fontes de direito da união europeia - 1

21
Direito Europeu II Cap. I Fontes de Direito da União Europeia Fonte dupla: 1. Convencional: 1.1. Tratados - tipos (T.lei e T. quadro) 1.2. Convenções - tipos (entre a UE e E-membros, ex.) 2. Actos Unilaterais: regulamentos, directivas e decisões 2. Distinção entre Dt Originário e Dt Derivado I - Fonte dupla: i) Convencional ii) Unilateral i) Fonte convencional de Direito da União Europeia: mediante a celebração de convenções concluídas no seio da União e no âmbito internacional (Título I). Exemplos: Tratados, Convenções entre Estados-membros, Convenções entre a União Europeia e terceiros Estados. Tratados – o Tribunal Constitucional Alemão refere-se aos Tratados como “representantes da Constituição da Comunidade”. São actos convencionais internacionais de tipo clássico, fruto exclusivo da vontade soberana dos Estados contratantes, obedecendo às regras de Direito Internacional no momento da sua conclusão e respectivas normas constitucionais. Representam a base de toda a ordem jurídica da União, daí que sejam apelidados de “Direito Originário”. Incluem esta categoria os Tratados fundadores: dois Tratados de Roma de 25 de Março de 1957 (criadores da CE e CEEA ou EURATOM), Acto Único Europeu (1987), Tratado de Maastricht (1992 – TUE), Tratado de Amesterdão (1997 – entrada em vigor a 1 de Maio de 1999), Tratado de Nice (22 de Fevereiro de 2001). 1

Upload: joao-macedo

Post on 22-Jul-2016

23 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Direito Europeu II

Cap. IFontes de Direito da União Europeia

Fonte dupla:1. Convencional:1.1. Tratados - tipos (T.lei e T. quadro)1.2. Convenções - tipos (entre a UE e E-membros, ex.)2. Actos Unilaterais: regulamentos, directivas e decisões2. Distinção entre Dt Originário e Dt Derivado

I - Fonte dupla:

i) Convencionalii) Unilateral

i) Fonte convencional de Direito da União Europeia: mediante a celebração de convenções concluídas no seio da União e no âmbito internacional (Título I).Exemplos: Tratados, Convenções entre Estados-membros, Convenções entre a União Europeia e terceiros Estados.Tratados – o Tribunal Constitucional Alemão refere-se aos Tratados como “representantes da Constituição da Comunidade”. São actos convencionais internacionais de tipo clássico, fruto exclusivo da vontade soberana dos Estados contratantes, obedecendo às regras de Direito Internacional no momento da sua conclusão e respectivas normas constitucionais.Representam a base de toda a ordem jurídica da União, daí que sejam apelidados de “Direito Originário”. Incluem esta categoria os Tratados fundadores: dois Tratados de Roma de 25 de Março de 1957 (criadores da CE e CEEA ou EURATOM), Acto Único Europeu (1987), Tratado de Maastricht (1992 – TUE), Tratado de Amesterdão (1997 – entrada em vigor a 1 de Maio de 1999), Tratado de Nice (22 de Fevereiro de 2001).A actual União Europeia rege-se em conformidade com o Tratado que fundou a EURATOM, com o Tratado de Maastricht (TUE) e com o TFUE, todos com a redacção resultante do Tratado de Lisboa. Acrescem a este leque: (a) Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, pois tem o mesmo valor jurídico que os Tratados, nos termos do art.6º, nº1 TUE. (b) os sucessivos Tratados de Adesão; (c) os vários Protocolos e Anexos dos Tratados que destes fazem “parte integrante” (art.51º TUE).

1

Os Tratados, no seu conjunto, são considerados como a “Constituição” da União Europeia e, enquanto tal:1. Enunciam os objectivos fundamentais da UE e definem os respectivos instrumentos de realização; 2. Definem a sua estrutura institucional, mediante um conjunto de regras que se reportam à sua estrutura orgânica, especificam as atribuições e poderes das instituições, definem as relações entre elas e com os Estados-membros, as condições do exercício do controlo político e jurisdicional a que a sua actuação se encontra sujeita;3. Contêm disposições relativas às relações entre a UE e os seus Estados-membros e às relações entre a União e as instituições internacionais ou terceiros Estados. Dentro destas disposições:(a) Sistema de partilha de competências entre a União e os Estados-membros, assim como, as condições em que os Estados-membros respondem perante a União pelo cumprimento das obrigações que assumiram;(b) Domínios da competência internacional da União e as condições em que esta pode concluir acordos com 3ºs países ou com outras organizações internacionais;

4. Tutelam a acção dos órgãos da União, Estados-membros, agentes económicos em geral, quando esta actuação se relacione com o estabelecimento e funcionamento do mercado interno da União. 5. Organizam o sistema jurisdicional de salvaguarda da ordem jurídica da União;6. Receitas e despesas da União Europeia;7. Estabelecimento do seu orçamento e sobre a execução orçamental

Tratado-Lei: Exemplo paradigmático é o Tratado EURATOM, pois prescreve muito pormenorizadamente e com detalhe as regras essenciais a que deve obedecer o funcionamento do Mercado Comum dos produtos nucleares.

