democratização da comunicação - daniel cassol.pdf

95
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL DANIEL BARBOSA CASSOL A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL Anotações Teóricas e História do Movimento ============================================================== Porto Alegre, RS, Brasil 2003

Upload: matheus-sampaio

Post on 07-Feb-2016

21 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

DANIEL BARBOSA CASSOL

A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL

Anotações Teóricas e História do Movimento

==============================================================

Porto Alegre, RS, Brasil

2003

Page 2: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

2

Page 3: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

3

DANIEL BARBOSA CASSOL

A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL

ANOTAÇÕES TEÓRICAS E HISTÓRIA DO MOVIMENTO

Monografia de Graduação em Comunicação Social/Jornalismo Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Departamento de Comunicação

Orientador: Wladymir Ungaretti

Porto Alegre

2003

Page 4: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

4

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE BIBLIOTECONOMIA E COMUNICAÇÃO

DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO

A Banca Examinadora, abaixo assinada, aprova a Monografia de Graduação

A DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO NO BRASIL Anotações Teóricas e História do Movimento

elaborada por Daniel Barbosa Cassol

Como requisito parcial para a obtenção do grau de

Bacharel em Comunicação Social – Habilitação em Jornalismo

BANCA EXAMINADORA:

__________________________________________________

Wladymir Ungaretti (orientador)

__________________________________________________

Geraldo Canali

__________________________________________________

Venício Artur de Lima

Porto Alegre, agosto de 2003

Page 5: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

5

AGRADECIMENTOS

A Ernesto Che Guevara, Sepé Tiarayu, Luiz Sérgio Metz, Garrincha, Atahualpa Yupanqui e Apparício Torelly, pela inspiração.

A Ana Basso, Gustavo Gindre, James Goergen, João Brant, Jonas Valente, Pedrinho

Guareschi, Sandra de Deus, Renata Charão e Rogério Tomaz Jr., por terem conversado, lido meu trabalho, opinado, cedido entrevistas, respondido às minhas mensagens.

Ao meu orientador, Wladymir Ungaretti; aos professores Venício Artur de Lima e Geraldo Canali; à colega Micheline Michaelsen e à relações públicas e minha mãe, Glória Barbosa Cassol, pela colaboração fundamental para a realização deste trabalho.

À Tia Vilma, por me oferecer refeições e cerveja por preço honesto.

Aos meus colegas do movimento estudantil e da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos), por terem feito com que minha vida na Fabico não fosse uma mera passagem rumo ao deus-mercado. O resultado final deste trabalho pode ter ficado aquém das expectativas, mas o tema segue de fundamental importância. Só cheguei até ele por causa da Enecos e do combatido e combativo movimento estudantil de comunicação. Este trabalho é de todos nós. E à Nanda, pela companhia nesta reta final.

Page 6: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

6

“atirados em passeatas ou em casos solitários

como batuques diferentes numa mesma pulsação

que não vão mudar o mundo mas fazem a diferença fazem nossa diferença

ao fascismo que cresce com a crise fazem nossa diferença na maneira de encarar

cidadania, ruas e microfones”

Marcelo Yuka

Page 7: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

7

À memória de Amélio Antônio Cassol

Page 8: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

8

RESUMO

A democratização dos meios de comunicação é reivindicação de diversos setores da sociedade civil brasileira. No entanto, o entendimento do que é uma comunicação democrática e de como estabelecer a democratização da comunicação ainda é vago e diverso. Este trabalho procura entender qual é a base histórica e teórica da luta pela democratização da comunicação. No plano internacional, a principal referência está nos debates promovidos pela UNESCO, que vieram alertar o mundo para a necessidade de uma Nova Ordem Mundial da Informação e da Comunicação. A reivindicação da NOMIC se baseia na idéia de que a comunicação constitui-se num dos direitos humanos fundamentais. Como proposta, apontava uma ampla gama de ações que até hoje servem de referência àqueles que se dedicam ao tema. No Brasil, o debate da NOMIC se coadunou, no início da década da 1980, com o crescente interesse que o tema da comunicação vinha adquirindo no país e com o fortalecimento das entidades da sociedade civil, que passaram a encarar a democratização da comunicação como fundamental para a própria redemocratização do Brasil. Este trabalho constitui-se numa pesquisa exploratória, com base em bibliografia, entrevistas com especialistas e documentos das entidades ligadas à trajetória da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC) e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC). No primeiro capítulo, procuramos discutir introdutoriamente “o que é uma comunicação democrática” e “como democratizar a comunicação”. No segundo capítulo, traçamos o histórico do movimento pela democratização da comunicação no Brasil, resgatando também as origens do debate internacional promovido pela UNESCO. Esperamos que, com base neste estudo preliminar que ora empreendemos, sejam feitas discussões mais aprofundadas daqui para frente, uma vez que nas bases de discussão da democratização da comunicação está o debate sobre que sociedade queremos.

Page 9: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

9

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 11

ABORDAGEM METODOLÓGICA .................................................................................. 21

1 ANOTAÇÕES TEÓRICAS ........................................................................................ 30 1.1 O que é uma comunicação democrática? ............................................................ 30 1.2 Como democratizar a comunicação? .................................................................. 36 1.3 As propostas da sociedade civil brasileira .......................................................... 40 2 HISTÓRICO DO MOVIMENTO ............................................................................... 50 2.1 O Debate Internacional ....................................................................................... 50 2.1 A Democratização da Comunicação no Brasil .................................................... 57 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 76 OBRAS CONSULTADAS ................................................................................................. 83 ANEXOS ............................................................................................................................. 87 SITES RECOMENDADOS ................................................................................................ 95

Page 10: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

10

LISTA DE ANEXOS

ANEXO 1 – PRINCIPAIS SIGLAS ................................................................................... 87

ANEXO 2 – DATAS SIGNFICATIVAS ........................................................................... 89

ANEXO 3 – RESOLUÇÃO DE BELGRADO ................................................................... 93

ANEXO 4 – PLANO DA UNESCO PARA 1990-1995 ..................................................... 94

Page 11: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

11

INTRODUÇÃO

Desde que Bertold Brecht imaginou, em sua “Teoria de Rádio” de 1932, que cada

cidadão poderia ter um aparelho emissor-receptor em sua residência e assim participar de

uma assembléia popular permanente (DANTAS, 1996), até os dias de hoje, quando o

desenvolvimento da Internet reacende ânimos para uma nova utopia, o que aconteceu de

concreto foi a consolidação dos grandes conglomerados de comunicação. No entanto, à

medida que os sistemas de comunicação se desenvolviam e a propriedade dos meios de

radiodifusão se concentrava cada vez mais na mão de poucas empresas, surgiam

movimentos de resistência isoladamente em várias partes do mundo.

Assumindo características variadas, esses movimentos atuaram em diversas frentes

no combate ao monopólio dos meios de comunicação. Do enfrentamento direto à

formulação teórica, o sentimento geral de que os sistemas de comunicação deveriam e

Page 12: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

12

devem ser transformados foi, ao longo dos tempos, assumindo o caráter de luta pelo que se

convencionou chamar “democratização da comunicação”.

A democratização da comunicação constitui-se em bandeira de diversos

movimentos sociais, entidades e intelectuais que se dedicam ao tema. Das rádios

comunitárias aos meios acadêmicos, da formulação de políticas públicas ao ativismo dos

movimentos populares, a sociedade civil tem se organizado – ou atuado de forma isolada –

para levar adiante essa luta.

Todavia, ainda não se realizou nenhuma pesquisa especificamente sobre os discursos da sociedade civil, principalmente relativos à sua participação nas lutas pela democratização, embora ela venha ocorrendo, mesmo com diferentes níveis de intensidade, desde o período do regime autoritário (SANTOS, 1995).

Num momento em que as iniciativas se fragmentam e o próprio Fórum Nacional

pela Democratização da Comunicação (FNDC), criado justamente com o objetivo de

unificar os esforços do movimento social, se desarticula novamente, é importante pararmos

um pouco para refletir sobre de onde vem e o que é a democratização da comunicação.

Quais são as origens desta luta? O que as entidades da sociedade civil brasileira, através de

seus documentos, entendem por uma comunicação democrática? Quais são as propostas

historicamente apresentadas para se estabelecer a democratização da comunicação? Situar

histórica e conceitualmente a questão da democratização da comunicação, a partir dessas

perguntas, é o objetivo central deste trabalho.

Page 13: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

13

O debate internacional sobre a democratização da comunicação tem como referência

a UNESCO, Órgão das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura. Foi nos fóruns da

UNESCO que, a partir principalmente da década de 1960, os sistemas de comunicação

passaram a ser tema de interesse, fruto da pressão das chamadas nações não alinhadas, que

reivindicavam maior equilíbrio no fluxo de informações entre os países do primeiro e do

terceiro mundo (PUNTEL, 1994).

As primeiras propostas de ação, que de certa maneira poderiam ser consideradas

“ingênuas”, foram perdendo espaço à medida que eram levantadas questões como a

concentração da propriedade dos meios, a intervenção dos Estados autoritários e os

conteúdos dos sistemas de comunicação. O movimento, numa UNESCO hegemonizada por

países do bloco socialista, passa a ser pela implementação de políticas nacionais que

garantissem o acesso e o direito do povo à comunicação.

Devido ao grande espalhafato gerado pelo debate das Políticas Nacionais de

Comunicação, alardeadas pelos países liberais como um ataque à liberdade de imprensa,

além das diversas outras polêmicas geradas nos debates, a Conferência Geral da UNESCO

de 1976 solicitou ao diretor-geral que os problemas da comunicação na sociedade fossem

estudados. Decidiu-se, assim, criar a Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas

da Comunicação, presidida pelo irlandês Sean MacBride e amplamente representativa dos

países membros da UNESCO (UNESCO, 1983).

Page 14: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

14

Dos trabalhos da Comissão é que nasce um dos documentos de maior referência no

debate sobre a democratização da comunicação: “Um Mundo e Muitas Vozes –

Comunicação e Informação na nossa Época”, de 1980, conhecido mundialmente como

Relatório MacBride. A importância do documento reside na defesa de uma Nova Ordem

Mundial da Informação e da Comunicação (NOMIC), segundo a qual o processo de

democratização da comunicação compreenderia medidas como a implementação de

políticas de aumento do acesso aos meios, incentivo à comunicação alternativa e – o mais

importante – uma mudança de perspectiva em relação à comunicação.

Essa mudança de perspectiva viria a partir do momento em que a comunicação fosse

entendida como um direito humano fundamental. Um dos primeiros promotores do direito

de comunicar foi Jean D’Arcy, em artigo de 1969, ao defender que as Nações Unidas

avançassem em relação à mera defesa da liberdade de expressão. O direito à comunicação,

conceito mais amplo que o direito à informação, significa que a todas as pessoas deve ser

garantido o direito de informar, ser informado, trocar idéias e opiniões, por quaisquer meios

de comunicação, sem qualquer restrição (Id., 1983).

Mesmo que os planos da UNESCO tenham sido boicotados pelos países liberais,

como Estados Unidos e Inglaterra, a idéia central da NOMIC continuou viva e espalhou-se

pelo mundo, interpretada e adaptada de diversas formas. No Brasil, o debate da NOMIC

chega principalmente pela mão de alguns pesquisadores da comunicação e, a partir de um

certo momento, se coaduna com o movimento da sociedade civil pela redemocratização do

país, na década de 1980.

Page 15: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

15

Não há como determinar uma data exata para o surgimento de um movimento pela

democratização da comunicação no Brasil. Antes do golpe militar de 1964 a comunicação

ainda não era uma questão política relevante, até mesmo porque não havia, no país, um

sistema de comunicação de massa estruturado. São os militares que dão início ao processo

de desenvolvimento das telecomunicações, dentro do projeto de integração nacional

(SANTOS, 1995). À Rede Globo de Televisão é delegada a missão de irmanar o país em

torno do futebol, das novelas, do Jornal Nacional. Ao lado disso, o recrudescimento da

repressão e da censura fez com que surgissem movimentos de resistência.

Nesse período, é fundamental o papel da imprensa alternativa e dos movimentos

populares, como aqueles ligados aos setores progressistas da Igreja Católica, pela

capacidade de mobilização das comunidades e pelas iniciativas de comunicação popular. A

Igreja também assume posição importante, seja pela atuação das Comunidades Eclesiais de

Base e do Movimento de Educação de Base e suas “escolas radiofônicas”, como também

das entidades ligadas à comunicação na América Latina, que formularam conceitos de

comunicação alternativa e horizontal, interpretando os preceitos da NOMIC a partir de

experiências entre as classes populares (PUNTEL, 1994). No Brasil, a União Cristã

Brasileira de Comunicação é outra entidade que merece destaque.

No ambiente acadêmico, o debate sobre as Políticas Nacionais de Comunicação

ganha uma nova conotação a partir de questões levantadas em congressos da Associação

Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação (ABEPEC). Como defender a

Page 16: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

16

implementação de políticas de comunicação, que pressupunham a interferência direta do

Estado, se o Brasil ainda vivia sob um regime autoritário? (RAMOS, 1991)

Paralelo ao movimento de chegada do debate da NOMIC, o movimento social vai

aos poucos desenvolvendo suas próprias ferramentas de comunicação e as entidades da

sociedade civil, por sua vez, passam a ganhar importância com o processo de

redemocratização do Brasil. É nesse cenário, de crescimento das preocupações do

movimento social com a comunicação, fortalecimento da sociedade civil e questionamento

das PNC, que os debates se misturam e há uma mudança no eixo de lutas, uma vez que a

reivindicação passa a ser pelo estabelecimento de Políticas Democráticas de Comunicação.

Era o momento em que a sociedade brasileira se mobilizava para elaborar uma nova

Constituição para o país. A articulação de algumas entidades ligadas à área da comunicação

culmina com a fundação, em 1984, da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas

de Comunicação (FNPDC), que chegou a contar com 45 entidades e 27 parlamentares

(SOUZA, 1996). Nesse ano, dois documentos podem nos ajudar a entender o conceito de

comunicação democrática e quais as propostas destas entidades para a democratização da

comunicação.

O manifesto de fundação da Frente assumia como compromisso a luta para que uma

comunicação democrática significasse acesso igualitário aos meios, participação de

profissionais na decisão sobre a linha editorial dos veículos e participação da sociedade na

definição das políticas de comunicação do país (FNPDC, 1984). Desde o princípio, a

Page 17: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

17

principal reivindicação das entidades era a constituição de um sistema público de

comunicação. O Centro de Estudos em Comunicação de Brasília, em seu documento

também de 1984, formula um conceito de Sistema Público, entendido como aquele

financiado por contribuição direta, pelo Estado ou pela iniciativa privada, cuja programação

é controlada por setores organizados da sociedade civil (CEC, 1984).

Pilar mestre deste Sistema Público seria o Conselho Nacional de Comunicação, que,

composto por ampla representação da sociedade civil, teria como função decidir sobre as

políticas de comunicação, além de fiscalizar a programação das emissoras. Esse Conselho,

previsto na Constituição de 1988, só foi instalado em 2001, com a denominação de

Conselho de Comunicação Social, com atribuições extremamente restritas em relação ao

que reivindicavam as entidades no processo constituinte. Essa é apenas uma mostra das

diversas derrotas sofridas pelo movimento, que foi retrocedendo em suas reivindicações ao

longo do tempo.

A mais importante articulação da sociedade civil na história do movimento é, sem

dúvida, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, criado em 1991, que

chegou a contar, em seu auge, com 32 entidades em nível nacional, além de 44 comitês

regionais e comissões pró-comitês. O FNDC é responsável por algumas das principais

conquistas do movimento pela democratização no âmbito institucional, como a própria

instalação do CCS, malgrado seu caráter restritivo e o próprio processo de negociação. A

atuação do FNDC é baseada em quatro eixos estratégicos: a constituição do controle

público dos meios de comunicação, a reestruturação do mercado, a capacitação da

Page 18: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

18

sociedade para o conhecimento e a ação sobre a mídia e a implementação de uma política

de desenvolvimento da cultura do país (FNDC, 1994).

