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CAMILA DA SILVA MARQUES DISFUNÇÃO COGNITIVA NO PÓS-OPERATÓRIO Trabalho de Conclusão de Curso, como requisito parcial para término da Residência Médica em Anestesiologia, no Hospital Geral de Fortaleza. Orientador: Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes FORTALEZA 2016

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CAMILA DA SILVA MARQUES

DISFUNÇÃO COGNITIVA NO PÓS-OPERATÓRIO

Trabalho de Conclusão de Curso,

como requisito parcial para término

da Residência Médica em

Anestesiologia, no Hospital Geral de

Fortaleza.

Orientador: Prof. Dr. Rogean

Rodrigues Nunes

FORTALEZA

2016

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CAMILA DA SILVA MARQUES

DISFUNÇÃO COGNITIVA NO PÓS-OPERATÓRIO

Trabalho de Conclusão de Curso,

como requisito parcial para término

da Residência Médica em

Anestesiologia, no Hospital Geral de

Fortaleza.

Aprovada em ____/____/______

BANCADA EXAMINADORA

_______________________________________

Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes (Orientador)

Corresponsável CET Hospital Geral de Fortaleza

_______________________________________

Profª. Drª. Sara Lúcia Ferreira Cavalcante

Corresponsável CET Hospital Geral de Fortaleza

_______________________________________

Dr.a Cristiane Gurgel Lopes Faria

Corresponsável CET Hospital Geral de Fortaleza

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A Deus.

AGRADECIMENTOS

A Dr.aAglais Gonçalves da Silva Leite, pela coordenação e dedicação ao serviço

de anestesiologia do Hospital Geral de Fortaleza.

Ao Prof. Dr. Rogean Rodrigues Nunes, orientador desta monografia, pelas

orientações profissionais, acadêmicas e pela competência.

À Drª. Sara Lúcia Ferreira Cavalcante e à Dr.a Cristiane Gurgel Lopes Farias,

também orientadoras desta monografia, pelo empenho, paciência, dedicação e

sabedoria ao repassar seus conhecimentos aos seus residentes.

A todos os preceptores em anestesiologia dos seis hospitais do Estado (HGF,

HGWA, HGCC, HIAS, HM e ICC) que com paciência e confiança contribuíram

com ensinamentos fundamentais para minha formação.

Aos meus pais, por todo o apoio concedido e por ser o alicerce da minha

formação e conduta.

Ao meu esposo Rafael pelo apoio em tudo que eu faço, pelo companheirismo e

carinho diário e pela compreensão nos meus períodos de ausência.

Aos meus colegas de residência pela amizade, carinho e agradável convívio

nesses três anos.

A todos os pacientes que confiaram suas vidas aos nossos cuidados.

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RESUMO

Aproximadamente um quarto de um bilhão de pessoas se submetem a cirurgias

todos os anos, com expectativa de alívio, cura ou melhora. Um conceito tem

surgido que, apesar dos benefícios da cirurgia, pacientes idosos podem sofrer

injúrias neurológicas decorrentes da cirurgia e anestesia levando a declínio

cognitivo persistente. No entanto, muitos estudos sobre difunção cognitiva no

pós-operatório têm metodologia fraca, incluindo a escassez de grupos-controles

adequados, dissociação de resultados cognitivos e cirúrgicos, técnicas

estatísticas inadequadas, e ausência de um acompanhamento cognitivo

longitudinal no pré-operatório. As causas para essa condição permanecem

desconhecidas, embora existam fatores de risco, sendo o principal fator a idade.

As desordens cognitivas no pós-operatório são associadas com aumento da

mortalidade e incapacidade permanente. Apesar de existirem estudos

promissores em animais em relação a intervenções perioperatórias que possam

reduzir a incidência de distúrbio cognitivo no pós-operatório, não existem ainda

intervenções comprovadas que reduzam a disfunção pós-operatória em

humanos.

Palavras-chave: Disfunção cognitiva. Anestesiologia. Pós-operatório. Idosos,

Cirurgia. Idade.

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ABSTRACT

Approximately a quarter of a billion people undergo surgery every year hoping

that the operation Will alleviate symptoms, cure diseases, and improve quality-

of-life. A concern has arisen that, despite the benefits of surgery, elderly patients

might suffer neurological injury from surgery and anaesthesia leading to

persistent cognitive decline. However, many studies of postoperative cognition

have had methodological weaknesses, including lack of suitable control groups,

dissociation of cognitive outcomes from surgical outcomes, sub-optimal statistical

techniques, and absence of longitudinal preoperative cognitive assessments.

The causes for this condition is largely unknown, although there are risk factors,

the predominant one being age. Postoperative cognitive disorders are associated

with increased mortality and permanent disability. In spite of promising findings

in animal experiments, no intervention reduces postoperative cognitive

dysfunction in humans.

Keywords: Cognitive dysfunction. Anaesthesiology. Postoperative. Elderly.

Surgery. Age.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 7

2 DEFINIÇÃO .................................................................................................................................. 7

3. FISIOPATOLOGIA ....................................................................................................................... 7

4. DIAGNÓSTICO ............................................................................................................................ 9

5. INCIDÊNCIA DCPO ................................................................................................................... 15

6. FATORES DE RISCO PARA DCPO .............................................................................................. 15

6.1 Idade .................................................................................................................................. 15

6.2 Genética ............................................................................................................................ 16

6.3 Escolaridade ...................................................................................................................... 16

6.4 Doenças prévias ................................................................................................................ 17

6.5 Tipos de cirurgia ............................................................................................................ 18

6.5.1 Cirurgias cardíacas ...................................................................................................... 19

6.5.2 O questionamento da circulação extracorpórea (CEC) .............................................. 20

6.6 Embolização ...................................................................................................................... 20

6.7 Hipoxemia ......................................................................................................................... 21

6.8 Hipotensão ........................................................................................................................ 21

7 A RELAÇÃO ENTRE ANESTESIA E DCPO .................................................................................... 22

7.1 Neurotoxicidade anestésica .............................................................................................. 22

7.2 Tipos de anestésicos .......................................................................................................... 23

7.3 Anestesia geral e regional ................................................................................................. 24

7.4 O uso de monitorização da profundidade anestésica ....................................................... 25

8 MELHORA COGNITIVA PÓS-OPERATÓRIA ................................................................................ 26

9 DROGAS NEUROPROTETORAS ................................................................................................. 27

10 TRATAMENTO ......................................................................................................................... 28

11 CONCLUSÃO ........................................................................................................................... 28

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................... 30

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7

1 INTRODUÇÃO

A disfunção cognitiva no pós-operatório (DCPO) é uma complicação pós-

operatória comum associada com significante morbidade e até mortalidade,

principalmente em pacientes idosos. Tem havido um grande interesse e muitas

controvérsias em relação à DCPO; de como é diagnosticada, quanto tempo dura,

e suas implicações precisas para o paciente. Tal fato tem ocorrido em parte pelo

número crescente de artigos publicados sobre esse assunto. O número de

cirurgias realizadas mundialmente se aproxima de 250 milhões por ano, e há um

importante aumento do número de cirurgias realizadas em pacientes idosos.

