diagnóstico e tratamento das principais lesões tendinosas e ligamentosas dos equinos

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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA Faculdade de Medicina Veterinária Diagnóstico e tratamento das principais lesões tendinosas e ligamentosas dos equinos Diana Abril Pereira Lapa CONSTITUIÇÃO DO JÚRI Professor Doutor José Sales Luís Professor Doutor Armando Panhanha Serrão Doutor Nuno Filipe Bernardes ORIENTADOR Doutor Pedro Pinto Bravo LMV, MsC CO-ORIENTADOR Doutor Nuno Filipe Bernardes LMV, MSC 2009 Lisboa

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medicina veterinária - grandes animais

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  • UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA

    Faculdade de Medicina Veterinria

    Diagnstico e tratamento das principais leses tendinosas e ligamentosas dos equinos

    Diana Abril Pereira Lapa

    CONSTITUIO DO JRI

    Professor Doutor Jos Sales Lus

    Professor Doutor Armando Panhanha Serro

    Doutor Nuno Filipe Bernardes

    ORIENTADOR

    Doutor Pedro Pinto Bravo

    LMV, MsC

    CO-ORIENTADOR

    Doutor Nuno Filipe Bernardes

    LMV, MSC

    2009

    Lisboa

  • UNIVERSIDADE TCNICA DE LISBOA

    Faculdade de Medicina Veterinria

    Diagnstico e tratamento das principais leses tendinosas e ligamentosas dos equinos

    Diana Abril Pereira Lapa

    DISSERTAO DE MESTRADO EM MEDICINA VETERINRIA

    CONSTITUIO DO JRI

    Professor Doutor Jos Sales Lus

    Professor Doutor Armando Panhanha Serro

    Doutor Nuno Filipe Bernardes

    ORIENTADOR

    Doutor Pedro Pinto Bravo

    LMV, MsC

    CO-ORIENTADOR

    Doutor Nuno Filipe Bernardes

    LMV, MSC

    2009

    Lisboa

  • DEDICATRIA

    Dedico esta dissertao aos meus pais e ao meu irmo, pelo apoio incondicional na realizao

    de todas as minhas escolhas pessoais e profissionais.

    Sei que esto sempre presentes.

  • i

    AGRADECIMENTOS

    Agradeo ao Dr. Pedro Pinto Bravo por me permitir acompanhar o dia-a-dia da sua prtica

    clnica, pela orientao e aprendizagem durante o perodo de estgio e pela sua colaborao

    neste trabalho. Agradeo tambm a toda sua equipa Equicare pela disponibilidade prestada.

    Agradeo ao Dr. Nuno Bernardes todo o apoio ao longo dos anos de faculdade, todas as

    oportunidades na clnica equina que me tem facultado e que me tm proporcionado

    experincia na rea. Agradeo a sua orientao na escolha do tema e pesquisa bibliogrfica

    para a realizao deste trabalho e sobretudo, agradeo a dedicao e empenho ao longo do

    desenvolvimento desta dissertao, tornando-a possvel. Agradeo tambm a amizade e o

    carinho nos momentos difceis.

    Agradeo ao Dr. Rui Mendes pela cedncia de imagens ecogrficas que contriburam para o

    enriquecimento desta dissertao e as oportunidades na clnica equina que me facultou.

    Agradeo ao Dr. Jos Carlos Estepa Nieto pela cedncia de imagens ecogrficas e prontido

    prestada que contriburam para o enriquecimento desta dissertao.

    Agradeo s minhas amigas (Ana, Carla, Lia e Solange) pela amizade, carinho e apoio nos

    bons e nos maus momentos e a guarida durante o tempo de escrita.

    Agradeo ainda minha famlia por todo o carinho e apoio desde sempre.

  • ii

    Diagnstico e tratamento das principais leses tendinosas e ligamentosas dos equinos

    Resumo

    As leses tendinosas e ligamentosas dos membros dos cavalos de desporto, representam

    grande parte da patologia msculo-esqueltica da prtica clnica em equinos. As principais

    preocupaes que se colocam relativamente a estas patologias so os prolongados tempos de

    recuperao e a incerteza de uma recuperao total no final do tratamento. Para garantir

    maiores taxas de sucesso os animais so retirados da actividade desportiva por longos

    perodos de tempo, para que assim possam ser implementados programas de tratamento

    complexos e morosos e ainda para que a sua recuperao possa ser cuidadosamente

    monitorizada, at que estejam novamente aptos a retornar a actividade desportiva. Na maioria

    dos casos este perodo de afastamento da competio no inferior a um ano.

    A reduo do tempo de recuperao, a obteno de tecidos cicatriciais resistentes e o retorno

    do animal aos nveis desportivos anteriores, so os principais motivos que tm incentivado os

    veterinrios a recorrer ao uso de mais mtodos de diagnstico e de protocolos teraputicos

    menos complexos e mais eficazes.

    A presente dissertao de mestrado rene os estudos mais recentes nas reas de diagnstico e

    de tratamento que se tm realizado nos ltimos 10 anos e que actualmente representam novas

    e melhores ferramentas ao dispor dos mdicos veterinrios. Os mtodos de diagnstico so

    mais complexos e permitem uma melhor compreenso de determinadas leses, bem como o

    diagnstico de outras que at ento se desconheciam e que comprometiam o sucesso

    teraputico. As novas modalidades teraputicas complementam os protocolos anteriores e

    permitem uma reduo dos tempos de tratamento assim como, maiores taxas de sucesso

    clnico.

    Palavras-chave: Leses, tendinosas, ligamentosas, diagnstico, teraputica.

  • iii

    Diagnosis and treatment of the most important tendon and ligament lesions in horses

    Abstract

    The lesions that occur in tendons and ligaments on the distal aspect of the limbs in horses,

    correspond to the majority of clinical problems of the musculoskeletal system on equine

    practice. The major concerns are related to the long periods of recovery and the uncertainty of

    a full recovery of these lesions by the end of the treatment. To warrant higher rates of

    successful treatments the animals should be removed from active sport competition for long

    periods of time. By this time treatment protocols for these lesions can be initiated and a close

    monitoring of the lesions can be performed until full recovery is achieved. Most of the times

    these long periods away from active sport competition can extend to almost a year.

    The main reasons that promote the use of more efficient diagnostic aids by the equine

    practitioners and that makes them study less complex treatment protocols are the reduction of

    the recovery periods, the achievement of regenerated tissues that are more resistant to tension

    and the ultimate goal of returning to the previous level of exercise that horses had right before

    the lesion.

    This work collects the information of some studies from the last ten years regarding the

    diagnostic and treatment aids that represent newer and better tools available to practitioners.

    The most recent diagnostic procedures are more complex and allow a better understanding of

    certain lesions and the diagnosis of others, that previously where unnoticed, that could

    compromise the therapeutic success. The new therapeutical tools complement previously

    designed protocols, allowing a reduction of the recovery periods and the increase of clinical

    success rates.

    Key words: lesions, tendons, ligaments, diagnostic, treatment

  • iv

    NDICE GERAL

    AGRADECIMENTOS i

    RESUMO. ii

    ABSTRACT. iii

    NDICE GERAL. iv

    NDICE DE FIGURAS. vii

    NDICE DE GRFICOS.......... ix

    NDICE DE ABREVIATURAS.. x

    RELATRIO DE ESTGIO 1

    INTRODUO E OBJECTIVOS 3

    1. ANATOMIA DAS EXTREMIDADES DISTAIS DOS MEMBROS DOS

    EQUINOS 4

    1.1. MEMBRO ANTERIOR.. 4

    1.1.1. Tendes extensores.. 5

    1.1.2. Tendes flexores...... 6

    1.1.3. Ligamento suspensor do boleto...... 7

    1.1.4. Aparelho suspensor. 7

    1.2. MEMBRO POSTERIOR 7

    1.2.1. Tendes extensores.. 7

    1.2.2. Tendes flexores.. 8

    1.2.3. Aparelho suspensor. 9

    2. PARTICULARIDADES DA COMPOSIO HISTOLGICA, DA

    FISIOLOGIA E DA BIOMECNICA DOS TENDES E

    LIGAMENTOS...... 9

    2.1. ESTRUTURA ANATMICA E FISIOLOGIA... 9

    2.2. IRRIGAO SANGUNEA... 10

    2.3. PROPRIEDADES MECNICAS.. 11

    2.4. RESPOSTA LESO E CICATRIZAO....... 12

    3. MTODOS DE DIAGNSTICO..... 13

    3.1. EXAME FSICO: VISUAL, ESTTICO E DINMICO.... 13

    3.2. RADIOGRAFIA... 18

    3.3. ECOGRAFIA... 19

    3.4. CINTIGRAFIA 23

    3.5. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA 24

  • v

    3.6. RESSONNCIA MAGNTICA 25

    3.7. TERMOGRAFIA. 26

    4. TRATAMENTO. 28

    4.1. TRATAMENTO MDICO. 28

    4.2. TRATAMENTO CIRRGICO.. 31

    4.2.1. Tendon splitting 31

    4.2.2. Desmotomia do ligamento acessrio do tendo flexor digital superficial (LA

    do TFDS).. 31

    4.2.3. Desmotomia do ligamento acessrio do tendo flexor digital profundo (LA

    do TFDP).. 32

    4.2.4. Desmotomia do ligamento anular palmar/plantar (LAP)... 33

    4.3. NOVAS MODALIDADES DE TRATAMENTO. 34

    4.3.1. Matriz acelular de bexiga de porco... 35

    4.3.2. Clulas germinativas mesenquimatosas 36

    4.3.3. Factores de crescimento.. 38

    4.3.4. Terapia por ondas de choque extra-corporais.. 41

    4.4. FISIOTERAPIA... 44

    4.5. FERRAO. 46

    5. LESES... 48

    5.1. LESES TENDINOSAS. 48

    5.1.1. Tendinite do Tendo Flexor Digital Superficial .. 48

    5.1.2. Tendinite do Tendo Flexor Digital Profundo. 54

    5.2. LESES LIGAMENTOSAS... 59

    5.2.1. Desmite do ligamento suspensor do boleto.... 59

    5.2.1.1. Desmite proximal do Ligamento Suspensor do Boleto.. 59

    5.2.1.2. Desmite do corpo do Ligamento Suspensor do Boleto.. 63

    5.2.1.3. Desmite dos ramos do Ligamento Suspensor do Boleto 65

    5.3. LESES NAS BAINHAS DE TENDES. 67

    5.3.1. Tenossinovites.. 67

    5.3.1.1. Tenossinovite idioptica .. 68

    5.3.1.2. Tenossinovite traumtica. 69

    5.3.1.3. Tenossinovite sptica 71

    6. APRESENTAO DE CASOS CLNICOS... 73

    6.1. CASO 1.. 73

  • vi

    6.2. CASO 2.. 77

    6.3. CASO 3.. 80

    6.4. CASO 4.. 83

    DISCUSSO 85

    CONCLUSO. 89

    BIBLIOGRAFIA. 93

  • vii

    NDICE DE FIGURAS

    Figura 1 - Anatomia do membro anterior equino.. 5

    Figura 2 - Anatomia do membro posterior equino............ 8

    Figura 3 - Ecgrafo com sonda linear........... 20

    Figura 4 - Sistema de diviso do membro anterior do cavalo em 7 zonas, para

    identificao do local da leso... 22

    Figura 5 - Fotografia de um cavalo sob anestesia geral em preparao para a realizao

    de uma TC. A mesa tem capacidade para suportar o animal 24

    Figura 6 - A. Aparelho de ressonncia magntica de menor intensidade. B. Animal

    posicionado no aparelho para avaliao da extremidade distal do membro anterior

    direito. 26

    Figura 7 - A. Termografia face palmar dos membros anteriores de um cavalo. A regio

    flexora do membro direito est inflamada. B. Termografia dos membros posteriores de

    um cavalo. O bordo coronrio do membro esquerdo demonstra um fluxo sanguneo

    normal. C. Termografia aos membros posteriores de um cavalo onde possvel avaliar as

    diferenas de temperatura entre a extremidade distal dos membros, que est elevada, e os

    curvilhes, onde est diminuda 27

    Figura 8 - A. Centrifugadora com kits usada para obter PRP. B. Copo onde foi colocada a

    amostra de sangue que foi centrifugada para obteno de PRP 39

    Figura 9 - Exemplo de um cavalo a receber TOC. 43

    Figura 10 - Ecografia de um caso de tendinite no TFDS. esquerda em corte transversal,

    direita em corte longitudinal (a rea da leso encontra-se delineada a vermelho)........ 51