Assim como não podemos definir dia e hora exatos do surgimento do movimento, é

igualmente impossível definir quem, nos dias de hoje, está na luta pela democratização da

comunicação. Não existe um movimento global, mas iniciativas diversas – algumas

pontuais, outras dentro de um projeto estratégico – quase a totalidade delas levantando a

mesma bandeira. São poucos, no entanto, os avanços conquistados pelo movimento,

principalmente na sua atuação institucional. Portanto, é importante recuperarmos conceitos

e a história do movimento, a fim de nortearmos a nossa atuação, ainda mais agora com a

nova realidade a partir da convergência tecnológica dos meios de comunicação.

O primeiro capítulo desta monografia é dedicado à tentativa de entendermos o

conceito de democratização da comunicação. A partir do debate da NOMIC e de

documentos históricos das entidades da sociedade civil brasileira, buscamos respostas a

algumas questões. O que se entende por uma comunicação democrática? E quais são as

propostas para a democratização da comunicação? Nesse capítulo, as referências principais

são o Relatório MacBride e os documentos das entidades ligadas à FNPDC e ao FNDC.

Entendidos os conceitos preliminares, passamos para o segundo capítulo, no qual traçamos

um histórico do movimento pela democratização da comunicação, desde o debate

internacional da NOMIC e suas diversas origens e frentes de atuação no Brasil. Aqui,

tivemos que recorrer a diversas fontes, justamente para compor um histórico o mais amplo

possível. Algumas questões mencionadas no primeiro capítulo só serão aprofundadas no

Page 19: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

19

segundo. Escolhemos dispor os capítulos dessa maneira para que o leitor possa primeiro

entender os conceitos principais e o que as entidades pensam sobre a democratização da

comunicação para depois acompanhar a história do movimento.

Por fim, é importante fazermos algumas considerações sobre as limitações deste

trabalho. Nosso objetivo não é discutir os monopólios de mídia, a influência da

comunicação na sociedade ou se a reivindicação da democratização da comunicação é justa

ou não. Nosso objetivo aqui, simplesmente, é tentar sistematizar a história do movimento,

além de suas principais propostas e ações. É de fundamental importância que se faça uma

discussão aprofundada sobre o conceito de democratização da comunicação e sobre as

diferentes concepções de sociedade refletidas nas maneiras de entendê-lo.

No entanto, esta monografia se limitará a fazer apenas um breve introdução ao tema.

Esperamos, assim, que este trabalho possa servir de base para futuras discussões, realmente

aprofundadas, que poderão ir dos discursos da sociedade civil brasileira sobre a

democratização da comunicação até sobre o próprio conceito de democracia. Ele pode,

também, ser utilizado por aqueles que, pela primeira vez, pretendam se dedicar ao tema,

procurando entender as origens do movimento e as propostas centrais. Falamos

especialmente dos estudantes de Comunicação Social que militam no movimento

estudantil.

Aliás, a primeira motivação deste trabalho vem da necessidade de sanar as

inquietações do autor, surgidas com a vivência no movimento estudantil do curso de

Page 20: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

20

Comunicação Social. Foram – e são – muitas dúvidas e reflexões durante essa vivência, que

recebem, agora, uma primeira sistematização teórica. Decorre que esta é uma visão parcial

da questão da democratização da comunicação, baseada nas reflexões e nas práticas

vivenciadas pelo autor e que, por ter essa natureza, está sujeita a erros, discordâncias e

deslizes às normas acadêmicas. Ainda assim, vamos a ele.

Page 21: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

21

ABORDAGEM METODOLÓGICA

Antonio Carlos Gil (1995) define o método como o “caminho para se chegar

a determinado fim. E método científico como o conjunto de procedimentos intelectuais e

técnicos adotados para se atingir o conhecimento”. É importante que um trabalho

acadêmico que se pretenda sério exponha claramente seus objetivos e os meios pelos quais

se chegou até eles, a fim de diferenciar o conhecimento cientifico do senso comum. No

entanto, é importante considerar que, na pesquisa científica hoje, há diversos tipos de

métodos utilizáveis, a depender do objeto de estudo e do seu objetivo, principalmente em

relação às ciências sociais, como nos diz o autor.

Muitos pensadores do passado manifestaram a aspiração de definir um método universal aplicável a todos os ramos do conhecimento. Hoje, porém, os cientistas e os filósofos da ciência preferem falar numa diversidade de métodos, que são determinados pelo tipo de objeto a investigar e pela classe de proposições a descobrir (GIL, 1995).

Page 22: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

22

Para Lucia Santaella (2001), a ciência é uma coisa viva, em permanente

metabolismo e crescimento, produzida por pesquisadores vivos que buscam descobrir

aquilo que ainda não se conhece. A pesquisa científica nasce, portanto, da necessidade de

se encontrar uma resposta a um questionamento. Exige, mesmo assim, que o pesquisador

cumpra certos procedimentos, a fim de que o conhecimento produzido possa ser

considerado verdadeiro e justificado. A questão, que Santaella levanta a exemplo de Gil, dá

conta de que a ciência, por possuir essas características, desenvolve esses procedimentos à

sua maneira, de acordo com as necessidades que surgem a partir da própria ciência.

Quanto mais a prática científica se aproxima desse ideal, mais científica ela é, não se confundindo com meras encomendas burocráticas, administrativas, comerciais ou ideológicas que são muitas vezes equivocadamente chamadas de pesquisa cientifica (SANTAELLA, 2001).

A pesquisa científica possui diversas divisões. A primeira grande divisão,

segundo Santaella, ocorre entre pesquisa fundamental (cuja função é criar quadros teóricos

de referência) e a aplicada (cuja principal atribuição é resolver algum problema). Quanto

aos seus objetivos, a pesquisa social pode ser dividida em pesquisa exploratória, descritiva

e explicativa. As pesquisas exploratórias são aquelas que exigem menor rigor no

planejamento, uma vez que objetivam dar uma visão geral sobre um assunto pouco

abordado e, geralmente, são apenas o primeiro passo para uma investigação posterior mais

ampla. O levantamento bibliográfico e documental, as entrevistas não padronizadas e os

estudos de caso são procedimentos normalmente utilizados. As pesquisas bibliográficas têm

Page 23: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

23

“como principal finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias, com

vistas na formulação de problemas mais precisos ou hipóteses pesquisáveis para estudos

posteriores” (GIL, 1995).

As pesquisas descritivas, como o próprio nome diz, têm como objetivo

descrever as características de um determinado grupo, fenômeno ou uma situação

(condições de moradia em determinado município, por exemplo). As pesquisas

explicativas, por sua vez, procuram encontrar as razões de determinado fenômeno ou

situação. Mesmo que as três pesquisas tenham o mesmo valor, normalmente os estudos

exploratórios e descritivos costumam fazer parte de uma etapa anterior dos estudos

explicativos.

Nos estudos exploratórios, são muito utilizadas as pesquisas bibliográfica e

documental. Para o autor, a pesquisa bibliográfica tem a vantagem de oferecer ao

pesquisador a cobertura ampla de um tema, principalmente quando os dados estão

dispersos. Nos estudos históricos, por exemplo, a pesquisa bibliográfica se faz fundamental.

No entanto, o autor levanta uma desvantagem deste tipo de pesquisa: muitas vezes as fontes

apresentam dados equivocados. A pesquisa documental diferencia-se da pesquisa

bibliográfica unicamente na natureza das fontes.

Outra divisão que pode ser feita, de acordo com Santaella, é entre pesquisa

qualitativa e quantitativa. A pesquisa quantitativa, grosso modo, é aquela que usa o recurso

das estatísticas. A pesquisa qualitativa, por seu turno, abriga várias subdivisões, e pressupõe

Page 24: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

24

“uma relação dinâmica, uma interdependência entre o mundo real, o objeto da pesquisa e a

subjetividade do sujeito” (SANTAELLA, 2001). Esse caráter “aberto” da pesquisa

qualitativa não significa, para a autora, que o pesquisador possa abrir mão de critérios

prévios para a realização do trabalho, rejeitando o uso de métodos. A autora também faz a

ressalva que a divisão entre pesquisa qualitativa e quantitativa não encontra consenso no

meio acadêmico, devido aos vários sentidos que se pode dar principalmente à pesquisa

qualitativa.

Na área da Comunicação Social, Santaella afirma que DeVito (1997) dividiu

as pesquisas em descritiva, histórico-crítica e experimental. A pesquisa descritiva tem,

como pode se perceber, o objetivo de descrever comportamentos, atitudes, valores, etc. Já a

histórico-crítica é aquela pesquisa que parte da reconstituição do passado a fim de melhor

compreender os fenômenos. Por fim, temos a pesquisa experimental, baseada

fundamentalmente na observação empírica de fenômenos.

Procedimentos metodológicos adotados neste trabalho

Gil recomenda que, na redação final do texto, sejam descritos os

procedimentos adotados na pesquisa, principalmente, no nosso caso, se a pesquisa é

Page 25: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

25

exploratória, descritiva ou explicativa e, ainda, qual o delineamento que foi seguido. É o

que faremos.

Antes de relatarmos os procedimentos metodológicos adotados neste estudo,

é importante ressaltar que a monografia é, para muitos estudantes de graduação, a primeira

experiência de fôlego na pesquisa acadêmica. Daí a dificuldade no trato com a metodologia

a ser adotada. É fundamental que um curso de Comunicação Social estimule a produção

científica também na graduação mas, para isso, é preciso que, durante o decorrer do curso,

seja estimulado o contato do estudante com a pesquisa acadêmica e suas particularidades.

O tema da democratização da comunicação no Brasil tem sido bastante

explorado. No entanto, isso tem acontecido de maneira fragmentada, pontual ou limitada a

um certo período de tempo. Normalmente, os trabalhos existentes abordam acontecimentos

específicos em uma determinada época (o debate sobre PNC na década de 1970), ou então a

atuação de um determinado grupo ou entidade (a participação da Igreja na luta pela

democratização da comunicação). Apesar de existirem textos sobre a história do

movimento pela democratização no país, muitos deles reproduzem a visão de determinado

grupo que esteve diretamente ligado ao movimento. Sentimos a falta de um estudo mais

amplo em termos de período de tempo e de visões. Além disso, desejávamos sistematizar

preliminarmente a questão da democratização da comunicação, em seus aspectos históricos

e conceituais, a fim de servir de base para uma discussão teórica mais aprofundada que

possa futuramente ser feita.

Page 26: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

26

Nosso trabalho assume, portanto, o caráter de pesquisa exploratória, uma

vez que pretende servir de ponto de partida para uma discussão mais ampla e se utilizou

principalmente de fontes bibliográficas e documentais para a sua realização. Também

podemos enquadrá-lo dentro da pesquisa qualitativa, haja vista os procedimentos adotados

(pesquisa bibliográfica, documental, entrevistas, etc), além da flexibilidade – e, com

sinceridade, imprecisão – na escolha de um método. Mas a principal característica que

colocou desde o início este trabalho dentro do quadro das pesquisas qualitativas é a certeza

de que nos depararíamos com diversas questões no decorrer da pesquisa, que poderiam

mudar seus rumos.

A bibliografia utilizada, aparentemente, pode ser considerada um tanto

extensa. Isso se deve a dois motivos: o primeiro deles, porque não havia um estudo

sistematizado sobre o nosso tema, onde pudéssemos encontrar uma bibliografia básica.

Além disso, desejávamos fazer um amplo resgate da história do movimento, além de

contemplar as diversas visões sobre o conceito de democratização da comunicação. A

existência de diferentes visões sobre a história do movimento e sobre como deve se dar a

luta pela democratização da comunicação nos levou a constituir uma bibliografia extensa, a

partir dos textos já conhecidos, que levaram ao conhecimento de outros. Acreditamos que

esse procedimento possa facilitar o trabalho àqueles que desejarem se dedicar ao tema com

maior profundidade.

Elaboramos uma espécie de roteiro que norteou nossa pesquisa por livros e

artigos que tratassem do assunto objeto de nosso estudo. Assim, procuramos encontrar

Page 27: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

27

textos que abordassem: a) as origens da discussão sobre a democratização da comunicação

nos planos internacional e nacional; b) a história do movimento pela democratização da

comunicação no Brasil e a atuação das entidades da sociedade civil; c) reflexões teóricas

em torno do conceito de direito à comunicação e democratização da comunicação.

Os documentos utilizados são aqueles ligados à história da FNPDC e do

FNDC e já eram, em sua maioria, de nosso conhecimento. À época da Constituinte,

diversos partidos também formularam questões sobre a comunicação, no entanto, não os

analisamos por não fazerem parte direta da história desses dois movimentos formados

essencialmente por entidades da sociedade civil, embora alguns partidos de esquerda

tenham participado dessa articulação. Os autores dos documentos utilizados neste trabalho

são entidades e grupos que estiveram à frente do movimento pela democratização da

comunicação nas décadas de 1980 e 1990. A partir de sua análise, buscamos entender quais

eram e quais são as propostas para a democratização da comunicação e o que estas

entidades entendiam por uma comunicação democrática. Utilizamos os documentos por

economia de tempo e por acreditarmos que um questionário enviado às entidades da

sociedade civil não traria resultados satisfatórios. Como nos diz Gil:

As fontes de ‘papel’ muitas vezes são capazes de proporcionar ao pesquisador dados suficientemente ricos para evitar a perda de tempo com levantamento de campo, sem contar que em muitos casos só se torna possível a investigação social a partir de documentos (GIL, 1995).

Page 28: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

28

No início de nossa pesquisa, pensamos na possibilidade de enviar um

questionário às entidades ligadas ao FNDC, às entidades patronais do empresariado de

comunicação, além de movimentos populares e de mídia alternativa, a fim de

identificarmos as diferentes visões sobre a democratização da comunicação. Não

concretizamos a idéia porque, além de haver a possibilidade de não recebermos respostas,

estas poderiam vir vagas, difusas ou alheias às práticas das entidades, não colaborando com

a discussão que pretendíamos propor. No entanto, acreditamos ser importante, algum dia,

realizar uma espécie de mapeamento das visões sobre democracia na comunicação, a fim de

questionarmos a atuação da sociedade civil e fazer com que ela própria se questione.

Consideramos importante, também, realizar entrevistas com pesquisadores

interessados no assunto, ligados de alguma maneira aos debates e ao movimento pela

democratização da comunicação. Pedrinho Guareschi é professor do curso de pós-

graduação em Psicologia da PUC-RS e ligado ao movimento das pastorais. É autor de

livros como “Comunicação e Poder”, “Comunicação e Controle Social” e “Os Construtores

da Informação”, todos pela Editora Vozes. Recentemente, organizou uma coletânea de

artigos para o livro “Uma Nova Comunicação é Possível”, pela Evangraf. Venício Artur de

Lima é professor titular aposentado de Ciência Política e Comunicação da Universidade de

Brasília. Autor do recente “Mídia: Teoria e Política”, pela Fundação Perseu Abramo, foi o

primeiro coordenador do Núcleo de Estudos sobre Mídia e Política da UnB e fez parte do

Centro de Estudos de Comunicação e Cultura. João Brant foi coordenador geral da

Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social, tendo elaborado a monografia

“Políticas Nacionais de Radiodifusão (1985-2001) e Espaço Público” como trabalho de

Page 29: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

29

conclusão do curso de Comunicação Social/Radialismo da Universidade de São Paulo

(USP). São pessoas diretamente envolvidas com a questão da democratização da

comunicação, tanto pelo trabalho acadêmico quanto pela militância que desenvolvem. As

entrevistas tiveram o objetivo de complementar as informações sobre a história do

movimento no Brasil e do debate da NOMIC, além de – o mais importante – possibilitar

que realizássemos apontamentos teóricos sobre a questão, que podem, futuramente, servir

de base para novas e mais profundas discussões. É preciso destacar a importância de termos

ouvido outras pessoas que fazem parte da história do movimento no Brasil, algo que não

conseguimos fazer por não termos encontrado algumas e não termos recebido resposta de

outras.