Tratado-Quadro: O TFUE é exemplo deste tipo de Tratado. Com efeito, se é verdade que relativamente ao regime da “União Aduaneira”, o TFUE é muito rigoroso, com regras muito precisas acerca da liberdade de circulação de mercadorias, a verdade é que quanto aos outros elementos essenciais da noção de “Mercado Interno” (livre circulação dos factores de produção e políticas comuns), o Tratado limita-se a enunciar princípios gerais a atingir e a fixar competências e poderes que são necessários para os realizar.

A «Revisão dos Tratados» não constitui, porém, o único meio de suprir as lacunas, de aperfeiçoar os dispositivos que a prática tenha mostrado serem

2

insatisfatórios. Na verdade, apesar de se encontrarem consagrados enquanto “modo normal de colmatar brechas do sistema instituído”, estes mecanismos de revisão dos Tratados, existem igualmente mecanismos para colmatar lacunas, falhas e omissões dos Tratados, visando, nessa precisa medida, aperfeiçoá-los. São eles:1. O recurso às disposições de um Tratado para preencher as lacunas de outro, mediante:i) A utilização de certos mecanismos institucionais que, prudentemente, os seus autores fizeram incluir no articulado dos Tratados;ii) A «Teoria das Competências Implícitas» Hoje, esta teoria é claramente aceite e assumida no seio do Direito Internacional, podendo mesmo considerar-se consagrada pela Jurisprudência do Tribunal de Haia. Aliás, tanto a Jurisprudência do TPJI, como a do TIJ permitem considerar como regra de DI estabelecida a de que devem considerar-se atribuídos a uma organização internacional todos os poderes que, apesar de não serem expressamente reconhecidos na carta constitutiva, são essenciais ao pleno exercício das suas atribuições.

O que está aqui em causa ao falarmos no recurso da Teoria das Competências Implícitas é saber se, para além das competências que explicitamente foram conferidas à União, esta também disporá ou não implicitamente de quaisquer outras que lhes sejam indispensáveis à realização dos seus objectivos estatutários.

De facto, o TJUE assume a legitimidade do recurso a esta teoria, com vista à prossecução do efeito útil dos Tratados. É, sobretudo, no seu Ac. 31 de Março de 1971 que este tribunal afirma categoricamente, sem margem para dúvidas que a competência da Comunidade “resulta não somente de uma atribuição expressa ou explícita constante de um Tratado, mas também resulta de outras disposições do Tratado e de outros actos adoptados, no âmbito das disposições que algum modo instituam um regime comum”.

Outro aspecto a reter desta teoria é que os Estados-membros perdem o direito, quer individual, quer colectivamente, de contratar com terceiros Estados obrigações que coloquem em causa esse “regime comum” que confere competências implícitas à União.Quer isto dizer que, só a União está habilitada a assumir e executar, com efeitos em todo o domínio de aplicação da ordem jurídica comunitária, os compromissos assumidos perante terceiros Estados.

3

Este Acórdão assume enorme relevância jurídica, na medida em que resolve uma questão essencial, ao afirmar que as instituições da UE possuem, mesmo no silêncio dos Tratados, competência exclusiva para negociar e celebrar qualquer acordo internacional sobre matérias que na ordem jurídica interna estejam submetidas a uma regulamentação da União. Ou seja, a competência interna da União implica a sua competência externa.O Tribunal tem admitido o apelo à «teoria dos poderes implícitos» com vista a atingir o «efeito útil dos Tratados», mediante uma interpretação teleológica dos Tratados, a qual aceitou o reconhecimento de poderes implícitos às Instituições, na medida em que tais poderes sejam necessários para o cumprimento das atribuições que lhes foram conferidas.

