diretriz brasileira para o manejo da asma

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  • DIRETRIZES

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

    EDITORES

    Roberto Stirbulov (SBPT)

    Professor Adjunto da FCM da Santa Casa de So Paulo

    Chefe da Disciplina e da Clnica de Pneumologia.

    Luiz Antnio G. Bernd (ASBAI)

    Professor Titular da Disciplina de Imunologia

    Fundao Faculdade Federal de Cincias Mdicas de Porto Alegre.

    Doutor em Imunologia pela UNIFESP-EPM

    Especialista em Alergia e Imunologia Clnica pela ASBAI/AMB - CFM

    Dirceu Sol (SBP)

    Professor Titular e Livre Docente da Disciplina de Alergia,

    Imunologia Clnica e Reumatologia, Depto de Pediatria, UNIFESP-EPM

    Presidente do Departamento de Alergia e Imunologia da SBP

    Vice Presidente da Associao Brasileira de Alergia e Imunopatologia

    Presidente Eleito da Sociedade Latino-Americana de Alergia e Imunopatologia

    MEMBROS PARTICIPANTES

    Alfeu Tavares Frana (ASBAI)

    Professor Associado e Livre-Docente da Faculdade de Medicina da

    UFRJ; Professor da Unidade de Imunopatologia da Faculdade de

    Medicina da FTESM; Chefe do Servio de Alergia do Hospital So

    Zacharias.

    Ana Luiza Godoy Fernandes (SBPT)

    Professora Associada de Pneumologia UNIFESP; Coordenadora do

    Programa de Ps-Graduao em Pneumologia UNIFESP; Membro da

    Comisso de Asma da SBPT

    Antnio Carlos Pastorino (SBP)

    Assistente da Unidade de Alergia e Imunologia do Instituto da

    Criana do HC-FMUSP; Mestre e Doutor em Medicina pela

    Faculdade de Medicina da USP

    Charles K. Naspitz (ASBAI)

    Professor Titular da Disciplina de Alergia, Imunologia Clinica,

    Reumatologia, Depto de Pediatria, UNIFESP

    Dennis Alexander Rabelo Burns (SBP)

    Preceptor de Residncia Mdica em Alergia e Imunologia Peditrica

    Hospital Universitrio de Braslia UnB

    Emanuel S. Cavalcanti Sarinho (SBP)

    Professor Adjunto, Doutor, Disciplina de Pediatria da Universidade

    Federal de Pernambuco; Coordenador Adjunto do Centro de

    Pesquisas em Alergia e Imunologia Clnica da UFPE

    Emilio Pizzichini (SBPT)

    Professor Adjunto e Doutor, Depto de Clnica Mdica do Centro de

    Cincias da Sade, Universidade Federal de Santa Catarina

    Pesquisador Associado do Father Sean OSullivan Research Centre

    McMaster University, Canad

    Evandro Alves do Prado (SBP)

    Professor do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina

    da UFRJ; Chefe do servio de Alergia e Imunologia do Instituto de

    Pediatria da UFRJ; Vice-presidente da ASBAI

    Fbio F. Morato Castro (ASBAI)

    Professor Associado da Disciplina de Imunologia Clnica e Alergia da

    FMUSP; Supervisor do Servio de Imunologia Clnica e Alergia do

    HC-FMUSP

    Joo Negreiros Tebyri (ASBAI)

    Professor Livre Docente em Alergia e Imunologia pela UNIRIO

    Professor Associado do Curso de Especializao em Alergia e

    Imunologia; Escola Mdica de Ps-Graduao da PUC-RJ

    Jos ngelo Rizzo (ASBAI)

    Professor Adjunto e Doutor de Clnica Mdica, UFPE; Coordenador

    do Centro de Pesquisas em Alergia e imunologia Clnica, UFPE

    Jos Dirceu Ribeiro (SBP)

    Professor Doutor do Depto de Pediatria da FCM da Unicamp

    Presidente dos Deptos de Pneumologia Peditrica da SBP e da SBPT

    Jos Miguel Chatkin (SBPT)

    Professor Titular de Medicina Interna, Pneumologia da FM da

    PUCRS; Ps-Doutorado na University of Toronto

    Jussara Fiterman (SBPT)

    Doutora em Pneumologia pela UFRGS; Faculdade de Medicina da

    PUCRS e Hospital de Clnicas de Porto Alegre

    Luiz Fernando F. Pereira (SBPT)

    Coordenador do Ambulatrio de Asma, Hospital das Clnicas da

    UFMG

    06/29-05/222

    Rev. bras. alerg. imunopatol.

    Copyright 2006 by ASBAI

    222

  • Maria do Rosrio da S. Ramos Costa (SBPT)

    Professora Adjunta e Chefe do Depto de Medicina I da UF do

    Maranho; Doutora em Medicina (Pneumologia) pela UNIFESP

    Marina Lima (SBPT)

    Coordenadora da Unidade de Pesquisa clnica em Pneumologia

    Instituto de Doenas do Trax da UFRJ.

    Nelson Augusto Rosrio Filho (ASBAI)

    Professor Titular, Doutor, Universidade Federal do Paran;

    Presidente Associao Brasileira de Alergia e Imunopatologia;

    Vice-Presidente da Sociedade Latino-Americana de Alergia e

    Imunologia; Coordenador do Curso de Especializao em Alergia

    Peditrica, UFPR

    Paulo Augusto Camargos (SBP)

    Professor Titular do Depto de Pediatria, Universidade Federal de

    Minas Gerais; Membro do Depto de Pneumologia da SBP

    Coordenador Executivo GARD-Brasil

    Paulo de Tarso Roth Dalcin (SBPT)

    Professor Adjunto, Depto de Medicina Interna; Doutor em Medicina

    (Pneumologia); Faculdade de Medicina da Universidade Federal do

    Rio Grande do Sul

    Rafael Stelmach (SBPT)

    Assistente Doutor da Disciplina de Pneumologia do InCor/HC FMUSP

    Professor Colaborador do Departamento de CardioPneumologia

    FMUSP

    Sergio Luis Amantea (SBP)

    Professor Adjunto, Doutor, Depto de Pediatria da FFFCMPA

    Chefe do Servio de Emergncia do Hospital da Criana Santo

    Antnio - Porto Alegre; Membro do Depto de Pneumologia da SBP

    Solange O. Rodrigues Valle (ASBAI)

    Mestre em Imunologia Clnica pela FM UFRJ; Professora do Curso de

    Aperfeioamento em Imunologia Clnica do HU; Clementino Fraga

    Filho, UFRJ.

    Wilson Tartuce Aun (ASBAI)

    Mdico Chefe da Seo de Imunologia do Servio de Alergia do

    Hospital; Servidor Pblico do Estado de So Paulo.

    COORDENADORES E PRESIDENTES DAS SOCIEDADES

    Mauro M. Zamboni Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT)

    Pneumologista do Grupo de Oncologia Torcica do HC I - INCA

    Mestre em Pneumologia pela Universidade Federal Fluminense

    Nelson A. Rosrio Filho Associao Brasileira de Alergia e Imunopatologia (ASBAI)

    Professor Titular, Doutor, Universidade Federal do Paran

    Vice-Presidente da Sociedade Latino Americana de Alergia e Imunologia

    Dioclcio Campos Jnior Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)

    Professor Titular de Pediatria da Universidade de Braslia

    Doutor em Pediatria pela Universit Libre de Bruxelles

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 223

  • NDICE

    Prefcio.......................................................................................................................... 224

    Apresentao.... ............................................................................................................. 225

    I. Definio, epidemiologia e fisiopatologia ................................................................... 225

    II. Patologia e patogenia ............................................................................................... 225

    III. Diagnstico, classificao da gravidade e definio de controle ............................. 226

    IV. Tratamento de manuteno.................................................................................... 228

    V. Tratamento da crise ............................................................................................... 232

    VI. Asma de difcil controle .......................................................................................... 234

    VII. Perspectivas teraputicas....................................................................................... 234

    VIII. Educao em asma................................................................................................ 237

    IX. Asma em situaes especiais.................................................................................. 238

    X. Recursos legais ...................................................................................................... 241

    Referncias .................................................................................................................... 242

    Prefcio

    A IV Diretriz Brasileira em Asma resultado do trabalho

    de um grupo de especialistas que representaram trs soci-

    edades de especialidade e que aplicaram seu conhecimento

    e experincia pessoal na elaborao do documento. Procu-

    rou-se elaborar um texto conciso de modo a facilitar a con-

    sulta e estimular a leitura. As diretrizes j incorporam as

    modificaes introduzidas no Documento GINA 2006 o que

    demonstra a sua atualidade.

    A orientao e o acompanhamento de pacientes com as-

    ma requerem o conhecimento das diversas facetas da do-

    ena. Sensibilizao alrgica, infeces, irritantes, entre

    outros fatores do ambiente, atuam em conjunto sobre uma

    base gentica para determinar a extensa variedade de ex-

    presses clnicas da asma. A Diretriz aborda os mecanis-

    mos fisiopatolgicos, diagnstico, avaliao clnico-labora-

    torial, possibilidades teraputicas disponveis no momento

    e os programas de educao em asma.

    Considerando a alta prevalncia de asma no Brasil de

    se esperar que este documento tenha ampla difuso e re-

    percusso entre os profissionais que atuam no tratamento

    da asma. A informao mdica fundamental para orienta-

    o precisa e a abordagem adequada do paciente com as-

    ma, evitando-se a sub-medicao como tambm os exage-

    ros na dose e nmero de medicamentos. Promover o con-

    trole da asma o objetivo dos especialistas em asma. Este

    documento representa a atitude atual na busca deste obje-

    tivo.

    Prof Dr Luiz Antonio G Bernd

    Prof Dr Dirceu Sol

    224 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • Apresentao

    A asma representa hoje no pas um grave problema de

    sade pblica, responsvel por importante custo financeiro

    e social, que traz considervel comprometimento quali-

    dade de vida dos pacientes e de seus familiares. Essas

    conseqncias tm como principal fator causal a falta de

    controle da doena na maioria dos pacientes, determinada

    por inmeras causas, entre os quais se destacam a no

    utilizao adequada dos medicamentos profilticos e o des-

    conhecimento dos aspectos fundamentais da doena por

    parte de pacientes, familiares e, infelizmente, por parte de

    vrios mdicos. Por se tratar de uma doena inflamatria

    crnica, progressiva e degenerativa das vias areas, e sem

    cura definitiva, devemos buscar, a todo custo, a obteno

    do controle inflamatrio, clnico e funcional, atravs da

    adoo de medidas farmacolgicas e no farmacolgicas. A

    IV Diretriz Brasileira de Asma foi concebida para ser um

    documento ao mesmo tempo rico e enxuto, para dar a

    qualquer mdico recomendaes essenciais para que tenha

    a possibilidade de promover o controle da asma em seus

    pacientes, melhorando a qualidade de vida e reduzindo a

    mortalidade. Fundamentamos as recomendaes na Medi-

    cina baseada em evidncias, procurando fornecer dados

    com forte teor cientfico, suportados por literatura consa-

    grada e confivel. O texto est dividido em nove captulos,

    partindo da etiopatogenia e epidemiologia, passando pela

    classificao clnica da gravidade e controle, tratamento de

    manuteno e da exacerbao, educao em asma, e ter-

    minando com as informaes sobre os recursos legais hoje

    disponveis para subsidiar o fornecimento de medicamen-

    tos aos pacientes. Esperamos que a IV Diretriz Brasileira

    de Asma cumpra seu principal objetivo, que a divulgao

    de recomendaes para que nosso paciente asmtico atinja

    e mantenha o estado de controle da doena.