Na redação final do trabalho, utilizamos como base o livro “Normas

Técnicas para o Trabalho Científico”, do professor Pedro Augusto Furaste, que fez uma

explicitação das normas mais recentes da Associação Brasileira de Normas Técnicas

(ABNT). Apenas como base, pois nos surpreendeu a inacreditável gama de interpretações

que recebem as referidas normas.

Page 30: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

30

1 Anotações Teóricas sobre a Questão da Democratização da Comunicação

Neste capítulo, propomos uma discussão introdutória sobre os conceitos da

democratização e os caminhos que a ela levariam. O direito à comunicação é a base da

reivindicação e seu debate tem origens nas discussões promovidas pela UNESCO. O

Relatório MacBride é a principal referência na primeira parte deste capítulo, que pretende

responder à questão: “o que é uma comunicação democrática?”. Na segunda parte, na qual

o Relatório MacBride também tem importância ao lado de entrevistas realizadas para este

trabalho e da obra de Joana Puntel (1994), pretendemos discutir os caminhos que levam à

democratização da comunicação. Na terceira e última parte, analisamos alguns dos

principais documentos produzidos pelas entidades da sociedade civil, para que possamos

identificar suas principais propostas e reflexões sobre a questão.

1.1 O que é uma comunicação democrática?

Um dos conceitos fundamentais para o entendimento da questão da democratização

da comunicação dá conta de que a comunicação precisa ser vista como um aspecto dos

Page 31: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

31

direitos humanos. Trata-se de um conceito mais amplo que o direito de receber

comunicação ou de ser informado. Com essa perspectiva, a comunicação passa a ser

entendida como um diálogo e tem participação fundamental para o desenvolvimento da

sociedade.

Em todas as épocas históricas, o homem lutou para se libertar dos poderes que o dominavam [...]. Graças apenas a alguns esforços fervorosos e infatigáveis, os povos conseguiram a liberdade de palavra, de imprensa e de informação. Hoje em dia, prossegue a luta por estender os direitos humanos e conseguir com que o mundo das comunicações seja mais democrático que agora (UNESCO, 1983).

O “direito de comunicar” foi enunciado pela primeira vez em 1969, por Jean

D’Arcy, num artigo em que afirmava que a Declaração Universal dos Direitos Humanos

precisava avançar na discussão e defender um direito mais amplo que o direito à

informação (FISHER, 1982). A linha do tempo proposta por D’Arcy era de que, na época

da ágora grega, onde se estabelecia uma comunicação direta entre as pessoas, surgiu

primeiramente o conceito de liberdade de opinião. O surgimento da imprensa e as

possibilidades que dela advieram abriram espaço para um conceito semelhante, o de

liberdade de expressão. A tese de D’Arcy era de que o controle de uma sociedade sempre

esteve nas mãos de quem controlava os meios de comunicação. Quando estes eram

limitados, sua posse normalmente ficava por conta de líderes religiosos, políticos ou

pessoas em particular. A “pessoa comum” aceitava essa condição.

Em 1969, no entanto, época em que os instrumentos de comunicação eletrônica e

seu uso se popularizavam, D’Arcy entendia que o avanço das tecnologias permitiria que

Page 32: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

32

mais pessoas pudessem ter o direito de comunicar, e para isso as estruturas sociais teriam

de se modificar.

Hoje em dia parece possível um novo passo adiante: o direito do homem à comunicação, derivado de nossas últimas vitórias sobre o tempo e o espaço, da mesma forma que da nossa mais clara percepção do fenômeno da comunicação (D’ARCY, 1969 apud UNESCO, 1983).

Segundo Fisher, a idéia foi recebida com indiferença na UNESCO. Acreditava-se

que a introdução deste novo conceito poderia confundir os estudos e retardar os resultados.

No entanto, em sua essência o direito à comunicação é defendido, mencionando-se

inclusive Jean D’Arcy como “um dos primeiros promotores do direito à comunicação”

(UNESCO, 1983). Segundo Fisher, ao passo que as nações “ocidentais” consideravam o

direito à comunicação mais um ataque à liberdade de imprensa, as nações do bloco

socialista temiam que esse direito fosse usado para justificar a continuação do desequilíbrio

de informações entre as nações de ambos os blocos. Por isso, ele alertava para a

necessidade de uma discussão filosófica sobre o conceito, entendendo, porém, a ânsia de

alguns intelectuais em saber quais seriam as implicações práticas da implementação desse

direito.

O direito de comunicar não significa que um determinado país precise aceitar a submersão de sua própria cultura por valores importados. Neste caso, o direito de comunicar significa o direito de uma sociedade de se comunicar em termos de suas próprias necessidades e de se proteger contra os sistemas de valores

Page 33: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

33

importados, que solapariam suas próprias formas culturais de expressão (FISHER, 1982).

No Relatório MacBride, uma nota aponta que o russo Sergei Losev, integrante da

comissão, temia abordar o conceito de forma tão ampla, já que ainda não se tratava de um

direito reconhecido. Mesmo assim, o texto final da comissão elabora uma formulação do

direito de comunicar.

Todo mundo tem o direito de comunicar. Os elementos que integram esse

direito fundamental do homem são os seguintes, sem que sejam de modo algum limitativos: a) direito de reunião, de discussão, de participação e outros direitos de associação; b) o direito de fazer perguntas, de ser informado, de informar e outros direitos de informação; c) o direito à cultura, o direito de escolher, o direito à proteção da vida privada e outros direitos relativos ao desenvolvimento do indivíduo. Para garantir o direito de comunicar seria preciso dedicar todos os recursos tecnológicos de comunicação a atender às necessidades da humanidade a esse respeito (UNESCO, 1983).

A comunicação é encarada como parte dos direitos humanos. Um direito que não se

resume ao direito de receber informação de qualidade, mas como um processo de mão

dupla do qual pessoas e grupos devem participar, a fim de estabelecer um “diálogo

democrático e equilibrado” (Id., 1983). Essa visão implica tratar a comunicação como “um

processo social fundamental, permitindo que os indivíduos e as comunidades troquem

informações e opiniões” (PUNTEL, 1994).

Page 34: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

34

A idéia de que a comunicação é um direito forma a base da defesa da

democratização da comunicação. Mas o que seria essa situação? Em que condições

poderíamos dizer que a comunicação está democratizada? No texto final do Relatório

MacBride, a democratização da comunicação é encarada não como um conjunto de

condições estabelecidas, mas como um processo a partir do qual:

a) o indivíduo passa a ser um elemento ativo, e não um simples objeto da comunicação; b) aumenta constantemente a variedade de mensagens intercambiadas; c) aumentam também o grau e a qualidade da representação social na comunicação ou na participação (UNESCO, 1983).

Para Joana Puntel (1994), a questão da democratização da comunicação implica a

consideração de dois fatores: o acesso e a participação. Resumidamente, essa condição

significa que qualquer pessoa deve ter acesso aos meios de comunicação para informar, ser

informado e expressar suas opiniões e, além disso, deve poder participar da elaboração das

políticas de comunicação, bem como das decisões sobre o conteúdo e organização dos

veículos. Segundo a autora, este processo “promove um fluxo horizontal de comunicação,

de representação do público na elaboração das políticas, de acesso às fontes de informações

e de participação nas decisões sobre difusão de conteúdos ou distribuição de informações”.

Em entrevista a Joana Puntel, Luiz Ramiro Beltran, à época consultor da UNESCO

para comunicação na América Latina, também definiu a democratização da comunicação

Page 35: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

35

como um processo. Ele partia de um ponto de vista latino-americano, definindo a questão

no sentido de aumentar a base popular na utilização e na gerência da mídia.

A nível nacional, Beltran vê a democratização da comunicação como um processo de implantação do acesso e da participação popular nos meios de comunicação. A nível internacional, ele a entende como um processo “de busca de equilíbrio nas liberdades das relações de comunicação entre as nações desenvolvidas e em desenvolvimento” (PUNTEL, 1994).

Tomando como base a Constituição Brasileira, Pedrinho Guareschi entende a

comunicação como um serviço público, assim como os correios, a telefonia e as estradas.

Assim sendo, a comunicação deveria prestar um serviço público à toda a população. Para o

estabelecimento de uma comunicação democrática, “este serviço público tem de cumprir

sua tarefa fundamental: ser porta-voz de toda a sociedade civil para que ela possa dizer sua

palavra, expressar sua opinião, manifestar seu pensamento” (GUARESCHI, 2003).

Por sua vez, João Brant considera perigoso entender a comunicação como um

serviço, oferecido por entes privados ou estatais ao público. O direito à comunicação

entraria em oposição à idéia de comunicação como serviço, uma vez que, como direito, o

Estado deveria garantir à toda a população o acesso e participação na comunicação.

“Precisamos romper a idéia da comunicação como serviço e estabelecê-la como direito.

Não basta permitir o acesso democrático, deve-se trabalhar para garanti-lo.” (BRANT,

2003)

Page 36: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

36

1.2 Como democratizar a comunicação?

Feitos esses breves apontamentos sobre o que seria uma comunicação democrática,

precisamos identificar quais são as propostas de atuação para o a promoção da

democratização da comunicação. O Relatório MacBride observava uma série de obstáculos

que impedem a democratização da comunicação.

Sociedades não-democráticas seriam o primeiro entrave. Não apenas pelo fato de

que um Estado autoritário tende a moldar um sistema de comunicação centralizado e

burocrático, de acordo com seus interesses. A falta de democracia também se reflete nas

discrepâncias existentes entre as minorias culturais e a massa de analfabetos. Outra questão

que o Relatório apontava era que o público ainda não estava efetivamente representado na

definição das políticas de comunicação. Em muitos países, igualmente, predominava a

chamada “comunicação vertical”, representada pelos monopólios, além de os meios serem

insuficientes para que a população pudesse ter acesso a eles. Faltaria, também,

conhecimento dos indivíduos para compreender as mensagens dos meios de comunicação.

O Relatório também atentava que as novas tecnologias, embora aumentassem as

possibilidades de democratização, poderiam aumentar ainda mais a concentração da posse

dos meios.

Page 37: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

37

Para superar essas barreiras, o Relatório definia quatro tipos de métodos: o aumento

do acesso da população aos órgãos de informação e ao sistema global de comunicação, a

participação de leigos na produção e emissão dos programas, o estabelecimento de

comunicação alternativa e o estímulo à participação da sociedade na gestão dos meios e na

adoção de decisões. Além disso, o Relatório considerava fundamental também estimular o

espírito crítico dos indivíduos.

Mas o mais importante é que o Relatório ressaltava que eram muitos os caminhos

para democratizar a comunicação, sendo que não eram excludentes entre si. No entanto,

não poderiam ficar restritos apenas a medidas quantitativas, como ampliação dos meios

físicos ou aumento do acesso do público. Era preciso entender a importância de uma troca

de informações em pé de igualdade, seja no plano internacional ou no local, no qual não

houvesse qualquer forma de dominação ou discriminação.

Em outras palavras, implica uma mudança de perspectiva. Sem dúvida se requer uma informação mais abundante, procedente de uma pluralidade de fontes, mas se não houver possibilidades de reciprocidade, a comunicação não será realmente democrática. Sem uma circulação de duplo sentido entre os participantes, sem a existência de várias fontes de informação que permitam uma seleção maior, sem o desenvolvimento das oportunidades de cada indivíduo para tomar certas decisões baseadas no conhecimento completo de fatos heteróclitos e de alguns pontos de vista divergentes, sem uma maior participação dos leitores, dos espectadores e dos ouvintes na adoção de decisões e na constituição dos programas dos meios de comunicação social, a verdadeira democratização não chegará a ser uma realidade (UNESCO, 1983).

Page 38: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

38

Essa “mudança de postura” serve de gancho para uma outra discussão sobre os

caminhos a serem seguidos. Como veremos, muitas entidades da sociedade civil que se

dedicaram à luta pela democratização da comunicação acabaram por se concentrar na

chamada “luta institucional”, ou seja, a pressão junto ao Estado para a mudança na

legislação de comunicação. Um dos debates mais acirrados dentro do próprio movimento

pela democratização da comunicação tange a aparente dicotomia entre a atuação

institucional e a “ação direta”, esta última relacionada principalmente às experiências de

comunicação popular e alternativa.

Se as práticas de comunicação popular ou alternativa são consideradas, de um lado, como determinantes para a democratização da comunicação, elas podem também, por outro, serem vistas com ceticismo pelos teóricos que acreditam que a democratização da comunicação deve começar do alto, onde reside o poder e onde se travam as discussões (PUNTEL, 1994).

Para entendermos a importância da comunicação alternativa e popular1, torna-se

importante um breve retorno à reflexão sobre o direito de comunicar.

Para Brant, o direito à comunicação opõe-se à liberdade de expressão, uma vez que

esta expressa a idéia de que às pessoas é permitido se expressar, enquanto o primeiro

significa que deva existir uma garantia para que as pessoas possam comunicar. Por

conseqüência, deve haver um garantidor: o Estado. Ao Estado caberia não apenas permitir

1 A expressão “comunicação alternativa e popular” é usada aqui de forma genérica, de modo a identificar iniciativas como rádios comunitárias, jornais de bairro, movimentos de contra-informação, comunicação sindical, formação de redes pela Internet, etc.

Page 39: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

39

às pessoas comunicarem, mas garantir que toda a sociedade possa ter acesso e participação

nos meios de comunicação e na definição das políticas. Por isso, ele acredita na importância

da disputa por mudanças na legislação, mas ressalva que essa frente de atuação não pode

ser tomada como fim em si mesmo. “A luta é muito mais cultural. Mudança de legislação é

um instrumento da disputa cultural para o estabelecimento de uma comunicação

democrática” (BRANT, 2003).

Para Joana Puntel, são três as características básicas da comunicação alternativa.

Primeiro, trata-se de um processo que implica participação dirigida à uma determinada

mudança social. Nesse processo, o que existem são trocas de mensagens entre pessoas,

inexistindo as figuras do emissor e do receptor. Em segundo lugar, a comunicação

alternativa é um processo latino-americano, de oposição à comunicação vertical

estabelecida pelos monopólios, que exerce diversas funções: contra-informação, educação

não-formal, conscientização, mobilização e fortalecimento. Por fim, ela acredita que

processos de comunicação alternativa podem ser estabelecidos de diversas maneiras, seja

pela diversidade de meios como a forma como eles podem ser usados. Entende a autora que

essas estratégias de comunicação alternativa normalmente são voltadas para a resolução de

algum problema imediato de um determinado grupo ou comunidade, mas seu objetivo final

é a organização, a ação política e a elaboração de conceitos sobre a comunicação.

Estas formas alternativas de comunicação têm metas claras para desenvolver valores de comunicação participativa e uma infra-estrutura de formas de mídia participativas e inovadoras (PUNTEL, 1994).

Page 40: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

40

Puntel diz que, como o movimento pela implementação de políticas nacionais de

comunicação na América Latina não foi levado adiante na década de 1970 principalmente

porque a maioria das nações vivia sob ditaduras, os movimentos de comunicação popular e

alternativa surgiram à margem da sociedade, desempenhando papel fundamental na luta

pela democratização da comunicação. Estes movimentos, “enquanto elaboravam conceitos

de comunicação, formas de utilização da mídia e práticas inovadoras de formação cultural,

incorporaram conceitos de comunicação democrática, tais como o acesso e a participação”

(Id., 1994).

