diagnostico hiperprolactinemia

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DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA HIPERPROLACTINEMIA SERVIÇO DE ENDOCRINOLOGIA DO HUWC – FUC. Clêide Maria Furtado Arruda Pires I – INTRODUÇÃO A Prolactina (PRL) é um hormônio polipeptídico de cadeia única, contendo 198 aminoácidos e peso molecular de 23.000 Da; é fracamente homóloga ao GH e ao Lactogênio placentário humano. É sintetizada e secretada pelas células lactotróficas da adenohipófise. Regulação da Secreção de PRL A secreção de PRL é controlada por fatores inibidores e estimuladores e, diferentemente dos outros hormônios hipofisários, o controle da sua secreção é predominantemente inibidor. O hipotálamo elabora uma série de fatores inibidores (PIF) e liberadores (PRF) de PRL. Fatores inibidores de PRL (PIF) ________________________________________________________ Dopamina GABA Somatostatina Acetilcolina Calcitonina Neuropeptídio Y (NPY) Peptídio atrial natriurético (PAN) Neurotensina ______________________________________________________________________________________

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Diagnostico hiperprolactinemia

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Page 1: Diagnostico hiperprolactinemia

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DA HIPERPROLACTINEMIA

SERVIÇO DE ENDOCRINOLOGIA DO HUWC – FUC. Clêide Maria Furtado Arruda Pires

I – INTRODUÇÃO A Prolactina (PRL) é um hormônio polipeptídico de cadeia única, contendo 198 aminoácidos e peso molecular de 23.000 Da; é fracamente homóloga ao GH e ao Lactogênio placentário humano. É sintetizada e secretada pelas células lactotróficas da adenohipófise. Regulação da Secreção de PRL A secreção de PRL é controlada por fatores inibidores e estimuladores e, diferentemente dos outros hormônios hipofisários, o controle da sua secreção é predominantemente inibidor. O hipotálamo elabora uma série de fatores inibidores (PIF) e liberadores (PRF) de PRL. Fatores inibidores de PRL (PIF) ________________________________________________________ • Dopamina • GABA • Somatostatina • Acetilcolina • Calcitonina • Neuropeptídio Y (NPY) • Peptídio atrial natriurético (PAN) • Neurotensina ______________________________________________________________________________________

Page 2: Diagnostico hiperprolactinemia

Fatores liberadores de PRL (PRF) ________________________________________________________ • TRH • VIP • Serotonina (5-HT) • Peptídio liberador

de PRL (PrRP) • Ocitocina • Estrógenos • Histamina • Vasopressina (AVP)

• GnRH • Opióides • PHI, PACAP • Angiotensina II

(AgII) • Substância P • Galanina • Bombesina • Interleucinas

______________________________________________________________________________________

Ações da PRL ________________________________________________________ • Lactação • Função lútea • Reprodução • Apetite • Supressão da fertilidade • Homeostase

� Sistema imunológico � Balanço osmótico

• Maturação adrenal • Coagulação ______________________________________________________________________________________

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II – HIPERPROLACTINEMIA A hiperprolactinemia é a alteração endócrina mais comum do eixo hipotálamo-hipofisário, predominando no sexo feminino. Sua prevalência é de 0,4% na população adulta geral, variando de 9 a 17% em mulheres com desordens reprodutivas. Os prolactinomas compreendem 50% das etiologias da hiperprolactinemia. São os mais comuns, podendo representar 50% dos tumores hipofisários secretores de hormônios. São classificados como microprolactinomas (diâmetro menor que 10 mm) ou macroprolactinomas (diâmetro maior que 10 mm). São quase sempre benignos e, usualmente, de crescimento lento. Ocorrem mais freqüentemente em mulheres, entre 20 e 50 anos de idade, que em homens. A grande maioria (95%) dos prolactinomas em mulheres são microadenomas, enquanto os macroadenomas ocorrem em mais de 90% dos casos em homens. Causas de hiperprolactinemia ________________________________________________________ Fisiológicas • Gravidez, lactação • Estimulação do mamilo • Estresse • Período neonatal (“leite-de-bruxa”) • Sono ________________________________________________________

Page 4: Diagnostico hiperprolactinemia

Causas de hiperprolactinemia ________________________________________________________ Farmacológicas • Antidepressivos e ansiolíticos (alprazolam, buspirona, inibidores da

MAO, inibidores da recaptação da serotonina, antidepressivos tricíclicos)

• Anti-hipertensivos (atenolol, alfa-metildopa, reserpina, verapamil) • Antipsicóticos • Bloqueadores dos receptores H2 da histamina • Hormônios (estrógenos, progestágenos, TRH) • Outras drogas (clorpromazina, anfetaminas, anestésicos, arginina,

cisaprida, metoclopramida, ácido valpróico, opiáceos, domperidona, isoniazida etc.)

