dialogus 2006 v.1_n.1

404
CENTRO UNIVERSITÁRIO “BARÃO DE MAUÁ” Departamento de História e Geografia Dialogus Revista das Graduações em Licenciatura em História e Geografia ISSN 1808-4656 Dialogus Ribeirão Preto v.1, n.2 p.1-404 2006

Upload: lilian-oliveira-rosa

Post on 06-Jun-2015

778 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

  • 1. CENTRO UNIVERSITRIO BARO DE MAU Departamento de Histria e Geografia Dialogus Revista das Graduaes em Licenciatura em Histria e Geografia ISSN 1808-4656 Dialogus Ribeiro Preto v.1, n.2 p.1-404 2006

2. CENTRO UNIVERSITRIO BARO DE MAU Reitor Prof. Joo Alberto de Andrade Velloso Vice-reitor Profa. Elizabeth Maria Cristina Pincerno Fvaro Pr-Reitora de Acompanhamento e Registro Acadmico Profa. Ms. Maria Clia Pressinatto Pr - Reitoria de Ps - Graduao, Extenso e Prticas Investigativas Profa. Dra Joyce Maria W. Gabrielli Pr Reitor Acadmico Prof. Esp. Dacio Leandro Campos Pr-Reitor de Ensino Prof. Esp. Silvio Jos Cecchi Diretores de Ensino Prof. Ms Marcelo Zini e Walter de Paula Pr - Reitoria Administrativa Sr. Paulo Srgio C. Zucoloto Coordenadora das Graduaes em Geografia e Histria Profa. Ms. Llian Rodrigues de Oliveira Rosa Comisso Pedaggica Profa. Dulce Aparecida Trindade do Val, Profa. Dra. Dulce Maria Pamplona Guimares, Profa. Sara Maria Campos Soriani Comisso Editorial Prof. Ms. Humberto Perinelli Neto, Prof. Ms. Marcos Antonio Gomes Silvestre Prof. Ms. Llian Rodrigues de Oliveira Rosa Conselho Editorial Antnio Carlos Lopes Petean (CEUBM) Antonio Aparecido de Souza (CEUBM) Beatriz Ribeiro Soares (IG/UFU) Cenira Maria Lupinacci Cunha (PUC/MG) Charlei Aparecido da Silva (CEUBM) Dulce Maria P. Guimares (Unesp/Franca) Edvaldo Cesar Moretti (UFMS) Fbio Augusto Pacano (CEUBM) Francisco Sergio B. Ladeira (IG/UNICAMP) Hector Benoit (IFCH/Unicamp) Ivan Aparecido Manoel (Unesp/Franca) Publicao Anual/Publication Solicita-se permuta/Exchange desired Dialogus Rua Laguna, n.241, Jardim Macedo/Paulista CEP: 14.090-060 Ribeiro Preto / SP Dialogus (Departamento de Histria e Geografia Centro Universitrio Baro de Mau) Ribeiro Preto, SP Brasil, 2006. 2006, 2 2 ISSN 1808-4656 Capa: Torre da antiga fbrica da Companhia Cervejaria Antarctica, Ribeiro Preto (SP), 2006. Arquivo Pessoal de Jaime Rodrigo Marques da Silva. Jorge Luis Silva Brito (IG/UFU) Jos Lus V. Almeida (Unesp/S.J.Rio Preto) Leila Morato de Azevedo (CEUBM) Llio Luiz de Oliveira (Unesp/Franca) Maria Lcia Lamounier (Unesp/Araraquara) Nei Oliveira de Mendona (CEUBM) Renato L. Marcondes (FEA/USP/Ribeira Preto) Ronildo Alves dos Santos (CEUBM) Silvio Reinod Costa (CEUBM) Vera Lucia Abro (CEUBM) 3. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 3 Apresentao Muitas so as expresses que indicam persistncia, continuidade e enfrentamento: trocar o passo, seguir em frente e levar adiante, por exemplo. Pois bem, movidos por estas e por tantas outras expresses prprias em sinalizar a ao humana frente vida - a despeito das dificuldades e obstculos que ela contm - que nos dedicamos a tornar realidade mais um nmero da revista Dialogus. Seguimos assim os dilogos. A publicao deste nmero vem dotada de desafios. Tratou-se de repetir as virtudes presentes no primeiro nmero. Ao mesmo, nos foi imposto a interminvel inteno de corrigir equvocos e aprimorar parte daquilo que havia sido realizado. Nesta combinao fluda e desigual de acertos e erros que a temperana humana normalmente testada. Amparados num exame critico constante que nos esforamos para praticar do melhor modo possvel este tour de force. Por fim, salientamos que a ocasio especial, pois este segundo nmero celebra o sesquicentenrio da cidade de Ribeiro Preto. Todavia, celebrar envolveu a seleo e divulgao de diferentes reflexes, igualmente responsveis por destacar temas pertinentes em torno dos homens e mulheres que viveram e vivem neste lugar. Celebrar foi neste peridico, portanto, um verbo cuja conjugao esteve empregada com o ato de lembrar e de destacar. Os esforos foram feitos, resta desejar ao leitor que aproveite estes novos dilogos. Comisso Editorial 4. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 5 Apresentao do segundo volume A revista Dialogus no seu segundo nmero traz o dossi Ribeiro Preto, a propsito da comemorao do seu sesquicentenrio. A opo temtica e o nmero de artigos revelam a forte tendncia de insero nas questes locais que as pesquisas e estudos realizados nos cursos do Centro Universitrio possuem. A revista consolida-se e aperfeioa-se em inmeros aspectos da tcnica de montagem, tanto no que diz respeito elaborao da capa, a diagramao como no que se refere a sua divulgao na Internet por um link no site do Centro Universitrio. No se pode deixar de observar que o nmero de artigos escritos por alunos, em co-autoria ou individualmente, registrou uma ampliao significante. O trabalho inicial da revista de autoria da Profa. Dra. Vera L. S. Pessa que honrou essa Instituio com sua conferncia na abertura da X Semana de Histria e Geografia. Os artigos que versam sobre Ribeiro Preto voltam-se a questes atuais polmicas, como a do patrimnio, no meio ambiente da habitao e do transporte coletivo. Tratam de assuntos histricos clssicos, como da escravido e do caf, e mais recentes, como da cana-de-acar e da participao poltica feminina. Os demais artigos discutem pontos instigantes da Educao, Epistemologia, Meio Ambiente, Turismo e da rea da Histria. Encerrando a publicao apresentada uma resenha referente obra do professor Paul Singer que discorre sobre o capitalismo. Destaque deve ser dado para o afinco do trabalho da coordenao do curso de Histria e Geografia, e dos responsveis pela elaborao da revista Dialogus. Reitoria do Centro Universitrio Baro de Mau 5. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 7 SUMRIO/CONTENTS Conferncia/Conference Pesquisa e conhecimento: construindo os saberes... Research and knowledge: constructing to know them Vera Lcia Salazar PESSA p.15 Dossi "Ribeiro Preto"/Special "Ribeiro Preto" Patrimnio cultural: reflexes para o sesquicentenrio de Ribeiro Preto Cultural patrimony: reflections for the one hundred fifty years of Ribeiro Preto Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA Nainora Maria Barbosa de FREITAS p.31 Polticas pblicas de habitao popular: os papis da companhia habitacional regional de Ribeiro Preto cohab rp no desenvolvimento urbano Public politics of popular habitation: the papers of regional company habitacional of Ribeiro Preto COHAB RP in the urban development Silvia Aparecida de Sousa FERNANDES p.43 A bacia hidrogrfica como unidade territorial para o planejamento e gesto ambiental: estudo da bacia hidrogrfica do ribeiro Preto no municpio de Ribeiro Preto - SP The water basin as territorial unit for the planning and ambient management: study of the hidrogrphic basin of the ribeiro Preto in the city of Ribeiro Preto - SP Gabriel Vendruscolo de FREITAS p.65 6. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 8 Anlise sobre o funcionamento do sistema de transporte coletivo urbano de Ribeiro Preto-SP Analysis on the functioning of the system of urban collective transport of Ribeiro Preto-SP Andr BARIONI p.85 O cultivo canavieiro na regio de Ribeiro Preto: histria, modernizao e tecnologia 1940/1970 The sugar cane culture in the region of Ribeiro Preto: history, modernization and technology - 1940/1970 Rodrigo de Andrade CALSANI p.101 A participao poltica feminina - apontamentos sobre Ribeiro Preto The participation feminine politics - notes on Ribeiro Preto Paulo GARDE p.115 A saga de Ribeiro Preto na Belle poque caipira: modernidade e urbanizao na Primeira Repblica The saga of Ribeiro Preto in the Belle poque caipira: modernity and urbanization in the First Republic Jos Evaldo de Mello DOIN Rodrigo Ribeiro PAZIANI Josu Peroni CUELLO p.135 Populao escrava de Ribeiro Preto de 1870 a 1888 Enslaved population of Ribeiro Preto of 1870 the 1888 Osmar DAVID JUNIIOR p.161 7. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 9 Artigos/Articles Educao/Education Polticas Pblicas, Movimentos Sociais Rurais e Processo Educacional: a ao poltica e pedaggica da escola em movimento Public Politicals, Social Rural Movements and Educational Process: the political and pedagogic action in the school in movement Paulo Eduardo Vasconcelos de Paula LOPES p.179 Epistemologia/Epistemology As expresses da barbrie no naturalismo poltico The expressions of the barbarity in the naturalism politician Luiz Rufino dos SANTOS JUNIOR p.199 Incurses pela Blle poque Caipira: proposta de uma prtica de Histria da Cidade e do Urbanismo Incursions for Blle poque Caipira: proposal practical of history of the city and the urbanism Humberto PERINELLI NETO Jos Evaldo de Mello DOIN Fbio Augusto PACANO p.213 Todos os caminhos me encaminham pra voc: possibilidades interpretativas de objetos de importncia a posteriori All the ways direct me to you: possibilities of interpretation especifcs objects in history Rafael Cardoso de MELLO Rodrigo de Andrade CALSANI Tiago Silva GIORGIANNI p.239 8. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 10 A construo do pensamento geogrfico e os novos caminhos da geografia humana no mundo globalizado The construction of the geographic thought and the new ways of geography human being in the global world Marcos Antnio Silvestre GOMES p.261 Geografia/Geography A proposta de um desenvolvimento rural sustentvel como oportunidade para o Brasil The proposal of a sustainable agricultural development as chance for Brazil Tatiana de Souza Leite GARCIA David George FRANCIS p.273 A complexidade da questo ambiental e a necessidade de conservao do patrimnio ambiental global e local The complexity of the ambient question and the necessity of conservation of the global and local ambient patrimony Marcos Antnio Silvestre GOMES Viviane Caetano Ferreira GOMES p.301 Entendimento sobre a atividade turstica nos Planos Plurianuais dos quadrinios compreendidos entre 1996 e 2007 Agreement on the tourist activity in the Plurianuais Plans of the quadrinios understood between 1996 and 2007 Antonio Aparecido de SOUZA p.315 9. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.1-404, 2006. 11 Histria/History Xang e Dante na terra de Macunama: a questo negra aps a Escravido Xang and Dante in Macunaimas Land: the afro-american question in the So Paulo State Lucas Augusto ROSA p.337 Os nossos heris: onde esto? Our heroes: where they are? Bruno Lourencini PUGA p.351 Sexualidade Feminina na Amrica Portuguesa Feminine sexuality in Portuguese America Jorge Luiz de FRANA p.365 Resenha/Review SINGER, Paul. O capitalismo: sua evoluo, sua lgica e sua dinmica. So Paulo: Moderna, 2005. Paulo Eduardo Vasconcelos de Paula LOPES Andr BARIONI p.385 ndice de assuntos ...................................................... p.393 Subjetc Index ............................................................... p.395 ndice de autores/Authors index .................................. p.397 Normas para apresentao de original ...................... p.399 10. CONFERNCIA/CONFERENCE 11. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 15 PESQUISA E CONHECIMENTO: CONSTRUINDO OS SABERES...