    Prof Dr Roberto Stirbulov

    I - Definio, epidemiologia e fisiopatologia

    Definio

    A asma uma doena inflamatria crnica, caracteriza-

    da por hiperresponsividade das vias areas inferiores e por

    limitao varivel ao fluxo areo, reversvel espontanea-

    mente ou com tratamento, manifestando-se clinicamente

    por episdios recorrentes de sibilncia, dispnia, aperto no

    peito e tosse, particularmente noite e pela manh ao

    despertar. Resulta da interao entre a carga gentica, ex-

    posio ambiental a alrgenos e irritantes, e outros fatores

    especficos que levam ao desenvolvimento e manuteno

    dos sintomas

    1-2

    .

    Epidemiologia

    Anualmente ocorrem cerca de 350.000 internaes por

    asma no Brasil, constituindo-se ela na quarta causa de

    hospitalizaes pelo Sistema nico de Sade (2,3% do

    total) e sendo a terceira causa entre crianas e adultos jo-

    vens

    3,27

    . H registro de aumento do nmero de internaes

    entre 1993 e 1999. Embora existam indcios de que a pre-

    valncia da asma esteja aumentando em todo o mundo, no

    Brasil ela parece estar estvel

    5-6

    . Em 1996, os custos do

    Sistema nico de Sade com internaes por asma foram

    de 76 milhes de reais, 2,8% do gasto total anual com in-

    ternaes e o terceiro maior valor gasto com uma nica

    doena. Estudo multicntrico (International Study for Asth-

    ma and Allergies in Childhood ISAAC) recm concludo

    apontou ser a prevalncia mdia mundial de asma de

    11,6% entre escolares (seis e sete anos), oscilando entre

    2,4% e 37,6%. Entre os adolescentes (13 e 14 anos) a

    prevalncia mundial mdia foi de 13,7% e oscilou entre

    1,5% e 32,6%

    5

    . No Brasil, os ndices ainda permanecem

    elevados e ao redor de 20% para as duas faixas etrias

    7

    .

    A mortalidade por asma ainda baixa, mas apresenta

    magnitude crescente em diversos pases e regies. Nos

    pases em desenvolvimento, a mortalidade vem aumentan-

    do nos ltimos dez anos, e corresponde de 5% a 10% das

    mortes por causa respiratria, com elevada proporo de

    bitos domiciliares. No Brasil, em 2000, a taxa de mortali-

    dade por asma como causa bsica ou associada foi de

    2,29/100.000 habitantes e a mortalidade proporcional foi

    de 0,41%, predominando no adulto jovem e em ambiente

    hospitalar

    8-9

    . Dados de 2005 mostram que as hospitaliza-

    es por asma corresponderam a 18,7% daquelas por cau-

    sas respiratrias e a 2,6% de todas as internaes no pe-

    rodo, tambm com algum decrscimo em relao s dca-

    das anteriores. Nesse ano, os custos do Sistema nico de

    Sade com internaes por asma foram de 96 milhes de

    reais, o que correspondeu a 1,4% do gasto total anual com

    todas as doenas

    3

    .

    II - Patologia e patogenia

    A principal caracterstica fisiopatognica da asma a

    inflamao brnquica, resultante de um amplo e complexo

    espectro de interaes entre clulas inflamatrias, media-

    dores e clulas estruturais das vias areas. Ela est pre-

    sente em todos os pacientes asmticos, inclusive naqueles

    com asma de incio recente, nas formas leves da doena e

    mesmo entre os assintomticos

    8-9

    .

    A resposta inflamatria alrgica iniciada pela intera-

    o de alrgenos ambientais com algumas clulas que tm

    como funo apresent-los ao sistema imunolgico, mais

    especificamente os linfcitos Th2. Estes, por sua vez, pro-

    duzem citocinas responsveis pelo incio e manuteno do

    processo inflamatrio. A interleucina (IL)-4 tem papel

    importante no aumento da produo de anticorpos IgE

    especficos ao alrgeno

    1-8-9

    .

    Vrios mediadores inflamatrios so liberados pelos

    mastcitos (histamina, leucotrienos, triptase e prostaglan-

    dinas), pelos macrfagos (fator de necrose tumoral TNF-

    alfa, IL-6, xido ntrico), pelos linfcitos T (IL-2, IL-3, IL-4,

    IL-5, fator de crescimento de colnia de granulcitos), pe-

    los eosinfilos (protena bsica principal, ECP, EPO, media-

    dores lipdicos e citocinas), pelos neutrfilos (elastase) e

    pelas clulas epiteliais (endotelina-1, mediadores lipdicos,

    xido ntrico). Por seus mediadores, as clulas causam

    leses e alteraes na integridade epitelial, anormalidades

    no controle neural autonmico (substncia P, neurocinina

    A) e no tnus da via area, alteraes na permeabilidade

    vascular, hipersecreo de muco, mudanas na funo

    mucociliar e aumento da reatividade do msculo liso da via

    area

    10

    .

    Esses mediadores podem ainda atingir o epitlio ciliado,

    causando-lhe dano e ruptura. Como conseqncia, clulas

    epiteliais e miofibroblastos, presentes abaixo do epitlio,

    proliferam e iniciam o depsito intersticial de colgeno na

    lmina reticular da membrana basal, o que explica o apa-

    rente espessamento da membrana basal e as leses irre-

    versveis que podem ocorrer em alguns pacientes com as-

    ma. Outras alteraes, incluindo hipertrofia e hiperplasia

    do msculo liso, elevao no nmero de clulas calicifor-

    mes, aumento das glndulas submucosas e alterao no

    depsito e degradao dos componentes da matriz extra-

    celular, so constituintes do remodelamento que interfere

    na arquitetura da via area, levando irreversibilidade de

    obstruo que se observa em alguns pacientes (figura 1)

    8

    .

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 225

  • Figura 1 - As complexas interaes celulares neurais presentes na patogenia da asma resultam em manuteno da inflamao e conduzem ao

    remodelamento brnquico.

    III - Diagnstico, classificao da gravidade e defini-

    o de controle

    O diagnstico da asma deve ser baseado na anamnese,

    exame clnico e, sempre que possvel, em provas de funo

    pulmonar e na avaliao da alergia

    1-3

    .

    III.1 - Diagnstico clnico

    So indicativos de asma: um ou mais dos sintomas

    dispnia, tosse crnica, sibilncia, aperto no peito ou des-

    conforto torcico, particularmente noite ou nas primeiras

    horas da manh; sintomas episdicos; melhora espontnea

    ou pelo uso de medicaes especficas para asma (bronco-

    dilatadores, antiinflamatrios esterides); trs ou mais epi-

    sdios de sibilncia no ltimo ano; variabilidade sazonal

    dos sintomas e histria familiar positiva para asma ou ato-

    pia; e diagnsticos alternativos excludos.

    Muitos estudos mostram que 50% a 80% das crianas

    asmticas desenvolvem sintomas antes do quinto ano de

    vida. O diagnstico pode ser difcil nessa faixa etria e tem

    implicaes importantes

    13

    . As seguintes perguntas devem

    ser formuladas aos pacientes (ou pais) para se estabelecer

    o diagnstico clnico de asma: a) tem ou teve episdios re-

    correntes de falta de ar (dispnia)? b) tem ou teve crises

    ou episdios recorrentes de chiado no peito (sibilncia)? c)

    tem tosse persistente, particularmente noite ou ao acor-

    dar? d) Acorda por tosse ou falta de ar? e) tem tosse, sibi-

    lncia ou aperto no peito aps atividade fsica? f) apresenta

    tosse, sibilncia ou aperto no peito aps exposio a alr-

    genos como mofo, poeira domiciliar ou animais, irritantes

    como fumaa de cigarro ou perfumes, ou aps resfriados

    ou alteraes emocionais como riso ou choro? g) usa algu-

    ma medicao quando os sintomas ocorrem, e com que

    freqncia? h) h alvio dos sintomas aps o uso de medi-

    cao? i) tem antecedentes familiares de doenas alrgicas

    ou asma? j) tem ou teve sintomas de doenas alrgicas

    (especialmente rinite ou dermatite atpica)?

    III.2 - Diagnstico funcional

    O diagnstico de asma fundamentado pela presena

    de sintomas caractersticos, sendo confirmado pela de-

    monstrao de limitao varivel ao fluxo de ar. A medida

    da funo pulmonar fornece a avaliao da gravidade da

    limitao ao fluxo areo, sua reversibilidade e variabilida-

    de, alm de confirmar o diagnstico de asma.

    Os termos variabilidade e reversibilidade esto relacio-

    nados a alteraes dos sintomas acompanhadas por altera-

    es do fluxo areo que ocorrem espontaneamente ou

    aps interveno farmacolgica. O termo reversibilidade

    mais utilizado para indicar melhoras rpidas no volume ex-

    piratrio forado no primeiro segundo (VEF1) ou no pico de

    fluxo expiratrio (PFE) aps a inalao de um agente be-

    ta2-agonista de ao rpida ou a melhora gradual em dias

    ou semanas aps a introduo de medicao controladora

    efetiva. Varibilidade indica melhora ou deteriorao dos

    sintomas ou da funo pulmonar no decorrer do tempo.

    Pode ocorrer durante o dia, com o passar dos dias ou se-

    manas ou anualmente. A obteno de histria de variabili-

    dade componente essencial no diagnstico de asma alm

    de fazer parte dos critrios para o estabelecimento do con-

    trole da asma.

    Espirometria

    o mtodo de escolha na determinao da limitao ao

    fluxo de ar e estabelecimento do diagnstico de asma. So

    indicativos de asma

    11,12,14,15

    : a) obstruo das vias areas

    caracterizada por reduo do VEF1 para abaixo de 80% do

    previsto e da sua relao com a capacidade vital forada

    para abaixo de 75% em adultos e de 86% em crianas; b)

    obstruo ao fluxo areo, que desaparece ou melhora sig-

    nificativamente aps o uso de broncodilatador (aumento do

    VEF1 de 7% em relao ao valor previsto e de 200 mL em

    valor absoluto, aps inalao de agente beta2-agonista de

    curta durao), ressaltando-se que a limitao ao fluxo a-

    reo sem resposta ao broncodilatador em teste isolado no

    deve ser interpretada como obstruo irreversvel das vias

    areas; c) aumentos no VEF1 superiores a 20% e exceden-

    do a 250 ml de modo espontneo no decorrer do tempo ou

    aps interveno com medicao controladora (ex., predni-

    sona 30 a 40 mg/dia VO, por duas semanas).

