diálogos 5 - agosto de 2012

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Diálogos do Fórum DRS Desenvolvimento Rural, Território e Políticas Públicas de enfrentamento da Pobreza Edição 5 Ano 1 Agosto/2012 Jerônimo Souza Sérgio Leite Philippe Bonnal Joaquim Soriano

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Desenvolvimento Rural, Território e Políticas Públicas de Enfrentamento da Pobreza

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Page 1: Diálogos 5 - Agosto de 2012

Diálogos do Fórum DRS

Desenvolvimento Rural, Território e Políticas Públicas de

enfrentamento da Pobreza

Edição 5

Ano 1

Agosto/2012

Jerônimo Souza

Sérgio LeitePhilippe Bonnal

Joaquim Soriano

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Coordenador Executivo do Fórum DRSCarlos Miranda

Assessor Técnico do Fórum DRSBreno Tiburcio

Assistente Técnico do Fórum DRSRenato Carvalho

Projeto Gráfico e EditoraçãoPatricia Porto

Jornalista André Kauric

FotosArquivo IICA

Representação do IICA no BrasilSHIS QI 03, Lote A, Bloco F, Centro Empresarial TerracottaCEP 71605-450, Brasília-DF, Brasil.

Visite nossos Sites:www.iicaforumdrs.org.br www.iica.org.br

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ExpedienteEsta publicação está disponível em formato eletrônico (PDF) no site: www.iicaforumdrs.org.br

Fale Conosco55 61 2106.5477/ 5417 / [email protected]@iica.int

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ApresentaçãoA série “Diálogos do Fórum DRS” é uma publicação exclusiva do Fórum Per-manente de Desenvolvimento Rural Sustentável (Fórum DRS). Tem origem na seção “Diálogos”, do Boletim Informativo do Fórum DRS, que brindou durante anos o leitor com entrevistas e debates com personalidades relacionadas ao tema DRS. A série “Diálogos do Fórum” ganhou espaço exclusivo nas publica-ções do Fórum DRS desde março de 2012.

Em novo formato, a série oferece ao leitor conteúdo rico e exclusivo, com pon-tos de vista distintos, permitindo que você tenha um panorama mais amplo à respeito dos temas relacionados ao DRS. A interação marca este novo espa-ço, já que os usuários podem interagir com os participantes dos diálogos por meio do site do Fórum DRS.

Diálogos do Fórum DRS

Desenvolvimento Rural, Território e Políticas Públicas de

enfrentamento da Pobreza

Edição 5

Ano 1

Agosto/2012

Jerônimo Souza

Sérgio LeitePhilippe Bonnal

Joaquim Soriano

Nesta EdiçãoO quinto número da série Diálogos do Fórum DRS reune os gestores públicos Joaquim Soriano e Je-rônimo Souza, do MDA e os pesquisadores e aca-dêmicos Sérgio Leite e Philippe Bonnal, abordan-do temáticas relacionadas ao desenvolvimento rural, território e as políticas públicas de enfren-tamento da pobreza. Os debates focalizaram os desafios e as iniciativas governamentais em curso para universalizar as ações de combate ä pobreza, tendo como estratégia o fortalecimento da política de desenvolvimento territorial.

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Desenvolvimento Rural, Território e Políticas Públicas

de enfrentamento da Pobreza

A quinta edição da série Diálogos do Fórum aborda o tema Desenvolvimento

Rural, Território e Políticas Públicas de enfrentamento da Pobreza. Joaquim

Calheiros Soriano – coordenador no Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvi-

mento Rural (NEAD), do Ministério do Desnvolvimento Agrário (MDA); Jeronimo

Rodrigues Souza – secretário de desenvolvimento territorial do ministério do

desenvolvimento agrário (SDT/MDA); Philippe Bonnal – Pesquisador e consultor

da Centre de Coopération Internationale de Recherche Agronomique Pour Le

Dével; e Sergio Leite – coordenador do OPPA/CPDA/UFRRJ). Abordam a temática

de políticas públicas e enfrentamento da pobreza a partir da análise de diversas

políticas, como Brasil sem Miséria, territórios da cidadania e outros.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – Vamos começar por certa provocação que o

Sérgio fez hoje de manhã que é o seguinte: a gente tinha o programa Territórios

Rurais, levado fundamentalmente a cabo pelo MDA. Tivemos uma experiência de

dois anos, três anos do Território da Cidadania. Mas para o Território da Cida-

dania, o novo governo iniciou debatendo o programa como política de combate

à pobreza. Teve uma memorável reunião com a então presidenta eleita e não

empossada que falava que o programa Território da Cidadania era um piloto, era

um bebê, tinha que cuidar bem. Mas isso era um caminho. Isso ela fazendo uma

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Diálogos do Fórum DRS

intervenção política boa sobre combate à pobreza.

Aí começa o debate na transição, depois no início

do governo, do Brasil de Miséria. Aí o Brasil sem

Miséria Rural, vou fazer esse corte, que mantém

ainda na sua política, no seu desenvolvimento o

recorte territorial. Seleciona primeiro as áreas,

etc. e tal.

Mas qual é o duro? É que nosso Programa de

Combate à Miséria, não atingiu nesse conceito

de miséria absoluta. Boa parte do que ocorreu no

Brasil nos últimos anos, a brutal ascensão social,

aquela camada do povo que por conta fundamen-

talmente do aumento do rendimento do salário e

transferência direta de renda. O Bolsa Família [...}.

Tem uma classe que não vai. Esses muito pobres

não se movimentam, não se movimentaram para

que os movimentos não tenham uma ação mais

efetiva, uma ação mais direta do governo do Es-

tado brasileiro. Esse é o grande mérito do Brasil

Sem Miséria. Procurar lá no fundo. No caso do

rural, com participação mais efetiva do MDA, vo-

cês conhecem bem essa ideia de utilizar os meca-

nismos de acesso, a contratação muito específica

de que publico atingir. A ideia da inserção positiva

é forte. É para isso. E a ideia que estão chamando

de “busca ativa”. Então faz parte do contrato. Ele

tem que achar os que não estão cadastrados. Ele

estima em determinada região.

Agora, no fundamental, o Programa Território

da Cidadania está hibernando. Mais recentemente

remontou o comitê gestor, mas ele está, digamos

assim, em estado hibernal. Aí o grande debate que

a gente precisa fazer. A gente precisa dar conti-

nuidade. Integração de política pública no papel,

no desenho rola bem. Assinar, se comprometer,

Agora, efetivar é o “cão”. Dá um trabalho danado.

É as experiências que gente teve aqui em dois

anos e meio, três anos.

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Para finalizar a questão, porque mesmo no

caso fazendo aportes com territórios rurais, a

fragilidade institucional do programa, ou seja,

depender de convênios com entidades parceiras

para tocar, o articulador colegial, o articulador do

estado, é muito frágil. Então, não é só fragilidade

do Território da Cidadania que contava com esse

apoio do Território Rural. Nem só a dificuldade da

integração de políticas, mas na efetivação delas

você não ter um corpo permanente, profissional

de gestão, é muito difícil. É muito difícil tocá-lo

adiante. No balanço que a gente fazia no final de

2010 sobre o Território da Cidadania, nossa “via-

gem utópica” chegou a isso. Criar uma carreira de

gestor territorial. Ter curso para gestores nessa

área. Talvez seja um caminho para se perseguir

essa parte da institucionalização do programa de

desenvolvimento territorial rural. A integração de

políticas precisa formar dentro do governo, o Es-

tado brasileiro, uma concepção que hoje é em-

brionária, pouco expressiva.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Eu já havia

preparado alguns comentários e preparei três

questões.

Uma diz respeito, já que estamos falando de

qualificação, aperfeiçoamento das políticas pú-

blicas para o combate à pobreza num enfoque

territorial, para nós parece que um movimento é

do governo fazer isso. O governo precisa aperfei-

çoar as políticas enquanto um ente, um sujeito

que promove, ele precisa dentro do âmbito do

governo fazer esse aperfeiçoamento, nas mais

diversas formas.

