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Direito da União Europeia Professor Fausto Quadros 葡京法律的大学|大象城堡

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Direito da União Europeia Professor Fausto Quadros

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Desejando boa sorte, cabe-me alertar para o facto de a sebenta ter,

certamente, pequenas imprecisões que, por lapso e sem intenção, nela

perpassaram. Leiam criticamente, como tudo em ciência! E não

dispensem a consulta dos manuais

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A União Europeia

Definição e caracterização geral da União Europeia:

1. As noções de “comunidade” e de “União”: o conceito de Comunidade, valorizando a ideia

de solidariedade e de coesão entre os seus membros, como espelho da prevalência dos

interesses que são comuns a eles sobre os interesses que os separam. O conceitos de União

mantém íntegra toda essa construção e aprofunda-a de modo a aproximá-la da construção

federal. Mas a noção de União apresenta, em relação ao conceito de Comunidade, a

característica de um maior aprofundamento da solidariedade e da coesão interna e das

relações de subordinação no seio da União.

2. A criação das Comunidades pelo método da integração funcional: por duas vezes se tentou

no século XX alcançar a integração europeia segundo o modelo americano. A primeira

tentativa nesse sentido foi realizada com o Memorando Briand; ele não foi por diante

especialmente porque surgiu no início da grande depressão de 1929 – 1932. A segunda

tentativa traduziu-se na «Mensagem aos Europeus», de 8 a 10 de maio de 1948. Esta

tentativa fracassou, porque o Reino Unido, para travar a concretização das ideias aprovadas

naquele Congresso, promoveu a criação, em 1949, do Conselho da Europa, numa base de

simples cooperação intergovernamental. O método da integração global, pensado no

Congresso de Haia, teve, pois, de ceder o lugar ao método da integração funcional. Foi

nesse quadro que o Plano Schuman optou pelo método funcional, ao propor uma

Comunidade só para o Carvão e o Aço. Consolidou-se o método funcional através da criação

em 1957, de mais duas Comunidades sectoriais, a CEE e a CECA. A criação da União Europeia

pelo TUE em 1992, veio trazer alterações ao método funcional na integração europeia, ao

criar a União com um sentido amplo, que incluía nela as Comunidades Europeias.

3. O abandono do método da integração funcional: o Tratado de Lisboa alterou

significativamente o regime até então vigente na matéria. Pelo Tratado de Lisboa, a União

Europeia viu dissolver-se nela a CE, fazendo com que o pilar comunitário, traduzido na

União, passasse a ser praticamente o único pilar desta, com a única especialidade que

consistiu na intergovernamentalidade que perdurou parcialmente na PESC, e sem nos

esquecermos da subsistência residual da Euratom no pilar comunitário. Com estas ressalvas,

pode-se, dizer que o método funcional foi definitivamente abandonado pelo Tratado de

Lisboa para dar lugar à União Europeia.

4. Génese e evolução da União Europeia: depois da criação das Comunidades e até ao Tratado

de Maastricht, foram várias as vezes que em documentos oficiais foi utilizada a expressão

“União Europeia”. Em nenhum desses documentos se propunha a criação da União

Europeia como uma entidade que se substituísse às Comunidade. Neles, defendia-se

apenas um aprofundamento das Comunidades, em termos tais, que estas alargassem o

âmbito das suas atribuições e os poderes dos seus órgãos. A única exceção ao que acaba

de se afirmar era o Tratado Spinelli, que, na realidade, propunha a extinção das três

Comunidades e a sua substituição por uma União Europeia. Mesmo o Ato Único Europeu,

posterior a esse Tratado, não viria a pretender criar uma União Europeia. Isto quer dizer

que o nascimento da União Europeia como realidade diferente das Comunidades só

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ocorreu com o Tratado da União Europeia, cujo projeto, foi aprovado pelo Conselho

Europeu, na sua reunião em Maastricht, de 0 a 10 de dezembro de 1991. O Tratado da

União Europeia veio a refletir uma série de compromissos que estiveram na sua origem, o

maior dos quais terá sido a fusão de dois projetos: um projeto de Tratado sobre a União

Económica e Monetária, e um projeto de Tratado sobre a União Política. Note-se, todavia,

que o Tratado de Maastricht não transformou as Comunidades em União. A União e as

Comunidade coexistiam, fundando-se aquela, desde logo, nestas, e tendo a União, como

ser verá, personalidade jurídica própria, ainda que de conteúdo muito restrito. Desta

coexistência da União e das Comunidades resultava que o Tratado da União Europeia era

um verdadeiro Tratado de Tratados. Ou seja, ele englobava os Tratados Institutivos das

Comunidades Europeias. O Tratado Constitucional veio pretender dar uma sistematização

e uma arrumação muito clara, nesta matéria. Para tanto, passava a haver um só Tratado,

que criava uma nova União Europeia. O Tratado de Lisboa manteve essa orientação,

embora com uma alteração o plano formal. Dele resultaram dois Tratados e não um só: o

Tratado da União Europeia e o Tratado de Funcionamento da União Europeia. Das antigas

Comunidades manteve-se apenas a Euratom, regulada no Protocolo n.º2 anexo ao Tratado

de Lisboa.

5. A estrutura da União Europeia. O domínio material do Tratado da União Europeia até à

Convenção sobre o Futuro da Europa: estudar a estrutura significa apreender o âmbito ou

o domínio material coberto pelo TUE. Acerca dessa matéria, o Tratado EU, já antes do

Tratado de Lisboa, continha um preceito básico: «A União funda-se nas Comunidades

Europeias, completadas pelas políticas e formas de cooperação instituídas pelo presente

Tratado. A União tem por missão organizar de forma coerente e solidária as relações entre

os Estados membros e entre os respetivos povos». A União Europeia era assimilada mais

vulgarmente à arquitetura de um templo grego, cuja estrutura apresentaria três pilares.

Eram os artigos 1.º a 7.º do Tratado, que disciplinavam a criação da União Europeia, fixavam

os seus objetivos, definiam os seus princípios fundamentais e estabeleciam quais eram os

seus órgãos. Digamos que essas disposições comuns eram o arco que cobria os três pilares.

Seguiam-se, então, os três pilares em que se desdobrava a União. O primeiro pilar, que era

o pilar central e o mais importante, era o pilar comunitário, que em 1992 era composto

pela três Comunidades, na sequência da lógica do artigo 1.º, §3.º, TUE. O artigo 8.º absorvia

o Tratado CE, que conservava autonomia; o artigo 9.º incorporava o Tratado CECA que,

também, à data conservava autonomia; por fim, o artigo 10.º acolhia o Tratado CEEA, que,

também, mantinha autonomia. Este pilar comunitário era o pilar integrado da União

Europeia, aquele onde, portanto, encontrávamos os traços federais que a União Europeia

progressivamente foi criando. O Tratado de Amesterdão alterou a numeração originária

dos preceitos do Tratado CE, mas manteve a dos preceitos dos Tratados CECA e CEEA. O

Tratado de Nice não modificou essa estrutura do primeiro pilar a não ser pela absorção de

algumas matérias que até então estavam no terceiro pilar. Entretanto, em 24 julho de 2002,

deixou de existir a CECA. Isso aconteceu pelo facto de o respetivo Tratado ter cessado a sua

vigência, que o seu artigo 97.º fixava em cincoenta anos desde a entrada em vigor do

Tratado. Por conseguinte, o primeiro pilar da União Europeia passou a englobar apenas a

CE e a CEEA. Ao contrário do primeiro pilar, o segundo e o terceiro pilares da União tinham

natureza intergovernamental. Estavam, também eles, previstos na fórmula geral do artigo

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1.º §3.º, EU. O segundo pilar encontrava-se regulado nos artigo 11.º a 28.º, na versão de

Nice: ocupava-se da Política Externa e de Segurança Comum (PESC). Este segundo pilar

tinha vindo pôr termo à “cooperação política europeia”, e veio substitui-la por uma “politica

comum”. O desenho inicial da PESC, criado pelo Tratado de Maastricht, foi reforçado pelo

Tratado de Amesterdão, ao incluir nela a “definição gradual de uma política de defesa

comum”, que “poderá conduzir a uma defesa comum”, e ao incluir a UEO na União como

Organização Internacional autónoma, e a atribuição à União Europeia de uma “capacidade

de atuação autónoma baseada em forças militares credíveis”. Estavam, assim, criadas as

bases de uma Política Europeia Comum em matéria de Segurança e de Defesa. O Tratado

de Nice veio alterar o sistema assim delineado, na medida em que desapareceu a

integração da UEO na União Europeia. Por sua vez, o terceiro pilar estava disciplinado nos

artigos 29.º a 42.º e regulava a Cooperação policial e judiciária em matéria penal. Este pilar

havia sido introduzido pelo Tratado de Maastricht no TUE como uma consequência da

criação da liberdade de circulação e da eliminação de fronteiras internas dentro da União.

O preço a pagar por isso foi o de antecipar a criação de um “espaço de liberdade, segurança

e justiça”, de um “espaço judiciário europeu” – ou seja, um espaço em que a liberdade de

circulação fosse efetiva e, por isso, ficasse garantida, mas, simultaneamente, não fosse

utilizada para fins criminosos. Como se disse, este pilar, era de mera cooperação

intergovernamental. Por isso, foi-se concretizando, logo após o Tratado de Maastricht, por

acordos bilaterais ou multilaterais entre os Estados Membros. O bom funcionamento da

cooperação intergovernamental em algumas matérias deste terceiro pilar levou o Tratado

de Amesterdão a comunitarizar, ou seja, a passar para o primeiro pilar, o domínio dos vistos,

do asilo, da imigração, e de outras políticas relativas à livre circulação de pessoas, que, por

isso, passou a ser disciplinado no novo Título IV do Tratado CE. As matérias que sobraram

do terceiro pilar continuara no Título VI do TUE, que, passou a ter a epígrafe mais ambiciosa

de “cooperação policial e judiciária em matéria penal”. O Tratado de Nice veio reforçar

ainda mais este terceiro pilar, sobretudo através da criação da Eurojust (Unidade Europeia

de Cooperação Judiciária) e do aprofundamento dos meios de cooperação judiciária em

matéria penal, tais como eles passaram a ser regulados nos novos artigos 29.º, §2.º, 2.º

travessão, e 31.º UE.

6. A estrutura da União Europeia no Tratado Constitucional: um dos objetivos da Convenção

sobre o Futuro da Europa era de dar arrumação e simplificação à União Europeia. Por isso,

o Tratado Constitucional criava só uma União Europeia, que se pretendia coerente. Para

tanto, a nova União Europeia sucedia juridicamente à União Europeia que então existia e

absorvia as duas Comunidades que subsistiam (a CE e a Euratom) bem como o segundo e o

terceiro pilares.

7. A estrutura da União Europeia no Tratado de Lisboa: O Tratado de Lisboa resolveu manter

com um regime especial o antigo segundo pilar, ou seja, a PESC, agora integrada numa nova

realidade, mais ampla, chamada Ação Externa da União. De seguida, surge-nos, com igual

valor jurídico que o TUE (artigo 1.º, §3.º TFUE), o Tratado de Funcionamento da União

Europeia. Este Tratado ocupa-se do antigo pilar comunitário, do antigo terceiro pilar, agora

sob a epígrafe de “O espaço de liberdade, segurança e justiça”, e que agora é plenamente

integrado no antigo pilar comunitário. Fora da EU continua a Euratom com o seu Tratado

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próprio modificado pelo Protocolo n.º2, anexo ao TFUE, por força do artigo 4.º do Tratado

de Lisboa.

8. Os objetivos da União antes do Tratado de Lisboa: os fins primários ou principais da

integração europeia foram sempre fins políticos. Esses fins políticos eram, uns, imediatos,

outros, mediatos ou de longo prazo. OS fins políticos imediatos da integração, quando foi

criada a primeira Comunidade, a CECA, eram a prossecução da Paz, pela abolição da

«oposição secular entre a França e a Alemanha» e pela criação de imediato de «uma

solidariedade de facto» entre os Estados Europeus. Logo nos anos 50, elegeu um claro fim

político mediato ou de longo prazo: o da sua execução resultariam «os primeiros passos

concretos para uma Federação europeia indispensável à preservação da Paz». Tendo-se

optado, no Plano Schuman, pelo método funcional para o início da integração europeia, os

seus fins secundários, mas imediatos, eram fins fundamentalmente económicos, - a criação

de um mercado comum –, completados, nos Tratados institutivos das três Comunidades,

pela referência, ainda que embrionária, a alguns objetivos de índole social: a melhoria das

condições de vida e de emprego e a garantia da estabilidade social. Com o Tratado de

Maastricht o Tratado EU e o Tratado CE passaram a impor à CE e à própria UE a prossecução,

ao lado de fins económicos, de objetivos de natureza social, cultural e política. O Tratado

UE tem vindo a enunciar o objetivo global da União Europeia: a «criação de uma união cada

vez mais estreita entre os povos da Europa», artigo 1.º, §2.º TUE.

9. Os objetivos da União depois do Tratado de Lisboa: o Tratado de Lisboa foi ainda mais longe

na definição dos objetivos da União Europeia. Assim, diz o artigo 3.º, n.º1 TUE, os três

grandes objetivos da União são: a paz, os valores enunciados no artigo 2.º e que o 2.º

considerando do preâmbulo qualifica de “valores universais”, e o bem estar dos povos. Nas

suas relações com o resto do mundo, a União prossegue esses mesmos objetivos. A nova

sistematização dada pelo Tratado de Lisboa aos objetivos visados pela União Europeia não

é diferente apenas no plano formal: ela pretendeu também ampliar os objetivos da União

no campo social e cultural. A União já alcançou a União Económica e Monetária. Agora, o

TUE pretende avançar para a Europa Cultural, fundada na diversidade cultural dos povos

europeus e respeitadora do seu património cultural, religioso e humanista, e para a Europa

social. Esta última constitui a grande ambição do TUE e, por isso, é visada de modo especial

no artigo 3.º TUE. O artigo 3.º, n.º3, enuncia com clareza os traços do modelo social

europeu: uma Economia Social de Mercado altamente competitiva, que vise alcançar o

pleno emprego e o progresso social. No campo político, os Tratados continuam a não se

pronunciar sobre o futuro modelo da União. Mantém-se, por isso, sem alteração, a

referência à decisão dos Estados membros de «continuar o processo de criação de uma

União cada vez mais estreita entre os povos da Europa».

