os estudantes de doutorado dedicarem-se a seu aperfeiçoamento pedagógico.

14 O Institut National de Recherche Pédagogique – INRP – publicou um número temático da revista Recherche et Formation, com o seguinte subtítulo: "Quelle formation pédagogique pour les enseignants du supérieur?" Nele aparece uma série de artigos relatando experiências de formação para docentes de ensino superior, em vários países da Europa (Fave-Bonnet, 1994).

15 O depoimento da pedagoga Nídia Pavan Kuri, que ministrava a disciplina Metodologia do Ensino Superior em colaboração com o professor Marcius F. Giorgetti, para o curso de Engenharia de São Carlos, foi muito claro nesse sentido. Ela dificilmente poderia realizar seu trabalho a contento, sem o auxílio do professor especialista na área, já que sobre as questões de conteúdo ela não poderia opinar. Sua formação na área pedagógica permitia-lhe apenas avaliar a forma.

16 Devemos registrar, a respeito das diversas funções que compõem o trabalho na universidade, especialmente na USP, que as chamadas tarefas técnico-administrativas ocupam uma parcela muito grande do tempo dos professores, pois aqueles com dedicação de tempo integral à docência e à pesquisa obrigatoriamente participam de comissões estatutárias (congregação, conselhos de departamento, comissões de ensino, pesquisa e extensão) bem como de bancas de titulação, seleção de novos docentes e de concursos. Essa faina tende a ser, em geral, uma grande fonte de pressão para a atividade docente.

17 Não podemos deixar de mencionar que durante os debates sobre a reforma universitária uma das questões que mais ofereceram resistência disse respeito à possibilidade de extinção do princípio de liberdade de cátedra, considerado por muitos como um dos pilares constitutivos da autonomia universitária.

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Educação & Sociedade Print version ISSN 0101-7330 Educ. Soc. vol.22 no.75 Campinas Aug. 2001 doi: 10.1590/S0101-73302001000200010

O BOM CIDADÃO DOCENTE UNIVERSITÁRIO NA SENDA DA QUALIDADE NO ENSINO SUPERIOR

Arménio Rego*

RESUMO: Este artigo representa uma extensão de trabalho prévio realizado no

domínio dos comportamentos de cidadania dos professores universitários (Cidoce).

O seu objectivo é o de mostrar como quatro categorias de Cidoce (comportamento

participativo, orientação prática, conscienciosidade e cortesia) influenciam a

motivação profissional e autoconfiança dos estudantes (actuais ou antigos), assim a

cotação global de desempenho que estes lhes atribuem. Retomam-se dados de

investigação anteriormente realizada com amostras de estudantes e professores

(Rego & Sousa, 2000), procedendo-se à inclusão de uma amostra de diplomados

com curso superior. Na globalidade, foram inquiridos 249 estudantes, 123

professores e 209 diplomados. Os estudantes debruçaram-se sobre actuais

docentes, e os professores e diplomados foram convidados a descrever os

comportamentos dos seus antigos mestres. Os resultados revelam o seguinte: a) os

três tipos de participantes nos estudos declaram que as quatro categorias de

cidadania influenciam significativamente a sua motivação profissional e

autoconfiança; b) todos eles ponderam fortemente esses quatro comportamentos

quando são chamados a notar o desempenho global dos seus professores. A

consistência desta evidência sugere que podemos estar em presença de

comportamentos docentes com forte potencial de melhoria da qualidade do ensino

superior, nomeadamente no que concerne à qualidade do processo ensino-

aprendizagem.

Palavras-chave: Qualidade no ensino superior; Comportamentos de cidadania dos

professores universitários; Autoconfiança; Motivação profissional.

Introdução

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1. Qualidade versus processo ensino-aprendizagem

A qualidade no ensino superior tem ocupado, nos últimos anos, um lugar de

destaque, seja no discurso dos agentes educativos, nas preocupações dos

decisores políticos, ou na literatura especializada (v.g., Horine, Hailley & Rubach,

1993; Schargel, 1994; Ellington & Ross, 1994; Ace, 1994; Feigenbaum, 1994; Helms

& Key, 1994; Sirvanci, 1996; Rowley, 1996; Hansen & Jackson, 1996; Bailey &

Bennett, 1996; Massy, 1997; Horsburgh, 1999; Montano & Utter, 1999; Zabalza,

1999). Esta significativa expressão do tópico representa, em grande medida, a

expansão para o domínio educativo de uma filosofia de gestão que, desde há muito,

se vem tentando implementar nas empresas industriais e de serviços (v.g., Hackman

& Wageman, 1995; Shemwell, Yavas, & Bilgin, 1998; Zbaracki, 1998).

Para se alcançarem efectivas melhorias qualitárias, importa, todavia, descortinar as

áreas de pesquisa e intervenção mais pertinentes. Se se pretende evitar que a

eficácia da acção fique seriamente comprometida, é crucial extraír do "terreno" os

ensinamentos mais frutuosos. Sucede que, neste domínio, o processo ensino-

aprendizagem tem sido referido por diversos estudiosos da qualidade (v.g.,

Schargel, 1994; Ellington & Ross, 1994; Bailey & Bennett, 1996; Hansen & Jackson,

1996; Rowley, 1996; Yorke, 1997; Horsburgh, 1999) como uma das áreas de

intervenção com maior potencial. Helms & Key (1994) enunciaram eloqüentemente

essa tese ao afirmarem que "não há lugar algum onde os resultados positivos da

gestão da qualidade total sejam mais necessários do que… na sala de aula" (p. 97).

Este artigo insere-se nesse domínio de preocupações e procura dar resposta a um

desafio expressivamente manifestado por Hansen & Jackson (1996): "Apesar do

extenso discurso sobre a qualidade, a actividade nuclear das universidades - a

docência - permanece em grande medida intacta" (pp. 211-212).

É possível que este déficit tenha a sua génese na dificuldade que o campo encerra

(v.g. Helms & Key, 1994; Rowley, 1996). Mas tal não deve (não pode!) ser impeditivo

de que novas pesquisas e contributos sejam procurados e lançados para discussão.

Acresce que as ausências e carências contêm, quase sempre, duas facetas: um

obstáculo e… uma oportunidade. Constituem, até, um convite à criatividade,

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221

investigação, reflexão e descoberta de linhas de orientação potencialmente

contributivas de melhores desempenhos individuais e organizacionais. Um olhar

atento permite, aliás, verificar que alguns caminhos proveitosos já começaram a ser

rasgados. Com efeito, é possível identificar na literatura um elenco significativo de

comportamentos docentes com potenciais efeitos positivos sobre os estudantes e,

globalmente, o processo de ensino-aprendizagem. A título ilustrativo podem citar-se

(v.g., Ellington & Ross, 1994; Helms & Key, 1994; Rowley, 1996; Stringer & Irving,

1998; Marsh et al., 1998; Horsburgh, 1999):

a) feedback da aprendizagem pontual e justo;

b) preparação dos materiais;

c) clareza das explicações;

d) pontualidade;

e) entusiasmo;

f) dinamismo;

g) encorajamento da participação;

h) actuação amistosa, interesse pelos estudantes e disponibilidade para os atender;

i) espírito de diálogo e práticas reflexivas partilhadas;

j) credibilidade e fiabilidade nas avaliações;

k) promoção da autonomia e da aprendizagem activa;

l) justiça, cortesia e conscienciosidade no exercício do papel docente.

2. Comportamentos de cidadania docente universitária

Alguns dos comportamentos mais vincados nessas pesquisas apresentam

semelhanças com os comportamentos de cidadania docente universitária (Cidoce).

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222

Estes podem ser definidos como os comportamentos (tendencialmente)

discricionários, não directa ou explicitamente reconhecidos pelo sistema de

recompensa formal, e que contribuem para o funcionamento eficaz da organização

universitária, designadamente no que concerne ao desempenho académico dos

estudantes.

Esta definição tem a sua génese no conceito de comportamentos de cidadania

organizacional (Smith, Organ & Near, 1983; Van Dyne, Cummings & Parks, 1995;

Organ & Ryan, 1995; Organ, 1988, 1997; Podsakoff et al., 1997; Netemeyer et al.,

1997; MacKenzie et al., 1998; Organ & Paine, 1999), tendo sido adaptada e

desenvolvida por Rego & Sousa (Rego, 1999; Rego & Sousa, 1999a). Depois de

obterem itens na literatura (Marsh et al., 1998; Stringer & Irwing, 1998; Rego &

Sousa, 1999b) e de analisarem o material semântico obtido em entrevistas semi-

estruturadas junto de 49 estudantes e 7 professores universitários (a quem foi

solicitado que referissem actos característicos de antigos professores que

considerassem excelentes), os dois investigadores operacionalizaram o constructo,

tendo descortinado quatro dimensões:

a) O comportamento participativo representa a promoção do diálogo e o fomento da

participação dos estudantes no processo pedagógico.

b) A orientação prática reflete a preocupação pedagógica do docente em ilustrar a

explanação das matérias com exemplos práticos e interessantes para a vida dos

estudantes.

c) A conscienciosidade pedagógica respeita aos comportamentos reveladores de

uma postura preocupada com o exercício rigoroso da função docente (v.g., preparar

bem as aulas, ser exigente, dar as aulas com rigor e seriedade).

d) A (des)cortesia representa um tratamento (des)respeitador dos estudantes.

Nas suas investigações, Rego & Sousa enfatizaram as ações pedagógicas mais

presumivelmente ligadas ao desempenho dos estudantes, procurando suprir a

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223

ausência de estudos nessa matéria. Enveredaram por uma tal veia comportamental

por três razões:

a) Em primeiro lugar, notaram que os instrumentos e constructos de cidadania

disponíveis secundarizavam os actos direccionados para os estudantes. Com efeito,

o instrumento usado por Koh, Steers & Terborg (1995) resultou de uma adaptação

do instrumento desenvolvido por Smith, Organ & Near (1983), sendo este destinado

a medir os comportamentos de cidadania organizacional. Por seu turno, o

questionário usado por Skarlicki & Latham (1995) enfatizou os actos direccionados

para a organização escolar e os colegas docentes.

b) Em segundo lugar, pareceu-lhes lógico que o estudo empírico das relações entre

os Cidoce e os impactos sobre os estudantes (com especial destaque para os

desempenhos académicos) seria mais profícuo se fossem pesquisados

comportamentos de relacionamento entre docentes e estudantes - mais do que

actos direccionados para os colegas docentes (v.g., ajuda na revisão de um artigo)

ou para a organização (v.g., fornecer sugestões de melhoria do funcionamento

administrativo da instituição).

c) Em terceiro lugar, procuraram responder ao desafio lançado por Hansem &

Jackson (1996): "A menos que se actue sobre o processo ensino-aprendizagem, as

mudanças na gestão da qualidade suscitarão, apenas, benefícios diminutos" (p. 211-

212. Grifo nosso).

O presente artigo visa expor os resultados de diversos estudos cujo objectivo é o de

relacionar os comportamentos de cidadania dos professores universitários com três

variáveis: a) o desempenho global dos professores, tal como atribuído pelos seus

alunos (actuais ou antigos); b) a motivação profissional e a auto-confiança dos seus

estudantes. Sucinta e simplesmente, será exposta diversa evidência empírica

susceptível de contribuir para responder a duas questões básicas. Primeira: o que

significa ser um "excelente" professor universitário? Segunda: haverá diferenças

entre as concepções de estudantes, professores e diplomados com curso superior?

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3. Metodologia

Foram inquiridos 249 estudantes universitários, 123 professores e 209 diplomados

com curso superior. Os estudantes provinham de 27 cursos superiores (das áreas de

letras/humanidades, engenharias, ciências, gestão/economia) e freqüentando entre

o 1º e o 5º ano. Os professores exerciam actividade na Universidade de Aveiro,

distribuindo-se por diversos departamentos (gestão, engenharia, química, física,

educação, biologia, geologia, comunicação e arte, matemática) dessa instituição. Os

diplomados eram detentores de diplomas de diversa natureza, exerciam actividades

profissionais diversas e haviam terminado os seus cursos em momentos bastante

distintos. A sua caracterização encontra-se em anexo.

Os participantes foram abordados do seguinte modo: a) os estudantes foram

convidados a reflectir sobre um actual professor, à sua escolha; b) aos professores e

diplomados foi solicitado que reflectissem sobre um antigo docente, também à sua

escolha. A todos foi proposto que escolhessem e pensassem num docente, cujo

comportamento pudessem descrever com algum rigor, independentemente de

gostarem ou não dele, de o considerarem ou não competente, e qualquer que fosse

o sexo, idade ou área de actividade. O inquérito que lhes foi proposto continha três

partes principais:

a) Na primeira, a pessoa era convidada a responder ao questionário de medida dos

Cidoce, assinalando em que medida as afirmações enunciadas se aplicavam ao

docente em que havia pensado, através de uma escala tipo Likert de 7 pontos (1:

"não se aplica nada"; …; 7: "aplica-se completamente"). O questionário tem duas

versões. Na sua forma extensa (aplicada aos estudantes), comporta 32 itens. Na sua

forma reduzida (respondida por professores e diplomados), integra 14 descritores

(Tabela 1). No presente artigo, para efeitos comparativos, apenas se apresentam os

dados relativos à forma sucinta.

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b) Na segunda parte, era solicitado ao inquirido que referisse os impactos que esse

professor havia exercido sobre si, através de 10 escalas de diferencial semântico

(também com 7 pontos). Estes descritores haviam sido recolhidos por Rego & Sousa

(Rego, 1999; Rego & Sousa, 1999a) em duas fontes. Primeira: entrevistas semi-

estruturadas a 13 estudantes, os quais foram convidados a pensar em excelentes

(antigos) professores, e a reportar os efeitos que eles haviam exercido sobre a sua

vida. Segunda: análise do material semântico obtido na fase exploratória de recolha

de itens para o instrumento de medida dos Cidoce. Com efeito, os 49 estudantes e 7

professores participantes nesse estudo exploratório não se limitaram a citar

comportamentos, antes extravasaram para os efeitos sentidos e para as razões

pelas quais consideravam exemplares os professores escolhidos.

c) Na terceira, solicitava-se ao indivíduo que atribuísse uma cotação global de

desempenho ao professor em mente, numa escala de 1 ("péssimo professor") a 20

("excelente professor"). Esta escala é similar à que é utilizada pelos docentes para

avaliarem o desempenho dos seus alunos.

Os dados de cidadania e impactos foram sujeitos a uma análise factorial

confirmatória (Joreskog & Sorbom, 1993; Byrne, 1998). Foi testado o modelo de seis

dimensões emergente da investigação de Rego (1999): quatro para a cidadania e

duas para os impactos (motivação profissional e auto-confiança) - o resultado

encontra-se na Tabela 1. Globalmente, os índices de ajustamento do modelo são

satisfatórios e as consistências internas satisfazem o valor mínimo de 0.70 sugerido

por Nunnally (1978).

4. Resultados

A Tabela 2 expõe as médias, desvios-padrão e correlações entre as variáveis. Em

geral, as variáveis de cidadania relacionam-se significativamente entre si, com as

duas variáveis de impacto (especialmente a motivação profissional) e a cotação

global de desempenho. Estes valores correlativos são similares para os três tipos de

inquiridos (estudantes, professores e diplomados).

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A Tabela 3 expõe os resultados para as análises de regressão. Procura evidenciar o

poder explicativo das dimensões de cidadania para a cotação de desempenho, a

motivação profissional e a auto-confiança. A sua leitura permite extrair algumas

tendências, designadamente:

a) Todas as variáveis de cidadania explicam de modo bastante expressivo a cotação

de desempenho e a motivação profissional. Ou seja, tanto estudantes como

professores e graduados ponderam fortemente esses quatro tipos de

comportamento quando avaliam o desempenho dos seus mestres (actuais ou

antigos), e quando reflectem sobre a influência por eles exercida na sua própria

motivação profissional. Os efeitos exercidos pelos Cidoce sobre a autoconfiança são

menos notórios.

b) O poder explicativo das quatro dimensões de cidadania para as variáveis de

impacto e de desempenho global é superior entre os já diplomados do que no seio

dos estudantes e professores inquiridos em estudos anteriores. A diferença é mais

notória para a autoconfiança.

c) Os diplomados ponderam a cortesia mais fortemente do que os indivíduos das

outras duas amostras. Ela representa, mesmo, a variável com influência mais

significativa sobre a autoconfiança.

d) Quando se trata de avaliar o desempenho global dos docentes, os diplomados e

os professores ponderam a conscienciosidade e a orientação prática em maior grau

do que os estudantes. Estes, por seu turno, valorizam mais o comportamento

participativo.

e) A orientação prática representa a categoria de cidadania mais fortemente

relacionada com a motivação profissional declarada, seja para os estudantes, os

professores ou os diplomados.

f) Enquanto os estudantes declaram que os seus níveis de autoconfiança crescem

com o comportamento participativo dos seus mestres, os diplomados ponderam as

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outras três categorias. Os professores, por seu turno, valorizam a orientação prática

e, menos claramente, a postura participativa.

Para testarmos a eventual existência de efeitos moderadores provocados pelo tipo

de curso realizado, a actividade profissional dos diplomados e o tempo decorrido

desde o terminus do curso, executámos regressões para: a) quatro tipos de curso

(via-ensino e humanidades, ciências, engenharias, economia/gestão); b) três tipos

de ocupação (técnicos superiores, professores do ensino secundário,

gestores/directores); c) três períodos temporais pós-curso (menos de 3 anos, entre 3

e 8 anos, e mais de 8 anos). Não foram detectadas particularidades dignas de

registo, exceptuando uma pequena tendência: os diplomados com cursos de

engenharia são mais sensíveis à orientação prática.

A tabela 4 expõe a caracterização de seis agrupamentos de docentes (os escolhidos

pelos diplomados inquiridos), oriundos de uma análise de clusters (Bryman &

Cramer, 1990; Reis, 1991; Pestana & Gageiro, 1998). A análise foi baseada nas

quatro dimensões de cidadania. Após o agrupamento procedeu-se a uma análise de

variância (Teste Scheffé) tendo em vista conhecer as diferenças inter-grupos nas

variáveis de cidadania, de impacto e de desempenho global. Os agrupamentos

podem ser assim caracterizados:

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a) Os docentes do grupo 1 foram denominados "Fracos" por apresentarem baixas

notações em todas as dimensões de cidadania. Todos os tipos de inquiridos lhes

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atribuem cotação de desempenho bastante "negativa". Os efeitos exercidos sobre a

motivação profissional e a autoconfiança são, igualmente, os mais fracos de entre os

seis agrupamentos. Em termos gerais, os professores inquiridos são mais

benevolentes nas apreciações destes docentes, e os diplomados são os mais

contundentes na avaliação negativa.

b) Aos elementos do grupo 2 foi imputada a designação de "Apenas corteses". As

suas notações de cidadania são geralmente baixas, mas apresentam uma elevada

pontuação em cortesia. Assemelham-se a docentes simpáticos, mas que são pouco

empenhados na preparação das aulas, pouco organizados e metódicos na

leccionação, fracos promotores da participação dos alunos, e modestamente

orientados para a ilustração da matéria com exemplos práticos e da vida pessoal.

São alvo de cotações negativas de desempenho por parte de todos os tipos de

inquiridos, especialmente os graduados. Os três tipos de inquiridos declaram que os

efeitos por eles exercidos sobre a motivação profissional e a autoconfiança são

igualmente fracos, embora melhores do que os ocorridos para o grupo anterior.

c) Os docentes englobados no terceiro agrupamento foram denominados

"Conscienciosos": as suas pontuações nas duas primeiras dimensões de cidadania

são fracas, mas expressam elevada orientação conscienciosa (e pautam-se por um

espírito moderadamente cortês). São uma espécie de docentes que se preocupam

com o rigor e organização das suas aulas, adoptam um relacionamento harmonioso

e cortês, mas descuram a vertente prática das aulas e o fomento da participação dos

alunos. Denotam uma cotação de desempenho globalmente positiva, embora

modesta. Os professores que participaram nos estudos parece, no entanto,

apreciarem relativamente bem este perfil nos seus antigos mestres. Com efeito,

para além da razoavelmente elevada cotação de desempenho que lhes atribuem,

declaram terem sido bastante influenciados por eles no que concerne à motivação

profissional. É possível que tal se deva, fundamentalmente, ao pendor

consciencioso.

d) No quarto grupo estão agrupados os elementos que nomeámos "Regulares". São

medianamente orientados para todas as dimensões de cidadania. Em geral, todos

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os inquiridos os consideram razoavelmente bons docentes, embora seja de notar a

menor apreciação de que são alvo por parte dos graduados. Os professores que

participaram do estudo, por seu turno, são mais benevolentes, denotando apreciar

bastante este perfil nos seus antigos mestres. Em geral, todos os inquiridos

consideram que eles influenciaram de modo positivo os seus níveis de motivação

profissional e autoconfiança.

e) Os docentes do agrupamento "Profissionais diligentes" caracterizam-se por

pontuações bastante elevadas em todas as dimensões de cidadania, recebendo

cotações de desempenho igualmente expressivas por parte de estudantes,

professores e graduados. A influência por eles exercida sobre as duas variáveis de

impacto é globalmente bastante positiva, qualquer que seja o tipo considerado de

inquiridos.

f) Finalmente, os docentes do sexto grupo receberam a designação de

"Exemplares", devido ao facto de serem considerados excelentes cidadãos docentes

em todas as dimensões comportamentais. O reflexo mais claro deste perfil está

projectado na cotação de desempenho que todos os inquiridos lhes atribuem - a

mais elevada dentre todos os grupos. Os impactos exercidos sobre a motivação

profissional e a autoconfiança são mais elevados do que os verificáveis em qualquer

dos agrupamentos anteriores.

5. Análise, discussão e conclusões

O primeiro elemento digno de menção a propósito dos dados expostos é o referente

às boas propriedades psicométricas do instrumento de medida dos Cidoce. Com

efeito, o modelo tetra-dimensional ajusta-se satisfatoriamente aos dados, as

consistências internas de cada dimensão ultrapassam sistematicamente o mínimo

de 0.70 sugerido por Nunnally (1978), e a validade preditiva de cada categoria

comportamental é assinalável. Há, por conseguinte, razões acrescidas para

prosseguir as pesquisas com o recurso ao instrumento em causa.

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Em segundo lugar, importa referir que os elementos empíricos evidenciados revelam

que a excelência docente universitária implica que os professores promovam a

participação dos alunos, confiram às aulas um pendor prático, sejam conscienciosos

na preparação e organização das lições, e adoptem condutas cordiais e corteses.

Não basta ser consciencioso, nem é suficiente ser simpático/cortês: é necessário

conciliar as quatro categorias de cidadania. Estas concepções são perfilhadas pelos

professores e diplomados, mas também pelos estudantes.

Por conseguinte, contrariamente a uma ideia por vezes detectada na vida

académica, afigura-se que os estudantes não procedem a apreciações naives

acerca dos seus professores. Eles valorizam as quatro vertentes comportamentais e

acolhem particularmente bem o professor que consegue combiná-las em alto grau.

Note-se, especialmente, o facto de cotarem de modo relativamente fraco os

professores "Apenas corteses". Consequentemente, a ideia frequentemente

divulgada de que os estudantes fazem juízos enviesados acerca dos desempenhos

docentes - deixando-se "iludir" com professores (apenas) simpáticos, amistosos e

corteses! - só pode fazer carreira se se admitir… que esses enviesamentos são

partilhados pelos professores e diplomados

Ou seja: também aos "olhos" dos alunos, não basta ser cortês; também não basta

ser consciencioso; nem é suficiente a conciliação das duas vertentes; o perfil mais

valorizado é, efectivamente, o que se caracteriza por elevadas orientações nas

quatro categorias comportamentais. Globalmente, as suas concepções são muito

semelhantes às dos actuais professores e dos já diplomados. Há, portanto, algumas

razões para advogar que os estudantes demonstram uma perspectiva acerca da

excelência da docência que contradiz algumas ideias pré-concebidas e

relativamente comuns no meio académico.

Esta recorrente evidência empírica projecta sobre os resultados uma validade

indubitável, conferindo grande dose de verossimilhança à noção de que os

comportamentos pesquisados são susceptíveis de contribuir para os incrementos da

qualidade no ensino superior. Ela é, aliás, convergente com os dados empíricos

atinentes às "avaliações pelos estudantes da eficácia do professor" (v.g., Stringer &

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Irving, 1998; Rowley, 1996) e às "avaliações pelos estudantes da qualidade

educativa" (v.g., Marsh et al., 1998). A tendência geral exposta não deve, no

entanto, obnubilar algumas particularidades decorrentes da cogitação entre as

concepções de diplomados, estudantes e professores. Elas não diminuem a

validade dos dados, antes lhe conferem maior poder heurístico. Importa reter as

mais relevantes:

Primeira: os diplomados (tal como os professores) ponderam as quatro categorias

comportamentais docentes mais fortemente do que os estudantes. É presumível que

a experiência profissional entretanto adquirida os torne mais aptos a avaliar a

importância e os efeitos dos seus antigos mestres. A exposição à realidade do

mundo do trabalho pode torná-los mais sensíveis à valia e (bom ou mau) exemplo

dos seus antigos professores.

Segunda: para as mesmas configurações de cidadania docente (Tabela 4), os

professores inquiridos tendem a ser mais benevolentes nas cotações de

desempenho atribuídas aos seus antigos mestres e nos impactos que declaram ter

deles recebido. Os diplomados, por seu turno, são tendencialmente mais

contundentes nas apreciações negativas. No que respeita à benevolência dos

professores, é possível que ela resulta da renitência sentida pelos próprios em

atribuírem pontuações excessivamente negativas aos seus colegas de profissão. É

igualmente presumível que, devido à experiência docente entretanto adquirida,

sejam mais capazes de compreender as dificuldades da função e se sintam menos

propensos a juízos extremadamente negativos. Relativamente aos diplomados, pode

admitir-se que a sua maior contundência se deve à experiência profissional que lhes

suscita uma maior consciencialização das deficiências formativas recebidas de

professores com fraco espírito de cidadania docente.

Terceira: mais do que os estudantes, os diplomados (e professores) atribuem à

orientação prática uma importância relativa superior à imputada pelos estudantes. O

mesmo pode ser dito a propósito da conscienciosidade. A argumentação

anteriormente aduzida ajuda a explicar esta evidência. Com efeito, é possível que a

experiência profissional os torne mais cientes da importância dos ensinamentos

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práticos que os professores lhes transmitiram (ou não). E que lhes revele a

importância da conscienciosidade profissional, isto é, do rigor, método e

organização. Pode suceder que, com a experiência de vida, sintam que os antigos

docentes mais conscienciosos foram aqueles que, no médio/longo prazo, vieram a

produzir efeitos mais proveitosos nas suas vidas.

Quarta: a cortesia é mais ponderada pelos diplomados do que pelos estudantes e

professores. Ela representa, mesmo, a categoria comportamental que mais explica a

respectiva autoconfiança. O dado pode parecer surpreendente, mas não deixa de

chamar a atenção para a importância dos actos docentes não especificamente

ligados aos conteúdos programáticos formais. O que os dados sugerem é que uma

variável relacional como a cortesia docente é (continua a ser!) valorizada pelos

indivíduos já ingressados no mundo do trabalho. Este dado apela para a

consideração da evidência obtida por Rego (1999) quando verificou, num estudo

longitudinal, que esta dimensão era a única com poder preditivo significativo do

desempenho académico. Segundo o investigador, o resultado poderia significar uma

de duas coisas:

a) É possível que os professores (des)corteses exerçam um efeito (des)motivador

sobre os seus estudantes, induzindo-os a alterar os seus níveis de esforço e

empenhamento, com repercussões no desempenho académico.

b) Mas também é verossímil que a relação detectada resulte da influência de uma

terceira variável sobre os Cidoce e as classificações dos alunos, e não propriamente

do efeito dos comportamentos dos docentes sobre o trabalho e desempenho dos

estudantes. Na verdade, pode suceder que alguns professores tenham

determinadas características de personalidade que os induzem a ser mais corteses

e, simultaneamente, mais benevolentes na atribuição das notas.

Ora, o que os dados empíricos emergentes dos actuais estudos sugerem é que,

porventura, a cortesia representa algo mais do que a génese da benevolência

docente. Ela pode constituir, complementarmente com outros actos de cidadania,

uma actividade docente de natureza sócio-afectiva com impactos significativos sobre

a motivação, empenho, entusiasmo, satisfação, identificação pessoal, autoconfiança,

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identificação pessoal e maior disponibilidade para assumir responsabilidades dos

estudantes (Podsakoff et al., 1990; Harvie & Leiter, 1999; Yukl, 1998). Por essas

vias, é susceptível de incrementar os níveis de dedicação ao trabalho, estimulação e

aprendizagem (Stringer & Irving, 1998).

Quinta: as tendências detectadas são extensivas aos diplomados com vários tipos

de curso e diferentes profissões. E parecem ser independentes do momento

temporal em que o curso foi realizado. A consistência dos dados sugere, uma vez

mais, a sua relevância e validade. Todavia, descortinou-se uma pequena tendência

para que os diplomados em engenharias sejam mais sensíveis à orientação prática

dos seus antigos docentes. O dado não é supreendente, se pensarmos no teor dos

conteúdos formativos desses cursos. É presumível que a aprendizagem de matérias

com forte conteúdo técnico e tecnológico seja mais fortemente promovida com

exemplos práticos do que a aprendizagem de tópicos cujo conteúdo é mais

científico, "cultural" ou humanístico.

Finalmente, importa reter um aspecto que, embora (aparentemente) colateral, pode

ajudar a compreender as concepções manifestadas pelos inquiridos. Na verdade,

tanto os estudantes como os professores e os diplomados direccionaram as suas

escolhas para docentes que são por eles considerados "bons" ou "excelentes" (vide

figura 1). A prevalência de escolhas de perfis docentes "positivos" é, por

conseguinte, extensiva aos estudantes. Este dado parece contrariar uma noção

corrente, segundo a qual os alunos são predominantemente "contestatários",

especialmente atentos a casos "negativos", e pouco sensíveis às "excepções"

positivas. E torna mais rica a evidência empírica obtida, pois sugere aquilo que eles

valorizam especialmente bem - mais do que aquilo que não desejam. Sublinhe-se,

todavia, que a tendência é mais expressiva para os professores e diplomados

inquiridos do que para os estudantes. Daqui emergem dois comentários:

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a) Por razões corporativistas, é possível que os docentes se sintam desconfortáveis

na escolha e avaliação de "maus professores". Podem, designadamente, sentir que

uma tal opção representa uma avaliação negativa indirecta da sua própria

actividade.

b) Ao serem convidados a reflectir sobre os seus antigos mestres, é presumível que

os professores e restantes diplomados recuperem da memória aqueles que mais se

salientaram como modelos positivos para a sua própria actividade actual.

O presente estudo contém algumas especificidades (mormente metodológicas),

cujas insuficiências os estudos posteriores poderão suprir, mas cujas

potencialidades poderão ser desenvolvidas:

a) Os dados relativos às variáveis dependentes e independentes foram recolhidos

na mesma fonte. Por conseguinte, os riscos da variância do método comum

(Podsakoff & Organ, 1986) são mais prováveis. Há, portanto, interesse em que

pesquisas posteriores adoptem uma metodologia de "dupla fonte": alguns inquiridos

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descrevem o comportamento dos professores, e outros expressam os impactos e a

cotação de desempenho. Para ultrapassar eventuais dificuldades de concretização

de uma tal metodologia, pode revelar-se útil obter os dados a partir dos mesmos

indivíduos em momentos distanciados no tempo.

b) Um dos factores de impacto (autoconfiança) carece de validação posterior, já que

a sua interpretação suscita algumas dificuldades.

c) A metodologia usada é correlacional, pelo que não é possível aduzir um nexo de

causalidade entre as variáveis. Pode, por exemplo, suceder que os estudantes que

obtiveram melhores classificações na disciplina (ministrada pelo professor que

escolheram para avaliação) procedam a racionalizações post hoc que os induzem a

cotar positivamente o desempenho dos seus antigos professores, a declarar efeitos

mais fortes na motivação e autoconfiança e a atribuir-lhes cotações de cidadania

mais elevadas. Nesse caso, assistir-se-ia a uma relação de causalidade inversa à

subjacente no presente estudo.

d) O facto de haver correlações fortes entre determinados comportamentos dos

docentes e as cotações de desempenho que lhes são imputadas pelos seus alunos

não implica, necessariamente, que esses comportamentos sejam determinantes

para o desempenho académico. Importa, por conseguinte, prosseguir as pesquisas,

na tentativa de se descortinar um padrão de relações que explique o poder

explicativo dos Cidoce para o desempenho académico dos estudantes.

De qualquer modo, é de justiça realçar que os resultados aqui apresentados são

consistentes com diversa evidência empírica, designadamente a que tem sido

produzida no âmbito das "avaliações pelos estudantes da eficácia do professor"

(v.g., Stringer & Irving, 1998) e das "avaliações pelos estudantes da qualidade

educacional" (v.g., Marsh et al., 1998; Rowley, 1996). Eles contribuem para a

compreensão dos efeitos que os professores podem exercer sobre os estudantes e

fornecem valor acrescentado num domínio que os estudos sobre o ensino superior

vêm progressivamente enfatizando: a qualidade. Sugerem claramente que as quatro

dimensões de cidadania estudadas são bastante valorizadas, tanto pelos docentes e

diplomados que se debruçaram sobre os seus antigos docentes, como pelos

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estudantes que avaliaram os seus actuais professores. Todos consideram que as

quatro categorias de cidadania definem vincadamente o perfil de um "bom" professor

universitário e exercem efeitos sobre a sua motivação profissional e (menos

expressivamente) autoconfiança.

É possível que isso ocorra porque os professores que agem como "bons cidadãos"

funcionem como modelos passíveis de imitação, gerem ambientes promotores do

envolvimento activo dos estudantes e do seu desenvolvimento, criem expectativas

positivas nos seus alunos que induzem estes na tentativa de as cumprir, promovam

as relações de confiança, transmitam entusiasmo, suscitem fenómenos de

identificação pessoal, concitem satisfação e sentimentos de auto-eficácia, estimulem

a aprendizagem, transmitam mensagens conducentes à assunção de

responsabilidades.

Não pode daqui extrair-se simplisticamente a tese de que os comportamentos

simultaneamente valorizados por professores, estudantes e diplomados devem ser

inseridos, de imediato, nos processos avaliativos da qualidade no ensino superior.

Mas a convergência legitima a ideia de que os comportamentos aqui gizados

constituem áreas de actuação de mais provável eficácia - seja para os docentes que

pretendem adoptar posturas de "melhoria contínua", seja para as instituições que

estão empenhadas em promover a adopção desses comportamentos pelos seus

docentes.

Estes estudos representam, por conseguinte, um passo adicional na busca de

factores de melhoria da área que diversos estudiosos vêm mencionando como

crucial para a gestão da qualidade total: o processo ensino-aprendizagem. Eles

ajudam, ainda, a desfazer um dos maiores equívocos detectáveis no discurso por

vezes desenvolvido em torno da qualidade no ensino superior: a secundarização das

perspectivas dos estudantes. Na génese de um tal caminho estão razões várias e

não será possível elencar exaustivamente as mais prováveis e/ou verossímeis. Mas

uma se nos afigura mencionável: a tese segundo a qual os estudantes não estão

capacitados para emitir juízos apropriados acerca da qualidade do ensino que lhes é

ministrado. A presente investigação vai ao arrepio dessa ideia e sugere que ela só

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pode continuar a ser sustentada se admitirmos que… também os diplomados e os

actuais professores carecem dessa capacidade!

