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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO FACULDADE DE EDUCAÇÃO MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO CURRÍCULO, LINGUAGENS E INOVAÇÕES PEDAGÓGICAS DEYTIVAN OLIVEIRA CARDOSO FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: A DEFICIÊNCIA VISUAL NO CERNE DA QUESTÃO Salvador 2018

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

    PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

    FACULDADE DE EDUCAÇÃO

    MESTRADO PROFISSIONAL EM EDUCAÇÃO CURRÍCULO, LINGUAGENS E

    INOVAÇÕES PEDAGÓGICAS

    DEYTIVAN OLIVEIRA CARDOSO

    FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

    NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: A

    DEFICIÊNCIA VISUAL NO CERNE DA QUESTÃO

    Salvador

    2018

  • DEYTIVAN OLIVEIRA CARDOSO

    FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

    NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: A

    DEFICIÊNCIA VISUAL NO CERNE DA QUESTÃO

    Projeto de Intervenção apresentado ao curso de Mestrado

    Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e

    Inovações Pedagógicas, Faculdade de Educação,

    Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial

    para obtenção do grau de Mestre em Educação.

    Orientadora: Profa. Dra. Silvia Maria Leite de Almeida

    Salvador

    2018

  • SIBI/UFBA/Faculdade de Educação – Biblioteca Anísio Teixeira

    Cardoso, Deytivan Oliveira.

    Formação de professores em educação especial na perspectiva da educação

    inclusiva: a deficiência visual no cerne da questão / Deytivan Oliveira Cardoso–

    2018.

    Orientadora: Prof. Dra. Silvia Maria Leite de Almeida.

    Projeto de intervenção (Mestrado Profissional em Educação, Currículo,

    Linguagens e Inovações pedagógicas) - Universidade Federal da Bahia. Faculdade de

    Educação, Salvador, 2018.

    1. Educação especial. 2. Educação inclusiva. 3. Professores de educação

    especial – Formação. 4. Professores de cegos – Formação. 5. Cegos – Educação.

    I. Almeida, Silvia Maria Leite de. II. Universidade Federal da Bahia. Faculdade

    de Educação. Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e

    Inovações Pedagógicas. III. Título.

    CDD 371.9046 – 23. ed.

  • DEYTIVAN OLIVEIRA CARDOSO

    FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA

    DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: A DEFICIÊNCIA VISUAL NO CERNE DA QUESTÃO

    Projeto de Intervenção apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em

    Educação Profissional: Currículo, Linguagens e Inovações Pedagógicas, Faculdade de

    Educação, da Universidade Federal da Bahia.

    Aprovado em 23 de fevereiro de 2018.

    Prof. Dra. Silvia Maria Leite de Almeida- – Orientadora

    Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia

    Prof. Dra Alessandra Santos de Assis– Examinadora

    Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia

    Prof. Dr. Euler Moraes Penha– Examinador

    Doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia

    Prof. Dra.Giovana Cristina Zen – Examinadora

    Doutora em Educação pela Universidade Federal da Bahia

  • Dedico a minha mãe e a meu filho Luiz.

  • AGRADECIMENTOS

    À Deus, Senhor supremo e majestoso que me permitiu chegar até aqui. Por sua grandeza e

    misericórdia, Ah! Se não fosse o Senhor!

    À minha mãe, por ser uma guerreira incansável. Sempre me apoiando e me incentivando a ser

    o que sou hoje. Devo tudo isso a ela.

    À meu filho Luís, pela sensibilidade e inspiração. Você foi a melhor coisa que a vida me trouxe!

    À Denize Boaventura, minha co-orientadora informal e também meus olhos nesse projeto,

    companheira de uma longa jornada. Sem dúvida alguma, foi um percurso de muitos espinhos,

    mas também de muitas flores!

    À minha orientadora Profa. Dra. Silvia Maria Leite de Almeida, obrigada pelo olhar apurado e

    pelos “pentes finos”. Certamente eles foram necessários para amadurecer melhor as ideias e

    superar alguns equívocos!

    Aos professores e colegas do Mestrado profissional em Educação: Currículo, Linguagens e

    Inovações Pedagógicas. Sou grato por compartilharem seus saberes de forma tão generosa!

    À João Batista, presidente da ADEVIR, suas contribuições foram riquíssimas. Obrigado pela

    parceria.

    Aos meus amigos e colegas mestrandos... foi uma caminhada difícil, mas valeu a pena!

    Aos professores do Colégio Odete! Que suas vozes sejam sempre ouvidas, em alto e bom som!

    A todos que de forma direta ou indireta me ajudaram nessa pesquisa! Meus votos de gratidão!

  • A formação não se faz antes da mudança, faz-se durante,

    produz-se nesse esforço de inovação e de procura dos

    melhores percursos para a transformação da escola.

    (Nóvoa, 1992, p.17)

  • CARDOSO, Deytivan Oliveira. Formação de professores em Educação Especial na

    perspectiva da Educação Inclusiva: A Deficiência Visual no cerne da questão. Projeto de

    intervenção (Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e Inovações

    pedagógicas) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.

    RESUMO

    Este Projeto de Intervenção-PI enfoca as contribuições do estudo sobre formação continuada

    de professores em educação especial na perspectiva da educação inclusiva, tendo a deficiência

    visual no cerne da questão. Aborda a importância da preparação docente dentro da profissão-

    “in loco”- e suas implicações no processo de ensino e aprendizagem dos alunos com deficiência

    visual. A investigação teve o caráter de uma abordagem qualitativa e consistiu em analisar se

    os docentes do Ensino Fundamental- Anos Finais da Escola Municipal Odete Nunes Dourado-

    EMOND, situada no município de Irecê, no estado da Bahia, estão preparados/capacitados para

    ensinar alunos com deficiência visual (cegos) na sala regular e de que modo uma formação

    docente, na área da deficiência visual contribui na promoção de uma escola mais inclusiva. Para

    isso, foi realizado uma pesquisa de campo, cuja estratégia metodológica consistiu num estudo

    de caso, no qual utilizei como instrumento: um (01) questionário semiestruturado, respondido

    por 09 professores do 6º ano vespertino e um(01) formulário Google Forms respondido por 18

    professores da EMOND. Nesse âmbito, foi possível apreender através destes questionários

    impressos e eletrônicos as reais necessidades dos professores de profissão e como seus saberes

    ou não saberes sobre inclusão, deficiência visual, Sistema Braille, Tecnologia Assistiva-TA e

    outras especificidades repercutiam nas experiências escolares com alunos cegos. No tocante ao

    referencial teórico, esse PI tem o aporte de autores como Nóvoa (1992, 2009, 2015) ao defender

    uma formação dentro da profissão, na qual os professores exerçam papéis importantes na

    formação de seus colegas e na sua própria formação; Tardif (2014) e a questão dos saberes

    docentes; Miranda, Galvão Filho e colaboradores (2012) discorrendo sobre o professor e a

    educação inclusiva; além de outros autores que contribuíram na fundamentação dos

    dispositivos elementares de uma formação docente. Em relação aos fundamentos legais, o

    estudo se baseou em documentos e legislações, a exemplo da Lei de Diretrizes e Bases da

    Educação- LDB, Nº 9.394/96, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da

    Educação Inclusiva (2008), entre outros. Para composição desse Projeto de Intervenção e

    caracterização do lócus da pesquisa, fiz uso de levantamento bibliográfico, análise documental

    da Proposta Curricular da Rede Municipal de Ensino de Irecê (2013) e do Projeto Político

    Pedagógico da EMOND. A pesquisa interventiva apontou a necessidade de propor um plano de

    formação continuada em educação especial na perspectiva da educação inclusiva, cujos

    pressupostos teóricos/metodológicos possibilitam aos professores refletir sobre os desafios e

    possibilidades frente a escolarização dos alunos com deficiência visual no Colégio Odete,

    Irecê/Bahia.

    Palavras – chave: Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Formação de

    professores “in loco”. Deficiência visual.

  • CARDOSO, Deytivan Oliveira. Formação de professores em Educação Especial na

    perspectiva da Educação Inclusiva: A Deficiência Visual no cerne da questão. Projeto de

    intervenção (Mestrado Profissional em Educação, Currículo, Linguagens e Inovações

    pedagógicas) - Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2018.

    ABSTRACT

    This Intervention Project-PI focuses on the contributions of the study on continuing education

    of teachers in special education from the perspective of inclusive education in the area of visual

    impairment, addressing the importance of professional preparation "in loco" and its

    implications in the teaching and learning process of students with visual impairment. The

    research had the character of a qualitative approach and consisted in analyzing if the teachers

    of the Elementary School - Final Years of the Municipal School Odete Nunes Dourado-

    EMOND, located in the municipality of Irecê, in the state of Bahia, are prepared / trained to

    teach students with visual impairment (blind) in the regular classroom and how a teacher

    training, with visual impairment at the heart of the issue, contributes to the promotion of a more

    inclusive school. For that, a field research was carried out, whose methodological strategy

    consisted of a case study, in which I used semistructured questionnaires as instruments, which

    were answered by 09 teachers of the 6th grade in the afternoon, and a Google Forms form

    answered by 18 teachers from EMOND. In this context, it was possible to perceive through

    these questionnaires printed and electronic the real needs of professors of profession and as

    their knowledge about continued education, inclusion, visual impairment, Braille System,

    Assistive Technology, had repercussions in the school experiences with blind students. With

    regard to the theoretical reference, this PI has the support of authors such as Nóvoa (1992, 2009,

    2015) in defending a formation within the profession, in which teachers play important roles in

    the formation of their colleagues and in their own formation; Tardif (2014) and the question of

    teacher knowledge, Miranda; Galvão Filho et al. (2012) discussing teacher and inclusive

    education; besides the discussion of the elementary devices of a teacher formation. Regarding

    the legal grounds, the study was based on documents and legislation, such as LDB 9394/96, the

    National Policy on Special Education in the Perspective of Inclusive Education (2008), among

    others. For the composition of this Project of Intervention and characterization of the locus of

    the research, I made use of a bibliographical survey, documentary analysis of the Curriculum

    Proposal of the Municipal Education Network of Irecê (2013) and the Political Educational

    Project of EMOND. The intervention research pointed out the need to propose a continuous

    training plan in the perspective of inclusive education, whose theoretical / methodological

    assumptions make it possible to reflect on the challenges and possibilities faced by students

    with visual impairment at Odete College Irecê/Bahia.

