dieta e impacto da predaÇÃo de gatos domÉsticos...
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UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
DIETA E IMPACTO DA PREDAÇÃO DE GATOS
DOMÉSTICOS (Felis catus) EM AMBIENTES RURAIS
Inês Assis dos Santos Nobre Leitão
MESTRADO EM BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO
2008
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
DIETA E IMPACTO DA PREDAÇÃO DE GATOS
DOMÉSTICOS (Felis catus) EM AMBIENTES RURAIS
Inês Assis dos Santos Nobre Leitão
MESTRADO EM BIOLOGIA DA CONSERVAÇÃO
Dissertação orientada pela Professora Doutora Margarida Santos-Reis (DBA/CBA- FCUL)
2008
i
Agradecimentos
A realização deste trabalho só foi possível mediante todo o apoio recebido. Desta forma quero agradecer:
À Professora Doutora Margarida Santos-Reis por ter aceite a orientação da
minha tese de mestrado e por todo o apoio demonstrado até ao último dia.
À Cristina Maldonado pelo tempo disponibilizado na triagem dos últimos
dejectos e na identificação dos pêlos, dentes e pênas, e pela boa disposição demonstrada
durante a estadia em Barrancos.
Ao Mário Boeiro e Miguel Rosalino pela ajuda na identificação dos insectos.
À Mafalda Basto e à Tátá pelo esclarecimento de dúvidas na triagem dos
dejectos e pela ajuda inicial no laboratório.
Ao professor Henrique Cabral, Mafalda Costa, Ana Marta Serronha e Ana Rita
Mateus pela ajuda na elaboração da análise estatística multivariada.
Ao Nuno Silva e ao Nelson Cintra, pela ajuda informática.
Aos guardas do Perímetro Florestal da Contenda, da Herdade da Coutada dos
Frades e do Castelo de Noudar, pela boa disposição demonstrada, companhia no campo
e conhecimentos transmitidos.
A todos os barranquenhos, pela enorme hospitalidade e amizade demonstradas,
pela companhia e apoio, pelas noites de diversão e pelo respeito e compreensão
demonstrados pela natureza.
Aos meus grandes amigos, que sempre me apoiaram ao longo deste período,
especialmente à Ana Rita Mateus e Mariana Montez pela enorme amizade.
Ao meu pai, por me ter transmitido a paixão pela natureza e pela vida selvagem
desde pequena e por sempre me ter apoiado na minha carreira como bióloga.
Aos meus pais, pela compreensão, ajuda e força demonstradas nas situações
mais complicadas. A eles dedico este trabalho!
E finalmente ao gato-bravo (Joaquim Pedro Ferreira), por me ter escolhido
como parceira nesta grande aventura, por todos os conhecimentos transmitidos no
campo, pela ajuda em todas as fases deste trabalho, pela grande amizade demonstrada,
pelas horas de trabalho e também de diversão, e por mostrar que em Portugal existem
excelentes investigadores.
ii
Resumo
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
O gato doméstico exerce um reconhecido impacto predatório sobre populações
de aves e pequenos mamíferos, nomeadamente em ilhas e zonas urbanas. Contudo, a sua
maior ameaça refere-se à integridade do gato-bravo, através da hibridação e da
competição pelo espaço e pelo alimento, estas últimas indirectamente reveladas pelo
grau de associação da espécie doméstica ao homem e às suas infra-estruturas. Através
deste estudo pretendeu-se caracterizar a dieta do gato doméstico no Sítio Moura-
Barrancos (Alentejo) e determinar o seu impacto predatório sobre espécies silvestres,
comparando ainda os resultados obtidos, com os de diferentes áreas geográficas: ilhas,
zonas urbanas e outras zonas rurais. Relacionou-se também o regime do gato doméstico
no Sítio Moura-Barrancos com o obtido para o gato-bravo no contexto nacional,
averiguando sobre a possível competição alimentar entre as duas espécies. Entre Março
e Agosto de 2007, foram recolhidos dejectos de gato doméstico em três herdades
situadas em zonas favoráveis à ocorrência de gato-bravo. A análise da dieta, foi
expressa pela frequência de ocorrência e percentagem de biomassa de cada item
alimentar. Dos 166 dejectos analisados, detectou-se o consumo de 473 presas,
agrupadas em 8 grupos principais (Lagomorpha: F.O.-1,48%, P.B.-4,36%; Rodentia:
F.O.-26,85%; P.B.-9,61%; Insectívora: F.O.-0,63%, P.B.-0,08%; Aves: F.O.-7,19%,
P.B.-11,02%; Reptilia: F.O.-1,48%, P.B.-0,03%; Arthropoda: F.O.-20,30%, P.B.-0,27%;
Material Vegetal: F.O.-14,38%, P.B.-0,05% e Restos de alimentação humana: F.O.-
27,70%, P.B.-74,58%). Os resultados indicam que os gatos domésticos desta zona, são
predadores oportunistas tendo hábitos alimentares mais generalistas que os observados
noutras zonas, e que no Sítio Moura-Barrancos a competição alimentar não representa
um risco para o gato-bravo, uma vez que os gatos domésticos baseiam a sua dieta em
restos de alimentação humana e presas associadas ao homem.
Palavras-chave: dieta, Felis catus, Felis silvestris, predação, Sítio Moura-Barrancos, conservação
iii
Abstract Feeding habits and predation impact of domestic cat (Felis catus) in rural environments
The domestic cat exerts an well known predation effect on birds and small
mammals populations, namely on islands and urban areas. Although, the biggest threat
is related to the wildcat integrity, through hybridization and competition for space and
food, the last ones indirectly revealed by the degree of association of the domestic
species to man and its environment. The goals of this study were to characterize the
domestic cat diet on Moura-Barrancos (Alentejo) and determine the domestic cat
predatory impact on wildlife species, comparing the results with those of distinct
geographic areas: islands, urban areas and others rural areas. The domestic cat diet in
Moura-Barrancos was compared to wildcat diet in a national context, to understand the
possible trophic competition between the two species. Between March and August 2007,
domestic cat scats were collected in three rural farms located in favourable wildcat areas.
The diet composition was expressed by frequency of occurrence and percentage of
consumed biomass of each food item. In the 166 analysed scats ,there were identified
473 different preys, separated in 8 principal groups (Lagomorpha: F.O.-1,48%, P.B.-
4,36%; Rodentia: F.O.-26,85%; P.B.-9,61%; Insectívora: F.O.-0,63%, P.B.-0,08%;
Birds: F.O.-7,19%, P.B.-11,02%; Reptilia: F.O.-1,48%, P.B.-0,03%; Arthropoda: F.O.-
20,30%, P.B.-0,27%; Plant matter: F.O.-14,38%, P.B.-0,05% and Household food:
F.O.-27,70%, P.B.-74,58%). The results indicate that domestic cats in Moura-Barrancos
are opportunistic predators with feeding habits more generalized that those observed in
others areas, and that the trophic competition doesn’t represent a threat to the wildcat,
since the domestic cats diet is based in household food and preys linked to man.
Keywords: diet, Felis catus, Felis silvestris, predation, Moura-Barrancos, conservation
iv
Índice Agradecimentos……………………………………………………………………. i
Resumo……………………………………………………………………………... ii
Abstract…………………………………………………………………………….. iii
1 Introdução……………………………………………………………………...... 1
1.1 Objectivos do estudo………………………………………….......................... 6
2 Área de Estudo…………………………………………………………………... 8
2.1 Caracterização do Sítio Moura-Barrancos………………………………......... 9
2.2 Critérios para a selecção dos locais de amostragem……………...................... 11
2.3 Caracterização dos locais de amostragem…………………………………..... 12
2.3.1 Perímetro Florestal da Contenda………………...……………………… 12
2.3.2 Castelo de Noudar………………………………………………………. 14
2.3.3 Herdade da Coutada dos Frades…….…………………………………... 15
3 Métodos………………………………………………………………………....... 17
3.1 Recolha de dejectos…………………………………………………………… 18
3.2 Procedimento laboratorial…………………………………………………...... 18
3.3 Análise do regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos.…… 19
3.3.1. Homogeneidade e representatividade espacial das amostras .................. 19
3.3.2. Estimativas de ocorrência e de biomassa consumida para cada item
trófico…………………………………………………………………... 20
3.3.3. Análise da variação no consumo de presas ……………………………. 22
3.3.4. Diversidade no consumo de presas…………………………………….. 22
3.3.5. Sobreposição dos nichos alimentares ………………………………….. 23
3.3.6. Classificação dos recursos tróficos consumidos……………………….. 23
3.4. Análise do regime trófico do gato doméstico em diversos ambientes..……. .. 23
3.5 Competição alimentar com Felis silvestris…………………………………… 24
4 Resultados………………………………………………………………………... 27
v
4.1. Regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos……………….. 28
4.1.1. Análise global do regime trófico do gato doméstico………………........ 28
4.1.2. Análise espacial do regime trófico do gato doméstico……..…………... 30
4.1.2.1. Regime trófico do gato doméstico no Perímetro Florestal da
Contenda……………………………………………………….. 30
4.1.2.2. Regime trófico do gato doméstico no Castelo de Noudar……... 32
4.1.2.3. Regime trófico do gato doméstico na Herdade da Coutada dos
Frades…………………………………………………………... 32
4.1.2.4. Consumo de mamíferos nos três locais amostrados..…………. 33
4.1.2.5. Consumo de aves nos três locais amostrados………………….. 34
4.1.2.6. Amplitude do Nicho Trófico…………………………………... 35
4.1.2.7. Sobreposição do Nicho Trófico……………………………...... 35
4.2. Comparação do regime trófico do gato doméstico em diferentes regiões........ 36
4.2.1. Comparação do regime alimentar em ilhas, zonas urbanas e zonas
rurais………………………………………………………………….... 36
4.2.2. Amplitude do Nicho Trófico …………………..…………………….... 38
4.3. Competição alimentar com Felis silvestris…………………........................... 39
4.3.1. Regime trófico de Felis silvestris e Felis catus ……………………….. 39
4.3.2.Consumo de pequenos mamíferos por Felis silvestris e Felis catus…… 41
5 Discussão de resultados………………………………………………………… 43
5.1 Regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos………………. 44
5.1.1 Análise global do regime trófico do gato doméstico…………………... 44
5.1.2 Variação espacial do regime trófico do gato doméstico..……..……….. 45
5.1.2.1. Análise do consumo das diferentes classes-presa……………... 45
5.1.2.2. Consumo de mamíferos……………………………...……….... 46
5.1.2.3. Consumo de aves …………………………...…………………. 47
5.1.2.4. Amplitude do Nicho Trófico…………………………………... 48
5.1.2.5. Sobreposição do Nicho Trófico………………………………... 49
5.2. Comparação do regime trófico do gato doméstico em diferentes regiões...…. 50
5.2.1. Comparação do regime alimentar em ilhas, zonas urbanas e zonas
vi
rurais........................................................................................................ 50
5.3. Competição alimentar com Felis silvestris…………………………………... 54
5.3.1. Regime trófico de Felis silvestris e Felis catus …………………….….. 55
5.3.2. Análise do consumo de micromamíferos……………………..………... 56
6 Considerações finais…………………………………………………………….. 58
7 Referências bibliográficas………………………………………………………. 62
8 Anexos……………………………………………………………………………. 72
vii
Índice de tabelas
Tabela 1 – Sexo, idade e cor da pelagem dos gatos domésticos existentes no
Perímetro Florestal da Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da
Coutada dos Frades................................................................................ 14
Tabela 2 – Pesos médios das classe-presas consumidas pelos gatos domésticos
(mamíferos, aves, répteis, artrópodes, sementes)………....................... 21
Tabela 3 – Número de indivíduos, Frequência de Ocorrência e Percentagem de
Biomassa referentes ao regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-
Barrancos................................................................................................ 29
Tabela 4 – Número de excrementos e de items alimentares referentes ao Perímetro
Florestal da Contenda, Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos
Frades………………............................................................................. 30
Tabela 5 - Frequências de Ocorrência referentes aos artrópodes consumidos no
Perímetro Florestal da Contenda……………………………..……...... 31
Tabela 6 –Valores de Amplitude do Nicho Trófico para o Perímetro Florestal da
Contenda, Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos Frades..…... 35
Tabela 7 – Valores de Sobreposição do Nicho Trófico para o Perímetro Florestal da
Contenda, Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos Frades..….... 36
Tabela 8 – Valores de Qui-quadrado obtidos para cada classe-presa constituinte do
regime trófico do gato doméstico, quando se comparam os dados do
presente estudo com os dados verificados noutras regiões….……....... 37
Tabela 9 – Valores de amplitude do nicho trófico (índice de Levins padronizado),
calculado com base em 8 classes-presa (Lagomorpha, Rodentia,
Insectivora, Aves, Reptilia, Arthropoda, Material Vegetal e Restos de
Alimentação Humana) para zonas rurais, zonas urbanas e ilhas……… 39
Tabela 10 - Resultados da análise PCA por comparação dos regimes tróficos de
Felis silvestris e Felis catus. Valores próprios (eigenvalues) e
percentagem de variância cumulativa das classes-presa explicada por cada
eixo.......................................................................................................... 40
viii
Tabela 11 - Resultados da análise PCA por comparação do consumo de pequenos
mamíferos por Felis silvestris e Felis catus. Valores próprios (eigenvalues)
e percentagem de variância cumulativa das classes-presa explicada por
cada eixo………..................................................................................... 41
ix
Índice de Figuras
Figura 1 – Localização das herdades rurais existentes no Sítio Moura-Barrancos
(Baixo Alentejo), com indicação das herdades onde foi verificada a
presença de gatos domésticos……………………………….………... 11
Figura 2 – Sítio Moura-Barrancos (Baixo Alentejo), com indicação das áreas de
adequabilidade à ocorrência de gato-bravo e a localização do Perímetro
Florestal da Contenda, do Castelo de Noudar e da Herdade da Coutada dos
Frades………………………………………......................................... 12
Figura 3 – Vista do Perímetro Florestal da Contenda……………………………. 13
Figura 4 – Pombal 1........................................................................….…………… 13
Figura 5 – Palheiro 1.........................................................................………...….... 13
Figura 6 – Vista do castelo de Noudar…………………………………………… 14
Figura 7 – Torre da igreja ……………………………..………………………… 15
Figura 8 – Vista da Herdade da Coutada dos Frades…………………………….. 16
Figura 9 – Palheiro 2............................................................................…………... 16
Figura 10 – Pombal 2......................................................................…………..….. 16
Figura 11 – Galinheiro.........................................................................……........... 16
Figura 12 – Localização geográfica dos locais onde foram realizados os estudos
acerca do regime trófico do gato doméstico……………....…………… 24
Figura 13 – Localização geográfica dos locais onde foram realizados os estudos de
gato doméstico e de gato-bravo……………………………….............. 25
Figura 14 – Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às
classes-presa consumidas no Perímetro Florestal da Contenda………. 31
Figura 15 – Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às
classes-presa consumidas no Castelo de Noudar…...………………..... 32
Figura 16 – Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às
classes-presa consumidas na Herdade da Coutada dos Frades...…..…... 33
Figura 17 – Frequências de ocorrência referentes aos mamíferos consumidos no
Perímetro Florestal da Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da
Coutada dos Frades………………………………………………….... 33
x
Figura 18 – Frequências de ocorrência referentes às aves consumidas no Perímetro
Florestal da Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da Coutada dos
Frades……………………….………………………………..……….. 34
Figura 19 – Frequências de ocorrência referentes às 8 classes-presa consumidas na
Ilha de Port-Cros (França), em São Paulo (Brasil), em Madrid (Espanha),
no Sítio Moura-Barrancos (Portugal) e nas montanha Jura (Suiça), durante
a época seca.……................................................................................... 37
Figura 20 – Percentagem de Biomassa referente às 8 classes-presa consumidas no
Sítio Moura-Barrancos (Portugal) e em Revinge (Suécia), durante a época
seca………............................................................................................. 38
Figura 21 – Representação gráfica da PCA, realizada com base no regime trófico de
Felis silvestris e Felis catus………………………………….……...... 40
Figura 22 – Representação gráfica da PCA, realizada com base no consumo de
pequenos mamíferos por Felis silvestris e Felis catus……….……..… 42
xi
Índice de Anexos Anexo I…………………………………………………………………………....... 73
Anexo II…………………………………………………………………………….. 74
Anexo III…………………………………………………………………………... 75
Anexo IV…………………………………………………………………………... 76
Anexo V…………………………………………………………………………….. 77
Anexo VI…………………………………………………………………………… 78
Anexo VII………………………………………………………………………….. 79
INTRODUÇÃO
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
2
1.Introdução
Na natureza, muitos predadores, no decurso dos processos evolutivos e sob
influência da selecção natural, especializaram-se no consumo de presas ou grupos
presas específicos, o que se traduz em vantagens energéticas, evitando também
fenómenos de competição inter e intra específica. Como resposta, muitas presas
evoluíram desenvolvendo mecanismos fisiológicos e comportamentais que minimizam
esta eficiência predatória. Um exemplo é o lince ibérico (Lynx pardinus), espécie
especializada no consumo de coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus), que se encontra
criticamente ameaçado (Cabral et al. 2005) devido à diminuição drástica das populações
desta presa, as quais foram dizimadas pela mixomatose e a febre hemorrágica viral
(Delibes 1980, Ward 2005). A co-evolução destas duas espécies, teve início com o
ancestral do lince-ibérico (Lynx issiodorensis) que sobreviveu à competição alimentar
com outros carnívoros da Península Ibérica, os quais consumiam essencialmente
ungulados, por ver favorecidas as suas menores dimensões corporais e concentrar a
predação no ancestral do coelho, espécie abundante na altura (Castro 1992). Estes
mecanismos de co-evolução, são fortemente influenciados pela selecção natural, visto
que os predadores, ao longo das gerações, vão transmitindo os genes que lhes permitem
obter uma maior eficiência na detecção e captura das presas, enquanto que as presas,
pelo mesmo mecanismo, vão-se tornando necessariamente mais eficientes na resposta às
tentativas de captura, o que poderá garantir a sua sobrevivência, a longo-prazo
(Eimermacher 2004, Brodie & Brodie 1999). Deste modo, estabelece-se um equilíbrio
ecológico entre predadores e presas que co-existem num mesmo ecossistema, fruto da
evolução recíproca entre os dois grupos, o qual apenas pode ser quebrado pela remoção
ou introdução de predadores ou presas nesse sistema natural (Strauss et al. 2006).