    226 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • Pico de fluxo expiratrio (PFE)

    O PFE importante para o diagnstico, monitorao e

    controle da asma. A variao diurna do PFE pode ser utili-

    zada para se documentar a obstruo do fluxo areo. So

    indicativos de asma

    11,15-17

    : a) aumento de pelo menos 15%

    no PFE aps inalao de um broncodilatador ou curso oral

    de corticosteride; b) variao diurna no PFE maior que

    20% (diferena entre a maior e a menor medida do pero-

    do) considerando medidas feitas pela manh e tarde, ao

    longo de um perodo de duas a trs semanas.

    Testes adicionais

    Em indivduos sintomticos com espirometria normal e

    ausncia de reversibilidade demonstrvel ao uso de bron-

    codilatador, o diagnstico pode ser confirmado pela de-

    monstrao de hiperresponsividade das vias areas. As

    medidas de hiperresponsividade refletem a sensibilidade ou

    facilidade com que as vias areas reagem aos estmulos

    externos que podem causar sintomas de asma e os resul-

    tados do teste so usualmente expressos como a concen-

    trao (ou dose) provocadora do agonista utilizado em

    causar uma queda significativa no VEF1 (por conveno

    maior ou igual a 20%)

    18,19

    : a) teste de broncoprovocao

    com agentes broncoconstritores (metacolina, histamina,

    carbacol) com alta sensibilidade e alto valor preditivo ne-

    gativo; b) teste de broncoprovocao por exerccio de-

    monstrando queda do VEF1 acima de 10 a 15%.

    III.3 - Diagnstico da alergia

    A anamnese cuidadosa importante para a identificao

    da exposio a alrgenos relacionados com a asma. A sen-

    sibilizao alrgica pode ser confirmada por provas in vivo

    (testes cutneos) ou in vitro (determinao de concentra-

    o srica de IgE especfica)

    20

    .

    Testes cutneos devem ser realizados utilizando-se ex-

    tratos biologicamente padronizados (a tcnica mais empre-

    gada a de puntura). Em nosso meio predomina a sensibi-

    lizao a antgenos inalveis, sendo os mais freqentes os

    caros Dermatophagoides pteronyssinus, Dermatophagoi-

    des farinae e Blomia tropicalis.

    Outros alrgenos inalveis (plen, baratas, epitlio de

    gatos e ces) so importantes, mas sensibilizam menor

    nmero de pacientes. Alimentos raramente induzem asma.

    Poluentes ambientais ou ocupacionais so desencadeantes

    e/ou agravantes de asma.

    A determinao de IgE srica especfica confirma e com-

    plementa os resultados dos testes cutneos.

    III.4 - Diagnstico diferencial

    Algumas condies so especficas das diferentes faixas

    etrias. O quadro 1 resume as que mais freqentemente

    podem ser confundidas com asma e que devem ser consi-

    deradas no diagnstico diferencial. importante assinalar o

    papel das infeces virais na ecloso e manuteno de sibi-

    lncia no lactente

    13

    .

    III.5 - Classificao da gravidade para incio de tra-

    tamento

    O objetivo primordial no manejo da asma a obteno

    do seu controle. A classificao da gravidade tem como

    principal funo a determinao da dose de medicamentos

    suficiente para que o paciente atinja o controle no menor

    prazo possvel. Estima-se que 60% dos casos de asma se-

    jam intermitentes ou persistentes leves, 25% a 30% per-

    sistentes moderados e 5% a 10% persistentes graves.

    Ressalta-se que embora a proporo de asmticos graves

    represente a minoria dos asmticos ela concorre com a

    maior parcela na utilizao dos recursos de sade.

    A avaliao usual da gravidade da asma pode ser feita

    pela anlise da freqncia e intensidade dos sintomas e

    pela funo pulmonar. A tolerncia ao exerccio, a medica-

    o necessria para estabilizao dos sintomas, o nmero

    de visitas ao consultrio e ao pronto-socorro, o nmero

    anual de cursos de corticosteride sistmico, o nmero de

    hospitalizaes por asma e a necessidade de ventilao

    mecnica so aspectos tambm utilizados para classificar a

    gravidade de cada caso

    11

    .

    A caracterizao da gravidade da asma deve envolver a

    gravidade da doena subjacente propriamente dita e sua

    responsividade ao tratamento. Em conseqncia disso, a

    asma pode se apresentar com graves sintomas e limitao

    ao fluxo de ar e ser classificada como persistente grave na

    apresentao inicial, mas responder muito bem ao trata-

    mento e necessitar de uma dose baixa de medicao con-

    troladora e ser ento caracterizada como asma leve ou

    moderada. Mais ainda, a gravidade no uma caracters-

    tica fixa do paciente com asma e pode se alterar com os

    meses ou anos.

    Neste sentido, uma avaliao peridica do paciente com

    asma e o estabelecimento do tratamento de acordo com o

    nvel de controle seria mais relevante e til.

    No quadro 2 so apresentados os principais parmetros

    para classificao da gravidade da asma.

    Quadro 1 - Diagnstico diferencial.

    Anel vascular

    Fstula traqueo-esofgica

    Apnia obstrutiva do sono

    No coordenao da deglutio

    Aspergilose broncopulmonar alrgica

    Infeces virais e bacterianas

    Bronquiectasias

    Insuficincia cardaca

    Bronquiolites

    Massas hipofarngeas

    Carcinoma brnquico

    Massas mediastinais

    Discinesia da laringe

    Obstruo alta das vias areas

    Disfuno de cordas vocais

    Obstruo mecnica das vias areas

    Doena respiratria crnica da prematuridade

    Refluxo gastresofgico

    Doena pulmonar obstrutiva crnica

    Sndrome de Leffler

    Embolia pulmonar

    Sndrome de hiperventilao

    Fibrose cstica

    Alveolite alrgica extrnseca ou pneumonite por

    hipersensibilidade

    III.6 - Controle da asma

    A principal meta do tratamento da asma o seu contro-

    le. No seu senso mais comum, o controle poderia indicar

    preveno total da doena ou mesmo a sua cura, mas no

    caso da asma, onde, presentemente, nenhuma destas op-

    es realista, se refere ao controle das manifestaes

    clnicas e funcionais. Idealmente este conceito deveria ser

    aplicado aos marcadores laboratoriais de inflamao e s

    caractersticas fisiopatolgicas da doena. No entanto, a

    no disponibilidade e os custos elevados dos mtodos de

    medida seriada da inflamao (escarro induzido ou xido

    ntrico exalado) os tornam impraticveis como parmetros

    de medida de controle na prtica clnica diria. O controle

    pode ser caracterizado de acordo com parmetros clnicos

    e funcionais em trs diferentes nveis: asma controlada,

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 227

  • asma parcialmente controlada e asma no controlada

    (quadro 3)

    11

    .

    O completo controle da asma freqentemente obtido

    com os tratamentos atualmente disponveis. O objetivo do

    tratamento manter o controle da asma por perodos pro-

    longados levando-se sempre em considerao os efeitos

    adversos potenciais, custo, e interaes dos medicamen-

    tos.

    O tratamento inicial da asma pode ser iniciado de acor-

    do com critrios de gravidade. No entanto a manuteno

    deve ser baseada fundamentalmente no estado de controle

    da doena, conforme apresentado no quadro 3

    11

    .

    Quadro 2 - Classificao da gravidade da asma.

    Persistente

    Intermitente*

    Leve Moderada Grave

    Sintomas Raros Semanais Dirios Dirios ou contnuos

    Despertares noturnos Raros Mensais Semanais Quase dirios

    Necessidade de agente beta2-agonista

    inalado para alvio

    Rara Eventual Diria Diria

    Limitao de atividades Nenhuma Presente nas exacerbaes Presente nas exacerbaes Contnua

    Exacerbaes Raras Afeta atividades e o sono Afeta atividades e o sono Freqentes

    VEF1 ou PFE 80% previsto 80% previsto 60-80% previsto 60% previsto

    Variao VEF1 ou PFE < 20% < 20-30% > 30% > 30%

    Classificar o paciente sempre pela manifestao de maior gravidade.

    *Pacientes com asma intermitente, mas com exacerbaes graves, devem ser classificados como tendo asma persistente moderada.

    VEF1: volume expiratrio forado no primeiro segundo; PFE: pico de fluxo expiratrio.

    Quadro 3 - Nveis de controle do paciente com asma.

    Parmetro Controlado

    Parcialmente controlado

    (pelo menos um em qualquer semana)

    No controlado

    Sintomas diurnos Nenhum ou mnimo Dois ou mais/semana

    Despertares noturnos Nenhum Pelo menos um

    Necessidade de medicamentos

    de resgate

    Nenhuma Duas ou mais por semana

    Limitao de atividades Nenhuma Presente em qualquer momento

    PFE ou VEF1

    Normal ou prximo do

    normal

    < 80% previsto ou do melhor individual, se

    conhecido

    Trs ou mais parmetros

    presentes em qualquer semana

    Exacerbao Nenhuma uma ou mais por ano Uma em qualquer semana

    Adaptado da reviso do GINA 2006

    *A ocorrncia de uma exacerbao deve levar reviso do tratamento de manuteno para assegurar que o mesmo adequado.

    IV Tratamento de manuteno

    O tratamento atual dirigido para controlar os sintomas

    e prevenir exacerbaes. A introduo precoce do trata-

    mento antiinflamatrio com corticosterides inalatrios

    (CI) resulta em melhor controle de sintomas, podendo pre-

    servar a funo pulmonar em longo prazo e, eventualmen-

    te, prevenir ou atenuar o remodelamento das vias areas.

    Alguns pacientes com asma grave podem desenvolver obs-

    truo irreversvel aps muitos anos de atividade da doen-

    a.

    Princpios do tratamento de manuteno

    Todos os pacientes com asma e seus familiares devem

    receber orientaes sobre sua doena e noes de como

    eliminar ou controlar fatores desencadeantes, especial-

    mente os domiciliares e ocupacionais. As diferenas entre

    tratamento broncodilatador sintomtico e tratamento de

    manuteno regular devem ser enfatizadas. O paciente

    deve entender a doena e seu tratamento. Em casos mo-

    derados e graves, o registro escrito da medicao consumi-

    da e sintomas pode auxiliar no melhor autocontrole e na

    conduo mdica. Todos os pacientes com asma persisten-

    te moderada ou grave devem ter um plano de ao escrito

    para uso em caso de exacerbaes.

