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Desenvolvimento socioeconômico local e reestruturação produtiva paranaense na década de 1990 Socioeconomic development and production restructuring in Paraná in the 1990s decada Développment socioéconomique et restructuration productive du Paraná pedant la décennie 1990 Desarrollo socioeconómico y reestructuración productiva del Paraná en la década de 1990 Christian Luiz da Silva * Wilian Michon Júnior ** Recebido em 9/1/2008; revisado e aprovado em 28/2/2008; aceito em 29/2/2008. Resumo: A abertura de mercado, aliada a atração de investimento por políticas industrias e guerras fiscais dos Estados, como o Paraná, promoveram uma reestruturação produtiva na década da 1990. O objetivo deste artigo foi avaliar as mudanças socioeconômicas e territoriais a partir das transformações produtivas do Paraná e das suas Mesorregiões na década de 1990. A pesquisa foi descritiva, aplicada e quantitativa, com análise dos dados de 1991 a 2000. Concluiu-se que os investimentos foram concentrados na indústria automobilística e na região metropolitana, não propiciando a redução da desigualdade regional. Palavras-chave: Desenvolvimento local. Paraná. Reestruturação produtiva. Abstract: In the 1990s decade, market opening plus investments attracted by industrial policies and fiscal war in the Brazilian states, such as Paraná, fostered production restructuring. The present article aims at assessing Paraná socioeconomic and territorial changes based on the production and territorial changes experienced by this state and its meso-regions in the 1990s decade. The article research was descriptive, applied and quantitative and analyzed data from 1991 to 2000. The research inferred that investments were mainly concentrated in the Curitiba metropolitan area car industries, what did not reduce the existing regional unbalance. Key words: Local development. Paraná. Production restructuring. Résumé: L’ouverture du marché, associée à l’attraction des investissements due aux politiques industrielles et aux guerres fiscales entre les unités de la Fédération brésilienne, telles que le Parana, ont promu une restructuration productive pendant la décennie 1990. L’objectif de cet article a été celui d’évaluer les changements socioéconomiques et territoriaux à partir des transformations productives du Parana et de ses mésorégions pendant la décennie 1990. La recherche a été descriptive, appliquée et quantitative, avec l’analyse de données de 1991 à 2000. On a conclu que les investissements ont été concentrés sur l’industrie automobile et sur la région métropolitaine, et que cela n’a pas favorisé une réduction de l’inégalité régionale. Mots-clé: Développement local. Paraná. Restructuration productive. Resumen: La apertura de mercado, en conjunto con la atracción de nuevas inversiones por políticas industriales y guerra fiscal entre los Estados, como Paraná, promoverán una reestructuración productiva en la década de 1990. El objetivo de este artículo fuera evaluar los cambios socioeconómicos y territoriales a partir de las transformaciones productivas del Paraná y de sus regiones en la década de 1990. La pesquisa fuera descriptiva, aplicada y cuantitativa, con análisis de los datos de 1991 hasta 2000. La conclusión es que las inversiones fueran concentradas en la industria automovilística y en la región metropolitana de Curitiba, no habiendo la reducción de la desigualdad regional. Palabras clave: Desarollo local. Paraná. Reestruturación productiva. INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 9, n. 1, p. 29-43, jan./jun. 2008. * Pesquisador - CNPq - Desenvolve o projeto de pesquisa intitulado: Modelo dinâmico de desenvolvimento local para o apoio ao Planejamento Público (processo 40085/2006-3). ** Co-autor do artigo. Economista e pesquisador - CNPq - auxiliar de pesquisa do projeto: Modelo dinâmico de desenvolvimento local para o apoio ao Planejamento Público (processo 40085/2006-3). 1 Introdução O Paraná passou pela transformação de sua estrutura produtiva seguindo a nova realidade internacional (LOURENÇO, 2003; LOURENÇO, 2000; IPARDES, 2002a; IPARDES, 2002; CASTOR e LEÃO, 2005; VASCONCELOS e CASTRO, 1999). Visan- do a ampliação quantitativa e qualitativa, as empresas iniciaram uma busca por maior efi- ciência e escala produtiva para poder com- petir no ambiente globalizado, conforme ex- posto pelo Consenso de Washington (BAUMANN, 1996; REGO e MARQUES, 2003; SILVA, 2005a) A reforma da estrutura produtiva foi influenciada expressivamente pela indústria automobilística instalada na Região Metropo- litana de Curitiba, por razoes de infra-estru- tura, incentivos fiscais e mão de obra (FIRKOWSKI, 2002; SAMPAIO, 2005). Con- tudo, a atração destas indústrias só foi possí-

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Desenvolvimento socioeconômico locale reestruturação produtiva paranaense na década de 1990Socioeconomic development and production restructuring

in Paraná in the 1990s decadaDéveloppment socioéconomique et restructuration productive

du Paraná pedant la décennie 1990Desarrollo socioeconómico y reestructuración productiva del Paraná en la década de 1990

Christian Luiz da Silva*

Wilian Michon Júnior**

Recebido em 9/1/2008; revisado e aprovado em 28/2/2008; aceito em 29/2/2008.