    Figura 11 - Ecografia de um caso de tendinite no TFDS (a rea da leso encontra-se

    delineada a vermelho)... 52

    Figura 12 - Ecografia de um caso de tendinite no TFDP. esquerda em corte transversal,

    direita em corte longitudinal (a rea da leso encontra-se delineada a vermelho)............ 56

    Figura 13 - Ecografia de um caso de tendinite no TFDP (a rea da leso encontra-se

    delineada a vermelho)... 57

    Figura 14 - Ecografia de um caso de desmite do corpo do LSB (a rea da leso encontra-

    se delineada a vermelho).. 64

    Figura 15 - Ecografia de um caso de desmite do corpo do LSB (a rea da leso encontra-

    se delineada a vermelho)... 65

    Figura 16 Ecografia de um caso de desmite de um ramo medial do LSB (a rea da leso

    encontra-se delineada a vermelho).... 66

  • viii

    Figura 17 - Ecografia da leso na face palmar do tero mdio do MAE (entre as zonas 1B

    e 2A), realizada a 17 de Outubro de 2008. A. Ecografia da leso em corte longitudinal. B.

    Ecografia da leso em corte transversal............................ 76

    Figura 18 - A e B. Ecografias da leso na face palmar do tero mdio do MAE (entre as

    zonas 1B e 2A) em cortes transversais, realizada a 15 de Novembro de

    2008... 76

    Figura 19 - Ecografia da leso na face palmar do tero mdio do MAE (entre as zonas 1B

    e 2A), realizada a 15 de Dezembro de 2008. A. Ecografia da leso em corte transversal,

    comparando com a mesma regio do membro contralateral saudvel. B. Ecografia da

    leso em corte longitudinal, comparando com a mesma regio do membro contralateral

    saudvel. 77

    Figura 20 - Ecografia da leso na face palmar no tero mdio do MAE (2A), realizada a

    17 de Outubro de 2008. A. Ecografia da leso em corte longitudinal. B. Ecografia da

    leso em corte transversal 79

    Figura 21 - A e B. Ecografias da leso na face palmar no tero mdio do MAE (2A) em

    cortes transversais, realizadas a 15 de Novembro de 2008............... 79

    Figura 22 - Ecografia da leso na face palmar do tero mdio do MAE em corte

    transversal (ecografia mais esquerda), comparando com a mesma regio do membro

    contralateral saudvel (ecografia mais direita), realizada a 15 de Dezembro de 2008.. 80

    Figura 23 - Ecografia da leso no tero proximal palmar do MAE (1B), realizada a 17 de

    Outubro de 2008. A. Ecografia da leso em corte longitudinal. B. Ecografia da leso em

    corte transversal 82

    Figura 24 - Ecografia da leso no tero proximal palmar do MAE (1B), realizada a 15 de

    Novembro de 2008. A. Ecografia da leso em corte transversal. B. Ecografia da leso em

    corte longitudinal.. 82

    Figura 25 - Ecografia da leso no tero proximal palmar do MAE (1B), realizada a 15 de

    Dezembro de 2008. A. Ecografia da leso em corte transversal, comparando com a

    mesma regio do membro contralateral saudvel. B. Ecografia da leso em corte

    longitudinal, comparando com a mesma regio do membro contralateral

    saudvel. 83

    Figura 26 - Animal com inflamao ao nvel da regio palmar da canela no MAD.. 84

    Figura 27 - O mesmo animal, mas recuperado da inflamao na regio palmar da canela

    no MAD..... 84

  • ix

    NDICE DE GRFICOS

    Grfico 1 - Casustica geral da clnica de cavalos em regime de ambulatrio observada

    entre Setembro e Dezembro de 2008, nas regies de Coimbra e Aveiro............................. 2

    Grfico 2 - Percentagem das leses tendinosas e ligamentosas nos casos de

    ortopedia... 2

    Grfico 3 - Plano de exerccio com aumento gradual de durao e intensidade do animal

    no caso 1... 74

    Grfico 4 - Plano de exerccio com aumento gradual de durao e intensidade da

    segunda leso do animal no caso 1. 75

    Grfico 5 - Plano de exerccio com aumento gradual de durao e intensidade do animal

    em estudo no caso 2. 78

    Grfico 6 - Plano de exerccio com aumento gradual de durao e intensidade do animal

    em estudo no caso 3. 81

  • x

    NDICE DE ABREVIATURAS

    AINEs - Anti-inflamatrios no esterides

    AH - cido hialurnico

    bFGF - basic Fibroblast Growth Factor

    BAPN - Beta-aminoproprionitrilo

    CG - Clulas germinativas

    COMP - Cartilage oligomeric matrix protein

    DMSO - Dimetilsulfxido

    FC - Factores de crescimento

    GAG - Glicosaminoglicanos

    GAGPS - Glicosaminoglicanos polissulfatados

    HGF - Hepatocyte Growth Factor

    IFD - Interfalngica distal

    IFP - Interfalngica proximal

    IGF-I - Insulin-like Growth Factor I

    kg - Quilograma

    LA - Ligamento acessrio

    LADD - Ligamento anular digital distal

    LADP - Ligamento anular digital proximal

    LAP - Ligamento anular palmar/plantar

    LSB - Ligamento suspensor do boleto

    MAD - Membro anterior direito

    MAE - Membro anterior esquerdo

    MC III - Metacarpo III

    mg - Miligrama

    MHz - Megahertz

    ml - Mililitro

    MPD - Membro posterior direito

    MPE - Membro posterior esquerdo

    MT III - Metatarso III

    P1 - Primeira falange

    P2 - Segunda falange

    P3 - Terceira falange

    PDGF - Platelet Derived Growth Factor

    PRP - Plasma rico em plaquetas

  • xi

    RM Ressonncia magntica

    SPF - Specific Pathogen Free

    TC Tomografia computadorizada

    TSA - Teste de sensibilidade a antibiticos

    TEDC - Tendo extensor digital comum

    TEDL - Tendo extensor digital lateral

    TFDP - Tendo flexor digital profundo

    TFDS - Tendo flexor digital superficial

    TGF- - Transforming Growth Factor

    TOC Terapia por ondas de choque

    TOCR - Terapia por ondas de choque radiais

    VEGF - Vascular Endothelial Growth Factor

  • 1

    RELATRIO DE ESTGIO

    O presente estgio realizou-se entre os meses de Setembro e Dezembro do ano de 2008 e

    incidiu no acompanhamento da clnica ambulatria em cavalos sob orientao do Dr. Pedro

    Pinto Bravo, nas regies de Coimbra e Aveiro. A clnica ambulatria em cavalos apresenta

    uma casustica particular, com principal incidncia de casos na rea da reproduo, e dos

    aparelhos msculo-esqueltico e articular (claudicaes na sua maioria) e digestivo (casos de

    dor abdominal aguda).

    Durante o perodo de estgio foram vistos 177 casos clnicos. 57 destes casos foram seguidos

    mais do que uma vez, correspondendo a um total de 173 observaes dos referidos casos.

    Com os restantes 120 casos perfez um total de 293 observaes clnicas. Durante este perodo,

    a maioria dos casos observados correspondia a animais de desporto, facto que justifica uma

    maior percentagem de leses a nvel ortopdico como se pode confirmar nos 31,64% de casos

    de ortopedia no Grfico 1. Destes, apenas 14,29% corresponderam a casos de leses em

    tendes e ligamentos (Grfico 2), enquanto 85,71% estavam relacionados com outros

    problemas do aparelho locomotor, tais como abcessos do casco e outras claudicaes sem

    origem nos tecidos moles, ou seja, com origem ssea ou articular. Depois do aparelho

    msculo-esqueltico a maioria dos casos observados corresponderam a patologias dos

    aparelhos digestivo e reprodutor. Os casos de gastroenterologia registados compreendiam

    maioritariamente as situaes de dor abdominal aguda vulgarmente designados de clica.

    Foi ainda registado um caso de megaesfago numa poldra de 6 meses. A rea da reproduo

    representa uma percentagem relativamente baixa (apenas 14,12%), facto que pode ser

    justificado pela altura do ano em que o estgio decorreu, uma vez que em Portugal a poca

    tradicional de reproduo desta espcie polistrica sazonal tem incio em Fevereiro.

    Os 10,17% de casos correspondentes rea de traumatologia, incluem leses provocadas por

    cordas, arames, ferros, estacas de madeira, parafusos no protegidos, etc, presentes no

    ambiente do cavalo. A maioria destes casos ocorreu em animais de lazer, visto que os animais

    de desporto de um modo geral esto mais protegidos deste tipo de acidentes. A elevada

    percentagem de casos observados na rea de estomatologia (9,60% de acordo com o Grgico

    1) reflecte a importncia crescente da dentisteria na sade oral do cavalo. Estes aspectos so

    importantes na promoo de uma mastigao dos alimentos facilitando a sua digesto mas

    tambm conseguindo que no haja interferncia com as embucaduras durante os treinos ou

    provas. Esta interferncia particularmente importante quando se considera a alterao de

    desempenho desportivo em animais de desporto.

  • 2

    Grfico 1 Casustica geral da clnica de cavalos em regime de ambulatrio, observada entre

    Setembro e Dezembro de 2008, nas regies de Coimbra e Aveiro.

    Grfico 2 Percentagem das leses tendinosas e ligamentosas nos casos de ortopedia.

    Os casos de dermatologia observados eram na sua maioria casos de dermatofilose que quando

    afectam as quartelas so denominados de arestins e a incidncia, que significativa, vai de

    encontro com a altura do ano em que decorreu o perodo de estgio. nestas alturas que o

    facto de os animais no serem bem secos depois de tomarem banho e o clima hmido prprios

    do Outono e Inverno permitem a proliferao do Dermatophilus congolensis, agente

    responsvel por estas leses drmicas.