Recebido para publicação em março de 2000.

THE UNIVERSITY TEACHER AS A GOOD CITIZEN: IN SEARCH OF QUALITY IN HIGHER EDUCATION

ABSTRACT: This paper extends previous research in the field of citizenship behaviors of university teachers (CBUT). It aims at showing how four dimensions of CBUT (participatory behavior, practical orientation, conscientiousness and courtesy) explain: a) the professional motivation and self-confidence of students; b) the way students evaluate teachers' performance. Previous data obtained from students and teachers samples are retaken, and a sample of graduates is added. The whole sample comprises 249 students (who described the behaviors of an actual teacher of their choice) plus 123 teachers and 209 graduates (who were invited to report the behaviors of a former teacher). The main findings are the following: a) students, teachers and graduates consider that the four behaviors of their (actual or former) teachers influenced significantly their own professional motivation and self-confidence; b) the three types of participants in the study attribute a high value to the four CBUT when evaluating the performance of their (actual or former) teachers. The consistency of these findings suggests that the CBUT can be an important source of quality in higher education, namely as for as the teaching-learning process is concerned.

Key words: Quality in higher education; Citizenship behaviors of university teachers; Self-confidence; Professional motivation.

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* Secção Autónoma de Gestão e Engenharia Industrial da Universidade de Aveiro (Portugal). E-mail: [email protected]

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO TECNOLÓGICO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO

DE CONTADOR A PROFESSOR: A trajetória da docência no ensino superior de contabilidade

MARCOS LAFFIN FLORIANÓPOLIS, 2002

Esta tese de Doutorado foi examinada e julgada adequada para a obtenção do título de Doutor em Engenharia de Produção e aprovada na sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em

Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina.

VERSOS DE ORGULHO Meus êxtases, meus sonhos, meus cansaços ... - são os teus abraços dentro dos meus braços, - Via Láctea fechando o Infinito. Florbela Espanca DEDICATÓRIA Este trabalho carinhosamente se endereça e se entrega sem mistérios para: Hermínia, minha mulher Adriana, Nathália, Gustavo, meus filhos sempre presentes e em múltiplas gentilezas e afagos foram inseparáveis e irrenunciáveis na construção desta tese.

RESUMO

Este estudo teve como objetivo compreender os fundamentos epistemológicos da

organização do trabalho do professor de contabilidade no ensino superior. Para

alcançar esse propósito caracterizo a sua trajetória de formação e a sua inserção no

trabalho docente, assim como identifico as concepções epistemológicas e categorias

metodológicas do seu trabalho no ensino superior de Ciências Contábeis. A

questão central da tese buscou caracterizar quais são os componentes

epistemológicos do processo de ensino que organizam o trabalho do professor de

contabilidade no ensino superior. Para responder a essa questão decidi pela

abordagem qualitativa, mediante a qual tomo como referência os princípios

explicativos de Homem e Trabalho. Por meio desse eixo teórico enfatizo a

constituição do sujeito e a sua condição humana através de suas relações sociais,

históricas e culturais, declarando assim sua possibilidade omnilateral. A construção

da pesquisa empírica foi realizada em 04 (quatro) Instituições de ensino superior,

com 28 (vinte e oito) professores. Todos os professores pesquisados possuem

graduação em Ciências Contábeis e desenvolvem as atividades no ensino superior

em disciplinas do curso de Ciências Contábeis. Ao concluir o estudo sobre o trabalho

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do professor de contabilidade no ensino superior, afirmo que ensinar exige

responsabilidade porque, para além do domínio de conteúdos específicos e de

saberes de formação humana, assim como de métodos adequados a promover

essas apropriações no contexto no qual está inserido, é preciso insistir na

solidariedade humana, na preservação do mundo humano. Essa sensibilidade

coletiva será visível nas atividades do professor de contabilidade quando, em seu

trabalho, configurar-se um entendimento crítico e emancipatório da categoria

trabalho.

1 INTRODUÇÃO

1.1 Exposição do Assunto

O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico.

Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação

por meio das disciplinas, tendo-se tornado impossível aprender o que significa ser

humano. É preciso restaurá-la, de modo que cada um, onde quer que se encontre,

tome conhecimento e consciência, ao mesmo tempo, de sua identidade complexa e

de sua identidade comum a todos os outros humanos (MORIN, 2000, p.15).

O contexto sócio-político-econômico e cultural no qual a sociedade contemporânea

assenta suas ações encontra-se complexificado de incertezas e de provisoriedades

em face da emergência de novos conhecimentos e novos procedimentos do homem,

os quais se intensificam e acabam por afetar o conjunto da sociedade humana. No

conjunto complexo das relações humanas é preciso ressignificar o homem em sua

condição humana para que, no contexto da sua condição, seja possível enfrentar o

desafio que se coloca a todas as instituições, ao mesmo tempo em que se coloca a

todos os homens.

Na identidade desse contexto, as organizações buscam reorganizar suas estruturas

tanto de gestão quanto produtivas por meio da coesão organizacional. No entanto,

para essa reorganização, faz-se necessário superar o entendimento reducionista do

homem concebido apenas como técnico na organização. As variáveis de incertezas

e novos conhecimentos requerem a inclusão da totalidade do homem na

organização para que este possa contribuir e se constituir em sua

multidimensionalidade. Integrar o homem no espaço da organização, na busca do

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significado pleno, ultrapassa os limites de uma disciplina na educação, mas requer a

consciência de produzir o ser unidade.

Assim, na conexão dos diversos microssitemas da estrutura organizacional, a

contabilidade, como uma área do conhecimento que lida com o objeto patrimonial

em âmbito econômico e financeiro, deve integrar-se de forma substancial à dinâmica

organizacional, contribuindo para a proposição de alternativas, para a

competitividade e para a continuidade da organização na realização de sua missão.

Também nesse contexto faz-se necessária a revisão dos pressupostos teóricos que

orientam a dinâmica organizacional, na busca de superar modelos rígidos e

insubstanciais na relação capital-trabalho.

Dessa forma, para resolver situações-problemas no âmbito das organizações,

transformando-as em situações de criatividade e assim viabilizar respostas às

exigências

imediatas e também de longo prazo, como também de, simultaneamente, otimizar e

incorporar conhecimentos ao produto de sua atividade, é preciso uma nova

concepção de sujeito na organização da vida associada. Nesse sentido, ao se

requerer do profissional da contabilidade um entendimento amplo do contexto social

em que se insere, bem como da concepção de mundo que assume na produção de

seu trabalho, faz-se necessário instrumentalizá-lo nas condições concretas de sua

existência. Por conseguinte, ao articular o conjunto dessas relações e ao

compreender tais condições, o profissional da contabilidade poderá realizar nas

múltiplas dimensões do seu trabalho o processo inesgotável de constituição do

homem também como sujeito histórico.

O processo de apropriação e construção de novos conhecimentos para desenvolver

novas práticas sociais tem evidenciado a discussão do tema da formação nas mais

diferentes áreas da produção humana. Os procedimentos de especialização para

alguns tipos de trabalho têm se constituído como indispensáveis para o exercício da

atividade e se configurado como formação continuada.

No âmbito do ensino superior de Ciências Contábeis, cujo currículo, estabelecido

pela Resolução 03/92 do CFE, está organizado predominantemente com as

contribuições dos conhecimentos das ciências sócio-econômicas, os problemas

mais amplos do mundo real são sublimados, ficando circunscritos à reflexão e à

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resolução de problemas somente no que se refere aos aspectos imediatos à

organização. Esse fato tem contribuído para inibir a reflexão da ação no cotidiano da

atividade de ensino, não favorecendo a articulação desses conhecimentos com o

conjunto das relações sociais. As questões didático-pedagógicas, como

preocupações teórico-práticas que possibilitam a reflexão das ações do dia-a-dia no

processo ensino-aprendizagem, ainda não são tomadas como fundamentais nesta

área de ensino. Neste contexto, as teorias da educação, assim como as

contribuições da sociologia, da psicologia e da filosofia apresentam-se como

descoladas da realidade da formação do professor de contabilidade. Este fato, a ser

evidenciado pela pesquisa, contribui para que a sua percepção de mundo, de sujeito

e do fenômeno educativo fique restrita ao conjunto dos limites de sua formação. As

contribuições das ciências humanas são vistas por estes, na maioria das vezes, de

forma desintegrada da análise dos fenômenos sociais.

Nas últimas décadas, marcadas sobretudo pela internacionalização da economia, as

organizações estão restringindo a ocupação de cargos e funções à formação

especializada, exigindo competências e habilidades para as mais diferentes

atividades. Mediante essas constatações, este estudo, ao discutir a formação do

professor de contabilidade, poderá contribuir para a visualização do ensino da

contabilidade como mediador entre a nova base da realidade social e as exigências

de profissionais especializados para atuarem na gestão dos negócios da

organização, assim como na operacionalização da produção de bens e serviços.

Em nossa cultura, a formação e a especialização do bacharel em ciências contábeis

são certificadas pelo processo de escolarização. Assim, ao educar o cidadão,

princípio primeiro da universidade, esta deveria nortear também as relações de

proximidade entre as necessidades do contexto social e a construção de

conhecimentos para práticas sociais de inclusão. No entanto, a inter-relação entre

educação e trabalho na área da contabilidade muitas vezes tem se restringido à

transmissão dos conhecimentos contábeis com ênfase no tecnicismo associado aos

conteúdos mecanicistas, moldando a formação do profissional da contabilidade nos

moldes da racionalidade técnica.

Refletir sobre o trabalho do professor de contabilidade como atividade social implica

o comprometimento com a melhoria desse nível de ensino. Requer, ainda,

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reconhecer o percurso dessa formação visando contribuir para uma trajetória de vida

pessoal e profissional que identifique o professor como sujeito de saberes que o

constitua pelo estatuto da profissão de professor, compreendendo-se como sujeito

de intervenção e, dialeticamente, como capaz de repensar-se e de refazer-se, o que

é próprio da incompletude da natureza humana, na parcialidade dos seus saberes.

A formação do professor de contabilidade implica, portanto, a dimensão e a

proposição de práticas pedagógicas com caráter inovador que permitam a

apropriação do seu trabalho por meio da reflexão das suas ações. Reflexão que

possibilitará a reconstituição de teorias e práticas, associando-as aos procedimentos

de crítica, criatividade e autonomia na apreensão da realidade circundante, para a

promoção de uma educação entendida como prática social no contexto dos arranjos

sociais que se efetivam. Não se cogita o afastamento da formação técnica

específica; pelo contrário, supõe-se agregar a esses fundamentos um referencial

mais amplo para a formação do contador. Logo, discutir a formação do professor de

contabilidade implica detectar os atuais problemas nos quais o conhecimento

contábil exerce fator de responsabilidade social como participante na busca de

alternativas.

Assim, a formação do professor de contabilidade deverá articular o que é próprio da

função docente com a realidade do trabalho da contabilidade, possibilitando que

situações de trabalho se convertam simultaneamente em situações de formação.

Tais articulações deverão tornar possível a extensão das dimensões da gestão do

conhecimento contábil para abranger as mudanças que ocorrem em contextos

históricos.

Dessa forma configura-se a natureza substancial da função do professor de

contabilidade - a de ensinar - por meio dos atributos essenciais do conhecimento

contábil, como uma prática social de intervenção, cujas ações em favor da ética

serão fortalecidas e influenciadas pela apropriação humanizadora da cultura e do

contexto histórico no qual estas se inserem.

1.2 Discussão do tema e do problema

No contexto atual, qual o significado de discutir e estudar a formação do professor

de contabilidade?

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Quando dizemos professor, estamos dizendo profissão, atividade, trabalho, e

quando dizemos formação do professor, pensamos a profissão, a atividade, o

trabalho, os sujeitos.

Marx disse que, transformando o mundo, os homens se transformam a si mesmos.

Não modificaremos substancialmente o seu pensamento se alterarmos a sua frase e

afirmarmos agora que não podemos transformar o mundo se, ao mesmo tempo, não

nos transformarmos a nós mesmos (HELLER, 1992, p.117).

A questão, na atualidade, parece requerer um novo sentido para a transformação de

nós mesmos como pertencentes ao gênero humano. A percepção de que o homem

não é ou isto ou aquilo nos remete a sua origem, à antropologia cultural já discutida

pelos filósofos da antigüidade: o homem é monista. Ao assumirmos essa

perspectiva, afirmamos que o homem, na sua unidade, constitui a sua

multidimensionalidade. Nesse entendimento, pensar a formação do professor de

contabilidade é pensar o sujeito, a realidade do seu trabalho, as suas condições

materiais e subjetivas, a sua individualidade, todo o seu contexto, enfim, a história

de sua constituição num mundo transitório.

A vida do ser humano contemporâneo situa-se num universo complexo. Questões

da sua subjetividade particular e coletiva, tal qual a sua origem e o seu destino,

complexificam a sua constituição objetiva. Cada ser humano é único e precisa ser

compreendido em sua unicidade, que se forma através de uma construção histórica

e coletiva e que se faz na sua individualidade e na sua identidade dialética

relativizada na sociedade que o constituiu.

O existir do ser humano, no dia-a-dia das suas relações sociais, está

contextualizado em uma sociedade que contém situações adversas à sua natureza.

Em suas diferentes ações, esse ser genérico não se separa de seu pensamento,

das suas crenças, dos seus saberes. Esse ser, que em essência é maior do que seu

contexto, necessita ser compreendido para além de sua natureza social. Entendê-lo

apenas como ser social significa, no modelo da sociedade vigente, reduzi-lo às

condições materiais de sua existência. No âmbito da materialidade, o ser humano

busca circunscrever sua identidade à posse das suas condições, que constituem a

sua multidimensionalidade. Uma dessas dimensões está configurada no seu

trabalho, nas suas atividades, na sua ocupação, e é por meio delas que, em

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250

diferentes práticas sociais, busca sempre processos de interação com outros

sujeitos e com outros saberes.

Ao discutir a formação do professor de contabilidade, não estamos nos referindo a

algo não existente, não estamos abstraindo uma realidade para pensar sua

concretude, estamos compreendendo-o como ser genérico que sofre as influências

do ambiente e ao mesmo tempo em que o modifica alterando as suas relações em

busca de significados para sua vida.

Significados atingidos pelo acesso a um saber que lhe permita, por um lado,

conhecer as relações sociais que determinam seu modo de vida, sua concepção de

mundo, sua consciência e, por outro, participar ativamente do processo de

construção da sociedade através do trabalho e da participação política (KUENZER,

1988, p. 105).

O trabalho é uma das dimensões que permitem ao homem conhecer as relações

sociais que interferem na constituição de sua consciência.

Na atualidade, a problemática mais instigante que faz o ser humano perder a

sincronia com a sua realidade imediata - a maneira de prover a sua existência -

decorre do avanço da ciência que se instala no mundo produtivo, provocando não

apenas a perda da sua estabilidade subjetiva-e-material, mas também a expansão

da sociedade marginalizada pela suspensão dos direitos humanos conquistados

através de lutas históricas. Neste contexto complexo e de insegurança social estão

os avanços dos meios de comunicação, que podem gerar constantes mudanças na

aplicação do capital financeiro em diferentes nações. Os processos microeletrônicos

e novas bases tecnológicas alteraram substancialmente os processos produtivos,

trazendo exigências de novos conhecimentos e competências para a vida produtiva.

As descobertas de base microbiogenética submetem as crenças e valores a novos

modelos de homem e de ética humana. O conjunto dessas transformações e a

rapidez com que ocorrem produzem enormes conseqüências na vida humana

individual e coletivamente.

É preciso, todavia, relativizar os conhecimentos produzidos pela ciência no que

concerne à muldimensionalidade do ser humano, uma vez que hoje é transferida

para a ciência a condução das condições de vida da sociedade. Essa situação

decorre em função de que encontramo-nos num estágio da evolução histórica em

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que são desqualificados os saberes não científicos e não técnicos; o poder e a

autonomia da ciência já se encontram tão bem assegurados que ela procura até

mesmo erigir-se em juiz de moral (JAPIASSU, 1991, p. 13).

A compreensão do conhecimento, de como ele é produzido, a quem se destina e a

maneira como é socializado, bem como as mudanças que provoca na vida das

pessoas devem constituir procedimentos de análise crítica nas ações do professor

de contabilidade, pois a concepção que ele tem do conhecimento ultrapassa o

âmbito da aula e dos conteúdos contábeis específicos e vai interferir na constituição

de sujeitos e de subjetividades humanas.

Essas revoluções no conhecimento, nas formas de compreendê-lo e nas maneiras

de produzi-lo contribuíram para indiciar o surgimento de novos paradigmas

científicos e permitir que a ciência moderna, ao romper com as verdades absolutas,

abra perspectivas de novas alternativas para intervenções no real e na busca de

respostas aos desafios e dicotomias da própria ciência. Contudo, o desenvolvimento

das ciências traz consigo a contradição dos seus processos que atinge de forma

imediata a condição humana. É para essas contradições, que se configuram, na

forma de dificuldades de organização do trabalho e conseqüente perda de

consciência dos direitos sociais colocados pelo novo paradigma técnico-científico,

que se fazem necessárias alternativas de não neutralidade para a inclusão do ser

humano nesse universo complexificado.

As bases tecnológicas da nova produtividade, ao serem implantadas no mundo

produtivo, além de alterarem o universo do trabalho, modificam as políticas públicas,

econômicas, sociais e culturais da sociedade, trazendo em seu bojo exigências de

novos conhecimentos e novas competências para os objetivos da natureza imediata

do ser humano.

Por conseguinte, a continuidade da reflexão, da ação e da participação na

superação dos desafios da exclusão que concentramos na perspectiva da formação

do professor de contabilidade possibilita um movimento de transformação da

realidade a partir da sua consciência de mudança. O sentido da modificação está,

portanto, no sentido da mudança própria do ser e de relativizar o mundo, que pode

ser desenvolvido com base no pressuposto do bem comum e no contexto de

movimentos de educadores, entendidos como forças ativas, mobilizadoras de

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práticas e idéias. Coletivos que busquem em sua própria prática profissional dar

sentido ao seu trabalho, expressar publicamente tais motivações e as formas pelas

quais o ensino escolar se encontra preso em conflitos que nem sempre são

educativos, ainda que se protejam sobre o ensino (CONTRERAS, 1999, p. 97).

Compreender as mudanças e ao mesmo tempo incorporá-las criticamente para dar

sentido ao seu trabalho pressupõe a formação do professor de contabilidade para

além das exigências do domínio das técnicas do saber contábil. Ele precisa saber

relacioná-las no contexto de constituição de múltiplos sujeitos por meio de sua

prática profissional de ensino.

As exigências de qualificação para o trabalho implicam novos processos de

formação do ser humano, uma vez que exigem novos conhecimentos, novas

competências e habilidades para gerir programas, processos e tecnologias, assim

como para administrar a nova base produtiva. Também as mudanças nas políticas

econômicas alteram significativamente a vida produtiva e as condições sociais e

culturais, requerendo das instituições a compreensão dos fatores que interferem e

concorrem para produzir mudanças em suas formas de organização e na

legitimidade da formação do ser humano.

Na sociedade atual, as universidades, também entendidas como instituições

culturais de formação, não promovem um processo de ensino e de formação para

atender às demandas da sociedade e de novos conhecimentos com a mesma

intensidade e rapidez das mudanças do mundo moderno e objetivo. Não obstante,

não ignoramos que os contextos atuais da sociedade são demarcados por sua

centralização no mercado, condição que implica determinantes na

multidimensionalidade do ser humano e isto nos impõe dizer que não nos pertence

apenas essa denúncia, mas também o estudo de alternativas possíveis, sobre como

lidar com os conhecimentos e com os diferentes processos democráticos que

contemplem a inclusão do ser humano no seu universo histórico e em sua

multidimensionalidade.

A educação, como uma instância cultural, busca inserir o sujeito no processo de

apropriação da cultura humana. Assim, na sua existência, os sujeitos transmitem os

seus costumes, as suas normas, as suas crenças e os seus valores para o convívio

social. Como construção cultural, a educação escolar objetiva, por processos de

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ensino-aprendizagem, transmitir ao ser humano conhecimentos sistematizados para

que, de posse dos mesmos, constitua-se em sujeito histórico e cultural.

No espaço social da instituição escolar, os conhecimentos produzidos pela ciência

são recortados como saberes escolares e, ao serem convertidos em disciplinas ou

programas de ensino, assumem-se como uma maneira de transmissão dessa

produção. Os conhecimentos são repassados no interior da universidade como

conteúdos curriculares, que, por sua vez, são transferidos para a prática pedagógica

configurando objetivos do trabalho docente. O reconhecimento desses fatos implica

intervenções através de estudos e pesquisas para que os conhecimentos produzidos

pela humanidade fortaleçam a sua existência e garantam ao ser humano um

processo de apropriação das transformações que ocorrem no mundo e que se

corporificam em novos conhecimentos e novas exigências.

O espaço institucional não pode ser visto apenas como um espaço de rigor

acadêmico, de conhecimento científico, de espaço pronto e acabado. O espaço

institucional deve constituir-se, também, por meio da prática e da ação do professor,

como um espaço para o sonho, para a utopia, porque o espaço do sonho e da utopia

é o espaço fértil para o novo, para a concretização do que é sonho. É nesse espaço

que se encontram as possibilidades do devir, do que ainda não é.

O sonho pela humanização, cuja concretização é sempre processo, e sempre devir,

passa pela ruptura das amarras reais, concretas, de ordem econômica, política,

social, ideológica, etc., que nos estão condenando à desumanização.

O sonho é assim uma exigência ou uma condição que se vem fazendo permanente

na história que fazemos e que nos faz e re-faz. Nem uma nem outra, humanização e

desumanização, são destino certo, dado, sina ou fardo (FREIRE, 1992, p. 99).

No horizonte político das rupturas e sem ser neutro na esperança, acredito que a

apropriação de diferentes práticas de trabalho por parte do professor lhe permitirá

formas de comunicação mais amplas entre as relações sociais e o conhecimento

contábil.O professor, não sendo apenas alguém que executa as atividades de

ensino, mas ao se constituir como sujeito histórico, faça a análise crítica e reflexiva

de suas atividades, busque conhecer diferentes concepções do processo ensino-

aprendizagem, e assim, capaz de apropriar-se, de sistematizar e de organizar uma

concepção ampliada do conhecimento contábil e sua aplicabilidade, visualize novas

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alternativas de organização curricular. Práticas de trabalho diferentes da mera

execução, ao serem concebidas e internalizadas pelo professor podem ampliar

diferentes maneiras de lidar com o objeto, método e conteúdo de seu trabalho, e por

conseguinte, na sua maneira de ser, de estar e de intervir no mundo humano que

cotidianamente está sendo feito e refeito pela condição humana.

No campo das ciências e na sua divisão, a contabilidade, como um campo de

conhecimentos, está classificada como uma ciência sócio-econômica. Essa

classificação decorre de ter como objeto de trabalho e produção cultural o patrimônio

das diferentes entidades. Os conhecimentos produzidos pela cultura contábil, suas

práticas em atividades organizacionais e confluentes para a sociedade, são,

invariavelmente, como nas demais áreas, convertidos em práticas escolares as

quais são retransmitidas por processos de ensino-aprendizagem.

A contabilidade, como área de saber, comporta teorias e técnicas nas quais possui

domínio de competências construídas sobre seu objeto. Assim, Uma disciplina pode

ser definida como uma categoria organizadora do conhecimento científico: ela institui

a divisão e a especialização do trabalho e responde à diversidade dos domínios que

recobrem as ciências. Ainda que esteja englobada dentro de um conjunto científico

mais vasto, uma disciplina tende naturalmente à autonomia pela delimitação de suas

fronteiras, pela linguagem que ela constitui, pelas técnicas que ela é levada a

elaborar ou a utilizar e, eventualmente, pelas teorias que lhe são próprias. Assim,é,

por exemplo, com a biologia molecular, a ciência econômica ou a astrofísica

(MORIN, 2000, p. 65-66).

No dia-a-dia, o saber contábil é manipulado por diferentes sujeitos a partir de

diferentes atividades. O bacharel em Ciências Contábeis, que atua em atividades

indiretas à contabilidade, possui um entendimento e lida com determinadas noções

do conhecimento contábil na relação com a produção de suas atividades. O

contador, que atua nas organizações públicas ou privadas e que desenvolve

atividades diretamente ligadas à contabilidade, utiliza conhecimentos contábeis

técnico-gerenciais mais abrangentes, que dão suporte às decisões organizacionais.

Já o professor de contabilidade lida de forma diferente com o saber contábil, porque

o produto do seu trabalho, que decorre, também, do conhecimento contábil, é

diferente do produto de outras atividades que demandam conhecimentos da área.

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255

Os trabalhos desenvolvidos pelos diferentes usuários da contabilidade perpassam

por um delineamento e por uma execução passíveis de rotinas, de visualização em

valor de uso e finalidade, como também da possibilidade de se reconhecerem

naquilo que produziram.

Mas a educação não se resume à transmissão desses conhecimentos; uma pessoa

de posse de tais instrumentos ainda não está apta a relacionar-se com o mundo e

com a sociedade de maneira plena, autêntica e satisfatória: falta-lhe ainda uma

postura diante da realidade, uma forma de utilizar esses aparelhos, uma

personalidade definida (GALLO, 2000, p. 19).

Para educar na perspectiva da multidimensionalidade humana, o professor de

contabilidade deverá conceber que suas ações devem ultrapassar os limites da

transmissão de conteúdos contábeis e a sua relação com outras áreas do saber. A

maneira como age em relação aos seus alunos no processo ensino-aprendizagem e

o posicionamento que assume diante da realidade social são maneiras de manter

em movimento sua concepção de mundo e de sujeito a que os alunos são

chamados a participar, extrapolando o âmbito da aula e ampliando-se para as

demais relações sociais.

No entanto, para além desses aspectos delineados e de ser inquestionável o valor

social da sua atividade, o que difere o professor de contabilidade dos demais

usuários do conhecimento contábil é o tipo de trabalho que realiza: o trabalho

pedagógico. O formato que assumem as atividades do professor de contabilidade é

diferente daquele realizado pelo contador. Enquanto para o contador existe uma

rotina de normas e aspectos legais, de procedimentos para registro e controle do

patrimônio administrado, de um resultado objetivado decorrente de atos e fatos

administrativos do contexto específico das organizações, para o professor de

contabilidade, além de toda essa formatação do trabalho, existe ainda a formação do

sujeito que irá reunir, num contexto específico e pela prática social, suas

concepções de homem e de sociedade.

Para articular os diversos saberes que estruturam o trabalho do professor, no qual o

processo de ensino configura-se como produto de seu trabalho, é preciso pensar,

no âmbito da sociedade e do sistema de ensino superior, a prática pedagógica que

será utilizada pelo professor de contabilidade.

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Nessa tese, discutirei o trabalho do professor de contabilidade, buscando elementos

para um processo de formação continuada que contribua para a reflexão e

construção de uma prática pedagógica.

No caso do presente estudo, que tem como tema a formação do professor de

contabilidade e a abordagem sobre as exigências no contexto de transformações, o

enfoque da pesquisa está centrado no sujeito professor de contabilidade, decorrente

do entendimento de ser ele o mediador entre os conhecimentos produzidos em sua

área de atuação e a prática pedagógica determinada por um contexto histórico-

social.

Nesse sentido, impõe-se ao professor de contabilidade, na organização da sua

prática, fazer a opção por conteúdos, por métodos e por objetivos que pretende

alcançar, sem o que não produzirá os conhecimentos sobre os quais fundamenta o

seu trabalho. Dessa forma, o professor de contabilidade necessita ter uma

compreensão epistemológica sobre conteúdos, métodos e objetivos, assim como

das ações de intervenção para mediar a transformação social através do seu

trabalho. Para essa transformação social o entendimento da categoria trabalho é

fundamental para que a prática do professor de contabilidade explicite não apenas a

maneira de lidar com o conhecimento de sua área, mas sobretudo com a sua

concepção quanto à formação dos sujeitos e da sociedade que produzirá por meio

de seu trabalho.

Assim, a prática pedagógica do professor de contabilidade, coerente com ações de

responsabilidade social, precisa ser apropriada na categoria trabalho como uma

atividade singular que esteja expressa nas relações sociais. Para tanto, essa prática

requer ser compreendida e inserida no seu contexto para que se possa visualizar as

possibilidades de intervenção, por meio da educação, em práticas pedagógicas e em

seus processos de formação, face às necessidades de enfrentamento das

mudanças globais e da contextualização histórica dos sujeitos.

Portanto, ao reiterar as diferentes formas de trabalho humano, assim como a sua

dimensão nas organizações contemporâneas, e ao participar das discussões que

buscam construir novos entendimentos e novas competências sobre o sujeito em

seus diferentes contextos, apresento como substancial a formação do professor de

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contabilidade. Também essa formação busca configurar novo significado aos

componentes do processo de ensino.

Logo, as aprendizagens, os conteúdos, os métodos, o professor, o aluno, entre

outros componentes constitutivos do ensino necessitam de um novo entendimento

sobre seus objetivos na relação com o outro e na compreensão dessa relação.

No conjunto das reflexões desenvolvidas e na busca de respostas que fundamentem

a organização do trabalho do professor de contabilidade, o meu estudo tem como

questão norteadora caracterizar:

Quais são os componentes epistemológicos do processo de ensino que

organizam o trabalho do professor de contabilidade no ensino superior?

Ao desenvolver as atividades de ensino, o professor mantém um diálogo com seus

alunos e reflete criticamente sobre os conteúdos curriculares que seleciona. Esse

diálogo pressupõe a manifestação, por parte dos alunos, de saberes prévios ou em

vias de apropriação em relação aos conteúdos propostos pelos quais deve ocorrer a

mediação do professor. O processo ensino-aprendizagem dos conhecimentos

sistematizados não é algo pronto e natural, contido como semente em cada ser

humano, mas um processo que se constitui de múltiplos componentes do

conhecimento e seus vínculos com a condição humana. Nesse sentido, aquilo que é

fundamental na composição de sistemas visando a explicar suas relações culturais,

configuram-se como componentes epistemológicos do processo de ensino que

organizam o trabalho do professor de contabilidade no ensino superior. Nesse

estudo os componentes epistemológicos são o aluno, o professor, o currículo, as

metodologias, o ensino, a aprendizagem, a avaliação, a universidade.

Portanto, para discutir a formação do professor de contabilidade, mediante a

questão norteadora, parto do entendimento de que: o trabalho educativo é o ato de

produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é

produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da

educação diz respeito, de um lado, à identificação dos elementos culturais que

precisam ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se

tornem humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas

mais adequadas para atingir esse objetivo (SAVIANI, 1997, p. 17).

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258

A identificação dos elementos culturais diz respeito aos conteúdos selecionados e

como o professor os relaciona, de forma estática ou superada, com os

conhecimentos historicamente produzidos. A seleção de conteúdos envolve a

concepção que o professor tem do processo ensino-aprendizagem e sua concepção

de sujeitos. Portanto, o ensino-aprendizagem e os alunos constituem-se como

componentes do processo de ensino e que norteiam a organização da prática

pedagógica do professor.

A prática pedagógica consiste em todas as ações que objetivam a aula, ações que

definem uma postura política diante do mundo, dos sujeitos com os quais trabalha e

dos conhecimentos que socializa. Saberes estes que assumem o caráter de

desenvolver as habilidades e de formatar técnicas para executar alguma atividade.

Entretanto, por meio dos conteúdos também é possível transmitir e construir valores

éticos e de compreensão da vida e da constituição dos sujeitos para um desenho de

sociedade que dê significados ao gênero humano.

As condições concretas de cada indivíduo deverão ser compreendidas pela ação

educativa, que é direta e intencional, mediando a apropriação de elementos culturais

produzidos pela coletividade. Por ser direta e intencional é que se configura a

organização do trabalho do professor e suas ações no ensino.

Deste ponto de vista, tenho como objetivo geral neste estudo:

Compreender os fundamentos epistemológicos da organização do trabalho do

professor de contabilidade no ensino superior.

A compreensão dos fundamentos do trabalho do professor de contabilidade tem

como objetivos específicos (1) caracterizar a trajetória de formação e da sua

inserção como professor de contabilidade no ensino superior; (2) identificar as

concepções epistemológicas e as categorias metodológicas do trabalho pedagógico

do professor de contabilidade no ensino superior.

A proposição deste estudo fundamenta-se no fato de que, ao pensar alternativas de

formação continuada para o professor de contabilidade, tal formação seja

compreendida como elo entre educação e prática social no ensino superior e

também pelo fato de que:

Os professores não produzem o conhecimento que são chamados a reproduzir, nem

determinam as estratégias práticas de ação. Por isso, é muito importante analisar o

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significado da prática educativa e compreender as suas conseqüências no plano da

formação de professores e do estatuto da profissão docente (NÓVOA, 1995, p. 68).

Ao propor este estudo, entendo que a atuação do professor de contabilidade deverá

ocupar-se de um espaço no qual seja capaz de explicitar as maneiras como ensina e

como relaciona os saberes com os quais trabalha com as demandas mais

abrangentes da realidade social.

1.3 Justificativa para a escolha do tema

1.3.1 O Contador nas Organizações: um novo contexto

O universo sofre processos de mutação. Tais mudanças ocorrem pelo movimento

próprio dos fenômenos da natureza, mas também pela intervenção do homem sobre

a natureza. Os processos de mudança são, portanto, de caráter atemporal, quando

relacionados à natureza, e têm o caráter de dimensões históricas, quando da

intervenção do homem sobre a maneira de produzir e de organizar a sua vida.

No universo das organizações, uma maneira predominante e complexa, de o homem

produzir e organizar a sua vida, o fenômeno de maior impacto que tem provocado

mudanças em diferentes níveis é denominado globalização. A globalização pode ser

considerada como uma totalidade de fenômenos colocados em movimento pela

cultura da civilização humana e que, no estágio atual, assume a sua dimensão

concreta através dos avanços tecnológicos, da estruturação política, do

desvelamento de culturas, do ordenamento econômico e do agir social. Esses

fenômenos sempre estiveram presentes na história da civilização humana; no

entanto, o que os diferencia de outros contextos no estágio atual é a rapidez do

impacto que causa sobre a vida das pessoas e das organizações.

No que se refere ao universo das organizações, os avanços e as mudanças

caracterizam-se pelos instrumentos e maneiras de organizar a gestão administrativa

e a gestão produtiva. As organizações que já atuavam com base em tecnologias

necessitam agora, além da contínua implementação tecnológica, ampliar seu

processo de gestão e produção com base em conhecimentos produzidos na era

global de novos conhecimentos e de informações.

As organizações, no modelo de sociedade vigente, mais que permanecer no

mercado global e concorrencial, precisam ser competitivas no ramo em que atuam

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para potencializar novas e exigentes demandas, não somente do universo

consumidor, mas sobretudo das exigências do capitalismo, o que implica a

constante manutenção dos itens de qualidade, custos e dos aspectos diferenciais

em seus bens e serviços.