    Key words: Special Education in the perspective of Inclusive Education. Teacher training "in

    loco". Visual impairment.

  • LISTA DE ILUSTRAÇÕES

    Gráfico 01 Evolução da Política de Inclusão nas Classes comuns do Ensino

    Regular.....................................................................................................39

    Figura 01: Integração x inclusão ...............................................................................43

    Gráfico 02 População residente por tipo de deficiência –Brasil-2010........................59

    Tabela 01 Quantitativo da população brasileira com pelo menos um tipo de

    deficiência severa.....................................................................................60

    Figura 02 Materiais para escrita manual em braile: papel 40 quilos, prancheta e

    reglete e punção. .....................................................................................74

    Figura 03 Máquina de escrever em braile................................................................74

    Figura 04 Sorobã .....................................................................................................74

    Figura 05 Território de Identidade de Irecê...............................................................79

    Figura 06 Layout da 1ª Parada da Educação Especial da Rede Municipal de ensino

    de Irecê.....................................................................................................82

    Gráfico 03 Nível de escolaridade dos professores do Colégio Odete .......................103

    Gráfico 04 Percentual de interesse em construir e participar da proposta de formação

    de professores no Colégio Odete............................................................104

    Gráfico 05 Quantitativo de professores que acreditam na contribuição plena e parcial

    de uma formação de professores para a inclusão.....................................105

    Gráfico 06 Percentual entre os 18 professores que defendem a inclusão da formação

    continuada "in loco" na perspectiva da educação inclusiva no Projeto

    Político Pedagógico da escola................................................................101

  • LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

    ADEVIR Associação de deficientes visuais de Irecê e região

    AEE Atendimento Educacional Especializado

    CENESP Centro Nacional de Educação Especial

    CERMULT Centro de Referência Multidisciplinar da Educação Inclusiva de Irecê

    CNE Conselho Nacional de Educação

    CEB Câmara de Educação Básica

    CF Constituição Federal

    CONPEDE Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência

    DCN Diretrizes Curriculares Nacionais

    ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

    EMOND Escola Municipal Odete Nunes Dourado

    EJA Educação de Jovens e Adultos

    IBC Instituto Benjamim Constant

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

    ICB Instituto de Cegos da Bahia

    IDEB Desenvolvimento da Educação Básica

    IDH Índice de Desenvolvimento Humano

    LDB Diretrizes e Bases da Educação

    MEC Ministério de Educação

    NEE Necessidades Educacionais Especiais

    PACTO Pacto Nacional pela Alfabetização Na Idade Certa

    PI Projeto de Intervenção

    PNE Plano Nacional de Educação

    PNEE-EI- Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação

    Inclusiva

    PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

    PPP Projeto Político Pedagógico

    SEA Sistema de Escrita Alfabético

    SEDPAC Secretaria de Estado de Direitos Humanos, Participação Social e Cidadania

    SINPRO Sindicato dos Professores no Distrito Federal

  • SEM Sala de Recursos Multifuncionais

    TA Tecnologia assistiva

    UFBA Universidade Federal da Bahia

    UCSAL Universidade Católica de Salvador

    UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

    UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

  • SUMÁRIO

    INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12

    1 A EDUCAÇÃO ESPECIAL E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA

    PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................ 20

    1.1 IMPLICAÇÕES DO PESQUISADOR .............................................................................. 20

    1.2 A EDUCAÇÃO ESPECIAL E A FORMAÇÃO DOCENTE NO BRASIL ...................... 24

    1.2.1 Breve histórico e marcos legais ............................................................................. 24

    1.2.2 Percursos, legislações e políticas afirmativas: Um diálogo sobre educação

    especial e formação de professores ................................................................................ 33

    1.3 A POLÍTICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA

    EDUCAÇÃO INCLUSIVA: O paradigma da inclusão x integração ...................................... 40

    1.3.1 Paradigmas integracionistas e inclusivos ............................................................. 40

    1.3.2 A Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva

    e a formação continuada de professores. ...................................................................... 44

    2 DISPOSITIVOS DE UMA FORMAÇÃO “IN LOCO”: APONTAMENTOS E

    ENTRELAÇAMENTOS SOBRE A DEFICIÊNCIA VISUAL ......................................... 49

    2.1 DISPOSITIVOS DE UMA FORMAÇÃO DOCENTE”: EXPERIÊNCIAS, PROCESSOS

    DE ENSINO/APRENDIZAGEM, AUTOFORMAÇÃO E SUBJETIVIDADE DOS

    PROFESSORES DE PROFISSÃO .......................................................................................... 49

    2.1.1 Elementos de uma formação “in loco” e as implicações dos saberes docentes . 54

    2.2 A DEFICIÊNCIA VISUAL NO CERNE DA QUESTÃO ................................................ 56

    2.3 O SISTEMA BRAILLE E OS SABERES DOCENTE ..................................................... 61

    2.3.1 Aprendizagem do aluno com deficiência visual na sala regular ........................ 63

    2.3.2 Saberes pedagógicos sobre leitura e escrita braille ............................................. 65

    2.3.3 O uso de Tecnologia Assistiva -TA no processo de ensino/aprendizagem dos

    alunos com deficiência visual ......................................................................................... 72

    3 COMPREENDENDO O ESPAÇO DE AÇÃO: A ESCOLA MUNICIPAL ODETE

    NUNES DOURADO ............................................................................................................... 78

    3.1CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO DE IDENTIDADE E DA REDE PÚBLICA

    MUNICIPAL DE ENSINO DE IRECÊ ................................................................................... 78

    3.1.1 Perfil da Rede Municipal de ensino de Irecê ....................................................... 81

    3.1.2 As primeiras iniciativas de formação de professores na rede municipal de ensino

    de Irecê: A invisibilidade dos anos finais do Ensino Fundamental ........................... 82

  • 3.2 O ESPAÇO DE AÇÃO: A ESCOLA MUNICIPAL ODETE NUNES DOURADO

    .................................................................................................................................................. 86

    3.3 A PESQUISA DE CAMPO: DIREÇÕES METODOLÓGICAS ..................................... 89

    3.4 DESVELANDO A PESQUISA DE CAMPO: ANÁLISES E APONTAMENTOS PARA

    A CONSTRUÇÃO DA INTERVENÇÃO ............................................................................... 94

    3.4.1 Questionário semiestruturado: o que dizem os professores? ............................. 95

    3.4.2 O que diz o Projeto Político Pedagógico do Colégio Odete (2011) sobre formação

    continuada ........................................................................................................................ 99

    3.4.3 O que diz o questionário (formulário) eletrônico semiestruturado via Google

    Forms .............................................................................................................................. 101

    3.4.4 Entrevista semiestruturada e levantamento de dados ...................................... 107

    4 A INTERVENÇÃO: PLANO DE FORMAÇÃO CONTINUADA EM EDUCAÇÃO

    ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA - DEFICIÊNCIA

    VISUAL ................................................................................................................................. 109

    5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 117

    6 REFÊRENCIAS ................................................................................................................ 120

    ANEXOS ............................................................................................................................... 125

  • 12

    INTRODUÇÃO

    Este Projeto de Intervenção-PI analisa as contribuições de uma proposta de formação

    continuada de professores em educação especial na perspectiva da educação inclusiva,

    1abordando a importância da preparação profissional “in loco” e suas implicações no processo

    de ensino e aprendizagem dos alunos com deficiência visual no Colégio Odete, Irecê-Bahia.

    Nesse contexto, é fundamental entender a configuração dos novos e diferenciados cenários

    sociais, econômicos, políticos e culturais que remontam à paisagem da contemporaneidade2.

    No âmbito dessa temporalidade, é essencial na pesquisa investigativa ressignificar as formas de

    se pensar a educação, o processo de escolarização e consequentemente a formação de

    professores, cujos pressupostos éticos e legais procuram direcionar esses profissionais para

    atuar na diversidade existente na sala regular, através de uma abordagem inclusiva.

    Diante disto, a ressignificação da escola e da formação de professores, parte da premissa

    da educação como um direito estabelecido em uma sociedade democrática e da necessidade de

    uma (re)definição de práticas pedagógicas, as quais sejam (re)pensadas com vistas à promoção

    da aprendizagem e da inclusão (NÓVOA, 2009). De tal modo, as transformações nos processos

    de aquisição do conhecimento e dos saberes necessários à prática docente, transcendem os

    muros da escola, imprescindindo que haja por parte dos docentes atualização, formação

    continuada e uma constante preparação para atender a heterogeneidade de seus alunos.