1.3 As propostas da sociedade civil brasileira

Na trajetória do movimento pela democratização da comunicação no Brasil, alguns

documentos, produzidos principalmente na época da Assembléia Nacional Constituinte, são

peças-chave para visualizarmos quais as propostas da sociedade civil para democratizar os

meios de comunicação. O primeiro documento é “A Transição Política e a Democratização

da Comunicação Social”, produzido pelo Centro de Estudos de Comunicação e Cultura, de

Brasília, em outubro de 1984, a pedido do Senador Affonso Camargo, chefe do escritório

do então candidato à presidência, Tancredo Neves. Os demais documentos estão mais

Page 41: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

41

ligados ao movimento que culminou com a criação do FNDC, embora o CEC tenha

participado deste processo. São eles: o manifesto de fundação da Frente Nacional de Luta

por Políticas Democráticas de Comunicação (FNLPDC), de 1984; a “Carta de Brasília” do

Encontro Nacional dos Jornalistas e a “Carta de Brasília” do Encontro Nacional dos

Estudantes de Comunicação Social, ambos realizados em 1986; a “Proposta dos Jornalistas

à Sociedade Civil”, de 1991; e o documento “Bases de um Programa para a

Democratização da Comunicação”, de 1994.

O Centro de Estudos em Comunicação e Cultura era composto por Luiz Gonzaga

Motta, Venício Artur de Lima, José Salomão Amorim, Ubirajara da Silva, Carlos Setti e

Murilo Ramos. O documento produzido pelo grupo para o candidato Tancredo Neves veio

a público um ano depois de sua formulação, às vésperas da Constituinte. No diagnóstico da

Comunicação Social no Brasil, o documento apontava a existência de um sistema

autoritário, de caráter excludente, privilegiando minorias, tendendo à crescente

concentração de propriedade. Além disso, identificava uma acentuada dependência externa,

tanto em relação à programação quanto às tecnologias. Predominava o sistema comercial,

não havendo participação dos profissionais e do público na decisão sobre as políticas de

comunicação, regulamentadas por uma legislação considerada obsoleta.

A principal proposta do documento era a constituição de um Sistema Público de

Radiodifusão.

Entendemos como sistema público aquele que sendo financiado tanto por contribuições diretas do público como pelo Estado e/ou pela iniciativa privada tem,

Page 42: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

42

todavia, sua programação sob o controle de segmentos organizados da sociedade civil (CEC, 1984).

O CEC defendia que o Conselho Nacional de Comunicação, criado em 1972 em

substituição ao Conselho Nacional de Telecomunicações, deveria cumprir suas finalidades

de assessoramento ao Ministério das Comunicações na formulação e execução das políticas

de radiodifusão, além de elaboração de estudos sobre a programação das emissoras. O CNC

deveria ser composto por representantes de ministérios mais diretamente ligados à questão

da radiodifusão, por entidades de profissionais da área, Universidades, representantes dos

empresários, do poder legislativo, garantindo-se paridade entre os representantes do Estado

e da sociedade civil. A vinculação do CNC ao Ministério das Comunicações era

considerada um erro, uma vez que, de acordo com o documento, “qualquer política de

radiodifusão deve ser implementada a partir do seu interesse sócio-cultural e não da sua

viabilidade técnica” (Id.,1984).

Ao Conselho caberia deliberar sobre os assuntos da radiodifusão, até que uma

alteração na Constituição pudesse reverter a situação em que se encontrava o sistema de

comunicação no Brasil. O caráter precário das concessões de rádio e TV deveria ser

mantido, prevendo-se uma série de condições para a renovação dos contratos. O CEC

também propunha o aumento na programação jornalística e na execução de músicas

brasileiras, restrições à publicidade, em especial ao merchandising, entre outras medidas.

Page 43: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

43

O manifesto de fundação da FNPDC é fruto de um primeiro esforço de um conjunto

de entidades para a organização de um movimento nacional, cuja missão principal, à época,

era a disputa na Constituinte. No documento, a comunicação é entendida como um direito

do cidadão. Uma comunicação democrática, segundo o texto, significaria

a) o acesso igualitário de todas as camadas da população à produção, difusão e consumo do bem cultural; b) a participação dos profissionais na decisão das linhas editoriais dos veículos de comunicação; c) a participação de todos os setores da sociedade na definição de políticas de comunicação (FNPDC, 1984).

Embora a democratização da comunicação esteja quase sempre ligada à questão da

radiodifusão, o manifesto também apresenta medidas referentes a outras áreas: imprensa

escrita, publicidade, artes, censura, tecnologia, liberdade de informação, educação e

comunicação popular. As medidas propunham o controle da sociedade sobre as políticas

das diversas áreas, incentivo às produções regionais e capacitação da sociedade para a

reflexão crítica em relação à comunicação e também para a ação prática. De certa maneira,

essa visão mais ampla da questão da comunicação no país é que vai permear o ideário de

criação do FNDC, na década seguinte.

Em relação à radiodifusão, o documento da Frente defendia que nas concessões de

rádio e TV deveriam ser priorizadas entidades sem fins lucrativos e socialmente

representativas. Além disso, defendia-se que uma mesma entidade não poderia acumular

mais de uma concessão de serviço de radiodifusão. Previa-se a criação de um Conselho

Page 44: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

44

Federal de Radiodifusão, órgão que forneceria pareceres sobre as concessões. Conselhos

municipais e federais seriam responsáveis pela fiscalização da programação das emissoras,

que deveriam fixar limites mínimos de produção regional, garantir espaços para o horário

político gratuito e para programas informativos e de entretenimento gerados por uma

entidade pública nacional. A radiodifusão de baixa potência, a produção independente e o

caráter público das emissoras educativas também eram contemplados no texto.

Menos detalhadas, as respectivas cartas dos jornalistas e dos estudantes de

comunicação não deixam de aprofundar a defesa de um sistema público de comunicação

social, reforçando a idéia de que os veículos deveriam ser explorados apenas por fundações

e entidades públicas sem fins lucrativos. A carta dos jornalistas divulgada após o encontro

em Brasília defendia

a instituição de um novo modelo de comunicação social, com a participação de todos os setores da sociedade na definição de políticas de comunicação. Deve ser garantido, também, o pleno e livre acesso de todos os setores aos meios de comunicação para informar, serem informados e se auto-expressarem (FENAJ, 1986).

Ambos os documentos defendiam que os meios de comunicação deveriam ser

explorados por entidades públicas sem fins lucrativos. O agora denominado Conselho

Nacional de Comunicação seria o órgão responsável por “decidir sobre todas as questões

que dizem respeito à política de comunicação, acompanhar as diretrizes aprovadas e

fiscalizar a respectiva legislação” (Id., 1986).

Page 45: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

45

Para os estudantes de Comunicação Social, igualmente, caberia ao Conselho a

definição de políticas para a constituição de um Sistema Público de Comunicação com

vistas à democratização dos meios de comunicação. Os estudantes defendiam a pluralidade

de fontes e a expressão das culturas regionais e da opinião das minorias.

Esta nova política promoveria a revisão das concessões hoje existentes e estabeleceria critérios para as novas concessões que refreassem o poder dos monopólios e garantissem a diversificação cultural e de informações, com limites mínimos de programação regional estabelecidos em lei (ENECOM, 1986).

O documento alertava para o fato de que “a luta pela democratização da

comunicação não começou na Constituinte, não podendo, portanto, limitar-se a seus

resultados” (Id., 1986), sinalizando, em última análise, o debate sobre a limitação da luta

pela democratização à disputa pela mudança nas leis. Assim, fazia a defesa das rádios livres

e dos movimentos que desafiavam à censura.

Esses documentos refletem as idéias do movimento que criou a Frente e, após a sua

desarticulação, bancou, através da FENAJ, uma emenda popular à Constituição. Como

veremos, a derrota sofrida com a criação de uma Assembléia Constituinte restritiva arrefece

a articulação das entidades. Os resultados obtidos na Constituição são limitados, às vezes

considerados como uma derrota do movimento.

Page 46: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

46

Apesar da falta de recursos, das dificuldades de mobilização e da avaliação inicial negativa da direção da Frente que considerou a luta na Constituinte com uma derrota sua, pela primeira vez o tema da comunicação social foi tratado em um capítulo especial da Constituição, contendo cinco artigos sobre a temática (SOUZA, 1996).

A Constituição, teoricamente, proibiu a formação de oligopólios mas, na visão dos

jornalistas, no documento de 1991, “consolidou o privilégio dos grande grupos de

comunicação instalados no país” (FENAJ, 1991). O Conselho Nacional de Comunicação

foi regulamentado como Conselho de Comunicação Social e teve suas atribuições

drasticamente reduzidas, limitando-se a ser um órgão consultivo do Congresso Nacional.

Vale dizer que ele só foi instalado efetivamente em 2002, mais de dez anos depois do que

estava previsto em lei.

Para a FENAJ, porém, havia lacunas na Constituição, que dependiam de legislação

ordinária, nas quais as entidades deveriam interferir para a transformação do sistema de

comunicação brasileiro. Por isso, convocava a sociedade civil para a criação de um

Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação. O documento retrocede em

algumas reivindicações, se comparadas com as propostas contidas nos documentos escritos

no período pré-constituinte. Como exemplo, a questão do Conselho de Comunicação

Social, visto não mais como um órgão a decidir, mas assessorar e opinar sobre as

concessões, além de democratizar as informações sobre as empresas de radiodifusão. Sua

composição deveria ser, de acordo com o texto, amplamente representativa da sociedade

civil.

Page 47: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

47

Em seu documento, os jornalistas faziam um diagnóstico do sistema de

comunicação brasileiro e apontavam algumas necessidades prementes à época. Nota-se, já,

que não se fala mais em um amplo Sistema Público, mas em garantir que as emissoras

existentes privilegiassem o interesse público e que houvesse abertura para novos

protagonistas, de preferência, entidades públicas. No seu diagnóstico, os jornalistas

observavam

a) Ilegitimidade do predomínio exclusivo, sem mandato e sem representação, de interesses minoritários, sobre os atuais sistemas de rádio e televisão que se constituíram, em larga medida, amparados em ilegalidades, imoralidades, favorecimentos, compadrio e corrupção. b) Necessidade da existência de princípios claros e de regulamentação para a assegurar efetiva compatibilização da particularidade dos interesses que operam as emissoras como interesse público que, em última instância, deve prevalecer. Isto é, a reafirmação e a consolidação de um estatuto de serviço público para a radiodifusão e a definição de princípios éticos que devem orientar sua atuação. c) Necessidade de se assegurar a abertura do sistema de radiodifusão para novos protagonistas, de modo a tornar efetivamente pluralista sua atuação, privilegiando o ingresso de entidades públicas, não estatais e representativas da sociedade civil (Id., 1991).

O documento dos jornalistas serviu como estímulo para rearticulação das entidades,

para a criação do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Em sua quinta

plenária, o FNDC lança as bases para seu programa que, pelo menos até a plenária de 2003

mantinha-se como o principal documento da entidade. O documento defende um conjunto

abrangente de propostas, dentro de um projeto estratégico definido, além de entender, como

o Relatório MacBride, que a democratização da comunicação não possuiu um fim em si

mesmo.

Page 48: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

48

O alcançável é um determinado grau de democratização que será, permanentemente, recorrente ao estágio de desenvolvimento tecnológico, e ao conflito entre as distintas vontades. Sendo assim, percebe-se a necessidade de avanços, sobretudo, na capacidade da sociedade elaborar o próprio conflito humano (FNDC, 1994).

O FNDC se baseia em quatro eixos estratégicos de atuação. O primeiro, e o mais

importante deles, seria a construção do controle público dos meios de comunicação de

massa.

A construção do controle público deverá corresponder ao advento de práticas democráticas na elaboração de políticas públicas para a área das comunicações, gerando critérios para a concessão, posse e uso dos veículos e, sobretudo, a possibilidade de incidência democrática da sociedade sobre o conteúdo dos veículos de comunicação (Id., 1994).

Os outros três eixos são: a reestruturação do mercado na área de comunicações, a

capacitação da sociedade para o conhecimento e a ação sobre os meios de comunicação e,

por fim, a definição de uma política cultural para o país. No entanto, o documento traz mais

uma vez marca das sucessivas derrotas sofridas pelo movimento. O Conselho de

Comunicação Social, por exemplo, ainda não instalado, é admitido apenas como órgão

consultivo.

A grande maioria das propostas de atuação vai na linha da disputa pela mudança na

legislação, fato que se comprovou na prática. A própria direção executiva do FNDC, em

Page 49: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

49

documento de avaliação do movimento, de 2003, admite que alguns eixos de atuação do

Fórum foram hipertrofiados em detrimento de outros.

Page 50: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

50

2 Histórico do Movimento pela Democratização da Comunicação no Brasil

Neste capítulo, pretendemos traçar um histórico do movimento pela

democratização da comunicação no Brasil, principalmente no que tange a atuação das

entidades da sociedade civil.

2.1 O Debate Internacional

O debate internacional sobre a importância da democratização da comunicação se

concentrou fundamentalmente nos fóruns da Unesco (Organização das Nações Unidas para

Educação, Ciência e Cultura), e culminou com a publicação do livro “Um Mundo e Muitas

Vozes – Comunicação e Informação na nossa Época”, conhecido como Relatório

MacBride, em 19802. Esse debate tem grande influência no Brasil, principalmente entre os

meios acadêmicos e nas organizações da Igreja Católica, como veremos adiante, e em

certos aspectos orientou a trajetória do movimento pela democratização da comunicação no

Brasil.

Desde sua fundação, a ONU já afirmava que uma sociedade só seria justa e

democrática se garantisse a liberdade de expressão de seus cidadãos. Fisher aponta que na

“Resolução 59 da Assembléia Geral de 1946 declarou-se que ‘a liberdade de informação é

2 Utilizamos, neste trabalho, a edição publicada no Brasil, em 1983.

Page 51: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

51

um direito humano fundamental e é a pedra de toque de todas as liberdades às quais à ONU

se consagra’” (FISHER, 1982). Famoso tornou-se o artigo XIX da Declaração Universal

dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembléia Geral em 10 de dezembro de 1948, no

qual está escrito que:

Todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar, receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e idéias por qualquer meio de expressão (Declaração Universal dos Direitos Humanos, ONU)3.

Entre as décadas de 1950 e 1970 as atividades da ONU na área da comunicação

passaram a se concentrar na UNESCO, fruto da pressão das chamadas não-alinhadas pelo

estabelecimento de um fluxo equilibrado de informações entre as nações desenvolvidas e

em desenvolvimento. Em 1972, autorizou-se o diretor geral do órgão a promover estudos

sobre os problemas relativos à comunicação na sociedade. O principal debate relacionava a

comunicação com o processo de desenvolvimento dos países. Era o momento em que a

televisão se expandia, principalmente com o desenvolvimento dos satélites. As distâncias

iam sendo estreitadas. Assim, defendia-se que os meios de comunicação fossem

empregados com o objetivo de “acelerar o desenvolvimento, fazendo deles meios também,

e principalmente, de educação, inclusive de educação à distância” (RAMOS, 2000).

3 A versão em português foi retirada diretamente do site oficial da ONU (http://www.unhchr.ch/udhr/lang/por.htm). Existem diferentes versões, embora todas possuam o mesmo conteúdo.

Page 52: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

52

Grosso modo, pensava-se que as desigualdades entre as nações desenvolvidas e em

desenvolvimento poderiam ser suprimidas se houvesse equilíbrio no fluxo de informações.

Chegou a ser proposto que os países deveriam observar padrões mínimos de meios de

comunicação para servir a população. A idéia aos poucos foi perdendo força, porque

“percebeu-se que havia coisas mais importantes em jogo – o conteúdo dos sistemas de

comunicação e o direito do povo de usá-los” (FISHER, 1982)

A idéia de “liberdade de informação e expressão”, muito mais aplicável aos tempos

exclusivos da imprensa escrita, foi aos poucos dando lugar à de um “livre fluxo de

informação”, esta também superada pela defesa de um ”fluxo de informação livre e

equilibrado”, conceito incorporado ao programa da 18a sessão da Conferência Geral da

UNESCO, em 1974. Mas essas expressões ainda se centravam na questão do conteúdo da

comunicação, deixando de lado questões como o acesso aos meios.

