deliberaÇÃo do conselho diretivo da entidade … · a exposição que originou os autos versa...

33
1 DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRETIVO DA ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE (VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL) Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio; Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio; Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio; Visto o processo registado sob o n.º ERS/067/11; I. DO PROCESSO I.1. Origem do processo 1. Em 13 de julho de 2011, a Entidade Reguladora da Saúde (doravante, ERS) recebeu uma exposição anónima, atinente a eventual direcionamento explícito, para estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde do setor privado, de utentes dos Centros de Saúde de Fafe e de Cabeceiras de Basto, integrados no Agrupamento de Centros de Saúde Ave I Terras de Basto (doravante, ACES Ave I). 2. Do que importa salientar, é alegado na exposição o direcionamento de utentes por parte de “[…] médicos e alguns enfermeiros a mandar os doentes fazer exames auxiliares de diagnóstico fora de Fafe […] pelas contrapartidas que essas instituições vêm cá oferecer.”; 3. Bem como a alegada existência, no Centro de Saúde de Fafe, de “[…] publicidade em cima das mesas e balcões […]” – cfr. exposição anónima, junta aos autos.

Upload: phungphuc

Post on 20-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

1

DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DIRETIVO DA

ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE

(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)

Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo

3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio;

Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio;

Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde

estabelecidos no artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio;

Visto o processo registado sob o n.º ERS/067/11;

I. DO PROCESSO

I.1. Origem do processo

1. Em 13 de julho de 2011, a Entidade Reguladora da Saúde (doravante, ERS)

recebeu uma exposição anónima, atinente a eventual direcionamento explícito,

para estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde do setor privado, de

utentes dos Centros de Saúde de Fafe e de Cabeceiras de Basto, integrados no

Agrupamento de Centros de Saúde Ave I – Terras de Basto (doravante, ACES Ave

I).

2. Do que importa salientar, é alegado na exposição o direcionamento de utentes por

parte de “[…] médicos e alguns enfermeiros a mandar os doentes fazer exames

auxiliares de diagnóstico fora de Fafe […] pelas contrapartidas que essas

instituições vêm cá oferecer.”;

3. Bem como a alegada existência, no Centro de Saúde de Fafe, de “[…] publicidade

em cima das mesas e balcões […]” – cfr. exposição anónima, junta aos autos.

2

4. Após a análise preliminar do teor da exposição em causa, o Conselho Diretivo da

ERS, por despacho de 25 de agosto de 2011, ordenou a abertura do processo de

inquérito registado sob o n.º ERS/067/11.

I.2. Diligências

5. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS e considerando a situação

exposta, realizaram-se as seguintes diligências de obtenção de prova1:

i) consulta do Sistema de Registo dos Estabelecimentos Regulados

(SRER) da ERS;

ii) ação de fiscalização ao ACES Ave I, com deslocação às instalações

do Centro de Saúde de Fafe, no dia 29 de setembro de 2011;

iii) ação de fiscalização ao ACES Ave I, com deslocação às instalações

do Centro de Saúde de Cabeceiras de Basto, no dia 29 de setembro

de 2011.

II. DOS FACTOS

6. A exposição que originou os autos versa sobre o alegado direcionamento de

utentes, por parte de profissionais de saúde dos Centros de Saúde de Fafe e de

Cabeceiras de Basto, para determinados prestadores do setor privado, para efeito

de realização de MCDT.

7. O ACES Ave I tem como seus componentes os Centros de Saúde de Fafe, de

Cabeceiras de Basto e de Mondim de Basto.

8. O Centro de Saúde de Fafe tem associadas a Unidade de Saúde Familiar Novo

Cuidar, a Extensão de Saúde Regadas, a Extensão de Saúde Travassós, a

Unidade de Saúde Familiar Nós e Vós Saúde, a Unidade de Saúde Familiar Arões

e a Unidade de Saúde Familiar Fafe Sentinela;

9. O Centro de Saúde de Cabeceiras de Basto tem associada a Extensão de Saúde

Arco de Baúlhe e de Cavez;

10. Já o Centro de Saúde de Mondim de Basto, tem associadas as Extensões de

saúde Atei, Bilhó e Ermelo2.

1 Sem prejuízo de outras diligências encetadas no âmbito do presente processo, não consideradas na

presente deliberação porque distintas em termos de objeto material e destinatário(s), sendo que para a análise vertida na presente deliberação relevam as diligências supra elencadas, afigurando-se possível a decisão com base nas mesmas, sem mais diligências adicionais.

3

11. Alegou-se, na exposição, o direcionamento de utentes por parte de “[…] médicos e

alguns enfermeiros a mandar os doentes fazer exames auxiliares de diagnóstico

fora de Fafe […] pelas contrapartidas que essas instituições vêm […] oferecer.”;

12. Ou seja, foi na exposição alegado o direcionamento para determinados

estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde do setor privado, para efeito

de realização de MCDT;

13. Referindo-se ademais que “[…] os médicos que trabalham em Fafe também

trabalham em algumas dessas unidades […]”;

14. […]

15. Ademais, ocorreria igualmente o direcionamento explícito dos utentes para

prestadores privados com os quais determinados profissionais médicos

colaborariam, aduzindo-se que “[…] os médicos […] que têm consultório privado

[manter-se-iam] dos dois lados entre a unidade e o consultório […]”;

16. […]

17. Outra questão suscitada ainda, prendeu-se com a alegada existência, no Centro

de Saúde de Fafe, de “[…] publicidade em cima das mesas e balcões […]” – cfr.,

quanto a todo o exposto, a exposição anónima, junta aos autos.

II.1. Da ação de fiscalização ao ACES Ave I – Centro de Saúde de Fafe

18. No âmbito da ação de fiscalização ao ACES Ave I, ocorrida em 29 de setembro de

2011, foi inquirido o Diretor Executivo, Dr. Henrique Manuel da Silva Botelho, que

declarou, relativamente ao eventual direcionamento dos utentes para o setor

privado, no que aqui importa salientar, que:

i) quanto às Unidades Funcionais do Centro de Saúde de Fafe,

desconhece uma tal situação, nunca tendo rececionado nenhuma

queixa de utentes, “[…] nem sequer tal assunto foi focado em

“conversas laterais””;

ii) no Centro de Saúde de Fafe existem três médicos que não se

encontram integrados em unidades funcionais, estando inseridos no

denominado antigo Módulo 1;

2 Cfr., quanto à identificação do ACES, a informação retirada do Portal da Saúde e junta aos autos.

4

iii) concretizando, no que se refere à Dr.ª […], afeta ao referido Módulo

1, esta detém uma lista de 4000 utentes, “[…] que não querem que esta

deixe de ser sua médica de família.”;

iv) […]

v) é seu entendimento, quanto ao Módulo 1, que a “[…] lista

desmesurada de utentes, cuja existência dificulta o cabal cumprimento

de Protocolos aos mais diversos níveis”, é o maior fator de

preocupação;

vi) sendo certo que se estaria, à data dos factos, a proceder a uma

limpeza dos ficheiros, através da identificação dos utentes que não

recorrem ao Centro de Saúde há mais de cinco anos, colocando-os num

“ficheiro latente” (sem cancelar a respetiva inscrição), mediante a qual

seria expectável uma diminuição do número de utentes.

vii) de todo o modo, “[…] a solução passaria pela maior integração

possível dos utentes em unidades funcionais (nova(s) USF)”;

viii) em suma, e idealmente, todos os utentes ficariam agregados em

unidades funcionais, “[…] com exceção daqueles atendidos pela Dr.ª

[…]”;

ix) e com efeito, de acordo com as análises do Departamento de

Contratualização da Administração Regional de Saúde do Norte, I.P.

(ARS Norte, I.P.), o desempenho das USF do ACES Ave I é bom,

referindo ser uma experiência de sucesso.

x) quanto à questão do eventual direcionamento de utentes, “[…] os

médicos das USF não reencaminham utentes, porque lhes é prejudicial.