Dessa maneira, as novas formas de organizar a produção implicam

conseqüentemente em novos desenhos organizacionais, entre os quais os modelos

de organização e gestão do trabalho. Na contemporaneidade, os novos modelos de

gestão do trabalho surgem das mudanças ocorridas na base técnica de produção.

Mudanças que vão sendo articuladas com o conceito de internacionalização da

economia e que, por sua vez, demandam novas estratégias de competitividade. No

capitalismo, em especial na reestruturação produtiva, a articulação entre as formas

de organização do trabalho e as novas tecnologias intensifica o uso da força de

trabalho e desta forma ajuda a responder às novas demandas dos desenhos

organizacionais modelados para a competitividade.

A característica da organização competitiva decorrente do cenário globalizado é a da

organização flexível, que tende a ser caracterizada por unidades de negócios, nas

quais visualizam-se cadeias produtivas com potencial de geração e distribuição de

riquezas e têm como perspectiva a transição para a construção de um novo modelo

de sociedade.

Estamos testemunhando o desmoronamento da hierarquia, uma gradual substituição

da ênfase burocrática na ordem, na uniformidade e na repetição, por uma ênfase

empresarial na criatividade e na execução de acordos. Mas, ao mesmo tempo,

estamos também assistindo ao surgimento de novos dilemas sociais com a chegada

dessa mudança (KANTER, 1997, p. 66).

Um dos dilemas colocados para as organizações refere-se ao perfil de um

trabalhador capaz de compreender os processos de gestão e de produção e assim

lidar com as novas tecnologias. Um trabalhador que seja polivalente, criativo, com

competências e habilidades que possibilitem à organização aprendizagens

contínuas, demanda uma formação plena, abrangente e não fragmentada, que

considere o homem como sujeito histórico, crítico e participante do cotidiano. Esse

novo trabalhador não se produz na mesma dinâmica em que são produzidas as

novas tecnologias.

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261

Segundo Kuenzer, Esta nova realidade exige novas formas de mediação entre o

homem e o conhecimento, que já não se esgotam no trabalho ou no

desenvolvimento da memorização de conteúdos ou formas de fazer e de condutas e

códigos éticos rigidamente definidos pela tradição taylorista/fordista, compreendida

não só como forma de organização do trabalho, mas da produção e da vida social,

enquanto paradigma cultural dominante nas sociedades industriais modernas

(KUENZER, 2000, p. 19).

Também neste contexto, penso ser desejável que o contador tivesse uma formação

crítica, que permitisse superar a formação fragmentada e assim contribuir para o

desenho de um novo modelo de sociedade.

Na contradição existente entre uma nova organização do processo de trabalho e um

trabalhador polivalente, situa-se como demanda do capitalismo contemporâneo a

superação de formas fragmentadas de educação, que baseadas no modelo

taylorista-fordista, atava o trabalhador a uma e exclusiva ocupação parcelarizada por

toda a sua vida. Impõe-se, agora, como necessidade do próprio capital, substituir

esse trabalhador taylorista-fordista pelo trabalhador polivalente, trabalhador

multitarefa ou chamado trabalhador flexível. A contradição situa-se porque ao

mesmo tempo em que o desenvolvimento capitalista recoloca a demanda da

dimensão de totalidade para superar a dimensão fragmentada, intensifica e

precariza o trabalho por meio do desemprego estrutural, inviabilizando desta forma a

retomada de totalidade.

Ainda segundo Kuenzer, a qualificação profissional passa a repousar sobre

conhecimentos e habilidades cognitivas e comportamentais que permitam ao

cidadão/produtor chegar ao domínio intelectual da técnica e das formas de

organização social de modo a ser capaz de criar soluções originais para problemas

novos que exigem criatividade, a partir do domínio do conhecimento (KUENZER,

2000, p. 20).

No espaço dessa contradição suponho que o trabalho do contador pudesse ser

substantivo e não meramente instrumental no sentido da superação das estratégias

de formação do profissional polivalente para a acumulação flexível e ao mesmo

tempo tomar essa recomposição de totalidade polivalente no sentido da superação

das condições de exploração desse trabalhador.

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A polivalência como decorrente da valorização do capital busca superar a formação

fragmentada, mas para o capital, retomá-la na dimensão de totalidade é muito

perigoso, porque não pode se dar para a totalidade dos trabalhadores e, assim,

quanto mais a produção flexível exclui o trabalhador do processo de trabalho, mais

inviabiliza uma formação flexível para a maioria dos trabalhadores. Assim, ao

mesmo tempo em que é viabilizada a polivalência, também dessa forma se impede e

se inviabiliza a categoria totalidade. O papel do ensino crítico da contabilidade é

usar esse espaço de contradição para aprofundar as possibilidades de superação

desse modo de produção excludente.

Outro desafio posto às organizações consiste na busca de maneiras de articular a

realização de seus objetivos com novas formas da estrutura organizacional. Superar

as formas da organização burocrática não quer dizer eliminar o modelo burocrático,

mas sim pensar alternativas para a gestão organizacional ao novo contexto,

considerando as experiências construídas culturalmente.

Uma vez que no presente estágio histórico é inconcebível que qualquer sociedade

venha jamais a ser capaz de descartar completamente as atividades de natureza

econômica, certo grau de hierarquia e coerção será sempre necessário para a

ordenação dos negócios humanos, como um todo. No âmbito de seus respectivos

enclaves, as economias burocratizadas podem-se tornar mais produtivas para seus

membros e para os cidadãos em geral (RAMOS, 1989, p. 150).

Pelo visto, o contexto atual é um contexto concorrencial e de desafios constantes. A

dinâmica dos processos de comunicação exige agilidade e otimização nas ações

referentes aos negócios da organização. Neste panorama de nova organização, o

que se busca é integrar todas as áreas de trabalho a todas as atividades, desde o

planejamento até a discussão dos resultados obtidos em cada período. Esse

processo, ao pretender-se dinâmico, prevê múltiplas e novas aprendizagens.

A contabilidade, como uma área de conhecimentos de fundamental importância para

as organizações, além de otimizar o controle econômico e financeiro do patrimônio,

através da relação custo e qualidade na execução de seus bens e serviços,

necessita entender a organização e a sua missão por meio dos atributos essenciais

da informação e do conhecimento contábil.

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A informação sempre foi instrumento essencial em qualquer atividade humana,

agora, quando vivemos em uma economia globalizada, em que o nível de

concorrência é cada vez mais acirrado e complexo, e considerando-se a satisfação a

que o homem chegou nas comunicações, o estar correta e tempestivamente

informado é a única possibilidade de manter-se de pé e crescer de acordo com os

objetivos estabelecidos (ABRANTES, 1998, p. 06).

Muitas organizações enfrentam o dilema da transição e ainda não compreenderam a

plenitude da globalização. Não é apenas a passagem para processos robotizados,

esse é um entendimento linear e artificial não compatível com o ambiente

competitivo. A intensificação de informações propicia um ambiente de insegurança

administrativo-organizacional, pois a mera substituição de equipamentos pesados

por processos flexíveis não é suficiente para inserir a organização em ambientes de

competitividade. O fluxo de eventos, muitas vezes denominados de informação,

precisa ser filtrado para consolidar decisões no âmbito das transições. A informação

que tem origem em dados, fatos, fenômenos ou mensagens de qualquer natureza,

ao ser decodificada, pode ser utilizada em situações objetivadas num contexto e

tempo real.

Com a caracterização destes desafios e dilemas não quero dizer que o modelo da

reestruturação produtiva é o modelo que tende a ser hegemônico e que, portanto,

tende a superar estruturalmente as formas taylorista-fordista da organização do

trabalho. A lógica parece ser a permanência da diversificação dos modelos de

organização e gestão, porque o segmento mais reestruturado somente se mantém

como dinâmico na medida que ele se alimenta das formas tradicionais, e é isso que

tem garantido a competitividade. Portanto, não está em questão a superação do

modelo burocrático, mas uma nova forma de incorporação de formas primárias,

inclusive do trabalho escravo, que viabilize a competitividade do modelo capitalista,

que cada vez mais se apóia na precarização do trabalho humano. Portanto, a

possibilidade da competitividade reside na incorporação das formas exploradas e

com formas de organização que pretensamente estariam sendo superadas

historicamente.

Assim sendo, para esse contexto e para as exigências sempre transitórias das

organizações, o contador necessita agir para além dos processos de escrituração e

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emissão dos demonstrativos contábeis. A ação do contador é de pensar a

organização através dos conhecimentos contábeis e, neste sentido, requer-se um

profissional capaz de articular as competências de sua área de atuação às

necessidades do contexto organizacional em novas dimensões.

As informações oriundas dos procedimentos contábeis não podem ser apenas

meras transcrições e leituras dos fenômenos passados e devidamente registrados

pela contabilidade.

O que as empresas em contextos competitivos demandam são informações

confiáveis, por meio das quais poderão tomar decisões e assim decidir em favor de

sua missão.

A confiança da sociedade em uma organização decorre, hoje, fundamentalmente

das ações desenvolvidas pela empresa no contexto em que se insere. Desta forma,

a gestão e os empresários necessitam estar assessorados para que as decisões,

além de manterem a empresa em níveis competitivos, conquistem a respeitabilidade

da sociedade.

No conjunto dessas ações o contador tem um papel relevante a desenvolver a partir

do seu trabalho e das suas ações, decorrente da relação que estabelece entre os

conhecimentos contábeis e destes com as demais áreas do saber. Desta forma,

visualizo a contabilidade nas organizações como mais que um fazer de

procedimentos rotineiros, mas sim um fazer que, pela constituição do corpo teórico

da ciência contábil, possibilitará que sejam procedimentos justificados e mediados

pela reflexão da ação.

A contabilidade como ciência sócio-econômica tem delimitado seu objeto de estudo

que é o Patrimônio, porém é através da amplitude de entendimentos sobre o

patrimônio, sobre a sua constituição histórica, assim como o resultado de sua

manipulação no modelo de sociedade vigente que o contador poderá contribuir com

os processos de aprendizagem organizacional em contextos de imprevisibilidade.

Assim, ao ampliar sua competência técnico-formal por meio de uma formação plena,

mais abrangente, ampliará a dimensão substantiva do seu trabalho no espaço

organizacional, tendo como conseqüência possível a superação do modelo

excludente.

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O desafio de superar o modelo de homem operacional (Ramos, 1984), buscando

alcançar a dimensão multidimensional do contador na organização, está presente

nas possibilidades de ação frente às novas exigências de gestão que são marcadas

por incertezas e instabilidades do contexto global. Tais exigências visam superar o

modelo de procedimentos rotineiros por procedimentos de aprendizagens.

Entretanto, para essa perspectiva do contador nas organizações o que se requer é

um processo que amplie a sua formação inicial mediante processos de formação

continuada, caracterizando razões substantivas de intervenção do seu trabalho no

contexto em que se insere.

Contemplar a articulação de espaços substantivos na organização para substituir o

modelo de homem operacional por uma concepção de homem parentético requer

uma estrutura de múltiplas aprendizagens entre a natureza humana e a natureza

das organizações.

A concepção de homem parentético implica um reconhecimento do homem como

um ser genérico e, assim, como um sujeito de intervenções em seu contexto, o que

significa dizer que é um ser que age mediante procedimentos de reflexão, tornando-

se capaz de afastar-se do seu ambiente para ser um espectador do cenário social.

Nessa dimensão, Ramos configura deliberadamente o homem como capaz de

perceber-se como crítico do seu contexto e que, ao distanciar-se da sua realidade

imediata incorpora em suas ações a ética da convicção para pensar o coletivo na

direção das atividades que o situa em condições de autonomia.

Na realidade, o homem parentético não pode deixar de ser participante da

organização. Porém, justamente por tentar ser autônomo, ele não pode ser

psicologicamente enquadrado como aqueles indivíduos que se comportam de

acordo com os modelos reativo e operacional. Ele possui uma consciência crítica

altamente desenvolvida das premissas de valor presentes no dia-a-dia (RAMOS,

1984, p. 05).

O homem somente poderá ser concebido como multidimensional quando possuir

autonomia para compreender a organização e as suas ações no contexto em que se

insere. É essa consciência dos seus atos, no seu cotidiano, obtida pelos processos

de aprendizagens que permite ao homem multidimensional o desenvolvimento para

novas e contínuas aprendizagens.

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O desafio de maior significado e abrangência social que se coloca para o contador é

que este seja capaz de elaborar diferentes maneiras de gerar resultados, para na

mesma medida, fazer a sua distribuição por meio do conhecimento contábil. Assim,

para que as competências do contador possam emergir no âmbito das organizações

competitivas e de aprendizagens, é preciso considerar o seu acesso às novas

tecnologias, ao significado de novas formas de comunicação, de abstração e de

cálculos e possibilidades de solução, a idiomas que traduzem manuais e noções

operacionais, entre outras habilidades do seu saber-fazer. A esse conjunto de

requisitos não cabem os cursos de treinamento aligeirados e artificiais, mas um

processo qualitativo de formação básica, de sólida fundamentação conceitual

específica, de experiências práticas relacionadas e de interdisciplinaridade com

conhecimentos genéricos; esse processo inicial deve ser contínuo e acontecer em

ambientes significativos.

Aprender é uma experiência social; o aprendizado ocorre através de interações com

outras pessoas e de seu auxilio. Para passar dos objetos e ações para o campo dos

significados, o aprendiz conversa com outras pessoas para expandir seu campo de

entendimento. Durante o diálogo, idéias e experiências são compartilhadas e o

aprendiz expõe seus problemas, gera hipóteses, conduz experimentos e reflete

sobre os resultados (SCHUCK, 1997, p. 243).

Esse entendimento sobre relações de trabalho e de aprendizagens é completamente

inverso ao modelo ainda hoje aplicado nos diferentes níveis de ensino formal, assim

como nos cursos informais. Também as organizações precisam incorporar o

conjunto destas mudanças, bem como propiciar processos de aprendizagens

socialmente mediados para um novo tipo de sociedade.

1.3.2 Novas Exigências para o Contador: as bases na formação do professor

de contabilidade

O mundo do trabalho passa por transformações gerais e radicais. O ritmo acelerado

do reordenamento econômico em escala mundial e a modernização tecnológica e

gerencial alteram completamente o perfil da oferta de empregos. O desemprego

aparece como uma realidade estrutural, em vez de uma suposta disfunção do

sistema econômico. Simultaneamente, novas exigências se impõem à qualificação

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profissional: o que se exige agora do trabalhador é que apresente e desenvolva

certas qualidades que vão muito além daquelas habilidades gerais ou técnicas que

os processos educativos convencionais podem oferecer (CASALI, 1997, p. 15).

A vida cotidiana é marcada pela racionalidade substantiva1, mas, sobretudo, pela

racionalidade instrumental, a qual se faz presente nas instituições da sociedade

contemporânea. As instituições, por seu caráter público e/ou privado, têm maneiras

próprias na consecução de seus objetivos. Na atualidade, permeada de ideologia, o

fenômeno da globalização, assenta-se no paradigma da economia mundial, e ao

exaurir o seu alcance, delineiam-se alguns beneficiários, potências políticas e

megacorporações com caráter hegemônico de novas exigências. Também por um

discurso hegemônico é a globalização caracterizada como irreversível e inevitável

do ponto de vista dos avanços tecnológicos. No entanto, não imobilizado por

diferentes procedimentos de análise, o que significa não emudecer à razão de

céticos valores e dogmas que intrinsecamente avançam aumentando as

desigualdades sociais, busca-se uma compreensão diversa de organizar a vida

social e produtiva.

Os fenômenos econômicos e sociais que determinam a reestruturação dos

ambientes de produção de bens e serviços por meio dos avanços tecnológicos que

ampliam as formas de comunicação exigem competência profissional nas mais

diferentes áreas do trabalho.

No atual contexto de competitividade, em que oportunidades de negócios e a

urgência nas decisões são determinantes para a inserção e continuidade das

diversas organizações, são requeridas do contador, também, atribuições nos atos de

gerir o patrimônio alheio. Para essa atividade, são necessários atributos de

competência profissional decorrentes de sua formação específica e geral, bem como

das diferentes experiências fundamentadas teórica e empiricamente.

___________________________________________________________________

1 Diz-se que é substancialmente racional todo ato intrinsecamente inteligente, que se baseia num conhecimento lúcido e autônomo de relação entre fatos. É um ato que atesta a transcendência do ser humano, sua qualidade de criatura dotada de razão. Aqui, a razão, que preside ao ato, não é a sua integração positiva numa série sistemática de outros atos, mas o seu teor mesmo de acurácia intelectual (RAMOS, 1983, p.39).

__________________________________________________________________

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Desta forma, a exigüidade dos recursos à disposição das entidades requer

habilidades e fluência no discurso e nas diferentes formas de comunicação que

objetivam procedimentos para realizar negócios com empresas comerciais,

industriais e de serviços, assim como para implementar o uso da tecnologia, que vai

desde os conceitos básicos aos mais elaborados e pertinentes à ciência contábil e

suas relações com diferentes áreas.

A contabilidade, como ciência social, ao ampliar seus objetivos sobre seu objeto, o

patrimônio das organizações, insere-se nesse movimento para contribuir com esse

processo.

Em tal movimento imbricam-se diversas formas, filosofias e mentalidades

empresariais, cujas ações repercutem em intrincados e singulares modos de ser e

de agir.

O contador, como gestor do patrimônio das entidades, tem funções mais

abrangentes do que apenas o registro dos eventos contábeis; precisa decidir e agir

em condições de continuidade e competitividade do empreendimento. Assim, as

novas formas de organizar o trabalho contábil, com a gestão organizacional, exigem

competência profissional que envolve um complexo processo de formação inicial e

continuada do contador, processo esse que confrontará diferentes maneiras de

aprender com as organizações e sujeitos multiculturais. O perfil desse novo contexto

faz exigências ao profissional da contabilidade para que tenha condições de delinear

projetos de trabalho por meio de visões prospectivas e sistêmicas, nas diferentes

filosofias organizacionais.

A reflexão sobre as ações, assim como sobre os resultados das decisões, requer a

intermediação de um processo de formação continuada para desenvolver novas

estratégias e sistemas organizacionais, envolvendo não somente um estilo

gerencial, mas também um rigor metodológico na tomada de decisões junto aos

fenômenos contábeis em articulação com a diversidade cultural dos sujeitos e

instituições.

Questões relacionadas à ética humana e profissional estarão sempre presentes nas

decisões, no âmbito da gestão e do contexto no qual se situa a organização,

indiciando uma atenção-preocupação com os usuários e/ou consumidores de bens e

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serviços, com atitudes de cooperação na resolução de problemas ou alternativas

viáveis.

A comunicação das ações de uma organização com seus interagentes deverá ser

expressa através dos diferentes demonstrativos contábeis, os quais, em seus limites

e especificidades, buscam informar sobre as ações, as decisões e sobre os

resultados. Assim, a contabilidade, como ciência sócio-econômica, por meio de um

profissional com competência e habilidade, ao atuar no mundo dos negócios, muitas

vezes perverso, busca alternativas na amplitude de sua atuação na dimensão da

ética, da preservação da natureza e dos interesses de um mercado consumidor

cada vez mais exigente em termos de qualidade, baixo custo e responsabilidade

social.

A construção de uma prática contábil que se configure pela preocupação com a

inclusão social não é possível por meio da aridez mecanicista e desprovida da

compreensão das relações mais abrangentes do ensinar-e-aprender. É nesta

perspectiva que o tema deste estudo focaliza a formação do bacharel em Ciências

Contábeis por meio da formação do professor de contabilidade.

A função dos professores define-se pelas necessidades sociais a que o sistema

educacional deve dar resposta, as quais se encontram justificadas e mediatizadas

pela linguagem técnica pedagógica. O conceito de educação e de qualidade na

educação tem acepções diferentes segundo os vários grupos sociais e os valores

dominantes nas distintas áreas do sistema educativo. A imagem da profissionalidade

ideal é configurada por um conjunto de aspectos relacionados com os valores, os

currículos, as práticas metodológicas ou a avaliação (NÓVOA, 1995, p. 67).

No sentido de instrumentalizar novas formas de agir do profissional da contabilidade,

frente ao contexto de transitoriedade do mundo, é preciso discutir a formação do

professor de contabilidade.

Ao propor o estudo sobre quais são os componentes epistemológicos do processo

de ensino que organizam o trabalho pedagógico do professor de contabilidade no

ensino superior para compreender os fundamentos epistemológicos da

organização deste trabalho no ensino superior, entendo como necessário contribuir

com esse profissional no que diz respeito à reflexão sobre sua prática e aos

aspectos que influenciam o seu trabalho.

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Em pesquisas realizadas2 foi possível constatar a recorrência das objeções por

parte dos alunos em relação aos procedimentos dos professores quanto aos

conteúdos, sua distribuição e formas de ensinar. As análises dessas pesquisas

levadas a cabo enumeram a insatisfação quanto à consolidação de conhecimentos

contábeis para inserir-se no trabalho.

Pesquisa realizada no Rio de Janeiro também conclui que “A opinião da maioria é de

que o estudante, ao concluir o curso de Ciências Contábeis, não está apto a exercer

atividades profissionais3.”

___________________________________________________________________

2 LAFFIN, Marcos. (1) O perfil sócio-econômico dos alunos de Ciências Contábeis 97/99 – (2) Avaliação: uma primeira abordagem no Departamento de Ciências Contábeis da UFSC –1999 - (3) Orientação de Monografias de Conclusão de Curso. 3 COELHO, C.U.F. Uma análise do ensino superior de contabilidade e do mercado de trabalho no município do Rio de Janeiro. Revista CRC – SP, março 2001

___________________________________________________________________

Ajudar o aluno a aprender e a superar os procedimentos de aprendizagens é a

contribuição que o professor de contabilidade deve propiciar por intermédio de um

trabalho que se deseja profissional. A prática reflexiva toma sentido quando forem

perceptíveis as dimensões sociais e políticas que esse ensino for capaz de incluir

por meio de práticas que busquem a autonomia da produção do trabalho.

Na operacionalização do currículo prescrito, cabe ao professor de contabilidade,

através do registro do que ocorreu em sua aula, refletir sobre o currículo, não como

um projeto rígido, mas como uma construção capaz de comportar a sensibilidade e a

reflexão sobre as ações dele decorrentes.

Ao justificar a relevância da formação do professor de contabilidade busco contribuir

para superar um ensino homogêneo e pasteurizado que se repete em todos os

lugares.

Tenciono contribuir para um ensino em que alunos e professores sejam sujeitos de

identidades e subjetividades. Para essa perspectiva e para a perspectiva de um

profissional da contabilidade que possa dimensionar suas atividades nas

organizações, é de fundamental importância o estudo desse tema. Contudo, cabe

ainda questionar, como justificativa, como se forma o professor de contabilidade?

Dentro do modelo que inspira a universidade brasileira, a formação de professores

ocupa um lugar bastante secundário. Nele as prioridades são concentradas nas

funções de pesquisa e elaboração do conhecimento científico, em geral

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consideradas como exclusividade dos programas de pós-graduação. Tudo o que

não se enquadra dentro dessas atividades passa, em geral, para um quadro inferior,

como são as atividades de ensino e formação de professores (LÜDKE, 1994, p. 6).

A contribuição do estudo de Lüdke pode ter duas dimensões na justificativa de meu

estudo: a primeira, ao mesmo tempo que faz a crítica da pós-graduação como único

espaço para pensar a pesquisa, indica esse espaço como uma dimensão possível

para discutir a formação do professor de contabilidade; e a segunda, com um acento

de gravidade ainda maior, aponta para a inconseqüente maneira como a formação

dos professores das licenciaturas tem ocorrido no interior das universidades. Esse

eximir-se de contribuir para a formação de uma nova escola por meio da formação

de professores é uma disfunção da universidade. Ao transpor esse entendimento

para a formação do professor de contabilidade penso ser possível ampliar a questão

enunciada acima, no sentido de identificar os componentes que organizam o

trabalho do professor de contabilidade no ensino superior.

Entende-se que: a formação não se constrói por acumulação (de cursos, de

conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade

crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade

pessoal. Por isso é tão importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da

experiência (NÓVOA, 1992, p. 25).

Nesse entendimento, uma educação que seja simultaneamente contábil e formadora

de sujeitos autônomos e de sentido emancipatório humano precisa fomentar e

ajudar a construir um caráter político da prática pedagógica do professor de

contabilidade. Prática política comprometida com os conteúdos com os quais

trabalha e com a articulação dos métodos com os quais socializa conhecimentos, ao

mesmo tempo em que ele próprio se socializa. Entendo que essa dimensão da

formação deve ser simultânea com o compromisso político e com a competência

técnica indissociável da prática pedagógica.

Assim, uma formação que se faça fundamentada na reflexão sobre a vivência do

trabalho a partir do âmbito da aula permite ampliar não somente as experiências

pessoais e profissionais do professor de contabilidade como sujeito histórico, mas

também contribui para o desenvolvimento de novas autonomias. Autonomias estas

que servirão de mediação entre a identificação e o equacionamento dos diferentes

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272

problemas de seu aluno, construindo soluções para estes problemas, como também

propiciando uma imersão em suas causas.

Essa reflexão, que se assume como crítica da própria ação, será capaz de conduzir

à autonomia do trabalho do professor de contabilidade e lhe possibilitará distinguir

entre o prescrito e o autônomo na condução do processo de ensino, expressando

sua concepção na opção da ação transformadora. E como transformadora, também

transitória e sempre preliminar.

O estudo desse tema justifica-se predominantemente pela ausência de um

procedimento reflexivo de natureza social na formação dos profissionais da área da

Ciência Contábil.

Visualizo este estudo como uma contribuição às ações de ruptura e de construção

como processos que se fazem no cotidiano e dizem “respeito a múltiplas frentes”

(CANEVACCI, 1984, p.38).

Justifico a busca por uma prática de reflexão que possibilite sempre a curiosidade

como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como

pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de

atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital (FREIRE, 1997, p.

35).

Explico essa curiosidade como uma pulsação entre o homem e suas relações

sociais no mundo humano, como algo que contemple o homem e seu trabalho, que

desvele o professor de contabilidade e a essência do seu ensinar. Explico essa

curiosidade, tomando como participação a reflexão juntamente com o professor de

contabilidade, como busca rigorosa de rever-se em processos de formação

continuada. Uma curiosidade como utopia de princípios de sensibilidade para com o

gênero humano.

1.4 Relevância e originalidade desta tese

Olhar os fenômenos que ainda não se mostram em sua essência, fenômenos que se

caracterizam como incomuns, é próprio da investigação. Não obstante, uma tese

anuncia uma intenção e uma realização e, nestas, emerge por meio de um discurso,

de movimentos, de proposições, enfim, de uma enunciação. Na dialogia possível

dos argumentos teóricos e empíricos, tal enunciação deve ser capaz de exercer um

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retorno ao seu ponto inicial, qual seja, aos questionamentos que foram pontos de

partida, ainda que artificiais, mas contextualizados e que, ao serem sistematizados

em sua trajetória cotidiana, se mostram, porque sempre em movimento, como

resultados provisórios.

O que constitui uma tese é, portanto, o exercício de uma atividade, de uma maneira

de produzir trabalho e que, ao ser empreendido, ressignifica a vida social, singular e

coletiva, vidas sociais que, ao se constituírem em sujeitos e objetos produzidos pela

história de cada singularidade, recriam novas possibilidades.

Ressignificar a realidade é escrever pela dialogia e por meio da escritura das raízes

ainda ocultas, que tomam o sujeito/objeto não uma nascente pessoal egocêntrica,

mas sim uma interação contemporânea possível de sedimentação epistemológica

pela sensibilidade ética e política. Assim, nesta tese, coloco em ação o meu deixar

de não pensar.

Tenho medo de escrever. É tão perigoso. Quem tentou, sabe. Perigo de mexer no

que está oculto – e o mundo não está à tona, está oculto em suas raízes submersas

em profundidade do mar. Para escrever, tenho que me colocar no vazio. Neste vazio

é que existo intuitivamente. Mas é um vazio terrivelmente perigoso: dele arranco

sangue. Sou um escritor que tem medo da cilada das palavras: as palavras que digo

escondem outras – quais? talvez as diga. Escrever é uma pedra lançada no poço

fundo (LISPECTOR, 1999, p. 15).

O cotidiano é objeto de investigação e é nele que a vida se faz gesto. Assim, ao

perceber sua realidade, refletir sobre seus fenômenos, em suas raízes profundas, e

tentar captá-los em sua essência, constitui-se genuinamente em território próprio

dos sujeitos e objetos de investigação. O território próprio do presente estudo

consiste na problemática referente aos componentes epistemológicos do processo

de ensino que organizam o trabalho do professor de contabilidade no ensino

superior.

Portanto, se é pela diversidade de movimentos que se constrói a história da

humanidade, a qual é constituída na individualidade de significações do todo social,

tem esta tese o objetivo de, por meio da relação educação e trabalho, estudar o

terreno baldio do ensino superior de Ciências Contábeis, sua configuração e sua

organização pela raiz pedagógica.

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Esse desbravar, porque ainda submerso, busca se apropriar dos componentes que

caracterizam a prática pedagógica na organização do trabalho do professor de

contabilidade para significá-lo como parte constitutiva da história universal dos

homens, a partir de espaços contextualizados por diferentes dimensões.

Na investigação do particular - o curso de Ciências Contábeis - dentro de uma

cultura maior - a sociedade organizada em suas instituições - é preciso conhecer

como o cotidiano desse ensinar-e-aprender mantém-se no percurso do

desconhecido, das palavras enunciadas e de outras silenciadas. Quero experienciar

em saberes o que encontro e que são do meu cotidiano como professor de

contabilidade, e que de alguma maneira estão me lançando a uma episteme, para

além dos fragmentos que se fazem de diferentes ou indiferentes maneiras de

ensinar-e-aprender a Ciência Contábil.

Só quando o homem toma conhecimento através do seu rude olhar é que lhe parece

um começo (LISPECTOR, 1999, p. 32).

Ao lidar com a pesquisa na contabilidade, situada no campo das ciências sócio-

econômicas, a originalidade, o ineditismo desta tese não consiste em buscar uma

nova descoberta ou a ampliação dos conceitos e dos modos de fazer existentes,

pela construção de novos conceitos e proposições. O que a constitui como tal se dá

no significar e ressignificar conceitos elaborados no tempo histórico, assim como

compreender e ampliar as práticas sociais deles decorrentes. No estágio atual da

humanidade, conectar a construção histórica do homem universal aos

conhecimentos e práticas contábeis é inferir questões sobre o como e os porquês

desses saberes se movimentarem no universo da diversidade e da

multidisciplinaridade. Compreender é aceitar a transitoriedade do saber, é aceitar

que o que foi pensado, elaborado e implementado no tempo e no espaço pode ser

ampliado no processo de desenvolvimento do ser humano. A originalidade que

busco está no desvelar os fundamentos epistemológicos da organização do trabalho

do professor de contabilidade no ensino superior para, a partir daí, construir e

reelaborar o universo do trabalho em educação no qual a contabilidade, como

ciência sócio-econômica, configure sua contribuição para o desenho de uma

sociedade de inclusão, por meio das muitas maneiras como poderá se relacionar

com outros saberes.

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A relevância do estudo destaca-se, ainda, pelo caráter inédito da pesquisa no que

concerne à forma de abordagem da formação do professor de contabilidade. Saber

quais são os componentes epistemológicos do processo de ensino que organizam o

trabalho pedagógico do professor de contabilidade no ensino superior nos permitirá

compreender os fundamentos epistemológicos da organização do seu trabalho para

visualizar uma estrutura de formação continuada como mediação entre educação e

prática social no ensino superior.

Portanto, se é preciso pensar a formação continuada do professor de contabilidade

face às exigências de um novo contexto, então se faz necessário identificar os

pressupostos de sua formação inicial e as maneiras como desenvolve suas

atividades de ensino para que se possa contribuir, de forma efetiva, para a

formação do professor de contabilidade, o que tem implicações diretas na formação

do contador.

Meu estudo caracteriza-se como relevante porque vai dialogar com o professor,

buscando discutir o caráter da docência e da profissionalização do professor de

contabilidade.

Assim, uma contribuição esperada desta pesquisa é a de caracterizar a dimensão

das dificuldades que o professor encontra na sua prática docente.

Ao sugerir que as atividades de professor são um conjunto de ações que tem uma

finalidade e, por isso, reveste-se de intencionalidade, entendo que é preciso articular

a formação do professor de contabilidade com os profissionais de contabilidade,

reiterando a integração entre ensino, pesquisa e extensão. O professor de

contabilidade tem que se apropriar das atividades do contador para incluir, no seu

trabalho, a perspectiva do desenvolvimento científico da contabilidade, assim como

a visualização de ações da cultura, da ética, da inclusão e da responsabilidade

profissional. Portanto, o professor precisa preocupar-se e estar atento às práticas

possíveis de socializar aprendizagens, porque não é possível abrir mão da

responsabilidade do processo de ensino, uma vez que se pressupõe o professor

como um sujeito culturalmente com mais experiências e conhecimentos sobre os

fenômenos contábeis e concepção de mundo do que seus alunos.

1.5 Metodologia de Construção da Tese

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1.5.1 Pressupostos da Pesquisa

A construção de uma pesquisa necessita de envolvimento, de curiosidade e de

condições materiais para desvelar determinado fenômeno. Nesta pesquisa, esses

pré-requisitos favoreceram o comprometimento em buscar conhecer os fenômenos

que circundam a organização do trabalho do professor de contabilidade.

A partir de um recorte sobre a formação do professor de contabilidade, a temática foi

convertida em curiosidade, expressa como questão norteadora nos seguintes

termos: Quais são os componentes epistemológicos do processo de ensino que

organizam o trabalho do professor de contabilidade no ensino superior?

Tendo por base essa questão busquei um enfoque crítico, mediante o qual pretendo,

a partir da conclusão da pesquisa, contribuir como ensino de Ciências Contábeis,

em diversas instâncias do ensino superior, mais especificamente com o trabalho do

professor de contabilidade.

Sob essa perspectiva fiz a opção pela pesquisa qualitativa, uma vez que:

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa, nas

ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja,

ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e

atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos

processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de

variáveis (MINAYO, 1996, p. 21-22).

Ao trabalhar com o universo de significados que os professores de contabilidade do

ensino superior atribuem ao trabalho pedagógico, o estudo configurou-se como

qualitativo, porque foram analisados os dados que emergiram do próprio ambiente,

ou seja, do curso superior em Ciências Contábeis; dos professores de contabilidade

e seus saberes sobre o ensino e sobre a organização do seu trabalho.

No contexto dessa pesquisa, com o ressignificar dos sentimentos, das atitudes, dos

gestos, das palavras, das crenças, admitiu-se como possível a constituição da

diversidade em diferentes maneiras de ser do sujeito professor. Assim, o universo de

significados construído pelos diferentes atores sociais explicita uma representação

social das suas experiências construídas e interpretadas, subjetiva e objetivamente

no cotidiano da vida.

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Minayo (1994) diz que mesmo sabendo que ela (representação social) traduz um

pensamento fragmentário e se limita a certos aspectos da experiência existencial

freqüentemente contraditória, possui graus diversos de claridade e nitidez em

relação à realidade (...) Porém, é importante observar que as Representações

Sociais não conformam a realidade e seria outra ilusão tomá-las como verdades

científicas, reduzindo a realidade à concepção que os atores sociais fazem dela.