10. A relevância dos objetivos da União no plano do Direito: o Tribunal de Justiça tem usado

frequentemente a interpretação teleológica. E foi nesse quadro que, quando à CEE, muito

cedo ele entendeu que os preceitos dos Tratados sobre os objetivos que eles fixam têm

«natureza constitucional», constituem «Direito Imperativo» e gozam de efeito direto,

poendo, portanto, ser invocados pelos particulares perante os tribunais nacionais.

11. Os símbolos da União: a União Europeia tem, desde o início das Comunidades, os seus

ímbolos próprios. Assim, a União tem uma bandeira, composta por um círculo de doze

estrelas douradas sobre fundo azul. Depois, a União tem o seu hino próprio. A União tem

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também o seu dia: o Dia da Europa, que é celebrado a 9 de maio, aniversário da Declaração

Schuman; o lema da União “Unida na diversidade” e o euro como meda da União. Na

declaração n.º52 anexa a Tratado de Lisboa, dezasseis Estados, incluindo Portugal,

reconhecem que o símbolos que constavam do citado preceito do Tratado Constitucional

«continuarão a ser, para eles, os símbolos do vínculo comum dos cidadãos à União Europeia

e dos laços que o ligam a esta».

12. A personalidade jurídica da União: em nenhum preceito o TUE, antes do Tratado de Lisboa,

reconhecia expressamente personalidade jurídica à União. Daí, que a doutrina dominante

sustentasse que a União não gozava de personalidade jurídica própria, distinta da das

Comunidades. Nunca fomos dessa opinião. Dos trabalhos preparatórios do Tratado de

Maastricht tínhamos dificuldade em extrair a conclusão de que, mesmo no puro plano

político, não se quis atribuir à União autonomia em relação às Comunidades. Ou seja, a

identidade da União não era afirmada através das Comunidades, designadamente, através

da C, mas era formada pela própria União. Contudo, colocado o problema no plano jurídico

entendíamos que do TUE resultava com clareza, ainda que na ausência de preceito expresso

sobre a matéria, que a União gozava de personalidade jurídica própria. O TUE atribuía À

União capacidade jurídica própria, pelo menos para celebrar, ela própria acordos

internacionais. Ora, o reconhecimento dessa capacidade jurídica, desse ius tractum,

implicava, só por si, a atribuição de personalidade jurídica própria à União. Mas também

num outro domínio aparecia-nos confirmada a personalidade jurídica própria da União.

Toda a pessoa coletiva tem órgãos próprios. Ora, a União tinha órgãos que lhe imputavam

a ela, autonomamente, direitos e deveres próprios, isto é, que atuavam com órgãos da

União e não das Comunidades, exercendo eles, nesse quadro, a sua competência específica,

que o Tratado lhes conferia. Podia-se, pois, concluir dizendo que a União tinha

personalidade jurídica própria. O problema ficou resolvido em definitivo, com o Tratado de

Lisboa, que introduziu no TUE o novo artigo 47.º, que dispõe: «A União tem personalidade

jurídica».

13. A capacidade jurídica da União: qual é a capacidade jurídica, de gozo e de exercício da União?

Em primeiro lugar, a capacidade jurídica da União está limitada pelo princípio da

especialidade, que o Tratado UE chama de princípio da atribuição (artigo 5.º, n.º1 TUA). É

claro que, dada a vastidão dos objetivos e das atribuições que o TUE impõe à União não é

fácil aplicar, na prática, à União o princípio da especialidade. O que significa que serão

inválidos os atos praticados pela União, melhor, pelos seus órgãos, fora das suas atribuições

e para prosseguir objetivos que não lhe estão confiados pelos Tratados. Em segundo lugar,

a capacidade da União está condicionada pelo princípio da competência de atribuição dos

seus órgãos. Isto quer dizer que, para além de a União se encontrar limitada pelo princípio

da especialidade das suas atribuições, os seus órgãos têm de se conter dentro dos limites

dos poderes que os Tratados lhe conferem. O Tratado admite a possibilidade de ela fazer

expandir os poderes dos seus órgãos para se adaptar essa capacidade àquelas que forem,

em cada momento, as necessidades da integração. Há dois meios pelos quais se consegue

atingir esse resultado; primeiro o artigo 352.º TFUE; depois a teoria dos poderes implícitos.

A capacidade jurídica da União é de Direito interno, o que lhe permite atuar na sua ordem

interna, e de Direito Internacional, o que a autoriza a agir na ordem internacional.

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14. A integração diferenciada: particularmente após o Ato Único Europeu ter acelerado o passo

da integração europeia rumo ao Mercado Interno, a atingir, em 1 de janeiro de 1993, que

se começou a verificar que nem todos os Estados membros das Comunidades se encontrava,

em condições de progredir no processo de integração de modo igual, isto é, com o mesmo

ritmo e em todas as matérias. Logo nessa altura se sentiu, portanto, a necessidade de se

preverem mecanismos e condições que permitissem a alguns Estados, que estivessem

preparados para o efeito, avançar na integração mais depressa do que outros, pelo menos

em algumas matérias. Todavia, só com o Tratado de Amesterdão é que essa corrente ficou

consagrada nos Tratados, concretamente, no TUE e sob a designação de “cooperação

reforçada”. Elas visam permitir, portanto, que, verificadas determinadas condições, certos

Estados avancem mais rapidamente do que outros, em domínios concretos da integração,

sem que para tanto possam ser impedidos pelos outros Estados. Estamos perante a

aceitação formal, pelo TUE, da integração diferenciada. As cooperações reforçadas foram

incluídas no TUE por iniciativa da França e da Alemanha para prevenir o aprofundamento

do desnível entre Estados desenvolvidos e Estados menos desenvolvidos, que iria ser

provocado pelos alargamentos da União ocorridos neste século, principalmente a Estados

do Centro e do Leste da Europa.

a. Regime geral: o regime geral das cooperações reforçadas encontra-se comporto pelo

artigo 20.º TUE, e está desenvolvido nos artigos 326.º a 334.º TFUE. Esses preceitos

sujeitam as cooperações reforçadas à verificação dos seguintes requisitos: elas não

podem abranger as atribuições exclusivas da União e devem respeitar o regime

especial definido para a PESC no artigo 331.º TFUE (artigos 20.º, n.º1, §1.º TUE, e

329.º e 331.º TFUE); elas visam favorecer a realização dos objetivos da União,

preservar os seus interesses e reforçar o processo de integração (artigo 20.º, n.º1,

§2.º TUE); elas estão abertas a todos os Estados membros e a todo o momento

(artigo 20.º, n.º1, §2.º, e 328.º, n.º1, TFUE); elas devem ser utilizadas apenas em

“último recurso”, quando o Conselho se certificar que os objetivos por elas visados

não podem ser alcançados, num prazo razoável, pela União no seu conjunto (artigo

20.º, n.º2, §1.º, TUE); elas devem ser decididas por, pelo menos, nove Estados

membros, devendo, todavia, tentar-se alarga-las ao maior número possível de

Estados (artigo 20.º, n.º2 TUE, e 328.º, n.º, TFUE); todos os membros do Conselho

podem participar nas deliberações sobre as cooperações reforçadas mas só os

Estados membros que participem nestas é que têm direito a voto (artigo 20.º, n.º3,

TUE e 330.º TFUE); os atos aprovados no âmbito de uma cooperação reforçada só

vinculam os Estados que nela participem (artigo 20.º, n.º4, TUE); as cooperações

reforçadas devem atender às atribuições, aos direitos e aos deveres dos Estados que

nelas não participem, não podendo, todavia, estes impedir que elas sejam efetivadas

(artigo 327.º TFUE); elas não podem pôr em causa nem o mercado interno, nem a

coesão económica, social e territorial dentro da União, do mesmo modo como não

devem conduzir nem a uma restrição, nem a uma discriminação às trocas entre os

Estados membros e não devem causar distorções à concorrência entre eles (artigo

326.º TFUE). O procedimento de instituição de uma cooperação reforçada sujeita ao

regime geral encontra-se disciplinado nos artigos 329.º, n.º1 e 330.º TFUE. Por aí se

vê esse procedimento segue a forma de um processo legislativo especial com

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aprovação do Parlamento Europeu. Todavia, por força da chamada cláusula

passerelle, estabelecida no artigo 333.º, n.º2, TFUE, o Conselho, deliberando por

unanimidade, formada nos termos do artigo 330.º, §1.º e 2.º TFUE pode deliberar

que o procedimento a adotar será o de processo legislativo ordinário. O

procedimento para a participação numa cooperação reforçada já iniciada está

regulado no artigo 331.º, n.º1 do mesmo Tratado. A participação de um Estado

nessas condições pressupõe a aceitação, da sua parte, dos atoas que já tiverem sido

adotados no âmbito da respetiva cooperação reforçada (artigo 328.º, n.º1, §1.ª e 2.ª

parte TFUE).

b. Regimes especiais: o primeiro regime especial relativo às cooperações reforçadas

aplica-se à PESC. A instituição, ou criação, de uma cooperação reforçada no domínio

da PES encontra-se sujeita ao procedimento regulado no artigo 329.º, n.º2, TFUE, e

a participação numa cooperação já instituída nesse domínio rege-se pelo

procedimento disciplinado no artigo 331.º, n.º2, do mesmo Tratado. Os preceitos

citados do TFUE exigem para o efeito deliberação do Conselho por unanimidade. Esta

deve ser calculada à luz do artigo 330.º, §2.º TFUE. Todavia, por efeito da cláusula

passerelle, estabelecida pelo artigo 331.º, n.º2 TFUE, para as deliberações do

Conselho, é substituída pela maioria qualificada. O segundo regime especial é o da

cooperação estruturada permanente. Ela encontra-se prevista no artigo 42.º, n.º6

TUE, e no Protocolo n.º 10 anexo ao Tratado, relativo à cooperação estruturada

permanente. É o regime da cooperação reforçada que o Tratado de Lisboa criou para

o domínio da defesa. Essa cooperação desenvolveu-se no âmbito da Política Comum

de Segurança e Defesa (PCSD). O regime da cooperação estruturada permanente tem

de ser visto como um regime de exceção e os únicos requisitos que ele impõe são os

seguintes: só podem criar essa cooperação, ou participar nela, os Estados que

reúnam os requisitos do referido artigo 42.º, n.º6 TUE, e do citado Protocolo,

independentemente do seu número; esses Estado têm de assumir os compromissos

constantes dos artigos 1.º e 2.º do referido Protocolo, deixando, todavia, os Tratados

claro que a PCSD não afeta o caráter específico da política de segurança e defesa dos

Estados membros ( artigo 42.º, n.º7, in fine TUE e considerando o 4.º do citado

Protocolo). O procedimento da criação de uma cooperação estruturada permanente,

bem como da participação nela, rege-se pelo artigo 46.º TUE. O Conselho delibera

aqui por maioria qualificada, após consulta ao Alto Representante da União para os

Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança (Artigo 46.º, n.º3, §2.º e 3.º TUE). O

terceiro domínio é o das missões no exterior do domínio da PCSD, referidas no artigo

42.º, n.º1 TUE. O conteúdo e os objetivos dessas missões encontram-se definidos

naquele preceito bem como no artigo 43.º, n.º1 TUE. O Conselho, respeitado o

procedimento dos artigos 43.º, n.º2 e 44.º TUE, pode confiar uma missão desse tipo

a um grupo de Estados, independentemente do seu número, que reúna as condições

do artigo 44.º, n.º1 TUE. A coordenação dessas missões cabe ao Alto Representante,

sob a autoridade do Conselho e do Comité Político e de Segurança, e aos Estados

membros (artigo 43.º, n.º2, e 44.º, n.º1 TUE). Também é possível aos Estados

participarem na Agência Europeia de Defesa. Aquela Agência está prevista no artigo

42.º, n.º2 TUE. As suas atribuições encontram-se definidas nos artigos 42.º, n.º3, §2.º,

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e artigo 45.º do mesmo Tratado, e no artigo 3.º do Protocolo n.º10. Ela está aberta

aos Estados que nela queiram participar, a fim de reforçar as suas capacidades

militares.

c. Conclusão: as cooperações reforçadas ou a integração diferenciada apresentam o

grande risco da quebra da coesão económica, social e territorial entre os Estados

membros. Ora, essa coesão constitui um dos objetivos fundamentais da integração.

De facto, o TUE proíbe as cooperações reforçadas nos casos em que elas puserem

em perigo aquela coesão. Não tendo, todavia, a União Europeia os mesmos

mecanismos integradores de uma Federação, ela só deve aceitar as cooperações

reforçadas mesmo em “último recurso”, como vimos ser exigido pelo TUE, evitando-

se que se institucionalize, com caráter mais ou menos definitivo, uma União mais

estreita, ou várias Uniões mais estreitas, dentro de uma União mais diluída.

Princípios constitucionais e valores da União Europeia

Introdução: os princípios constitucionais e valores como elemento nuclear da

Constituição material da União: a União Europeia assenta em alguns princípios fundamentais.

