direito ambiental sistematizado - toshio mukai

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MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. 197 páginas. (14 copiadas) CAPÍTULO I CONCEITUAÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL 1. Meio ambiente Duas são as posições que o homem pode adotar em face dos bens da Criação segundo o seu comportamento: dono/custodiante (visão criativista do universo e se inspira na reta interpretação do ‘Genesis’) ou explorador/destruidor (fruto de uma visão materialista do mundo, é a causa do desastre produzido pela civilização). A concepção materialista entende que o mundo só é produto de uma evolução casual e não está ordenado por uma inteligência criadora, cabendo ao homem através de sua atuação criativa ordenar tais fatores de modo a facilitar a sua exploração. Para ela o homem na Antigüidade considerava-se parte da natureza, vivendo em harmonia com o ambiente, sendo abalada com a doutrina do antropocentrismo. Heisenberg diz: “A natureza, não mais cenário participante da vida divina e humana, tornou-se objeto indiferente e homogêneo das experiências científicas. O termo natureza passou a designar muito mais uma descrição científica da natureza do que ela mesma”. Para ele os elementos naturais foram ‘reduzidos a equações matemáticas, fórmulas científicas, esquemas racionais e pragmáticos, elementos físicos do universo’. Ernest Haeckel em 1866 que criou o termo ecologia para designar a investigação das relações totais do animal tanto com seu ambiente orgânico como inorgânico. Em 1981, Suetônio Mota disserta sobre ecossistema: ‘é formado de dois sistemas intimamente inter-relacionados: o ‘sistema natural’, composto do meio físico e biológico (solo, animais, vegetação, etc.) e o ‘sistema cultural’, consistindo nas atividades do homem. Modernamente entende-se por ecossistema como as interações do meio físico com a espécie que nele habita e vive. No que toca a expressão ‘meio ambiente’ temos as seguintes definições: a) Interação de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida do homem. b) ‘Trata-se do homem (com seus problemas) ou de qualquer outro animal, ou vegetal, uma espécie viva, que insere-se em um tecido de co-ações entre os seres que ocupam o meio que os acolhe’. (Paulo Affonso Leme Machado) c) ‘é possível individualizar três sentidos para a expressão ambiente: como modo de ser global da realidade natural baseado num dado equilíbrio dos seus elementos; como soma de bens culturais; e, como ponto de referência objeto dos interesses e do direito urbanístico, respeitantes ao território como espaço’. (M. S. Giannini) d) ‘Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos fatores econômicos, sociais e culturais com efeito direto ou

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Fragmento da obra "Direito Ambiental Sistematizado, de Toshio Mukai. Neste arquivo você encontrará o conceito, as características e outras peculiaridades do Direito Ambiental. Os direitos autorais são reservados ao autor da obra.

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MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. 197 páginas. (14 copiadas)

CAPÍTULO ICONCEITUAÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL

1. Meio ambiente

Duas são as posições que o homem pode adotar em face dos bens da Criação segundo o seu comportamento: dono/custodiante (visão criativista do universo e se inspira na reta interpretação do ‘Genesis’) ou explorador/destruidor (fruto de uma visão materialista do mundo, é a causa do desastre produzido pela civilização).

A concepção materialista entende que o mundo só é produto de uma evolução casual e não está ordenado por uma inteligência criadora, cabendo ao homem através de sua atuação criativa ordenar tais fatores de modo a facilitar a sua exploração. Para ela o homem na Antigüidade considerava-se parte da natureza, vivendo em harmonia com o ambiente, sendo abalada com a doutrina do antropocentrismo. Heisenberg diz: “A natureza, não mais cenário participante da vida divina e humana, tornou-se objeto indiferente e homogêneo das experiências científicas. O termo natureza passou a designar muito mais uma descrição científica da natureza do que ela mesma”. Para ele os elementos naturais foram ‘reduzidos a equações matemáticas, fórmulas científicas, esquemas racionais e pragmáticos, elementos físicos do universo’.

Ernest Haeckel em 1866 que criou o termo ecologia para designar a investigação das relações totais do animal tanto com seu ambiente orgânico como inorgânico.

Em 1981, Suetônio Mota disserta sobre ecossistema: ‘é formado de dois sistemas intimamente inter-relacionados: o ‘sistema natural’, composto do meio físico e biológico (solo, animais, vegetação, etc.) e o ‘sistema cultural’, consistindo nas atividades do homem.

Modernamente entende-se por ecossistema como as interações do meio físico com a espécie que nele habita e vive.

No que toca a expressão ‘meio ambiente’ temos as seguintes definições:a) Interação de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciam o desenvolvimento equilibrado da vida do homem.b) ‘Trata-se do homem (com seus problemas) ou de qualquer outro animal, ou vegetal, uma espécie viva, que insere-se em um tecido de co-ações entre os seres que ocupam o meio que os acolhe’. (Paulo Affonso Leme Machado)c) ‘é possível individualizar três sentidos para a expressão ambiente: como modo de ser global da realidade natural baseado num dado equilíbrio dos seus elementos; como soma de bens culturais; e, como ponto de referência objeto dos interesses e do direito urbanístico, respeitantes ao território como espaço’. (M. S. Giannini)d) ‘Ambiente é o conjunto dos sistemas físicos, químicos, biológicos e suas relações e dos fatores econômicos, sociais e culturais com efeito direto ou indireto, mediato ou imediato, sobre os seres vivos e a qualidade de vida dos homens’. (Lei de ases do ambiente de Portugal)e) Giannini prega inexistir conceito unitário de meio ambiente, mas Postiglione entende como necessário a unificação. Luís Felipe Colaço Antunes advoga: ‘a necessidade de uma noção unitária de ambiente resulta não só da multiplicidade de aspectos que caracterizam as atividades danosas para o equilíbrio ambiental, por conseguinte de uma planificação global, mas também da necessidade e relacionar o problema da tutela do ambiente com os direitos fundamentais da pessoa, nomeadamente o da saúde”.f) ‘Meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.’ (inciso I, do art. 3º da Lei 6.938/81).

2. Direito do meio ambiente: natureza jurídica. Designações.

2.1 Natureza jurídica

Luís Felipe Colaço Antunes conceitua interesse difuso como ‘o interesse juridicamente reconhecido, de uma pluralidade indeterminada ou indeterminável de sujeitos que, potencialmente, pode incluir todos os participantes da comunidade’.

Mais adiante explica que: ‘Objetivamente, o interesse difuso estrutura-se como um interesse pertencente a todos e cada um dos componentes da pluralidade indeterminada de que se trate. Não é um simples interesse individual, reconhecedor de uma esfera pessoal e própria, exclusiva do domínio. O interesse difuso é o interesse que cada indivíduo possui pelo fato de pertencer à pluralidade de sujeitos a que se refere a norma. Tão pouco é o interesse próprio de uma comunidade organizada, constituída pela soma dos interesses (ou de alguns deles) dos indivíduos concretos que a compõem e, portanto, exclusivo. O conteúdo ou a conseqüência jurídica do interesse difuso é o reconhecimento de uma pluralidade de situações objetivas a sujeitos individuais ou a entes associativos. Nisto, se diferencia do interesse público clássico, mais ou menos geral, inclusive quando a pluralidade em que se reconhece o interesse seja tendencialmente coincidente com a totalidade dos cidadãos. Quer dizer, o

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interesse difuso supõe um ‘plus’ de proteção ou uma proteção diversificada de um bem jurídico; pública, por um lado, e dos cidadãos por outro. Quando se diz que o Estado tutela o direito ao ambiente, nesta fórmula reconhece-se um interesse público, a faculdade de atuação do Estado, mas ao mesmo tempo um interesse jurídico, não meramente de fato, de todo cidadão à proteção adequada do bem ambiental, segundo os ditames do ordenamento jurídico. Assim, podemos dizer que o interesse difuso é um interesse híbrido, que possui uma alma pública e um corpo privado, que transcende o direito subjetivo privado e se estende pelo público. É um interesse coletivo-público, um interesse pluriindividual de relevância pública, cuja forma mais natural de agregação é a forma associativa. Um interesse comunitário de natureza cultural, não corporativo.’