Actos UnilateraisSão actos emanados das instituições comunitárias adoptados em aplicação dos tratados e em sua conformidade. Como esses actos encontram nos tratados o seu fundamento jurídico e delas derivam, designam-se de direito derivado. Esses actos são fontes de direito derivado: art.288º TFUE oferece-nos um elenco não exaustivo: regulamentos, decisões, directivas, recomendações e pareceres.

Regulamento:Características essenciais:

i) Tem carácter geral; ii) é obrigatório em todos os seus elementos; iii) é directamente aplicável em todos os estados membros

1ª característica «Carácter geral»: Os regulamentos são equiparáveis às leis nacionais. De facto, tal como estas, os regulamentos estabelece regras, impõe obrigações e confere direitos a todos os que se incluam ou possam vir no futuro a incluir-se na categoria de destinatários que o regulamento define em abstracto e segundo critérios objectivos.A generalidade do regulamento tanto pode reportar-se aos destinatários, como ao objecto da prescrição (os comportamentos permitidos ou impostos ou as situações jurídicas emergentes da norma). Daqui decorre uma distinção entre: generalidade (quanto aos destinatários) e abstracção (quanto ao objecto da estatuição normativa).

O regulamento sem se reportar individualmente a quem quer que seja, impõe-se a todos (UE, instituições comunitárias, estados membros, seus órgãos, indivíduos ou empresas sujeitas à jurisdição da União) que possam ser considerados visados no presente ou futuro pela estatuição normativa. é

4

este aspecto que o distingue da decisão e directiva, pois estas apenas obrigam os seus destinatários – certos e determinados.Porém, um acto não perde o seu carácter regulamentar pelo facto de num dado momento ser possível identificar as pessoas sujeitas à aplicação das normas que nele se contêm. é o caso de um regulamento de carácter técnico, económico ou social destinar-se apenas a empresas cuja dimensão ou ramo de actividade em que se inserem, permitindo identificá-las facilmente nem por isso, tal regulamento perde o seu carácter geral e abstracto.Fundamental é que as normas constantes desse regulamento permaneçam aplicáveis a qualquer outra empresa que futuramente venha a preencher os respectivos requisitos (constantes do regulamento).

Jurisprudência relevante a este respeito:Ac. 5 de Maio de 1977 TJUE: “Constitui um regulamento, uma medida que se aplique a situações determinadas objectivamente e comporte efeitos jurídicos relativamente a categorias de pessoas encaradas de forma geral e abstracta”. Continua, referindo que “a natureza regulamentar de um acto não é posta em causa pela possibilidade de determinar com maior ou menor precisão o número ou identidade dos sujeitos de direito…”. Nem é contraditório com o carácter regulamentar de um acto, o facto de ele poder «ter efeitos concretos diferentes para os diversos sujeitos aos quais se aplica…desde que tal situação seja objectivamente determinada” pois é algo “natural” a uma disposição geral que a sua aplicação uniforme possa afectar os interesses de forma variável, segundo os particularismos da sua situação ou actividade”.Ac. Simmenthal de 9 de Março de 1978: o regulamento é um acto normativo de carácter geral e abstracto equiparável à lei interna. Tanto é assim que se alude ao «poder legislativo da comunidade», nos termos do art.289º ss TFUE.2ª característica «Obrigatoriedade em todos os seus elementos»: O carácter geral e obrigatório do regulamento revela um poder normativo perfeito que permite às instituições da União impor autonomamente, dispensando a intervenção e participação das instituições nacionais.

A União tem, com o regulamento, a capacidade de impor a observância da totalidade das disposições desse acto (regulamento) a todos os estados-membros, orgãos e autoridades nacionais, particulares (pessoas singulares e empresas). É neste aspecto, de «obrigatoriedade em todos os seus elementos», que o regulamento se distingue da directiva. Esta prescreve imperativamente o resultado a atingir, mas não os meios que os estados devem utilizar para atingir esse resultado.

Ao contrário da directiva, o regulamento pode impor quaisquer modalidades de aplicação e execução consideradas como necessários ou úteis pelas instituições da