O outro é a governança. E falando de territó-

rio, que capacidade os colegiados tem para fazer

esse movimento. Renato diz, justamente, que se

não houver um controle da sociedade civil forçando

essa articulação de políticas públicas, dificilmen-

te acontece como deveria acontecer. E pegando a

continuidade do que o Joaquim Soriano nos disse

nós estamos fazendo um esforço tamanho para

que os Estados assumam a responsabilidade do

financiamento da política territorial. Nós temos

aquele exemplo da Bahia com a Cultura. Agora,

mesmo a Bahia abriu uma chamada, está contra-

tando os assessores territoriais. Não vai mais ser

a gente que vai ficar fazendo isso. Pernambuco,

fará o mesmo. Para cada território eles querem

contratar os assessores. Acho que na medida em

que a gente está fazendo isso com Ceará, Bahia,

Rio Grande do Sul, tem um conjunto de Estados,

uns dez Estados, a gente já pode pensar numa es-

trutura dessas. No mínimo, é ter orçamento para

municiar as oficinas, as articulações, pessoal. E

isso acaba entrando, voltando para o governo, isso

é um desenho que para nós é uma estratégia de

sustentabilidade da proposta da política territorial.

Se a gente não fizer isso, é o que o Joaquim está

falando: que mesmo que a gente estimule a cria-

ção de uma profissão, de um cargo, se o Estado

não assumir isso, vai ficar sempre nas nossas cos-

tas. E aí essa governança fica fragilizada porque

agora, por exemplo, que tivemos problemas com

acórdãos, com decretos, com associações, que a

gente passa recursos para sustentar as ativida-

des. Está parado. Estão desde agosto, setembro

parados. Se a SDT, se o MDA não financia, fica pa-

recendo que a política não existe, está acabando. E

aí fica a pressão em cima do ministério. Isso revela

a fragilidade da estratégia. Da mesma forma que

é forte, “empoderada”, ela tem alguns aspectos

desses. Então, fica parecendo que o financiamen-

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Diálogos do Fórum DRS

to é apenas do MDA. Nós precisamos fazer isso.

Fazer tanto descer para os Estados, para os mu-

nicípios quanto para o Governo Federal e os outros

ministérios. Nós fizemos agora um PPA juntos –

Integração, MDA e Ministério do Trabalho, Senaes

(Secretaria Nacional de Economia Solidária) – nós

temos uma linha que fala em desenvolvimento ter-

ritorial, regional e desenvolvimento solidário. Não

dá para a gente ficar assumindo financiamento

não. Não digo nem financiamento, dessas ativi-

dades, mas com projetos. A gente está fazendo

isso, por exemplo, com os territórios digitais. A

Secretaria de Reordenamento Agrário - SRA já

está aberto, abriu edital para contratar consulto-

res nos Estados para cuidar da política dos gaps

fundiários numa dimensão territorializada. Se a

gente não der esse salto para que entre para o

PPA dos Estados esse financiamento, essa estra-

tégia – verá que não é impacto financeiro, mas é

estratégico, eu acho assim. Então uma questão de

vocês é um olhar do futuro de uma política como

essa no sentido da governança. Aí se eu consigo,

digamos assim, aperfeiçoar a política estratégica

com os territórios eu aperfeiçoo a política. Acho

que a lógica é essa.

A outra questão, não se aperfeiçoa política se

não se planeja. Acho que os PTDRS (Plano Ter-

ritorial de Desenvolvimento Rural Sustentável),

realmente avançaram bastante. Precisa-se ter

um avanço quantitativo enorme. Precisa. Mas é

um exercício. Nós saímos de um território que

só via Proinf. Fui a Tocantins. Tinha um território

que só funciona se tiver Proinf. Se é para Proinf,

é o de menos. Projeto tem que ser bem mais do

que isso. Tem que pensar estratégia para esses

municípios. Canalizar as políticas públicas. Acho

Se eu penso que eu quero

qualificar as políticas públicas,

tenho que ter uma governança

da estratégia. Tem que ter

planejamento estratégico.

”Jerônimo Rodrigues Souza

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que esse aspecto também da governança. Se eu

penso que eu quero qualificar as políticas públi-

cas, tenho que ter uma governança da estratégia.

Tem que ter planejamento estratégico.

O segundo é o aspecto do Pacto Federativo. Já

foi colocado pelo PTC, o MDA tem puxado isso, a

presidenta Dilma tem feito isso que é estender

essa parceria, essa responsabilidade dos pesos

e das conquistas com as três esferas. Fica pa-

recendo que o município, por exemplo, não tem

responsabilidade com a pobreza, por exemplo.

Está lá. O município sequer tem um cadastro das

pessoas. Sequer. Podia dizer: “Eu vou cadastrar

essas pessoas para pressionar o Governo Fede-

ral”. Os Estados sequer fizerem isso. Então, é um

Pacto que vem um pedaço do Governo Federal,

governo estadual, alguns assumem. Essa política

tanto a Estratégia Territorial quanto o Combate à

Pobreza, Programa Brasil sem Miséria, precisa

ser fortalecido nisso. Dito por vocês também, a

responsabilidade da sociedade. Isso não é papel

só do Estado. É do Estado, mas não é só do Estado.

Então esse Pacto Federativo para nós custa muito

caro. A construção disso. Precisamos criar uma

dinâmica que possamos nos especializar e forçar

um pouco esse debate.

E por último, a questão da inclusão produtiva.

Estou insistindo nisso por conta do que a gente

vem fazendo. Se a gente não conseguir mexer na

agenda desse povo não vai adiantar. E aí, a estra-

tégia nossa do Busca Ativa, do fomento que existe,

do Proinf, colocado como uma possibilidade. Já

falaram que esse é um povo que não tem organi-

zação nenhuma. O pobre extremo não tem. Esse

povo está sem estímulo para demanda. Não é nem

“estar”. Não “tem”, não é? Então, se a gente não

conseguir fazer essa inclusão produtiva, fortale-

cer o cooperativismo, o associativismo, esse povo.

Porque o enfoque do Bolsa Família é da família.

A Dilma quer mexer na veia da pessoa. A gente

é que tem dado esse recorte, no caso do Rural.

Porque a pobreza não está sozinha. Não tem um

pobre sozinho isolado. Onde tem um pobre tem

um monte. Então, a gente trabalha isso numa di-

mensão familiar, com a terra. Mas uma dimensão

comunitária, territorializada ou a gente não conse-

gue dar uma dimensão como, precisamos politizar

esse debate. E a politização vai se dar com coo-

perativismo. Essa é uma organização produtiva,

mas é uma dinâmica diferenciada. Eu acho que aí

os municípios terão responsabilidade grande. Por

exemplo, as bases de serviço é uma experiência

que [...] Por que os municípios não adotam isso

como política? Eu posso ter ali no município uma

ou duas bases de serviço. Por que o município não

pode jogar mais pesado na conta do PNAE (Pro-

grama nacional de Alimento Escolar)? Nós temos

uma formação ainda meio que fresca, mas vamos

conseguir colocar dentro do Rede Brasil Rural a

obrigatoriedade das chamadas públicas do PNAE.

Assim vai ser uma conquista enorme por causa

da transparência, politização.

Acho que são esses três temas: governança

desse aperfeiçoamento, do desenvolvimento das

políticas públicas, o pacto federativo e a inclusão

produtiva.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – O seguinte:

desses planos de desenvolvimento territorial que

os colegiados elaboraram, acho que uma evolu-

ção que a gente tinha que checar direito: quan-

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do eu cheguei no começo, me dava a ideia que

uma pequena comunidade de agricultores que

desenvolvia um plano mais sentido ou não levou

em consideração a sua inserção na sociedade lo-

cal, naquele mundo. Era quase nós e eles. Uma

política para nós, mas sem ver o “eles” que era

(...). Isso foi avançando no debate dos colegiados e

teve um aumento. Nós nos reunimos ano passado,

retrasado, com as redes dos colegiados, em que

a coordenação das redes estava assumindo essa

limitação. E algo que é muito impactante na rede

colegiada é quando no território tem uma grande

obra. Uma grande obra.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Um macro-

projeto, não é?