    Pressupõe-se assim, refletir sobre os saberes que servem de base ao oficio do professor,

    do saber -fazer e da sua relação com o conhecimento científico ou experimental, com as crenças,

    habilidades adquiridas ao longo da profissão e também com sua própria subjetividade

    (TARDIF,2014). Nessa perspectiva, urge pensar meios de desenvolver uma cultura inclusiva

    que perpasse todas as esferas sociais e que repercuta diretamente nos saberes que alicerçam o

    trabalho e a formação de professores que atuam na Educação Especial na perspectiva da

    Educação Inclusiva.

    É nessa conjuntura que situo essa pesquisa, em torno da formação continuada de

    1 Em alguns momentos me refiro apenas a “formação continuada na perspectiva inclusiva”, somente a título de enxugamento de palavras. 2 Do mesmo tempo, da mesma época, referindo-se ao que já existiu e ao que ainda existe. Nosso tempo.

    (BECHARA, 2011, p.352.)

  • 13

    professores, considerando as implicações dos saberes docentes, o percurso formativo, a

    insuficiente preparação para atuar na diversidade e os desafios encontrados na inclusão dos

    alunos com deficiência visual nas classes de ensino regular dos Anos Finais do Ensino

    Fundamental.

    Nas minhas vivências enquanto professor, tenho observado que há uma evidente

    dificuldade, por parte dos professores dos Anos Finais em “desvelar os conhecimentos e a

    subjetividade do aluno, subestimando, na maioria das vezes, a sua capacidade de aprender

    (SILVA, 2012, p.163). Face a essas questões, a promoção da aprendizagem significativa dos

    alunos cegos fica comprometida, pois os professores não conseguem inseri-los qualitativamente

    nos contextos de produção e aquisição do conhecimento, nos processos de comunicação social

    envolvendo o Sistema Braille, a utilização dos recursos de Tecnologia Assistiva e demais

    contextos próprios a escolaridade desse aluno.

    A esse respeito, Nóvoa (2009, p.16) argumenta sobre “a necessidade de construir

    políticas que reforcem os professores, os seus saberes e os seus campos de actuação, [...]”. Para

    entender esse processo, considero as contribuições das políticas afirmativas de educação

    inclusiva e de formação de professores já existentes essenciais. A exemplo disso, debruço-me

    sobre a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva- PNEE-

    EI, documento do Ministério da Educação - MEC, que define como estratégias para efetivar a

    inclusão de alunos com Necessidades Educacionais Especiais-NEE, a:

    ● Transversalidade da Educação Especial desde a educação infantil até a educação superior;

    ● Atendimento educacional especializado; ● Continuidade da escolarização nos níveis mais elevados do ensino; ● Formação de professores para o atendimento educacional especializado e demais profissionais da educação para a inclusão escolar;

    ● Participação da família e da comunidade; ● Acessibilidade urbanística, arquitetônica, nos mobiliários e equipamentos, nos transportes, na comunicação e informação; e

    ● Articulação intersetorial na implementação das políticas públicas (BRASIL, 2008, p.10. Grifo meu).

    Todos essas estratégias são pontuais, legitimas e necessárias no desenvolvimento de

    uma cultura inclusiva na escola, no entanto, atenho-me apenas ao quarto tópico, no qual

    delimito meu objeto de estudo, que é a formação continuada de professores da sala regular

    (compreendidos como esses “demais profissionais da educação para a inclusão escolar”) e as

    implicações de uma possível capacitação/preparação docente face às especificidades

    encontradas no atendimento aos alunos com deficiência visual, matriculados ou que venham a

    se matricular nas classes de ensino regular dos Anos Finais do Ensino Fundamental, na Escola

    Municipal Odete Nunes Dourado, Irecê-Bahia.

  • 14

    Portanto, esta discussão está fundamentada de acordo com os princípios legais

    estabelecidos através da PNEE-EI (2008), na qual diz que o professor para atuar na Educação

    Especial deve ter como base da sua formação, inicial e continuada, “conhecimentos gerais para

    o exercício da docência e conhecimentos específicos da área”. Sendo assim proponho uma

    formação de professores na perspectiva inclusiva dentro da profissão3, caracterizada aqui

    também como uma formação “in loco”. Face a esse universo, Pimentel (2012, p.141, grifo meu)

    discorre que “a inexistência desta formação gera o fenômeno da pseudoinclusão, ou seja, apenas

    da figuração do estudante com deficiência na escola regular, sem que o mesmo esteja

    devidamente incluído no processo de aprender”.

    Considerando esses aspectos, essa escolha temática se justifica pela dificuldade de

    efetivação das políticas públicas educacionais, especialmente no que tange a estratégia definida

    pelo PNEE-EI que indica a formação atuar na educação especial “dos demais profissionais da

    educação para a inclusão escolar” (Brasil,2008). Assim, através da minha experiência,

    observo que essa repercussão implica diretamente nas ações pedagógicas no cotidiano escolar,

    pois nesse cenário, encontramos professores que lecionam para alunos com deficiência visual,

    não tendo nenhuma preparação/capacitação para ensiná-los, ocasionando assim a insuficiente

    transversalidade da Educação Especial desde a Educação Infantil até a Educação Superior,

    comprometendo também a continuidade da escolarização desses alunos nos níveis mais

    elevados do ensino.

    De tal modo, cabe aos professores que atuam na educação especial na perspectiva

    inclusiva mediar qualitativamente o processo de ensino e aprendizagem, utilizando-se de

    estratégias pedagógicas que possibilitem a participação do aluno com deficiência visual em

    atividades de leitura e escrita através do Sistema Braille, além do uso de recursos de TA como

    aliados e facilitadores da inclusão escolar na sala regular.

    A preocupação é que a depender da falta de preparação do professor ou mesmo da sua

    concepção errônea de inclusão, os alunos com deficiência visual ou com outras Necessidades

    Educativas Especiais- NEE podem se tornar “invisíveis” na sala de aula. Tal realidade poderá

    refletir diretamente na exclusão ou na aprendizagem defasada e insuficiente, resultando muitas

    vezes em distorção idade/série e evasão escolar. Nesse entrelaçar, o despreparo dos professores

    e a ausência de uma formação/capacitação para a efetivação da educação inclusiva,

    especificamente do atendimento nas classes comuns, é um descumprimento do que determina

    3 Essa expressão é usada por Nóvoa (2009, 16) para justificar “a necessidade de os professores terem um lugar predominante na formação dos seus colegas. Não haverá nenhuma mudança significativa se a “comunidade dos

    formadores de professores” e a “comunidade dos professores” não se tornarem mais permeáveis e imbricadas”.

  • 15

    a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB quando diz no capítulo V, artigo 59

    que é preciso definir o currículo, os métodos, os recursos e uma organização específica para

    atender os alunos com necessidades educativas especiais, além de professores capacitados.

    Nesse viés, a Política Nacional de Formação de Profissionais do Magistério da Educação

    Básica, instituída pelo Decreto nº. 8752/2016, aponta para a formação do docente para atender

    às especificidades no exercício de suas atividades e aos objetivos das diferentes etapas e

    modalidades da educação básica como um princípio norteador. Além do mais, nesse documento

    a formação é entendida também como “um componente essencial da profissionalização

    docente, devendo integrar-se ao cotidiano da escola e considerar os diferentes saberes e a

    experiência docente” (BRASIL,2016, p.2).

    Tendo em vista os elementos teóricos e legais descritos acima analiso através de um

    estudo de caso na Escola Municipal Odete Nunes Dourado, mais conhecida como Colégio

    Odete, as implicações de uma proposta de formação continuada na perspectiva inclusiva, ao

    levantar duas questões-chave para o desenvolvimento da pesquisa: Os docentes do Odete estão

    preparados/capacitados para ensinar alunos com deficiência visual (cegos) na sala de aula

    regular? E de que modo uma formação de professores na perspectiva da educação inclusiva,

    tendo a deficiência visual no cerne da questão contribuiria no processo de capacitação/

    preparação do professor, com vistas a tornar a sala de aula regular, bem como a própria escola

    num lugar mais inclusivo?

    Com fins a estabelecer parâmetros para a investigação e para construção do Projeto de

    Intervenção- PI outros questionamentos foram levantados:

    - O que sabem os professores dos Anos Finais sobre deficiência visual, inclusão,

    Sistema Braille e Tecnologias Assistivas- TA?

    - A formação de professores na perspectiva da educação inclusiva é uma

    necessidade e uma prioridade que deverá ser prevista no Projeto Político

    Pedagógico da escola?

    - Como desenvolver um trabalho formativo – colaborativo "in loco", que

    resultasse na elaboração de um plano de formação continuada "no chão da

    escola", cujos pressupostos teóricos/metodológicos possibilitassem refletir sobre

    a educação especial inclusiva e deficiência visual?

    - Os saberes sobre Sistema Braille, Tecnologia assistiva (softwares adaptados,

    máquina braille, reglete; e outros temas específicos resultaria em um

    melhoramento de sua prática pedagógica no atendimento ao aluno com

    deficiência visual?

  • 16

    - Quais às suas reais necessidades frente às questões envolvendo os alunos com

    deficiência visual e outras especificidades na sala regular?

    - De que modo, uma formação continuada na perspectiva da educação inclusiva

    poderia acontecer no espaço escolar?

    Assim, para fins dessa investigação, optei pela abordagem qualitativa, por compreender

    que através dela posso observar questões particulares, como a necessidade de considerar a

    formação continuada de professores como um elemento indispensável para uma prática

    pedagógica que atenda às necessidades específicas de cada aluno e que construa ao mesmo

    tempo, percursos significativos de aprendizagem que possibilitem ao docente a compreensão

    da sua realidade, como fruto dela e de seus fenômenos.