O gato doméstico (Felis catus) é actualmente um dos carnívoros com maior
área de distribuição, em grande parte por o processo de domesticação lhe ter permitido
adaptar-se à vida nos novos meios criados pelo homem. Por outro lado, a elevada
plasticidade ecológica, trófica e comportamental possibilita a sua sobrevivência nos
mais variados habitats (Artois et. al 2002), exercendo um efeito negativo na manutenção
do efectivo populacional de várias espécies de presas. A introdução voluntária ou
acidental do gato doméstico em muitas ilhas, em particular nos anos 90, teve um forte
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
3
impacto nas populações de pequenos mamíferos igualmente introduzidos (Mus
musculus e Rattus sp.) e de aves marinhas (Furet 1989, Van Rensburg 1985, Kirpatrick
1986), assim como em populações de répteis localizadas em ilhas a baixas latitudes
(Fitzgerald 1988). Nestes casos, a inexistente relação predador-presa beneficiou
extraordinariamente o gato doméstico, visto que as presas ao evoluírem na ausência de
predadores, não desenvolveram mecanismos de defesa anti-predação, de elevado custo
energético, para garantirem a sua sobrevivência (Nogales 2004, Blumstein & Daniel
2005); assim, a introdução deste carnívoro resultou numa diminuição do efectivo
populacional de muitas espécies, e, em alguns casos, conduziu mesmo à extinção destas
(Olivier 1955 in Woods et al. 2003, Vázquez-Domínguez et al. 2004).
Em contraste com este notório impacto verificado em ambientes insulares, as
populações de presas silvestres dos continentes que partilham, há inúmeras gerações, as
suas áreas de ocorrência com o gato doméstico, mostram níveis de predação muito
inferiores (Fitzgerald 1988). No centro das grandes metrópoles, onde o grau de
urbanização excede grandemente o verificado nas zonas rurais e onde a disponibilidade
alimentar é ampla e variada, numerosos grupos familiares de gatos assilvestrados,
atingem elevadas densidades populacionais. No seio dos grupos, as pequenas áreas
vitais dos indivíduos sobrepõem-se, e os recursos alimentares são partilhados por todos
os membros (Liberg & Sanndell 1988); a promiscuidade associada ao modo de vida e ao
contacto entre grupos, reflecte-se numa elevada propagação de doenças (Artois et al.
2002). Nas mesmas áreas urbanas, mas sob condições um pouco diferentes, vivem os
gatos domésticos que embora partilhando as habitações com o homem, normalmente
possuem livre acesso às ruas, o que permite a sua dispersão por amplas áreas. Nos
quintais de muitas casas e nos jardins municipais, situados no centro das cidades, ocorre
uma infinidade de espécies silvestres, que são presas fáceis para o elevado número de
gatos existentes. Nestes locais, a predação destes felinos tem maior incidência sobre
pequenos mamíferos, com especial ênfase para os roedores, e, em menor escala, sobre
passeriformes e lacertídeos (Woods et al. 2003, Baker et al. 2005). Em alguns casos, a
intensa predação incide também sobre espécies com estatuto de ameaça, como as
espécies de passeriformes Sialia sialis e Archilochus colubris, o que agrava a situação
das mesmas (Lepczyk 2003). Devido a este facto, numerosos esforços têm sido
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
4
efectuados, com vista à diminuição do impacto predatório dos gatos domésticos sobre
populações silvestres, sendo encorajada, junto dos donos, a proibição de acesso
ilimitado às ruas (Daniels et al. 2001) e a colocação de coleiras com sinos, o que reduz
o impacto predatório destes felinos (Ruxton 2002).
Numa perspectiva mais rural, os gatos domésticos sempre foram vistos como
exímios caçadores de ratos, tendo sido fomentado o aumento do número de gatos
domesticados nestas zonas, com o propósito de controlar as pragas de roedores, em
especial nos celeiros (Turner & Meister 1988).
Nos meios rurais, onde o nível de urbanização é reduzido, a elevada riqueza
específica de presas traduz-se num forte impacto predatório, sendo que nestas áreas a
existência de outros predadores influencia a pressão predatória manifestada pelo gato
doméstico (Alterio et al. 1998). Nestes locais, o gato doméstico rural possui uma forte
ligação ao homem, em termos alimentares e de abrigo (Liberg 1984), mas, em
contrapartida, possui também livre acesso aos habitats naturais e a todo o tipo de presas
aí existentes. Os grupos de gatos assilvestrados, são constituídos por um número
reduzido de indivíduos, apenas fêmeas e crias (Liberg & Sandell 1988), que variam o
consumo de restos de alimentação humana na dieta, consoante o grau de dependência
em relação ao homem (Biró et al. 2005). As principais presas do gato doméstico são
pequenos mamíferos, lagomorfos e aves, de acordo com a sua disponibilidade, sendo
similar a dieta observada entre gatos domésticos e assilvestrados em meio rural (Liberg
1984), apesar deste felino também capturar presas pertencentes a outros grupos (Woods
et al. 2003, Biró et al. 2005, Campos 2004), sendo considerado um predador oportunista
(Fitzgerald 1988, Clevenger 1995, Konecy 1987), apto a explorar uma grande
diversidade de presas e a trocar de fonte alimentar primária, sempre que necessário.
Por outro lado, as zonas rurais localizadas em espaços naturais bem
conservados, são os locais onde o gato doméstico pode induzir graves problemas de
conservação, nomeadamente no que diz respeito à hibridação com o gato-bravo (Felis
silvestris, Scheber 1975). Esta espécie, que se encontra actualmente ameaçada a nível
Europeu, foi classificada com o estatuto de espécie Vulnerável (VU) (Cabral et al. 2005)
por o conhecimento existente indicar uma acentuada regressão nas suas populações
(Ferreira 2003). Como factores de ameaça são referidos a destruição do habitat, a
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
5
perseguição directa, o atropelamento e o controlo de predadores (Mayo 1986, Garcia
2004), sendo a hibridação com o gato doméstico, a maior ameaça à integridade da
espécie (Stahl & Artois 1991, Stahl & Leger 1992).
Nestes ambientes rurais, os grupos de gatos assilvestrados permanecem em
contacto directo com outros grupos de gatos semelhantes, sendo frequente e facilitada a
transmissão de doenças, durante as lutas e os acasalamentos (Yamaguchi 1996). Desta
forma, a hibridação é vista como uma fonte de diminuição do pool genético puro do
gato-bravo, e um factor de transmissão de doenças virais, como o FIV (sida felina) e o
FeLV (leucemia felina), entre as duas espécies (McOrist 1991), o que pode ter graves
consequências nas populações de gato-bravo de reduzido efectivo. Em diversos países,
onde a hibridação e as doenças estão na base do declínio do gato-bravo, foram
adoptadas medidas minimizadoras de contacto entre as duas espécies, por exemplo,
programas de exclusão dos gatos domésticos das áreas de gato-bravo (Hubbard et al.
1992). Por outro lado, a hibridação tem como pressuposto o contacto directo entre as
espécies, que só pode ocorrer se houver sobreposição das suas áreas de ocorrência,
mesmo que ocasionalmente, ou apenas numa restrita parte (Biró et al. 2004), visto que o
gato-bravo é uma espécie habituada a habitats onde a perturbação humana é reduzida
(Stahl & Artois 1991, Ferreira 2003, Fernandes 2004), e as áreas vitais dos gatos
domésticos encontram-se confinadas à área circundante das estruturas humanas
(Palomares & Delibes 1993). Esta eventual sobreposição de áreas vitais, poderá ainda
estar na base de uma marcada competição alimentar, visto que ambas as espécies
apresentam preferências sobre as espécies de presas que ocorrem em maior abundância
no meio ambiente (Malo et al. 2004), sendo esta competição prejudicial para o gato-
bravo, nos locais onde a densidade de gatos domésticos é elevada (Biró et al. 2003). Na
Península Ibérica, e até ao presente, apenas um estudo analisou o regime trófico do gato
doméstico, e numa área em que o gato-bravo não estava presente (Marques 2003).
Em Portugal e em diversas zonas mediterrânicas de Espanha, o reduzido
número de estudos sobre a biologia e ecologia do gato-bravo, definem-no como uma
espécie solitária, de hábitos nocturnos, cuja dimensão das áreas vitais, e,
consequentemente dos territórios, está estritamente relacionada com a quantidade e
qualidade dos recursos disponíveis no meio (Fernandes 1991, Monterroso 2006). A base
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
6
da alimentação desta espécie são os lagomorfos e os roedores (Aymerich 1982, Abreu
1993, Pereira et al. 2001, Moleón & Gil-Sànchez 2003, Carvalho & Gomes 2004),
parecendo haver uma nítida preferência sazonal pelos primeiros, quando estes são
abundantes no meio, o que confere ao felino uma economia no esforço de predação
(Sarmento 1996) e uma maximização da energia diária necessária adquirida (Pereira et
al. 2001), sendo os segundos mais predados quando os lagomorfos estão ausentes duma
determinada região (Malo et al. 2004). O gato-bravo ocorre preferencialmente em zonas
de matagal e bosque mediterrâneo, em que a presença de linhas de água é quase
obrigatória, alternadando com áreas abertas, sendo que as zonas de matos densos estão
associadas ao repouso do felino, e as zonas abertas são áreas previligeadas de caça
(Ferreira 2003, Lozano et al. 2006).
No Sul de Portugal, o conhecimento existente sobre as populações de gato-
bravo é ainda mais limitado, restringindo-se a estudos pontuais na bacia do Rio
Guadiana (Pereira et al. 2001, Ferreira 2003, Monterroso 2006). O aparente declínio da
espécie, observado do litoral para o interior, torna as regiões fronteiriças como a
margem esquerda do Rio Guadiana importantes para a conservação do gato-bravo
(Ferreira 2003), uma vez que se tratam de áreas de.continuidade da distribuição ibérica
da espécie (Palomo & Gisbert 2002). Deste modo, torna-se importante compreender as
causas da descontínuidade e redução da área de distribuição de gato bravo,
nomeadamente conhecer os factores que determinaram essa regressão, e qual o seu peso.
A hibridação e a introgressão de genes de gato doméstico nas populações de gato-bravo
são uma ameaça à integridade da última (Pierpaoli et al. 2003). Em Portugal, as
populações de gato-bravo e de gato doméstico que vivem em simpatria, possuem uma
proporção significativa de híbridos, cerca de 15% (Fernandes 1996, Oliveira et al. 2007),
fruto do contacto directo entre as duas espécies.
1.1 Objectivos do estudo
Este estudo pretende dar a conhecer o regime trófico do gato doméstico rural,
numa região de ocorrência confirmada de gato-bravo (Pereira et al. 2001, Ferreira 2003,
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
7
Monterroso 2006), o que poderá implicar fenómenos de competição por recursos
alimentares e de hibridação entre as duas espécies.
Assim, através deste estudo pretende-se atingir os seguintes objectivos:
. Determinar o impacto predatório do gato doméstico sobre as espécies silvestres numa
zona rural do Sul de Portugal, e comparar com o grau de predação observado noutros
habitats.
. Aferir sobre a possível existência de competição alimentar entre o gato doméstico e o
gato bravo, na zona rural em questão, onde o grau de humanização é reduzido.
Tendo em conta os objectivos definidos, foram testadas as seguintes hipóteses:
1. O gato doméstico varia a sua dieta de acordo com a disponibilidade de recursos
alimentares naturais e não naturais existentes em cada local (Fitzgerald 1988).
2. Em ambientes rurais, apesar da disponibilidade e acessibilidade a presas silvestres, o
gato doméstico comporta-se como um oportunista mostrando-se dependente dos restos
alimentares fornecidos pelo homem (Liberg 1984, Weber & Dailly 1998).
3. A dependência do homem por parte do gato doméstico em ambientes rurais reduz o
seu potencial como competidor do gato-bravo pelos recursos alimentares.
ÁREA DE ESTUDO
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
9
2.Área de Estudo
2.1 Caracterização do Sítio Moura-Barrancos
O Sítio Moura-Barrancos integra-se na Rede Natura 2000, a qual foi criada
com o objectivo de promover a conservação da natureza e da diversidade biológica dos
países da União Europeia. Este Sítio de Interesse Comunitário, foi proposto no âmbito
da directiva Habitats e posteriormente definido como Zona Especial de Conservação
(ZEC), visando a conservação dos habitats naturais, fauna e flora silvestres da região em
causa, através da aplicação das medidas necessárias à manutenção e restabelecimento do
estado de conservação favorável dos habitats naturais ou das populações das espécies
para as quais o Sítio foi designado (DR 1999, de 24 de Abril).
A selecção do Sítio Moura-Barrancos como área de estudo, justifica-se pela sua
importância para a conservação do gato-bravo, que encontra aqui uma das áreas de
ocorrência confirmada no Sul de Portugal. Por outro lado, é nesta área natural que tem
sido feito o maior investimento tendo em vista a análise dos factores que potencialmente
poderão ser determinantes para o estado das suas populações (Pereira et al. 2001,
Santos-Reis et al. 2003, Ferreira 2003).