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – É um ne-

gócio importante, é muito recorrente. Eu gosto

muito de tratar dele, porque tem PAC. Você pega

Acho que esse tema Pobreza Rural, nova

cara da pobreza, a gente tinha que dar um

tratamento a esse aspecto. Porque essa é a

famosa nova cara mesmo. Você criar algo

que pode ser virtuoso para o país, para a

região, para a comunidade. E não é para

quem está no entorno.

”Joaquim Calheiros Soriano

um mapa do Brasil, bota os territórios rurais, Ter-

ritórios da Cidadania, bota em cima dele, o que

é grandes obras do PAC. É uma loucura! Não é

só a Belomonte, que é num território inteirinho

nosso lá. E é só que tem do lado, que tem o ter-

ritório, já têm os conflitos ARPA, trabalhistas em

geral. Aí se tem literatura e conhecimento, o que

pode ocorrer e, vai ocorrer, com o impacto des-

sas grandes obras. Isso, para mim, eu penso, vem

uma combinação importante desse conjunto de

políticas públicas para a área rural, para Terri-

tórios da Cidadania, territórios rurais. Com uma

antecipação. Conjunto de políticas públicas que

vai ter sempre... Você sabe quais são alterações

sociais, econômicas, sociais, ambientais que vão

ocorrer e como você pode antecipar os grandes

problemas. Porque, na realidade, a literatura é far-

ta. Você sabe que colocando 20 mil homens num

canteiro de obra, a quantidade de problemas que

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gera isso. E têm aquelas fórmulas assim, que é:

Ah, não tem problema, pega o telefone. O gerente

da empreiteira lá que está construindo. Pega o

telefone, liga para uma rede de supermercado,

“resolve” o problema de abastecimento e ali ao

lado você está criando outras camadas de pobreza.

Então, acho que esse tema Pobreza Rural, nova

cara da pobreza, política pública, a gente tinha que

dar um tratamento a esse aspecto. Porque essa

é a famosa nova cara mesmo. Você criar algo que

pode virtuoso para o país, para a região, para a

comunidade. E não é para quem está no entorno.

SÉRGIO LEITE – Não sei. Estou pensando no

que vocês falaram. Acho que a primeira configu-

ração que deveríamos retomar seria, fazendo re-

ferência à Tânia Bacelar, o fato de que estamos

tratando de instrumentos muito diferentes. Ob-

viamente que como objetivos complementares,

como desenvolvimento territorial e combate à po-

breza, que são interessantes as interfaces entre

os programas, não é? Mas são, digamos assim,

projetos com repertórios e instrumentos muito

específicos. Objetivos também diferenciados. A

primeira consideração, talvez, seja o fato de que

no caso da pobreza, e na erradicação da miséria,

você esteja tratando de programas de caráter mais

universal na medida em que o fenômeno, apesar

de concentrado em periferias, grandes metrópoles

ou meio rural, ele, de certa maneira, atinge uma

camada significativa ainda da população. Objeti-

vo que justifica, inclusive, a chamada do governo

Dilma para o problema da miséria, não é? A per-

sistência da miséria. Enquanto que o programa

territorial, seja o Pronatec, seja o Territórios da

Cidadania, no meu entendimento são programas

com um direcionamento mais preciso, porque de

cara envolve cautela no diálogo desses dois instru-

mentos. Mais ainda, eu acho que a Tânia chegou a

falar disso em algumas oportunidades, eu talvez

venha a concordar com ela, o fato de que talvez

se tenha ido muito rápido com os programas de

território rural. Ou seja, quantitativamente falan-

do. Não sei se teria sido melhor se fosse posição,

obviamente, se nós tivéssemos construído um

número menor de territórios, com maior densi-

dade identitária. Porque a construção mesmo do

desenho dos Territórios foi um processo político,

obviamente, claro, mas havia alguns casos com

maior lastro e outros tocados muito mais rapi-

damente. Tirando esses processos, fazendo um

filtro e examinando experiências que efetivamente

tinham densidade identitária territorial, não tem

êxito melhor trabalharmos inicialmente com um

número menor de territórios, avançando mais na

sua construção.

Aí eu volto ao tema do Joaquim, que eu acho

que ainda é efetivamente importante, que é a au-

sência de uma burocracia para tratar da execução

da política. Eu acho que a SDT vive esse problema

hoje dramaticamente. Então, se a SDT tivesse um

quadro de funcionários que o Incra tem, por exem-

plo, teria condições muito mais efetivas de dar

conta do desenho e, principalmente, das continui-

dades que a rotina do processo de regulamentação

da política demanda. Mas é isso que você colocou.

Até aonde se quer chegar com isso? É para valer?

A construção do Programa de Desenvolvimento

Territorial que demanda para isso, um quadro de

funcionários ao alcance dos desafios e das metas

e que não fique ao sabor dos contratos, digamos

assim, existentes que permitem o não pagamento

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Diálogos do Fórum DRS

dos articuladores etc. Eu acho que é uma discus-

são de Estado. É nesse sentido que eu vejo o pro-

blema. Óbvio que é uma discussão política. Você

não vai usar isso. Você vai ter que usar isso.

Então, eu acho, Jerônimo, que essa possibi-

lidade do pacto federativo na articulação com os

estados é extremamente bem vinda, sobretudo

no sentido de você, digamos assim, pensar con-

trapartidas oriundas dessas instâncias na medida

em que os efeitos da política também beneficiam

essas instâncias. Estou completamente de acordo.

A minha dúvida, digamos assim, é qual é a efetiva

capacidade de resposta que você tem aí. Supomos,

eu acho que é muito mais fácil ter uma resposta

positiva na Bahia, que adotou a política, que tem

experiência sobre o assunto, que tem um acúmu-

lo e uma certa, digamos assim, sensibilidade ao

diálogo com o Governo Federal a respeito dessa

proposta, mas não sei se seria a mesma coisa,

por exemplo, no Paraná. Como os territórios estão

espalhados nacionalmente, tanto o Pronat quanto

o PTC, eu imagino que para efetuar um diálogo

nessa direção você teria que ter a resposta de to-

das as unidades da federação no sentido de um

mínimo de colaboração nesse arranjo. Pergunto-

me, talvez, depois que a gente começou a fazer

essa reflexão e um pouco concordando com o que

o Philippe expôs, várias coisas que estavam, de

certa forma, pensadas e que foram trazidas à luz

do programa Brasil sem Miséria, vários itens já

estavam colocados no programa Territórios da

Cidadania, particularmente e mal ou bem desen-

volvidos. Nessa sua direção, me pergunto o pa-

pel dos colegiados de articulação estadual, dos

Cae’s. Você tem uma figura e uma arena institu-

cional prevista no Territórios da Cidadania que é,

fazendo um filtro e examinando

experiências que efetivamente

tinham densidade identitária

territorial, não tem êxito melhor

trabalharmos inicialmente como

um número menor de territórios

avançando mais na sua construção.

”Sérgio Leite

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em alguns casos, superada. Em outros não. Isso

vai variar de Estado para Estado. Esse comitê de

articulação estadual que prevê participação de ór-

gãos públicos federal, municipal e estadual. Então,

nesse sentido, por exemplo, uma agenda que acho

que esses Cae’s têm que enfrentar é essa que a

gente está propondo. Eu acho que há uma chance

para decidir isso que pode tratar, inclusive, das

contrapartidas orçamentárias na medida em que

os resultados do programa são compartilhados.