Portanto, otimizar a função cognitiva pós-operatória assim como prevenir e tratar

a DCPO são questões importantes para a saúde pública.1

2 DEFINIÇÃO

O termo disfunção cognitiva no pós-operatório (DCPO) é definido como uma

desordem sutil dos processos do pensamento que pode influenciar domínios

isolados da cognição, tais como memória verbal, memória visual, compreensão

da linguagem, abstração visoespacial, atenção ou concentração; podendo

persistir por meses ou anos.2 A DCPO é associada com prejuízo na qualidade

de vida, diminuição da capacidade de trabalho e aumento da mortalidade após

a cirurgia. O limiar preciso da deterioração e os domínios afetados são matéria

de discussão. Como a DCPO é muito sutil, só pode ser diagnosticada por testes

neuropsicológicos, que são realizados antes e após a exposição à anestesia. A

disfunção pode ser detectada dias a semanas após a cirurgia e pode também

permanecer como uma desordem definitiva. Diferentemente do delirium, a

DCPO não afeta o nível de consciência e este diagnóstico ainda não consta nas

listas de doenças CID-10 ou DSM-IV.3,4

3. FISIOPATOLOGIA

A cirurgia é associada com ativação da síndrome da resposta inflamatória, e a

liberação de citocinas pode prejudicar a função cerebral. A inflamação sistêmica

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pode causar um prejuízo à cognição, tendo sido documentado em pacientes

cirúrgicos e não cirúrgicos. Estudos têm mostrado uma ligação entre

neuroinflamação e o desenvolvimento de doença de Alzheimer. O trauma da

cirurgia induz uma substancial inflamação aguda através da ativação do sistema

imune natural e da liberação de citocinas proinflamatórias capazes de destruir a

potenciação hipocampal a longo prazo, que tem uma correlação neurobiológica

com a formação de memória e aprendizagem. A inflamação sistêmica

aumentada no período pós-operatório imediato provavelmente contribui para o

delirium pós-operatório ou DCPO precoce, podendo produzir injúria a longo

prazo em pacientes vulneráveis.5,6

Cirurgias cardíacas, ambas com e sem CEC, induzem uma intensa resposta

inflamatória sistêmica que tem sido associada com delirium e DCPO precoce.

Pequenas doses de dextrocetamina parecem reduzir a incidência de delirium e

DCPO após revascularização do miocárdio com CEC, possivelmente devido aos

seus efeitos no sistema inflamatório. A resposta inflamatória sistêmica também

tem sido documentada em cirurgias não cardíacas, como artroplastia, sendo o

aumento dessa resposta associado com altas taxas de delirium pós-operatório.

Em alguns pacientes vulneráveis, como os com síndrome metabólica, a

regulação do processo inflamatório pode ser disfuncional ou os efeitos da função

neuronal podem ser mais profundos podendo levar a um declínio cognitivo

tardio.4,6

Estudos clínicos em andamento têm começado a revelar um papel importante

de biomarcadores inflamatórios no liquor cefalorraquidiano e sangue.1 Um

estudo recente em animais também sugeriu que déficits de memória no pós-

operatório podem ser devido a indução pela anestesia da subunidade alfa-5 que

compõe os receptores GABA-A (ácido-gama-aminobutírico) no hipocampo.

Essas subunidades dos receptores GABA inibem a potenciação a longo prazo.

Desse modo, a ativação desses receptores pode estar relacionada com déficits

de memória e de aprendizado, podendo exercer um papel importante no DCPO

e/ou delirium pós-operatório.5 No entanto, permanece incerto quais achados em

estudos em animais podemos extrapolar para humanos.1

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9

Outros estudos em humanos não têm mostrado uma associação entre a

presença ou níveis de mediadores centrais inflamatórios e a presença ou

duração de DCPO, entretanto, um estudo recente relatou que altos níveis no

plasma de “coceptin” (um peptídeo liberado junto com a vasopressina pelo

hipotálamo) foi associado com delirium e DCPO.7 Um recente estudo piloto

também encontrou uma associação entre a extensão de danos preexistentes na

substância branca cerebral (mensurada pela ressonância magnética) e déficits

na função executiva no pós-operatório em pacientes que se submeteram a

artroplastia de joelho.8 Estudos de neuroimagem também têm mostrado que a

cirurgia cardíaca em particular é associada com o aumento de infartos

silenciosos ou hipersinais na substância branca vistos na ressonância

magnética, entretanto o dano total na substância branca após a cirurgia não foi

correlacionado com a presença de DCPO.9 Logo, são necessários futuros

estudos para elucidar a fisiopatologia do DCPO.

4. DIAGNÓSTICO

Os testes neuropsicológicos para DCPO normalmente incluem exames que

avaliam múltiplos domínios cognitivos. Tais testes individuais são agrupados de

acordo com o domínio cognitivo avaliado. Dependendo do estudo, qualquer um

dos quatro a oito domínios cognitivos têm sido usados, comparando os

resultados pré e pós-operatórios. O teste mais usado, Mini-Exame do Estado

Mental (MEEM) também pode detectar alterações cognitivas ao longo dos

estudos destes pacientes. Os testes são aplicados antes e após os efeitos

agudos do procedimento anestésico-cirúrgico, ou seja, pelo menos uma semana

após a cirurgia. Um limiar normalmente é definido tanto para uma queda no

desempenho cognitivo global (a média dos escores dos domínios cognitivos

individuais) ou para uma queda no desempenho em um único domínio cognitivo.