(MINAYO, 1994, p. 173-174)

Os fenômenos que ocorrem na realidade não são passíveis de apreensão na sua

totalidade, de forma que as inferências feitas sobre a realidade percebida, são

capazes, quando substantivizadas, de configurar as produções elaboradas nas

relações sociais de uma realidade que se expressam em sentimentos, valores,

crenças, atitudes e que são produzidos também pelos interesses dos grupos sociais

a que pertencem. Assim, ao estudar o curso superior de Ciências Contábeis, o

professor de contabilidade com seus saberes sobre o ensino, a organização do seu

trabalho mediante o que foi possível apreender dessa realidade, configurei uma

representação social desse fenômeno.

Com este entendimento, o estudo proximizou também uma maior interação de

minha parte com os professores de contabilidade e com o curso de Ciências

Contábeis. A proximidade desse contexto possibilitou a elaboração de subsídios

teóricos sobre o curso, o perfil dos professores pesquisados e a organização do seu

trabalho, visando compreendê-los sob a perspectiva histórica, assim como a

possibilidade de contribuir com novos conhecimentos e significados na produção do

trabalho docente.

Essa perspectiva foi corroborada na fala de um professor, que ao participar da

pesquisa expressou-se da seguinte forma:

Gostei da abrangência do questionário e entendo que serve, inclusive, para algumas

mudanças diretas e imediatas nos procedimentos. Ele me fez refletir ... reposicionar

... redirecionar algumas atitudes pedagógicas com aplicabilidade imediata. Entendo,

muito útil, depois de tabulado, para subsidiar o planejamento estratégico e

operacional do Departamento.

Nesse sentido, a partir da realidade pesquisada, os dados foram interpretados e

analisados por meio de múltiplos diálogos com o referencial teórico que,

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compreendido como princípios explicativos, possibilitaram uma reflexão mais crítica

das alternativas de mudanças, nos limites do que é possível propor a partir desse

estudo.

1.5.2 Delimitação do Estudo

A delimitação e a abrangência desse estudo visou a atingir o objetivo de

compreender os fundamentos epistemológicos da organização do trabalho do

professor de contabilidade no ensino superior, circunscrito no contexto de 04

(quatro) Instituições de Ensino Superior que oferecem o curso superior de

Ciências Contábeis, sendo 01 (uma) instituição pública e 03 (três) instituições

particulares.

Destas 04 (quatro) instituições, 02 (duas) estão localizadas no município de

Florianópolis, respectivamente a Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC e

a Fundação Barddal de Educação e Cultura - BARDDAL; 01 (uma) no município de

Palhoça, denominada Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL e 01 (uma)

no município de Biguaçu, denominada de Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.

1.5.3 Os sujeitos da Pesquisa

Os sujeitos da pesquisa são professores com graduação em Ciências Contábeis que

trabalham com disciplinas do conhecimento contábil no curso superior de Ciências

Contábeis.

Os professores estão vinculados aos departamentos de Ciências Contábeis das

instituições acima referidas e formam a estrutura curricular referente ao período de

2001 e 2002 das respectivas instituições.

A população amostral desse estudo foi configurada inicialmente de 54 (cinqüenta e

quatro) professores, sendo 22 (vinte e dois) professores da UFSC, 05 (cinco)

professores do BARDDAL, 12 (doze) professores da UNISUL e 15 (quinze)

professores da UNIVALI.

Contudo, foi necessário ajustar o universo de 54 (cinqüenta e quatro) para uma

amostra de 42 (quarenta e dois) professores.

A redução do universo amostral ocorreu em função de que:

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a) Do total de 32 (trinta e dois) professores do universo BARDDAL, UNISUL E

UNIVALI, a amostra repetiu-se em 07 (sete) professores, reduzindo-se para 25 (vinte

e cinco) professores.

b) Do total de 22 (vinte e dois) professores da UFSC 05 (cinco) não participaram da

pesquisa em função de estarem em diferentes tipos de afastamento das atividades

de trabalho, reduzindo-se a amostra para 17 (dezessete) professores.

Contudo, do universo caracterizado em 42 (quarenta e dois) professores, 28 (vinte e

oito) disponibilizaram-se a participar efetivamente da pesquisa.

Os professores da UFSC possuem vínculo de trabalho mediante concurso público,

regidos pelo Regime Jurídico Único. Dos participantes da pesquisa, 14 (catorze) tem

regime de dedicação exclusiva e 01 (um) com regime de 20 (vinte) horas.

Os professores das 03 (três) instituições particulares mantêm vínculo com as

instituições através da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), com contrato de

trabalho baseado em horas-aula.

Para expor com transparência todos os dados e todas as informações, sem contudo,

constranger os sujeitos pesquisados, optei por substituir a identidade dos

professores por outros nomes.

1.5.4 Os Instrumentos e o Local da Pesquisa

Empoleirado num ramo, o famoso Gato de Chester, com o seu eterno sorriso,

parecia esperar.

- Por onde é que hei de ir?

- Depende do lugar aonde quiseres chegar!

À direita mora um chapeleiro maluco e à esquerda a Lebre de Março, que perde a

cabeça quando as folhas novas arrebentam e também quando as folhas caem.

- Mas eu não tenho vontade nenhuma de fazer visitas a malucos!!

- Que importância têm? Todos nós somos malucos (CARROL, 1980, p.:13)

Se eu não soubesse para onde ir, qualquer caminho serviria. Mas eu sabia onde

queria chegar: compreender como se configura o trabalho do professor de

contabilidade; para tanto, foi preciso conhecer os caminhos e os diferentes recursos

de coleta de dados para decidir por onde ir e, assim, saber como encaminhar e

como caminhar com o outro.

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Neste caminhar/conhecer foi preciso mudar o previamente planejado. Como ponto

de partida para a coleta de dados havia feito a opção pela entrevista semi-

estruturada, por considerar esse recurso um instrumento favorável na observação de

detalhes, gestos, pausas, rearticulação da fala enfim, de um conjunto de dados que,

quando recorrentes, articulam-se de forma mais expressiva e consistente. Porém,

nas primeiras abordagens junto ao universo da pesquisa, a entrevista não foi aceita

como instrumento de diálogo para a coleta de dados.

Vários fatores e indícios redundando na questão tempo contribuíram para inibir a

entrevista.

Esse fato, em seu contexto, constituiu-se em dado a ser considerado na busca das

demais informações para a pesquisa.

Pesquisar é embrenhar-se na realidade e a realidade não é estática e nem sempre

se mostra tal como se movimenta. Nessa compreensão da realidade e, diante do

fato de recusa para as entrevistas, o percurso da coleta de dados teve que ser

refeito através do uso do questionário. O questionário havia sido pensado como

instrumento para a coleta de dados sobre a caracterização do universo e dos

sujeitos da pesquisa. No entanto, nesta pesquisa, em seu primeiro momento,

assumiu-se o questionário como um instrumento constituído de uma série ordenada

de perguntas, que [foram] respondidas por escrito e sem a presença do

entrevistador. Em geral, o pesquisador envia o questionário ao informante, pelo

correio ou por um portador; depois de preenchido, o pesquisado devolve-o do

mesmo modo (MARCONI & LAKATOS, 1985, p. 74).

Com o questionário como instrumento central para a coleta de dados, as questões

que haviam sido pensadas para nortear as entrevistas semi-estruturadas tiveram de

ser rediscutidas, analisadas, reformuladas com o subsídio de diferentes áreas.

Na educação busquei contribuições para focalizar as questões que envolvessem a

formação e a prática pedagógica dos professores pesquisados. Com o olhar da

Psicologia da Educação busquei contribuições para fundamentar, entre o pretendido

e o possível, o alcance das questões propostas. Com a contribuição da área da

lingüística busquei a coerência entre os objetivos da tese e as perguntas do

questionário. Portanto, tanto na redifinição do instrumento de coleta de dados quanto

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nas questões busquei garantir a mesma expressividade e consistência previstas

previamente para as entrevistas semi-estrururadas.

Depois de refeito o instrumento de coleta de dados, voltei ao universo da pesquisa

por diferentes meios, tais como e-mails, telefonemas, encontros presenciais para

disponibilizar informações sobre o questionário e seu objetivo, assim como para

garantir o maior número de participantes.

Dessa forma, o questionário foi utilizado para: (1) a caracterização do universo e dos

sujeitos da pesquisa, (2) a coleta de dados sobre questões que permitissem

identificar a trajetória de inserção e de formação do professor de contabilidade no

ensino superior e, (3) o atendimento aos objetivos relacionados à prática

pedagógica desses professores. Portanto, o questionário, nesse estudo, objetivou

coletar dados para as questões que envolveram a natureza da problemática

estudada.

No conjunto das circunstâncias que envolveram o estudo foi necessário construir e

reconstruir as relações de diálogo com os professores, com suas maneiras de

compreender a organização do trabalho docente, uma vez que, com a abordagem

qualitativa, pretendi contemplar um mundo cultural como objeto a ser conhecido e

que, ao mesmo tempo se supunha e desejava tornar-se conhecido.

Assim, no processo de aproximação com os professores, tendo em vista o objeto

deste estudo, foi preciso construir um ambiente propício para vários encontros. Esse

retorno à fonte dos dados serviu para aprofundar algumas questões que

primeiramente, na coleta de dados via questionário, não apresentaram respostas

possíveis de inferências, por serem questões com respostas insuficientes ou

embrionárias de explicitação.

Através do processo de locução estabelecido com os professores, mais

precisamente com aqueles que disponibilizaram o retorno ao questionário, aproveitei

para incluir o rascunho da construção preliminar dos dados. Esse artifício objetivou

compreender e aprofundar determinada resposta do questionário que fazia

inferência, ao mesmo tempo em que se convertia o questionário em discussões mais

explícitas. Esse recurso do diálogo, da leitura do rascunho da análise preliminar

permitiu resgatar não somente mais informações sobre as questões elencadas no

questionário, como também o de superar o imaginário dado explícito, o dado pronto

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que estaria contido nas entrevistas. Assim, de uma maneira muito peculiar, muitos

dados foram obtidos e ampliados por meio de um tipo de entrevista-diálogo mediado

pelo texto preliminar de análise de dados.

No conjunto, esses recursos constituíram um rico material de informações, o que

possibilitou conhecer o cotidiano do ensino-aprendizagem e a organização do

trabalho dos professores desta pesquisa.

Portanto, para alcançar os objetivos específicos de identificar a trajetória de inserção

e de formação do professor de contabilidade, assim como de identificar as

concepções epistemológicas e as categorias metodológicas do trabalho pedagógico

do professor de contabilidade no ensino superior, fez-se necessário apresentar

preliminarmente os princípios explicativos aqui caracterizados na concepção de

Homem e de Trabalho, que intrínsecos à formulação da questão de pesquisa,

objetivam a sua articulação. Envolvendo discussões sobre a concepção de Homem,

foram discutidos alguns aspectos sobre a formação do professor. Na categoria

Trabalho foram discutidos alguns aspectos relativos à prática pedagógica do

professor de contabilidade.

Nesse contexto, as categorias foram entendidas como “formas de conscientização

nos conceitos e modos universais da relação do homem com o mundo, que refletem

as propriedades e leis mais gerais e essenciais da natureza, a sociedade e o

pensamento”.

(DICCIONÀRIO DE FILOSOFIA, 1984, p. 59). De acordo com Sampaio 1998, as

categorias não surgem a priori para organizar dados em compartimentos estanques,

mas [para organizar] princípios articuladores que se relacionam mais fortemente a

alguns indicadores, embora se apliquem a todos os indicadores apontados

separadamente (SAMPAIO, 1998, p. 241).

Os princípios explicativos iniciais desse estudo eu discuto e apresento nos conceitos

de Homem e de Trabalho, no segundo capítulo, assim como estes conceitos estão

envolvidos na apresentação, discussão e justificativa do tema. Outros indicadores,

tais como educação, ensino-aprendizagem, prática pedagógica, relação professor-

aluno entre outros possíveis e decorrentes da questão de pesquisa foram

incorporados ao estudo.

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As discussões sobre a inserção do conhecimento contábil no ensino e a

caracterização do atual ensino superior de Ciências Contábeis eu discuto no

terceiro capítulo.

No capítulo quarto e quinto arrolo os dados empíricos que atendem os objetivos

desta tese e, posteriormente, apresento a sua conclusão.

1.5.5 Limites da Tese

Para o desenvolvimento dessa tese sobre a formação e o trabalho do professor de

contabilidade adotei os procedimentos metodológicos considerados adequados. No

entanto, os recursos metodológicos carregam limites e neles mesmo, recursos e

limites, reconheço a incompletude das possibilidades do tema em análise.

Os instrumentos utilizados para a coleta de dados nessa tese podem ter causado

alguns problemas na sua obtenção. Assim, também, a opção pelo referencial teórico

utilizado assumiu contornos de inferir na construção do objeto em análise.

Dessa forma, autores utilizados foram identificados e assumidos, sem contudo

confrontá-los em suas diferenças epistemológicas. Com isso pretendi resgatar suas

contribuições como possibilidades de explicar os dados que emergiram da pesquisa

empírica.

Considero também que esse estudo, por apresentar-se como primeira abordagem

ao tema, encontrou alguns limites em seus aspectos de análises, comparações e

generalizações.

Portanto, não pretendi apresentar soluções pontuais à questão estudada, mas sim

circunscrevê-la como objeto de pesquisa no âmbito do conhecimento contábil.

Desse modo, no contexto desse estudo sobre a formação e o trabalho do professor

de contabilidade colocam-se os seus limites, mas também os seus desafios.

2 O HOMEM E O TRABALHO: concepções e relações sociais

2.1 A Condição Humana

2.1.1 O homem: da transgressão do instinto para o ser de reflexão

A vida, considerada atemporal e infinitamente involutiva na sua origem, está

presente no processo de desenvolvimento do homem. A origem da vida humana,

como involutiva no tempo, encontra abrigo nos estudos da Paleoantropologia,

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ciência que estuda a o conjunto de mudanças que ocorre na vida do homem. Os

achados arqueológicos e pesquisas realizadas, subsidiadas por recursos de

sofisticada tecnologia, têm produzido inferências desestabilizadoras sobre a origem

da vida humana. A cada nova descoberta de fósseis, outros vestígios de vida

afirmam ser de milhões de anos a origem humana na Terra.

O homem, como vida, como um ser de espécie animal é atemporal, não tem uma

data de nascimento. A sua temporalidade como marco distintivo do processo de

hominização configura-se no gênero humano, processo da ação transformadora do

homem sobre a natureza, resultando na construção de um mundo humano, mundo

construído pelo homem.

Assim, o gênero humano, como resultado da relação do homem com outros homens

e com objetos, constitui-se no homem presente, que desde o princípio, ao se

produzir, produz cultura, singularidade essa que não se incorpora por

hereditariedade genética, mas por procedimentos de agir intencional. O homem

atual, na sua unicidade, constitui várias dimensões humanas e, em sua natureza

histórica, apreende seu processo de desenvolvimento.

Natureza humana não como naturalmente humano ou como a naturalização do

humano, como se houvesse uma síntese apriorística em cada homem; porém,

compreendido como natureza humana o ser em movimento que, ao transformar o

espaço que o constitui, transforma também os seus modos de ser. Nesta acepção, a

natureza humana é apreendida de forma crítica na qual assume-se como condição

humana. Dessa forma, o homem passa a ser visto como um ser que constrói as

formas de satisfação de suas necessidades e faz isto com outros homens. Essa é a

sua condição. A cada momento histórico é preciso que se compreenda como isto

está se dando, que necessidades estão colocadas e quais as formas de satisfação

delas que foram construídas; como o homem tem feito isto com os outros homens

(BOCK, 1999, p. 16).

Sob essa compreensão, o homem toma posse das conquistas anteriores, apropria-

se da cultura produzida, faz-se para ser e, nessa dimensão, sua vida e sua

significação passam a ser coletivas, pois a vida não é solitária. A vida é a

materialidade, é a materialidade abstrata conjugada nas condições do vir a ser das

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contradições, dos enfrentamentos, de forma que o homem produza o seu vir a ser

pela dialética no/com o outro.

Na concepção de condição humana, a identidade do gênero humano, como ser

genérico, constitui-se na relação com o outro que, para além do pensar abstrato,

incorpora-o à materialidade da sua existência. Assim, o homem se faz pelo conjunto

dos outros homens pelo qual produz autonomia coletiva da sua sobrevivência, que

necessita ser compreendida como lugar social, contextualizada na materialidade

humana e, em suas efetivas condições. Somente assim é possível explicar o homem

sem os limites da sua individualidade e compreendê-lo como condição humana em

movimento.

A vida do homem, caracterizada pela gênese biológica e simultaneamente pelo

desenvolvimento do processo histórico-cultural, constitui o gênero humano como

múltiplas possibilidades de alcançar a superação qualitativa do estágio atual do

processo histórico-social. A busca constante pela superação da existência humana,

não apenas em termos epistemológicos, mas sobretudo em objetivações materiais,

conserva perene a inquirição profunda sobre a sua origem e o seu futuro. Esse

questionamento, em síntese, evidencia o processo de construção de novas buscas

pelo confronto dos conhecimentos já elaborados, ao mesmo tempo que produz

complexos significados sobre o fazer de sua vida, ressignificando e recolocando a

pergunta: que é o homem?

É esta a primeira e principal pergunta da filosofia. Como respondê-la? (...) Se

observarmos bem, veremos que – ao colocarmos a pergunta “o que é o homem” –

queremos dizer: o que o homem pode se tornar, isto é, se o homem pode controlar

seu próprio destino, se ele pode “se fazer”, se ele pode criar a sua vida. Digamos,

portanto, que o homem é um processo, precisamente o processo de seus atos.

Observando ainda melhor, a própria pergunta “o que é o homem” não é uma

pergunta abstrata ou “objetiva”. Ela nasce do fato de termos refletido sobre nós

mesmos e sobre os outros; e de querermos saber, de acordo com o que vimos e

refletimos, aquilo que somos, aquilo que podemos ser, se realmente – e dentro de

que limites – somos “criadores de nós mesmos”, da nossa vida, do nosso destino. E

nós queremos saber isto “hoje”, nas condições de hoje, da vida de “hoje”, e não de

uma vida qualquer e de um homem qualquer (GRAMSCI, 1978, p. 38).

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O homem de hoje é o homem concreto refeito por questões e situações complexas

do devir humano, dos seus gestos, das suas ações, da sua reflexão, dos níveis de

sua consciência, das suas condições objetivas de vida. É na dimensão da reflexão

sobre si mesmo e suas ações que o homem se projeta para a construção de seu

destino. Entretanto, é no confronto entre as perspectivas desejadas e os limites do

seu vir-a-ser que se lança como ser filosófico, ser em reflexão, que se indaga sobre

sua individualidade, sobre seu coletivo e sobre o destino de sua construção

histórica. É o homem de hoje, fazendo o resgate do seu percurso histórico e

projetando-se para as suas possibilidades, que mantém latente a questão da busca

sobre se aquilo que somos como gênero é tão somente aquilo que podemos ser ou

se aquilo que somos como gênero são as possibilidades do devir humanizando-se.

2.1.2 Uma possibilidade do compreender-se humano

O homem, como gênero humano, pode ser entendido por diferentes estágios de

desenvolvimento. Esses estágios não são considerados situações positivas de um

desenvolvimento linear, uma vez que carregam também situações adversas que se

conjugaram em sua construção em diferentes momentos. Assim, com a convicção

da passagem de um ser animal para o gênero humano, tem-se a etapa na qual, no

primeiro estágio, pode-se entender o homem como desenvolvimento exclusivamente

biológica. Esse desenvolvimento se caracterizou pela adaptação ao meio ambiente e

pelas mudanças ocorridas no conjunto das condições que a cercaram. Para

compreender e aceitar esse processo de desenvolvimento, é necessário

primeiramente compreender que ocorreram transformações no organismo biológico,

as quais foram sendo acumuladas na sua carga genética e que, por sua vez, foram

se transformando ao longo do tempo. Essas transformações foram sendo

transmitidas às gerações futuras. Esse entendimento de mudanças exclusivamente

biológico, portanto, supõe um longo processo de transformações porque se

caracterizou como necessária primeiramente o desenvolvimento biológico na busca

de adaptação ao ambiente da espécie. Com isso, não quero dizer que o pensamento

ainda não existia, mas que a necessidade adaptativa teve primazia em face da sua

fragilidade biológica existente no conjunto do que era ainda inorgânico. Portanto:

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Como qualquer outra espécie animal, o homem é um produto determinado e limitado

pela natureza; ele é capaz, entretanto, de elevar-se acima de tais limites, de

subordinar ao seu poder o conjunto da natureza, transformando tal conjunto em seu

corpo inorgânico (MARKUS, 1974, p.48).

Por conseguinte, foi preciso fazer-se pelo domínio da natureza para

simultaneamente fazer-se com a natureza e, assim, convertendo-a em seu

benefício, avançar para um segundo momento que incorpora a atemporalidade do

primeiro, determinará os fundamentos para a vida associativa. Essa rudimentar

maneira de vida coletiva é indicada pela produção de instrumentos recorrentes e

adequados às exigências de sobrevivência. Nesse processo de aprendizagens e

desenvolvimento, o gênero humano esteve consciente de sua realidade, consciência

essa adquirida pela experiência e pela atividade cognitiva. Essa sensibilidade vai

ampliar-se na produção da sua existência, hominizando suas dimensões de coletivo.

De acordo com Marx e Engels:

Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo

o que se queira. Mas eles próprios começam a se diferenciar dos animais tão logo

começam a produzir seus meios de vida, passo esse que é condicionado por sua

organização corporal. Produzindo seus meios de vida, os homens produzem,

indiretamente, sua própria vida material (MARX & ENGELS, 1979, p. 27).

Como decorrência, o Homo Sapiens evidencia o terceiro estágio do homem. O

desenvolvimento decorrente de suas aprendizagens, também na atemporalidade,

incorporando os processos anteriores, é agora caracterizado pelo desenvolvimento

de atividades próprias da prática social.

A partir dos processos de uma formatação biológica que incorporou a natureza como

campo inorgânico em sua natureza, o homem se forma em sua biologia com a

estrutura do gênero humano e assim, superando questões relacionadas à seleção

natural, conduz-se para formas de organização coletiva, importante para sua

sobrevivência e mediadora em sua relação com a natureza.

Incorporando também esse estágio, o gênero humano não mantém apenas uma

relação adaptativa com o ambiente, passa a apropriar-se da natureza

sucessivamente, convertendo-a em favor da sua objetivação, ou seja, produzindo e

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reproduzindo o gênero humano, sua realidade, suas necessidades, assim como a

apropriação dos resultados historicamente alcançados.

A historicidade desses processos e estágios possibilitou ao homem transgredir seu

instinto de adaptação para o estágio de reflexão, revelando que as propriedades

biologicamente herdadas do homem não determinam as suas aptidões psíquicas. As

faculdades do homem não estão virtualmente contidas no cérebro. O que o cérebro

encerra virtualmente não são tais ou tais aptidões especificamente humanas, mas

apenas a aptidão para a formação destas aptidões (LEONTIEV, 1978, p. 257).

A objetivação, o desejo de fazer-se genericamente, são marcados por diferenças

entre o instinto e o pensamento. Essas diferenças consideram a herança genética

existente no organismo humano, que transmite as características da espécie para as

novas gerações, mas a existência objetiva do homem, a sua maneira de ser no

mundo, a satisfação de suas necessidades não são transmitidas geneticamente e

sim por sua organização social, pela realização de atividades num crescendo de

complexidades sem fim. É neste sentido que o desenvolvimento do gênero humano

é histórica e social, constituindo-se, assim, a cultura humana em diferentes estágios.

A vida agora convertida em vida no e do gênero humano impõe que o primeiro

pressuposto de toda a existência humana e de toda a história, é o que os homens

devem estar em condições de viver para poderem fazer história. Mas, para viver, é

preciso antes de tudo comer, beber, ter habitação e algumas coisas mais. O primeiro

ato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam a satisfação dessas

necessidades. (...) O segundo ponto é que, satisfeita essa primeira necessidade, a

ação de satisfazê-la e o instrumento de satisfação já adquirido conduzem a novas

necessidades – e esta produção de novas necessidades é o primeiro ato histórico

(MARX & ENGELS, 1979, p. 39-40).

Ao produzir os meios que permitam a satisfação de suas necessidades, o gênero

humano estabelece o caráter a ser empregado em sua sobrevivência e torna-o

complexo ao procurar a apropriação daquilo que de humano ele próprio elaborou.

Dessa maneira, o homem pode ser compreendido como um ser vivo no qual a vida,

como princípio ontológico, transcorre de forma a inaugurar uma realidade histórica

pela produção e reprodução da sua existência, qual seja, da realidade humana

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constituída da apropriação da natureza e que, por sua vez, se refaz na natureza

humana.

Assim, a pergunta: que é o homem? não apenas alude às possibilidades do vir-a-ser

do gênero humano, como também requer sua contextualização, abordando, entre

outras dimensões, o devir do ser humano ético-político. Ético porque suscetível a

adquirir qualidades e valores na preservação da vida individual e coletiva; político

porque, autodeterminado, de modo absoluto capaz de decidir numa visão de

totalidade, sabendo que esta sempre será relativa.

Nessa perspectiva, o ser histórico e social incorpora a multidimensionalidade da

diversidade cultural produzida pelo próprio gênero, construindo em diferentes

dimensões atributos de sua essência e de sua liberdade na totalidade de ser, ao

mesmo tempo, singular e coletivo.

2.1.3 A cultura do gênero humano

O homem dos grandes centros urbanos, o homem do interior, o homem simples, o

homem complexo, o homem igual, o homem desigual, o homem como gênero

humano em seu estágio atual, todos, sem exceção, encarnam e condensam em si a

sua construção histórica e de essência humana. Nesse refazer-se contínuo, o

homem é, precisamente, o resultado de seus atos refletidos sobre ele próprio e

sobre os outros.

A cultura do gênero humano são as diferentes relações construídas entre o homem

e outro homem, entre a singularidade e a coletividade do gênero. A cultura é,

portanto, resultante das relações e situações que se humanizam na relação própria

de significados temporais para os homens dado o contexto no qual se incluem, a

saber:

Na Índia, onde os casos de meninos-lobo foram relativamente numerosos,

descobriram-se, em 1920, duas crianças, Amala e Kamala, vivendo no meio de uma

família de lobos. A primeira tinha um ano e meio e veio a morrer um ano mais tarde.

Kamala, de oito anos de idade, viveu até 1929. Não tinham nada de humano e seu

comportamento era exatamente semelhante àquele de seus irmãos lobos. Elas

caminhavam de quatro patas apoiando-se sobre os joelhos e cotovelos para os

pequenos trajetos e sobre as mãos e os pés para os trajetos longos e rápidos. Eram

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incapazes de permanecer de pé. Só se alimentavam de carne crua ou podre,

comiam e bebiam como os animais, lançando a cabeça para frente e lambendo os

líquidos. Na instituição onde foram recolhidas, passavam o dia acabrunhadas e

prostradas numa sombra; eram ativas e ruidosas durante a noite, procurando fugir e

uivando como lobos. Nunca choraram ou riram. Kamala viveu durante oito anos na

instituição que a acolheu, humanizando-se lentamente. Ela necessitou de seis anos

para aprender a andar e pouco antes de morrer só tinha um vocabulário de

cinqüenta palavras. Atitudes afetivas foram aparecendo aos poucos. Ela chorou pela

primeira vez por ocasião da morte de Amala e se apegou lentamente às pessoas

que cuidaram dela e às outras crianças com as quais conviveu. A sua inteligência

permitiu-lhe comunicar-se com outros por gestos, inicialmente, e depois por palavras

de um vocabulário rudimentar, aprendendo a executar ordens simples (REYMOND,

1965, p. 12-14).

A citação acima nos permite afirmar que apenas a estrutura biológica existente no

humano não é suficiente para que se desenvolva o que é essencialmente próprio do

gênero humano: sua cultura, produzida humanamente por meio das suas relações

sociais.

No estágio atual da humanidade, o gênero humano tem diante de si e para si, na

individualidade ou na coletividade, histórias de sua constituição. Mediante essa

historicidade constitui a subjetividade humana e através desta constitui o todo social.

O processo de apropriação da construção social expande o contexto cultural que o

constitui e, nesse contexto é particularmente aceitável o processo de hominização,

ou seja, do processo de transformação na constituição das características físicas e

psíquicas do homem.

Ao compreender e aceitar o gênero humano como processo de transformação

biológico e cultural, faz-se a síntese das múltiplas relações que o humano produziu

para o estágio da vida associada.

O processo de humanização do gênero humano pode ser entendido como

decorrente de aprendizagens de situações concretas, permitindo assim a

variabilidade humana e seu desenvolvimento. A variabilidade humana,

diferentemente do instinto de outras espécies, decorre da intencionalidade da ação

humana, projetando-se para além do tempo presente como experiência vivida,

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ultrapassando a realidade que o cerca. É no processo de transformação da natureza

que o homem produz sua cultura, a qual progressivamente modifica o próprio

homem, porque é o ato condensado de consciência da finalidade que o faz agir.

2.1.4 A multidimensionalidade do gênero humano

O gênero humano, na sua individualidade, reúne a sua coletividade e a sua cultura.

Essa afirmação sem qualitativos ou adjetivações pode ser aceita como perene assim

como parecer de uma banalidade próxima ao absurdo. Mas é também na

perspectiva do absurdo, do espanto, que a existência humana se caracteriza por

processos criativos, reinventando, a partir do subterrâneo das aparências do

cotidiano, o seu propósito de realidade.

O gênero humano, em suas múltiplas dimensões, é na individualidade o coletivo

reconstruído pelas mediações da própria cultura elaborada pelo homem. Assim, o

homem é, no seu conjunto complexificado, feito de conceitos e arranjos sociais que

o circundam desde a realidade apreendida à abstração do trabalho, da arte, da

ciência, autor e sujeito de suas produções.

Escolho discorrer agora, por gosto, sobre a dimensão da arte no artista, lembrando a

advertência feita por Rubem Alves (1999, p. 37) de que “gosto, como se sabe, é uma

categoria não científica, não podendo ser objeto de pesquisa”. No entanto, tão

necessário é o gosto, não somente como desejo de querer, de decidir, de politizar o

aconselhamento, mas até mesmo diante das referências objetivas da ciência!

A arte é o artista. O artista não está fragmentado; antes, o artista recompõe, por

meio do belo, do inusitado, do gesto, da palavra, a dimensão plena do gênero

humano. O homem faz-se estético no reflexo da arte-cultura que produz porque a

incorpora. Na produção da arte, em suas dimensões de múltiplas linguagens,

afeiçoa desde o concreto da literatura, da pintura, da estética, do gesto do teatro, do

cinema, do lúdico, da música até o abstrato da literatura, da pintura, da estética e do

gesto do teatro, do cinema, do lúdico, da música.

Na dimensão do artista está a dimensão da arte e, assim, entrelaçam-se

possibilidades de desvelar outras realidades ainda não pensadas, que sugerem a

não fragmentação do gênero humano, mas sim a constituição de uma manifestação

filosófica. Portanto, o gênero humano, na busca de expressar sua compreensão

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sobre a sua própria humanidade incorporada pelo ser, pensa o próprio ser, de modo

que:

No poetar do poeta, como no pensar do filósofo, de tal sorte se instaura um mundo,

que qualquer coisa, seja uma árvore, uma montanha, uma casa, o chilrear de um

pássaro, perde toda monotonia e vulgaridade (HEIDEGGER, 1969, p. 55).

Assim, o ser humano, para além da liberdade do gesto criativo, para além da

produção da cultura e apropriação da produção humana, recria sua história, sua

visão de mundo e muitas vezes opõe-se radicalmente ao existente, tornando belo o

vulgar, dinâmico o monótono, visível o insensível. No esparramar de tantos

contrários, mostra sua unidade, sua síntese, suas referências, suas ancoragens. O

que aparenta ser fragmento impõe-se como unidade quando questiona, sugere,

afirma ou nega por meio da impressão da síntese criativa artístico-cultural ou

científico-cultural em sua produção humana. Desse modo, ao tentar procurar em

partes as partes dessa totalidade única e inexorável, o gênero humano esvazia-se

em sua essência, buscando nas sínteses os vários recomeços. Está nesse gesto o

movimento das afirmações de suas múltiplas negações. Esta possibilidade dos

contrários é relatada no mito de Sísifo:

Os deuses tinham condenado Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até o

cume de uma montanha, de onde a pedra caía de novo, em conseqüência de seu

peso. Tinham pensado com alguma razão, que não há castigo mais terrível do que o

trabalho inútil e sem esperança. (...) O rochedo ainda rola.

Deixo Sísifo no sopé da montanha! Encontramos sempre o nosso fardo. Mas Sísifo

ensina a fidelidade superior que nega os deuses e levanta os rochedos. Ele

também julga que tudo está bem. Esse universo, enfim sem dono, não lhe parece

estéril nem fútil. Cada grão dessa pedra, cada estilhaço mineral dessa montanha

cheia de noite forma por si só um mundo. A própria luta para atingir os píncaros

basta para encher um coração de homem. É preciso imaginar Sísifo Feliz (CAMUS,

s/d, p. 147, 152).

Escapar à condenação da morte pelo recomeço incessante de sua condenação

ilustra de maneira significativa que somente o homem, como ser multidimensional, é

capaz de fazer-se feliz diante do tormento. Essa não é somente uma visão ingênua

e romântica do homem em relação à diversidade humana existente, mas é também

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uma visão que comporta a existência de um fardo, de uma opção, de um movimento

necessário e não linear de constituição do homem de reflexão: refazer-se por

rupturas pode apenas parecer absurdo.

Negar uma dada situação é argumentar em favor de seus contrários e, assim, negar

os deuses é ressignificar o mundo humano em cada estilhaço. É preciso, portanto,

imaginar.

Somente o homem, como gênero humano em múltiplos gestos de ser, é capaz de

rever-se, de refletir e de relativizar entre o estéril e a possibilidade de outros

mundos.

O gênero humano, na multiplicidade artística, não constitui apenas a representação

do seu tempo, nem o tempo do seu trabalho, mas sim o tempo da sua construção no

ir e vir não do contexto imediato, mas do existir do gênero.

O homem arte, o homem artista, a arte-homem é o homem pleno de todos os

homens, porque simultaneamente constrói amplas relações de produtividade ou

esvazia-se em perdas reparáveis. Mesmo assim, constitui-se em síntese de

totalidade e diversidades. Assim, o gênero humano, na sua individualidade, reúne a

sua coletividade e a sua cultura. E desde que seja possibilitada a ele, nas

dimensões do conhecimento, uma determinada busca, de sentidos e significados por

qualquer objeto do conhecimento, definido ou indefinido, esta se converterá na

enunciação de uma objetividade, de uma pluralidade, de uma referência. Saramago

enfatiza que:

sentido e significado nunca foram a mesma coisa; o significado fica-se logo por aí, é

direto, literal, explícito, fechado em si mesmo, unívoco, por assim dizer, ao passo

que o sentido não é capaz de permanecer quieto, fervilha de sentidos segundos,

terceiros e quartos, de direções irradiantes que se vão dividindo e subdividindo em

ramos e ramilhos, até se perderem de vista, o sentido de cada palavra parece-me

com uma estrela quando se põe a projectar marés vivas pelo espaço fora, ventos

cósmicos, perturbações magnéticas, aflições (SARAMAGO, 1997, p. 134).