Porque não necessariamente os Estados e mu-

nicípios deveriam também efetivamente talvez

colaborar nessa direção. Então acho que talvez

explorar melhor esse espaço que eu vejo ainda

bastante precário no sentido do seu funcionamen-

to, no desenho institucional do programa. Você

ter um avanço muito grande dos colegiados como

exercício, como lugar ou arena de exercício dos

projetos, das discussões, dos embates, das deci-

sões, mas posso estar equivocado, mas os relatos

das pesquisas que a gente tem feito, todas falam

da experiência dos Cae’s.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Minoria da

minoria os Cae’s funcionam. A política pública era

decidida ali com todas as secretarias do governo.

O governador chamava a Casa Civil, enfim, MDA

ia. Agora, rigorosamente no desenho institucional,

a peça-chave [...]

SÉRGIO LEITE – A coisa não funciona. E para

atender esse objetivo, como é que você faz essas

contrapartidas a partir do município e a partir do

governo estadual. Até o caso dessa contratação

de articuladores.

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Diálogos do Fórum DRS

Eu acho que efetivamente há outro ponto que

precisaria ser tocado. Até eliminar a outra fase,

que eu não gosto, que é articulação política se

faz na base. Se você vai esperar que a articulação

seja feita em Brasília, quer dizer, não é falta de

boa vontade das pessoas. Eu acho que são vícios

do sistema. É muito difícil. É uma articulação que

faz na base. Vamos pensar então: quem é a base?

Tem uma questão que o Joaquim tocou que é, en-

fim, quão restritivos é ou não o Projeto Territorial

de Desenvolvimento Rural. Eu não diria que ele

abarca ou não abarca. Eu acho que alguns são

mais estreitos. Outros mais dialogáveis. Acho que

essa pergunta é extremamente pertinente se a

gente está pensando em base articulada, digamos

assim. Pensando na efetiva capacidade de articu-

lação da base, das políticas, inclusive da Política

de Combate à Pobreza e à Miséria.

O que eu me preocupo mais efetivamente, vol-

tando ao que o Renato Maluf, Professor do CPDA/

UFRRJ, disse hoje de manhã, quando a gente fala

de setor rural, agricultura familiar, você tem as

organizações que representam os agricultores fa-

miliares, digamos assim. Vamos deixar um pouco

de fora os não organizados, não é? Quando eu falo

de movimentos sociais por terra, têm 30 movimen-

tos que ocupam a terra no país. Quando eu falo

em classe produtora, eu tenho CNA, tenho CRB,

enfim. Quando eu falo em território, eu tenho o que

efetivamente? Eu tenho constituição de uma Rede

Nacional De Colegiados Territoriais, que eu acho

que já foi um passo extremamente decisivo. Mas

veja que a identificação do público beneficiário da

política é muito mais difusa, têm as suas próprias

características, o que de certa maneira implica

numa dificuldade de organização e representa-

ção desse segmento da base. Seria então uma

associação de territorializados, digamos assim.

Então, quem é que externaliza, do ponto de vista

da sociedade civil, as reivindicações, anseios, ex-

pectativas provindas da base territorial? De um

lado você tem a rede dos colegiados territoriais,

mas a própria rede é mista, no sentido de que re-

presenta pessoas da sociedade civil, que isso já e

uma coisa interessante. Para mim, a constituição

da rede é um dado muito positivo, tanto no sentido

de fazer exercício para fora dos territórios quanto

de fazer exercício entre os territórios. Têm diálo-

gos entre os territórios. Mas pensando num mo-

mento como esse, onde a política foi efetivamente

desacelerada, quem vai clamar pela aceleração ou

pela reaceleração da política? Bom, eu recebi um

manifesto dos articuladores estaduais, que é um

segmento vinculado a uma execução da política.

Não é dos beneficiários. Quem é que representa?

Quem é a tal voz dos beneficiários da política?

Bom, eu tenho o Lavin na rede de colegiados ter-

ritoriais, que é uma liderança importante. Mas veja

que falta, no meu entendimento, é uma questão

apenas, não tenho nenhuma resposta para isso,

mas falta massa, falta massa política organizada

que represente, por exemplo, essa base localizada

nos territórios.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Existe o pro-

blema da representação e da delegação.

SÉRGIO LEITE – É.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Porque rigo-

rosamente um ato convocatório não é quem está

presente ali cria.

SÉRGIO LEITE – Cria.

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14 Diálogos do Fórum DRS

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importantes – não os mais importantes, mas os

mais antigos – são dirigidos à agricultura familiar.

Então, essa pergunta do Jerônimo sobre o fu-

turo da governança, sobre essa coisa de quem

vai pagar os articuladores e tudo isso. A pergunta

que vem à minha cabeça é: Será que os territó-

rios atuais e da agricultura familiar a situação é

a mesma em 2003 quando foi criado o programa

de territórios? Temos a mesma realidade? Vamos

pedir a mesma coisa a esses articuladores? O que

tinha que fazer nesse momento é a mesma coisa

que tem que fazer agora? E mais ainda. Será que

essa agricultura familiar é a mesma que aque-

la de 1995, quando se criou o Fundaf, quando se

começou a dizer: “Precisamos de dispositivos de

fortalecimento da agricultura familiar”. Mais que

fortalecimento, de visibilização da agricultura fa-

miliar, que não existia. Na verdade, nem a palavra

existia, eram pequenos e médios produtores.

E por que, estou fazendo a pergunta, porque

eu acho a pergunta que fez: “Quem vai pagar os

articuladores?” Quer dizer, é reformar o sistema

de governança federal aqui no território? Para

responder a essa pergunta, qual a repartição das

novas responsabilidades do Governo Federal,

dos Estados e do Município? Território? Aí têm

duas coisas: nova situação, nova repartição das

responsabilidades, nova repartição dos meios

de financiamento. E daí minha pergunta: Qual é

a situação atual da agricultura familiar? E uma

pergunta ainda mais: Será que o Pronat, que é

um programa de desenvolvimento territorial a

partir da agricultura familiar, não foi apenas, não

deveria ser apenas uma fase da construção de

uma governança territorial? Receber orçamentos

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Mas e aí?

SÉRGIO LEITE – E no momento que você pre-

cisa de pressão, quem é que pressiona? Na po-

breza também. Quer dizer, os pobres não estão

organizados para pressionar, enfim. Então, você

tem uma, a não ser numa situação de extrema

violência ou numa situação de extrema miséria

generalizada, que você tem protestos e que são

expontaneizados. Jirau, por exemplo, quando você

têm situações de precariedade absoluta e que aí

não precisa nem de líder. É um negócio que meio

que pega fogo instantaneamente. Não é o caso

dos Territórios.

Como é que você mobiliza? Como é que você

articula no sentido de ter um mecanismo de pres-

são que force respostas do Estado? Porque o Es-

tado não é necessariamente o Jerônimo, nesse

sentido, enfim, para pensar, inclusive, em proces-

sos de priorização da agenda política. Aí acho que

falta. Não sei como que você efetivamente pensa

essa dimensão. Certamente não serão os articu-

ladores estaduais que vão efetivamente conseguir

reverter à situação. Por mais que a reivindicação

deles seja justa. Não sei.

PHILIPPE BONNAL– Não sei se não tem, nessa

conversa, a mistura de três temas que sejam um

pouco diferentes. Que é o fortalecimento da agri-

cultura familiar, que sustenta o Pronat e o PCT. O

segundo, desenvolvimento territorial, com essas

coisas e grandes obras e ordenamento territorial

e tudo isso. E a terceira essa coisa da pobreza, da

eliminação da pobreza.