Por fim o autor conclui que ‘no que se refere a sua natureza o ambiente é um interesse público, difuso, unitário e pluralista’.

2.2 Designações

Direito ecológico, Direito ambiental, Direito do ambiente, Direito do meio ambiente, etc. Prefere-se a denominação Direito Ambiental.

3. Direito Ambiental: conceito

Sérgio Ferraz: ‘conjunto de técnicas, regras e instrumentos jurídicos organicamente estruturados, para assegurar um comportamento que não atente contra a sanidade mínima do meio ambiente’

Carlos Gomes de Carvalho: ‘conjunto de princípios e regras destinados à proteção do meio ambiente, compreendendo medidas administrativas e judiciais, com a reparação econômica e financeira dos danos causados ao ambiente e aos ecossistemas, de uma maneira geral’.

Nossa posição: O direito ambiental (no estágio atual de sua evolução no Brasil) é um conjunto de normas e institutos jurídicos pertencentes a vários ramos do Direito, reunidos por sua função instrumental para a disciplina do comportamento humano em relação ao seu meio ambiente.

CAPÍTULO IIAS COMPETÊNCIAS DOS ENTES FEDERADOS EM MATÉRIA AMBIENTAL NA CF/88

1. A distribuição de competências no federalismo. As regras tradicionais. O novo federalismo de cooperação.

1.1. As regras tradicionais do federalismo clássico

M. Mouskheli: Estamos em presença de Estados federais quando existem no mesmo território dois grupos governantes: os centrais e os locais, correspondendo os primeiros ao Estado federal, e os segundos, aos Estados-membros. O Estado federal é um Estado que se caracteriza por uma centralização de forma especial e de grau elevado que se compõe de coletividades-membros dominadas por ele, mas que possuem autonomia constitucional bem como participam da formação da vontade federal, distinguindo-se desta maneira de todas as demais coletividades públicas inferiores.

Para nós a federação se constitui de uma descentralização territorial instituída no nível da Constituição, onde coexistem governos autônomos políticos que dão leis a si próprios.

O Prof. José Alfredo de Oliveira Baracho aponta quais seriam os pontos em comum dos Estados federais:. divisão dos poderes de modo que os governos (central e locais) sejam independentes dentro de sua competência. equilíbrio da pluralidade com a unidade. manutenção da unidade do Estado (princípios constitucionais sensíveis). o ato constituinte do Estado federal é um ato político que integra uma unidade conjunta com coletividades particulares. é um Estado soberano composto de vários Estados. Constituição surge como norma principal que tem eficácia e validade para dar suporte, também, aos ordenamentos locais. A preeminência da Constituição federal não retira a atribuição dos Estados particulares em elaborar a própria organização constitucional. A Constituição ordena uma distribuição de competências que determinam as relações entre a federação e os Estados

O mesmo autor sublinha que a repartição de competência é essencial à definição jurídica da federação, decorrendo daí o princípio federal de que cada um dos componentes tem sua órbita de ação circunscrita, que decorre da Constituição.

Convém relembrar que o nosso sistema constitucional, desde 1891, copiou a estrutura de distribuição de competência clássica do Direito norte-americano, por obra de Rui Barbosa, adotando a fórmula de competências enumeradas (União e municípios) ou de poderes remanescentes (estados-membros).

Em matéria de distribuição de competências o nosso constituinte vem adotando as denominadas competências horizontais (privativas) e as verticais (concorrentes). As verticais realizam uma distribuição idêntica de matéria legislativa entre a União e os

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Estados-membros, estabelecendo condomínio legislativo consoante regras constitucionais de convivência. Nas competências concorrentes a relação entre lei federal e lei estadual passa de hierarquia e não de competência.

1.2. O federalismo cooperativo

O federalismo clássico deu lugar, em sua evolução, a uma nova forma de relacionamento entre os níveis de governo, trata-se do denominado federalismo cooperativo.

Nele os níveis de governo não se digladiam pela suas competências, mas se unem para, cada qual, dentro de suas atribuições, darem conta das necessidades dos administrados.

É o que pretendeu o constituinte ao contemplar a competência comum no art. 23, prevendo que lei complementar fixará normas para a cooperação entre os entes visando o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

2. As competências dos entes na CF/88

2.1. Privativas

União: art. 21 (ordem administrativa) e 22 (ordem legislativa).Municípios: art. 30, interesse localEstados: art. 25, toda aquela não vedada pela CF

2.2 Comuns

Primeira vez que o constituinte insere este tipo de competência na CF, dispondo somente de competência de ordem administrativa.

Neste tipo de competência só cabe a atuação compartida, em termos de cooperação. Aqui se trata de resolver questões de administração ambiental, no sentido de solucionar, com recursos financeiros e de pessoal, os problemas ambientais que envolvam elaboração de obras. Não pode haver atuação a título de exercício do poder de polícia, posto que este tipo de competência só cabe no âmbito privativo de cada ente.

2.3 Concorrente

O constituinte exclui expressamente o Município, mas deu a ele a oportunidade de complementar a legislação que existir com vistas no interesse local.

O critério de prevalência da legislação da União, frente aos outros entes e do Estado ao Município não afeta o princípio federativo da autonomia dos entes políticos.

2.4 Distinções entre competência comum e concorrente

Comum: a competência é estabelecida a título de cooperaçãoConcorrente: estabelece-se a hierarquia administrativa, onde o exercício primário do poder está vinculado a ela. A União e Estados só podem legislar para estabelecer normas gerais.

CAPÍTULO IIIPRINCÍPIOS QUE REGEM O DIREITO AMBIENTAL

1. Princípios gerais

São em sua maioria de natureza pública, mais precisamente, manifestações do exercício do poder de polícia.

Destaca-se: proporcionalidade dos meios ao fim (não se pode admitir que o legislador e a administração imponham a liberdade restrições que excedam ao que é necessário para atender o fim perseguido).

2. Princípios constitucionais da Ordem Econômica e a proteção do meio ambiente: a ponderação dos interesses em conflito

Tendo em vista o que dispõe o art. 170 da CF entendemos que a CF sufragou uma democracia econômica e social.

Assim, os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência não são princípios hierarquicamente superiores, podendo ser restringidos na conformidade do interesse social.

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J.J. Gomes Canotilho: o princípio da democracia econômica e social contém uma imposição obrigatória dirigida aos órgãos de direção política, no sentido de desenvolverem uma atividade econômica e social conformadora, transformadora e planificadora das estruturas socioeconômicas, de forma a evoluir-se para uma sociedade democrática. Constitui uma autorização constitucional no sentido de o legislador político-constitucional adotarem as medidas necessárias para a evolução da ordem constitucional sob a ótica de uma justiça constitucional nas vestes de justiça social.

O princípio da democracia econômica e social é um elemento essencial de interpretação conforme a Constituição. O legislador, a administração e os tribunais terão de considerar este princípio como obrigatório para se avaliar a conformidade dos atos do poder público com a Constituição. Essa interpretação se destaca nos casos de exercício do poder discricionário e de conceitos indeterminados. Constitui uma medida vinculativa do exercício da discricionariedade e uma linha de direção obrigatória na concretização do conceito indeterminado.

