diário do pará crise no setor madeireiro causa estragos em breves

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Crise no setor madeireiro causa estragos em Breves O setor florestal-madeireiro já estava agonizante nas principais áreas de produção do arquipélago marajoara quando veio a crise financeira internacional de 2008, que afetou as exportações brasileiras. Os municípios de Breves e Portel, ambos economicamente muito atrelados à atividade madeireira como principal fonte geradora de emprego e renda, entraram em depressão e tiveram dramaticamente agravados os seus problemas sociais. Entre eles, a violência urbana (e já agora também rural), o consumo de drogas e a exploração sexual infanto-juvenil. Em setembro do ano passado, enquanto as indústrias madeireiras sofriam uma quebradeira geral e milhares de trabalhadores perdiam o emprego, só o município de Breves contabilizava nada menos que 22 projetos de manejo pendentes de decisão da Secretaria de Meio Ambiente (Sema). E não se tratava de papelada recente, muito pelo contrário. Segundo revelou na ocasião o prefeito José Antônio Azevedo Leão, o “Xarão Leão” (PMDB), esses processos aguardavam análise e liberação da Sema desde 2002. Leão admitiu inclusive ter resultado inútil, na época, até mesmo um movimento liderado pela Prefeitura de Breves com a participação de lideranças políticas, empresariais e sindicais, que vieram a Belém para cobrar da Sema uma tomada de posição. Não é de admirar, assim, que empresas de grande porte tenham sido forçadas a encerrar suas atividades. Como foi o caso, por exemplo, da Madenorte, que chegou a empregar quase 1.500 trabalhadores. O diretor técnico da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeiras do Estado do Pará (Aimex), Guilherme Carvalho, admitiu que os embargos de gaveta apostos no passado pela Sema na análise de processos tiveram efeitos devastadores sobre o parque industrial madeireiro do Marajó. Empresas grandes, médias e pequenas, segundo ele, tiveram que fechar as portas, e as poucas que sobreviveram passaram a operar desde então com limitações, mantendo no máximo entre 15 e 20 por cento da sua antiga força de trabalho. O diretor ressalta que, desde o ano passado, quando houve a mudança de comando na pasta, a Sema passou a trabalhar com agilidade na análise dos processos e na consequente liberação das licenças ambientais. “É preciso destacar que não houve perda de qualidade técnica”. No segundo semestre de 2009, quando se combinaram os efeitos do declínio do setor madeireiro na região com a queda das exportações, em decorrência da crise financeira global, Breves amargou uma redução de cerca de 50% em sua receita orçamentária. Na mesma época, em decorrência do fechamento em série das serrarias, estima Leão que mais de dez mil trabalhadores ficaram desempregados. CAOS “O município de Breves vive uma situação dramática; estamos mergulhados no caos social. É louvável que se tente combater a ilegalidade mas, ao mesmo tempo, é preciso que se criem

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Crise no setor madeireiro causa estragosem Breves

O setor florestal-madeireiro já estava agonizante nas principais áreas de produção doarquipélago marajoara quando veio a crise financeira internacional de 2008, que afetou asexportações brasileiras. Os municípios de Breves e Portel, ambos economicamente muitoatrelados à atividade madeireira como principal fonte geradora de emprego e renda, entraramem depressão e tiveram dramaticamente agravados os seus problemas sociais. Entre eles, aviolência urbana (e já agora também rural), o consumo de drogas e a exploração sexualinfanto-juvenil.

Em setembro do ano passado, enquanto as indústrias madeireiras sofriam uma quebradeirageral e milhares de trabalhadores perdiam o emprego, só o município de Breves contabilizavanada menos que 22 projetos de manejo pendentes de decisão da Secretaria de MeioAmbiente (Sema). E não se tratava de papelada recente, muito pelo contrário. Segundorevelou na ocasião o prefeito José Antônio Azevedo Leão, o “Xarão Leão” (PMDB), essesprocessos aguardavam análise e liberação da Sema desde 2002.

Leão admitiu inclusive ter resultado inútil, na época, até mesmo um movimento liderado pelaPrefeitura de Breves com a participação de lideranças políticas, empresariais e sindicais, quevieram a Belém para cobrar da Sema uma tomada de posição. Não é de admirar, assim, queempresas de grande porte tenham sido forçadas a encerrar suas atividades. Como foi o caso,por exemplo, da Madenorte, que chegou a empregar quase 1.500 trabalhadores.