    Os restantes casos apresentam uma casustica menor mas que retracta globalmente a clnica

    ambulatria seguida durante o perodo de tempo referido.

  • 3

    INTRODUO E OBJECTIVOS

    O aparelho msculo-esqueltico e articular sede da maioria das patologias clnicas em

    cavalos de desporto. Mesmo situaes consideradas de menor gravidade podem comprometer

    seriamente o desempenho desportivo de um animal de alta competio. Um dos grupos de

    estruturas mais importantes nestas patologias so os tendes e os ligamentos, os quais, pelas

    particularidades da sua composio histolgica, da sua fisiologia e biomecnica, apresentam

    grandes problemas no que respeita sua regenerao e cicatrizao. Por estes motivos torna-

    se imprescindvel um maior cuidado na abordagem a estes animais. Deve atender-se

    brevidade com que o mdico veterinrio deve ser chamado, mas tambm ao cuidadoso

    diagnstico das principais patologias que afectam este grupo de estruturas. ainda de vital

    importncia a instituio dos respectivos protocolos de tratamento, de forma a no

    comprometer a carreira desportiva futura destes animais.

    Na presente dissertao ser feita uma descrio das principais leses que afectam os tendes

    e os ligamentos em cavalos. Estas leses sero descritas sob o ponto de vista do diagnstico

    obtido por ecografia, sero discutidas as principais opes teraputicas apoiadas pelos estudos

    mais recentes ao dispor do mdico veterinrio, e ser avaliado o prognstico esperado em

    cada situao. No final do trabalho so tambm descritos alguns casos acompanhados durante

    o tempo de estgio, detalhando os resultados do diagnstico, do tratamento institudo e do seu

    resultado a curto-mdio prazo.

    O objectivo geral desta dissertao pretende abordar a integrao dos meios de diagnstico

    actualmente disponveis no diagnstico de leses tendinosas e ligamentosas em equinos e

    referir quais os tratamentos mais adequados a cada caso.

    O leque actual e mais alargado de exames complementares possibilita agora o diagnstico de

    leses que anteriormente estavam ecograficamente inacessveis, quer fosse pela sua

    localizao quer fosse pelas suas dimenses muito reduzidas.

    Os tratamentos que vm sendo implementados neste tipo de leses so complexos, exigem

    uma grande disponibilidade e comprometimento por parte dos tratadores ou proprietrios dos

    pacientes e requerem perodos de recuperao bastante prolongados. Desta maneira os

    animais so afastados da competio e do seu dia-a-dia normal de trabalho, por perodos de

    tempo mais ou menos indeterminados, mas sempre prolongados. A estes factores ainda

    adicionada a incerteza de uma recuperao completa do animal. Tem portanto todo o interesse

    a procura contnua de protocolos mdicos, cirrgicos e fisioteraputicos que sejam cada vez

    mais prticos e precisos, que consigam reduzir os perodos de recuperao dos animais e

    ainda que permitam maiores taxas de sucesso clnico.

  • 4

    Em suma pretende-se abordar a investigao realizada nas reas de diagnstico e tratamento

    de leses tendinosas e ligamentosas durante os ltimos 10 anos e o seu potencial em termos

    de informao para a clnica desportiva equina.

    1. ANATOMIA DAS EXTREMIDADES DISTAIS DOS MEMBROS DOS EQUINOS

    As extremidades distais dos membros dos equinos, distalmente ao carpo e ao tarso, so

    compostas maioritariamente por ossos, tendes e ligamentos. Os ligamentos mantm a ligao

    entre os ossos, ao nvel das articulaes e os tendes transmitem a aco dos msculos do

    membro s estruturas sseas mais distais. O grande comprimento destes tendes e a sua

    composio bem como a dos ligamentos tornam estas estruturas muito atreitas ao

    desenvolvimento de leses.

    Seguidamente ser feita uma pequena reviso da anatomia dos membros dos equinos, em

    particular das estruturas acima referidas. Tanto os membros anteriores como os membros

    posteriores apresentam uma anatomia muito semelhante nas regies referidas. Desta forma a

    descrio anatmica ser feita por defeito para o membro anterior. As diferenas em relao

    ao membro posterior sero devidamente assinaladas.

    1.1. MEMBRO ANTERIOR

    O esqueleto sseo do membro anterior distalmente ao carpo composto pelo terceiro

    metacarpiano (MC III) e metacarpianos acessrios (MC II e IV), pelas falanges proximal,

    mdia e distal (P1, P2, P3), por dois ossos sesamides proximais ao nvel da articulao

    metacarpofalngica (articulao do boleto) e pelo osso sesamide distal, tambm designado

    de navicular.

    A regio da canela constituda pelos trs metacarpianos. O boleto tem correspondncia

    anatmica com a articulao metacarpofalngica que formada pela extremidade distal do

    MC III, pela extremidade proximal da P1 e pelos sesamides proximais localizados

    palmarmente. A quartela tem como base ssea a P1 e a P2. J o casco contm a extremidade

    distal da P2, a P3 e o navicular. As trs falanges articulam-se entre si formando as articulaes

    interfalngicas proximal (entre a P1 e a P2) e distal (entre a P2, a P3 e a face dorsal do

    navicular). As articulaes entre os ossos so reforadas por ligamentos e mobilizadas por

    intermdio dos tendes. Os tendes so estruturas relativamente inelsticas e que transmitem

    a aco dos msculos aos ossos localizados distalmente ao carpo. Estas estruturas apresentam

    um percurso sobre as faces dorsal e palmar do membro e quando passam pelas articulaes,

  • 5

    so mantidos em posio por intermdio de bandas de tecido conjuntivo. Estas incluem os

    retinculos ao nvel do carpo, o ligamento anular palmar (LAP) ao nvel do boleto e os

    ligamentos anulares digitais proximal e distal (LADP e LADD) ao nvel da quartela. Tambm

    ao nvel das articulaes os tendes esto envolvidos pelas bainhas sinoviais que evitam

    frico destes sobre a articulao. As bainhas sinoviais so compostas por dois folhetos, o

    parietal que sinovial e o visceral que fibroso, por entre os quais se encontra o lquido

    sinovial que possibilita o deslizamento dos tendes sobre as articulaes (Stashak, 1998).

    Figura 1 Anatomia do membro anterior equino.

    Fonte: (Stashak, 1998)

    Os tendes da extremidade distal dos membros esto agrupados em tendes extensores, que

    passam na face dorsal das estruturas sseas e em tendes flexores, que passam na face palmar

    ou plantar dos membros.

    1.1.1. Tendes extensores

    O tendo extensor digital comum (TEDC) faz parte do msculo extensor digital comum que

    tem origem na face craniolateral da extremidade distal do mero. Este tendo passa ao longo

  • 6

    das faces dorsais do MC III e das trs falanges e vai-se inserir no processo extensor da P3.

    Sensivelmente a meio da difise do MC III o TEDC recebe o tendo extensor digital lateral

    (TEDL), com o qual se liga. O TEDC tem tambm inseres nas extremidades proximais de

    P1 e P2 e envolvido por uma bainha sinovial na sua passagem pela face dorsal do boleto.

    O TEDL faz parte do msculo extensor digital lateral que tambm se origina proximalmente

    na face craniolateral da extremidade distal do mero. Tanto o msculo como o tendo tm

    uma posio lateral no membro, no entanto, como referido anteriormente, a meio da difise do

    MC III, o tendo toma uma posio dorsal e junta-se ao TEDC. Insere-se distalmente na

    extremidade proximal da P1 lateralmente insero mdia do TEDC (Stashak, 1998).

    Estes dois tendes esto envolvidos por bainhas sinoviais quando passam nas faces dorsais do

    carpo e do boleto.

    1.1.2. Tendes flexores

    O tendo flexor digital superficial (TFDS) faz parte do msculo flexor digital superficial que

    emerge da face caudomedial da extremidade distal do mero. Durante o seu percurso ao longo

    do antebrao, cuja base ssea so o rdio e a ulna, toma uma posio mais palmar. Este

    tendo a estrutura mais superficial ao longo das faces palmares do MC III e do boleto. Ao

    nvel da quartela bifurca-se em dois ramos que percorrem as faces lateral e medial da P1 e que

    se vo inserir nas extremidades distal da P1 e proximal da P2, palmarmente aos ligamentos

    colaterais da articulao interfalngica proximal (IFP). O ligamento acessrio do TFDS (LA

    do TFDS) tem origem na face caudal do rdio e une-se ao tendo ao nvel da regio inferior

    do antebrao.

    O tendo flexor digital profundo (TFDP) faz parte do msculo flexor digital profundo que, tal

    como o TFDS, emerge da face caudomedial da extremidade distal do mero e segue numa

    posio dorsal ao TFDS ao longo das faces palmares do MC III e do boleto. Proximalmente

    ao canal do boleto, o TFDP passa por uma abertura circular no TFDS denominada de Manica

    flexoria e ao nvel da quartela passa pela bifurcao do TFDS seguindo para a sua insero

    distal na face flexora da P3. O ligamento acessrio do TFDP (LA do TFDP) tem origem numa

    cpsula fibrosa na face palmar da articulao do carpo e insere-se no TFDP sensivelmente a

    meio da canela (Stashak, 1998).

    Estes dois tendes so envolvidos pela bainha sinovial do carpo na face palmar do carpo e

    pela bainha digital na face palmar da articulao do boleto e quartela.

  • 7

    1.1.3. Ligamento suspensor do boleto

    Na face palmar do MC III encontra-se tambm o ligamento suspensor do boleto (LSB).

    Localizado mais dorsalmente aos tendes flexores um ligamento largo, achatado e

    constitudo por fibras musculares organizadas em duas bandas longitudinais nas partes

    proximal e no corpo do ligamento. Tem origem nas faces palmares da fileira distal dos ossos

    do carpo e da extremidade proximal do MC III. Ao nvel distal do MC III bifurca-se dando

    origem a dois ramos extensores que passam pela superfcie abaxial de cada sesamide

    proximal e da P1 para se irem combinar com o TEDC na face dorsal da extremidade proximal

    da P1 (Stashak, 1998).

    1.1.4. Aparelho suspensor

    O aparelho suspensor, caracterstico desta espcie, confere a estes animais a capacidade de

    permanecerem sobre os quatro membros durante longos perodos de tempo mesmo quando

    dormem. A sua anatomia est de tal modo estruturada que msculos e ligamentos mantm a

    posio sem grandes gastos energticos, e portanto, sem que os msculos entrem em fadiga.

    Quando os animais esto em descanso, normalmente apresentam um dos membros posteriores

    relaxado, denominando-se esta postura por estao. O aparelho suspensor dos membros

    anteriores constitudo pelo TFDS e o seu LA, o TFDP e o seu LA e o LSB (Stashak, 1998).

    1.2. MEMBRO POSTERIOR

    O membro posterior, distalmente ao tarso tem uma constituio idntica ao membro anterior.

    No entanto, a regio do metatarso tem uma designao diferente, bem como os ossos que a

    compem: os trs metatarsianos (MT II, III e IV). Os tendes extensores e os flexores tambm

    so diferentes como a seguir se explicar.