Pacientes com pontuação abaixo do limiar pré-definido são então diagnosticados

como DCPO. Não existe consenso claro sobre qual deve ser a pontuação de

corte/limiar para definir DCPO. Também não há um consenso em como

classificar pacientes que apresentam uma queda na pontuação abaixo do corte

em um domínio cognitivo específico, mas que apresentam uma melhora

cognitiva em outros domínios. Tais pacientes podem até apresentar uma

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melhora global no seu índice cognitivo, embora possam preencher critério para

o diagnóstico de DCPO.1

A maioria dos pacientes geralmente tende a melhorar o seu desempenho nos

testes através da repetição destes nas consultas. Isto ocorre devido ao aumento

da familiaridade com tais testes denominado efeito de aprendizagem ou de

prática, o que torna uma queda no desempenho ainda mais surpreendente. No

entanto, isto também faz com que seja difícil determinar o nível real da queda do

desempenho no pós-operatório, pois o desempenho observado no pós-

operatório pode assim refletir um déficit cognitivo no pós-operatório que, ao

mesmo tempo, pode ser mascarado por melhorias no desempenho relacionadas

ao efeito de prática. Os efeitos de prática podem ser amenizados usando testes

cognitivos com formas alternativas equivalentes, de modo que uma forma é

usada no teste pré-cirúrgico e formas alternativas são usadas na avaliação pós-

operatória subsequente.1,10

Além dos efeitos de prática, cada teste cognitivo, tem sua própria variabilidade

teste-reteste, que pode afetar a interpretação de qualquer mudança cognitiva

pós-operatória. Portanto, atualmente não há um consenso entre os

neuropsicólogos sobre o método estatístico e/ou limiar que deve ser usado e

sobre quantos domínios cognitivos devem apresentar um declínio para o

diagnóstico de DCPO.1,10

Segue abaixo os domínios cognitivos avaliados e os vários testes

neuropsicológicos usados com as suas descrições, assim como a sua relação

com as diferentes regiões do cérebro envolvidas:

a. Domínio cognitivo: global

a.1 Componente cognitivo: múltiplo

- Teste: “Montreal Cognitive Assessment (MoCA)”

- Descrição: Breve avaliação de múltiplos domínios cognitivos, incluindo

memória e orientação.1

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- Região cerebral envolvida na tarefa: múltiplas.

b. Domínio cognitivo: função executiva

b.1 Componente cognitivo: atenção simples e complexa

- Teste: subteste do “Wechsler Adult Intelligence Scale – 3rd Revision

(WAIS-III)”

- Descrição: simples tarefa de atenção auditivo-verbal, em que o paciente

é convidado a repetir uma série de dígitos, que aumentam durante o

período total que o teste progride.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: córtex pré-frontal dorsolateral direito.

b.2 Componente cognitivo: inibição de resposta

- Teste: teste das palavras coloridas

- Descrição: Uma série de palavras coloridas, mas com nomes de cores

diferentes das que elas são pintadas (por exemplo, a palavra azul pintada

em tinta vermelha) são apresentadas aos participantes, que são

solicitados a dizer a cor da tinta da serie de palavras. Há uma tendência

natural em dizer a palavra impressa em vez da cor da tinta.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: córtex cingulado anterior, giro inferior

frontal direito e cerebelo.

b.3 Componente cognitivo: flexibilidade mental

- Teste: “Trail Making A & B Test”

- Descrição: O “trail making A” apresenta uma série de círculos numerados

distribuídos em um pedaço de papel e requer que o participante conecte

tais círculos em ordem crescente, enquanto o “trail making B” tem letras

do alfabeto e círculos numerados que devem ser conectados em ordem

crescente (ex: 1A, 2B, 3C). O trail making A e B devem ser feitos em

sucessão imediata.1

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- Região cerebral envolvida na tarefa: lobo temporal medial, córtex frontal

medial e dorsolateral esquerdo.

b.4 Componente cognitivo: fluência verbal

- Teste: “Controlled Oral Word Association Test (COWA)”

- Descrição: Os participantes são solicitados a dizer o máximo de palavras

que comecem com uma consoante em particular em 1 minuto, e são

dadas 3 consoantes diferentes (ex: C, F, L). Os pacientes são orientados

a não usar nomes próprios ou a mesma palavra com terminações

diferentes (ex: comer, correr).1

- Região cerebral envolvida na tarefa: Parte posterior do córtex pré-frontal

inferior a esquerda.

c. Domínio cognitivo: aprendizado e memória

c.1 Componente cognitivo: aprendizado auditivo-visual e memória

- Teste: “Hopkins Verbal Learning Test, Revised (HVLT-R)”

- Descrição: São apresentadas verbalmente 12 palavras relacionadas em

uma mesma categoria. Os participantes são solicitados a memorizar

essas palavras em uma serie de três apresentações repetidas, e após 25

minutos, os participantes são solicitados a repetir as palavras

memorizadas.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: Cortex pré-frontal ventrolateral

esquerdo

c.2 Componente cognitivo: Aprendizado visual e memória

- Teste: “Brief Visuospatial Learning Test, Revised”

- Descrição: Seis figuras são apresentadas em uma folha grande e é

permitido aos participantes um breve período para estudar as figuras. Eles

são então solicitados a reproduzir as mesmas em suas localizações

adequadas por três vezes. Após 25 minutos, os participantes são

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novamente solicitados a reproduzir as figuras em suas localizações

adequadas.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: córtex pré-frontal ventrolateral

esquerdo.

d. Domínio cognitivo: função visoespacial

d.1 Componente cognitivo: Integração visual e motora

- Teste: “Digit Symbol Coding Test from the Weschsler Adult Intelligence

Scale-3rd Revision (WAIS-III)”

- Descrição: Os participantes devem usar uma tabela com números e

símbolos no topo de uma página impressa como um guia para determinar

quais símbolos estão faltando ao lado de uma grande variedade de

números. A tarefa é cronometrada e a pontuação obtida é baseada no

número total de pares corretos de símbolos/números completos em 120

segundos.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: Corpo caloso, cápsula interna, giro

anterior singulado, giro esquerdo pré-frontal, e lobo parietal inferior.

d.2 Componente cognitivo: percepção visoespacial complexa

- Teste: “Hooper Visual Organizational Test (HVOT)”

- Descrição: Envolve a integração e nomeação de objetos comuns

apresentados dispersos espacialmente como um “quebra-cabeça”.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: Lobo parietal superior, córtex

temporo-occipital, área posterior de associação visual, campo visual

frontal, córtex pré-frontal dorsolateral esquerdo.1

e. Domínio: função psicomotora

e.1 Componente cognitivo: Dextreza manual e velocidade motora

- Teste: “Lafayette Grooved Pegboard Test”

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- Descrição: Envolve a inserção de pequenos pinos em “buracos”

aleatórios. Cada mão é avaliada separadamente com uma pontuação

refletindo o tempo total para a inserção de todos os 25 pinos por cada

mão.1

- Região cerebral envolvida na tarefa: Função nigroestriatal dopaminérgica.