A aposta é que tudo isso pode ser tratado no

mesmo território via programas, dos quais os mais

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Diálogos do Fórum DRS

cooperativos. Fazia sentido, não? Porque os agri-

cultores familiares não existiam. Não tinham essa

parte social e econômica há vinte anos, anterior a

1995. Agora tem. Tem uma fossa econômica. Se

sabe quantos por cento da produção total aqueles

produtos que participam, e tem institucionalidade

forte, são licitados pelo ministério. Tem um ga-

nho com a agricultura familiar. A construção do

fortalecimento dos outros agricultores familiares

não é suficiente também agora para parar. Dizer:

agora vocês são os mesmos atores, a mesma força

política e econômica que os grandes produtores,

que os empresários, que não sei o quê. E vamos

pensar outra institucionalidade territorial. Se fo-

car no desenvolvimento territorial com segmentos

socioprodutivos. É uma pergunta um pouco provo-

cativa, mas acho que estava dentro da discussão

de quem vai pagar os funcionários.

Você sabe quando você puxa o fio se chega a

mais ou menos esse tipo de pergunta. Porque,

a cada vez, eu acho que não podemos escapar

do fato que a agricultura familiar não representa

todos os atores do território. Falta muita gente.

Faltam os comerciantes, faltam os empresários,

faltam os pobres, faltam as profissões liberais,

os médicos etc., falta um montão de gente. Não

podemos reduzir sempre o desenvolvimento de um

território imenso, a Amazônia, o portal da Amazô-

nia, são pedaços e espaços imensos, unicamente

em uma categoria. E aí entramos nessa lógica que

tem que pensar botar no plano como repensar um

sistema de institucionalidade que permite elabo-

rar planos de desenvolvimento territorial dessa

qualidade. Tem que puxar a qualidade para cima.

Puxar a qualidade para cima quer dizer profissio-

nalizar. Tem que ter engenheiros agrônomos, tem

Tem que pensar botar no plano

como repensar um sistema de

institucionalidade que permite

elaborar planos de desenvolvimento

territorial dessa qualidade. Tem que

puxar a qualidade para cima. Puxar

a qualidade para cima quer dizer

profissionalizar.

”Philippe Bonnal

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16 Diálogos do Fórum DRS

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que ter pesquisadores, tem que ter economistas,

tem que ter sociólogos em apoio a setores sociais.

Tem que ter um corpo. Que dominam os códigos

da Caixa Econômica, que vai analisar os projetos.

Tem que ter um “puxão”, criar nos territórios. E

não esquecer ninguém dentro da meta de nego-

ciação.

Então foi por isso que nós fizemos. Nós es-

tamos um pouco em um momento de questio-

namento, um pouco de toda essa construção um

pouco histórica, não? Esta era uma primeira coisa.

Segunda coisa, sobre governança. A questão

que foi levantada. Pessoalmente, não acho que

governança se resume, mas é minha opinião pes-

soal, se resume a democracia participativa, por

um lado, e a controle social do outro. Eu acho que

tem uma engenharia institucional forte.

E não sei se a democracia participativa tem interesse de resolver tudo. Eu acho que o momen-to tem que ter pessoas que tomem decisões. E tenham legitimidade para tomar decisões, o que passa pelo sistema direto e que são cobrados por isso. Se eles estão cobrando, se é uma democracia participativa permite cobrar, se é participativo não tem que cobrar. Uma cobrança moral, uma ques-tão sua. Mas se tem um sistema representativo. Na medida em que o processo de desenvolvimento nos territórios ficar mais complexo, pelos próprios aspectos de desenvolvimento, e da capacidade dos atores, quer dizer, já exige a tomada de decisão, vai ser problemas mais complexos. E têm que ter pessoas que tomem as responsabilidades de to-mada de decisões. E vocês cobranças... Logo, me parece, talvez, que estamos um pouco no limite da democracia participativa. Ou pelo menos de completar esse sistema. É mais uma pergunta que

estou fazendo, não estou afirmando nada. Ou vai depender se sabe completar essa institucionali-

dade participativa.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Nesse as-

pecto, no colegiado territorial dos Territórios da

Cidadania, ele era também meio a meio. Metade

da sociedade civil. Mas era para envolver funda-

mentalmente os ilustres prefeitos.

Diferente do território rural, na origem, no da

Cidadania tentaram incorporar representantes dos

governos federal, estadual e municipal no terri-

tório – e os prefeitos, o que é uma luta grande.

Também tem isso aqui, no caso.

O problema da democracia representativa tam-

bém, em minha opinião, no caso dos territórios co-

legiados, ela fica a meia, porque a representação

da sociedade civil não é eleita universalmente. Não

tem nenhum mecanismo. Talvez por isso pudesse

caminhar por aí, e alguma coisa que pudesse re-

presentação de baixo, porque é uma assembleia

– convocar quem está lá, se delega aqui. Mas não

tem X% da população que apoiou para o que o

Alfredo seja o colegiado. Não é por aí.

Agora, tem outro desenho importante para se

mexer, que é no caso brasileiro. Tem a possibili-

dade, depois dos últimos anos, de se constituir o

consórcio público, consórcio municipal público.

Que é, formalmente, um belo mecanismo, espe-

cialmente para atendimento de política pública

dos municípios pobres. Você cria um consórcio,

entidade pública, acordo em todas as câmaras de

vereadores, entre todos os prefeitos e aí facilita

a vida enormemente desses municípios. Inclusi-

ve, por esse aspecto, que eu acho decisivo, que

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Diálogos do Fórum DRS

Philippe estava falando, de aportar Inteligência

desses municípios. Colocar o técnico agrícola, o

agrônomo, o economista ajuda muito a demandar

política pública. Porque colocava lá o computador,

mas não ensinava ninguém a preencher a ficha.

Mas é muito difícil fazer.

Teve uma experiência também que era consór-

cio público com o território da cidadania, via ECT.

Selecionaram uma dúzia, foram atrás, Casa Civil,

secretaria de governo, mas o “diabo” do prefeito e

da prefeita assinar é muito difícil, porque vem de

uma tradição política muito conservadora. Então,

cada pequeno município quer ter seu hospital,

cada um quer ter o seu lixo. E não funciona. Ele

sabe que não funciona, mas a inércia do método

da justiça é muito forte. Isso é outra coisa que a

gente tinha que mexer porque dá um casamento

feliz, em territórios muito pobres, em Territórios

da Cidadania, consórcio público. Só que não roda.

Você não vê. Lá em Belomonte tem. Tem lá a usi-

na, aí tem doze municípios que eles fizeram para

assuntos relativos à usina.

PHILIPPE BONNAL – E sobre o pacto federa-

tivo, eu sempre tenho enorme dificuldade porque

no meu território não existe, do ponto de vista da

constituição. Não existe.

SÉRGIO LEITE – Consórcio porque é a melhor

forma jurídica para eles.

PHILIPPE BONNAL – E esse desenvolvimento territorial precisa, como falava Sérgio, da burocra-cia. E burocracia de ter um espaço institucional conhecido. Então há que se achar a entrada de reforma ou reforma constitucional ou através de consórcio. E consórcio que foi feito para outros projetos, por exemplo, Consad.

SÉRGIO LEITE– Sim.

PHILIPPE BONNAL – É isso que muitas vezes

se apoia sobre um consórcio municipal.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – O problema

do consórcio é que ele não prevê a participação de

organismos da sociedade civil. O consórcio inter-

municipal público prevê uma câmara não delibe-

rativa. Porque muito do conceito foi feito no padrão

antigo. O consórcio não era um ente público. Era

um ente privado.

PHILIPPE BONNAL– Porque não uma portaria

para impor um sistema de câmaras consultivas,

um comitê consultivo. Uma portaria. porque não...