    1.2.1. Tendes extensores

    O tendo extensor digital longo provm do msculo extensor digital longo cuja insero

    proximal se faz na extremidade distal do fmur. O tendo insere-se distalmente no processo

    extensor da P3, no entanto apresenta ligaes s extremidades proximais das P1 e P2. A nvel

    do tero proximal do MT III, este tendo recebe o tendo extensor digital lateral, ao qual se

    liga.

    O tendo extensor digital lateral faz parte do msculo extensor digital lateral que tem

    inseres proximais na fbula, no ligamento intersseo, na face lateral da tbia e no ligamento

    colateral lateral da articulao femorotibial. Tem um percurso ao longo da face lateral do

  • 8

    membro at que, no tero proximal do MT III, se dirige para a face dorsal onde se combina

    com o tendo extensor digital longo (Stashak, 1998).

    1.2.2. Tendes flexores

    O TFDS faz parte do msculo flexor digital superficial, que por sua vez se origina na fossa

    supracondilar do fmur e se localiza sob o msculo gastrocnmio. O TFDS contorna o tendo

    do gastrocnmio pela sua face medial, ficando numa posio mais plantar, at atingir a

    tuberosidade do calcneo onde o tendo do gastrocnmio se insere. O TFDS segue pela face

    plantar da extremidade distal do membro at se bifurcar ao nvel da quartela, passando pelas

    faces abaxiais da P1, e inserindo-se plantarmente aos ligamentos colaterais da articulao IFP.

    O TFDP provm do msculo flexor digital profundo que composto pelos msculos flexor

    digital lateral, flexor digital medial e tibial caudal e que tm um percurso idntico at que se

    transformam num tendo nico. Este tendo passa pela face plantar do membro posterior. Ao

    longo do metatarso o TFDP apresenta uma posio dorsomedial em relao ao TFDS

    enquanto que ao nvel do boleto passa pela Manica flexoria do TFDS e, ao nvel da quartela,

    passa pela bifurcao do TFDS para se ir inserir na face flexora da P3, tal como acontece no

    membro anterior (Stashak, 1998).

    Figura 2 Anatomia do membro posterior equino.

    Fonte: (Stashak, 1998)

  • 9

    1.2.3. Aparelho suspensor

    A constituio deste aparelho nos membros posteriores diferente. Para alm de no haver

    LA do TFDS, composto por muitas outras estruturas deste membro, sejam elas o TFDP, o

    TFDS, o tensor da fscia lata, o msculo gastrocnmio, o msculo fibular terceiro, o LA do

    TFDP e o msculo FDS (Stashak, 1998).

    2. PARTICULARIDADES DA COMPOSIO HISTOLGICA, DA FISIOLOGIA E

    DA BIOMECNICA DOS TENDES E LIGAMENTOS

    2.1. ESTRUTURA ANATMICA E FISIOLOGIA

    Tendes e ligamentos so bandas de tecido conjuntivo denso que fazem parte da matriz

    extracelular, e enquanto os primeiros tm como funo a transmisso das foras entre

    msculos e ossos, os segundos, ligam os ossos entre si (Stashak, 1998; Colahan, Mayhew,

    Merrit & Moore, 1999). O tecido conjuntivo dos tendes apresenta um arranjo especfico

    (Crowson et al, 2004), que no s lhe confere fora e resistncia carga, como tambm

    elasticidade, sendo estas as suas propriedades mecnicas fundamentais. A unidade estrutural

    da fibra de colagnio composta maioritariamente por fibrilhas de colagnio tipo I, agrupadas

    paralelamente entre si, formando a fibra primria. Estas esto rodeadas de filas de fibroblastos

    (tencitos), que se ligam por processos de anastomose. As fibras primrias agrupam-se em

    fibras secundrias, que por sua vez se agrupam em fibras tercirias de maiores dimenses. O

    tendo composto por feixes destas fibras tercirias.

    As fibrilhas de colagnio apresentam uma disposio helicoidal ao longo do eixo longitudinal

    do tendo e as fibras em repouso apresentam um padro ondulado (Colahan et al, 1999)

    denominado de crimp. So estas duas caractersticas que conferem elasticidade ao tecido

    (Colahan et al, 1999).

    Nos locais de compresso, onde o tendo passa por proeminncias sseas, apresenta tambm

    fibrilhas de colagnio tipo II.

    Todo este colagnio compe 80% da matria seca da matriz extracelular, sendo que os

    restantes 20% so compostos por protenas no colagnicas que desempenham papel

    importante na organizao das fibrilhas de colagnio, na remodelao da matriz e ainda como

    marcadores moleculares em leses tendinosas (Colahan et al, 1999). Esta componente da

    matriz extracelular no homognea ao longo do tendo, o que pode reflectir o diferente

    ambiente biomecnico verificado em cada regio. Tm sido realizados estudos sobre uma

    dessas protenas, a protena de matriz da cartilagem oligomrica (COMP do Ingls Cartilage

  • 10

    oligomeric matrix protein) que se supe ser sintetizada em resposta carga (Stashak, 1998;

    Smith et al, 2000; Smith, 2005). Desta forma apresenta-se em grandes quantidades no TFDS

    ao nvel da regio do MC III durante a fase de crescimento, decrescendo depois apenas nesta

    mesma localizao. Esta componente proteica tambm constituda por proteoglicanos, como

    sejam os agrecanos, a decorina, os biglicanos e a fibromodulina. Estudos nestes compostos

    revelam que, por exemplo, os agrecanos predominam nas regies compressivas dos tendes

    sendo caractersticos da matriz resistente presso da cartilagem (Stashak, 1998).

    A superfcie do tendo revestida por uma camada fina de tecido conjuntivo laxo, o

    epitendo. A partir desta estrutura estendem-se para dentro do tendo por entre os feixes de

    colagnio trabculas com a mesma composio denominadas de endotendo. O epitendo

    revestido por uma camada de tecido conjuntivo laxo vascular denominada de paratendo, ou,

    pela bainha do tendo. A bainha do tendo localiza-se nas zonas onde o tendo muda de

    direco ou onde h maior frico e composta pelas membranas parietal e visceral, sendo a

    primeira sinovial e a segunda fibrosa. O mesotendo uma estrutura que geralmente continua

    ao longo da bainha. Os ligamentos anulares so bandas fibrosas que fixam o tendo ao nvel

    das articulaes, regies de onde eles se poderiam facilmente deslocar (Stashak, 1998).

    De um modo geral, pensa-se que em termos histolgicos os tendes, ligamentos e fscias

    sejam estruturas muito semelhantes. No entanto, estudos feitos em coelhos em 1984 indicam

    que os ligamentos so estruturas metabolicamente mais activas que os tendes uma vez que

    apresentam maior contedo celular, ligaes cruzadas mais reduzidas, e portanto mais

    apertadas e fortes, e uma maior quantidade de colagnio tipo III tornando-o mais resistente. O

    tempo de remodelao do colagnio nos tendes prolongado, limitando assim a reparao

    das microleses que vo sofrendo. Por outro lado o tendo dos poldros apresenta uma

    actividade metablica bastante elevada, sendo capaz de sintetizar matriz extracelular em

    grandes quantidades. Isto foi verificado num estudo que avaliou o rpido crescimento da

    espessura do TFDS em poldros, principalmente entre o 5 e o 8 ms de vida (Koening, Cruz,

    Genovese, Fretz & Trostle, 2002).

    2.2. IRRIGAO SANGUNEA

    A circulao sangunea do tendo tem duas componentes, uma intratendinosa e outra

    extratendinosa, e estabelece-se a partir do msculo e do osso para as extremidades proximal e

    distal do tendo, do mesotendo ao nvel da bainha sinovial e do paratendo sendo esta a fonte

    mais importante porque vasculariza o tendo nos locais onde no h bainha ao nvel da difise

    do MC III. As regies de vascularidade diminuda apresentam grande probabilidade de

    sofrerem alteraes degenerativas (Crowson et al, 2004). A nutrio dos tencitos dentro do

  • 11

    tendo estabelece-se por perfuso sangunea e difuso dos nutrientes a partir da sinvia,

    embora esta seja de menor contributo, tendo em conta o tamanho do tendo (Colahan et al,

    1999).

    2.3. PROPRIEDADES MECNICAS

    Como foi j referido anteriormente, a funo dos tendes transmitir fora entre msculos e

    ossos, mas tambm amplificar a dinmica durante a contraco muscular rpida, armazenar

    energia elstica e atenuar a fora durante movimentos rpidos e inesperados. Apesar de pouco

    extensveis, possuem propriedades elsticas e viscoelsticas. Perante a actuao de uma fora

    tnsil o tendo inicialmente apresenta complacncia perdendo-a medida que o esforo

    continuado e excede 5% da extenso. Nesta fase elstica, as fibras perdem o padro ondulado,

    retomando-o assim que removida a fora. No entanto, as caractersticas mecnicas do tendo

    alteram-se de modo aparentemente irreversvel depois da extenso superior aos 5% (Stashak,

    1998; Rose & Hodgson, 2000).

    A ondulao das fibras e a sua respectiva densidade celular, vo diminuindo com a idade do

    animal, no entanto, os segmentos do tendo ao nvel dos teros proximal e mdio do MC III

    apresentam por si ss, uma ondulao diminuda e espaos interfasciculares menores,

    especialmente em cavalos mais velhos. Alguns estudos comprovam que isto se deve ao

    comportamento mecnico das fibras naquelas regies do MC III e com a fraqueza dentro do

    TFDS (Stashak, 1998).

    Ainda no se conhece bem como se processa a adaptao funcional dos tendes e ligamentos

    quando aumenta a solicitao mecnica, no entanto, no parece ser idntica ao mecanismo dos

    restantes tecidos esquelticos que, no caso dos msculos respondem com um aumento da

    massa muscular. Um estudo que procurou avaliar como se processa a resposta dos tendes

    flexores e do LSB ao exerccio, permitiu verificar que o TFDP e o LSB no sofreram

    quaisquer alteraes durante o galope, enquanto que o TFDS apresentou microtraumatismos

    na regio central caracterizados pela diminuio do padro ondulado. Estas alteraes

    parecem indicar que houve uma maior carga sobre este tendo e que a acumulao destes

    microtraumatismos enfraquece o tendo podendo resultar posteriormente uma ruptura parcial

    ou completa (Stashak, 1998; Colahan et al, 1999). As anlises bioqumicas realizadas matriz

    extracelular nas reas degenerativas referidas, permitiu identificar um aumento do contedo

    de glicosaminoglicanos (GAG), de colagnio do tipo III (tpico do tecido de cicatrizao) e

    uma diminuio do nmero de ligaes de colagnio. Estas alteraes so sugestivas de

    alterao no metabolismo celular e na renovao da matriz extracelular na regio central do

  • 12

    TFDS, e que podem traduzir uma resposta de cicatrizao inicial por parte das clulas destes

    tecidos (Stashak, 1998).