Da mesma forma que não há um consenso sobre como o diagnóstico de DCPO

é definido, também é incerto quanto tempo este distúrbio pode durar. A DCPO

dura até três meses em mais de 10% dos pacientes idosos. De fato, estudos

revelam que a DCPO precoce afeta todas as faixas etárias, mas se resolve mais

rápido em indivíduos mais jovens.1,6

A definição de DCPO persistente, arbitrariamente definida como uma DCPO que

dura mais de seis meses, tem sido questionada baseada na revisão de literatura.

Alguns estudos de coorte têm se atentado a avaliar grupos controles para

comparação, mas tais estudos são não randomizados e assim potencialmente

confundidos pelo fato de que os pacientes cirúrgicos podem ser intrinsecamente

diferentes dos controles não cirúrgicos. Uma revisão de estudos publicada em

2007 que avaliam pacientes submetidos a cirurgias não cardíacas comparados

ao grupo controle não mostrou diferenças em relação ao declínio cognitivo entre

os grupos após seis meses.11 Similarmente, uma revisão subsequente de

estudos envolvendo cirurgias cardíacas e não cardíacas confirmam que,

comparando a grupos controles não cirúrgicos, a DCPO persistente geralmente

não ocorre. Um estudo recente que avaliou 192 pacientes cirúrgicos e um grupo

controle pareado por idade (n=138), tem contestado esta conclusão. Após a

correção para o efeito de aprendizado no grupo controle, os investigadores

concluíram que 11,2% dos pacientes cirúrgicos comparados com 3,8% dos

pacientes do grupo controle apresentaram declínio cognitivo em um ano.12 Além

disso, dois grandes estudos mostraram que pacientes submetidos à cirurgia e

anestesia apresentam risco aumentado de desenvolver demência anos

depois.13,14 Tais estudos sugerem que talvez exista um subgrupo de pacientes

vulneráveis que se encontram em risco para DCPO persistente.11-14

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Logo, a maioria dos casos de DCPO se resolve dentro de meses após cirurgias

cardíacas e não cardíacas, embora seja impossível prever quanto tempo cada

caso individual de DCPO irá durar. É importante enfatizar que a DCPO tem mais

do que uma causa subjacente, e se esta se desenvolve, o curso e prognóstico

irá depender da sua causa.1,6

5. INCIDÊNCIA DCPO

Kotekar et al, em um estudo prospectivo que avaliou a disfunção cognitiva pós-

operatória em um total de 200 pacientes idosos, mostrou uma incidência de 12%

no terceiro dia, 8% no sétimo dia e 7,5% no trigésimo dia.3 Similarmente, o maior

estudo realizado que avaliou mais de 1200 pacientes com mais de 60 anos de

idade denominado “International Study of Post-operative Cognitive Dysfunction

1” (ISPOCD 1) estimou uma incidência geral de DCPO de 25,8% em uma

semana e 9,9% após três meses.15 A incidência de DCPO após três meses foi

de 7% em pacientes com 60-69 anos e 14% em pacientes com mais de 69 anos.

O seguimento desses pacientes afetados mostrou que a incidência de problemas

cognitivos finalmente caiu em direção aos níveis encontrados em grupos

controles pareados, mas aproximadamente 1% apresentou DCPO não resolvida

por mais de dois anos após a cirurgia. Os pacientes mais idosos avaliados neste

estudo apresentaram uma alta incidência de DCPO; aproximadamente um em

cada três pacientes em um grupo relativamente pequeno de pacientes com 80

anos apresentaram DCPO.15 Deste modo fica claro que a idade é um fator de

risco para DCPO.15,16

6. FATORES DE RISCO PARA DCPO

6.1 Idade

O aumento da idade tem sido associado com o aumento do risco de DCPO em

uma semana e em três meses, gerando uma hipótese de que este fato é

atribuído a uma diminuição da reserva cognitiva em pacientes mais idosos. No

entanto, não está claro até que ponto o controle inadequado de comorbidades e

a trajetória cognitiva pré-operatória tem levado a idade a ser identificada como

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um fator de risco independente.6 Enquanto disfunção cognitiva precoce foi

associada com múltiplas comorbidades, o fator de risco predominante para o

declínio cognitivo prolongado foi a idade avançada.17

O mecanismo base para a associação da DCPO com cirurgia, anestesia, ou

ambos em pacientes idosos permanece incerto, mas pode refletir respostas

alteradas a drogas, perda da reserva funcional, ou efeito cumulativo de doenças

crônicas ao longo do tempo. Com o aumento da idade, as taxas de neurogênese

e simpatogênese diminuem, o número total de neurônios diminui, e os

subprodutos potencialmente tóxicos se acumulam. Estes processos levam a

uma gradual perda da reserva, aumento da vulnerabilidade do cérebro a insultos,

incluindo a exposição ao estresse perioperatório.17

Em relação a cirurgia cardíaca, acredita-se que o mecanismo pelo qual a idade

estaria relacionada a DCPO seria aterosclerose progressiva associada a doença

cerebrovascular oculta e fatores intrinsecamente relacionados ao risco de

embolização. Além disso, indivíduos mais idosos são predispostos a apresentar

alteração da vasculatura e da auto-regulação do fluxo cerebral.18

6.2 Genética

Indivíduos com o alelo apoliproteina Ɛ4 são conhecidos por terem piores

resultados cognitivos e neurológicos após lesão cerebral e acidente vascular

cerebral e por terem um maior risco para doença de Alzheimer. Tal genótipo foi

investigado em estudos, no entanto, não foi visto associação entre o gene

apoliproteina Ɛ4 e DCPO. Isto não exclui a possibilidade de propensão genética

para DCPO, mas sugere que outros genes candidatos devem ser

investigados.10,19

6.3 Escolaridade

A escolaridade é um fator pré-operatório que merece destaque na patogênese

da DCPO. Ainda não se conhece plenamente o modo como um maior grau de

escolaridade implicaria em maior reserva cognitiva, em melhora nas habilidades

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às avaliações ou em um aumento na homeostase neuronal, situações que