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA - Tem um

balanço sendo feito nesse momento de grande

dificuldade financeira, talvez de clareza com a pre-

sidenta Dilma, que agora a tendência dela agora

é segurar os recursos para custeio, que é o que

mobiliza isso. Então, nesse momento, ultimamen-

te eu tenho ido em cinco estados – Tocantins, Ala-

goas, Ceará [...] e há uma sensação de alguma

coisa para se apegar, por conta desse, não diria

esvaziamento, mas por circunstância, um mo-

mento de inteligência. Ou a gente cria uma saída

criativa para podermos dar outro salto, como se

fosse uma segunda, uma terceira fase dos terri-

tórios, agora, ou a gente não se sustenta. Porque

a gente vai para os estados, e por conta da forma

como construímos essa política, muito mais na

política do que, às vezes, na gestão. A rede cole-

giada em momento algum dialogou, por exemplo,

com as assembleias legislativas. Não tem contato

nenhum. Ela não fez esse movimento dentro do

Estado. A rede se isolou, mas não dialogou com a

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associação dos prefeitos, não dialogou com secre-

tarias estratégicas de Estado, não dialogou com

assembleias, nem com bancadas federais, que é

o cara que pode votar a emenda. Onde os estados

se destacaram e dialogou com o deputado federal,

com o senador, o cara botou uma emenda para

custeio. Está rodando. O Ceará, por exemplo, está

rodando uma emenda parlamentar do deputado

Eudes. No Rio Grande do Norte, a deputada botou

um lá, está rodando, custeio. Já criou uma auto-

nomia de que nós é que temos que ver o nosso

papel do MDA.

De qualquer forma, Joaquim, são fontes de re-

cursos. Pode não ser para custeio, mas pode ser

de orçamento, enfim. As diversas possibilidades

que existem no Estado de orçamento, temos que

dispor. Por exemplo, tem um caso no Estado do

Ceará, que tem uma empresa que está querendo

cumprir seu papel social: “Estou botando aqui 5

milhões para projetos sociais”. Os colegiados (...)

“Vai pegar ou não vai”? (...), fazer projeto de (...) de

leite e tal. Quer dizer, aí faltou uma certa inteli-

gência. E aí creio que a gente, no ministério, criou

uma certa dependência – estava ali um dinheiro

das entidades, estava ali um dinheiro do Proinf. A

gente nunca forçou outra forma que não fosse só

ali: “Olha, só vou olhar para a Proinf”. Então não

consegue olhar estratégia.

E a última coisa. Nós saímos em 2003 do mu-

nicípio, porque o Pronat Infraestrutura era muni-

cipal. Caímos na armadilha boa dos territórios e

não saímos dali. Não estamos tendo uma visão de

olhar o Estado como um todo. Então, até o dinheiro

que cai, se eu tenho 10 territórios, eu estou com

10 mil por território, tenho 3 milhões por Estado.

Cada território é botando o seu. Em momento al-

gum bota na mesa do Estado e diz assim: “Toma

aqui 3 milhões”. “O senhor bota nas contas do

governador, aqui em cima?”. “Bota um para um”

– são 6 milhões. Essas inteligências, com essa

situação está forçando os caras a buscar saídas.

Agora, é claro que temos que ter um certo con-

trole para que a política... Bom, se a política cai

como está caindo no Ceará, como está caindo no

Piauí, está caindo na Bahia, desanda. Nós vamos

ter outro papel, não mais aquele. Imagine que se

for territorializar o país hoje, dá em torno de 400

territórios. O país territorializado. Em média disso.

Onde é que o MDA vai ter dinheiro para colocar um

Proinf em cada Estado? Nós temos outro papel

que não mais esse. Essa é a inteligência nossa

no ministério – descobrir qual é o papel nosso.

Novo. Os estados estão descobrindo isso, estão

remando, estão correndo atrás. Então, aonde é

que a gente quer chegar, digamos, estar ouvindo

o governo da Dilma? Conquanto, é o país territo-

rializado? É só isso? Então essas questões estão

chegando muito fortes na mesa da gente.

PHILIPPE BONNAL– Era isso quando eu fala-va que era interessante ligar a discussão sobre a repartição das responsabilidades. Atualmente, com o sistema Pronat, o Governo Federal tem o domínio da política, não? (...) de ter outro sistema de repartição das responsabilidades se pode acer-tar que cada estado evolui na direção que mais lhe convém. Ao final, essa coisa é diferente. Talvez não uma coisa ruim. Talvez seja muito bom. Mas tem que estar pensando nesse sentido. Será que é in-teressante guardar uma incoerência sobre o espa-ço nacional, como um todo? Ou se deixa acarretar (...) sua política territorial? Qual o papel do Estado Federal? Qual o papel do Estado, do governo? E

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Diálogos do Fórum DRS

qual o papel daquele território? É nesse sentido que fiz essa referência, essa pergunta sobre qual é a situação dos territórios, também anos atrás? Já

alcançou essa fase de considerar todo o sistema?

SÉRGIO LEITE – (...) já aqui, não dá para pegar

aqui, assim, situação de menos recursos e de cer-

ta desestruturação do sistema para buscar recur-

so em qualquer canto. Aquele negócio da emenda

parlamentar é completamente contraditória com a

noção de planejamento. Acho que tem que combi-

nar política territorial com planejamento. Isso fica

evidente com as grandes obras. Não tem jeito. A

hidrelétrica não é para a comunidade. No caso

da hidrelétrica no Brasil é para a América Latina

inteira. Pelo menos. No caso de uma refinaria de

petróleo, não é... Então, tem que ser combinado.

Tem que resgatar o conceito de planejamento.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – Isso que você

está falando, da demanda local, ela tem que ser a

partir de um certo arcabouço que se consegue. No

caso da Bahia tem. A Bahia permanece fazendo o

orçamento plurianual com participação popular,

temporalizado. Então você vai mexer em recurso

a partir daquele desenho estabelecido anterior-

mente. Então, isso que tem que caminhar junto

porque senão vira (...), no caso dos órgãos cole-

giados vira um tipo lote específico com recursos

emergenciais.

SÉRGIO LEITE – A minha dúvida com relação a

isso, estamos tocando num ponto. Até que ponto o

programa territorial está suficientemente conso-

lidado para este salto de autonomização. A minha

impressão é que não. Obviamente pelos dados que

levantamos aqui. Eu faço um pouco uma analogia,

por exemplo, com as investidas recentes sobre a

transferência do marco regulatório do processo

de execução da política ambiental, no que tange

à demarcação de reservas legais, por exemplo, da

União para Estados e municípios e a ousadia do

caso catarinense. Se formos transferir isso para

Estados e municípios, certamente não teríamos

maiores garantias que tais espaços seriam pre-

Ou a gente cria uma saída criativa para

podermos dar outro salto, como se

fosse uma segunda, uma terceira fase

dos territórios, agora, ou a gente não se

sustenta.

”Jerônimo Rodrigues Souza

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AGOSTO | 2012 www.iicaforumdrs.org.br

servados. Municipal é muito mais ainda instável,

digamos assim. Hoje mesmo saiu um bom artigo

no O Globo a respeito desse assunto da demar-

cação das áreas quilombolas, que é outro tema

que está no projeto hoje da discussão. Mostrando

que nos Estados Unidos, depois que se transferiu

o poder de demarcação de áreas de reserva para

unidades federativas, a única coisa que foi demar-

cada foram os parques e monumentos nacionais,

que ainda é iniciativa do Estado Federal. Porque

o resto não existe mais nada. É como se fosse

territorial rural.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO– É o que estou

acabando de falar. Vai acabar.

SÉRGIO LEITE – Justamente. A minha dúvida

é que em temas sensíveis dessa natureza, cuja

legitimidade social é extremamente frágil é di-

ferente da palavra saúde. Por exemplo, não tem

posto médico funcionando em um hospital cuja

responsabilidade é do município, a demanda de

pessoas doentes parte diretamente da cota da-

quele prefeito. Se eu não tenho a política terri-

torial funcionando, não sei o que acontece. Não

adianta de nada. Enfim, em alguns setores onde

você tem um tipo de lastreabilidade, construção

da legitimidade é mais evidente, explícita, como é

o caso da educação, saúde, onde é possível você

fazer gerências compartilhadas de gestão e imple-

mentação de políticas, ensino fundamental, médio

e superior. Esse arranjo é mais tranquilo. Minha

impressão é que nos casos dos territórios, por

ser um tema bastante sensível, como é o caso,

por exemplo, da apropriação de terra. É bastante

sensível e com baixíssima consolidação e pouca

legitimidade, visibilidade política no sentido mais

amplo da palavra. Esse tipo de arranjo me parece

ainda temeroso e arriscado. Eu não sou contra as

parcerias. Na minha leitura, eu vejo essas parce-

rias muito bem desenhadas no espaço que já exis-

te para tanto, que é o Cae. Então, vamos alterar

o Cae porque eles não funcionam efetivamente.