    2.4. RESPOSTA LESO E CICATRIZAO

    Seja qual for a leso que afecte tendes ou ligamentos, sabe-se que de um modo geral a

    cicatrizao neste tipo de estruturas muito demorada. Isto deve-se ao facto do fluxo de

    sangue ser menor nestas estruturas com consequente alterao do metabolismo (Stashak,

    1998; Colahan et al, 1999; Rose & Hodgson, 2000). Apesar da cicatrizao de leses

    tendinosas e ligamentosas se realizar por mecanismos semelhantes, pensa-se que esta

    compreenda uma componente extrnseca de capital importncia composta pelos capilares do

    paratendo, e uma componente intrnseca composta pelas clulas do endotendo que passam a

    poder funcionar como fibroblastos activos. Desta maneira e tendo em conta estes aspectos, a

    maximizao da cicatrizao intrnseca, que pode ser potenciada por intermdio do exerccio

    controlado mas precoce no processo de cicatrizao, e a minimizao da cicatrizao

    extrnseca, poder limitar a formao de aderncias peritendneas que so de todo indesejveis

    (Stashak, 1998).

    parte destas consideraes, a cicatrizao de qualquer leso numa destas estruturas

    processa-se como nos outros tecidos em geral. Inicia-se por um processo inflamatrio, que na

    fase inicial bastante pronunciado, com invaso dos tecidos lesionados por neutrfilos,

    moncitos e macrfagos. H um aumento da circulao sangunea e formao de edema. As

    enzimas de degradao que so libertadas nesta fase para remoo do tecido lesado chegam a

    destruir tambm tecido tendinoso funcional saudvel, facto no de todo desejvel. Esta fase

    prolonga-se por uma a duas semanas e est associada a dor, tumefaco, rubor e claudicao.

    Segue-se a fase de reparao alguns dias aps o estabelecimento da leso sobrepondo-se

    inflamao. Esta fase caracterizada pelo estabelecimento da angiognese e pela acumulao

    de fibroblastos no local aps 4 dias da leso, com um pico de acumulo destas clulas s 3

    semanas. S ento sintetizado colagnio tipo III que inicialmente fraco, menos funcional e

    com menor elasticidade que o colagnio tipo I. A extenso da fibroplasia depende da

    gravidade da leso inicial e de qualquer agresso precoce que o tendo possa sofrer, como por

    exemplo, quando um animal lesionado colocado novamente em exerccio sem ter terminado

    o perodo de tratamento. As bainhas do tendo no apresentam o mesmo contributo

    extracelular do paratendo, e portanto, a cicatrizao nestes locais bastante lenta. Se a

    superfcie do tendo estiver lesionada este adere bainha durante a cicatrizao com

    consequentes desvantagens funcionais no futuro. Se a fibroplasia envolver a periferia do

    tendo, esta pode resultar num espessamento do paratendo e na formao de aderncias, que

  • 13

    por sua vez inibem ainda mais o movimento e a funo do tendo, tornando-o susceptvel a

    uma ruptura quando aumenta o exerccio.

    Por ltimo, a fase de remodelao estabelece-se alguns meses aps a leso verificando-se a

    transformao do colagnio tipo III em colagnio tipo I. No entanto, esta transformao

    ocorre segundo uma disposio diferente daquela do padro funcional normal (fibrilhas

    longitudinais paralelas entre si). A transformao do colagnio tipo III em colagnio tipo I,

    est dependente do grau de ruptura inicial, sendo que o tendo resultante, apesar de mais

    forte, tem uma menor funcionalidade e menos fora tnsil (Colahan et al, 1999).

    3. MTODOS DE DIAGNSTICO

    3.1. EXAME FSICO: VISUAL, ESTTICO E DINMICO

    O primeiro passo na abordagem a um animal com histria de claudicao o exame fsico.

    Este deve ser o mais meticuloso possvel para assim se conseguir recolher os elementos

    necessrios identificao da leso e sua localizao. O exame dinmico ajuda a identificar e

    a limitar a regio afectada. Por norma o exame fsico deve ser seguido pela realizao de

    exames complementares de diagnstico para confirmao do diagnstico obtido no exame

    fsico. Estes meios de diagnstico permitem avaliar a extenso das leses e a sua gravidade e

    ainda, monitorizar a recuperao das mesmas, auxiliando o mdico veterinrio na avaliao

    do tratamento aplicado e no estabelecimento de um prognstico. Permitem ainda interpor

    qualquer correco ao tratamento que se torne necessria de acordo com a evoluo das leses

    que se forem verificando ao longo do tempo.

    O exame fsico deve comear pela avaliao visual do animal em descanso, inicialmente a

    alguma distncia e depois mais de perto, incluindo todos os lados do cavalo. A postura normal

    do animal traduz-se por uma igual distribuio de peso pelos quatro membros e portanto, com

    este exame procuram-se perceber quaisquer alteraes no seu comportamento ou postura que

    no s sejam indicativos de claudicao, mas que possam tambm ajudar a perceber em que

    regio de que membro pode estar o problema (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). Nesta

    fase deve procurar-se caracterizar o corpo do animal, a sua conformao, a sua condio

    corporal, as alteraes de postura e as transies de peso entre membros. Num exemplo de

    claudicao em que ambos os membros anteriores estejam afectados, o animal alterna

    frequentemente o peso entre estes membros ou transfere o apoio do peso para os membros

    posteriores de maneira a aliviar a dor (Stashak, 1998). Outra situao indicativa de

  • 14

    claudicao surge quando o animal descansa constantemente um dos membros furtando-se ao

    apoio (Stashak, 1998).

    Na avaliao visual feita com maior proximidade deve avaliar-se cada membro

    individualmente, fazendo sempre a comparao com o membro oposto, de maneira a se

    poderem detectar quaisquer assimetrias. Na avaliao dos cascos procuram-se sinais de uso

    exagerado, de presena de rachas, de desequilbrios, de alteraes de tamanho e contraco

    dos tales; nas articulaes, nos tendes e suas bainhas procuram-se tumefaces; nos

    msculos dos membros, das costas e da garupa procuram-se alteraes compatveis com

    tumefaces ou atrofias (Stashak, 1998).

    A seguir ao exame visual segue-se o exame esttico, durante o qual as estruturas dos membros

    devem ser palpadas de forma a detectar qualquer zona com aumento de temperatura, de

    sensibilidade e a eventual presena de aderncias aos tecidos adjacentes (Stashak, 1998; Rose

    & Hodgson, 2000). O exame esttico baseia-se numa explorao e palpao meticulosas de

    todas as estruturas das regies do membro que apresenta claudicao, de maneira a localizar a

    regio afectada ou mesmo identificar alguma estrutura mais dolorosa nessa regio (Stashak,

    1998; Rose & Hodgson, 2000). No caso das estruturas que esto inacessveis para palpao,

    como o caso das estruturas dentro do casco, a sua avaliao pode ser realizada de modo

    indirecto, ou seja, exercendo presso com recurso pina e cascos num nvel mais exterior

    mas que provoque igualmente um aumento de presso nessas estruturas e consequente

    manifestao de dor se houver leso (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). A manifestao

    de dor por parte do animal verifica-se pela tentativa de se furtar palpao. O casco oposto

    deve ser igualmente avaliado para efeitos de comparao (Stashak, 1998; Rose & Hodgson,

    2000). A banda coronria deve posteriormente ser palpada para pesquisa de aumentos de

    temperatura, tumefaces ou sensibilidade (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    A partir da quartela e no sentido proximal dos membros, os tendes e os ligamentos podem

    ser avaliados por palpao. Os tendes flexores e os ligamentos sesamoideos distais so

    avaliados na face palmar/plantar, enquanto que os ligamentos colaterais da articulao IFP so

    avaliados fixando a extremidade proximal da articulao com uma mo e empurrando a

    extremidade distal para um dos lados com a outra (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). A

    avaliao da articulao IFP feita promovendo a rotao das falanges entre si, segurando o

    membro pelo casco (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    Na avaliao da articulao do boleto, os ramos extensores do LSB so avaliados aplicando

    presso acima da sua insero nos ossos sesamides proximais (Stashak, 1998; Rose &

    Hodgson, 2000). A presena de sinais de dor pode ser indicativa de desmite, sesamoidite ou

    at de fracturas dos sesamides. Tambm devem ser avaliados os tendes flexores, a bainha

  • 15

    sinovial e o ligamento anular palmar/plantar (LAP) recorrendo presso digital e palpao

    das estruturas para pesquisar calor, tumefaces ou dor, que possam indicar a presena de

    tendinites, sinovites, tenossinovites ou desmites (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    Para avaliar a articulao do boleto e os respectivos ligamentos colaterais, pode proceder-se

    de modo idntico avaliao da articulao IFP, pesquisando sinais de dor e avaliando o grau

    de mobilidade por flexo da articulao (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). Est

    tambm indicado o teste de flexo desta articulao, flectindo-a ao mximo durante um

    minuto com o carpo em extenso, ao fim do qual o animal sai a trote e o grau de claudicao

    avaliado, tendo agravado ou no. No entanto, este teste no especfico para a articulao do

    boleto, pois inclui tambm a flexo das articulaes interfalngicas (Stashak, 1998; Rose &

    Hodgson, 2000).

    A regio do metacarpo/metatarso (MC/MT) deve ser avaliada com o membro tanto em apoio

    no solo como elevado. Os tendes extensores devem ser palpados para pesquisa de aderncias

    indicativas de traumatismos e/ou laceraes. Os tendes flexores esto envolvidos por bainhas

    sinoviais nos seus teros proximal e distal enquanto o tero mdio se apresenta revestido pelo

    paratendo. No entanto, cada uma destas regies deve ser avaliada minuciosamente para

    pesquisar eventuais tumefaces, calor ou dor (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). A

    presena de tenso pode estar relacionada com deformaes flexurais. Durante a palpao

    deve-se tentar fazer deslizar o TFDS sobre o TFDP com ajuda do polegar e do indicador, o

    que num estado normal ocorre facilmente. No entanto, em casos de leso, pode no ser

    possvel separ-los devido presena de aderncias ou ao espessamento destas estruturas,

    como ocorre nos casos de tendinite ou de tenossinovite (Stashak, 1998; Rose & Hodgson,

    2000). O LSB deve ser palpado para pesquisa de dor ou tumefaco. No entanto, a origem do

    ligamento deve ser avaliada por presso digital constante na face palmar da extremidade

    proximal do metacarpo (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). As manifestaes de dor

    neste caso caracterizam-se por tentativas constantes de retirar o membro e se furtar presso.

    A palpao dolorosa do LA do TFDP associada a sinais de inflamao, tambm indicativa

    de desmite deste ligamento (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    Na avaliao do carpo procuram-se sinais de distenso da bainha dos tendes extensores que

    pode resultar de sinovite, tenossinovite e/ou ruptura na face dorsal, enquanto que na face

    palmar, ao nvel do canal do carpo, a presena de tumefaco pode resultar de fractura do

    osso acessrio do carpo, tenossinovite ou formao de osteocondroma (Stashak, 1998).

    O tarso avaliado para pesquisa de distenso sinovial, inflamao do ligamento plantar longo

    ou do TFDS, luxao do TFDS, bursite traumtica ou efuso subtendinosa. A bainha do

    TFDP pode estar inchada, o que indica sinovite ou tenossinovite. Depois da palpao desta

  • 16

    articulao, deve ser feito um teste de flexo durante um minuto e meio, segurando apenas na

    extremidade distal do MT e no flectindo as articulaes distais a esta regio (Stashak, 1998).