O homem se comunica por meio da palavra, espalhando sentidos e significados,

buscando sempre a inquietude frente às possibilidades de todos usufruírem a

totalidade cultural produzida pelos próprios homens. Mesmo as implicações

reducionistas de objetividade derivadas da própria subjetividade humana,

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designação de ciência ou arte, são superadas pela permeável referência do pensar

em algo ainda ausente. Essa projeção de realidade é única no gênero humano e

característica essencial do ser que constrói artefatos na relação que se estabelece

entre o ser de reflexão e o ser que busca conhecer pelo pensar – momento-

monumento audacioso da singularidade humana, a transgressão do instinto para o

ser de reflexão, a transgressão entre o dilema de ser um e o de ser muitos.

2.1.5 O homem como território do mundo humano

O homem, como multidimensional, é um ser social, um ser político, um ser

econômico, um ser artístico, um ser espiritual, um ser ético, um ser plural e nesse

seu universo de saberes sabe não ser pleno em tudo: é a consciência de que as

suas várias dimensões somente são possíveis por meio da sua relação com o outro,

com outras culturas, com o conjunto de atividades sociais e individuais, para além

das formas biológicas. Assim, A comparação entre o homem e os animais, buscando

aquilo que é específico ao homem, decorre do fato de que toda e qualquer

concepção, que não feche intencionalmente os olhos e ouvidos para a ciência,

deverá considerar as origens biológicas do gênero humano. O homem é, antes de

mais nada, produto da natureza e, enquanto um ser natural, um ser vivo, não pode

viver sem a natureza, a começar pela natureza de seu próprio organismo (DUARTE,

1993, p. 65).

É pela consciência de suas ações que o homem define o seu destino. Essa definição

é a consciência própria da definição. Esse mesmo caráter de definição permite

rever, ampliar e mesmo transformar o anteriormente planejado. Esses

procedimentos envolvem-no em níveis de consciência sobre os processos de

humanização que, ao mesmo tempo que o liberta, pode aliená-lo da vida. No

entanto, em suas ações conscientes, é preciso considerar a totalidade de indivíduos

para não se configurar o conjunto social apenas por amostras, uma parcela, uma

abstração generalizada. É importante que cada indivíduo participe dos destinos dos

homens, sem o que apenas a alienação se configura e a humanização será apenas

uma retórica coletiva e concreta na unilateralidade. Logo, É uma ilusão, um erro,

supor que o „melhoramento‟ ético seja puramente individual: a síntese dos

elementos constitutivos da individualidade é „individual‟, mas ela não se realiza e

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desenvolve sem uma atividade para o exterior, atividade transformadora das

relações externas, desde as com a natureza e com os outros homens – em vários

níveis, nos diversos círculos em que se vive – até à relação máxima, que abraça

todo o gênero humano (GRAMSCI, 1978, p. 47).

Ao definir seu destino, o seu vir-a-ser, o homem caracteriza suas muitas dimensões

a partir das transformações das suas atividades que, mesmo tendo o caráter de

individuais, concretizam-se pela externalização ao próprio homem. E assim o

homem se diferencia de outros animais porque se apropria de outros meios para

trabalhar a sua existência. Ao trabalhar a sua existência, que é a sucessão infinita

do humanizar-se por meio do seu corpo inorgânico – a natureza - , o homem define-

se como ser consciente de suas ações fundamentalmente pela existência de outros

e de sua especificidade como gênero.

As relações humanas são tecidas por complexidades justamente porque o ser

humano não é somente uma tipologia humana, somente social ou somente

econômico, mas sim multidimensional, com realidade sempre profunda em quem a

magia da vida não pode ser reduzida a compartimentos ou racionalidades

tecnoburocráticas. A multidimensionalidade humana é constituída também de uma

consciência humana que se constrói e se manifesta em diferentes níveis, os quais

estão intrinsecamente vinculados às suas condições materiais e sócio-culturais.

As ações humanas decorrentes dos diferentes níveis de consciência, apreendidos

historicamente, mostram-nos que “uma das maiores aquisições da consciência

contemporânea passou a ser a consciência dos limites” (MORIN, 1999, p. 49). E é

justamente pela consciência dos limites da ação humana que não experenciamos

somente isonomias, fenonomias4 e tempo de salto (Ramos 1989), mas também nos

exercitamos como seres conviviais. É esta multidimensionalidade humana, cuja

complexidade engendra racionalidades e poesia, que não comporta reduzir-se o

humano à promessa do progresso científico.

Nessa mesma dimensão tanto o ser econômico, político, social como o poeta, não

precisa se fechar no território restrito e confinado dos jogos de palavras e símbolos.

O poeta possui uma competência total, multidimensional, que concerne à

humanidade e à política, mas não pode se deixar submeter à organização política.

Sua mensagem política implica ultrapassar o político (MORIN, 1999, p. 39), porque

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não cabem mais, na sociedade humana, espaços de anonimato nem de isolamento,

mas construções de coletividades, com todas as suas contradições, como espaços

éticos de responsabilidade e de convicções.

Essa ressignificação do território humano se faz necessária, em função de que,

talvez, estejamos perdidos num planeta suburbano, de um sol suburbano, de uma

galáxia periférica, de um mundo desprovido de centro. Mesmo assim, possuímos

plantas, pássaros, flores, assim como a diversidade de vida, as possibilidades do

espírito humano. Doravante, aqui residirão nosso único fundamento e nosso único

recurso possível (MORIN, 1999, p. 41).

__________________________________________________________________

4 Na dimensão das isonomias, também as “fenonomias são cenários sociais protegidos contra a penetração do mercado, e esse aspecto não deve ser desprezado, se se deseja compreender a natureza de uma fenonomia.” (RAMOS, 1989:152) As atividades plenas e que exercitam a autonomia do homem somente poderão ocorrer em espaços que conjuguem ações empreendidas pelo desejo próprio do homem na consecução de atividades pessoais consideradas por ele próprio como relevantes e de exercício da multidimensionalidade humana. A consciência social derivada da fenonomia busca construir novas sensibilidades sociais para as experiências possíveis da atividade fenonômica, de atividades automotivadas compreendidas e comprometidas em ações de individualidade, pelo esforço na consecução da realização da coletividade.

___________________________________________________________________

A reflexão originária dos níveis de consciência permitiu este ensaio sobre a dialogia

e as possibilidades humanas em suas múltiplas dimensões e não unicamente sobre

a possibilidade humana dominada e aterrorizada. O homem, em suas tecituras com

outros homens se faz sábio na consumação dos caminhos da sua autodeterminação

que inclui, entre as múltiplas possibilidades, a sua condição ética, afetiva, social,

econômica e poética.

Nesse contexto, o tempo irrefletido é somente o tempo do dever do trabalho. É

preciso transformar a dimensão substantiva em espaços isonômicos, nos quais o

homem possa constituir sua autonomia de trabalho e desfrutar de valores

emancipatórios. Logo, transformar a vida é transformar os ambientes institucionais

em tempos impulsionados pelas fenonomias.

O tempo de salto é um tipo muito pessoal de experiência temporal, cuja qualidade e

ritmo refletem a intensidade do anseio do individuo pela criatividade e auto-

esclarecimento. É um momento muito importante na vida de uma pessoa criativa e

perscrutora, isoladamente ou na companhia de outras pessoas igualmente

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sintonizadas com o mesmo tipo de indagação. É o impulso temporal das fenonomias

(RAMOS, 1989, p. 169).

Na filogenia humana encontramos diagnósticos do constituir-se e do desenvolver-se

a partir do reconhecimento de várias existências temporais pelas quais a existência

do outro é ressignificada nas indagações. Assim, um mundo humano, delimitado em

seus enclaves sociais, é passível de construção pelo homem e como uma resposta

coerente às muitas indagações sobre o homem. A ontogênese humana constitui em

cada ser a descoberta de que é pelo outro que movemos nosso pensar e nossas

ações. Esses movimentos não nos remetem a nenhuma certeza, por vezes nos

colocam em diapasão com imensas incertezas e até mesmo com nossa imobilidade

face ao certo nível de alienação que constituímos. O tempo do salto é o tempo do

pensar sobre outras possibilidades, é o tempo da reflexão, de vislumbrar o depois e

não somente o hoje. O tempo do salto é uma construção solitária mediada por

construções coletivas em que o eu faz emergir o entendimento e a compreensão do

outro, na perspectiva do bem-estar e da eqüidade. O outro, como um signo que se

constrói em individualidades, na coletividade e superando o mundo dos absurdos –

capital e solitário - é possível construir a existência das relações do eu com a

totalidade em linguagens desconhecidas, mas que, por meio das relações

substantivas, são internalizadas. Esse desejo não é ingênuo, porque carrega em si a

participação da condição humana para uma sociedade humana, na qual a

convivialidade e as fenonomias constituem dimensões da vida humana.

2.2 O Trabalho como Produto Humano

2.2.1 O Trabalho e o complexo desafio de produzir-se humano

É claro que o homem quer ser mais do que apenas ele mesmo. Quer ser um homem

total. Não lhe basta ser um indivíduo separado; além da parcialidade da sua vida

individual, anseia por uma “plenitude” que sente e tenta alcançar, uma plenitude de

vida que lhe é fraudada pela individualidade e todas as suas limitações; uma

plenitude na direção da qual se orienta quando busca um mundo mais

compreensível e mais justo, um mundo que tenha significação (FISCHER, 1987, p.

12).

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A concepção de homem como um ser multidimensional permite aceitá-lo em toda a

sua plenitude e, no alcance dessa significação, como um ser de ação. E é a

consciência das suas múltiplas possibilidades de agir que o constitui como um ser

de cultura pela produção da sua vida. Produção essa que é definida pelas condições

materiais de sua existência, como ser histórico que produz e é produzido pela práxis

humana.

O homem, como um ser que trabalha, produz não somente para ele mesmo, mas

produz, nesse processo, a transformação do mundo em que vive. É, portanto, o

trabalho do homem que o distingue de outros animais, pela ação transformadora da

realidade existente.

Assim, o trabalho, como ação dirigida e intencional, produz o próprio homem. Nesse

processo, ele estabelece relações de convivência social, nas quais aprende a

dominar a natureza, gerando novas expectativas nas formas de prover sua

existência. É essa essência que caracteriza o homem e o diferencia das demais

espécies. Dessa maneira, o trabalho intencional e dirigido é que forma o homem

livre, o homem que fundamenta sua liberdade na perspectiva do seu trabalho. A sua

importância pode ser verificada a partir da concepção de que:

O trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em

que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu

intercâmbio material com a natureza como uma de suas forças (...)

Atuando assim sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica

sua própria natureza. (MARX, 1980, p. 202).

O trabalho, como modo de intercâmbio entre o homem e a natureza, levou o homem

a um certo tipo de comum unidade entre os homens e suas relações, e desta

maneira foi possível a organização das primeiras comunidades em que o homem

forjou processos de autoprodução. Faz parte da história associativa do homem o

percurso realizado desde as comunidades primitivas até a sociedade atual,

passando, assim, por processos de avanço e, ao mesmo tempo, por processos de

exploração do homem por outros homens. Neste sentido, é o homem, portanto, um

ser histórico que, ao produzir a si mesmo, produz o seu coletivo e, transformando a

realidade, produz sua cultura, pela produção de sua existência.

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Pelo modo primitivo de produção, o homem produziu socialmente com outros

homens a sua existência, extraindo bens da natureza e, ao produzir bens em

excesso, estabeleceu a divisão do trabalho. Ao apropriar-se da produção excedente,

criou a propriedade privada, instalando um determinado modo de produção,

caracterizado de um lado, por aqueles que produzem e, de outro, pelos que vivem

da produção excedente.

Esse sistema denominado capitalismo é um processo de exploração sofisticado, em

que grandes contingentes de seres humanos são divididos em classes sociais, nas

quais uns poucos possuem os meios de produção e, por conseguinte, são os donos

do capital, e a grande maioria são os possuidores apenas da força de trabalho como

modo de prover a sua existência, ou seja, os trabalhadores, os proletários, os

assalariados.

Das comunidades primitivas à livre concorrência, passando pelo capital monopolista

até a era da globalização, o modo de produção capitalista, por basear-se na

contínua exploração da força do trabalho humano, exclui dos trabalhadores os

benefícios e as vantagens que só o trabalho produz, e que, por mecanismos de

exploração, só uns poucos têm acesso. Dessa forma, os trabalhadores, por lhes

faltarem os meios materiais para produzirem mercadorias, passaram a vender sua

força de trabalho ao capitalista, mantendo-a vinculada ao capital. A produção

excedente e a divisão do trabalho reforçam no trabalhador idéias de que ele é

propriedade do capital, perdendo sua independência para submeter-se ao comando

do capital, que vai discipliná-lo.

No conjunto das circunstâncias, para produzir a sua existência, o trabalhador não se

realiza como gênero humano, como individualidade, por não ser detentor do

conhecimento do processo de produção do trabalho. Em primeiro lugar, porque não

lhe é permitido dominar todo o processo que torna estanque a produção, o que não

lhe possibilita conhecer a realidade sobre a qual executa determinado trabalho. Em

segundo lugar, porque não retornam ao trabalhador os benefícios da produção, mas

somente novas e maiores exigências lhe são requisitadas. O trabalho tornou-se,

assim, opressão, e não um fator de amplas aprendizagens e desenvolvimento

humano, fato que subjuga o trabalhador, fazendo-o incapaz.

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Assim, o trabalho, que é próprio do homem, como constitutivo em essência do seu

agir sobre a natureza, transforma-o num continuum, pelo modo dominante, num ser

produtor de sua existência pela produção de uma cultura externa, inorgânica à sua

compreensão e à sua omnilateralidade.

A compreensão do homem, como ser de ação, enquanto produtor, implica

reconhecê-lo como ser social, uma vez que o processo de transformação da

realidade objetiva, no transcurso do qual ele produz-se a si mesmo, se faz através

do conjunto de relações que o homem estabelece consigo mesmo, com os outros

homens e com a natureza. Estas relações são produto humano, e ocorrem no

tempo, em circunstâncias estruturais dadas em cada sociedade, que por sua vez

são também conformadoras. Assim, o homem deve ser entendido enquanto ser

social, histórico, produzido e produtor das circunstâncias (KUENZER, 1992, p. 69-

70).

Reconhecer o homem, também, como um ser social, implica reconhecer as

possibilidades de suas ações assim como o produto de sua produção histórica. Se,

por um lado, o homem é capaz de produzir-se em circunstâncias estruturais dadas

em cada sociedade, é também capaz de produzir mudanças, quer por vezes

qualitativas, quer por vezes dificultando a sua ação, todavia, sempre mediada pela

cultura também refeita.

A organização contemporânea da produção configura-se por um método que

incorpora os princípios da administração científica, o taylorismo refeito, flexibilizado

que, ao introduzir o cronômetro para decompor o tempo de cada trabalho, converteu

a essência humana em trabalho cronometrado, parcelado como unicidade da

dimensão do trabalho humano. Dessa forma, refletir o trabalho como dimensão

humana e perceber as mudanças nas suas formas de ser no mundo contemporâneo

implica ver e discutir as condições que o homem possui no modo vigente de produzir

trabalho e, de outro lado, as formas de exclusão no seu modo de produzir-se

humano.

2.2.2 O trabalho na realidade presente: apreensão de alguns elementos

constitutivos

Entendo o conceito de trabalho como toda e qualquer atividade desenvolvida pelo

homem que, na sua realização, amplia as condições de seu desenvolvimento e a

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301

satisfação de todas as suas necessidades. O emprego é a tradução da existência de

um vínculo entre partes e entre interesses pelo qual condições são, de alguma

forma, aceitas; a ocupação é um trabalho que pode ou não ser potencializado no

emprego.

Nessas sínteses conceituais, incorporam-se diferentes concepções e diferentes

contextos nos quais o trabalho humano e sua concretização são compreendidos

pela sua amplitude ou por sua redução, quer potencializados no homem ou

expropriados do homem.

A existência de derivações conceituais sobre o trabalho delineia maneiras diferentes

na sua compreensão, contudo, sua essência é imutável. Do conceito adjetivado

infere-se a existência da divisão social do trabalho e dos percursos dessa divisão na

história da humanidade. Logo, se é procedente a afirmação de que homem e

trabalho são indissociáveis, o próprio conceito contém o caráter explicativo dos

movimentos conceituais que não são lineares na gênese histórica de constituição e

de desenvolvimento do homem como gênero e, como tal, homem que se faz de

trabalho, de emprego e de ocupação.

O trabalho, o emprego, a ocupação e outros arranjos conceituais imbricados, tais

como a profissionalização do homem trabalhador, trabalho formal e informal, entre

outros, estão à margem de uma melhor compreensão por não serem apreendidos no

contexto histórico de sua derivação. O homem é um ser histórico que traz em si,

mediante sua cultura, o registro de suas mudanças. A aceitação e a manutenção do

entendimento do homem como sujeito histórico não implicam a manutenção de

conceitos forjados em períodos distintos. A permanência no tempo de conceitos não

pode restringir ou imobilizar o homem nos avanços culturais, fato é que, em

diferentes formas e momentos, o homem sempre desenvolveu mecanismos de

prover sua existência. Não distantes do homem e do trabalho são instituídas as

relações de capital e trabalho e seus instrumentos de gestão da representação do

valor do trabalho e, mais tarde, de situações econômicas e financeiras nele contido.

Portanto, além da questão conceitual que permeia diferentes ideologias cuja

concretude é histórica, a operacionalização dos conceitos de trabalho, emprego e

ocupação, entre outros, é, na sociedade humana, invariavelmente, a tradução de

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302

uma troca, mas que, de forma alguma, destitui a indissociabilidade como essência

humana.

Não obstante, o homem, na produção do seu trabalho, configura a história como

movimento de que é singular a cultura humana e sua busca incansável de novos

empreendimentos pelos quais provoca mudanças não somente nos diversos

contextos, mas também nas próprias necessidades do homem. As mudanças

acontecem desde as transformações nas maneiras de um trabalho ou em uma dada

situação específica até as construções do desconhecido, do antes não pensado.

Segundo Marx:

Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a abelha supera mais

de um arquiteto ao construir sua colméia. Mas o que distingue o pior arquiteto da

melhor abelha é que ele figura na mente sua construção antes de transformá-la em

realidade. No fim do processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes

idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não transforma apenas o material

sobre o qual opera; ele imprime ao material o projeto que tinha conscientemente em

mira, o qual constitui a lei determinante do seu modo de operar e ao qual tem de

subordinar sua vontade (MARX, 1980, p. 202).

O homem, ao produzir a sua cultura, produz a sua educação para a vida associada,

educação que se estabelece mediante relações de convivialidade, nas quais o seu

pensamento se antecipa à sua ação, convertendo-o em benefício da coletividade,

que é na individualidade a sua própria existência.

Assim como em outros períodos históricos, no mundo contemporâneo, as formas do

homem prover sua existência estão diretamente ligadas às suas condições

materiais, as quais possibilitam seu pleno desenvolvimento. As mudanças na forma

de produzir trabalho decorrem da superação dos estágios do conhecimento

produzido pelo homem universal, implementado numa sociedade e por ela aceito e

que, no entanto, refaz a cultura do trabalho, do emprego e da ocupação. A produção

do conhecimento e sua utilização pelo homem promovem inclusões e exclusões nas

maneiras de gerir o trabalho, refletindo em avanços e recuos aquilo que é próprio do

trabalho humano. A descoberta do fogo, a revolução industrial e, atualmente, a

utilização da informática e das maneiras de se apropriar e de fazer circular o

conhecimento mostram que o homem vem produzindo formas de substituir o

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trabalho, como esforço físico, assim como vem reconceituando o trabalho frente às

adversidades dos avanços e dos recuos de seu desenvolvimento. Assim, a

substituição de diferentes formas do trabalho humano por processos tecnológicos

constitui também mudanças conceituais na concretização efetiva do trabalho. No

entanto, desde as mais rústicas formas até as mais robotizadas maneiras de

produzir trabalho, antes de seu resultado, de seu produto, está a essência humana

que o projetou, donde se volta a afirmar que homem e trabalho são indissociáveis.

O que instiga a discussão de alternativas possíveis e que sejam ao mesmo tempo

não agressivas à condição humana é a questão da mera substituição do esforço

físico pela máquina. Essa transposição linear é, em última análise, a substituição da

força de trabalho humano por processos mecânicos sofisticados que incluem a

exclusão do homem de contextos mais abrangentes. Defende-se impetuosamente

contra o desconforto pleno em casos de manutenção do dispêndio de esforço físico

na produção de trabalho, pois que o homem pode aproveitar a sua capacidade

criativa na elaboração de outras atividades infinitamente superiores à mecanização.

O avesso dessa transposição é que, mesmo longe das operações mecânicas, o

homem precisa ter intimidade com as diferentes formas de lidar com a produção de

novos saberes e assim ficar distante da linearidade das novas ocupações originadas

pela obsoletização do esforço físico. Essa transposição é linear e excludente porque

não produziu um contingente de trabalhos, de empregos, de ocupações para o

homem substituído; as relações do conhecimento permaneceram estanques e,

nesse sentido, reconceituar trabalho, emprego, ocupação, sem a sua existência

concreta, é apenas renomear a velha retórica, promessa não realizável do capital.

2.2.3 A produção flexível: um novo colapso para o trabalho

Na passagem dos processos de produção em massa para os modelos de produção

flexíveis foi possível perceber a incorporação das mudanças no interior das formas

produtivas, o que, por sua vez, alterou as exigências na vida do homem que, na

produção do trabalho, produz a sua sobrevivência. Ao entender-se que o trabalho é

centralidade na vida do homem, entende-se que homem e trabalho são

indissociáveis. Assim, nos espaços de construção-desconstrução, de produção de

trabalho, precisa o homem buscar formas de superação dos fenômenos intrínsecos

à condição humana.

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Ao constatar a migração da produção do trabalho do interior das fábricas para as

áreas da prestação de serviços verifica-se que a alteração que se processou no eixo

da produção de trabalho não abarcou a totalidade de trabalhos, de empregos e de

ocupações.

Desse modo, posso inferir que as mudanças que ocorrem no interior da produção

irão alterar significativamente a vida do homem, porque na reestruturação do

trabalho é visível a escassez das áreas que oferecem emprego. Mudanças também

ocorrem nas exigências do mercado consumidor, assim como provocam o

desemprego do trabalhador. Não estão desconsiderados os fatores que alteram,

principalmente nas sociedades capitalistas, as relações entre capital e trabalho, que

são precárias no universo global.

Ao entender o trabalho, o emprego, a ocupação e agora também a empregabilidade

como necessidades históricas, como aquilo que o homem utiliza para prover sua

existência, tem-se ainda a configuração do trabalho como centralidade humana.

Para ampliar a compreensão, na atualidade, de alguns fatores relacionados ao

trabalho e suas derivações é necessário abstrair um entendimento do

desenvolvimento do homem por meio das mudanças ocorridas, desde a cultura das

sociedades primitivas até o surgimento e as transformações da economia, assim

como observar os conflitos, os recuos e os avanços que relacionam o trabalho com

emprego, com ocupação e com a condição humana no limiar do tempo presente. Ao

refazer esse percurso histórico, indicio a necessidade de deslocar o olhar para

incorporar um novo conceito que é forjado junto com a reestruturação produtiva: o

conceito de empregabilidade.

No contexto atual das forças produtivas, a empregabilidade pode ser entendida

como um conjunto de capacidades e competências que tornam a pessoa capaz de

gerir o seu destino, inclusive provendo meios para sua subsistência, estando ou não

empregado. O conceito extrapola os valores de mercado, muito embora seu alcance

não esteja bastante claro para o homem comum (MENEGASSO, 1998, p. 171).

O sujeito, para ser capaz de gerir seu destino, precisa estar inserido num contexto e

estar de posse de suas experiências prévias, portanto, não deslocado de uma

realidade da qual queira participar. Assim, ao mesmo tempo que é capaz de

interpretar o momento presente e dar significados à construção de um projeto de

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sociedade, necessita ressignificar os fenômenos sociais e estar ciente da delicada

consumpção de mudanças estruturais do vir a ser.

Estar de posse de experiências prévias atribui ao sujeito a condição de detentor de

algum saber, mesmo que artificial, porém não expropriado, o que lhe garante a

disponibilidade de articulação frente às situações de adversidade. Em vista disso, na

intranqüilidade de estar inserido no mundo do trabalho, do emprego, da ocupação,

poderá buscar alternativas reais de prover sua existência na sistematização de seus

saberes. Por outro lado, a inflexibilidade das instituições restringe a um grande

contingente humano o acesso às mais diversificadas formas de promover a sua

empregabilidade, o que tem implicações na redistribuição de subsídios para que

outros ampliem proposições iniciais. O acesso a que nos referimos mantém estreita

relação com a educação inicial de qualidade e com projetos de formação

continuada, que são condição indispensável na garantia do direito de livre arbítrio.

Não se considera aqui a transferência linear de responsabilidades para o trabalhador

na produção de sua empregabilidade, e sim, o desafio que se apresenta para a

geração de trabalho na busca da eqüidade de responsabilidades, nas questões

sociais macro abrangentes, assim como na estrutura de mundo e no estado geral

das coisas hoje existentes. É nessa perspectiva de eqüidade que precisa ser

acessado o conhecimento pelo homem trabalhador, que pode vir a ser o “cidadão

produtivo, aquele capaz de apreender e gerir uma realidade que tem como regra a

transitoriedade permanente” (MENEGASSO, 1998, p. 174).

No mundo contemporâneo, ao se buscar uma relação entre trabalho, emprego e

ocupação, é relevante considerar ainda a emergência de outra situação conexa ao

conceito de empregabilidade: o real enfrentamento do homem é o desafio do

desemprego. Na sociedade atual, é indubitável que fatores econômico-financeiros,

custo versus qualidade, continuidade do empreendimento, entre outros, fazem parte

das determinações que aumentam o índice do desemprego e que, no mesmo eixo,

produzem o surgimento da empregabilidade como barganha do trabalho assalariado,

do subemprego e da não ocupação. A precária situação do trabalhador que

necessita prover sua existência configura-se no desafio de prover sua

empregabilidade. O trabalhador apresenta-se muitas vezes sem condições

igualitárias para a apropriação dos novos saberes, da mesma forma que se defronta

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com a ausência inconcebível das prerrogativas sociais dadas como condições

necessárias à constituição de sua identidade e cidadania. Essas condições apontam

para a co-responsabilidade das instituições culturalmente instituídas, assim como

imperativa também é a participação de toda a sociedade organizada contra a

deterioração da indissociabilidade humana.

O movimento do homem, da sua cultura e dos seus empreendimentos aproximou e

soldou o potencial do trabalho ao estatuto do emprego, de forma que vem se

tornando corrente a substituição de um conceito por outro. Os vestígios dessa

deformação - não há vagas - encontram-se expressos à vista em inúmeros painéis,

faixas, cartazes, placas, avisos em comunicações de toda ordem, em diversas

organizações do mundo.

Uma questão pertinente se impõe: não há vagas para quem? Assim como pertinente

é questionar qual é o contexto social no qual o desemprego se move? E ainda, qual

o contingente que engloba?

Essas questões não são foco de análise neste trabalho; no entanto, a contabilidade

como categoria de trabalho necessita considerar atentamente a tese da polarização

das competências que aparentemente situa-se entre o entendimento da polivalência

e o da politecnia. A polarização das competências demanda diferentes e desiguais

aportes de educação; para a grande maioria, excluída do emprego ou submetida a

trabalhos precarizados, formação simplificada, de curta duração e baixo custo. Para

os poucos que ocuparão os empregos existentes, relativos às tarefas de concepção,

manutenção e gerência, formação de maior complexidade, custo e duração

(KUENZER, 2001, p. 5).

O que se busca com a polivalência é uma ampliação da capacidade do trabalhador

para aplicar novas tecnologias, sem que haja mudança qualitativa desta capacidade.

Ou seja, para enfrentar o caráter dinâmico do desenvolvimento científico-tecnológico

o trabalhador passa a desempenhar diferentes tarefas usando distintos

conhecimentos, sem que isto signifique superar o caráter de parcialidade e

fragmentação destas práticas ou compreender a totalidade (KUENZER, 2000, p. 86).

Já com a politecnia o que se configura é o domínio intelectual da técnica e a

possibilidade de exercer trabalhos flexíveis, recompondo as tarefas de forma

criativa; supõe a superação de um conhecimento meramente empírico e de

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formação apenas técnica, através de formas de pensamento mais abstratas, de

crítica, de criação, exigindo autonomia intelectual e ética. Ou seja, é mais que a

soma de partes fragmentadas; supõe uma rearticulação do conhecido,

ultrapassando a aparência dos fenômenos para compreender as relações mais

íntimas, a organização peculiar das partes, descortinando novas percepções que

passam a configurar uma compreensão nova, e superior, da totalidade, que não

estava dada no ponto de partida (KUENZER, 2000, p. 86).

A tendência da sociedade contemporânea situa-se na exigência cada vez maior de

mais conhecimentos para os que ocupam as poucas vagas ainda não precarizadas

na estrutura do emprego. Por outro lado, esta exigência demanda uma educação

mais generalizada para a grande maioria dos trabalhadores o que , no sistema atual

de ensino, confronta-se entre polivalência , que é uma forma mais elaborada da

racionalização técnica porque submete o trabalhador à contínua qualificação, porém

fragmentada, para dar conta de sua empregabilidade, e a politecnia, que para ser

realizada exige não apenas ter o domínio entre o ser e o acontecer dos fenômenos,

mas sobretudo é necessário conhecer a totalidade na qual o ser e o acontecer dos

fenômenos se constituem, que é histórica e que, portanto, somente é possível de

apreensão a partir das relações em que são produzidos.

A abrangência das questões acima implica cuidados na proposição de respostas

aligeiradas e não menos levianas face à indisponibilidade de dados quantitativos e

qualitativos que especifiquem um contexto dentro de uma totalidade. Não há uma

passagem tranqüila de uma resposta à outra sem a consolidação de uma análise

rigorosa de tais dados, assim como das dimensões e da íntima relação dessas

questões. Contudo, tais questões decorrem da derivação do trabalho e, como tal,

têm implicações na ausência deste. Assim, por dedução, se o trabalho é a maneira

do homem prover sua existência, sem trabalho, qual o destino desse contingente

humano?

Um desempregado, hoje, não é mais objeto de uma marginalização provisória,

ocasional, que atinge apenas alguns setores; agora, ele está às voltas com uma

implosão geral, com um fenômeno comparável a tempestades, ciclones e tornados,

que não visam ninguém em particular, mas aos quais ninguém pode resistir. Ele é

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objeto de uma lógica planetária que supõe a supressão daquilo que se chama

trabalho; vale dizer, empregos (FORRESTER, 1997, p. 11).

Em meio a esse conflito, Menegasso (1998, p. 87) indaga: como se “poderá garantir

a sobrevivência das pessoas em tais condições?”

A essa pergunta converge uma diversidade de outras questões e de respostas

possíveis para um contexto específico e localizado, porém o desemprego está

mundializado e, no estado geral das coisas, qual é o caminho possível, de forma

imediata, a curto prazo e a longo prazo, para soluções adequadas? A obviedade nos

diz: produzir trabalho. No entanto, é necessário concretizar ações efetivas, imediatas

e com continuidade, pautadas em projetos viáveis e abrangentes. A engrenagem

central capaz de mover em direção contrária esse caos generalizado do não-

emprego é o planejamento e a concretização de um projeto de sociedade que faça

opção pela inclusão do todo social. A lógica para essa opção reside no fato de que

as mudanças que ocorrem nas relações de produção alteram também as relações

sociais, as quais, por imperativo da subjetividade humana, são imprevisíveis.

Quando, no limite dos níveis de consciência, o homem trabalhador encontrar-se sem

trabalho, dissociado dele pela sua ausência, como reagirá? Portanto, é o homem o

sujeito que movimenta seu destino com ações de autonomia, podendo fazer,

inclusive, a sua opção de finitude histórica.

A não finitude histórica do gênero humano envolve a destituição do histórico

discurso político e a erradicação da exploração do homem pelo próprio homem em

benefício da harmonia humana. Essa não é uma visão romântica da barbárie

instalada, tampouco é uma futurologia ficcionista e radical ideológica, mas imprime o

caráter indissociável da natureza da atividade humana à condição de socialização

das suas conquistas. Socialização esta que deve incorporar as mais abrangentes

ações de ética e de democracia, porque:

Desemprego e “tarefas menos qualificadas” são, para os trabalhadores, a via de um

mesmo processo: exploração. A alternativa de trabalhar menos, o „tempo liberado‟

para que todos possam trabalhar é a via sugestiva do próprio capital, pois o seu

processo contínuo de conceber homem e máquina como um único objeto da

produção irá manipular formas de tornar obsoleto o tempo liberado. Trabalhar

menos, no modo de produção vigente, para que mais pessoas trabalhem, é ampliar

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as formas de produzir mais-valia e não, em hipótese alguma, liberar o homem no e

do trabalho (LAFFIN, 1996, p. 36).

As mudanças que percorrem as relações produtivas e que alteram significativamente

a vida humana nas diversas formas das relações sociais envolvem decisões que

afetam não somente a organização do trabalho, mas a apreensão dos significados

que isto representa na recuperação do homem de emprego e na empregabilidade do

gênero humano. Em qual ideologia racional encontra-se a lógica para decretar o fim

do emprego ao mesmo tempo em que não há origem de recursos para a

manutenção do homem? Polêmico e irredutível, esse questionamento defronta-se

com toda noção de modelos de homem, com a diversidade de níveis de consciência

plena desde a hominização ao gênero, a multidimensionalidade, a omnilateralidade

humana. Nesse sentido, Menegasso refere que:

As polêmicas em debate são muitas e cruciais para a sobrevivência da população

mundial. Parece que a humanidade se encontra na encruzilhada da história entre

dois cenários: de um lado, um cenário positivo, mágico e cheio de promessas e de

certezas; de outro lado, negativo, incerto, irreal, singular, complexo e repleto de

armadilhas.

Todavia é importante que se decida o que fazer perante esses dois cenários, pois o

caminho escolhido nesta transição poderá levar a um porto seguro ou a um terrível

abismo, dependendo de como a civilização irá se preparar e das opções que se

fizerem para a era pós-mercado que virá logo após a terceira revolução industrial

(MENEGASSO, 1998, p. 99-100).

Mais do que definir apenas diferentes conceitos ao abrigo da ciência ou de

sistematizar as mudanças conceituais, é imperativo desenvolver uma nova

concepção de trabalho a partir de novas formas de organizá-lo, que permita

encaminhar a superação da alienação do trabalhador possibilitando-lhe participar do

fruto do seu próprio trabalho, das decisões sobre ele e dos benefícios da cultura

contemporânea. Uma das condições para que isso ocorra é a reapropriação do

saber por todos os que dele foram historicamente excluídos (KUENZER, 1989, p.

16-17).

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A apropriação do trabalho deve se dar nos espaços de sua produção e nas relações

da sua construção através do conhecimento socializado pela cultura e pela

educação ampla e irrestrita.