A Constituição material da União Europeia cria a União; define os princípios de base e os valores

que a regem, a ela e aos Estados Membros; aponta-lhe os objetivos; fixa-lhe as atribuições;

disciplina as suas relações com os Estados Membros; dá à União um aparelho orgânico e

institucional para atuar; cria os mecanismos necessários para a interpretação e a aplicação do

Direito da União; regulamenta as fontes formais do Direito da União; salvaguarda os direitos

fundamentais dos cidadãos europeus; estabelece os meios que vão garantir a legalidade

comunitária. O Tratado de Lisboa alargou o conteúdo e o âmbito dessa Constituição material

através da inclusão nela dos “valores da União” (artigo 2.º TUE), e da Carta dos Direitos

Fundamentais da União Europeia, e que, por força de disposição expressa no TUE (artigo 6.º,

n.º1), faz parte integrante deste Tratado. Eles são princípios que, por serem fundamenais do

ponto de vista axiológico, dão corpo, no plano da Filosofia Política e do Direito, Às opções básicas

da União e aos valores que ela escolheu para regerem a sua existência e a sua atividade.

Podemos dizer que eles fazem parte de ordem pública da União. Eles ocupam o lugar cimeiro

entre as fontes de Direito da União, e constituem, portanto, autênticos limites materiais à

revisão dos Tratados da União. Como ius cogens, pode entender-se que a sua violação pelos

tratados gera a nulidade destes, por força do artigo 53.º da Convenção de Viena sobre o Direito

dos Tratados. A importância desses princípios fundamentais em nada fica diminuída pelo facto

de alguns deles serem princípios gerais de Direito. É o caso, por exemplo, dos princípios da

proporcionalidade e da não discriminação. Eles não são apenas princípios, são verdadeiros

valores. Pro serem inerentes às características essenciais e específicas da Ordem jurídica da

União, eles presidem à existência e à atividade da União.

Idem: em especial, os valores da União: o primeiro documento oficial foi a Declaração sobre

a Identidade Europeia, de 14 de dezembro de 1973. Nessa Declaração, os então nove Estados

membros reconheciam a necessidade de as Comunidades afirmarem a sua identidade própria,

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que lhes permitisse exprimirem-se melhor nas suas relações com outros Estados do mundo, bem

como quanto às suas responsabilidades nas grandes questões mundiais. A Declaração de 1973

inspirava-se no Estatuto do Conselho da Europa de 1949. Esse Estatuto afirmava que os Estados

Membros se encontravam «indissoluvelmente vinculados aos valores morais e espirituais que

constituem o património comum dos respetivos povos e que para ele eram, desde logo, os

princípios da liberdade individual, da liberdade política e do primado do Direito, sobre os quais

se funda toda a verdadeira Democracia». O TUE, aprovado pelo Tratado de Maastricht, veio

retomar a referência aos “valores comuns” da União como objetivo a prosseguir pela PESC. O

tratado de Amesterdão manteve essa posição. O Tratado de Nice não trouxe qualquer

modificação ao referido artigo 11.º, n.º1, 1.º travessão, TUE. Pelo artigo 2.º do TUE após o

tratado de Lisboa. Os valores aí definidos são os seguintes: o respeito pela dignidade da pessoa

humana, a democracia, a liberdade, a igualdade, o Estado de Direito, o respeito pelos Direitos

do Homem, inclusive pelos direitos de pessoas pertencentes a minorias. Para o Tratado, esses

valores têm de ser comuns a todos os Estados membros, numa sociedade caracterizada pelo

pluralismo, pela não discriminação, pela tolerância, pela justiça, pela solidariedade e pela

igualdade entre homens e mulheres. Sublinhe-se que a circunstância de esses valores serem

assumidos, de modo expresso, não apenas como valores da União mas também como valores

“comuns aos Estados membros”, assume uma enorme relevância. Isso quer dizer que,

independentemente da União como uma pessoa jurídica autónoma, os Estados membros se

comprometem a respeitar esses valores na sua ordem interna e nas suas relações entre si e com

a União. Note-se que, se o artigo 2.º ganha a importância pelo facto de enunciar os valores que

o Tratado quis impor à União, o 2.º considerando do preâmbulo do Tratado: ele obriga os

Estados a “inspirarem-se” no “património cultural, religioso e humanista da Europa, de que

emanam os valores universais que são os direitos invioláveis e indeclináveis da Pessoa Humana,

bem como a liberdade, a democracia, a igualdade e o Estado de Direito”. Com esta redação, o

preâmbulo do Tratado é muito mais ambicioso e abrangente do que o artigo 2.º,

particularmente quando reconhece que esta tem um património comum de índole cultural,

religioso e humanista, que a União deve respeitar e ao qual ela tem de ser fiel. Neste aspeto, o

TUE inspira-se no 2.º considerando do preâmbulo da Carta dos Direitos Fundamentais da União.

Idem: a relevância jurídica dos valores da União: a enunciação dos valores referidos no

artigo 2.º não é meramente programática: eles obrigam a União, como, logo a seguir, estabelece

o artigo 3.º, n.º1 TUE. A sua violação grave e persistente, ou o mero risco manifesto da sua

violação grave, por um Estado membro, pode acarretar para ele a aplicação das sanções

previstas no artigo 7.º, n.º1 e 2 TUE. Particular destaque concede o TUE, de modo enfático, à

sujeição da ação da União na cena internacional aos valores referidos (artigos 3.º, n.º5; 21.º,

n.º2, alínea a) e artigo 32.º, §1.º TUE). Quanto à força jurídica dos valores da União há duas

observações a fazer. A primeira é a de que temos quanto a isso que atender ao que dispõe o

TUE no seu artigo 3.º, n.º1. De facto, aquele preceito impõe à União a promoção dos valores da

União. Isto quer dizer que estes constituem «parte da substância intrínseca» da União. Ou seja,

os valores da União impõem-se a esta como Direito imperativo. Fazem parte do ius cogens da

União. A segunda observação é a de que ao inscreverem no TUE que os valores são «comuns

aos Estados membros”, os Estados signatários do Tratado de Lisboa comprometeram-se a

conformar a sua Ordem Jurídica interna, bem como a sua prática política, com esses valores».

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A Cidadania da União Europeia

Origem e significado: o TUE veio impor à União o objetivo do «reforço da defesa dos direitos

e dos interesses dos nacionais dos seus Estados membros, mediante a instituição de uma

cidadania da União». Por conseguinte, o Tratado de Maastricht veio incluir no Tratado CE “A

cidadania da União”. O facto de os Tratados se terem começado a preocupar com a cidadania

da União a partir do TUE constituiu um boom sinal da intenção desse Tratado de inocular na

integração uma forte componente social e humanista, deixando a integração de ser concebida

como um processo quase exclusivamente económico.

Natureza e valor jurídico da União: o artigo 20.º, n.º1, TFUE, depois de nos dizer que «é

instituída a cidadania da União», acrescenta o seguinte: «(…) É cidadão da União qualquer

pessoa que tenha a nacionalidade de um Estado membro. A cidadania da União acresce à

cidadania nacional e não a substitui». A cidadania da União era conferida pelo facto de um dado

indivíduo ter a nacionalidade de qualquer dos Estados membros, isto é, não lhe advinha

separada e autonomamente. Ou seja, o Estado Membro, ao determinar, no exercício da sua

soberania, quem é seu nacional, era ele que também estava a dizer quem era cidadão da União.

Em termos jurídicos, estrangeiros serão cidadãos de Estados terceiros que não têm nenhuma

nacionalidade em comum com os cidadãos portugueses. Os cidadão dos outros Estados

membros da União, conjuntamente com os cidadãos portugueses, têm de ser tratados pelo

nosso Direito como cidadãos da União ou cidadãos comunitários, nunca como estrangeiros,

porque têm em comum a cidadania da União, embora com o valor jurídico que esta tem.

Os direitos reconhecidos no âmbito da cidadania da União:

1. O direito de circular e permanecer: o primeiro direito do cidadão da União é o de «circular

e permanecer livremente no território dos Estados membros» (artigos 2.º, n.º2, alínea a) e

21.º TFUE). Com o TUE, o direito de permanecer no espaço da União não depende do

exercício de uma atividade económica e vale par qualquer atividade. Podemos dizer que

ele se transformou num direito pessoal ou num direito civil. Este direito subdivide-se em

dois: o direito de circular pelos Estados membros e o direito de permanecer, inclusive o de

residir, em algum ou alguns deles. Compete ao Parlamento e ao Conselho, ou só ao

Conselho definir as condições de exercício desse direito, podendo eles, para o efeito, se for

necessário, adotar as medidas previstas no artigo 21.º, n.º2 e 3 TFUE.

2. O direito de eleger e ser eleito: o segundo dos direitos incluídos na cidadania da União

consta dos artigos 20.º, n.º2, alínea b) e 22.º TFUE: o direito de eleger e ser eleito nas

eleições para o Parlamento Europeu e nas eleições municipais do Estado de residência, nas

mesmas condições em que o podem fazer os nacionais desse Estado. Para alguns Estados,

este direito trouxe pouco de novo; outros tiveram que rever as respetivas Constituições

para acolher este direito: foi o que fez Portugal quanto ao atual artigo 15.º, n.º4 e 5 da

Constituição.

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3. O direito à proteção de autoridades diplomáticas e consulares: o terceiro direito conferido

ao cidadão da União é o de poder requerer, no território de Estado terceiros em que o

Estado membro de que é nacional não se encontre representado, proteção da parte de

autoridades diplomáticas e consulares de qualquer outro Estado membro, nas mesmas

condições dos nacionais desse Estado (artigos 20.º, n.º2, alínea c) e 23.º TFUE). Este direito

beneficia especialmente os nacionais dos Estados membros que têm poucas

representações diplomáticas e consulares em Estados terceiros, particularmente em

pequenos Estados, ou em Estados longínquos e que, desta forma, podem beneficiar, nesses

Estados terceiros, da proteção diplomática e consular de Estados membros como o Reino

Unido, a França e a Alemanha, que se encontram representados por embaixadas em quase

todos os Estados da Comunidade Internacional.

4. O direito de iniciativa popular: este importante direito foi criado pelo Tratado de Lisboa e

consta do artigo 11.º, .n.º4 TUE. Ele consiste no direito reconhecido aos cidadãos da União,

em número igual ou superior a um milhão, e desde que sejam cidadãos de um “número

significativo” de Estados membros, de tomarem a iniciativa de convidar a Comissão

Europeia, dentro da sua competência, a apresentar uma proposta adequada sobre

questões para as quais eles entendam que é necessário um ato jurídico da União para se

cumprirem os Tratados. As condições de exercício deste direito encontram-se reguladas no

artigo 24.º, §1 TFUE. Aí se prevê o modo como se determinará o número mínimo de Estados

aos quais devem pertencer os cidadãos que queiram exercer este direito. Este direito dá

corpo ao princípio da democracia participativa, ao pretender associar diretamente os

cidadãos da União ao exercício do poder na União.

5. O direito de se dirigir a qualquer órgão ou instituição da União: também este direito foi

criado pelo Tratado de Lisboa. Ele consta dos artigos 20.º, n.º2, alínea d), 3.ª parte , e 24.º,

§4 TFUE. Ele confere aos cidadãos da União a faculdade de se dirigirem, em qualquer das

línguas dos Tratados, aos órgãos referidos nos n.º1 a 4 do TUE, sobre qualquer assunto da

respetiva competência, e de receberem, uma resposta escrita, na mesma língua.

6. O direito de petição ao Parlamento Europeu: o Tratado CE estabelece, no quadro da

cidadania da União, os dois direitos de natureza predominantemente adjetiva, ou

instrumental, ou procedimental. O primeiro deles consta do artigo 20.º, n.º2, alínea d), 1.ª

parte TFUE. Consiste no direito de petição ao Parlamento Europeu. O objeto deste direito,

bem como os termos do seu exercício, encontram-se regulados no artigo 227.º TFUE. O

direito de petição pode incidir «sobre qualquer questão que se integre nos domínios de

atividade da União e lhe (ao peticionário) diga diretamente respeito».

7. O direito de queixa ao Provedor de Justiça: o outro direito de natureza adjetiva traduz-se

na queixa ao Provedor de Justiça. Ele está previsto no mesmo artigo 20.º, n.º2, alínea d),

mas na 2.ª parte, TFUE. O exercício desse direito está disciplinado no artigo 228.º TFUE,

merecendo referência especial o seu objeto: ele pode dizer respeito à violação do dever de

boa administração (casos de má administração) na atuação de instituições, órgãos e

organismos da União, com exceção do Tribunal de Justiça da União Europeia quando este

atue no exercício das suas funções jurisdicionais.

A extensão desses direitos: resta um ponto importante a sublinhar quanto aos direitos: é o

da extensão desses direitos. Este problema tem de ser estudado em dois planos: o da extensão

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subjetiva dos direitos e o da sua extensão material. Alguns dos direitos estudados – o de livre

circulação e permanência, inclusive residência, o de petição ao Parlamento Europeu e o de

queixa ao Provedor de Justiça – não são exclusivos dos cidadãos da União. No que diz respeito

ao primeiro desses direitos, ele foi estendido a alguns familiares dos cidadãos da União, mesmo

que eles, por não terem a nacionalidade de qualquer dos Estados membros da União, não

possam ser considerados, eles próprios cidadãos da União. Essa extensão encontra hoje

cobertura no artigo 45.º, n.º2 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE) e

é perfeitamente compreensível porque, pretendendo reagrupar as famílias, visa preservar a sua

unidade e estabilidade. Por seu lado, o direito de petição e o direito de queixa foram

reconhecidos em função, não só do estatuto a cidadania da União, como também da residência

ou da sede estatutária no espaço da União, pelo que gozam daqueles direitos tanto os cidadãos

da União, mesmo que não residam no território da União, como também qualquer pessoa

jurídica que resida ou tenha a sua sede estatutária naquele território, mesmo que não seja

cidadão da União. Hoje a extensão desses dois direitos é levada a cabo pelos artigos 43.º e 44.º

da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Passemos agora à extensão material dos

direitos. A cidadania da União não se esgota nos direitos tipificados nos artigos 20.º a 24.º TFUE

e 11.º, n.º4 TUE. De facto, o artigo 25.º TFUE vem permitir ao Conselho, respeitado que seja o

procedimento aí previsto, aprove as disposições destinadas «a aprofundar os direitos». Por

«aprofundamento» dos direitos deve ser entendido, não apenas o enriquecimento do conteúdo

dos direitos referidos nos citados artigos dos Tratados TUE e TFUE, como também a criação de

novos direitos que derivem diretamente daqueles. Note-se, todavia, que, de harmonia com a

parte final do citado artigo 25.º TFUE, essas disposições só entrarão em vigor depois de elas

terem sido aprovadas pelos Estados membros em conformidade com as respetivas regras

constitucionais, o que não acontece com o núcleo central dos direitos de cidadania acima

estudados e que vinculam os Estados por força direta dos Tratados.