Resumo: A abertura de mercado, aliada a atração de investimento por políticas industrias e guerras fiscais dosEstados, como o Paraná, promoveram uma reestruturação produtiva na década da 1990. O objetivo deste artigo foiavaliar as mudanças socioeconômicas e territoriais a partir das transformações produtivas do Paraná e das suasMesorregiões na década de 1990. A pesquisa foi descritiva, aplicada e quantitativa, com análise dos dados de 1991a 2000. Concluiu-se que os investimentos foram concentrados na indústria automobilística e na região metropolitana,não propiciando a redução da desigualdade regional.Palavras-chave: Desenvolvimento local. Paraná. Reestruturação produtiva.Abstract: In the 1990s decade, market opening plus investments attracted by industrial policies and fiscal war in theBrazilian states, such as Paraná, fostered production restructuring. The present article aims at assessing Paranásocioeconomic and territorial changes based on the production and territorial changes experienced by this state and itsmeso-regions in the 1990s decade. The article research was descriptive, applied and quantitative and analyzed datafrom 1991 to 2000. The research inferred that investments were mainly concentrated in the Curitiba metropolitan areacar industries, what did not reduce the existing regional unbalance.Key words: Local development. Paraná. Production restructuring.Résumé: L’ouverture du marché, associée à l’attraction des investissements due aux politiques industrielles et auxguerres fiscales entre les unités de la Fédération brésilienne, telles que le Parana, ont promu une restructurationproductive pendant la décennie 1990. L’objectif de cet article a été celui d’évaluer les changements socioéconomiqueset territoriaux à partir des transformations productives du Parana et de ses mésorégions pendant la décennie 1990. Larecherche a été descriptive, appliquée et quantitative, avec l’analyse de données de 1991 à 2000. On a conclu que lesinvestissements ont été concentrés sur l’industrie automobile et sur la région métropolitaine, et que cela n’a pasfavorisé une réduction de l’inégalité régionale.Mots-clé: Développement local. Paraná. Restructuration productive.Resumen: La apertura de mercado, en conjunto con la atracción de nuevas inversiones por políticas industriales yguerra fiscal entre los Estados, como Paraná, promoverán una reestructuración productiva en la década de 1990. Elobjetivo de este artículo fuera evaluar los cambios socioeconómicos y territoriales a partir de las transformacionesproductivas del Paraná y de sus regiones en la década de 1990. La pesquisa fuera descriptiva, aplicada y cuantitativa,con análisis de los datos de 1991 hasta 2000. La conclusión es que las inversiones fueran concentradas en la industriaautomovilística y en la región metropolitana de Curitiba, no habiendo la reducción de la desigualdad regional.Palabras clave: Desarollo local. Paraná. Reestruturación productiva.

INTERAÇÕES, Campo Grande, v. 9, n. 1, p. 29-43, jan./jun. 2008.

* Pesquisador - CNPq - Desenvolve o projeto de pesquisa intitulado: Modelo dinâmico de desenvolvimentolocal para o apoio ao Planejamento Público (processo 40085/2006-3).** Co-autor do artigo. Economista e pesquisador - CNPq - auxiliar de pesquisa do projeto: Modelo dinâmico dedesenvolvimento local para o apoio ao Planejamento Público (processo 40085/2006-3).

1 Introdução

O Paraná passou pela transformaçãode sua estrutura produtiva seguindo a novarealidade internacional (LOURENÇO, 2003;LOURENÇO, 2000; IPARDES, 2002a;IPARDES, 2002; CASTOR e LEÃO, 2005;VASCONCELOS e CASTRO, 1999). Visan-do a ampliação quantitativa e qualitativa, asempresas iniciaram uma busca por maior efi-ciência e escala produtiva para poder com-

petir no ambiente globalizado, conforme ex-posto pelo Consenso de Washington(BAUMANN, 1996; REGO e MARQUES,2003; SILVA, 2005a)

A reforma da estrutura produtiva foiinfluenciada expressivamente pela indústriaautomobilística instalada na Região Metropo-litana de Curitiba, por razoes de infra-estru-tura, incentivos fiscais e mão de obra(FIRKOWSKI, 2002; SAMPAIO, 2005). Con-tudo, a atração destas indústrias só foi possí-

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vel a partir de pesados incentivos fiscais du-rante a guerra fiscal entre os estados que visa-vam ampliar suas estruturas produtivas comindústrias vindas de outras regiões do globo.

A expansão dos investimentos amplioua taxa de crescimento potencial da ofertaindustrial, a partir de incrementos na pro-dutividade do setor mais dinâmicos e con-corrências, além da redução das margens delucro da indústria visando se adequar aospreços internacionais competitivos impostospelos novos players entrantes no mercado(IPARDES, 2002a).

Esta reestruturação produtiva ocorridadurante os anos 1990 possibilitou o cresci-mento econômico moderado a partir do anodo segundo qüinqüênio desta década. Embo-ra as teorias clássicas de desenvolvimentopreconizassem que o crescimento econômicogera automaticamente o desenvolvimento dasociedade, através da geração da renda, no-vas teorias apresentam que o desenvolvimen-to possui um conceito mais amplo que o cres-cimento (BELLEN, 2004; CAMARGO, 2003;CLAYTON e RADCLIFFE, 1996; DRESNER,2002; FOLADORI, 2002; GRAFF et al., 1996;HAQUE, 2000; SACHS, 1986; SACHS,1993; SILVA, 2005b; SOUZA, 1999). Destemodo, é necessário questionar como as trans-formações produtivas impactaram no pro-cesso de desenvolvimento local da socieda-de paranaense. A importância do conceitolocal se desenvolve, principalmente, ao setratar a dinâmica territorial (VAZ, 1995),como pressuposto neste artigo.