À medida que o debate avançava começou a se solidificar a idéia de que, para que

se estabelecesse um fluxo equilibrado de informações, deveriam ser implementadas

Políticas Nacionais de Comunicação (PNC). A idéia aparece pela primeira vez na

Conferência Geral da UNESCO, em 1970 (RAMOS, 1991). A implementação dessas

políticas seria “o melhor caminho para a democratização do acesso das populações à

informação e à educação, logo, ao exercício da política e da cidadania” (RAMOS, 2000).

Numa Unesco hegemonizada por países do bloco socialista, a idéia de uma ação estatal

nesse sentido ganhou força.

Page 53: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

53

Em linhas gerais, as políticas nacionais de comunicação previam [...] uma intervenção explícita do Estado, direta e indireta, fosse pela ação dos meios estatais de comunicação, fosse por regulamentos e normas diversas que ajustassem os eventuais meios privados aos programas, objetivos e metas que compunham o planejamento governamental para toda a sociedade (RAMOS, 1991).

Conforme aponta MacBride no prólogo ao relatório final, a década de 1970 foi um

momento em que “o debate internacional sobre os problemas da comunicação tinha

chegado, depois de muito espalhafato, à fase de enfrentar um bom número de questões”

(UNESCO, 1983). O “espalhafato” girava principalmente em torno das PNC. Os países

liberais, minoritários na UNESCO, sustentavam que a existência de PNC representaria a

interferência do Estado na liberdade de imprensa, considerada um dos pilares da

democracia liberal. A reação centrou-se inicialmente na Sociedade Interamericana de

Imprensa (RAMOS, 2000).

Para equacionar a série de polêmicas levantadas, em 1976 a Conferência Geral da

UNESCO solicitou que fossem estudados os problemas da comunicação na sociedade, a

partir de uma comissão formada por membros “amplamente representativos da diversidade

ideológica, política, econômica e geográfica do mundo” (UNESCO, 1981). O resultado foi

a criação da Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação4,

presidida por Sean MacBride. A Comissão iniciou seus trabalhos em dezembro do ano

4 Membros da Comissão: Elie Abel (Estados Unidos), Hubert Beuve-Méry (França), Elebe Ma Ekonzo (Zaire), Gabriel García Márquez (Colômbia), Sergei Losev (URSS), Mochtar Lubis (Indonésia), Mustapha Masmoudi (Tunísia), Michio Nagai (Japão), Fred Isaac Akporuaro Omu (Nigéria), Bogdan Osolnik (Iugoslávia), Gamal el-Oteifi (Egito), Johannes Pieter Pronk (Holanda), Juan Somavia (Chile), Boobli George Verghese (Índia), Betty Zimmerman (Canadá)

Page 54: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

54

seguinte e concluiu o relatório em novembro de 1979. De acordo com MacBride, no

prólogo do livro, foram realizadas neste período oito reuniões, cuja duração total foi de dois

meses.

O Relatório MacBride, publicado em maio de 1980, veio enunciar a necessidade de

se estabelecer uma “nova ordem mundial mais justa e eficaz da informação e da

comunicação” (que a partir deste ponto vamos denominar NOMIC, sigla pela qual a

expressão ficou conhecida). O relatório é considerado o mais abrangente documento sobre

a importância da democratização da comunicação, tendo se constituído no “ápice de um

precursor movimento internacional” (SOUZA, 1996).

Nos estertores da Guerra Fria, uma comissão formada majoritariamente por países

do bloco socialista trazia para o debate internacional a necessidade de se constituir uma

NOMIC, opondo-se aos monopólios internacionais da comunicação, aos fluxos de

informação em “sentido descendente” e propondo a implementação de Políticas Nacionais

de Comunicação que visassem à democratização do acesso aos meios. A própria

formulação do direito de comunicar dava a idéia da necessidade de algum tipo de

interferência direta para a garantia desse direito e o estabelecimento da democratização da

comunicação.

Cabe ressaltar que, devido ao grau de polêmica dos debates que antecederam a

formação da comissão e a origem dos membros que a compuseram, o texto final do

Relatório carece de uniformidade e apresenta contradições de ordem teórica e política. No

Page 55: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

55

entanto, não se resume a discutir caminhos para a construção de uma NOMIC, embora

apenas isso já explicasse sua relevância. Tampouco se trata de um relatório sobre a

influência dos meios de comunicação na política. A comissão se propôs a se situar “numa

perspectiva histórica, política e sociologicamente mais ampla” (UNESCO, 1983).

Para tanto, elaborou um traçado histórico sobre o ato de comunicar, desde os tempos

em que a comunicação se dava entre indivíduos, sem mediação, apontando a importância

da comunicação para o desenvolvimento da humanidade. Um preâmbulo que, segundo o

Relatório, não é gratuito, uma vez que “perceber melhor os canais graças aos quais se

desenvolveu a comunicação, as formas de que se revestiu no passado, os objetivos que

persegue e os meios de que dispõe, pode abrir perspectivas para o futuro” (Id., 1983). Fiel a

seu objetivo de estudar os problemas da comunicação, não deixou de abordar a questão da

concentração dos meios pela iniciativa privada nem o uso que os governos autoritários

fazem da comunicação. Já naquela época, atentou para o surgimento das novas tecnologias,

que poderiam tanto aumentar o acesso da população aos meios como restringi-lo, caso

concentradas nas mãos de poucos.

Embora o texto considere que a democratização da comunicação não acaba em si

mesma, se constituindo num processo, são apontados alguns caminhos que tornariam mais

democrática a comunicação. Entre eles, ampliação do acesso popular aos meios de

informação, participação de leigos na produção e emissão de programas, estabelecimento

de comunicações alternativas ou de contra-informação, gestão coletiva dos meios de

comunicação, políticas nacionais de comunicação, cooperação internacional para suprir a

Page 56: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

56

falta de recursos os países em desenvolvimento e fortalecimento do espírito crítico dos

cidadãos.

A parte mais inovadora do relatório MacBride retoma a premissa fundamental da NOMIC, ou seja, a pretensão de democratizar a comunicação. O relatório MacBride reconhece a necessidade de ultrapassar as barreiras que impedem uma democrática comunicação, baseando seu pedido no ‘direito de comunicar’. Com esta finalidade, o relatório recomenda que se estabeleçam novas políticas de comunicação social e apresenta também uma outra concepção de comunicação alternativa e horizontal, que prevê o efetivo acesso e a participação de todas as pessoas que passam a ser agentes ativos e não apenas sujeitos passivos da comunicação (PUNTEL, 1994).

As propostas que levariam à NOMIC foram sintetizadas na Resolução de Belgrado,

aprovada em outubro de 1980 pela 21a reunião da Conferência Geral da UNESCO. Os onze

princípios apontavam claramente para a necessidade de se pôr fim aos monopólios da

comunicação, respeitando a pluralidade de fontes e as identidades culturais dos países (ver

anexo 3).

A polêmica que acompanhou o debate sobre a NOMIC e as políticas nacionais de

comunicação desde sua origem acabou por decretar a derrocada do Relatório MacBride. O

presidente Ronald Reagan, dos Estados Unidos, respaldado por Japão e Inglaterra, liderou

um movimento de esvaziamento da UNESCO, por meio principalmente da redução dos

recursos destinados ao órgão da ONU.

Page 57: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

57

O plano da UNESCO para a primeira metade da década de 1990 representou um

retrocesso em relação às propostas do Relatório MacBride. As quatro principais metas

definidas voltavam a mencionar a modernização dos meios de comunicação nos países em

desenvolvimento e o privilégio à produção educativa (MELO, 1991). As metas abordavam

apenas as questões de conteúdo, ignorando o debate sobre a posse dos meios de

comunicação (ver anexo 4). Segundo Puntel, nos planos da UNESCO do final da década de

1990 foram ignorados os “princípios políticos” da NOMIC: o direito de comunicar, as

políticas nacionais de comunicação e a Nova Ordem Econômica Internacional (PUNTEL,

1994).

Nos dias de hoje, a UNESCO segue promovendo debates teóricos sobre a

comunicação, muito mais centrados nos conteúdos e na questão cultural. A União

Internacional de Telecomunicações, órgão também ligado à ONU, convocou para dezembro

de 2003 a Conferência Mundial sobre a Sociedade da Informação.

2.2 A Democratização da Comunicação no Brasil

Costuma-se afirmar que o movimento pela democratização no Brasil surge, de

forma organizada e institucional, com a criação da Frente Nacional por Políticas

Page 58: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

58

Democráticas de Comunicação, organizada por jornalistas, professores, estudantes de

comunicação, apoiados por várias entidades da sociedade civil, durante a redemocratização

do país em 1983/1984 (SOUZA, 1996). O programa do FNDC aponta que as primeiras

propostas de organização de um movimento nacional pela democratização no final da

década de 1970 eram imbuídas de um espírito “oposicionista e ‘negativo’”, e que as

iniciativas surgidas no final dos anos 1980 e início dos 1990 tinham uma perspectiva

imediatista e particularizada. Constituíam-se numa capitulação à “falta de um projeto

político abrangente em troca da satisfação produzida por um ativismo pretensamente ‘mais

concreto’” (FNDC, 1994). Embora admita que as propostas da Frente também não

constituíam um “projeto global”, o documento afirma que:

Em quase vinte anos de luta pela democratização da comunicação transcorrida no Brasil, uma exceção surgiu durante a transição do regime militar, com as propostas apresentadas por alguns setores para o governo Tancredo Neves e que acabaram olimpicamente desconsideradas pela Frente que sustentou Sarney no governo (Id., 1994).

De fato, a atuação institucional e organizada de um conjunto de entidades da

sociedade civil brasileira em prol da implementação de leis que limitassem o poderio das

grandes empresas de comunicação se dá em 1983/1984. No entanto, não é razoável assumir

que o debate e a luta pela democratização da comunicação no Brasil nascem, como que do

nada, no início da década de 1980, a partir do estímulo provocado pela “manipulação do

processo político durante a campanha das ‘Diretas Já’” (SOUZA, 1996), sob pena de se

Page 59: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

59

descontextualizar as origens do movimento e reduzir sua atuação à disputa por mudanças

na legislação do setor.

É preciso considerar alguns fatores que, se não tiveram influência direta no

chamado movimento pela democratização da comunicação, perfazem o contexto histórico

do seu surgimento no Brasil. Um deles diz respeito às iniciativas ligadas à comunicação

popular e alternativa a partir da década de 1960. Além disso, é de se destacar o papel de

algumas entidades cuja fundação é anterior ao surgimento da FNPDC, tendo inclusive

participado da sua criação, como a FENAJ, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a

Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil

(CNBB). É importante considerar que o debate sobre as Políticas Nacionais de

Comunicação chega ao Brasil já na década de 1970, principalmente através de artigos e

publicações da UNESCO e de pesquisadores ligados ao órgão da ONU. Desempenham

papel fundamental também a Associação Brasileira de Pesquisa e Ensino em Comunicação

(ABEPEC) e os setores progressistas da Igreja Católica na América Latina.

Para José Milton Santos, antes do golpe militar de 1964, “a comunicação mediática

não se colocava com uma questão política relevante no Brasil, haja vista que nada consta

sobre ela no elenco das reformas de base defendidas pelos setores progressistas e

capitalizadas pelo governo João Goulart” (SANTOS, 1995). Isso acontecia porque o Brasil

ainda não possuía um sistema de comunicação de massa estruturado e a população do país

ainda era predominantemente rural. Só a partir da instalação da ditadura, quando os

militares passam a encarar a comunicação como um meio de alcançar a meta de integração

Page 60: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

60

nacional, que o sistema se consolida. Surgem a Embratel (1965), o Ministério das

Comunicações e o Conselho Nacional de Telecomunicações (1967), a rede nacional de

microondas e o sistema de transmissão via satélite, a Empresa Pública de Correios e

Telégrafos (1969), a Telebrás e a TV a cores (1972). O próprio regime estimulou o

desenvolvimento dos meios de comunicação, especialmente jornais, concedendo

“empréstimos subsidiados para a construção de novas sedes e modernos parques gráficos,

além de lhes destinarem vultosas verbas publicitárias” (Id., 1995).

Com a instauração do AI-5, em 1968, a repressão recrudesceu e aumentou a censura

aos meios de comunicação de massa. A Rede Globo consolidava-se como “porta-voz” do

regime (o Jornal Nacional vai ao ar em setembro de 1969). Nesse contexto, surgiam

espaços de resistência social.

De um lado, a repressão direta e a censura aos meios de comunicação de massa tentavam bloquear as manifestações e as reivindicações populares, com o objetivo de impor um isolamento ao movimento de base e à sociedade civil como um todo. De outro lado, as próprias condições de marginalidade social e política, acrescidas à crescente pauperização das classes subalternas, construíam pólos de conflitos e resistência (FESTA, 1986).

Nesse período é importante o papel das Comunidades Eclesiais de Base, grupos

originários das periferias das cidades e do campo, apoiados pela Igreja Católica, que

buscavam mobilização social e política a partir dos ensinamentos do Evangelho. É nessa

fase também que surgem alguns das mais importantes publicações alternativas, como

Page 61: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

61

Pasquim, Opinião, Coojornal, Movimento, Em Tempo, entre outros que, “apesar do

bombardeio da censura, travaram uma luta contra o autoritarismo através da

conscientização, mobilização e organização popular” (SANTOS, 1995).

Conforme Santos, no final desse período de resistência e de início do processo de

redemocratização do país, cresce a importância da chamada sociedade civil. Entidades

como a FENAJ, a OAB, a ABI, a CNBB, entre outras, “passam a liderar o processo, dando-

lhe, inclusive, maior legitimidade” (Id., 1995).

Os meios acadêmicos assimilam o debate da UNESCO sobre as políticas nacionais

de comunicação, principalmente nos recém-criados cursos de pós-graduação em

Comunicação e nos meios profissionais ligados ao jornalismo (RAMOS, 2000). Para

Venício Artur de Lima, existiram dois movimentos paralelos, a partir da década de 1970,

responsáveis pelas origens do debate sobre a democratização da comunicação no Brasil. De

um lado, os debates da UNESCO que chegavam de maneira bastante restrita em algumas

universidades. Do outro, a luta das entidades da sociedade civil pela redemocratização do

país, algumas delas ligadas à comunicação, que passaram a colocar na pauta a necessidade

de democratizar também a comunicação. “A discussão da NOMIC chegou de forma

independente ao movimento da sociedade civil pela democratização da comunicação. Num

determinado momento, essas duas coisas acabam se interpenetrando” (LIMA, 2003).

Uma entidade que possui destaque nesta discussão é a ABEPEC, oficialmente

fundada em julho de 1972. O debate mais polêmico envolvia a aplicação da NOMIC nos

Page 62: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

62

países da América Latina. Temia-se com os resultados que as PNC poderiam causar se

aplicados pelos regimes autoritários da época, ainda mais no Brasil, que vivia sob uma

ditadura desde 1964.

Vivia-se aqui o dilema de lutar por políticas nacionais de comunicação, com o risco de que elas de fato fortalecessem o regime autoritário e não o processo de democratização, ou permanecer intocado o sistema de comunicação que favorecia a perpetuação de nossa “dependência cultural” (SANTOS, 1995).

Este debate é feito pelos professores e pesquisadores da Universidade de Brasília,

Luiz Gonzaga Mota e Ubirajara da Silva, intitulada “Crítica das Políticas de Comunicação:

entre o Estado, a empresa e o povo”, que foi apresentada durante o III Congresso da

ABEPEC, em Caxias do Sul (RS), em julho de 1976. A conferência é um diálogo com um

artigo do também professor da UnB, Marco Antônio Rodrigues Dias, que questionava o

conceito de PNC5.