5

UE. O regulamento é, pois, um acto legislativo perfeito e completo, na medida em que a sua aplicação e execução dispensam o exercício da actividade normativa dos estados-membros. Este facto desemboca em várias consequências:(1) O regulamento vigora automática e directamente na ordem interna, pelo que se exige que a «sua entrada em vigor e a sua aplicação a favor ou contra os sujeitos de direito se realizem sem intervenção de qualquer medida de recepção do direito nacional.(2) Como o regulamento é um acto normativo normalmente completo*, tal significa que não é permitido às autoridades nacionais acrescentar às suas disposições seja o que for.* significa que nele estão previstas todas as situações em que vai decorrer a respectiva aplicação no território dos estados membros.(3) Os estados membros não podem escolher “partes” do regulamento: não podem aplicar de modo selectivo ou incompleto as disposições do regulamento, prejudicando a legislação comunitária que considerem ser contrários aos seus interesses nacionais.(4) Lá porque são difíceis as condições de execução de um regulamento, tal não significa que o estado membro possa “dispensar-se unilateralmente” do cumprimento das suas obrigações. Do mesmo modo, o estado membro não pode invocar disposições ou práticas jurídicas internas para justificar o “menosprezo” das obrigações e prazos resultantes dos regulamentos.(5) O respeito pelas formas e processos do direito nacional é tido em conta, na estrita medida em que não contenda com a aplicação uniforme das disposições comunitárias.Nunca o respeito pelo “formalismo jurídico” e “procedimental” do direito interno poderá desvirtuar o conteúdo e real alcance do regulamento.(6) Se é verdade que a maioria das vezes, o regulamento apresenta-se como um acto jurídico completo, também acontece que surja como um acto incompleto. Incompleto, na medida em que não contém no seu dispositivo, todas as disposições necessárias à sua boa execução.Quando isto sucede, os estados membros têm obrigação de preencher as suas omissões por vários motivos:

(i) Porque o próprio regulamento o ordena;(j) Porque devido ao seu carácter obrigatório, o direito nacional tem de dar

execução aos actos normativos da União (291º TFUE, 4º, nº3 TUE).

6

(7) É sempre permitido às autoridades nacionais prescrever, para sua própria comodidade e razões de eficiência, a observância de certas regras de comportamento ou a sujeição dos infractores a certas penalidades.(8) Contudo, essas medidas adoptadas pelos estados membros devem ser compatíveis com os princípios do regulamento a executar e não podem servir para condicionar os direitos que o regulamento concede a outras exigências (não previstas).(9) Os estados membros podem dar instruções e orientações aos serviços administrativos responsáveis para aplicação do regulamento, desde que seja com total respeito pelas disposições regulamentares e sem adoptar disposições com efeito obrigatório.(10) Os estados membros têm obrigação de tomar todas as medidas adequadas a garantir o pleno alcance e eficácia indispensável do direito europeu. Mesmo quando uma regulamentação da UE não preveja disposições com sanções para a sua violação. Remete, nesse ponto, para as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas nacionais.

3ª característica «Aplicabilidade directa»: Os regulamentos são «directamente aplicáveis em todos os estados membros» nos termos do art.288º TFUE. Assim que sejam publicados no JO e decorrida a «vacatio legis», entram em vigor em todo o espaço da União, ficando automaticamente incorporados no direito nacional dos estados membros. O disposto no art.297º, nº1 refere que os regulamentos entram em vigor na data que eles próprios fixam ou, na falta dessa fixação, no 20º dia seguinte ao da sua publicação.

Quando falamos em «aplicabilidade directa» torna-se imperioso referir que não é necessária, nem admissível uma recepção explícita ou implícita do regulamento na ordem jurídica nacional de modo a incluir ou incorporar esse acto jurídico no corpo legislativo nacional:Os regulamentos obrigam, impõem-se como Direito da União, e não como direito nacional. Por outro lado, o regulamento produz efeitos imediatos e, enquanto tal, tem aptidão para conferir aos particulares, direitos que os seus órgãos jurisdicionais têm o dever de salvaguardar.

Os regulamentos inserem-se automaticamente no ordenamento jurídico interno dos estados membros, logo qualquer acto jurídico nacional de recepção no direito interno dos estados é dispensável e proibido por se entender que viola, desrespeita o «p. aplicabilidade directa».

7

De facto, o regulamento goza do «p. imediatismo ou automatismo federal». Contudo, é importante realçar que tal não implica que seja sempre imediatamente aplicável: além da vacatio legis, a aplicação do regulamento pode depender de medidas complementares a adoptar, pela instituição comunitária competente (290º, 291º, nº2 TFUE) mediante “regulamentos de execução”, e/ou pelas autoridades nacionais competentes (ex. através da criação de serviços ou adopção de providências administrativas ou financeiras que visam possibilitar o cumprimento das disposições do regulamento). Por isto se diz que «aplicabilidade directa» não equivale a «aplicabilidade imediata».

Os regulamentos de execução subordinam-se aos regulamentos de base. Estes consistem em regulamentos que visam estabelecer as bases gerais do regime jurídico a adoptar. Recorre-se a estes para aplicar disposições de tratados ou outras convenções vinculativas da UE.