tornariam os pacientes mais resistentes ao insulto neurológico. Uma hipótese

que explicaria essa associação está baseada no fato de que a escolaridade

aumenta a densidade sináptica no neocórtex, aumentando a comunicação

neuronal e minimizando os sinais de comprometimento cognitivo e funcional.18

Monk et al em um estudo prospectivo que avaliou 1064 pacientes submetidos a

cirurgias não-cardíacas concluiu que baixo nível educacional foi associado com

maior incidência de declínio cognitivo20, como previamente encontrado no estudo

ISPODC 115, assim como um estudo mais recente realizado por Kotekar et al

encontraram resultados semelhantes.3

6.4 Doenças prévias

A maioria dos estudos sobre DCPO são relacionados a cirurgias cardíacas e,

consequentemente, as amostras de pacientes estudados tendem a apresentar

doenças cardíacas. Embora não haja estudos definitivos, tais pacientes

provavelmente tendem a apresentar doenças cerebrovasculares em menor ou

em maior extensão devido ao fato de que doença vascular é uma doença

sistêmica. Dentro dos estudos envolvendo cirurgias não cardíacas, os pacientes

geralmente são idosos, e nós sabemos que a prevalência de doenças vasculares

nesse grupo também é alta.21

Em uma metanálise foi visto que existe uma associação entre fatores de risco

para doença cardiovascular, como idade, diabetes, hipertensão, obesidade,

eventos vasculares prévios, doenças vasculares periféricas e em carótidas, e

DCPO.21

É aparente que muitos indivíduos submetidos a cirurgias cardíacas e mesmo

indivíduos idosos submetidos a cirurgias não cardíacas podem já apresentar

algum declínio cognitivo decorrente de doença cerebrovascular. Tem sido

identificado um declínio cognitivo prévio em 35 a 45% dos pacientes submetidos

a cirurgias cardíacas. No entanto, a contribuição desse distúrbio cognitivo

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18

preexistente para um subsequente declínio após a anestesia e cirurgia não tem

sido fácil de identificar.21

A influência de doenças vasculares prévias como fator de risco mais importante

que a CEC é reforçada por uma comparação da cognição de pacientes que se

submeteram a cirurgia cardíaca e intervenção percutânea para o tratamento de

doença arterial coronariana. A avaliação da cognição após seis e 12 meses da

cirurgia não mostrou diferença entre os grupos.22

Além disso, estudos comparando pacientes submetidos a cirurgias cardíacas

com pacientes não cirúrgicos do grupo controle com ou sem doenças vasculares,

sugeriram que a doença vascular de base, e não a cirurgia foi o fator relevante.

Não houve diferença na taxa de declínio cognitivo em pacientes com doença

vascular que se submeteram a cirurgia cardíaca e aqueles que não foram

tratados cirurgicamente, no entanto, o grupo controle sem doença vascular não

apresentou a mesma taxa de declínio cognitivo. Logo, os investigadores

sugeriram que doença vascular generalizada talvez seja um fator de risco mais

forte para DCPO do que cirurgia coronariana.6,23

Em relação ao diabetes mellitus (DM) em pacientes submetidos a cirurgias

cardíacas, um possível mecanismo que explicaria essa associação seria o fato

de que indivíduos diabéticos possuem uma auto-regulação do fluxo cerebral

comprometida, caracterizada por maior extração do oxigênio durante a CEC e,

consequentemente, menor disponibilidade para o cérebro. Da mesma forma,

HAS e a terapia anti-hipertensiva também podem se relacionar a desfechos

cognitivos, reflexo da auto-regulação comprometida do fluxo sanguíneo cerebral,

enrijecimento das pequenas artérias cerebrais e da doença aterosclerótica

generalizada presente em indivíduos hipertensos.18

6.5 Tipos de cirurgia

Canet et al concluíram que a incidência de DCPO sete dias após a cirurgia foi

significantemente menor após cirurgia de pequeno porte (6,8%) do que após

cirurgia de maior porte (25,8%). Após três meses, não foram vistas diferenças

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significativas entre os dois grupos. Fatores como duração da anestesia, trauma

cirúrgico, estresse pós-operatório, hospitalização, dor pós-operatória e

analgésicos foram implicados para justificar a diferença nas taxas de DCPO

entre cirurgias menores e maiores.24 No estudo ISPOCD 1, a duração da

anestesia foi um risco significante para DCPO após sete dias da cirurgia.15 A

incidência foi 18% quando a duração foi menor que duas horas e 27% quando a

duração foi mais longa.15 No entanto, kotekar et al não encontraram relação entre

o tempo anestésico-cirúrgico e a incidência de DCPO.3

Um estudo prospectivo realizado por Evered et al, que avaliou 644 pacientes,

concluiu que a incidência de DCPO após sete dias foi maior em pacientes

submetidos à revascularização do miocárdio do que artroplastia total de quadril,

mas, após três meses, tal incidência foi independente do tipo de procedimento

quando comparou cateterismo cardíaco, artroplastia total de quadril e

revascularização do miocárdio. De maneira surpreendente, a presença de

história de doença cardiovascular, fatores de risco ou tratamento para tal doença

não foi associada com DCPO.25

Estudos recentes frequentemente têm falhado em detectar qualquer distúrbio

cognitivo após cirurgia não cardíaca, particularmente quando usam os mesmos

métodos usados em estudos com cirurgias cardíacas. Estudos subsequentes

têm identificado fatores associados com DCPO, que além da idade incluem o

baixo nível de educação, como descrito acima, e complicações pós-operatórias,

enquanto o tipo de cirurgia tem se tornado menos importante.20,26,27

6.5.1 Cirurgias cardíacas

DCPO é mais frequente após cirurgia cardíaca do que cirurgia não cardíaca e é

associado com a duração da circulação extracorpórea (CEC), cirurgia valvar e

função cardíaca diminuída. A incidência de DCPO após cirurgia cardíaca é 50 a

70% na primeira semana após a cirurgia, 30 a 50% após seis semanas, e 20 a

40% após seis meses a um ano. Esta variabilidade é devida em parte a

problemas de metodologia. Apesar dessa variabilidade, parece existir um

consenso geral de que DCPO após cirurgia cardíaca ocorre em uma proporção

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20

de pacientes. A causa é provavelmente multifatorial, embora o uso de circulação

extracorpórea frequentemente seja implicado.4,10

6.5.2 O questionamento da circulação extracorpórea (CEC)

Existe uma forte percepção de que a cirurgia cardiovascular, especialmente com

circulação extracorpórea (CEC), é causalmente associada com um alto risco de

DCPO. Embora muitos esforços tenham sido feitos para identificar qual

componente da CEC seria responsável pelo DCPO, nenhum componente

específico pôde ser identificado. Hogue et al. defenderam o uso de filtros na linha