Essa pesquisa busca compreender adinâmica das mesorregiões paranaenses apartir das mudanças no padrão industrialna década de 1990, que também serão frutode avaliação neste trabalho. O objetivo doartigo é avaliar as mudanças socioeconômi-cas e territoriais a partir das transformaçõesprodutivas do Paraná e das suas mesorre-giões na década de 1990. A principal limita-ção é tratar o processo de desenvolvimentolocal somente pela ótica socioeconômica, apartir da sua delimitação e dinâmica espa-cial ou territorial.

Esse artigo está organizado em seis se-ções, incluindo esta introdução. A segundaseção apresentará a fundamentação teóricabaseada em teorias de desenvolvimento eco-nômico, mostrando evolução de conceitos

até a discussão do desenvolvimento susten-tável e suas dimensões. A terceira seção apre-sentará a metodologia de pesquisa e a quar-ta seção contextualizará o período analisa-do com a evolução de alguns indicadores re-presentativos da macroeconomia paranaen-se na década de 1990. A quinta seção trata-rá da comparação das transformações entreas mesorregiões do Paraná separadas entreas dimensões do desenvolvimento sustentá-vel, visando discutir o problema em questãoneste artigo. A sexta seção trará as conclu-sões e proposta de novos trabalhos.

2 Desenvolvimento local: controvérsias apartir da estrutura produtiva

Soto Torres e Fernandez Lechón (2006)não discutem a influência do Estado no pro-cesso de desenvolvimento local, mas revisamos estudos sobre crescimento econômico e res-saltam que novos elementos têm sido avalia-dos, como a influência específica dos fatoresdo crescimento contínuo. Os autores citam,contudo, que “there are models constructedonly by using statistical methods andeconometric techniques and in other cases,the researches use particular insights in orderto capture aspects of a complex reality”(SOTO TORRES e FERNANDEZ LECHÓN,2006, p. 2). Como contraponto os autores ci-tam Sterman para explicar que alguns estu-dos desses modelos mostram que um núme-ro significativo de variáveis é interconectadopela influência causal que gera um processode feedback, o que explica o processo de acu-mulação inerente a qualquer crescimento.

Essa contribuição ressalta que o desen-volvimento local é um processo dependentedos recursos pertencentes, das decisões to-madas e dos acontecimentos passados. Asações presentes pertencem a história e impli-cam no futuro. Ao considerar o processo dedesenvolvimento local somente como resul-tado dos recursos disponíveis e na sua perfei-ta combinação, como ressaltado por SotoTorres e Fernandez Lechón nos modelos esta-tísticos e econométricos tradicionais, perde-se a componente histórica e de retroalimen-tação da ação presente sobre o futuro.

Os modelos de planejamento e desen-volvimento local surgem com o objetivo demostra que a história pode ser diferente da

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tendência, quando ações são executadaspara mudá-las. O processo de planejamen-to e implementação de modelos de desen-volvimento local é antagônico e controversopela estrutura da sociedade. Mercado eCórdova (2005) recontam a história contro-versa entre o desenvolvimento sustentável ea indústria e mostram diversos dilemas e di-ferenças entre o discurso e a prática do de-senvolvimento sustentável, como, por exem-plo, sobre a ecologia global:

... durante los noventa, ... se presenciaronprocesos político-ecónomicos suficiente-mente antagónicos como para frenar elproceso de conformación de la nueva cultu-ra ambiental industrial que comenzaba aavizorarse. De una parte, digamos positiva,podría destacarse la considerableampliación de la preocupación ambiental enla sociedad (y) … hacían posiblen o sólo ladisminución del impacto ambiental de laactividad industrial sino también proponernuevas formas de producción y hasta deconsumo… Por la otra, digamos negativo,estarían el decaimiento significativo delímpetu de dicha participación debido a quemuchas de las oportunidades fueron cerra-das a inicios del nuevo siglo, fundamenta-da por presiones del ‘mercado’ ydisminución de respaldo por parte del Esta-do (MERCADO e CÓRDOVA, 2005, p. 37).

Silva (2005b, p. 15) avança sobre estacontrovérsia e argumenta que “a diferençaentre o discurso e a prática ainda continuagerando conflito porque, em ambas óticas(capitalista e ambientalistas), ao refletir so-bre o longo prazo, a zona de negociação émenos árida do que no curto prazo. Porexemplo, negociar que a geração futura temde preservar para sobreviver é muito maissimples do que acordar que essa geraçãopreservará o meio ambiente e não utilizaráformas degradantes para os recursos”. Essadiferença entre o discurso e a prática do de-senvolvimento sustentável é minimizada noâmbito da discussão, segundo Vivien (2005),pela sua retórica dominante. O autor men-ciona que “Il est courant de présenter lêdéveloppment soutenable comme la solutionaux problèmes rencontrés par lês sociétéscontemporaines. (...). Il cachê (...) unevolonté grandissante de nier les conflicts, depasser outre les divergences et d’aligner lesarguments contradictoires” (VIVIEN, 2005,

p. 4). Os autores retomam tal controvérsiapara relativizar os dogmas criados em tornode um conceito, que ressalta mais a existên-cia de um problema do que uma solução.