________________________________________________________ Patológicas • Desordens hipotalâmicas e da haste pituitária (craniofaringioma,

sarcoidose, tuberculose, irradiação craniana, secção da haste, síndrome da sela vazia, esclerose múltipla, carcinoma metastático, hipofisite linfocítica)

• Tumores pituitários (prolactinomas, adenomas mistos secretantes de GH e PRL, adenomas secretantes de ACTH – doença de Cushing e síndrome de Nelson)

• Doenças sistêmicas (hipotireoidismo primário, insuficiência renal crônica, cirrose, lúpus)

• Irritação da parede torácica (cirurgia, herpes zoster, queimaduras, esofagite, refluxo esofágico)

• Malignidades não pituitárias (carcinoma broncogênico, adenocarcinoma renal, linfomas, hipernefroma)

• Aneurisma de carótida, gangliocitoma Hiperprolactinemia idiopática ______________________________________________________________________________________

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III – DIAGNÓSTICO DA HIPERPROLACTINEMIA Manifestações Clínicas • Nas mulheres: galactorréia, amenorréia, oligomenorréia,

infertilidade, diminuição da libido, dispareunia, osteoporose, acne/hirsutismo, ganho de peso.

• Nos homens: galactorréia, ginecomastia, disfunção erétil, infertilidade, diminuição da libido, osteoporose, ganho de peso.

Investigação Laboratorial A. Investigação Laboratorial de Prolactinoma Prolactina basal (repouso) geralmente > 100 ng/ml; FSH, LH (geralmente inibidos); E2 (em geral diminuído); Testosterona no sexo masculino (em geral diminuída); Progesterona (mulheres ainda ciclando). B. Investigação de Hiperprolactinemia associada a outras

patologias Prolactina basal (repouso); T4 livre e TSH (hipotiroidismo primário); GH e IGF1 (somatotropinoma com produção mista); Cálcio iônico; Fósforo (suspeita de NEM1*); Uréia, creatinina, TGO, TGP, FA (função renal e hepática); Investigar função hipofisária em caso de suspeita de hipopituitarismo relacionado a efeito de massa por tumor hipofisário não-funcionante; Testes de estímulo só seriam necessários se os basais não forem conclusivos; Testosterona, DHT, DHEA (em mulheres com SOP) geralmente com E2, FSH e LH elevados. * Hiperparatiroidismo está presente em 95% dos casos de NEM1. Portanto, no paciente com hipercalcemia confirmada complementar com: PTH, Gastrina, Insulina, Polipetídeo Pancreático; TC de abdome, US de pescoço e mapeamento das paratireóides.

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C. Detecção de Macroprolactinemia Forma polimérica com baixa atividade biológica, mas com imunorreatividade semelhante à PRL monomérica. Corresponde a complexos de prolactina com imunoglobulinas antiprolactina. Ocorre em cerca de 15% das hiperprolactinemias. Não há manifestações clínicas. D. Efeito Gancho (hook effect) Ocorre quando macroprolactinomas volumosos cursam com níveis de PRL menores que 100 ng/ml. Essa presença de níveis falsamente baixos de prolactina ocorre quando são empregados ensaios com dois anticorpos. Tal efeito pode ser evitado fazendo-se a diluição prévia do soro. Investigação Radiológica A. RM de hipófise: T1 e T2 sem contraste e T1 com contraste Vantagem: delineia melhor os limites do macroadenoma (invasão para-selar), diferencia conteúdo cístico de hemorrágico, determina relação do adenoma com o quiasma óptico. B. TC de hipófise com cortes coronais (sem e com contraste) Tríade → hipocaptação focal de contraste + desvio da haste + assimetria do assoalho selar (melhor visualização de estrutura óssea). Avaliação Oftalmológica Necessária em pacientes portadores de macroadenoma hipofisário com expansão supra-selar para determinação do tratamento e acompanhamento. Mandatório na gestação. A. Campimetria visual; B. Fundo de Olho.

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IV – TRATAMENTO DA HIPERPROLACTINEMIA • Induzida por drogas: suspensão da medicação. • Hipotiroidismo: reposição com L-tiroxina. • Idiopática: agonistas dopaminérgicos. • Pseuprolactinomas: cirurgia. • Prolactinomas: agonistas dopaminérgicos, cirurgia e radioterapia. Agonistas Dopaminérgicos (AD) (reduzem em torno de 80% o tamanho do tumor) • Mecanismo de ação: atuam sobre os receptores D2 da dopamina nos

lactótrofos, inibindo a síntese e a secreção de PRL e diminuindo a síntese de DNA celular e crescimento do tumor.