    Nesse aspecto, a abordagem qualitativa se torna importante, pois ela define alguns

    procedimentos metodológicos das Ciências Sociais que dialogo sobre um caráter construtivo-

    interpretativo, dialógico e que volta sua atenção a singularidade dos acontecimentos sociais que

    não podem ser quantificados (LAKATOS, 2006). Em relação as fontes utilizadas, fiz uso do

    levantamento bibliográfico, cuja intencionalidade foi a de me familiarizar com o objeto de

    estudo e com a pesquisa de campo, o estudo de caso. Para Lakatos e Marconi (2017, p.32) “a

    pesquisa pode ser bibliográfica, de laboratório e de campo”.

    No tocante a pesquisa bibliográfica, esse PI tem o aporte de autores como Nóvoa (1992,

    2009, 2015), Tardif (2014) Miranda e Galvão Filho colaboradores (2012), outras leituras

    complementares, além de documentos e legislações oficiais. Dentre os procedimentos

    metodológicos da pesquisa de campo, optei pelo estudo de caso, pois segundo Merrian (1998,

    apud BOGDAN e BIKLEN,1994, p.89) esse método “consiste na observação detalhada de um

    contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documentos ou de um acontecimento específico”.

    Assim, o estudo de caso se deu na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Anos

    Finais) Odete Nunes Dourado, da rede pública de ensino de Irecê, por se tratar de uma

    instituição escolar que tem recebido ao longo da década 2007- 2017 cerca de 13 alunos com

    deficiência visual-cegueira (dados obtidos com a atual professora de Atendimento Educacional

    Especializado da instituição), os quais foram matriculados tanto nas salas regulares como na

    Sala de Recursos Multifuncional- SRM. A SRM do Odete é do tipo II, 4ou seja, ela é equipada

    4 Sala de Recursos Multifuncional – Tipo I, na Educação Básica é um atendimento educacional especializado, de

    natureza pedagógica que complementa a escolarização de alunos que apresentam deficiência Intelectual,

    deficiência física neuromotora, transtornos globais do desenvolvimento e transtornos funcionais específicos,

    matriculados na Rede Pública de Ensino.

    Disponível em: http://www.educacao.pr.gov.br/arquivos/File/instrucoes/Instrucao162011.pdf. Acesso em

    21/10/2017.

    http://www.educacao.pr.gov.br/arquivos/File/instrucoes/Instrucao162011.pdf

  • 17

    com vários recursos de acessibilidade como impressora braille, globo terrestre com continentes

    e países em braille, calculadora sonora e outros, a escola também dispõe de uma professora

    braillista, possibilitando que haja um trabalho de inclusão em parceria com a sala regular. Nesse

    viés, esse PI compreende que a SRM não pode ser uma via de mão única, um serviço “tamanho

    único”, visto que é na sala regular que o aluno permanece a maior parte do tempo no seu

    processo de escolarização (MENDES; MALHEIRO, 2012).

    Assim, a escolha do lócus da pesquisa se justificou por esta escola oferecer os Anos

    Finais do Ensino Fundamental, estar bem centralizada e receber alunos de aproximadamente

    umas sete (07) escolas do Anos Iniciais do Ensino Fundamental, localizadas nas proximidades.

    Neste ano, a escola recebeu 04 alunos cegos, desistiu 01 e 03 continuaram sendo que destes 02

    também apresentam deficiências múltiplas. Outro fator importante na escolha dessa temática é

    a minha participação na Associação de Deficientes Visuais de Irecê e Região- ADEVIR, desde

    a sua fundação em 2000, durante esses 17 anos, encontrei na convivência da instituição alunos

    egressos e ingressos no Colégio Odete que compartilharam muitas vezes experiências escolares

    excludentes. A escola e a ADEVIR estão localizadas em bairros vizinhos.

    Compreendendo essa realidade, entendo que o fato do Colégio Odete ser uma escola de

    grande porte, esse PI possibilita (re)pensar através da formação continuada de professores na

    perspectiva da educação inclusiva “in loco” meios de fomentar ações que viabilizem conforme

    conta no Projeto Político Pedagógico-PPP da instituição “o desenvolvimento pleno do aluno, a

    conscientização dos seus direitos e deveres no exercício da vida cidadã, embasada na

    solidariedade humana, na responsabilidade social e no respeito às diferenças”(IRECÊ, 2017,

    p.10).

    Nesse contexto, o Colégio Odete tem um quadro de professores que não dispõem de um

    plano de formação continuada, apesar de ser um dos objetivos institucionais previstos em seu

    PPP que os auxilie no processo de atendimento às especificidades, dos alunos com deficiência

    visual atualmente matriculados e dos que vinherem a se matricular.

    De tal modo, a proposta de intervenção no Colégio Odete em Irecê/Ba consiste na

    proposição de um plano de formação continuada na perspectiva da educação inclusiva, cujos

    pressupostos teórico/metodológicos possibilitem aos professores refletir inicialmente sobre os

    desafios e possibilidades frente a escolarização dos alunos com deficiência visual.

    Tal proposição tem o objetivo de sensibilizar ou provocar os professores como autores

    de suas práticas a promoverem inovações pedagógicas envolvendo os processos de ensino e

  • 18

    aprendizagem da leitura e da escrita através do Sistema Braille5, associado ao uso de recursos

    de tecnologia assistiva- TA nas salas regulares. Nesse âmbito, a discussão não pretende esgotar

    apenas nesses dois pontos, mas englobar outros aspectos referentes à inclusão da pessoa com

    deficiência visual, a exemplo de continuidade nos estudos, formação para o trabalho,

    autonomia, emancipação etc.

    Esse PI está estruturado em 04 partes posteriores a essa introdução. A primeira está

    intitulada como “A Educação Especial e a Formação de professores na perspectiva da educação

    inclusiva”, cujas abordagens trazem as minhas implicações iniciais, o contexto histórico da

    formação de professores na Educação Especial no Brasil, uma breve discussão sobre os

    paradigmas integração X inclusão, as legislações (marcos legais) que fundamentam à inclusão

    e as políticas educacionais afirmativas, face à formação de professores e a escolarização do

    aluno com deficiência visual.

    Na segunda parte intitulada “Dispositivos de uma formação “in loco”: apontamentos e

    entrelaçamentos sobre a deficiência visual” pondero sobre os entrelaçamentos e dispositivos

    que envolvem o universo da proposta de formação “in loco”, puxando fios de uma conversa

    sobre as especificidades da deficiência visual. Essa parte, considero-a como o coração da

    pesquisa, pois nela trago a sugestão de alguns elementos fundamentais a uma formação “in

    loco”.

    Na terceira parte, “Compreendendo o espaço da ação: A Escola Municipal Odete Nunes

    Dourado” é realizada a caracterização da cidade de Irecê, do seu Território de Identidade, da

    Rede municipal de ensino e do Colégio Municipal Odete Nunes Dourado, além de constar a

    descrição metodológica dos instrumentos da pesquisa, as análises dos materiais investigados e

    apontamentos para a construção da proposta interventiva.

    Na quarta parte, trago a proposta de intervenção, a estruturação do Plano de formação

    continuada de professores na perspectiva da educação inclusiva, tendo a deficiência visual no

    cerne da questão. Portanto, propõe-se aqui, um plano de formação continuada que possibilite o

    sujeito se “autoformar”, no exercício de sua profissão, no diálogo com outros professores, na

    reflexão de seus saberes, valores éticos e políticos. Importante dizer também que a discussão

    5 No âmbito de organizações e serviços ligados ao ensino, à produção e ao uso do Sistema Braille no Brasil vem

    utilizando, há 150 (cento e cinquenta) anos, a palavra “braille” em sua grafia original francesa (BRASIL, 2006b,

    p.92). Usa-se nesse PI as grafias Braille, braille e braile, pois na “Língua Portuguesa, as três formas de grafia [...]

    estão corretas, dependendo das circunstâncias em que cada uma delas for utilizada. Conforme MARTINS (1990

    apud Sassaki (2010), grafa-se Braille quando se referir ao educador francês Louis Braille (ou quando este nome

    fizer parte de nomes de instituições) e grafa-se braile nos demais casos. A Comissão Brasileira do Braille- CBB

    manteve a grafia Sistema Braille, como nome próprio e não como termo técnico. Texto adaptado disponível em:

    http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=1882

    http://www.planetaeducacao.com.br/portal/artigo.asp?artigo=1882

  • 19

    não se exaure no recorte dado aqui à deficiência visual, pois considerar a formação de

    professores na perspectiva inclusiva “in loco” é englobar todo e qualquer aluno no processo de

    aprendizagem, considerando suas necessidades e particularidades.

  • 20

    1 A EDUCAÇÃO ESPECIAL E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA

    PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA

    Pensar sobre formação de professores na perspectiva da educação inclusiva tendo como

    cerne da discussão, a deficiência visual, demanda levantar questões dos saberes dos professores,

    da natureza desses saberes e dos princípios que fundamentam a prática pedagógica desses

    profissionais que atuam na escolarização desse público-alvo da Educação Especial. Nessa

    instância, é importante que entendamos as legislações que a embasam, as políticas educacionais

    afirmativas de formação de professores e de inclusão escolar, além de entender em que contexto

    histórico e sócio-político a formação de professores foi/é pensada e construída no Brasil.

    1.1 IMPLICAÇÕES DO PESQUISADOR

    Como falar em formação de professores, sem o pertencimento, sem contar das minhas

    implicações, das minhas vivências, ora como professor, ora como aluno com deficiência visual?

    A escolha do objeto de estudo, decorre então dessas minhas inferências pessoais, profissionais

    e acadêmicas, que ao meu ver, traz muito do sentimento de identidade a esse projeto de

    intervenção.