    Depois do exame esttico realizado o exame dinmico e nesta fase o principal objectivo

    identificar qual o grau de claudicao ou incoordenao do movimento que o animal

    apresenta. O animal deve ser avaliado distncia, tanto a passo como a trote, em linha recta e

    em crculo, em piso mole e em piso duro (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). Durante o

    movimento do cavalo os sinais que se procuram so: o balanceio da cabea, a assimetria no

    movimento, as alteraes na altura do arco e fases do passo, as alteraes no ngulo de

    flexo/extenso das articulaes, a colocao dos cascos e o uso e simetria dos msculos

    (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). A primeira avaliao deve ser geral e s depois de

    identificado o membro afectado que se observa mais detalhadamente, fazendo sempre a

    comparao com o membro oposto (Stashak, 1998).

    Nos casos de claudicao, o animal procura retirar o mximo de peso sobre o membro que

    claudica, cada vez que tem de o apoiar. Quando a claudicao num membro anterior, ele

    eleva a cabea durante o apoio desse membro e baixa-a quando apoia o membro anterior do

    qual no claudica (Stashak, 1998). Na antecipao do contacto desse membro com o solo, o

    animal tambm contrai os msculos caudais do pescoo e do ombro. Quando a claudicao

    num membro posterior, o animal contrai menos os msculos glteos e eleva a anca

    correspondente quando apoia o membro que claudica no solo e baixa-a quando apoia o

    membro que no apresenta claudicao (Stashak, 1998). Assim sendo, preciso ateno

    durante o trote para que no se confunda uma claudicao num membro posterior com o

    respectivo membro anterior. Nestes casos, o animal vai baixar a cabea quando o membro

    anterior oposto, correspondente diagonal do trote, apoiar no solo. Desta forma alivia assim o

    peso no membro posterior que est a claudicar parecendo que est a retirar o peso do membro

    anterior correspondente (Stashak, 1998). No entanto, se o animal for observado por trs

    durante a marcha, possvel observar a assimetria tpica da garupa, e portanto, indicativa de

    claudicao de membro posterior. Nos casos de intensidade mdia ou cujas leses sejam

    bilaterais, pode no haver movimento da cabea (Stashak, 1998). Nestes casos, devem-se ter

    em conta outros parmetros para avaliar alteraes na locomoo, tais como o arco e as fases

    do passo.

    Depois de se identificar a regio que se supe ser a responsvel pela claudicao, deve-se

    tentar confirmar atravs da realizao de bloqueios anestsicos loco-regionais. Este

    procedimento permite eliminar a dor da regio afectada, levando a que o animal deixe de

    claudicar (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). As anestesias locais que aqui se utilizam

    so infiltraes perineurais, realizadas por regies, comeando pela regio mais distal do

  • 17

    membro em questo e progredindo at mais proximal at se eliminar a claudicao (Stashak,

    1998; Rose & Hodgson, 2000). Nos casos em que se suspeita de algum problema articular

    devem ser feitas anestesias intra-articulares que so mais especficas. Nos casos de suspeita de

    fracturas no se deve considerar a anestesia local como hiptese, uma vez que pode levar ao

    agravamento da leso. O local de infiltrao deve ser preparado, com corte de plo sempre

    que possvel, desinfeco da pele e uso de uma nova embalagem de anestsico. Os anestsicos

    mais utilizados so a lidocana a 2% e a mepivacana a 2%, sendo que esta a menos irritante

    para os tecidos e a que apresenta um efeito mais prolongado (Stashak, 1998; Rose &

    Hodgson, 2000).

    A anestesia perineural digital palmar insensibiliza entre um tero e metade da regio

    palmar/plantar do dgito. realizada com o membro levantado e o dgito em extenso de

    maneira a que o ligamento do esporo fique tenso. Os nervos palmares/plantares digitais

    medial e lateral tm localizao mais profunda relativamente a este ligamento. A infiltrao

    deve ser realizada ao nvel do bordo proximal das cartilagens complementares, administrando

    1,5 a 2 ml de anestsico local subcutaneamente (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    A anestesia perineural abaxial insensibiliza todas as estruturas abaixo do boleto, podendo

    incluir a regio distal dos ossos sesamides proximais, mas sem atingir a face dorsal do

    boleto. realizada com o membro levantado, estando os nervos palmares/plantares

    localizados palmarmente/plantarmente aos vasos sanguneos sendo palpveis na face abaxial

    dos sesamides proximais. Administram-se cerca de 3 a 4 ml de anestsico local (Stashak,

    1998; Rose & Hodgson, 2000).

    A anestesia perineural 4 pontos baixa (nervos palmares/plantares e metacarpianos

    palmares/metatarsianos plantares), insensibiliza todas as estruturas distais articulao do

    boleto incluindo a sua face dorsal. Os nervos palmares medial e lateral so infiltrados com 2

    ml de anestsico local entre o TFDP e o LSB, ao nvel da extremidade distal dos

    metacarpianos/metatarsianos acessrios, enquanto os nervos metacarpianos

    palmares/metatarsianos plantares medial e lateral so infiltrados com 1 a 2 ml de anestsico

    junto s extremidades distais dos metacarpianos/metatarsianos acessrios (Stashak, 1998;

    Rose & Hodgson, 2000).

    A anestesia perineural 4 pontos alta (nervos palmares/plantares e metacarpianos

    palmares/metatarsianos plantares), insensibiliza as estruturas distais ao metacarpo/metatarso,

    e ao nvel desta regio, o LSB, os tendes flexores e os metacarpianos/metatarsianos

    acessrios. No entanto, se esta infiltrao for mal efectuada e alcanar as bolsas distais

    palmares da articulao carpometacrpica, pode insensibilizar tambm esta articulao, bem

    como a intercrpica. Este bloqueio no no entanto suficiente para eliminar uma claudicao

  • 18

    com sede na insero proximal do LSB. Para proceder a este bloqueio deve fazer-se uma

    infiltrao local directamente sobre a origem do LSB na face palmar/plantar do MC III/MT

    III. A administrao de 2 ml de anestsico local feita na face dorsal do TFDP, tanto medial

    como lateralmente, ao nvel da extremidade proximal do MC III/MT III, passando o

    retinculo flexor. De maneira a se evitar alcanarem as bolsas, pode-se tambm insensibilizar

    o ramo lateral do nervo metacarpiano palmar/metatarsiano plantar, administrando 5 ml de

    anestsico entre o bordo distal do osso acessrio do carpo e a poro mais proximal do

    MC/MT IV, e insensibilizar o ramo medial ao nvel da extremidade proximal do MC/MT II,

    igualmente com 5 ml de anestsico (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    Apenas so referidas estas anestesias perineurais uma vez que a maioria das leses tendinosas

    e ligamentosas se localizam distalmente ao carpo e ao tarso, no entanto, sempre que for

    considerado necessrio, esto indicadas outras anestesias mais proximais.

    Aps a identificao da regio do membro que se encontra lesionada, devem ser realizados

    exames imagiolgicos que permitam registar e identificar a leso. Este registo imagiolgico

    orienta a instituio do tratamento mais adequado leso identificada e permite monitorizar a

    recuperao e a evoluo da leso ao longo do tempo, e consequentemente a eficcia do

    tratamento (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000).

    O registo imagiolgico das leses tendinosas e ligamentosas de vital importncia para a

    monitorizao da recuperao destas leses. So geralmente leses com perodos de

    recuperao prolongados e que requerem a instituio de um protocolo teraputico com um

    certo grau de complexidade (Stashak, 1998; Rose & Hodgson, 2000). A monitorizao

    permite avaliar os progressos ou retrocessos na recuperao das leses e portanto, proceder s

    alteraes no tratamento que se considerem mais adequadas nesse momento.

    Seguidamente so abordados os mtodos de diagnstico imagiolgico que normalmente so

    empregues no diagnstico das leses tendinosas e ligamentosas.

    3.2. RADIOGRAFIA

    A radiografia o meio de diagnstico mais usado na avaliao de claudicaes nos cavalos,

    particularmente quando estas esto relacionadas com problemas sseos ou articulares. No

    entanto, quando as leses tm sede nos tecidos moles, a sua utilidade mais limitada

    (Stashak, 1998; Colahan et al, 1999; Rose & Hodgson, 2000). No que respeita a leses de

    tendes e ligamentos, a radiografia apenas permite identificar os sinais caractersticos de

    leses crnicas, de que so exemplos as entesiofitoses nas origens dos ligamentos ou a

    calcificao distrfica que pode surgir pela administrao intralesional de grandes

    quantidades de corticosterides (Stashak, 1998). Este meio de diagnstico imagiolgico tem

  • 19

    particular importncia no diagnstico de leses na origem do LSB, porque no s identifica os

    sinais caractersticos das leses crnicas no prprio ligamento como tambm na face

    palmar/plantar do MC III/MT III (Stashak, 1998). Na face palmar/plantar do MC III/MT III

    possvel identificar alguma radiolucncia caracterstica da reabsoro ssea prpria da

    desmopatia de insero (Stashak, 1998). Permite ainda na leso de desmite diferenciar os

    casos que tenham origem em fracturas por avulso ou em fracturas por stress, que so

    relativamente comuns nesta regio (Stashak, 1998). Estes achados so tambm visveis

    atravs da ecografia, no entanto, a radiografia mais especfica pelo envolvimento sseo

    associado (Stashak, 1998).

    3.3. ECOGRAFIA

    A ecografia um mtodo de diagnstico muito til na avaliao de leses tendinosas e

    ligamentosas. Uma vez que a radiografia no um mtodo sensvel, e antes da expanso da

    ecografia, o diagnstico destas leses estava limitado observao clnica, palpao e

    experincia do clnico. A ecografia veio possibilitar a localizao exacta das leses sobretudo

    nos tecidos moles, a classificao das mesmas, a realizao de alguns procedimentos para o

    seu tratamento como seja a administrao intralesional ecoguiada de medicamentos, e ainda a

    realizao ecoguiada de alguns procedimentos cirrgicos que sero descritos mais adiante.

    Outra grande vantagem a possibilidade de monitorizar a cicatrizao das leses ao longo de

    todo o tratamento. O fcil acesso leso e a prpria realizao deste meio de diagnstico

    possibilita qualquer correco no tratamento quando assim for necessrio, quando se

    verificam retrocessos no estado de recuperao da leso, e possibilita ainda programar o

    tratamento para as fases subsequentes de acordo com a evoluo da leso.

    Na realizao deste exame diagnstico o clnico deve estar familiarizado com a aparncia

    normal dos tecidos moles para poder identificar as alteraes que surgem nas imagens, pelo

    modo como os tecidos moles lesionados afectam os ultra-sons.

    Na avaliao das estruturas tendinosas usam-se as sondas lineares (Figura 3),

    preferencialmente de 7,5 MHz que podem atingir uma profundidade de quatro a seis

    centmetros dada a proximidade dos tecidos tendinosos e ligamentosos com a pele. Uma

    frequncia elevada proporciona uma melhor resoluo axial e lateral, facto que explicado

    pelo tamanho reduzido dos cristais que compem a sonda, e que portanto vo permitir melhor

    focagem dos tendes e dos ligamentos. Tambm est indicado o uso de sondas de 10 MHz. O

    uso do pad, muitas vezes necessrio na avaliao dos tendes e dos ligamentos, permite

    aumentar a distncia entre a sonda e a superfcie da pele, colocando estas estruturas numa

    zona de melhor focagem e diminuindo os artefactos que possam eventualmente surgir. No

  • 20

    entanto, certos autores dispensam o seu uso na avaliao do LSB e do LA do TFDP (Rose &

    Hodgson, 2000).