Segundo Ramos (1991), Mota e Silva admitiam que a proposta de implementação

de Políticas Nacionais no Terceiro Mundo tinha um caráter de reação ao liberalismo e, por

isso, havia sido apropriada por grande parte dos setores progressistas nos países

desenvolvidos. Alertavam, no entanto, que por trás de qualquer política há um Estado, cuja

5 A referência desse documento é: DIAS, Marco Antônio Rodrigues. A Responsabilidade Cultural da Radiodifusão. In: Revista da ABT. Ano VI, n.9.

Page 63: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

63

ideologia se reflete nesta política. Entre a “estatização autoritária” e a “comunicação

liberal”, os professores se perguntavam: “com quem ficar?”.

Mota e da Silva, na tentativa de resolver o impasse decorrente da questão do Estado, colocam-se na posição de buscar, teoricamente, uma saída diversa daquela posta pelo debate entre ‘estatização autoritária’ e ‘democracia liberal’. Eles sugerem a participação independente de setores e interesses populares no debate entre estatização e privatização dos meios e mensagens de comunicação e propõem um retorno à cultura brasileira6 como uma terceira opção para os profissionais e teóricos da comunicação (RAMOS , 1991).

O debate da NOMIC também foi assimilado pela Igreja Católica na América Latina,

que se posicionou em um outro segmento da luta pela democratização da comunicação:

“Enquanto vários pesquisadores de renome reivindicavam o estabelecimento de Políticas

Nacionais de Comunicação, outras organizações, destacando-se entre elas a Igreja Católica,

passaram a apoiar a criação de uma comunicação alternativa ou popular” (PUNTEL, 1994).

Neste aspecto, a Igreja Católica pode ser considerada pioneira, principalmente no

uso dos instrumentos de radiodifusão eletrônica. Já em 1947, nasciam as chamadas “escolas

radiofônicas”, a partir da experiência colocada em prática na Colômbia, com a Acción

Cultural Popular (ACPO) – Radio Sutatenza. No Brasil, as escolas radiofônicas

começaram com a experiência de Dom Eugênio Sales, em Natal (RN), no ano de 1958.

6 O retorno à cultura brasileira, para os pesquisadores, representava que “o compromisso de profissionais e teóricos da comunicação deve ser com a cultura brasileira que emana de baixo para cima, aquela que corresponde às classes que historicamente sempre estiveram subjugadas” (MOTA e SILVA, 1976 apud RAMOS, 1991).

Page 64: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

64

Desta iniciativa nasce o Movimento de Educação de Base que, em 1963, contava com 59

sistemas em operação, atingindo 7.353 escolas de 15 estados, tendo sido financiados pelo

governo federal por cinco anos, sob a direção da CNBB (Id., 1994).

A tarefa de organização dos comunicadores cristãos ficou a cargo de entidades

como a Conferência Episcopal Latino-Americana (CELAM), a Associação Católica Latino-

Americana para Rádio e Televisão (UNDA-AL), o Secretariado para América Latina da

Organização Católica Internacional de Comunicação (SAL-OCIC) e a União Católica

Latino Americana de Imprensa (UCLAP). Segundo Puntel, no contexto latino-americano

quatro tipos de prática pastoral foram desenvolvidos: o estabelecimento de organizações de

mídia, a presença maior da Igreja na mídia, a criação de meios de comunicação de grupo e,

por fim, as alternativas à NOMIC.

Segundo a autora, a Igreja Católica nunca fez referência oficial à NOMIC. Isso

ocorreu de forma indireta, de três modos distintos. O primeiro, nos documentos das

Conferências de Medellín (1968) e Puebla (1979). Em segundo lugar, por meio da teologia

da libertação. Por fim, a forma mais expressiva, a partir dos congressos e seminários das

entidades citadas acima, além da União Católica Internacional de Imprensa (UCIP), a partir

do final da década de 1970. Considerado “um marco para a América Latina no terreno da

Comunicação” (PUNTEL, 1994), o documento produzido no encontro de Embu (SP), em

1982, convocava os membros da Igreja a “participar ativamente da implantação da

NOMIC” (EMBU, 1982 apud PUNTEL, 1994).

Page 65: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

65

No Brasil, é importante destacar a atuação da União Cristã Brasileira de

Comunicação, formada por profissionais, escolas, empresas, professores e pesquisadores.

Fundada em 18 de julho de 1969, em São Paulo, a UCBC nasce num contexto em que

aumentava a participação de leigos na Igreja Católica, além de ser esse o período de

surgimento das CEBs e da Teologia da Libertação (GOMES, 1991).

A questão da comunicação passou a ser tema de interesse, em maior ou menor grau,

em diversos setores dos movimentos sociais. No início da década de 1980, “a partir do

acesso a essas novas tecnologias (vídeo, fax, correio eletrônico, computadores etc.), o

movimento popular cria novo fôlego para sua atuação na comunicação” (SOUZA, 1996).

Entre os exemplos dessa nova conjuntura que se desenhava está a criação da Associação

Brasileira de Vídeo Popular, criada em dezembro de 1984 a partir de experiências na

documentação das edições do Congresso Nacional das Classes Trabalhadoras

(CONCLAT). Em 1985 é criado o Movimento Nacional de Rádios Livres e a Associação

de Rádios Livres do Estado de São Paulo (ARLESP), a partir principalmente de uma

experiência na cidade de Sorocaba (SP), onde estudantes colocaram no ar cerca de 56

pequenas emissoras de rádio.

Paralelamente começam a ser desenhadas as primeiras articulações que vão levar à

criação da Frente Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC),

a partir do episódio de manipulação da campanha das Diretas pela Rede Globo.

Page 66: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

66

Esse movimento é paralelo e não está articulado aos projetos e trabalhos desenvolvidos com as novas tecnologias de comunicação. São dois lados de uma mesma moeda que inicialmente são gerados de forma espontânea e independente (SOUZA, 1996).

É o momento de abertura política do país e fortalecimento da sociedade civil,

quando algumas entidades ligadas à comunicação passam a se articular em torno de uma

luta estratégica pela democratização da comunicação. O embrião desse movimento vem da

tese apresentada pela delegação do curso de Comunicação Social da UFSC durante o IV

Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação (ENECOM), em setembro de 1980, em

Curitiba. Intitulado “Os estudantes de Comunicação e a Radiodifusão Brasileira”, o

documento questionava o sistema de comunicação no Brasil mas ainda não falava na

necessidade de uma articulação nacional.

Em 7 de outubro de 1983, durante o IV Encontro Latino-Americano de Faculdades

de Comunicação e o VII Congresso da ABEPEC, em Florianópolis, acontece uma reunião

com entidades representativas e acadêmicas da comunicação, além de outras entidades da

sociedade civil, como a FENAJ, a ABI, a ABEPEC e o CEC de Brasília. A FNPDC é

lançada oficialmente em 24 de setembro de 1984, na Câmara dos Deputados em Brasília.

“O lugar escolhido estrategicamente já demonstrava que o movimento daria uma

importância fundamental às lutas legais, de mudança da legislação, como o Código

Brasileiro de Telecomunicações, Lei de Imprensa, entre outros” (SOUZA, 1996). Para

Santos, é uma mudança substantiva no eixo da luta pela democratização da comunicação

Page 67: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

67

que faz com que o termo PNC dê lugar à expressão Políticas Democráticas de

Comunicação.

Essa proposta estava em sintonia com o salto qualitativo dos setores organizados da sociedade que, sem abandonar os meios de resistência criados até então, vislumbram a possibilidade de transformações institucionais e constitucionais de maior envergadura (SANTOS, 1995).

A Frente conseguiu reunir 45 entidades e 27 parlamentares até que, com a derrota da

emenda Dante Oliveira, no início de 1985, o movimento se desarticula. Entidades de peso

que compunham a frente centram forças na luta por uma Assembléia Nacional Constituinte

Exclusiva, “livre, soberana e democrática”. O presidente José Sarney opta pela alternativa

conservadora, de delegar poderes constituintes aos congressistas eleitos em 1986 (SOUZA,

1996). Apesar das derrotas seguidas, neste período vários setores da sociedade civil e dos

partidos políticos lançam documentos sobre a questão da democratização da comunicação

na constituinte, analisados no capítulo anterior.

Todos estes documentos, com diferentes enfoques, propõem a constituição de um sistema democrático de comunicação no Brasil, o fim dos monopólios, a criação de um Conselho de Comunicação Social, com a participação da sociedade civil, o reconhecimento do direito à comunicação como um novo direito humano, e a liberdade irrestrita de expressão (SANTOS, 1995).

Page 68: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

68

Ante à constituinte, as entidades buscam a rearticulação da Frente. De acordo com

Santos, a partir de 1986, “a ênfase nas políticas democráticas de comunicação é substituída

por democratização da comunicação” (SANTOS, 1995). No entanto, devido à pouca

mobilização do conjunto das entidades da Frente, fica decidido que a FENAJ bancaria uma

proposta de emenda popular, apoiada também pelo Movimento Nacional pela

Democratização da Comunicação (MNDC), criado em São Paulo, em 1987, por jornalistas,

radialistas, professores da USP, rádios livres, etc (SOUZA, 1996).

A exemplo dos debates sobre as Políticas Nacionais de Comunicação na UNESCO,

as propostas da Frente também foram encaradas como ataque à liberdade de imprensa pelas

entidades empresariais da comunicação. Apesar disso, algumas propostas foram aprovadas

na Constituição de 1988, principalmente a proibição de monopólios e oligopólios, a

regionalização da produção e a criação do Conselho de Comunicação Social.

A Frente não consegue se articular após a constituinte. “Depois dos limitados

resultados obtidos na Assembléia Nacional Constituinte, a luta pela Democratização da

Comunicação prosseguiu com iniciativas regionais” (SOUZA, 1996). O processo de

rearticulação das entidades se dá somente após a polêmica edição do debate entre Collor e

Lula, na Rede Globo, nas eleições presidenciais de 1989, quando “deflagrou-se um

movimento de indignação por todo o país, o que fez com que vários setores da sociedade

civil se articulassem para lutar pela democratização da comunicação” (Id., 1996). No ano

seguinte, começam a surgir comitês pela democratização da comunicação em alguns

Page 69: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

69

estados brasileiros. O primeiro é criado em maio, no Rio de Janeiro, com a adesão de 67

sindicatos e entidades da sociedade civil. Em novembro, é fundado o comitê paulista.

No XXIV Congresso Nacional dos Jornalistas, realizado de 31 de outubro a 4 de

novembro de 1991, em Florianópolis, a FENAJ:

(...) tomou uma série de posições que têm a seguinte síntese: é imprescindível a criação, no Brasil, de um movimento de caráter nacional, capaz de aglutinar os setores já mobilizados e ampliar o conjunto das categorias, partidos políticos e entidades preocupadas com a democratização da comunicação (FENAJ, 1991).

Nesse ano, surge o terceiro comitê pela democratização da comunicação, em Minas

Gerais. No momento em que sete Estados (SC, RJ, SP, GO, MG, DF, MT) já contavam

com seus comitês, é realizada uma reunião em Brasília, nos dias 5 e 6 de junho de 1991, na

qual se decide retomar a idéia de um movimento nacional, denominado a partir daquele

momento Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (SOUZA, 1996). Desde

seu início, o movimento demonstra seu caráter “institucional”. Suas principais frentes de

atuação foram a regulamentação e a implantação do Conselho de Comunicação Social, a

disputa da regulamentação da TV a Cabo e a elaboração de uma nova Lei de Imprensa que

o Fórum respondeu, posteriormente, com o projeto da Lei da Informação Democrática,

além ainda da campanha de reestruturação da Rede Manchete (FENAJ, 1994).

Page 70: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

70

Em 1994 o Fórum chegou a contar com 44 comitês regionais e comissões pró-

Comitês, além de 32 entidades nacionais (FNDC, 1994). É neste ano que o movimento

aprova as “Bases de um Programa para a Democratização da Comunicação no Brasil”, em

sua quinta plenária, realizada em Salvador.

Em 1994/1995, é aprovada a Lei do Cabo, considerada uma das conquistas do

FNDC, uma vez que, entre outras questões, garante a criação dos canais de acesso público

(Câmara, Senado, Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores, Canais

Universitários, Canais Comunitários e Canais Educativo-Culturais). Outro fato importante

na história do FNDC foi a elaboração da lei de radiodifusão comunitária, entre 1996 e

1997, período no qual é criada a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária

(ABRAÇO).

A sexta plenária, realizada no ano de 1995, em Belo Horizonte, demarca um período

em que o Fórum começa a se desarticular,

(...) exaurido pelas disputas internas e pelas fortes resistências à articulação da sociedade civil geradas pelo governo FHC e a sua decorrente desmobilização, além de renovadas reações contrárias do empresariado de comunicação, atraído pelo governo com a retomada de práticas de barganha e clientelismo (FENAJ, 2001).

Várias tentativas de retomada do FNDC surgiram entre 1998 e 2000, principalmente

como reação a atitudes do Governo Federal, como a Proposta de Emenda Constitucional

Page 71: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

71

que acabou permitindo a abertura do capital das empresas de comunicação em 30% a

grupos estrangeiros. Em 2001, o FNDC consegue realizar sua oitava plenária, em Brasília.

É o momento em que o Fórum intensifica seu processo de rearticulação: além da plenária

realizada no Rio de Janeiro, em 2002, comitês voltam a funcionar no Rio Grande do Sul,

São Paulo e Rio de Janeiro. O ano de 2003 é de indefinições. O debate sobre as práticas

internas do FNDC volta à tona, sendo marcada uma reunião de avaliação do movimento em

São Paulo.

São produzidos quatro documentos de avaliação da trajetória do FNDC: “Por que

reconstruir o FNDC?”, pela coordenação executiva do Fórum, composta por FENAJ,

ABRAÇO, Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (ENECOS),

Conselho Federal de Psicologia (CFP), Federação Interestadual dos Trabalhadores em

Empresas de Radiodifusão e Televisão (FITERT); “Avaliação da atuação do FNDC

(nov2001 – jan2003)”, pela ENECOS; “Remontando as bases de um FNDC possível”, por

Álvaro Neiva e Adílson Cabral; e “Carta ao FNDC”, produzido por integrantes do Comitê

carioca, sendo enviado três vezes, por entidades distintas, porém com o mesmo conteúdo. O

teor dos três últimos textos é de crítica ao movimento, no que diz respeito ao modo de sua

atuação, das sucessivas derrotas aceitas como vitórias e também questões relativas a

práticas internas do FNDC.

O Conselho de Comunicação Social só é instalado em 2002, assim mesmo como um

órgão auxiliar do Congresso e com reduzida participação da sociedade civil. Além disso,

também as aprovações da Lei do Cabo e da Lei de Radiodifusão são vistas como “derrotas

Page 72: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

72

de fato vendidas como vitórias de direito” (CABRAL e NEIVA, 2003), pelo caráter

restritivo que sofreram. Basicamente, os três textos apontam a falta de sustentação popular

do FNDC, que teria assumido um caráter cupulista e limitado à disputa por mudanças na

legislação.

(...) a pior derrota, de todos nós que fazemos parte do FNDC, é não termos conseguido inserir, na sociedade civil, a importância da luta e do debate sobre a comunicação social e a sua democratização. Esta derrota nos levou muitas vezes a aceitar aquilo que era possível no embate de forças com os oligopólios da comunicação e não o que era desejável para a sociedade (COMITÊ RIO, 2003).

Para Venício Artur de Lima, questões consideradas como conquistas do movimento,

como a Lei do Cabo e o Conselho de Comunicação Social, são passíveis de diversas críticas

não apenas por seus resultados com pelo processo de condução das negociações. Segundo

ele, numa avaliação das conquistas do movimento, os resultados podem ser considerados

muito pequenos. Ele aponta uma outra questão, que pudemos evidenciar com a análise dos

principais documentos: “O movimento e sobretudo o próprio FNDC ficaram mais

acanhados em relação às suas reivindicações originais” (LIMA, 2003).