O Sítio Moura-Barrancos, localizado entre as latitudes 38º13´N e 37º57´N e as
longitudes 7º24´O e 6º59´O, abrange uma área de 43 309 ha do sudeste alentejano,
estando limitado pelas povoações de Safara, Santo Aleixo da Restauração, Sobral da
Adiça, Vila Verde de Ficalho e Barrancos. É considerado parte integrante da região
bioclimática pré-mediterrânica, visto apresentar Verões quentes e Invernos frios. O
regime pluviométrico é marcado por uma elevada sazonalidade e escassez de chuvas,
sendo o clima denominado de sub-húmido mesotérmico (Rivas-Martinez 2005).
A paisagem é bastante heterogénea e caracterizada pela elevada diversidade de
biótopos, onde os montados de sobro (Quercus suber) e azinho (Quercus ilex subsp.
rotundifolia) com subcoberto (33,4%) e sem subcoberto (30,6%) dominam e assumem
grande importância, por estarem bem adaptados às condições edafo-climáticas da região,
ocorrendo em solos fracos para o uso agrícola e com grandes riscos de erosão. Com
menor representatividade aparecem os olivais explorados (12,7%), que se encontram
associados a uma utilização agrícola ou pastoril. As searas (4,8%), são zonas de extrema
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
10
importância para a avifauna residente ameaçada, visto serem locais de ocorrência da
abetarda (Otis tarda), do sisão (Tetrax tetrax) e do cortiçol-de-barriga-negra (Pterocles
orientalis), sendo também uma zona de invernada do grou-comum (Grus grus). Estes
habitats são locais igualmente importantes para os juvenis de grandes rapinas, como a
águia-de-Bonelli (Hieraaetus fasciatus), a águia-real (Aquila chrysaetus) e a águia-
imperial-ibérica (Aquila adalberti), visto disponibilizarem uma elevada quantidade de
presas, principalmente micromamíferos, e para as espécies de rapinas necrófagas, por
fornecerem cadáveres suficientes de bovinos e ovinos que pastam neste tipo de habitat.
As espécies arbóreas não nativas aparecem representadas por zonas de pinhal Pinus sp.
com subcoberto (3,3%), pinhal sem subcoberto (0,8%), e áreas de eucaliptal
(Eucalyptus globosus) com subcoberto (0,4%). As plantações recentes (1%) e os
cultivos de vinha, hortas e pomares (0,8%) encontram-se fracamente representados
(Ferreira 2003).
A esteva (Cistus ladanifer) é a espécie arbustiva que predomina na região,
associada a matos e matagais de outras espécies características, como os sargaços
(Cistus salvifolius e Cistus monspeliensis), a roseira pequena (Cistus crispus), o tojo
(Ulex spp.), a giesta (Genista spp.), a urze (Erica spp.), o rosmaninho (Lavandula spp.),
a aroeira (Pistacia lentiscus) e o carrasco (Quercus coccifera), ou aparecendo em
manchas homogéneas - estevais (Baltazar 2001).
O sítio Moura-Barrancos é atravessado pelo rio Ardila e por diversas ribeiras
(Murtigão, Toutalga, Safara, Murtega, Pães Joanes e Safarejo) de regime torrencial no
Inverno, altura em que possuem um caudal considerável no canal de escoamento. Estes
cursos de água da Bacia do Guadiana correm ao longo de vales encaixados,
normalmente com zonas rupícolas (0,8%) associadas, onde a vegetação ripicola (1,6%)
aparece representada pelo tamujo (Securinega tintorea) e o aloendro (Nerium oleander).
Nestes locais podem ser avistadas espécies como bufo-real (Bubo bubo), cegonha-preta
(Ciconia nigra), lontra (Lutra lutra) e toirão (Mustela putorius) (Ferreira 2003).
Em torno das linhas de água, podem ser encontradas manchas de matagais
(6,6%), matos clímax (2,7%) e matos de esteva dominante (0,5%), salientando-se o
complexo de serras Adiça-Preguiça-Ficalho-Malpique, onde o património botânico é
reconhecido a nível mundial. Neste local, a comunidade de carnívoros encontra-se bem
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
11
representada, pela grande diversidade de espécies existentes, sendo uma das zonas onde
a densidade populacional de coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) atinge valores mais
elevados (Ferreira 2003).
A reduzida ocupação humana do Sítio Moura-Barrancos, concentrada em
quatro povoações (Barrancos, Moura, Mourão e Serpa), revela uma actividade centrada
essencialmente na agricultura e pecuária; a actividade cinegética é também muito
comum, visto que 66% dos espaços florestais correspondem a zonas de regime de caça
especial (ICN 2006).
2.2 Critérios para a selecção dos locais de amostragem
A realização de inquéritos orais efectuados em todas as herdades do Sítio
Moura-Barrancos (N = 132), foi o método seleccionado para avaliar a ocupação das
mesmas por gatos domésticos; em cada local de presença de gatos, foi reunida
informação acerca das características fenotípicas, biológicas e sanitárias dos indivíduos
observados (Anexo I). Da avaliação feita em toda a área de estudo verificou-se que das
132 herdades aí existentes, somente 27 (20%) encontram-se em actividade, estando os
gatos domésticos inventariados (n = 112) apenas presentes naquelas cujas casas rurais
estão habitadas ou são utilizadas de uma forma parcial (p. ex. por trabalhadores durante
o dia) (Fig. 1).
Figura 1 – Localização das herdades rurais existentes no Sítio Moura-Barrancos (Baixo
Alentejo), com indicação das herdades onde foi verificada a presença de gatos domésticos.
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
12
Para análise da dieta e do impacto predatório dos gatos domésticos em
ambiente rural seleccionaram-se três locais de amostragem (Perímetro Florestal da
Contenda, o Castelo de Noudar e a Herdade da Coutada dos Frades – Fig. 2) sendo os
critérios que presidiram à sua escolha a proximidade a áreas adequadas para a
ocorrência de gato-bravo (Ferreira 2003), serem herdades em que alguns dos indivíduos
estavam a ser alvo de rádio-seguimento (J.P. Ferreira, Com. Pess.) (Anexo II) e as
condições de acessibilidade.
Figura 2 - Sítio Moura-Barrancos (Baixo Alentejo), com indicação das áreas de adequabilidade
à ocorrência de gato-bravo e a localização do Perímetro Florestal da Contenda, do Castelo de
Noudar e da Herdade da Coutada dos Frades.
2.3 Caracterização dos locais de amostragem
2.3.1 Perímetro Florestal da Contenda
A Herdade da Contenda apresenta uma elevada heterogeneidade espacial,
sendo catalogada como Zona de Caça Nacional (ZCN). Estende-se por uma área de
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
13
5,319 ha, onde predomina a esteva (Cistus ladanifer), que pode estar associada a outras
espécies arbustivas ou integrada em matos. No coberto arbóreo, as espécies dominantes
são o pinheiro manso (Pinus pinea), o pinheiro bravo (Pinus pinaster), a azinheira
(Quercus rotundifolia) e o sobreiro (Quercus suber) (Ferreira 1997).
Considerando que a distância média de afastamento dos gatos alvo de rádio-
seguimento é de cerca de 1 km (J.P. Ferreira, Com. Pess.), para uma melhor
caraterização do habitat disponível para os indivíduos residentes em cada herdade, foi
criado um “buffer” com 1km de raio em seu redor. No Perímetro Florestal da Contenda,
o uso do solo dominante neste “buffer” é o montado disperso sem subcoberto (60% -
Fig. 3), sendo a restante área ocupada por montado com subcoberto (30%) e linhas de
água (10%).
Figura 3 – Vista do Perímetro Florestal da Contenda (© J.P. Ferreira)
No interior da Herdade, existem 3 casas rurais, sendo apenas uma usada em
permanência, e integrando um pombal (Fig. 4), uma capoeira, um barracão com
maquinaria agrícola e florestal e um armazém de palha (Fig. 5).
Figura 4 – Pombal 1 (© I.N. Leitão) Figura 5 – Palheiro 1 (© I.N. Leitão)
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
14
No Perímetro Florestal da Contenda existem quatro gatos, dois machos e duas
fêmeas (Tab. 1).
Tabela 1 – Sexo, idade e cor da pelagem dos gatos domésticos existentes no Perímetro Florestal
da Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da Coutada dos Frades
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Gato Nº 1 2 3 4 5 6 7 8 9
Sexo M F M F M F M F F
Idade A A SA A SA A A A A
Pelagem PB P PB PB P P P PC P
M-macho, F-fêmea; A-adulto, SA-sub-adulto; PB-preta e branca; P-parda; PC-parda clara
2.3.2 Castelo de Noudar
O Castelo de Noudar, eleva-se entre as margens da ribeira do Múrtega e do Rio
Ardila, estando envolvido por áreas de matagais bem conservados e habitats rupícolas
integradas numa matriz de montados de azinho (Quercus rotundifolia) com um sub-
coberto de herbáceas (Fig. 6).
A área envolvente ao Castelo de Noudar (“buffer”), compôe-se de matagal
mediterrânico (30%), montado com subcoberto (20%), montado sem subcoberto (30%)
e linhas de água (20%).
Figura 6 - Vista do castelo de Noudar (© J.P. Ferreira)
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
15
No interior do Castelo, existe uma torre da antiga igreja (Fig. 7), onde se
estabeleceram ninhos de apodiformes (Apus sp.), e três casas, funcionando uma delas
como local de armazenamento de palha.
No Castelo de Noudar existem dois gatos, um macho subadulto e uma fêmea
adulta (ver Tab. 1).
Figura 7 – Torre da igreja (© I.N. Leitão)
2.3.3 Herdade da Coutada dos Frades
A Herdade da Coutada dos Frades, com uma extensão de 490ha, faz fronteira
com o Perímetro Florestal da Contenda, estando integrada no Regime Cinegético
Especial como Zona de Caça Turística.
O montado de azinho com subcoberto é o tipo de vegetação predominante na
área, apesar de também ocorrerem afloramentos rochosos ao longo das linhas de água,
como nas Ribeiras de Paejoanes e Murtigão. A espécie arbustiva dominante é a esteva
(Cistus ladanifer) (Fig. 8).
Na proximidade (“buffer”) da casa rural associada à Herdade da Coutada dos
Frades, predomina o montado com subcoberto (90%) e as linhas de água (10%).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
16
Figura 8 – Vista da Herdade da Coutada dos Frades (© I.N. Leitão)
A área adjacente à casa do monte possui um palheiro (Fig. 9), um pombal (Fig.
10), e um galinheiro (Fig. 11), além de ninhos de apodiformes nos telhados das casas.
Nesta herdade existem três gatos adultos, um macho e duas fêmeas (ver Tab. 1).
Figura 9 - Palheiro 2 (© I.N. Leitão) Figura 10 – Pombal 2 (© I.N. Leitão)
Figura 11- Galinheiro (© I.N. Leitão)
MÉTODOS
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
18
3.Métodos
3.1 Recolha de dejectos
Com a finalidade de recolher informação sobre o regime trófico dos gatos
domésticos em zonas rurais integradas em áreas de ocorrência potencial de gato-bravo,
o método seleccionado foi o habitual em estudos de dieta de carnívoros (Reynolds &
Aebischer 1991), isto é, a análise de amostras fecais.
A recolha de dejectos decorreu entre Março (excepto na Herdade da Contenda,
com início em Maio) e Agosto de 2007, com uma periodicidade quinzenal. Previamente,
foi efectuada uma prospecção, num raio de 1km em torno da casa principal de cada
herdade, de forma a identificar os locais habituais de defecção dos gatos.
A cada excremento recolhido foi anexada a seguinte informação: data da
recolha, número da amostra, localização (sítio onde foi encontrado e se estava enterrado
ou a descoberto) e a idade previsível do mesmo (recente ou antigo).
3.2 Procedimento laboratorial
No laboratório, após o amolecimento em água, procedeu-se à lavagem de cada
excremento, utilizando um jacto de água e uma rede de malha fina (crivo). De seguida,
efectuou-se a triagem dos vários componentes não digeridos, representantes das
diferentes classes-presa consumidas: pêlos, penas, ossos, peças quitinosas, escamas,
material vegetal e material não identificado. Os componentes de cada excremento foram
colocados em caixas de petri, o que facilitou a determinação visual da percentagem de
ocorrência (P.O.) das diversas classes-presa. Cada caixa de petri foi colocada na estufa a
50ºC, até os vários componentes ficarem totalmente secos, sendo posteriormente
guardados e devidamente identificados.
O material vegetal não energético, constituído por folhas e caules, e o material
não identificado, constituído por restos de alimentação humana, foram considerados
como sendo voluntariamente ingeridos, enquanto recurso alimentar, apenas quando a
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
19
sua P.O. no excremento era igual ou superior a 20%. Apenas as sementes, devido ao
elevado valor energético dos frutos, foram consideradas como recurso voluntariamente
ingerido independentemente da sua P.O. em cada dejecto (Rosalino 1995).
Posteriormente procedeu-se à identificação do material triado. A identificação
microscópica dos pêlos de revestimento dos mamíferos foi efectuada a partir da
observação da medula entre lâmina e lamela, de cortes transversais em medula de
sabugueiro e, sempre que necessário, da impressão cuticular (Teerink 1991). As
espécies de micromamíferos foram ainda identificadas através dos restos de dentição
encontrada nos excrementos (Santero & Alvarez 1985). A observação microscópica de
preparações simples das plumas, permitiu a identificação das aves até à ordem (Brom
1986). A identificação dos répteis foi efectuada com base em escamas, sendo apenas
possível diferenciar os lacertídeos dos répteis não identificados, visto não terem
ocorrido nos dejectos vértebras constituintes destes, que permitiriam uma identificação
mais rigorosa. Recorrendo a uma colecção de referência, a um guia de identificação
(Chinery 1997) e a especialistas, foi possível associar as peças quitinosas aos diferentes
grupos de artrópodes, na maioria dos casos até à Familia.
3.3 Análise do regime trófico do gato doméstico no Sitio Moura-
Barrancos
A Primavera (Março, Abril e Maio) e o Verão (Junho, Julho e Agosto) do ano
em estudo não mostraram diferenças climatéricas significativas, pelo que os dados
recolhidos no campo foram analisados conjuntamente, como que fazendo parte da
estação seca do ano de 2007.
3.3.1 Homogeneidade e representatividade espacial das amostras
De forma a verificar a homogeneidade da dimensão da amostra, em termos
espaciais, utilizou-se o teste do Qui-quadrado (Fowler & Cohen 1990). Para avaliar a
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
20
representatividade das amostras espacialmente, foi calculada a Curva Acumulativa da
Diversidade Trófica (Mason & Macdonald 1980), definida pela relação entre a
frequência acumulada de cada item alimentar e o número de excrementos referentes a
cada local de recolha, seleccionados por ordem aleatória.
3.3.2. Estimativas de ocorrência e de biomassa consumida para cada item trófico
Os resultados obtidos foram expressos em termos de:
Frequência de Ocorrência (F.O.) - quociente entre o número de ocorrências de cada
classe-presa e o número total de ocorrências de todas as classes-presa * 100)
Percentagem de Biomassa (P.B.): quociente entre o peso médio total de cada classe-
presa ingerida e o peso total de todos os items consumidos * 100). O peso médio total
de cada classe-presa foi calculado multiplicando o peso médio tabelado (Tab. 2) para
cada classe-presa, pelo número de ocorrências correspondente a cada classe-presa.
Para calcular o valor de biomassa referente aos restos de alimentação humana,
estimou-se a dose diária de alimento necessária por sexo (machos:250g;
fêmeas:156,25g), tendo em conta que o peso médio dos machos é 4Kg e o das fêmeas
2,5Kg, e que um gato com aproximdamente 3,5kg necessita de 225g de alimento por dia
(Scott 1968 in Liberg 1984). Assumindo que um excremento corresponde a uma
refeição diária, foi calculada a dose média necessária por dia (1 refeição) e por gato,
independentemente do sexo (cerca de 203g). A este valor foi subtraído o peso total das
presas que ocorreram em cada dejecto, sendo esse o valor atribuído à biomassa dos
restos de alimentação humana, por dejecto.