Os regulamentos de base limitam-se, muitas vezes, a formular «os elementos essenciais da matéria a regular». Não deve é remeter para o regulamento de execução algo para além do desenvolvimento das medidas necessárias à execução das disposições fundamentais que constam do regulamento base.

Os regulamentos de execução dão, como o próprio nome indica, execução aos regulamentos de base, cujo regime jurídico pormenorizam e desenvolvem, estabelecendo as condições e meios da sua aplicação. Por outro lado, não podem modificar as disposições do regulamento base. A competência para adopção de regulamentos de base cabe exclusivamente ao Conselho. Pelo contrário, apesar de a competência para a sua adopção ser atribuída ao Conselho, a verdade é que são maioritariamente conferidos à Comissão (290º TFUE).

- DIRECTIVA –Nos termos do art.288º «vincula o estado membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando liberdade quanto à forma e meios de atingir o mesmo».Fixa imperativamente o resultado que no interesse comum devia ser atingido e permite que cada estado membro escolha os meios e formas mais adequadas para alcançar o desiderato pretendido.Representa um mecanismo mais flexível, adaptado a objectivos menos ambiciosos (face aos do regulamento) de aproximação das legislações nacionais e de realização de finalidades comuns de natureza jurídica, técnica, económica, fiscal e social, ao mesmo tempo que permite atender aos particularismos nacionais deixando aos estados membros certa margem de liberdade na criação das regras adoptadas pela UE.

8

- Características –

(1) Ausência de carácter geral: Destinatários são os Estados membros;(2) Obrigatoriedade quanto ao resultado a atingir;(3) Liberdade de escolha de forma e meios;(4) Aplicabilidade directa

Ausência de Carácter Geral: obriga apenas os destinatários que ela própria designa, os quais são exclusivamente Estados-membros.Mesmo quando a directiva se dirige a todos os estados membros, nem por isso perde o seu carácter individual, pois os destinatários são certos e determinados. Só podem ser os Estados e não particulares, ex. em virtude da natureza do acto em si e aos objectivos por ele visados.

A directiva é um instrumento privilegiado de harmonização das legislações nacionais e da prossecução, em termos concertados, de objectivos comuns.O resultado a atingir é da responsabilidade das instituições da União, ie, a “nível central”. A determinação e adopção das medidas destinadas a alcançar tal resultado incumbem aos Estados destinatários da directiva.* nenhum estado se encontra em posição de definir e impor aos seus parceiros um “seu” objectivo.Como sabemos a directiva distingue-se do regulamento, na medida em que este é um acto normativo de alcance geral: destina-se não só a estados-membros, mas a todos aqueles que se integrem numa categoria abstracta, de destinatários apenas determináveis na conformidade de critérios objectivos que o próprio regulamento estabelece.

A recusa do carácter geral da directiva deve ser entendida de modo «hábil», ie, quando dirigida a todos os estados membros – 113º e 115º TFUE – e sendo aplicadas as suas disposições mediante medidas internas legislativas ou regulamentares adequadas à sua execução – opera-se uma modificação geral da situação jurídica na UE, devido à aproximação dos regimes nacionais. Deste modo, a directiva funciona como processo de legislação indirecta produzindo «efeito normativo geral».

** Noção de estado para efeitos de aplicação da directiva, aceite e utilizada pelo TJUE abarca a qualidade de estado quando exerce investido do «ius imperium» e quando desempenha as suas actividades comerciais e similares em cujo exercício

9

se liberta de poderes de autoridade, designadamente quando participa na vida económica através de empresas públicas.

Quando os particulares podem invocar uma directiva contra o Estado podem faze-lo qualquer que seja a qualidade em que este último possa faze-lo, como forma de evitar que o estado possa tirar proveito da sua veste de autoridade pública como modo de não observar o direito da União. As disposições de uma directiva podem ser invocadas pelos estados ou contra os estados por parte de particulares. E não só. Estes últimos podem ir contra organismos e entidades sujeitos à autoridade ou controlo do estado ou que possuam poderes mais amplos que os resultantes das normas aplicáveis às relações entre particulares.