Agora, eu não teria ainda muita densidade para

irmos mais além nesse momento. Não sei mas é

a minha impressão.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Nos tempos

do governo Lula, o presidente avançou o que avan-

çou, deixar por conta das dinâmicas políticas locais

tende ao retrocesso. Eu acho que tem que ter bom

senso. Mais peso da União, mais peso dos Estados,

mais planejamento democraticamente centraliza-

do. Isso consegue erguer uma nação, o Estado con-

segue erguer uma nação. É por aí.

De qualquer forma, o que estamos fazendo é um

balanço da situação. São dois extremos, eu diria.

Nem tanto fazer entrega para que os Estados cada

um crie sua autonomia, faça o que quiser, esse é

um extremo. Nem deixar como está. Como está,

estamos fadados a não suportar o peso, porque a

política é de estado reconhecimento pelo MDA de

um território significa uma barganha por dinheiro

para custeio, para investimento. Nós temos hoje

165 reconhecidos. Esse ano acho que é um ano

bom para a gente tocar, como está sendo feito, mas

há que se fazer um bom balanço do que é preciso

fazer para adiante, para que a gente não tenha a

mesma capacidade. Porque nós estamos parados.

Os Estados a gente vai continuar fazendo dupla

com a sociedade civil, que é o que você está dizen-

do. Não é uma barca segura. Você é chamado para

garantir a política. Então nós vamos cumprir nos-

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Diálogos do Fórum DRS

sa meta justamente fazer esse bom balanço, que

medida, que transição é essa que a gente precisa

fazer para manter o jogo equilibrado no domínio,

uma política nacional que tenha impacto nacional

nesse processo. É um dever nacional mesmo e não

é só para o MDA. O bacana é isso. Não é só para

o MDA. A gente viu isso. Até hoje você tem lá um

pacote de ações do MEC, da Saúde, do Incra, que

são cursos para os territórios, feito pelo PCT, na

cria do PCT. Nós estamos num momento que nós

dizemos: Nós temos que aproveitar que há previsão

de encontro da rede agora em maio. Aí vai poder

avaliar isso. Vamos poder colocar um pouco desse

balanço que a gente pode olhar para a frente. A

rede está muito equilibrada muito no sentido de

garantir essa quebra. Há um acordo com ele mas é

preciso que a gente possa fazer um balanço dentro

do ministério em que medida a gente vai ter que

sustentar. O PCT, de certa forma, está precisando

de fato dessa avaliada. Eu acho que é um bom mo-

mento para um balanço. Eu acho.

JOAQUIM CALHEIROS SORIANO – Essa parte

que eu estava falando do nacional, tombamento

não é vinculado à situação agora, da estrutura

precária dos articuladores, dos consultores ter-

ritoriais. É para a gente poder pensar de forma

mais ampla para não substituir a precariedade.

É precária a contratação estadual e agora dividi-

mos em várias contratações estaduais também

precárias. Não é disso que eu estou falando, quer

dizer, qual o desenho necessário, se o Estado bra-

sileiro quer fazer assim, bom, tem que fazer. En-

volve isso. Eu acho que isso é um aspecto muito

importante. Quais sãos as quais são as condições

institucionais, formais do programa. Porque ele é

calcado menor vontade, a vontade presidencial,

um desenho todo em torno do programa. Já era

difícil carregar o programa Territórios Rurais, aí

você carrega mais 22 ministérios em cima, com

a mesma estrutura e faz um pacto. Tem esse as-

pecto importante.

Tem um processo em transição,

porque o Brasil está numa fase de

desenvolvimento rápido, de aparecer

novos desafios. A eliminação da

miséria é um desses, importante

desafio.

”Philippe Bonnal

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22 Diálogos do Fórum DRS

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JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Eu acho mui-

to bom esse tipo de conversa de hoje, de pensar

no jeitinho que é política pública para combater a

pobreza rural. Temos os instrumentos. Os Territó-

rios Rurais, Territórios da Cidadania, tem o Brasil

sem Miséria, que está se realizando, no âmbito do

MDA, para a área rural. E quais são os elementos

das experiências passadas que a gente pode uti-

lizar hoje, mas fundamentalmente tentar avançar,

mas não preso ao momento atual, às dificuldades

atuais, mas desenhar isso pensando o Brasil daqui

para frente. Que Brasil a gente quer? Quer dizer,

daqui a 20 anos, em 2022 ou 2032. Como o Brasil

vai ser? O que a gente tem que fazer para chegar

lá. Eu acho que seria legal. Eu acho importante

juntar nessa cara da pobreza os grandes projetos.

Eu tenho certeza disso. Eu estou com 55 anos.

Quando eu estiver com 75 anos, o Brasil preci-

sa ser bem diferente. Tenho muita confiança que

esse projeto é acumulativo e avança. A gente tem

que estar preparado para isso. Qual a nossa difi-

culdade com a pobreza? Que nosso desafio, que

a literatura, que a nossa conversa revela? Essa

coisa pode andar bem, mas não significa que todo

mundo vai aproveitar. E nessa parte muito lá de

baixo, se a gente, como disse a Miriam, se a gente

não pega com a mão, não traz pelo braço. Acho

que esse é um dos objetivos do nosso projeto do

instituto de pesquisa. E eu tenho certeza que vocês

vão sair muito bem lá.

PHILIPPE BONNAL– Eu guardo um pouco de

restrição, é a minha ideia. Em primeiro lugar, tem

um processo em transição, porque o Brasil está

numa fase de desenvolvimento rápido, de apare-

cer novos desafios. A eliminação da miséria é um

desses, importante desafio. Ao mesmo tempo,

tem que ter um patrimônio. E o patrimônio não é

esse de desenvolvimento territorial, que o Brasil

praticamente inventou. Você tenta usar esse pa-

trimônio para enfrentar esses novos desafios e

é aí que surgem várias perguntas: como fazer, a

entrada, tem que mexer um pouco na entrada. E

isso mexe com uma organização de governança

estadual, federal, municipal e tudo isso.

Então essa ideia que as coisas são realmente

dinâmicas e representam um laboratório não vai

se esgotar agora.

JERÔNIMO RODRIGUES SOUZA – Final do

tema, a estratégia de combate à pobreza ela é

com foco territorial. Então, para nós do MDA,

mais fortemente da SDT, está muito forte, mui-

to clara a estratégia territorial. Ela, a estratégia

territorial nos dá possibilidade de ver um lugar

intermediário porque o Governo Federal não tem

condição de chegar na ponta de cada município.

Pode chegar num lugar ou outro com o Mec, com

ações e mesmo se chega no Estado fica muito

distante da comunidade. Então, uma posição em

que o Estado federal se relaciona com as mesos

regiões, mas ele vai para o Estado que é o parceiro

mais forte do pacto federativo. No próximo caso

do município, tem uma estratégia que como não

dá para fazer um desenho de planejamento e de

gestão política em cada um dos 5.600 municípios,

a estratégia territorial é essa que aproxima. Então,

lá no MDA, a gente não vai conseguir chegar em

cada município, em cada comunidade rural com

o Pronat. A política chega, mas a gestão dessa

política a gente entende que é o território que vai

ter essa possibilidade de fortalecer o município, de

fortalecer o pacto federativo. Tem essas nuances

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Diálogos do Fórum DRS

aí da representatividade, do poder de barganha.

Então, para nós está claro isso. Acho que o que

está posto como consideração final dessa mesa é

esse gargalo, essas perguntas perversas, às vezes,

para a gente, mas que nos remete a criar uma

relação mais forte.