A despeito desse dilema em discussão,o processo de desenvolvimento das regiõesdeve considerar ambas óticas (econômica eambiental), valendo-se da presente retóricado desenvolvimento sustentável, cuja com-plexidade é incontestável e inerente as suasimplicações geopolíticas (AJARA, 2003, p.9). Neste sentido, deve-se limitar o processode desenvolvimento ao local que está sendoanalisado. Para Froehlich (1998, p. 95)

o espaço passa hoje a desempenhar um pa-pel crucial para se pensar o desenvolvi-mento, pois a própria sociedade só é con-creta com o espaço, sobre o espaço, no espa-ço. Espaço agora multifacetado, porque seconsidera que, só pensado enquanto multi-dimensional, pode ser autêntico o desenvol-vimento. (...) É neste âmbito argumentativoque se pode considerar válido atribuir umsentido ‘localista’ ao desenvolvimento, po-dendo-se falar em algo como ‘desenvolvi-mento local’. (grifo nosso)

Blakely (1994) explica que o desenvol-vimento econômico desse local tem ênfaseno “desenvolvimento endógeno”, utilizan-do-se do potencial humano local, institucio-nal e recursos físicos. O autor ocupa-se ape-nas da dimensão econômica do desenvolvi-mento e diz que o desenvolvimento econômi-co local é um processo-orientado. “That is,it is a process involving the formation of newinstitutions, the development alternativeindustries, the improvement of the capacityof existing employers to produce betterproducts, the identification of new markets,the transfer of knowledge, and the nurturingof new firms and enterprises” (BLAKELY,1994, p. 50). Esse autor torna o processo dedesenvolvimento algo inerente ao próprio lo-cal e específica o papel da intervenção públi-ca para o provimento das necessidades parao estabelecimento da indústria privada, que,a partir da orientação e dinâmica dos agen-tes e instituições locais, seriam os responsá-veis pelo processo de desenvolvimento.

Souza (1997, p. 19) também entendeesta noção de desenvolvimento como “ummovimento (sem fim - ou seja, sem ‘estágiofinal’ ou mesmo direção concreta predeter-minados ou previsíveis e que não poderá ja-

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mais ser declarado como ‘acabado’ - e sujei-to a retrocessos) em cuja esteira uma socie-dade torna-se mais justa e aceitável para seusmembros” (grifo nosso).

A posição de ambos autores, Blakely eSouza, enfatizam o papel dos agentes locaisem detrimento a participação do Estado,colocando o tema no estágio de discussãoproposto por Mattos, citado em Froehlich(1998), sobre a descentralização do poder.Neste artigo considera-se que o processo dedesenvolvimento local é endógeno e orien-tado, como citado por Blakely, em movimen-to, como exemplificado por Souza, mas in-fluenciado pela intervenção do Estado. Aparticipação deste agente pode ser ativa,como agente e investidor, ou institucional,como regulador, mas é interveniente no pro-cesso de desenvolvimento local, como o foina década de 1990 com a política industrialadotada (SILVA e FARAH Jr, 2004).

Contudo, esse desenvolvimentoendógeno, apesar de estar relacionado aoprocesso de interveniência do Estado, podeser alterado e em virtude dos objetivos nacio-nais estabelecidos no planejamento públicopara a região. A década de 1990 teve refle-xos da política industrial do Estado que foideterminante para o processo de reestrutu-ração produtiva do Paraná. Esta reestrutu-ração, contudo, ocorre a partir de uma lógi-ca histórica e seu impacto não se desprendedo passado para formar um novo futuro,como salienta Lencioni.

Isso significa que a compreensão da reestru-turação produtiva e da extensão territorialdo processo de metropolização não pode tercomo referência uma totalidade fechada; atéporque há uma lógica histórica em sua cons-tituição que precisa ser apreendida. A com-preensão dessa lógica histórica é fundamen-tal para se entender o processo de reestrutu-ração produtiva e, não, a apreensão de to-dos os elementos dessa totalidade. (...) Emsuma, e parodiando, o termo reestruturaçãoprodutiva tem que se colocar em seus devi-dos termos; ou seja, entendido como umaestruturação nova que se impõe à antiga e,ao mesmo tempo contém germes de um futu-ro. Pensado, portanto como uma totalidadedialética e não sistêmica, em processo e nãoacabada. (LENCIONI, 2003, p. 1).

A intensa modernização da baseprodutiva do Estado e a sua concentração

em alguns pólos regionais definiu histori-camente os contornos dessas disparidades,segundo Ipardes (2004). Apesar do novo ci-clo de investimento, a questão é como ocor-reu este processo de reestruturação produti-va e, principalmente, se houveram mudan-ças socioeconômicos para os municípios pa-ranaenses a partir desta base produtiva. Apróxima seção apresenta a metodologia paraavaliação destas mudanças, para na seçãoposterior contextualizar o ambiente compe-titivo no Estado no período analisado e emseguida avaliar os impactos socioeconômi-cos por mesorregião.