    A preparao do membro para o exame ecogrfico de grande importncia, uma vez que tem

    implicao directa na imagem obtida. necessrio efectuar o corte do plo, to curto quanto

    possvel, tanto do membro afectado como do contralateral. Seguidamente deve realizar-se

    uma lavagem com gua quente e uma soluo desengordurante de forma a remover os plos e

    a gordura presentes na pele.

    Figura 3 - Ecgrafo com sonda linear.

    Depois faz-se a aplicao de gel de ecografia ao

    longo de toda a regio a ser avaliada (Colahan

    et al, 1999). H no entanto quem recomende

    secar o membro depois de o lavar e aplicar

    lcool antes da aplicao do gel (Rose &

    Hodgson, 2000), mas estes casos geralmente

    apresentam uma menor qualidade de imagem.

    Os exames ecogrficos devem ser realizados

    com os animais em estao para que haja uma

    distribuio equilibrada do peso, de modo a no provocar alteraes nos tendes e ligamentos

    que possam conduzir a interpretaes menos correctas (Colahan et al, 1999; Rose & Hodgson,

    2000). Todas as estruturas da regio afectada devem ser criteriosamente avaliadas, de modo a

    se obter um diagnstico to correcto e completo quanto possvel. Esta avaliao deve incluir

    sempre varrimentos transversais e longitudinais para se caracterizar a leso o melhor possvel.

    Deve ainda ser avaliada a mesma regio do membro oposto para comparar a simetria entre os

    2 membros e porque h tambm uma elevada incidncia de leses bilaterais (Colahan et al,

    1999; Rose & Hodgson, 2000; Mair & Kinns, 2005). O feixe da sonda deve estar sempre

    direccionado a 90 com cada estrutura a avaliar para evitar a ocorrncia de artefactos que

    podem em alguns casos ser confundidos com leses.

    A imagem ecogrfica de tendes e ligamentos caracteriza-se por ser uma imagem com

    elevada ecogenicidade uma vez que so estruturas heterogneas e densas que reflectem os

    ultra-sons. O varrimento transversal destas estruturas mostra uma arquitectura interna

    representada por pontos que representam as fibras seccionadas perpendicularmente,

    enquanto o varrimento longitudinal revela um padro linear que representa as fibras de

    colagnio paralelas entre si (Rose & Hodgson, 2000; Mair & Kinns, 2005). As leses ao nvel

    destas estruturas caracterizam-se por se apresentarem como zonas hipoecognicas ou mesmo

    Fonte: http://ultrasound-machine.blogspot.com

  • 21

    anecognicas, consoante se tratem de rupturas das fibras de colagnio, de separaes das

    fibras por hemorragia intratendnea, de tecido de granulao ou mesmo de tecido fibroso

    recente (Colahan et al, 1999). Estas estruturas tambm se podem apresentar aumentadas de

    tamanho sem no entanto haver alterao da arquitectura interna, facto que traduz um dos

    primeiros sinais de leso (Rose & Hodgson, 2000). Tambm preciso ter em conta que o

    aumento destas estruturas pode alterar o aspecto das que lhes esto prximas ou mesmo

    causar distoro das suas formas, como acontece por exemplo nos casos em que as leses so

    excntricas ou h formao de aderncias (Rose & Hodgson, 2000).

    As imagens ecogrficas de estruturas que estejam preenchidas por lquidos, tais como os

    vasos sanguneos ou as bainhas digitais que apresentam liquido sinovial, caracterizam-se por

    serem normalmente anecognicas porque os lquidos no reflectem os ultra-sons. Estas

    estruturas podem apresentar um aumento da ecogenicidade na zona mais profunda, efeito que

    se denomina por janela acstica, e que surge depois dos ultra-sons atravessarem uma rea de

    baixa atenuao como acontece com os lquidos (Colahan et al, 1999; Rose & Hodgson,

    2000). Este facto considerado como um erro de atenuao dos ultra-sons mas tem utilidade

    na avaliao das leses com hemorragia e na avaliao da sua extenso. Por outro lado os

    fluidos que apresentem alguma ecogenicidade indicam a presena de partculas em suspenso

    como sejam fibrina ou detritos celulares que reflectem os ultra-sons (Colahan et al, 1999).

    Depois de realizado um exame exaustivo a toda a regio, e tendo comparado esta com a do

    membro oposto, a leso deve ser documentada para que posteriormente seja mais fcil de

    aceder e de monitorizar a recuperao. Normalmente pode optar-se por um de dois sistemas.

    O mais comum consiste em dividir a canela do membro anterior em 7 regies equidistantes e

    o conjunto formado pelo tarso e a canela do membro posterior em 9 a partir de um ponto de

    referncia, que no caso do membro anterior a face ventral do osso acessrio do carpo e no

    caso do membro posterior a ponta do curvilho (Rose & Hodgson, 2000; Mair & Kinns,

    2005). Essas zonas so denominadas de 1A, 1B, 2A, 2B, 3A, 3B e 3C para os membros

    anteriores e de 1A, 1B, 2A, 2B, 3A, 3B, 4A, 4B e 4C para os membros posteriores (Rose &

    Hodgson, 2000; Mair & Kinns, 2005) (Figura 4). O outro sistema de localizao mede a

    distncia em centmetros desde os pontos de referncia at ao incio da leso. Parecendo ser o

    mais rigoroso possibilita um acesso posterior mais fcil. Neste sistema, os pontos de

    referncia so a face ventral do osso acessrio do carpo nos membros anteriores e a margem

    proximal do MT IV para os membros posteriores (Rose & Hodgson, 2000).

    Quanto classificao das leses segundo a sua aparncia ecogrfica elas so normalmente

    classificadas em agudas, sub-agudas e crnicas. As leses agudas caracterizam-se pela ruptura

    das fibras de colagnio e consequente preenchimento com sangue do espao irregular que se

  • 22

    forma, resultando num aumento do tamanho do tendo ou ligamento. A pele pode apresentar-

    se separada das estruturas subjacentes pela inflamao e edema que se instalam, ou mesmo

    por hemorragia nos casos mais severos. Estas leses so classificadas em 4 graus, sendo que

    as de grau 1 so as mais subtis com alguma ecolucncia indicativa de alguma ruptura das

    fibras de colagnio, as de grau 2 apresentam uma maior ecolucncia, enquanto que as de grau

    3 so predominantemente ecolucentes mas ainda com ecos de baixa amplitude (Colahan et al,

    1999). Por ltimo, as de grau 4 so anecognicas e denominadas de leses nucleares (Colahan

    et al, 1999).

    Figura 4 - Sistema de diviso do membro anterior do cavalo em 7 zonas, para identificao do

    local da leso.

    As imagens longitudinais das leses no apresentam o

    padro linear normal sendo possvel identificar o lquido

    ecolucente que preenche o espao entre as fibras.

    As leses sub-agudas podem resultar de leses directas

    menos graves nos tendes ou ligamentos, ou ento

    corresponderem fase seguinte da cicatrizao das leses

    agudas e que podem numa fase posterior evoluir para

    leses crnicas quando o tratamento insuficiente ou

    inadequadamente aplicado. Tanto as leses sub-agudas

    como as crnicas se caracterizam por apresentarem uma

    ecogenicidade crescente medida que a componente

    celular vai produzindo colagnio para reparar a leso.

    Nesta fase a monitorizao por varrimentos longitudinais

    muito importante para ir avaliando o alinhamento das

    novas fibras de colagnio. Este deve ser to paralelo

    quanto possvel para assim resultar num arranjo estrutural

    forte e adequando estrutura (Colahan et al, 1999). Nos casos de alinhamento anormal das

    fibras muito importante o stress da fisioterapia que pode ser aplicada durante o tratamento, e

    que tambm tem como objectivo ajudar a repor esse alinhamento normal (Colahan et al,

    1999). Os varrimentos transversais so insuficientes para esta avaliao pois podem revelar

    imagens normais quando o alinhamento ainda no o adequado.

    As leses sub-agudas podem ser difceis de diagnosticar, especialmente se no houver

    qualquer manifestao clnica por parte do animal. Neste sentido foi realizado um estudo

    baseado na medio da velocidade dos ultra-sons nos tendes cujo objectivo consistia em

    Fonte: (Rose & Hodgson, 2000).

  • 23

    identificar factores que permitissem um diagnstico antecipado desta condio sub-clnica. O

    estudo concluiu haver diferenas considerveis na velocidade dos ultra-sons entre tendes

    saudveis e tendes lesionados, sendo mais lenta nestes do que nos tendes saudveis

    (Forresu, Lepage, Buiret, Perrier & Cauvin, 2004).

    Podem tambm ocorrer novas leses agudas em tecidos cicatriciais de leses anteriores,

    especialmente quando os cavalos retomam o grau de exerccio anterior, quando paream estar

    totalmente recuperados, ainda que na realidade isso no se verifique. Estas leses no s

    requerem um maior tempo de cicatrizao, como tambm podem at no recuperar

    totalmente.

    Na classificao das leses deve ter-se em conta o dimetro desta num varrimento transversal,

    pois um elemento de grande importncia na monitorizao da recuperao da leso ao longo

    do tratamento.

    3.4. CINTIGRAFIA

    A cintigrafia um mtodo de diagnstico no invasivo cada vez mais utilizado e que permite

    a localizao de leses msculo-esquelticas e no s, cujos resultados ao exame radiogrfico

    tenham sido negativos ou inconclusivos ou ainda em reas em que a radiografia no seja

    possvel. A imagem obtm-se por emisso de radiao gama e uma imagem que traduz o

    estado fisiolgico da regio, podendo ser mais informativa que a imagem obtida por

    radiografia que anatmica (Colahan et al, 1999; Roberts, 2006). A cintigrafia tem maior

    sensibilidade e menor especificidade diagnsticas quando comparada com a radiografia e

    permite a deteco de qualquer alterao nas estruturas antes que seja possvel identificar

    alteraes radiogrficas. Exemplo disto so os casos de fracturas por stress que se tornam

    visveis radiograficamente apenas dez a catorze dias depois da sua ocorrncia (Roberts, 2006).

    Este facto possibilita a aplicao do tratamento muito mais cedo, no deixando que as

    situaes clnicas piorem. As desvantagens deste meio de diagnstico relacionam-se com os

    custos dos equipamentos, com os protocolos de proteco de radiao que incluem isolamento

    do paciente e destruio dos dejectos aps o exame, e com a necessidade de haver

    remodelao ssea activa para se detectarem processos patolgicos ainda que no haja

    deposio ssea marcada (Roberts, 2006).

    Este exame apresenta trs fases especficas para avaliao dos vrios tipos de estruturas. A

    segunda fase a de maior interesse para avaliao de tendes e ligamentos e que comea um a

    dois minutos aps a administrao do radionucletido, prolongando-se por 10 a 20 minutos.