Só têm vantagens em atender [utentes] no contexto das USF, dentro da

carteira básica a que estão obrigados […]”;

xi) muito embora não possa garanti-lo, com tanta certeza, no âmbito da

prescrição e realização de MCDT;

xii) no Centro de Saúde de Fafe, ainda que existam médicos em regime

de acumulação de funções, este é um número reduzido,

desconhecendo, quanto a todos aqueles que exercem funções privadas,

se o praticam nas imediações do referido centro de saúde;

5

xiii) já relativamente ao Centro de Saúde de Cabeceiras de Basto, certo

é que, num quadro de sete médicos, quatro exercem funções no setor

privado:[…];

xiv) […]

xv) e também quanto a estes profissionais, certo é que o declarante

não dispõe de qualquer queixa concreta, que lhe permitisse a atuação

em conformidade, quanto a direcionamento de utentes para prestadores

específicos do setor privado.

19. Questionado ainda quanto à alegada existência de publicidade ao setor privado

nas instalações das unidades funcionais que constituem o ACES, o Diretor

Executivo referiu não ter conhecimento de que tal ocorra, sendo certo que cada

Unidade Funcional é responsável pela prestação de informação aos utentes sobre

os prestadores convencionados;

20. Concretamente, as indicações dadas aos funcionários dessas unidades vão no

sentido de darem a conhecer aos utentes uma listagem de prestadores

convencionados;

21. Sucede que, após a prestação de tal informação, não raras vezes os próprios

funcionários procedem à marcação em prestador privado, por solicitação dos

utentes.

22. Por último, relativamente a Mondim de Basto, onde não se verifica a existência de

médicos em exercício de funções privadas, o Diretor Executivo do ACES

considerou antes a existência de um “défice de acesso” associado à falta de

médicos – cfr., por todo o exposto, auto de declarações lavrado em sede da ação

de fiscalização e junto aos autos.

23. Tendo sido para o efeito notificado, em sede da ação de fiscalização, o ACES Ave

I procedeu ainda ao envio de documentação atinente às autorizações para a

acumulação de funções de natureza privada, quanto aos profissionais de saúde ao

mesmo pertencentes – cfr. documentação, junta aos autos;

24. Da análise de tais documentos, e do que aqui importa ressalvar, retira-se que foi

concedida autorização à maioria dos profissionais médicos em exercício de

funções junto dos Centros de Saúde de Fafe e de Cabeceiras de Basto;

25. Aqui incluídos os profissionais médicos indicados na exposição que deu origem

aos autos, bem como em relação às instalações/estabelecimentos aos mesmos

associados.

6

II.1.1. Da fiscalização às instalações das Unidades Funcionais “USF Fafe

Sentinela”, “USF Nós e Vós Saúde” e “Centro de Saúde de Fafe – Módulo 1”

26. Foram ainda objeto de fiscalização, no mesmo dia 29 de setembro de 2011, a

Unidade de Saúde Familiar (USF) Fafe Sentinela, a USF Nós e Vós Saúde e o

Centro de Saúde de Fafe – Módulo 1 (Módulo 1), a funcionarem nas mesmas

instalações do ACES Ave I.

27. As diligências empreendidas consubstanciaram-se em duas técnicas da ERS

dirigirem-se às respetivas receções de utentes e solicitarem a apresentação do

Livro de Reclamações, bem como o esclarecimento relativamente à informação

prestada aos utentes quanto a entidades convencionadas com o SNS.

28. Quanto às reclamações exaradas nos Livros de Reclamações das três unidades

funcionais:

i) na USF Fafe Sentinela, da totalidade das reclamações (de 1 a 6,

relativas aos anos de 2008 e 2012), nenhuma versava sobre o

direcionamento de utentes para o setor privado;

ii) na USF Nós e Vós Saúde, da totalidade das reclamações (de 1 a 6,

relativas aos anos de 2008 a 2010), nenhuma versava sobre o

direcionamento de utentes para o setor privado;

iii) o mesmo sucedendo no Módulo 1, considerada a totalidade das

reclamações (de 1 a 11, maioritariamente do período de maio a agosto

de 2011) – cfr. cópias das folhas dos Livros de Reclamações existentes

nas unidades funcionais referidas, juntas aos autos.

29. Ainda no que se refere à USF Fafe Sentinela, a funcionária que prestou o

atendimento informou que:

i) “[…] o médico é quem passa a credencial, sendo que a nível

administrativo o seguimento é realizado via informática […]”;

ii) “[s]empre que questionadas sobre os convencionados existentes as

administrativas indicam o mais próximo, de acordo com o caso

concreto.”;

iii) “[…] existe uma lista que, ainda que não esteja afixada, inclui os

convencionados [a qual] [n]ormalmente não é mostrada aos utentes

porque estes também não solicitam.”;

7

iv) relativamente a profissionais de saúde da USF que exerçam funções

no privado, dos seis médicos que trabalham na USF, apenas dois

acumulam funções no privado;

v) sendo que, não tem “[…] conhecimento de qualquer

encaminhamento de utentes por parte dos profissionais de saúde da

USF para o setor privado […]” – cfr. auto de inquirição de testemunha,

lavrado em sede da ação de fiscalização de 29 de setembro de 2011 e

junto aos autos.

30. No que se refere à USF Nós e Vós Saúde, inquirido o funcionário que prestou o

atendimento, este referiu:

i) não tem “[…] uma lista de convencionados afixada, nem acessível

aos utentes”;

ii) sendo que quando questionado, é o próprio quem “[…] informa os

utentes dos locais mais próximos para a realização de exames.”;

iii) três dos seis médicos da USF também exercem no sector privado,

“[…] ainda que não tenha conhecimento de direcionamento de utentes

para o setor privado.” – cfr. auto de inquirição de testemunha, lavrado

em sede da ação de fiscalização de 29 de setembro e junto aos autos.

31. Resultou ainda que nesta unidade é utilizada uma agenda, na qual estão apostos

contactos de estabelecimentos convencionados – cfr. cópias de fls. da agenda

utilizada, recolhidas na ação de fiscalização de 29 de setembro, juntas aos autos.

32. Já nas instalações do Módulo 1, da inquirição da funcionária que prestou o

atendimento resultou a informação de que:

i) os três médicos que exercem no Módulo 1, “[…] exercem também no

privado”;

ii) quanto à existência de lista onde conste informação quanto a

entidades convencionados, esta é inexistente, “[…] pelo que a

informação que presta advém do seu conhecimento próprio.”;

iii) normalmente os utentes questionam da existência de

convencionados em Fafe, sendo que “[…] transmite informação das

clínicas existentes, dizendo que os utentes têm liberdade de escolha

[…]”;

8

iv) desde maio de 2011, momento em que iniciou funções de

administrativa no Módulo 1, “[…] não tem conhecimento de

direcionamento de utentes para determinado prestador privado […]” –

cfr. auto de inquirição de testemunha, lavrado em sede da ação de

fiscalização de 29 de setembro de 2011 e junto aos autos.

II.2. Da ação de fiscalização ao ACES Ave I - Centro de Saúde de Cabeceiras de

Basto

33. Foram igualmente objeto de fiscalização, no mesmo dia 29 de setembro de 2011,

as instalações do Centro de Saúde de Cabeceiras de Basto3, sendo que as

diligências consubstanciaram-se em três técnicas da ERS terem-se dirigido às

respectivas instalações, e solicitado ao assistente técnico que prestou o

atendimento que indicasse como era fornecida aos utentes informação relativa a

entidades convencionadas.

34. Nessa sequência, foram pelo mesmo disponibilizados os documentos destinados

aos utentes, consubstanciados em:

i) lista para Eletrocenfefalografia (impressão da informação da ARS

Norte, I.P.);

ii) listas para Imuno-Alergologia Pneumologia, Gastrenterologia e

Cardiologia – cfr. documentos com lista de entidades convencionadas,

juntos aos autos.