Os deveres incluídos na cidadania da União: o artigo 20.º, n.º2 TFUE, estabelece que o

estatuto da cidadania da União se desdobra em direitos e deveres. Contudo, tanto as quatro

alíneas desse n.º2 como os artigos 21.º a 24.º TFUE e o artigo 11.º, n.º4 TUE, só enuncia, os

direitos incluídos na cidadania. O Tratado esquece-se, pois, dos deveres dos cidadãos da União.

A Proteção dos Direitos Fundamentais na União Europeia

A proteção dos direitos fundamentais no início da integração europeia:

1. Os direitos fundamentais no início da integração europeia: a ideia de salvaguarda e da

proteção dos direitos fundamentais encontra-se presente no processo da integração

europeia desde o seu início. É certo que não constava dos Tratados institutivos das três

Comunidades, na sua versão original, nenhum preceito específico sobre a matéria. Mas do

silêncio dos Tratados não era legítimo concluir-se que já nesse período de lançamento e

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criação das Comunidades a salvaguarda dos direitos fundamentais fosse ignorada pelos

fundadores da integração. Várias razões leva-nos a defender esta posição. Primeiro, O

Plano Schuman, de 1950, anunciava como objetivo da integração europeia, como vimos, «a

paz e a liberdade» e o «progresso económico e social». Depois, os Tratados institutivos das

três Comunidades vieram a adotar, como núcleo essencial do sistema jurídico comunitário,

as «quatro liberdades»: as liberdades de circulação de mercadorias, pessoas, serviços e

capitais. A essas quatro liberdades podia, em bom rigor, ser acrescentada, ainda na versão

inicial dos Tratados CECA, CEE e CEEA, uma quinta liberdade: a liberdade de concorrência.

Em terceiro lugar, vários preceitos dos Tratados institutivos reconheciam, logo no início,

importantes direitos fundamentais aos cidadãos dos Estados membros: a livre iniciativa

privada e a não discriminação em razão da nacionalidade, o direito de petição, e o direito

ao sigilo profissional. Por seu lado, os Tratados reconheciam aos lesados o direito à

reparação dos danos causados pelas Comunidades no quadro da sua responsabilidade

extracontratual.

2. A construção pela jurisprudência comunitária da proteção dos direitos fundamentais: o

estado atual da jurisprudência da União resume-se no seguinte excerto «(…) os direitos

fundamentais fazem parte integrante dos princípios gerais de Direito, cujo respeito cabe ao

Tribunal assegurar. Ao garantir a salvaguarda desses direitos, o Tribunal está obrigado a

inspirar-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados Membros de ta forma que não

são admitidas nas Comunidades medidas incompatíveis com os direitos fundamentais

reconhecidos pelas Constituições desses Estados. Os instrumentos internacionais relativos

À proteção dos Direitos do Homem aos quais os Estados membros aderiram ou com os quais

têm cooperado podem também fornecer indicações que convém tomar em conta no quadro

do Direito Comunitário». Ou seja, para o TJ o âmbito dos direitos fundamentais que o

Direito da União tem de salvaguardar, forma um sistema global e coerente, e é ditado pelas

tradições constitucionais comuns aos Estados membros e por todos os instrumentos

internacionais sobre Direitos do Homem nos quais os Estados membros sejam parte.

A proteção dos direitos fundamentais após o Tratado da União Europeia: só com o

Tratado da União Europeia e que o Direito Comunitário Originário viria a ter uma norma escrita

e expressa sobre a salvaguarda dos direitos fundamentais. O TUE acolhia e codificava, no

essencial, a jurisprudência comunitária sobre a matéria. No que diz respeito particularmente à

Convenção Europeia dos Direitos do Homem, referida no citado artigo F, n.º2, na redação de

Maastricht, havia sido especialmente discutido o modo como a Ordem Jurídica da União passaria

a encarar a CEDH: muito concretamente, se a União Europeia deveria aderir Àquela Convenção,

o que, por mais de uma vez, as Comunidades se haviam recusado a fazer. Também aqui foi então

entendido manter-se a posição até à data seguida pelo TJ, ou seja, a posição segundo a qual o

TUE passaria a afirmar, de forma expressa, que a CEDH vigorava na Ordem Jurídica da União

como um conjunto de princípios gerais de Direito Comunitário, mas ficando excluída a adesão

da União àquela Convenção.

A proteção dos direitos fundamentais no Tratado da União Europeia após o Tratado

de Amesterdão:

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1. Introdução: o Tratado de Amesterdão veio reforçar profundamente a proteção dos direitos

fundamentais na União Europeia.

2. O novo artigo 6.º, n.º1, do Tratado EU: em primeiro lugar, afirmando o princípio do respeito

pelos direitos fundamentais como princípio constitucional da União. De facto, a redação

totalmente nova do artigo 6.º, n.º1, TUE, levou este a dispor o seguinte:

«1. A União assenta nos princípios da liberdade, de democracia, do respeito

pelos direitos do Homem e pelas liberdades fundamentais, bem como do

Estado de Direito, princípios que são comuns aos Estados membros».

3. A garantia dos diretos reconhecidos no artigo 6.º, n.º2, Tratado EU: segundo o artigo 6.º,

n.º2 TUE, os direitos fundamentais expressamente acolhidos pela União nessa disposição

concreta passavam agora a estar sujeitos ao controlo do Tribunal de Justiça. Assim, vinha

dispor, de forma expressa, o artigo 46.º, na sua alínea d). Com essa alteração trazida pelo

artigo 46.º, alínea d), chegava-se a um triplo objetivo. Por um lado, passava a ter

fundamento no próprio Tratado a fiscalização pelo TJ do respeito pelos direitos

fundamentais pela União e pelas Comunidades. Dava-se, dessa forma, acolhimento

expresso à doutrina, segundo a qual «o respeito pelos direitos do Homem constitui (…) uma

condição da legalidade dos atos comunitários». Por outro lado, punha-se termo a uma

situação absurda, que fora criada pelo Tratado de Maastricht, e que podia ser interpretada

como uma subtração ao controlo do TJ da proteção dos direitos fundamentais tal como ela

já decorria até então da própria jurisprudência daquele Tribunal. Por fim, ao se alargar, por

via do novo artigo 46.º, alínea d), a fiscalização judicial da conformidade dos atos da União

e das Comunidades com os direitos fundamentais a que refere o artigo 6.º, n.º2, punha-se

termo à preocupação dos Estados membros, que, pelo Tratado de Maastricht, tinham

transferido para a União poderes soberanos seus em matéria de direitos fundamentais.

4. O novo artigo 49.º, §1, do Tratado EU: a terceira matéria em que o Tratado de Amesterdão

veio inovar em relação ao texto inicial do TUE foi a constante do seu novo §1 do artigo 49.º.

Passou a exigir-se que um Estado para aderir À União «respeite os princípios enunciados no

artigo 6.º, n.º1».

5. O novo artigo 7.º do Tratado EU: a quarta alteração introduzida pelo Tratado de

Amesterdão no TUE do domínio da proteção dos direitos fundamentais consistiu na

introdução do novo artigo 7.º TUE. Esse preceito permitia ao Conselho, se este concluísse

que um Estado membro, de algum dos princípios enunciados no n.º1 do artigo 6.º TUE,

aplicar ao Estudo em questão a sanção da suspensão de «alguns dos direitos decorrentes

da aplicação do Tratado ao Estado membro em causa, incluindo o direito de voto» desse

Estado no Conselho. O não respeito por qualquer daqueles princípios podia desse modo,

afetar a participação plena do respetivo Estado na União. Esses n.º1 e 2 disciplinavam o

procedimento administrativo de aplicação dessa sanção. Ele iniciava-se com a audiência do

Estado visado. Finda esta, o Conselho, reunido a nível de Chefes de Estado e de Governo, e

respeitado o procedimento regulado no n.º1 do artigo, poderia deliberar, se fosse o caso,

que existia a referida violação. Essa deliberação teria de ser tomada por unanimidade, para

a qual não contava o voto do Estado visado e as abstenções não valiam como voto negativo.

Uma vez aprovada essa deliberação, o Conselho, por maioria qualificada, podia aplicar a

Estado em causa a sanção prevista no n.º2 do referido artigo 7.º. Uma vez decidida, a

sanção podia ser alterada ou revogada nos termos previstos no n.º3 do mesmo artigo.

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6. Os direitos sociais: o quinto domínio onde o Tratado de Amesterdão introduziu alterações

em matéria de direitos fundamentais consistiu no acolhimento, de forma expressa pelo TUE,

dos direitos sociais. De facto, no novo considerando 4.º do preâmbulo do TUE acrescentado

pelo Tratado de Amesterdão, os Estados haveriam confirmado «o seu apego aos direitos

sociais, fundamentais, tal como definidos na Carta Social Europeia, assinada em Turim, em

18 de outubro de 1961, e na Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos

Trabalhadores, de 1989». Este acolhimento da Carta Social Europeia e da Carta Comunitária

dos Direitos Sociais pelo TUE, ainda que nas condições limitadas em que ocorreu, devia ser

entendido como englobando todos os direitos sociais nelas assegurados, alguns dos quais

se encontravam elencados no artigo 136.º, §1 TCE, e, como tal, vinha reforçar

profundamente a dimensão social da integração europeia. Todavia, a não referência

àqueles textos no artigo 6.º, n.º2 TUE, impedia o controlo jurisdicional do respeito por

aqueles direitos.

7. Os direitos fundamentais e o espaço de liberdade, segurança e justiça: o Tratado de

Amesterdão também veio reforçar a proteção dos direitos fundamentais através do

alargamento da competência do TJ no domínio da justiça e dos assuntos internos, por fora

dos artigos 46.º, alínea b), e 35 TUE. A comunitarização de parte do terceiro pilar, isto é, a

integração no pilar comunitário de parte do terceiro pelar (ou seja, da cooperação nos

domínios da justiça e dos assuntos internos) veio estabelecer uma relação direta entre essa

matéria e a liberdade de circulação de pessoas, de forma a se poder alcançar «um espaço

de liberdade, de segurança e de justiça».

A proteção dos direitos fundamentais no Tratado da União Europeia após o Tratado

de Nice: o Tratado de Nice preocupou-se pouco com a questão dos direitos fundamentais.

Mesmo assim, merecem referência duas inovações importantes que aquele Tratado trouxe. A

primeira consistiu na introdução de um novo n.º1 no artigo 7.º TUE. Enquanto que, na versão

inicial, aquele artigo, nos seus n.º1 e 2, possibilitava a aplicação de sanções a um Estado membro

apenas em caso de «uma violação grave e persistente» por parte do Estado, de algum dos

princípios enunciados no artigo 6.º, n.º1, TUE, ele, com a revisão de Nice, no seu novo n.º1,

permitia a verificação da existência «de um risco manifesto de violação grave» de qualquer

daqueles princípios. Na situação do referido «risco manifesto de violação grave», ao Estado

membro em causa apenas podiam ser dirigidas «recomendações apropriadas», conforme

dispunha o novo artigo 7.º, n.º1, e respeitado que fosse o procedimento aí regulado, prévio

sobre a situação concreta a personalidades independentes. A aplicação das sanções previstas

no artigo 7.º, n.º3, depois da revisão de Nice continuava a só ser possível em caso de violação

consumada e reiterada. Por outro lado, enquanto que para a matéria do artigo 7.º, n.º2,

continuava a ser competente o Conselho reunido a nível de Chefes de Estado e de Governo, e

deliberando por unanimidade, para o efeito do artigo 7.º, n.º1, este contentava-se coma

intervenção do Conselho, e deliberando pela maioria qualificada aí prevista. A segunda inovação,

em matéria de «cooperação económica, financeira e técnica com os países terceiros», veio

estabelecer no novo artigo 181.º-A TCE, no seu n.º1, §2, que «A política da Comunidade neste

domínio contribuirá para o objetivo geral de desenvolvimento e consolidação da democracia e

do Estado de Direito, bem como para o objetivo de respeito pelos direitos humanos e das

liberdades fundamentais».

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A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia: remissão: entretanto, em 7 de

dezembro de 2000, o Parlamento Europeu, o Conselho e a Comissão, através de uma primeira

Proclamação conjunta, aprovaram a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A

União passava, dessa forma, a ter finalmente, em forma escrita, o seu próprio rol de direitos

fundamentais.

A proteção dos direitos fundamentais na União Europeia após o Tratado de Lisboa:

1. Introdução: o Tratado de Lisboa veio aprofundar sensivelmente o grau de proteção e

salvaguarda dos direitos fundamentais até então vigentes no Direito da União Europeia.