    As imagens devero indicar um aumento de actividade nos tecidos quando esteja presente

    alguma leso, indicativa portanto de inflamao (Colahan et al, 1999; Roberts, 2006).

  • 24

    preciso ter ateno com os locais onde foram realizados bloqueios perineurais uma vez que

    vo apresentar um aumento de incorporao do radionucletido, aumento esse que se

    prolonga por dezassete dias. No apresenta no entanto incorporao anormal nos ossos ou

    incorporao persistente nos tecidos moles (Colahan et al, 1999). ainda preciso ter em conta

    que os animais jovens apresentam maior reteno de radionucletido uma vez que apresentam

    actividade ssea mais activa.

    3.5. TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA

    A tomografia computadorizada (TC) um meio de diagnstico que fornece imagens

    correspondentes a um corte do corpo do animal sem que ocorra sobreposio de estruturas, e

    portanto possibilita a avaliao de todos os tecidos que se encontrem nesse corte, tornando-o

    um meio de diagnstico superior radiografia. Tal como a radiografia, este meio de

    diagnstico tem grande especificidade para avaliar leses nos tecidos duros ou nos tecidos

    moles que tenham sofrido mineralizao distrfica (Bergman & Puchalski, 2008).

    Nos cavalos, a TC tem sido pouco utilizada pois requer equipamento volumoso e de custos

    elevados, alm de outras condies especiais e algo limitantes. Necessita de uma mesa

    preparada para suportar um cavalo sob anestesia geral, que apenas possvel em meio

    hospitalar. A entrada do aparelho limita tambm o uso da TC avaliao das extremidades

    distais dos membros, distalmente ao carpo e ao tarso, e da cabea e pescoo at s vrtebras

    cervicais C3 e C4, (Colahan et al, 1999) (Figura 5).

    Figura 5 Fotografia de um cavalo sob anestesia geral em preparao para a realizao de

    uma TC. A mesa tem capacidade para suportar o animal.

    Fonte: http://oregonstate.edu/vetmed/hospital/clinical/diagnostic-imaging

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    Tm sido realizados estudos para avaliar a eficincia da ressonncia magntica em

    comparao com a TC, no que respeita avaliao de leses dos tecidos moles,

    principalmente quando localizadas dentro do casco. A TC tem mostrado uma maior eficincia

    alm de permitir em alguns casos a realizao de intervenes teraputicas, como por

    exemplo injeces intralesionais guiadas pela TC. Por estes motivos a TC tem sido preferida

    ressonncia magntica (Snyder, Maher & Puchalski, 2007).

    A TC comea a ter uma relevncia clnica maior e j considerada por alguns um meio de

    diagnstico complementar fundamental aos outros meios de diagnstico imagiolgicos.

    cada vez mais includo nos exames clnicos, uma vez que a informao que fornece permite

    que os clnicos realizem um plano teraputico mais dirigido leso e/ou o estabelecimento de

    um prognstico mais preciso (Colahan et al, 1999).

    3.6. RESSONNCIA MAGNTICA

    A ressonncia magntica (RM) um meio de diagnstico imagiolgico no invasivo e de

    grande potencial diagnstico por usar as propriedades magnticas dos tecidos para obter

    imagens anatmicas de elevada resoluo e detalhe em qualquer plano, e com boa resoluo

    espacial e contraste. Por este motivo considerado o exame de eleio na avaliao dos

    tecidos moles, cartilagens e cpsulas articulares, sinvia e osso. Na avaliao dos tecidos

    moles, nomeadamente tendes e ligamentos, o diagnstico feito pela alterao no contraste.

    Devido sua composio histolgica os tendes, que contm pouca gua, apresentam um

    sinal de baixa intensidade. Quando lesionados h um aumento do contraste pela presena de

    hemorragia, infiltrao celular e edema permitindo o diagnstico da leso (Mair & Kinns,

    2005).

    A sua relevncia clnica tem sido crescente pelo facto de permitir acesso a zonas mais restritas

    aos restantes meios de diagnstico imagiolgicos, como sucede no caso do casco (Busoni,

    Heimann, Trenteseaux, Snaps & Dondelinger, 2005; Mair & Kinns, 2005; Murray,

    Schramme, Dyson, Branch & Blunden, 2006; Powell & Bathe, 2008) e as estruturas nele

    includas. Tambm permite o diagnstico de leses em estruturas como o ligamento anular

    digital distal (difcil de diagnosticar) e que aparentemente so mais comuns do que se pensava

    e diagnosticava (Busoni et al, 2005; Cohen, Schneider, Zubrod, Sampson & Tucker, 2008).

    Outra vantagem deste meio de diagnstico que ao permitir o diagnstico de leses s quais

    antes no se tinha acesso possibilita o estabelecimento de uma teraputica dirigida a

    condies especficas, e portanto mais correcta (Murray et al, 2006).

    Por outro lado, as despesas do equipamento, a baixa acessibilidade prtica veterinria, os

    riscos e os custos da anestesia que lhes est implcito, so as principais limitaes deste meio

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    de diagnstico. No entanto, existem mais recentemente aparelhos de ressonncia magntica de

    menor intensidade (Figura 6) que permitem realizar este exame com o cavalo em estao sem

    necessitar de anestesia. Estes aparelhos de baixa frequncia tm facilitado e incrementado a

    sua aplicao no diagnstico de leses ortopdicas em cavalos (Mair & Kinns, 2005; Powell

    & Bathe, 2008). Apesar da menor intensidade, este tipo de aparelhos produz imagens de boa

    qualidade diagnstica, como foi comprovado num estudo realizado para comparar a qualidade

    entre aparelhos de elevada intensidade e de baixa intensidade (Mair & Kinns, 2005).

    Figura 6 A. Aparelho de ressonncia magntica de menor intensidade. B. Animal

    posicionado no aparelho para avaliao da extremidade distal do membro anterior direito.

    A Fonte: www.hallmarq.net/vetpage.htm

    B Fonte: www.hallmarq.net

    3.7. TERMOGRAFIA

    A termografia um meio de diagnstico no invasivo e que se baseia na deteco e medio

    da emisso de calor atravs da superfcie do corpo, que pode ser representativa de inflamao

    subjacente, e portanto, de leso (Colahan et al, 1999; Turner, 2007). Este tipo de exame

    permite avaliar todo o corpo do animal e, combinado com o exame fsico, permite identificar

    zonas que necessitem de um exame mais detalhado e que de outro modo passariam

    despercebidas. Estas caractersticas tornam-no num bom mtodo para avaliao dos tecidos

    moles.

    A termografia baseia-se na libertao do calor do corpo, mediante troca com radiao

    infravermelha entre o corpo e o ambiente envolvente. As zonas que apresentam elevao da

    temperatura so denominadas por pontos quentes. No entanto, preciso ter em conta alguns

    aspectos normais, como a existncia de certas zonas na extremidade distal do membro equino

    cuja temperatura naturalmente mais elevada, como a zonas entre o MC III/MT III e os

    tendes flexores, por onde passam os respectivos vasos sanguneos, a zona do bordo coronal

    (Figura 7B) e a regio entre os tales porque apresentam maior irrigao sangunea (Turner,

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    2007). Tambm preciso ter ateno que as veias tm maior temperatura do que as artrias,

    uma vez que drenam reas metabolicamente activas (Colahan et al, 1999; Turner, 2007).

    Casos h em que as zonas lesionadas apresentam diminuio da temperatura, como sejam

    casos de edema, fibrose crnica, trombose vascular, enfarte e leses nos nervos, mas estas

    zonas esto geralmente circundadas por uma zona de aumento de emisso de temperatura que

    pode representar neovascularizao do processo de cicatrizao (Colahan et al, 1999; Turner,

    2007).

    As indicaes para a utilizao deste meio de diagnstico so variadas, desde detectar zonas

    de inflamao atempadamente e/ou de localizao remota, complementar o exame fsico e

    direccion-lo, seguir os cursos das inflamaes e monitorizar a sua resposta ao tratamento, e

    tambm monitorizar o treino dos animais. Apesar de que os primeiros aparelhos e seus custos

    tornavam o seu uso inacessvel, actualmente os aparelhos portteis tm possibilitado uma

    maior acessibilidade tendendo para um uso cada vez maior.

    Nas leses de tendes (Figura 7A) e ligamentos este meio de diagnstico particularmente

    vantajoso por permitir detectar zonas de leso e inflamao reduzidas at duas a quatro

    semanas antes de surgirem outros sinais clnicos. Nos casos agudos de tendinite do TFDS e

    desmite do LSB, os pontos quentes correspondem aos locais de leso. Estes pontos vo-se

    tornando mais difusos com a cicatrizao mas mantm a elevada emisso de calor por tempo

    considervel.

    Figura 7 A. Termografia face palmar dos membros anteriores de um cavalo. A regio

    flexora do membro direito est inflamada. B. Termografia dos membros posteriores de um

    cavalo. O bordo coronal do membro esquerdo demonstra um fluxo sanguneo normal. C.

    Termografia aos membros posteriores de um cavalo onde possvel avaliar as diferenas de

    temperatura entre a extremidade distal dos membros, que est elevada, e os curvilhes, onde

    est diminuda.

    A Fonte: http://www.vet-

    therm.com/equine-thermography.htm

    B C

    Fonte: http://www.equinethermography.co.uk/horseowners/horseowners.php

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    As limitaes desta tcnica podem ser a dissipao da temperatura pelos tecidos que separam

    o local da leso da superfcie corporal que se verifica em certas zonas, a elevada sensibilidade

    ao meio ambiente externo com o qual podem haver pequenas trocas de calor que vo

    influenciar o verdadeiro termograma para aquela regio, e pelo facto de no permitir a

    identificao precisa de quais as estruturas lesionadas ou o seu grau de envolvimento. Esta

    tcnica deve portanto ser associada a outras tcnicas de diagnstico imagiolgicas, como a

    ecografia, a radiografia e a cintigrafia para potencializao do seu valor diagnstico (Colahan

    et al, 1999; Turner, 2007).

    4. TRATAMENTO

    4.1. TRATAMENTO MDICO

    Tendo em conta que a recuperao das leses tendinosas e ligamentosas complexa e

    delicada e atendendo grande probabilidade deste tipo de leses poder comprometer a vida

    desportiva destes animais, a abordagem ao seu tratamento um ponto fulcral e de mxima

    importncia. A menor circulao sangunea caracterstica destas estruturas, bem como os

    mediadores inflamatrios que se libertam em resposta ocorrncia de leso, contribuem

    indirectamente para dificultar a regenerao destas leses. Por estes motivos, no s

    importante realizar um diagnstico completo e preciso, como tambm perceber em que fase a

    leso se encontra para assim se poder estabelecer o tratamento mais adequado para cada caso

    clnico.

    So trs as fases de cicatrizao, aguda, sub-aguda e crnica, no entanto de todo prefervel

    que o animal seja observado na fase aguda. Esta situao considerada uma emergncia

    mdica pelos referidos efeitos lesivos que a reaco inflamatria tem sobre as fibras de

    colagnio, e portanto, fundamental que o animal seja observado pelo mdico veterinrio to

    cedo quanto possvel aps a ocorrncia da leso. Esta fase tem a durao de alguns dias e o

    tratamento mdico aplicado deve ter como objectivo principal o controlo da reaco