Para os lagomorfos e aves não passeriformes (Columbiformes, Anseriformes e
Galliformes), cujo peso individual ultrapassa o valor correspondente à dose diária de
alimentos ingeridos por um gato doméstico adulto, 203g, foi atribuído um valor de
biomassa de 170g por indivíduo consumido (Fitzgerald & Karl 1979 in Nogales 1988).
O peso médio da ordem Passeriformes, foi calculado com base no peso real (Cramp
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
21
1985) de indivíduos pertencentes às cinco espécies mais comuns da avifauna existente
na área de estudo (Tab. 2).
O material vegetal não energético (folhas e caules), não entrou no cálculo da
biomassa, visto assumir-se que foi consumido apenas como purgante (Pettersson 1968
in Fitzgerald 1988).
Tabela 2 - Pesos médios das classe-presas consumidas pelos gatos domésticos (mamíferos, aves,
répteis, artrópodes, sementes)
Item alimentar Peso Médio (g) Fonte bibliográfica
Apodemus sylvaticus 22,61 Ramalhinho (Com. Pess.) in Clamote 1997
Arvicola sapidus 155 Calviño 1984
Mus sp. 11,91 Ramalhinho (Com. Pess.) in Clamote 1997
Rattus sp. 150 Simão 1988
Microtus sp. 20 Simão 1988
Crocidura russula 7,40 Ramalhinho (Com. Pess.) in Clamote 1997
Lagomorpha 170 Fitzgerald & Karl 1979 in Nogales 1988
Passeriformes 25 Cramp 1985
Apodiformes 45 Cramp 1985
Accipitriformes 180 Cramp 1985
Columbiformes 170 Fitzgerald & Karl 1979 in Nogales 1988
Anseriformes 170 Fitzgerald & Karl 1979 in Nogales 1988
Galliformes 170 Fitzgerald & Karl 1979 in Nogales 1988
Lacertidae 3 Castells & Mayo 1993 in Malo 2004
Insecta 0,5 Castells & Mayo 1993 in Malo 2004
Arachnida 1,22 Teixeira & Coutinho 2002
Scolopendra cingulatus 2,98 Ferreira 1997
Olea europaea (sementes) 2 Simão 1988
Tricitum sp. (sementes) 0,5 Delibes 1974
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
22
3.3.3. Análise da variação no consumo de presas
Tendo em conta a distribuição espacial dos dados e as frequências de
ocorrência de cada item alimentar, utilizou-se o teste do Qui-Quadrado modificado, com
um nível de significância de 0,05 (Simpson et al. 1960) para averiguar possíveis
diferenças no consumo dos diversos itens alimentares entre locais. Este é definido
segundo a fórmula:
X2 = N (ad-bc)2 / (a+b) (c+d) (a+c) (b+d)
onde: a – nº de vezes que o recurso i ocorreu na amostra A; b – nº de vezes que o
recurso i não ocorreu na amostra A; c – nº de vezes que o recurso i ocorreu na amostra
B; d – nº de vezes que o recurso i não ocorreu na amostra B; N = a+b+c+d.
3.3.4. Diversidade no consumo de presas
Para analisar o grau de diversidade da dieta em cada local, calculou-se a
amplitude do nicho alimentar, tendo em conta 8 categorias alimentares (Lagomorpha,
Rodentia, Insectívora, Aves, Reptilia, Arthropoda, Material vegetal e Restos de
Alimentação Humana), através do índice de Levins (Krebs 1972), expresso pela
seguinte fórmula:
B = 1 / Σ pi2
em que pi é a proporção da frequência de ocorrência da classe-presa i em relação ao
total de itens consumidos em cada herdade.
De forma a possibilitar a comparação das amplitudes de nichos alimentares
entre locais, procedeu-se a uma padronização do índice de Levins, descrita pela seguinte
equação:
BA = (B-1) / (n-1)
onde B é a amplitude do nicho alimentar calculada e n o número de categorias
alimentares definidas.
Este índice varia entre 0 e 1, correspondendo os valores próximos de 0 a uma
dieta mais restrita (especialista), e os valores próximos de 1 a uma dieta mais ampla
(generalista).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
23
3.3.5. Sobreposição dos nichos alimentares
De maneira a avaliar a sobreposição dos nichos alimentares, foi utilizado o
índice de Pianka (Pianka 1974):
ahk = ∑ pih * pik / √ ∑ pih2 * ∑ pik
2
onde pi é a proporção de cada classe-presa i na dieta nas amostras h e k.
Este índice varia igualmente entre 0 e 1, sendo este último o valor máximo
atingido, quando os espectros alimentares são semelhantes nas duas amostras.
3.3.6. Classificação dos recursos tróficos consumidos
Os recursos tróficos consumidos foram classificados tendo em conta a
frequência de ocorrência (F.O.) definida para cada item alimentar (Oreja 1990 in Tomé):
F.O. < 1% - Recurso Ocasional
1% < F.O. < 5% - Recurso Complementar
5% < F.O. < 20% - Recurso Constante
F.O. > 20% - Recurso Básico
3.4 Análise do regime trófico do gato doméstico em diversos ambientes
O regime trófico do gato-doméstico no Sítio Moura-Barrancos foi comparado
com o observado em outros locais da área de distribuição da espécie, utilizando-se para
tal todos os estudos disponíveis onde a análise do regime trófico foi efectuada através de
excrementos recolhidos apenas na época seca. Previamente a esta análise, os dados
foram homogeneizados, sendo recalculadas as respectivas F.O. (%) de acordo com as 8
classes-presas definidas (Rodentia, Insectívora Lagomorpha, Aves, Reptilia, Arthropoda,
Material vegetal e Restos de Alimentação Humana).
Dos cinco estudos seleccionados, dois foram efectuados em zonas urbanas
(Marques 2003, Campus 2004), dois em zonas rurais (Liberg 1984, Weber & Dailly
1998) e um numa ilha mediterrânica (Bonnaud et al. 2007) (Fig. 12). Os estudos
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
24
realizados em zonas urbanas, ocorreram num bosque (Marques 2003) e num Campus
Universitário (Campus 2004), de grande proximidade às cidades de Madrid e de São
Paulo, respectivamente, e com intensa actividade humana.
A análise da diversidade trófica foi efectuada através do cálculo da amplitude
do nicho alimentar, indicado pelo índice de Levins padronizado (ver 3.3.4.)
Figura 12 – Localização geográfica dos locais onde foram realizados os estudos acerca do
regime trófico do gato doméstico: (1) Liberg 1984; (2) Weber & Dailly 1998; (3) Marques 2003;
(4) Campus 2004; (5) Bonnaud et al. 2007; (6) presente estudo.
3.5 Competição alimentar com Felis silvestris
Para avaliar o potencial competitivo do gato-doméstico face ao gato-bravo
efectuou-se uma análise comparativa dos regimes alimentares das duas espécies
utilizando um modelo multivariado de ordenação canónica. De maneira a determinar
qual o melhor modelo de ordenação multivariada a utilizar, efectuou-se uma Detrended
Correspondence Analysis (DCA), que revelou um comprimento do gradiente inferior a
3 S.D., indicando a Principal Components Analysis (PCA) como a análise mais
adequada (ter Braak & Smilauer 1998). Este método de análise multivariada tem sido
BBosque de Valdelatas Madrid, Espanha (3)
Campus Universitário São Paulo, Brazil (4)
Montanhas Jura, Suíça (2)
Revinge, Suécia (1)
Ilha de Port-Cros, França (5) Sítio
Moura-Barrancos, Portugal (6)
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
25
actualmente usado em estudos referentes ao regime trófico de felinos, como o gato
doméstico (Pontier et al. 2002), o gato-bravo (Lozano et al. 2006) e o jaguar (Panthera
onça) (Nuno 2007).
Nesta análise utilizaram-se seis estudos, sendo três de gato doméstico (Weber
& Dailly 1998, Marques 2003, presente estudo) e três de gato-bravo (Corbett 1979,
Fernandes 1991, Pereira et al. 2001) (Fig. 13). Em todos, a análise do regime alimentar
foi realizada recorrendo apenas a excrementos referentes à época seca, de modo a haver
uniformidade nos dados. Os dados provenientes dos diferentes estudos foram
reorganizados, tendo sido recalculadas as F.O. de acordo com as classes definidas no
presente estudo (Rodentia, Insectívora Lagomorpha, Aves, Reptilia, Arthropoda,
Material vegetal e Restos de Alimentação Humana).
Para a execução da DCA e da PCA fez-se recurso ao software CANOCO for
Windows versão 4.5 (ter Braak & Smilauer 1998).
Figura 13 – Localização geográfica dos locais onde foram realizados os estudos de gato
doméstico e de gato-bravo: (1) Corbett 1979; (2) Fernandes 1991; (3) Weber & Dailly 1998; (4)
Pereira et al. 2001; (5) Marques 2003; (6) presente estudo.
Glen Tanar, Escócia (1) Parque Natural
Montesinho, Portugal (2)
Bacia do Guadiana, Portugal (4)
Bosque de Valdelatas Madrid, Espanha (5)
Montanhas Jura, Suíça (3)
Sítio Moura-Barrancos,
Portugal (6)
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
26
Sendo que os micromamíferos representam o grupo-presa mais consumido
tanto pelo gato doméstico, como pelo gato-bravo, de modo a verificar se existe um
consumo diferencial dos vários géneros e espécies, que poderia minimizar o potencial
competitivo, efectuou-se uma segunda análise de ordenação canónica - Detrended
Correspondence Analysis (DCA). Esta revelou igualmente um comprimento do
gradiente inferior a 3 S.D., indicando a PCA como a análise mais adequada a realizar
(ter Braak & Smilauer 1998).
Nesta análise, foram utilizados quatro estudos realizados na Península Ibérica,
dois de gato-bravo (Fernandes 1991, Pereira et al. 2001), e dois de gato doméstico
(Marques 2003, presente estudo) (Fig. 13) onde as F.O. de micromamíferos foram
elevadas. Tendo em conta as espécies consumidas em cada estudo, foram definidos 8
grupos classificados de acordo com o género (Apodemus sp, Arvicola sp, Mus sp.,
Rattus sp., Microtus sp., Crocidura sp., Talpa sp. e Eliomys sp.).
RESULTADOS
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
28
4.Resultados
4.1 Regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos 4.1.1 Análise global do regime trófico do gato doméstico
No conjunto dos três locais de amostragem, foram recolhidos 166 excrementos
de gato doméstico, que revelaram um consumo de 473 items alimentares (Tab. 3).
Os restos de alimentação humana foram o item mais importante na dieta dos
gatos domésticos, tanto em termos de frequência de ocorrência (27,70%), como em
termos de biomassa consumida (74,58%). No entanto, o consumo de recursos naturais,
de natureza animal e vegetal, assumiu uma expressão significativa, particularmente em
termos de F.O., sugerindo uma complementaridade com alguma relevância no regime
trófico deste felino.
Das presas selvagens os mamíferos assumem-se como a componente mais
importante (P.O. = 29%, P.B. = 14%). A ordem rodentia foi a mais frequente, tanto em
termos de ocorrência (26,85%) como de biomassa (9,61%), sendo o género Mus, o mais
consumido (17,55%), e o que contribuiu com maior quantidade de biomassa (3,62%).
Apesar da ordem lagomorpha aparecer apenas com uma frequência de 1,48% na dieta
do felino, esta representa 4,35% da biomassa consumida.
As aves ocorreram com reduzida frequência (7,19%). Contudo forneceram uma
quantidade de biomassa próxima da fornecida pelos mamíferos (11,02%). A ordem
Passeriformes foi a mais consumida (2,96%), apesar de ter disponibilizado somente
1,28% da biomassa referente às aves. A ordem Columbiformes foi a segunda mais
frequente (2,33%), e a que representa mais biomassa (6,85%).
O consumo de répteis foi pouco frequente (1,48%), sendo este recurso alimentar
um complemento da dieta, tendo contribuído com uma percentagem de biomassa
praticamente nula (0,03%).
Os artrópodes constituíram a terceira classe-presa mais consumida pelos gatos
domésticos, aparecendo na dieta com uma frequência de 20,30%, apesar de
disponibilizarem apenas 0,26% da biomassa total adquirida. Os insectos foram a classe
que mais se destacou, em termos de ocorrência (14,38%) e de biomassa (0,12%), sendo
as ordens Coleoptera (5,07%) e Orthoptera (5,92%) as mais frequentes na dieta.
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
29
O material vegetal, constituído pelas sementes (4,44%) e pelo material não
energético (9,94%), forneceu apenas 0,05% da biomassa assimilada.
Tabela 3 – Número de indivíduos, frequência de ocorrência e percentagem de biomassa
referentes ao regime trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos.
F.O. (%) P.B. (%)
Classes-presa N (n=473)
Classe Mammalia 137 28,96 14,04 Lagomorpha 7 1,48 4,36 Rodentia 127 26,85 9,61 Mus sp. 83 17,55 3,62 Rattus sp. 3 0,63 1,65 Microtus sp. 2 0,42 0,15 Apodemus sylvaticus 37 7,82 3,06 Arvicola sapidus 2 0,42 1,13 Insectívora 3 0,63 0,08 Crocidura russula 3 0,63 0,08
Classe Aves 34 7,19 11,02 Accipitriformes 2 0,42 1,32 Anseriformes 1 0,21 0,62 Apodiformes 2 0,42 0,33 Columbiformes 11 2,33 6,84 Galliformes 1 0,21 0,62 Passeriformes 14 2,96 1,28 Aves n.i. 3 0,63 -
Classe Reptilia 7 1,48 0,03 Lacertidae 3 0,63 0,03 Répteis n.i. 4 0,85 -
Filo Arthropoda 96 20,30 0,27
Classe Insecta 68 14,38 0,12 Coleoptera 24 5,07 - Hymenoptera 7 1,48 - Orthroptera 28 5,92 - Lepidoptera 3 0,63 - Insectos n.i. 6 1,27 - Classe Aracnhida 25 5,29 0,11 Classe Chilopoda 3 0,63 0,03
Material Vegetal 68 14,38 0,05 Sementes 21 4,44 0,05 Material vegetal não energético 47 9,94 -
Restos de alimentação humana 131 27,70 74,58
Total 473 100 100
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
30
4.1.2. Análise espacial do regime trófico do gato doméstico
A distribuição dos 166 excrementos analisados pelos três locais de amostragem
(Tab. 4) mostrou que globalmente os dados provêm de uma amostra homogénea (X2 =
2,085: gl = 2: p = 0,35).
Tabela 4 – Número de excrementos e de items alimentares referentes ao Perímetro Florestal da
Contenda, Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos Frades
P. F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Nº de excrementos 50 64 52
Nº de items 185 161 129
De acordo com as Curvas Acumuladas de Diversidade Trófica, verifica-se que,
para cada local de amostragem, a frequência acumulada das classes-presa tende para a
assímptota (Anexo III), podendo-se inferir que as três amostras espaciais têm a
dimensão adequada para serem consideradas representativas do regime trófico dos gatos
domésticos de cada local amostrado.
4.1.2.1. Regime trófico do gato doméstico no Perímetro Florestal da Contenda
Neste local os gatos domésticos revelaram um consumo de 7 classes-presa (Fig.
14) (Anexo IV - Tab. 1). Os artrópodes foram a classe-presa mais consumida (38,25%),
apesar de só representarem 0,76% da biomassa ingerida. Os roedores foram a segunda
classe-presa mais frequente, em termos de ocorrência (26,23%) e de biomassa (17,35%).