Assim, há que se compatibilizar os princípios elencados no art. 170 da CF, observando a obrigação de ponderação dos interesses contrapostos. Essa ponderação deve conduzir a uma fusão e a um entrelaçamento de todos os interesses em conflito. A ponderação deve também permanecer no nível da adequação, da harmonização, da justa medida e dos sacrifícios dos interessados, sem aniquilar um e sem causar prejuízos ao outro.

O Prof Nagib Slaibi Filho assevera que o meio ambiente é considerado bem de uso comum do povo, o que o exclui do rol de bens economicamente utilizados por particulares com exclusividade.

A invocação do direito de propriedade e da livre concorrência, em face da contraposição à defesa do meio ambiente, será inconstitucional, posto que, nessa situação, o bem ou o direito à atividade privada estarão atrelados, indissoluvelmente, às condições legais previstas pelos órgãos públicos, que visem à defesa referida.

3. Princípios fundamentais do direito ambiental

3.1. Inexistência de principiologia no direito pátrio

Fernando Alves Correia afirma que seguindo a doutrina alemã temos três princípios: prevenção, poluidor pagador ou responsabilização e cooperação ou participação.

3.2. Significados dos princípios fundamentais do direito ambiental

- Prevenção: prioridade para as medidas que evitem o nascimento de atentados ao meio ambiente, as atuações com efeitos imediatos ou a prazo no ambiente devem ser consideradas de forma antecipada, reduzindo ou eliminando causas, prioritariamente à correção dos efeitos dessas ações ou atividades suscetíveis de alterarem a qualidade do ambiente (inciso I do art. 2º da Lei 6.938/81)

- Poluidor pagador ou da responsabilização: o poluidor é obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultantes, não lhe sendo permitido continuar a ação poluente, apontando para a assunção, pelos agentes, das conseqüências, para terceiros, de sua ação, direta ou indireta, sobre os recursos naturais (inciso VII do art. 4º, e §3º do art. 14, todos da Lei 6.938/81).

- Cooperação: princípio fundamental do procedimento do direito ambiental e expressa a idéia de que para a resolução dos problemas do ambiente deve ser dada especial ênfase à cooperação entre o Estado e a sociedade, através da participação dos diferentes grupos sociais na formação e execução da política do ambiente. É contemplado genericamente no art. 225 da CF.

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CAPÍTULO IVINSTITUTOS E INSTRUMENTOS JURÍDICOS DO DIREITO AMBIENTAL

1. O poder de polícia do Estado

É através do poder de polícia que o Poder Público protege, fundamental e precipuamente, o meio ambiente. A grande maioria das leis administrativas tendentes à proteção ambiental veicula restrições ao uso da propriedade e às atividades em geral, visando ao equilíbrio ecológico.

Designado como:-É uma faculdade inerente ao Estado;-Poder superior a todos os membros da coletividade;-Atributo de que é dotado o Estado de limitar, restringir, o uso da propriedade, das liberdades e atividades dos particulares individualmente considerados, em benefício da coletividade.-Conjunto de contribuições concedidas à administração para disciplinar e restringir, em favor do interesse público adequado, direitos e liberdades individuais (Caio Tácito);-Atividade administrativa do Estado que tem por fim limitar e condicionar o exercício das liberdades e direitos individuais visando assegurar, em nível capaz de preservar a ordem pública, o atendimento de valores mínimos da convivência social, notadamente a segurança, a salubridade, o decoro e a estética (Diogo Figueiredo Moreira Neto).-O poder de polícia, police power, em sentido amplo, compreende um sistema total de regulamentação interna, pelo qual o Estado busca não só preservar a ordem pública, senão também estabelecer para a vida de relações dos cidadãos aquelas regras de boa conduta e de boa vizinhança que se supõem necessárias para evitar conflitos de direitos e para garantir a cada um o gozo ininterrupto de seu próprio direito, até onde for razoavelmente compatível com o direito dos demais (Cooley).

Sua extensão abrange desde a moral, bons costumes até a preservação da saúde pública, segurança, construções, etc.

O seu exercício só pode ser limitado através da Constituição e dos princípios de direito público e ambiental. Além de ser razoável e proporcional, o poder de polícia deve coexistir com as necessidades do momento. Toda lei que vá além do razoável, abolindo direitos cujo exercício não implica em atendimento dos demais, não pode ser incluída no poder de polícia do Governo.

O principal meio de atuação deste poder é a ordem, proibição, restrição, alvará, licença, autorização ou fiscalização.

A desobediência às normas gera o poder-dever de aplicar as sanções. Tal aplicação será sempre precedida de procedimento contraditório.

2. Dever de publicidade

Já a Lei 6.938/81 previa a publicação no diário oficial dos pedidos de licenciamento, renovação e a respectiva concessão. Impõe ainda o dever de fornecer a qualquer interessado qualquer informação sobre as análises efetuadas (art. 6º, §3º; art. 10, §1º).

A CF/88 também repete a imposição de publicidade (art. 225, §1º, IV, final).

3. A obrigatoriedade do estudo de impacto ambiental

A obrigatoriedade decorre da CF/88 (art. 225, §1º, IV) e da Lei 6.938/81 (art. 9º, III).

A obrigatoriedade se dirige não a qualquer obra que afete o meio ambiente, mas sim a obras e atividades que potencialmente possam causar dano significativo ao meio ambiente.

A exigência de ‘na forma da lei’ se refere a lei editada pelo ente administrativo competente para conceder o licenciamento.

No sistema americano a responsabilidade de fazer o estudo é da administração pública, enquanto que no sistema europeu a responsabilidade é do proponente do projeto.

No Brasil, procura-se situar a equipe multidisciplinar com presença participativa e atuante dos especialistas da sociedade civil no procedimento de planejamento, ficando entre o Estado e o empresário.

O estudo culmina por apontar e oferecer ao administrador público e ao interessado no projeto uma ou várias alternativas para a sua implantação, visando a evitar, tanto quanto possível, prejuízos ao meio ambiente.

Para acolher ou não as indicações do estudo, o órgão ambiental deve fundamentar a decisão tomada.

4. Zoneamento ambiental

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Instrumento de proteção ambiental, situado em todos os níveis da administração.

O livro não traz conceito, mas entendi que parece ser uma delimitação das áreas e locais a serem aproveitados, quais não podem ser aproveitados e quais não interessam para a intervenção dos órgãos.

Por se tratar de competência concorrente, a União dita normas gerais, os Estados regionais e o Municípios locais, não podendo um interferir na competência de outro.

5. Os impostos e seu uso extrafiscal, os preços públicos e a defesa do ambiente

5.1. Os impostos e seu uso extrafiscal.

O uso extrafiscal, na tributação das nações civilizadas, é uma medida comum. Ao lado da função arrecadatória, os tributos ganharam função regulatória, tão importante como a primeira, que é a de intervir nas atividades dos indivíduos, ora incentivando, ora desestimulando certas ações, no interesse da coletividade, mediante isenções, reduções, suspensões, ou mesmo, da tributação progressiva. É comum a sua utilização no direito urbanístico (no Brasil: ITPU e ITR)

5.2. Os preços públicos e a defesa do meio ambiente

-A possibilidade de cobrança de preços públicos pelo uso ou derivação de recursos hídricos:A titularidade das águas encontra-se no domínio público, e se divide:a) União: mar territorial, lagos, rios e quaisquer correntes sob seu domínio ou que banhem mais de um Estado, façam limites com outros países ou dele provenhamb) Estados: águas superficiais, subterrâneas, fluentes, emergentes ou em depósito, salvo as da Uniãoc) Município: não tem titularidadeA competência legislativa é exclusiva da União, mas pode o Estado instituir sistema estadual de gerenciamento dos seus recursos hídricos aproveitando a legislação da União.A classificação das águas se dá de acordo com o Código de Águas: uso comum (navegáveis, flutuáveis, captação pública e açudagem e ainda aquelas em zonas de seca), dominicais (não tem serventia pública) e particulares (extinta pela CF/1946 até o momento).É certo ainda que os bens de uso comum do povo são passíveis de utilização especial por determinados membros da coletividade, mediante autorização. O uso pode ser gratuito ou oneroso (art. 36 §2º do Código de Águas). Sendo oneroso o valor pago é considerado preço público.