35. Tais listas, vinham sendo disponibilizadas na forma de “folhetos”, tal como infra

representados:

3 Estando, à data, em funcionamento, o Serviço de Atendimento Permanente.

9

Eletrocenfefalografia

Imuno- Alergologia Pneumologia

10

Gastrenterologia

Cardiologia

III. DO DIREITO

III.1. Das atribuições e competências da ERS

36. De acordo com o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, a ERS tem

por missão a regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de

cuidados de saúde;

37. Neste enquadramento, estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do artigo 8.º

do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, todos os “[...] estabelecimentos

prestadores de cuidados de saúde, do setor público, privado e social,

independentemente da sua natureza jurídica […]”;

11

38. É esse o caso do ACES Ave I, bem como das Unidades Funcionais no mesmo

integradas;

39. As atribuições da ERS, de acordo com o n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º

127/2009, de 27 de maio, compreendem “[…] a supervisão da atividade e

funcionamento dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde […]”

nomeadamente quanto “[…] à garantia dos direitos relativos ao acesso aos

cuidados de saúde e dos demais direitos dos utentes […] à legalidade e

transparência das relações económicas entre os diversos operadores, entidades

financiadoras e utentes.”.

40. Por outro lado, estando cometido à ERS, conforme a alínea b) do artigo 33.º do

Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, o objetivo regulatório de “[a]ssegurar o

cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde […]”, o mesmo é

concretizado pela alínea d) do artigo 35.º do mesmo diploma, a qual estabelece ser

incumbência da ERS “[z]elar pelo respeito da liberdade de escolha nos

estabelecimentos de saúde privados.”;

41. Ademais, e já no que concerne o objetivo regulatório previsto na alínea e) do

mesmo artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, de “[d]efender a

concorrência nos segmentos abertos ao mercado […]”, a alínea b) do artigo 38.º do

mesmo Decreto-Lei estabelece que incumbe ainda à ERS “[v]elar pelo respeito da

concorrência nas actividades abertas ao mercado sujeitas à sua jurisdição”;

42. Podendo a ERS assegurar tais incumbências mediante o exercício dos seus

poderes de supervisão, consubstanciados, designadamente, em “[v]elar pela

aplicação das leis e regulamentos e demais normas aplicáveis às actividades

sujeitas à sua regulação […]”, e em “[e]mitir ordens e instruções, bem como

recomendações ou advertências individuais, sempre que tal seja necessário – cfr.

as alíneas a) e b) do artigo 42.º do Decreto – Lei n.º 127/2009, de 27 de maio.

43. Atento este enquadramento, devem, então, analisar-se os resultados das

diligências efetuadas numa dupla perspetiva, a saber:

a. quanto à garantia dos direitos e interesses legítimos dos utentes de

cuidados de saúde, designadamente, o da liberdade de escolha nas

unidades privadas de saúde; e

b. quanto à garantia do respeito da livre concorrência entre os

prestadores.

12

44. Note-se que, a ERS debruçou-se já sobre questão similar no âmbito do seu

processo de inquérito n.º ERS/088/07, no qual foi considerado que:

“[…]

a não publicitação por parte dos Centros de Saúde das listas integrais de

entidades convencionadas não só é potencialmente lesiva dos direitos e

interesses legítimos dos utentes, dado que os sujeita a maiores tempos de

espera ou a deslocações de alcance desnecessárias, como

a. tem como consequência directa uma redução significativa da liberdade de

escolha dos utentes nas unidades de saúde privadas,

b. provoca, na perspectiva dos utentes (procura), uma redução virtual do

número de prestadores convencionados disponíveis (oferta) no mercado

convencionado do SNS, e

c. deturpa, artificialmente, o nivelamento (“level-playing-field”) que deveria ser

idêntico para os prestadores convencionados de cuidados de saúde. […]”;

45. Tendo nessa sequência sido deliberado pela ERS, e atento o disposto no n.º 1 do

artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril, quanto à obrigação de

“afixação, de modo visível ao público, das listas das entidades convencionadas

nos centros de saúde e respetivas extensões […]”,

“[…]

(i) Emitir […] uma instrução [às ARS…], nos seguintes termos:

a) As ARS devem enviar sem demora a todos os Centros de Saúde as

listas de convencionados devidamente atualizadas e ordenar a sua

afixação imediata, em local visível ao público, nos referidos Centros de

Saúde;

b) As ARS devem proceder à atualização das listas de convencionados

sempre que as mesmas tenham uma qualquer alteração e ordenar a

afixação das listas atualizadas nos Centros de Saúde;

c) As ARS devem ordenar aos Centros de Saúde sob sua coordenação e

orientação, bem como aos respetivos funcionários, que se abstenham,

imediata e permanentemente, da prática de quaisquer atos,

designadamente quanto à afixação de elementos publicitários

13

juntamente com as listas de convencionados, que sejam aptos a

prejudicar a objetividade, integralidade e integridade da informação para

os utentes que deverá resultar das listas de entidades convencionadas;

d) As ARS devem ordenar aos Centros de Saúde sob sua coordenação e

orientação, bem como aos respetivos funcionários, que se abstenham,

imediata e permanentemente, da prática de quaisquer atos de

direcionamento de utentes para prestadores;

e) As ARS devem promover o conhecimento e formação dos funcionários

dos Centros de Saúde sob sua coordenação e orientação sobre o dever

de respeitar os direitos e interesses legítimos dos utentes de cuidados

de saúde, designadamente, o direito fundamental da liberdade de

escolha nas unidades privadas de saúde.

(ii) Emitir […] a seguinte recomendação dirigida [às ARS…], nos seguintes

termos:

a) implementar, conjuntamente com o respeito do teor da instrução supra,

nos Centros de Saúde sob sua coordenação e orientação mecanismos

internos, designadamente de suporte informático, que facilitem a

transmissão pelos funcionários dos Centros de Saúde da informação

constante das listas de convencionados e sua correta compreensão

pelos utentes dos mesmos, em prol da escolha livre e esclarecida de

prestadores por estes últimos;

b) proceder à divulgação pública, nos sítios de Internet das ARS e outros

que se afigurem relevantes em prol da difusão da informação, das listas

de entidades convencionadas.” – cfr. deliberação emitida no

ERS/088/07, publicada em www.ers.pt.

III.2. Da natureza e organização do SNS

46. Importa salientar, sumariamente e a respeito do SNS, que a Lei de Bases da

Saúde (LBS), aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, veio consagrar, no n.º

4 da sua Base I, que “os cuidados de saúde são prestados por serviços e

estabelecimentos do Estado ou, sob fiscalização deste, por outros entes públicos

ou por entidades privadas, sem ou com fins lucrativos”.

14

47. E, enquanto concretização dos princípios fundamentais estabelecidos para um

SNS, a LBS consagra ainda, nas diretrizes da política de saúde estabelecidas na

Base II, que “é objetivo fundamental obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos

cuidados de saúde, seja qual for a sua condição económica e onde quer que

vivam, bem como garantir a equidade na distribuição de recursos e na utilização

de serviços”.

48. É por outro lado reconhecida ao cidadão a “liberdade de escolha no acesso à rede

nacional de prestação de cuidados de saúde, com as limitações decorrentes dos

recursos existentes e da organização dos serviços” – cfr. n.º 5 da Base V da LBS;

49. Neste sentido, veio o legislador assumir a existência de um sistema de saúde

estratificado no qual os serviços e unidades de saúde se devem estruturar,

funcionar e articular entre si, em favor dos interesses dos utentes que, em

condições de igualdade, devem aceder aos cuidados de saúde;

50. Ora, as Unidades Funcionais em causa integram, assim, o conjunto das

“instituições e serviços oficiais prestadores de cuidados de saúde dependentes do

Ministério da Saúde”, isto é, pertencem ao SNS tal como definido pelo n.º 2 da

Base XII da LBS.

51. Por outro lado, deve ter-se igualmente presente que o SNS, enquanto conjunto

organizado e hierarquizado de instituições e de serviços oficiais prestadores de

cuidados de saúde, se organiza em regiões de saúde – cfr. n.º 1 do artigo 3.º do

Estatuto do SNS;

52. Como, aliás, igualmente se estatui na Base XXIV da LBS, que estabelece que o

SNS se caracteriza por ter organização regionalizada e gestão descentralizada e

participada - cfr. alínea e) da referida Base, já citada supra – e que surge, aliás,

enquanto concretização do princípio fixado no n.º 4 do artigo 64.º da CRP, de que

o SNS tem gestão descentralizada e participada.