Ao homem, com suas habilidades e competências do pensar, é possível refazer a

concretude do trabalho e do não-trabalho quando acessa as disponibilidades das

condições da empregabilidade. Nas forças produtivas do capital, o conceito de lucro

precisará ser ampliado para o conceito de resultado, que quer dizer condições de

inclusão e de qualificação dos sujeitos.

O fenômeno da globalização não responde de forma objetiva à questão do trabalho,

apenas amplia o fosso do problema. Assim, se uma comunidade específica

encontrar adequações emergenciais para seus problemas de trabalho , emprego,

ocupação e renda, terá como tendência voltar-se para seu mercado como um dos

espaços possíveis de realização humana. Nesse tipo de sociedade, a gestão social

poderá indicar mudanças comportamentais e novas concepções de mundo e de

sujeito.

Para organizar a sociedade complexa e os modelos nela organizados, é preciso

elaborar alternativas concretas e contínuas para resolver questões emergenciais e,

para tanto, é preciso apoiar-se no princípio indissociável homem-trabalho.

A revolução tecnológica necessita promover a revolução para os benefícios sociais,

sem os quais não haverá desenvolvimento econômico, político, social e cultural:

O trabalho, como algo complexo, é a relação que o trabalhador insere entre ele

próprio e seu objeto de trabalho, utilizando todo seu organismo, bem como as

formas mecânicas para produzi-lo. O trabalho sem ser estranhamento é o apropriar-

se da concepção e da execução do próprio trabalho e, por conseguinte, do processo

de produzir o trabalho (LAFFIN, 1996, p. 41).

Nos espaços de realização humana, tanto o emprego, como a ocupação, assim

como a empregabilidade são decorrências da atividade humana; assim o homem

pelo trabalho, na relação com a natureza, em seu conceito abrangente de condição

humana, possibilita a transformação da natureza para além das suas necessidades

de sobrevivência do homem, transformando a si pelos valores de uso. No entanto,

para o capitalismo e no capitalismo, por manter os meios de produção e assim

retendo pelo assalariamento a força de trabalho humano, o trabalho converte-se na

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produção de valor de troca, alienando e desqualificando o homem em suas relações

sociais, submetendo-o assim, a objeto pelas condições de precarização aliadas a

constantes exigências.

Dessa forma e no movimento próprio da dialética, a discussão aqui realizada

pretendeu distinguir essas diferentes conceituações por vezes distanciadas do

trabalho. Assim, o conceito de trabalho, de emprego, de ocupação associado à

categoria trabalho, assume hoje os contornos da empregabilidade. Conforme

Menegasso:

Como decorrência das transformações que vêm ocorrendo, a concepção de

emprego entra em declínio e, em seu lugar, passa-se a utilizar o entendimento de

empregabilidade. Tal como o significado da palavra trabalho, também o

entendimento do que significa empregabilidade é, ao mesmo tempo, cristalino e

turvo. Para alguns, representa a expressão do potencial e oportunidade de viver

livremente as escolhas, com competência, garantindo a própria sobrevivência. Para

outros, representa a insegurança, o medo e a busca permanente de trabalho para

sobreviver (MENEGASSO, 1998, p. 168).

As mudanças no modo de produção robotizado, conseqüência da necessidade de

manutenção do capital monopolista, fazem diminuir drasticamente o emprego

estrutural. Com a diminuição do emprego, a exploração da força de trabalho se dá

pela qualificação exigida do trabalhador. Como nem todos têm acesso à qualificação

profissional por meio de um sistema de escolarização que garanta esse contínuo

educar-se para o trabalho, evidencia-se, ainda, a concorrência do capital sobre os

trabalhadores mais preparados. É a velha fórmula da exploração, agora reformulada

no conceito da qualidade total na produção e ampliada para a empregabilidade.

O homem produz trabalho tanto no emprego, na ocupação, como na

empregabilidade. A necessidade está em construir e partilhar uma sociedade de

inclusão social. Ressalto A empregabilidade é uma atitude adotada no presente,

preparando a forma de como viver o futuro, vivendo o hoje, ao mesmo tempo

preparando o futuro, ao mudar o presente. Assim, o desafio atual passa a ser a

construção social da empregabilidade (MENEGASSO, 1998, p. 171).

No entanto, ao defrontar-se com a polarização das competências, situando em um

extremo a polivalência e em outro a politecnia, o homem como produtor de trabalho,

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destituído das condições de apropriação da sua realidade histórica, fica inviabilizado

de produzir a sua empregabilidade. Embora o discurso do capital seja de que todos

devam possuir competências para o trabalho flexível, são poucos os espaços que

requerem o trabalhador flexível qualificado. A maioria dos espaços de trabalho hoje

existentes são tediosos, caracterizados pela incapacidade de desenvolvimento

intelectual.

Nesse contexto, o conceito de empregabilidade não se situa como categoria central,

mas como decorrente de uma nova concepção de formação para o trabalho

acoplado à exigência de polivalência e não de politecnia; portanto, um novo

reducionismo das possibilidades de multidimensionalidade humana.

Nesse momento, os conhecimentos produzidos para as mudanças irreversíveis das

tecnologias precisam promover a empregabilidade, no sentido de uma sociedade do

trabalho que entenda a inclusão do trabalhador. Empregabilidade que seja

decorrente do amplo acesso ao conhecimento, disponível à totalidade do gênero

humano, decorrente de uma educação de qualidade, historicizada pela cultura

humana. Assim, a preocupação não deve estar centrada na velocidade das

transformações decorrentes da robótica, mas na urgência em devolver ao homem

seu sentido histórico de vida que está na centralidade da categoria trabalho, assim

como na apreensão de sua constituição histórica.

2.3 Organizações contemporâneas: organizações possíveis

2.3.1 Metamorfoses e desafios exaurindo fronteiras

As instituições constituídas pela cultura humana a partir de contextos específicos e

localizadas em tempos históricos formam a expressão desse contexto e desse

mesmo tempo a partir das atividades desenvolvidas na vida produtiva e social e nas

instituições, por meio das rotinas da vida cotidiana.

A vida cotidiana, marcada pela racionalidade instrumental, permanece presente nas

instituições da sociedade contemporânea. As instituições, por seu caráter público

e/ou privado, adotam maneiras próprias na consecução de seus objetivos. Na

atualidade, o fenômeno da globalização assenta-se no paradigma da economia

mundial e, ao exaurir o seu alcance, delineiam-se alguns beneficiários: potências

políticas e megacorporações com caráter hegemônico, de novas exigências.

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Também por um discurso hegemônico é caracterizada como irreversível e inevitável

devido aos avanços tecnológicos. No entanto, a globalização não está imobilizada

devido a diferentes procedimentos de análise, o que significa não emudecer perante

céticos valores e dogmas que intrinsecamente avançam aumentando as

desigualdades sociais, mas procurar uma compreensão diversa de organizar a vida

social e produtiva.

Ao analisar a passagem da modernidade à pós-modernidade na cultura

contemporânea, a partir das teorizações existentes e utilizadas para a acumulação

do capital, bem como sobre as fontes de poder social, Harvey (1994) afirma que nas

últimas décadas vem ocorrendo uma mudança abissal nas práticas culturais e

político-econômicas sem, contudo, indiciar mudanças profundas no modelo de

sociedade vigente e, por conseguinte, as transformações que ocorrem no âmbito da

sociedade pós-industrial são de mera aparência, em função de que o „triunfo‟ da

sociedade moderna assenta-se nos valores antigos e eternos.

Harvey argumenta que o progresso aparente se dá por uma junção de diferentes

fragmentos, nos quais as rachaduras nos espelhos não podem ser muito grandes e

as fusões nas extremidades podem não ser muito marcantes, mas o fato de todas

elas existirem sugere que a condição da pós-modernidade passa por uma súbita

evolução, talvez alcançando um ponto de autodissolução em alguma coisa diferente.

Mas o quê? Não é possível dar resposta fazendo abstração das forças político-

econômicas que ora transformam o mundo do trabalho, das finanças, do

desenvolvimento geográfico desigual etc. As linhas de tensão são bem claras

(HARVEY, 1994, p. 325).

No percurso das mudanças que ocorrem, quer no âmbito da nossa atividade

profissional cotidiana, quer no âmbito das teorizações decorrentes de estudos e

pesquisas, é questionável a percepção do delineamento de tais mudanças para todo

o gênero humano, em todas as organizações e das formas de como sabem lidar

com estas transformações que simultaneamente são futuristas e presentes.

Na existência inegável de crenças e valores presentes na sociedade atual

apresentam-se tendências variadas, analisando-se as alterações na economia,

devido às novas tecnologias, às quais as grandes corporações e o mercado, em seu

ritmo de prosperidade e de recessão, tendem a se adequar. Em sentido contrário,

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Toffler (1990) mostra que as mudanças que estão ocorrendo no mundo não são

apenas de ordem econômica e tecnológica, que envolvem todos os aspectos da

civilização humana, e que estamos em meio a um processo genuíno de inventar

novas formas de gerar riquezas e que isto vai afetar todos os aspectos da

sociedade.

Outros fatos são analisados por Thurow (1997) e que se apresentam como desafios

às mudanças, como por exemplo a destituição das sociedades comunistas, como o

caso da soviética, e, por conseguinte, da inserção de novos milhões de pessoas à

sociedade capitalista, imprimindo a estas o que desse modelo é próprio. Como se

pode perceber, nas mais rigorosas expressões da ética capitalista, crime é

simplesmente mais uma atividade econômica, que por acaso tem um alto preço

(prisão) se o criminoso for apanhado. Não existe nenhuma obrigação de obedecer à

lei.

Não existe nada que alguém „não deva‟ fazer. Deveres e obrigações não existem.

Só existem as transações no mercado (THUROW, 1997, p. 208).

Por meio da sua reflexão é possível concluir que a inexistência de modelos

diferentes ao do capitalismo, o que o caracteriza como modelo único e solitário,

provocará sua implosão por sua lógica interna. Outro exemplo citado por Thurow

refere-se ao fenômeno do fundamentalismo religioso que há de vir, pela busca de

um sentido de vida livre de opressões para o gênero humano.

Schaff (1993), ao analisar o mundo atual, suas instituições e as mudanças que estão

ocorrendo na sociedade moderna, apresenta projeções que, segundo ele, irão

ocorrer nos próximos 50 anos. Suas projeções indicam alterações na cultura

humana a partir da busca de um sentido de vida por meio da valoração da

espiritualidade e do lazer. Sua análise funda-se no que chama de revolução

microeletrônica, que mudou o padrão de produção industrial e que provocou um

exército de reservas do qual toda a sociedade terá que dar conta.

Assim, ao lado do desaparecimento do trabalho, no sentido tradicional da palavra, a

mudança cultural será certamente a conseqüência social mais importante da

segunda revolução industrial. Em minha opinião, a sociedade informática escreverá

uma nova página na história da humanidade, pois dará um grande passo no sentido

da materialização do velho ideal dos grandes humanistas, a saber, o homem

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315

universal, e universal em dois sentidos: no de sua formação global, que lhe permitirá

fugir do estreito caminho da especialização unilateral, que é hoje a norma, e no de

se libertar do enclaurusamento numa cultura nacional, para converter-se em cidadão

do mundo no melhor sentido do termo (SCHAFF, 1993, p. 71).

Schaff aponta para a necessidade de uma ética humana na revolução

microbiológica, que tem desdobramentos na engenharia genética e na revolução

energética, acarretando mudanças na vida individual e coletiva. Aponta também

para a ciência que, ao se transformar numa força produtiva, explicita a necessidade

de produzir um sentido de vida para as pessoas dentro da organização social no

âmbito de toda a civilização humana.

Em nível mais restrito, mas não menos importante, Reich (1994), a partir da análise

do desenvolvimento das nações ricas, tendo como campo de análise a sociedade

americana, apresenta algumas projeções para as potencialidades da sociedade

brasileira. Ao situar as novas organizações dentro da teia global, acentua que o

capital decorrente da capacidade criativa, tanto quanto financeira, pode vir a

deslocar-se de qualquer lugar e ser agregado instantaneamente. Com isso, alerta

para o ajuste necessário das empresas às condições e qualidade de vida de seus

cidadãos, bem como para a sua inserção no contexto global. É enfático ao afirmar

que sem investimentos na educação o Brasil não conseguirá promover o bem-estar

social, nem se diferenciar dos países analfabetos. Aponta para as transformações

nas empresas, desde as megacorporações até a formação de redes empresariais

em função do ajuste à permeabilidade dos avançados sistemas de comunicações.

No âmbito específico das organizações, Senge (1998) diz que vivemos mudanças

institucionais sem precedentes desde a era industrial, e que diante da complexidade

organizacional há necessidades de se considerar o pensamento sistêmico como

reflexão e como instrumento nas organizações que aprendem e pensam dentro do

universo atual. Para esse autor, a aprendizagem necessária à continuidade das

organizações decorre de um esforço caracterizado pela capacidade de trabalho

coletivo. Uma das propostas de Senge refere-se aos modelos mentais que,

conforme ele, determinam não apenas a forma como entendemos o mundo, mas

também como agimos nele. As concepções de Senge sobre modelos mentais

baseiam-se em pressupostos do cognitivismo; no entanto, avançam no sentido de

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pensar a organização como colaborativa nos processos de aprendizagem, não

somente das próprias organizações, mas fundamentalmente da inteligência humana.

Considerando o fator tempo para as tomadas de decisão em organizações já

inseridas em contextos transitórios, Mintzberg (1995) não considera a racionalidade

como questão exclusiva, mas aposta em uma administração que esteja articulada e

que considere as sutilezas de criatividade do pensamento humano. O autor destaca

a estrutura organizacional em cinco partes: núcleo operacional, linha intermediária,

cúpula estratégica, tecnoestrutura e assessoria de apoio. O que interessa ressaltar é

o caráter das alterações na concepção de trabalho dentro da organização, através

da qual a intuição e a criatividade ocupam espaço na execução de atividades. Na

estrutura apresentada por Mintzberg, o núcleo operacional - as pessoas que

executam o trabalho -, mantêm, na dinâmica do planejamento e execução, uma

participação direta na produção de bens ou de serviços e na direção estratégica. Na

manutenção de uma hierarquia e na divisão de atividades, essa participação do

núcleo operacional na missão da empresa permite uma autonomia no modo

operacional, o que demonstra uma certa mudança na maneira de perceber o homem

no trabalho.

De forma análoga a esses embates organizacionais, Kaplan e Norton (1997), ao

analisarem as estratégias e métodos existentes para avaliar o desempenho

empresarial, concluem que estes são insuficientes frente ao panorama de alta

tecnologia utilizada nas organizações modernas e que será impossível competir em

desempenho utilizando a gestão do passado. Acrescentam que os modelos, tanto no

nível estratégico quanto operacional hoje existentes e ainda utilizados por muitas

empresas, não são adequados às rápidas exigências das realidades empresariais.

Assim, modelos dinâmicos de decisão necessitam acessar e compreender uma

diversidade possível de estratégias e ações. Não distante do modelo de análise e de

estratégias está a percepção de que não apenas o modelo está superado, como

também superada está a ausência do homem nas atividades da vida cotidiana e das

diferentes organizações.

No recorte teórico configurado, refletem-se intrinsecamente acontecimentos das

últimas décadas, os quais mostram que as transformações ocorridas no âmbito da

ciência, e, por conseguinte, das tecnologias imprimiram mudanças na forma do

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gênero humano organizar a vida produtiva e social. Essas mudanças atingiram

predominantemente as sociedades capitalistas, em que novas exigências são feitas

de maneiras conjugadas para a sua articulação interna e de manutenção, visando

dar conta da estrutura em movimento com acenos de prosperidade, porém,

acentuando muito mais os recuos do sistema nas bases de sua promessa de bem-

estar social.

Não obstante, é perceptível que as diferentes formas de organização da vida social

e o desenvolvimento do capitalismo requerem das instituições simples ou complexas

uma forma de organização ou de controle para sua subsistência.

As organizações, tanto públicas quanto privadas, com atuação em diferentes áreas

da sociedade centrada exclusivamente no mercado, utilizam-se dos recursos

oriundos dos contextos históricos específicos, bem como da produção universal que

lhes são pertinentes, tendo em vista a adaptação às exigências de sua continuidade.

O capitalismo contemporâneo, modelo predominante de organização da vida social,

imprime aos diferentes sistemas de produção das diversas organizações uma

dimensão de reorganização nas maneiras de gestão da vida produtiva, visando sua

continuidade, associada aos movimentos da estrutura, no que, em alguma medida,

cabem intervenções, no sentido de um novo desenho de sociedade, não como

possibilidade regionalizada, mas antes globalizada.

Nesse contexto abrangente, contraditório e instável, as mudanças da história

administrativa como um sistema de cultura elaborado pelo homem busca decifrar

modelos na organização dos empreendimentos. Nesses modelos, uns refazem-se

continuamente mantendo, contudo, sua lógica interna, enquanto outros, por não

estarem adequados ao modelo operante, são completamente substituídos,

imprimindo não apenas mudanças nos métodos ou modelos, mas sobretudo nas

dimensões do potencial humano.

Discorrendo sobre os novos paradigmas econômicos e sócio-culturais acima

descritos, ainda marcados pela racionalidade econômica, Kuenzer (1998) os

sintetiza de forma crítica, o que transcrevo com o intuito de salientar as contradições

desse processo de mudanças, metamorfoses e desafios, pois entende que a

globalização da economia e a reestruturação produtiva, enquanto macroestratégias

responsáveis pelo novo padrão de acumulação capitalista, transformam

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radicalmente esta situação, imprimindo vertiginosa dinamicidade às mudanças que

ocorrem no processo produtivo, a partir da crescente incorporação de ciência e

tecnologia, em busca da competitividade. A descoberta de novos princípios

científicos permite a criação de novos materiais e equipamentos; os processos de

trabalho de base rígida vão sendo substituídos pelos de base flexível; a

eletromecânica, com suas alternativas de solução bem definidas, vai cedendo lugar

à microeletrônica, que assegura amplo espectro de soluções possíveis desde que a

ciência e a tecnologia, antes incorporadas aos equipamentos, passem a ser domínio

dos trabalhadores; os sistemas de comunicação interligam o mundo da produção

(KUENZER,1998, p. 37).

No contexto dessas configurações e inferências, são necessárias intervenções, que

vão desde os discursos aqui configurados por sua sistematização metodológica, às

ações que estão ao nosso alcance, visando a efetivar o conhecimento produzido

pelo homem universal na perspectiva de superação do processo de hominização,

desde as projeções aqui delineadas até o exaurir-se das fronteiras do sonho antes

isolado.

No estágio atual da vida humana, percorrendo todos os seus enfrentamentos e as

conquistas partilhadas, vejo as mudanças dos meios tecnológicos e

simultaneamente dos meios de comunicação como o que tem causado maior

impacto na vida social organizada, porque altera fundamentalmente a maneira de o

homem produzir trabalho, com conseqüências imediatas de barbárie para a

condição humana.

Se o trabalho é central na vida do gênero humano, pelo qual ele se constitui e forma

sua cultura, que se amplia nas suas relações sociais, então o estágio atual da vida

social consiste no maior desafio do gênero humano. Suponho serem necessários

contínuos enfrentamentos pelos mesmos caminhos da ciência para combater a

pregação da individualidade e a negação das conquistas sociais a um grande

contingente da população mundial, marcada não somente pela perda de sua

referência mas, principalmente, por um tipo de racionalidade que tem configurado as

organizações sociais.

3 O CONHECIMENTO CONTÁBIL E A LEGISLAÇÃO DO ENSINO

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A contabilidade, como qualquer área de conhecimento humano, sempre esteve

associada ao próprio progresso da humanidade, em termos de benefícios que são

oferecidos à sociedade, decorrentes dos aperfeiçoamentos tecnológicos

surgidos.(GOMES, 1986, p. 22).

O homem, como ser genérico no processo de seu desenvolvimento, vai marcando e

construindo a história pelo movimento dos recursos que utiliza, reinventando sua

maneira de ser.

No confronto de sua maneira de ser com as suas diferentes necessidades vai

tecendo maneiras de prover a sua existência, assim como produz saberes e formas

de lidar com os conhecimentos.

A invenção primitiva dos instrumentos como meio de realizar suas atividades

consistiu numa conquista do homem que o impulsionou à transformação do

ambiente em que se imprimiram maneiras de viver. Por sua vez, essas

transformações necessitaram de métodos e técnicas que lhe propiciassem um

resultado dessa sua atividade. O conjunto dessas atividades no curso do fazer-se

em desenvolvimento, denominou-se trabalho, essência indissociável das diferentes

maneiras de sua sobrevivência. Das relações de trabalho e do manuseio de

instrumentos surge sua cultura, que o explicita no tempo e no espaço como um ser

de conquistas ilimitadas.

Como a cultura de um povo se refaz pelo refazer do próprio tempo, igualmente a

contabilidade teve fases distintas na história de sua constituição.

A contabilidade, como área de conhecimento, surgiu da técnica de controle da

riqueza possuída e administrada e, deste modo, imprime a sua praticidade na

história do homem. Assim, podemos verificar na literatura específica que a

contabilidade tem sua origem e desenvolvimento na própria história do homem.

Encontramos na literatura contábil momentos distintos que mostram as várias etapas

do desenvolvimento da contabilidade como um saber ou como instrumento de

controle da riqueza administrada, ou seja, das formas de apropriação do homem

sobre bens e serviços mediante os registros e os controles e que tomam formas

mais apuradas na conseqüente dimensão das relações que caracterizam o ato de

comércio.

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Segundo Gomes (1986), a contabilidade sempre esteve associada ao progresso do

homem. Nesse entendimento, torna-se difícil demarcar datas histórias nas quais a

contabilidade, como área do conhecimento, impõe-se ao cotidiano das ações de

comércio. A despeito de autores e datas diferentes, fiz a opção por períodos para

configurar em sínteses seu percurso como área do saber. Tais sínteses estão

ancoradas nos estudos realizados por Lopes de Sá (1997), Hendriksen & Van Breda

(1999) e Scmidt (2000).

No período compreendido entre os anos 6000 a.C. e 1202 d.C., a escrituração,

como forma de registro e controle, dos negócios da época, era feita em tábuas de

argila. Essa maneira de registrar os negócios foi encontrada nas civilizações

sumério-babilônica, egípcia e fenícia, entre outras. Nas tábuas de argila eram

demonstrados os objetos, números e sua relação como posse das pessoas. Mais

tarde, a pictografia, maneira de representação dos objetos da realidade mediante o

desenho do animal ou objeto, passou a representar o controle e o registro de

determinado bem. Nesse período, a contabilidade se manifestava pela simples

anotação dos fatos sem, contudo, apresentar qualquer método ou princípio; era tão

rudimentar quanto a cultura de comércio da época. Essa é considerada a era

empírica da contabilidade.

Atualmente, os registros e o controle são realizados mediante a denominação

técnica de conta para caracterizar as especificidades do bem, assim como dos

eventos contábeis ocorridos.

O período que compreende a sistematização da contabilidade é assinalado entre

1202 e 1494. Nessa época surgem os primeiros livros para a escrituração através do

método das partidas dobradas. Alguns desses livros registravam as entradas,

saídas, inventário e receitas decorrentes dos fatos administrativos que se

caracterizavam em negócios da época, sendo que os primeiros vestígios de

contabilidade organizada foram encontrados em Pisa. Porém, o fato de maior

importância desse período, e que se mantém em nossos dias, é a escrituração, feita

através do método das partidas dobradas.

O método das partidas dobradas consiste no princípio fundamental de que não há

devedor sem que haja credor e vice-versa, o que significa que para cada débito

existente há um crédito de igual valor. Dessa forma, a soma dos débitos

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corresponde invariavelmente à soma dos créditos. Esse princípio determina uma

equação: o valor do Patrimônio Líquido é a diferença existente entre o valor do ativo

e o valor do passivo.

A terceira etapa do desenvolvimento da contabilidade caracteriza-se como fase

moderna ou fase da Literatura Contábil, que se situou entre 1494 e 1840. Essa

literatura desenvolvida seguiu basicamente o método das partidas dobradas, de

Veneza. Apesar de o método não ter sofrido qualquer modificação significativa

desde a sua exposição em 1494, os processos por meio dos quais o método é

aplicado apresentaram um desenvolvimento complexo e hoje se encontram num

nível de aperfeiçoamento alinhando-se às facilidades do desenvolvimento da

informática. É por volta de 1803, até 1840 que se inicia a discussão do caráter

científico da contabilidade, bem como a publicação de obras sobre a contabilidade

aplicada à administração pública e privada.

De 1840 até os dias atuais temos a quarta etapa, considerada a era científica da

Contabilidade. Novas doutrinas contábeis surgem e colocam em discussão os

princípios adotados para a análise da riqueza administrada.

A partir de 1840 entram em confronto a teoria da Escola italiana e a teoria norte

americana, que constituem a essência da atual literatura contábil. A escola italiana

empregou demasiada ênfase na demonstração da cientificidade da contabilidade,

enquanto a escola norte americana buscou solidificar uma teoria que contemplasse

o desenvolvimento da teoria e prática contábeis, objetivando que a contabilidade se

tornasse um instrumento útil na tomada de decisões acerca do patrimônio

administrado e caracterizando-se pela constante preocupação em evidenciar com

clareza a informação contábil aos seus diferentes usuários.

Frederico Herrmann Junior, no livro intitulado “Contabilidade Teórica”, datado de

1936, e que em novas edições ostenta o título “Contabilidade Superior”, destina o

primeiro capítulo da obra à distinção entre ciência e arte, buscando demonstrar o

caráter científico da contabilidade. Para tanto utiliza o conceito de E.Ranieri sobre a

distinção entre ciência e arte, dizendo que a ciência, no pensamento, é um sistema

de conhecimentos e a arte, um sistema de ação, que interdependem, porque a

ciência tem necessidade da arte para ser útil à vida e dirigir a marcha das coisas

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humanas e a arte se apóia na ciência para tornar-se esclarecida e consciente dos

seus fins e da sua potencialidade (RANIERI, apud HERMANN JUNIOR, 1978, p. 23).

Mediante esse entendimento, Herrmann Junior sugere que a contabilidade deva ser

estudada em princípio como um sistema de conhecimentos a respeito dos fatos que

lhe constituem o fundamento e, depois, como conjunto de preceitos que permitem

adaptá-lo às conveniências humanas (HERMANN JUNIOR, 1978, p.24).

Ao ser considerada uma ciência, a contabilidade passa a fazer parte do grupo das

Ciências Políticas e Sociais, por possibilitar o estudo das estruturas sociais bem

como das leis de seu funcionamento e de seu desenvolvimento. A busca da

cientificidade contábil tem origem na ausência de tradição filosófica do conhecimento

científico entre os profissionais da área contábil. Assim, durante longo período, entre

a discussão e a comprovação de sua cientificidade, o que imperou e configurou a

sua utilidade, foi o seu pragmatismo, sendo um instrumento de administração dentro

de uma estrutura organizacional.

Na esfera mundial, mais precisamente por volta de 1929, com a quebra da bolsa de

valores de Nova York, a contabilidade foi chamada a reorientar seus demonstrativos

contábeis, tanto na forma quanto no conteúdo, fazendo evidenciar com clareza,

inclusive periodicamente, as reais condições nas quais um determinado patrimônio

se encontrava.

As mudanças ocorridas no Brasil a partir de 1930, com o desenvolvimento industrial,

fizeram com que novos horizontes se projetassem sobre a área da administração.

Nesse sentido, a contabilidade foi chamada a inserir-se nessa nova regulagem do

mercado.

Dessa forma, na década de 50 é regulamentado no Brasil o mercado de capitais e

toma grandes proporções o processo inflacionário, ficando patentes a importância da

contabilidade como um elemento gerenciador das decisões e a necessidade da

escrituração contábil abranger novos espaços e adotar novas formas de evidenciar

um patrimônio. Assim, a contabilidade, como área do conhecimento, foi chamada a

redefinir sua utilidade para um panorama empresarial que se consolidava na

estrutura da sociedade capitalista.

Essas mudanças na estrutura conjuntural vieram exigir da contabilidade um maior

conhecimento de suas relações, uma vez que não apenas os registros dos fatos

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323

administrativos passaram a ser relevantes, mas também a análise do processo do

qual são resultantes, a fim de mostrar, através de relatórios, os rumos que se

seguiriam a determinadas decisões, visando reorientá-las se preciso fosse.

A busca por profissionais capacitados na área administrativa teve como

conseqüência a melhoria da formação dos profissionais da contabilidade.

Esses processos de transformação, aliados ao desenvolvimento da economia

brasileira, proporcionaram mudanças inclusive na legislação vigente. Os seguintes

dispositivos legais demonstram o caráter amplo de tais mudanças: a Lei 4.320/64

(orçamentária), a Lei 4.595/64 (reforma bancária), a Lei 4728/64 (mercado de

capitais) e o Decreto-Lei 200/67 (reforma administrativa).

Outra lei que veio contribuir para redimensionar o caminho da contabilidade foi a Lei

6.404, de 15 de dezembro de 1976, que dispõe sobre mudanças no aspecto formal

das demonstrações contábeis, bem como em seu conteúdo e principalmente em

relação aos princípios contábeis até então estabelecidos, “introduzindo inclusive

muitas técnicas para as quais uma parcela substancial dos profissionais da área não

estava preparada”. (IUDICIBUS, MARTINS E GELBCKE, 1985, p. 35).

Contextualizadas de forma sintética algumas etapas do desenvolvimento do

conhecimento contábil em suas relações sociais, contextualizo a seguir o ensino da

contabilidade no sistema educacional, mais especificamente no aspecto da

legislação do ensino comercial.

3.1 A contabilidade na legislação do ensino comercial

Com base em estudos realizados por Fávero (1987), Hermes (1986) e também

apoiados em Romanelli (1993), pode-se verificar que o ensino da contabilidade no

Brasil começou a tomar forma ainda no século XIX, tendo o seu desenvolvimento as

seguintes etapas:

1808 - criação da cadeira de Economia Política, que mais tarde foi denominada de

“aula de comércio”, pelo Decreto nº. 456, de 06 de julho de 1846;

1810 - criação da Academia Real Militar, tendo em seu currículo a disciplina “cálculo

das probabilidades”, e desta academia saíram os primeiros atuários do Brasil;

1827 - o Decreto de 11 de agosto institui as faculdades de Direito de Olinda e de

São Paulo, a disciplina Economia Política faz parte do currículo a partir de 1929;

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1846 - criação da Escola Central de Comércio que, através do Decreto 456, de

06/06/46, regulamenta a carta de habilitação dos diplomados da aula de comércio;

1856 - criação do Instituto Comercial do Rio de Janeiro;

1890 - a Escola Politécnica do Rio de Janeiro passa a ter em seu currículo a

disciplina Direito Administrativo e Contabilidade;

1891 - criada em Fortaleza a Escola de Comércio da Fênix Caixeiral;

1894 - é reformado o ensino na Escola Politécnica de São Paulo, sendo instituído o

diploma de contador para os alunos que terminassem o curso geral, com duração de

um ano;

1899 - é criada a Escola Prática de Comércio do Pará;

1902 - surge a Academia de Comércio do Rio de Janeiro e a Escola Prática de

Comércio de São Paulo.

A Escola de Comércio Álvares Penteado, denominada anteriormente de Escola

Prática do Comércio de São Paulo, foi uma das primeiras, em 1902, a organizar o

curso destinado a formar os “guarda-livros”, com duração de três anos.

A contabilidade foi, pois, surgindo de forma tímida como objeto e área de

conhecimento a ser transmitido. Primeiramente, como disciplina em cursos

esparsos, e mais tarde surge como curso específico, com o objetivo de preparar

profissionais com maior conhecimento nessa área de atuação.

Os cursos oferecidos no ensino comercial necessitavam de pouquíssimos

investimentos, o que os diferenciava dos cursos que estavam na dependência do

poder público; assim apresentavam e se constituíam de uma “vocação” para um

comércio privado de ensino. Além dessa característica, serviam para atender à

demanda da classe média que começava a constituir-se. Esses cursos eram visados

pelas profissões liberais e também pelos destinados aos empregos públicos. Assim

a contabilidade, através de sua técnica primitiva de escrituração, está presente no

Brasil até os dias atuais.

Tais técnicas, ao apontarem sua utilidade para registrar os fatos administrativos, do

comércio local e das repartições públicas despontavam para o ramo do ensino.

Satisfeitos os anseios e a demanda de uma classe social em ascendência e que

vislumbrava nessa área de ensino um “status”, o poder público promulgava sua

utilidade assistencialista de duas formas: pouco investia nessa área do ensino pela

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sua natureza prática e, de forma ideológica, investia nos conceitos do “saber fazer”,

em detrimento do “aprender a refletir” que atendiam aos interesses da dominação

vigente. Tem início aí a habilitação para o trabalho e a inabilidade da cidadania para

o pensar e para o agir.

Dessa forma, foi com o Decreto nº. 1339, de 09 de janeiro de 1905, que buscou

organizar o ensino comercial no Brasil. Nessa época foram instituídos os cursos

regulares para o ensino da contabilidade na já existente Academia de Comércio do

Rio de Janeiro e na então Escola Prática de Comércio de São Paulo, ambas criadas

em 1902.

Na verdade, a organização do ensino comercial que se buscava foi frustrada, e o

que resultou foi apenas o restrito reconhecimento de utilidade pública dessas

escolas e o reconhecimento dos diplomas emitidos.

No Decreto nº 17329, de 28 de maio de 1926, que passou a regulamentar o Ensino

Comercial, estava previsto um curso geral com duração de quatro anos, seguido ou

não de um curso superior. Contudo, esses cursos básicos, denominados “Curso

Geral”, eram os que habilitavam para as funções de guarda-livros e perito judicial e

empregos de fazenda. Eram cursos essencialmente práticos e as disciplinas que

formavam o currículo eram: português, francês, inglês, aritmética, álgebra,

geometria, história, ciências naturais, noções de direito civil e comercial, legislação

de fazenda e aduaneira, prática jurídico-comercial, caligrafia, estenografia, desenho

e escrituração mercantil. Havia, sem dúvida, uma mescla de disciplinas de formação

humanística e disciplinas que ofereciam a “prática” dos ofícios.

No curso denominado “Superior” e que tinha caráter facultativo para o

estabelecimento de ensino comercial, as disciplinas que formavam o currículo nada

visavam além da mera transmissão-reprodução do conhecimento até então

acumulado. Eram contempladas com a retórica do discurso e assim se constituíam

nas disciplinas de geografia comercial e estatística, história do comércio e da

indústria, tecnologia industrial e mercantil, direito comercial e marítimo, economia

política, ciência das finanças, contabilidade do estado, direito internacional,

diplomacia, história dos tratados e correspondência diplomática, alemão, italiano ou

espanhol, matemática superior, contabilidade mercantil comparada e banco

modelo.

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326

Esse conjunto de disciplinas era ministrado em curso com três anos de duração, que

outorgava aos formandos o título de bacharéis em Ciências Econômicas-comerciais.

Esse curso visava formar profissionais solidamente capacitados, destinados aos

serviços do Ministério das Relações Exteriores, bancos e grandes empresas

comerciais. A passagem para o curso superior era feita através do curso geral, que

servia de base preparatória, ou seja, servia de base para o ingresso no curso

superior.