    A terapia deve focalizar de forma especial a reduo da

    inflamao. Deve-se iniciar o tratamento de acordo com a

    classificao da gravidade da asma. A manuteno do tra-

    tamento deve variar de acordo com o estado de controle

    do paciente. Havendo dvida na classificao, o tratamento

    inicial deve corresponder ao de maior gravidade. O trata-

    mento ideal o que mantm o paciente controlado e est-

    vel com a menor dose de medicao possvel. Uma vez

    obtido o controle sintomtico por um perodo mnimo de

    trs meses, pode-se reduzir as medicaes e suas doses,

    mantendo-se o acompanhamento do paciente.

    Se o controle esperado no for obtido, antes de quais-

    quer mudanas teraputicas deve-se considerar: a adeso

    do paciente ao tratamento; os erros na tcnica de uso dos

    dispositivos inalatrios; a presena de fatores desencade-

    antes e/ou agravantes, como rinite persistente, sinusite

    228 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • crnica, doena do refluxo gastresofgico, exposio a

    alrgenos, tabagismo, e transtornos psquicos e sociais.

    Recomenda-se, sempre que possvel, a realizao de es-

    pirometria de controle, no mnimo semestralmente nos ca-

    sos mais graves e anualmente para todos os asmticos.

    Recursos teraputicos para o tratamento de manu-

    teno da asma

    Corticosteride inalatrio

    Trata-se do principal medicamento utilizado no trata-

    mento de manuteno, profiltico e antiinflamatrio, tanto

    em adultos como em crianas. Grande parte dos pacientes

    com asma leve obtm o controle com doses baixas, en-

    quanto que outros necessitam de doses moderadas ou al-

    tas. O tratamento de manuteno com CI reduz a freqn-

    cia e gravidade das exacerbaes, o nmero de hospitali-

    zaes e de atendimentos nos servios de emergncia, me-

    lhora a qualidade de vida, a funo pulmonar e a hiperres-

    ponsividade brnquica, e diminui a broncoconstrico indu-

    zida pelo exerccio.

    O controle dos sintomas e a melhora da funo pulmo-

    nar podem ocorrer aps uma a duas semanas de trata-

    mento, enquanto que para reverso da hiperresponsivi-

    dade brnquica o paciente pode necessitar de meses ou

    anos de utilizao de CI. A suspenso do tratamento com

    CI pode levar deteriorao do estado de controle da as-

    ma.

    Os efeitos colaterais sistmicos dos CI so habitualmen-

    te observados com utilizao de doses altas por tempo pro-

    longado e so eles: perda de massa ssea, inibio do eixo

    hipotlamo-hipfise-adrenal e dficit de crescimento, sem

    alterao da maturao da cartilagem de crescimento.

    Candidase oral, disfonia e tosse crnica por irritao das

    vias areas superiores podem ser observadas com qual-

    quer dose e so reduzidas se a recomendao de higiene

    oral aps o uso for seguida. O Quadro 4 mostra a equiva-

    lncia de doses dos corticosterides utilizados no Brasil

    (Evidncia A)

    21-28

    .

    Quadro 4 - Equivalncia de dose dos corticosterides inalatrios utilizados no Brasil.

    Adultos

    Frmaco Dose baixa (mcg) Dose mdia (mcg) Dose elevada (mcg)

    Beclometasona 200-500 500-1.000 > 1.000

    Budesonida 200-400 400-800 > 800

    Ciclesonida 80-160 160-320 > 320

    Fluticasona 100-250 250-500 > 500

    Crianas

    Beclometasona 100-400 400-800 > 800

    Budesonida 100-200 200-400 > 400

    Budesonida suspenso para nebulizao 250-500 500-1000 > 1000

    Fluticasona 100-200 200-500 > 500

    Ciclesonida* * * *

    * A ciclesonida est indicada para crianas com idade superior a quatro anos na dose de 80 a 160 mcg por dia.

    Adaptado da reviso do Global Initiative for Asthma, 2006.

    Beta-agonistas de ao prolongada (LABA)

    Os LABA so utilizados em associao aos CI em paci-

    entes acima de quatro anos, quando estes forem insufici-

    entes para promover o controle da asma. No Brasil esto

    disponveis o formoterol e o salmeterol. A associao dos

    LABA ao CI pode ser utilizada como terapia inicial na asma

    classificada como moderada ou grave. A adio do LABA ao

    CI reduz o tempo para obteno do controle da doena. A

    monoterapia com LABA deve ser sempre evitada.

    Os efeitos adversos no so comuns e restringem-se

    aos efeitos causados pelo estmulo cardiovascular, tremo-

    res de extremidades e hipocalemia. Alguns pacientes po-

    dem continuar sintomticos enquanto que outros podem

    perder o controle de sua asma por efeito paradoxal dos

    LABA (Evidncia A)

    29-39

    .

    Antagonistas de receptores de leucotrienos cisteni-

    cos (antileucotrienos)

    Para alguns pacientes com asma persistente, os antileu-

    cotrienos (montelucaste e zafirlucaste) podem ser teis co-

    mo medicao substitutiva aos LABA e adicional associa-

    o de LABA e CI.

    Os leucotrienos esto aumentados em secrees, san-

    gue e urina aps infeces por vrus sincicial respiratrio e

    a sua utilizao em sibilncia recorrente aps bronquiolite

    viral aguda pode ser uma indicao clnica til em lacten-

    tes. Efeitos adversos graves so raros. A sndrome de

    Churg-Strauss, inicialmente associada ao uso de antileuco-

    trienos, parece estar mais relacionada suspenso do cor-

    ticosteride oral. Leso heptica foi descrita apenas com

    antileucotrienos no cistenicos (Evidncia A)

    40,41

    .

    Teofilina

    A teofilina um broncodilatador dotado de propriedades

    antiinflamatrias. Deve ser utilizada apenas como medica-

    mento adicional aos CI, em pacientes no controlados. V-

    rios efeitos colaterais esto relacionados com sua utiliza-

    o: sintomas gastrintestinais, manifestaes neurolgicas,

    arritmias cardacas e parada crdio-respiratria, em geral

    com doses acima de 10 mg/kg/dia (Evidncia B)

    42-44

    .

    Omalizumabe

    O omalizumabe um anticorpo monoclonal recombinan-

    te humanizado especfico. Sua principal caracterstica im-

    pedir a ligao da IgE com o seu receptor de alta afinidade

    (FcRI). Ocasiona marcada inibio da broncoconstrico

    induzida por alrgeno nas fases precoce e tardia da infla-

    mao, acarretando reduo da hiperresponsividade das

    vias areas.

    O tratamento com a anti-IgE est indicado para pacien-

    tes maiores de doze anos com asma alrgica de difcil con-

    trole. A dose empregada (a cada duas ou quatro semanas

    por via subcutnea) deve levar em conta o peso e o nvel

    de IgE srica total. Para pacientes com peso acima de 150

    kg ou IgE total < 30 ou > 700 UI/mL no se recomenda,

    atualmente, a utilizao de anti-IgE (Evidncia A)

    45-49

    .

    Bambuterol (beta-agonista de ao prolongada por

    via oral)

    Trata-se de uma pr-droga da terbutalina oral com ao

    broncodilatadora prolongada, que permite a sua adminis-

    trao uma vez ao dia. til nos pacientes com asma no-

    turna.

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 229

  • A comparao do bambuterol com salmeterol mostrou

    equivalncia no controle dos sintomas da asma, sendo uma

    alternativa para crianas e idosos com dificuldades na utili-

    zao de medicaes inalatrias. Pode ser administrado a

    partir de dois anos de idade na dose de 10 mg (10 mL)

    uma vez ao dia. Para crianas com idade superior a seis

    anos, a dose pode ser aumentada para 20 mg/dia. Em cri-

    anas orientais recomenda-se iniciar com metade da dose.

    No est indicada sua utilizao na asma induzida por

    exerccio. Deve-se evitar seu uso isolado, sem associao

    com antiinflamatrios

    50-51

    .

    Cromonas

    O papel do cromoglicato de sdio no tratamento em lon-

    go prazo da asma no adulto limitado. Sua eficcia tem si-

    do descrita em pacientes com asma persistente leve e

    broncoespasmo induzido por exerccio. Seus efeitos antiin-

    flamatrios so fracos e menores do que doses baixas de

    CI. Os efeitos adversos so tosse aps inalao e dor de

    garganta

    52,53.

    Imunoterapia especfica com alrgenos (IT)

    Consiste na administrao de doses progressivamente

    maiores de alrgenos especficos em pacientes sensibiliza-

    dos, fora de crise aguda, buscando a induo do estado de

    tolerncia.

    A IT deve ser administrada por especialista treinado no

    manejo de reaes anafilticas graves e deve ser indicada

    apenas na asma alrgica, demonstrada pela presena de

    anticorpos IgE para alrgenos do ambiente, principalmente

    caros, polens, fungos e insetos.

    A IT habitualmente tem sido aplicada por via subcut-

    nea. Estudos recentes indicam a eficcia da IT sublingual

    com doses elevadas de antgenos.

    Pacientes com sensibilizao mltipla (vrios alrgenos)

    podem no se beneficiar do tratamento imunoterpico. A

    IT mais efetiva em crianas e adolescentes do que em

    adultos, mas pode ser indicada para indivduos com idade

    entre cinco e 60 anos.

    Para pacientes em terapia farmacolgica, antes de ad-

    ministrar a injeo, aconselhvel verificar se o VEF1 ou

    PFE est acima de 70% do previsto. Asmticos leves ou

    muito graves devem ser excludos.

    A IT no est indicada para os pacientes que respondem

    bem profilaxia ambiental e ao tratamento farmacolgico.

    Est contra-indicada em pacientes com outras doenas

    imunolgicas ou que utilizem drogas beta-bloqueadoras

    (Evidncia A)

    54,55

    .

    Recursos teraputicos utilizados no resgate de sinto-

    mas agudos

    Beta-2 agonistas inalados de curta durao

    So os medicamentos de escolha para alvio dos sinto-

    mas de broncoespasmo durante as exacerbaes agudas

    de asma e como pr-tratamento do broncoespasmo induzi-

    do por exerccio. O aumento da necessidade de beta2 ago-

    nistas inalados de curta durao um sinal de descontrole

    da asma. A dificuldade na obteno de broncodilatao

    sustentada aps utilizao dos beta2 agonistas de curta

    duraro indica a necessidade de cursos de corticosterides

    orais. Esto disponveis o salbutamol, o fenoterol e a ter-

    butalina. Seus principais efeitos adversos so tremores de

    extremidades, arritmias cardacas e hipocalemia

    56,57

    .