Erguendo o respeito pelos direitos fundamentais a valor da União, no artigo 2.º TUE;

alargando substancialmente o elenco dos direitos protegidos na Ordem Jurídica da União;

e dando à União o seu catálogo próprio de direitos fundamentais, que, do ponto de vista

jurídico, está incluído nos Tratados, e que não exclui todas as outras fontes que até então

eram reconhecidas como fontes do Direito a União sobre direitos fundamentais.

2. O respeito pelos direitos fundamentais como valor da União: até ao Tratado de Lisboa, e

desde o TUE, o respeito pelos direitos fundamentais já fazia parte da Constituição material

da União. De facto, o respeito pelos direitos fundamentais é erguido a alor em que se funda

a União – di-lo o já nosso conhecido artigo 2.º TUE. E isso é obtido quer pela referência

expressa ao respeito pelos direitos fundamentais, quer através da referência a outros

valores aí enunciados. E refira-se que todos esses valores não são apenas valores da União,

são «valores comuns» a todos os Estados membros. Esse respeito projeta-se em toda a

ação externa da União, na medida em que ele deve ser afirmado e prosseguido por esta

nas suas relações com todo o mundo. Isso é, de modo muito claro, imposto pelos artigos

3.º, n.º5, e 21.º, n.º1 TUE.

3. O novo elenco dos direitos reconhecidos: o Tratado de Lisboa também ampliou o âmbito

dos direitos fundamentais reconhecidos pelo Direito da União. Estes passaram a ter as

seguintes fontes:

a. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (artigo 6.º, n.º1, TUE);

b. Em segundo lugar, a CEDH e as tradições constitucionais comuns aos Estados

membros (artigo 6.º, n.º3 TUE). Atualmente, estabelece o artigo 6.º, n.º3, TUE, que

eles fazem parte do Direito da União «enquanto princípios gerais».

c. Além disso, o Tratado de Lisboa resolveu incluir esparsamente, ao longo dos tratados

TUE e TFUE, alguns direitos e grupos de direitos, mesmo para além daqueles que se

encontram diretamente integrados na cidadania da União, enunciados nos artigos

9.º e seguintes TUE, e dos que constam, de alguma forma , da Carta. Dentro desses

direitos merecem destaque: os direitos das pessoas pertencentes a minorias (artigo

2.º TUE), a igualdade entre homens e mulheres (artigo 3.º, n.º3, §2 TUE), os direitos

da criança (artigo 3.º, n.º3, §2 e 5 TUE), os direitos sociais elencados no artigo 9.º

TFUE, o direito à não discriminação (artigo 10.º TFUE), o direito ao ambiente e ao

desenvolvimento sustentável (artigo 12.º TFUE), o direito das igrejas, associações e

comunidades religiosas, bem como das organizações filosóficas e não confessionais

dos Estados membros, à sua identidade e ao seu estatuto político (artigo 17.º TFUE),

etc.

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4. Os direitos fundamentais e o espaço de liberdade, segurança e justiça: a ideia que preside

a este sistema é sempre, a de se encontrar um permanente equilíbrio entre liberdade e

segurança, de tal modo que esses dois pólos de harmonizem e se completem em vez de um

deles se sacrificar ao outro, ou seja, em vez de a liberdade ameaçar a segurança ou de esta

pôr em perigo a liberdade. Nesse sentido, merecem ser destacados os novos artigos 3.º,

n.º1 e 2 TUE, e 67.º TFUE quanto ao espaço de liberdade, segurança e justiça. Tem que se

conceder relevância à ênfase que os artigos 3.º, n.º2 TUE e 67.º, n.º1 TFUE põem na

necessidade de se respeitar os direitos fundamentais na condução e na gestão do espaço

de liberdade, segurança e justiça. Os n.º2 e 4 do artigo 61.º TFUE desenvolvem e

pormenorizam essa ideia, pondo especial destaque na necessidade de se proteger de forma

“equitativa” os nacionais de Estados terceiros e equiparando a eles os apátridas.

5. As alterações introduzidas no artigo 7.º do Tratado EU: o artigo 7.º TUE sofreu algumas

alterações com o Tratado de Lisboa. Elas podem resumir-se no seguinte: o risco de violação

dos princípios é agora referido aos valores do artigo 2.º TUE; no quadro do previsto no n.º1,

o Conselho passa a poder dirigir recomendações ao Estado em falta; houve alterações de

índole institucional no procedimento previsto, no n.º2, a mais importante das quais

consistiu na substituição do Conselho pelo Conselho Europeu; o n.º5 do artigo alterou de

modo significativo as regras de votação aplicáveis ao caso. Mas a mais importante das

alterações introduzidas na matéria consistiu na atribuição pelo novo artigo 269.º TFUE de

competência ao TJ para conhecer da legalidade dos atos praticados ao abrigo do artigo 7.º

TUE.

A Agência de Direitos Fundamentais da União Europeia: esta Agência foi criada em 2007

pelo Regulamento CE n.º 168/2007 do Conselho de 15 fevereiro. Ela visa apenas fornecer aos

órgãos e Às instituições da União, bem como aos Estados membros, quando apliquem Direito

da União, informações «objetivas, fiáveis e comparáveis», e dar-lhes apoio com vista a se

respeitar totalmente os direitos fundamentais reconhecidos pelas referidas fontes. A Agência

tem personalidade jurídica própria. Ela deve cooperar estreitamente com o Conselho da Europa,

com as organizações não governamentais (ONG) e, de uma maneira geral, com a sociedade civil.

A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

A elaboração da Carta: a Convenção tinha uma composição quadripartida: numa Europa de

Quinze, ela era composta por representantes dos Chefes de Estados e de Governo, do

Parlamento Europeu, dos Parlamentos nacionais e por um representante do Presidente da

Comissão Europeia. Tinha, portanto, ao todo, 62 membros. Com o estatuto de observadores

permanentes, com direito ao uso da palavra, participaram nela dois representantes do Conselho

da Europa, e um Juiz e um Advogado Geral do Tribunal de Justiça.

A caracterização da Carta na sua fase inicial: não houve acordo na Convenção para que à

Carta fosse dado um efeito vinculativo para os seus destinatários, sem prejuízo do que a esse

respeito se dirá adiante, o que desde logo inviabilizou a inclusão do texto da Carta no TUE. Como

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tal, a Carta não se limitava a valer como uma mera declaração política, despida de valor jurídico,

mas reconheçamos que a sua força jurídica era fraca.

A evolução da Carta até ao Tratado Constitucional: A Convenção sobre o Futuro da Europa

quis resolver depressa, e em definitivo, o problema do estatuto jurídico da Carta e, sobretudo,

o seu grau hierárquico nas fontes de Direito da União.

O conteúdo da Carta. Em especial, os direitos nela reconhecidos:

1. A importância do conteúdo da Carta: a Carta constitui, no plano internacional, o mais

ambicioso e o mais elaborado texto jurídico sobre Direitos da Pessoa. E por várias razões.

Em primeiro lugar, porque é o primeiro texto que compila, simultaneamente, direitos civis,

políticos, sociais, culturais e económicos. Em segundo lugar, o arrolamento dos direitos pela

Carta encontra-se, logo à partida, valorizado pelo facto de os direitos fundamentais serem

apresentados como emanação de valores chave, que se encontram vertidos, cada um deles,

numa única palavra, e de forma muito expressiva, que ultrapassa largamente a já gasta e

ultrapassada trilogia da Revolução Francesa, da Liberdade – Igualdade – Fraternidade:

referimo-nos aos valores da dignidade, das liberdades, da igualdade, da solidariedade, da

cidadania e da justiça. Mais do que serem vistos como um modo de agrupar e aglutinar os

direitos reconhecidos pela Carta, esses valores têm de passar a ser considerados como

valores básicos de todo o ordenamento jurídico da União, reconduzíveis aos valores

enunciados no artigo 2.º do TUE. Em terceiro lugar, é certo que a Carta, logo no seu

preâmbulo afirma a sua função codificadora e enuncia até as fontes onde foi buscar os

direitos por ela reconhecidos. Isto significa que a Carta nasceu com o intuito muito

ambicioso de codificar os direitos consagrados nos referidos textos das Nações Unidas, na

DEDH e nos seus Protocolos, nos Tratados da União e das Comunidades, na jurisprudência

quer do TJ, quer do TEDH, e nas tradições constitucionais comuns dos Estados membros.

Todavia, nessa função codificadora, a Carta fornece respostas às exigências atuais da

proteção dos Direitos da Pessoa, ao acolher, ao lado dos direitos clássicos, os direitos

“novos” e até “novíssimos”. Por fim, a Carta reconhece direitos apenas aos nacionais dos

Estados membros mas, sim, a todas as pessoas sujeitas à sua jurisdição. É assim que deve

ser interpretado o 7.º considerando do seu preâmbulo. Todavia, dessa extensão subjetiva

têm de ficar excluídos os direitos que a própria Carta prende à cidadania da União e que,

pelo seu texto, estão reservados aos cidadãos da União: é o caso dos direitos referidos nos

artigo 39.º, 40.º e 46.º da Carta.

2. Os direitos reconhecidos pela Carta:

- no artigo 1.º, a menção da dignidade do ser humano como um direito fundamental

autónomo e como absolutamente inviolável;

- no artigo 2.º, n.º2, a proibição absoluta da pena de morte e da execução;

-- no artigo 3.º, a consagração do direito à integridade, física e mental, do ser humano,

que impõe o respeito pelas exigências enunciadas no n.º2 desse artigo, inclusive a

proibição absoluta de práticas eugénicas e de clonagem reprodutiva dos seres humanos;

- no artigo 5.º, n.º3, a proibição do tráfico de seres humanos;

- no artigo 6.º, o direito de todos “à liberdade e à segurança”;

- no artigo 7.º, o reconhecimento do direito ao respeito pela vida privada e familiar;

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- no artigo 8.º, o reconhecimento do direito `proteção de dados pessoais;

- no artigo 9.º, a menção ao direito de contrair casamento e de constituir família;

- no artigo 10, n.º2, a previsão do direito à objeção de consciência;

- no artigo 11.º, n.º2, a garantia do respeito pela liberdade e pelo pluralismo dos meios

de comunicação social;

- no artigo 12.º, a previsão da liberdade de reunião pacífica e de associação;

- no artigo 13.º, o reconhecimento da liberdade no campo artístico, no da investigação

científica e no da “liberdade académica”;

- no artigo 14.º, a previsão do direito à formação profissional e contínua e o direitos dos

pais de assegurarem a formação e o ensino dos filhos em plena liberdade;

- no artigo 15.º, n.º1, o reconhecimento do direito de trabalhar e de exercer uma

profissão que tenha sido livremente escolhida ou aceite, e, no n.º3, a garantia, em

matéria de condições de trabalho, do princípio da igualdade entre nacionais de Estados

terceiros e de Estados da União;

- no artigo 16.º, a menção da liberdade de empresa;

- no artigo 17.º, a exigência, em caso de expropriação por utilidade pública, de “justa

indemnização”;

- no artigo 18.º, a previsão do direito de asilo;

- nos artigos 20.º, 21.º, e 23.º, por um lado, uma ampla complementariedade entre a

igualdade e a não discriminação;

- no artigo 24.º, o reconhecimento às crianças de um direito ao bem estar. Este direito

tem de ser completado com a proibição do trabalho infantil e da exploração económica

dos jovens, constante do artigo 32.º;

- no artigo 25.º, a concessão às pessoas idosas do direito “a uma existência condigna e

independente”;

- no artigo 26.º, o reconhecimento aos deficientes do sue direito à autonomia, à

integração e à participação na vida social;

- nos artigos 28.º e 30.º, a concessão aos trabalhadores do direito à negociação coletiva

e, se for caso disso, do direito à greve, bem como da proteção contra os despedimentos

sem justa causa;

- no artigo 31.º, n.º1, o reconhecimento aos trabalhadores de condições de trabalho

saudáveis, seguras e dignas;

- no artigo 32.º a previsão de proteção especial para os jovens no trabalho;

- no artigo 33.º, a garantia de proteção plena à família, do direito de todos poderem

conciliar a vida familiar e a vida profissional e do reforço da proteção da maternidade

da paternidade;

- no artigo 34.º, n.º1, a garantia do “direito de acesso” às prestações de segurança social

e aos serviços sociais aí previstos, embora se conceda relevância na matéria aos Direitos

Nacionais; e, no n.º3, o reconhecimento do direito a uma assistência social que assegure

uma existência condigna especialmente aos mais carenciados;

- no artigo 35.º, a previsão de um elevado nível de proteção da saúde humana;

- no artigo 37.º, o reconhecimento da necessidade de se promover um elevado nível de

proteção do ambiente;

- no artigo 38.º, o reconhecimento de um elevado nível de defesa dos consumidores;

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- no artigo 41.º, a previsão do direito a uma boa administração, o que vai muito para

além do dever imperfeito de boa administração;

- no artigo 42.º, o reconhecimento a todo o cidadão da União e a toda a pessoa, singular

ou coletiva, residente na União, do direito de acesso a documentos de todos os órgãos

e instituições ou quaisquer organismos da União;

- no artigo 47.º, o reconhecimento de um amplo direito de acesso a a qualquer tribunal,

para se fazer valer quaisquer direitos subjetivos reconhecidos pelo Direito da União;

- no artigo 49.º, n.º1, a permissão de aplicação retroativa da lei que preveja uma pena

mais leve e, no n.º3, a imposição da proporcionalidade das penas em relação aos crimes;

- no artigo 50.º, a extensão da proibição do princípio ne bis in idem, em Direito Penal, a

todo o espaço da União, isto é, a proibição do julgamento ou da punição penal por

delitos pelos quais a pessoa em causa já tenha sido anteriormente julgada ou condenada,

mesmo se por outro Estado da União;

3. O valor jurídico da Carta: quanto ao seu valor jurídico, a Carta suscitou duas questões

importantes e que eram controversas em certos meios jurídicos: a do seu caráter jurídico e

a da sua força obrigatória ou vinculativa. Quanto à primeira questão, queria-se discutir se

a Carta era um ato jurídico ou uma mera declaração política. Quanto à segunda questão,

punha-se em causa se ela obrigava ou se ela, ao contrário constituía um texto meramente

facultativo. Assim, no que toca ao caráter jurídico ou não da Carta, o TUE é claro. Segundo

o já referido artigo 6.º, n.º1, a Carta consiste num catálogo de direitos, liberdades e

princípios que tem o mesmo valor jurídico do Tratado. Ou seja, ela tema força de um

tratado internacional. Por conseguinte, ela consiste num acordo de natureza jurídica. Por

sua vez, quanto à segunda questão, a Carta obrigam nos mesmos moldes em que os

Tratados TUE e TFUE obrigam.