Em junho de 2003 é marcada a X Plenária do FNDC, para os dias 19, 20 e 21 de

setembro do mesmo ano, na sede do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo. O ambiente é

de crise, marcada pela existência de apenas três comitês regionais (SC, RS e RJ), muitas

críticas e algumas tentativas de rearticulação, evidenciadas no documento da executiva da

entidade.

Page 73: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

73

Porque as definições sobre a introdução da tecnologia digital na comunicação social eletrônica, a reestruturação do mercado de mídia no Brasil, a política de concessão de outorgas de radiodifusão e a revisão da legislação da área estão em curso, ou prestes a serem deflagradas, ainda sem uma diretriz clara por parte do governo federal. E é justamente neste vácuo de propostas que o acúmulo e a experiência desenvolvidos pelo FNDC poderiam se mostrar necessários (FNDC, 2003).

Na outra frente da luta pela democratização da comunicação, os movimentos de

mídia alternativa e popular têm contribuído de diversas formas. Rádios comunitárias,

veículos sindicais, movimentos de contra-informação, entre outras iniciativas, têm a

capacidade de não só fazer um enfrentamento aos monopólios e oligopólios da

comunicação como também de promover a reflexão entre os movimentos sociais e

populares sobre a importância da mídia na sociedade contemporânea, além de transformar o

“cidadão comum” em sujeito ativo do processo de comunicação.

Alguns casos exemplares podem ser citados, como a própria criação da Associação

Brasileira de Radiodifusão Comunitária, além da Associação Mundial das Rádios

Comunitárias. O movimento de rádios comunitárias tem se apresentado como um dos

principais focos de resistência aos monopólios de mídia, sendo alvo de ataques freqüentes

da Polícia Federal sob determinação da Agência Nacional de Telecomunicações

(ANATEL).

Page 74: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

74

Movimentos de cunho anarquista também têm atuado na chamada mídia alternativa

ou de contra-informação: um exemplo é o Centro de Mídia Independente, movimento

mundial criado para fazer a cobertura alternativa das manifestações antiglobalização em

Seattle, e que hoje no Brasil possui grupos trabalhando nas principais capitais brasileiras. A

principal característica desses grupos é o uso da internet para promover uma espécie de

perturbação na ordem comunicacional vigente.

Na esfera institucional, setores do Congresso Nacional, em conjunto com

representantes da sociedade civil, têm se dedicado a campanhas de fiscalização dos

programas e de esclarecimento à população sobre os meios de comunicação social. É o caso

da campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, iniciativa da Comissão de

Direitos Humanos da Câmara dos Deputados com entidades da sociedade civil, que tem

como objetivo acompanhar a programação da televisão e denunciar ataques ao direitos

humanos.

Além disso, hoje cada vez mais os sindicatos, entidades, movimentos, procuram

desenvolver seus próprios meios de comunicação. O Movimento dos Trabalhadores Rurais

Sem-Terra, por exemplo, possui site na Internet, boletim por correio eletrônico, jornais,

além de estarem participando do projeto “Brasil de Fato”, criado para ser um jornal de

esquerda na imprensa brasileira. O próprio meio Internet tem sido o ambiente de articulação

de redes de pessoas e movimentos sociais.

Page 75: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

75

Todas essas iniciativas, e muitas outras, embora não façam parte de um movimento

unificado, contribuem à sua maneira pela democratização da comunicação – pelo menos

este é o objetivo de muitos desses movimentos e entidades. Merecem um estudo

aprofundado, principalmente sobre o impacto das novas tecnologias nas concepções e nas

práticas dos movimentos sociais.

Page 76: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

76

CONCLUSÃO

Com este trabalho, pretendemos fazer uma discussão introdutória sobre o que se

entende por uma comunicação democrática e quais são os caminhos para o estabelecimento

da democratização da comunicação. Além disso, elaboramos um histórico do movimento

pela democratização da comunicação no Brasil, em suas diversas características,

procurando entender de que modo sua concepção de comunicação democrática e suas

reivindicações nesse sentido foram sendo colocadas ao longo da trajetória. Na parte

histórica, nos dedicamos mais às origens do debate, até porque atualmente as iniciativas

estão tão fragmentadas quanto os próprios conceitos que as orientam.

A principal base de defesa da democratização da comunicação é, justamente, a idéia

de que a comunicação hoje se constitui num dos direitos humanos. Isso significa que a

população não tem o direito apenas de receber informação de qualidade, a partir de uma

pluralidade de fontes, mas de ser sujeito da comunicação, trocando informações e opiniões,

sem restrições de qualquer ordem. Embora o direito à informação ainda seja defendido por

Page 77: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

77

alguns setores do movimento, é no direito à comunicação que reside a importância de sua

democratização. A própria formulação do direito de comunicar, contida no Relatório

MacBride, dá conta de que são necessárias ações no sentido de garantir o direito à

comunicação.

Considerada a comunicação como um direito de todo o cidadão, o processo de sua

democratização implica amplo acesso e participação de toda a população aos meios e à

definição das políticas de comunicação. A democratização da comunicação é vista então

como um processo a ser constantemente buscado, que tem como base a idéia de que os

indivíduos sociais e coletivos devem estabelecer um diálogo democrático e equilibrado via

meios de comunicação.

Só chegamos a esses conceitos com o retorno às origens do debate, principalmente o

relativo à NOMIC, no qual estão expressas as idéias centrais do que seria a comunicação

democratizada. Bandeira de diversas entidades e movimentos sociais, a democratização da

comunicação, a nosso ver, foi banalizada a ponto de o próprio movimento entrar em

contradição.

Em relação às suas práticas, a sociedade civil brasileira tem atuado, basicamente,

em duas frentes. A primeira delas é o estabelecimento de iniciativas de comunicação

alternativa, nos movimentos sociais e populares, nas comunidades, até mesmo nos meios

profissionais. Embora possamos dizer que a chamada imprensa alternativa exista desde o

surgimento da própria imprensa, é nos meios de radiodifusão eletrônica que os movimentos

Page 78: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

78

sociais desenvolveram as mais importantes investidas. A começar pelos setores

progressistas da Igreja Católica, com o uso do rádio nos Movimentos de Educação de Base

(MEB), passando pela criação da Associação Brasileira de Vídeo Popular, hoje extinta,

culminando com um crescente número de rádios comunitárias e alternativas pelo País.

Embora muitas vezes desarticuladas entre si e outras vezes reproduzindo a lógica dos

veículos comerciais, as rádios comunitárias, bem como todas as iniciativas de comunicação

horizontal, alternativa ou popular, têm servido não apenas como resistência à censura e ao

monopólio dos meios, mas para gerar o debate sobre a importância do acesso e da

participação de toda a população na comunicação.

É a partir da primeira metade da década de 1980 que o movimento pela

democratização da comunicação tem sua primeira organização institucional, com a Frente

Nacional de Lutas por Políticas Democráticas de Comunicação (FNPDC). É o início de

uma segunda frente de atuação do movimento, de luta pela limitação do poder dos

monopólios e pelo controle público dos meios de comunicação a partir de mudanças na

legislação. Esse movimento culmina na criação do Fórum Nacional pela Democratização da

Comunicação (FNDC), de conquistas e derrotas ao longo de sua trajetória, que tem um

programa estratégico bastante amplo e audacioso, embora tenha retrocedido em diversos

pontos a cada derrota sofrida.

O FNDC mereceu destaque em nosso trabalho porque, em seu auge, congregou uma

vasta gama de entidades e é dele que partiram importantes formulações teóricas e

reivindicações da sociedade civil. Não o consideramos, com isso, o único espaço onde se

Page 79: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

79

articula um movimento pela democratização da comunicação que, como dissemos, assume

diversas características, cada uma com sua importância.

Dessa diversidade de características surge uma falsa dicotomia. A de que a “ação

institucional” exclui a “ação direta”, e vice versa. Ora, sabemos que, de um lado, há um

sistema de comunicação no Brasil que precisa ser modificado e, de outro, que essas

mudanças não serão possíveis nem mesmo frutíferas se a sociedade não for capaz de

entender a importância da democratização da comunicação, ainda mais num país em que a

crítica da mídia é quase inexistente. Por isso optamos por entender o movimento pela

democratização da comunicação no Brasil em todas suas frentes de atuação, até porque sua

fragmentação, embora perca o sentido de uma luta conjunta e estratégica, pode servir

também para disseminar o debate sobre a importância da comunicação. Se o próprio

Relatório MacBride aponta diversas alternativas para a democratização da comunicação,

não é razoável apontar apenas uma delas como referência de luta.

Em linhas gerais, pode-se dizer que o movimento mais ligado à disputa de

mudanças na legislação tem como horizonte a construção do controle público dos meios de

comunicação, expresso inclusive como o principal eixo estratégico do FNDC. Nos

primeiros documentos das entidades da sociedade civil na época da constituinte, porém, a

defesa era a de um radical Sistema Público de Comunicação, no qual à sociedade caberia a

tarefa de definir as políticas de comunicação e controlar a programação das emissoras, que

deveriam ser eminentemente públicas. Há, claramente, um retrocesso. No Sistema Público,

todos os meios de comunicação devem ser públicos – nem estatais, nem privados. Ao que

Page 80: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

80

nos parece, a idéia de “controle público” dá a entender de que se aceita a existência de

meios de comunicação privados, sobre os quais o público deveria apenas exercer controle,

principalmente no que tange à programação.

O retrocesso na reivindicação evidencia-se no famigerado Conselho de

Comunicação Social. Na década de 1980, reivindica-se a constituição de um Conselho

Nacional de Comunicação, que deveria ser amplamente representativo da sociedade civil e

responsável pela decisão sobre as concessões – somente a fundações públicas – e pela

fiscalização das programações. Instalado dez anos depois de sua regulamentação, com o

nome modificado, o Conselho de Comunicação Social tem hoje, além de funções

meramente consultivas, restrita participação da sociedade civil.

Esse retrocesso representado pelo recuo na reivindicação em relação ao CCS se

evidencia em outras questões do programa do FNDC. Ao propor a reestruturação dos

mercados, por exemplo, o FNDC aceita a apropriação privada dos meios de comunicação e,

assim, dá indícios de defender uma sociedade em que decisões serão tomadas por

improváveis consensos entre setores com interesses tão distintos.

O primeiro diagnóstico, logicamente, é o da dificuldade de mudanças na legislação

em um Congresso em que boa parte dos deputados já foi agraciada com concessões de

rádio e televisão. Além disso, nota-se que a sociedade em geral e os próprios movimentos

sociais ainda não se deram conta da importância de se combater os monopólios da

comunicação no Brasil. Os movimentos sociais precisam entender que a luta pela

Page 81: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

81

democratização da comunicação incide sobre suas lutas específicas. De outra parte, deve se

trabalhar constantemente para que a população entenda as razões de se democratizar a

comunicação, como acontece, por exemplo, com a luta pela reforma agrária, hoje

amplamente debatida no Brasil. Não será a mídia, que agenda o debate político no país, que

irá fazer sua autocrítica. A despeito dessas dificuldades, porém, o movimento social deve

ter como meta, para a democratização da comunicação, a democratização do próprio

debate.

De que debate estamos falando? Até aqui, nos limitamos a fazer uma espécie de

mapeamento geral sobre os principais conceitos e reivindicações do movimento pela

democratização da comunicação. Com o decorrer do estudo, porém, fomos nos deparando

com questões que indicaram a existência de um debate de fundo ainda pouco explorado.

Um debate que coloca, dentro do próprio movimento, diferentes concepções de sociedade

em disputa.

A discussão sobre a democratização da comunicação ainda se limita aos

encaminhamentos práticos, ou seja, sobre as mudanças necessárias na legislação e sobre os

meios de enfrentamento aos monopólios. Garantir o acesso e a participação de todos no

processo da comunicação é uma idéia ousada que precisa ser defendida, ainda mais em um

país como o Brasil, no qual a exclusividade de tudo o que é dito e ouvido fica por conta de

um seleto grupo de grandes empresas familiares. No entanto, no seio do próprio

movimento, é um equívoco contentar-se com essa discussão. A pergunta a ser feita é: que

democratização da comunicação queremos?

Page 82: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

82

Acredita-se que, nesta sociedade que temos, haverá a situação idealizada em que os

diferentes segmentos, com seus interesses conflitantes entre si, conseguirão alcançar

consensos – e que a comunicação será o espaço para que isso aconteça? Ou admite-se que

não existem consensos numa sociedade em que um grupo subjuga outro – e que a

comunicação deve ser justamente o espaço de disputa desses interesses? Como admitir

uma comunicação democrática dentro da sociedade capitalista? Esse debate de fundo, aqui

simploriamente colocado, permeia a atuação do movimento e, se ele não é feito, acaba

tornando a luta pela democratização um processo confuso em que não se sabe que tipo de

sociedade se tem como meta. Discutir a democratização da comunicação é discutir que

sociedade queremos e colocar em cheque o próprio conceito de democracia.

São dúvidas e inquietações que ficam ao final deste trabalho. A única saída é a

recuperação dos conceitos e o aprofundamento do debate. Vivemos um momento em que a

Internet abre uma nova perspectiva e demanda uma nova postura dos movimentos sociais

que, neste campo, sempre tiveram sua atuação voltada à questão da radiodifusão. Brecht,

calejado com as derrotas da sociedade civil e com o avanço do capitalismo, talvez não

sonhasse para a Internet o mesmo que sonhou para o rádio. É por isso que só um debate

sério sobre a democratização da comunicação, que não se limite às práticas do movimento,

mas perfaça as questões acima colocadas, será capaz de fazer com que a sociedade civil

assuma uma postura crítica diante da convergência tecnológica e tenha claro o norte

político de sua atuação. Que ele seja feito daqui pra frente.

Page 83: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

83

OBRAS CONSULTADAS

BRANT, João (2002). Políticas Nacionais de Radiodifusão (1985-2001) e Espaço Público. Monografia de conclusão do curso de graduação. USP: São Paulo, 2002. _________ (2003). Entrevista com o autor. Julho de 2003. CABRAL, Adílson. Democratizar a comunicação para a democratização da sociedade. Disponível em <http://www.ucbc.org.br/artigos.asp?ident=10>. s.d. COMPARATO, Fábio Konder (2000). A Democratização dos Meios de Comunicação de Massa. In: BUCCI, Eugênio (org.). A TV aos 50. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2000. DANTAS, Marcos (1996). A lógica do capital-informação: a fragmentação dos monopólios e a monopolização dos fragmentos num mundo de comunicações globais. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996. FESTA, Regina e SILVA, Carlos Eduardo Lins da (orgs.) (1986). Comunicação popular e alternativa no Brasil. São Paulo: Paulinas, 1986. FISHER, Desmond (1982). O Direito de Comunicar: Expressão, Informação e Liberdade. São Paulo: Brasiliense, 1982.

Page 84: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

84

FURASTÉ, Pedro Augusto. Normas Técnicas para o Trabalho Científico. Explicitação das Normas da ABNT. Porto Alegre: s.n., 2003. GIL, Antonio Carlos (1995). Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas, 1995. GOMES, Pedro Gilberto (1991). Para uma História da UCBC. Unisinos: Porto Alegre, 1991. GOMES, Wilson (1993). Pressupostos Ético-Políticos da Questão da Democratização da Comunicação. In: PEREIRA, Carlos Alberto Messeder & NETO, Antônio Fausto (org). Comunicação e cultura contemporâneas. Rio de Janeiro: Notrya, 1993. GUARESCHI, Pedrinho (2003). Entrevista com o autor. Porto Alegre, Junho de 2003. LIMA, Venício Artur de (2001a). Comunicação, Política e Cidadania. In: Revista Fronteiras – estudos midiáticos. Vol. 3, n. 2, dezembro de 2001. _________ (2001b). Mídia: Teoria e Política. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2001. _________ (2003). Entrevista com o autor. Porto Alegre, Julho de 2003. MELO, José Marques de (1991). UNESCO, NOMIC y America Latina. De la Guerra Fria al espíritu de buena voluntad de MacBride. In: Comunicación y Sociedad, n. 12, maio-agosto de 1991, p. 11-27. Guadalajara, México. PEREIRA, Moacir. A Democratização da Comunicação e o Direito à Informação na Constituinte. São Paulo: Global, 1987. PUNTEL, Joana T (1994). A Igreja e a Democratização da Comunicação. São Paulo: Paulinas, 1994.