(2) Obrigatoriedade quanto ao resultado a atingir: a directiva obriga os seus destinatários quanto aos fins, resultados ou objectivos a atingir no domínio económico, comercial, fiscal, social e jurídico. Impõe, pois, aos estados uma «obrigação de resultado», na dupla vertente, de atingir o fim proposto e de adoptar determinado comportamento (nos termos do disposto da directiva e do art.4º, nº3 TUE) traduzido na adopção de quaisquer medidas gerais ou especiais adequadas a atingir esse resultado.As jurisdições nacionais estão obrigadas a interpretar o direito nacional à luz do texto e da finalidade da directiva, de modo a alcançar o resultado e a excluir as normas internas contrárias à directiva, em obediência ao princípio da primazia do direito da União. Sendo fixado o resultado a atingir pelos estados membros (destinatários), os tratados dão-lhes a liberdade de providenciar quanto aos meios e forma das medidas a adoptar no quadro nacional para que a finalidade ou resultado fixado no acto comunitário sejam plenamente alcançados.

2.1. Liberdade de Escolha da Forma:

significa que o Estado pode utilizar para a adopção das medidas necessárias a atingir o resultado pretendido, qualquer modalidade ou instrumento jurídico-técnico autorizado pelo Direito interno.

É-lhe permitido actuar por via legislativa, regulamentar ou administrativa através de instruções aos agentes do Estado. No fundo, cabe a cada Estado, atendendo à sua situação concreta (jurídica, económica, social), decidir sobre a forma mais adequada à finalidade visada.

Impõe-se aos Estados acatar a obrigação de resultado prescrita pela Directiva – o que implica o cumprimento da obrigação de comportamento que se traduz no dever

10

de implementar esse acto na ordem interna ou o dever de proceder à sua correcta transposição para o Direito nacional.A liberdade de escolha sobre a forma do instrumento jurídico inclui a liberdade quanto ao conteúdo do acto interno, desde que tal não prejudique a finalidade visada (objectivo prescrito pela directiva).

2.2. Liberdade de Escolha dos Meios: é mais complicada na prática, pois por vezes para atingir o objectivo prescrito pela União, não há senão um meio a utilizar. Por outro lado, na generalidade dos casos, mais parece um regulamento, o que priva os Estados da margem de discricionariedade na escolha dos meios que o art.288º se refere.

Os Estados gozam da possibilidade de escolher, entre as medidas concretas susceptíveis de levar ao resultado prescrito pela U.E., as que lhe pareçam mais convenientes e adequadas, que perturbem menos a sua ordem jurídica interna e mais conformes ao seu regime jurídico.

O TJ, no seu Ac. 4 de Dezembro de 1974 – caso Van Duyn: passou a admitir a aplicabilidade directa da directiva sempre que estiverem preenchidos os pressupostos que ele próprio definiu.

3. Classificação das Directivas em função de: i. Autores (arts.289º e 290º)

Directivas do Parlamento Europeu e do ConselhoDirectivas do ConselhoDirectivas da Comissão

ii. Natureza Jurídica As Directivas da Comissão podem ser: a) directivas-base: com fundamento nos Tratados; b) directivas de execução: podem resultar de regulamento e de uma directiva anterior.

A adopção das directivas é precedida de consultas ao Comité Económico e Social, ao Comité das Regiões, ao Parlamento Europeu e à Comissão. As directivas devem ser fundamentadas e apenas são obrigatoriamente publicadas no JOUE quando se dirigem a todos os Estados membros. Contudo, na prática, são sempre publicadas para «informação» de todos os eventuais interessados.

11

Posteriormente, segue-se a sua assinatura pelo Presidente da instituição que as adoptou ou, quando adoptadas mediante processo legislativo ordinário (art.289º, 294º TFUE), pelo Presidente do Parlamento Europeu e pelo Presidente do Conselho (art.297º TFUE).Logo que sejam publicadas no JOUE, entram em vigor na data por elas fixada ou, na falta desta, após 20 dias a contar da sua publicação.

A data da entrada em vigor da directiva não prejudica o prazo fixado na própria directiva, que aos Estados é facultado para a implementação na ordem jurídica interna respectiva.

A «omissão» de qualquer formalidade essencial ou substancial conduz à declaração de nulidade da directiva pelo TJUE (263º).

- DECISÃO-

Art.288º TFUE: a decisão é obrigatória em todos os seus elementos para os destinatários que ela designar.Este acto unilateral obriga apenas os destinatários que ela própria designar, individualizando-os. Os destinatários podem ser Estados, pessoas singulares e pessoas colectivas (empresas e organismos).Normalmente, tem por finalidade aplicar as regras do Direito da União a casos particulares. Apresenta-se como um instrumento que as Instituições podem utilizar para aplicação do Direito comunitário por via administrativa.A decisão também pode ser utilizada para prescrever a um Estado ou grupo de Estados membros, um objectivo cuja realização procede-se mediante a adopção de medidas nacionais de alcance geral. E, assim, surge como instrumento de legislação indirecta semelhante à directiva.