* Vera Lcia Salazar PESSA** RESUMO: A produo do conhecimento resulta de uma reflexo crtica, a partir de um problema. A busca de resposta para este questionamento, o domnio do referencial terico e dos procedimentos metodolgicos, expressos nos resultados obtidos, so condies essenciais para o pesquisador. O objetivo do presente trabalho mostrar a importncia da pesquisa para a construo e divulgao do conhecimento cientfico. PALAVRAS-CHAVE: pesquisa; conhecimento cientfico; interdisciplinaridade. Introduo A busca pelo conhecimento uma constante no ser humano. por meio dele que aprendemos a desvendar a realidade do mundo. Esse conhecimento pode ser adquirido por leituras em livros, mapas, meios de comunicao, conversas com amigos e parentes, observao do cotidiano, pesquisa. Cada forma escolhida nos proporciona um * O contedo deste texto foi objeto de palestra proferida pela referida professora, por conta do lanamento deste segundo nmero da revista Dialogus e em decorrncia das atividades da X Semana de Histria e Geografia do Centro Universitrio Baro de Mau, Ribeiro Preto (SP). Registram-se os agradecimentos da autora ao Prof. Dr. Glucio Jos Marafon pela leitura e sugestes que contriburam para a construo deste texto. ** Professora do Programa de Ps-Graduao em Geografia/Mestrado/Doutorado do Instituto de Geografia/UFU. E-mail: [email protected] 12. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 16 aprendizado novo. Entretanto, o caminho percorrido para obter este aprendizado ser de acordo com o objetivo estabelecido. No caso especfico de obter conhecimento por meio da pesquisa cientfica, para que se possa divulg-lo, h um caminho a percorrer. O ponto de partida a formulao de um problema quando pode ser resolvido com conhecimentos j produzidos ou com aqueles factveis de serem produzidos (GUIMARES, 2002, p. 20). Uma vez cumpridas as etapas, ao apresentar os resultados finais, a pesquisa estar contribuindo para que o conhecimento seja divulgado. Assim, o objetivo desse trabalho mostrar a importncia da pesquisa para a construo e divulgao do conhecimento. Para cumprir o objetivo proposto, o trabalho est organizado em quatro sees, alm da Introduo e Consideraes Finais. A primeira, faz uma breve reflexo sobre senso comum e senso crtico, considerando o senso crtico como fundamento para o desenvolvimento da pesquisa. Na segunda seo, mostramos que cincia e pesquisa so uma tarefa de reflexo. Na terceira seo, discutiremos o papel da interdisciplinaridade na pesquisa. Na quarta seo, faremos uma abordagem sobre a universidade e a importncia da pesquisa para a construo do conhecimento. A questo do saber: diferenciando senso comum e senso crtico As caractersticas que distinguem o homem dos demais seres so o querer descobrir algo novo, a curiosidade, a capacidade de conhecer o mundo em que vive e ter conscincia de suas sensaes e seus desejos. Nesse sentido, o homem procura conhecer, de diversas formas, o mundo que o rodeia. Essas formas de conhecimento podem ser adquiridas por meio da observao, das crenas, dos romances, dos filsofos e at mesmo da autoridade (GIL, 1999). Utlizando-se das idias do referido autor, perguntamos: como adquirir estes conhecimentos? 13. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 17 Com relao observao, usando os sentidos, o homem recebe e interpreta as informaes do mundo exterior. Assim, quando olha para o cu e v nuvens escuras, sabe que vai chover. um conhecimento simples, mas tem seu significado. As crenas tambm constituem fonte de conhecimento. Dentre elas, podemos destacar as crenas religiosas e populares. As benzeduras, as rezas, muito comuns entre pessoas mais velhas, as pajelanas para curar doenas, ilustram as crenas religiosas. Saber escolher a lua para plantar, para cortar madeira um exemplo de sabedoria popular. Outra fonte de conhecimento so os romances. Qualquer que seja sua natureza (fico, histrico...), podem proporcionar informaes importantes sobre os sentimentos, as motivaes, as pessoas, a histria dos lugares. Como exemplos, podemos citar: Os Sertes (Euclides da Cunha) que nos possibilita conhecer as caractersticas fsicas de parte do serto nordestino na histria de Canudos. Na leitura de A Viagem de To (Catherine Clment), o leitor adquire conhecimento sobre as religies, acompanhando To em sua viagem pelo mundo. Em O Mundo de Sofia (Jostein Gaarder), temos uma aula de filosofia, acompanhando as inquietaes da personagem. Por meio das leituras, portanto, h sempre algo para aprender. H tambm uma fonte conhecimento derivada da autoridade (GIL, 1999) que repassada pelos pais, professores, governantes, lderes partidrios, jornalistas, escritores. A viso de mundo, as normas e procedimentos dessas autoridades acabam sendo verdadeiras medida que a sociedade as reconhecem como sua prtica. Por ltimo, os filsofos tambm proporcionam importantes elementos para compreender o mundo. Os ensinamentos dos filsofos tm grande validade para proporcionar um adequado conhecimento do mundo porque se fundamentam em procedimentos racional e especulativo (GIL, 1999). Entretanto, essas formas de conhecimento, por estarem baseadas na observao casual dos fatos, podem incorrer em equvocos 14. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 18 porque a observao subjetiva, no satisfazendo, portanto, aos espritos mais crticos. Esses conhecimentos esto no nvel do Senso Comum ou Bom Senso, ou seja, o conhecimento do mundo real e imaginrio por meio de um conjunto de opinies, hbitos e formas de pensamento assistematicamente estruturado, utilizado diariamente pelos indivduos como forma de orientao para suas vidas (SEABRA, 2001, p.15). Assim, quando o conhecimento dos fatos exige algumas interpretaes, surgem os questionamentos para fundamentar o Senso Crtico. Nessa linha de pensamento, retomando as idias de Seabra (2001, p.16) dizemos que para compreender a realidade, o Senso Crtico busca sua essncia, seu verdadeiro significado. E sua explicao pode ser encontrada pelo emprego da cincia. Portanto, a partir da necessidade de obter conhecimentos mais cientficos do que aqueles oriundos do Senso Comum, desenvolveu-se a cincia. E perguntamos: por que surge a cincia? A cincia e a pesquisa: uma tarefa de reflexo A cincia surge para proporcionar respostas mais seguras aos problemas levantados, demonstrar a verdade dos fatos e possibilitar sua aplicao prtica. Entre os pesquisadores, mesmo procurando entender a cincia por ngulos diferentes, h um consenso de que a pesquisa cientfica caminha para um objetivo que demonstrar a verdade dos fatos, conforme j destacado. Portanto, fazer pesquisa desenvolver um conjunto de atividades orientadas para a aquisio de determinado conhecimento (SEABRA, 2001, p.19). Nesse sentido, as descobertas, dependendo do nvel de profundidade, causam impactos e, muitas vezes, a aceitao dos resultados pela sociedade no fcil. Exemplos, hoje (2006), so os transgnicos, a clonagem de seres humanos. Outros, apenas de riscos, 15. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 19 surgem como esperana. Exemplos so as pesquisas com clulas- tronco, alguns tipos de transplantes de rgos. Para que a pesquisa seja considerada cientfica, a sistematizao dos dados, o uso de mtodos e das tcnicas apropriadas importante. Ao fazer uma pesquisa, o pesquisador pode levantar algumas questes: 1. Sobre o que quero pesquisar? (O tema/o problema). 2. Por que quero pesquisar este assunto? (A Justificativa/ A Relevncia). 3. Para que pesquisar? (Os Objetivos: geral e especficos). 4. O que a comunidade cientfica j sabe sobre este assunto? (Reviso de Literatura/Referencial Terico/Fundamentao Terica). 5. Como vou conseguir as informaes, os dados? (A Metodologia da Pesquisa/ Os Procedimentos Metodolgicos). 6. Como vou analisar as informaes, os dados obtidos? (A Anlise dos Dados/ A Estatstica). 7. Quanto tempo vou demorar para concluir a pesquisa? (Cronograma). Ao elaborar estas questes, estamos pensando no projeto de pesquisa, isto , um conjunto de passos sistematizados que nos levar a buscar respostas para as inquietaes propostas. Portanto, para se elaborar um projeto necessrio [...] considerar criticamente os limites e as possibilidades do contexto de trabalho, definindo os princpios norteadores da ao, determinando o que queremos conseguir, estabelecendo caminhos e etapas para o trabalho e avaliando continuamente o processo e os resultados (RIOS, 2002, p.75). Esta elaborao vai exigir do pesquisador muita leitura e reflexo para encontrar a(s) resposta(s) porque fazer pesquisa espionar, observar paciente e atentamente durante dias e horas a fio, como se aguarda de tocaia o momento do ataque. A investigao exige olhos atentos e mos sempre prontas para fazer anotaes. A cada fato 16. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 20 novo uma espiada, e mais uma anotao. Falar somente o suficiente. Ouvir e observar o mximo. a regra (SEABRA, 2001, p.11). Ao nos inserir no mundo da pesquisa importante refletir sobre as perguntas de Garcia (2003, p.21) em seu artigo Para quem investigamos - para quem escrevemos: reflexes sobre a responsabilidade social do pesquisador. No referido trabalho, a autora pergunta: - Pesquisamos para a academia e para as agncias de fomento ou para as escolas onde a complexidade da realidade desafia a cada dia a competncia docente? - Pesquisamos para ganhar pontos nos relatrios internos e externos, para publicar e vender livros, para adquirir/consolidar prestgio, ou nossa pesquisa parte de nosso compromisso poltico com a luta pela transformao da sociedade? - Escrevemos para nossos pares ou para as professoras que esto na sala de aula? - Quem, afinal, se beneficia com as nossas pesquisas e os nossos escritos? - Com que projeto de sociedade nossas pesquisas esto comprometidas e a que projeto de sociedade nossas pesquisas se opem ou simplesmente, nos pretendemos neutros? - Afinal, de onde falamos, para quem falamos e o que pretendemos com nossas falas? - Existe em ns uma preocupao em ampliar o nosso auditrio ou nos interessa apenas uma platia seleta de iniciados? (grifos do autor). Os questionamentos levantados pela autora nos faz refletir sobre a responsabilidade do pesquisador quando se prope a desenvolver um trabalho. Ao apresentar os resultados sociedade, a pesquisa torna-se um importante instrumento de disseminao do conhecimento e lhe permitir: 17. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 21 - compreender a realidade na qual est inserido e se posicionar criticamente frente a ela; - propor a transformao da sociedade porque parte de seu compromisso poltico; - propor discusses e at mesmo solues para o problema que originou sua pesquisa; - fazer com que suas idias e concluses sejam ouvidas por um nmero significativo de pessoas. Para que estas metas sejam alcanadas, o pesquisador dever dominar bem aquilo que faz, ou seja, o contedo e as tcnicas (RIOS, 2002). No domnio do contedo, o mtodo de interpretao da realidade importante porque est relacionado concepo de mundo do pesquisador, sua viso da realidade, da cincia, do movimento[...] Refere-se a posturas filosficas, ao posicionamento quanto s questes da lgica[...], ideologia e posio poltica do cientista. O mtodo [...] o arcabouo estrutural sobre o qual repousa qualquer conhecimento cientfico (MORAES; COSTA, 1984, p.27). O mtodo de pesquisa importante e representa o conjunto de tcnicas utilizadas em qualquer estudo que se faa necessrio. O mtodo de pesquisa, portanto, relaciona-se mais aos problemas operacionais da pesquisa que a seus fundamentos filosficos [...] A utilizao de um mtodo de pesquisa no implica diretamente posicionamentos polticos ou concepes existenciais do pesquisador, resultando muito mais das demandas do objeto tratado e dos recursos tcnicos de que dispe (MORAES; COSTA, 1984, p.27). Assim, o pesquisador, ao mostrar o domnio do contedo, das tcnicas de pesquisa e mtodo de interpretao (viso de mundo), divulga os resultados obtidos que podem contribuir para a compreenso dos fatos e, atravs da sua disseminao, possibilitar a transformao da realidade. 18. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 22 A interdisciplinaridade: uma prtica importante na construo do conhecimento A discusso sobre pesquisa e conhecimento pressupe no s o trabalho na mesma rea de atuao do pesquisador como tambm a noo de interdisciplinaridade, ou seja, a integrao de diferentes disciplinas com tal disposio de saberes em que diferentes disciplinas se fundiriam num nico saber mais abrangente (VEIGA-NETO, 2002). Nesse sentido, a interdisciplinaridade de conhecimentos importante para o desenvolvimento das pesquisas. Somada interdisciplinaridade, est a multidisciplinaridade. Tanto o sujeito coletivo (grupo) quanto o sujeito uno (pesquisador individual) podem pesquisar utilizando a perspectiva interdisciplinar, multidisciplinar, como interinstitucional. Assim, a interdisciplinaridade [...] seria um caminho para superar a compartimentalizao do saber e a dicotomizao do conhecimento e a acentuada especializao, caracterizadores da Cincia Moderna, sendo que essa superao apenas possvel e fecunda a partir de um trabalho em equipe, onde se forma uma espcie de sujeito coletivo (GUIMARES, 2002, p.15). Essa afirmativa reforar a importncia de envolver docentes e discentes de reas afins que estejam em consonncia com a temtica da pesquisa, mesmo tendo a convico de que a praxis interdisciplinar no tarefa fcil porque cada rea do conhecimento, de acordo com sua especificidade, utilizar estratgias diversificadas no trabalho de cooperao (NBREGA, 2002). Ainda nessa mesma linha de raciocnio, Domingos Sobrinho (2002, p.56) diz que no se rompe com a fragmentao herdada do cartesianismo, nem se assume a complexidade da produo dos fenmenos que nos rodeiam. Entretanto, para que os resultados possam atingir seus objetivos, os pesquisadores 19. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 23 precisam superar essas diferenas para realizar a tarefa de formar futuros profissionais. A universidade e a pesquisa: uma parceria necessria Produzir cincia, produzir pesquisa (cientfica), ou seja, produzir conhecimento uma tarefa das Universidades. Isto porque a Universidade uma agncia formadora da cincia e da tecnologia, assim como configura um lugar de produo do imaginrio coletivo, capaz de articular, prtica e simbolicamente, a sociedade poltica e a sociedade civil. Encontramos na Universidade o lugar necessrio e adequado para desenvolver a atividade cientfica, da pesquisa cientfica entendida como o processo criativo que visa a produo do conhecimento (TAVARES DOS SANTOS, [199 -), p.178). A partir desse raciocnio, a Universidade se estrutura no trip: ensino, pesquisa e extenso. No que tange pesquisa, os professores, na sua maioria, tm que dedicar parte de sua carga horria a esta atividade, muitas vezes, aprovadas em financiamentos internos e externos. Entretanto, a Universidade, principalmente a pblica, tem enfrentado uma crise (aqui considerada financeira). Esta crise, conforme afirma Santos (2004, p.19), por via da descapitalizao um fenmeno global, ainda que sejam significativamente diferentes as suas conseqncias no centro, na periferia e na semiperiferia do sistema mundial. Nas Universidades, os Programas de Ps-Graduao Stricto Sensu, de Iniciao Cientfica, os trabalhos de concluso de curso (TCC), as pesquisas de carter individual e interdisciplinar dos professores, financiadas pelos rgos de fomento (CNPq, Fundaes Estaduais), tm contribudo para esse crescimento. Nesse sentido, retomando as idias de Tavares do Santos ([199-], p.186), acerca do papel que a Universidade desempenha no contexto cientfico, vemos que a Universidade no pode deixar de ser o lugar da inovao, de busca da 20. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 24 produo de um saber original e da descoberta cientfica, lugar da revoluo do conhecimento cientfico, da inovao cultural e da rebelio cultural. Ao formar cidados para o tempo futuro, tambm a Universidade propicia imaginar como resolver as prticas do relacionamento com o outro e como resolver os sistemas do pensamento. Com base nessas reflexes, o papel que a Universidade exerce como lcus do conhecimento, do saber mostra que a produo desse conhecimento dever ser feita com tica e competncia pelo pesquisador. Isto o torna comprometido com uma sociedade mais justa e democrtica, em que saber e poder tenham equivalncia enquanto elementos de interferncia no real e organizao de relaes de solidariedade, e no de dominao, entre os homens (RIOS, 2002, p.65). No mundo atual, vivemos uma crise de tica e de competncia. Superar isto um grande desafio para todos ns, mais do que pesquisadores, cidados comprometidos com o social. Consideraes Finais A partir das consideraes feitas, podemos afirmar que o processo de produo do conhecimento cientfico produto de uma reflexo crtica e tambm uma atividade transformadora, quer da realidade, quer da sociedade, produto desse conhecimento. Por meio do conhecimento, o homem saber exercer seu papel de cidado, com tica e competncia, na sociedade em que est inserido. O saber crtico- metodolgico ser seu suporte. Esse conhecimento (cientfico), conforme j destacado, adquirido por meio do rigor da pesquisa porque, ao propor o problema, somos levados a buscar no referencial terico e nos procedimentos metodolgicos as respostas procuradas. Ao elaborar o trabalho, estamos construindo esse conhecimento que dever ser usado em benefcio da sociedade. 21. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 25 PESSA, Vera Lcia Salazar. Research and knowledge: constructing to know them Dialogus. Ribeiro Preto, v.1, n.2, 2006, p.15-27. ABSTRACT: The goal of this work is to show how important research is to building and spreading scientific knowledge, which is produced from a critical thought on a given problem. In the process of production, both looking for answers and mastering theoretical background and methodological procedures are conditions, expressed in the results, essential to the researcher. KEYWORDS: research; scientific knowledge; interdisciplinarity. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS CLMENT, C. A viagem de Tho: romance das religies. Traduo Eduardo Brando. 4.reimp. So Paulo: Companhia das Letras, 1998. COSTA, S. F. Mtodo cientfico: os caminhos da investigao. So Paulo: HARBRA, 2001. CUNHA, E. Os sertes: campanha de Canudos. So Paulo: Abril Cultural, 1982. DOMINGOS SOBRINHO, M. Campo cientfico e interdisciplinaridade. In: FERNANDES, A.; GUIMARES, F. R.; BRASILEIRO, M. do C. E. (Org.). O fio que une as pedras: a pesquisa interdisciplinar na ps-graduao. So Paulo: Biruta, 2002. p.49-58. DONOFRIO, S. Metodologia do trabalho intelectual. 2. ed. So Paulo: Atlas, 2000. GARCIA, R. L. Para quem investigamos para quem escrevemos: reflexes sobre a responsabilidade social do pesquisador. In: ___. 22. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 26 MOREIRA, A. F. et al. (Org.). Para quem pesquisamos, para quem escrevemos: o impasse dos intelectuais. 2. ed. So Paulo: Cortez, 2003. p.11-36. (Coleo Questes de Nossa poca). GIL, A. C. Mtodos e tcnicas de pesquisa social. 5. ed. So Paulo: Atlas, 1999. GUIMARES, F. R. Um novo olhar sobre o objeto de pesquisa em face da abordagem interdisciplinar. In: FERNANDES, A.; GUIMARES, F. R.; BRASILEIRO, M. do C. E. (Org.). O fio que une as pedras: a pesquisa interdisciplinar na ps-graduao. So Paulo: Biruta, 2002. p.13-25. GAARDER, J. O mundo de Sofia: romance da histria da filosofia.Traduo Joo Azenha Jr. 14.ed. So Paulo: Companhia das Letras, 1995. MORAES, A. C. R; COSTA, W. M. O ponto de partida: o mtodo. In: ______. Geografia crtica: a valorizao do espao. So Paulo: HUCITEC, 1984.p.26-34. NBREGA, G. M. Interdisciplinaridade: uma viso dos tempos atuais. In: FERNANDES, A.; GUIMARES, F. R.; BRASILEIRO, M. C. E. (Org.). O fio que une as pedras: a pesquisa interdisciplinar na ps-graduao. So Paulo: Biruta, 2002. p.111-118. PESSA, V. L. S. Grupos de pesquisa e formao dos profissionais em geografia agrria: um olhar sobre sua construo. In: ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA: Agricultura, desenvolvimento regional e transformaes socioespaciais, I., 2005. Anais... Rio de Janeiro: UERJ, 2005. 1 CD-Rom. RIOS, T. A. Competncia e utopia: prtica profissional e projeto. In: ______. tica e competncia. 12. ed. So Paulo: Cortez, 2002. p.60-85. (Coleo Questes de Nossa poca). SANTOS, B. S. A descapitalizao da universidade pblica. In: ______. A universidade no sculo XXI: para uma reforma democrtica e 23. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.15-27, 2006. 27 emancipatria da universidade. So Paulo: Cortez, 2004. p.19-26. (Coleo Questes de Nossa poca, v.120). SEABRA, G. F. Pesquisa cientfica: o mtodo em questo. Braslia: EDUnB, 2001. SOARES, M. Para quem pesquisamos? Para quem escrevemos? In: MOREIRA, A. F. et al. (Org.). Para quem pesquisamos, para quem escrevemos: os impasses dos intelectuais. 2. ed. So Paulo: Cortez, 2003, p.65-90. (Coleo Questes de Nossa poca, v. 88). TAVARES DOS SANTOS, J V. A nova organizao do trabalho cientfico. In: MOROSINI, M. C. (Org.). Universidade no MERCOSUL. So Paulo: Cortez; Porto Alegre: FAPERGS/CNPq, [199-], p.178-187. VEIGA-NETO, A. Interdisciplinaridade na ps- graduao: isso possvel? In: FERNANDES, A.; GUIMARES, F. R.; BRASILEIRO, M. do C. E. (Org.). O fio que une as pedras: a pesquisa interdisciplinar na ps-graduao. So Paulo: Biruta, 2002, p.26-35. 24. Dossi "Ribeiro Preto"/ Special "Ribeiro Preto" 25. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 31 PATRIMNIO CULTURAL: REFLEXES PARA O SESQUICENTENRIO DE RIBEIRO PRETO Lilian Rodrigues de Oliveira ROSA* Nainora Maria Barbosa de FREITAS** RESUMO: A preservao do patrimnio elemento de segurana contra toda forma de uniformizao dos povos em um nico modelo cultural. O momento de comemorao do sesquicentenrio de Ribeiro Preto revela-se importante para a reflexo sobre o processo de construo destrutiva vivida pelo municpio, justificado pela falta de comprometimento da populao com as prticas preservacionistas e agravado pela falta de uma poltica patrimonial pblica amplamente consolidada. PALAVRAS-CHAVE: patrimnio cultural; cidadania; Ribeiro Preto. Os estudos e discusses sobre patrimnio cultural tornam-se cada vez mais freqentes no meio acadmico. Tomado como um tema que carece de uma abordagem multidisciplinar, gegrafos, historiadores, antroplogos, socilogos, turismlogos, arquitetos, pedagogos, entre outros, debruam-se sobre a teia de variveis apresentadas pela complexa questo do patrimnio cultural, envolvendo as relaes entre o homem e o meio, o conceito de paisagem, a discusso sobre histria e * Licenciada em Geografia e em Histria. Mestre em Histria pela FHDSS/UNESP. Coordenadora dos cursos de Geografia e Histria do Centro Universitrio Baro de Mau, Ribeiro Preto (SP). ** Historiadora. Mestre em Histria pela FHDSS/UNESP e Doutoranda em Histria pela mesma instituio. Docente do Centro Universitrio Baro de Mau, Ribeiro Preto (SP). 26. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 32 memria, sobre identidade cultural, relaes socioeconmicas, qualidade de vida e educao. A prpria amlgama entre os vocbulos e as variaes de definio sofridas pelos dois conceitos amplia ainda mais a dificuldade de sua compreenso. O vocbulo cultura, de origem inglesa, resultante da sntese dos termos Kultur (vocbulo germnico do sculo XVIII que definia os aspectos espirituais de uma comunidade) e Civilization (vocbulo francs referente s realizaes materiais de um povo). A prpria definio da UNESCO para o conceito de cultura, revela indcios da origem do vocbulo: [...] conjunto de caractersticas distintas, espirituais e materiais, intelectuais e afetivas, que caracterizam uma sociedade ou um grupo social [...] engloba, alm das artes e letras, os modos de viver, os direitos fundamentais dos seres humanos, os sistemas de valor, as tradies e as crenas. (GAMARRA apud BELTRO, 2002) A palavra patrimnio tem sua origem relacionada herana familiar, geralmente ligada aos bens materiais de uma sociedade estvel. Ser na Frana do sculo XVIII que o termo patrimnio assumiu a definio de conjunto de bens culturais de uma nao protegidos por lei, dentro do contexto de discusso dos elementos necessrios para a consolidao do Estado-nao. Nessa fase, surgiram iniciativas relativas a sua permanncia e conservao, quando D. Joo V, de Portugal, mandou inventariar o patrimnio edificado do reino para evitar sua descaracterizao, enquanto na Inglaterra realizavam-se os primeiros estudos sobre tcnicas de restaurao. (BASTOS, 2004). Quanto institucionalizao1 da preservao do patrimnio a primeira iniciativa ocorreu a partir de 1837, quando foi criada a Comisso dos Monumentos 1 Entendemos por institucionalizao da preservao do patrimnio cultural a criao dentro do organograma do Estado-nao de rgos governamentais cuja funo especfica cuida dessa temtica nos limites territoriais do pas. 27. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 33 Histricos, responsvel pelos estudos dos remanescentes da antiguidade na Frana. Dentre outras aes de preservao destaca-se a da Igreja Catlica que, detentora de um rico patrimnio, j adotava algumas medidas preventivas para a guarda deste acervo desde o Renascimento: As sucessivas lies de Roma em favor da preservao de monumentos e documentos sob a guarda da igreja mostram a importncia do papel eclesistico na conservao dos bens de valor artstico e histrico. O papa Paulo II, em 1460, proibiu a alienao dos bens preciosos da igreja, sem licena da Santa S. Os Papas Eugnio IV, Pio II e Sisto IV proibiram a exportao de estatuas antigas. Paulo III nomeou um superintendente das antiguidades romanas. Leo XIII providenciou a guarda dos arquivos paroquiais e bibliotecas. Pio X chamou ateno para a importncia e significado dos monumentos e documentos histricos e artsticos, enquanto Pio XI criou, em 1923, uma comisso permanente para a conservao do acervo dos bens eclesisticos. Tambm os arcebispos brasileiros, em 1915, no Conclio Plenrio da Amrica latina, fizeram advertncias severas, no sentido de impedir prejuzos e descaracterizao do patrimnio da Igreja. (PIRES, 1994, p.17). Motivados pela destruio provocada pela 1a. Grande Guerra Mundial, ocorre em Atenas, Grcia, em 1931, a I Conferncia Internacional para conservao de monumentos histricos, gerando a conhecida Carta de Atenas, marco para a construo de diretrizes internacionais para a restaurao do patrimnio edificado. Aps a 2a. Guerra Mundial, a ONU reconheceu o patrimnio cultural como frgil e precioso. A partir de ento, acadmicos passaram a discutir a necessidade de preservao do patrimnio como forma de propiciar s naes a possibilidade de construir sua prpria identidade, manifestando-a no apenas nos bens imveis, representados pelos grandes monumentos to caros memria oficial e protegidos por leis e instituies governamentais, mas tambm pelo patrimnio edificado sem tanta expresso arquitetnica, mas de grande importncia histrica, 28. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 34 como testemunho do modus vivendi do campons, do operrio e de outros tantos trabalhadores (BURKE, 1992). Nas dcadas de 1980 e 1990, ampliou-se essa discusso alargando as fronteiras do patrimnio, redefinindo seus contedos e abrindo amplo espao para o incio da valorizao dos elementos imateriais, provocando um outro olhar sobre o patrimnio como um fator de memria das sociedades. No Brasil, em meio s remodelaes urbanas do incio do sculo XX, quando o estilo arquitetnico era o ecletismo, caracterizado pela mistura de estilos, com grande valorizao do neoclassicismo, ocorrem as primeiras manifestaes de preocupao com a preservao do patrimnio edificado, influenciadas pelo pensamento europeu. Nessa fase surgem propostas de valorizao da cultura nacional e dos bens culturais, antecedendo a Semana de Arte Moderna. A partir desse momento o patrimnio passa a ser encarado como a representao material da nao, carregado do iderio nacionalista, portanto repleto de simbolismo, valorizando-se o estilo neocolonial, em oposio ao ecletismo, repudiando-se a simples importao de estilos. (BASTOS, 1992). No governo Vargas o incio da institucionalizao da preservao das referncias culturais ocorreu com a criao da Inspetoria de Monumentos Nacionais (1934) do Servio de Patrimnio Histrico e Artstico Nacional SPHAN (1937), substitudo mais tarde pelo Instituto de Patrimnio Histrico e Artstico Nacional - IPHAN . Mesmo com a criao dos conselhos estaduais e municipais de preservao, a partir dos anos 60, fato que demonstra o aumento da participao da sociedade civil, a institucionalizao ainda ficou evidente, j que foi destinada ao Estado a responsabilidade quase absoluta de preservao dos bens culturais do pas. Com problemas de verba, com uma equipe pequena e falta de um amplo inventrio dos bens de valor histrico e cultural, o Estado acaba por se preocupar prioritariamente com os grandes conjuntos arquitetnicos, ou as manifestaes culturais de maior evidncia nacional e no atua de maneira fiscalizadora no espao dos municpios. 29. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 35 Essa mentalidade, que permanece at os dias de hoje no Brasil, reflete o distanciamento da populao em relao necessidade de salvaguarda do patrimnio histrico. Boa parte dos bens culturais do pas est espalhada por pequenos municpios que no passaram pelo processo de inventrio e tombamento do IPHAN e, sem fiscalizao do poder executivo municipal, perdem paulatinamente suas referncias culturais, num irreversvel processo de descaracterizao da identidade cultural brasileira. Dessa forma, a preservao do patrimnio elemento essencial de segurana contra toda forma de uniformizao dos povos em um nico modelo cultural. Processo agravado pela mundializao do capitalismo (Del Plata, 1997), que restringe a transmisso de gerao para gerao da herana cultural. Tal fato tambm impede a constante recriao e reconstruo da identidade das comunidades e grupos em funo do seu prprio ambiente, de suas relaes com o meio e com sua histria, dificultando a sedimentao de um sentimento de continuidade, que garanta a promoo do respeito diversidade cultural e criatividade por meio da convivncia com o outro nas vrias paisagens construdas pelo gnio humano. Dentro desse contexto de complexas relaes entre a necessidade de preservao do patrimnio cultural como elemento essencial de qualidade de vida e a falta de polticas pblicas municipais consolidadas para implantar aes de preservao de acordo com as diretrizes internacionalmente aceitas, se faz necessria uma reflexo sobre essa temtica em Ribeiro Preto. Em 19 de junho de 2006, Ribeiro comemora os 150 anos da concluso do processo de doao de terras para o patrimnio de So Sebastio, ao que originou o que viria a ser o atual ncleo urbano. Do pequeno povoado em torno de uma capela, rodeado por fazendas de gado e de policultura para subsistncia em meados do sculo XIX, (LAGES, 1996) a economia ribeiropretana cresceu e se transformou na mais representativa regio produtora de caf das primeiras dcadas do sculo XX, quando recebeu a alcunha de capital do caf. 30. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 36 Nessa fase, a cidade tinha efetiva participao, tanto economicamente, quanto politicamente, na estrutura de poder permeada pela chamada poltica do Caf com leite, quando foi palco da atuao de alguns dos mais poderosos cafeicultores paulistas, os coronis, numa economia forjada pelo trabalho do escravo, substitudo posteriormente pelo imigrante (WALKER, 2000). Com a crise da cafeicultura veio tambm a crise de identidade. A cidade passou por vrias tentativas de recuperao do seu prestgio nacional, intitulando-se a capital do chope, a capital da cultura e, mais recentemente, a capital do agronegcio. Essa necessidade de capitanear, se reverte em situaes potencialmente desastrosas do ponto de vista da histria como a forma cientfica da memria coletiva: a cristalizao do perodo ureo do caf como o nico foro de interesse para a preservao do patrimnio, imbudo da inteno de resgate do poder perdido por uma parcela da populao, ou de outro lado, o absoluto esquecimento das razes histricas, como no Fausto, de Goethe, (GOETHE, 1982) em que parece imprescindvel destruir o velho para construir a sociedade contempornea. Pensar patrimnio cultural quando Ribeiro Preto celebra o seu sesquicentenrio suscita uma srie de reflexes acerca de questes cruciais para o desenvolvimento urbano, a qualidade de vida, a identidade e a participao poltica. Contudo, discutir a importncia da preservao da memria, tanto na dimenso material quanto imaterial, dos vrios grupos formadores de uma comunidade, envolve primordialmente o orgulho que esses grupos tm da sua prpria identidade, o nvel de conhecimento e conscientizao sobre a importncia da valorizao do patrimnio cultural para a sua prpria existncia como cidado, por meio da atuao sobre a memria, trabalhando e mobilizando a mediao da afetividade, de forma que invoque o passado fazendo-o vibrar como se fosse presente [...] defendendo o ser humano do traumatismo da existncia, como um dispositivo de segurana (CHOAY, 1992, p.11-60). 31. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 37 Contudo, a destruio construtiva, embutida de forma virulenta no corpo social ocidental a partir da Revoluo Industrial e consolidada quase como uma tradio com a mundializao do capitalismo, faz com que as aes em prol da preservao do patrimnio cultural paream elementos desconexos de grupos saudosistas compostos por uma elite acadmica que defende a idia de preservao como necessria consolidao da identidade cultural e como um remdio, por vezes amargo, em particular para os interesses econmicos, para a doena social que provoca a perda progressiva das razes histricas, responsvel pela modernizao fustica e pelo conseqente esquecimento coletivo, cujo resultado o cidado que no mais reconhece sua imagem na paisagem, quebrando os vnculos afetivos, to necessrios prtica da cidadania. Nesse contexto, em particular quando se trata de patrimnio edificado e arqueolgico, se de um lado esto os acadmicos, do outro esto os proprietrios, que reivindicam o direito a dispor livremente dos seus bens, contra o que determina a constituio brasileira que privilegia o interesse pblico em relao ao privado, no que se refere ao patrimnio cultural. O peso dessas reivindicaes no raro vem temperado por uma combinao poderosa: interesses econmicos e polticos eleitoreiros. Mesmo existindo um consenso em favor da preservao, por vezes com ares de pesar pelo patrimnio perdido, este sentimento rapidamente suplantado pelo interesse imediatista do viver o hoje sem restries, mesmo que isso tenha como conseqncia a perda da face de humanidade no meio da multido. Esse consenso esbarra e, em alguns casos, compactua, consciente ou inconscientemente com: [...] uma poltica cultural que idolatra a memria sob uma nica memria oficial irremediavelmente comprometida com as formas presentes de dominao, herdadas de um passado ignorado. Fadada repetio e impedida de renovao (CHAU, 1992, p.37). 32. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 38 Ao assumir tal postura a gesto pblica do patrimnio torna-se cmplice do status quo, impedindo a aplicao do que prev o artigo 216 da Constituio de 1988: Constituem patrimnio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referncia identidade, ao, memria dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira [...]. A valorizao do patrimnio sintetiza a necessidade de conservao e restaurao, mas esbarra nos valores do sistema capitalista. O destino das polticas pblicas e a valorizao do patrimnio no caminham dissociados. A comunidade o destino, o patrimnio de todos os cidados. Apreender a amplitude de que cuidar do patrimnio tarefa da populao significa entender o papel do cidado na comunidade qual pertence. Ocupar para preservar no significa transformar em museus ou em centros culturais todos os edifcios tombados. A valorizao do patrimnio cultural e a elaborao de projetos educativos envolvendo a comunidade escolar permite em longo prazo olhar o patrimnio como um instrumento de desenvolvimento local, enriquecendo a dinamicidade na re-criao da guarda da memria. A educao patrimonial consiste num movimento permanente de mudana e transformao para com a comunidade que iniciada numa alfabetizao cultural, capaz de capacitar o cidado para compreender sua identidade cultural e apropriar-se do seu patrimnio individual e coletivo, estabelecendo um procedimento de preservao e identificao cultural. A interao com este mundo social que permite avanar com a percepo do universo por outro prisma, buscando a essncia da identidade do cidado. Um dos caminhos para essa busca realizao de aes educativas voltadas para a populao freqentadora de instituies de memria como museus, arquivos histricos e centros de documentao. 33. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 39 Nos museus, a educao patrimonial permite o enriquecimento da troca de experincias entre o pblico e a equipe educacional. Os museus, de maneira geral, esto direcionando os projetos de educao patrimonial para o pblico escolar. Com a aplicao de polticas pblicas adequadas cresce a insero da comunidade na construo da memria cultural. A insero de projetos educativos patrimoniais pelos cursos de ensino superior tem contribudo para integrar o jovem numa proposta de alfabetizao cultural. A rejeio de alguns jovens em interagir e por outro lado a adeso de outros revela que o caminho longo e cheio de obstculos. Os programas curriculares das reas da Histria e Geografia no ensino mdio e fundamental buscam priorizar a interao do jovem com o estudo de novos temas com pesquisas que incluem a cultura, as idias, os valores cotidianos, ritos, festas, hbitos alimentares, o espao, as diferentes formas que os vrios grupos sociais tem criado para se comunicar. A espacializao dos problemas culturais que buscam integrar o jovem com a educao cultural tem priorizado estgios em museus, arquivos, centros culturais atraindo um nmero ainda pequeno de jovens universitrios como mediadores e educadores culturais. A democratizao desse processo depende em parte da recepo dos projetos educativos que inserem o estudante universitrio no cenrio da comunicao patrimonial. A experincia revela que jovens ao participarem de projetos educativos acabam inseridos na educao cultural, desenvolvendo habilidades capazes de identificar na vida cotidiana o valor da prpria cultura. Nos museus o objetivo da educao criar possibilidades para a comunicao, informao, aprendizado e conseqentemente a construo da cidadania (STUDART, 2004). Dentro desse aspecto, em Ribeiro Preto so desenvolvidos projetos de estgio pelo poder pblico em parceria com universidades, que trabalham com o acervo de museus identificando e catalogando peas de acervo, em bibliotecas, 34. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 40 identificando e catalogando livros raros, em arquivos com fotografias, monitorias, entre outras atividades que jovens estagirios voluntrios ou remunerados esto desenvolvendo junto aos museus, arquivos e casas de cultura do municpio. Contudo, essas aes, muitas vezes descontnuas esto longe de representar uma slida e eficaz poltica patrimonial. Independentemente das escolhas polticas institucionais que vem sendo feitas ao longo desses 150 anos (e antes deles), a construo da identidade cultural do ribeiropretano vm sendo sedimentada paulatinamente. No a identidade forjada artificialmente pela ao dos sujeitos polticos que detm o poder econmico e do Estado e, muitas vezes, almejam uma cultura monoltica, mas a identidade que respeita a diversidade cultural tocada pelo som da viola, contada nos causos do caipira, vivida pela herana africana, lembrada pelos sobrenomes imigrantes e alinhavada pelos vrios ciclos socioeconmicos vivenciados pela cidade, gerando bens culturais materiais e imateriais diversos. Esse processo deveria estar sendo acompanhado pelo amadurecimento da reflexo e dos projetos de educao patrimonial e conseqente compreenso, por parte do ribeiropretano, da importncia das suas razes como parte integrante da sua experincia cultural, imprescindvel na formao do cidado comprometido com a sua histria e, portanto, coma comunidade a qual pertence. ROSA, Llian Rodrigues de Oliveira; FREITAS, Nainra Maria Barbosa. Cultural patrimony: reflections for the sesquicentenrio of Ribeiro Preto. Dialogus. Ribeiro Preto, v.1, n.2, 2006, p. 31-42. ABSTRACT: The preservation of the patrimony is element of security against all form of uniformization of the peoples in an only cultural model. The moment of commemoration of the 150 years of Ribeiro Preto shows important for the reflection on the process of destructive construction 35. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 41 lived by the city, justified for the lack of comprometimento of the population with the preservation practical and aggravated by the lack of one widely consolidated public patrimonial politics. KEYWORDS: cultural patrimony; citizenship; Ribeiro Preto. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ARARIPE, F. M. A. Do patrimnio cultural e seus significados. Transinformao, Campinas, maio/ago., 2004. BASTOS, S. Patrimnio cultural uma metodologia de pesquisa. Revista de Turismo e patrimnio cultural. PASOS. Vol 2, n. 2, p. 257 265, 2004. BELTRO, A. R. Patrimnio cultural: novas fronteiras. Prima@Facie [on line]. Ano1, n.1, jul./dez.2002. BORGES, M. E. B. A pintura na capital do caf. So Paulo: UNESP, 1999. BURKE, P. (org.). A Escrita da Histria. Ed.1. So Paulo: Editora UNESP, 1992. CHAU, M. Poltica cultural, cultura poltica e patrimnio Histrico. In O Direito Memria: patrimnio histrico e cidadania. So Paulo: Secretaria Municipal de Cultura DPH, 1992, p.37 46. Carta de Mar Del Plata sobre patrimnio intangvel. Junho de 1997. Publicao eletrnica do IPHAN, 2004. CHOAY, F. A alegoria do Patrimnio. Trad. Luciano Vieira Machado.So Paulo: UNESP, 2001. GOETHE, J. W. V. Fausto. Trad. Jenny Klabin Segall. So Paulo: Editorora 34, 2004. 36. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.31-42, 2006. 42 LAGES, J. A. Ribeiro Preto: da Figueira Barra do Retiro. Ribeiro Preto: VGA, 1996. LEONEL, M. E. M. Conhecer para preservar, preservar para conhecer: um projeto de educao patrimonial. Braslia: IPHAN, 1995. PIRES, M. J. Lazer e Turismo Cultural. So Paulo: Manole, 2002. Recomendaes de Paris, 17 de outubro de 2003. Publicao eletrnica do IPHAN, 2004. STUDART, D. C. Educao em museus: produto ou processo? Rio de Janeiro, Revista Brasileira de Museus e Museologia, v.1, n.1, 2004. VALADO, V. Memria Arquitetnica de Ribeiro Preto. Dissertao de mestrado apresentada seo de ps-graduao da UNESP Campus de Franca, 1997. WALKER, T. W. e BARBOSA, A. S. Dos coronis metrpole. Ribeiro Preto: Palavra Mgica, 2000. 37. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 43 POLTICAS PBLICAS DE HABITAO POPULAR: OS PAPIS DA COMPANHIA HABITACIONAL REGIONAL DE RIBEIRO PRETO COHAB RP NO DESENVOLVIMENTO URBANO* Silvia Aparecida de Sousa FERNANDES** RESUMO: Buscamos neste artigo analisar a relao existente entre as polticas pblicas de habitao popular formuladas pelo Governo Federal no perodo 1964-2004 e a poltica desenvolvida nos municpios atravs da atuao da Companhia Habitacional Regional de Ribeiro Preto Cohab RP. Essa empresa, vinculada ao governo municipal, tem cumprido o papel de articuladora entre os nveis de governo, no que se refere aos trmites para a obteno de recursos voltados s polticas de habitao, mesmo aps a crise do sistema SFH/BNH. PALAVRAS-CHAVE: Ribeiro Preto; desenvolvimento urbano; habitao popular; companhia habitacional. Introduo A Companhia Habitacional Regional de Ribeiro Preto Cohab RP foi criada em 20 de novembro de 1969, pela Lei n 2301, e tem o municpio de Ribeiro Preto como acionista majoritrio, com 52,79% das * Este texto est baseado numa parte da Tese de Doutorado defendida pela autora na FCL/UNESP/Araraquara e intitulada Poltica habitacional no interior do estado de So Paulo: a territorializao das Companhias Habitacionais. ** Gegrafa. Mestre em Geografia pela FCT/UNESP/Presidente Prudente e Doutora em Sociologia pela FCL/UNESP/Araraquara. Docente do Centro Universitrio Baro de Mau, Ribeiro Preto (SP). 38. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 44 aes. Possui, ao todo, 21 municpios e 17 pessoas fsicas compondo o quadro de acionistas da empresa. Alm de Ribeiro Preto, destacam-se Sertozinho e Orlndia, com 6,81% e 5,10% das aes, respectivamente2. Essa empresa foi criada para cumprir o papel de agente promotor junto ao Banco Nacional da Habitao, atendendo s determinaes do Sistema Financeiro da Habitao. No perodo 1969- 2004 implementou 249 projetos e entregou 73.488 unidades, nmero bastante expressivo.3 O municpio de Ribeiro Preto concentra um tero da produo: 28.291 unidades, distribudas em 60 conjuntos habitacionais, o que permite pensarmos a relao entre a atuao dessa companhia e o desenvolvimento urbano. Para entender a relao entre a criao da empresa, seu perfil de atuao e a articulao de interesses entre os nveis de poder poltico faremos um breve histrico das polticas pblicas de habitao popular no Brasil no perodo analisado, para na seo seguinte analisarmos a produo dessa companhia e sua relao com o poder local. Polticas habitacionais no Brasil: breve contextualizao As polticas habitacionais no Brasil podem ser agrupadas por perodo, segundo suas caractersticas, agentes promotores, instncia decisria e origem dos recursos. Neste artigo apresentaremos as polticas engendradas pelo governo federal no perodo 1964-2004, j que 2 Alm dos municpios de Ribeiro Preto, Sertozinho e Orlndia, fazem parte do grupo de municpios acionistas: Altinpolis, Batatais, Brodowski, Cajuru, Cravinhos, Dumont, Guar; Igaparava, Ituverava; Jardinpolis, Miguelpolis, Pontal, Sales de Oliveira, So Joaquim da Barra, Santa Rosa de Viterbo, Santo Antonio da Alegria, Serrana e Taquaritinga. Destes, destacamos Altinpolis, So Joaquim da Barra e Pontal, com mais de 3% das aes. Os demais tm participao percentual prximo a 1% 3 Quando comparada s demais companhias que atuam no interior do estado de So Paulo (Cohab Bandeirante, Campinas, Bauru, Companhia Regional de Habitao de Interesse Social Crhis, com sede em Araatuba) a empresa que com maior nmero de projetos realizados e unidades entregues. 39. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 45 em 1964 a criao do Sistema Financeiro da Habitao (SFH) e Banco Nacional da Habitao (BNH) representou um marco nas polticas federais de habitao popular. Nesse perodo, a formulao e implementao das polticas de desenvolvimento urbano no pas passaram por vrias modificaes, quanto aos rgos decisores e promotores das polticas, intensidade de produo e grupos de destinao de recursos. Enquanto no perodo 1964-1986, predominam as polticas formuladas pelo BNH, momento em que as Companhias Habitacionais foram criadas para cumprirem o papel de agentes promotores do SFH, o perodo seguinte 1986-2004 caracteriza-se pela reformulao das polticas habitacionais no pas, com a reduo dos financiamentos federais, reestruturao do SFH e estmulo criao de agncias estaduais que cumpram o papel de agentes promotores, desempenhado no perodo anterior pelas Cohabs, ocupando quase que totalmente o lugar dessas empresas na produo de habitao social. Quando se trata da atuao da esfera federal de governo na formulao, regulamentao e implementao de tais polticas, temos assistido desde a segunda metade dos anos 1980, a um processo de descentralizao, repassa-se aos estados e municpios papis antes cumpridos no mbito federal. Muitos autores avaliaram a atuao do BNH no perodo 1964- 1986 (MARICATO, 1987, 2001; RODRIGUES, 1989; VALLADARES, 1980, 1983) e apontaram a incapacidade desse rgo em solucionar o problema da moradia para as famlias de baixa renda. Outros demonstraram que, desde os primrdios da habitao popular como poltica social, a preocupao central no resolver o problema da moradia das classes populares, mas controlar as insatisfaes dos moradores das cidades, alm de garantir a implantao de um modelo de desenvolvimento capitalista altamente excludente (BONDUKI, 1998; OLIVEIRA, 1982; SACHS, 1999). Ribeiro e Azevedo (1996, p.15-16) apontam cinco grandes eixos temticos desenvolvidos pelas pesquisas sobre o tema habitao no 40. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 46 Brasil. O primeiro grupo, a partir da segunda metade da dcada de 1970 abordava os aspectos macroeconmicos. O segundo eixo preocupava-se com os aspectos tcnicos da construo, buscando desvendar as relaes de trabalho e as dimenses tcnicas e econmicas da indstria da construo. O terceiro grupo discutia a construo popular e o padro perifrico de crescimento urbano. O quarto grupo discutia a poltica habitacional, no qual podemos inserir as recentes discusses acerca do processo de descentralizao das polticas habitacionais, e o quinto eixo temtico abordava a produo capitalista da moradia. Trazemos essa classificao com um objetivo didtico, pois bastante comum a presena de questes pontuadas por vrios desses eixos temticos nas anlises sobre o tema habitao popular no Brasil. Acrescentaramos, ainda, a essa classificao, um sexto eixo temtico: a discusso sobre a participao dos movimentos populares na definio das polticas pblicas de habitao, os que abordam a participao social e o envolvimento dos movimentos populares na conquista pela moradia, o que remete aos temas processo construtivo e autogesto, alicerados numa concepo de processo participativo e constituio de cidadania. Para Valladares (1983), possvel distinguir-se quatro perodos da produo habitacional do BNH, de acordo com a organizao do banco e das funes que cumpriu. Na primeira fase, de 1964 a 1967, ocorreram a implantao e a estruturao do BNH como rgo central do SFH. Na segunda fase, de 1967 a 1971, ocorreu a ampliao das funes do banco para desenvolvimento urbano e a criao de programas especficos para saneamento, como o Plano Nacional de Saneamento (Planasa). Na terceira fase, 1971 a 1979 (mais longa que os perodos anteriores), a transformao do BNH em banco de segunda linha e a estruturao de uma rede de agentes pblicos e privados que intermediavam a relao entre o muturio e o banco, permitiu a ampliao da oferta de unidades habitacionais e consolidao das polticas de desenvolvimento urbano. Nesse momento tiveram grande importncia na definio do perfil de atuao do banco os programas Comunidade Urbana para Recuperao Acelerada (CURA) e o Planhap. 41. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 47 A partir de 1979, tem-se a quarta fase de atuao do BNH, com o lanamento de programas voltados populao de baixa renda, como o Programa de Erradicao de Habitao Subintegrada (Promorar), destinado urbanizao de favelas e autoconstruo assistida e o Programa Nacional de Autoconstruo Assistida, o Joo-de-Barro. Podemos concluir que o BNH, embora apresentasse entre seus objetivos atender aos segmentos de menores rendimentos no mercado habitacional, esteve longe de alcan-lo, devido a problemas de ordem estrutural e conjuntural. Ao assumir, logo no incio de sua atuao, a funo de desenvolvimento urbano, redirecionar constantemente os recursos a serem aplicados para o mercado mdio e desvincular o sistema de amortizao do sistema de reajuste do saldo devedor do financiamento (problemas estruturais), aliado aos cenrios de inflao, arrochos salariais e grupos de interesses, acabou distanciando-se da poltica a que se props. A contribuio significativa da poltica formulada no perodo ps 1964 , contudo, a consolidao da concepo de casa prpria e unifamiliar como modelo de moradia no pas. Aps o BNH, o acesso moradia para a populao de baixa renda ficou ainda mais difcil. Para Ribeiro e Azevedo (1996, p. 23), nos anos 1990 o sonho da casa prpria termina, inclusive para a maioria da classe mdia. Isso porque, num contexto de reforma institucional do Estado desenvolvimentista e de crescimento econmico nos anos 1980 e 1990, bastante inferiores ao apresentado na dcada de 1970, foi impossvel retomar as atividades imobilirias de maneira similar ao perodo de expanso do SFH. As companhias habitacionais, concebidas como agentes promotores do Banco Nacional de Habitao tm uma atuao compatvel com as polticas emanadas desse rgo e, posteriormente, com as definidas por outras instncias do Governo Federal, como o Conselho Curador do Fundo de Garantia por Tempo de Servio e o Ministrio das Cidades. Assim, vivenciam uma crise iniciada na dcada de 1980, embora a extino do banco no levou ao encerramento das atividades dessas companhias, e sim promoveu a reestruturao das 42. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 48 mesmas. Um dos objetivos deste trabalho apontar as estratgias utilizadas pela Cohab Ribeiro Preto para se manter financeira e politicamente vivel na dcada de 1990, com parcos recursos a serem investidos. Podemos dizer que, no perodo que vai de 1985 a 1994, assistimos no Brasil a um processo de desarticulao da poltica de habitao popular, com tentativas frustradas de formulao de um novo modelo de poltica, devido crise de arrecadao do FGTS, que resultaram na formao de um grande saldo negativo na arrecadao lquida (chamada de rombo do FGTS). No Governo Itamar Franco (1992- 1994), a opo foi por priorizar a concluso das obras em execuo e projetos j aprovados no governo anterior pelo Plano de Ao Imediata para Habitao (PAIH). Houve a criao de dois novos programas: o Habitar Brasil e o Morar Municpio4, com recursos oriundos do Imposto Provisrio sobre Movimentaes Financeiras (IPMF), buscando implementar outra fonte de captao de recursos. Apenas em 1995 que so retomados os financiamentos de habitao popular com recursos oriundos do FGTS, com os programas Pr-moradia, Carta de Crdito do FGTS e saneamento. Estes programas trazem uma inovao na comercializao das unidades habitacionais: a Caixa Econmica Federal financia at 85% do valor do imvel e quem efetiva o projeto o muturio, seja atravs da aquisio do imvel pronto (novo ou usado) ou sua construo, quando proprietrio de um lote. Para realizar a transao imobiliria, concedida carta de inteno de crdito. Alm dessas mudanas de cunho organizacional e da aplicao dos recursos, novas instncias do poder decisrio foram institudas, com a existncia de um colegiado (o Conselho Curador do FGTS) que tm por objetivo definir as diretrizes da poltica e alocar recursos. Os caminhos seguidos pela poltica habitacional no Brasil, nas ltimas dcadas, no foram capazes de assegurar, atravs das aes implementadas ou das tentativas de elaborao de um novo modelo 4 Programas existentes at 2005, mas que em 2003 receberam nova roupagem e designao. 43. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 49 estatal de produo de moradias, a construo ideolgica que estava sendo formulada desde a dcada de 1940. Ao contrrio, busca-se substituir o sonho da casa prpria, que representava a estabilidade e a segurana do abrigo, pelo sonho de consumo dos servios educacionais, que possam garantir a (iluso da) ascenso social, entendida como o acesso a bens de consumo (durveis ou no). Nesse contexto, parte da proviso de habitaes no mercado, entendidas como atribuies do Estado durante o perodo desenvolvimentista, ser oferecida por empresas privadas de construo civil, que implementam conjuntos habitacionais no institucionais, localizados tambm na periferia das cidades, constitudos por unidades habitacionais unifamiliares ou edifcios com at quatro pavimentos, destinados ao mercado de renda mdia. A atuao da Cohab-RP Desde a entrega do primeiro conjunto habitacional pela Cohab- RP em Ribeiro Preto em 1973, o Castelo Branco I com 181 unidades, a produo de habitao popular por essa empresa tem sido significativa. Mesmo nos momentos de crise do BNH ou na dcada de 1990, quando houve significativa reduo da produo das Cohabs, manteve a entrega de unidades, exceto nos anos de 1975 e 1999, o que denota a grande dinamicidade da empresa. Uma das caractersticas que auxiliou no desenho desse perfil de atuao, foi a produo em parcerias, significativa na dcada de 1990. O municpio de Ribeiro Preto concentra um tero da produo: 28.291 unidades, distribudas em 60 conjuntos habitacionais, o que representa 38,50% do total de unidades entregues (Apndice 1). O municpio de Sertozinho vem em seguida, com 5,38% e 3.953 casas. Alm desses, apenas Mococa conta com percentual superior a 3% (3,25%) e os demais municpios atendidos apresentam percentual inferior. 44. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 50 Temos como caracterstica da produo da Cohab Ribeiro Preto, a realizao de projetos com pequeno nmero de unidades, distribuda por um conjunto de municpios com pequena populao urbana. Essa pulverizao da produo com mais de um projeto implementado no mesmo municpio corresponde articulao desta empresa com o poder local, atendendo aos interesses da administrao municipal e cumprindo o papel de suporte reproduo da fora de trabalho, numa regio caracterizada pela agroindstria sucroalcooleira a partir dos anos 1970. Cumpre, portanto, os objetivos da poltica habitacional desenvolvida pelo BNH desde 1964, auxiliando na acumulao capitalista. A construo de unidades habitacionais, em pequenas cidades, auxilia no processo de reproduo da fora de trabalho e na permanncia da populao nesses ncleos locais, que desempenham poucas funes urbanas e se caracterizam economicamente pela explorao da atividade agrcola, abrigando um contingente de trabalhadores rurais, expulsos do campo, e que hoje se fixam em pequenas cidades. (BERNADELLI, 2004, p. 336). Com uma atuao dirigida principalmente s regies Norte e Nordeste do estado, a territorializao da Cohab Ribeiro Preto evidencia o atendimento a municpios com pequena populao e com a implementao de poucas unidades, principalmente ao se afastar do municpio sede. A produo de maior nmero de projetos e unidades entregues em municpios com pequena populao urbana, que no apresentam o perfil das cidades mdias, como Jaboticabal, Mococa, Batatais, Olmpia, So Joaquim da Barra, Igarapava e Fernandpolis, pode ser entendida a partir da articulao com as administraes municipais e o papel desempenhado por esses municpios na economia regional como j destacado. A produo no municpio de Sertozinho, por outro lado, pode ser explicada pela concentrao industrial do municpio, alm da proximidade fsico-territorial e a participao como acionista da Cohab Ribeiro Preto. possvel apontar que o governo local de Ribeiro Preto, 45. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 51 ao distribuir o capital da empresa por vrios municpios acionistas, sem, contudo, perder as atribuies e o poder poltico como acionista majoritrio, fez uso de uma estratgia poltica que possibilitou a criao de fortes vnculos desses municpios Cohab Ribeiro Preto. Assegura, dessa maneira, uma rea de atuao empresa e oferece, em contrapartida, ao municpio com pequena populao urbana, o aparato tcnico para o atendimento demanda por habitao social. Nos primeiros anos de atuao dessa companhia, os projetos implementados delineiam esse perfil, ou seja, privilegiaram o atendimento aos municpios acionistas. Dos 33 projetos entregues entre 1972 e 1979, apenas 5 no se dirigiram aos municpios acionistas. Dos conjuntos habitacionais entregues nesse perodo, apenas os que foram implementados em Ribeiro Preto apresentam grande nmero de unidades, considerados em seu conjunto. o caso do Jardim Castelo Branco, realizado em 3 fases que, somadas, totalizam 992 unidades. caracterstica dos anos 1980 a produo de conjuntos com nmero superior a 1000 unidades habitacionais, em geral casas trreas e implementadas apenas no municpio sede5. Para os demais municpios permanece a realizao de projetos menores, considerados mais fceis de serem implantados, do ponto de vista tcnico, pois exigem menores reas, reduzindo os investimentos da prefeitura municipal na doao do terreno e instalao de infra-estrutura. Atendem tambm a uma populao mais reduzida, adequando-se s demandas das pequenas cidades6. Assim como as demais companhias do interior do estado de So Paulo, o incio da dcada de 1980 o perodo mais dinmico da Cohab Ribeiro Preto, em nmeros de projetos realizados e unidades habitacionais entregues. Em apenas 3 anos, entre 1980 e 1982, foram 5 Temos como exemplo os conjuntos habitacionais Quintino Facci II, Antonio Marincek, Adelino Simioni I e II e o Avelino Alves Palma. 6 Conforme entrevista realizada na Cohab Ribeiro Preto, os projetos menores tm menores custos de implantao e so mais viveis tecnicamente, pois facilitam os processos de implantao, fiscalizao e comercializao das unidades. 46. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 52 implementados 100 conjuntos habitacionais, atendendo a 75 municpios. Destaca-se tambm, o ano de 1994, com 21 projetos totalizando 8.028 unidades entregues, o que representa 10,92% do total da populao da empresa. Destacamos os anos de 1981-1986 e 1987/1994, com 40% e 36% do total de unidades entregues, respectivamente. H uma significativa queda no perodo seguinte, 1995-2004, com 7% do total. (Grfico 1). Lembramos que, no mesmo perodo, outras Cohabs no tiveram qualquer nova incorporao, em decorrncia da impossibilidade de obteno de recursos junto ao FGTS (FERNANDES, 2005). GRFICO 1 Cohab Ribeiro Preto Produo por perodo de atuao, segundo o nmero de unidades 1970-2004 Fonte: Pesquisa de campo Apesar da crise do Sistema Financeiro da Habitao e a reduo nos financiamentos federais, na segunda metade da dcada de 1990, a produo da Cohab-RP foi assegurada pela vinculao dessa companhia administrao municipal de Ribeiro Preto, na realizao de projetos de regularizao fundiria e interveno em favelas (Tabela 1), alm das parcerias com a CDHU e iniciativa privada, que contaram 1% 16% 40% 36% 7% 1970 1974 1975 1980 1981 1986 1987 1994 1995 2004 47. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 53 com financiamento pela Caixa Econmica Federal, atravs do programa Carta de Crdito Associativo. TABELA 1 Cohab Ribeiro Preto Lotes urbanizados 2004 N MUNICPIO NOME DO LOTEAMENTO N DE UNIDADES ANO DE ENTREGA 01 Ribeiro Preto Jd. Florestan Fernandes 1541 1995/1996 02 Ribeiro Preto Jd. Diva Tarl de Carvalho 1853 1995 03 Ribeiro Preto Jd. Parque dos Flamboyans 1391 1997 04 Ribeiro Preto Jd. Parque dos Servidores 1883 1997 05 Sertozinho Jd. Luiz Carlos Zequim 394 1997 06 Ribeiro Preto Jd. Ipiranga 227 1997 07 Franca Jd. Panorama 71 1996 08 Ribeiro Preto Jd. Oreste Lopes de Camargo 904 1994 09 Ribeiro Preto Jd. Heitor Rigon 1756 1994 10 Ribeiro Preto Jd. Lo Gomes de Moraes 30 2004 TOTAL 10050 Fonte: Pesquisa de campo, Cohab-RP Mesmo com as dificuldades impostas pelo Governo Federal s Cohabs, na obteno de recursos para o financiamento habitacional, a partir de 1993, as parcerias com o capital privado e administrao municipal tm possibilitado Cohab Ribeiro Preto manter sua produo. 48. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 54 Essa empresa tambm realizou projetos em parceria com a CDHU, para construo de unidades habitacionais em mutiro. o caso do Jardim Paiva, implementado na cidade de Ribeiro Preto a partir de 1992, em 4 etapas. O comrcio de lotes urbanizados, em projetos de iniciativa de empresas construtoras privadas em que a Cohab participa apenas com a sua carteira de clientes7 na fase de comercializao dos imveis, tambm tem sido uma estratgia utilizada pela Cohab Ribeiro Preto nos anos recentes. A Tabela 1 evidencia que, a partir de 1995, a venda de lotes urbanizados em que a total responsabilidade pelo empreendimento do incorporador imobilirio, neste caso a empresa construtora, assegura uma produo significativa. Nesses projetos, a Cohab exerce o papel de corretor imobilirio, realizando um cadastro dos interessados na aquisio dos lotes urbanizados, com renda familiar mensal a partir de 2 salrios mnimos, e posterior comercializao. Recebe, por isso, uma taxa de administrao cujo percentual negociado em cada empreendimento. Para cumprir tal atribuio foi necessrio que a empresa passasse por uma reestruturao interna, criando um setor responsvel por parcerias, que junto com o setor de projetos tcnicos viabiliza, essas realizaes. Cabe ressaltar que, apesar dessas tentativas, esses projetos no garantem grande volume de recursos Cohab, a ponto de impedirem a vulnerabilidade financeira da empresa. Nesses projetos, fica bastante evidente o comprometimento das Companhias Habitacionais junto s administraes municipais, garantindo visibilidade aos projetos do poder pblico municipal, aps a extino do BNH. 7 Conforme entrevista realizada na Cohab Ribeiro Preto, em 15 de setembro de 2004. (RESTINO, 2004). 49. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 55 Consideraes Finais Embora as Cohabs sejam criadas com estatuto semelhante e visando ao mesmo objetivo, isto , atender aos municpios no provimento de unidades habitacionais, possvel afirmar que, em sua territorializao, lanam mo de diversas estratgias polticas que resultaram em uma re-regionalizao do estado de So Paulo, no seguindo a regio administrativa, que parece ter orientado a criao das companhias no estado, mas a sua prpria articulao de interesses. A maneira como as Companhias Habitacionais foram constitudas atrela-as a dois nveis de poder decisrio: o Governo Federal, que define as diretrizes e os recursos para habitao popular, e o executivo municipal, em particular dos municpios acionistas das empresas, pois nomeiam o presidente. Dessa forma, a Cohab liga-se diretamente administrao pblica local, apesar de no ter o estatuto de autarquia municipal e sim de empresa de economia mista. Com isso, o privilegiamento dos interesses do municpio sede no encaminhamento dos projetos e na realizao dos empreendimentos. Assim, consideramos em nossa anlise a varivel municpios acionistas como indicativa da articulao de interesses entre as diretrizes da empresa e a prefeitura municipal, na definio dos projetos realizados. na primeira metade da dcada de 1980 que se concentra o maior nmero de projetos e unidades implementadas pela Cohab RP. Isso decorre, a nosso ver, de dois fatores: i) a entrega de conjuntos iniciados na dcada de 1970; ii) a existncia de programas alternativos veiculados pelo BNH, que visavam ampliao da oferta de unidades de habitao social mediante a reduo do custo final do projeto e tiveram, por conseqncia, a reduo da rea construda e da qualidade do imvel, alm da nfase aos projetos de construo por mutiro ou autoconstruo. Isso se constitui num paradoxo da poltica federal de habitao, no momento em que se evidenciam os sinais de crise do sistema de financiamento do Banco Nacional de Habitao e inmeras 50. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 56 crticas lhe so dirigidas por privilegiar investimentos em obras de desenvolvimento e saneamento urbano. Consideramos importante ressaltar que, apesar de uma produo mais significativa nos anos destacados, o que marca a atuao da Cohab Ribeiro Preto o carter contnuo das atividades, com a entrega de pelo menos um conjunto habitacional por ano, mesmo nos perodos de crise do Sistema Financeiro da Habitao. O perfil de atuao da Cohab Ribeiro Preto revelador e nos auxilia a construir a seguinte tese: se por um lado, as Companhias Habitacionais so dependentes de polticas e recursos definidos pela instncia federal de poder, por outro, estabelecem estratgias de atuao permeadas pela articulao de interesses entre o poder local e os representantes do setor privado. Assim, apesar do delineamento da poltica federal de descentralizao das polticas habitacionais e excluso das Companhias Habitacionais do processo de implementao de projetos com recursos federais, em vigor desde a dcada de 1990, com o objetivo de inviabilizar poltica e financeiramente a atuao dessas companhias, assiste-se, a partir da segunda metade dessa dcada, a um novo arranjo poltico, com a incorporao de novos passos ao minueto da poltica habitacional brasileira, em que as Cohabs buscam novos parceiros na realizao de seus projetos e reafirmam seu papel nas polticas de desenvolvimento local. Dentre as estratgias utilizadas pela Cohab Ribeiro Preto, que corroboram essa afirmao, destacamos: i) o fortalecimento da articulao com as administraes municipais na definio de polticas locais de habitao popular em que a companhia participe como agente promotor, definindo parcerias com empresas construtoras privadas. Nesse caso, as Cohabs participam com os conhecimentos tcnicos adquiridos na definio da demanda, comercializao das unidades e administrao do contrato. ii) parcerias estabelecidas diretamente com o poder pblico municipal, em projetos emergenciais como a regularizao fundiria e a interveno em favelas, ou atravs de programas federais, 51. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 57 como o Programa de Arrendamento Residencial. Este programa, que inova a poltica habitacional no perodo analisado neste artigo, com a oferta de imveis para arrendamento, oferecendo a opo de compra do imvel aps o final do contrato tem possibilitado novos empreendimentos para as Cohabs Bauru, Campinas e Ribeiro Preto, em parceria com as administraes municipais, uma vez que os recursos do programa so dirigidos aos municpios e no s Cohabs. iii) reestruturao administrativa, com a reduo do nmero de funcionrios das empresas e tentativa de reduo da inadimplncia, visando reduo do dficit fiscal. Esta estratgia objetiva, por um lado, a viabilidade financeira da empresa, e, por outro lado, garantir a permanncia dos seus papis poltico-institucionais. A partir desses apontamentos, possvel dizer que mesmo com as diretrizes de descentralizao da poltica habitacional, estabelecidas pelo Governo Federal, desde a segunda metade da dcada de 1980, que incluem a proposta de encerramento das atividades das Cohabs enquanto agentes promotores h a manuteno dos papis dessas empresas, quando vinculadas diretamente ao poder local, apesar da reduo dos empreendimentos realizados. Na concepo dos rgos centrais, essas companhias foram criadas para atuar como agentes financeiros e promotores do BNH e suas funes deveriam ser encerradas junto com o banco. As medidas tomadas durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso tanto com a aprovao da Lei 10.150, de 22 de dezembro de 2000, que contribuiu com essa poltica na medida em que permitiu a quitao dos financiamentos dos contratos cobertos pelo FCVS, assinados at 31 de dezembro de 1987, e a incapacitao das Cohabs na obteno de recursos do FGTS, em 1993, apontam nessa direo. Essa perspectiva nos leva a concluir: se, por um lado, as Companhias Habitacionais so dependentes de polticas e recursos definidos pela instncia federal de poder, o que as tornam vulnerveis s polticas engendradas nessa esfera do poder decisrio, por outro, estabelecem estratgias de atuao permeadas pela articulao de 52. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 58 interesses com o poder local, visando perpetuao de seu papel institucional e de sua existncia como empresas. Destarte, com a poltica federal de descentralizao das polticas sociais e excluso das Companhias Habitacionais como agentes promotores e financeiros, em vigor desde a dcada de 1990, assiste-se configurao de um novo arranjo poltico, em que a Cohab Ribeiro Preto busca novos parceiros na realizao de seus projetos e reafirma seu papel nas polticas de desenvolvimento local. FERNANDES, Silvia Aparecida de Sousa. Public politics of popular habitation: the papers of regional company habitacional of Ribeiro Preto COHAB RP in the urban development. Dialogus. Ribeiro Preto, v.1, n.2, 2006, p.43-63. ABSTRACT: We search in this article to analyze the existing relation enters the public politics of popular habitation formulated by the Federal Government in the period the 1964-2004 and politics developed in the cities through the performance of Regional the Habitacional Company of Ribeiro Preto - Cohab RP. This company, tied with the municipal government, has fulfilled the articuladora paper enters the government levels, as for the proceedings for the attainment of resources directed to the habitation politics, exactly after the crisis of system SFH/BNH. KEYWORDS: Ribeiro Preto; urban development; popular habitation; habitacional company. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS AZEVEDO, S.; ANDRADE, L. A. G. Habitao e poder: da Fundao da Casa Popular ao Banco Nacional da Habitao. Rio de Janeiro: Zahar, 1982. 53. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 59 BERNARDELLI, M. L. F. H. Pequenas cidades na regio de Catanduva-SP: papis urbanos, reproduo social e produo de moradias. 2004. Tese (Doutorado em Geografia) Faculdade de Cincias e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2004. BONDUKI, N. Origens da habitao social no Brasil. anlise social: Revista do Instituto de Cincias Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, v. XXIX, n. 127, p. 711-732, 1994b. BRASIL. Ministrio das Cidades. Relatrio de Gesto exerccio 2003. Braslia, 2004a. Disponvel em: http://www.mte.gov.br/Menu/Publicacoes/relaGestao/2002.asp Acesso em: 05 fev. 2005. CARDOSO, A. L. Poltica habitacional: a descentralizao perversa. In: Planejamento e territrio. Ensaios sobre a desigualdade. Cadernos IPPUR/UFRJ. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ, ano XV, n.2, ago-dez/2001/ano XVI, n.1, p. 105-121, jan- jul/2002. FERNANDES, S. A. S. Poltica habitacional no interior do estado de So Paulo: a territorializao das Companhias Habitacionais. 2005. Tese (Doutorado em Sociologia) Faculdade de Cincias e Letras, Universidade Estadual Paulista, Araraquara, 2005. GAP Grupo de Arquitetura e Planejamento. Habitao popular: inventrio da ao governamental. Rio de Janeiro: FINEP, 1985. MARICATO, E. Poltica Habitacional no Regime Militar: do milagre brasileiro crise econmica. Petrpolis: Vozes, 1987. MARICATO, E. Brasil, cidades. alternativas para a crise urbana. Petrpolis: Vozes, 2001. MELO, M. A. B. A dcada perdida: globalizao, crise do Estado e metrpoles no Brasil. In: GONALVES, M. F. O novo Brasil urbano: 54. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 60 impasses, dilemas, perspectivas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1995, p. 249-60. RIBEIRO, L. C. Q.; AZEVEDO, S. L. A produo da moradia nas grandes cidades: dinmica e impasses. In: RIBEIRO, L. C. Q.; AZEVEDO, S. L. (org.) A crise da moradia nas grandes cidades: da questo da habitao reforma urbana. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 1996, p.13-32. RODRIGUES, A. M. Na procura do lugar o encontro da identidade: um estudo do processo de ocupao de terras-Osasco. 1988. Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade Filosofia Letras e Cincias Humanas, Universidade de So Paulo, So Paulo, 1988. SACHS, C. So Paulo: polticas pblicas e habitao popular. So Paulo: Editoda da Universidade de So Paulo, 1999. SANTOS, M. Por uma economia poltica da cidade. So Paulo: Hucitec/Educ, 1994. VALLADARES, L. P. (org.) Habitao em questo. Rio de Janeiro: Zahar, 1980. ___. (Org.) Repensando a habitao no Brasil. Rio de Janeiro: Zahar, 1983. APNDICES: Apndice 1: Cohab Ribeiro Preto Produo por municpio 2004 N MUNICPIO N DE CONJUNTOS % TOTAL UNIDADES % 01 Altair 02 0,80 108 0,15 02 Altinpolis 03 1,20 338 0,46 03 Americana 02 0,80 944 1,29 04 Araraquara 01 0,40 500 0,69 55. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 61 05 Bady Bassitt 01 0,40 64 0,09 06 Blsamo 01 0,40 110 0,15 07 Barretos 01 0,40 378 0,52 08 Barrinha 02 0,80 572 0,78 09 Batatais 06 2,39 1666 2,27 10 Bebedouro 03 1,20 1031 1,41 11 Brodowski 04 1,60 965 1,32 12 Cajuru 02 1,20 362 0,50 13 Candido Rodrigues 01 0,40 70 0,10 14 Cardoso 01 0,40 110 0,15 15 Catanduva 03 1,20 894 1,22 16 Colina 01 0,40 268 0,37 17 Cravinhos 06 2,39 1.293 1,76 18 Cristais Paulista 02 0,80 181 0,25 19 Dumont 01 0,40 139 0,19 20 Estrela DOeste 01 0,40 53 0,08 21 Fernandpolis 02 0,80 1.054 1,44 22 Franca 04 1,60 1.781 2,43 23 Guar 04 1,60 465 0,66 24 Guaraci 02 0,80 220 0,30 25 Guariba 01 0,40 482 0,66 26 Ibat 01 0,40 306 0,42 27 Igarapava 07 2,80 1.361 1,86 28 Itpolis 02 0,80 232 0,32 29 Itirapu 01 0,40 118 0,17 30 Ituverava 04 1,60 574 0,79 31 Jaborandi 01 0,40 66 0,09 32 Jaboticabal 04 1,60 1.545 2,11 33 Jales 02 0,80 682 0,93 34 Jardinpolis 04 1,60 725 0,99 35 Luis Antonio 03 1,20 443 0,61 36 Macednia 01 0,40 114 0,16 56. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 62 37 Miguelpolis 01 0,40 129 0,18 38 Mira Estrela 01 0,40 94 0,13 39 Mococa 05 2,00 2.391 3,26 40 Monte Alto 03 1,20 1.221 1,67 41 Morro Agudo 02 0,80 330 0,44 42 Neves Paulista 01 0,40 361 0,49 43 Nova Aliana 01 0,40 128 0,17 44 Nova Granada 02 0,80 197 0,26 45 Nuporanga 01 0,40 60 0,08 46 Olmpia 04 1,60 1.566 2,13 47 Orlndia 05 2,00 695 0,94 48 Palestina 03 1,20 346 0,47 49 Paraso 01 0,40 232 0,31 50 Paranapu 01 0,40 60 0,08 51 Patrocnio Paulista 02 0,80 243 0,33 52 Paulo de Faria 01 0,40 40 0,05 53 Pindorama 03 1,20 462 0,62 54 Pirangi 02 0,80 172 0,23 55 Pirassununga 02 0,80 884 1,20 56 Pitangueiras 04 1,60 815 1,10 57 Porto Ferreira 01 0,40 304 0,41 58 Potirendaba 01 0,40 113 0,15 59 Pradpolis 01 0,40 200 0,27 60 Ribeiro Preto 60 24,02 28291 38,49 61 Rinco 01 0,40 93 0,12 62 Riolndia 02 0,80 243 0,33 63 Sales de Oliveira 01 0,40 85 0,11 64 Santa F do Sul 01 0,40 558 0,75 65 Santa Rosa de Viterbo 05 2,00 711 0,96 66 Santo Antonio 01 0,40 120 0,16 57. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.43-63, 2006. 63 da Alegria 67 So Carlos 03 1,20 1590 2,16 68 So Joaquim da Barra 03 1,20 1463 1,99 69 So Simo 04 1,60 697 0,94 70 Serrana 02 0,80 398 0,54 71 Sertozinho 09 3,60 3953 5,37 72 Severnia 02 0,80 380 0,51 73 Santa Cruz das Palmeiras 05 2,00 908 1,23 74 Tabatinga 01 0,40 123 0,16 75 Tamba 03 1,20 649 0,88 76 Tarum 01 0,40 337 0,45 77 Terra Roxa 01 0,40 84 0,11 78 Turmalina 02 0,80 144 0,19 79 Urnia 01 0,40 93 0,12 80 Vargem Grande do Sul 01 0,40 183 0,24 81 Viradouro 04 1,60 605 0,82 82 Votuporanga 01 0,40 523 0,71 TOTAL 249 100,00 73488 100,00 Fonte: Pesquisa de campo 58. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.65-84, 2006. 65 A BACIA HIDROGRFICA COMO UNIDADE TERRITORIAL PARA O PLANEJAMENTO E GESTO AMBIENTAL: ESTUDO DA BACIA HIDROGRFICA DO RIBEIRO PRETO NO MUNICPIO DE RIBEIRO PRETO - SP Gabriel Vendruscolo de FREITAS* RESUMO: Pretende-se com este artigo apresentar uma metodologia de trabalho que estabelece a bacia hidrogrfica como unidade de planejamento e gesto ambiental, as vantagens e desvantagens desta abordagem e algumas tcnicas para realizao do diagnstico fsico de bacias utilizando como exemplo a rea de drenagem do ribeiro Preto e das sub-bacias dos crregos Laureano, Retiro Saudoso, Tanquinho e dos Campos, no municpio de Ribeiro Preto SP. PALAVRAS-CHAVE: Planejamento, Gesto Ambiental, Bacia Hidrogrfica Introduo O desenvolvimento urbano desse final de sculo XX tem produzido impactos significativos sobre a qualidade de vida nas cidades de mdio porte e neste contexto insere-se o municpio de Ribeiro Preto, pertencendo uma das regies de maior desenvolvimento do Estado de So Paulo e do Brasil. A cidade cresce rapidamente e horizontalmente, * Arquiteto e Urbanista. Especialista em geoprocessamento pela UFSCAR. Docente do Centro Universitrio Baro de Mau, Ribeiro Preto (SP). 59. DIALOGUS, Ribeiro Preto, v.1, n.2, p.65-84, 2006. 66 vendo a