    O meu “pertencer a causa” começou aos quatros anos de idade, no ano de 1980 quando

    tive a minha primeira experiência estudantil na Escola Presbiteriana de Lapão, onde fiz os

    primeiros rabiscos, vislumbrando o mundo e observando sempre através do olhar a beleza das

    coisas, das cores e de tudo ao meu redor. Ao completar os sete anos de idade, fui transferido

    para outra escola, Justiniano de Castro Dourado, onde para mim era tudo muito novo, novos

    colegas, nova professora e um relacionamento mais intenso com meus estudos. Em 1986,

    aproximando o final do ano, no mês de outubro, fui vítima de uma grande fatalidade, um

    acidente drástico me fez perder completamente a visão. Ao brincar com um primo soltando

    bombinhas (fogos de artificio), uma explodiu junto aos meus olhos.

    Em busca de recursos médicos cheguei ao Rio de Janeiro, onde obtive a primeira

    experiência de voltar a estudar, agora como um cego. Nessa época, conheci então o Instituto

    Benjamim Constant - IBC, onde os meus sonhos começariam a ser alimentados com grandes

    possibilidades de realizá-los, lá pude “ver” caminhos se abrindo e obstáculos sendo destruídos,

    já que era o meu sonho continuar os estudos. A defesa de uma formação de professores na

    modalidade inclusiva da deficiência visual perpassa então pela minha experiência positiva com

    professores altamente capacitados que me ajudaram a ver o mundo com “minhas próprias

    mãos” através de uma mediação significativa na leitura, escrita, cálculo e outros conhecimentos

  • 21

    utilizando o Sistema Braille.

    Assim, enquanto estudante cego experimentei de métodos educacionais especializados

    por parte de professores bem capacitados e que mediaram de forma prazerosa a minha

    aprendizagem, de forma a garantir o prosseguimento dos meus estudos, alicerçando

    qualitativamente minha base profissional e acadêmica. Nesse processo fui alfabetizado com o

    Sistema Braille e um novo percurso de escolarização foi se construindo, dando ênfase a uma

    nova história de formação educacional.

    Já adolescente fui transferido para o Instituto de Cegos da Bahia - ICB em Salvador,

    esta instituição era de Regime Integral de Internato e permaneci lá durante nove anos. Neste

    espaço tive um aprendizado muito significativo através dos cursos de locomoção, música,

    fisioterapia, terapia ocupacional, natação e outros. Enfim, todas essas atividades me

    possibilitaram uma maior independência, autonomia e emancipação como sujeito protagonista

    de uma história a ser construída num horizonte de possibilidades. Pude então observar o

    diferencial dos professores que atuam nesses espaços, eles estão ali porque são preparados para

    cada função.

    Ao sair do ICB, graduei-me em um curso de Bacharelado e Licenciatura em História

    pela Universidade Católica de Salvador - UCSAL. Nesse tempo, com diversas dificuldades,

    experimentei momentos desafiadores para estudar, pois não havia produções em braille e sequer

    algum tipo de recurso que pudesse auxiliar o meu processo de aquisição/produção do

    conhecimento. Percebi que apesar das instituições de ensino superior serem espaços de

    construção do conhecimento, muitas vezes não é possível um diálogo coerente sobre práticas

    inclusivas por parte de sua comunidade.

    Percebo então que a desigualdade e a exclusão nos processos de ensino e aprendizagem

    perpassam desde a educação infantil até o ensino superior, pois a inclusão ainda não é uma

    cultura própria das escolas, nem das universidades, muito menos da sociedade, ela ainda não

    acontece plenamente no dia-a-dia, entre as paredes da sala de aula, nos corredores, nos murais,

    nas falas e nas metodologias de ensino. Ainda predomina uma cultura heterogênea e reprodutora

    de práticas excludentes e segregacionistas.

    Ao conclui meu curso, ingressei-me no mundo do trabalho, tendo a minha primeira

    experiência profissional como professor substituto e coordenador da disciplina de História no

    Colégio Salesiano em Salvador. Nesse posto, coordenei projetos voltados a Educação Especial

    e a partir daí, tive a oportunidade de passar 04 anos na Itália, na cidade de Bologna, onde pude

    trabalhar nessa área e experimentar de um convívio social inclusivo que me fez pensar como

    Carneiro (2007, p.26) que “uma escola inclusiva só existirá na moldura de uma sociedade

  • 22

    inclusiva”. A Itália é um dos países pioneiros na implantação/implementação das escolas

    inclusivas, tendo uma legislação própria que regulamenta a inclusão de alunos com deficiência

    nas salas regulares, desde a década de 1970.

    Talvez por isso tenha me sentido tão bem acolhido entre os italianos. Nesse país, as

    experiências de implantação/implementação de escolas inclusivas e de formação de professores

    nessa perspectiva, assim como em outros países, como a Espanha e Reino Unido tiveram muitas

    dificuldades na adaptação, mas sempre iam se reciclando e reformulando novas formas de

    garantir a inclusão. No entanto, sobre essas ponderações, Carneiro (2007, p.28) pontua que “em

    todos os casos, prevaleceram a negociação, a preparação dos sistemas, das escolas e dos

    professores e não a força da lei”. O resultado de uma escola inclusiva perpassa por uma cultura

    social inclusiva, uma está indissociavelmente atrelada a outra.

    Após voltar para o cenário educacional do Território de Identidade de Irecê, enquanto

    professor efetivo das redes municipais de ensino de Irecê e Lapão, cidades vizinhas venho

    tentando me constituir enquanto professor e nessa caminhada me deparei com uma

    oportunidade ímpar que foi a seleção do mestrado profissional realizado através da parceria da

    Universidade Federal da Bahia - UFBA/ Irecê, Lapão e Ibititá. É nesse movimento, enquanto

    mestrando que vou me implicando com o tema, reportando-me às primeiras experiências de

    aproximação com os professores, com os colegas, os grupos de discussão e o cursar das

    disciplinas. Assim, entre o lembrar e o recordar vou subjetivamente me conduzindo a uma busca

    por aprofundamentos e amadurecimentos, procurando compreender como posso melhorar

    minha prática através da formação de professores na perspectiva da educação inclusiva.

    Nesse aspecto, entre idas, vindas, práticas e teorias, encontro-me em uma realidade

    educacional que me despertou algumas reflexões sobre a formação de professores na

    perspectiva inclusiva, cujas implicações possibilitam repensar o processo de

    ensino/aprendizagem da pessoa com deficiência visual, suas formas de comunicação e como

    seria possível superar as limitações impostas pela ausência/fragilidade/insuficiência das

    políticas afirmativas de inclusão no espaço escolar que repercutem também no despreparo do

    professor frente a diversidade. Tardif (2014) aponta que a formação continuada de professores

    pressupõe um tempo/espaço onde é possível dialogar, refletir, sensibilizar e olhar o trabalho

    docente a partir da realidade da sala de aula.

    Nesse contexto, enquanto pertencente a uma realidade educacional, a compreensão real

    da minha deficiência, foi a nível pedagógico, como um dos inúmeros professores espalhados

    pelo Brasil que não conseguem garantir o acesso de um ensino de qualidade aos alunos com

    necessidades educativas especiais, por justamente não estar preparado/capacitado para o

  • 23

    trabalho com as especificidades.

    Essas situações experienciadas como professor, fez-me perceber a necessidade de uma

    “formação dentro da profissão” como defende Nóvoa (2009), de saberes que pudessem auxiliar

    na construção e utilização de materiais pedagógicos em braille e no valer-se de recurso de TA

    como possibilitadores de uma aprendizagem mais significativa, enquanto professor cego que

    poderá ensinar para alunos cegos. O desejo por essa acessibilidade, perpassa a complexidade

    de desenvolver um planejamento pedagógico coerente e condizente com a realidade dos alunos,

    tendo em vista que na minha atuação docente, os espaços educativos não dispunham/dispõem

    de computadores adaptados, nem pistas táteis, nem sinalizadores, nem sequer pessoas que

    estivessem/estejam a disposição para auxiliar no processo de elaboração das minhas aulas.

    Portanto, a observação do meu cotidiano escolar, bem como o discurso presente nas

    falas dos colegas professores frente aos alunos com deficiência visual e outras NEE,6 também

    enquanto professor com deficiência visual diante dos alunos “ditos normais”. Essas questões

    fizeram-me inquietar enquanto pesquisador e sujeito humano, pois ao ouvir as angústias dos

    professores tornou-se claro que há um pedido de socorro ecoando nos espaços educativos. É

    como se eles não soubessem o que fazer, nem como emancipar esses alunos, nem ao menos

    garantir as condições mínimas de escolarização. Na verdade, há todo um despreparo a nível de

    competências e habilidades no atendimento educacional disponibilizado aos alunos com

    deficiência visual nas classes de ensino regular e diante disso há uma pergunta importante a se

    fazer: O que sabem os professores do Colégio Odete sobre deficiência visual?

    Assim, o interesse pela temática se deu nessa observação no “chão da escola”, na escuta

    das “queixas” de alguns professores e seus anseios por uma maior capacitação ou preparação

    para atender alunos com deficiência visual e outras NEE, ou seja, o desejo de uma “formação

    dentro da profissão”, como defende Nóvoa (2009). Urge, portanto, dialogar sobre “a

    importância do professor constituir saberes didáticos para o trato das questões da Educação

    Especial” (JESUS; EFFGEN, 2012, p.80) no “chão da escola”, procurando assim fomentar

    6 NEE - quer dizer Necessidades Educativas Especiais e é um conceito atual em Educação. O conceito de NEE passou a ser

    conhecido em 1978 a partir da sua formulação no "Relatório Warnock"[...] A Secretaria de Educação Especial (Seesp)

    atualmente Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão - SECADI ao desenvolver

    programas, projetos e ações a fim de programar no país a Política Nacional de Educação Especial, considera

    público-alvo da educação especial, os alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e com altas

    habilidades/superdotação. Texto adaptado, disponível em: https://sites.google.com/site/lucianealvesee/o-que--nee.