3 Metodologia de pesquisa

A pesquisa foi principalmente descri-tiva, aplicada e quantitativa. A hipótese des-te artigo é que embora os dados agregadosdo Paraná tenham mostrado melhorias em2000 em relação a 1991 a mudança ficouconcentrada na região metropolitana deCuritiba e nas grandes cidades. A validaçãoda hipótese ocorrerá pela avaliação compa-rativa de indicadores socioeconômicas sele-cionados por mesorregião.

No tocante aos seus objetivos, foi des-critiva quando relatou as as principais trans-formações produtivas na década de 1990 eas mudanças ocorridas em indicadores so-cioeconômico selecionados para esta décadapor mesorregião (MARKONI e LAKATOS,1996)1.

A técnica quantitativa foi utilizadapara estruturar os dados coletados para operíodo analisado com intuito de compre-ender as transformações ocorridas pormesorregião (GIL, 1999). Os dados utiliza-dos são agregados socioeconômicos e indi-cadores de desenvolvimento humano paraas delimitações territoriais trabalhadas,como: Índice de Gini, Theil, IDH-M, taxasde mortalidade e natalidade, níveis de edu-cação, taxa de analfabetismo, densidadedemográfica, grau de urbanização, taxa decrescimento populacional, cobertura de va-cinação, despesas municipais, empregos porindústrias, número de estabelecimentos, con-sumo de energia, produção da silvicultura,abastecimento de água, atendimento de es-goto, dentre outros.

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A coleta de dados ocorreu por levan-tamento nos sítios da Internet do IBGE,IPARDES, IPEA, PNUD e Ministério dasCidades. O período dos dados coletados selimita a década de 1990 nos seus extremos(1991 e 2000), vinculando ao momento an-terior dos novos investimentos (1991) e apósa sua consolidação (2000). Utilizou-se a téc-nica univariada (gráficos e tabelas com fre-qüência simples). Testou-se também a técni-ca bivariada (correlações simples), mas nãoresultou em informações incrementais quejustificassem a sua apresentação e análise.

4 Evolução socioeconômica e espacial doParaná na década de 1990

Ao longo dos anos 1990, a economia ea indústria paranaense, impulsionadas pelaretomada e transformações da economiabrasileira, demonstrou uma ampliação quali-

tativa e quantitativa nas suas bases de ope-ração. Esta expansão da base industrial, ini-ciada nos anos 1970, foi liderada pela indús-tria automobilística, e associou-se a fortesincrementos de produtividade, decorrentesde inversões para reposição dos bens de ca-pitais mais intensamente depreciados, umavez que a produtividade e preços internacio-nais passaram a determinar a viabilidadeeconômica de um empreendimento no novoambiente concorrencial (LOURENÇO, 2003;IPARDES, 2002a; FIRKOWSKI, 2002).

Os ganhos de eficiência possibilitarama racionalização dos recursos humanos e adesverticalização das unidades produtivas,para que a empresa esteja focada no corebusiness, com ganhos de competitividade,advindo da redução expressiva da alíquotade importação e da estabilidade de preços,que resultaram no aumento da competiçãoe na redução das margens de lucro, confor-me ilustra o gráfico 1 (IPARDES, 2002a).

Silva e Farah Jr. (2004, p. 19) discutema política industrial do Paraná na década de1990 para atração de novos investimentos apartir do retardamento do recolhimento doICMS (imposto sobre circulação de merca-dorias e serviços) para quem realizasse in-vestimentos fixos no Estado. Tal política foicaracteriza pelos autores como

(...) ações de política industrial horizontal evertical. A principal ação horizontal é a bus-ca pela desconcentração industrial e regio-nal, além da modernização tecnológica. Já apolítica vertical está relacionada aos setoresprivilegiados (mecânico, material elétrico ede comunicações, material de transporte equímica). O programa, entretanto, não dei-xa claro as regras para beneficiamento, nem

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a definição de indicadores de acompanha-mento, nem a transparência da concessãodos benefícios.

Segundo a classificação utilizada porCastro (2002) pode-se verificar o crescimentona participação do grupo tecnológico, o quecaracterizou um dos benefícios e resultadostrazidos pela reconfiguração produtiva para-naense da década de 1990. Essa reconfigu-ração foi, impulsionada principalmente pelocrescimento da indústria automotiva, que

cresceu 9,4 pontos percentuais na participa-ção do valor adicionado paranaense. O gru-po fornecedor apresentou crescimento maismoderado de 3,9 pontos percentuais na par-ticipação do valor adicionado, com destaquepara a indústria petroquímica que saltou de10,3% para 24,3% e a redução da agroin-dústria de 17,7% para 4,5% entre 1985 e2000. O grupo tradicional perdeu participa-ção no valor adicionado estadual, caindo12,1 pontos percentuais puxados pela indús-tria de alimentos (tabela 1).

A maior participação do grupo tecno-lógico foi direcionado pela estratégia de par-ticipação da cadeia global, que trouxe inves-timentos para exportação. A pauta de expor-tações paranaenses evidencia estas transfor-mações competitivas do sistema produtivo

do Paraná, em especial o grupo tecnológicodirecionado pela indústria automobilística,que incrementou a sua participação de 4,1%para 18,7% em 2000, em detrimento, princi-palmente, do grupo fornecedor, representa-da pela indústria petroquímica (tabela 2).