E nesse aspecto que o Phillipe traz no tema da

agricultura familiar, se for estratificar essa estru-

tura em três segmentos, a gente tem a agricultura

familiar que já está exportando, que é dinâmica.

Ela não precisa tanto da gente, de algumas ações

do MDA, como talvez os em transição e os pobres.

Agricultura familiar pobre e os em transição. Acho

que o que esse mais dinâmico precisa é de legis-

lação, de infraestrutura de comunicação, diferen-

te daquele em transição que precisa de um em-

purrão para qualificação de gestão, etc. E aquele

pobre, que não tem organização nenhuma. Que

é o terceiro. Parece-me que esses dois últimos

da dinâmica, esse é o foco da gente, e dos terri-

tórios, então. Só que acontece o que a gente viu

hoje pela manhã com vocês, que os colegiados

não conseguem dar conta de chegar, por exemplo,

nos quilombolas. A participação é fragilizada nos

territórios e veja que não é a gente que determina.

É o próprio colegiado que não consegue chegar.

Essas duas posições da estratégia territorial

como uma possibilidade de montarmos a ação

nossa com Estados, com municípios, com movi-

mento e esse olhar nosso com... A gente não pode

ficar espalhado. É claro que vai requerer ainda

mais uma ação qualificada nossa porque desses

Proinf’s nossos, digamos dos 6.000, vou pegar só

os dados do Joaquim – ele está ocupado aí – 2 mil

só em emendas parlamentares. Isso é um horror

porque emenda parlamentar o cara não está preo-

cupado com emenda parlamentar o cara não está

preocupado com Proinf. E não tem a frequência

anual. Então, a gente não pode botar, mas pas-

sa no território. A gente tem a grande dificuldade

de gestão. Não estamos colocando recursos para

investimentos e não estamos colocando um gás

maior na gestão. Construir um laticínio, um fri-

gorífico não é o mais difícil. É o mais fácil, talvez.

Mas o pior é ali. Você tem que pagar energia, pagar

pessoal, matéria prima, procurar mercado. Essa é

a inteligência que a gente precisa procurar fazer

esse pacto com os Estados. E alguns podem estar

fazendo com Sebrae, e a gente tem pouco relacio-

namento com as universidades nesse aspecto. Eu

acho que é esses três aspectos aí. Tem o aspecto

territorial, cada vez mais valendo para a gente.

Esse público da agricultura familiar, o pobre. A

agricultura familiar como é que a gente incorpora

na luta. E a gestão como elemento prioritário para

qualificar o desenvolvimento dos territórios.

SÉRGIO LEITE – Sair um pouco da zona umbi-

lical, digamos assim, e olhar um pouco mais de

fora. Eu estava num encontro de cientistas polí-

ticos no antigo Iuperj, no Rio de Janeiro, agora

chama Fiesp. Os cientistas estavam lá discutindo

e tal e uma das questões que saíram ali foi que

os cientistas políticos não tratam mais o rural. E

ficaram todos surpresos com a volta do rural. Se

o rural nunca foi, como diriam os portugueses.

Então, é impressionante como, por exemplo, o

rural saiu da agenda da análise da agenda política.

Em geral. E agora há certo retorno e interesse

desse grupo de pesquisadores pelo rural porque

em parte os atores tradicionais com os quais eles

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estavam acostumados a trabalhar se desmante-

laram. Se você pega a classe operária sindical,

digamos assim, houve uma mudança brutal e fu-

gindo aos esquemas mais tradicionais de ciência

política. Naquela ideia de sindicatos, partidos po-

líticos, eleições. Você sai desse esqueminha um

tanto quanto “quadrado” de análise eu não dou

conta de entender as transformações em curso,

particularmente, essas existentes no rural. Novas

instâncias de poder e decisão, novos atores que

não estão necessariamente nos sindicatos, uma

gama de diversidade de situações e configura-

ções sociais com as mais diversas organizações

e representações políticas. Então, fiquei bastante

impressionado com a conversa porque parecia que

esse pessoal tinha congelado o tema na década

de 50, quando tinha realmente uma repercussão

e agora estão descobrindo isso, 70 anos depois,

como se não estivesse aí.

Isso me leva a pensar que parte do tratamento

dispensado ao tema, e agora vou entrar um pouco

mais nas políticas, numa análise de política próxi-

ma ao campo dessas pessoas. Essas políticas que

estamos falando aqui são todas(...), eu dependo

daquela estruturação meio clássica, divisão do

estatuto de títulos da política, aquela que per-

tence ao núcleo duro. Numa análise de triângulo

de ferro. E essas que nós estamos tratando são

As grandes cadeias,

particularmente portadoras de

commodities, enfim, que é uma

dimensão do rural. Não a única,

como a política de territórios

mostra bem, a diversidade de

situações. Eu diria que há muito

trabalho de convencimento e

sensibilização para uma melhor

compreensão do que é o rural

”Sérgio Leite

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Diálogos do Fórum DRS

políticas completamente residuais. Se elas são

residuais, por exemplo, essa sua preocupação se

vai ter ou não vai ter grana para tocar o projeto,

pouco importa. Não afeta em nada o núcleo duro

de funcionamento do poder.

Então, a minha questão é essa. Voltando ao

tema, há também o problema de visibilidade do

rural. Quer dizer, os economistas quando mui-

to consegue chegar ao agronegócio. As grandes

cadeias, particularmente portadoras de com-

modities, enfim, que é uma dimensão do rural.

Não a única, como a política de territórios mostra

bem, a diversidade de situações. Eu diria que há

muito trabalho de convencimento e sensibiliza-

ção para uma melhor compreensão do que é o

rural. Eu diria que e esse trabalho é muito mais

árduo e necessário para dentro do governo do

que para fora. Enfim, eu não sei como se faz isso

efetivamente. De qualquer maneira, ainda acho

que a capacidade de sensibilização, diagnóstico e

identificação do real significado dessa dimensão

rural brasileira ainda está para ser construída. E

ela, me parece, a base e a justificativa, inclusive,

para manutenção das políticas que dirigem a esse

rural. Rural no sentido bem ampliado. Não é uma

coisa só setorial, não é? Estou pensando numa

coisa mais ampla. Acho que esse projeto sobre

novas ruralidades, por exemplo, teria, espera-se,

um rebatimento num redesenho inclusive orça-

mentário das políticas. Se o rural não é mais 10%,

se o rural agora é 40% eu não posso ficar com a

política orçada para 10% porque não dou conta

de atender uma meta, um público que represen-

ta 40%. Essa é a briga, portanto, toda feita em

torno do piso do agronegócio. O que está por trás

do agronegócio? está por trás dessa metodologia

de calcular o piso do agronegócio? Está por trás

uma disputa por dinheiro. Porque se o agronegócio

pesa 10, se ele pesa 30 ou 41, isso tem significado

em termos de políticas que são reivindicadas seja

estratégico, seja renegociação da dívida, etc. Eu

acho que ainda não nós. Nós fomos criados na

zona umbilical. Não precisamos nos convencer

disso, mas acho que saindo do “circuitinho”, que é

muito restrito, quando você pergunta qual a visão

que as pessoas têm do rural, é risível. Isso aí é o

Itamaraty há 10 anos atrás. O Itamaraty só foi des-

cobrir que tinha agricultura familiar com o REAF.

Só o rural, uma coisa homogeneização total, dos

produtores de cana, soja, café, laranja etc.

Enfim, acho que há efetivamente um trabalho

grande a ser feito nessa direção por mais que, por

exemplo, a agricultura familiar tenha se consoli-

dado na sua representação, eu ainda acho que ain-

da não está circunscrito ao “circuitinho”. Quando

você pensa isso no geral e vai no Ministério da Fa-

zenda, por exemplo, e pergunta o que eles acham

do peso da agricultura familiar. Duvido que você

encontre uma resposta satisfatória nessa nossa

perspectiva aqui. Por mais que tenha se difundido

os relatórios.

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