    Glicocorticides orais

    Esto indicados no tratamento das exacerbaes graves

    da asma. Devem ser administrados no domiclio a pacien-

    tes em tratamento com CI durante a exacerbao, no mo-

    mento da alta dos servios de emergncia, e aps exacer-

    baro grave, em cursos de cinco a dez dias, na dose mdia

    de 1 a 2 mg/kg/dia, com o mximo de 60 mg. Os princi-

    pais efeitos adversos surgem aps o uso prolongado e/ou

    doses elevadas, destacando-se: alteraes no metabolismo

    da glicose, reteno de lquidos, osteoporose, ganho de pe-

    so, fcies arredondada, hipertenso arterial e necrose as-

    sptica da cabea do fmur.

    Anticolinrgicos inalados

    O brometo de ipratrpio pode ser usado no tratamento

    das exacerbaes graves de asma, associado ao beta2

    agonista de curta durao ou em sua substituio, no caso

    de efeitos adversos como taquicardia e arritmia cardaca.

    Os anticolinrgicos inalatrios podem ser utilizados em pa-

    cientes que no suportam os tremores de extremidades

    causados pelos agentes beta2 agonistas. Entre os efeitos

    adversos dos anticolinrgicos esto includos secura da

    mucosa oral, glaucoma e reteno urinria

    58

    .

    Dispositivos para administrao de medicamentos

    por via inalatria

    A deposio pulmonar dos medicamentos depende do

    tipo de dispositivo inalatrio utilizado. A escolha do dispo-

    sitivo mais adequado depende da anlise de vrios aspec-

    tos.

    A satisfao e a adeso do paciente ao tratamento po-

    dem ser melhoradas se for respeitada, dentro do possvel,

    sua escolha pessoal por determinado dispositivo. A escolha

    deve ser baseada na otimizao da relao entre custo e

    benefcio, considerando fatores ligados ao paciente, dro-

    ga e aos dispositivos disponveis. A maioria dos pacientes,

    quando bem orientados, consegue usar eficientemente os

    aerossis dosimetrados. Em pacientes com dificuldade de

    uso dos aerossis dosimetrados, inclusive quando acopla-

    dos a espaadores, a melhor alternativa so os inaladores

    de p. Nebulizadores de jato so reservados para exacer-

    baes graves, crianas com menos de trs anos e idosos

    debilitados ou com dificuldade cognitiva, que no conse-

    guem usar corretamente ou no se adaptam aos aerossis

    dosimetrados acoplados aos espaadores ou aos inaladores

    de p. Sempre que possvel, usar apenas um tipo de dispo-

    sitivo para facilitar o aprendizado da tcnica e melhorar a

    adeso ao tratamento. A escolha deve levar em considera-

    o a apresentao dos medicamentos, dispositivos dispo-

    nveis e facilidade de transporte. Para reduzir os efeitos

    adversos, pacientes que necessitam de altas doses de CI

    devem acoplar espaadores ao aerossol dosimetrado e la-

    var a boca aps o uso de inaladores de p. Independente-

    mente do grau de dificuldade de aprendizado da tcnica,

    essencial conferir e reorientar periodicamente o uso ade-

    quado de cada dispositivo (quadro 5).

    Tratamento de manuteno inicial baseado na gravi-

    dade

    Em asma intermitente, utilizar beta2 agonista de curta

    durao por via inalatria para alvio dos sintomas.

    Em asma persistente leve: utilizar beta2 agonista de curta

    durao por via inalatria para alvio dos sintomas; iniciar

    terapia antiinflamatria de manuteno (a primeira escolha

    o CI, em dose baixa); so alternativas os antileucotrienos

    ou cromoglicato dissdico, especialmente em crianas.

    Para a asma persistente moderada: utilizar beta2 ago-

    nista de curta durao por via inalatria para alvio dos sin-

    tomas; utilizar CI em doses moderadas (especialmente em

    crianas) a altas ou CI em doses baixas a moderadas, as-

    sociado a LABA; alternativas - associar antileucotrienos ou

    teofilina a doses baixas a moderadas de CI; nas exacerba-

    es graves pode ser necessria a utilizao de corticoste-

    ride oral.

    Para a asma persistente grave: utilizar CI em dose alta,

    especialmente em crianas; utilizar CI em dose alta asso-

    ciado a LABA; associar antileucotrieno ou teofilina; utilizar

    corticosteride por via oral na menor dose necessria para

    230 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • controle dos sintomas e/ou nas exacerbaes; no caso de

    no obteno do controle deve-se considerar a introduo

    da teraputica com anticorpos monoclonais anti-IgE (qua-

    dro 6).

    Quadro 5 - Recomendaes para utilizao dos dispositivos inalatrios.

    Aerossol dosimetrado - spray

    Retirar a tampa.

    Agitar o dispositivo.

    Posicionar a sada do bocal verticalmente 2 a 3 cm da boca.

    Manter a boca aberta.

    Expirar normalmente.

    Coordenar o acionamento do dispositivo no incio da inspirao lenta e profunda.

    Fazer pausa ps-inspiratria de no mnimo 10 segundos.

    Nova aplicao pode ser repetida aps 15 a 30 segundos.

    Inaladores de p

    Preparo da dose:

    Aerolizer: retirar a tampa do inalador de p e colocar uma cpsula. Em seguida, perfur-la, comprimindo as garras laterais.

    Turbuhaler: retirar a tampa, manter o IP na vertical, girar a base colorida no sentido anti-horrio e depois no sentido horrio at escutar um

    clique.

    Diskus: abrir o IP rodando o disco no sentido anti-horrio. Em seguida puxar sua alavanca para trs at escutar um clique.

    Pulvinal: retirar a tampa, manter o IP na vertical, apertar o boto marrom com uma mo, girar o IP no sentido anti-horrio com a outra mo

    (aparecer marca vermelha). Em seguida, soltar o boto marrom e girar o IP no sentido horrio at escutar um clique (aparecer a marca

    verde).

    Expirar normalmente e colocar o dispositivo na boca.

    Inspirar o mais rpido e profundo possvel (fluxo mnimo de 30 L/min).

    Fazer pausa ps-inspiratria de dez segundos.

    No caso do Aerolizer, aps inalao do produto, verificar se h resduo de p na cpsula. Em caso positivo, repetir as manobras anteriores.

    IP: inalador de p.

    Quadro 6 - Tratamento de manuteno inicial baseado na gravidade

    Gravidade Alvio Primeira escolha Alternativa Uso de corticide oral

    Intermitente

    Beta-2 de

    curta

    durao

    Sem necessidade de medicamentos de manuteno

    Persistente

    leve

    Beta-2 de

    curta

    durao

    CI dose baixa

    Antileucotrieno

    Cromonas*

    Corticosteride oral nas exacerbaes

    graves

    Persistente

    moderada

    Beta-2 de

    curta

    durao

    CI dose moderada* a alta

    Ou

    CI dose baixa a moderada,

    associado a LABA

    Baixa a moderada dose de CI

    associada a antileucotrieno ou

    teofilina

    Corticosteride oral nas exacerbaes

    graves

    Persistente

    grave

    Beta-2 de

    curta

    durao

    CI dose alta*

    CI dose alta

    + LABA

    Alta dose de CI + LABA,

    associados a antileucotrieno ou

    teofilina

    Cursos de corticide oral a critrio do

    mdico, na menor dose para se

    atingir o controle

    * Especialmente em crianas. CI: corticosteride inalado; LABA: beta2 agonista de longa durao.

    Em todos os casos deve ser promovido o controle ambi-

    ental e implantada e mantida a educao em asma para

    pacientes e cuidadores.

    Tratamento de manuteno baseado no estado de

    controle

    O estado de controle do paciente com asma e o tra-

    tamento no momento da avaliao determinam a escolha e

    a dose dos medicamentos a serem prescritos. Se, durante

    determinada avaliao, o paciente no se encontra con-

    trolado, deve ser promovido o incremento do esquema

    teraputico, aumentando-se as doses e/ou as classes de

    medicamentos, e passar para a etapa seguinte de tra-

    tamento. Se o controle estiver mantido por pelo menos

    trs meses, o paciente deve ter seus medicamentos ou

    doses reduzidas de acordo com a etapa anterior, em nveis

    suficientes para se manter o controle. Se a asma estiver

    parcialmente controlada, o mdico deve julgar a passagem

    para a etapa seguinte, considerando aspectos como satis-

    fao do paciente com o nvel de controle, efeitos adversos

    dos medicamentos a serem prescritos, atividades do pa-

    ciente, presena de co-morbidades e histria de asma

    quase fatal (quadros 7 e 8).

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 231

  • Quadro 7 - Etapas do tratamento de manuteno da asma baseadas no estado de controle (Vide quadro 3).

    Etapas de tratamento

    Educao em asma

    Controle ambiental

    Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Etapa 4 Etapa 5

    Beta-2 de

    curta durao

    S/N

    Beta-2 de curta

    durao S/N

    Beta-2 de curta

    durao S/N

    Beta-2 de curta

    durao S/N

    Beta-2 de curta durao S/N

    Selecione uma das opes

    abaixo

    Selecione uma das opes

    abaixo

    Adicionar um ou mais em

    relao etapa 3

    Adicionar um ou mais em

    relao etapa 4

    CI baixa dose CI baixa dose + LABA Opo

    preferencial

    Em crianas < 6 anos,

    dose moderada de CI

    Moderada ou alta dose de CI

    + LABA

    Corticosteride oral dose

    baixa

    CI dose moderada Antileucotrienos Antileucotrienos

    CI baixa dose +

    Antileucotrieno

    Outras

    opes

    CI dose baixa + teofilinas

    Teofilinas

    Anti-IgE

    s/n: se necessrio; CI: corticosteride inalatrio; LABA: beta-2 agonista de longa durao.

    Adaptado da atualizao do Global Initiative for Asthma, 2006.

    Quadro 8 - Esquema simplificado para o tratamento da asma ba-

    seado no estado de controle (Vide quadro 3).

    Estado de Controle Conduta

    Controlado

    Manter o paciente na mais baixa etapa

    de controle

    Parcialmente controlado

    Considerar aumentar a etapa de

    controle

    No controlado

    Aumentar a etapa at a obteno do

    controle

    Exacerbao Condutas apropriadas para a ocorrncia

    Adaptado da atualizao do Global Initiative for Asthma, 2006.

    A segunda etapa representa o tratamento inicial para a

    maioria dos pacientes com asma persistente, virgens de

    utilizao de CI. No entanto, se na avaliao inicial, ficar

    estabelecido que o paciente apresenta asma no contro-

    lada e os sintomas e avaliao funcional caracterizarem o

    paciente como portador de asma moderada ou grave, o

    tratamento pode ser iniciado na etapa 3.

    Aspectos importantes relacionados ao tratamento da

    asma

    Ainda que os diversos CI inalados sejam igualmente efe-

    tivos em doses equivalentes (Quadro 4), caso o paciente se

    mantenha sintomtico com determinado CI, recomenda-se

    a sua troca por outro CI e/ou sua associao com LABA.