53. Assim, a organização do sistema de saúde baseia-se na divisão do território

nacional em regiões de saúde que “são dotadas de meios de ação bastante para

satisfazer autonomamente as necessidade correntes de saúde dos seus

habitantes, podendo, quando necessário, ser estabelecidos acordos inter-regionais

para a utilização de determinados recursos” – cfr. n.º 1 e 2 da Base XVIII da LBS.

15

54. E consequentemente, o SNS detém uma organização de carácter regional, sendo

administrado por cada uma das ARS, responsáveis por cada uma das regiões

administrativamente organizadas4;

55. Devendo nesta sede evidenciar-se enquanto dever das ARS de cumprirem e

fazerem cumprir, por todos os Centros de Saúde sob sua coordenação e

orientação, o disposto no n.º 1 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de

abril, de que “as administrações regionais de saúde ficam obrigadas a proceder à

afixação, de modo visível ao público, das listas das entidades convencionadas nos

centros de saúde e respetivas extensões e nas áreas de atendimento de doentes

dentro dos hospitais […]”;

III.3. Das atribuições e competências dos ACES e das respetivas Unidades

Funcionais

56. Uma das principais novidades introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22 de

fevereiro, que procedeu a uma profunda modificação dos modelos de gestão ao

nível da prestação de cuidados de saúde primários, foi a consagração da figura

dos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), enquanto serviços de saúde

integrados no SNS, dotados de “autonomia administrativa, constituídos por várias

unidades funcionais, que integram um ou mais centros de saúde.” – cfr. n.º 1 do

artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22 de fevereiro.

57. Têm por missão principal, os ACES, garantir a prestação de cuidados de saúde

primários à população de determinada área geográfica ainda que sujeitos ao seu

poder de direção;

58. E, para tanto, devem desenvolver atividades de promoção de saúde e prevenção

da doença, prestação de cuidados na doença, bem como promover atividades de

vigilância epidemiológica e participam na formação de diversos grupos

profissionais – cfr. artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22 de fevereiro.

59. Com efeito, os ACES são serviços desconcentrados, com autonomia administrativa

da respetiva ARS, estando sujeitos ao seu poder de direção5 – n.º 3 do artigo 2.º

do referido Decreto-Lei.

4 Competindo ademais a cada uma das ARS um papel fundamental na estruturação e organização da

resposta do SNS nas áreas sob sua influência, que aliás são responsáveis pela saúde das populações da respetiva área geográfica “[…] coordenam a prestação de cuidados de saúde de todos os níveis e adequam os recursos disponíveis às necessidades, segundo a política superiormente definida e de acordo com as normas e diretivas emitidas pelo Ministério da Saúde.” – cfr. n.º 1 da Base XXVII da LBS.

16

60. Os ACES podem ser constituídos por um ou mais Centros de Saúde, e podem

compreender diversas unidades funcionais, sendo que “em cada centro de saúde

componente de um ACES funciona, pelo menos, uma USF ou UCSP e uma UCC

ou serviços desta.” – cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22

de fevereiro.

61. Enquanto características comuns, salienta-se que “cada unidade funcional é

constituída por uma equipa multiprofissional, com autonomia organizativa e técnica

e atua em intercooperação com as demais unidades do centro de saúde e do

ACES” – cfr. artigo 8.º do diploma citado.

62. Assim sendo, resulta do exposto que é função das unidades funcionais

assegurarem a prestação de cuidados de saúde no âmbito de um determinado

ACES, que por sua vez, e enquanto serviço descentralizado, é dotado de

“autonomia administrativa para decidir e implementar soluções adaptadas aos

recursos e às condições de cada local e comunidade”, bem como de órgãos e

instrumentos próprios de gestão organizacional;

63. Refira-se ainda, que apesar de, com a reestruturação do Decreto-Lei n.º 28/2008,

de 22 de fevereiro, as Unidades de Saúde Familiar (USF) terem passado a ser

consideradas unidades funcionais dos recém-criados ACES, estas mantiveram a

natureza que lhes fora conferida em sede de legislação específica,

designadamente, o Decreto-Lei n.º 298/2007, de 22 de agosto.

64. Garantiu-se, assim, especial ênfase para as USF no contexto dos cuidados

primários, tal como reconhecida no Programa do XVII Governo Constitucional, que

privilegiara os cuidados de saúde primários enquanto “o pilar central do sistema de

saúde” e que previra a sua reestruturação em unidades funcionais, com particular

destaque para as USF.

65. São estas estruturas elementares de prestação de cuidados de saúde a uma

população determinada, constituídas por uma equipa multiprofissional, num quadro

de contratualização interna, dotadas de autonomia organizativa, funcional e

técnica;

66. Assumindo, elas próprias, a contratualização de um compromisso assistencial, que

se vem a traduzir num conjunto de serviços prestados à população abrangida.

5 Ainda, para efeitos de gestão, o Decreto-Lei n.º 28/2008, de 22 de fevereiro previu a “[…] existência de

contratos-programa, enquanto acordos celebrados entre o diretor executivo do ACES e o conselho diretivo da administração regional de saúde pelo qual se estabelecem, qualitativa e quantitativamente, os objetivos do ACES e os recursos afetados ao seu cumprimento e se fixam as regras relativas à respetiva execução.” – cfr. preâmbulo do diploma.

17

III.4. Do princípio da liberdade de escolha dos utentes

67. Note-se que, ainda que as entidades convencionadas com o SNS venham a

integrar, pela via da convenção, a rede nacional de prestação de cuidados de

saúde, tal como definida no n.º 4 da Base XII da LBS, no sentido do conjunto dos

“estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde e os estabelecimentos privados e

os profissionais em regime liberal com quem sejam celebrados contratos nos

termos do número anterior” e que lhes seja aplicável o próprio Estatuto do SNS,

nos termos do artigo 2.º do respetivo Estatuto, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

11/93, de 15 de janeiro;

68. Elas pertencem, ainda, ao setor privado, onde se deverá considerar que a

liberdade de escolha dos utentes assume particular relevância.

69. Ora, esta liberdade de escolha assentará necessariamente no direito dos utentes à

informação quanto ao conjunto dos prestadores que, sendo convencionados com o

SNS, integram a rede nacional de prestação de cuidados de saúde.

70. Com efeito, aos utentes deve ser reconhecido desde logo o direito ao

consentimento informado e esclarecido, nos termos da alínea e) do n.º 1 da Base

XIV da Lei de Bases da Saúde e, consequentemente, de escolher livremente o

agente prestador de cuidados de saúde, nos termos da alínea a) do n.º 1.º da Base

XIV da mesma Lei de Bases da Saúde;

71. Pois, na verdade, o direito do utente à informação não se limita ao que prevê a

alínea e) do n.º 1 da Base XIV da LBS, para efeitos de consentimento informado e

esclarecimento quanto a alternativas de tratamento e evolução do estado clínico;

72. Trata-se, antes, de um princípio que deve modelar todo o quadro de relações

atuais e potenciais entre utentes e prestadores de cuidados de saúde, públicos e

privados, com ou sem fins lucrativos.

73. Porquanto, esta livre escolha está na dependência direta da informação referente à

prestação de cuidados de saúde presentes e futuros.

74. Ora, a relação dos prestadores com os seus utentes deve pautar-se por princípios

de verdade, completude e transparência, devendo ainda, e em todo o momento,

conformar-se pelo direito do utente à informação, enquanto concretização do dever

de respeito, pelos prestadores de cuidados de saúde, dos direitos e interesses

legítimos dos utentes.

18

75. Nesse sentido, o direito à informação – e o concomitante dever de informar – surge

aqui com especial relevância e é dotado de uma importância estrutural e

estruturante da própria relação;

76. A informação não pode, por isso, deixar de ser verdadeira, completa e inteligível;

77. Só assim se logrando obter a referida transparência na relação entre os

prestadores de cuidados de saúde e utentes;

78. Pelo que, e considerando o caso concreto, importa garantir que a informação

prestada nas unidades funcionais do ACES Ave I é suficiente para dotar o utente

medianamente esclarecido e diligente dos elementos necessários ao livre exercício

da escolha da unidade privada de saúde convencionada com o SNS à qual

recorrerá.