-Impossibilidade constitucional da cobrança de preços públicos pela utilização dos demais recursos ambientaisO art. 225 da CF, embora tenha declarado que o meio ambiente é bem de uso comum do povo, não o declarou como sendo público e sim interesse difuso. Nessas condições os recursos ambientais, salvo os hídricos e o subsolo não podem ser considerados públicos, constitucionalmente.

6. Estabelecimento de padrões ambientais

As normas gerais são lançadas pela União, e as normas suplementares por Estados e DF. Outras normas, que embora não sirvam de padrões ambientais, mas que visam a observância das regras e comandos essenciais à proteção do meio ambiente também tem esse ‘status’.

7. Responsabilidade civil objetiva

7.1. A responsabilidade objetiva pelos danos ambientais.

A Lei 6.938/81 institui a responsabilidade objetiva pela prática de qualquer dano ambiental (§1º do art. 14).

O dispositivo não esclarece qual a teoria adotada (do risco ou integral). Entretanto é pacífico tanto na doutrina como na jurisprudência que desde 1946 o constituinte brasileiro abraçou a teoria do risco administrativo e não a do risco integral.

No direito ambiental, a resp. civil objetiva é baseada no risco criado, tendo em vista que somente se exige a responsabilidade se o dano foi causado pela atividade do poluidor, excluindo-se a responsabilidade sob qualquer atividade estranha a realizada efetivamente por ele.

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Relativamente a responsabilidade causadas por danos nucleares o legislador não foi diferente, embora se doutrine o contrário. Os art. 4º e 8º da Lei 6.453/77 fazem a exclusão de algumas hipóteses: culpa da vítima (fato de terceiro); conflito armado, guerra civil, insurreição (caso fortuito) ou fato da natureza (força maior).

A responsabilidade civil do Estado por ato ou omissão da administração:- O Brasil nunca adotou a teoria da irresponsabilidade- A responsabilização foi subjetiva (CC 1916) até a Constituição de 1946 (que introduziu o risco administrativo)- A teoria do risco integral não foi acolhida no Brasil- A teoria do ‘fault du service public’ ou da ‘culpa anônima do serviço’ está acolhida por nós.- É possível a responsabilização por dolo ou culpa do funcionário- A responsabilidade civil da Administração exsurge de comportamentos comissivos ou omissivos;- A Administração é responsável pode danos causados por ações omissivas ou comissivas, bem como por atos legais e ilegais.- A Administração só responde por fatos de outrem se agiu ou deixou de agir com culpa grave.- A responsabilidade solidária da Administração surge quando: a) mesmo dentro dos padrões impostos há dano; ou, b) quando o poluidor funciona com autorização do poder público. O texto legal não admite essa extensão da responsabilização, o que se afigura injusto tendo em vista que se o empresário cumpre as normas impostas pela administração e com sua autorização, ele acredita que as seguindo não causa dano.- São excludentes a culpa da vítima e o motivo de força maior, o caso fortuito não se inclui por se encontrar no risco da atividade.

8. Criminalização dos danos ambientais

Não seria possível uma proteção eficaz do ambiente sem a colaboração do Direito Penal, nos dizeres de Paulo José da Costa Jr. e G. Gregori.

Existe uma tendência em acentuar, na construção da norma penal ambiental, a indicação do fim perseguido, em prejuízo da descrição precisa do fato vetado. Esse tipo de norma confia grande discricionariedade ao juiz e presta-se felizmente aos destinos incertos de uma interpretação evolutiva, o tipo tende a ter caráter exemplificativo.

A indeterminação dos tipos demonstra que a atitude legislativa tenta proteger a qualquer preço os bens que estão sendo destruídos. O caráter indeterminado do tipo visa punir o maior número de condutas poluentes. No atual estágio não é possível tutelar diversamente, mas de forma adequada, os bens ecológicos. Na construção da norma penal ecológica deve-se em grande parte prescindir da conduta vetada, para concentrar a maior atenção nas características e nos tipos de lesão que ofendem o bem protegido.

Quanto ao crime de dano ecológico, ocorre sempre que a tutela emprestada ao bem natural considere o momento em que se verificam os efeitos da inquinação e o dano constitui-se numa alteração da situação preexistente em razão da ação de determinado sujeito. O crime comportará a valoração da lesão efetiva de um bem ambiental. Esses crimes não são freqüentes e a norma no caso concreto fica de difícil aplicação.

Quanto ao crime ecológico ser enquadrável como crime de perigo, adiantam os autores que tal concepção exerce sobre o legislador enorme atração, porque ele torna o problema muito mais simples.

Se verifica o crime de perigo sempre que a lei transfira o momento consumativo do crime, da ‘lesão’ para aquele instante da ‘ameaça’, aperfeiçoando-se o crime no instante em que o bem tutelado encontrar-se numa condição objetiva de possível ou provável lesão.

A tendência é antecipar a proteção do ambiente natural, do momento do dano ao momento do exercício da atividade perigosa aos bens ecológicos.

A doutrina mais atenta e nas experiências legislativas de vanguarda vem se firmando que a proteção do ambiente seja confiada principalmente à autoridade administrativa. O direito penal desenvolveria a função secundária de punir a violação das prescrições administrativas. O crime ecológico então consistiria em mera desobediência aos preceitos da autoridade estatal competente em disciplinar o uso dos recursos ambientais (normas penais em branco).

8.1. As recentes sanções penais.

A Lei 9.605/98 teve o condão de introduzir a responsabilidade penal da pessoa jurídica. Introduzindo também:a) Co-autoria culposa (art. 2º): diversamente do CP (em que a co-autoria é dolosa – teoria monista), admite a responsabilização se o participante da sociedade sabia do crime e podia agir para evitar e se omitiu (o autor fala em autoria culposa, mas me parece que seja co-autoria por omissão).b) A responsabilização da pessoa jurídica sempre que: ocorrem os ilícitos previstos nela e que a prática seja do interesse ou benefício da entidade.c) Desconsideração da pessoa jurídica sempre se esta se tornar obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.d) Duração da pena restritiva de direitos no mesmo tempo da pena substituída (no CP é diferente §4º do art. 46).

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9. O controle administrativo preventivo: autorizações, concessões e permissões

É feito por meio de autorizações e licenças (esta somente no tocante ao direito de construir).

Por ser bem de uso comum do povo o Poder Público pode, de modo discricionário, por via de Autorização, conceder o exercício de qualquer atividade, construção, obras ou empreendimentos.

O emprego na legislação e na doutrina do termo licenciamento não traduz necessariamente a utilização da licença, em seu rigor técnico, sempre tendo o sentido de autorização. Por isso, sempre que a lei 6.938/81 fala em licenciamento, emprega essa como sinônima de autorização (ato discricionário e precário).

No tocante a recursos hídricos sua utilização é outorgada mediante concessões ou permissões.

9.1 Licenciamento ambiental e estudo de impacto ambiental

A Lei 6.938/81 outorgou ao CONAMA estabelecer, mediante proposta do IBAMA, normas e critérios para o licenciamento. Essa norma foi editada, é a Resolução nº 237/97.