arterial e membranas nos oxigenadores para a diminuição da formação de

êmbolos, considerando que os microêmbolos formados na CEC estariam

associados a DCPO, mas afirmam que há pouca evidência para muitos aspectos

do atual manejo da CEC.28 A CEC foi excluída como causa de DCPO em 2002

quando, em um estudo prospectivo bem desenhado randomizado controlado,

Van Dijk et al mostraram que a incidência de DCPO em 3 e 12 meses não foi

diferente entre pacientes que se submeteram a cirurgias com e sem CEC.29 Além

disso, uma metanálise recente de estudos clínicos que randomizaram pacientes

submetidos a cirurgias cardíacas com ou sem CEC, não encontraram diferença

na trajetória cognitiva entre os grupos.30 Logo, parece que a CEC foi

injustamente vista como uma causa de DCPO e que essa convicção foi

derrubada.21

6.6 Embolização

Embora muitas das propriedades da CEC tenham sido excluídas como fatores

causais do DCPO, microêmbolos têm permanecido sob consideração como

potencial causa. Tal fato deriva da quase mandatória formação de microêmbolos

durante a CEC, que podem ser tanto partículas sólidas derivadas de placas

ateroscleróticas ou células inflamatórias agregadas, ou microêmbolos gasosos

originados durante a propulsão de sangue. Tal fato se confirma pelo fato de que

alterações estruturais em exames de ressonância magnética (RNM) vistas após

cirurgias com CEC não foram vistas em pacientes que se submeteram a cirurgias

sem CEC.21 No entanto, uma revisão sistemática foi incapaz de concluir qualquer

relação entre microêmbolos formados e DCPO.31 Em um estudo chinês,

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21

comparando cirurgias com CEC e sem CEC, as cirurgias sem CEC notavelmente

diminuíram o número de microêmbolos detectados; no entanto a incidência de

DCPO não foi alterada após três meses e não houve associação entre êmbolos

e DCPO.32

Em outras cirurgias, como artroplastia de joelho, um procedimento comum

realizado em idosos, microêmbolos em formas sólidas e gasosas são quase

rotineiramente detectados. Dois estudos em cirurgias ortopédicas (com 24 e 37

pacientes) investigaram uma associação entre microêmbolos e desempenho

cognitivo e não encontraram associação. Logo, tem sido difícil determinar se

embolização cerebral é uma das causas.4,33,34

6.7 Hipoxemia

Hipoxemia severa causa danos ao cérebro. Logo, hipóxia moderada no pós-

operatório pode contribuir para disfunção cognitiva, mas os resultados tem sido

inconsistentes. Um ou mais episódios de saturação de oxigênio abaixo de 80%

por pelo menos dois minutos, dentro dos primeiros três dias no pós-operatório,

não foi associado com disfunção cognitiva em um estudo, enquanto outro estudo

mostrou correlação entre hipoxemia cinco dias após a cirurgia e disfunção

cognitiva.4,15,35

6.8 Hipotensão

Hipotensão intra-operatória, como um indicador de hipoperfusão, tem sido

frequentemente visto como uma causa para deterioração cognitiva pós-

operatória. Um ou mais episódios de 30 minutos de pressão arterial média menor

que 60% da pressão arterial basal pré-operatória não foi associada com DCPO

em dois estudos, totalizando mais de 1000 pacientes.¹¹ No entanto, um estudo

com somente 45 pacientes submetidos a cirurgia espinhal mostrou uma

associação entre hipotensão intra-operatória e DCPO em um subgrupo de

pacientes com hipertensão pré-operatória.4,36

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22

7 A RELAÇÃO ENTRE ANESTESIA E DCPO

7.1 Neurotoxicidade anestésica

Neurotoxicidade é definida como uma alteração estrutural ou funcional no

sistema nervoso que resulta da exposição a um agente físico, biológico ou

químico. O cérebro é especialmente vulnerável aos efeitos das neurotoxinas nos

extremos de idade.37 Anestesia geral altera o cérebro de animais, principalmente

com uma idade muito baixa. Inúmeros estudos tem mostrado uma associação

entre anestesia em crianças e subsequentes desordens cognitivas, problemas

de aprendizado e deficiência comportamental. No entanto, essa associação não

prova o nexo de causalidade. É possível que o desenvolvimento de déficit

cognitivo seja decorrente de doenças que precipitaram a cirurgia, ou fatores que

predispõem a anormalidades no desenvolvimento e a doença cirúrgica.4

Existem evidências de que os anestésicos inalatórios podem aumentar o risco

de desenvolver DCPO. Experimentos em animais sugerem que os anestésicos

inalatórios podem alterar a função cognitiva através do acúmulo de amiloide β,

alteração na neurotransmissão, alterações sinápticas e na homeostase do

cálcio. No entanto, estudos clínicos permanecem contraditórios sobre a

relevância desses estudos em laboratórios para a população pediátrica. Além

disso, estudos clínicos relatados avaliando a incidência de DCPO em adultos e

anestésicos inalatórios falharam em mostrar uma associação.38

No outro extremo de idade, é um fato que pacientes idosos apresentam um

aumento do risco de DCPO com um bem reconhecido declínio cognitivo após a

cirurgia. Os mecanismos de base e a contribuição da anestesia, em particular

para DCPO, permanecem indefinidos.38 O aumento da vulnerabilidade levam a

um comprometimento funcional decorrente de insultos neurais como estresse

oxidativo ou exposição a toxinas.37 Modelos laboratoriais sugerem interações

anestésicas com mecanismos neurodegenerativos, como a que ocorre com o

início e progressão da doença de Alzheimer, mas a sua relevância clínica

permanece indefinida. Estudos prospectivos randomizados estão a caminho

para tentar mostrar a relevância desses achados, mas existem grandes

dificuldades no desenho, execução e interpretação desses estudos.38

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23

O estudo de efeitos neurotóxicos em humanos é limitado por vários fatores,

incluindo a dificuldade em obter tecido para estudo histopatológico e os efeitos

que confundem da cirurgia e doenças associadas. Para dificultar ainda mais, os

anestésicos podem ter efeitos neuroprotetores dependendo da droga, dose e

duração da exposição.37

Existem inúmeras razões para o atraso na valorização da potencial associação

entre os anestésicos e a neurodegeneração, incluindo a progressão natural lenta

da doença neurodegenerativa, acompanhamento limitado por cirurgiões e

anestesiologistas, presença de fatores confundidores, como uma doença que

coincide, e o estigma social da doença.37

7.2 Tipos de anestésicos

Numerosos estudos têm estudado se drogas anestésicas específicas estão

relacionadas com o aumento de DCPO. Embora estudos em animais tenham

sugerido diferenças na neurotoxicidades entre anestésicos voláteis e agentes