III.5. Do respeito pela sã concorrência entre prestadores convencionados com o

SNS

79. Importa salientar que constitui incumbência prioritária fundamental imposta ao

Estado pela alínea f) do artigo 81.º da Constituição da República Portuguesa

“assegurar o funcionamento eficiente dos mercados, de modo a garantir a

equilibrada concorrência entre as empresas, a contrariar as formas de organização

monopolistas e a reprimir os abusos de posição dominante e outras práticas

lesivas do interesse geral”.

80. Assim, e sendo pacífico que da livre concorrência, designadamente entre

fornecedores de bens e serviços, resulta o estímulo da inovação e do crescimento,

em prol do aumento de variedade e/ou da qualidade de bens e serviços a preços

inferiores, é, então, igualmente assente que o bem público concorrência deve ser

promovido e respeitado pelos agentes privados, mas igualmente pelos agentes

públicos.

81. Um tal desiderato é, aliás, sustentado na política de saúde estabelecida na Base II

da LBS, ao estabelecer que “É apoiado o desenvolvimento do setor privado da

saúde e, em particular, as iniciativas das instituições particulares de solidariedade

social, em concorrência com o sector público” – cfr. alínea f) da referida Base.

82. Por outro lado, é sabido que mercados com estruturas mais concorrenciais

potenciam o jogo competitivo entre prestadores, e que o reverso tipicamente

ocorrerá em mercados mais concentrados.

19

83. Desde logo, naquelas situações em que o próprio preço constitui um instrumento

de concorrência e diferenciação entre os agentes económicos, a existência de

grau considerável de concorrência tenderá a gerar preços mais baixos, ao passo

que na segunda hipótese serão tendencialmente cobrados preços mais elevados

pelos mesmos serviços ou bens.

84. Mas a concorrência entre agentes económicos não se desenvolverá apenas e

somente no estrito campo dos preços. Na realidade, sendo a concorrência indutora

de inovação e desenvolvimento, a diferenciação entre os agentes económicos

pode, ainda, ocorrer em características dos serviços ou produtos relevantes tão

importantes quanto a qualidade, disponibilidade, rapidez de fornecimento,

inovação, disponibilidade e eficiência.

85. Assim sendo, e mau grado os mercados da prestação de cuidados de saúde

serem regulados, e enquadrados por regras mais ou menos estritas de

determinação prévia de formas de acesso a tais cuidados de saúde, na medida em

que exista âmbito remanescente para exercício do jogo concorrencial entre

agentes, a concorrência deve ainda ser promovida;

86. Uma vez que continua a ser expectável que daí decorrem benefícios para os

utentes de unidades de saúde.

87. Ou seja, mesmo nas situações em que um prestador de cuidados de saúde haja

acordado ou convencionado a prestação de cuidados de saúde a beneficiários de

um dado sistema, subsistema, ou seguro de saúde, verifica-se ainda a

possibilidade de os agentes lograrem distinguir-se no jogo competitivo.

88. A título de exemplo, o facto de em tais situações os prestadores haverem abdicado

do mecanismo “preço” enquanto instrumento concorrencial, tanto não afastará a

possibilidade de a distinção ainda ocorrer com recurso a outros mecanismos, quais

sejam a qualidade ou disponibilidade (tão mais importante quanto o acesso aos

cuidados de saúde possui uma vertente temporal extremamente relevante).

89. Concretizando, as entidades convencionadas do SNS para a prestação de

determinado cuidado de saúde (serviço) concorrem entre si, naquele que seja o

mercado geográfico relevante, pelos utentes do SNS portadores de Credencial

para realização daquele concreto cuidado de saúde.

90. Consequentemente, uma eventual redução de oferta, que poderá ocorrer mediante

a prestação de informação não completa, será apta a produzir um efeito de

minoração ou eliminação da tensão concorrencial pré-existente;

20

91. Daí podendo decorrer uma redução dos benefícios, atuais e futuros, que para os

utentes decorrem da existência de uma estrutura de mercado concorrencial.

IV. ANÁLISE

92. Recorde-se que que foi suscitada, a respeito de profissionais de saúde em

exercício no ACES Ave I, a questão do direcionamento para determinados

prestadores privados, para efeito da realização de MCDT;

93. Resulta assim, e considerando tratar-se de atuação em sede de prestador de

cuidados primários do SNS, que a análise dos presentes autos seja delimitada à

consideração do direcionamento explícito para prestadores do setor privado,

convencionados com o SNS para a realização de MCDT.

94. Neste âmbito, foi possível constatar, dos elementos carreados para os autos, que

nas unidades funcionais fiscalizadas não se encontravam afixadas, de modo

visível ao público, as listas de entidades convencionadas;

95. Nem tampouco resultou que as mesmas se encontrassem disponíveis para

consulta no balcão de atendimento dos utentes;

96. Ora, muito embora as diligências instrutórias (desde logo as inquirições e

documentação analisadas) não tenham permitido apurar elementos concretos,

relativos ao direcionamento explícito tal como denunciado na exposição aqui em

causa;

97. Outrossim, foi possível detetar nos autos, situações que podem caracterizar-se

como6:

i) listagens de convencionados não afixadas nem facilmente

disponibilizadas, e onde os funcionários administrativos transmitem

verbal e informalmente as informações que entendem dever prestar aos

utentes;

ii) róis de entidades elaborados ao nível das próprias Unidades

Funcionais, todavia incompletas porque não totalmente

correspondentes com as listagens disponibilizadas pelas ARS.

98. Recorde-se, a propósito, que segundo resultou da fiscalização às Unidades

Funcionais do Centro de Saúde de Fafe, e de acordo com os funcionários

administrativos responsáveis pelo atendimento aos utentes:

6 Lançando mão da análise e categorização realizadas no ERS/088/07.

21

i) na USF Fafe Sentinela, “[s]empre que questionadas sobre os

convencionados existentes as administrativas indicam o mais próximo,

de acordo com o caso concreto.”;

vi) “[…] existe uma lista que, ainda que não esteja afixada, inclui os

convencionados [a qual] [n]ormalmente não é mostrada aos utentes

porque estes também não solicitam.”;

iv) a USF Nós e Vós Saúde, não tem “[…] uma lista de convencionados

afixada, nem acessível aos utentes”;

v) sendo que quando questionado, é o próprio funcionário quem “[…]

informa os utentes dos locais mais próximos para a realização de

exames.”;

vi) tendo sido apurada, nesta unidade, a utilização de uma agenda com

os contactos, apostos à mão, de estabelecimentos convencionados;

vii) no Módulo 1, era inexistente lista com informação quanto a

entidades convencionadas, “[…] pelo que a informação que presta

advém do conhecimento próprio [da funcionária].”;

viii) normalmente os utentes questionam da existência de

convencionados em Fafe, sendo que “[…] transmite informação das

clínicas existentes, dizendo que os utentes têm liberdade de escolha

[…]” – cfr. autos de inquirição de testemunha, lavrados em sede da

ação de fiscalização de 29 de setembro às Unidades Funcionais do

Centro de Saúde de Fafe, juntos aos autos.

99. Recorde-se, ainda, que conforme resultou da fiscalização às instalações do Centro

de Saúde de Cabeceiras de Basto, os documentos destinados a serem entregues

aos utentes, com informação sobre as entidades convencionadas, revelaram, à

semelhança do constatado no Centro de Saúde de Fafe, conter informação

incompleta.

100. Assim, e não obstante o declarado pelo Diretor Executivo do ACES Ave I, de que

seriam dadas “[…] indicações aos funcionários […] no sentido de darem a

conhecer aos utentes uma listagem de prestadores convencionados.”;

101. Certo é que, os elementos destinados aos utentes não coincidiam com a

informação tal como disponibilizada no sítio eletrónico da ARS Norte, I.P. sobre as

22

entidades convencionadas, à data, nas diversas especialidades, para a região de

Braga7;

102. Não estando, repita-se, afixadas nem sendo facilmente disponibilizadas,

quaisquer listas, completas, relativas às entidades convencionadas;

103. Ocorrendo, outrossim, a difusão da informação de acordo com o mero

conhecimento dos respetivos funcionários;

104. Daqui não deixando de decorrer a possibilidade de direcionamento explícito, por

a informação estar mais norteada pelo “sentido” individual e subjetivo de cada

funcionário do que deveria, ou não, ser informado.