Esta resolução trouxe:- Distribuição de competências para conhecer do licenciamento e outorgar autorização:a)IBAMA: empreendimentos e atividades de âmbito nacional ou regionalb)Órgão ambiental estadual ou do DF: empreendimentos e atividades: desenvolvidos ou localizados em mais de um município, realizados em área de conservação de domínio do estado, localizados em florestas ou vegetação de preservação permanente (Código Florestal), ou cujo impacto ambiental ultrapasse mais de um município.c)Órgão ambiental municipal: empreendimento de impacto local, após ouvidos os órgãos federais estaduais.- Única instância de licenciamento: as atividades serão licenciadas em um único nível de competência (federal, estadual ou municipal).- Requisitos para exercício das competências: deverão ter implementado: Conselhos de Meio Ambiente com caráter deliberativo, participação social e por meio de profissionais legalmente habilitados.- A elaboração de Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto no Meio Ambiente (EIA/RIMA) somente para as atividades consideradas efetiva e potencialmente causadoras de significativa degradação ao meio ambiente, dando-se publicidade ao mesmo. (A significativa degradação é requisito introduzido pela CF/88, antes seriam todas as atividades que degradassem o meio ambiente). As atividades foram relacionadas no Anexo nº 1 da resolução.

Outras resoluções trataram do tema: Resolução nº 279 (empreendimentos elétricos com pequeno potencial de impacto), Resolução nº 273 (localização, construção, instalação, modificação, ampliação e operação de postos revendedores de combustíveis)

10. Controle administrativo repressivo: embargos de obras, interdições de atividades e fechamento de estabelecimentos

É feito mediante a utilização de institutos básicos classificados na teoria dos atos administrativos como atos punitivos.

Penas previstas: perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscal, perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento, suspensão e redução de atividades, embargo de obra, interdição de atividade, fechamento de estabelecimento. A multa tem que ser prevista em lei do ente federativo e deve ter um limite fixado.

Quanto a suspensão ou redução de atividades (até 15 dias, até 30 dias e mais de 30 dias), é medida preliminar da interdição de estabelecimento, que é preliminar do fechamento.

O embargo de obra: Lei 6.513/77 – locais turísticos, Lei 6.902/81 – estações ecológicas, e 7565/86 – Código do Ar

Interdição: Dec-lei 221/67 – pesca, Dec-lei 289/67 – flora.

O fechamento está previsto nas leis de combate a poluição sonora e do ar.

Todas penas devem ser aplicadas em ordem gradativa de acordo com a infração.

10.1. Recente lei que fixa sanções administrativas e penais em matéria ambiental

A Lei 9.605/98 fixa que infração administrativa é toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente. Esta lei funciona como norma geral para os demais entes da federação, que devem editar suas normas. Ela elenca 11 sanções.

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São competentes para aplicação de penalidades todos os integrantes do SISNAMA, desde que dentro de sua competência, sendo respeitados o contraditório. A sanção somente tem abrangência no território de competência do órgão, salvo as sanções penais que atuam em todo país.

O art. 74 e 75 prevêem limites a aplicação da multa. O primeiro traça parâmetros para o cálculo da multa. O segundo diz que o pagamento de multa efetuado ao estado ou município exclui a multa a ser aplicada pela União se a hipótese de incidência for a mesma.

A Lei foi regulamentada pelo Decreto 3.170/99, que acrescentou a sanção de reparação do dano.

11. Meios processuais de defesa ambiental

11.1 – Ações do CPCAções ordinárias, sumárias, cautelares, executivas e nunciação de obra nova.

11.2 – Ações especiais:a) Mandado de injunção: sempre que falta de norma reguladora tornar inviável a manutenção do meio ambiente equilibrado ou que impeça o exercício constitucional relativo ao meio ambiente. Seu rito é o mesmo do mandado de segurança. A regulamentação pode ser lei, decreto ou qualquer ato administrativo. O judiciário ordenará a edição da norma fixando prazo.b) Ação Civil Pública: o poluidor ou predador do meio ambiente pode, com sua ação, causar danos determinados e específicos a certas pessoas, a coletividade ou ao meio ambiente em si considerado. Na primeira hipótese cabe ação ordinária de indenização, na segunda e terceiras ação popular ou ação civil pública. O CDC modificou a lei de ACP acrescentando: as pessoas físicas ou aglomerados delas são legitimados ativos, o requisito da pré-constituição pode ser dispensado, etc. Embora não seja pacífico na doutrina o MP pode desistir da ação. A ação é imprescritível.c) Ação popular: não se presta com plenitude a defesa ambiental, sendo somente viável quando as agressões ao meio ambiente são realizadas por atividades dependentes de autorização do poder público ou quando o ato que concede a autorização é ilegal.

12. A criação de unidades de conservação. O tombamento

12.1. Unidades de conservação

A criação de unidades de conservação é uma das maneiras mais importantes para a proteção dos recursos naturais ambientais, tanto assim que a Constituição declarou como sendo um dos deveres do Poder Público “definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e supressão permitida somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção” (inc. III, do § 1º do art. 225 da CF).

Elas estão instituídas e previstas em leis federais de diversas ordens e que tratam da proteção ambiental em âmbitos setoriais e específicos, em especial, na Lei nº 6.938/81 e no Código Florestal (Lei 4.771/65), que são normas gerais.

Vejamos as características de cada uma delas:- Estações Ecológicas — São áreas representativas dos ecossistemas brasileiros, destinadas à realização de pesquisas básicas e aplicadas de Ecologia, à proteção do ambiente natural e ao desenvolvimento da educação conservacionista (Lei 6.902, de 27.4.81). Serão criados pela União, Estados e Municípios, em terras do seu domínio, definidas, no ato de criação, seus limites geográficos e o órgão responsável pela sua administração (art. 22 da mesma lei).- Áreas de Proteção Ambiental — São áreas declaradas como tais pelo Poder Público, de domínio privado, a fim de assegurar o bem-estar das populações humanas e conservar ou melhorar as condições ecológicas Locais (art. 82 da Lei nº 6.902/8 1). A idéia básica é permitir todas as atividades produtivas normais na área, mas possibilitando também a conservação dos recursos naturais. Trata-se de um tipo de unidade de conservação mais aberto e próprio para áreas que se inserem naturalmente no contexto das cidades e de um desenvolvimento econômico natural.- Reservas Ecológicas - São as florestas e demais formas de vegetação natural públicas ou particulares, de preservação permanente, situadas ao longo dos rios ou qualquer curso d’água, ao redor dos lagos etc. (Código Florestal — Lei 4.771/65; art. 18 da Lei nº 6.938/8 1; Decreto nº 89.336, de 31. 1.84 — que dispõe sobre as Reservas Ecológicas e Áreas de Relevante Interesse Ecológico).- Áreas de Relevante Interesse Ecológico — São áreas com características naturais extraordinárias ou que abriguem exemplares raros da biota regional, com até 5 mil hectares, com pequena ou nenhuma ocupação humana por ocasião do ato declaratório (Decreto nº 89.336, de 3 1.1.84, art. 2º).- Parques Nacionais, Estaduais ou Municipais:a)Parques Nacionais — São áreas geográficas extensas e delimitadas, dotadas de atributos excepcionais, objeto de preservação permanente, submetidas às condições de inalienabilidade e indisponibilidade no seu todo, onde é proibida qualquer forma de exploração dos seus recursos naturais (art. 52, alínea a e seu parágrafo único do Código Florestal; art. 1º do Decreto Federal 84.017, de 2 1.9.79).b)Parques Estaduais — São bens dos Estados, criados para a proteção e preservação permanente de regiões dotadas de excepcionais atributos da natureza, ou de valor científico ou histórico, postos à disposição do povo. Segue o mesmo regime do Parque Nacional (art. 52, alínea a e seu parágrafo único do Código Florestal).