Porém, no Brasil, proliferaram as Escolas de Comércio, com evidências de um

ensino sem objetivos claramente delineados e assim, por força do Decreto nº 4724-

A, de 23 de agosto de 1923, estas tiveram seus diplomas equiparados aos das

escolas anteriormente mencionadas, obtendo o reconhecimento de utilidade pública.

Sem alcançar os objetivos para o que foram propostos, decorrentes de uma política

descompromissada para com o ensino vigente, tais cursos começaram a sofrer

críticas. Esses são fatos que marcaram o surgimento de uma escola brasileira que,

desvinculada de um contexto sócio-histórico e do desenvolvimento econômico do

país, pouco contribuiu para o desenvolvimento.

A denominação de “contabilista” aparece oficialmente através do Decreto nº. 20.158,

de 30 de junho de 1931, logo após a revolução de 1930, quando então surgiu o

primeiro estatuto legal organizando o ensino comercial e regulamentando a

profissão de contador. Com esse decreto é estabelecida a formação dos

profissionais da contabilidade em nível médio, através do curso denominado

“Guarda-livros”, agora com duração de dois anos, e do curso de “Perito Contador”,

de três anos. O referido decreto autorizava ainda outros cursos alternativos, tais

como o de Secretários, Administradores-vendedores e Atuários.

Assim, por meio do Decreto de nº. 20.158 os estabelecimentos de ensino comercial,

oficialmente reconhecidos pelo Governo federal, possuíam a seguinte organização:

(a) curso de admissão (facultativo), com duração de um ano;

(b) curso propedêutico, com duração de três anos, servindo de base para o acesso

aos cursos técnicos;

(c) cursos técnicos (secretário, guarda-livros, administrador-vendedor, atuário e

perito-contador);

(d) curso elementar de auxiliar de escritório;

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327

(e) curso superior de administração e finanças, com duração de três anos.

Nessa estrutura de ensino, a contabilidade ficou restrita ao nível médio. Até 1929

somente tinham acesso ao curso superior de Administração e Finanças os alunos

que houvessem concluído o curso técnico de Perito-Contador. Após essa data,

também os alunos oriundos do curso de atuária passaram a ter acesso ao curso

superior.

Através do art. 1º. do Decreto de nº. 1535, de 23 de agosto de 1939, o curso de

Perito-Contador voltou a ser denominado curso de Contador, sem qualquer

modificação na sua estrutura. Já em seus artigos 74 e 77 estava previsto que, para o

preenchimento de cargos públicos, tais como para o Banco do Brasil, agente

consular, empregados de fazenda, bem como para a promoção nas repartições

públicas, além do indispensável conhecimento da contabilidade, somente os

diplomados por cursos de Contador deviam ser escolhidos, tanto na esfera municipal

quanto na estadual e federal.

O Decreto Lei nº. 6.141, de 28 de dezembro de 1943, que estabeleceu novas bases

de organização e de regime do ensino comercial de segundo grau, em seus artigos

4º., 5º., 8º. E 36., previu a formação para auxiliar de escritório através de um curso

básico de primeiro ciclo, ministrado por escolas comerciais, e também a formação de

técnicos em comércio e propaganda, assistentes de administração, guarda-livros,

estatísticos-auxiliares e secretários por cursos do segundo ciclo, igualmente

ministrados pelas escolas de comércio.

O que pretendia o referido decreto eram reformas educacionais de maior amplitude,

em que a articulação entre o ensino comercial e o sistema educacional fosse

efetiva. Visava também a elevar ao nível superior o curso de contador, com amplas

reformas em seu currículo. Lanaro Júnior registra:

O curso de Contabilidade, ministrado nas escolas de comércio, além de não

satisfazer completamente as nossas necessidades, é quase de um modo geral

ministrado com pouca eficiência, visto a dificuldade de se encontrar bons

professores, além de outras circunstâncias, tais como: grande número de alunos em

cada classe, falta de uma boa disciplina e deficiência das aulas quanto ao seu

sistema prático (LANARO JUNIOR, 1946, p.26).

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328

Assim, pelas pressões exercidas por parte dos profissionais da área e frente às

necessidades que o processo de desenvolvimento industrial vislumbrava o curso de

Ciências Contábeis e Atuariais é elevado ao nível superior através do Decreto-Lei

de nº 7.988, de 22 de setembro de 1945, conferindo aos seus formandos o grau de

bacharel em Ciências Contábeis e Atuariais. Segundo seu artigo 5º., seria conferido

o título de Doutor em Ciências Contábeis e Atuariais ao candidato que, no período

de dois anos após a conclusão do curso, defendesse tese que elevasse o padrão de

conhecimentos da área contábil.

Situada na esfera do ensino superior, a contabilidade contribuiu para a criação, a

26 de janeiro de 1946, da Faculdade de Ciências Econômicas e Administrativas da

Universidade de São Paulo, sendo criado o curso de Ciências Contábeis e Atuariais

e extinguindo-se o curso médio de contador. Também o curso superior de

Administração e Finanças foi desdobrado em dois novos cursos: no curso de

Ciências Econômicas e no curso de Ciências Contábeis e Atuariais.

Já a Lei nº 1041, de 31 de julho de 1951, apresentou novas reformulações acerca

desses cursos. Novos desmembramentos foram feitos, sendo dividido o curso de

Ciências Contábeis e Atuariais em dois cursos distintos: Curso de Contador e Curso

de Atuário, sem, contudo, extinguir-se o curso anterior, ou seja, o curso denominado

Ciências Contábeis e Atuariais.

As disposições contidas no Decreto-Lei 7.988 de 1945, em seu artigo 1º,

enfatizavam que o ensino superior se constitui em dois cursos: 1) curso de

Ciências Econômicas e 2) curso de Ciências Contábeis e Atuárias. Em seu artigo 3º,

dispõe sobre o conjunto de disciplinas que serão distribuídas nas quatro séries do

curso de Ciências Contábeis e Atuariais: e Com a demonstração do currículo-

conteúdo estabelecido para o curso superior de contabilidade, o que se pode

observar é a sua estreiteza, o seu caráter eminentemente prático e servil às normas

instituídas, ou seja, o ensino da contabilidade sem uma visão humanística, pois

somente são exigidos conhecimentos técnicos em favor da evolução do capital, sem,

todavia, prever e favorecer a formação do homem multidimensional. Existe, contudo,

no conjunto das disciplinas curriculares um caráter de direito, economia política mas

ao situar sua ementa no contexto histórico visualiza-se que a contabilidade,

mediante a legislação da escola, quando chamada a participar do progresso da

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329

nação, sempre foi moldada nos limites das tendências que emergiam na dimensão

do mercado.

A compreensão de escola, na perspectiva do técnico-conteudista, configura-se como

uma máquina no fazer dos instrumentos, e o investimento feito não ultrapassa a

quantidade inexpressiva e previamente planejada. Essa interpretação de escola

sempre manteve distante a concepção da necessidade de uma escola real para o

homem completo.

Após ser elevada ao nível superior, a contabilidade busca agrupar em apenas duas

categorias os titulados em sua área de conhecimento. Assim, o Decreto-Lei nº 8.191,

de 20 de novembro de 1945, altera para Técnico em Contabilidade o diploma dos

egressos dos cursos de guarda-livros, atuários, contadores e perito-contadores

formados em nível médio, e confere o título de Contador ou Bacharel para os

formados em nível superior. Essa medida certamente veio abafar o conteúdo

previsto no Decreto-Lei nº 6.141, em decorrência do que a eles vieram a ser

equiparados os anteriores guarda-livros, pela lei 3.384, de 28 de abril de 1958.

Em seu artigo 1º, o Decreto-Lei nº 8.191 de 20/12/1945, além de alterar o diploma,

também ratifica as prerrogativas asseguradas por lei a este título. E desde então

trava-se uma luta para separar em sindicatos as categorias distintas, ou seja, um

sindicato para a categoria de técnicos (já existente) e a criação de um sindicato para

os contadores, uma vez que, com a criação do curso superior, são definidas

atribuições distintas às duas categorias.

O projeto de Lei nº 2.461/64 tem em seu teor a pretensão de elevar a nível de

contador o técnico em contabilidade de nível médio sem a realização do curso

superior.

Também o projeto de Lei nº 1784/68 volta a exercer pressões para a equiparação

dos técnicos em contabilidade, designando-os contadores, sem a devida

escolarização. Esse mesmo teor esteve implícito no Projeto de Lei nº 2.504/79, que

outra vez procurava equiparar os técnicos de nível médio aos contadores.

A esse respeito, tanto os Técnicos em Educação quanto os Assessores Ministeriais

e os Diretores do Ensino Comercial do MEC, através do Parecer de 12/12/67-

(Técnica em Educação/Assessora Ministerial-MEC), do parecer 251 de 07/06/68-

(CFE), do ofício 366 de 19/02/69-(Diretor do Ensino Comercial do MEC), do parecer

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de 21/07/70-(Diretor do Ensino Comercial do MEC) e ofício 117/80-

(CCHS/SEsu/MEC), manifestaram ser inconveniente a transformação em lei dos

projetos mencionados, logo, favoráveis à diferenciação entre técnicos e contadores.

Assim, embasados no parecer de 12/12/67, a equipe do MEC sustentou que os

referidos Projetos de Lei tencionavam “primordialmente a revogação de duas leis: a

de nº 4024, de 23/12/61, e a de nº 9.295, de 27/05/46, aquela fixando as Diretrizes e

Bases da Educação Nacional; esta, regulamentando a profissão de contabilista,

criou os Conselhos de Contabilidade e definiu as atribuições do Contador e do

Guarda-Livros (ou Técnico em Contabilidade, por força do Decreto lei n. 8.191 de

20/11/45)”. E ainda:

O Governo está vivamente empenhado na formação de profissionais de nível médio

técnico e de nível superior ou universitário, para todas as áreas de atividades que

interferem no processo de desenvolvimento do país. A umas mais do que as outras,

segundo as carências necessárias a um justo equilíbrio (PARECER 12/12/67 In.

HERMES 1986, p. 24, 31).

A esse respeito, Hermes se pronuncia da seguinte forma:

A individualização organizacional do Contador se revela condição “sine qua non”

para que conquiste no Brasil o elevado conceito de que goza no exterior. A

sindicalização distinta do contador, à semelhança das demais profissões de grau

superior, identifica-se com o progresso cultural e a justiça profissional, ao contrário

da retrógrada pretensão de promover técnicos para bacharéis, mediante artifício de

qualquer espécie, implícita na unificação das duas classes em uma só de nível

universitário, como defende o infeliz parecer. Os bacharéis de qualquer campo de

saber só têm a perder quando confundidos com profissionais de segundo grau, o

que é elementar. (HERMES, 1986, p. 90).

Através desse discurso percebe-se que os objetivos que rondam tais projetos não

superam os interesses de classes e a forma como a contabilidade possa vir a

transformar a realidade social, por meio do ensino, é irreconhecida, considerada

irrelevante, ou seja, o saber fazer ainda não vislumbra superação na tradição

contábil.

Novas transformações, tanto no nível superior quanto no nível médio, que envolvem

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331

o desenvolvimento da contabilidade no sistema educacional, terão fundamentos na

Lei nº 4024, de 20 de dezembro de 1961 que, ao criar o Conselho Federal de

Educação, atribui a este a competência de fixar os currículos mínimos e a duração

dos cursos. Apesar de ter essa Lei fixado as diretrizes e bases da educação

nacional, muito pouco, ou nada de consubstancial foi inserido no tocante ao nível

médio profissional de ensino.

Na legislação do ensino encontram-se os fins da educação no Brasil. Nela, os

legisladores brasileiros, pelo menos em teoria, garantem para todos a melhor

educação.

Estabelecem o que deve determinar e controlar o trabalho pedagógico em todos os

seus graus e modalidades. Idealizam a educação, caracterizando-a como uma

educação através de uma ideologia. Essa referência aos objetivos pode ser

encontrada na Lei 4024/61, em seu artigo 1º, quando trata dos fins da educação no

país.

Dessa forma, pode-se afirmar que a educação, na prática, nega o que afirma a lei.

Esses objetivos não são alcançados. Não funcionam por diversas razões. Uma

delas, talvez a maior, era a falta de recursos em nossas escolas e o despreparo dos

profissionais da educação.

Entre a teoria e a prática existe uma distância imensa e as pessoas no país

protestam e pedem que pelo menos a lei seja cumprida, que a escola de qualidade

exista e seja acessível a todos; no entanto, continuam imobilizadas diante do que

determinam as leis. Acredito que um primeiro passo é subverter esta ordem para

então propiciar aos indivíduos o que nos garantem os artigos 2º,3º. e 4º da Lei

4024/61, que é “educação distribuída por igual para todos”. De acordo com Brandão,

Há interesses econômicos, políticos que se projetam também sobre a educação.

Não é raro que aqui, como em toda parte, a fala que idealiza a educação esconda,

no silêncio do que não diz, os interesses que pessoas e grupos têm para os seus

usos. Pois, do ponto de vista de quem controla, muitas vezes definir a educação e

legislar sobre ela implica justamente ocultar a parcialidade desses interesses, ou

seja, a realidade de que eles servem a grupos, a classes sociais determinadas, e

não tanto “a todos”, à nação”, “aos brasileiros" (BRANDÃO, 1985, p. 60 ).

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Romanelli (1993) assinala que as negociações de privilégios que se estabelecem,

entre uma minoria de interesses, na promulgação de uma legislação de ensino,

fazem com que o Estado não propicie condições para que a lei se cumpra. Tal

política tem levado à satisfação de interesses político-econômicos permeados de

uma retórica de bem comum que se prolonga também como uma progressiva

desobrigação do Estado para com a educação. Em conseqüência disso, deparamo-

nos com a expansão da iniciativa privada, que negocia a educação como

“mercadoria” altamente lucrativa, o que mostra o caráter elitista do atual processo

educacional do Brasil.

Uma outra questão que emerge no campo educacional é a relação entre Educação e

Trabalho. Muitas são as pessoas que são obrigadas a abandonar o direito à

educação para ingressar no mercado de trabalho. É grande também o número de

pessoas que estudam e trabalham ao mesmo tempo. Sem participar de uma

escolarização crítica, dificilmente conseguem compreender ao certo as relações

sociais e as divisões de classes produzidas pela divisão do trabalho e que acabam

por ensinar o indivíduo a ser trabalhador. Conforme pode-se verificar, o professor da

“parte de formação especial” já não pode, na perspectiva das atuais diretrizes, ser

aquele “instrutor” de outrora que apenas adestrava o aluno para tarefas típicas de

uma determinada ocupação; sem dúvida, como antes, ele irá atuar em domínio

prático, mas terá de usar o “fazer” como ingrediente indispensável de qualquer

educação que se pretenda “integral” (CHAGAS, 1980, p. 329).

O que ainda encontramos são escolas tentando preparar o indivíduo para um

emprego ou determinada ocupação para ser exercida no futuro. Essa é uma visão e

uma postura descomprometida com a realidade que evolui constantemente. Essa é

a forma que a escola utiliza para excluir as classes menos favorecidas das

vantagens da educação e assim divide educação e trabalho como não sendo

processos integrados de transformação da sociedade.

O ensino profissionalizante de segundo grau, em sua legislação (Lei 7044/82 art.

1º), visa à “preparação para o trabalho e para o exercício consciente da cidadania”.

O grande problema aqui não são os objetivos, mas os meios para cumpri-los, pois,

na estrutura atual existente, tem-se muitas dúvidas quanto à sua eficácia em atingir

tais objetivos.

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3.2 Alguns aspectos intervenientes no currículo do curso superior de Ciências

Contábeis

O currículo do curso de Ciências Contábeis foi fixado juntamente com a instituição

desse nível de ensino pelo Decreto Lei nº 7988, de 22/09/45.

A determinação legal para estabelecer currículos mínimos foi transferida ao então

Conselho Federal de Educação mediante a Lei nº 4024 de 20/12/61, objetivando,

desta maneira, maior agilidade nas discussões curriculares e os ajustes necessários.

Nova discussão sobre o currículo mínimo para o curso de Ciências Contábeis é

realizada a partir da Resolução de 08-02-63, depois de decorridos aproximadamente

18 anos de sua instituição. Nesse intervalo de tempo, como nos casos seguintes,

algumas instituições de ensino promoveram as chamadas reformas curriculares,

substituindo algumas poucas disciplinas e dando novas nomenclaturas às disciplinas

e, em alguns casos, por especializações dentro das áreas abrangentes sem,

entretanto, promover alterações significativas na compreensão do currículo,

permanecendo a compreensão fracionária do conhecimento, na modalidade de

conhecimento escolar, mediante sua distribuição em disciplinas.

Segundo Schmidt, a “contabilidade brasileira pode ser dividida em dois estágios de

desenvolvimento: anterior a 1964 e posterior a 1964” (2000, p.205).

Pelos estudos realizados também por Fávero (1987), Romanelli (1993) e Hermes

(1986), pode-se entender que a fase anterior a 1964 relaciona a contabilidade a seu

trânsito na legislação do ensino comercial até elevar-se ao estatuto de ensino

superior em 1945 e, sobretudo, pelos aspectos legais concernentes às atividades

profissionais específicas da contabilidade naquele contexto histórico. O que se

buscava na formação superior era a substituição das atividades do técnico em

contabilidade pelas exigências do mercado empresarial então emergente.

O Decreto-Lei nº 2627, de 1940, estabeleceu a primeira Lei das Sociedades

Anônimas. Esse documento legal definiu, entre outros procedimentos, a maneira de

avaliar o ativo das entidades, bem como as formas de distribuição de lucros.

Também o Decreto-Lei nº 2416, de 17/03/40, determinou um modelo único de

balanços para prefeituras e estados. A definição de lucro real pode ser encontrada

no Decreto-Lei 4178 de 1942. Em 1947, o Decreto-Lei 24239, além de definir alguns

procedimentos contábeis, redefine o lucro real e introduz a reavaliação de ativos. Em

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1958, mediante o Decreto-Lei nº 3470, é instituída a correção monetária dos ativos

fixos.

Para SCHMIDT, essa primeira fase da contabilidade no Brasil tem dois aspectos

relevantes: “a intervenção da legislação no desenvolvimento de procedimentos

contábeis e a influência doutrinária das escolas italianas” (2000, p. 209). No entanto,

o que se percebe no contexto histórico é que as alterações legais decorrentes do

desenvolvimento econômico e, por conseguinte, as estruturações da gestão nas

organizações empresariais demandam um profissional técnico-contábil capaz de

acompanhar as determinações legais, e a contabilidade, assim compreendida,

acabou por se caracterizar como subserviente às determinações legais e, nesse

aspecto, sempre se mostrou eficiente. Com esse entendimento permeando as

especificidades da área contábil, o currículo e as reformas curriculares, sempre

coadunados com a prescrição legal, do interesse econômico, favoreceram a não-

inclusão de uma formação mais abrangente, que atentasse para dimensões sociais,

políticas e culturais. E assim foi regido o ensino, substancialmente pela lógica da

racionalidade técnico-instrumental.

A segunda etapa do desenvolvimento da contabilidade no Brasil é marcada pelo

contexto político vigente a partir de 1964. Nesse contexto, mediante a Lei nº 4357,

de 16/07/64, é implantada a obrigatoriedade da correção monetária dos elementos

patrimoniais classificados no ativo fixo e no grupo do capital, suprimindo em parte as

distorções apresentadas nos relatórios contábeis AMORIM (1999) assinala que a Lei

4.695, de 26/06/1965, depois pelo Decreto-Lei nº 1040, de 21/10/1969, e novamente

alterada pela Lei nº 5730, de 08/11/1971, estabeleceu essencialmente nova

estruturação para a composição do Conselho Federal de Contabilidade.

Entre outros itens, definiu a composição do Conselho, estabelecendo a quota de 2/3

de seus membros para contadores e 1/3 para técnicos em contabilidade. O

Conselho objetiva agregar os profissionais da área, visando acompanhar a atuação

do profissional em diferentes esferas como, por exemplo, em órgãos regionais ou

entidades classistas, a fim de garantir que as atividades contábeis sejam sempre

executadas por profissional habilitado e na forma da legislação em vigor.

Outra disposição legal que surgiu no cenário nacional foi a Lei nº 4.728, de

14/07/1965, que foi expedida para disciplinar o mercado de capitais e estabelecer

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medidas para o seu desenvolvimento. A instituição desse documento legal teve por

finalidade assegurar a correção de práticas comerciais relacionadas a negócios que

envolvam títulos ou valores mobiliários. Nesse cenário, a contabilidade assume

importante papel em relação à divulgação de informações pertinentes e confiáveis

decorrentes dos eventos contábeis escriturados.

A Lei nº 6.385/70 criou a Comissão de Valores Mobiliários, que substituiu o Banco

Central do Brasil na regulação de atividades das sociedades que realizavam a

cotação de suas ações na bolsa de valores.

A Lei 6404, de 15/12/1976, é um documento que dispõe sobre as Sociedades por

Ações e se configura como importante documento legal para que a contabilidade,

mediante o registro dos eventos contábeis e mediante as prerrogativas profissionais

do contador, constitua um dinâmico fluxo de atividades nas organizações. Pode-se

inferir que as organizações societárias encontram na Lei 6.404 as orientações

necessárias para o contexto histórico do atual desenvolvimento no Brasil, assim

como as orientações para as suas dinâmicas complexificadas.

O Conselho Federal de Contabilidade, visando constituir um corpo doutrinário do

conhecimento contábil para orientar as diferentes práticas do exercício contábil,

inclusive as atividades didáticas de magistério, instituiu a Resolução nº 529, de

23/10/81, posteriormente revogada pela Resolução nº 711, de 25/07/91, também

revogada pela Resolução do CFC nº 751, de 29/12/1993, que estabeleceu as

Normas Técnicas ligadas à ciência contábil. Os conceitos doutrinários passam a ser

caracterizados pelo prefixo NBC-T, enquanto as Normas Profissionais, que fixam

regras de procedimento profissional, portanto, relacionadas à profissão, são

caracterizadas pelo prefixo NBC-P, também numeradas seqüencialmente, de acordo

com a última Resolução mencionada.

Também em 23 de outubro de 1981, o Conselho Federal de Contabilidade aprovou

os Princípios Fundamentais de Contabilidade - NBC-T-1, tendo em vista um

tratamento contábil uniforme dos eventos contábeis da administração e, por

conseguinte, das demonstrações deles decorrentes. É a partir da Resolução nº 751

que se estabeleceu uma maior proximidade entre os Princípios Fundamentais de

Contabilidade e a Teoria Contábil. A Teoria da Contabilidade é uma disciplina

curricular que, na quase totalidade dos cursos de Ciências Contábeis, somente

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encontrará espaços de intervenção a partir da Resolução nº 03/92 do Conselho

Federal de Educação. Não louvo aqui de forma demasiada a disciplina “teoria

contábil”, porque tenho o entendimento de que a forma isolada desta figurar no

curso, sem manter relação com as demais especificidades da contabilidade, coloca-

a distante de sua real significação.

A Resolução nº 3, de 05/10/1992, do Conselho Federal de Educação, ao determinar

os conteúdos mínimos em categorias do conhecimento, define também que o curso

superior de Ciências Contábeis deverá ser integralizado com o mínimo de 2.700

horas/aula e realizado num mínimo de 04 anos para os alunos que ingressarem a

partir do ano de 1994.

A referida Resolução prevê ainda que cada Instituição de Ensino Superior, ao

adotar uma orientação pedagógica coerente com seus objetivos, deverá definir o

perfil do profissional a ser formado, observando as necessidades da região e dos

alunos, assim como a natureza e as características da instituição.

Pelo percurso seletivo e considerando a diversidade de leis, decretos-leis, normas,

resoluções ainda atuais ou já revogadas, é possível visualizar que a contabilidade,

desde a sua inserção no ensino por meio do ensino comercial e, mais tarde, no

ensino superior, sempre acompanhou o cortejo do corpo legislativo que está

ancorado na concepção de sociedade que tem o mercado como eixo e totalidade da

vida humana. Não obstante, conhecimentos de Filosofia, Estudos Sociais, Ética,

Cultura Brasileira entre outros, estão inseridos no currículo, mas a abordagem desse

saber é sempre isolada, fragmentada, não compreendendo formas relacionais com a

contabilidade e assim, favorecendo uma interpretação da contabilidade como uma

ciência pragmática. Nessa formatação, a contabilidade, na formação de seus

profissionais, empenha-se em dinamizar o objeto próprio de sua investigação, o

patrimônio das entidades, sem, contudo, ampliar seu corpo teórico nas outras

dimensões humanas a não ser a econômica, concebendo-a assim nos limites de

suas inferências.

No que diz respeito aos aspectos legais da instituição do ensino superior de

Ciências Contábeis, de 1945 até os dias atuais, podemos dizer que foram três as

alterações de maior abrangência: o Decreto Lei nº 7.988, de 22/09/1945, que criou o

curso e instituiu o currículo; a Resolução de 8/02/1963, que propôs alterações no

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currículo mínimo do curso de Ciências Contábeis; e a Resolução nº 3, de

03/10/1992, que inserida no conjunto de medidas governamentais para cumprir o

acordado na Conferência Mundial de Educação para Todos, (Jomtein, Tailândia),5

que definiu duração e conteúdos mínimos. As instituições universitárias, como

organizações formais burocráticas, zelaram em demasia no cumprimento do aparato

legal. Restrito ao fazer, o currículo de Ciências Contábeis, em longos e esparsos

períodos foi revisitado adequando-se sempre, apenas, às necessidades do contexto

econômico.

Hoje, no contexto da sociedade capitalista solitária, que requerer um sujeito criativo,

polivalente, sujeito de múltiplas aprendizagens, com capacidade crítica e

discernimento frente à sociedade tecnológica e pulverizada de informações e, ao

não encontrar egressos com tais competências e habilidades, julga improdutivos a

universidade, o curso e os professores. Esse processo é histórico e assenta suas

raízes nas condições objetivas dos sujeitos participantes, assim como na

constituição das suas instituições.

Em 21 de dezembro de 1996 é promulgada a nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, e em sua composição insere-se o Capítulo IV, que trata da

Educação Superior, prescrevendo entre os artigos 43 a 57, desde a finalidade da

educação superior até o mínimo de horas aulas semanais para os professores das

instituições públicas.

Em seu artigo 43, no inciso II, encontra-se a finalidade da educação superior, que

consiste em formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento aptos para a

inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da

sociedade brasileira, bem como para colaborar na sua formação contínua. Os

demais capítulos, assim como a íntegra da Lei, seu teor, necessitam ser

criteriosamente analisados quando da definição de propostas curriculares visando a

compreender o pressuposto da Lei e os fins a que se destinam os cursos superiores.

___________________________________________________________________

5 Esta conferência foi realizada em 1990 e financiada pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), UNICEF (Fundo das Nações Unidas para a Infância), PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e Banco Mundial.

___________________________________________________________________

O projeto Jomtien assumiu que a educação deveria garantir as necessidades

básicas de aprendizagem (NEBA), para crianças, jovens e adultos que deveriam

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constituir-se na possibilidade do sujeito ter condições de: 1) sobrevivência; 2)

desenvolvimento pleno de suas capacidades; 3)uma vida e um trabalho dignos; 4)

uma participação plena no desenvolvimento; 5) melhoria na qualidade de vida; 6)

tomada de decisões informadas e 7) possibilidade de continuar apreendendo. Para

garantir esses aspectos foram acordadas, em nível nacional, metas para os alunos

subseqüentes a serem alcançadas nos diferentes âmbitos educacionais que

possibilitassem: o desenvolvimento de políticas de apoio no contexto social,

econômico e cultural; a mobilização de recursos financeiros, públicos, privados e

voluntários para investimentos na educação e fortalecer a solidariedade

internacional com relações econômicas justas e qualitativas. Nessas metas inserem-

se as novas prescrições curriculares para o ensino universitário, e logo, também

para o ensino superior de contabilidade, com a definição de suas diretrizes

curriculares. Alinhado à Lei 9394/96 e ao contido no artigo 43 inciso II, o edital 04/97

do MEC/SESU/DPES/CEE/Ciências Contábeis convoca a participação da

comunidade acadêmica para a discussão das Diretrizes Curriculares dos cursos de

Ciências Contábeis.

Essa proposta de Diretrizes Curriculares foi elaborada por uma comissão de

especialistas da área de Ciências Contábeis nomeada pelo MEC, e até o presente

momento encontra-se para análise no Conselho Nacional de Educação.

Os vários itens da proposta ressaltam, entre outros aspectos, a descrição do perfil

desejado do formando, as competências e habilidades desejadas, os conteúdos

caracterizadores do curso, recomendações e sugestões de conhecimentos para a

configuração de uma grade curricular (currículo pleno), carga horária e duração do

curso.

No contexto da pesquisa e dessa tese o que desejo ressaltar é a configuração dos

conteúdos propostos pela referida comissão, a qual sendo definida pelo CNE,

redefinirá o contido na Resolução 03/92 do MEC.

Pelo Edital 04/97, os conteúdos para o curso de graduação em Ciências Contábeis

são assim elencados:

CONTEÚDOS CARACTERIZADORES DO CURSO CONTEÚDOS OBRIGATÓRIOS

DE FORMAÇÃO BÁSICA E PROFISSIONAL (50% da carga horária total). Estes

conteúdos não representam nomes de disciplinas, mas áreas de conhecimentos:

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1. CONTEÚDOS DE ADMINISTRAÇÃO

Teoria Geral da Administração

Estratégia Empresarial

Comportamento Organizacional

2. CONTEÚDOS DE ECONOMIA

Teoria da Firma (Monopólio, Oligopólio, Concorrência Perfeita, etc)

Cenários Econômicos e Economia Internacional

Economia da Empresas

3. CONTEÚDOS DE DIREITO

Legislação Social e Trabalhista

Direito Tributário

Direito Comercial e Societário

4. CONTEÚDOS DE MÉTODOS QUANTITATIVOS

Medidas de Tendência Central e de Dispersão

Análise de Regressão e Correlação

Análise de Série Temporal

Cálculo Integral e Diferencial

5. CONTEÚDOS DE TEORIA DA CONTABILIDADE

História do Pensamento Contábil

Ativo e Passivo e sua Mensuração

Receitas, Despesas, Perdas e Ganhos e suas Mensurações

Teorias do Patrimônio Líquido

Princípios Fundamentais de Contabilidade e Harmonização Internacional

6. CONTEÚDOS DE CONTABILIDADE FINANCEIRA

Princípios, Normas e Procedimentos de Contabilidade Financeira

Elaboração e Evidenciação das Demonstrações Contábeis

7. CONTEÚDOS DE CONTABILIDADE TRIBUTÁRIA

Contabilidade de Tributos Federais, Estaduais e Municipais

Planejamento Tributário

8. CONTEÚDOS DE CONTABILIDADE GERENCIAL

Métodos de Custeio

Sistemas de Acumulação de Custos

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Análise de Custos

Descentralização (Preço de Transferência e Centro de Resultado)

9. CONTEÚDOS DE AUDITORIA

Controles Internos

Princípios, Normas e Procedimentos de Auditoria

Planejamento de Auditoria

Papéis de Trabalho

10. CONTEÚDOS DE CONTROLADORIA

Sistemas de Informações

Processo de Planejamento, Execução e Controle

Avaliação de Desempenho

Responsabilidade de Prestar Contas da Gestão Perante a Sociedade

("Accountability")

CONTEÚDOS OPTATIVOS PARA ÊNFASE(S) CURRICULAR(ES) (50% restantes

da carga horária total): para o desenvolvimento de competências e habilidades, que

reflitam a heterogeneidade das demandas sociais, as IES terão a liberdade de definir

livremente a metade do currículo pleno. A IES que optar por ênfase(s) (por exemplo:

auditoria, análise de sistemas contábeis, controladoria, contabilidade pública,

contabilidade tributária, contabilidade societária, contabilidade de custos, perícia,

arbitragem contábil, contabilidade de organizações não governamentais,

contabilidade ambiental, contabilidade internacional, contabilidade e finanças

corporativas, etc.) deve completar a metade do currículo pleno levando em

consideração tal opção. A IES que não optar por ênfase(s) deve utilizar estes

conteúdos optativos para completar a formação plena do contador.

Conforme o contido no texto da Comissão de Especialistas anuncia, estarão os

conteúdos distribuídos em 50% obrigatórios e 50% optativos, a critérios das IES. O

texto anuncia, também, que são as áreas do conhecimento anteriormente listadas

que serão referência para elaborar propostas de Diretrizes Curriculares. Informa

ainda que tais áreas não representam nomes de disciplinas mas sugestionam

conteúdos. Dessa forma, os conteúdos podem ser sintetizados nas seguintes áreas:

ADMINISTRAÇÃO

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CONTABILIDADE

MÉTODOS QUANTITATIVOS

DIREITO

ECONOMIA

OPTATIVOS

A formatação dessas áreas do conhecimento convertidas em referência para as

Diretrizes Curriculares do curso superior de Ciências Contábeis em nada difere das

propostas de 1945; da alteração de 1968, e do contido na Resolução 03/92,

podendo-se afirmar que, em prevalecendo a proposta encaminhada ao CNE, o

modelo dos cursos superiores de Ciências Contábeis criados em 1945 ainda

permanece vigente, em face da precarização com que se pensa, estrutura-se e se

age na educação superior em Ciências Contábeis. Contudo, é preciso, ainda, estar

atento e atentar contra os referidos percentuais dos conteúdos obrigatórios de

formação básica e profissional e dos conteúdos optativos para ênfase(s)

curricular(es), que os massificam em uma (de) formação aligeirada do profissional

da contabilidade.

As discussões atuais sobre a proposta das Diretrizes Curriculares para o ensino

superior de contabilidade podem ser inseridas nas discussões realizadas por Lima

(1996), que ao discutir o paradigma da educação superior em Portugal o situa no

paradigma contábil, discutindo assim três modelos de universidade: o modelo

corporativo, que mantém através do Estado um forte controle político e

administrativo da instituição; o modelo político-participativo no qual a universidade é

domesticada e na qual se objetiva a busca de uma cidadania organizacional; o

modelo gerencialista, que baseado em políticas neoliberais busca conciliar ganhos

de qualidade e produtividade ao mesmo tempo que concretiza cortes nos

investimentos em educação.

Nesse contexto, tanto para educação superior em Portugal quanto para o ensino

superior de contabilidade no Brasil, acaba por se configurar e valorizar concepções

mecanicistas das organizações e da administração educativas, a educação contábil

tende a centrar-se no cálculo e na mensuração dos resultados (desvalorizando os

processos e os resultados mais difíceis de contabilizar), favorece a padronização

(em prejuízo da diversidade), apóia-se em regras burocráticas e em tecnologias

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estáveis e rotineiras, promove a decomposição e fragmentação dos processos

educativos em unidades elementares e mais simples, passíveis de „mercadorização‟.

Enquanto orientação política, a educação contábil evidencia uma alta capacidade de

discriminação da educação que conta e da educação que não conta, ou conta

menos (LIMA, 1996, p. 55).