O terceiro recurso alimentar mais consumido nesta herdade foram os restos de
alimentação humana (17,49%), sendo este o de maior importância em termos de
biomassa (74,27%). Os lagomorfos aparecem como recurso complementar (1,09%),
apesar de corresponderem à terceira classe-presa que disponibilizou mais biomassa
(4,83%).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
31
Figura 14 - Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às classes-presa
consumidas no Perímetro Florestal da Contenda. M.V.-Material vegetal; R.A.H.-Restos de
alimentação humana.
Em relação aos artrópodes, as ordens mais consumidas da classe Insecta foram
a Coleoptera (28,57%) e a Orthroptera (28,57%), sendo que na primeira as famílias mais
consumidas foram a Tenebrionidae (15,71%) e a Scarabacidae (7,14%), e na segunda, a
familia com maior frequência de ocorrência foi a Acrididae (11,43%) (Tab. 5).
Tabela 5 – Frequências de ocorrência referentes aos artrópodes consumidos no Perímetro
Florestal da Contenda.
N F.O. (%) P.B. (%)
Classe Insecta 49 70,00 46,05 Ordem Coleoptera 20 28,57 - Dynastidae 2 2,86 - Scarabacidae 5 7,14 - Tenebrionidae 11 15,71 - Coleoptera n.i. 2 2,86 - Ordem Orthoptera 20 28,57 - Acrididae 8 11,43 - Gryllidae 5 7,14 - Gryllotalpidae 4 5,71 - Orthoptera n.i. 3 4,29 - Ordem Hymenoptera 2 2,86 - Ordem Lepidoptera 1 1,43 - Insectos n.i. 6 8,57 - Classe Arachnida 19 27,14 43,42 Classe Chilipoda 2 2,86 10,53
Total 70 100 100
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Lagomorpha Rodentia Insectiv ora Av es Reptilia Arthropoda M.V. R.A.H.
Classes-presa
F.O
. / P.B. (%
)
F.O. P.B.
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
32
4.1.2.2. Regime trófico do gato doméstico no Castelo de Noudar
Os roedores e os restos de alimentação humana também demonstraram ser dois
recursos básicos da dieta dos gatos domésticos do Castelo de Noudar, aparecendo na
dieta com uma ocorrência de 31,06%, apesar dos roedores contribuírem apenas com
11,79% da biomassa ingerida, em contraste com os 76,55% dos restos de alimentação.
As aves constituíem 11,18% da frequência de ocorrência e 11,24% da biomassa (Fig. 15)
(Anexo IV – Tab. 2).
Figura 15 - Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às classes-presa
consumidas no Castelo de Noudar. M.V.-Material vegetal; R.A.H.-Restos de alimentação
humana.
4.1.2.3. Regime trófico do gato doméstico na Herdade da Coutada dos Frades
Também na Herdade da Coutada dos Frades os restos de alimentação humana
foram o recurso alimentar com maior frequência de ocorrência (37,98%) e percentagem
de biomassa (71,39%) (Fig. 16) (Anexo IV – Tab. 3). Os roedores foram a segunda
classe-presa mais frequente (22,48%), apesar de representarem apenas 3,48% da
biomassa total. As aves foram consumidas como um recurso constante (10,08%),
disponibilizando 16,44% da biomassa. Os lagomorfos aparecem como recurso
complementar da dieta (3,88%), apesar de corresponderem à terceira classe-presa com
maior percentagem de biomassa (8,57%).
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Lagomorpha Rodentia Insectiv ora Aves Reptilia Arthropoda M.V. R.A.H.
Classes-presa
F.O
. / P.B. (%
)
F.O. P.B.
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
33
Figura 16 - Frequência de ocorrência e percentagem de biomassa referentes às classes-presa
consumidas na Herdade da Coutada dos Frades. M.V.-Material vegetal; R.A.H.-Restos de
alimentação humana.
4.1.2.4. Consumo de mamíferos nos três locais amostrados
O Mus sp. foi o género de roedor mais consumido nas 3 herdades, seguido de
Apodemus sylvaticus na P. F. da Contenda e no Castelo de Noudar e de lagomorfos na H.
da Coutada dos Frades (Fig.17) (Anexo V – Tab. 1).
Figura 17 - Frequências de ocorrência referentes aos mamíferos consumidos no Perímetro
Florestal da Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da Coutada dos Frades.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Lagomorpha Rodentia Insectiv ora Av es Reptilia Arthropoda M.V. R.A.H.
Classes-presa
F.O
. / P.B. (%
)
F.O. P.B.
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Lagomorpha Mus Apodemus Rattus Arv icola Microtus Crocidura
Mamíferos
Frequência de Ocorrência (%)
P. F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
34
No consumo de roedores entre os três locais de amostragem, registaram-se
diferenças significativas no referente a Apodemus sylvaticus entre o P. F. da Contenda e
a H. da Coutada dos Frades (X2 = 20,268, g.l. = 2, p = 0,00004) e entre o Castelo de
Noudar e a H. da Coutada dos Frades (X2 = 11,627, g.l. = 2, p = 0,003). Para o género
Mus, verificaram-se diferenças significativas no consumo entre a P. F. da Contenda e a
H. da Coutada dos Frades (X2 = 13,250; g.l. = 2; p = 0,001), e entre o Castelo de Noudar
e a H. da Coutada dos Frades (X2 = 0,953; g.l. = 2; p = 0,031), enquanto que o consumo
de lagomorfos foi significativamente diferente entre o Castelo de Noudar e a H. da
Coutada dos Frades (X2 = 8,269, g.l. = 2, p = 0,016) (Anexo VI – Tab. 1).
4.1.2.5. Consumo de aves nos três locais amostrados
A Ordem Columbiformes é a mais consumida na H. da Coutada dos Frades
(61,54%), seguida dos passeriformes (30,77%). Já no Castelo de Noudar, foi a Ordem
Passeriformes (50%) a mais consumida. No Perímetro Florestal da Contenda, o
consumo de columbiformes e de passeriformes foi similar (33,33%) (Fig.18) (Anexo V
– Tab. 2).
Figura 18 - Frequências de ocorrência referentes às aves consumidas no Perímetro Florestal da
Contenda, no Castelo de Noudar e na Herdade da Coutada dos Frades.
0
10
20
30
40
50
60
70
Passerif orme Collumbif orme Apodif orme Accipitrif orme Gallif orme Anserif orme Av es n.i.
Aves
Frequência de Ocorrência (%)
P. F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
35
A análise do consumo de aves entre os três locais de amostragem, mostrou
haver diferenças significativas no consumo de columbiformes entre a H. da Coutada dos
Frades e o Castelo de Noudar (X2 = 8,784, g.l. = 2, p = 0,012) (Anexo VI – Tab. 2).
4.1.2.6. Amplitude do Nicho Trófico
A amplitude no Nicho Trófico tem o valor mais reduzido no P. F. da Contenda
(Tab. 6), revelando um regime alimentar mais especialista dos gatos domésticos, em
comparação com os outros dois locais; no Castelo de Noudar, a amplitude do Nicho
Trófico foi a mais elevada, apresentando estes gatos um regime alimentar mais
generalista.
Tabela 6 –Valores de Amplitude do Nicho Trófico para o Perímetro Florestal da Contenda,
Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos Frades
Perímetro Florestal Castelo de Noudar Herdade da
da Contenda Coutada dos Frades
BA 0,459 0,544 0,534
4.1.2.7. Sobreposição do Nicho Trófico
A sobreposição do Nicho Trófico entre os três locais amostrados, revelou que
entre o P. F. da Contenda e a H. da Coutada dos Frades houve um maior consumo de
diferentes classes-presa, enquanto que a sobreposição do Nicho Alimentar entre o
Castelo de Noudar e a H. da Coutada dos Frades é elevada, revelando um elevado
consumo das mesmas classes-presas (Tab. 7).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
36
Tabela 7 – Valores de Sobreposição do Nicho Trófico para o Perímetro Florestal da Contenda,
Castelo de Noudar e Herdade da Coutada dos Frades
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades P.F. da Contenda
Índice de Pianka 0,78 0,97 0,71
4.2 Comparação do regime trófico do gato doméstico em diferentes
regiões
4.2.1. Comparação do regime alimentar em ilhas, zonas urbanas e zonas rurais
O gato doméstico baseia a sua alimentação numa grande diversidade de presas,
que podem variar, consoante os diferentes tipos de habitat onde ocorre.
A comparação efectuada entre 5 estudos, mostra que na ilha de Port-Cros
(França), englobada no Parque Nacional de Port-Cros, a classe-presa mais consumida
foram os roedores (84,07%). Numa zona urbana de São Paulo (Brasil), os gatos
mostraram ser grandes consumidores de material vegetal (44,44%) e artrópodes
(44,03%), enquanto que numa zona urbana de Madrid (Espanha), o maior consumo
recaiu sobre os restos de alimentação humana (45,24%) e material vegetal (35,71%). No
Sítio Moura-Barrancos (Portugal) e nas montanhas Jura (Suiça) (zonas rurais), o recurso
trófico mais consumido foram os restos de alimentação humana (27,70% e 75%,
respectivamente), sendo os roedores e o material vegetal o segundo recurso alimentar
mais consumido (26,85% e 13,24%, respectivamente). (Fig. 19) (Anexo VII).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
37
Figura 19 – Frequências de ocorrência referentes às 8 classes-presa consumidas na Ilha de
Port-Cros (França), em São Paulo (Brasil), em Madrid (Espanha), no Sítio Moura-Barrancos
(Portugal) e nas montanhas Jura (Suiça), durante a época seca. M.V.-Material vegetal; R.A.H.-
Restos de alimentação humana.
Como esperado, observaram-se diferenças significativas no consumo das
diversas classes-presas entre locais, fruto da elevada heterogeneidade de habitats
encontrados nos vários estudos (Tab. 8).
Tabela 8 – Valores de Qui-quadrado obtidos para cada classe-presa constituinte do regime
trófico do gato doméstico, quando se comparam os dados do presente estudo com os dados
verificados noutras regiões.
Ilha Port-Cros São Paulo Madrid Montanhas Jura
Classes-presa X2 p X2 p X2 p X2 p Lagomorpha 9,727 0,002 0,558 0,455 6,497 0,010 1,020 0,312 Rodentia 238,059 0,000 70,883 0,000 10,024 0,001 10,420 0,001 Insectívora 1,878 0,170 1,548 0,213 0,268 0,604 0,434 0,510 Aves 1,346 0,246 5,518 0,018 0,349 0,554 1,726 0,188 Reptilia 0,809 0,368 1,659 0,197 0,630 0,427 1,020 0,312 Arthropoda 45,780 0,000 44,526 0,000 8,099 0,004 16,779 0,000 M.V. 46,530 0,000 78,286 0,000 12,992 0,000 0,063 0,801 R.A.H. 98,504 0,000 45,809 0,000 5,751 0,016 59,594 0,000
Diferenças significativas (p<0,05)
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
Lagomorpha Rodentia Insectiv ora Av es Reptilia Arthropoda M.V. R.A.H.
Classes-presa
Frequência de Ocorrência (%)
Ilha Port-Cros São Paulo Madrid Sítio Moura-Barrancos Montanhas Jura
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
38
Num outro estudo realizado na época seca, em Revinge, uma zona rural da
Suécia (Liberg 1984), não foi especificado o número de indivíduos consumidos por
classe-presa, tendo sido os dados analisados apenas em termos de percentagem de
biomassa (P.B.) (Anexo V). A comparação entre o Sítio Moura-Barrancos (Portugal) e o
estudo efectuado em Revinge apenas foi verificada graficamente (Fig. 20), visto não ter
sido possível testar as diferenças significativas no consumo das diversas classes-presa
entre os dois estudos.
Nos dois estudos, foram os restos de alimentação humana que mais
contribuíram para o total da biomassa consumida (Sítio Moura-Barrancos: 74,58%;
Revinge: 61,67%). No Sítio Moura-Barrancos, as aves (11,02%) e os roedores (9,61%)
surgem como a segunda maior fonte de biomasssa para os gatos domésticos, enquanto
que em Revinge foi o consumo de lagomorfos (28%).
Figura 20 – Percentagem de Biomassa referente às 8 classes-presa consumidas no Sítio Moura-
Barrancos (Portugal) e em Revinge (Suécia), durante a época seca. M.V.-Material vegetal;
R.A.H.-Restos de alimentação humana.
4.2.2. Amplitude do Nicho Trófico
No Sítio Moura-Barrancos (Portugal), a amplitude do nicho trófico mostrou ser
a mais elevada de entre os 5 estudos, revelando o carácter mais generalista dos gatos
domésticos deste local. No bosque situado em Madrid (Espanha), a amplitude do nicho
trófico foi próxima da obtida no Sítio Moura-Barrancos, enquanto que os gatos
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Lagomorpha Rodentia Insectiv ora Av es Reptilia Arthropoda MV RAH
Classes-presa
Percentagem de Biomassa (%)
Sítio Moura-Barrancos Revinge
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
39
encontrados no Campus da Universidade de São Paulo (Brasil), apresentaram um
regime trófico mais especialista. Nas montanhas Jura (Suiça), a amplitude do nicho
trófico foi menor que nas duas zonas urbanas, mostrando o carácter mais especialista
dos gatos desta área rural. A amplitude de nicho mais reduzida foi verificada na ilha de
Port-Cros (França), visto os gatos deste local se terem especializado no consumo de
roedores (Tab. 9)
Tabela 9 – Valores de amplitude do nicho trófico (índice de Levins padronizado), calculado
com base em 8 classes-presa (Lagomorpha, Rodentia, Insectivora, Aves, Reptilia, Arthropoda,
Material Vegetal e Restos de Alimentação Humana) para zonas rurais, zonas urbanas e ilhas.
Local Ambiente Amplitude do Nicho Trófico
Port-Cros (França) Insular 0,100 Madrid (Espanha) Urbano 0,384 S. Paulo (Brasil) Urbano 0,254 Sítio Moura-Barrancos (Portugal) Rural 0,518 Montanhas Jura (Suíça) Rural 0,233
4.3. Competição alimentar com Felis silvestris
4.3.1. Regime trófico de Felis silvestris e Felis catus
Os padrões de alimentação do gato doméstico e do gato bravo reflectem-se no
diagrama de ordenação da PCA (Fig. 21). O primeiro eixo explica 67.3% da variância
total (Tab. 10), sendo o que mais contribui para a discriminação entre os regimes
tróficos das duas espécies, estando os estudos referentes ao regime trófico de gato
doméstico localizados do lado direito do eixo vertical, em oposição aos estudos
relativos ao regime trófico de gato-bravo, situados do lado esquerdo do eixo vertical. A
distribuição gráfica dos vários estudos está associada ao diferente consumo de presas
primárias por parte de cada espécie. Assim, os estudos referentes à dieta do gato
doméstico estão associados aos restos de alimentação humana e material vegetal,
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
40
-1.0 1.5
-1.0
1.0
Ro
In
La
Aves
Re
Ar
MV
RAH
1
2
3
4
5
6
enquanto os que se referem à dieta do gato-bravo encontram-se associados ao consumo
de presas silvestres (roedores, artrópodes, insectívoros, aves, répteis e lagomorfos). O
segundo eixo, explica 25.2% da variância total (Tab. 10), sendo o consumo de
lagomorfos, artrópodes e roedores que determina a discriminação entre os vários
estudos.