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Essas transformações resultaram emum processo de reestruturação produtiva,nos moldes expostos por Lencioni (2003), ouseja, uma estruturação nova que se impõe àantiga, pensado com uma totalidade dialé-tica da dinâmica territorial e em processoinacabado. Esse crescimento ocorreu na re-gião metropolitana de Curitiba, principal-mente, onde já havia uma basemetalmecânica estabelecida desde 1970(FARAH, 2002). A próxima seção tratará dasmudanças locais, próprias da dinâmica ter-ritorial paranaense, a partir das alteraçõesprodutivas paranaenses na década de 1990.

4 Avaliação comparativa dasmesorregiões paranaenses nos anos 1990

As diferenças das mesorregiões geo-gráficas do Paraná são oriundas da estrutu-

ra heterogênea em relação a sua própria for-mação, ou seja, a composição municipal,populacional, grau de urbanização, cresci-mento populacional, participação na rendada economia do Estado e empregabilidade(tabela 3). A região centro-ocidental, porexemplo, é composta de apenas 25 municí-pios, com taxa de crescimento populacionalnegativa, moderado grau de urbanização(73%) e participação de apenas 2,2% do va-lor adicional. Em contrapartida a região nor-te central tem 79 municípios, a populaçãocresce a uma taxa de 1,2%, com alta taxa deurbanização (88%) e representa 14% do va-lor adicionado do Estado. Assim, como men-ciona Lencioni (2003) a divergências dasmesorregiões são frutos de um processo his-tórico e já estavam presentes no início dadécada de 1990, antes do novo ciclo de in-vestimentos produtivos no Estado.

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A distribuição das mesorregiões noParaná auxilia a compreensão da dinâmicapopulacional e suas principais atividadeseconômicas. O Paraná possui 199,88 milquilômetros quadrados, sendo que 11,6%desta área situam-se na região metropolita-na de Curitiba, responsável por quase um

terço da população do estado. O processode urbanização comentado anteriormenteestá presente em todas as mesorregiões doestado, principalmente na região sul do es-tado, onde a população apresenta menorgrau de urbanização do estado (tabela 4).

O crescimento da população entre1991 e 2000 foi muito acentuado namesorregião metropolitana de Curitiba, e emmenor escala nas mesorregiões onde hágrandes cidades, como Londrina e Maringáno Norte Central do Paraná. Isto se deve emparte pelo processo migratório entre

mesorregiões e interestadual, em que mui-tas pessoas que moravam no interiorparanaense migraram para as cidades, prin-cipalmente Curitiba e poucos para Londri-na e Maringá. A tabela 5 apresenta o fluxomigratório intermesorregional e interesta-dual no Paraná entre 1995 e 2000.

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Com relação à infra-estrutura urbana,houve melhorias significativas em todas asmesorregiões do estado, principalmente nasmesorregiões que apresentavam as condi-ções mais precárias em 1991, como na regiãosul do estado. Com exceção ao sul paranaen-se, todas as mesorregiões apresentam 90%ou mais dos domicílios com água encanada.A mesma dinâmica ocorre na energia elétri-ca, embora somente a mesorregião central-sul do Paraná, que ficou abaixo dos 90% dosdomicílios atendidos (tabela 6).

O consumo de energia cresceu em mé-dia 67% nas mesorregiões paranaenses, e no-vamente as regiões sul do estado apresenta-ram maior crescimento em função da baseser muito baixas nestas mesorregiões. En-quanto o sul cresceu a taxas 89,8%, as demaismesorregiões cresceram a 65%. O consumode energia do setor secundário (indústria)cresceu a valores superiores ao total consu-mido, com média de 70%, com crescimentomais expressivo na região sul do estado, cres-cendo o dobro das demais regiões do estado.

O tamanho da economia dasmesorregiões, medido através do ProdutoInterno Bruto, mostra que 40,7% do PIB doestado é gerado na região metropolitana deCuritiba, 16,9% no Norte Central (principal-mente Londrina e Maringá) e 14,5% no Oeste(Foz do Iguaçu e Cascavel são os expoen-tes). A produtividade, medida através darazão PIB por PEA, se mostrou maior nasregiões onde o PIB industrial é elevado. Nasregiões onde o PIB agropecuário é maior, a

produtividade se mostrou inferior em rela-ção ao demais. A região metropolitana pos-sui a maior produtividade pelo fator traba-lho do estado, seguido pela centro oriental.

O desemprego cresceu entre 1991 e2000 em todas as mesorregiões do estado,ultrapassando dois dígitos em todas as mesor-regiões, com exceção ao Sudeste e Sudoesteparanaense. As maiores taxas estão namesorregião metropolitana de Curitiba, Cen-tro Oriental e Centro Ocidental (tabela 7).

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As regiões com maior participação doPIB industrial (metropolitana de Curitiba,Centro Oriental, Norte Central e Oeste Pa-ranaense) possuem as maiores rendas. Asmesorregião Sudoeste e Sudeste do estadoapresentaram os maiores crescimentos narenda, 55,6% e 48,1% de crescimento respec-tivamente.

A composição do PIB no estado é45,1% de Serviços, 41,3% de Indústria e

13,7% de Agropecuária. O PIB de serviços ésuperior a um terço em todas as mesorre-giões, porém é no PIB Industrial e Agrope-cuária que há as maiores diferenças. A re-gião Sul, com exceção do Centro-sul apre-senta maior dinâmica agropecuária, junta-mente com a Centro Ocidental. A mesorre-gião metropolitana de Curitiba, a CentroOriental e o Oeste Paranaense apresentammaior grau industrial do estado (gráfico 2).