Page 85: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

85

_________ (1991). As Políticas Nacionais de Comunicação e a Crise dos Paradigmas. In: Textos de Comunicação e Cultura, n.27, p. 42-50. Salvador: UFBA, 1991 RAMOS, Murilo (2000). Televisão a cabo no Brasil: desestatização, reprivatização e controle público. In: Ciberlegenda, número 3, 2000. Disponível em <http://www.uff.br/mestcii/ramos.htm> RAMOS, Murilo; BAYMA, Israel e LUZ, Dioclécio (2001). Por Políticas Democráticas de Comunicação – Contribuição ao ideário de reconstituição do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Brasília, fevereiro de 2001 ROCHA, José Carlos (1995). A Luta pela Democratização da Comunicação no Brasil. In: Revista da ADUSP. São Paulo, Abril de 1995. SANTAELLA, Lucia (2001). Comunicação e Pesquisa: projetos para mestrado e doutorado. São Paulo: Hackers Editores, 2001. SANTOS, José Milton (1995). A Democratização da Comunicação nos Discursos da Sociedade Civil Brasileira – 1974/1994. In: Revista Ordem/Desordem. Belo Horizonte, n. 12, p. 9-16, Agosto de 1995. SOUZA, Marcio Vieira de (1996). As Vozes do Silêncio: o movimento pela democratização da comunicação no Brasil. Florianópolis: Diálogo, 1996. UNESCO (1983). Um Mundo e Muitas Vozes: comunicação e informação na nossa época. Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação. Trad.: Eliane Zagury. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1983. DOCUMENTOS CABRAL, Adílson & NEIVA, Álvaro (2003). Remontando as Bases de um FNDC Possível. Disponível em <http://www.fndc.org.br>. Rio de Janeiro, 2003. CENTRO DE ESTUDOS DE COMUNICAÇÃO E CULTURA (1984). A Transição Política e a Democratização da Comunicação Social. Brasília, outubro de 1984.

Page 86: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

86

COMITÊ RIO PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO. Carta ao Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Disponível em <http://www.fndc.org.br>. Rio de Janeiro, 2003. COORDENAÇÃO EXECUTIVA DO FNDC (2003). Por que reconstruir o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação?. Disponível em <http://www.fndc.org.br>. Brasília, abril de 2003. ENCONTRO NACIONAL DOS ESTUDANTES DE COMUNICAÇÃO (1986). Carta de Brasília. Brasília: 26 de julho de 1986. EXECUTIVA NACIONAL DOS ESTUDANTES DE COMUNICAÇÃO SOCIAL (2003). Avaliação da atuação do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação – FNDC (nov2001 – jan2003). São Paulo, 2003. FEDERAÇÃO NACIONAL DOS JORNALISTAS (1986). Carta de Brasília. Brasília: 21 de abril de 1986. _________ (1991). Proposta dos Jornalistas à Sociedade Civil. Joinville: UFSC, 1991. _________ (2001). Histórico do Fórum. Disponível em <www.fndc.org.br>. Brasília, 2001. FÓRUM NACIONAL PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO (1994). Bases de um Programa para a Democratização da Comunicação no Brasil. Disponível em <http://www.fndc.com.br>. Salvador, Julho de 1994. _________ (1995). Ata de Reunião da Fundação do Fórum Nacional Pela Democratização Da Comunicação. Disponível em <http://www.fndc.org.br>. Brasília, 1995. FRENTE NACIONAL DE LUTA POR POLÍTICAS DEMOCRÁTICAS DE COMUNICAÇÃO. Manifesto de Fundação. Brasília: 4 de Julho de 1984.

Page 87: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

87

ANEXO 1 - PRINCIPAIS SIGLAS ABEPEC: Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Comunicação ABI: Associação Brasileira de Imprensa ABRAÇO: Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária ABVP: Associação Brasileira de Vídeo Popular ACPO: Acción Cultural Popular AMARC: Associação Mundial de Rádios Comunitárias ARLESP: Associação de Rádios Livres do Estado de São Paulo CEB: Comunidade Eclesial de Base CEC: Centro de Estudos em Comunicação e Cultura CFP: Conselho Federal de Psicologia CNBB: Confederação Nacional dos Bispos do Brasil CONCLAT: Congresso Nacional das Classes Trabalhadoras CMI: Centro de Mídia Independente ENECOS: Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social ENECOM: Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social FENAJ: Federação Nacional dos Jornalistas FITTERT: Federação Interestadual dos Trabalhadores em Empresas de Radiodifusão e Televisão FNDC: Fórum Nacional pela Democratização das Comunicações FNPDC: Frente Nacional de Luta por Políticas Democráticas de Comunicação MNDC: Movimento Nacional pela Democratização da Comunicação NOMIC: Nova Ordem Mundial da Informação e da Comunicação

Page 88: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

88

OAB: Ordem dos Advogados do Brasil ONU: Organização das Nações Unidas PNC: Políticas Nacionais de Comunicação SAL-OCIC: Secretariado para América Latina da Organização Católica Internacional de Comunicação UCBC: União Cristã Brasileira de Comunicação UCIP: União Católica Internacional de Imprensa UCLAP: União Católica Latino-Americana de Imprensa UNDA-AL: Associação Católica Latino-Americana para Rádio e Televisão UNESCO: Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura

Page 89: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

89

Anexo 2 – DATAS SIGNIFICATIVAS DO MOVIMENTO PELA DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO

1908 – Fundação da ABI. 1927-1928 – Criação da União Católica Internacional de Imprensa (UCIP), na Bélgica. 1928 – criação da Organização Católica Internacional de Cinema (OCIC). 1928 – Criação da Organização Católica Internacional de Rádio e Televisão (UNDA), na Alemanha. 1945 – Carta das Nações Unidas. 1945 – Constituição da Unesco. 1947 – Surgimento da Rádio Suatenza, com a ACPO. 1948 – Declaração Universal dos Direitos Humanos. 1948 – Resolução 7.22 da Unesco sobre o Livre Fluxo de Informações (Beirute). 1952 – Criação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil. 1958 – Início das escolas radiofônicas, lideradas por dom Eugênio Sales, em Natal (RN). 1961 – Começo do Movimento de Educação de Base (MEB) no Brasil. 1964 – Golpe empresarial-militar no Brasil. 1965 – Começo das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) no Brasil. 1965 – Criada a Embratel. 1967 – Surgimento do Ministério das Comunicações e do Conselho Nacional de Telecomunicações. 1968 – Instalação do Ato Institucional número 5. 1968 – Lançamento do documento da Conferência de Medellín. 1969 – Publicação do artigo de Jean D’Arcy, proclamando o direito de comunicar. 1969 – fundação da União Cristã Brasileira de Comunicação

Page 90: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

90

1969 – Criação da Empresa Pública de Correios e Telégrafos no Brasil. 1970 – 16a reunião da Conferência Geral. Delegações de vários países em desenvolvimento colocaram explicitamente o que caberia qualificar de problemática da distribuição desigual dos meios de informação. Nesta década, começam as discussões sobre a NOMIC, articuladas pelas nações não-alinhadas. 1972 – Declaração dos Princípios-Guia sobre o Uso de Radiodifusão por Satélite para o Livre Fluxo de Informações, a Disseminação da Educação e um Maior Intercâmbio Cultural. 1972 – autorizou-se o diretor geral a promover o desenvolvimento de pesquisas em matérias de comunicação. 1972 – Fundação da ABEPEC. 1972 – Surgem a Telebrás e a TV a cores no Brasil. 1972 – Criação do Conselho Nacional de Comunicação no Brasil. 1974 – aprovação da Nova Ordem Econômica Internacional (NOEI) em sessão especial da Assembléia das Nações Unidas. 1975 – criação de uma Associação de Agências de Notícias Não-alinhadas. 1976 – encontro em Tunis das nações não-alinhadas com enfoque especial em comunicação. 1976 – A 19a reunião da Conferência Geral da ONU encarrega Amadou-Mahtar M’Bow de proceder um exame geral dos problemas da comunicação na sociedade da época. Constitui-se, assim, a Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da Comunicação. 1976, julho – conferência em San José, Costa Rica. Sugere-se a criação dos Conselhos Nacionais de Comunicação. 1976 – Nairóbi, 19a reunião da Conferência Geral. Tamanhas eram as pressões contrárias que “a única solução realista consistia em prosseguir o debate e adiar qualquer solução” (Sean MacBride, na apresentação do Relatório). 1976, julho – Realização do terceiro Congresso da ABEPEC, em Caxias do Sul (RS). 1977, dezembro – início dos trabalhos da Comissão da UNESCO. 1978, abril – reunião internacional em Estocolmo.

Page 91: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

91

1977 – primeiro Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação 1978 – 20a reunião da Conferência Geral. Apresentado relatório provisório da Comissão. Aprovada a “Declaração sobre os Meios de Comunicação de Massa”. 1978 – Paris. Publicação do texto da “Declaração dos princípios fundamentais relativos à contribuição dos meios de comunicação de massas para o fortalecimento da paz e a compreensão internacional, para a promoção dos direitos humanos e para a luta contra o racismo, o apartheid e a provocação à guerra”. 1979, novembro – término dos trabalhos da Comissão. 1979 – Lançamento do documento de Puebla. 1980 – Publicação do Relatório MacBride, pela UNESCO. 1982 – encontro da Igreja Católica sobre comunicação, em Embu. Documento lançado é considerado uma “mini-NOMIC” na Igreja. 1983 – Publicação do Relatório MacBride no Brasil. 1983 – reunião de entidades para a criação da FNPDC, durante o sétimo Congresso da ABEPEC, em Florianópolis. 1984 – Publicação do documento “A Transição Política e a Democratização da Comunicação Social”, do CEC. 1984, setembro – Lançamento oficial da FNPDC. 1984 – Criação da ABVP. 1985 – retirada dos EUA da UNESCO. 1985 – Criação do Movimento Nacional de Rádios Livres e da ARLESP. 1985 – Derrota da Emenda Dante Oliveira no Congresso Nacional. 1986 – Retirada da Inglaterra da UNESCO. 1986 – Publicação da “Carta de Brasília”, no Encontro Nacional dos Jornalistas. 1986 – Publicação da “Carta de Brasília”, no Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social. 1987 – Fundação do MNDC, em São Paulo.

Page 92: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

92

1987 – Instalação da Assembléia Nacional Constituinte. 1989 – UNESCO expõe mudança no foco de atuação no campo da comunicação, no lançamento do Terceiro Plano Intermediário (1990-1995) na XXV Conferência Geral. 1989 – Debate Lula x Collor na Rede Globo. 1991 – Criação da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social. 1991 – Lançamento do documento “Proposta dos Jornalistas à Sociedade Civil”, pela FENAJ. 1991 – Fundação do FNDC. Em Junho, é realizada a primeira plenária, em Brasília. 1991, Outubro – Segunda plenária do FNDC, em Brasília. 1992 – Terceira Plenária do FNDC, em São Paulo. 1993 – Quarta plenária do FNDC, no Rio de Janeiro. 1994 – Quinta plenária do FNDC, em Salvador. Publicação do documento “Bases de um programa para a Democratização da Comunicação”. 1994-1995 – Aprovação da Lei do Cabo. 1995 – Sexta plenária do FNDC, em Belo Horizonte. 1996 – Criação da ABRAÇO. 1997 – Sétima plenária do FNDC, no Rio de Janeiro. 2001 – Realização do XXV Enecom, em Brasília, com o tema “Democratização da Comunicação: quem está no controle?”. 2001 – Oitava plenária do FNDC, em Brasília. 2002 – Instalação do Conselho de Comunicação Social, depois de 10 anos de sua regulamentação.

Page 93: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

93

ANEXO 3 – RESOLUÇÃO DE BELGRADO

Trecho retirado do artigo “UNESCO, NOMIC y America Latina. De la Guerra Fria al espíritu de buena voluntad de MacBride”, de José Marques de Melo (1991). La esencia de las propuestas de la Comisión MacBride se encontró consustanciada en la Resolución de Belgrado, aprobada por la vigésima primera sesión de la Conferencia General de la UNESCO, en octubre de 1980 (Shea y Jarret 1984:82-83). Esta resolución contiene once princípios, en los cuales se debería basear el NOMIC (Nuevo Orden Mundial de la Información y de la Comunicación): 1. Eliminación de los desquilibrios y desigualdades que caracterizan la situación vigente. 2. Eliminación de los efectos negativos de determinados monopolios, publicos o privados, y de las excesivas concentraciones. 3. Remoción de los obstáculos internos y externos para un libre flujo de y una más ampla y equilibrada diseminacióm de informaciones e ideas. 4. Pluralidade de fuentes e canales de información. 5. Libertad de prensa y de información. 6. Libertad para los perodistas y para todos los profesionales de los medios de comunicación; una libertad inseparable de la responsabilidad. 7. Habilitación de los países en desarollo para mejorar sus proprias situaciones, sobre todo en lo que respecta a la adquisición de equipo propio, entrenamiento de personal, recuperación de infraestrutuctura, además de capacitación de sus medios informativos y de comunicación, para sintonizarse con sus propias necesidades y aspiraciones. 8. Compromiso sincero de los países desarollados para ayudarlos a lograr tales objetivos. 9. Respeto a la identidad cultural de cada pueblo y al derecho de cada nación para informar al públco internacional sobre sus intereses, aspiracionais y respectivos valores sociales y culturales. 10. Respeto al derecho de todos os pueblos para participar en el intercambio internacional de información, con base en la igualda, la justicia y el beneficio mutuo. 11. Respeto al derecho de la coletividad, de los grupos étnicos y sociales, así como de los individuso para tener acceso a las fuentes de información y participar activamente en los flujos de comunicación.

Page 94: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

94

ANEXO 4 – PLANO DA UNESCO PARA 1990-1995 Trecho retirado do artigo “UNESCO, NOMIC y America Latina. De la Guerra Fria al espíritu de buena voluntad de MacBride”, de José Marques de Melo (1991). El nuevo plan de la UNESCO para el quinquenio 1990-1995 contiene cuatro metas bien definidas: 1. Inversiones en infraestrutuctura, ampliando y modernizando las redes de comunicaciones de los países en desarollo. 2. Entrenamiento de los recursos humanos, dando prioridad a la producción educativa, la selección de tecnologías apropriadas y la investigación aplicada. 3. realización de estudios sobre el impacto sociocultural de los medios de comunicación de masas y las nuevas tecnologías en la identidad cultural de los pueblos. 4. Desarollo de programas destinados a educar los usuarios de los medios de comunicación, capacitándolos para escoger críticamente las mensajes disponibles, a resisitir las posibles manipulaciones y a defender sus derechos como ciudadanos.

Page 95: Democratização da Comunicação - Daniel Cassol.pdf

95

SITES RECOMENDADOS Associação Mundial das Rádios Comunitárias www.amarc.org Centro de Mídia Independente brasil.indymedia.org Comunicação, Cultura e Política www.comcult.blogger.com.br Ética na TV www.eticanatv.org.br Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social www.enecos.org.br Federação Nacional dos Jornalistas www.fenaj.org.br Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação www.fndc.org.br Media Democracy Day www.mediademocracyday.org Mídia Tática Brasil www.midiatatica.org Observatório da Imprensa www.observatoriodaimprensa.com.br Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura www.unesco.org Rede Brasil de Comunicação Cidadã www.rbc.org.br União Cristã Brasileira de Comunicação www.ucbc.org.br