• Principais drogas: o Bromocriptina (BRC): Parlodel, Bagren; o Lisurida: Dopergin; o Pergolida: Permax; o Cabergolina: Dostinex; o Quinagolida: Norprolac.

Bromocriptina (BRC) • Eficácia e tolerabilidade: normalização da PRL (70 a 80%); retorno

de menstruações ovulatórias (80 a 90%); redução tumoral (75%); efeitos colaterais (até 30%); intolerância (5-10%); resistência (5-18%).

• Efeitos colaterais: náuseas, vômitos, cefaléia, fadiga, congestão nasal, hipotensão postural, constipação, dor abdominal. Raros: depressão, psicose, rinoliquorréia.

• Posologia: 5 a 7,5 mg/dia. Iniciar com doses pequenas, 1/4 do comprimido (0,625 mg) à noite. No prolactinoma gigante, são necessárias doses maiores, em torno de 15 mg/dia, e a resposta de tais tumores é lenta.

• Bromocriptina LAR: 50 a 250 mg/IM/mensal.

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Cabergolina • Maior afinidade pelos receptores D2 nas células lactotróficas e

meia-vida prolongada, podendo ser administrada uma ou duas vezes por semana.

• Opção nos casos de intolerância ou resistência à BRC ou a outros AD.

• Efeitos colaterais: semelhantes aos da BRC, porém com freqüência significativamente menor (3 a 4% dos pacientes).

• Posologia: iniciar com 0,25 mg, uma ou duas vezes por semana, com reajustes de dose e freqüência de acordo com a resposta do paciente.

• Desvantagem: custo elevado. Cirurgia (Transesfenoidal) As indicações cirúrgicas compreendem intolerância ou resistência à terapia medicamentosa, apoplexia hipofisária com manifestações neurológicas, fístula liquórica decorrente de redução tumoral após tratamento clínico em macroprolactinomas invasivos para o seio esfenoidal e crescimento tumoral na vigência de tratamento clínico. Radioterapia Nos casos de intolerância ou resistência ao AD, quando a cirurgia não foi bem-sucedida. A resposta é lenta ou incompleta (2 a 15 anos) e há risco elevado de hipopituitarismo (30 a 50% dos pacientes) e carcinogênse cerebral. A dose usual é de 4.500 cGy. Radiocirugia gama-knife Remissão em 30 a 40% dos pacientes em dois anos.

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Análogos da Somatostatina São promissores como uma nova terapêutica medicamentosa, principalmente quando houver intolerância ou resistência ao AD. Prolactinomas e Gestação Na gestação (controle com campimetria e fundo de olho) o tratamento pode ser mantido nos casos de macroprolactinoma (ocorre aumento tumoral em 16-25% dos casos) e mais raramente nos microprolactinomas (aumento tumoral em 1,4 a 6% dos casos).

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Algoritmo para investigação de Hiperprolactinemia

PROLACTINA

>200 ng/ml <200 ng/ml

PROLACTINOMA CAUSAS FISIOLÓGICAS (stress, exercício, gestação)

TC ou RM sela Campo visual

Avaliar função hipofisária Avaliar NEM I

CAUSAS FUNCIONAIS

Drogas lesão parede torácica

hipotiroidismo 1º falência renal ou hepática

AUSENTE PRESENTE

Remoção/Tratamento PRL persistente

aumentada

ORIGEM HIPOTALÂMICA

HIPOFISÁRIA

PRL normal

Confirma funcional

TC ou RM sela Campo visual

Avaliar função hipofisária Efeito de massa

Tumor Hipofisário Prolactinoma

Adenoma misto Adenoma não-

funcionante

Doença orgânica infiltrativa Hipotalâmica/Hipofisária (sarcoidose, tuberculose,

histiocitose X)

Idiopática (reavaliar

periodicamente

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Bibliografia BANDEIRA, Francisco (editor chefe). Condutas em Endocrinologia. Rio de Janeiro: MEDSI – Editora Médica e Científica Ltda., 2003. CUKIERT, Arthur & LIBERMAN, Bernardo. Neuroendocrinologia: Clínica e Cirúrgica. São Paulo: Lemos Editorial, 2002. VILAR, Lúcio et al., Armadilhas no Diagnóstico da Hiperprolactinemia. In: Arquivos Brasileiros e Endocrinologia & Metabologia, vol. 47, n.4, agosto/2003.