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c)Parques Municipais — São áreas pertencentes aos Municípios com a finalidade de proteção dos atributos da natureza, ou seja, da flora, fauna, solo e belezas cênicas naturais, com utilização para fins científicos, educacionais e recreativos. Mesmo regime dos Parques Nacionais (art. 52, alínea a e parágrafo único, do Código Florestal).- Reservas Biológicas — São áreas do domínio federal, dos Estados ou Municípios, com finalidades de conservação e proteção integral e permanente do ecossistema e recursos naturais, especialmente os renováveis, como reserva genética da flora e fauna, para fins científicos, educacionais e culturais, sendo proibida qualquer forma de exploração de seus recursos naturais (art. 59, alínea a do Código Florestal; idem, idem da Lei de Proteção à Fauna - Lei 5.197, de 3.1.67).- Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais — Florestas são vegetações cerradas constituídas de árvores de grande porte, cobrindo grande extensão de terreno.As florestas de preservação permanente são as previstas no art. 2º do Código Florestal, que considera de preservação permanente, pelo só efeito dela (a lei), as florestas e demais formas de vegetação natural situadas ao Longo dos rios, lagos, topos de montanhas etc. Também as previstas no art. 3º do Código Florestal são de preservação permanente, desde que atos do Poder Público lhes dêem tal caráter; podem estas, no entanto, ser suprimidas parcial ou totalmente para execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social (art. 11), por atos do Executivo.Já as florestas do art. 2º do Código Florestal só podem ser suprimidas ou alteradas por força de lei.Entretanto, fica aí a questão introduzida pelo inc. III do § 1º do art. 225 da CF, em relação às florestas do art. 32, pois o texto constitucional somente admite a alteração e a supressão através de lei dos espaços especialmente protegidos.O art. 5º do Código Florestal previu a possibilidade de Estados e Municípios criarem florestas com fins econômicos, técnicos ou sociais.- Monumentos Naturais — São regiões, objetos ou espécies vivas de animais ou plantas, de interesse estético ou valor histórico ou científico, aos quais é dada proteção absoluta, com o fim de conservar um objeto especifico ou uma espécie determinada de flora ou fauna, declarando-se uma região, um objeto ou uma espécie isolada, como sendo monumento natural, inviolável, exceto para a realização de investigações cientificas devidamente autorizadas, ou inspeções oficiais (art. 1º, inc. III da Convenção para a Proteção da Flora, da Fauna e das Belezas Cênicas Naturais dos Países da América -Decreto Federal 58.054, de 23 de março de 1966).- Jardim Zoológico — Ë qualquer coleção de animais silvestres mantidos vivos em cativeiros ou em semiliberdade e expostos à visitação pública (art. 1º da Lei Federal nº 7.173, de 14.12.83).- Hortos Florestais— São áreas pertencentes ao Poder Público, destinadas a: propagar os conhecimentos relativos à silvicultura, através de investigações e demonstrações práticas; organizar instruções sobre plantio, replantio e tratos culturais mais adequados a cada essência florestal e a cada região; estudar as essências nativas, manter sementeiras e fornecer mudas, principalmente (art. 32 e 49 do Decreto Federal nº 4.439 de 26 de julho de 1939).

A Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, veio consolidar num diploma único todas as Unidades de Conservação, instituindo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e estabelecendo critérios e normas para a criação, implantação e gestão das unidades de conservação.

O art. 3º diz que o SNUC é constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais, de acordo com o disposto na Lei. O art. 42 elenca os objetivos do SNUC.

Importante aqui é o § 7º do art. 22, que dispõe que “a desafetação ou redução dos limites de uma unidade de conservação só pode ser feita mediante lei especifica”.

O art. 27 exige que as unidades de conservação devem dispor de um plano de manejo.

Os Locais de Interesse Turístico são trechos do território nacional, compreendidos ou não em Áreas Especiais, destinados por sua adequação ao desenvolvimento de atividades turísticas, e à realização de projetos específicos, e que compreendam: I — bens não sujeitos a regime específico de proteção; II —os respectivos entornos de proteção e ambientação.

O entorno de proteção é o espaço físico necessário ao acesso do público ao Local e à sua conservação, manutenção e valorização. O entorno de ambientação é o espaço físico necessário à harmonização do Local com a paisagem em que se situar (art. 42 e §§1º e 2º da Lei 6.513/77).

As Áreas Especiais e os Locais de Interesse Turístico serão instituídos pela União (EMBRATUR e CNTur), Estados, Municípios (art. 21 da Lei nº 6.513/77).

São considerados de interesse turístico, passíveis de serem protegidos através da instituição de Áreas Especiais ou Locais de Interesse Turístico (art. 1º da Lei 6.513/77): I — os bens de valor histórico, artístico, arqueológico ou pré-histórico; II — as reservas e estações ecológicas; III — as áreas destinadas à proteção dos recursos naturais renováveis; IV — as manifestações culturais ou etnológicas e os locais onde ocorram; V —as paisagens notáveis; VI — as localidades e os acidentes naturais adequados ao repouso e à prática de atividades recreativas, desportivas ou de lazer; VII — as fontes hidrominerais aproveitáveis; VIII — as localidades que apresentam condições climáticas especiais; IX — outros que venham a ser definidos, na forma da Lei ri2 6.513/77.

A declaração de determinada região como Área Especial de Interesse Turístico terá por fim a elaboração e execução de planos e programas, no seu interior, destinados a: I— promover o desenvolvimento turístico; II — assegurar a preservação e valorização do patrimônio cultural e natural; III — estabelecer normas de uso e ocupação do solo; IV — orientar a alocação de recursos e incentivos necessários a atender aos objetivos e diretrizes da lei (art. 11).

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A instituição de Local de Interesse Turístico visará à disciplina do uso e ocupação do solo, preservação, proteção e ambientação, sendo que o ato (decreto) que declarar o Local deverá indicar: I — seus limites; II — os entomos de proteção e ambientação; III — os principais aspectos e características do Local; IV — as normas gerais de uso e ocupação do solo, destinadas a preservar aqueles aspectos e características, e com eles harmonizar as edificações e construções, e a propiciar a ocupação e o uso do Local de forma com eles compatível (art. 18). O mesmo deve ocorrer com relação às Áreas Especiais de Interesse Turístico (art. 17).

Em princípio, tais Áreas e Locais são declarados em relação a propriedades privadas, que, desde então, ficam com sua utilização restringida, conforme se depreende do art. 8º da Lei 6.513/77.

Entretanto, em caso de necessidade de desapropriação, a Lei 6.513/77 incluiu na Lei de Desapropriação por Interesse Social (Lei 4.132, de 10.9.1962) uma alínea (VIII) ao art. 2º, considerando como fundamento da referida desapropriação: “A utilização de áreas, locais ou bens que, por suas características, sejam apropriados ao desenvolvimento de atividades turísticas.”

Além disso, como instrumento de defesa judicial das Áreas Especiais de Interesse Turístico, deu-se acesso ao cidadão para protegê-las, ao se alterar o § 1º da Lei nº 4.717, de 29.6.1965 (Lei de Ação Popular), para: “Considera-se patrimônio público, para os fins referidos neste artigo, os bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico”, acrescentando-se, ainda, ao art. 52 da Lei ri9 4.717/65, o § 4º, com a seguinte redação: “Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado.”

A Constituição de 1988, ao se referir à ação popular, fala em “meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural”, não tendo repetido a expressão “turístico”. Entretanto, essa expressão está, evidentemente, incluída na mais abrangente “meio ambiente”.

Quanto às Áreas Especiais e Locais de Interesse Turístico, a regulamentação da Lei 6.513/77 foi efetuada pelo Decreto 86.176, de 6.6. 1981.