- Características-1) Não tem carácter geral: limitação dos destinatários da decisão;2) Obrigatoriedade da decisão;3) Aplicabilidade directa da decisão:3.1. dirigidas aos Estados membros3.2. dirigidas pelas Instituições da UE a particulares (indivíduos ou empresas)

Seja como for, a decisão é obrigatória em todos os seus elementos. O que nos remete para a 2ª característica da decisão:

12

Obrigatoriedade em todos os seus elementos, tal como o regulamento. A decisão impõe o resultado a atingir, mas é obrigatória quanto aos modos ou formas de execução.

3ª característica: aplicabilidade directa.A questão que se levanta é saber se a decisão produz efeito jurídico imediato na ordem jurídica dos Estados membros ou se é apta para gerar na ordem jurídica interna direitos para os particulares que o juiz tem de salvaguardar. Aqui, opera-se uma distinção:i) decisões dirigidas a particulares (indivíduos ou empresas)As decisões destinadas a particulares geram direitos e obrigações para os respectivos destinatários e eventualmente para terceiros.

Exemplo 1: Art.101º TFUE – proíbe acordos entre empresas susceptíveis de falsear o jogo da concorrência no mercado interno, ferindo tais acordos de nulidade.Mas, o nº3 afasta essa proibição e a sua nulidade quando daqueles acordos resultem certos benefícios para a economia e consumidores.

Neste caso, a decisão pela qual a Comissão isenta certas empresas da proibição do nº1, concede directa e imediatamente às empresas o direito de manter o cartel que hajam formado, ficando este regularizado e oponível a quantos pretendam ver nele um cartel ilegal.

Exemplo 2: Art.102º considera incompatível com o mercado interno e proíbe o abuso de posição dominante. A Comissão pode aplicar uma sanção pecuniária aos infractores e ordenar-lhes que adoptem as medidas adequadas a reparar a infracção.

Esta decisão não é apenas aplicável directa e imediatamente na esfera jurídica das empresas em causa. Mais que isso: qualquer pessoa física ou moral fica habilitada, invocando a decisão da Comissão (porquanto esta reconheceu efeitos erga omnes à ilicitude daquele comportamento) a exigir às empresas infractoras do art.102º, a indemnização pelos prejuízos que o abuso da posição dominante lhe tenha causado.

(2) decisões dirigidas aos Estados: não podem, por regra, produziu efeito directo e imediato na esfera jurídica dos cidadãos. Antes, o entendimento corrente ia no sentido de que o art.288º apenas reconhecia aplicabilidade directa aos regulamentos e não às decisões dirigidas aos Estados.

13

Contudo, desde que o TJ, no seu acórdão 6 de Outubro de 1970 (caso Franz Grad) passou a reconhecer a possibilidade da decisão produzir efeito directo na esfera jurídica individual. Assim, se a Comissão considerar, em decisão dirigida ao Estado, que este violou as regras comunitárias da concorrência – 107º, 108º - então qualquer agente económico interessado poderá invocar essa decisão perante os tribunais nacionais, podendo instaurar contra o Estado prevaricador uma acção de indemnização por prejuízos.

- Classificação em função de:i) Autoridade competente para as tomarii) Destinatários: Estados membros (um, vários, todos); pessoas singulares ou colectivas

i) Autores.1. O Conselho (293º) tem o poder de decidir, mas em certas situações também a Comissão pode tomar as decisões que se impõem. O Parlamento Europeu pode, sozinho ou conjuntamente com o Conselho, adoptar decisões (289º, 294º).

2. Decisões da Comissão são de dois tipos:a) as decisões que dependem da competência exclusiva da Comissão. Ex: supressão das ajudas concedidas por um Estado membro a empresas nacionais em violação das regras da concorrência (108º, nº2 TFUE).b) decisões que autorizam os Estados membros a adoptar certos comportamentos no caso de a violação das regras de concorrência (105º, nº2).

- Condições de Forma:As decisões devem ser precedidas de consultas que estejam previstas nos tratados. Devem ser fundamentadas.As decisões do PE e do Conselho (processo legislativo ordinário) são obrigatoriamente publicadas (297º); as demais decisões devem ser notificadas aos respectivos destinatários, produzindo efeitos apenas relativamente a eles mediante notificação e para informação do público em geral devem ser publicadas no JOUE (297º, nº2).