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SITES E LIVROS PARA CONSULTAS

Uso de ferramentas na docência do ensino superior NPAR Oliveira - EXPERIENCIAS COM TECNOLOGIAS DE …, 2006 - books.google.com USO DE FERRAMENTAS NA DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR Nara Pollyanne de Araújo Ramalho Oliveira 1. Introdução Vivemos numa sociedade na qual a informação chega a todos os instantes e de várias formas através de livros, jornais, revistas, TV, rádio e internet. O ... Citado por 3 - Artigos relacionados Formar para a excelência profissional–pressupostos e rupturas nos níveis iniciais da docência [PDF] de metodista.brMC Roldão - Educação & Linguagem, 2009 - metodista.br ... la excelencia profesional – presupuestos y rupturas en los niveles iniciales de la docencia ... refere aos professores, e muito particularmente aos professores dos níveis iniciais de docência. ... uma Escola Superior de Educação, tipo de instituição do ensino superior politécnico que ... Citado por 12 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões [PDF] Docência universitária e os desafios da formação pedagógica [PDF] de scielo.brCMB Fernandes - Interface-Comunic. Saúde, Educ, 2001 - SciELO Brasil ... na escola básica e no ensino médio, exige-se a formação pedagógica, mas o professor que atua no ensino superior “não precisa desse ... não é humana, social e histórica?) que dariam conta de instrumentalizar o professor para compreender e interpretar sua docência ratifica o ... Citado por 10 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 4 versões [PDF] Formação de Professores de Matemática [PDF] de ulbra.brHN Cury, ASA Bianchi, CRJ de Azambuja… - Revista de Ciências …, 2002 - ulbra.br ... nas séries iniciais, aos níveis de desenvolvimento cognitivo, às teorias, mas nunca examinando uma situação real de ensino superior. ... aqueles que têm apenas bacharelado, com mestrado ou doutorado em Matemática, não tendo nenhuma experiência de docência no ensino ... Citado por 18 - Artigos relacionados - Ver em HTML [PDF] A universidade pública sob nova perspectiva

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[PDF] de scielo.brM Chaui - Revista Brasileira de Educação, 2003 - SciELO Brasil ... do nível do ensino superior (cuja avaliação era feita por organismos ligados às próprias empresas). 2. Definir a autonomia universitária não pelo cri- tério dos chamados “contratos de gestão”, mas pelo direito e pelo poder de definir suas nor- mas de formação, docência e ... Citado por 199 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 23 versões [CITAÇÃO] Qualidade no ensino superior: um referencial pedagógico de professores MC GRILLO - Porto Alegre: Tese de Doutorado, Faculdade de …, 1992 Citado por 4 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] Abrindo parênteses: os fundamentos da educação ea docência no ensino superior NDR SILVEIRA - … & SOCIEDADE/CEDES. Campinas: Cortez Editora, 1988 Citado por 3 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] Do egocentrismo à descentração: a docência no ensino superior TBI MARQUES - Porto Alegre: UFRGS, 2005 Citado por 3 - Artigos relacionados [PDF] O mestrado profissional na política atual da Capes [PDF] de feevale.brRJ Ribeiro - Revista Brasileira de Pós-Graduação, 2005 - feevale.br ... para setores que não lidam com a docência nem com a pesquisa de ponta; segunda, com o aumento das titulações no País, constata-se que boa parte dos mestres e uma parte significativa dos doutores encaminham-se para um destino que não é o ensino superior; e, terceira ... Citado por 12 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 10 versões [HTML] Reflexões sobre o preparo para a docência na pós-graduação em enfermagem [HTML] de scielo.brV Pimentel, DDCF Mota… - Revista da Escola de …, 2007 - SciELO Brasil ... su contribución en el desarrollo de competencias para el ejercicio de la docencia universitaria en ... estão voltados para o desenvolvimento científico-tecnológico, assim como ao preparo para a docência. ... a importância da formação de mestres e doutores para o ensino de nível ... Citado por 6 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 6 versões [CITAÇÃO] A Gratificação de Estímulo a Docência (GED): Alterações no Trabalho Acadêmico e no Padrão de Gestão das Instituições Federais de Ensino Superior

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AM CATANI… - DOURADO, LF & CATANI, ª M.(orgs.) Universidade …, 1999 Citado por 4 - Artigos relacionados [PDF] Expansão do ensino superior: contextos, desafios, possibilidades [PDF] de scielo.brAJ Severino - Avaliação, Campinas - SciELO Brasil ... Primeiramente em decorrência do envolvimento intrínseco do ensino superior com a educação em geral. ... institucional, daquela tarefa técnica de formar os professores, como profissionais do ensino. ... ao justificar a criação da Bolsa de Iniciação à Docência.(TAKAHASHI; PINHO ... Citado por 5 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 8 versões [CITAÇÃO] Universidade, docência, globalização E Lampert - 1999 - Editora Sulina Citado por 25 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] As novas tecnologias na formação inicial de professores JP da Ponte… - Ministério da Educação. … Citado por 65 - Artigos relacionados - Todas as 3 versões [CITAÇÃO] Interface entre trabalho docente e saúde de uma instituição de ensino superior TM Araújo, IS Paranhos… - … . Reformas educacionais na América Latina e …, 2003 Citado por 7 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões [CITAÇÃO] Trabalho docente e as reformas neoliberais RG Barreto, R Leher… - Reformas educacionais na América Latina e …, 2003 Citado por 26 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões [CITAÇÃO] Docência no Ensino Superior Docência no Ensino Superior Docência no Ensino Superior S PIMENTA… - 2005 - São Paulo: Cortez Citado por 3 - Artigos relacionados [PDF] Metodologia de Ensino na Universidade Brasileira: elementos de uma trajetória [PDF] de usp.brLGC ANASTASIOU - … textos em metodologia do ensino superior …, 2001 - moodle.stoa.usp.br ... ir para uma sala de aula, tomar conta de uma turma de alunos e efetivar o ritual da docência: apresentação de conteúdos, controle dos alunos, avaliação da aprendizagem, disciplinamento.” 7 “Talvez a primeira e principal idéia francesa adotada no ensino superior, desde a ... Citado por 20 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões

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[PDF] Embates na definição das políticas de formação de professores para a atuação multidisciplinar nos anos iniciais do Ensino Fundamental: respeito à cidadania … [PDF] de scielo.brI Brzezinski - Educação & Sociedade, 1999 - SciELO Brasil ... a eficácia desses institutos para formar docentes para os anos iniciais do Ensino Fundamental. ... que era de seu conhecimento o sucesso da experiência do Instituto Superior “Presidente Kennedy ... brasileiras adotaram, desde o final da década de 1980, a docência como base de ... Citado por 42 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 6 versões [CITAÇÃO] Qualidade de vida de professores universitários em fase de mestrado SD SOUZA - Programa de Pós Citado por 6 - Artigos relacionados [LIVRO] Universidade pública: políticas e identidade institucional LF Dourado… - 1999 - books.google.com ... da educação brasileira 60 Referências bibliográficas 63 CAPÍTULO QUATRO A GRATIFICAÇÃO DE ESTÍMULO À DOCÊNCIA (GED): ALTERAÇÕES NO TRABALHO ACADÉMICO E NO PADRÃO DE GESTÃO DAS INSTITUIÇÕES FEDERAIS DE ENSINO SUPERIOR (! ... Citado por 14 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] Metodologias no ensino superior: algumas reflexões MC Sonzogno, NA BATISTA… - … , Batista SH, organizadores. Docência …, 2004 Citado por 12 - Artigos relacionados [PDF] Formação de profissionais da educação no Brasil: o curso de pedagogia em questão [PDF] de scielo.brL Scheibe… - Educação & Sociedade, 1999 - SciELO Brasil ... criada pelos Institutos Superiores de Educação e da suspensão da aná- lise dos processos dos cursos de pedagogia voltados para a docência. Observadas as conseqüências dessas medidas, verifica-se que as insti- tuições de ensino superior foram induzidas a apresentar ... Citado por 68 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 13 versões [CITAÇÃO] Ensino como mediação da formação do professor universitário MI CUNHA - Professor do ensino superior: identidade, docência e …, 2000 Citado por 44 - Artigos relacionados [PDF] Dormi aluno (a)... Acordei professor (a): interfaces da formação para o exercício do ensino superior [PDF] de ufop.brAMO CUNHA, TTR BRITO… - … de Educação Superior, 2004 - prograd.ufop.br ... No entanto, essas iniciativas não constituem regra geral, pois há certo consenso de que a

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docência no ensino superior não requer formação no campo do ensinar. ... docência no ensino superior coexistem junto a tantos outros que se entremeiam no universo do professor. ... Citado por 5 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 6 versões [HTML] Enfermeiro professor: um diálogo com a formação pedagógica [HTML] de scielo.brMTP Rodrigues… - Revista Brasileira de …, 2007 - SciELO Brasil ... La docencia universitaria se presenta como un tema importante en un momento de transformación en la enseñanza de Enfermería caracterizado por cambios curriculares y ... Assim, exige-se do professor competências para a docência no ensino superior: ser competente em ... Citado por 13 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 3 versões [CITAÇÃO] Publicidade: um discurso de sedução AG Pinto - 1997 - Porto Editora Citado por 60 - Artigos relacionados [DOC] Docência universitária: repensando a aula [DOC] de oktiva.com.brMT Masetto - … e aprender no ensino superior. São Paulo (SP): …, 2003 - wp.oktiva.com.br Em geral, nós professores universitários consumimos grande parte do tempo de nossas atividades em sala de aula, e, ao menos, teoricamente estamos sempre a nos interrogar como poderiam ser melhor aproveitadas estas aulas pelos nossos alunos. Ao mesmo tempo que nos ... Citado por 19 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 2 versões [CITAÇÃO] A docência, o aluno ingressante no ensino superior ea escolha profissional AW Pagotti… - A prática da docência universitária. São Paulo: Factash …, 2003 Citado por 4 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] Docência como profissão no ensino superior e os saberes científicos e pedagógicos LGC ANASTASIOU - Educação e Cultura, Joinvile, 2002 Citado por 4 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] O currículo no ensino superior em saúde JA Maia, NA Batista… - … NA, Batista SH, orgs. Docência em saúde: temas e …, 2004 Citado por 16 - Artigos relacionados [PDF] Trabalho docente no ensino superior sob o contexto das relações sociais capitalistas

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[PDF] de anped.org.brDB LEDA - Caxambu, 29ª reunião da ANPED, 2006 - anped.org.br ... p.71) comenta: [... a educação superior privada, sobretudo ... O ensino privado tem empregado muita gente nesse país, especialmente, pela não realização de concursos para as instituições públicas. ... trabalhadores precisam garantir uma forma de subsistência ea docência no ... Citado por 9 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 6 versões [LIVRO] Projeto político-pedagógico da escola: uma construção possível IPA Veiga - 2007 - books.google.com ... eo cotidiano escolar, o estágio supervisionado, a didática do ensino superior etc ... 6. ESCOLA, APRENDIZAGEM E DOCÊNCIA: IMAGINÁRIO SOCIAL E INTENCIONALIDADE POLÍTICA Mário Osório Marques 7 ... com o objetivo de levar às instituições públicas de ensino uma visão ... Citado por 402 - Artigos relacionados [PDF] O bom cidadão docente universitário na senda da qualidade no ensino superior [PDF] de scielo.brA Rego - Educação & Sociedade, 2000 - SciELO Brasil ... portanto, algumas razões para advogar que os estudantes demonstram uma perspectiva acerca da excelência da docência que contradiz ... à noção de que os comportamentos pesquisados são susceptíveis de contribuir para os incrementos da qualidade no ensino superior. ... Citado por 14 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 6 versões [HTML] Docência na universidade: professores inovadores na USP [HTML] de scielo.brHC Chamlian - Cadernos de pesquisa, 2003 - SciELO Brasil ... que se recomenda, por exemplo, a criação da disciplina Metodologia do Ensino Superior como uma ... adotada pela Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior – Capes – passou a tornar obrigatório o estágio supervisionado na docência como parte ... Citado por 26 - Artigos relacionados - Em cache - Todas as 2 versões [CITAÇÃO] das GC (2002) SG Pimenta… - Docência no ensino superior Citado por 3 - Artigos relacionados [CITAÇÃO] O pensamento de Vygotsky e Bakhtin no Brasil MT de Assunção Freitas - 1994 - Papirus Editora Citado por 97 - Artigos relacionados - Todas as 2 versões Formação de Professores

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J Pacheco… - Teoria e Praxis. Braga: …, 1995 - webs.ie.uminho.pt ... ensino superior. Se a controvérsia existe, pois discute-se o lugar da formação ... décadas de 70, 80 e 90, do século XX, criaram cursos de licenciaturas em ensino. ... docência, tem contribuído para a manutenção de situações de clara inadequação do professor à realidade escolar. ... Citado por 65 - Artigos relacionados - Ver em HTML Aprendizagem da docência: professores formadores [PDF] de pucsp.brMGN Mizukami - Revista Científica e-curriculum ISSN 1809-3876, 2010 - revistas.pucsp.br ... A docência no ensino superior é ainda território que apresenta iniciativas tímidas - comparativamente às demais -, embora mais recentemente também tenha passado a fazer parte do debate da área de forma mais sistemática. ... Citado por 16 - Artigos relacionados - Todas as 7 versões [PDF] Docência na universidade, cultura e avaliação institucional: saberes silenciados em questão [PDF] de scielo.brMI da Cunha - Revista Brasileira de Educação, 2006 - SciELO Brasil ... Esses são os pressupostos que estimularam uma ação investigativa sobre os impactos do modelo avaliativo, imposto pelo Ministério da Educação (MEC) ao ensino superior, na segunda metade da dé- cada de 1990, sobre a docência universitária. ... Citado por 18 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Todas as 6 versões

[PDF] ►PRÁTICA PEDAGÓGICA II C Científica, F Costa - ese.ipsantarem.pt ... Coordenação Científica: Fernando Costa ... 5- Anexos com todos os materiais que considerar relevantes na sua prática pedagógica. BIBLIOGRAFIA ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Metodologia da Pesquisa Metodologia da Pesquisa LCH Zanella Artigos relacionados - Pesquisa na web

[PDF] ►PRÁTICA PEDAGÓGICA III C Científica - eses.pt ... Coordenação Científica: Fernando Costa Page 2. INTRODUÇÃO ... Realizar seminários de preparação da prática pedagógica nas suas diferentes ... BIBLIOGRAFIA ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

[LIVRO] Gestão escolar: desafios e tendências ACR Xavier, JA Sobrinho, F Marra, AC Médici - 1994 - Instituto de Pesquisa

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Econômica Aplicada Citado por 10 - Artigos relacionados - Pesquisa na web

[PDF] ►PEDAGOGIA DIFERENCIADA–NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS D RESPONSÁVEL, TP MARQUES, C CIENTÍFICA, G HAMIDO - eses.pt ... COORDENAÇÃO CIENTÍFICA GRACINDA HAMIDO 2006/2007 ... dinamizadas a partir de situações problema colocadas através da Prática Pedagógica. ... BIBLIOGRAFIA ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►Desenvolvimento e Gestão Curricular C Científica - eses.pt ... Coordenação Científica: Ramiro Marques ... Pré-Escolar, acompanhados de justificação pedagógica e sugestões ... com consulta livre da bibliografia da disciplina ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

PDF] ►MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA/SEED UA DO BRASIL - coralx.ufsm.br ... Avaliação em processo. Sistema de acompanhamento. Bibliografia HOFFMANN, JML. ... Marialice de Moraes Materiais impressos e coordenação pedagógica * ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA EDITAL PROCESSO DE SELEÇÃO EXTERNA DE DOCENTES C VAGAS - fead.br ... será conduzido por uma Comissão instituída pela Coordenação Pedagógica, pelo Coordenador ... A listagem do conteúdo juntamente com a bibliografia será de ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

[CITAÇÃO] Psicologia da Aprendizagem CE de Infância, C Científica, T Sá, D da … Artigos relacionados - Pesquisa na web

[DOC] ►ESTÁGIO TUTELADO 2 DEPGE CURSO, T EDUCACIONAL, ÉS DE OLIVEIRA - br.geocities.com ... BIBLIOGRAFIA..... 23. ... escolar, visando uma coordenação pedagógica. ... Ver em HTML - Pesquisa na web

[RTF] ►A PRÁXIS PEDAGÓGICA COMO INSTRUMENTO DE TRANSFORMAÇÃO DA PRÁTICA DOCENTE FRANCO, Maria Amélia … M de Pesquisa - anped.org.br ... Caberá à atividade de coordenação pedagógica, nos diferentes níveis de ... para

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dar contornos à emergência de uma nova práxis pedagógica. Bibliografia: ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

[PDF] ►Questões sobre a organização do trabalho na escola SG PIMENTA, AS BORGES - BORGES, Abel S. et. al - crmariocovas.sp.gov.br ... Já a coordenação de projetos não é ... a competência da equipe pedagógica, fica claramente ... por meio da atualização -cursos, bibliografia, estudos, troca e ... Citado por 8 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►PEDAGOGIA EM CONTEXTOS NÃO FORMAIS CDEE SOCIAL, C CIENTÍFICA, G HAMIDO, S MADEIRA - eses.pt ... COORDENAÇÃO CIENTÍFICA: ... Bibliografia: ... JAL (2000) –Paradigmas y Métodos Pedagógicos para la Educación Social – La praxis pedagógica en educación ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►O papel da coordenação de curso: a experiência no ensino de graduação em geologia na Universidade … JAB Sabadia - Educação em Debate, 2000 - revistadegeologia.ufc.br ... 29 O Papel da Coordenação de Curso – A Experiência no Ensino de ... de graduação não contempla disciplinas de formação pedagógica ea pós ... Bibliografia ... Citado por 4 - Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►PEDAGOGIA DA PRIMEIRA INFÂNCIA C Científica, MJ Cardona - eses.pt ... Coordenação Científica Mª João Cardona ... descrição/caracterização de uma situação observada no estágio da prática pedagógica em creche ... BIBLIOGRAFIA ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

PLANO DE DISCIPLINA C PROGRAMÁTICO, B BÁSICA, B COMPLEMENTAR - pucrs.campus2.br ... BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR. ... Aprendizagem e desenvolvimento Infantil 3: Psicomotricidade- alternativa pedagógica. ... Negrine, A. A coordenação Psicomotora e suas ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 4 versões

[PDF] ►A Qualidade no Currículo E de Brito Silva - portal.mec.gov.br ... iniciado após estudo da legislação e de bibliografia apropriada; ... 40 horas semanais, 10 horas/aula de coordenação pedagógica, em turno contrário, ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 3 versões

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[DOC] ►I. O TRABALHO COM PROJETOS III CRONOGRAMA, FMÊSP TAREFAS, IVA DO PROJETO, VCE … - anglo-vale.com.br ... Bom trabalho! Coordenação Pedagógica / 2006. BIBLIOGRAFIA. BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Média e Tecnológica. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[CITAÇÃO] EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA FE POLÍTICAS Artigos relacionados - Pesquisa na web

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[PDF] ►Métodos e Técnicas de Administração Escolar N Prévia - dce.ua.pt ... interna e externa ao estabelecimento de ensino; • Compreender as sinergias benéficas de uma adequada coordenação pedagógica ao nível ... Page 2. Bibliografia ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

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educación ... Ver em HTML - Pesquisa na web

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[PDF] ►RESOLUÇÃO Nº 17/2006 Ao curso de Pós-Graduação, P sob a … - ufcg.edu.br ... Subordinação e coordenação: confrontos e contrastes. ... Aplicação da lingüística à pesquisa pedagógica em matéria de ensino da ... BIBLIOGRAFIA SUGERIDA: ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

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Revista@ prender Virtu@ l, Vol. 1, No 1 (2008) - ►ufsc.br [PDF] DX Garcia - Revista@ prender Virtu@ l, 2008 - revistas.cin.ufsc.br ... didáticos, bibliografia e programação das atividades devem constar no ... A coordenação pedagógica deverá estar atenta para as práticas pedagógicas dos ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[DOC] ►1.3) ATIVIDADES CIENTÍFICAS, PROFISSIONAIS E/OU ARTÍSTICAS C Programático - noticias.pufuadm.ufu.br ... 0,5 por ano (com comprovação) máximo de 1,0 pontos, Coordenação pedagógica

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na área de Alfabetização e/ou séries iniciais. ... BibLiografia: ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►PROGRAMA DE INCENTIVO Á FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DO ENSINO MÉDIO ESUAFPE CURRICULAR - portal.mec.gov.br ... Coordenação do curso: ... As atividades de natureza psico-pedagógica foram ... oportunidade de aprofundar seu conhecimento e de se atualizar com bibliografia e ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[LIVRO] A reconstrução da didática: elementos teórico-metodológicos MRNS Oliveira - 1992 - Papirus Editora

[LIVRO] Orientação psico-pedagógica no ensino superior A Hoirisch, DIM Barros, IS Souza - 1993 - UFRJ Editora Citado por 7 - Artigos relacionados - Pesquisa na web

[DOC] ►Parte Teórica: Aulas expositivas, Leitura da bibliografia indicada. Parte Prática: Exercícios e … F de Custos–Critérios, MAE Classificação - unipan.br ... BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR. DUTRA, RG Custos: uma abordagem prática: São Paulo: Atlas, 2003. ... APROVAÇÃO DA COORDENAÇÃO DE CURSO. ... Coordenadora Pedagógica. ... Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►VIII-001-USO DE FERRAMENTAS DE INFORMÁTICA EM FAVOR DE NOVAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS AMBIENTAIS FMB Zorzal, J Jachic, EMS Dumke, MSB Ostrowsky, L … - bvsde.paho.org ... o início do curso; m) oferecer e manter uma bibliografia que apóie as ... de inclusão digital, desta vez por parte do corpo docente e coordenação pedagógica. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[LIVRO] O trabalho docente teoria & prática AG Queluz, M Alonso - 2003 - Thomson Learning Ibero Citado por 7 - Artigos relacionados - Pesquisa na web

[RTF] ►AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA SPD DE PERCURSOS - nead.ufmt.br ... tem que ser, também, avaliada no desenvolvimento das funções de coordenação geral, coordenação administrativa e coordenação pedagógica. ... Bibliografia. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►Construção e Valorização do saber GDOD FEDERAL - gdfsige.df.gov.br

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... BIBLIOGRAFIA ..... 35 ... desenvolvidos e planejados na coordenação pedagógica. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►Curso de Educação de Infância C Científica - eses.pt ... Programa Coordenação Científica: ... análise no subgrupo ou turma de situações problemáticas da prática pedagógica dos ... BIBLIOGRAFIA - AA VV (1997). ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 4 versões

[DOC] ►CIRCUNFERÊNCIA E CÍRCULO CMS OLIVEIRA, EDOSS NUNES - br.geocities.com ... 7 – Bibliografia 34. ... é elaborado e revisto periodicamente pelos professores em reuniões por área de ensino supervisionado pela coordenação pedagógica. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA A DOCÊNCIA NA EAD: A DIALOGICIDADE DOS TEXTOS DOS PROFESSORES NA PRÁTICA … IB de Camargo Cortelazzo, FA Rizzato, RF Borges, C … - utp.br ... em Educação de TCC da FCHLA e da coordenação de oficinas ... Palavras Chave: formação, docência, prática pedagógica, educação, distância. BIBLIOGRAFIA. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►Sistema de Avaliação de Alunos A Cidade, LGG Mählmann - guaiba.ulbra.tche.br ... Com base nessa bibliografia, são criadas perguntas para serem inseridas nas provas. ... utilizada para consulta pedagógica pela coordenação ou professores ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[CITAÇÃO] Informática Aplicada à Educação DCA Mesquita, DT Castro Artigos relacionados - Pesquisa na web

PDF] ►MAX WEBER NOS PROGRAMAS NACIONAIS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: UM BALANÇO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA … B de Teses, D da Coordenação, AP do Ensino - lpp-uerj.net ... de Teses e Dissertações da Coordenação e Aperfeiçoamento ... Judith; A “revisão da bibliografia” em teses e ... Modernidade e ação pedagógica em Max Weber ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►Educação para a cidadania E Moral, R Católica, Á de Projecto, E Acompanhado, … - Ciências - esvf.net ... Ao nível dos professores da turma: efectuando a coordenação pedagógica ( num ... 84 5.

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BIBLIOGRAFIA E FONTES DE INFORMAÇÃO Legislação: - LBSE, 46/86; ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

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[PDF] ►FAZENDO ARTE NA ESCOLA DE ENSINO FUNDAMENTAL LH da Silva CHRISTOV - unesp.br ... O desenvolvimento de leitura e escrita foi uma exigência da coordenação pedagógica, uma vez que o Projeto Pedagógico da escola tem como um dos ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[LIVRO] Educação ambiental: da prática pedagógica à cidadania JLB Talamoni, AC Sampaio - 2003 - Escrituras Citado por 2 - Artigos relacionados - Pesquisa na web

[PDF] ►A Heterogeneidade de Fatores Envolvidos na Aprendizagem: uma Visão Multidisciplinar LAG Senna - A presentação - senna.pro.br ... após ter alta do hospital, a direção convocará a coordenação pedagógica para definir ... BIBLIOGRAFIA GARIN, E. (1995) Ciência e vida civil no Renascimento ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 4 versões

[PDF] ►1.0. PERÍODO, HORÁRIO E LOCAL DE INSCRIÇÃO DLP Parceladas, UAT Neves, B Cavalhada, LP … - unemat.br ... g) O candidato que tiver a proposta aprovada terá que entregar a Coordenação Pedagógica devidamente, relatório da disciplina e avaliação ... Bibliografia: ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

Livro Didático e aprendizado de leitura no início do ensino fundamental C Franco, PMFR Nunes, PCSR da Silva, PFC de … - maxwell.lambda.ele.puc-rio.br ... desenvolveu atividades de ensino e de coordenação pedagógica em escolas ... na orientação de licenciandos e na coordenação do projeto de ... Inclui bibliografia ... Pesquisa na web - Todas as 2 versões

PDF] ►ESTRATÉGIAS DE IMPLEMENTAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE FORMAÇÃO À DISTÂNCIA MM Tassigny - rieoei.org ... à distância 4 . O acompanhamento ea coordenação pedagógica (formada por ... A preparação pedagógica e, mais particularmente, o desenvolvimento ... BIBLIOGRAFIA ... Artigos relacionados - Pesquisa na web - Todas as 3 versões

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[DOC] ►CURSO DE FORMAÇÃO METODOLÓGICA E DIDÁTICO-PEDAGÓGICA DIA DA, HD PROFESSORES, M DA PESQUISA, MDOE … - unerj.br ... metodológica e didático-pedagógica, apresentar monografia ... UNIDADE RESPONSÁVEL: Coordenação de Pós-Graduação. 1.5. ... EMENTAS E BIBLIOGRAFIA DAS DISCIPLINAS ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[DOC] ►PREFEITURA MUNICIPAL DE SANTA VITÓRIA DO PALMAR SECRETARIA DE ADMINISTRAÇÃO CONCURSO PÚBLICO PARA … C Vagas - furg.br ... nominal e verbal, período composto por coordenação e subordinação ... Papirus, 2002.A pesquisa como instrumentalização da prática pedagógica. ... BIBLIOGRAFIA: ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►1º PERÍODO C de Avaliação, B Básica, B Complementar - uss.br ... São Paulo: Edgard Blucher, 1973. Bibliografia Complementar: ... FARIAS, RF Química de Coordenação fundamentos e atualidades. Campinas/SP: Editora Atomo, 2005. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 2 versões

[DOC] ►ANEXO I DO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO Nº 034/2006 PCAOSC DE NIVEL, S PROGRAMA, B SUGERIDA, ACAOSC DE … - e-concurso.com.br ... Ministério da saúde,2ºEdição, 1994.Coordenação Nacional de ... processo de comunicação como fator de gestão da ação Pedagógica. ... BIBLIOGRAFIA SUGERIDA. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 4 versões

[PDF] ►Curso Normal no Distrito Federal: Processo de Mudança CMNH Santana, E Waisros - emaberto.inep.gov.br ... de pesquisa gerou dois produtos: um Relatório Final, composto de 163 páginas divididas em seis capítulos, bibliografia ... classe e coordenação pedagógica; ... Ver em HTML - Pesquisa na web - Todas as 4 versões

[PDF] ►PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES M de Irecê–Bahia - ciberparque.faced.ufba.br ... Bibliografia Bibliografia ..... ... pedagógica ... pela coordenação ... Ver em HTML - Pesquisa na web

[PDF] ►GESTÃO ESCOLAR PÚBLICA ADEJC CARIAS - freewebtown.com ... mesma. No que se refere à bibliografia optamos por separar os escritos que foram ... e coordenação pedagógica das unidades escolares; ...

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[CITAÇÃO] Criança e paz M Teresa, M do Carmo, M Elisabete, A Coelho Artigos relacionados - Pesquisa na web

[DOC] ►Pós-graduação CG DE - nead.unit.br ... COORDENAÇÃO GERAL DE ... Bibliografia. ... 9 - MORAN, José Manuel, MASETTO, Marcos T. & BEHRENS, Marilda Aparecida - Novas tecnologias e mediação Pedagógica. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

[DOC] ►Temas contemporâneos em educação P PEDAGÓGICA - redebrasil.tv.br ... Consta também uma bibliografia geral sobre violência sexual doméstica e exploração ... Supervisora Pedagógica. ... Coordenação de Utilização e Avaliação. ... Artigos relacionados - Ver em HTML - Pesquisa na web

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GARCIA, C. M. Formação de Professores – Para uma mudança Educativa. Porto: Porto, 1999. LEITE, E. E., MALPIQUE, M. Espaços de Criatividade. Porto: Porto, 1986. MARQUES, R. (1991). A Participação dos Pais na Vida da Escola. Escola Cultural, nº 1, vol.1 16-20. NÓVOA, A. Para uma análise das instituições escolares. In Nóvoa, A.( coord. ). As organizações escolares em análise. Lisboa: D. Quixote, 1992. PERRENOUD, PH. Práticas Pedagógicas, Profissão Docente e Formação de Professores – Sociológicas. I.I.E., Public. Lisboa:. D. Quixote, 1993. PERRENOUD, PH. Dez Novas Competências para Ensinar. Porto Alegre: Artmed, 2000. ROLDÃO, M. C. Gestão curricular - Fundamentos e Práticas. Lisboa: DEB, 1999. ROLDÃO, M. C. Gestão do currículo e avaliação de competências - as questões dos professores. Lisboa: Presença, 2003. STIÉVENART, M. (1989). L’emergence d’une notion:: Le Partenariat socio-educatif. Les Sciences de l‟Éducation. 5, 35-50. VALENTE, B. Por uma Escola Projecto. Lisboa: Livros Horizonte, 1988. ZABALZA, A. Do currículo ao projecto. In CANÁRIO, R. (org.) Inovação e projecto educativo de escola. Lisboa: Educa, 1992.

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ORIENTAÇÕES PARA BUSCA DE ARTIGOS CIENTÍFICOS NO SCIELO

Após a escolha do tema do TCC, pertinente ao seu curso de Pós-graduação,

você deverá fazer a busca por artigos científicos da área, em sites especializados,

para a redação do seu próprio artigo científico. O suporte bibliográfico se faz

necessário porque toda informação fornecida no seu artigo deverá ser retirada de

outras obras já publicadas anteriormente. Para isso, deve-se observar os tipos de

citações (indiretas e diretas) descritas nesta apostila e a maneira como elas devem

ser indicadas no seu texto.

Lembre-se que os artigos que devem ser consultados são artigos científicos,

publicados em revistas científicas. Sendo assim, as consultas em revistas de ampla

circulação (compradas em bancas) não são permitidas, mesmo se ela estiver

relatando resultados de estudos publicados como artigos científicos sobre aquele

assunto. Revistas como: Veja, Isto é, Época, etc., são meios de comunicação

jornalísticos e não científicos.

Os artigos científicos são publicados em revistas que circulam apenas no

meio acadêmico (Instituições de Ensino Superior). Essas revistas são denominadas

periódicos. Cada periódico têm sua circulação própria, isto é, alguns são publicados

impressos mensalmente, outros trimestralmente e assim por diante. Alguns

periódicos também podem ser encontrados facilmente na internet e os artigos neles

contidos estão disponíveis para consulta e/ou download.

Os principais sites de buscas por artigos são, entre outros:

SciELO: www.scielo.org

Periódicos Capes: www.periodicos.capes.gov.br

Bireme: www.bireme.br

PubMed: www.pubmed.com.br

A seguir, temos um exemplo de busca por artigos no site do SciELO.

Lembrando que em todos os sites, embora eles sejam diferentes, o método de

busca não difere muito. Deve-se ter em mente o assunto e as palavras-chave que o

levarão à procura pelos artigos. Bons estudos!

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Siga os passos indicados:

Para iniciar sua pesquisa, digite o site do SciELO no campo endereço da

internet e, depois de aberta a página, observe os principais pontos de pesquisa: por

artigos; por periódicos e periódicos por assunto (marcações em círculo).

Ao optar pela pesquisa por artigos, no campo método (indicado abaixo),

escolha se a busca será feita por palavra-chave, por palavras próximas à forma que

você escreveu, pelo site Google Acadêmico ou por relevância das palavras.

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Em seguida, deve-se escolher onde será feita a procura e quais as palavras-

chave deverão ser procuradas, de acordo com assunto do seu TCC (não utilizar “e”,

“ou”, “de”, “a”, pois ele procurará por estas palavras também). Clicar em pesquisar.

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Lembre-se de que as palavras-chave dirigirão a pesquisa, portanto, escolha-

as com atenção. Várias podem ser testadas. Quanto mais próximas ao tema

escolhido, mais refinada será sua busca. Por exemplo, se o tema escolhido for

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relacionado à degradação ambiental na cidade de Ipatinga, as palavras-chave

poderiam ser: degradação; ambiental; Ipatinga. Ou algo mais detalhado. Se nada

aparecer, tente outras palavras.

Isso feito, uma nova página aparecerá, com os resultados da pesquisa para

aquelas palavras que você forneceu. Observe o número de referências às palavras

fornecidas e o número de páginas em que elas se encontram (indicado abaixo).

A seguir, estará a lista com os títulos dos artigos encontrados, onde constam:

nome dos autores (Sobrenome, nome), título, nome do periódico, ano de publicação,

volume, número, páginas e número de indexação. Logo abaixo, têm-se as opções

de visualização do resumo do artigo em português/inglês e do artigo na íntegra, em

português. Avalie os títulos e leia o resumo primeiro, para ver se vale à pena ler todo

o artigo.

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Ao abrir o resumo, tem-se o nome dos autores bem evidente, no início da

página (indicado abaixo). No final, tem-se, ainda, a opção de obter o arquivo do

artigo em PDF, que é um tipo de arquivo compactado e, por isso, mais leve, Caso

queria, você pode fazer download e salvá-lo em seu computador.

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Busca por periódicos

Caso você já possua a referência de um artigo e quer achá-lo em um

periódico, deve-se procurar na lista de periódicos, digitando-se o nome ou

procurando na lista, por ordem alfabética ou assunto. Em seguida, é só procurar

pelo autor, ano de publicação, volume e/ou número.

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É preciso ressaltar que você deve apenas consultar as bases de dados e os

artigos, sendo proibida a cópia de trechos, sem a devida indicação do nome do

autor do texto original (ver na apostila tipos de citação) e/ou o texto na íntegra.

Tais atitudes podem ser facilmente verificadas por nossos professores, que

farão a correção do artigo.