O diretor técnico da Associação das Indústrias Exportadoras de Madeiras do Estado do Pará(Aimex), Guilherme Carvalho, admitiu que os embargos de gaveta apostos no passado pelaSema na análise de processos tiveram efeitos devastadores sobre o parque industrialmadeireiro do Marajó. Empresas grandes, médias e pequenas, segundo ele, tiveram quefechar as portas, e as poucas que sobreviveram passaram a operar desde então comlimitações, mantendo no máximo entre 15 e 20 por cento da sua antiga força de trabalho. Odiretor ressalta que, desde o ano passado, quando houve a mudança de comando na pasta, aSema passou a trabalhar com agilidade na análise dos processos e na consequente liberaçãodas licenças ambientais. “É preciso destacar que não houve perda de qualidade técnica”.

No segundo semestre de 2009, quando se combinaram os efeitos do declínio do setormadeireiro na região com a queda das exportações, em decorrência da crise financeiraglobal, Breves amargou uma redução de cerca de 50% em sua receita orçamentária. Namesma época, em decorrência do fechamento em série das serrarias, estima Leão que maisde dez mil trabalhadores ficaram desempregados.

CAOS

“O município de Breves vive uma situação dramática; estamos mergulhados no caos social. Élouvável que se tente combater a ilegalidade mas, ao mesmo tempo, é preciso que se criem

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alternativas para a sobrevivência dessas famílias”. Ele considera também que, ao generalizaras medidas de controle ambiental, o governo, por puro desconhecimento da realidaderegional, está penalizando os municípios marajoaras.

O Marajó, segundo Leão, tem uma área tomada por campos naturais, aproveitadashistoricamente pelos pecuaristas para a criação de gado. Nas áreas restantes, inteiramentecortadas por furos e rios, é impossível a entrada de máquinas para a extração de madeira.“Nós não temos máquinas, não temos uma atividade mecanizada. Logo, também não temosdesmatamento, já que a extração é forçosamente seletiva e tem baixíssimo impactoambiental”.

O fechamento de indústrias madeireiras causa, sem dúvida, transtornos para a economia domunicípio e acarreta complicações ainda maiores na área social, onde já existem problemasgraves. Mas a dificuldade maior experimentada por Breves – e também pelos demaismunicípios marajoaras – acaba sendo mesmo a ausência do governo, seja ele o Estado ou aUnião.

A avaliação é de Reginaldo Cardoso Sarraf, na condição de presidente da AssociaçãoComercial, Empresarial e Agropastoril de Breves e, cumulativamente, da Câmara deDirigentes Lojistas da cidade. O empresário diz que, no período mais crítico de demissões emmassa nas serrarias, o benefício do seguro-desemprego contribuiu para tornar menos aflitiva asituação dos trabalhadores e de suas famílias.

PREOCUPAÇÃO

“A nossa preocupação maior é com o que vai ocorrer quando cessar o benefício”, afirmou,destacando que uma cidade como Breves não pode depender unicamente dos empregosgerados pela administração pública e pelo comércio. “O comércio também sente o baque dacrise, mas tem procurado reagir através de campanhas promocionais de incentivo aoconsumo”.

Ele considera, porém, que é indispensável a união das forças influentes do município em tornode um projeto capaz de lhe oferecer uma alternativa econômica assentada em bases sólidas,até como forma de multiplicar as oportunidades de geração de emprego e renda. “Mas, paraisso, nós precisamos que o Estado esteja junto. Nada pode justificar a ausência do governo”.Como exemplo, citou a possibilidade de ser transferido para o porto de Breves o embarquede cargas geradas na própria cidade e em municípios vizinhos, acabando-se com o “passeio”desses carregamentos até o porto de Vila do Conde. “Nós temos aqui três portosalfandegados – o da Madenorte, o da Mainardi e o da Robco, todos desativados desde queas empresas foram fechadas. Por que não utilizar um desses portos?”.

ALTERNATIVAS

E quanto às alternativas, que o próprio Azevedo Leão define como necessárias? Ele lembraque o município de Breves já foi, nas décadas de 1960/70, o maior produtor de arroz devárzea do Brasil. Também foi grande produtor de juta e borracha. Com o início do cicloextrativista da madeira, a partir de 1970, uma atividade que tem como principaiscaracterísticas o ganho financeiro mais rápido e a capacidade de absorver grandescontingentes de mão de obra, as alternativas econômicas tradicionais foram abandonadas.

“O fato é que o nosso caboclo, ao migrar para o trabalho da madeira, perdeu a habilidade

natural para a cultura do arroz”. Para resgatar essa cultura, em sua opinião, será preciso

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natural para a cultura do arroz”. Para resgatar essa cultura, em sua opinião, será precisosuperar primeiro a deficiência técnica existente em seu município e na região. Hoje, Brevesconta com apenas dois técnicos da Emater, o que é praticamente nada para um municípiocuja população já rompeu a barreira dos cem mil habitantes. (Diário do Pará)