A falta das consultas obrigatórias ou de fundamentação tornam o acto nulo por omissão das formalidades essenciais (263º). A falta de notificação não determina a nulidade da decisão, mas sim a inoponibilidade ao destinatário.

III - Outras Fontes de Direito Comunitário são, designadamente:i) Princípios Gerais de Direito;

14

ii) Jurisprudência do TJ;iii) Costume

Princípios Gerais da União Europeia – englobam outros princípios fundamentais, como designadamente:i) Princípios de DIPii) Princípios que o TJUE capta no direito interno de cada Estado membroiii) Princípio que deduz das exigências da própria construção europeia e da ordem jurídica que a rege

Noção: consistem em exigências de justiça e de respeito de certos valores superiores do indivíduo e da sociedade civilizada em que este se insere.Servem igualmente para auxiliar a tarefa de interpretação do Direito da União Europeia e a preencher as respectivas lacunas legislativas.

O TJUE recorre a Princípios de DIP para:1º. Resolver conflitos entre os Tratados que regem a União e um outro Tratado celebrado por Estados membros entre si e Estados membros com 3ºs países;2º. Para interpretar os Tratados, recorrendo aos métodos de interpretação consagrados no DIP;3º. Quando se revela conveniente reafirmar o carácter obrigatório dos Tratados em que a União se baseia:O TJUE actua por vezes como verdadeiro tribunal internacional e mesmo quando assim não sucede, a sua competência resulta de tratados internacionais. Ora, estes obedecem a regras de DIP, desde o momento da sua conclusão, validade e obrigatoriedade (Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados).

Em contrapartida, o TJUE afasta o recurso aos princípios do DIP sempre que estes sejam incompatíveis com a natureza jurídica, estrutura institucional e objectivos da União. Contudo, em certos casos, o Direito da União prevê expressamente que uma questão relativa à sua aplicação seja resolvida com base no direito interno dos Estados membros.

Noutras situações, o TJUE opta por aplicar princípios que ele próprio deduz desse direito. Seja como for, existem princípios gerais comuns aos direitos de todos os Estados membros, nos termos do art.340º TFUE.

De todo o elenco de princípios fundamentais resultantes da natureza jurídica específica da UE, na sua missão de interpretar e aplicar os Tratados com respeito

15

pelo Direito, prevista nos termos do art.19º, nº1 TUE, importa realçar, devido à sua relevância, os seguintes:

P. igualdade de tratamento, P. não discriminação, P. liberdade, P. solidariedade, P. coesão económica e da Preferência comunitária, P. equilíbrio institucional, P. aplicabilidade directa, P. Primazia do Direito Comunitário (Primado ou Prevalência), P. efectividade ou do efeito útil das disposições dos Tratados.

Vamos desenvolver, com maior acuidade, os princípios relativos à “garantia da eficácia do Direito da União na ordem jurídica interna dos Estados membros”. São eles: P. Primazia, P. Aplicabilidade directa, P. Uniformidade de interpretação das disposições do Direito da União e de apreciação de validade dos actos adoptados pelas suas instituições.

I – Eficácia Interna do Direito da União: “Federalismo Jurídico” da UE.

É característica base de um sistema federal que as leis emanadas dos órgãos centrais de uma federação sejam aplicáveis directamente em todo o território do Estado. Em caso de conflito face a leis locais, os tribunais devem reconhecer a primazia da lei federal sobre a lei do Estado federado.

As normas do direito federal gozam de uma interpretação uniforme e de apreciação de validade em todo o espaço federal. Estas normas são salvaguardadas por um tribunal supremo apto para garantir a unidade do ordenamento jurídico do Estado.

“O Direito Federal prevalece sobre o Direito dos Estados que o compõem (federados)”. A primazia do direito da federação sobre o direito dos Estados federados implica a aplicabilidade directa das normas federais.

Contudo, a UE não é, pelo menos, ainda uma federação de Estados. A prossecução dos objectivos enunciados nos tratados exige uma aplicação uniforme do direito da União como Direito Comum a todos os seus Estados membros que pretendem realizar a sua integração económica.Deste modo, revela-se necessário que:- as normas do Direito da União se integrem automaticamente, de pleno direito, na ordem jurídica interna dos Estados;- as normas do Direito da União exclui a aplicação de quaisquer normas nacionais contrárias;- as normas de Direito da União beneficiam em todos os Estados membros, de uma interpretação uniforme e de uma uniforme apreciação de validade, assim como,

16

- beneficiam da salvaguarda jurisdicional do respeito devido à ordem jurídica da UE

17