O número de estabelecimentos indus-triais da mesorregião noroeste cresceu 95,4%no período 1990 a 2000, sendo a mesorregiãoque mais aumentou o número de estabeleci-mentos em termos relativos. Em termos abso-lutos, o Norte Central instalou 1.738 estabele-cimentos industriais, seguido pela metropoli-tana de Curitiba 1.318 novos estabelecimentos.

O Noroeste, Norte Central e Oeste Pa-ranaense aumentaram suas participações noemprego do estado ao longo da década de1990, com a mesorregião metropolitana per-dendo 710 pontos básicos na participaçãodo emprego do estado. Contudo, a partici-pação da mesorregião metropolitana no va-lor adicionado cresceu 451 pontos básicos,

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seguido pelo centro oriental com 443 pontosbásicos, enquanto as regiões que aumenta-ram a participação no emprego, apresenta-

ram perda de 161 pontos básicos em médiana participação do valor adicionado do es-tado (tabela 8).

A mesorregião metropolitana de Cu-ritiba possui a maior média de anos de estu-dos do Paraná, distando 1,2 anos de estu-dos em relação à segunda mesorregião nes-te ranking, Norte Central que aumentou amédia de anos de estudo em 1,3 junto comOeste Paranaense. As mesorregiões commaior média de anos de estudo são as mes-mas que apresentam a maior dinâmica in-dustrial e grau de urbanização.

Os professores de ensino fundamentalcom ensino superior representavam, emmédia, 25,1% dos professores no Paraná em1991 e passou para 31,8% em 2000. Asmesorregiões Centro-Sul (que apresentou

decrescimento desta proporção), Oeste eSudeste paranaense apresentam os menoresíndices de professores com ensino superior,cuja média foi 25,7%. A região norte (NortePioneiro e Norte Central) possui os maioresíndices do estado, onde é média é de 38,8%dos professores do ensino fundamental.

As mesorregiões Norte Central e No-roeste paranaense possuem os maiores índi-ces de médicos por mil habitantes, com 25,4e 21,6 médicos a cada mil habitantes. O Su-deste, Centro Oriental e Centro Sul, queapresentou uma redução no índice de médi-cos por mil habitantes, são as mesorregiõescom menor índice do Estado (tabela 9).

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A esperança de vida paranaense cres-ceu quatro anos entre 1991 a 2000, passandode 65,9 anos para 69,9 anos. As mesorre-giões apresentaram esperança de vida pró-xima de 70 anos para as mesorregiões quepossuem um índice de médicos por mil ha-bitantes superiores a 10, embora o CentroOcidental e o Norte Pioneiro não possuírema mesma característica.

A desigualdade no Paraná permane-ceu nos mesmos patamares de 1991, embo-ra algumas mesorregiões tenham crescido,como a metropolitana de Curitiba e algumastenham decrescido, como Sudoeste. Porém,todas as mesorregiões apresentaram redu-ção das pessoas pobres2, com algumas

mesorregiões reduzindo significativamenteeste índice, como Noroeste, Norte Pioneiro,Sudeste e Sudoeste Paranaense (tabela 10).

Com relação à violência, mensuradaatravés da taxa de homicídio a cada cem milpessoas, apresentou comportamentos distin-tos em sua maioria, embora que em três gran-des mesorregiões em termos de tamanho daeconomia, apresentaram crescimento dastaxas de homicídios, além de serem as re-giões com maior índice de homicídio. Sãoelas: Metropolitana de Curitiba (24,3), Oes-te (30,1) e Norte Central (11,4). A mesor-região Centro Sul possui o segundo maioríndice de violência do Paraná, apesar da re-dução entre 1991 e 2000.

Os indicadores selecionados na tabela11 mostram a melhora em todas elas, quepoderiam ser alocadas em algumas outrasdimensões. A região sul do estado apresen-tou as maiores melhorias nos indicadores dequalidade de vida, como Água Encanada eBanheiro, Energia e Geladeira, Coleta de lixoe redução dos domicílios subnormais. Osindicadores de riqueza, Energia e Televisão,três bens duráveis ou mais e telefone,apresentaram as maiores melhorias namesorregião Oeste, seguida pelo Norte Cen-tral e Metropolitana de Curitiba. Somente

Energia e Televisão que a região sul do es-tado apresentou as maiores médias de cres-cimento.

As mesorregiões com maior dinâmicaindustrial possuem mais domicílios com in-dicadores positivos, excetuando domicíliossubnormais nas mesorregião metropolitanade Curitiba, Centro Oriental e Oeste Para-naense. Apenas o Norte Central, que possuielevada dinâmica industrial reduziu os do-micílios subnormais para aproximadamen-te zero, e a mesorregião oeste com reduçãopara 0,4% de domicílios subnormais.

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Desta forma, ao longo da década de1990 as transformações produtivas no Pa-raná impactaram em diversas áreas da socie-dade. A dinâmica industrial contribuiu paramelhorar alguns indicadores socioeconômi-cos, porém também houve alguns impactosnegativos, como desemprego e concentraçãopopulacional em grandes centros.