    Acesso em: 12/12/2017.

    https://sites.google.com/site/lucianealvesee/o-que--nee

  • 24

    práticas formativas e inclusivas que mediem as relações de ensino/aprendizagem entre

    professores e alunos com deficiência visual em tempos/espaços, com condições humanas e

    materiais.

    Nesse âmbito, esse PI emergiu do desejo de compreender como a ausência/insuficiência

    de capacitação/preparação docente implica no desenvolvimento de práticas pedagógicas

    inclusivas que melhorem os processos de ensino/aprendizagem e desenvolvam condições de

    emancipação dos alunos com deficiência visual, tornando-os críticos, autônomos e

    participativos.

    1.2 A EDUCAÇÃO ESPECIAL E A FORMAÇÃO DOCENTE NO BRASIL

    Não é possível abordar a questão da Educação Especial e da formação docente na

    perspectiva inclusiva sem marcar temporalmente os aspectos históricos e os marcos legais que

    influenciaram as políticas e os paradigmas atuais que envolvem esse objeto de estudo. Nesse

    contexto, pensar em educação inclusiva “dentro da” e “para fora da” formação continuada de

    professores “dentro da profissão” no Ensino Fundamental (Anos Finais) exige certas

    observações dos paradigmas educacionais adotados ao longo do surgimento da Educação

    Especial no país, bem como suas implicações no trato aos alunos com deficiência, a forma como

    eram vistas, tratadas, aceitas ou segregadas socialmente.

    1.2.1 Breve histórico e marcos legais

    Nos registros históricos há fortes indícios de que as sociedades primitivas, bem como as

    primeiras civilizações mantinham relações conturbadas em relação às pessoas com deficiências.

    Conforme Silva (2012), os diferentes eram muitas vezes exterminados e as causas desse

    extermínio variavam de acordo com as crenças ou necessidades de sobrevivência de cada grupo

    ou tribo. Predominavam nessa época os mitos e as crenças, haja vista que elas, muitas vezes,

    determinavam o comportamento social.

    Ao longo da Idade Média, com o advento do Cristianismo e a forte influência exercida

    nas sociedades ocidentais, foram sendo formuladas concepções e alternativas para lidar com

    pessoas com deficiências. Uma dessas alternativas, foram os hospitais de caridade (criados no

    século IV), locais que isolavam ou segregavam crianças, no entanto era uma forma de salvá-las

    do convívio difícil com a família e outras esferas sociais. Nesse contexto, Silva (2012, p.31)

    aponta que “as instituições assistencialistas passaram a cumprir o papel de isolar as pessoas

    com deficiência do convívio social, modelo de exclusão que, guardadas as proporções

  • 25

    permanecem até os dias atuais”.

    Mas adiante no século XVII com o Iluminismo e posteriormente, com a Revolução

    Industrial, novas concepções, novos modelos de homem e de família foram surgindo como

    contraponto às concepções místicas que envolviam as pessoas com deficiências (SILVA, 2012).

    A sociedade passa a procurar na medicina e nas instituições, a forma mais apropriada de cuidar

    de seus doentes, deixando um pouco de lado as superstições, as crenças e o misticismo.

    Nesse aspecto, a institucionalização permaneceu como medida mais aceitável no

    tratamento as pessoas com deficiência, através de asilos, internatos, escolas especiais etc. A

    institucionalização, que era, na melhor das hipóteses, superior ao abandono ou a tutela da igreja,

    ainda não atendia aos interesses das pessoas com deficiências. O fato de estar sujeito ao controle

    autárquico, de normas e regras faziam com que muitas pessoas não tivessem o privilégio de

    serem autônomos, de construírem sua emancipação, produto este, necessário no processo de

    inclusão.

    Assim, em decorrência de uma conjuntura social, na qual os valores foram sendo

    modificados, de acordo com um novo tipo de homem e de sociedade, os períodos de

    perplexidade e misticismo vão cedendo lugar aos encaminhamentos assistencialistas e

    educacionais, principalmente no período Pós I Guerra e II Guerra Mundial. Nesse cenário,

    muitas famílias recebiam seus soldados deformados, cegos, amputados e completamente

    impossibilitados de exercerem as mesmas atividades que até então vinham executando. De tal

    modo, através da vivência de como era ser diferente, das dificuldades enfrentadas pela falta de

    acessibilidade, socialização e comunicação, iniciou-se um processo de lutas e deliberações para

    a inserção de pessoas com deficiências nos sistemas educacionais e trabalhistas. Acerca disso,

    Platt (1999, p.7) considera que:

    Nas duas grandes guerras mundiais, assim como em outros conflitos que

    historicamente temos conhecimento (como o do Vietnã, Palestina etc.), o saldo de

    deficientes sempre foi exorbitante; a depressão e a baixa autoestima destes jovens

    comprometiam sua vontade de viver e de repensar sua nova condição física diante de

    suas rearticulações sócio-política-econômica-culturais. A própria sociedade exigiu

    dos organismos políticos que deliberassem oportunidades de inserção trabalhistas e

    educacionais a estes indivíduos.

    Mediante esses acontecimentos, os movimentos sociais, iniciados no Iluminismo e

    fortalecidos pelos ideais da Revolução Francesa, pela perplexidade e horror do Pós-guerra

    intensificaram suas lutas em prol das minorias, defendendo e incorporando os valores de

    igualdade, inclusão, democracia, etc.

    Nas sociedades ocidentais, os discursos de defesa dos direitos humanos ganham força

  • 26

    no século XX, influenciadas pelo fenômeno da globalização7 e iniciam gradativamente acordos

    e compromissos como requisito a participarem da ONU- Organização das Nações Unidas, cujos

    princípios exigiam metas e compromissos a serem assumidos pelos líderes de cada país. Nessa

    conjuntura, temos como marco a Declaração Universal dos Direitos Humanos em 19488.

    Embora, mesmo após esse compromisso firmado pelo Brasil, a realidade educacional

    para as pessoas com deficiência ainda era bem delicada. Segundo Santos (2007), a partir de

    1960 há uma forte tendência no sistema educacional brasileiro pela institucionalização (período

    marcado pela segregação, isolamento, silenciamento, internações, escolas especiais), seguidos

    posteriormente dos princípios de integração (normalização, tudo é igual a todos, as diferenças

    são negadas nesse processo) nas décadas de 70 e 80 do século XX.

    A institucionalização estava mais ligada ao atendimento assistencialista clínico

    especializado, que incluía em seus parâmetros, a educação escolar. Um exemplo dessas

    instituições tradicionais de assistência às pessoas com deficiências, é o pioneirismo do Instituto

    dos Meninos Cegos, fundado na cidade do Rio de Janeiro, em fins de 1854 (MANTOAN,2011).

    Embora essas instituições eram essenciais e importantes na história do país, elas também

    representavam a segmentação das deficiências, cada uma se preocupando apenas com sua área

    e limitando seu atendimento a poucos. Acerca disso, Mantoan (2011, p.3) relata que:

    Entre a fundação desse Instituto e os dias de hoje, a história da educação especial no

    Brasil foi se estruturando, seguindo quase sempre modelos que primam pelo

    assistencialismo, pela visão segregativa e por uma segmentação das deficiências, fato

    que contribui ainda mais para que a formação escolar e a vida social das crianças e

    jovens com deficiência aconteçam em um mundo à parte.

    Por outro lado, os princípios de integração nasciam timidamente quando a educação

    especial passa a ser assumida pelo poder público na década de 1960. O termo educação especial

    aparece legalmente pela primeira vez na LDB 4.024, de 1961 (MANTOAN, 2011). Nesse

    7 A globalização é um dos processos de aprofundamento internacional da

    integração econômica, social, cultural e política, que teria sido impulsionado pela redução de custos dos meios de

    transporte e comunicação dos países no final do século XX e início do século XXI. É tido, como início da

    globalização moderna, o fim da Segunda Guerra mundial, e a vontade de impedir que uma monstruosidade como

    ela ocorresse novamente no futuro, sendo que as nações vitoriosas da guerra e as devastadas potências do

    eixo chegaram a conclusão que era de suma importância, para o futuro da humanidade, a criação de mecanismos

    diplomáticos e comerciais para aproximar, cada vez mais, as nações uma das outras. Disponível em:

    https://www.infoescola.com/geografia/globalizacao/. Acesso em: 14/01/2018;

    8 A Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que delineia os direitos humanos básicos, foi adotada

    pela Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948. Foi esboçada principalmente pelo canadense

    John Peters Humphrey, contando, também, com a ajuda de várias pessoas de todo o mundo. Considera que o

    reconhecimento da dignidade é inerente a todos os membros da família humana e seus direitos são iguais e

    inalienáveis, constituindo o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Disponível em:

    http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf. Acesso em 12/12/2017.

    https://pt.wikipedia.org/wiki/Economiahttps://pt.wikipedia.org/wiki/Socialhttps://pt.wikipedia.org/wiki/Culturalhttps://pt.wikipedia.org/wiki/Pol%C3%ADticahttps://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_XXhttps://pt.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9culo_XXIhttps://pt.wikipedia.org/wiki/Pot%C3%AAncias_do_eixohttps://pt.wikipedia.org/wiki/Pot%C3%AAncias_do_eixohttps://www.infoescola.com/geografia/globalizacao/http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Documents/UDHR_Translations/por.pdf

  • 27

    contexto, iniciam-se as políticas públicas na educação especial com a criação “das

    “Campanhas”, destinadas especificamente para atender a cada uma das deficiências”,

    (MANTOAN, 2011, p, 4) física, visual e auditiva. Estas campanhas tinham o objetivo de

    promover as medidas necessárias à educação, integração e assistência no mais amplo sentido.