venosos, existe uma escassez de estudos bem executados avaliando esta

questão. 1,38

Um estudo mostrou alta incidência de declínio cognitivo após 1, 2 e 3 dias da

cirurgia dentre 2000 pacientes randomizados para receber inalatórios

comparados com anestésicos venosos, no entanto, não houve diferença entre

os grupos após 10 dias da cirurgia. Em tal estudo, entretanto, não houve como

assegurar a equivalência da profundidade anestésica em ambos os grupos, e os

pacientes do grupo dos inalatórios provavelmente receberam uma sobredose de

inalatórios.39,40 Já alguns estudos sugeriram que anestesia inalatória foi

associada com menos disfunção cognitiva pós-operatória do que anestesia

venosa total.41,42

Tang et al, em um estudo prospectivo randomizado com pacientes idosos já com

algum distúrbio cognitivo antes da cirurgia, foi comparado o uso de sevoflurano

com o uso do propofol durante a cirurgia e não foram vistas diferenças na

incidência de DCPO após 7 dias da cirurgia em ambos os grupos. Tanto o

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24

propofol, como o sevoflurano foram associados com efeitos cognitivos negativos,

mas o sevoflurano teve um impacto maior na gravidade da disfunção cognitiva

do que o propofol.43

Uma metanálise comparando a função cognitiva em pacientes idosos

submetidos à anestesia com desflurano e sevoflurano concluiu que o desflurano

foi associado com uma recuperação mais rápida da anestesia geral, mas não

houve diferença significativa na incidência de DCPO.44 Já em outro estudo

recente foi investigada a qualidade do despertar e a função cognitiva em

pacientes idosos submetidos a cirurgias comparando o uso do sevoflurano com

o do desflurano e foi visto que o grupo dos pacientes que usaram desflurano

apresentou uma significante melhor qualidade do despertar e melhor função

cognitiva mesmo após um longo período de cirurgia.45

Em relação aos benzodiazepínicos, estes medicamentos tem efeito negativo

conhecido na função cognitiva, isto pode estar relacionado ao metabolismo lento

e variável, particularmente do diazepam, que produz vários metabólitos ativos.

No entanto, vários estudos relatam que os benzodiazepínicos não exercem

papel principal na disfunção cognitiva após a anestesia.46,47

7.3 Anestesia geral e regional

Tem sido sugerido que evitar cirurgia geral usando técnicas regionais preservaria

a cognição, particularmente em idosos. Entretanto um estudo recente concluiu

que a incidência de DCPO foi semelhante independente do tipo de cirurgia ou

anestesia.48 Já um estudo prévio relatou um aumento na incidência de DCPO

uma semana após anestesia geral em comparação com anestesia regional,

apesar de que não houve diferença após três meses da cirurgia.49 No entanto,

Silbert et al recentemente não relataram diferença na incidência de disfunção

cognitiva entre pacientes que se submeteram a litotripsia extracorpórea sob

anestesia geral ou anestesia espinhal; houve uma surpreendente tendência do

aumento de DCPO no grupo de pacientes que se submeteram a anestesia

espinhal, sugerindo que anestesia geral por si só não aumenta o risco de

DCPO.50 Tais achados são particularmente difíceis de conciliar com os demais

estudos porque mais de 90% dos pacientes do grupo da anestesia espinhal não

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receberam nenhuma sedação venosa, em contraste com muitos outros estudos

em que os pacientes randomizados para receber anestesia regional também

receberam altas doses de sedação venosa.49 No entanto, o estudo de Silbert et

al 50 foi aproximadamente quatro vezes menor que o estudo de Rasmussen et

al.49 Além disso, os pacientes do grupo da anestesia espinhal eram em média

três anos mais velhos que o grupo da anestesia geral no estudo de Silbert et al.50

Uma metanálise realizada em 2014 não relatou diferença na taxa de disfunção

cognitiva após anestesia regional comparada com anestesia geral, no entanto,

uma séria limitação na interpretação dos resultados dos estudos avaliados nesta

metanálise inclui o uso de uma grande variedade de modalidades de testes para

avaliar a função cognitiva. É possível que muitos desses testes possam não ser

sensíveis o suficiente para detectar mudanças sutis na função cognitiva. Tal fato

combinado com o fator confundidor de adjuntos sedativos frequentemente

usados durante anestesia regional torna difícil comparar especificamente se

existem diferenças entre anestesia geral e somente anestesia regional na

incidência de DCPO.51

7.4 O uso de monitorização da profundidade anestésica

O cérebro do idoso requer menores doses dos agentes anestésicos quando

comparado com o do jovem e tem maior probabilidade de apresentar surto-

supressão no eletroencefalograma. Os monitores cerebrais, como o BIS,

permitem adequar a profundidade anestésica, com ajuste das doses, e

minimizam os efeitos residuais dos fármacos sobre a cognição.2

Há correlação entre anestesia superficial e síndrome do estresse pós-traumático

e entre anestesia profunda e disfunção cognitiva. Vários estudos têm concluído

que evitar uma anestesia muito profunda com o uso de monitorização da

profundidade anestésica pode reduzir a incidência de DCPO.2

Um estudo recente avaliou um grupo de 921 pacientes idosos submetidos a

procedimentos cirúrgicos não cardíacos e concluiu que destes pacientes, o

grupo em que a monitorização da profundidade anestésica foi usada, com a

manutenção dos valores do BIS entre 40 e 60 durante a cirurgia, houve uma

menor incidência de delirium durante a hospitalização inicial e uma menor

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incidência de DCPO após três meses da cirurgia. O uso do BIS também acelerou

a recuperação da anestesia.52 Já em outro estudo, Radtke et al concluíram que

o uso do BIS foi associado com uma menor incidência de delirium, mas não

influenciou na incidência de disfunção cognitiva após 7 dias e três meses da

cirurgia.53

Portanto, fica clara a associação de anestesia profunda com a incidência de

delirium, enquanto a incidência de DCPO precoce não parece estar relacionada

com a quantidade de anestésicos usados, e as evidências são ainda

inconsistentes para a incidência de DCPO após três meses da cirurgia, sendo

necessários mais estudos.52-54

8 MELHORA COGNITIVA PÓS-OPERATÓRIA

Evidências sugerem que existe um potencial para melhora cognitiva no pós-

operatório (MCPO), embora esta hipótese seja controversa. Isto pode ocorrer de

maneira concebível quando a cirurgia promove saúde, aumenta a qualidade de

vida, diminui a inflamação, ou alivia dor. Esta melhoria pode refletir uma melhora