    Antes da troca, certificar-se quanto sua correta utilizao

    e excluir outros fatores de descontrole.

    No se recomenda o uso isolado de LABA como medica-

    o de controle em asma persistente.

    Pacientes com asma persistente grave tratados de for-

    ma adequada e que necessitem de uso freqente de corti-

    costerides orais devem ter seguimento diferenciado por

    tratar-se de provvel asma refratria ou de difcil controle.

    Acompanhamento

    Pacientes com asma persistente devem ser avaliados re-

    gularmente. Nos classificados como moderados e graves,

    especial ateno deve ser dada ao crescimento e funo

    pulmonar (PFE, espirometria) a cada consulta, com avalia-

    o oftalmolgica e densitometria ssea anualmente. Nos

    pacientes graves aconselhvel a medio do PFE matinal

    antes do uso de broncodilatadores. A espirometria deve ser

    realizada, sempre que possvel, para avaliao do controle

    da asma e nas mudanas de esquema teraputico.

    Encaminhamento ao especialista

    Os pacientes devem ser encaminhados ao especialista

    nas seguintes situaes: dvida sobre o diagnstico da

    doena (por exemplo, asma versus doena pulmonar obs-

    trutiva crnica, tosse persistente ou dispnia sem causa

    aparente); provvel asma ocupacional; asma de difcil

    controle (asma instvel, sintomas contnuos apesar de al-

    tas doses de CI ou necessidade de uso de corticosteride

    sistmico para controle); piora da asma na gravidez; ade-

    so fraca ao tratamento e problemas psicossociais; alta

    hospitalar recente; entidades clnicas complicando a asma

    (por exemplo, sinusite crnica ou refluxo gastresofgico

    persistente grave).

    V - Tratamento da crise

    As crises de asma devem ser classificadas segundo sua

    gravidade (Quadro 9) e o tratamento deve ser institudo

    imediatamente

    59-61

    .

    Identificao do asmtico de risco

    A causa da morte por asma asfixia na quase totalidade

    dos casos, raramente decorre de tratamento excessivo, por

    isto preciso identificar os seguintes aspectos que indicam

    maior risco para os pacientes (Evidncia B)

    62

    : a) crise

    grave prvia com necessidade de ventilao mecnica ou

    internao em unidade de terapia intensiva (constituem os

    fatores de risco mais fortemente associados a crises fatais

    ou quase-fatais); b) trs ou mais visitas emergncia ou

    duas ou mais hospitalizaes por asma nos ltimos doze

    meses; c) uso freqente de corticosteride sistmico; d)

    uso de dois ou mais frascos de aerossol dosimetrado de

    broncodilatador por ms; e) problemas psicossociais (por

    exemplo, depresso, baixo nvel socioeconmico, dificulda-

    de de acesso assistncia, falta de aderncia a tratamen-

    tos prvios); f) presena de co-morbidades (doena cardio-

    vascular ou psiquitrica); g) asma lbil, com marcadas va-

    riaes de funo pulmonar (> 30% do PFE ou do VEF1); e

    h) m percepo do grau de obstruo.

    No quadro 10 esto mostradas as indicaes para a rea-

    lizao de exames complementares.

    232 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • Quadro 9 - Classificao da intensidade da crise de asma em adultos e crianas.

    Achado* Muito grave Grave Moderada/leve

    Gerais Cianose, sudorese, exausto Sem alteraes Sem alteraes

    Estado mental Agitao, confuso, sonolncia Normal Normal

    Dispnia Grave Moderada Ausente/leve

    Fala Frases curtas/monossilbicas. Lactente:

    maior dificuldade alimentar

    Frases incompletas/parciais. Lactente:

    choro curto, dificuldade alimentar

    Frases completas

    Musculatura

    acessria

    Retraes acentuadas ou em declnio

    (exausto)

    Retraes subcostais e/ou

    esternocleidomastodeas acentuadas

    Retrao intercostal leve ou

    ausente

    Sibilos Ausentes com MV localizados ou difusos Localizados ou difusos Ausentes com MV

    normal/localizados ou difusos

    FR (irm)** Aumentada Aumentada Normal ou aumentada

    FC (bpm) > 140 ou bradicardia > 110 110

    PFE (% melhor ou

    previsto)

    < 30% 30-50% > 50%

    SaO2 (ar ambiente) < 90% 91-95% > 95%

    PaO2 (ar ambiente) < 60 mmHg Ao redor de 60 mmHg Normal

    PaCO2 (ar ambiente) > 45 mmHg < 40 mmHg < 40 mmHg

    * A presena de vrios parmetros, mas no necessariamente todos, indica a classificao geral da crise.

    ** FR em crianas normais: < 2 meses, < 60 /min; 2-11 meses, < 50/min; 1-5 anos, < 40 /min; 6-8 anos, < 30 /min; > 8 anos = adulto.

    MV: murmrio vesicular; FR: freqncia respiratria; FC: freqncia cardaca; PFE: pico de fluxo expiratrio; SaO2: saturao de oxignio no

    sangue arterial; PaO2: presso parcial de oxignio no sangue arterial; PaCO2: presso parcial de gs carbnico no sangue arterial.

    Quadro 10 - Indicaes de exames complementares.

    Gasometria Sinais de gravidade, PFE < 30% aps

    tratamento ou SaO2 < 93%

    Radiografia de trax Possibilidade de pneumotrax, pneumonia

    ou necessidade de internao por crise

    grave

    Hemograma Suspeita de infeco. Neutrfilos

    aumentam quatro horas aps o uso de

    corticosterides sistmicos

    Eletrlitos Coexistncia com doenas

    cardiovasculares, uso de diurticos ou altas

    doses de agentes beta2 agonistas,

    especialmente se associados a xantinas e

    corticosterides

    PFE: Pico de fluxo expiratrio; SaO2: saturao de oxignio no

    sangue arterial.

    Tratamento medicamentoso

    O tratamento deve ser baseado no quadro clnico e,

    quando possvel, na avaliao objetiva da limitao ao flu-

    xo areo, pela espirometria, medida do PFE, ou da satura-

    o de oxignio no sangue arterial, quando possvel (Evi-

    dncia A) (quadro 9). O algoritmo de tratamento da crise

    de asma no pronto-socorro (figuras 2 e 3) determina a ad-

    ministrao seqencial de drogas e a necessidade de ava-

    liao continuada da resposta clnica.

    Doses adequadas e repetidas de agente beta-2 agonista

    por via inalatria a cada 10 a 30 minutos na primeira hora

    constituem a medida inicial de tratamento (Evidncia

    A)

    63

    .

    O efeito do beta-2 agonista de curta durao adminis-

    trado por aerossol dosimetrado acoplado a espaador se-

    melhante ao obtido por nebulizador de jato, sendo eficaz

    mesmo em casos de crises graves (Evidncia A)

    64

    .

    Na crise grave est indicada a utilizao de brometo de

    ipratrpio em doses repetidas, administrado conjuntamen-

    te com os agentes beta-2 agonistas de curta durao por

    nebulizao ou por aerossol dosimetrado (Evidncia A)

    65

    .

    O uso de beta-2 agonista de curta durao administrado

    por via intravenosa pode ser uma alternativa farmacolgica

    na tentativa de se evitar a evoluo para insuficincia res-

    piratria e a necessidade de suporte ventilatrio, especial-

    mente em pacientes peditricos, que se apresentam com

    quadros graves (Evidncia B)

    66

    .

    Nas crises moderadas e graves o oxignio deve ser utili-

    zado. A administrao pode ser feita por cnula nasal a 2 L

    por minuto, mscara facial (simples ou Venturi), campnu-

    la ou tenda. Nos pacientes adultos, a meta manter a as-

    turao de oxignio no sangue arterial 92%, sendo que

    em gestantes, pacientes com doenas cardiovasculares e

    crianas a meta mant-la igual ou superior a 95% (Evi-

    dncia A)

    67

    .

    Corticosterides reduzem a inflamao, aceleram a re-

    cuperao e diminuem o risco de crise fatal. Os pacientes

    atendidos na emergncia devem receber corticosterides

    sistmicos precocemente, j na primeira hora de atendi-

    mento. O uso de corticosteride por via oral ou endoveno-

    sa tem efeito equivalente

    68-70

    . As doses indicadas esto nos

    algoritmos de tratamento (Figuras 2 e 3). No h evidn-

    cias suficientes que indiquem a utilizao dos CI na crise

    em substituio aos corticosterides sistmicos

    71

    . A amino-

    filina no tem indicao como tratamento inicial. Em paci-

    entes muito graves, hospitalizados, ela poder ser consi-

    derada como tratamento adjuvante

    72-75

    .

    A administrao intravenosa de sulfato de magnsio tem

    sido proposta como forma adjuvante de tratamento para

    as exacerbaes mais graves, sendo a melhor indicao

    para os pacientes refratrios teraputica inalatria com

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 233

  • beta-2 agonista de curta durao. A dose recomendada pa-

    ra adultos de 1 a 2 g em infuso venosa durante vinte

    minutos, e na populao peditrica, 25 a 75 mg/kg, com

    dose mxima de 2 g (Evidncia A)

    76-78

    .

    Avaliao da resposta ao tratamento

    A resposta ao tratamento inicial (entre 30 e 60 minutos)

    e a reclassificao do paciente reapresentam os critrios

    mais teis para se determinar o prognstico com respeito

    admisso, alta e necessidade de medicao posterior.

    Conduta na alta do paciente do pronto-socorro

    Antes da alta hospitalar, o paciente deve receber as se-

    guintes orientaes: utilizar 40 a 60 mg de prednisona/dia,

    por sete a dez dias para adultos e, para crianas, 1 a 2

    mg/Kg/dia (mximo de 60 mg/dia) por trs a cinco dias

    69,

    79-81

    ; utilizar tcnica adequada quanto ao uso da medicao

    inalatria

    82

    ; seguir plano de ao em caso de exacerba-

    o

    83

    ; procurar o mdico assistente o mais rpido possvel

    (preferivelmente em uma semana), preferencialmente es-

    pecialista

    84

    .

    Erros e deficincias mais comuns durante o trata-

    mento no pronto-socorro

    Os erros e deficincias mais comuns durante o trata-

    mento no pronto-socorro so: histria e exame fsicos ina-

    dequados; falta de medidas funcionais para avaliao da

    gravidade e da resposta ao tratamento; no identificao

    de paciente com asma de risco; uso de aminofilina como

    tratamento principal e inicial; subdoses de agentes beta-2

    agonistas de curta durao ou grande intervalo entre as

    doses; no utilizao de espaadores ou tcnica de inala-

    o inapropriada para populao peditrica

    85

    ; dose insu-

    ficiente ou demora na administrao de corticosterides.