    Um exemplo claro, disso é o Decreto Nº 44.236, de 1º de agosto de 1958 que Institui a

    Campanha Nacional de Educação e Reabilitação dos Deficitários Visuais. No artigo 3º dessa

    legislação, diz que caberá a campanha:

    c) cuidar da integração dos cegos e amblíopes reabilitados em atividades comerciais,

    industriais, agrárias, científicas, artísticas e educativas, tanto em instituições de

    natureza privada quanto oficiais;

    d) promover a integração dos deficitários visuais nos estabelecimentos de ensino

    dedicados aos videntes (BRASIL, 1958, p.1, grifo meu);

    Observa-se que havia uma grande preocupação com a integração. Embora tenha me

    referido apenas a Campanha Nacional de Educação e Reabilitação dos Deficitários Visuais,

    houveram outras campanhas, voltadas as outras deficiências. Nesse contexto, Mantoan (2011,

    p.6 grifo meu) diz que:

    A evolução dos serviços de educação especial caminhou de uma fase inicial,

    eminentemente assistencial, visando apenas ao bem-estar da pessoa com deficiência

    para uma segunda, em que foram priorizados os aspectos médico e psicológico Em

    seguida, chegou às instituições de educação escolar e, depois, à integração da

    educação especial no sistema geral de ensino. Hoje, finalmente, choca-se com a

    proposta de inclusão total e incondicional desses alunos nas salas de aula do ensino

    regular.

    Como segmento dessa política educacional integrativa, em 1972 foi apresentado o

    Grupo-Tarefa de educação especial, constituído pelo Ministério de Educação e Cultura – MEC,

    tendo o objetivo de estruturar a educação especial brasileira e pensar a “educação dos

    excepcionais” (MANTOAN,2011). Mesmo essas iniciativas não sendo as desejadas, nos

    parâmetros desejáveis atualmente frente a perspectiva inclusiva, a institucionalização e a

    integração eram iniciativas e ações direcionadas para que a educação especial brasileira

    avançasse de alguma forma.

    Assim, acerca do surgimento da educação especial no Brasil. Santos (2007, p.11) faz

    uma síntese desses períodos, ao observando que:

    Pode-se observar três momentos na evolução da Educação Especial brasileira que

    desde o seu início até o momento atual é signatária de tendências europeias e norte-

    americanas: o primeiro, caracterizado pelas instituições totais predominantes até fins

    dos anos 60, adotava a prática da segregação do aluno com deficiência para o processo

    educativo; o segundo, nos anos 70 e 80, com as iniciativas de integração, cujo

    princípio fundamental era a idéia da normalização, baseado no modelo médico da

    deficiência enfatizava o aluno e sua capacidade individual de adequar-se à realidade

    da escola; e o terceiro e atual estágio, é marcado pelo movimento de inclusão,

    perspectiva que assume um discurso inovador radical tendo como princípio a

    aceitação da diversidade.

  • 28

    Mantoan (2002, p.3) por sua vez, organiza a história da educação de pessoas com

    deficiência no Brasil, a educação especial em três grandes períodos:

    De 1854 a 1956 - marcado por iniciativas de caráter privado. Nascem as instituições;

    de 1957 a 1993 – definido por ações oficiais de âmbito nacional. Período em que o

    Brasil se torna signatário de acordos internacionais e a partir de 1993 que é

    caracterizado pelos movimentos em favor da inclusão escolar, destaca-se a

    participação dos movimentos sociais e emancipação das pessoas com deficiências.

    Em suma, os dois autores pontuam as mesmas características apresentadas na trajetória

    de aproximadamente 60 anos de educação especial no Brasil. Nesse contexto processual de

    caracterização do que é inclusão, superação do silenciamento e da segregação, Mantoan (2002,

    p.3) pontua que:

    Só muito recentemente, a partir da última década de 80 e início dos anos 90 as pessoas

    com deficiência, elas mesmas, têm se organizado, participando de Comissões, de

    Coordenações, Fóruns e movimentos, visando assegurar, de alguma forma os direitos

    que conquistaram de serem reconhecidos e respeitados em suas necessidades básicas

    de convívio com as demais pessoas. Esses movimentos estão se infiltrando em todos

    os ambientes relacionados ao trabalho, transporte, arquitetura, urbanismo, segurança

    previdência social, acessibilidade em geral. As pessoas buscam afirmação e querem

    ser ouvidos, como outras vozes das minorias, que precisam ser consideradas em uma

    sociedade democrática, como a que hoje vivemos neste país”.

    Vemos assim que, algumas mudanças foram sendo processadas, muitas em virtude das

    novas leis que entraram em vigor no final do século XX. Nessa época surgiram os primeiros

    marcos ou fundamentos legais para a educação especial. Listei alguns que também já embasam

    a formação continuada de professores na perspectiva inclusiva que atuam em salas regulares

    dos Anos Finais do Ensino Fundamental:

    • A Constituição Federal/1988;

    • O Decreto 3298/99 que regulamenta a Lei no 7.853, de 24 de outubro de 1989,

    dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de

    Deficiência;

    • O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990.;

    • Declaração de Salamanca, 1994.

    • A Lei 9394/96- a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB;

    • Portaria MEC nº 1679/99 que institui as Diretrizes Nacionais para a Educação

    Especial na Educação Básica;

    • O Plano Nacional de Educação- PNE, através da lei nº 10.172/01;

    • LEI 13.146/2015- O Estatuto da Pessoa com Deficiência.

    Analisando a importância disso, a CF/1988 no artigo 206 defende a igualdade de

  • 29

    condições para o acesso e permanência na escola como um direito público subjetivo. Só esse

    artigo da CF/1988 já seria o suficiente para a defesa da importância dessa intervenção. Como

    garantir igualdade de condições, sem professores preparados para atender as especificidades do

    aluno com deficiência visual?

    Posteriormente, o Decreto 3298/99 que dispõe sobre a Política Nacional para a

    Integração da Pessoa Portadora de Deficiência defende que haja um fomento à formação de

    recursos humanos adequado e eficiente no atendimento a pessoa com deficiência, além do

    mais, em seu artigo 15, inciso III, ao se referir a equiparação de oportunidades diz que os

    “órgãos públicos prestarão os serviços de escolarização em estabelecimentos de ensino regular

    com a provisão dos apoios necessários, ou em estabelecimentos de ensino especial”( BRASIL,

    a, 1999a, p.1,).

    Nesse mesmo parâmetro, o ECA em seu artigo art. 54, inciso III diz que é dever do

    Estado assegurar à criança e ao adolescente o [...] “- atendimento educacional especializado aos

    portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino” (BRASIL, 1990, p.9,

    a). Em seguida, a LDB dedica um capítulo exclusivo sobre a educação especial e a entende

    como uma “modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de

    ensino, para educandos portadores de necessidades especiais” (BRASIL, 1994a, p.19).

    Além do mais, ela destaca no §2º que “o atendimento educacional será feito em classes,

    escolas ou serviços especializados, sempre que, em função das condições específicas dos

    alunos, não for possível a sua integração nas classes comuns do ensino regular” (BRASIL,

    1994a, p.19, grifo meu). Assim entendo que somente quando não for possível, deve ser recorrer

    a outras instâncias, mas o empenho para alfabetizar, orientar e acompanhar o processo de

    aprendizagem do aluno cego deverá ser na sala regular, junto com todos os outros alunos,

    integrado ao sistema comum, incluso nos procedimentos didáticos do professor, na sua

    metodologia, no seu planejamento e na execução de suas aulas.

    Nessa conjuntura, as contribuições da Declaração de Salamanca 9 já se faziam presentes

    nos marcos legais e nas pesquisas educacionais. O referido documento contribuiu na defesa dos

    direitos das pessoas com NEE, na defesa de uma educação para a diversidade e também na

    9 Documento elaborado na Conferência Mundial sobre Educação Especial, em Salamanca, na Espanha, em 1994,

    com o objetivo de fornecer diretrizes básicas para a formulação e reforma de políticas e sistemas educacionais de

    acordo com o movimento de inclusão social. Declaração de Salamanca é considerada um dos principais

    documentos mundiais que visam a inclusão social, ao lado da Convenção de Direitos da Criança (1988) e da

    Declaração sobre Educação para Todos de 1990. Ela é o resultado de uma tendência mundial que consolidou a

    educação inclusiva, e cuja origem tem sido atribuída aos movimentos de direitos humanos e de

    desinstitucionalização manicomial que surgiram a partir das décadas de 60 e 70.Disponível em:

    http://www.educabrasil.com.br/declaracao-de-salamanca/. Acesso em 12/11/2017;

    http://www.educabrasil.com.br/declaracao-de-salamanca/

  • 30

    mudança de paradigma: integração versus inclusão. Visto que um de seus postulados foi que os

    congregados adotassem “o princípio de educação inclusiva em forma de lei ou de política”

    (BRASIL, 1994b, p.2). Neste documento foi proclamado que:

    •toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade de

    atingir e manter o nível adequado de aprendizagem,

    • toda criança possui características, interesses, habilidades e necessidades de

    aprendizagem que são únicas,

    • sistemas educacionais deveriam ser designados e programas educacionais deveriam

    ser implementados no sentido de se levar em conta a vasta diversidade de tais

    características e necessidades,

    • aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola regular,

    que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança, capaz de

    satisfazer a tais necessidades,

    • escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais

    eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades acolhedoras,

    construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para todos; além disso,

    tais escolas provêm uma educação efetiva à maioria das crianças e aprimoram a

    eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o sistema educacional

    (BRASIL, 1994b, p.1).