105. Ora, certo é que, as circunstâncias de facto assim apuradas aportam

consequências para a transparência, densidade e correção da informação

prestada aos utentes.

106. Por um lado, e por via do incumprimento da obrigação de afixação das listas de

convencionados, a liberdade de escolha dos utentes poderá vir a ser restringida;

107. Com efeito, quaisquer limitações e distorções introduzidas na prestação de

informação aos utentes, tal como a falta de rigor e transparência dos elementos

fornecidos provocam uma redução virtual da rede de convencionados;

108. O que poderá resultar em maiores tempos de espera para a marcação de

consultas ou de MCDT ou na necessidade de os utentes realizarem deslocações

de alcance exagerado e injustificado, que se traduzem, afinal, numa utilização de

recursos não eficiente, porque desnecessária face à rede real de prestadores

convencionados;

109. Aumentando, por esta via, globalmente e de modo considerável, os custos

suportados pelos utentes com a prestação de cuidados de saúde.

110. Havendo que atentar ainda no facto de a redução de oferta convencionada (como

a que decorre, por exemplo, desde logo, de uma não atualização das listas de

convencionados ou da sua limitação a determinadas entidades) ser, obviamente,

compressora da liberdade de escolha de utentes, entendida enquanto assente

num conjunto, tão amplo quanto possível, de prestadores com capacidade de

satisfação de necessidades de cuidados de saúde.

7 Cfr. listas retiradas do sítio eletrónico da ARS Norte, I.P., com a informação à data disponibilizada sobre

as entidades convencionadas.

23

111. Desta feita, a disponibilização aos utentes das listas de entidades

convencionadas não pode deixar de se caracterizar pela completude, veracidade e

inteligibilidade, permitindo que a informação prestada seja objetiva, o que

necessariamente colidirá também com o fornecimento de elementos publicitários

de certos prestadores.

112. Desde logo, e na medida em que a liberdade de escolha nas unidades de saúde

privadas, de que aqui se cuida, se exercerá em princípio apenas relativamente ao

conjunto das entidades convencionadas com o SNS, a lista para este fim

disponibilizada aos utentes deverá estar limitada às entidades convencionadas,

não devendo ser realizada, paralelamente à apresentação das listas a que faz

referência o artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril, publicidade a

outras entidades (não convencionadas).

113. Tal publicidade é suscetível de induzir o utente a procurar estas entidades (não

convencionadas), na convicção de se tratarem de entidades convencionadas, o

que, no limite, facilitaria – ou mesmo criaria - situações de lesão dos seus direitos e

interesses financeiros.

114. Por outro lado, o que se constata in casu, é que o não cumprimento do dever de

prestação de informação objetiva e efetiva, quer na sua integralidade, quer na sua

integridade, designadamente por não afixação das listas de entidades

convencionadas provoca, na perspetiva dos utentes (procura), uma redução virtual

do número de prestadores convencionados disponíveis (oferta) no mercado

convencionado do SNS.

115. Daí decorre que a procura (utentes do SNS para dado ato em dada região)

buscará prima facie a satisfação da concreta necessidade junto da oferta

(prestadores convencionados do SNS para tal ato em tal região) assim

virtualmente reduzida.

116. Por outro lado, e já na perspetiva dos próprios prestadores convencionados do

SNS para tal ato em tal região, verifica-se que se deturpa, artificialmente, o

nivelamento (“level-playing-field”) que deveria ser idêntico para os prestadores

convencionados de cuidados de saúde.

117. Na realidade, a falta de transparência no fornecimento da informação aos utentes

– ou melhor dizendo, o fornecimento de informação parcial aos utentes – coloca os

prestadores convencionados abrangidos pela informação disponibilizada em

situação privilegiada face àqueles outros prestadores, igualmente convencionados,

que são objeto de tratamento desigual;

24

118. Criando-se, ademais, situações propícias a favoritismos de uns prestadores face

a outros, o que deve ser totalmente evitado.

119. Tanto é, claro está, suscetível de distorcer, de forma sensível, a concorrência e o

próprio funcionamento eficiente do mercado dos prestadores de cuidados de

saúde convencionados, com as consequências analisadas, designadamente para

os utentes do SNS, bem como para os prestadores convencionados prejudicados

por tais práticas.

120. Ora, refira-se que a atividade de prestação de cuidados de saúde é sujeita a

regulação setorial.

121. Esta regulação visa, em essência, a supervisão do cumprimento dos requisitos

de exercício da atividade e de funcionamento, da garantia dos direitos relativos ao

acesso aos cuidados de saúde e dos demais direitos dos utentes, e da legalidade

e transparência das relações económicas entre os diversos operadores, entidades

financiadoras e utentes – cfr. n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27

de maio.

122. Sendo igualmente objetivo regulatório a defesa da liberdade de escolha nos

estabelecimentos de saúde privados por parte dos utentes – cfr. alínea d) do artigo

35.º de Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio.

123. Assim, e in casu, para que a liberdade de escolha dos utentes não seja

prejudicada, deve a mesma pautar-se por um estrito e rigoroso respeito por

princípios de transparência, veracidade, integridade e completude;

124. Pois recorde-se, a liberdade de escolha nas unidades de saúde privadas constitui

um dos pilares fundamentais da relação utente-prestador de cuidados de saúde,

incumbindo à ERS, no âmbito dos seus poderes de regulação, garantir que a

assimetria de informação existente entre o utente e os prestadores de cuidados de

saúde não conduz a práticas pontuais ou reiteradas de direcionamento.

125. Resulta assim, de todo o exposto, que a situação tal como constatada junto do

ACES Ave I – e muito em concreto, das unidades funcionais objeto da fiscalização

– não será aceitável na perspetiva regulatória vinda de sublinhar;

126. Pois como como visto, a publicidade e informação relativa a serviços de saúde

não deve influenciar a procura de determinado prestador quando baseada em

informações erradas;

127. Porquanto tanto corresponde à veiculação de informação inverídica e errónea;

25

128. Passível de potenciar, de facto, o direcionamento explícito de utentes, ao arrepio

da obrigação de garantia da livre escolha, pelos utentes, de entidade

convencionada;

129. Havendo, então, que assegurar os necessários procedimentos garantidores da

livre escolha e dissuasores da prestação de informação menos objetiva, por parte

dos funcionários (administrativos e demais profissionais de saúde) em exercício no

ACES Ave I.

130. Por todo o constatado, resulta então e em conclusão, uma violação do dever de

respeito dos direitos e interesses legítimos dos utentes por não cumprimento do

dever de prestação de informação completa e verdadeira.

131. Importa salientar agora, que nos termos do n.º 1 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º

97/98, de 18 de abril, que aprovou o Regime de Celebração de Convenções, que:

“as administrações regionais de saúde ficam obrigadas a proceder à

afixação, de modo visível ao público, das listas das entidades

convencionadas nos centros de saúde e respetivas extensões e nas

áreas de atendimento de doentes dentro dos hospitais (…)”;

132. Note-se que, no âmbito da prévia intervenção regulatória da ERS, supra

mencionada, foi considerado que:

“[…]

Tal sistema de suporte de informação deve partir, claro está, do

cumprimento do disposto no quadro legal que aqui se analisa. Mas

poderá, também, evoluir com base nas possibilidades que as

plataformas tecnológicas já permitem […] o que facilitará quer o

funcionamento prático dos Centros de Saúde e a difusão da informação

de forma íntegra e integral, quer a redução de situações de intromissão

ilícita no esclarecimento cabal dos utentes.

Por outro lado, o funcionamento do sistema pode ainda evoluir no

sentido de proceder à difusão de informação em outros locais que não

apenas os próprios Centros de Saúde e suas extensões.