4. Os destinatários da Carta: segundo o já referido artigo 51.º, n.º1, da Carta, esta obriga,

antes de mais, todos os órgãos, as instituições e os organismos da União, no respeito pelo

princípio da subsidiariedade. De qualquer modo, decorre da 2.ª parte do mesmo n.º1 do

artigo 51.º e do n.º2 do mesmo artigo que a aplicação da Carta aos órgãos, às instituições

e aos organismos da União não deve desrespeitar a delimitação vigente das atribuições

entre a União e os Estados membros, nem deve levar à criação de novas atribuições para a

União. Depois, a Carta também se aplica aos Estados membros, mas com uma grande

limitação: só quando eles apliquem o Direito da União. Fora dessa situação os Estados não

estão obrigados pela Carta. Por fim, são destinatários da Carta todas as pessoas que

estiverem sob jurisdição dos Estados membros, salvo quanto aos direitos que, pela sua

natureza, deverão ser considerados como estando intrinsecamente ligados à cidadania da

União, caso em que estes deverão ser reservados a quem goze da referida cidadania da

União.

Problemas específicos da interpretação e da aplicação da Carta:

1. Distinção entre direitos e princípios: ela figura na epígrafe do artigo 52.º e no n.º5 desse

artigo. Explicámos com é que os princípios representam um valor menos protegido do que

os direitos.

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2. Garantia do conteúdo essencial dos direitos: ocupa-se dela o artigo 52.º, n.º1. Isso significa

que, para estarmos perante uma violação de um direito reconhecido pela Carta, basta que

haja interferência na substância daquele direito, sem ser necessário chegar-se ao extremo

da privação ou ablação do direito.

3. As anotações relativas à Carta: o 5.º considerando do preâmbulo bem como o artigo 52.º,

n.º7 da Carta, e o artigo 6.º, n.º1, §3.º TUE, dispõem que os direitos, as liberdades e os

princípios consagrados na Carta devem ser interpretados pelos órgãos jurisdicionais da

União e dos Estados membros. Por um lado, o preâmbulo das Anotações dispõe o seguinte:

«embora não tenham em sii força de lei, constituem um valioso instrumento de

interpretação destinado a clarificar as disposições da Carta». Mas, por outro lado, como se

viu, a Carta, tanto no seu preâmbulo, como no artigo 52.º, n.º7, impõe que na interpretação

daqueles direitos se tenham «na devida conta» as referidas Anotações. Pra, porque o artigo

6.º, n.º1, §1.º TUE, atribui à Carta o mesmo valor jurídico dos Tratados e, porque esse

preceito manda atender a essas Anotações, estas, também elas, acabam por ter a dignidade

e o valor jurídico de preceitos dos Tratados. Todavia, esta diferente sensibilidade para a

natureza e o valor jurídico das Anotações em causa não deve permitir concluir senão que

elas pretendem ajudar o intérprete dos respetivos preceitos a melhor compreender os

pormenores do respetivo conteúdo.

4. O nível mais alto de proteção dos direitos: o artigo 53.º da Cata impõe o grau mais elevado

de proteção para os direitos que a Carta reconhece. E fá-lo do seguinte modo: a Carta

cederá o passo à fonte de Direito que confira, no caso concreto, ao direito em causa, o mais

alto grau de proteção. O princípio fica, deste modo, claramente definido. Dispõe no mesmo

sentido, especificamente quanto à CEDH, o n.º3 do artigo 52.º, e o mesmo regime deve ser

adotado na interpretação do n.º4 daquele artigo, quanto às tradições constitucionais

comuns aos Estados membros.

A Carta e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem: como atrás demonstrámos, a

Carta é largamente subsidiária da CEDH, não apenas porque a tomou como fonte como também

porque a adotou dentro do nível mínimo de interpretação da própria Carta e, por via disso,

dentro do nível mínimo de proteção dos direitos por esta reconhecidos (artigos 52.º, n.º3 e

artigo 53.º).

A adesão da União Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem:

1. O estado da questão antes da Carta: esta questão começou a ser discutida nos anos 70. Ela

foi suscitada por duas razões: na ausência então de um catálogo de direitos fundamentais

das Comunidades, os particulares não tinham, pelos Tratados, acesso direto pleno aos

Tribunais Comunitários para questionarem, em sede de recurso de anulação, os atos dos

órgãos que ofendessem esses direitos. O primeiro problema foi resolvido provisoriamente

pela Jurisprudência do TJ. Por esse meio, como atrás vimos, a CEDH passou a vigorar na

Ordem Jurídica Comunitária pela via dos princípios gerais de Direito Comunitário. O

segundo problema nunca foi resolvido. Como atrás dissemos, o Tratado de Maastricht

incluiu nos Tratados, pela primeira vez, a vinculação da União e das comunidades à CEDH,

mas, outra vez, pela via dos princípios gerais de Direito Comunitário. Os Tratados de

Maastricht, de Amesterdão e de Nice não se comprometeram com a adesão da União e das

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Comunidades E CEDH. Pelo contrário, os artigo 6.º, n.º1, TUE, depois do Tratado de

Maastricht, e 6.º, n.º2 TUE, depois das revistas de Amesterdão e Nice, não incluíram

qualquer referência à adesão à CEDH. O obstáculo que se via à adesão era o de que os

Tratados não reconheciam Às Comunidades e à União atribuições em matéria de direitos

fundamentais. Por isso, estas não podiam aderir à CEDH, nem ̈ mesmo podiam aprovar uma

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia sem prévia revisão dos Tratados que o

permitissem.

2. Os argumentos contra a adesão: na esteira do Tratado Constitucional, o Tratado de Lisboa,

incluiu no TUE uma obrigação para a União de Aderir a CEDH. Segundo esses autores, as

dificuldades jurídicas com que a adesão se defrontava eram as seguintes: não é possível

nem é conveniente sujeitar a União À dupla jurisdição do TJUE e do TEDH; a aplicação da

CEDH como lex scripta vai fazer submeter a União ao Direito Internacional numa matéria

muito sensível, como é a dos direitos fundamentais, o que vai fazer quebrar nessa matéria

a autonomia, a uniformidade e a coesão interna do Direito da União; essa aplicação vai

também trazer para o seio da União o princípio da necessidade de prévia exaustão dos

meios internos, que é exigido pela CEDH, mas que desde os Tratados institutivos das

Comunidades é recusado pelo sistema de garantias contenciosas no seio das Comunidades

e da União. Além disso, para esses autores, a adesão também era desnecessária. Esta

construção tornaria ao TJ pronunciar-se sobre questões prejudiciais de interpretação direta

da CEDH colocadas pelos tribunais nacionais quando aplicassem o Direito da União, porque

a CEDH estaria abrangida pela alínea b) do atual artigo 267.º TFUE. Note-se que, dentro

dessa orientação, os Tribunais da União seriam, eles, os juízes da conformidade de atos

comunitários com a CEDH, porque esta faria parte, por si, do bloco de legalidade do Direito

da União. Isto, obviamente, quando estivéssemos no âmbito da aplicação do Direito da

União.

3. A necessidade da adesão: os argumentos em cima referidos contra a adesão não são

suficientes para afastar a necessidade de a União aderir à CEDH para garantir aos seus

cidadãos um mais alto grau de proteção dos seus direitos fundamentais. Primeiro, se os

particulares ´so puderem contar com o recurso de anulação para o TJUE, previsto no artigo

263.º TFUE, para impugnarem os atos dos órgãos que violem a Carta, nesse caso não veem

plenamente assegurada essa proteção porque, repetimos, eles têm capacidade judiciária

ativa limitada em face desse artigo, são recorrentes só semipriviligeados. Pouco

acrescentam à proteção devida aos direitos fundamentais as questões prejudiciais do artigo

267.º TUE. De facto, as partes nunca podem suscitar essas questões, só os tribunais

nacionais o podem fazer. Depois, sem a adesão à CEDH, a União nunca se poderá defender

quando for dirigida ao TEDH uma queixa contra um Estado com o fundamento de que este

infringiu a CEDH através de um seu ato em que ele aplicou o Direito da União. Em tecreiro

lugar, a Carta dos Direitos Fundamentais só pode ser aplicada pelos Tribunais em situações

de aplicação do Direito da União. Ficam fora de controlo dos Tribunais os casos de violação

dos direitos por ela reconhecidos em que não esteja em causa o Direito da União. Critica-

se a adesão por submeter a União à dupla jurisdição do TJUE e do TEDH. Há que relativizar

esta crítica. Já hoje o sistema de garantias dentro da União Europeia conhece dupla

jurisdição entre os tribunais estaduais, como tribunais comuns do Direito da União, e o TJUE.

Portanto, a dupla jurisdição entre o TJUE e o TEDH não será novidade para o sistema jurídico

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da União Europeia, desde que o Tratado de Adesão inclua «cláusulas que preservem as

características da União e do Direito da União». Também não procede a crítica segundo a

qual a adesão vai introduzir de exaustão dos meios internos no sistema de proteção dos

direitos fundamentais na União Europeia. A adesão da União à CEDH não vai obrigar os

particulares a esgotar previamente os meios internos do Direito da União pela razão

simples de que não há meios internos a esgotar. De facto, os particulares têm legitimidade

para impugnar para o TJUE atos dos órgãos da União que infrinjam os seus direitos e, por

outro lado, não têm legitimidade para, eles próprios, suscitarem questões prejudiciais

perante o TJUE. Do mesmo modo, nada obsta também a que se crie um mecanismo através

do qual, antes de o TEDH se pronunciar sobre a validade de um ato da União, deve o TJUE

ter a oportunidade de se pronunciar sobre ela. Igualmente nada impede que se reveja a

forte restrição trazida à capacidade da pessoa para dirigir uma queixa ao TEDH traduzida a

exclusão dessa capacidade Às pessoas coletivas de Direito Público, como decorre do artigo

34.º CEDH. Por fim, há que estar atento ao facto de o critério de reparação segunda a CEDH

consistir numa mera «reparação razoável» (artigo 50.º CEDH). Se não procedem muitas das

críticas dirigidas à adesão também não devem ser relevantes alguns outros argumentos

aduzidos a favor da adesão. Assim, diz-se que, sem aquela adesão, não será possível a

aplicação das sanções previstas nos artigos 7.º TUE e 209.º CE, na redação do Tratado de

Nice, hoje os artigos 7.º TUE e 351.º TFUE. Não é verdade, aqueles preceitos remetem para

o artigo 2.º TUE, e este deve ser interpretado, na parte relativa ao «respeito pelos direitos

do Homem», como abrangendo também os direitos contidos na CEDH, quer porque a Carta

engloba esta, quer porque a referência do artigo 2.º abrange também os direitos referidos

no artigo 6.º, n.º3, TUE. Diz-se, também, que, sem a adesão, haveria, um matéria de direitos

fundamentais, uma Europa a “duas velocidades”. À partida, trata-se de uma realidade

inevitável: por um lado, não é possível a aplicação da Carta a Estados partes na CEDH e não

membros da União Europeia; por outro lado, não é legítimo impedir-se ao s Estados

membros da União Europeia de, como decorre do citado artigo 52.º, n.º3 da Carta,

acolherem e adotarem na Carta um nível de proteção dos direitos fundamentais superior

ao fornecido pela CEDH. A solução está em, por um lado, se interpretar a Carta e a CEDH,

somadas Às tradições constitucionais comuns aos Estados membros, como um conjunto

entre si complementar, harmonioso e coerente e, por outro lado, em se atualizar, para se

aperfeiçoar, a CEDH, que, data de 1950, consagra métodos e princípios que o tempo tornou

retrógrados. Diz-se por fim, que a cabal proteção dos Direitos do Homem na Ordem Jurídica

da União impõe que os atos da União sobre direitos fundamentais sejam apreciados por

um tribunal alheio à União. Não é verdade. Trata-se de uma suspeição prévia e abstrata

lançada sobre os Tribunais da União, que estes não merecem.

4. O procedimento da adesão: não vai ser fácil a adesão da União à CEDH em função das

exigências colocadas ao processo de adesão. Vai requerer o acordo de todos os Estados

membros da União porque o Acordo de adesão terá de ser aprovado pelo Conselho por

unanimidade. Após a aprovação do Parlamento Europeu, e depois terá de ser ratificado por

todos os Estados Membros segundo as respetivas normas constitucionais. É o que dispõe o

artigo 218.º, n.º6, alínea a), ii, e n.º8 TFUE. Mas vai também requerer o acordo de todos os

Estados que são partes na CEDH do Conselho da Europa, porque a adesão impõe a

conclusão de um novo protocolo adicional àquela Convenção que autoriza a adesão. O

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25

Tratado de adesão da União À CEDH deverá respeitar o Protocolo n.º8 e a Declaração n.º2

anexos ao Tratado de Lisboa.