Tabela 10 - Resultados da análise PCA por comparação dos regimes tróficos de Felis silvestris
e Felis catus. Valores próprios (eigenvalues) e percentagem de variância cumulativa das
classes-presa explicada por cada eixo
Eixo 1 Eixo 2 Eixo 3 Eixo 4 Valores próprios (eigenvalues) 0.673 0.252 0.048 0.026
% Variância cumulativa das classes 67.3 92.4 97.2 99.8
Figura 21 – Representação gráfica da PCA, realizada com base no regime trófico de Felis
silvestris e Felis catus. Círculos: estudos (3, 5 e 6-dieta Felis catus; 1, 2, e 4-dieta Felis
silvestris); Ro-Roedores, In-Insectívoros, La-Lagomorfos, Aves, Re-Répteis, Ar-Artrópodes,
MV-Material vegetal, RAH-Restos de alimentação humana
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
41
4.3.2.Consumo de pequenos mamíferos por Felis silvestris e Felis catus
A relação gráfica entre os vários estudos em análise e o consumo de roedores,
por F. silvestris e F. catus está ilustrada na figura 22. O diagrama mostra que as
diferenças observadas estão directamente relacionadas com o consumo diferencial
destes mamíferos por parte de cada espécie. O primeiro eixo explica 76.7% da variância
total (Tab. 11), sendo o que mais contribui para as diferenças observadas. Verifica-se
uma nítida distinção entre estudos, estando os referentes ao regime trófico de gato
doméstico localizados do lado esquerdo do eixo vertical, em oposição aos estudos
relativos à dieta do gato-bravo, situados do lado direito do eixo vertical. O regime
trófico do gato doméstico traduz a associação do gato doméstico ao homem e suas
infraestruturas, representada pelo consumo de Mus sp., em oposição ao consumo de
presas mais associadas a habitats naturais ou semi-naturais (por. ex. Microtus e Elyomis
quercinus). O segundo eixo, que explica 22.9% da variância total (Tab. 11), mostra um
gradiente de naturalização com as espécies mais associadas às actividades humanas
(ratinho-caseiro, rato-dos-pomares, e rato-cego) a contrastar com espécies consideradas
mais silvestres.
Tabela 11 - Resultados da análise PCA por comparação do consumo de pequenos mamíferos
por Felis silvestris e Felis catus. Valores próprios (eigenvalues) e percentagem de variância
cumulativa das classes-presa explicada por cada eixo
Eixo 1 Eixo 2 Eixo 3 Eixo 4 Valores próprios (eigenvalues) 0.767 0.229 0.003 0.000
% Variância cumulativa das classes 76.7 99.7 100.0 0.0
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
42
-1.5 1.0
-1.0
1.0 Apo
Arv
Mus
Rat
Mic
Cro
Tal
Ely2
4
5
6
Figura 22 – Representação gráfica da PCA, realizada com base no consumo de pequenos
mamíferos por Felis silvestris e Felis catus. Círculos: estudos (5 e 6-dieta Felis catus; 2 e 4-
dieta Felis silvestris); Rat-Rattus sp., Mic-Microtus sp., Arv-Arvicola sp., Apo-Apodemus
sylvaticus; Mus sp., Tal-Talpa occidentalis, Cro-Crocidura russula, Ely-Elyomis quercinus.
DISCUSSÃO
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
44
5.Discussão 5.1 Regime Trófico do gato doméstico no Sítio Moura-Barrancos
5.1.1 Análise global do regime trófico do gato doméstico
Os gatos domésticos do Sítio Moura Barrancos mostraram ser predadores
oportunistas, apresentando um regime generalista, com o consumo de um elevado
número de presas silvestres apesar da elevada importância dos restos da alimentação
humana e das espécies de presas associadas ao homem, como Mus sp.
A presença de restos de alimentação humana na dieta dos gatos domésticos, tal
como observado no Sítio Moura-Barrancos, foi anteriormente verificada, sendo este um
recurso básico importante na alimentação do gato doméstico em outras áreas rurais
(Liberg 1984, Weber & Dailly 1998). No regime trófico de gatos assilvestrados que
habitam zonas rurais, verificou-se serem os roedores (Biró et al. 2005), e os lagomorfos
(Liberg 1984), as presas mais consumidas, apesar dos restos de alimentação humana
estarem igualmente presentes na dieta. O menor grau de dependência destes gatos em
relação ao homem, leva a crer que estes utilizam os desperdícios humanos apenas como
recurso trófico complementar (Biró et al. 2005), enquanto que os gatos rurais semi-
domesticados, tiram mais partido dos restos de alimentação humana que lhes são
regularmente fornecidos (Weber & Dailly 1998, obs. pess. 2007). Este recurso trófico
facilmente disponível, proporciona uma elevada quantidade de energia (Liberg 1984),
permitindo que as populações de gatos rurais se mantenham e exerçam uma pressão de
predação continuada sobre as presas complementares.
Tal como verificado por diversos autores (Weber & Dailly 1998, Biró et al.
2005), os roedores foram a segunda classe presa mais consumida, possivelmente devido
à aptidão desenvolvida para caçar indivíduos deste grupo (Turner & Meister 1988), que
possui vários géneros adaptados a diferentes habitats, e com uma acelerada capacidade
de reprodução, aumentando rapidamente a respectiva disponibilidade no meio ambiente
(Palomo & Gisbert 2002).
Os artrópodes representaram um recurso básico na dieta, possível consequência
da elevada disponibilidade deste recurso na área de estudo (Ferreira 1997). Por outro
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
45
lado, o facto de 2 dos 9 gatos domésticos serem ainda sub-adultos, pode ter tido
influência na elevada presença deste item no regime alimentar global, visto que os
jovens tendem a comer mais invertebrados (insectos e aranhas) que os adultos
(Fitzgerald 1988).
Tal como verificado em estudos anteriores (Liberg 1984, Weber & Dailly
1998), as aves correspondem a um recurso constante na dieta de gatos rurais, sendo os
passeriformes as presas mais consumidas, incluindo espécies coloniais, que são presas
fáceis para os predadores (Ferreira 1997) desenvolvendo alguns gatos métodos de caça
especializados na captura de pássaros (Turner & Meister 1988).
5.1.2 Variação espacial do regime trófico do gato doméstico
5.1.2.1. Análise do consumo das diferentes classes-presa
A presença do homem teve uma influência directa na dieta dos gatos do
Castelo de Noudar e da H. da Coutada dos Frades, uma vez que os restos de alimentação
humana foram o recurso mais consumido nestes dois locais. No P. F. da Contenda, não
se verificou uma relação directa entre os restos da alimentação humana e o regime
trófico dos gatos rurais, tendo este sido constituído maioritariamente por insectos das
ordens Coleoptera e Orthroptera. O elevado consumo de indivíduos da família
Tenebrionidae (Coleóptera) pode ser uma consequência directa de muitos dos géneros
pertencentes a esta família serem pragas secundárias de armazéns (Grist & Lever 1969,
Jones & Jones 1974), tal como pode ter sucedido no palheiro de grandes dimensões
existente no Perímetro Florestal da Contenda.
Sendo uma Zona de Caça Nacional, o P. F. da Contenda apresenta uma
abundância considerável de artiodáctilos, representados pelo veado e javali (Ferreira
1997) e consequentemente de escarabídeos, coleópteros associados a excrementos de
herbívoros, dos quais depende o seu ciclo de vida (Jones & Jones 1974), e que
revelaram ser a segunda presa mais consumida pelos gatos. Já o consumo elevado de
membros da família Acrididae, pertencente à ordem Orthroptera, pode estar
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
46
directamente relacionado com a grande abundância de indíviduos desta família na época
seca (Ferreira 1997).
Um factor a ter em conta é o número de gatos existentes nos três locais. O
maior número de gatos existentes no P. F. da Contenda, pode ter tido influência na
quantidade e diversidade de alimento consumida por cada indivíduo. As relações de
dominância-subordinação estabelecidas entre os quatro gatos (obs. pess. 2007), pode ter
sido prejudicial para os gatos subordinados, visto que estes se alimentam em último
lugar (Crowell-Davis 2004); podendo não conseguir satisfazer as suas necessidades
diárias nutricionais com o alimento fornecido pelo homem, tendo, por isso, necessidade
de consumir um maior número de presas silvestres, sendo a predação direccionada para
as presas mais abundantes no ambiente (os insectos), de modo a que o gasto de energia
por captura seja reduzido.
5.1.2.2. Consumo de mamíferos
Através dos resultados obtidos é possível constatar que existe uma relação
directa entre o consumo de roedores e a presença de estruturas associadas ao Homem,
visto o género Mus ter sido o mais consumido. A ocorrência de palheiros nos três locais,
favorece a existência de ratinhos-caseiros, indivíduos que dependem do homem e das
actividades por ele desenvolvidas (Mathias et al. 1998, Palomo & Gisbert 2002). No P.
F. da Contenda, contudo, Apodemus sylvaticus foi consumido a níveis muito
semelhantes ao do género Mus, devendo este facto estar relacionado com o maior
número de machos existentes nesta herdade, em relação às outras herdades (ver Tab. 1).
De facto, os machos de gato doméstico nas deslocações pelo seu território afastam-se
dos locais de presença humana (Edwards et al. 2001) e aí predam sobre os roedores
mais abundantes e de melhor relação disponibilidade versus biomassa. O género Rattus
não aparece com frequência no regime alimentar de gatos domésticos, visto ser difícil
de capturar, devido às grandes dimensões e à agressividade demonstrada (Fitzgerald
1988). A espécie Arvicola sapidus foi uma presa complementar no Castelo de Noudar,
confirmando o carácter oportunista do gato doméstico que tira partido da ocorrência da
espécie em áreas de habitat favorável como o Rio Ardila (Palomo & Gisbert 2002).
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
47
Também o consumo complementar do género Microtus nesta herdade, foi muito inferior
ao verificado em estudos anteriores (Biró et. al 2005, Liberg 1984), mas corresponde à
ausência de habitats favoráveis a espécies deste género. O consumo de roedores como
presa principal foi igualmente verificado em outros estudos efectuados em zonas rurais
(Liberg 1984, Weber & Dailly 1998, Biró et al. 2005), e corresponde a uma
especialização do comportamento de caça, de esperar imóvel antes de saltar sobre a
presa, direccionada para a captura de roedores (Turner & Meister 1988).
O consumo complementar de lagomorfos no P. F. da Contenda e na H. Coutada
dos Frades, pode estar associado à existência de um cercado para coelhos no P. F. da
Contenda (obs. pess.). Contudo, os gatos rurais só ocasionalmente consomem coelhos
em grandes quantidades, podendo ter um impacto negativo nesta espécie de presa
(Liberg 1984, Fitzgerald 1988).
Os insectívoros apenas foram consumidos ocasionalmente, como verificado
por Molsher (1999), o que pode ser consequência do sabor desagradável e do reduzido
valor energético (Fitzgerald 1988).
Os resultados obtidos neste estudo não se encontram em concordância com
outros previamente publicados na Suécia (Liberg 1984) e na Austrália (Molsher 1999),
onde a classe-presa mais consumida por gatos rurais na época seca foram os coelhos,
nem na Hungria (Biró et al. 2005), onde o roedor Microtus arvalis foi a espécie mais
consumida por gatos assilvestrados ao longo de um ano.
Confirma-se assim que o gato doméstico rural é um predador oportunista, que
consegue alterar o consumo de diferentes espécies de mamíferos, consoante a
disponibilidade destas no meio.
5.1.2.3. Consumo de aves
Também relativamente às aves, é possível verificar uma relação entre as
estruturas associadas ao Homem e o consumo destas nos três locais de estudo.
O elevado consumo de columbiformes na Coutada dos Frades está
directamente relacionado com a grande abundância de pombos presente no pombal da
herdade (obs. pess. 2007), representando uma fácil fonte de alimento, sobretudo as crias
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
48
inexperientes. Já o maior consumo de passeriformes no Castelo de Noudar está
associado à elevada percentagem de biótopos favoráveis à sua ocorrência. De facto em
torno deste local existe uma grande área de bosque mediterrânico muito bem
conservado, habitat de excelência para muitas espécies de passeriformes insectívoros.
Também os biótopos florestais existentes no Parque de Natureza de Noudar,
proporcionam abrigo e alimento a um grande número de espécies, tal como as zonas de
montado de azinho associadas ou não a matos, que correspondem a 2/3 do parque e
albergam numerosas espécies de passeriformes (Gordinho 2006). No P. F. da Contenda,
o consumo de columbiformes e passeriformes foi similar revelando um consumo de
aves maiores associadas ao Homem (obs. pess. 2007), que disponibilizam maior
quantidade de energia, e de pequenas aves silvestres coloniais, que dormem em
dormitórios (Ferreira 1997), tornando-se presas fáceis de capturar pelos gatos.
Estes resultados suportam estudos previamente publicados (Liberg 1984, Biró
et al. 2005), confirmando que os passeriformes são as aves mais consumidas por gatos
rurais, apesar do seu consumo ser ocasional, e ocorrer oportunisticamente quando os
gatos estão à caça de coelhos ou roedores (Liberg 1984). Nos dois estudos acima
mencionados (Liberg 1984, Biró et al. 2005), foi verificado um reduzido consumo de
columbiformes por parte dos gatos rurais, sendo contudo frequente o consumo de aves
de capoeira de maiores dimensões e de aves associadas à actividade cinegética, o que
indica uma forte dependência dos gatos rurais em relação ao homem e às suas
actividades e estruturas associadas.
5.1.2.4. Amplitude do Nicho trófico
O consumo dos vários recursos alimentares nos três locais estudados foi
heterogéneo, registando-se variações espaciais em relação às classes-presa consumidas e
à frequência com que estas ocorreram no regime alimentar do gato doméstico.
No P. F. da Contenda, os restos de alimentação humana, fornecidos aos gatos,
eram recursos de reduzido valor energético (cascas de frutos e ossos - obs. pess. 2007),
o que induzia os gatos a predarem mais sobre presas silvestres. A escassez de presas
maiores, que disponibilizariam uma maior quantidade de biomassa, forçou os gatos a
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
49
consumirem presas menos energéticas, mas abundantes no meio (artrópodes), que ao
ocorrerem no regime trófico dos gatos com uma frequência muito superior à das outras
classes-presa contribuiram para o menor valor de amplitude de nicho trófico nos três
locais estudados.
No Castelo de Noudar e na H. da Coutada dos Frades, os restos do almoço dos
trabalhadores eram fornecidos aos gatos (obs. pess. 2007). Este recurso disponibilizava
uma elevada quantidade de biomassa, diminuindo a necessidade de predação sobre
presas silvestres, ao invés do observado no P.F. da Contenda. Contudo, na área
envolvente ao Castelo de Noudar, os diferentes habitats naturais potenciam uma elevada
diversidade de presas, o que influenciou a maior amplitude do nicho trófico dos gatos aí
existentes, em contraste com os outros dois locais de estudo. Inversamente, a
homogeneidade do habitat na H. da Coutada dos Frades disponibiliza uma menor
diversidade de presas silvestres, ainda que mais energéticas (coelho), sendo necessário
ao gato caçar menos presas para adquirir a energia necessária à sua actividade. A maior
parte dos recursos tróficos consumidos encontram-se associados ao homem, sendo
recursos igualmente acessíveis, e por isso consumidos de modo relativamente uniforme.
A variedade de biótopos no sítio Moura-Barrancos, tende a fornecer uma
grande diversidade de recursos, sendo estes consumidos de acordo com a sua
disponibilidade pelos gatos domésticos. Por outro lado, é de importância relevante, a
quantidade e qualidade dos restos de alimentação humana disponibilizados, já que
traduzem valores energéticos diferenciados.
5.1.2.5. Sobreposição do Nicho Trófico
Apesar das diferenças observadas entre os três locais de estudo, foi possível
constatar que alimentação dos gatos no Sítio Moura Barrancos é bastante uniforme,
registando-se uma exploração dos mesmos recursos tróficos.
O facto de as três herdades se localizarem numa zona de habitat mediterrânico,
que tende a albergar espécies faunísticas características, leva a que fosse esperado que
as classes-presa disponíveis fossem as mesmas nos três locais, reflectindo-se este facto
no respectivo consumo. Outro importante factor a ter em conta, são os recursos tróficos
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
50
disponibilizados directa (restos de alimentação humana) ou indirectamente (alguns
roedores e aves) pelo Homem, que mostraram ter uma contribuição muito importante no
regime alimentar dos gatos do Castelo de Noudar e da H. da Coutada dos Frades, facto
que contribuiu para a elevada sobreposição do regime trófico nestes dois locais.