Na verdade, deve permitir-se aos utentes a recolha da informação em

outros locais que não apenas nos próprios Centros de Saúde (ou suas

extensões), o que será facilitado através da divulgação das listas de

entidades convencionada nos sítios eletrónicos quer dos Centros de

26

Saúde, quer das ARS.” – cfr. deliberação emitida no ERS/088/07,

disponível em www.ers.pt.

133. E com efeito, diga-se concretamente quanto à ARS Norte, I.P., veio esta declarar,

em sede de audiência de interessados, que

“[…]

relativamente à listagem das entidades convencionadas em todas as

áreas a mesma estará, brevemente, disponível no Portal desta ARS

Norte. I.P., sendo permanentemente atualizada, cumprindo deste modo

os procedimentos recomendados por essa Entidade e facilitando o

cumprimento dos destinados aos Centros de Saúde […]” – cfr.

pronúncia da ARS Norte, I.P., no ERS/088/07.

134. Pode de facto constatar-se, no seguimento até do recomendado pela ERS, que

as listas estão disponibilizadas no sítio eletrónico e vão sendo sujeitas a

permanente atualização por parte da ARS Norte, I.P..

135. E nesta medida, não deixa a ARS Norte, I.P. de assegurar o cumprimento da

Recomendação ínsita no ERS/088/07, e que vem sendo objeto de

acompanhamento em sede de processo de monitorização, junto da ERS.

136. Note-se, por outro lado, que os ACES caracterizam-se por serem agora serviços

descentralizados, dotados de “autonomia administrativa para decidir e implementar

soluções adaptadas aos recursos e às condições de cada local e comunidade”,

bem como de órgãos e instrumentos próprios de gestão organizacional;

137. Refira-se, a título de exemplo, que no âmbito dos contratos-programa celebrados,

são incluídas, para os ACES, obrigações de garantia dos direitos e deveres dos

utentes, em matéria de divulgação da carta dos direitos e deveres dos utentes,

disponibilização de Livro de Reclamações e operacionalização, através do

gabinete do cidadão do tratamento de queixas, sugestões ou reclamações dos

utentes.

138. Por outro lado, as Unidades Funcionais aqui em causa dispõem, nos termos da

Lei e em particular quanto às USF, de autonomia organizativa, funcional e técnica;

139. E conforme resultou dos autos, no ACES Ave I, cometeu-se a cada Unidade

Funcional a responsabilidade pela prestação de informação aos utentes sobre os

prestadores convencionados;

140. Assim sendo, não pode deixar de considerar-se como extensível, compatível e

adequada ao núcleo de funções atualmente cometidas aos ACES, a obrigação de

27

“proceder à afixação, de modo visível ao público, das listas das entidades

convencionadas nos centros de saúde e respetivas extensões […]”, prevista no

artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 97/98, de 18 de abril;

141. Entendendo-se estas entidades como aquelas que em primeira linha melhor

poderão assegurar, também quanto à obrigação de afixação das listas de

entidades convencionadas, as melhores soluções adaptadas aos recursos e

condições de cada local e comunidade.

142. Intervenção que deverá, por isso, ser cabalmente assegurada, in casu, pelo

ACES Ave I;

143. Seja no que se reporta ao teor literal da lei, de afixação, de modo visível ao

público, das listas de entidades convencionadas;

144. Seja no desenho de medidas adicionais e alternativas de divulgação, para o que

relevam particularmente as competências das unidades funcionais em causa, face

à autonomia organizativa e técnica de que beneficiam.

145. Impõe-se, assim e por todo o exposto, a intervenção regulatória da ERS no

sentido de assegurar a adequação das situações detetadas, tudo com vista à cabal

garantia do respeito pelos direitos e legítimos interesses dos utentes.

V. AUDIÊNCIA DE INTERESSADOS

146. A presente deliberação foi precedida da necessária audiência escrita de

interessados, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 101.º do

Código do Procedimento Administrativo, aplicável ex vi do artigo 41.º do Decreto-

Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, tendo para o efeito sido chamado a pronunciar-se

o ACES Ave I.

147. Por ofício rececionado pela ERS em 20 de setembro de 2012, veio o ACES Ave I

exercer o seu direito de pronúncia, tendo nesse âmbito declarado, relativamente

ao projeto de deliberação da ERS notificado, não ter “objeções substantivas

relativamente ao mesmo”;

148. Existindo, no entanto, e segundo declarou igualmente, “[…] algumas questões

que gostaria de colocar”.

149. Assim, relativamente ao disposto no projeto de decisão da ERS, de que o “ACES

Ave I – Terras da Basto deve garantir, em todas as unidades funcionais que o

integram, a afixação imediata, em local visível ao público, das listas de

28

convencionados devidamente atualizadas”, refere o ACES Ave I, no que aqui

importa salientar, ter dúvidas quanto a que distritos incluir para efeitos de afixação

das referidas listas, na medida em que, por exemplo “[…] Fafe e Cabeceiras de

Basto pertencem ao distrito de Braga, mas Mondim pertence ao Distrito de Vila

Real e tem proximidade com áreas do Distrito do Porto.”.

150. Alega ainda quanto ao mesmo assunto que “[…] são inúmeras as

solicitações/determinações para afixação de materiais relacionados com os mais

variados assuntos. Só para o Distrito de Braga são 15 páginas A4 […]”;

151. O que acarreta, em seu entender, “o risco de fazer das nossas paredes um painel

que ninguém lê por excesso de informação”;

152. Por outro lado, acrescenta o mesmo ACES que não poderá “[…] responder pela

atualização das listas uma vez que tal tarefa só pode ser executada por quem tem

a competência para realizar ou fazer cessar os contratos – a ARS. O ACES

publicita as listagens disponíveis no portal da ARS do Norte que, para algumas

áreas dos MCDT possuem datas de 2009.”.

153. Já no que respeita à previsão, no projeto de deliberação da ERS, de o ACES Ave

I dever garantir que todos os funcionários se abstenham da prática de quaisquer

atos aptos a prejudicar a objetividade, integralidade e integridade da informação

para os utentes, bem como da prática de quaisquer atos que sejam aptos ao

direcionamento para prestadores, o ACES em causa salienta que “As diferentes

áreas do conhecimento e práxis, envolvendo a prescrição/realização de MCDT,

não pertencem ao domínio das ciências exatas […];

154. E no âmbito da prescrição de MCDT, será “legítimo que o médico que prescreve

possa ter uma opinião sobre a qualidade/adequação deste ou daquele serviço,

sobre a comunicação bidirecional que com ele estabelece e consequente relação

profissional […];

155. E nessa medida, não deverá atribuir-se uma “[…] suspeição a um médico pelo

simples facto dele transmitir ao seu utente, quantas vezes a seu próprio pedido,

“onde deve ir”. […]”.

156. Não obstante este entendimento, reconhece, todavia, “que é matéria onde a

fronteira entre a virtude e o interesse legítimo pode ser ténue, mas onde deve

prevalecer o princípio da confiança e da boa-fé.”;

29

157. E por considerar que “Haverá mecanismos de análise a construir para melhor

controlo destas dúvidas”, sugere que quanto a esta matéria “[…] seja auscultada a

Ordem dos Médicos”.

158. Mais refere o ACES Ave I ter privilegiado “[…] desde a primeira hora a

desmaterialização dos suportes de informação, recorrendo ao suporte de papel

apenas para as situações obrigatórias por lei.”;

159. Pelo que “[…] passou a divulgar a todos os médicos e às secretárias das

USF/UCSP, via correio eletrónico, as listagens de MCDT constantes do Portal da

ARSN, com a informação de que 1 exemplar em papel deve estar disponível nos

balcões de atendimento de cada unidade.”.

160. Ademais, e da mesma forma “[…] cada USF/UCSP afixará, da forma que

entender mais conveniente e eficaz, essas mesmas listas.”.

161. Neste âmbito ainda, manifesta o ACES Ave I que “[…a] criação de uma página do

ACES seria de enorme e progressiva utilidade para a divulgação de informação

deste tipo. Contudo […] nunca as entidades competentes deram luz verde aos

projetos […]”.