    Nessa perspectiva, foi demandado que os governos adotassem “o princípio de educação

    inclusiva [...], matriculando todas as crianças em escolas regulares, a menos que existam fortes

    razões para agir de outra forma” (BRASIL, 1994b, p.2). Além do mais, caberiam aos sistemas

    de ensino “endossar a perspectiva de escolarização inclusiva e apoiar o desenvolvimento da

    educação especial como parte integrante de todos os programas educacionais” (BRASIL,

    1994b, p.2). Na declaração foi incitado e apelado que cada governo garantisse “no contexto

    duma mudança sistémica, os programas de formação de professores, tanto a nível inicial como

    em-serviço (BRASIL, 1994b, p.2 grifo meu). Assim, a modalidade da educação especial passa

    a ser pensada não mais do ponto de vista integrativo, mas sim inclusivo.

    Embora, desde 1994, já se entedia o conceito de educação especial como um ensino

    específico, voltado a necessidade do aluno, pensado na sua integralidade, atendido incialmente

    na sala regular e tendo sua complementação na sala de recursos. O que percebo hoje é que o

    aluno com deficiência visual, bem como outras NEE, tem sido mais uma preocupação dos

    professores do AEE, da Sala de Recursos Multifuncionais. Isso na escola que houver esse

    professor, pois não são nem todas as escolas que dispõem dessa sala pelo Brasil. Há municípios

    no Território de Identidade de Irecê que receberam os equipamentos através do Programa

    Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais10, e até hoje as salas não funcionam.

    10

    O programa apoia os sistemas de ensino na implantação de salas de recursos multifuncionais, com materiais

    pedagógicos e de acessibilidade, para a realização do atendimento educacional especializado, complementar ou

    suplementar à escolarização. A intenção é atender com qualidade alunos com deficiência, transtornos globais do

    desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, matriculados nas classes comuns do ensino regular. O programa

    é destinado às escolas das redes estaduais e municipais de educação, em que os alunos com essas características

    estejam registrados no Censo Escolar MEC/INEP. Esse programa consistiu em oferecer equipamentos,

  • 31

    Retomando a discussão sobre a LDB 9.394/96 como um marco legal para a educação

    especial, a referida lei também discorre sobre dois perfis de professores para atuar nessa área:

    professores especializados para o AEE e “professores capacitados para a integração dos alunos

    com necessidades educativas especiais- NEE” nas salas comuns. Acerca dessa capacitação, ela

    tem “acontecido” na formação inicial, através de modificações nos currículos das instituições

    de ensino superior, de modo a incluir a discussão sobre o trabalho com a diversidade. Embora,

    apenas o curso de Pedagogia através de suas matrizes curriculares vem ampliado o saber sobre

    a Educação Especial de forma mais contundente (PIMENTEL,2012).

    O que se conclui mediante a isso é que em licenciaturas como matemática, geografia,

    história etc, a preparação para atuar na diversidade é muito superficial e não há uma política

    inclusiva eficaz para uma formação sólida em Educação Especial desses profissionais que irão

    atuar nos Anos Finais do Ensino Fundamental (PIMENTEL,2012). A esse respeito, Pimentel

    (2012, p, 148) questiona o porquê da inserção do componente curricular Educação

    Especial/Inclusiva dá se apenas no curso de Pedagogia: “Será que é porque esse curso possui

    uma formação mais ampliada ou porque se acredita que os estudantes com deficiência não

    ultrapassariam as series iniciais do Ensino Fundamental?”

    Compreendendo a fragilidade dessa formação inicial dos cursos de licenciatura para

    atuar nos Anos Finais do Ensino Fundamental é que proponho uma formação continuada em

    Educação Especial na Perspectiva da educação inclusiva na Escola Municipal de Ensino

    Fundamental( Anos Finais) Odete Nunes Dourado em Irecê/Ba com base no que diz a LDB

    em seu artigo 67: “os sistemas de ensino promoverão a valorização dos profissionais da

    educação” através de “[...] II – aperfeiçoamento profissional continuado[...]; V – período

    reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho e VI – condições

    adequadas de trabalho”.

    Sendo assim, a LDB é uma grande aliada na defesa de uma formação dentro da

    profissão, ao considerar que o aperfeiçoamento profissional continuado é uma forma de estar

    valorizando o docente e o discente. Após a LDB, através da Portaria MEC nº 1679/99 é

    instituída dois anos depois as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação

    Básica. Esse documento normativo inicialmente, foi pensado em dois grandes temas: A

    mobiliários e materiais didático-pedagógicos e de acessibilidade para a organização das salas de recursos

    multifuncionais, de acordo com as demandas apresentadas pelas secretarias de educação em cada plano de ações

    articuladas (PAR). De 2005 a 2009, foram oferecidas 15.551 salas de recursos multifuncionais, distribuídas em

    todos os estados e o Distrito Federal, atendidos 4.564 municípios brasileiros - 82% do total.

    Disponível em: http://portal.mec.gov.br/implantacao-de-salas-de-recursos-multifuncionais. Acesso em:

    12/10/2017.

    http://portal.mec.gov.br/implantacao-de-salas-de-recursos-multifuncionais

  • 32

    organização dos sistemas de ensino para o atendimento ao aluno com Necessidades Educativas

    Especiais- NEE e a formação do professor.

    O primeiro tema foi abordado nesse documento e o segundo foi encaminhado à Câmara

    de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação- para posteriormente elaborar as

    diretrizes para a formação de professores (BRASIL, 1999b). No entanto, essas diretrizes só são

    elaboradas aproximadamente dois anos depois, de forma generalizada, sem tratar

    especificamente da formação de professores para a educação especial, como se havia pensado

    no Parecer nº 17/2001 do Conselho Nacional de Educação da Câmara de Educação Básica-

    CNE/CEB. Nesse sentido, observa-se que através das Diretrizes Nacionais para a Educação

    Especial na Educação Básica houve uma preocupação em atingir os objetivos propostos na

    LDB, tanto na questão da organização da educação especial, quanto da formação de professores.

    Posteriormente, como marco legal tem-se ainda as contribuições do Plano Nacional de

    Educação- PNE através da lei nº 10.172/01, este documento foi um importante fundamento na

    implantação/implementação de políticas públicas integrativas/inclusivas de atendimento aos

    alunos com NEE. Nele foi estabelecido vinte e sete metas e objetivos para a educação especial,

    no qual um deles é justamente a “educação continuada dos professores que estão em exercício

    à formação em instituições de ensino superior” (BRASIL, 2001, p.11, grifo meu).

    Para finalizar a discussão desse tópico, acerca do histórico da Educação Especial no

    Brasil e dos marcos legais, aponto, além da Política Nacional de Educação Especial na

    Perspectiva da Educação Inclusiva- PNEE-EI, documento lançado pelo Ministério da Educação

    – MEC em 2008, uma das mais importantes conquistas voltadas a inclusão da pessoa com

    deficiência que é a LEI 13.146/2015( Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência,

    mais conhecida como Estatuto da Pessoa com deficiência) especialmente os artigos 27 ao 31,

    que versam sobre o direito a educação. A seguir, faço recortes de alguns trechos para melhor

    compreensão dessa lei, a começar pelo artigo 27 e suas disposições:

    A educação constitui direito da pessoa com deficiência, assegurados sistema

    educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda a vida, de

    forma a alcançar o máximo desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades

    físicas, sensoriais, intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e

    necessidades de aprendizagem (BRASIL,2015).

    No tocante a temática de formação de professores, a lei 13.146/2015, é bastante clara

    quando diz em seu artigo 28, inciso X que incumbe ao poder público assegurar, criar,

    desenvolver, implementar, incentivar, acompanhar e avaliar a:

    adoção de práticas pedagógicas inclusivas pelos programas de formação inicial e

    continuada de professores e oferta de formação continuada para o atendimento

    educacional especializado;

  • 33

    [...]XII - oferta de ensino da Libras, do Sistema Braille e de uso de recursos de

    tecnologia assistiva, de forma a ampliar habilidades funcionais dos estudantes,

    promovendo sua autonomia e participação(BRASIL,2015).;

    Portanto, nesse PI procuro valer-me desses documentos e principalmente dos princípios

    defendidos pela LBD quando destaca que, serão assegurados na educação especial:

    “professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento

    especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses

    educandos nas classes comuns” (BRASIL,1996, p.19, grifo meu). De tal modo, uma formação

    de professores na perspectiva da educação inclusiva é algo previsto em lei e que os municípios

    e seus respectivos sistema de ensino deverão se atentar para que ela seja garantida.

    Nesse interim, formar professores dos Anos Iniciais inclusivos pressupõe que a

    aprendizagem dos alunos com deficiência visual, não se esgotando nela, mas também nas outras

    NEE, é um direito a ser garantido preferencialmente na sala regular, pois incluir é dar condições

    do aluno aprender, independentemente de suas limitações.

    1.2.2 Percursos, legislações e políticas afirmativas: Um diálogo sobre educação especial

    e formação de professores

    A repercussão de responsabilidades e protagonismos, materializados sob a forma de