    Por ocasio da alta, os erros e deficincias mais comuns

    so: liberao precoce do pronto-socorro; falta de orien-

    tao da tcnica de uso dos aerossis; no orientao para

    tratamento de longo prazo; no orientao sobre retorno

    emergncia se necessrio; falta de orientao quanto aos

    sinais de piora; no prescrio de prednisona ou equiva-

    lente; no encaminhamento dos casos graves aos servios

    especializados.

    VI - Asma de difcil controle

    A asma de difcil controle (ADC) acomete menos de 5%

    dos asmticos. Em 1998, a ADC foi definida como a falta

    de controle da doena, quando so usadas as doses mxi-

    mas recomendadas dos frmacos inalatrios prescritos

    86

    .

    Outras denominaes comumente usadas so asma resis-

    tente, refratria, lbil (brittle asthma) e fatal.

    O diagnstico de ADC s deve ser estabelecido aps pe-

    rodo varivel de trs a seis meses de minuciosa avaliao

    clnico-funcional, sendo essencial descartar doenas conco-

    mitantes ou que simulam asma. Devido falta de definio

    consensual da ADC, optamos por combinar os critrios cl-

    nicos da American Thoracic Society e da European Respira-

    tory Society (Quadro 11) (Evidncia D)

    87, 88

    .

    Para a definio de ADC so necessrios pelo menos um

    critrio maior e dois menores, acompanhamento mnimo

    de seis meses, excluso de outros diagnsticos, avaliao e

    tratamento de fatores agravantes e certificar-se de que h

    boa adeso ao tratamento.

    A asma uma doena de mltiplos fentipos que resulta

    de interao complexa entre fatores genticos e ambien-

    tais

    89-95

    . A ADC tem fentipos distintos caracterizando v-

    rios subtipos, como (Evidncia B): asma com obstruo

    persistente e pouco reversvel devida a remodelamento

    brnquico; asma quase fatal ou fatal (crises graves com

    necessidade de ventilao no invasiva ou intubao e

    ventilao mecnica); asma lbil tipo I (variao diurna do

    PFE acima de 40% em mais de 50% dos dias em que foi

    realizada a monitorizao), e tipo II (crise sbita com risco

    de vida); asma menstrual (crises quase fatais no incio do

    ciclo menstrual); asma com sensibilidade a aspirina (asso-

    ciao com rinite, polipose nasal e sinusite crnica).

    O custo do tratamento da ADC elevado, em geral dez

    vezes maior do que o da asma leve, principalmente pelo

    grande nmero de internaes por ano (Evidncia C)

    97

    .

    Seu manejo deve ser feito por especialista. Quando ade-

    quado, melhora a qualidade de vida dos pacientes e reduz

    o custo da doena. Baseia-se em: primeiro passo certifi-

    car-se do diagnstico correto (Evidncia B)

    98

    ; segundo

    passo - identificar, controlar e tratar os problemas que difi-

    cultam o controle da asma, como fatores desencadeantes

    (ambientais, medicamentos, tabagismo), co-morbidades

    (doena do refluxo gastresofgico, rinossinusite, distrbios

    psicossociais), m adeso ao tratamento, e tcnica inade-

    quada de uso dos aerossis (Evidncia B)

    99-102

    ; terceiro

    passo - otimizao do esquema de tratamento.

    Um dos fatores que mais dificultam o manejo da ADC

    a m adeso ou aderncia ao tratamento (Evidncia B).

    de fundamental importncia identificar este grupo de paci-

    entes com perguntas diretas sobre o uso dos medicamen-

    tos, controlar as marcaes de dose dos dispositivos de p

    seco e consultar seus familiares sobre o uso dos frmacos.

    As opes teraputicas para o tratamento da ADC so

    reduzidas e a maioria dos pacientes necessita de corticos-

    terides orais (Evidncia B). Os resultados dos tratamen-

    tos com drogas alternativas como ciclosporina, methotre-

    xate, dapsona, sais de ouro e colchicina so decepcionan-

    tes (Evidncia B)

    87

    . Entretanto, alguns asmticos tm res-

    posta clnico-funcional acentuada e por isto devem receber

    teste teraputico individual. O omalizumab um novo me-

    dicamento que pode ser muito til na ADC (Evidncia

    A)

    103,104

    .

    VII - Perspectivas teraputicas

    Anti-TNF-

    Os inibidores de TNF atualmente disponveis so anti-

    corpos monoclonais contra TNF (infliximabe e adalimuma-

    be) ou o receptor de TNF solvel fundido com IgG humana

    (etanercepte).

    Os efeitos do etanercepte como tratamento adicional ao

    CI em pacientes com asma grave resultaram em melhor

    controle dos sintomas, da funo pulmonar e da hiperres-

    ponsividade brnquica metacolina. Faltam estudos con-

    trolados e em maior nmero de pacientes para maior con-

    sistncia desta forma de tratamento (Evidncia C)

    106-108

    .

    Roflumilaste

    Trata-se de um inibidor seletivo da fosfodiesterase 4

    com atividade antiinflamatria que tem sido estudado para

    o tratamento da asma. Sua ao principal a inibio da

    degradao do monofosfato cclico de adenosina. A maior

    parte dos estudos clnicos fase III ainda no est publicada

    na ntegra. Deve-se aguardar resultados mais consistentes

    (Evidncia C)

    109-112

    .

    Anti-IL-4

    A IL-4 atua atravs de seu receptor de membrana IL-

    4R, sendo importante nas reaes imunes mediadas pela

    IgE. Numerosas terapias anti-IL-4 falharam em sua avalia-

    o clnica. As drogas eram seguras, sem reaes adversas

    nem produo de auto-anticorpos, mas no conseguiram

    melhorar a asma, seja por causa do perodo curto de tem-

    po estudado seja pela via de administrao (inalatria,

    com ao local e sem absoro sistmica). O anticorpo hu-

    mano anti-IL-4R encontra-se em desenvolvimento pr-cl-

    nico. Entretanto, mais estudos clnicos necessitam ser de-

    senvolvidos (Evidncia C)

    113

    .

    234 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • Figura 2 - Algoritmo de tratamento da crise de asma do adulto no pronto-socorro. PFE: pico de fluxo expiratrio; SaO2: saturao de oxignio

    no sangue arterial; PS: pronto-socorro.

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 235

  • Figura 3 - Algoritmo de tratamento da crise de asma da criana no pronto-socorro. FR: freqncia respiratria; FC: freqncia cardaca; PFE:

    pico de fluxo expiratrio; SatO2: saturao de oxignio no sangue arterial; UTI: unidade de terapia intensiva.

    236 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • Quadro 11 - Critrios para o diagnstico da asma de difcil contro-

    le.

    Maiores

    Altas doses de CI (CI em mcg/dia)

    - Adultos: beclometasona > 2.000, budesonida > 1.600 e flutica-

    sona > 1.000

    - Crianas: beclometasona ou budesonida > 800 e fluticasona >

    400

    Corticosterides orais 50% dos dias do ano

    Menores

    Necessidade de outro medicamento dirio alm dos CI

    - LABA, antagonistas dos leucotrienos ou teofilina

    Necessidade diria ou quase diria de beta-2 agonistas de curta

    durao

    Obstruo persistente do fluxo areo

    - VEF1 < 80% previsto, variao diurna do pico de fluxo expirat-

    rio > 20%

    Uma ou mais exacerbaes com necessidade de ida a pronto-so-

    corro por ano

    Trs ou mais cursos de corticosteride oral por ano

    Piora rpida aps reduo de pelo menos 25% da dose de corti-

    costerides orais ou CI

    Histria anterior de exacerbao de asma quase fatal

    Combinao dos critrios: American Thoracic Society 2000 e Euro-

    pean Respiratory Society 1999.

    CI: corticosteride inalatrio; LABA: beta agonista de ao prolon-

    gada; VEF1: volume expiratrio forado no primeiro segundo.

    Anti-IL-5

    Anticorpos monoclonais humanizados foram sintetizados

    contra a IL-5 (mepolizumabe) e o IL-5R, objetivando de-

    pletar os eosinfilos dos tecidos.

    Embora a administrao da anti-IL-5 tenha diminudo

    significativamente o nmero de eosinfilos na submucosa

    brnquica, no depletou na mesma proporo os eosinfi-

    los sricos ou do escarro. No h evidncias at agora de

    que a anti-IL-5 tenha afetado de maneira significativa os

    desfechos clnicos da asma (Evidncia C)

    113

    .

    VIII - Educao em asma

    A educao associada ao tratamento farmacolgico

    constitui um dos pilares fundamentais no tratamento da

    asma. Ajuda do paciente e dos familiares na aquisio de

    motivaes, habilidades e confiana no tratamento, o que

    permite um impacto positivo na mudana ativa de compor-

    tamento frente doena, e ajuda a estabelecer vida nor-

    mal a essas pessoas

    115-116

    .

    Uma reviso sistemtica da literatura, realizada em

    2005, identificou 101 estudos que tratavam de programas

    de educao para adultos portadores de asma. Destes, 45

    foram includos na anlise final, sendo 36 ensaios clnicos

    controlados e randomizados. Concluiu que a interveno

    educacional satisfatria para bons desfechos em sade,

    ou seja, permite melhor controle da asma, reduz o nmero

    de hospitalizaes, de visitas ao pronto-socorro e de visitas

    no agendadas ao ambulatrio, alm de reduzir o absen-

    tesmo ao trabalho e escola, e os episdios de asma no-

    turna117.

    No Brasil, as pesquisas tambm demonstraram os bene-

    fcios desses programas no controle clnico da doena, nos

    custos diretos e tambm na qualidade de vida tanto de

    adultos como de crianas

    118-119

    .

    A educao em asma pode ser direcionada a diferentes

    pblicos: a) populao em geral - informar que a asma

    uma doena pulmonar crnica que, se adequadamente tra-

    tada, pode ser controlada, permitindo uma vida normal; b)

    profissionais ligados sade - garantir o diagnstico corre-

    to e a recomendao teraputica adequada para, conse-

    qentemente, diminuir a morbidade e a mortalidade

    121

    ; c)

    asmticos - devem ser educados a reconhecer os sintomas,

    conhecer os fatores desencadeantes e como evit-los, a

    participar ativamente do tratamento, identificando os me-

    dicamentos e conhecendo as aes a serem tomadas con-

    forme a evoluo da doena

    122

    ; d) familiares e cuidadores -

    no sentido de se sentirem confortados com as condutas a

    serem adotadas em relao evoluo da doena; educa-

    o nas escolas, empresas pblicas e privadas, e segura-

    doras de sade - como lidar com a morbidade e a mortali-

    dade relacionadas asma

    123

    .