162. Por fim, e a par com a apresentação das questões já descritas, veio o ACES Ave

I sugerir ainda “[…] alguns acrescentos e alterações de redação ao Projeto de

Deliberação”.

163. Feita a descrição da pronúncia do ACES Ave I, refira-se agora e numa análise ao

respetivo conteúdo, que à exceção da clarificação sugerida quanto às unidades

funcionais que compõem o ACES Ave I, a qual foi inserida no local próprio, não

foram acolhidas as demais sugestões de alteração de redação, por não se

afigurarem como essenciais à melhor compreensão, pelo próprio ACES Ave I, do

sentido desta deliberação.

164. Por outro lado, na apreciação das questões suscitadas no âmbito da mesma

pronúncia importará relembrar a factualidade apurada nos autos e as conclusões

daí retiradas, para assim melhor clarificar o sentido da intervenção regulatória

projetada.

165. Refira-se, então, quanto ao questionado sobre as áreas a considerar na

divulgação das entidades convencionadas, que estando o ACES Ave I abrangido

pela jurisdição da ARS Norte, I.P., deverá ser disponibilizada informação relativa à

área de jurisdição desta última.

30

166. Já relativamente à preocupação manifestada quanto à eventualidade de um

excesso de informação a afixar, recorde-se que a análise empreendida nos autos

não se restringiu à verificação do cumprimento da obrigação de afixação das listas

em causa;

167. Mas procurou aquilatar da existência em si de tal informação, ainda que

admitindo a sua prestação de modo alternativo, nomeadamente, através da

disponibilização para consulta no balcão de atendimento dos utentes;

168. No entanto, e conforme foi possível apurar nos autos, ocorriam situações de

“listagens de convencionados não afixadas nem facilmente disponibilizadas, e

onde os funcionários administrativos transmitem verbal e informalmente as

informações que entendem dever prestar aos utentes”;

169. Bem como, “róis de entidades elaborados ao nível das próprias Unidades

Funcionais, todavia incompletas porque não totalmente correspondentes com as

listagens disponibilizadas pelas ARS.”;

170. Neste enquadramento, e atento o sentido da deliberação aqui em causa, forçoso

será concluir que sempre assistiria – e assistirá – ao ACES Ave I a possibilidade

de recurso a soluções que simplifiquem e obviem eventuais constrangimentos à

compreensão da informação a prestar aos utentes;

171. Nomeadamente, mediante a afixação de informação sobre a existência no balcão

de atendimento das listas de entidades convencionadas para consulta pelos

utentes;

172. E desde que se garanta a disponibilização de forma clara, completa e objetiva, e

de acesso fácil para consulta no local;

173. Trata-se aliás, e conforme já salientado no projeto de deliberação, do

reconhecimento, in casu do ACES Ave I, como a entidade que melhor poderá

assegurar, seja a afixação, de modo visível ao público, das listas de entidades

convencionadas;

174. Seja o desenho de medidas adicionais, alternativas e mais adequadas de

divulgação, para o que relevam particularmente as competências das unidades

funcionais que integram o ACES, dada a autonomia organizativa e técnica de que

beneficiam.

175. Transitando para a análise da questão levantada a propósito da atualização das

mesmas listas, afigura-se que a par com a obrigação das ARS, de dar conta das

atualizações verificadas, haverá também uma obrigação do ACES Ave I de

31

certificação periódica para garantia de divulgação de informação o mais atualizada

possível.

176. Já relativamente à consideração, pelo ACES Ave I, de não dever assacar-se uma

qualquer “suspeição a um médico pelo simples facto dele transmitir ao seu utente,

quantas vezes a seu próprio pedido, “onde deve ir”, diga-se que será certamente

de admitir que o aconselhamento médico decorrerá do normal desempenho da sua

atividade, num ideal de proximidade e de acompanhamento contínuo dos utentes;

177. Todavia, e conforme terá sido certamente compreendido pelo ACES Ave I, não

foi esta a atuação visada nos autos como passível de correção e adequação

futura, pelo que se conclui que não merece acolhimento a sugestão de ser

auscultada a Ordem dos Médicos;

178. Todavia, é certo que na adequação dos procedimentos, a ser levada a cabo pelo

ACES Ave I e que se almeja seja de sentido preventivo e pedagógico, deverá ser

direcionada a todos os funcionários, na prossecução da divulgação da informação

aos utentes de modo objetivo e integral.

179. Por fim, a referência a que o ACES Ave I terá passado a “[…] divulgar a todos os

médicos e às secretárias das USF/UCSP, via correio eletrónico, as listagens de

MCDT constantes do Portal da ARSN, com a informação de que 1 exemplar em

papel deve estar disponível nos balcões de atendimento de cada unidade”;

180. E que, “[…] da mesma forma cada USF/UCSP afixará, da forma que entender

mais conveniente e eficaz, essas mesmas listas.”;

181. Embora indicie a adoção de um comportamento apto a promover pela garantia do

cumprimento futuro da instrução projetada pela ERS, não justifica que não deva

manter-se a intervenção regulatória in casu;

182. Com vista à garantia da conformação do comportamento deste ACES à instrução

projetada pela ERS, e à posterior demonstração do respetivo cumprimento.

183. Em conclusão, considerando todo o exposto, os factos dados a conhecer pelo

ACES Ave I em sede de pronúncia, não se revelam suficientes ou capazes de

infirmar ou alterar o sentido do projeto de deliberação tal como regularmente

notificado pela ERS, e cujos termos se mantêm, assim, na íntegra.

32

VI. DECISÃO

184. Face ao exposto, o Conselho Diretivo da ERS delibera, nos termos e para os

efeitos do preceituado no artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio,

emitir uma instrução ao ACES Ave I – Terras de Basto nos seguintes termos:

(i) o ACES Ave I – Terras da Basto deve garantir, em todas as unidades

funcionais que o integram, a afixação imediata, em local visível ao

público, das listas de convencionados devidamente atualizadas;

(ii) o ACES Ave I – Terras da Basto deve garantir, em todas as

unidades funcionais que o integram, a permanente atualização das

listas em causa;

(iii) o ACES Ave I – Terras de Basto deve garantir que todos os

funcionários se abstenham, imediata e permanentemente, da prática de

quaisquer atos que sejam aptos a prejudicar a objetividade,

integralidade e integridade da informação para os utentes que deverá

resultar das listas de entidades convencionadas, bem como da prática

de quaisquer atos que sejam aptos ao direcionamento de utentes para

prestadores;

(iv) o ACES Ave I – Terras de Basto deve promover o conhecimento e

formação dos funcionários sob sua coordenação sobre o dever de

respeitar os direitos e interesses legítimos dos utentes de cuidados de

saúde, designadamente, o direito fundamental da liberdade de escolha

nas unidades privadas de saúde.

185. O ACES Ave I – Terras de Basto deve dar cumprimento imediato à presente

instrução, bem como deve dar conhecimento à ERS, no prazo máximo de 30 dias

após a sua notificação, das diligências adotadas para o efeito.

186. A instrução ora emitida constitui decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º 1

do artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, configura como

contraordenação punível in casu com coima de € 1000 a € 44 891,81, “[….] o

desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no exercício dos seus poderes,

determinem qualquer obrigação ou proibição”.

187. O Conselho Diretivo da ERS mais delibera, nos termos e para os efeitos do

preceituado no artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 127/2009, de 27 de maio, recomendar

ao ACES Ave I – Terras de Basto para que implemente, conjuntamente com o

respeito do teor da instrução supra, mecanismos internos, designadamente de

33

suporte informático, que facilitem a transmissão pelos funcionários da informação

constante das listas de convencionados e sua correta compreensão pelos utentes

dos mesmos, em prol da escolha livre e esclarecida de prestadores por estes

últimos.

188. Será dado conhecimento da presente deliberação à Administração Regional de

Saúde do Norte, I.P..

189. A versão não confidencial da presente deliberação será publicada, a final, no sítio

oficial da ERS na Internet.

O Conselho Diretivo