5.2. Comparação do regime trófico do gato doméstico em diferentes
regiões
5.2.1.Comparação do regime alimentar em ilhas, zonas urbanas e zonas rurais
Apesar dos vários estudos que analisam a dieta do gato doméstico em
diferentes meios (Liberg 1984, Baker et. al 2005, Bonnaud et al. 2007), são escassos os
trabalhos que abordem esta temática na Península Ibérica, e em particular em áreas
rurais.
Nas ilhas, o regime trófico dos gatos domésticos é baseado essencialmente no
consumo de mamíferos introduzidos (Fitzgerald 1991, Matias & Catry 2007) e aves
(van Rensburg 1985, Kirkpatrick & Rauzon 1986). A ilha de Port-Cros (França) não foi
excepção, tendo o consumo de roedores (Rattus rattus e Apodemus sylvaticus) sido
superior a 80% do total de recursos consumidos. Geralmente quando roedores e coelhos
estão presentes na mesma ilha, os coelhos são a presa dominante na dieta dos gatos
(Pontier et al. 2002, Medina et al. 2006). Neste caso, a elevada área de floresta não
favoreceu a ocorrência de coelhos, mas sim de roedores (Bonnaud et al. 2007). O
consumo insignificante de restos de alimentação humana na ilha de Port-Cros, confirma
que a sobrevivência dos gatos assilvestrados existentes nesta ilha não depende deste
recurso trófico artificial, ainda que consumido ocasionalmente provindo do lixo e de
restos de comida deixados pelos turistas.
A introdução do gato doméstico em ilhas, promoveu o fenómeno da
hiperpredação (Bonnaud et al. 2007), ou seja, a inexistência de outros predadores nestes
locais promoveu a ascensão do gato doméstico a predador de topo. Deste modo, as
populações deste predador vão-se mantendo, subsidiadas pelo consumo de mamíferos
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
51
introduzidos em elevadas quantidades nas ilhas, e vão exercendo uma grande pressão de
predação sobre as espécies de aves e de mamíferos indígenas, que não tiveram tempo de
desenvolver estratégias de anti-predação contra este novo predador (Hoare 2006). Nas
ilhas onde o gato doméstico está presente, a diversidade e abundância de espécies é
reduzida, levando este carnívoro a especializar-se no consumo de determinada espécie.
A elevada predação exercida sobre uma espécie em particular, promove efeitos
negativos na densidade populacional da mesma, tendo como resultado a extinção de
algumas espécies (Vázquez-Domínguez 2004).
Já nas zonas urbanas, o grau de dependência do gato doméstico em relação ao
homem e seus produtos varia. Woods (2003), verificou que a comida fornecida pelos
donos é um importante meio de subsistência para os gatos, e que esta pode ser
comparada com o elevado número de espécies de mamíferos introduzidos em ilhas, cujo
consumo permite que ocorra hiperpredação sobre os recursos tróficos naturais. Contudo,
na maioria dos trabalhos realizados em zonas urbanas (Woods et. al 2003, Kays &
DeWan 2004, Baker et. al 2005), o consumo de restos de alimentação humana não é
tido em consideração, por a análise do regime trófico ser feita com base em
questionários efectuados aos donos sobre o número de presas levadas para casa pelos
gatos, não podendo ser comparado o grau de consumo daquele item em relação à
predação sobre presas silvestres.
Os dois estudos realizados em zonas urbanas situadas próximo de áreas verdes
(Marques 2003, Campus 2004), focam a dieta de gatos domésticos assilvestrados, que
possuem um regime alimentar baseado nos restos de alimentação humana, material
vegetal e artrópodes. Estes resultados não verificam os resultados obtidos em estudos
anteriores (Woods et. al 2003, Kays & DeWan 2004, Baker et. al 2005), onde os
micromamíferos são as presas chave da alimentação dos felinos nestes locais. Nas áreas
urbanas, os grupos de gatos assilvestradas são maiores, sendo a áreas vitais individuais
menores que nas zonas rurais (Kays & DeWan 2004), o que diminui as taxas de
encontro com presas silvestres. A competição dentro de um grupo diminui o sucesso na
captura de presas, mas aumenta os níveis de predação (Campus 2004), que normalmente
é direccionada para as espécies mais abundantes no meio, que também estão bem
adaptadas às zonas urbanas e à pressão de predação dos gatos, não resultando em efeitos
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
52
negativos na densidade populacional daquelas (Woods et al. 2003, Gillies & Clout
2003). Contudo, a predação pode incidir sobre espécies de aves ameaçadas (Lepczyk et
al. 2003), maioritariamente passeriformes, presas fáceis por se aglomerarem nos
bebedouros. De acordo com Lepczyk (et al. 2003), o gato doméstico é visto como um
mesopredador, que aumentou muito a densidade populacional das suas populações nas
zonas urbanizadas, graças à ausência de predadores de topo nestes locais, podendo
causar danos locais nas espécies com hábitos mais conspícuos e mais abundantes no
meio (Baker et al. 2005, Woods et al. 2003).
A elevada densidade populacional humana nas zonas urbanas, produz grandes
quantidades de lixo, que revelaram ser uma importante fonte trófica para os gatos
urbanos. A crescente aceitação dos gatos domésticos como animais de estimação,
aumentou muito a densidade de gatos nestas zonas, o que se traduz num impacto
predatório superior ao verificado nas zonas rurais (Lepczyk et al. 2003).
O regime trófico dos gatos domesticados e assilvestrados, demonstra o carácter
oportunista da espécie em meio urbano, visto a sua alimentação ser baseada num
recurso muito disponível em zonas urbanizadas, os restos de alimentação humana, o que
apoia o facto dos gatos urbanos não dependerem de presas silvestre para sobreviverem.
Tal como verificado em estudos anteriores (Liberg 1984, Weber & Dailly
1998), os resultados obtidos no presente estudo confirmam que os restos de alimentação
humana são a fonte alimentar primária (Weber & Dailly 1998) e energeticamente mais
importante (Liberg 1984) para os gatos rurais. No presente estudo, os gatos rurais eram
alimentados diariamente com os restos do almoço dos trabalhadores das herdades (obs.
pessoal), sendo este um recurso trófico abundante e acessível, facto que evidencia o
carácter oportunista deste felino.
Nas zonas rurais, a presença de predadores naturais anteriores à introdução do
gato doméstico, não permitiu a expansão do felino como predador de topo. Molsher
(1999) verificou existir competição inter-específica entre o gato doméstico e a raposa,
em termos de dieta, áreas vitais e uso do habitat, sendo a raposa beneficiada nesta
relação. A existência de predadores de maiores dimensões influencia o uso do habitat
por predadores mais pequenos (Alterio et. al 1998), como os gatos domésticos, tendo
um impacto directo no tipo de presas consumidas por estes. Deste modo, os gatos rurais
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
53
do Sítio Moura-Barrancos especializaram-se na captura e consumo de roedores e aves
associadas às estruturas humanas, diminuindo assim a competição com predadores
maiores. Na área de estudo, os celeiros e os pombais são frequentes, sendo abundantes
as espécies de roedores e aves associadas a estes locais. Estes dois grupos mostraram ser
importantes recursos tróficos na dieta dos gatos rurais, devido à proximidade dos
celeiros e pombais às casas das herdades, importantes refúgios para os gatos (obs.pess.),
o que acabou por traduzir um esforço de captura menor que o revelado na captura de
presas silvestres, que habitam zonas pouco humanizadas e distantes das zonas de
refúgio dos gatos rurais.
Deste modo, é possível confirmar os gatos rurais como predadores oportunistas
ainda que com hábitos alimentares mais generalistas que os documentados para áreas
urbanas, facto apoiado pelo consumo semelhante dos diferentes recursos tróficos
disponíveis no meio. O grau de predação verificado em zonas rurais, não tem os
impactos notórios observados em ilhas (extinções globais) e zonas urbanas (extinções
locais), visto a captura de presas silvestres ser menor que nestes locais, e não ser
direccionada para espécies com estatuto de ameaça.
A variável que mais contribui para as diferenças verificadas no regime
alimentar do gato doméstico, nos diversos ambientes, é a diversidade de presas
disponíveis, associada aos diferentes habitats.
A reduzida diversidade de espécies-presa existente nas ilhas habitadas por
gatos domésticos (Konecny 1987), promove um regime trófico baseado num reduzido
número de classes-presas, o que tende a diminuir a amplitude do nicho trófico do
predador, e traduz um regime especialista. Tal como verificado em estudos anteriores
(Furet 1989, Pontier et al. 2002, Matias & Catry 2007), a alimentação dos gatos da ilha
de Port-Cros é essencialmente baseada no consumo de roedores introduzidos, o que terá
contribuído para um valor de amplitude do nicho trófico tão reduzido.
Nas zonas urbanas e rurais, a disponibilidade de presas está directamente
relacionada com os habitats existentes. Nos parques naturais e nas florestas, a
diversidade de espécies é elevada, pondo à disposição dos gatos um conjunto razoável
de classes-presa, o que provoca um aumento na amplitude do nicho deste predador, tal
como verificado no estudo realizado em Madrid (Marques 2003). Em oposição, no
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
54
estudo realizado no Brasil (Campus 2004), o reduzido valor de nicho trófico, indica um
consumo mais especializado de artrópodes e material vegetal, possível consequência da
reduzida diversidade de espécies silvestres existentes no local.
A ocorrência de uma fauna bastante diversificada nos meios rurais, promove
um comportamento predatório com incidência numa elevada diversidade de classes-
presa, que são consumidas de forma uniforme, o que tende a aumentar a amplitude do
nicho trófico do predador, e a traduzir um regime alimentar mais generalista. Esta
situação foi verificada no Sítio Moura-Barrancos, onde os gatos basearam a dieta em 8
classes-presa diferentes, o que contribuiu para o maior valor de nicho trófico. Em
contraste, no estudo realizado numa zona rural da Suiça (Weber & Dailly 1998), o valor
de nicho trófico foi o segundo menor de entre todos os estudos analisados, visto o
regime trófico dos gatos integrar apenas 4 classes-presa, sendo verificada uma
especialização no consumo de restos de alimentação humana.
5.3. Competição alimentar com Felis silvestris
Até à data, foram escassos os estudos realizados com o propósito de comparar
o regime trófico do gato doméstico e do gato-bravo.
Corbett (1979), verificou serem os lagomorfos as presas mais importantes na dieta das
duas espécies na Escócia. Biró (et al. 2005), constatou serem os roedores as presas mais
consumidas pelas duas espécies na Hungria. Nestes dois estudos, foi então verificada
uma grande sobreposição dos nichos alimentares de gatos domésticos assilvestrados e
do gato-bravo, o que terá promovido uma forte competição alimentar inter-específica.
Diversos estudos definem o gato doméstico como sendo um predador
generalista e oportunista, que se alimenta dos recursos tróficos disponíveis no meio em
maior quantidade (Fitzgerald 1988, Clevenger, 1995, Konecy 1987). Em relação ao
regime trófico do gato-bravo, as opiniões divergem, sendo considerado por alguns
autores (Moleon & Gil Sánchez 2003, Malo et al. 2004, Lozano et al. 2006) um
especialista facultativo de lagomorfos, visto estes serem as presas mais consumidas
quando disponíveis no meio, alterando a sua fonte alimentar primária para os roedores,
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
55
quando os lagomorfos estão ausentes ou são escassos. Outros autores (Fernandes 1991,
Pereira et al. 2001), contudo, referem o gato-bravo como sendo uma espécie de hábitos
alimentares mais generalistas, que baseia a sua alimentação no consumo mais uniforme
de lagomorfos, micromamíferos, aves, répteis e insectos.
5.3.1. Regime trófico de Felis silvestris e Felis catus
No regime trófico do gato doméstico rural, os restos de alimentação humana
mostram ter uma elevada importância, em termos de ocorrência e energéticos, visto
serem um recurso trófico facilmente acessível. Tal como verificado no Sítio Moura-
Barrancos, o consumo de roedores como presa secundária no regime trófico de gatos
rurais foi observado por Weber & Dailly (1998) e Marques (2003). Em oposição, o
regime alimentar do gato-bravo, baseia-se em espécies silvestres, notando-se uma
preferência especial por roedores e lagomorfos, associada à maior disponibilidade
destes nos diferentes habitats.
Deste modo, os roedores e lagomorfos, são as presas silvestres mais
expressivas no regime alimentar das duas espécies, estando o seu consumo relacionado
com as áreas geográficas onde os estudos foram realizados, verificando-se uma nítida
distinção entre o maior consumo de lagomorfos a Norte na Escócia, e o maior consumo
de roedores em Portugal. Estas diferenças estão directamente relacionadas com a maior
abundância de coelho a Norte da Europa (Mitchell-Jones et al. 1999), e com a elevada
disponibilidade de roedores a sul da Europa (Mitchell-Jones et al. 1999).
O gato doméstico rural apresenta um elevado grau de dependência em relação
ao Homem, verificado pelo grande consumo de restos de alimentação humana na sua
dieta. A informação recolhida nos inquéritos realizados nos 132 montes do Sítio Moura-
Barrancos confirma esta ideia, visto que somente nas herdades habitadas pelo homem,
foi verificada a existência de gatos domésticos, não tendo sido detectada a sua presença
em nenhuma casa rural abandonada (obs. pess.). Foi ainda observado, em estudos
anteriores (Palomares & Delibes 1993), que as áreas vitais dos gatos rurais tendem a ser
definidas na zona envolvente às estruturas humanas, funcionando estas estruturas
(celeiros e casas das herdades) como refúgio para alguns animais (obs. pess.) Os
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
56
resultados obtidos em estudos anteriormente publicados (Stahl & Artois 1991, Ferreira
2003), permitem concluir que o gato-bravo não tolera habitats humanizados, facto
apoiado pelo consumo exclusivo de presas silvestres na sua alimentação. Os estudos
referentes ao uso do habitat pelo gato-bravo, parecem também confirmar esta ideia,
visto que as áreas vitais desta espécie abrangem apenas zonas naturais, de floresta de
coníferas (Corbett 1979), de carvalhos (Biró et al. 2004) e de faias (Wittmer 2001).
Desta forma, é possível afirmar que no Sítio Moura-Barrancos não parece
existir uma sobreposição nos nichos tróficos do gato doméstico rural e do gato-bravo,
talvez fruto da reduzida densidade humana da região.
5.3.2.Análise do consumo de micromamíferos
Em diversos estudos previamente publicados na Europa (Aymerich 1982, Riols
1988, Sarmento 1996, Carvalho & Gomes 2004), verificou-se serem os micromamíferos
a classe-presa mais consumida pelo gato-bravo. Tal como verificado por Weber &
Dailly (1998) e Marques (2003), no presente estudo as presas silvestres mais
consumidas pelos gatos domésticos na época seca foram os micromamíferos.
No Sítio Moura-Barrancos e no estudo realizado em Madrid (Marques 2003), o
grupo de micromamíferos mais consumido pelos gatos rurais foi o género Mus. Este
género ocorre em zonas muito humanizadas, encontrando-se muito associado ao homem
em zonas rurais onde existem palheiros (Gilbert & Palomo 2002), como é o caso dos
três locais amostrados. Nos estudos onde os micromamíferos são a presa primária na
dieta do gato-bravo, os insectívoros são pouco consumidos, visto a sua captura não
compensar energeticamente este predador, sendo preferidas presas maiores, como o
género Apodemus e, ocasionalmente, Rattus, cujo consumo disponibiliza uma maior
quantidade de energia.