As Reservas Particulares do Patrimônio Natural são unidades de conservação criadas pelo particular (proprietário) que, em imóvel do seu domínio, no todo ou em parte, onde sejam identificadas condições naturais primitivas, semiprimitivas, recuperadas, ou cujas características justifiquem ações de recuperação, pelo seu aspecto paisagístico, ou para a preservação do ciclo biológico de espécies da fauna ou da flora nativas do Brasil, resolve instituir um regime de preservação de tais condições em sua propriedade, mediante requerimento de reconhecimento pelo Presidente do IBAMA e posterior averbação do Termo de instituição junto ao Cartório de Registro de Imóveis competente, que gravará o imóvel com a Reserva, em caráter perpétuo, nos termos do art. 6º do Código Florestal (Lei ri9 4.771, de 15.9.65). (Decreto 98.914, de 31 de janeiro de 1990.)

12.2. O tombamento

Bens tombados são aqueles que constituem o patrimônio histórico e artístico etc., quer se constituam em imóveis ou moveis, cuja conservação seja de interesse da cultura nacional, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história, quer por seu excepcional valor artístico, que são inscritos no Livro do Tombo e, posteriormente, averbados, quando imóveis, no Cartório de Registro de Imóveis competente. Podem ser também tombados os monumentos naturais, bem como sítios e paisagens de feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana (art. 1º e §º 1º e 2º do Dec.-Lei Federal ri9 25, de 30.11.37 e Constituição Federal de 1988).

O art. 216 da Constituição de 1988 reza:“Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, á ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:I - as formas de expressão;II- os modos de criar, fazer e viver;III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;IV- as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.”

Portanto, verifica-se que a Constituição incluiu, como novidade em relação à legislação até então existente, a possibilidade do tombamento de bens de valor ecológico, de maneira abrangente, não mais se limitando às paisagens naturais notáveis.

O § 1º refere-se expressamente ao tombamento, como um dos instrumentos de proteção ambiental:“O Poder Público, com colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação.”

13. Os fundos para a proteção ambiental

A criação de fundos visando à captação de recursos financeiros é uma das medidas governamentais mais importantes na defesa do meio ambiente. A aplicação dos recursos, entretanto, julgamos nós, deve ficar sob estrito controle e fiscalização da comunidade.

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Esses fundos, ou podem ser destinados a atender as vitimas dos ilícitos ambientais, cujos autores sejam desconhecidos, ou podem visar à aplicação de seus recursos em programas e ações de aperfeiçoamento técnico para a defesa ambiental e à melhoria ou recuperação das condições ambientais.

No Brasil, foram criados dois fundos básicos.

O primeiro deles, denominado de Fundo dos Bens Lesados, foi previsto no art. 13 da LACP. O Decreto nº 92.302, de 16.1.86, regulamentou, em nível federal, o Fundo para Reconstituição de Bens Lesados.

O outro fundo foi criado pela Lei riº 7.797, de 10 de julho de 1989, tendo sido denominado Fundo Nacional do Meio Ambiente.

Segundo a lei, seu objetivo é o de desenvolver os projetos que visem ao uso racional e sustentável de recursos naturais, incluindo a manutenção, melhoria ou recuperação da qualidade ambiental no sentido de elevar a qualidade de vida da população brasileira (art. 12).

Os recursos do FNMA serão aplicados através de õrgãos públicos de nível federal, estadual e municipal ou de entidades privadas cujos objetivos estejam em consonância com os do FNMA, desdé que não possuam, as referidas entidades, fins lucrativos.

É administrado pela Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República, de acordo com as diretrizes fixadas pelo Conselho de Governo, sem prejuízo das competências do CONAMA (redação dada pela Lei 8.028/90).

Serão consideradas prioritárias as aplicações de recursos do Fundo em projetos nas seguintes áreas: Unidades de Conservação; Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico; Educação Ambiental; Manejo e Extensão Florestal; Desenvolvimento Institucional; Controle Ambiental; Aproveitamento Econômico Racional e Sustentável da Flora e Fauna Nativas.

Sem prejuízos das ações em âmbito nacional, será dada prioridade aos projetos que tenham sua área de atuação na Amazônia Legal.

A Lei 8.028 de 12.4.90 (art. 12, IV), criou o Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente, integrado por dois representantes da Secretaria do Meio Ambiente, dois do IBAMA —Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis, um do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento e três de Entidades Ambientalistas Não-Governamentais (Decreto ri2 99.249, de 11.5.90, art. 52, 1 a IV).

A Portaria 71, de 30 de agosto de 1991, aprovou o Regimento Interno do Comitê do Fundo Nacional do Meio Ambiente, cuidando de sua organização, competência, reuniões e funcionamento.

14. O planejamento e os planos ambientais

Toda a ação e as medidas de proteção ambiental devem ser cuidadosamente planejadas, através de estudos e diagnósticos da realidade, levando em conta todos os elementos a serem protegidos e concluindo-se com propostas que serão objeto de um ou vários planos legais (aprovados por lei formal).

Sobre o assunto, manifesta-se Corella Monedero (“Competência de Las disputaciones provinciales en la defensa del Medio Ambiente”, in Proteccion dei Medio Ambiente — Seminário de estudios para presidentes de disputaciones provinciales, Madri, Ed. Instituto de Estudios de Administracion Local, 1977, p. 27):“Toda estruturação e ordenação do território, adotada sob qualquer tipo de critério, comporta uma incidência no meio ambiente do território que se ordena. Com efeito, a ordenação territorial supõe o estabelecimento ou a fixação de usos do solo, tanto com fins urbanos como para finalidades não-urbanas, e supõe também o estabelecimento de limitações aos usos permitidos ou proibições aos usos incompatíveis com o modelo territorial que se eleja.”

E mais: “Essa ordenação territorial, quando assinala os usos e os elementos estruturais imprescindíveis para o aproveitamento do solo em função deles, há de ter em conta a incidência que se vai produzir no entorno. O problema vai se apresentar, sob a perspectiva ambiental, na indagação se a ordenação levou em conta alguma medida de proteção ou, pelo contrário, foi produzida sem a análise de mais elementos senão daqueles que os próprios do acondicionamento do território para um desenvolvimento socioeconômico, com desprezo das previsões de defesa.”

Assim, “parece lógico, então, que não se pode separar os três grupos de determinações assinalados, mas, ao contrário em qualquer atividade de ordenação territorial, deve-se contemplar os usos, as infra-estruturas e as medidas de proteção, conjuntamente” (p. 28).

Por essas premissas, o autor assinala: “Em último termo, isto nos conduzirá à conclusão de que o órgão político que vá decidir a respeito da ordenação do território — que comporta a ordenação e defesa do meio ambiente — pode ter em conta não só os critérios de desenvolvimento, mas também os custos dele, custos avaliáveis e não-avaliáveis economicamente, custos sociais, custos de degradação, que, desde logo, haverão de ser ponderados com uma visão de futuro” (p. 29).

E, finalmente observa: “E isto é possível tanto a respeito do meio ambiente urbano como não-urbano”.

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No primeiro, porque hão de ser nele considerados não somente a incidência das construções e terrenos, dos elementos naturais, fundamentalmente água e ar, mas porque desse ambiente urbano tomam parte também elementos culturais (conjuntos e monumentos históricos e artísticos) e circunstâncias paisagísticas.

No meio ambiente não urbano as alternativas que podem oferecer-se à decisão política hão de conter as inter-relações entre o desenvolvimento urbanístico e as construções permitidas, e a proteção e defesa da terra, ar e água, para evitar sua degradação, tanto seja nos elementos em si como nas formas de vida que neles possam se desenvolver (flora, fauna), assim como para a proteção de conjuntos naturais” (p. 30).