Rumo a um direito da União Europeia sobre Direitos Fundamentais: adesão da União

Europeia à CEDH não impedirá que a Carta venha a ocupar progressivamente um lugar nuclear

num sólido e ambicioso Direito da União Europeia sore Direitos Fundamentais, cuja elaboração

deve e há-de continuar a dever-se muito à jurisprudência da União, com a ajuda, espera-se, dos

tribunais consitucionais nacionais. Nesse Direito da União Europeia sobre Direitos Fundamentais

a CEDH terá menos importância do que por vezes se julga, dado que, por força dos artigos 52.º,

n.º3 e 53.º, da Carta, a CEDH traduzirá o limite mínimo de proteção, ultrapassável pela Carta

sempre que esta for mais favorável aos direitos em causa.

A Carta e as Constituições Estaduais: como se disse, dispõe o artigo 51., n.º1, da Carta que

ela só se aplica no âmbito da União. Acrescenta o artigo 53.º que «nenhuma disposição da

presenta Carta deve ser interpretada no sentido de restringir ou lesar os direitos reconhecidos,

entre outos, pela Constituições dos Estados membros». Quer dizer que cada Estado conserva a

liberdade de proteger e garantir os direitos fundamentais na sua Ordem Jurídica nacional.

Contudo, na prática, esta conclusão está sujeita a dois limites. Em primeiro lugar, através dos

princípios gerais de Direito, os Tribunais da União podem integrar os direitos reconhecidos pela

Carta na Ordem Jurídica da União e verificar se os Estados os cumprem. Em segundo lugar, a

Carta não quis a discriminação inversa na sua aplicação, discriminação essa que, aliás, e como

atrás demonstrámos, infringe o Direito Internacional e o Direito da União e, nalguns Estados,

também o Direito Constitucional. No que concretamente diz respeito a Portugal, não se

anteveem hipóteses e conflito entre a Carta e a Constituição da República Portuguesa, em que

aquela venha a restringir direitos e reconhecidos por esta última.

A garantia judicial da Carta: após a Carta ter sido integrada nos Tratados, não faz dúvida de

que os Tribunais da União aplica-la-ão como uma fonte formal de Direito, e nos termos nela

definidos. No que toca aos tribunais nacionais, não poderão então recusar a sua aplicação

quando ela for invocada perante eles, com a única limitação de que só o poderão fazer quando

apliquem o Direito da União. Não basta ao Legislador Nacional ficar à espera de que a

Administração Pública e os tribunais do respetivo Estado afastem o respetivo Direito Interno em

favor da Carta no acatamento do que o artigo 53.º da Carta lhes impõe. O Legislador Nacional,

constituinte e ordinário, tem o dever de conformar o Direito nacional com a Carta. Esse dever

funda-se no respeito pelo artigo 2.º TUE. E, por sua vez, a Administração Pública e os tribunais

nacionais têm a obrigação de aplicar a Carta, nos termos nela prescritos, sob pena de incorrerem

em incumprimento do Direito da União e em responsabilidade por esse incumprimento, nas

condições definidas pelo Direito da união (e não pelo respetivo Direito Nacional).

Conclusão: a Carta como núcleo central de um sistema global e coerente de proteção

dos Direitos do Homem em todo o continente europeu: a Carta está destinada a ser o

catálogo dos direitos fundamentais da União Europeia, ou seja, a Bill of Rights dos cidadãos dos

Estados membros da União. Contudo, por expressa vontade dela própria, a Carta não vive só.

Os direitos que ela reconhece devem ser interpretados como fazendo parte do acervo global de

direitos consagrados nas fontes, muito diversificadas, indicada no §5.º do preâmbulo da Carta.

Page 27: Direito da União Europeia

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A Carta (artigos 51.º a 54.º) pretende ser o núcleo central de um sistema jurídico global de

proteção dos direitos fundamentais em toda a Europa, mas um sistema complementar e

coerente entre si, no qual, como decorre dos artigos 52.º, n.º3, in fine, e 53.º, a Carta deseja

fornecer o grau mais elevado de proteção. Nesse sistema global ocupam lugar de destaque três

fontes: a Carta, a CEDH e as tradições constitucionais comuns aos Estados membros. Será com

base nessas três fontes que se irá construindo, para já, o Direito da União Europeia sobre

Direitos Fundamentais, ou, dito doutra forma, o Direito da União Europeia sobe Direitos do

Homem.

As Atribuições da União Europeia

A definição das atribuições da União. A repartição de atribuições entre a União e os

Estados Membros: as atribuições da União Europeia são as matérias em que ela pode agir.

Quais são então as atribuições da União? O Tratado de Lisboa veio, pela primeira vez, ocupar-se

da enunciação das atribuições da União. Fá-lo nos artigos 2.º a 6.º TFUE:

- atribuições exclusivas (artigo 3.º TFUE);

- atribuições concorrentes ou partilhadas (artigo 4.º TFUE);

- atribuições de apoio, coordenação ou completamento da ação dos Estados membros,

que designaremos por atribuições complementares (artigo 6.º TFUE).

Para compreensão daqueles preceitos do TFUE é necessário levar em conta também a

Declaração n.º18 anexa ao Tratado de Lisboa sobre a Delimitação de competências. Além disso

os Tratados preveem também atribuições exclusivas dos Estados (artigo 4.º, n.º2, in fine TUE).

O princípio da especialidade das atribuições da União: o princípio da especialidade dessas

atribuições delimita a capacidade jurídica de todas as pessoas coletivas, de Direito Público e de

Direito Privado, e estabelece que elas só têm capacidade jurídica, de gozo e de exercício, para a

prossecução das matérias que lhe sejam expressamente cometidas por lei ou pelos respetivos

Estatutos. A única pessoa coletiva à qual não se aplica o princípio da especialidade é o Estado.

Também a União vê a sua capacidade limitada pelo princípio da especialidade. O princípio da

especialidade, também chamado princípio de atribuição, encontra-se hoje consagrado no artigo

5.º, n.º1, 1.ª parte TUE.

«Em virtude do princípio de atribuição, a União atua unicamente dentro dos

limites da competência que os Estados membros lhe tenham atribuído nos

Tratados para alcançar os objetivos fixados por estes últimos».

Este princípio encontra-se também acolhido no artigo 7.º TFUE.

«A União assegura a coerência entre as suas diferentes políticas e ações,

tendo em conta o conjunto dos seus objetivos e de acordo com o princípio da

atribuição de competências».

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Também tem parcialmente a ver com o princípio da especialidade o artigo 13.º TUE que, depois

de no n.º1 enunciar os órgãos da CE, estabelece no n.º2 que

«Cada instituição atua nos limites das atribuições que lhe são conferidas

pelos Tratados (…)».

Enquanto se refere aos «limites das atribuições» este artigos está a pensar nas atribuições da

União (portanto, está a delimitar a capacidade jurídica da União).

As atribuições exclusivas da União: quais são as atribuições exclusivas da União? Segundo o

Tribunal de Justiça, a ex-Comunidade Europeia já tinha competência exclusiva nos domínios da

política comercial comum, prevista no ex artigo 133.º TCE, na versão de Nice, da política de

conservação dos recursos de pesca, contemplada no artigo 102.º do Tratado de Adesão de 1972,

e da política agrícola comum. Deviam ser consideradas também atribuições exclusivas da

Comunidade todas aquelas que constava da lista apresentada pela Comissão em anexo À sua

Comunicação sobre o princípio da subsidiariedade, de 27 outubro 1991: além das políticas

referidas pelo TJ e acima indicadas também a supressão de obstáculos À livre circulação de

mercadorias, pessoas, serviços e capitais (ex artigo 4.º TCE) as regras gerais da concorrência; e

os elementos essenciais da política de transportes (ex-artigo 71.º, n.º1, alínea a) TCE). Todavia,

para que existisse uma atribuição era sempre necessário que reunissem, na matéria em causa,

os seguintes dois requisitos cumulativos: a existência de uma obrigação clara e precisa de agir

da parte da Comunidade, hoje, da União, e a absorção pela União dos poderes soberanos dos

Estados membros nessa matéria, de tal forma que a perda desses poderes soberanos fosse

irreversível. Como se disse, o Tratado de Lisboa veio estabelecer quais passavam a ser as

atribuições exclusivas da União. Fá-lo no artigo 3.º TFUE. As atribuições exclusivas internas

referem-se ao mercado interno da União. São elencadas no n.º1 do referido artigo 3.º TFUE, ou

seja:

a) A união aduaneira;

b) O estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do

mercado interno;

c) A política monetária para os Estados membros cuja moeda seja o euro;

d) A conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das

pescas;

e) E a política comercial comum.

Note-se que nesta lista foi omitida referência à política agrícola comum, que o TJ há muito que

considera uma atribuição exclusiva da União, mas que deixa de o ser em face do referido

preceito do TFUE. As atribuições exclusivas externas são as que decorrem do n.º2 do artigo 3.º

TFUE. Ou seja, a União tem atribuição exclusiva para celebrar acordos internacionais cuja

conclusão esteja prevista num ato legislativo da União. A política comercial comum, enquanto

atribuição exclusiva, externa, encontra o seu conteúdo desenvolvido no artigo 207.º, n.º1, TFUE.

As atribuições exclusivas da União podem ser exercidas pelos Estados Membros através de

delegação neles por parte da União dos poderes necessários para o efeito, ou com o objetivo de

dar execução aos atos da União. É o que resulta do artigo 2.º, n.º1 TFUE.

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As atribuições concorrentes ou partilhadas: o estudo das atribuições concorrentes tem de

ser separado em duas fases: a fase anterior ao Tratado de Lisboa e a fase posterior a esse

Tratado. Antes do Tratado de Lisboa, na repartição vertical de atribuições entre a União Europeia

e os Estados membros, a regra era as atribuições serem concorrentes. Em todas as atribuições

que coubessem no princípio da especialidade da União e que não se tivessem tornado exclusivas

da União, esta e os Estados membros concorriam entre si. Depois do Tratado de Lisboa, as

atribuições concorrentes continuam a ser a regra, mas agora nos termos definidos pela parte

final do artigo 4.º, n.º1 TFUE. Ou seja, à partida são concorrentes todas as atribuições que aquele

Tratado não tenha incluído nas atribuições exclusivas que aquele Tratado não tenha incluído nas

atribuições exclusivas e complementares, nos seus artigos 3.º, 5.º e 6.º TFUE. Mas, além disso,

são seguramente atribuições concorrentes aquelas que estão elencadas no artigo 4.º, n.º2, TFUE.

Note-se que a agricultura e, com ela, a política agrícola comum, devem ser entendidas como

sendo atribuições concorrentes da União, em face do que dispõe o artigo 4.º, n.º2, alínea d),

não obstante, como se referiu, ser outra a posição do TJ. Do mesmo modo, das pescas fica para

as atribuições concorrentes tudo o que couber nas atribuições exclusivas, pelo que resulta do

mesmo preceito por confronto com o artigo 3.º, n.º1, alínea d) TFUE.

As atribuições complementares: o Tratado de Lisboa criou também, como se disse,

atribuições complementares para a União. Elas encontram-se elencadas nos artigos 5.º e 6.º

TFUE e disciplinadas no artigo 2.º, n.º3 e 5 TFUE. Essas atribuições são de duas categorias:

a) As atribuições de orientação e de coordenação, do artigo 5.º; e

b) As atribuições de apoio, coordenação e completamento, do artigo 6.º.

As atribuições de orientação e coordenação, do artigo 5.º, são atribuições:

- de orientação das políticas económicas dos Estados membros (artigo 5.º, n.º1, 1.ª

parte). São prosseguidas nos termos do artigo 121.º TFUE;

- de coordenação, de supervisão e de orientação das políticas monetárias dos Estados

da Zona Euro, que devem ser exercidas com respeito pelo artigo 136.º TFUE (artigo 5.º, n.º1, 2.ª

parte). No respeito dessas atribuições o n.º3 prevê a eleição de um Presidente do Eurogrupo,

com um mandato de dois anos e meio;

- de coordenação das políticas de emprego dos Estados membros (artigo 5.º, nº2, que

vem na linha do artigo 2.º, n.º3 TFUE). Estas atribuições são levadas a cabo nos termos do artigo

148.º TFUE;

- eventualmente, de coordenação das políticas sociais dos Estados membros (artigo 5.º,

n.º3). Os artigos 151.º e 156.º TFUE desenvolvem estas atribuições.

As atribuições de apoio, coordenação e completamento devem ser interpretadas como

conferindo uma atuação menos intensa à União. Elas constam do artigo 6.º TFUE. Estas

atribuições consistem num mero complemento das atribuições dos Estados, que não perdem a

sua competência sobre essas matérias. Por isso, estes não transferem para a União o poder de

legislar sobre esses domínios, nem mesmo com vista a harmonizar as legislações dos Estados

membros. É o que ficou a dispor o novo artigo 2.º, n.º5 TFUE. Por isso, e em face da parte final

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dos artigos m.º3 e 4 do artigo 4.º TFUE, entendemos que as matérias referidas naqueles dois

números do artigo 4.º TFUE devem ser consideradas atribuições complementares e não

atribuições concorrentes. Entre as atribuições previstas no citado artigo 6.º TFUE merecem

destaque a educação e também os novos domínios de atribuições da União, que são o turismo

(artigo 195.º TFUE), o desporto (artigo 165.º TFUE), a proteção civil (artigo 196.º TFUE) e a

cooperação administrativa (artigo 197.º TFUE).

O princípio da subsidiariedade:

1. Enunciado do problema: a intervenção da União na matéria das suas atribuições não

exclusivas rege-se pelo princípio da subsidiariedade. Portanto, tem de ficar claro que aquele

princípio não reparte atribuições entre a União e os Estados membros, mas apenas

disciplina o exercício de atribuições que os Tratados previamente repartem como não

sendo exclusivas da União. Com o Tratado de Lisboa, o princípio da subsidiariedade agora

entendido a todas as atribuições não exclusivas da União, passou a ter a sua sede principal

no artigo 5.º, n.º3 TUE.