O consumo de micromamíferos por parte das duas espécies de felinos é
fortemente influenciado pela localização geográfica dos estudos, que está directamente
relacionada com o tipo de habitat e vegetação existente em cada local. No Parque
Natural de Montesinho, as zonas de lameiros (Fernandes 1991) proporcionam um
habitat semi-natural favorável à ocorrência do género Microtus (Gilbert & Palomo
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
57
2002), mais consumido pelo gato-bravo neste local. Em oposição, as espécies Apodemus
sylvaticus e Arvicola sapidus são mais frequentes na dieta do gato-bravo na Bacia do
Guadina, onde os habitats naturais fracamente intervencionados pelo homem, e a
abundância de linhas de água (Pereira et al. 2001) são mais favoráveis à sua ocorrência
(Gilbert & Palomo 2002).
No Sítio Moura-Barrancos, os resultados obtidos no estudo realizado na Bacia
do Rio Guadiana (Pereira et al. 2001), e os resultados obtidos no presente estudo,
permitem verificar que o gato doméstico e o gato-bravo consomem diferentes géneros
de micromamíferos na área de estudo, o que indicia a inexistência de competição inter-
específica no consumo deste grupo de presas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
59
6.Considerações Finais
As perturbações ambientais induzidas pelo homem poderão estar na origem de
um eminente número de extinções, que tendem a ocorrer entre 100 a 1000 vezes mais
rapidamente que as extinções até agora conhecidas (Balmford 1996). A introdução de
espécies exóticas em novos habitats é actualmente considerado um dos factores que
mais promove a homogeneização da flora e fauna global (Atkinson 1996), visto alterar a
composição das comunidades existentes num determinado local, e consequentemente,
as relações inter-específicas previamente estabelecidas.
A introdução de carnívoros em habitats naturais, revela ter efeitos negativos
nas espécies indígenas, favorecendo a competição, a predação, a hibridação e a
transmissão de doenças (Macdonald & Thom 2001). O gato doméstico encontra-se entre
as espécies de carnívoros com maior número de introduções em novos habitats, sendo
responsável, por exemplo, pela extinção do passeriforme Xenicus lyalli na Stephen
Island (Oliver 1955 in woods et al. 2003), e pela brusca redução no efectivo
populacional da iguana (Cyclura carinata) na ilha de Pine Cay (Iverson 1978). Até à
data, não são conhecidas extinções de espécies associadas à predação pelo gato
doméstico nos continentes. Contudo, a ligação desenvolvida entre o homem e o gato
doméstico têm consequências graves para a fauna local ameaçada, com relevância para
a predação sobre espécies com estatuto legal de conservação (Lepczyk et al. 2003.)
O factor mais influente na dimensão das populações de gato doméstico em
zonas urbanas é a densidade de estruturas antropogénicas (Sims et al. 2008), o que
revela o elevado grau de dependência da espécie em relação ao homem. A crescente
humanização das áreas rurais traduz-se igualmente num aumento na densidade
populacional das espécies invasoras oportunistas associadas ao homem, como é o caso
do gato doméstico. Deste modo, torna-se extremamente importante estudar o impacto
destas populações de gatos rurais/assilvestrados nos ecossistemas naturais, incluindo o
seu potencial competidor com o seu congénere silvestre – o gato-bravo. Este estudo tem
uma importância acrescida, por ser dos poucos estudos sobre o regime trófico do gato
doméstico em ambientes rurais realizado na Europa, para além de ser um estudo
pioneiro ao nível da Península Ibérica.
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
60
Os resultados obtidos neste estudo, comprovam as três hipóteses em análise,
visto que se demonstra que o gato doméstico varia a sua dieta de acordo com a
disponibilidade de recursos alimentares naturais e não naturais existentes em cada local
(Hipótese 1); que em ambientes rurais, apesar da disponibilidade e acessibilidade a
presas silvestres, o gato doméstico comporta-se como um oportunista mostrando-se
dependente dos restos alimentares fornecidos pelo homem (Hipótese 2); e que a
dependência do homem por parte do gato doméstico em ambientes rurais reduz o seu
potencial como competidor do gato-bravo pelos recursos alimentares (Hipótese 3).
Através deste estudo, ainda que com uma frequência relativamente reduzida,
foi possível verificar a ocorrência de predação por parte do gato doméstico sobre presas
silvestres. Contudo, o facto de não ter sido determinada a abundância relativa de cada
espécie de presa, de modo a permitir analisar a relação entre a disponibilidade no
ambiente e o respectivo consumo, limita as conclusões do presente trabalho. Assim, e
no actual cenário de abandono dos ambientes rurais, torna-se pertinente responder às
seguintes questões:
- Qual a relação entre o consumo de presas silvestres e a sua disponibilidade no meio?
- Quais os grupos de presas mais afectados pela predação?
- Qual o futuro dos gatos domésticos quando as estruturas humanas de que dependem
forem abandonadas pelo homem?
Por outro lado, os objectivos propostos neste estudo, encontram-se englobados
na extensa lista de prioridades definidas com vista à conservação do gato-bravo no Sítio
Moura-Barrancos (Ferreira 2003).
Os dados obtidos deverão ser encarados como uma primeira abordagem à
investigação de aspectos relativos à ecologia do gato doméstico e às suas interacções
com o gato-bravo.
Por outro, sendo a hibridação entre o gato-bravo e o gato doméstico uma das
maiores ameaças à integridade da espécie silvestre (Stahl & Artois 1991, Hubbard et al.
1992, Beaumont et al. 2001), sugere-se a investigação de todos os factores que poderão
estar associados a este fenómeno, através da avaliação dos seguintes factores:
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
61
- Determinação da distribuição das duas espécies na área de estudo
- Análise do padrão de utilização do espaço e do tempo por ambas as espécies
- Quantificação do grau de hibridação entre o gato-bravo e o gato doméstico
- Investigação de patologias associadas ao gato-bravo e ao gato doméstico
É de notar que, a informação obtida neste estudo deve ser encarada como de
valor a nível regional, e em particular para o Sítio Moura-Barrancos, uma vez que a
sobrevivência dos gatos domésticos rurais se associa à ocupação humana, que varia de
área para área.
Em estudos futuros, será pertinente utilizar um maior número de locais de
amostragem e de gatos, de modo a caracterizar de forma mais rigorosa o regime trófico
dos gatos domésticos rurais da área de estudo definida. Deverá também ser efectuada
uma análise do regime trófico que englobe pelo menos um ciclo anual, para avaliar a
resposta das presas, e consequentemente dos gatos, às flutuações ambientais, e, se
possível, prolongar a análise durante vários anos, visto que os pequenos mamíferos
respondem muito rapidamente às condições climáticas, as quais geram picos
populacionais muito diferenciados e consequentemente variações a nível da
disponibilidade. Para uma melhor compreensão do regime trófico é ainda fundamental
relacionar o consumo com a disponibilidade de presas.
É também de salientar a ideia de que todos os agentes relacionados com a
conservação a nível local, regional e nacional, deverão efectuar esforços para que a
conservação de carnívoros seja vista como uma gratificação, não só para os grupos
directamente envolvidos, mas também para todos os cidadãos que não estão
directamente relacionados com o meio científico. Desta forma, é essencial que a atitude
transmitida pelos investigadores às populações seja baseada na transmissão de
conhecimentos e ideias de forma clara e aberta, como ocorreu durante a execução deste
trabalho, visto que muitas vezes os ideais defendidos pelos diferentes grupos de
interesse são os mesmos, a forma como são compreendidos é que difere, o que fragiliza
a relação investigadores/populações, e pode ter consequências negativas na conservação
de espécies ameaçadas. Um dos meios a adoptar é, sem dúvida, envolver as populações,
proprietários, agricultores e gestores cinegéticos nos trabalhos de
investigação/conservação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Dieta e impacto da predação de gatos domésticos (Felis catus) em ambientes rurais
63
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ANEXOS
73
ANEXO I
74
ANEXO II
Figura 1 – Gato doméstico (macho) da Herdade da Coutada dos Frades com colar de rádio-seguimento. (© Inês N.L.)
Figura 2 – Telemetria no Perímetro Florestal da Contenda (© J.P. Ferreira)
75
ANEXO III
Perímetro Florestal da Contenda
0
5
10
15
20
25
30
0 10 20 30 40 50 60
Nº dejectos
Frequência Acumulada (presas)
Figura 1 – Curva de Diversidade Trófica referente ao Perímetro Florestal da Contenda
Castelo de Noudar
0
5
10
15
20
25
30
0 10 20 30 40 50 60 70
Nº dejectos
Frequência Acumulada (presas)
Figura 2 – Curva de Diversidade Trófica referente ao Castelo de Noudar
Herdade da Coutada dos Frades
0
2
4
6
8
10
12
14
16
0 10 20 30 40 50 60
Nº dejectos
Frequência Acumulada (presas)
Figura 3 – Curva de Diversidade Trófica referente à Herdade da Coutada dos Frades
76
ANEXO IV
Tabela 1 – Número de indivíduos, frequência de ocorrência e percentagem de biomassa
referentes às classes-presa consumidas no Perímetro Florestal da Contenda
Classe-presa N F.O. (%) P.B. (%)
Lagomorpha 2 1,09 4,83 Rodentia 48 26,23 17,35 Insectivora 0 0 0 Aves 3 1,64 2,77 Reptilia 2 1,09 - Arthropoda 70 38,25 0,76 Material vegetal 26 14,21 0,07 Restos alimentação humana 32 17,49 74,27
Total 183 100 100
Tabela 2 – Número de indivíduos, Frequência de Ocorrência e Percentagem de Biomassa
referentes às classes-presa consumidas no Castelo de Noudar
Classe-presa N F.O. (%) P.B. (%)
Lagomorpha 0 0 0 Rodentia 50 31,06 11,79 Insectívora 3 1,86 0,21 Aves 18 11,18 11,24 Reptilia 2 1,24 0,03 Arthropoda 16 9,96 0,12 Material vegetal 22 13,66 0,06 Restos alimentação humana 50 31,06 76,55
Total 161 100 100
Tabela 3 – Número de indivíduos, Frequência de Ocorrência e Percentagem de Biomassa
referentes às classes-presa consumidas na Herdade da Coutada dos Frades
Classe-presa N F.O. (%) P.B. (%)
Lagomorpha 5 3,88 8,57 Rodentia 29 22,48 3,48 Insectívora 0 0 0 Aves 13 10,08 16,44 Reptilia 3 2,33 0,06 Arthropoda 10 7,75 0,07 Material vegetal 20 15,5 0,04 Restos alimentação humana 49 37,98 71,39
Total 129 100 100
77
ANEXO V
Tabela 1 – Número de indivíduos, Frequência de Ocorrência e Percentagem de Biomassa
referentes aos mamíferos consumidos no Perímetro Florestal da Contenda, no Castelo de
Noudar e na Herdade da Coutada dos Frades
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Classes-presa N F.O. P.B. N F.O. P.B. N F.O. P.B. (%) (%) (%) (%) (%) (%) Lagomopha 2 4,00 21,78 0 - - 5 14,71 71,08 Mus 23 46,00 17,55 31 58,49 34,18 29 85,29 28,88 Apodemus 22 44,00 31,86 15 28,30 31,40 0 - - Rattus 3 6,00 28,82 0 - - 0 - - Arvicola 0 - - 2 3,77 28,70 0 - - Microtus 0 - - 2 3,77 3,70 0 - - Crocidura 0 - - 3 5,66 2,01 0 - -
Total 50 100 100 53 100 100 34 100 100
Tabela 2 – Número de indivíduos, frequência de ocorrência e percentagem de biomassa
referentes às aves consumidas no Perímetro Florestal da Contenda, no Castelo de Noudar e na
Herdade da Coutada dos Frades
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. Coutada dos Frades
Classes-presa N F.O. P.B. N F.O. P.B. N F.O. P.B. (%) (%) (%) (%) (%) (%) Passeriforme 1 33,33 12,82 9 50,00 18,99 4 30,77 6,13 Collumbiforme 1 33,33 87,19 2 11,11 28,69 8 61,54 83,43 Apodiforme 0 0 0 2 11,11 7,60 0 - - Accipitriforme 0 0 0 2 11,11 30,38 0 - - Galliforme 0 0 0 0 - - 1 7,69 10,43 Anseriforme 0 0 0 1 5,56 14,35 0 - - Aves n.i. 1 33,33 - 2 11,11 - 0 - -
Total 3 100 100 18 100 100 13 100 100
78
ANEXO VI
Tabela 1 – Valores de Qui-quadrado obtidos quando se avalia estatisticamente as variações
espaciais no consumo de mamíferos entre o Perímetro Florestal da Contenda, o Castelo de
Noudar e a Herdade da Coutada dos Frades.
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. da Coutada dos Frades
Castelo de Noudar H. da Coutada dos Frades P.F. da Contenda
Classes-presa X2 p X2 p X2 p Lagomorpha 2,162 0,339 8,269 0,016 3,037 0,219
Rodentia 0,154 0,926 2,030 0,362 3,037 0,219
Mus sp. 1,609 0,447 0,953 0,031 13,250 0,001 Rattus sp. 3,275 0,194 - - 2,116 0,347 Microtus sp. 1,924 0,382 1,313 0,519 - - Apodemus sylvaticus 0,928 0,629 11,627 0,003 20,268 0,000 Arvicola sapidus 1,924 0,382 1,313 0,519 - -
Insectívora 2,915 0,233 1,993 0,369 - - Crocidura russula 2,915 0,233 1,993 0,369 - -
Diferenças significativas (p<0,05)
Tabela 2 – Valores de Qui-quadrado obtidos quando se avalia estatisticamente as variações
espaciais no consumo de aves entre o Perímetro Florestal da Contenda, o Castelo de Noudar e a
Herdade da Coutada dos Frades.
P.F. da Contenda Castelo de Noudar H. da Coutada dos Frades
Castelo de Noudar H. da Coutada dos Frades P.F. da Contenda
Classes-presa X2 p X2 p X2 p Passeriformes 0,286 0,867 1,146 0,564 0,007 0,996
Columbiformes 1,037 0,595 8,784 0,012 0,788 0,674
Apodiformes 0,368 0,832 1,544 0,462 - -
Accipitriformes 0,368 0,832 1,544 0,462 - -
Galliformes - - 1,373 0,503 0,246 0,884
Anseriformes 0,175 0,916 0,746 0,689 - -
Aves n.i. 1,037 0,595 1,544 0,462 4,622 0,099
Diferenças significativas (p<0,05)
79
ANEXO VII
Tabela 1 - Número de indivíduos, frequência de ocorrência e percentagem de biomassa
referentes às classes-presa consumidas no Sítio Moura-Barrancos (Portugal), Madrid (Espanha),
São Paulo (Brasil), Ilha de Port-Cros (França), Montanhas Jura (Suíça) e Revinge (Suécia)
durante a época seca. M.V.-Material Vegetal; R.A.H.-Restos Alimentação Humana.
Sitio M-B Madrid S. Paulo I. Port-Cros M. Jura Revinge
Classes-presa N F.O. P.B. N F.O. N F.O. N F.O. N F.O. P.B. (%) (%) (%) (%) (%) (%) (%) Lagomorfa 7 1,48 4,36 3 7,14 2 0,82 16 5,42 0 - 28,00 Rodentia 127 26,85 9,61 2 4,76 3 1,23 248 84,07 6 8,82 8,67 Insectívora 3 0,63 0,08 0 - 0 - 0 - 0 - - Aves 34 7,19 11,02 2 4,76 7 2,88 15 5,08 2 2,94 1,67 Reptilia 7 1,48 0,03 0 - 1 0,41 7 2,37 0 - - Arthropoda 96 20,30 0,27 1 2,38 107 44,03 9 3,05 0 - - M.V. 68 14,38 0,05 15 35,71 108 44,44 0 - 9 13,24 - R.A.H. 131 27,70 74,58 19 45,24 15 6,17 0 - 51 75,00 61,67
Total 473 100 100 42 100 243 100 295 100 68 100 100