Também para o jurista o planejamento ambiental é muito importante, como instrumento básico e prévio da proteção ambiental.

O Prof. Eduardo A. Pigretti, professor titular da disciplina Regime Jurídico dos Recursos Naturais da Faculdade de Direito e Ciências Sociais da Universidade de Buenos Aires e presidente da Sociedade Argentina para o Direito e a Administração do Ambiente e Recursos Naturais, assevera:

“Ordenamento ambiental: este princípio é básico de desenvolvimento do Direito Ambiental e se agregou a ele de um modo tão sólido que chegou a perder sua identidade até perder-se de maneira total no ambiental. O ordenamento territorial se desenvolveu primeiramente como uma técnica do urbanismo, para lograr, pouco a pouco, os critérios mais modernos nos quais trata de se assentar agora. Desde as leis de uso do solo em sentido agrícola, como as relativas ao conceito de unidade econômica rural, como alguns aspectos da conservação do solo contra as variadas formas de erosão e desertificação, passando pelos planos e programações públicas, tudo isso compreende o conceito de mínimos do ordenamento ambiental. Outras abordagens mais modernas, tais como as áreas críticas de contaminação de parques e monumentos naturais e culturais, tudo encontra inicio e justificação sobre a base do princípio do ordenamento assinalado. A instituição do impacto ambiental é, em definitivo, outra criação, em seus aspectos técnicos, do postulado ordenador (Identificação de Princípios Ambientais, in Ambiente y Futuro, Buenos Aires, Fundação Manuiba, 1987, ps. 75-76).

A Organização Mundial de Saúde recomendou em Relatório Técnico: “As normas do planejamento físico mais válidas são as que se apoiam em normas sanitárias e que consideram, portanto, os problemas de saneamento” (Boletim nº 297, série Relatórios Técnicos, 1965).

E ainda: “Desde que o uso do solo tem sido tradicionalmente a chave para o planejamento metropolitano, deve ser considerada a sua interação com o sistema de abastecimento de água, coleta e disposição de esgoto, drenagem, transporte, coleta e disposição de lixo, poluição do ar, do solo e da água etc.”

O planejamento urbano, segundo a Associação Internacional de Administradores Municipais, compreende um processo constituído de cinco etapas: estabelecimento de metas básicas, estudos e análises, preparação de planos e políticas, implantação de planos e políticas, e avaliação (cf. Korbitz, William E. (cd.), Urban public works administration, Washington D.C., International City Managers Association, 1976, p. 563).

Diríamos que, anteriormente a essas cinco etapas, deve existir uma etapa fundamental, que é a do diagnóstico da realidade sobre a qual se pretende intervir. Como afirma Luis Dorich (“Planejamento Urbano e Abastecimento de Água”, in Leituras de Planejamento e Urbanismo, Rio de Janeiro, Instituto Brasileiro de Administração Municipal, 1965), “o planejamento urbano consiste na organização do espaço, das atividades e funções de uma cidade, levando em consideração a realidade existente e suas implicações no desenvolvimento futuro, não só do ponto de vista físico, como também social e econômico, para obter o bem-estar progressivo desta localidade”.

Essa concepção do planejamento urbano, entretanto, modernamente, vai ficando ultrapassada, tendo em vista a conscientização, cada vez maior, dos órgãos técnicos do setor público, para os problemas ambientais da nossa época.

Assim é que do processo de planejamento não mais se descarta a vertente ambiental, a tal ponto de se falar em planejamento ambiental urbano e não mais simplesmente em planejamento urbanístico.

Portanto, pode-se dizer que o planejamento urbano passou por várias fases em sua concepção técnica. Desde a inicial visão de uma simples ordenação fisico-territorial, passando pela fase da visão integrada (aspectos fisico-territoriais, socioeconômicos e administrativos) até os nossos dias, em que se agrega a visão ambiental ao planejamento urbano.

E, nesse sentido, é preciosa a lição de Suetônio Mota, sobre as questões de cunho ambiental que devam ser consideradas no planejamento urbano:

“De um modo geral, podemos estabelecer que o planejamento de uma área urbana, com o objetivo de preservar a qualidade do meio ambiente, deve ser feito em seis importantes etapas:1.levantamento das condições ambientais existentes, a partir do qual se desenvolverá o planejamento;2.definição das áreas apropriadas para uso urbano e, conseqüentemente, das áreas a serem preservadas;3. definição dos diferentes usos do solo urbano, em função do maior ou menor impacto que os mesmos possam causar ao ambiente;4.utilização de índices urbanísticos que permitam uma ocupação das diferentes zonas da cidade, de forma a garantir uma melhor integração das edificações e de outras estruturas com o ambiente natural;

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5.definição de padrões de qualidade ambiental, em função das circunstâncias específicas de cada ambiente, devendo as medidas de controle da poluição ser aplicadas para alcançarem aqueles objetivos;6.relacionamento dos aspectos de preservação ambiental com os outros fatores a serem considerados no planejamento urbano, de modo a garantir um processo exeqüível sob o ponto de vista econômico, social e político” (Planejamento urbano e preservação ambiental, Fortaleza, Edições UFC-PROEDI, 1981, ps. 70-71).

Aduz, em seguida, o autor: “De modo integrado devem ser planejados os diversos aspectos de controle da poluição, em suas diversas modalidades: do solo, do ar, da água, acústica e visual. Sob o aspecto jurídico, o instrumento legal básico do planejamento ambiental é a lei formal, que, nos três níveis de governo, pode e deve ser o veículo de aprovação do documento oficial que traduz as diretrizes, os programas e ações futuras do órgão público responsável: o plano.”

Portanto, tanto a União, como os Estados-membros ou os Municípios, podem e devem elaborar seus planos ambientais.

A União pode e deve elaborar planos macroambientais e regionais, com fundamento no inc. IX do art. 21 da CF: “Elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenamento do território e de desenvolvimento econômico e social.” A aprovação do plano deverá ser por lei formal, posto que, como já demonstramos, a competência comum da União prevista no art. 23, VI, da CF, é dependente sempre de lei, pelo principio da legalidade.

Os Estados-membros, igualmente, podem e devem elaborar e executar planos regionais ou estaduais ambientais, com base no inc. VI do art. 23 e inc. VI do art. 24 da CF, e na sua competência geral remanescente (art. 24, § 1º, da CF).

Os municípios podem e devem elaborar seu plano de desenvolvimento, nele incluídos os Planos Diretor (urbano) e Plano de Proteção Ambiental Rural (ver art. 30, VIII, da CF promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano; art. 23, VI, da CV; art. 182 e parágrafos da CF; art. 186, II, da CF).

Agora, a elaboração e a aprovação do Plano Diretor pelo Município se tornou concretamente exigível, pelo Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001).

Com efeito, essa Lei veio regulamentar os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelecendo diretrizes gerais da política urbana.

O seu art, 41 tornou obrigatória a existência do plano diretor para as cidades: I — com mais de vinte mil habitantes; II — integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; III — onde o Poder Público Municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4º do art. 182 da Constituição Federal; IV — integrantes de áreas de especial interesse turístico; V — inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional (ver sobre o assunto o nosso O Estatuto da Cidade — Anotações Lei nº 10.257, de 10.7.2001, Saraiva, 2001).

Convém sublinhar que essa Lei considera como diretrizes fundamentais do planejamento municipal, dentre outras: VI— ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar: g) a poluição e a degradação ambiental; XII — proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico; XIII — audiência do Poder Público Municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural.

E, o art. 39 do Estatuto exige que tanto essas diretrizes como as demais sejam respeitadas (levadas em consideração) quando da elaboração do Plano Diretor.