genuína na função cognitiva, ou simplesmente uma reversão ou progressão mais

lenta de um declínio cognitivo no pré-operatório. Em alguns casos, esta melhora

cognitiva pode ser atribuída a algumas cirurgias específicas, por exemplo, a

restauração da perfusão cerebral após endarterectomia de carótida, a remoção

de uma lesão cerebral, ou o tratamento cirúrgico da obesidade e síndrome

metabólica. No entanto, mesmo nestes pacientes, o efeito de prática (tendência

a melhorar o desempenho com a repetição dos testes), pode também contribuir

significativamente para a possibilidade de erro ao se concluir que um indivíduo

apresentou uma melhora cognitiva no pós-operatório.1,6

O uso de múltiplos testes, realizados em diferentes tempos, resulta em uma

grande variabilidade mensurável. No estudo multicêntrico ISPOCD em que foi

investigada a ocorrência de DCPO em pacientes idosos, após cirurgias

abdominais e ortopédicas, foi avaliada também essa variabilidade e descoberta

uma melhora cognitiva em 4,2% a 8,7% dos pacientes após uma semana e em

5,0% a 7,8% após três meses.15 No entanto, nesta mesma população, os

investigadores encontraram uma incidência de DCPO três a seis vezes maior,

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levando a conclusão de que a “melhora” observada reflete uma variabilidade

imprevisível inerente dos testes neuropsicológicos.15 Embora exista um

subgrupo de pacientes com melhora cognitiva após a cirurgia, parece ser uma

população muito menor do que a que apresenta disfunção cognitiva. 6,15

É muito difícil imaginar que os fatores associados com anestesia e cirurgia

(jejum, estresse, anestesia, dano tecidual, perda sanguínea) possam conferir

benefícios cognitivos aos pacientes. No entanto, em uma metanálise avaliando

a função cognitiva antes e após a cirurgia de revascularização miocárdica, foi

vista uma melhora cognitiva evidente em múltiplos testes neuropsicológicos. Os

pacientes revascularizados também mostraram uma melhora física, social e

emocional após seis meses e um ano da cirurgia, incluindo menos ansiedade e

depressão.26 É provável que a melhora cognitiva desses pacientes que

realizaram revascularização miocárdica seja decorrente da melhora geral na

saúde e qualidade de vida, principalmente devido aos sabidos efeitos negativos

da depressão no desempenho cognitivo. Além disso, uma cirurgia bem sucedida,

muitas vezes faz com que os pacientes descontinuem o uso de medicações que

afetam a cognição (medicamentos para dor, insônia ou ansiedade), que eram

usadas antes da cirurgia, e assim, permite que tais pacientes melhorem o seu

funcionamento de modo geral.6 Em linha com essa ideia, mesmo pacientes que

apresentaram DCPO seis semanas após a cirurgia, com o aumento da

habilidade em realizar atividades da vida diária após esse período, apresentaram

uma melhora da cognição após um ano.55

9 DROGAS NEUROPROTETORAS

Algumas drogas parecem ter um efeito neuroprotetor contra DCPO. Um estudo

de revisão avaliou 25 estudos clínicos prévios e mostrou que o uso de

atorvastatina e sulfato de magnésio foram associados com uma menor

incidência de novos déficits neurológicos no pós-operatório. O uso de lidocaína,

cetamina e sulfato de magnésio foram associados com resultados controversos

na relação com DCPO. A disfunção cognitiva não sofreu influencia entre os

pacientes tratados e grupos controles para outras drogas testadas (tiopental,

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propofol, nimodipina, gangliosídeo GM1, lexipafant, glutamato/aspartato,

xenônio, eritropoietina, remacemida, piracetam, rivastigmina, “pegorgotein” e 17-

beta-estradiol). No entanto, as metodologias inconsistentes e fracas, e o

pequeno número de estudos não permitem afirmar conclusões.56

Uma metanálise recente avaliou a associação do uso da dexmedetomidina com

a incidência de DCPO e concluiu que o uso da dexmedetomidina no

perioperatório ou como sedativo em unidade de terapia intensiva foi associado

com baixo risco de DCPO.57 No entanto, mais estudos são necessários para

confirmar tal associação.

10 TRATAMENTO

Existem poucos estudos controlados que avaliam se alguma intervenção pode

tratar ou melhorar DCPO, uma vez que está em curso. É bastante difícil realizar

tais estudos, pois a maioria dos casos se resolve espontaneamente em meses.1

Um estudo randomizado avaliou o uso do inibidor da acetilcolinesterase

donepezil em pacientes que apresentaram DCPO um ano após cirurgia cardíaca.

O donepezil melhorou alguns aspectos do desempenho da memória nestes

pacientes, no entanto, não houve melhora no índice cognitivo total.58

Interessantemente, o antidepressivo e inibidor seletivo da recaptação de

serotonina (ISRS) citalopram foi usado com sucesso no tratamento de DCPO em

um relato de caso.59 Além da serotonina ter um papel na neuroplasticidade,

melhora a qualidade de vida em pacientes depressivos e melhora o humor

mesmo em indivíduos saudáveis não depressivos, o que sugere que os ISRS

podem ser eficazes em reduzir os danos à qualidade de vida associados com

DCPO.59 Mais estudos são necessários para determinar se os ISRS melhoram

a cognição, qualidade de vida e outros resultados em pacientes com DCPO.1

11 CONCLUSÃO

DCPO é uma síndrome que ocorre mais frequentemente em pacientes com 60

anos ou mais, e é associado com a saída precoce do mercado de trabalho,

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diminuição da qualidade de vida e mortalidade prematura. Tipicamente dura por

semanas a meses, embora raros casos possam durar mais.1 Com o aumento da

população idosa se submetendo a procedimentos cirúrgicos, se faz necessário

que haja um melhor entendimento sobre os fatores de risco, etiopatogênese e

diagnóstico do DCPO para o desenvolvimento de estratégias, para a prevenção

e tratamento desta doença, que pode ter consequências devastadoras para esta

população.21

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