2. Noção e génese: em bom rigor, existem duas versões cumulativas do princípio da

subsidiariedade: uma, que apela para o respeito, no processo de integração, pela

identidade nacional dos Estados membros; outra, que dá preferência aos Estados na

prossecução das atribuições que os Tratados consideram não exclusivas da União. A

primeira versão encontramo-la acolhida hoje no considerando 6.º do preâmbulo do TUE e

no artigo 4.º, n.º2, do mesmo Tratado. A segunda versão consta hoje da 2.ª parte do artigo

1.º, §2.º, do mesmo Tratado, e, como dissemos, encontra guarida, em termos de cláusula

geral, no artigo 5.º, n.º3, também do TUE. Quando usualmente se fala em subsidiariedade

no Direito da União Europeia é sobretudo no segundo dos dois referidos sentidos que se

emprega essa palavra. E é esse o sentido que nos interessa neste lugar. Diversos preceitos

do TFUE concretizam, quanto a matérias específicas, o princípio da subsidiariedade: é o

caso, designadamente, dos artigos 165.º, n.º1; 167.º, n.º1; 168.º, n.º1 e 180.º. O artigo

352.º TFUE, ao dispor sobre o modo como se pode alargar a competência dos órgãos da

Uni~+ao, não está a aplicar o princípio da subsidiariedade. Por outro lado, o princípio da

subsidiariedade é um projeto jurídico. Ou seja, ele confere preferência aos Estados no

exercício das atribuições não exclusivas. A intervenção dos Estados nessas matérias é, pois,

a regra.

3. O conteúdo do princípio: para que a Comunidade intervenha com respeito pelo princípio

da subsidiariedade no domínio das atribuições não exclusivas é, pois, necessário de

harmonia com o artigo 5.º, n.º3 TUE, que se verifiquem cumulativamente duas condições:

a insuficiência da atuação estadual e a maior eficácia da intervenção dogmática, o princípio

da subsidiariedade, como acima se disse, ser um princípio descentralizador, na prática, só

em cada caso concreto, e em cada momento concreto, é possível afirmar-se se a sua

aplicação leva a alargar ou a estreitar o âmbito de intervenção da União. Quais são os

elementos do conteúdo do princípio da subsidiariedade, tal como ele se encontra definido

no artigo 5.º, n.º3 TUE?

a. O princípio da subsidiariedade só se aplica às atribuições concorrentes e

complementares da União;

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b. É necessário provar-se a necessidade da intervenção da Comunidade, a

insuficiência da intervenção estadual, tanto ao nível central como ao nível

regional e local, para prosseguir os objetivos da ação prevista, e a maior

eficácia da intervenção da União;

c. Uma vez iniciada a intervenção da União, cessa a intervenção dos Estados;

d. A insuficiência dos Estados e a maior eficácia da União devem ser aferidas à

luz dos critérios elencados no artigo 5.º do Protocolo;

e. Porque a subsidiariedade assenta na ideia segundo a qual a regra é a

intervenção do Estado, a exceção, a intervenção da União, é à União que,

em cada caso, cabe o ónus de provar que se encontram preenchidas as

condições acima indicadas, na alínea b), e segundo os critérios a que nos

referimos na alínea d), e que, portanto, está justificada a sua intervenção;

f. No que especificamente diz respeito ao elemento das dimensões e dos

efeitos da ação considerada, mencionados no artigo 5.º, n.º3 TUE, para que

a União possa intervir em detrimento dos Estados, ela deverá provar que a

ação prevista tem dimensão e produz efeitos e a uma escala, no mínimo,

tendencialmente comunitária. E, mesmo quando se prove a necessidade da

intervenção da União, esta, antes de agir, deverá começar por tentar que os

Estados criem, eles próprios, a suficiência necessária para alcançar os

objetivos prosseguidos.

4. A aplicação do princípio: O respeito pelo princípio da subsidiariedade tem feito parte da

fundamentação dos atos de Direito derivado da União, exigida pelo artigo 296.º TFUE. A

subsidiariedade é reversível. Portanto, caso se venha a demonstrar que os Estados

entretanto ganharam suficiência para a ação necessária, e se entretanto a atribuição em

causa não tiver passado para o rol das atribuições exclusivas da União, voltam os Estados a

ter preferência na atuação na matéria concreta. A subsidiariedade impõe alguma

flexibilidade em dois princípios fundamentais do sistema jurídico da União: o da sua

uniformidade e o do seu primado sobre o Direito estadual. Quanto à uniformidade, porque

nos Estados cuja atuação tenha sido substituída pela da União por força da subsidiariedade,

as matérias em causa poderão vir a estar sujeitas a um regime jurídico diferente daquele

que para elas vigora nos Estados que, segundo os critérios do artigo 5.º, n.º3 TUE, não

perderam para a União o direito de intervir e, portanto, conservam para si esse direito,

desde logo, por via legislativa. Quanto ao primado, porque a subsidiariedade pode excluir

o primado do Direito da União, pelo simples facto de não se ter demonstrado que a

intervenção da União, deve substituir-se à dos Estados, portanto, por não se colocar o

problema de a União ter competência na matéria e, portanto, de o Direito da União vir a

regular a matéria. Por fim, haverá que insistir em que a subsidiariedade nas relações

Estados-União só será eficaz e fará sentido se for completada pela subsidiariedade nas

relações interestaduais.

5. O controlo da aplicação do princípio: o princípio da subsidiariedade tem de ser visto no TUE

como uma regra jurídica e não como um princípio meramente político. O controlo jurídico

da subsidiariedade pode ter lugar:

a. O controlo a posteriori: o controlo a posteriori da subsidiariedade pode ser controlo

político. Assim acontecerá por força do artigo 9.º do Protocolo atrás referido, eu

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impõe à Comissão a obrigação de apresentar, aos órgãos aí indicados, um relatório

anula sobre aplicação do princípio. Mas esse controlo também pode ser um controlo

jurídico. Como tal, esse controlo é, normalmente, levado a cabo pelo TJUE, no

exercício da respetiva competência e através dos seguintes meios contenciosos: o

recurso de anulação, do artigo 263.º TFUE; a exceção de ilegalidade, do artigo 277.º

TFUE; as questões prejudiciais, do artigo 264.º TFUE; e a ação por omissão, do artigo

265.º TFUE. Mas o controlo jurídico a posteriori da subsidiariedade também pode ser

levado a cabo pelos tribunais nacionais, caso, perante estes, algum interessado

invoque o efeito direto do artigo 5.º, n.º3, TUE.

b. O controlo a priori: o controlo da aplicação do princípio da subsidiariedade também

pode ser levado a cabo a priori, ou seja, a título preventivo. Esse controlo pode

revestir natureza jurídica ou sem um controlo político. Comecemos pelo controlo

jurídico. Ele consiste na exigência de fundamentação, pelas entidades referidas no

artigo 3.º do citado Protocolo, de cada projeto de ato legislativo, em termos de ele

demonstrar, em cada caso concreto, que respeitou o princípio da subsidiariedade.

Esse controlo encontra-se disciplinado no artigo 5.º daquele Protocolo.

c. Em especial, o controlo pelos Parlamentos nacionais: os Parlamentos nacionais

exercem, antes de mais, um controlo a priori da aplicação do princípio da

subsidiariedade. Mas este controlo preventivo é, inevitavelmente, um controlo

político. De facto, o artigo 4.º desse Protocolo n.º2 disciplina o envio aos Parlamentos

nacionais dos projetos de atos legislativos das entidades referidas no artigo 3.º.

Sobre esses projetos cada Parlamento nacional pode emitir o seu parecer (artigo 6.º),

que será tido em conta por aquelas entidades nos termos definidos no artigo 7.º

desse Protocolo n.º2, conjugado com o referido artigo 3.º do Protocolo. Mas os

Parlamentos nacionais também podem controlar a posteriori a aplicação do princípio

da subsidiariedade. Podem fazê-lo à sombra do artigo 8.º, §1.º do Protocolo n.º2,

acima referido, que permite um Estado membro recorra para o TJUE pedindo a

anulação de um ato legislativo com fundamento na violação do princípio da

subsidiariedade. Este controlo a posteriori é, pois, um controlo jurídico.

O princípio da proporcionalidade na atuação da União: já estudámos que o princípio da

proporcionalidade constitui um dos princípios constitucionais que rege todo o ordenamento

jurídico da União Europeia. Ele manifesta-se no sistema de repartição de atribuições entre a

União e os Estados membros. O artigo 5.º TUE vem dispor, no seu n.º4, que «(…) o conteúdo e a

forma da ação da União devem exceder o necessário para atingir os objetivos do presente

Tratado». Também aqui não estamos perante uma repartição de atribuições entre a União e os

Estados membros mas, sim, perante a disciplina do seu exercício. Ou seja, quer na prossecução

das suas atribuições exclusivas, quer no desempenho das atribuições não exclusivas, a ação da

União deve restringir-se apenas ao que for necessário. A conclusão imediata a tirar da

interpretação do artigo 5.º, n.º4 TUE, é a de que todo este sistema de repartição de atribuições

e de disciplina do respetivo exercício se encontra construído com coerência, e está imbuído de

um forte espírito descentralizador em favor dos Estados. A proporcionalidade tem, portanto,

aqui um papel, determinante para se determinar a amplitude possível da intervenção da União.

A aplicação daquele preceito pelo legislador da União só pode ser considerada ilegal pelo TJ «se

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ela se revelar manifestamente errada em face dos elementos de que ele disponha no momento

da adoção da regulamentação.

A especificidade da Ação Externa da União: dada a sua grande importância para a atividade

da União, não deixa de se surpreender o facto de, no elenco das atribuições da União constante

dos artigo 2.º a 6.º TFUE, os autores do Tratado de Lisboa se terem esquecido de indicar o lugar

da Ação Externa. Em nosso entender, para situarmos a Ação Externa nas atribuições da União,

temos que a dividir em três domínios. Em primeiro lugar, a Política Externa e de Segurança

Comum (PESC). Ela tem a sua sede no Capítulo II do Título V do TUE. A PESC tem uma forte matriz

intergovernamental. Isso resulta, sobretudo, do artigo 24.º TUE. Com efeito, segundo o n.º1,

§2,º, desse artigo, em regra a PESC é definida pelo Conselho Europeu e pelo Conselho; estes

deliberam na matéria por unanimidade; não há na PESC atos legislativos; e o TJUE não dispõe

de competência na PESC. Esses traços são mais fortes do que as características comunitárias da

PESC, que são, sobretudo, as seguintes: a PESC aparece-nos como atribuição da União e não dos

Estados membros (artigo 25.º TUE); a União tem competência para aprovar decisões nessa

matéria, por força, designadamente, dos artigo 25.º, alínea b), ii; e 26.º, n.º2, §1.º TUE, e as

decisões são na União atos legislativos obrigatórios, por força dos artigos 288.º, §4.º, e 289.º

TFUE. Dentro da PESC, a política comum de segurança e defesa (PCSD) (artigo 41.º, n.º1, 1.ªª

frase) apresenta traços intergovernamentais ainda mais fortes do que o regime geral da PESC. E

esses traços são dois: as decisões relativas à PCSD são tomadas pelo Conselho, deliberando por

unanimidade, sob proposta do Alto Representante, sem a participação do Parlamento Europeu

ou da Comissão (artigo 42.º, n.º4 TUE); e os Estados podem estabelecer entre eles uma

cooperação reforçada na forma de cooperação estruturada permanente, sem qualquer número

mínimo (artigos 42.º, n.º6, e 46.º TUE). Em segundo lugar, a política comercial comum. Esta

política comum é uma atribuição exclusiva da União. Nesse sentido é claro o artigo 3.º, n.º1,

alínea e) TFUE. Por força do n.º2 do mesmo artigo, também são atribuição exclusiva da União os

acordos internacionais na matéria da política comercial comum. Em terceiro lugar, também as

matérias que se referem os Títulos III, IV, VI, e VII TFUE. Essas matérias cabem nas atribuições

concorrentes ou partilhadas da União, ao abrigo da cláusula geral do citado artigo 4.º, n.º1 TFUE.

As atribuições exclusivas dos Estados: têm os Estados membros da União atribuições

exclusivas que, portanto, exclua a intervenção da União? Na União Europeia e como atrás

explicámos, houve uma tentativa de se ir por esse caminho quando da preparação do TUF, antes

do Tratado de Maastricht. Mas essa tentativa malogrou-se e desde então não for formalmente

retomada. Todavia, o Tratado de Lisboa inclui nos Tratados referência a atribuições exclusivas

dos Estados membros. É o caso, por exemplo, da segurança nacional, por força do artigo 4.º,

n.º2, 3.ª parte.

O paralelismo entre as atribuições internas e externas da União: estamos perante mais

uma criação sensata da jurisprudência da União. Entende o TJ que, na medida em que a União

tiver definido regras comuns no seu plano interno, ela fica investida de atribuições nesse

domínio também no plano externo, podendo, portanto, os seus órgãos concluir acordos

internacionais nessa matéria, mesmo na ausência de disposições expressas que lhe atribuam

competência para o efeito. Ou seja, o simples facto de a União ter atribuições num dado domínio,

faz nascer para ela, implicitamente, as mesmas atribuições na ordem externa ou internacional.

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É o problema das atribuições implícitas da União. A revisão de Lisboa resolveu este problema

em sede dos Tratados. Como já dissemos atrás, ficou disposto no artigo 3.º, n.º2 TFUE, que, no

domínio das suas atribuições exclusivas «A União dispõe (…) de competência exclusiva para

celebrar acordos internacionais quando tal celebração (…) seja necessária para lhe dar a

possibilidade de exercer a sua competência interna (…)».