    Quanto forma os programas podem ser informativos

    ou estruturados. O programa informativo (no estruturado)

    tem contedo programtico mnimo, com simples informa-

    o oral, escrita ou por programao

    124,125

    . O estruturado

    confere melhores resultados e possui os seguintes requisi-

    tos: informao educacional que utiliza as formas escrita,

    verbal, visual e/ou auditiva; linguagem acessvel e adapta-

    da populao-alvo; monitorizao dos sintomas e/ou do

    PFE (usar escores de sintomas, e/ou de uso de broncodila-

    tador e/ou de PFE); consulta mdica regular (reavaliao

    programada do paciente pelo mdico e por outros profis-

    sionais de sade); plano de ao individual por escrito que

    deve ser explicado e entregue ao paciente

    117-126

    .

    O contedo bsico de um programa de asma apresen-

    tado no quadro 12

    115

    .

    O plano de ao por escrito pode ser colocado em pr-

    tica pelo prprio paciente (automanejo) e planejado em

    parceria de acordo com os itens do quadro 12 e o modelo

    apresentado no quadro 13 (quadro 14).

    Quadro 12 - Contedo educacional programtico (O ABCD da

    asma).

    Abordar os fatores agravantes e orientar como evit-los

    Buscar medicamentos apropriados e com tcnica adequada

    Colocar em prtica a execuo de um plano de ao

    Descrever os efeitos colaterais dos medicamentos usados e

    saber como minimiz-los

    Quadro 13 - Itens de um plano de ao adequado.

    Especificao do tratamento de manuteno.

    Monitorizao dos sintomas da asma e/ou do PFE quando

    indicado

    Reconhecimento dos sinais e sintomas precoces de exacerbao

    Proposta de alterao do esquema teraputico

    Tratamento domiciliar das crises leves

    Indicaes claras de quando procurar um servio de emergncia

    PFE: pico de fluxo expiratrio.

    Quanto a um programa de educao em asma no servi-

    o pblico, se houver persistncia, cidadania, compromisso

    e empenho possvel estruturar um programa de educa-

    o em asma que pode ser adaptado s condies locais e

    populao alvo. A seguir apresentado um modelo ideal

    para servir de base a um programa real

    118-120

    .

    Modelo de funcionamento de um programa de educa-

    o

    Podemos aplicar uma sistematizao de atendimento

    por etapas que inclui pr-consulta, consulta mdica e ps-

    -consulta

    115

    .

    IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 237

  • Pr-consulta: Na sala de espera poder existir uma te-

    leviso com um aparelho para apresentao de vdeos edu-

    cativos sobre asma. A pr-consulta pode ser realizada pela

    equipe de enfermagem, alunos de graduao pertencentes

    a ligas acadmicas de asma, que facilitam o programa de

    treinamento para atendimento bsico, ou algum da comu-

    nidade interessado em ajudar e treinado devidamente no

    programa

    125

    .

    Quadro 14 - Plano de ao por escrito.

    Paciente (nome):

    Classificao da asma:

    Medicamentos de manuteno utilizados:

    Idade:

    Data:

    PFE:

    Seus sintomas e sinais precoces de

    crise:______________________________________________________________________________________________________________

    __________________________________________________________________________________________________________________

    Quando isso acontecer, faa o seguinte:__________________________________________________________________________________

    __________________________________________________________________________________________________________________

    Procure a emergncia se aps 12 horas seu tratamento de crise no fizer efeito, ou se antes disso aparecerem os seguintes sintomas

    indicativos de gravidade: ______________________________________________________________________________________________

    e/ou muita faltar de ar, tosse persistente e exaustiva, suor frio, fala entrecortada, noite sem conseguir dormir, dedos arroxeados. NESTE CASO,

    PROCURE LOGO AJUDA MDICA, NO FIQUE EM CASA SE ESTIVER PASSANDO MAL

    PFE: pico de fluxo expiratrio.

    A ficha clnica de pr-consulta inclui: dados antropom-

    tricos, questionrio de avaliao subjetiva da dispnia, es-

    cala analgica visual de dispnia com quatro pontos, men-

    surao da presso arterial, pulso, freqncia respiratria e

    verificao do PFE pr e ps-broncodilatador.

    Consulta mdica: A consulta sistematizada e consti-

    tui-se em interrogatrio sobre intensidade e freqncia dos

    sintomas da asma.

    Os fatores que freqentemente limitam a boa resposta

    ao tratamento so pesquisados em um interrogatrio que

    inclui adeso ao tratamento, co-morbidades associadas,

    uso de outros medicamentos e eventos adversos. A com-

    posio de informaes, levando-se em conta a dose da

    medicao em uso e a expresso de sintomas e do PFE,

    determina a condio de controle da asma, que pode estar

    bem controlada, no controlada ou exacerbada. Essa anli-

    se sistematizada determina a prescrio. O tratamento

    preconizado segue a recomendao do consenso baseado

    na classificao de gravidade da asma

    116

    .

    Ps-consulta: A ps-consulta divide-se em duas eta-

    pas. A primeira etapa d-se logo aps o trmino da consul-

    ta: a equipe de enfermagem revisa a prescrio mdica e

    treina o paciente para o uso da medicao inalatria. Na

    segunda etapa da ps-consulta, os pacientes participam de

    um programa de educao agendado para um dia da se-

    mana, e cada paciente dever participar de uma palestra

    educativa por ms, tendo que cumprir o mnimo de seis

    palestras em seis meses. As palestras educativas so reali-

    zadas pelos acadmicos de Enfermagem e/ou Medicina, ou

    algum profissional interessado ou at mesmo algum da

    comunidade que deseje ajudar

    128

    .

    Adeso ao tratamento

    A adeso ao tratamento essencial para um resultado

    positivo. Ela sempre considerada um item bastante difcil,

    principalmente em doenas crnicas como a asma. Por es-

    se motivo, fundamental avali-la e tentar estratgias

    prticas para aument-la

    129,130

    .

    No quadro 15 esto resumidas as principais causas de

    dificuldades de adeso ao tratamento

    Cerca de metade dos pacientes no aderem ao tratamento,

    mesmo com a medicao gratuitamente fornecida, geral-

    mente por desconhecimento da importncia do tratamento

    regular de manuteno.

    Os programas de educao visam a sanar estas dificul-

    dades, tentando maximizar o controle da doena

    129

    . Em um

    pas como o Brasil, a implementao de estruturas de

    atendimento associadas educao do paciente funda-

    mental para propiciar o adequado manejo da asma.

    IX - Asma em situaes especiais

    Asma no idoso

    Os asmticos idosos podem ser divididos em dois gran-

    des grupos: asmticos que envelheceram e aqueles que

    tm asma de incio tardio. A asma subdiagnosticada no

    idoso por vrias razes

    132-134

    : menor percepo da disp-

    nia; interpretao da dispnia como uma conseqncia

    natural da idade; presena de doenas associadas (cardio-

    vasculares, hipotireoidismo, doena pulmonar obstrutiva

    crnica, pneumopatias aspirativas e obesidade, entre ou-

    tras); dificuldade de comprovao objetiva da obstruo

    das vias areas.

    Quadro 15 - Principais causas de dificuldades de adeso ao trata-

    mento.

    Ligadas ao

    mdico

    M identificao dos sintomas e dos agentes

    desencadeantes

    Indicao inadequada de broncodilatadores

    Falta de treinamento das tcnicas inalatrias e

    de prescrio de medicamentos preventivos

    Diversidade nas formas de tratamento

    Falta de conhecimento dos consensos

    Ligadas ao

    paciente

    Interrupo da medicao na ausncia de

    sintomas

    Uso incorreto da medicao inalatria

    Complexidade dos esquemas teraputicos

    Suspenso da medicao devida a efeitos

    indesejveis

    Falha no reconhecimento da exacerbao dos

    sintomas

    As etapas do tratamento no diferem das dos indivduos

    de outras faixas etrias, mas alguns aspectos merecem ser

    enfatizados

    132-138

    : co-morbidades so comuns e devem ser

    identificadas e tratadas; interaes medicamentosas so

    freqentes e podem dificultar o controle da asma ou das

    doenas associadas; os efeitos adversos dos beta-2 ago-

    nistas e das xantinas como tremores, hipocalemia, taqui-

    cardia, arritmias e aumento do consumo de oxignio po-

    dem ser mais graves; por sua maior segurana os antico-

    linrgicos devem ser indicados quando for necessria me-

    dicao broncodilatadora contnua; a vacinao anual an-

    tiinfluenza e a antipneumoccica a cada cinco a sete anos

    238 Rev. bras. alerg. imunopatol. Vol. 29, N 5, 2006 IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma

  • deve ser indicada; a tcnica de utilizao de medicaes

    inalatrias deve ser revisada regularmente e a utilizao de

    espaadores para o uso dos aerossis dosimetrados deve

    ser estimulada quando inaladores de p no puderem ser

    utilizados; fundamental verificar a adeso, que pode ser

    inadequada devido prescrio de vrios medicamentos,

    declnio cognitivo com perda de memria, limitaes fsi-

    cas, dificuldade na compra por questes financeiras ou

    apatia.

    Asma na gravidez

    A gravidez tem um efeito varivel sobre o curso da as-

    ma, que pode permanecer estvel, piorar ou melhorar,

    com retorno ao estado anterior gravidez em cerca de trs

    meses aps o parto

    139

    .

    Os sintomas geralmente melhoram durante as ltimas

    quatro semanas da gravidez e o parto no costuma se as-

    sociar com piora da asma. O curso da asma em sucessivas

    gestaes costuma ser semelhante em cada paciente

    140

    .

    O manejo difere muito pouco daquele preconizado para

    no grvidas. O subtratamento resulta em maior risco para

    a me e para o feto do que o uso de quaisquer drogas ne-

    cessrias para o controle da doena

    141-143

    . O baixo risco de

    malformaes congnitas associadas s medicaes usual-

    mente utilizadas no tratamento da asma est documenta-

    do

    144,145

    . A budesonida o CI de preferncia para a gesta-

    o por apresentar mais dados referentes segurana e

    eficcia (Evidncia A).

    Pacientes com asma mal controlada devem ser cuida-

    dosamente monitorizadas quanto ao retardo de cresci-

    mento intra-uterino do feto e pr-eclmpsia, e ter consul-

    tas mensais de avaliao pulmonar (Evidncia B)

    144,146

    .

    Monitorizao fetal intensiva essencial em mulheres com

    asma aguda durante a gravidez. Algumas medicaes po-

    tencialmente usadas para indicaes obsttricas em paci-

    entes com asma devem ser evitadas pela possibilidade de

    broncoespasmo. Estas incluem prostaglandina F2-alfa, er-

    gonovina e agentes antiinflamatrios no esterides (paci-

    entes sensveis). A ocitocina a droga de escolha para in-

    duo do parto. Crises de asma durante o parto devem ser

    tratadas de maneira usual.

    A categorizao das drogas na gravidez mostrada no

    Quadro 16.

    O quadro 17 mostra as drogas utilizadas para asma na

    gravidez com as respectivas categorias propostas pelo

    Food and Drug Administration.

    Quadro 16 - Drogas na gravidez. Classificao do Food and Drug Administration.