Conclusões

O propósito do artigo era discutir asdiferenças constituídas no processo de rees-truturação produtiva do Paraná na décadade 1990 para as diversas mesorregiões. Osresultados trouxeram contribuição para aacademia, para o Estado e para as organi-zações que refletem e interferem no proces-so de desenvolvimento paranaense, comoFederações da Indústria Paranaenses (FIEP-PR). Para academia, por explorar o contro-verso debate sobre desenvolvimento local ea importância de intervenção do Estado parabusca de melhoria nas condições socioeconô-micas para diferentes regiões, com histórias

e necessidades específicas. Para o Estado eorganizações envolvidas com o processo dedesenvolvimento paranaense por refletir osreais impactos dos investimentos nas dife-rentes regiões do Paraná, em que se mostroua necessidade de avaliar e atrair investimen-tos para incentivar o crescimento associadoa redução da desigualdade regional, o quenão aconteceu.

O objetivo era avaliar as mudanças so-cioeconômicas e territoriais a partir dastransformações produtivas do Paraná e dassuas mesorregiões na década de 1990 e mos-trou-se que o aporte de investimentos foi di-recionado para indústria automobilística.Esse novo capital transformou tanto a pau-ta de produção quanto a de exportação in-dustrial e se localizou na região metropolitanade Curitiba pela infra-estrutura favorável epela existência de uma base metal-mecânica.Esta base não foi aproveitada o suficiente(FARAH, 2002), para otimizar os ganhos dosprodutores locais, mas que incentivou a atra-ção de investimento para região.

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As reflexões sobre os indicadores socio-econômicos, contudo, mostraram que essesganhos foram concentrados na região metro-politana, mas foi uma década com forte me-lhora em vários indicadores, apesar de nãoter uma mudança significativa no índice deGini, que mede a desigualdade de renda. Aelevação da desigualdade, devido ao desem-prego e a maior concentração de renda pelosmais ricos, mantiveram o crescimento da vio-lência analisada a partir da taxa de homicí-dio. Contudo, o maior grau de urbanização ea demanda por mão de obra qualificada me-lhoraram a educação da população, além dacriação de novas universidades no estado eda alteração do sistema educacional do ensi-no fundamental, reduzindo a evasão escolare aumentando a quantidade média de anosde estudos da população adulta, ou seja, hou-ve uma melhora quantitativa na educação.

Apesar da tendência do estado mos-trar melhoria nos indicadores, os resultadosentre as mesorregiões diferem. É possívelnotar que houve concentração de renda nasgrandes cidades onde a participação indus-trial é maior, como a região metropolitana,Norte Central e Centro Oriental. Com isso,se valida a hipótese que o Paraná tenhammostrado melhorias econômicas em 2000 emrelação a 1991, mas a mudança ficou con-centrada na região metropolitana de Curiti-ba e nas grandes cidades. Isso decorreu deuma política de incentivo ao processo demodernização produtiva e novos investi-mentos, sem a preocupação de desconcen-tração regional, já historicamente existenteentre as mesorregiões do Estado.

A partir dos resultados alcançados, tor-na-se importante destacar duas limitaçõesdesse trabalho. A primeira foi tratar o desen-volvimento local sob a ótica das mesorregiões,desconsiderando que mesmo cada municípiotem a sua própria dinâmica e o impacto doprocesso de reestruturação produtiva pode tersido, obviamente, diferente nestes em cadamunicípio de uma mesmo mesorregião. Con-tudo, esta limitação se torna necessária poravaliar uma intervenção em nível estadual eos resultados apresentam um delineamentopara estudos mais específicos. A segunda li-mitação foi tratar o processo de desenvolvi-mento a partir da esfera territorial (espacial),econômica e social, sem abordar questões

como mudança institucional, cultural e am-biental. Importantes temas mas que ficaramcom proposta para novos estudos.

Assim sendo, como proposta de conti-nuidade deste trabalho, cabe ainda avaliar edesenvolver políticas destinadas a reduçãodas disparidades entre as cidades do Paranácom maior disseminação das ações públicaspara o estímulo do processo de desenvolvi-mento local. Outro estudo interessante seriada efetividade destas políticas públicas comintuito de estabelecer de forma objetiva quala intervenção pretendida e que se resultadosse alcançou. Outro projeto importante seriade integração dos planos estratégicos munici-pais e do Estado com os estabelecidos legal-mente (Plano Plurianual, Lei de Diretrizes Or-çamentárias e Lei de Orçamento Anual) comintuito de avaliar a efetividade dos resultadosalcançados a partir do investimento público.Estes estudos teriam um enfoque local, embusca do amadurecimento do processo dedesenvolvimento local dos municípios a par-tir de uma intervenção pública efetiva pararedução das desigualdades e criação de opor-tunidades para descentralização econômicado Estado, com impactos sociais positivos. Porisso, sugerem-se também avaliações na esfe-ra municipal, com estudos de caso, para au-mentar a profundidade da análise e observaras diferentes dinâmicas em cada local.

Notas:1 As mesorregiões são as estabelecidas pelo IBGE e

tratadas por Ipardes (2004).2 Percentual de pessoas com renda domiciliar per capita

inferior a R$75,50, equivalentes a 1/2 do salário mí-nimo vigente em agosto de 2000.

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